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CLAUDIA PEREIRA DE PDUA SABIA
O PBLICO E O PRIVADO NA POLTICA DE COOPERAO UNIVERSIDADE-EMPRESA
DA UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA UNESP
MARLIA 2007
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CLAUDIA PEREIRA DE PDUA SABIA
O PBLICO E O PRIVADO NA POLTICA DE COOPERAO UNIVERSIDADE-EMPRESA
DA UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA UNESP Tese apresentada Faculdade de Filosofia e Cincias da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Campus de Marlia, para a obteno do ttulo de Doutor em Educao (rea de Concentrao: Polticas Pblicas e Administrao da Educao Brasileira).
Orientador: Dr. Candido Giraldez Vieitez
MARLIA 2007
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Ficha Catalogrfica
Sabia, Claudia Pereira de Pdua. S116p O pblico e o privado na poltica de cooperao universidade-empresa da Universidade Estadual Paulista - UNESP / Claudia Pereira de Pdua Sabia. --Marlia, 2007. 211f. : il. ; 30cm.
Tese (Doutorado em Educao) - Faculdade de
Filosofia e Cincias, Universidade Estadual Paulista, 2007. Bibliografia: p. 187 197. Orientador: Prof. Dr. Candido Giraldez Vieitez
1. Poltica. 2. Cooperao universidade-empresa.
3. Mercantilizao da Educao. I Autor. II.Ttulo. CDD 378
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CLAUDIA PEREIRA DE PDUA SABIA
O PBLICO E O PRIVADO NA POLTICA DE COOPERAO UNIVERSIDADE-EMPRESA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - UNESP
Esta tese foi julgada adequada e aprovada para a obteno do grau de Doutor em Educao, rea de concentrao em Polticas Pblicas e Administrao da Educao Brasileira, da Faculdade de Filosofia e Cincias da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Campus de Marlia.
Marlia, 30 de maro de 2007.
Comisso Examinadora:
__________________________________ Prof. Dr.Candido Giraldez Vieitez
Orientador
___________________________________ Prof Dr. Neusa Maria Dal R
______________________________________ Prof. Dr.Paulo Rodrigues Ribeiro da Cunha
_____________________________________ Prof. Dr. Marlia Faria de Miranda
_____________________________________ Prof. Dr.Carlos Bauer
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Aos meus pais, Francisco (in memorian) e Maria Jos, pelo amor, apoio, socorro e incentivo constantes. Ao meu marido Fernando, companheiro, amigo e amor da minha vida, que contribuiu efetivamente para que eu pudesse desenvolver este trabalho. Aos meus filhos Fernando e Mariana, razo maior do meu viver, que sobreviveram s minhas dificuldades e ausncias. A Deus, que tem me sustentado em todas as dificuldades.
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AGRADECIMENTOS
Ao chegar ao trmino deste trabalho, quero agradecer a muitas pessoas, que, cada uma a seu modo, deram sua colaborao. Por recear omisses, registro meus agradecimentos a todos os que contriburam, direta ou indiretamente, para a realizao desta pesquisa. Em especial:
Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Campus de Marlia, que, por meio de sua administrao e de seus professores e funcionrios, permitiram a realizao deste doutorado.
Ao professor Candido Giraldez Vieitez, pela sua valiosa orientao, pacincia e disponibilidade.
professora Neusa Maria Dal Ri, pelas contribuies, amizade e ensinamentos transmitidos.
Ao professor Paulo Rodrigues Ribeiro da Cunha, que com sua participao no exame de qualificao trouxe significativas contribuies ao trabalho.
Aos professores Marilia Faria de Miranda e Carlos Bauer, membros examinadores externos, pelo pronto atendimento e receptividade.
Maria Joana Barni Zucco, pela reviso do trabalho e apoio recebido.
Aos meus colegas de trabalho, Adriana Migliorini Kieckhfer, Marisa Lvia Branam de Freitas, Mrcia Oliveira Alves, Maria Ester Braga Faria, Luis Alberto Camargo Vassalo, Marcio Jos Segateli e Edmir Barbosa Viana pelo auxlio incondicional e amizade durante a realizao desse estudo.
minha irm Francis Marlia Pdua Fernandes, porque durante o caminho esteve disponvel, atendendo a meus pedidos de socorro.
minha amiga Luzia Eliza Belline Silvestre, pela sua amizade, torcida e disponibilidade.
s minhas auxiliares em casa, Rosemeire Saraiva de Oliveira, Valquiria Ferreira Prata e Maria da Penha Rodrigues, que, alm da ajuda nas tarefas domsticas, em revezamento, cuidaram com carinho dos meus filhos para que eu pudesse me dedicar realizao deste trabalho.
Aos familiares e amigos pelo carinho e incentivos permanentes, e pela compreenso nos momentos em que no estive presente.
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H homens que lutam um dia e so bons.
H homens que lutam um ano e so
melhores.
H homens que lutam muitos anos e so
muito bons.
Porm, h homens que lutam a vida
inteira, e esses so imprescindveis.
(Bertold Bretch)
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RESUMO SABIA, Claudia Pereira de Pdua. O pblico e o privado na poltica de cooperao universidade-empresa da Universidade Estadual Paulista UNESP. 2007. 211f. Tese (Doutorado em Educao) Faculdade de Filosofia e Cincias da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Marlia.
O estudo teve como objetivo identificar a poltica de cooperao universidade-empresa da Universidade Estadual Paulista UNESP contrapondo os interesses do setor privado e os da universidade. Buscou analisar o posicionamento e a atuao da UNESP, identificar as polticas pblicas de incentivo cooperao, detectar a posio do segmento docente e, em ltima instncia, analisar se os interesses da universidade e os interesses privados tm sido conciliados nas aes prticas da instituio. O objeto do estudo est contido no contexto de mudanas da universidade, provocadas principalmente pela diminuio do papel do Estado em vrios setores, particularmente o educacional, que traz como uma das conseqncias o processo de privatizao. O estudo considerou que a regulamentao da poltica universidade-empresa no explcita, alm de ser omissa e permissiva, ou seja, no foram identificadas, na pesquisa, aes efetivas no sentido de definir claramente as linhas de atuao para a parceria com o setor empresarial. Na atuao prtica, constatou-se a inexistncia de qualquer instrumento de controle dessas atividades, somada ao fato de o gerenciamento dos recursos obtidos pelos convnios ser feito pelas fundaes de apoio sem a devida prestao de contas. Dessa forma, confirma-se a hiptese de que a falta de uma poltica explcita para as relaes entre a universidade e a empresa tem favorecido os interesses privados das empresas e de um grupo de docentes envolvidos em detrimento dos interesses da universidade. Portanto, a poltica institucionalizada identificada parece possibilitar formas de privatizao interna da UNESP, constituindo-se como um instrumento que favorece a instalao do processo de mercantilizao na universidade. Palavras-Chave: Poltica. Cooperao universidade-empresa. Mercantilizao da Educao.
Ensino Superior Pblico e Privado. Universidade Estadual Paulista.
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ABSTRACT SABIA, Claudia Pereira de Pdua. - The Public and the Private sectors between the university-company cooperation policies of Paulista State University UNESP. 2007. 211f. Doctors Degree Dissertation (Doctor in Education) Faculty of Philosophy and Sciences of Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Marlia.
The study aimed to identify the cooperation policies of university-company of the State University UNESP interposing the interest of the private sector against those of the university. In intent to analyze UNESP actions and position, this work identified public policies of incentive for cooperation, detecting the teaching staff position, and as a final point analyzed whether the university and private interests have been coordinated with practical actions from the institution. The aim of the study was within the context of the academic changes, provoked mainly by the reduction of governmental roles into many sectors, particularly the educational one, consequently leading to a privatization process. The study considered that the regulations for university-company policies are not overt, besides they present omission and lenience, it means, effective actions were not identified during the research so to clearly define proactive approaches towards partnerships with the entrepreneur sector. At the practical action, this study has evidenced the lack of any controlling instrument for those activities, along with the fact that the management of resources obtained by grant foundations agreements were without due account reports. Therefore, the hypothesis of a lack of an overt policy was confirmed in regards to the relationship between university and the company, favoring private interests companies belonging to a group of academic staff- in detriment of the university own interest. As a conclusion, the identified institutionalized policy seems to enable ways that lead to internal privatization of UNESP, constituting itself as an instrument that favors the installment of a commercialization process into the university.
Key-words: Policies, university-company cooperation, education commercialization, private and public academic teaching, Universidade Estadual Paulista.
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LISTA DE ILUSTRAES
Ilustrao 1 Quadro de matrculas no ensino superior nas redes pblica e privada.............39
Ilustrao 2 Quadro de projetos de cooperao do programa PITE da FAPESP,
desenvolvidos pela UNESP e pela iniciativa privada de 1995 a 2001. ....................................71
Ilustrao 3 Quadro dos tipos de instrumentos dos convnios de cooperao. .................118
Ilustrao 4 - Quadro dos convnios de cooperao da UNESP por unidades.....................120
Ilustrao 5 - Quadro dos convnios de cooperao tcnico-cientfica sem valor financeiro da
UNESP. ..................................................................................................................................121
Ilustrao 6 - Quadro dos convnios de cooperao tcnico-cientfica com valor financeiro
da UNESP...............................................................................................................................123
Ilustrao 7 - Quadro dos convnios de outras cooperaes com valor financeiro da UNESP.
................................................................................................................................................124
Ilustrao 8 - Quadro dos valores dos convnios de 2006 a 2011. .......................................126
Ilustrao 9 - Quadro dos convnios de cooperao tcnico-cientfica sem e com valores
financeiros em vigor na Unidade de Araraquara ....................................................................129
Ilustrao 10 - Quadro dos convnios de outras cooperaes com valores financeiros em
vigor na Unidade de Araraquara.............................................................................................130
Ilustrao 11 - Quadro dos convnios de cooperao tcnico-cientfica sem e com valores
financeiros em vigor na Unidade de Jaboticabal. ...................................................................145
Ilustrao 12 - Quadro dos convnios de cooperao tcnico-cientfica com e sem valores
financeiros em vigor na Unidade de Botucatu........................................................................151
Ilustrao 13 - Quadro dos convnios com outras cooperaes com valores financeiros em
vigor na Unidade de Botucatu. ...............................................................................................153
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LISTA DE SIGLAS
ACQUAUNESP Projeto de Anlise de gua da Universidade Estadual Paulista
ADUSP Associao dos Docentes da Universidade de So Paulo
ADUNESP Associao dos Docentes da Universidade Estadual Paulista
AGCS Acordo Geral sobre Comrcio e Servios
AGREO rea de Gesto de Recursos Extra-Oramentrios
ALCA rea de Livre Comrcio das Amricas
ANDES Associao Nacional dos Docentes do Ensino Superior
ANDIFES Associao Nacional de Dirigentes de Instituies Federais de
Ensino Superior
ANPEI Associao Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia
de Empresas Inovadoras
APLO Assessoria de Planejamento Oramentrio
AREX Assessoria de Relaes Externas
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BM Banco Mundial
BNDE Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico
CADE Conselho de Administrao e Desenvolvimento
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CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior
CCEU Cmara Central de Extenso Universitria
CCG Cmara Central de Graduao
CCPe Cmara Central de Pesquisa
CCPG Cmara Central de Ps-Graduao
CECAE USP Coordenadoria Executiva de Cooperao Universitria e
Atividades Especiais da Universidade de So Paulo
CEPAL Comisso Econmica para a Amrica Latina e o Caribe
CEPE Conselho de Ensino, Pesquisa e Extenso Universitria
CEPEU Comisso Permanente de Extenso Universitria
CEPID Centros de Pesquisa, Inovao e Difuso
C&T Cincia e Tecnologia
CIDE Contribuio de Interveno do Domnio Econmico
CO Conselho Universitrio
ConSISTEC Consrcios Setoriais para a Inovao Tecnolgica
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
CSMPE Conselho Superior do Ministrio Pblico do Estado de So Paulo
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CSLL Contribuio Social sobre o Lucro Lquido
CTA Centro Tecnolgico Aeroespacial
CVPs Centros Virtuais de Pesquisa
CVRD Companhia Vale do Rio Doce
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria
FACTE Fundao de Apoio Cincia, Tecnologia e Educao
FAEPO Fundao Araraquarense de Ensino e Pesquisa em Odontologia
FAMESP Fundao para o Desenvolvimento Mdico e Hospitalar da Unesp
FAPESP Fundao de Amparo e Pesquisa do Estado de So Paulo
FCAV Faculdade de Cincias Agrrias e Veterinrias
FHC Fernando Henrique Cardoso
FIES Financiamento Estudantil
FINEP Financiadora de Estudos e Projetos
FINEP-TEC Financiadora de Estudos e Projetos - Apoio a Parceria
Tecnolgica Universidade-Empresa
FMI Fundo Monetrio Internacional
FNDCT Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
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FNS Fundo Nacional de Sade
FUNARB Fundao Arthur Bernardes
FUNDES Fundo de Desenvolvimento Econmico e Social
Fundo BIO Fundo de Biotecnologia
FUNDUNESP Fundao para o Desenvolvimento da Unesp (Reitoria)
FUNVET Fundao de Apoio aos Hospitais Veterinrios da Unesp
FURP Fundao para o Remdio Popular
FVA Fundo Verde Amarelo
GID Grupo de Informaes Documentrias
GT Fundaes Grupo de Trabalho das Fundaes FINEP
IBB Instituto de Biocincias do Campus de Botucatu
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
ICTs Instituies Cientficas e Tecnolgicas
IES Instituies de Ensino Superior
IFES Instituies Federais de Ensino Superior
INCUNESP Incubadora de Empresas de Base Tecnolgica da Unesp
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INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio
Teixeira
IPEA Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada
IPI Imposto sobre Produtos Industrializados
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao
MCT Ministrio da Cincia e Tecnologia
MEC Ministrio da Educao
MP Medida Provisria
MPE Micro e Pequenas Empresas
NIT Ncleo de Inovao Tecnolgica
OGU Oramento Geral da Unio
OMC Organizao Mundial do Comrcio
PADCT Programa de Apoio ao Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
PAPPE Programa de Apoio Pesquisa em Empresas
PAPI Programa de Apoio Propriedade Intelectual
PASEP Programa de Formao do Patrimnio do Servidor Pblico
PAT Plano Anual de Trabalho
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PBDCT Plano Bsico de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
PDCT Programa de Difuso da Cincia e da Tecnologia
PDTA Programa de Desenvolvimento Tecnolgico Agropecurio
PDTI Programa de Desenvolvimento Tecnolgico Industrial
P&D Pesquisa e Desenvolvimento
PIB Produto Interno Bruto
PICTA Parceria para Inovao em Cincia e Tecnologia
PIPE Parceria de Inovao em Pequenas Empresas
PIS Programa de Integrao Social
PITE Parceria para Inovao Tecnolgica
PND Plano Nacional de Desenvolvimento
PNE Plano Nacional de Educao
PPPs Parcerias Pblico-Privadas
PRODETAB Projeto de Apoio ao Desenvolvimento de Tecnologia
Agropecuria para o Brasil
PROEX Pr-Reitoria de Extenso
PROUNI Programa Universidade para Todos
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PROPe Pr-Reitoria de Pesquisa
RBT Rede Brasil de Tecnologia
RDCT Rede de Difuso da Cincia e da Tecnologia
RDIDP Regime de Dedicao Integral Docncia e Pesquisa
SEBRAE Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas
SEPLAN Secretaria de Planejamento
SESU/MEC Secretaria da Educao Superior do Ministrio da Educao
SINAES Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior
SNDCT Sistema Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
SUDAM Superintendncia do Desenvolvimento da Amaznia
SUDENE Superintendncia do Desenvolvimento do Nordeste
SUI Sistema nico de Informaes
SUS Sistema nico de Sade
TCDU Taxa de Contribuio ao Desenvolvimento da Universidade
Estadual Paulista
TLC Tratados de Livre Comrcio
UCB Universidade Catlica de Braslia
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UE Universidade-Empresa
UNB Universidade de Braslia
UNICAMP Universidade de Campinas
UFPB Universidade Federal da Paraba
UFSCAR Universidade Federal de So Carlos
UFV Universidade Federal de Viosa
UNE Unio Nacional dos Estudantes
UNESCO Organizao das Naes Unidas para a Educao
UNESP Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho
UNESPNET Rede de Computadores da Universidade Estadual Paulista
UPECLIN Unidade de Pesquisa Clnica do Hospital das Clnicas da
Faculdade de Medicina de Botucatu
USP Universidade de So Paulo
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SUMRIO
INTRODUO ......................................................................................................................21
1 CRESCIMENTO DO ENSINO SUPERIOR E SUA MERCANTILIZAO .............30 1.1 Privatizao direta: expanso privada ............................................................................33 1.2 Tentativa de ressemantizao do conceito de pblico....................................................41 1.3 Privatizao indireta: cooperao universidade-empresa.............................................52
2 POLTICAS PBLICAS DE INCENTIVO COOPERAO UNIVERSIDADE-EMPRESA...............................................................................................................................56
2.1 I Plano Bsico de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico PBDCT ......................57 2.2 Leis de Incentivos Fiscais..................................................................................................63 2.3 PITE e PIPE (FAPESP) e FINEP-TEC (FINEP) ...........................................................67
2.3.1 Parceria para Inovao Tecnolgica PITE..............................................68 2.3.2 Parceria de Inovao Tecnolgica em Pequenas Empresas PIPE.........72 2.3.3 FINEP-TEC ...................................................................................................75
2.4 Fundos setoriais .................................................................................................................75 2.5 Lei de Inovao..................................................................................................................80 2.6 Lei das Parcerias Pblico-Privadas .................................................................................83
3 NORMATIZAO DA COOPERAO NA UNESP ...................................................87 3.1 Estatuto ..............................................................................................................................87 3.2 Regimento Geral................................................................................................................91 3.3 Regimento Geral da Extenso ..........................................................................................93 3.4 Manual de Convnios........................................................................................................94 3.5 Extenso e Regime de Trabalho Docente: Resoluo UNESP no 85/99........................96 3.6 Recolhimento de taxas: Resoluo UNESP no 58/2000 ................................................101 3.7 Patentes: Portaria UNESP no 424/2006 .........................................................................104 3.8 Incubadora: Resoluo UNESP no 99/2002 ...................................................................106
4 POLTICA DE COOPERAO UNIVERSIDADE-EMPRESA NA LTIMA DCADA ...............................................................................................................................108
4.1 Projeto Rede UNESP.......................................................................................................108 4.2 Planos e relatrios de gesto dos quatro ltimos reitores............................................111
4.2.1 Foco na operacionalizao da cooperao universidade-empresa .........111 4.2.2 Foco da normatizao das atividades de cooperao ..............................112 4.2.3 Retomada dos projetos para incrementar o processo de cooperao
universidade-empresa ..........................................................................................................113 4.2.4 Pr-Reitoria de Pesquisa PROPe como catalisador das atividades
relacionadas cooperao universidade-empresa ............................................................115
5 ATUAO DA UNESP NOS CONVNIOS DE COOPERAO .............................118
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5.1 Convnios de Araraquara: maior nmero de projetos de P&D .................................128
5.1.1 Convnios tcnico-cientficos sem valor financeiro..................................131 5.1.2 Convnios tcnico-cientficos com valor financeiro .................................135 5.1.3 Outras cooperaes com valor financeiro.................................................139
5.2 Convnios de Jaboticabal: predomnio da agropecuria.............................................143
5.2.1 Cooperao tcnico-cientfica sem valor financeiro ................................143 5.2.2 Outras cooperaes com valor financeiro.................................................146
5.3 Convnios de Botucatu: prevalncia da rea da sade ................................................147
5.3.1 Cooperao tcnico-cientfica sem valor financeiro ................................148 5.3.2 Cooperao tcnico-cientfica com valor financeiro ................................154 5.3.3 Outras cooperaes com valor financeiro.................................................155
5.4 Consideraes gerais sobre os trs convnios de cooperao ......................................163
6 POSICIONAMENTO DA ASSOCIAO DOS DOCENTES DA UNESP ADUNESP SOBRE A COOPERAO UNIVERSIDADE-EMPRESA .....................169
6.1 Surgimento da ADUNESP..............................................................................................170 6.2. O olhar da ADUNESP sobre a cooperao universidade-empresa............................172 6.3 Posicionamento da Diretoria da ADUNESP .................................................................175
CONCLUSES.....................................................................................................................180
REFERNCIAS ...................................................................................................................187
APNDICES .........................................................................................................................198
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INTRODUO
O presente estudo examina a poltica de cooperao universidade-empresa da
Universidade Estadual Paulista UNESP , contraponto os interesses do setor privado e os da
universidade pblica, cuja contradio funda-se em duas diferentes lgicas:
[...] a lgica empresarial, que exige a apropriao privada dos resultados do projeto que participa, preservando-o mediante clusulas de uso restrito e de segredo; e a lgica universitria. De inequvoca base iluminista, que pretende a apropriao coletiva do saber mediante sua mais ampla difuso (CUNHA, 1995, p. 25).
Essa relao entre a universidade pblica e a empresa comeou a ser incentivada pelo
governo, a partir do I Plano Bsico de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico PBDCT,
de 1973, como uma das suas cinco reas de atuao: integrao indstria-pesquisa-
universidade (MOREL, 1979, p. 66).
O governo objetivava, por meio da cooperao universidade-empresa (ou indstria,
termo utilizado na poca), acelerar o desenvolvimento econmico. Entretanto, segundo Chau
(2000), foi somente na dcada de 1980 que ocorreu, nas universidades, a introduo da idia
de parceria entre a universidade pblica e as empresas privadas. As empresas privadas
deveriam assegurar empregos e estgios aos profissionais universitrios e tambm financiar
pesquisas diretamente ligadas a seus interesses.
Essa proposta que, no decorrer da dcada de 1970 e de 1980, iniciou buscando suporte
nas universidades para auxiliar o desenvolvimento econmico e o fortalecimento da indstria
nacional passou a ter outra conotao no decorrer da dcada de 1990 e virada do sculo.
Em relao dcada de 1980, conforme Sales Filho (2003, p. 408), por ocasio do
lanamento do III PBDCT, em fevereiro de 1980, a questo do desenvolvimento econmico
parecia no ser a prioridade, e o foco da cooperao universidade-empresa passou a ser a
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formao de recursos humanos para tecnologia industrial bsica (metrologia, normatizao,
certificao, propriedade intelectual, informao tecnolgica, engenharia de projetos, etc).
A partir da dcada de 1990, a cooperao universidade-empresa comeou a ter outro
direcionamento, em virtude do contexto mais amplo de mudanas que atingiram a
universidade, causadas pela diminuio do papel do Estado em vrios setores, especialmente
o educacional.
A citao de Sguissardi (2002, p. 5) evidencia esse contexto:
Ainda do ponto de vista do Estado, vale ressaltar o novo e inarredvel papel que se impe de obteno de equilbrio oramentrio e do controle da inflao a qualquer preo via reduo dos gastos pblicos, aumento de juros, privatizao de empresas estatais e transferncia para a iniciativa privada de obrigaes que tradicionalmente lhe cabia cumprir.
Como conseqncia, houve a reduo do financiamento pblico para a educao
superior e um generalizado processo de privatizao. Ainda conforme esse autor, a
privatizao direta, com a abertura do campo para a iniciativa de empresas comerciais de
servios, e a indireta, com a introduo de mecanismos de administrao e gerenciamento
corporativo-empresariais e busca de recursos junto ao mercado.
A privatizao indireta, apontada por Sguissardi, atinge as universidades que buscam
se adequar ao novo papel do Estado: regulador, avaliador e controlador com cujo perfil
abstm-se da plena manuteno e do desenvolvimento das universidades pblicas.
Na busca para essa adequao, a universidade vai-se transformando internamente.
Chau (2000) nomeia essa transformao de universidade operacional, cuja caracterstica
principal a perda de autonomia, submetendo-se cada vez mais s leis (de mercado) externas
a ela e agenda estatal. Segundo a autora, essa universidade operacional ainda uma
tendncia, no necessariamente uma realidade concretizada.
nesse contexto de transformao da universidade que o objeto do presente trabalho
poltica de cooperao universidade-empresa - encontra-se inserido. Sem a garantia do
financiamento estatal, as tradicionais justificativas e objetivos da universidade pblica
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subvertem-se, e a busca de recursos financeiros junto ao mercado por meio da prestao de
servios e do desenvolvimento de pesquisas vai-se tornando uma questo de sobrevivncia
institucional incentivada pelas polticas pblicas. Paralelamente, os docentes e pesquisadores
permanecem com salrios defasados, cujos aumentos no acompanham os ndices
inflacionrios e nem o aumento do custo de vida.
Por esse motivo, entendeu-se ser relevante delinear a poltica de cooperao existente
na UNESP, enfocando os interesses da universidade e os interesses do setor privado,
apresentado as possveis conseqncias e resultados, propiciando refletir a questo sob uma
nova tica. Busca-se, outrossim, trazer contribuies para essa temtica que, por ser recente,
carece, ainda, de estudos mais aprofundados.
Dessa forma, delineou-se o problema de pesquisa: Como a UNESP tem-se
posicionado sobre a poltica de cooperao universidade-empresa? Qual a sua prtica, ou seja,
sua atuao? Como so conciliados os objetivos e a funo social da universidade com os
interesses das empresas, ou seja, do capital?
O objetivo geral deste trabalho identificar e analisar o posicionamento e a atuao
da UNESP em relao poltica cooperao universidade-empresa, especificamente no que
concerne aos projetos de pesquisa e desenvolvimento (P&D).
Como objetivos especficos, destacam-se: verificar qual a poltica de cooperao
universidade-empresa existente na UNESP; identificar as polticas pblicas de incentivo
cooperao universidade-empresa; averiguar como as aes vm sendo desenvolvidas;
detectar qual a posio do segmento docente, em especial do seu sindicato, em relao
cooperao universidade-empresa; verificar se os interesses da universidade e os interesses
privados tm sido conciliados nas prticas da universidade.
Os interesses privados que circundam a questo e que so aqui referidos subdividem-
se em dois tipos: os da empresa privada propriamente dita e os dos docentes envolvidos nos
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projetos de cooperao que possam estar beneficiando-se particularmente revelia dos
interesses da UNESP nesse processo.
O interesse da pesquisadora pelo tema deve-se ao fato da mesma ser administradora e
atuar como diretora do curso de Administrao da Universidade de Marlia - UNIMAR h
mais de quatro anos. Pensando nas atividades de extenso como uma forma de aprimorar a
relao entre a teoria e a pratica, interessou-se pelos convnios de cooperao universidade-
empresa como instrumentos que pudessem facilitar o processo de aprendizagem. Entretanto, o
tema teve outro direcionamento em virtude do contexto encontrado no desenvolvimento da
pesquisa, distanciando-se completamente da proposta inicial.
Embora, a Universidade de Campinas UNICAMP e a Universidade de So Paulo
USP sejam consideradas as duas universidades paulistas que possuem maior volume de
projetos de cooperao universidade-empresa, a UNESP foi escolhida como caso de
referncia. Conforme survey realizado, pareceu ser, entre as trs universidades paulistas,
aquela que apresenta maior resistncia ao desenvolvimento de projetos em parceria com as
empresas. Ademais, em se tratando de tema controverso, que de alguma forma atinge a
sensibilidade das pessoas que se posicionam a favor ou contra essa cooperao, tornou-se
mais vivel ter acesso aos dados e desenvolver a pesquisa na UNESP, uma vez que, ser aluna
de um programa de ps-graduao deveria possibilitar uma abertura um pouco maior. Ainda
assim, a facilidade foi apenas relativa.
Na coleta de dados, a dificuldade foi enorme, justamente pelo tema tratado, que acaba
expondo os docentes envolvidos. Alm dos motivos elencados, levou-se em conta, tambm,
que a UNESP possui o maior nmero de campi espalhados por todo o Estado de So Paulo, o
que aparentemente lhe daria, em termos de estrutura, melhores condies para promover a
cooperao com as empresas. Ademais, bastante conhecida a tentativa de implementao de
uma poltica de cooperao universidade-empresa, na gesto do reitor Arthur Roquete de
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Macedo (1993-1996) particularmente por meio do Projeto REDE UNESP; e a instituio
reconhecida por sua competncia em pesquisa no cenrio nacional.
O projeto REDE UNESP tinha como objetivo estimular a cooperao universidade-
empresa em todos os campi da universidade (AKAMATSU, 1997). Trata-se, pois, de um
marco de referncia para o presente estudo, por ter sido a primeira tentativa de implementao
de um projeto institucional para o relacionamento com o setor produtivo. Por esse motivo, o
corte temporal em torno da ltima dcada, considerando as quatro ltimas gestes: (1993-
1996) Reitor Arthur Roquete de Macedo, (1997-2000) Reitor Antonio Manoel dos Santos
Silva, (2001-2004) Reitor Jos Carlos Souza Trindade, (2005-2008) Reitor Marcos
Marcari. O recorte da cooperao universidade-empresa formado pelos projetos de pesquisa
e desenvolvimento (P&D), no interessando outros tipos de cooperao (estgios, cursos de
extenso, ps-graduao lato sensu e outros projetos). Exceo apenas para os convnios que
utilizam recursos dos Fundos Setoriais que sero igualmente estudados por contriburem para
o entendimento da atuao da UNESP nos convnios de cooperao.
Conforme Bastos (2003, p. 238), os Fundos Setoriais so:
[...] fonte de recursos (royalties, compensao financeira, contribuio de interveno no domnio econmico etc), rubricas oramentrias dentro do FNDCT, que ficaram conhecidas como fundos setoriais de C&T, alm de dois outros de natureza no setorial: o fundo de integrao universidade-empresa (que ficou conhecido como verde e amarelo) e o fundo de infra-estrutura de pesquisas [...].
No decorrer do trabalho, os Fundos Setoriais foram caracterizados como uma das
polticas pblicas de incentivo cooperao universidade-empresa, tendo, da, brotado o
interesse de identificar se essa poltica utilizada pela universidade.
Sendo a UNESP o foco deste estudo, cabe antes descrev-la e caracteriz-la, ainda que
sucintamente.
A UNESP foi criada atravs da Lei no 952, de 30 de janeiro de 1976, por meio da
reunio de Institutos Isolados, tornando-se uma autarquia de regime especial, com autonomia
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didtica, cientfica, administrativa, disciplinar e, a partir de 1989, de gesto financeira e
patrimonial. Seus campi universitrios esto instalados em 23 cidades, sendo 21 no interior,
um na Capital do Estado, So Paulo, e um em So Vicente. Os dados da UNESP, divulgados
pela UNESP (2006a), extrados do Anurio Estatstico 2006, base de dados de 2005,
apresentam 31.171 alunos na graduao, 9.620 na ps-graduao, 117 cursos de graduao,
186 cursos de ps-graduao (105 programas de mestrado acadmico, 2 mestrados
profissionalizante e 79 programas de doutorado acadmico), 3.354 professores e 6.837
funcionrios. Em relao infra-estrutura, possui rea total de 60.317.743,63 m e rea
construda 640.217,75 m. Cabe destacar, ainda, 30 bibliotecas contendo 800.726 livros e
33.789 ttulos de peridicos; 1.900 laboratrios, entre outras instalaes. O oramento
previsto para o ano de 2005 foi de R$ 948,5 milhes.
Os procedimentos utilizados nesta pesquisa foram: pesquisa bibliogrfica, pesquisa
documental e entrevistas. A pesquisa bibliogrfica consistiu em levantamento de obras e
artigos que enfocam a mercantilizao da educao superior no Brasil, as polticas pblicas de
incentivo cooperao universidade-empresa e as relaes universidade-empresa. A pesquisa
documental partiu da coleta de documentao e foram analisados, alm da documentao da
UNESP, vrios documentos produzidos pela Associao dos Docentes da USP ADUSP
Seo Sindical, relativos s irregularidades que vm ocorrendo nas Fundaes de apoio
daquela universidade. A inteno foi utiliz-los como parmetro do que poderia ocorrer
tambm nas fundaes de apoio da UNESP, j que elas gerenciam financeiramente os
projetos de cooperao da universidade. Em relao coleta de dados empricos, fora
planejado realizar entrevistas com uma amostra significativa de docentes envolvidos com
projetos de cooperao universidade-empresa. Entretanto, houve enorme dificuldade no
agendamento desses encontros, no obstante toda a disponibilidade e flexibilidade de data e
local propostos. Quando, finalmente, realizou-se a primeira entrevista, ficou evidenciado que
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as informaes obtidas no seriam suficientes para a composio de um quadro da
cooperao universidade-empresa na UNESP.
Diante das dificuldades apresentadas, houve uma correo de rota e a coleta de dados
resumiu-se nas seguintes entrevistas:
- com o Ex-reitor Antonio Manoel dos Santos Silva, buscando identificar qual era a
poltica de cooperao universidade-empresa da UNESP na sua gesto (dezembro de 2005);
- com um docente que era coordenador de um projeto de cooperao (agosto de 2006);
- dois docentes da Associao dos Docentes da UNESP - ADUNESP - Seo Sindical
- com o objetivo de identificar o posicionamento da entidade sobre o tema em estudo
(dezembro de 2006);
- com o gerente administrativo da Fundao de Apoio Cincia, Tecnologia e
Educao FACTE, da Unidade de Araraquara (fevereiro de 2007). Cabe esclarecer que esta
Fundao de apoio da UNESP concentra a gesto financeira dos recursos oriundos dos
projetos de cooperao universidade-empresa do Instituto de Qumica, que possui o maior
nmero de projetos de pesquisa e desenvolvimento da UNESP.
Diante da dificuldade de levar a efeito as entrevistas com os docentes, foi intensificada
a anlise documental, que se constituiu na base do presente trabalho e possibilitou a obteno
de dados quantitativos da cooperao da UNESP. No decorrer da anlise, possibilitou, ainda,
identificar os aspectos qualitativos que contriburam para visualizao da atuao da UNESP
nos convnios de cooperao. Com tais informaes, foi possvel construir um quadro dos
convnios de cooperao na UNESP, ainda que algumas lacunas pudessem ter sido resolvidas
com as entrevistas.
Nesse contexto, em setembro de 2006, a Assessoria de Relaes Externas - AREX -
disponibilizou uma relao contendo todos os 588 instrumentos de cooperao em vigor da
UNESP (convnios genricos com os respectivos termos aditivos, protocolos de Intenes ou
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acordos de cooperao). Desse total, foram inicialmente selecionados 161 instrumentos,
identificados como de cooperao tcnico-cientfica com ou sem valor financeiro, outras
cooperaes com valor financeiro e dupla cooperao com valor financeiro.
Analisando estes 161 instrumentos, foi identificado o nmero dos processos que
interessava analisar - o corpus principal da pesquisa - de cujos convnios e termos aditivos
foram obtidas cpias junto AREX em So Paulo. Cada processo constitui-se numa pasta
numerada contendo todos os documentos oriundos do instrumento inicial mais os termos
aditivos que especifica cada projeto desenvolvido na cooperao. Foram selecionados os
convnios de cooperao em vigor das seguintes Unidades Universitrias: Araraquara
Jaboticabal e Botucatu. O motivo da escolha dessas Unidades deu-se primeiramente pelo
nmero de projetos em P&D, em seguida pela quantidade de convnios e, por ltimo, pelos
valores monetrios envolvidos.
Outros documentos analisados foram os planos e relatrios de gesto dos ltimos
quatro reitores.
Feitas essas colocaes preliminares, cabe ressaltar que a hiptese desta pesquisa a
de que a poltica de cooperao universidade-empresa constitui-se em uma forma de
privatizao interna da universidade pblica, j que pode beneficiar, em grande parte, a
iniciativa privada e a um pequeno nmero de docentes envolvidos no projeto, podendo deixar
muito pouco, em termos de resultados tanto do ponto de vista financeiro, como do ponto
de vista do desenvolvimento tcnico-cientfico para a universidade e para a sociedade como
um todo.
O presente trabalho foi organizado da seguinte forma.
No captulo 1, descreve-se o crescimento do ensino superior no Brasil e o seu processo
de mercantilizao.
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No seguinte, busca-se identificar as polticas pblicas de incentivo cooperao
universidade-empresa como, por exemplo, as Leis de Incentivo Fiscal, os programas de
Parceria para Inovao Tecnolgica PITE e Programa de Inovao Tecnolgica em
Pequenas Empresas PIPE , os Fundos Setoriais, a Lei de Inovao e a Lei das Parcerias
Pblico Privadas PPP(s).
No captulo 3, so analisados os documentos normatizadores da cooperao
universidade-empresa da UNESP Estatuto, Regimento Geral, Regimento da Extenso e
legislao complementar relacionada ao objeto de estudo.
No captulo 4, apresentado o Projeto REDE UNESP, bem como os Planos e
Relatrios de Gesto dos quatro ltimos reitores, destacando a nfase que cada gesto parece
dar questo sob anlise.
No captulo 5, so analisados os convnios de cooperao das Unidades de Araraquara,
Jaboticabal e Botucatu objetivando identificar como vem sendo a atuao da UNESP nessa
atividade.
No ltimo captulo, busca-se identificar o posicionamento da ADUNESP, como
entidade representativa dos docentes e defensora da universidade pblica, em relao
cooperao universidade-empresa.
Por ltimo, as concluses tm a inteno de integrar as observaes e anlises que
brotaram ao longo do trabalho, e compor um retrato das prticas de cooperao universidade-
empresa na UNESP e seus resultados, esclarecendo, sobretudo, como e em que medida se d
conciliao entre os interesses da universidade e os do setor privado.
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1 CRESCIMENTO DO ENSINO SUPERIOR E SUA MERCANTILIZAO
As ltimas trs dcadas do sculo XX foram, grosso modo, marcadas pela profunda
crise da social-democracia e do Estado do Bem-Estar, na maioria dos pases centrais e em
muitos pases da periferia latino-americana.
Diante da crise, das novas exigncias que se pem para a economia e para o Estado,
diante das demandas da chamada sociedade do conhecimento, a educao superior e a
universidade em particular so pressionadas a mudar.
Essas mudanas na universidade so provocadas principalmente pela diminuio do
papel do Estado em vrios setores, particularmente, no educacional. Conforme Sguissardi
(2002, p. 4):
[...] em relao ao aparelho do Estado, avanam as medidas apoiadas na concepo de Estado Subsidirio e Controlador (Cf. SANTOS, 1998), que conduzem, por um lado, a desertar de sua funo de provedor de servios sociais (educao, sade, seguridade), e, por outro, a aumentar sua presena como regulador, avaliador e controlador no interesse do (re)estabelecimento da hegemonia do mercado e da integrao do pas ao mercado mundial, no mbito do processo de mundializao do capital, ainda que, no caso dos pases da periferia, de forma claramente subalterna. Ainda do ponto de vista do Estado, vale ressaltar o novo e inarredvel papel que lhe impe de obteno do equilbrio oramentrio e do controle da inflao a qualquer preo via reduo dos gastos pblicos, aumento dos juros, privatizao das empresas estatais e transferncia para a iniciativa privada de obrigaes que tradicionalmente lhe cabia cumprir.
Segundo o referido autor, a reforma do Estado rege-se, em termos mundiais, entre
outras coisas, pela tica gerencialista e eficientista das empresas privadas ou do mercado.
Nesse sentido, as mudanas na educao superior so direcionadas pelo poder de interveno
dos organismos multilaterais de crdito (Fundo Monetrio Internacional FMI, Banco
Mundial BM, Banco Interamericano de Desenvolvimento BID).
A respeito do Banco Mundial, Sguissardi (2002, p. 5) enfatiza, ainda:
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[...] em especial, vai utilizar como estratgia disseminao de teses como as de que: 1) o ensino superior seria antes um bem privado que pblico; 2) o retorno individual e social dos investimentos em educao superior seria inferior ao dos investimentos aplicados na educao fundamental; 3) a universidade de pesquisa da associao, ensino, pesquisa e extenso seria muito cara tanto para os pases ricos, quanto especialmente para os pases pobres ou em desenvolvimento, s voltas com problemas de crnico dficit pblico.
A adoo dessas teses em vrios pases traz como conseqncia a generalizada
reduo do financiamento pblico para a educao superior, embora todos se defrontem com
o duplo desafio da exploso da demanda e da presso universal por qualidade do sistema.
Outra conseqncia apontada pelo autor um processo generalizado de privatizao,
seja direta com abertura do campo para a iniciativa de empresas comerciais de servios ,
seja indireta com a introduo de mecanismos de administrao e gerenciamento
corporativo-empresariais e busca de recursos junto ao mercado.
Ao se analisar as polticas educacionais que vm sendo implementadas no Brasil,
desde a dcada de 1980, percebe-se que caminham nessa mesma direo. Basta observar a
diminuio de recursos para o ensino superior pblico, a privatizao direta e indireta, a
diversificao e diferenciao do sistema de educao superior, etc.
Altos ndices de privatizao direta foram atingidos; isto , houve expressiva expanso
do nmero de Instituies de Ensino Superior IES e de matrculas do setor privado. O
nmero de IES privadas corresponde a aproximadamente 89% do total; e as matrculas, a 72%
(BRASIL, 2005c). A partir da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao LDB (1996),
inicia-se um processo de diferenciao e diversificao do sistema de educao superior. A
redao do artigo 45 no estabeleceu mais o princpio da indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extenso, permitindo abertura para que, posteriormente, atravs do artigo 8 do
Decreto 2.306/97, pudessem ser criadas outras formas de organizao acadmica, tais como
os Institutos Superiores, Escolas Superiores e os Centros Universitrios.
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A privatizao indireta est relacionada com as mudanas em curso na universidade
para adequao ao novo papel do Estado regulador, avaliador e controlador que
disponibiliza cada vez menos recursos para o seu financiamento. Neste contexto, a
universidade vai sendo incentivada a adotar mecanismos de administrao e gerenciamento
corporativo-empresariais e buscar recursos junto ao mercado para auxiliar sua manuteno.
Esta universidade, nomeada de universidade operacional por Marilena Chau (2000, p.
220) definida da seguinte maneira:
[...] regida por contratos de gesto, avaliada por ndices de produtividade, calculada para ser flexvel, a universidade operacional est estruturada por estratgias e programas de eficcia organizacional e, portanto, pela particularidade e instabilidade dos meios e dos objetivos. Definida e estruturada por normas e padres inteiramente alheios ao conhecimento e formao intelectual, est pulverizada em microorganizaes que ocupam seus docentes e curvam seus estudantes a exigncias exteriores ao trabalho intelectual. A heteronomia da universidade autnoma visvel a olho nu: o aumento insano de horas-aula, a diminuio do tempo para mestrados e doutorados, a avaliao pela quantidade de publicaes, colquios e congressos, a multiplicao de comisses e relatrios, etc. Virada para seu prprio umbigo, mas sem saber onde este se encontra, a universidade operacional opera e por isso mesmo no age. No surpreende, ento, que esse operar co-opere para sua continua desmoralizao pblica e degradao interna.
Essa posio de Chau chamando a ateno para a perda de autonomia da
universidade, ou seja, para a heteronomia da universidade, submetendo-se cada vez mais s
leis (de mercado) externas a ela, adotada tambm por Sguissardi (2002), segundo o qual o
processo de reconfigurao da educao superior e a mudana do ethos universitrio
caminham em direo hiptese de Schugurensky (2002, apud SGUISSARDI, 2002, p. 7),
para quem:
estaria ocorrendo de forma cada vez mais visvel o trnsito, no Canad como em muitos pases, de um modelo universitrio centrado na autonomia pra um modelo centrado na heteronomia, no qual setores externos (principalmente o Estado e a indstria) tm cada vez mais poder na definio da misso, da agenda e dos produtos das universidades.
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Nesse sentido, os autores sugerem que muitas universidades teriam perdido, nas
ltimas dcadas, importantes pores de sua autonomia institucional e estariam constrangidas
a adequar grande parte de suas atividades s demandas do mercado e agenda estatal.
Slauher e Leslie (1999, p. 209 apud TRINDADE, 2003, p. 175), tambm
compartilham dessa posio sobre a perda de autonomia das universidades pblicas
afirmando:
Todos esses fatores esto alterando a identidade prpria da universidade pblica e sua singularidade enquanto instituio social, atingindo sua autonomia acadmica pela eroso do espao pblico e pela privatizao do ethos acadmico. Esse processo levou a especialistas americanos, que comparam universidades australianas, canadenses, americanas e inglesas, a usar o conceito de capitalismo acadmico no sentido de os esforos institucionais e do corpo docente para obter fundos externos da mesma forma que o mercado, como parte do mercado.
A universidade pblica ao buscar essa adequao pode deixar espao para o processo
de privatizao interno chamado por Sguissardi (2002, p. 5) de privatizao indireta. O
objeto do presente trabalho - a cooperao universidade-empresa - est inserido nesse
contexto.
Tendo em vista essas colocaes preliminares, o tpico seguinte indicar aspectos
relativos privatizao direta, ou seja, expanso privada. Em seguida, discorrer sobre a
ressemantizao do conceito de pblico e suas conseqncias, para, finalmente, versar sobre a
privatizao indireta inserindo a cooperao universidade-empresa neste contexto de
mercantilizao da educao.
1.1 Privatizao direta: expanso privada
O crescimento do ensino superior brasileiro foi intensificado quando o regime militar
concedeu uma srie de incentivos fiscais beneficiando a iniciativa privada;
concomitantemente, no final da dcada de 1960, havia uma grande demanda por esse nvel de
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ensino. De acordo com Marques (2005, p. 40), at meados da dcada de 1960, as instituies
pblicas eram responsveis por 65% das matrculas do ensino superior e as instituies de
ensino privado ficavam com 35% das matrculas.
Outros nmeros sobre o crescimento de matrculas so apontados por Maciel (1991
apud VIEITEZ; DAL R, 2005), segundo os quais, num perodo de quinze anos - de 1962 a
1977 - , o nmero de matrculas na rede pblica teve uma expanso de 642,5%, enquanto que
a rede privada expandiu 1.681,5%, ou seja, o crescimento da rede privada foi 2,6 vezes maior.
Essa expanso do ensino superior privado tambm prevaleceu nas dcadas seguintes e,
no incio do sculo XXI, o nmero j tinha ultrapassado em mais de 70% o total de
matriculados neste nvel de ensino (BRASIL, 2000). Apenas para efeito de comparao,
durante toda a dcada de 1980, houve um crescimento de 11,82% nas matrculas, enquanto
que na dcada de 1990, esta porcentagem atingiu os 74,94%. Atualmente, um conjunto de
polticas pblicas neoliberais, iniciadas a partir da dcada de 1990, e outras em fase de
implantao/estudo no governo Lula, busca propiciar a expanso do acesso ao ensino superior
contando prioritariamente com o setor privado. Essas medidas tendem a reduzir investimentos
em reas sociais e indicam cada vez mais o direcionamento para o mercado.
Contudo, de acordo com Vieira (1995, p. 39), possvel identificar a coexistncia de
formas de educao pblica e privada desde as origens da construo de um sistema
educacional no pas. Afirma a autora:
[...] a partir dos anos vinte, entretanto, que comea a delinear-se a presena de ideologias em conflito (Buffa, 1979), movimento que iria explicitar-se nos anos trinta e ter continuidade ao longo da histria, culminando com a polmica sobre liberdade de ensino, no decorrer dos anos 50. At ento, a idia do conflito estava presente, muito embora a expresso privatizao no tivesse ainda se enraizado no iderio educativo. somente a partir dos anos 60 que o termo privatizao comea a ser adotado, assumindo conotaes prprias e relativas possibilidade de privatizao do pblico.
Sabe-se que a expanso privada do ensino superior no Brasil foi incentivada a partir da
dcada de 1960 com isenes tributrias, transferncias diretas e indiretas (como bolsas de
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estudo para as escolas privadas), emprstimos com juros negativos e subsdios a fundo
perdido.
Esses incentivos podem ser identificados, a partir de 1965, pela Emenda
Constituio de 1946, que reformulou o sistema tributrio nacional, e pelas Constituies
Federais seguintes. Cunha (1995, p. 15-16), relata esse processo:
[...] o novo texto, que passou a fazer parte da Constituio, vedava Unio, aos estados e aos municpios a cobrana de impostos sobre o patrimnio, a renda ou os servios das instituies de educao. Por essa emenda, a iseno fiscal das escolas privadas, institudas pela Constituio de 1946 foi ampliada. Enquanto esta previa a iseno de impostos sobre os bens e servios, a emenda de 1965 estendeu a iseno sua renda. [...] A Constituio de 1967 e a emenda de 1969 mantiveram esse dispositivo, alterando-o somente em aspectos secundrios. [...] A Constituio de 1988 reeditou esse privilgio das escolas privadas. Em complementao iseno tributria, o governo federal estendeu seu apoio mediante a criao de um mecanismo de aporte de recursos financeiros aos estabelecimentos privados de ensino. Em 21 de novembro de 1968 (menos de um ms antes da promulgao do Ato Institucional no 5) foi promulgada a Lei no 5.537, que criou o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao FNDE. Sua finalidade era reunir recursos financeiros e canaliz-los para o financiamento de projetos de ensino e pesquisa, inclusive alimentao escolar e bolsas de estudo para alunos carentes na rede privada.[...].
Portanto, o regime militar favoreceu enormemente a iniciativa privada no campo
educacional. O autor esclarece que esta orientao privatista foi possvel pela LDB de 1961,
por transferir para os conselhos de educao (federal e estaduais) importantes competncias
antes concentradas nos detentores dos cargos executivos. Os membros desses conselhos,
nomeados livremente pelo Presidente da Repblica e pelos governadores dos estados, eram
pessoas escolhidas mediante presso e articulao privada, menos visveis para as foras
polticas partidrias. Esses conselheiros ficavam expostos a presses e atrativos de diversas
espcies. Alm disso, divididos os centros de tomada de decises, tornava-se mais difcil a
resistncia s presses e aos atrativos das instituies privadas de ensino.
No final da dcada de 1960, encontrava-se em curso um aumento expressivo na
demanda por matrculas no ensino superior brasileiro. O nmero limitado de vagas
desencadeou a crise dos excedentes, ou seja, alunos aprovados por nota no vestibular, mas no
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classificados por falta de vagas. A Unio Nacional dos Estudantes (UNE) encabeou um
movimento reivindicatrio por mais vagas. A principal soluo encontrada pelo governo foi a
abertura e o incentivo para a expanso de vagas no setor privado do ensino superior.
Diante dos incentivos fiscais propiciados pelo Estado e da grande demanda por esse
nvel de ensino, os grupos empresariais interessados no mercado educacional promoveram
intensa e sistemtica propaganda nos meios de comunicao de massa, alardeando a
ineficincia e a insuficincia da administrao pblica, em contraste com as excelncias da
gesto desenvolvida pela iniciativa privada, tais como, agilidade na tomada de decises e
racionalidade no uso dos recursos.
Com o esgotamento do regime militar, essa ideologia privatista ganhou fora e aos
poucos foi sendo incorporada s idias e prticas j arraigadas no Brasil. Os grupos
econmicos privados passaram a acusar o Estado pela crise dos anos 80. A retomada do
processo inflacionrio, a manuteno de uma grande, onerosa e desnecessria burocracia, e a
crescente dvida interna atribuda necessidade de emprstimos a juros cada vez mais altos,
alimentando uma especulao financeira sem precedentes, so alguns dos fatores apontados
por esses grupos econmicos interessados no mercado educacional.
Nessa luta ideolgica, o privatismo brasileiro teve importantes modelos externos: o crescente movimento pela privatizao de funes pblicas em pases de centro capitalista (Estados Unidos, Inglaterra, Frana, Espanha e Itlia), na Amrica Latina (o Mxico, e a Argentina) e at mesmo na reinterpretao da Pierestrika sovitica, como se esta nada mais fosse do que uma face diferente do mesmo processo, isto , a incorporao da economia de mercado capitalista e o abandono da planificao estatal (CUNHA, 1995, p. 13).
O termo privatismo brasileiro definido pelo autor (p. 11) como a prtica de pr a
administrao pblica a servio de grupos particulares, sejam econmicos, religiosos ou
poltico-partidrios.
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Com a ascenso de Margareth Thatcher ao poder, a Inglaterra instituiu um amplo
programa de privatizao. Influncias semelhantes ocorreram tambm com o incio do
governo de Ronald Reagan, nos Estados Unidos. De acordo com Vieira (1995, p. 34):
[...] havia condies prvias no cenrio internacional para que o Brasil viesse a ingressar no ciclo de privatizao e compor o cenrio dos pases adeptos das teses neoliberais. Ao lado disso, necessrio ter-se em conta que a crise da dvida deve ter tido influncia marcante neste aspecto. Os primeiros sinais mais concretos nesta direo se manifestam pelo expressivo lobby do setor privado por ocasio da elaborao da constituio de 1988, a exemplo do debate em torno da definio de empresa nacional, do fim da reserva de mercado e de outros temas correlatos. Mas sob a gide do governo Collor que se acelera o processo de privatizao.
Cabe destacar tambm a definio de Leher (2003, p. 8) mais complexa sobre
privatizao:
Genericamente, o termo privatizao designa as iniciativas que ampliam o papel do mercado em reas anteriormente consideradas privativas do Estado. Isto inclui no apenas a venda de bens e servios de propriedade ou de prerrogativa exclusiva do Estado, mas, tambm, a liberalizao de servios, at ento de responsabilidade do Estado como a educao, sade e meio ambiente, pela desregulamentao e estabelecimento de contratos de gesto de servios pblicos por provedores privados.
No cenrio interno, o debate sobre a reduo da interferncia estatal comeou a tomar
corpo no final dos anos 70, quando foi inaugurado o primeiro programa governamental de
privatizao. Contudo, foi na dcada de 1990 que esta discusso efetivamente veio tona, de
modo mais especfico com o incio do governo Collor. Conforme citado no pargrafo anterior,
j existia no mundo inteiro um movimento pela redefinio das funes do Estado e, no
Brasil, a falncia da mediao estatal, como conseqncia primordial de uma profunda crise
fiscal em diversos setores da vida econmica e social, teve a sua contrapartida no
questionamento da interveno estatal na realidade brasileira.
Warde (1993, p. 11), assinala tambm a influncia externa no campo educacional:
[...] a agenda neoliberal introduzida por organismos internacionais como o Fundo Monetrio Internacional e o Banco Mundial, que j no incio dos anos 80 concebem programas de avaliaes dos sistemas de ensino e de projetos de reforma em diversos pases da Amrica Latina.
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A posio de Warde (1993) corroborada tambm por Soares (1996, p. 23) ao afirmar
que:
[...] por meio das condicionalidades, o Banco Mundial comeou a implementar um amplo conjunto de reformas estruturais nos pases endividados, pautadas em uma concepo mais adequada de crescimento: liberal, privatista, de abertura ao comrcio exterior e ortodoxa do ponto de vista monetrio.
A prestao de servios educacionais pelo setor privado j vinha se expandindo desde
a dcada de 1960, mas foi intensificado a partir da dcada de 1970, juntamente com o
crescimento do ensino superior brasileiro. As polticas educacionais, posteriores dcada de
1980, atendiam s recomendaes do Banco Mundial que, aps a ecloso da crise do
endividamento, passou a impor uma srie de condicionantes para a concesso de novos
emprstimos. Mediante a essas condicionantes, o Banco Mundial tal como o FMI passou a
intervir diretamente na formulao da poltica interna e a influenciar a prpria legislao do
pas.
Essa interferncia pode ser identificada na legislao que, segundo Cunha (2000),
favoreceu a iniciativa privada e reconheceu as instituies privadas com finalidade lucrativa a
partir da LDB de 1996, ao mesmo tempo que mantinha estagnados os recursos financeiros
para as instituies pblicas. Soares (1996) complementa tal idia afirmando que os
programas de ajuste do Banco Mundial possuam cinco eixos principais, dentre os quais
destaca-se, aqui, a privatizao das empresas e dos servios pblicos. A privatizao no
ensino superior brasileiro identificada com o acentuado crescimento de matrculas, bem
como com o aumento das instituies privadas, como pode ser verificado na lustrao 1, a
seguir.
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ANO TOTAL DE MATRCULAS MATRCULAS
REDE PRIVADA MATRCULAS
REDE PBLICA
1980 1.377.286 885.054 (64,26%) 492.232 (35,74%)
1990 1.540.080 961.455 (62,43%) 578.625 (37,57%)
2000 2.694.245 1.807.219 (67,07%) 887.026 (32,93%)
2004 4.163.733 2.985.405 (71,70%) 1.178.328 (28,30%)
ANO TOTAL DE INSTITUIES INSTITUIES
PRIVADAS INSTITUIES
PBLICAS
1980 882 682 (77,33%) 200 (22,67%)
1990 918 696 (75,82%) 222 (24,18%)
2000 1.180 1.004 (85,08%) 176 (14,92%)
2004 2.013 1.789 (88,87%) 224 (11,13%)
Ilustrao 1 Quadro de matrculas no ensino superior nas redes pblica e privada. Fonte: Brasil, 2000; 2001d e 2005c.
Analisando os nmeros apresentados, verifica-se que, na dcada de 1980, houve um
crescimento de 11,82% nas matrculas para cursos de graduao, j na dcada de 1990, o
crescimento de matrculas foi de 74,94% e, no perodo de apenas quatro anos, de 2000 a 2004,
houve um crescimento de 54,54%. O nmero de matrculas na rede privada, que j vinha
crescendo desde a dcada de 1990, atingiu, no ano de 2004, 71,7% do total de matriculados,
quando o nmero de instituies privadas atingiu 88,87% do total das instituies de ensino
superior do pas.
Outro aspecto que chama a ateno nesses dados disponibilizados pelo INEP que, at
o ano de 1998, o quadro que apresenta o nmero de instituies do pas dividido por
natureza e dependncia administrativa. A natureza subdividida em universidades, faculdades
integradas e centros universitrios e estabelecimentos isolados. A partir de 1999, foi
acrescentada a natureza Centros de Educao Tecnolgica, que faz parte da diferenciao das
instituies de ensino superior voltadas para atender demandas especficas. Este processo est
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em consonncia com o PNE 2001 que, dentre os 35 objetivos e metas para a educao
superior, contempla a diversificao do sistema superior de ensino para atender clientelas
com demandas especficas de formao (CATANI; OLIVEIRA, 2002, p. 4).
Nos ltimos anos, segundo os referidos autores (2000, p. 5),
[...] aquilo que se iniciou de modo disperso e desarticulado assumiu, claramente, a forma de um amplo processo de diversificao e diferenciao do sistema de educao superior no Brasil. Esse empreendimento tornou-se mais visvel no final do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), em decorrncia de diagnstico1 que inclua como problemas principais o: a) esgotamento do modelo nico baseado na indissociabilidade ensino-pesquisa-extenso; b) tamanho do sistema extremamente modesto para as dimenses e necessidades do pas; c) inadequao do processo de credenciamento de novas instituies, o que gerou um sistema sem competio e de baixa qualidade; d) falta de um sistema abrangente de avaliao do ensino de graduao; e) desafio de modernizar o ensino de graduao; f) ineficincia no uso dos recursos pblicos na parte federal do sistema.
Portanto, esse processo de diferenciao e diversificao colaborou para o crescimento
de matrculas no ensino superior que, desde a dcada de 1990, tem sido acelerado. Em
nmeros, de 2000 a 2004, o aumento ultrapassou a dcada anterior. Esse crescimento de
matrculas no ensino superior deve ser intensificado nos prximos anos, permanecendo a
preponderncia do setor privado, se levadas em conta s metas do Plano Nacional de
Educao PNE 2001 aprovado pela lei no 10.172, de 09/01/2001, no Governo Fernando
Henrique Cardoso, que previa o acesso ao ensino superior, at 2010, de 30% da populao
entre 18 e 24 anos, o que significaria dobrar os nmeros atuais (BRASIL, 2001c). Esse
objetivo no possui a contrapartida necessria, ou seja, o financiamento, pois o PNE sofreu
nove vetos presidenciais que anularam os sub-itens do Plano que promoviam alteraes ou
ampliavam recursos financeiros para a educao, sendo cinco deles referentes diretamente
educao superior.
Essa constatao inicial indica que no h inteno do governo em incrementar os
recursos para a educao, em particular para o ensino superior, e, no havendo ampliao dos
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recursos, o setor pblico s poder oferecer mais vagas pela racionalizao dos recursos das
Instituies Federais de Ensino Superior IFES, permitindo ampliao de vagas a custo zero,
sobretudo nas universidades federais (CATANI; OLIVEIRA, 2002). Nessas condies,
notrio que a expanso pblica ser limitada, j que no haver ampliao de recursos,
ficando para a iniciativa privada a grande expanso de vagas desejada.
1.2 Tentativa de ressemantizao do conceito de pblico
A proposta deste tpico destacar como o significado do conceito de pblico vem
sofrendo modificaes ao longo do tempo e do espao e quais as repercusses dessas
mudanas na Educao. No Brasil, principalmente aps 1995, com o Plano Diretor da
Reforma do Estado, a tentativa de ressemantizao do conceito de pblico foi acentuada,
favorecendo a privatizao do sistema educacional.
Sanfelice (2005, p. 178-179), descreve:
[...] grande parte da historiografia produzida na rea consagrou a terminologia educao pblica como sinnimo de educao estatal. Nesse sentido referimo-nos educao pblica para expressarmos a educao oferecida pela escola pblica e, muito raramente, a defesa da escola pblica no outra coisa seno a defesa da escola estatal. Rigorosamente, entretanto, escola estatal no escola pblica, a no ser no sentido derivado pelo qual o adjetivo pblico se relaciona ao governo de um pas ou de Estado: o poder pblico. A escola estatal no necessariamente pblica quanto tomamos o adjetivo pblico na forma de qualificao daquilo que pertence a um povo, a uma coletividade, que pertence a todos, que comum, aberto a quaisquer pessoas, que no tem carter secreto, manifesto e transparente.
nos anos 90 que se efetivam, no Brasil, tanto a abertura democrtica quanto os
ajustes de sua economia no contexto da mundializao do capital e nos moldes da
denominada modernizao conservadora, fato que ocorreu tambm com outros pases
perifricos. Veja-se, por exemplo, a afirmao de Mollis (2002, apud SGUISSARDI, 2002, p.
17), referindo-se Argentina:
1 A respeito, ver Souza (1998) e MEC (1996).
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A partir de diagnsticos e consultoria permanente do Fundo Monetrio Internacional e do Banco Mundial, esse pas [Argentina] teria cumprido, seja na esfera estritamente econmica, seja na esfera do Estado e da Educao Superior, a agenda de modernizao recomendada. No caso da educao superior e da relao Estado/Universidade, isto inclua a diminuio dos subsdios pblicos e a delegao de certas responsabilidades a mos privadas e de outros agentes.
Os ajustes no caso brasileiro tiveram incio no Governo Collor de Melo (1990-1991),
seguiram, embora em grau menos intenso, no de Itamar Franco (1992-1994) e recrudesceram
a partir da ascenso ao poder de Fernando Henrique Cardoso, em janeiro de 1995. Nessa
dcada, especialmente em seu segundo mandato, efetuaram-se os ajustes estruturais e fiscais e
as reformas especialmente orientadas para o mercado. A partir de 1995 ocorreram as
principais mudanas que conduziram a reconfigurao das esferas pblica e privada, no
mbito do Estado, assim como da educao superior.
As diretrizes da reforma gerencial do Estado foram colocadas em prtica a partir do
Plano Diretor da Reforma do Estado, de 1995. Nesse Plano se encontram os conceitos bsicos
tanto da reforma do aparelho do Estado, quanto das reformas pontuais que se traduziro no
captulo Da Educao Superior da Lei de Diretrizes e Bases da Educao (Lei 9.394/96),
nos decretos 2.207/97, 2.306/97 e 3.860/01, que se seguiram e em muitas portarias, propostas
de emendas constitucionais, medidas provisrias ou projetos de lei como os da Autonomia das
Universidades Federais.
Segundo Sguissardi (2002, p. 19), o Plano Diretor da Reforma de Estado estabeleceu:
O diagnstico dos supostos males da administrao pblica federal, assim como as principais diretrizes para moderniz-la. Ao identificar quatro setores compondo o aparelho do Estado - ncleo estratgico, atividades exclusivas, servios no exclusivos ou competitivos, e a produo de bens e servios para o mercado, situou as universidades, as escolas tcnicas, os centros de pesquisa entre os servios no exclusivos ou competitivos do Estado. Convicto que, em razo do dficit pblico, no seria mais vivel ao Fundo Pblico do Estado a manuteno e o financiamento, com expanso, da educao superior e outros servios, como sade, pesquisa, etc., prope que as Instituies Federais de Ensino Superior (IFES) sejam transformadas em um tipo especial de entidade no-estatal, as organizaes sociais. Propunha-se transform-las voluntariamente em organizaes sociais, em entidades que celebrassem um contrato de gesto com o poder Executivo e contassem com a autorizao do Parlamento para participarem do oramento pblico.
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Seriam as organizaes sociais espcies de entidades pblicas no estatais ou fundaes pblicas de direito privado.
O autor conclui que, embora a proposta no tenha se realizado em plenitude, cabe
salientar a importncia que esse conjunto de conceitos que lhe serviram de suporte teve como
substrato de muitas aes de reforma da educao superior, que conduzem ao atual estgio da
privatizao do sistema. Entre os conceitos que merecem destaque esto os de propriedade
pblica no estatal ou semipblica ou semiprivada. O programa que visaria a transformar as
instituies pblicas estatais desta natureza em organizaes sociais denominou-se de
Programa de Publicizao.
Conforme mencionado, a Reforma do Estado brasileiro buscando modernizar e
racionalizar as atividades estatais, distribudas em setores incluiu a educao no Setor de
servios no-exclusivos do Estado. A partir de ento, a proposta era transformar a
universidade em uma organizao social, prestadora de servios que celebraria "contratos de
gesto" com o Estado. Todavia, essa mudana de instituio social para organizao social
que aparentemente parece insignificante - traria conseqncias desastrosas para as
universidades pblicas que perderiam sua autonomia, fazendo, ainda, com que setores
externos a ela teriam cada vez mais poderes para a definio de sua misso, de sua agenda e
de seus produtos.
Chau (2000, p. 217-218), apresenta a diferena entre instituio social e organizao
social:
[...] A universidade sempre foi uma instituio social, isto , uma ao social, uma prtica social fundada no reconhecimento pblico de sua legitimidade e de suas atribuies, num princpio de diferenciao, que lhe confere autonomia perante outras instituies sociais, e estruturada por ordenamentos, regras, normas e valores de reconhecimento e legitimidade internos a ela. [...] Uma organizao difere de uma instituio por definir-se por uma outra prtica social, qual seja, a de sua instrumentalidade: est referida ao conjunto de meios (administrativos) particulares para obteno de um objetivo particular. No est referida a aes articuladas s idias de reconhecimento externo e interno, de legitimidade interna e externa, mas a operaes definidas como estratgias balizadas pelas idias de eficcia e de
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sucesso no emprego de determinados meios para alcanar o objetivo particular que a define.
Neste contexto de mudanas, hoje, a norma, na educao em nvel superior, o Estado
atribuir-se as funes de controle do sistema educacional, mas no mais aquelas relativas
sua plena manuteno, modificando-se, assim, profundamente o sentido da qualidade e da
eqidade do sistema pblico.
Sguissardi (2002, p. 6), ao definir as tendncias da educao superior neste sculo,
afirma:
Dada a premissa de que o ensino superior antes um bem privado que pblico e que se trata, segundo a teoria econmica neoclssica do capital humano, de um elemento agregador de valor, prega-se cada vez mais a aproximao da Universidade com o mundo empresarial, com o objetivo proclamado de superar o desajuste entre universidade e mundo do trabalho.
A tentativa de ressemantizao do conceito de pblico atinge o seu pice com a
aprovao da Lei das Parcerias Pblico-Privadas, em dezembro de 2004, que parece diluir a
fronteira entre o pblico e o privado. Com essa medida, o Estado promove a ressemantizao
do conceito de pblico, abstm-se da responsabilidade da plena manuteno do ensino
superior e prega a aproximao da universidade pblica com o mundo empresarial,
desconfigurando sua natureza ao querer instituir no seu interior a lgica do mercado. Esse
processo traz, como conseqncias, a privatizao do sistema e uma campanha de
desvalorizao da universidade pblica, utilizando-se para avali-la a tica gerencialista e
eficientista. Cabe, agora, observar algumas indicaes dessas conseqncias.
Conforme j afirmado, a privatizao comeou a ser incentivada a partir do regime
militar que contribuiu para a hegemonia do setor privado na educao. As mudanas
introduzidas foram articuladas e atingiram tanto a universidade quanto os demais graus de
ensino. Buffa (2005, p. 53) aponta a conseqente precarizao do ensino pblico com a
seguinte afirmao:
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Mais recentemente, os defensores do ensino pblico denunciam o descaso do Estado pelo ensino, em todos os nveis. J no se trata tanto de defender o ensino bsico para todos, o que estaria quase conquistado, mas de garantir a qualidade deste ensino. No superior, o descaso revela-se nas condies cada vez mais precrias de trabalho salrios desajustados, no-contratao de docentes, sucessivas ameaas de perda de aposentadoria integral, espaos insuficientes, feios e malcuidados, salas de aula, bibliotecas e laboratrios indigentes.
medida que a expanso do ensino superior privado foi sendo viabilizada e
incentivada, no decorrer da dcada de 1970, a expanso do setor pblico ocorreu em um ritmo
bem inferior. Conforme dados do INEP, o nmero de instituies pblicas, na dcada de
1980, teve um modesto crescimento em 1980 havia 200 instituies pblicas; em 1990, 222
e, na dcada de 1990, houve um decrscimo, pois no ano 2000 havia apenas 176 instituies
pblicas. A partir de 2001 o nmero de instituies pblicas voltou a crescer, totalizando 224
em 2004. Vieitez e Dal R (2005, p. 25), apresentam a maneira como esse processo foi sendo
desenvolvido:
[...] para o ensino superior o acontecimento fundamental foi a implantao de uma poltica que favoreceu a expanso deste nvel de ensino predominantemente por meio de estabelecimentos particulares. As providncias tomadas visando essa finalidade foram vrias. A mais importante foi o quase congelamento do setor pblico numa conjuntura em que a demanda por vagas estava fortemente reprimida e que dera origem crise dos excedentes. Outras providncias tomadas para incentivar o crescimento desse setor foram, por exemplo, isenes fiscais, subsdios financeiros e legislao amigvel quanto aos requisitos para o funcionamento das unidades de ensino.
Apesar do nmero reduzido de novas instituies pblicas, registrou-se um aumento
nas matrculas no ensino superior pblico. Analisando os dados do INEP em 2004, identifica-
se um crescimento da dcada de 1980 para 1990 de 17,55%; de 1990 para o ano 2000, o
crescimento foi de 53,30% e, de 2000 para 2004, o crescimento foi de 32,84%. Portanto,
ainda que em ritmo bem menor que o setor privado, as matrculas no ensino pblico
continuaram crescendo a despeito de uma srie de dificuldades como a reduo do
financiamento, a proibio de novas contrataes de docentes e funcionrios tcnico-
administrativos, a exigncia de busca de outras fontes de recursos, etc.
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Contudo, esse crescimento de matrculas do ensino superior pblico no acompanhou
a demanda, j que no houve aumento de recursos que pudesse viabilizar a expanso
requerida. Embora o debate sobre a privatizao tenha sua origem na esfera econmica, a rea
social no est isenta de ser atingida por seus efeitos, tendendo a aprofundar-se em todos os
setores, de modo especfico na sade e na educao. As observaes de Ferreiro (1993, p. 56)
a esse respeito esclarecem esta questo:
O Estado delega ao setor privado a maior parte de suas obrigaes e retm somente aquelas de tipo assistencial para os setores cujo poder aquisitivo no lhes permite pagar por um servio necessrio. A noo de direito sade, moradia e educao perde assim seu sentido global. Em lugar de os cidados reclamarem um direito, estabelece-se, como se fosse normal, que eles comprem servios. Aqueles que no podem compr-los devem conformar-se com uma ao assistencial do Estado, que se limita a dar o mnimo necessrio (e, freqentemente, bem abaixo do mnimo requerido para manter os nveis de subsistncia e funcionamento degradado dessa parcela da populao).
O sistema educacional pblico tem sido minimizado cada vez mais pelas polticas
governamentais em curso, e incentivada a mercantilizao da Educao sem restries. A esse
respeito, a Organizao Mundial do Comrcio OMC , no Documento S/CSS/W/23, de 18
de dezembro de 2000 (OMC, 2000), elenca as condies para um mercado livre, acessvel aos
investidores.
A questo da regulamentao do enfoque comercial no setor educacional pela OMC e
pelo Acordo Geral sobre Comrcio em Servios AGCS (ou GATS, em sua sigla em ingls),
foi analisada por Siqueira (2004, p. 154) e dele destaca-se o seguinte:
A perspectiva da educao na agenda do GATS, como um servio comercial, implica a no-existncia de barreiras para o seu livre-comrcio. H clusulas gerais as quais os pases-membros esto automaticamente sujeitos, como, por exemplo, a de estender a todos os pases signatrios o mesmo tratamento dado nao mais favorecida, a de no ter normas internas muito exigentes, a de aceitar os ttulos e as qualificaes obtidos no exterior, etc. As clusulas de adeso voluntria (tratamento nacional e acesso ao mercado), ao que parece, se depender dos Estados Unidos devero ser aceitas sem restries. Ou seja, no dever haver tratamento diferenciado para grupos nacionais e estrangeiros, tenham eles sede ou no no pas, empreguem ou no mo-de-obra nacional, desenvolvam ou no cursos de acordo com a realidade regional. Nesse caso, a oferta de subsdios, isenes de impostos, programa de bolsa de estudos hoje existentes para as
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instituies privadas educacionais nacionais poder ser requerida para todos os grupos estrangeiros que aqui estabeleam negcios.
Diante do crescente processo de mercantilizao do ensino superior, inclusive da
internacionalizao do mesmo, a universidade pblica vem sofrendo com a escassez de
recursos, sendo cada vez mais orientada a buscar recursos externos para sua sobrevivncia.
Catani e Oliveira (2002, p. 5), confirmam essa tendncia ao analisarem as polticas da
educao superior no PNE.
A ausncia dos itens vetados no PNE por FHC parece substanciar ainda mais o processo de mercantilizao da educao superior em curso no pas, medida que promove a ampliao crescente do setor privado; elimina aportes financeiros para manter ao menos a situao atual ou aumenta a oferta de vagas no setor pblico; induz as IFES, em geral, a assumirem perfil mais empresarial quanto obteno de recursos financeiros para a sua manuteno e desenvolvimento.
Enquanto a universidade pblica vem sofrendo com a escassez de recursos, o governo
de Lus Incio Lula da Silva cria programa que repassa recursos pblicos para as instituies
privadas, o Programa Universidade para Todos PROUNI, criado pela Medida Provisria
213 de 10/09/2004 (BRASIL, 2004a), destinado concesso de bolsas de estudo integrais e
parciais de cinqenta por cento (meia bolsa) para cursos de graduao e seqenciais de
formao especfica, em instituies privadas de ensino superior, com ou sem fins lucrativos.
Essa medida foi editada aproximadamente 48 horas depois do Frum Nacional em Defesa da
Escola Pblica (que rene diversas entidades ligadas ao setor) ter declarado que o PROUNI
uma medida nefasta para a educao.
Segundo Leher (2004b, p. 2), este programa consiste na bia de salvao das
instituies de ensino superior privado, que:
[...] conta com uma inadimplncia da ordem de 35 a 40%, de acordo com as entidades patronais. Elas no tm mais como ampliar o nmero de estudantes, pois os jovens das classes mais baixas no tm poder aquisitivo para comprar servios educacionais. Hoje, o nmero de vagas oferecido pelas instituies privadas j mais ou menos semelhante ao nmero de concluintes do segundo grau; s vezes, alguns deles at fazem um sacrifcio
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e ficam um, dois semestres, e depois evadem ou ficam inadimplentes. O ProUni uma operao de salvamento para o setor privado. [...]
O autor afirma, ainda, que essa MP no vai sequer arranhar o problema de acesso s
universidades, porque o nmero de bolsas oferecidas pequeno, no atende a demanda e no
garante a democratizao do acesso. Hoje, de cada 100 jovens com idade entre 18 a 24 anos, 9
esto matriculados em alguma instituio de ensino superior. Com o PROUNI, esse ndice
chegar a 10, at 12 de cada 100 jovens com idade entre 18 e 24 anos, o que no modifica a
excluso dos setores mais pobres.
Em outro artigo sobre o PROUNI, Leher (2004a, p. 2) acrescenta:
[...] um estudo da entidade dos reitores das universidades federais afirma que com apenas R$ 1 bilho seria possvel generalizar o ensino noturno das IFES, criando aproximadamente 400 mil novas vagas. Com o total de verbas pblicas que est sendo previsto para as instituies privadas poderamos ter mais de um milho de novas vagas. Os fatos desmentem o propsito social desta poltica que faz avanar ainda mais a privatizao do ensino superior, setor que totaliza 88% das instituies e 72% dos estudantes do ensino superior.
Cabe destacar, conforme dados do mesmo artigo citado, que, se todas as instituies
aderirem ao PROUNI, haver um subsdio superior a R$ 2 bilhes/ano aos empresrios. Isso
sem contar os cerca de R$ 1 bilho de FIES Financiamento Estudantil, programa criado pela
Medida provisria 2.094, de 13/06/1999, e transformado na Lei 10.260 em julho/2001
(BRASIL, 2001b) pelo governo Fernando Henrique Cardoso para financiar parte da
mensalidade dos estudantes.
Portanto, o PROUNI um programa que busca propiciar a expanso do acesso ao
ensino superior por meio do setor privado. Aponta sua posio de reduzir investimentos em
reas sociais, favorecendo cada vez mais as empresas educacionais. A aprovao da MP 213
se deu num contexto em que as universidades pblicas de um modo geral vivem um momento
de muita dificuldade. Marques (2005, p. 36), confirma esse contexto com seu relato:
Segundo dados da Associao Nacional de Dirigentes de Instituies Federais de Ensino Superior (Andifes), no perodo de 1995 a 2001, as 54 universidades federais perderam 24% dos recursos para custeio (gua, luz,
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telefone, compra de materiais) e 77% dos recursos para investir em salas de aula, laboratrios, computadores e acervo bibliogrfico.
Essa orientao para o mercado pode ser identificada pela expanso de vagas no
ensino superior pelo setor privado, em detrimento do pblico. O que passou a contar foram os
dados estatsticos, ou seja, aumento de cursos seqenciais e outras modalidades aligeiradas
(para os estudantes de renda mais baixa), ao invs da expanso de vagas no setor pblico com
cursos qualitativamente superiores.
De acordo com o Catani e Oliveira (2002, p. 3), a estratgia de diversificao para
as IFES inclui pensar na expanso do ps-secundrio, isto , na formao em reas tcnicas e
profissionais. Nesse sentido, sugere-se a modulao do ensino universitrio, com diploma
intermedirio, o que permitiria expanso substancial do atendimento sem custo adicional
excessivo.
Leher (2004a, p. 2) apresenta essa questo da expanso de vagas da seguinte forma:
Qual a melhor alternativa: estabelecer a poltica de acesso vinculada expanso do ensino pblico, de alta qualidade, esforo que fortalecer a capacidade de produo do conhecimento socialmente relevante ou inflar as estatsticas com cursos seqenciais aligeirados, sufocando o setor pblico? H dez anos, o Banco Mundial elaborou um documento afirmando que, no caso dos pases latino-americanos, a nica alternativa era esta ltima opo. A expectativa dos 52 milhes de brasileiros que votaram contra o neoliberalismo de que a educao deve ser vista como um direito fundamental e no como uma mercadoria.
Esta posio do Banco Mundial foi reafirmada em 2000 no documento Educao
superior nos pases em desenvolvimento: perigos e promessas. Trindade (2001, p. 34)
menciona que a leitura do documento mostra que,
apesar de algumas mudanas na linguagem e adeso a algumas teses da Unesco2, o Banco Mundial defende o estabelecimento de um sistema estratificado em termos de criao, acesso e disseminao do conhecimento. Pases e indivduos com renda superior deveriam produzir e ter acesso a conhecimento de alta qualidade, enquanto que os de baixa renda deveriam assimilar a produo. Essa a diviso social e econmica do saber proposta
2 Por exemplo, a necessidade de expanso da educao superior, sua misso pblica, sua relao com o desenvolvimento da sociedade e a formao da