o pantanal fluminense - um estudo da correlação entre suas lagoas e o relevo da região norte do...
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A paisagem da região norte do estado do Rio de Janeiro, também conhecida como Região Norte Fluminense, é marcada pela presença de expressivos corpos lênticos. Nela, já foram classificadas lagunas de rios barrados, lagoas deltaicas, de meandro abandonado, reliquiar e de tabuleiros. Estas lagoas estão distribuídas em diferentes formas de relevo: na Planície Fluviomarinha, construída no processo de migração para norte da foz do rio Paraíba do Sul no Quaternário e nos Tabuleiros Terciários do Grupo Barreiras. A região estudada se localiza no Baixo Curso deste rio, o que condicionou sua formação, material de origem e a dinâmica climática regional. Desta maneira, é necessário um mapeamento geomorfológico em diferentes escalas para caracterizar seus atributos e relacioná-los às estruturas, processos, funções e formas do relevo. Esta pesquisa é parte de um projeto de mapeamento de corpos hídricos, que nesta etapa objetiva analisar o relevo da região para elaborar um mapa dos compartimentos geomorfológicos correlacionando-os as lagoas. Os procedimentos metodológicos adotados basearam-se em dados obtidos sob a perspectiva da Análise Ambiental e no uso das geotecnologias, o que possibilitaram correlacionar os nexos topológicos de localização, proximidade, continuidade e frequência das lagoas junto ao relevo. Utilizando-se do Software ArcGIS 10.2 foi elaborado um mapa síntese em mesoescala para um melhor entendimento destes corpos hídricos. Após a elaboração do mapa, observou-se que no Cinturão Orogênico do Atlântico não há lagoas; nos Tabuleiros, encontram-se lagoas alongadas e orientadas para a Planície Holocênica, que devido a movimentos neotectônicos favoreceu a dissecação diferenciada dos depósitos do Grupo Barreiras, até alcançar o lençol freático; na Planície Fluviomarinha, localizam-se depressões rasas e arredondadas que formaram lagoas e brejos construídos pela migração da foz do rio Paraíba do Sul em direção à Atafona; na Planície Costeira, os corpos lênticos formam lagunas nas depressões construídas nos antigos talvegues de rios barrados no litoral. Dados da pesquisa mostraram que dos nove municípios da Região Norte Fluminense, seis apresentam lagoas em sua paisagem, e que a feição geomorfológica predominante é a Planície Fluviomarinha. Concluiu-se que há correlação entre os corpos lênticos e os compartimentos geomorfológicos na área estudada, com a maior densidade de lagoas nos Tabuleiros, sendo possível encontrar dezenas das lagoas conectadas por complexos sistemas de canais e brejos. Assim, e devido sua relevância ecológica, econômica e social, recomenda-se a conservação destes ambientes enquanto manancial ou pelos usos múltiplos das suas águas.TRANSCRIPT
O PANTANAL FLUMINENSE: UM ESTUDO DA CORRELAÇÃO ENTRE SUAS LAGOAS E
O RELEVO DA REGIÃO NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Área: Geografia física, recursos naturais, gestão de bacias hidrográficas, zonas costeiras e áreas
protegidas.
Leidiana Alonso Alves
Instituto Federal Fluminense – IFF
Diego de Oliveira Miro
Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE
Vinícius Santos Lima
Universidade Federal Fluminense - UFF
José Maria Ribeiro Miro
Instituto Federal Fluminense – IFF
Resumo
A paisagem da região norte do estado do Rio de Janeiro, também conhecida como Região Norte
Fluminense, é marcada pela presença de expressivos corpos lênticos. Nela, já foram classificadas
lagunas de rios barrados, lagoas deltaicas, de meandro abandonado, reliquiar e de tabuleiros. Estas
lagoas estão distribuídas em diferentes formas de relevo: na Planície Fluviomarinha, construída no
processo de migração para norte da foz do rio Paraíba do Sul no Quaternário e nos Tabuleiros
Terciários do Grupo Barreiras. A região estudada se localiza no Baixo Curso deste rio, o que
condicionou sua formação, material de origem e a dinâmica climática regional. Desta maneira, é
necessário um mapeamento geomorfológico em diferentes escalas para caracterizar seus atributos e
relacioná-los às estruturas, processos, funções e formas do relevo. Esta pesquisa é parte de um
projeto de mapeamento de corpos hídricos, que nesta etapa objetiva analisar o relevo da região para
elaborar um mapa dos compartimentos geomorfológicos correlacionando-os as lagoas. Os
procedimentos metodológicos adotados basearam-se em dados obtidos sob a perspectiva da Análise
Ambiental e no uso das geotecnologias, o que possibilitaram correlacionar os nexos topológicos de
localização, proximidade, continuidade e frequência das lagoas junto ao relevo. Utilizando-se do
Software ArcGIS 10.2 foi elaborado um mapa síntese em mesoescala para um melhor entendimento
destes corpos hídricos. Após a elaboração do mapa, observou-se que no Cinturão Orogênico do
Atlântico não há lagoas; nos Tabuleiros, encontram-se lagoas alongadas e orientadas para a Planície
Holocênica, que devido a movimentos neotectônicos favoreceu a dissecação diferenciada dos
depósitos do Grupo Barreiras, até alcançar o lençol freático; na Planície Fluviomarinha, localizam-
se depressões rasas e arredondadas que formaram lagoas e brejos construídos pela migração da foz
do rio Paraíba do Sul em direção à Atafona; na Planície Costeira, os corpos lênticos formam
lagunas nas depressões construídas nos antigos talvegues de rios barrados no litoral. Dados da
pesquisa mostraram que dos nove municípios da Região Norte Fluminense, seis apresentam lagoas
em sua paisagem, e que a feição geomorfológica predominante é a Planície Fluviomarinha.
Concluiu-se que há correlação entre os corpos lênticos e os compartimentos geomorfológicos na
área estudada, com a maior densidade de lagoas nos Tabuleiros, sendo possível encontrar dezenas
das lagoas conectadas por complexos sistemas de canais e brejos. Assim, e devido sua relevância
ecológica, econômica e social, recomenda-se a conservação destes ambientes enquanto manancial
ou pelos usos múltiplos das suas águas.
Palavras-chave: Geografia Lacustre, Manancial, Geotecnologias, Mapeamento Geomorfológico.
Introdução
A água é um elemento fundamental para o equilíbrio dos sistemas naturais, assim como os
agropastoris, industriais e às sociedades urbanas. Ela deve ser considerada como um recurso
esgotável, apesar de ser uma das substâncias mais disseminadas no planeta Terra. Sua relevância
enquanto recurso justifica estudos das mais diversas áreas do saber, garantindo sua disponibilidade
e qualidade, para que no futuro a humanidade não sofra uma “crise da água”. Nas mais diversas
funções, o aprofundamento do conhecimento científico dos sistemas relacionados às águas
continentais, devem prever ações para a conservação e recuperação de bacias hidrográficas, criando
Banco de Dados, nas mais diversas escalas, para a elaboração de cenários e avaliação de impactos
que garantam o acesso à água, considerando-a um componente fundamental ao desenvolvimento da
vida no planeta (TUNDISI, et al. 2006).
A Teoria Geral dos Sistemas, desenvolvida inicialmente por Bertalanffy (1968), vem
subsidiando a produção científica da Geografia brasileira. No que diz respeito ao entendimento do
conjunto de fenômenos que se processam através dos fluxos de matéria e energia, e da
interdependência das relações entre os subsistemas naturais e antrópicos, Cunha e Freitas (2004) ao
estudarem a bacia hidrográfica do rio São João, no estado do Rio de Janeiro, dizem que é possível
propor uma gestão dos ambientes naturais a partir da análise da fisiografia da paisagem.
Desta maneira, a paisagem se apresenta como um método de representar o espaço
geográfico. A combinação articulada de seus elementos físicos, biológicos e antrópicos formam um
conjunto indissociável de atributos que sempre evoluem e que a individualiza no espaço, por isso,
não há uma idêntica a outra. Segundo Bertrand (1968), para classificar as paisagens é necessário
situá-las numa escala temporo-espacial de análise, pois os fenômenos têm início e fim no espaço,
levando-o a dizer que “a definição de uma paisagem é função da escala” e que para interpretá-la,
imagens aéreas fornecem uma visão sintética, integrada e dinâmica de uma área de estudo.
Para estabelecer os componentes e as relações entre os elementos num sistema ambiental
(Geossistema), Christofoletti (1979) sugere que sejam observados os critérios de organização, tendo
em vista as entradas e saídas de matéria e energia disponíveis. Além disso, o autor diz que é
possível analisar o funcionamento dos sistemas ambientais sem considerar o detalhamento de sua
estrutura interna, o que é classificado como Processo Resposta. Por esse princípio lógico, ao
analisar as unidades geomorfológicas, pode-se considerar o conjunto dos processos que provocam
erosão, transporte e deposição de materiais, movidos pela energia potencial gerada a partir da
diferença altimétricas do relevo. Para isso, é preciso considerar os Processos Atuantes como um
todo, enquanto aqueles provocados pelos subsistemas climáticos, pedológicos, antrópicos, entre
outros, de forma integral. Na Figura 1 apresenta-se o modelo proposto pelo autor.
Figura 1. Modelo Caixa Preta
E – Entrada de matéria e energia; S – Saída de matéria e energia
Fonte: Adaptado de Christofoletti, 1979.
A paisagem da região norte do estado do Rio de Janeiro/BR, também conhecida como
Região Norte Fluminense, é marcada pela presença de expressivos corpos lênticos. Ela é descrita
por Lamego (1946) como o “Pantanal Fluminense” e a Baixada Campista como uma região alagada
composta por rios, lagoas, brejos, e que próximo à costa, encontram-se os ambientes terrestres e
marinhos caracterizados como ecossistemas de transição.
A ocorrência de lagoas neste recorte espacial dá-se de maneira homogênea, que para Esteves
(1998), são caracterizadas como corpos d’água rasos, de água doce, salobra ou salgada, em que a
radiação solar pode alcançar o sedimento, condicionando grande produtividade primária. Para o
autor, os corpos lagunares não são elementos permanentes das paisagens, pois numa escala
geológica eles são fenômenos de curta duração, que aparecem e desaparecem no decorrer tempo.
Em pesquisas anteriores, Alves et al. (2013) as classificaram como lagunas de rios barrados
(quando os sedimentos marinhos são depositados na desembocadura de rios que chegam a costa,
formando barras arenosas, interrompendo sua ligação direta com o mar); lagoas deltaicas (formadas
por depressões nos depósitos fluviomarinhos no processo de construção da planície costeira); de
meandro abandonado (formada a partir dos processos de auto-regulação de rios meandrantes);
reliquiar (este tipo de formação se dá tanto para lagoas, quanto para lagunas, pois elas são
construídas entre as faixas de areias deixadas pelos processos de Regressão e Transgressão
Marinha); e de tabuleiros (são lagoas encaixadas nos vales do Grupo Barreiras e esculpidas pela
erosão diferencial nos tabuleiros sedimentares).
Estas lagoas estão distribuídas em diferentes compartimentos do relevo, tanto na Planície
Fluviomarinha, quanto nos Tabuleiros Terciários do Grupo Barreiras, não ocorrendo no Cinturão
Orogênico do Atlântico, localmente denominada de Serra do Desengano (ALVES et al. 2014).
Ao estudarem o relevo regional, Geiger (1956) e Ramalho (2005) relataram que o Cinturão
Orogênico do Atlântico tem origem Pré-Cambriana, localizando-se a oeste da cidade de Campos
dos Goytacazes, onde se observam afloramentos rochosos, falhas, fraturas, além de morros
cristalinos isolados e arredondados. Contínuo a este, em direção a Planície Costeira, encontram-se
depósitos sedimentares Terciários do Grupo Barreiras, que são formados por materiais não
consolidados e erodidos, resultando em superfícies aplainadas e vales abruptos, esculpidos nos
eventos glaciais e interglaciais, aos quais foram submetidos. Por último, num patamar altimétrico
inferior, observa-se a Baixada Campista, formada no Quaternário, onde se destacam os depósitos
fluviomarinhos acomodados entre o rio Paraíba do Sul e lagoa Feia e, próximo à costa, encontram-
se cristas arenosas de formação marinha.
O relevo da região é submetido a processos erosivos, de transportes e deposições, relativos
ao baixo curso de rio Paraíba do Sul, o que condicionou sua formação, material de origem e a
dinâmica climática regional. Desta maneira, são necessários mapeamentos geomorfológicos
sistemáticos, em diferentes escalas, para caracterizar seus atributos e relacioná-los às estruturas,
processos e funções aos quais estão sendo submetidos, condicionando as formas de relevo que se
encontram na paisagem (ARGENTO, 1987).
Esta pesquisa é parte de um projeto de mapeamento de corpos hídricos, desenvolvido no
Instituto Federal Fluminense em parceria com a Universidade Federal do Espírito Santo. Nesta
etapa, objetivou-se analisar o relevo da região para elaborar um mapa dos compartimentos
geomorfológicos e em seguida correlacioná-los as formas de lagoas neles existentes. Por meio da
análise do mapa síntese e Trabalhos de Campo, chegou-se a hipótese que há correlação entre a
forma das lagoas e o relevo no qual elas estão localizadas. Logo, haveria agrupamentos destas
lagoas conforme suas similaridades geométricas. Desta forma, o problema de sistematização dos
corpos lênticos em sistemas ambientais foi tratado a partir de conceitos da Geometria Fractal,
enquanto ferramenta utilizada para analisar as complexidades que são observadas na natureza
(CHRISTOFOLETTI, 2004).
Na Figura 2, observa-se a região norte do estado do Rio de Janeiro, estabelecida por meio de
critérios hidrogeomorfológicos, considerando os divisores de água que direcionam fluxos de
matéria e energia da Serra do Mar na direção dos Tabuleiros Terciários, em seguida pela Baixada
Campista até alcançar o Nível Mar.
Figura 2. Mapa de localização da região norte do estado do Rio de Janeiro
Elaborado pelos autores.
Metodologia
Para realização desta pesquisa foram consultados livros, teses, dissertações, artigos em
periódicos e anais de congressos. Ressalta-se que neles não foi identificado um método específico
que correlacionasse os compartimentos geomorfológicos as formas de lagoas neles contidos.
O Método de Análise Ambiental foi indicado para o projeto, pois ele busca entender o
ambiente em sua totalidade, possibilitando observar as inter-relações entre os elementos neles
existentes (MARQUES, 2008). Isso possibilitou correlacionar os nexos topológicos de localização,
proximidade, continuidade e frequência das lagoas junto ao relevo. Para Xavier da Silva (1992) e
Câmara & Medeiros (1998), esta metodologia está associada ao uso das geotecnologias, o que
possibilita correlacionar à evolução espacial e temporal de um fenômeno geográfico.
Aliado ao método de Análise Ambiental, o Software ArcGIS 10.2 foi utilizado para elaborar
mapas em mesoescala e obter um melhor entendimento destes corpos hídricos junto aos
compartimentos geomorfológicos. Além disso, para que os dados fossem validados, foram
realizados Trabalhos de Campo para identificar in loco as unidades do relevo e suas lagoas, desta
forma, os objetos foram analisados de perto e suas possíveis correlações puderam ser atualizadas
com geotecnologias, sendo essencial para o bom desenvolvimento da pesquisa.
Na Figura 3 e no Quadro 1, apresentam-se graficamente o algoritmo para a organização
metodológica do trabalho Doni (2004), no qual, e com o Banco de Dados preexistente do
Laboratório Sala Verde IFF Campos, onde a pesquisa é realizada, selecionou-se informações de
acordo com as escalas disponíveis, para que através do método de Análise Ambiental fossem
gerados mapas sínteses, que posteriormente foram tratados com parâmetros estatísticos para
correlacionar as classes de lagoas ao seu relevo.
Figuras 3. Fluxograma do algoritmo da pesquisa
Elaborado pelos autores.
Quadro 1. Descrição das ações do algoritmo da pesquisa
Ação Descrição
1 Início; Planejamento das ações.
2 Seleção das informações para formação do Banco de Dados da pesquisa (textos, mapas,
planos de informações, fotografias e imagens de satélites).
3 Aplicar o método de Análise Ambiental e o Software ArcGIS 10.2 para correlacionar a
localização e frequência das lagoas da Região Norte Fluminense ao relevo.
4 Gerar mapa síntese.
5 Análise Estatística utilizando Índices de Circularidade para estabelecer classe de lagoas
segundo a forma; Correlacionar estas classes aos relevos aos quais estão contidas.
6 Finalização do processo. Elaborado pelos autores.
Procedimentos operacionais
Elaboração dos mapas
Para que o questionamento motivador, juntamente ao objetivo central desta investigação
fossem perseguidos, tornou-se necessário seccionar a pesquisa em distintas etapas processuais que
se iniciam com a aquisição dos materiais cartográficos, produtos orbitais e semi-orbitais. A etapa
subsequente é compreendida pelo método de Mapeamento Geomorfológico proposto por Silva
(2009), culminando no produto cartográfico gerando o Mapa Morfoescultural, resultando em
distintos níveis taxonômicos para representar esculturalmente o relevo. O fluxograma (Figura 4)
apresenta as principais fases metodológicas.
Figura 4. Principais etapas metodológicas
Fonte: Organizado pelos autores.
Etapa 1 – Aquisição de materiais cartográficos, produtos orbitais e semi-orbitais: todas as fontes
utilizadas nesta investigação foram obtidas gratuitamente via Internet junto a órgãos oficiais de
reconhecimento regional e nacional. Os Planos de Informações (PIs) dos Limites Municipais foram
adquiridos no sítio do Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro (INEA, 2011) na escala de
1:100.000. A Hidrografia foi gerada a partir do processo de digitalização dos alvos de interesse
(vetorização), tendo como base as ortofotos do Projeto RJ-25 do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE, 2008) com resolução espacial de 1 metro. O Modelo Digital de Elevação (MDE),
em formato raster Geotiff também foi adquirido junto ao IBGE (2008), sendo este, parte integrante
do Projeto RJ-25, com resolução espacial de 20 metros.
Etapa 2 – Mapeamento geomorfológico da Região Norte Fluminense: numerosas são as propostas
de representação cartográfica do relevo. Aliadas a elas, encontram-se argumentos que evidenciam a
importância da escala e das feições a serem mapeadas. Adotou-se para este trabalho, o método
proposto por Silva (2009), por entender que sua contribuição adequa-se ao objetivo central aqui
traçado e pela operacionalidade do manuseio com as ferramentas de Sistema de Informações
Geográficas (SIG) e Sensoriamento Remoto (SR). A autora regionalizou o estado do Rio de Janeiro
sob dois táxons geomorfológicos, a saber: os domínios morfoestruturais e os domínios
morfoesculturais, utilizando-se como critério a hipsometria. Para ela, os domínios morfoesculturais
são classificados em: Planícies Fluviais e Flúvio-Marinhas; Colinas; Morros; Serras Isoladas e
Serras Locais; e Serras Escarpadas, como se vê na Tabela 1, abaixo.
Tabela 1. Amplitudes hipsométricas dos domínios morfoesculturais da Região Norte Fluminense
Fonte: Silva (2009).
Análise Estatística
De posse do mapa síntese, Sistemas de lagoas costeiras do Baixo Curso do Rio Paraíba do
Sul, elaborado por Alves et al. (2014), que se vê na Figura 5, utilizou-se o método de Ward para a
análise de agrupamento (Cluster Analysis), com base nos parâmetros: proximidade; largura maior;
razão entre a área e o perímetro; e o índice de circularidade dado pela razão entre a área da lagoa e a
área de um círculo, cujo diâmetro corresponde a maior medida entre a sua largura maior e o
comprimento maior, de forma que o desvio padrão entre os objetos de cada grupo seja mínimo.
A Análise de Agrupamentos consiste em um conjunto de técnicas e algoritmos, cujo
objetivo é encontrar a melhor forma de organizar objetos em grupos de acordo com uma ou mais
características de interesse. Uma das formas mais comuns de representar esses grupos é através de
um dendograma ou diagrama de árvore. Um dendograma é um gráfico bidimensional em que o eixo
vertical é graduado com os resultados de similaridade, no qual os grupos são organizados, e linhas
horizontais que unem os objetos mais semelhantes, formando grupos homogêneos (FREI, 2006).
Para isso, utilizou-se o Software R Project 3.1.2 (R CORE TEAM, 2006), para agrupar as
lagoas em classes e elaborar o dendograma através das funções DIST() e HCLUST(), disponíveis
no programa. Desta forma, criou-se um Índice de Forma para as lagoas da região.
Figura 5. Sistemas das lagoas do Baixo Curso do rio Paraíba do Sul
Fonte: Alves et al. (2014).
Principais Resultados
A partir do que foi proposto por Silva (2009), elaborou-se o mapa dos Domínios
Morfoesculturais da Região Norte Fluminense, nele ratificou-se os trabalhos de Geiger (1956),
Argento (1987) e Ramalho (2005).
No mapa abaixo (Figuras 6), elaborado a partir de dados hipsométricos, observam-se
compartimentos bem definidos correlacionados ao período geológico e aos processos
geomorfológicos aos quais foram submetidos. Por uma interpretação geomorfológica, entende-se
que o relevo regional apresenta-se com um alto nível de dependência entre suas unidades, e que
formam subsistemas consecutivos, compostos por patamares bem definidos, o que condiciona os
fluxos de matéria e energia em cada um deles.
Figura 6. Mapa dos Domínios Morfoesculturais da Região Norte Fluminense
Elaborado pelos autores.
A porção mais afastada do litoral faz parte da cadeia de montanhas que formam a Serra do
Mar, originada da Colisão de Placas Tectônicas ocorrida entre 650 e 480 milhões de anos AP. Este
relevo cristalino se destaca na paisagem regional, nele predominam morros de encostas abruptas,
paredões de rochas metamorfizadas, muitas vezes verticais, que podem atingir altitudes de até 1.800
metros (GEIGER, 1956).
Consequente aos maciços cristalinos pode ser observada uma região de Tabuleiros. Ela se
formou no Período Terciário (Época Miocênica – aproximadamente entre 23 e 12 milhões de anos
AP), que se caracterizam por relevos de topos aplainados, encostas dissecadas e vales profundos
com brejos periféricos, além da presença de morros isolados, representando o relevo residual muito
erodido do Cristalino (ARGENTO, 1987).
Por último, como se observa no mapa acima, encontram-se as Planícies Fluviomarinha,
datada do Período Quaternário (2 milhões de anos AP até os dias atuais), sendo sua maior porção,
construída na Época Holocênica (10 mil AP até os dias atuais). Ela é seccionada pelo rio Paraíba do
Sul, que a divide em duas porções, sendo a maior, localizada na parte sul. Devido a problemas
metodológicos e de escala, não se vê no mapa seus dois compartimentos. Eles são definidos pelas
características apresentadas pelos solos, em que na porção encaixada entre o rio Paraíba do Sul e a
lagoa Feia, predominam depósitos aluviais, fruto de sua deposição no processo de migração da foz
do rio em direção ao norte; enquanto que na faixa mais próxima ao mar, prevalecem os solos
arenosos, originados pelos processos de Transgressão e Regressão Marinha, formando cristas mais
ou menos paralelas a linha de praia atual. Ressalta-se ainda, que estas planícies sedimentares
concentram, historicamente, a maior parte da população e das atividades econômicas da Região
Norte Fluminense (RAMALHO, 2005).
No Diagrama esquemático dos principais elementos do relevo da Região Norte Fluminense
(Figura 7), apresentam-se organizadas as principais unidades nela existente, especificando as
altitudes correlacionadas. Geomorfologicamente, consideram-se os fluxos entre os seus
componentes e que há processos interdependentes entre eles. Como relação à Geografia Lacustre,
infere-se que há necessidade de compreensão dos níveis hierárquicos ao qual elas estão inseridas e
aqueles à montante, devido aos fluxos de matéria e energia que ocorrem entre eles.
Figura 7. Diagrama esquemático dos principais elementos do relevo da Região Norte Fluminense
Elaborado pelos autores.
Na Figura 8, apresentam-se alguns exemplos de lagoas existentes na paisagem regional, nas
quais se observam as correlações acima mencionadas. As lagoas Limpa e da Onça, típicas do relevo
dos Tabuleiros Terciários, são influenciadas pelos patamares aos quais elas estão inseridas e aqueles
à montante. Desta forma, estas depressões relativas do relevo podem ser entendidas como Níveis de
Base Local, e receptoras de matéria e energia carreadas de outros patamares, elevando o risco de
assoreamento pelo uso inadequado da terra em seu entorno. Já as lagoas do Campelo e Açu
encontram-se localizadas na Planície Fluviomarinha, onde prevalecem os processos de auto-
regulação relativos ao tipo de solo e a distância que elas se encontram do mar.
Figura 8. Exemplos de lagoas existentes na região Norte Fluminense
Elaborado pelos autores.
Ao observar o mapa dos Sistemas de lagoas costeiras do Baixo Curso do Rio Paraíba do Sul
(Figura 5), encontrou-se um padrão de formas predominantes que sugerem processos formadores
semelhantes, como se vê na Figura 9. A seguir são apresentadas suas principais características:
Forma Dendrítica – lagoas que apresentam longos “braços” que se assemelham a raízes por
toda a extensão do corpo hídrico principal;
Forma Circular/Oval – lagoas que se apresentam grosseiramente circulares, em que os raios
medidos a partir de um ponto central, seriam semelhantes entre si;
Forma de Espinha de Peixe – lagoas que apresentam “braços” finos e paralelos ao longo do
corpo principal, assemelhando-se a uma dorsal, como as “espinhas” ao longo da vértebra
central dos peixes;
Forma Alongada – lagoas que apresentam um diâmetro de comprimento, algumas vezes
maior que o diâmetro de largura;
Forma tipo Serpente – lagoas que se apresentam na forma de um corpo principal muito
esguio e que seu comprimento é sempre muito superior a sua largura;
Forma Composta – lagoas que não apresentam uma forma definida, pois são combinações de
distintas formas;
Figura 9. Formas lacustres identificadas no relevo da Região Norte Fluminense
Elaborado pelos autores.
Na tentativa de correlacionar as lagoas da Região Norte Fluminense ao relevo ao qual elas
estão contidas, foi elaborado um dendograma de agrupamento por semelhança (Figura 10),
conforme o Índice Forma, descrito nos Procedimentos Operacionais Estatísticos acima. Desta
maneira, foi possível identificar um nível de similaridade de 90% das ligações intragrupos das 73
lagoas inventariadas. A seguir serão apresentadas as principais correlações encontradas entre o
relevo e os corpos lênticos da região:
A primeira semelhança surge com as lagoas Preta, Paulista e Carapebus, que podem ser
classificadas como lagoas Compostas, e ao correlacioná-las ao relevo nas quais estão
inseridas, observou-se que elas estendem-se da Planície Costeira até os Tabuleiros
Terciários;
As lagoas do Açu e Salgada aparecem no mesmo grupo e estão localizadas na Planície
Costeira, tendo a primeira forma tipo Serpente e a segunda tem forma Alongada;
As lagoas de Dentro, Luciano, Jacaré e Ribeira estão na Planície Fluvial e apresentam forma
Alongada;
As lagoas Carrilho, Carvão, Chica, Campelo ou Piri Piri, Canema, Visgueiro, Piri Piri, Pires,
Robalo, Bezerra, Amarra Boi, Maria Menina, Casa Velha, Garça, Ubatuba e Barrinha estão na
Planície Fluviomarinha e têm forma Circular/Oval;
As lagoas Comprida e Jurubatiba estão na Planície Fluviomarinha e apresentam a forma de
Espinha de Peixe;
As lagoas Lagamar e Taí estão na Planície Fluviomarinha e são Alongadas;
As lagoas Taquaruçu, Limpa, Santa Maria, São Gregório, Guriri, Buena, Tatagiba Açu,
Grande e Pedras estão no Tabuleiro e apresentam a forma Dendrítica;
As lagoas Taboa (Norte/Sul), Praia, Comércio, Grussaí e Iquipari estão na Planície
Fluviomarinha e têm forma do tipo Serpente;
Figura 10. Dendograma de agrupamento das lagoas da Região Norte Fluminense
Elaborado pelos autores.
As lagoas Manguinhos, Ilha ou Barrinha, Salgada – SFI (II), Doce, Tatagiba Mirim, Saco,
Onça, Vigário (Norte/Sul), Cantagalo, Furnas, Roça, Pedras – SFI, Funil, Coqueiro, Olaria,
Dentro – SFI, Jacu, Salgada – SFI e Maria do Pilar estão nos Tabuleiros Terciários, têm
forma Dendrítica, com áreas pequenas, variando entre a lagoa Ilha ou Barrinha com 3,41 ha e
Saco com 59,17 ha, com exceção de duas maiores, as lagoas Manguinhos 114,12 ha e Onça
com 126,25 ha;
As lagoas da Saudade, Brejo Grande, Feia do Itabapoana e Macabu estão nos Tabuleiros
Terciários, têm a forma Dendrítica, e se destacam na paisagem por terem áreas muito
grandes, variando entre a lagoa de Macabu com 571,02 ha e a lagoa Feia do Itabapoana com
5.127, 22 ha;
As discordâncias do modelo foram às lagoas de Cima, Imboassica, Funda, Arisco, Campelo e
Feia, pois não apresentaram boa correlação entre o Índice de Forma e a posição no relevo
onde estão localizadas.
Conclusões
A região norte do estado do Rio de Janeiro/BR apresenta diferentes unidades geossistêmicas
condicionadas por sua formação geológico-geomorfológica e história de uso e ocupação da terra.
Entendendo as lagoas costeiras como estruturas temporárias na paisagem, elas são corpos hídricos
de águas claras, e de alta produtividade primária, pois a luz do sol atinge o assoalho lacustre, o que
favorece o processo de eutrofização. Somado a isso, são corpos rasos que ao receberem sedimentos
de sua bacia, deflagram processos de assoreamento, definindo uma forte relação temporo-espacial
com o relevo adjacente.
Após a elaboração do mapa, observou-se que no Cinturão Orogênico do Atlântico não há
lagoas; nos Tabuleiros encontram-se lagoas alongadas e orientadas para a Planície Holocênica, onde
predomina a Forma Dendrítica, que devido a movimentos neotectônicos favoreceu a dissecação
diferenciada dos depósitos do Grupo Barreiras, até alcançar o lençol freático. Na Planície
Fluviomarinha, localizam-se depressões rasas e arredondadas que formaram lagoas e brejos
construídos pela migração da foz do rio Paraíba do Sul em direção à em Atafona; na Planície
Costeira, os corpos lênticos formam lagunas nas depressões construídas nos antigos talvegues de
rios barrados no litoral, podendo apresentar formas do tipo Serpente, Alongadas, Circulares/Oval
e Compostas. Dados da pesquisa mostraram ainda, que dos nove municípios da Região Norte
Fluminense, seis apresentam lagoas em sua paisagem, e que a feição geomorfológica predominante
é a Planície Fluviomarinha. Estes processos de erosão, transporte e sedimentação, criaram ao longo
do tempo uma paisagem particular, que também pode ser chamada de Cabo de São Tomé.
Concluiu-se que há correlação entre os corpos lênticos e os compartimentos
geomorfológicos na área estudada. Acrescenta-se que há maior densidade de lagoas nos Tabuleiros
Terciários, sendo possível encontrar dezenas delas conectadas por complexos sistemas de canais e
brejos. Assim, e devido sua relevância ecológica, econômica e social, recomenda-se a conservação
destes ambientes enquanto manancial ou pelos usos múltiplos das suas águas.
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