os desafios da escola pÚblica paranaense na … · basquete como alternativa interdisciplinar para...
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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
CONCEITOS MATEMÁTICOS NA QUADRA DE BASQUETE: UMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Paulo Luís Cordeiro1 Everton José Goldoni Estevam2
RESUMO
O ensino na Educação de Jovens e Adultos (EJA) apresenta (ou deveria apresentar) características bastante diferentes daquelas do ensino regular, uma vez que precisa estar alicerçado em fatos do cotidiano do aluno, nos quais surgem dificuldades, expectativas, desejos e propostas relacionadas à aquisição de conhecimento pelos educandos. Os educadores matemáticos que trabalham com a EJA devem valorizar as experiências pessoais e culturais de seus alunos como fatores extremamente importantes, a fim de tornar o ensino dessa disciplina mais relevante e significativo para os mesmos. Neste contexto, o presente artigo tem por objetivo investigar as potencialidades da quadra de basquete como alternativa interdisciplinar para o ensino de conceitos Matemáticos na EJA. Para tanto, optou-se por assumir os pressupostos metodológicos da pesquisa-ação, à medida que buscamos unir a pesquisa à ação. A pesquisa/intervenção foi desenvolvida em uma turma de 9º ano do Ensino Fundamental da EJA de uma escola do interior de Estado do Paraná. Como resultados, percebeu-se que foi possível criar um meio de interdisciplinaridade, um espaço fértil para a apropriação de conceitos matemáticos, compatíveis com as orientações curriculares e apontamentos de pesquisas no campo da EJA.
Palavras-Chave: Educação de Jovens e Adultos. Currículo. Medidas. Geometria. Esporte
1 Introdução
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino
garantida por lei (Lei nº 9.394/96) e orientada para pessoas que não tiveram acesso
ao ensino regular na idade apropriada, por algum motivo. Segundo as Diretrizes
Curriculares da Educação de Jovens e Adultos (PARANÁ, 2006), o perfil dos
educandos dessa modalidade de ensino é diferente da clientela da escola regular.
Trata-se de jovens, adultos e idosos com características diversas em relação à
idade, ao nível de escolarização, à situação socioeconômica e cultural, às
ocupações e à motivação pela qual procuram a escola. Partindo desse pressuposto,
as diretrizes estabelecem três eixos articuladores para a EJA: “a cultura, o trabalho e
1 Professor da Rede Estadual de Ensino. Graduado em Matemática e Ciências pela Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras de União da Vitória – Paraná e em Educação Física pela Unidade e Ensino Superior do Vale do Iguaçu – UNIGUAÇU, Paraná. Pós Graduado em Ciência e Educação Ambiental pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de União da Vitória – Paraná, em Ensino da Matemática pela UNICENTRO de Guarapuava, Paraná e em Personal Treiner pela UNIGUAÇU, Paraná. E-mail: [email protected]. 2 Professor-orientador do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE). Professor do Colegiado
de Matemática da Universidade Estadual do Paraná – UNESPAR, Campus de União da Vitória. Licenciado em Matemática, Mestre em Educação pela Universidade Estadual Paulista – UNESP e Doutorando em Educação Matemática pela Universidade Estadual de Londrina – UEL. E-mail: [email protected].
o tempo" (PARANÁ, 2006, p.16). A cultura compreende as diversas formas de
produção da vida e das relações sociais que compõem todas as atividades sociais.
O trabalho expressa uma ação pela qual o homem transforma a natureza e a si
mesmo, sendo que as relações trabalhistas são um dos principais motivos pelos
quais os jovens e os adultos procuram e retornam à escola. Por outro lado, o tempo
é um aspecto que diferencia bastante o aluno da EJA das outras modalidades de
ensino, seja na perspectiva social ou escolar (PARANÁ, 2006).
Neste sentido, Kooro e Lopes (2007, p. 100) salientam que o currículo da EJA
pode e deve nascer no âmbito escolar com base em “fatos do dia a dia, nos quais
emergem dificuldades, expectativas, desejos e propostas relacionadas à aquisição
de conhecimento dos envolvidos no processo educacional”.
Portanto, no presente trabalho a interdisciplinaridade foi associada à cultura
escolar da EJA para propor uma ação articulada na exploração de conceitos
matemáticos. A proposta tem origem na própria prática letiva na EJA, quando nos
deparamos com educandos, em sua grande maioria, sem estudar a vários anos,
integrantes de turmas sempre muito heterogêneas, não apenas em termos de idade
e ramo de atuação profissional, mas principalmente no que tange aos
conhecimentos matemáticos e às dificuldades para lidar com a Matemática escolar.
Por outro lado, percebeu-se que o esporte é algo familiar à maioria desses alunos,
seja por suas experiências ou pelas relações sociais e familiares. Conforme afirmam
as Diretrizes Curriculares da EJA:
Esses educandos trazem uma bagagem de conhecimento de outras instâncias sociais, visto que a escola não é o único espaço de produção e de socialização dos saberes. Essas experiências de vida são significativas e devem ser consideradas na elaboração do currículo escolar, o qual tem uma metodologia diferenciada porque apresenta características distintas do ensino regular. (PARANÁ, 2006, p.30).
Além de lecionar Matemática, o primeiro autor deste trabalho também atua na
disciplina de Educação Física e, pelos acontecimentos do dia a dia escolar (não só
da EJA), a Matemática e a Educação Física constituem dois extremos na preferência
dos alunos: a primeira odiada e a segunda a aula mais esperada. Isso justifica a
tentativa de fazer um elo entre Matemática e o esporte, em uma perspectiva
interdisciplinar.
Essas propostas [interdisciplinares] pretendem mudar o isolamento e a fragmentação dos conteúdos, ressaltando que o conhecimento disciplinar
por si só não favorece a compreensão de forma global e abrangente de situações da realidade vividas pelos alunos, elegendo dois princípios básicos para o ensino de Matemática: o da contextualização e o da interdisciplinaridade. (TOMAZ; DAVID, 2008, p. 14).
Pretende-se com a interdisciplinaridade fazer com que os alunos se sintam
atraídos e motivados para o estudo de Matemática, desmistificando "o monstro" que
esta disciplina representa para muitos deles. Segundo a Proposta Curricular para a
Educação de Jovens e Adultos (BRASIL, 2002), os estudos realizados para sua
elaboração revelaram que:
A Matemática é apontada por professores e alunos como a disciplina mais difícil de ser aprendida. Atribui-se a ela uma grande parte da responsabilidade pelo fracasso escolar de jovens e adultos. O baixo desempenho em Matemática no Ensino Fundamental traduz-se em elevadas taxas de retenção, tornando-se um dos filtros sociais. (BRASIL, 2002, p.13).
O aprendizado da matemática através da interdisciplinaridade e associado a
fenômenos diários, sejam eles físicos, biológicos ou sociais, pode facilitar a
aprendizagem, desde que seja significativo na vida do aluno e vá ao encontro das
necessidades do sujeito (ZANELLA, 2002).
Com base nesses dados surgiu o seguinte questionamento: Em que medida
uma abordagem interdisciplinar pode contribuir para o ensino de Matemática na EJA
no Ensino Fundamental? Partindo desse pressuposto, o presente trabalho assume
como objetivo geral investigar as potencialidades da quadra de basquete como
alternativa interdisciplinar para o ensino de conceitos matemáticos na EJA.
2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Não apenas na Educação de Jovens e Adultos (EJA) é consensual que, para
iniciar e viabilizar o processo de ensino, os professores precisam conhecer um
pouco do histórico escolar de seus alunos, seu contexto e cotidiano, uma vez que
tais elementos constituirão o ponto de partida para suas ações educacionais. Dentro
deste contexto, Kobayashi (2008) afirma que:
[...] essas vivências não podem ser deixadas de lado e devem ser ponto de partida para o aprendizado escolar. Assim, é necessário que o professor tenha a preocupação de abordar temas que sejam significativos para todos os alunos, partindo para uma contextualização integradora em que todos possam perceber a interação do repertório que possuem com o novo aprendizado construído no ambiente escolar. (KOBAYASHI, 2008, p. 61).
As orientações metodológicas para práticas pedagógicas apresentadas nas
Diretrizes Curriculares da EJA ressaltam que a seleção de conteúdos e práticas
deve valorizar a cultura dos seus educandos e dar relevância aos saberes escolares
frente à experiência social construída por eles historicamente. No entanto, para que
ocorra esse processo, deve haver a interação entre os saberes dos discentes e
docentes na busca por conteúdos significativos. "O educador deve perceber o que o
educando sabe e o que precisa saber, conhecendo-o no conjunto: profissão, religião,
desejos, anseios, características e ideologia, por meio do diálogo e da observação
permanentes" (PARANÁ, 2006, p.39).
Segundo Nicodemos (2011, p. 46), nas práticas curriculares da EJA a escola
não é idealizada como “um espaço sociocultural de reprodução e verificação de
conteúdos e conhecimentos; mas também”, como um “espaço de socialização, de
disputa em torno do que ensinar, de trocas culturais e de construção significativa do
conhecimento escolar e social”.
É importante que o ensino da EJA não copie o mesmo modelo de aula desenvolvida no ensino regular. Temos de considerar as condições específicas do aluno que participa das aulas da EJA. É o aluno adulto que trabalha no mínimo oito horas diária, e que teve pouco tempo para permanecer na escola quando deveria estar na idade adequada, segundo a Lei. Esse aluno está marcado por um sistema de ensino que o marginalizou, pois não lhe proporcionou crescimento, como ser humano, menos ainda, como intelectual que associasse o conhecimento adquirido nos bancos escolares à prática propriamente dita (RODRIGUES et al., 2009, p. 1574-1575).
O grande desafio da escola atualmente é trazer o cotidiano desse aluno para
dentro da sala de aula, bem como relacionar as disciplinas entre si para que ele
possa compreender melhor o conteúdo e aplicá-lo ao seu dia a dia. Para isso, o
currículo do EJA “deve ser flexível, diversificado e participativo, definido a partir da
compreensão de que as mudanças do mundo atual exigem que se compreenda
melhor a sociedade para nela atuar de maneira crítica, responsável e
transformadora” (PEREIRA, 2011, p. 91).
2.2 A INTERDISCIPLINARIDADE
Segundo Lück (1994), interdisciplinaridade:
é o processo que envolve a integração e engajamento de educadores, num trabalho conjunto, de interação das disciplinas do currículo escolar entre si com a realidade, de modo a superar a fragmentação do ensino, objetivando a formação integral dos alunos, a fim de que possam exercer criticamente a cidadania, mediante uma visão global de mundo e serem capazes de enfrentar os problemas complexos, amplos e globais da realidade atual. (p. 64).
Vê-se falar muito em interdisciplinaridade, mas observa-se muito pouca
efetivação de práticas interdisciplinares no dia a dia da escola. Geralmente, isso
somente acontece quando é desenvolvido algum projeto que adota um tema
gerador, no qual todas ou algumas disciplinas trabalham suas atividades
explorando-o. Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação Básica para
Matemática (PARANÁ, 2008), a interdisciplinaridade se estabelece quando:
· conceitos, teorias ou práticas de uma disciplina são chamados à discussão e auxiliam a compreensão de um recorte de conteúdo qualquer de outra disciplina; · ao tratar do objeto de estudo de uma disciplina, buscam-se nos quadros conceituais de outras disciplinas referencias teóricos que possibilitem uma abordagem mais abrangente desse objeto. (PARANÁ, 2008, p. 27).
Segundo Bittencourt (2004, p. 73), na década de 90 a interdisciplinaridade
(que é discutida em nosso país desde a década de 70) voltou a ser debatida e
nomeada como integração curricular, sendo esta integração tratada a partir de
diferentes focos, quais sejam, "a contribuição das teorias críticas de currículo; a
influência do pensamento complexo; a idéia de transversalidade; ou ainda
contribuições dos campos da Didática e da Filosofia da Educação".
Para Tomaz e David (2008), a interdisciplinaridade promove um aprendizado
que amplia os significados dos conteúdos estudados nas disciplinas escolares,
principalmente no que diz respeito ao uso do conhecimento escolar em situações
fora da escola. Para tanto, os professores devem explorar os pontos de conexões
com as demais disciplinas, que surgem na explanação de seus conteúdos, de forma
a demonstrar que as disciplinas estão interligadas, facilitar a compreensão por parte
dos alunos e colaborar com a harmonia do conhecimento (FERREIRA, 2006). Se
analisarmos mais profundamente todas as disciplinas, é possível encontrar um ponto
de intersecção, independente da área: ciências, físicas, humanas ou exatas.
2.3 A IMPORTÂNCIA DA MATEMÁTICA NA EJA E SUA APLICAÇÃO NO ESPORTE
A atividade matemática está presente em diversas situações no nosso dia a
dia, ou seja, as necessidades cotidianas da sociedade requerem que o homem
desenvolva capacidades de resolver problemas, na busca de aperfeiçoar
conhecimentos, de tomar decisões (LEAL et al, 2012).
Segundo Kooro e Lopes (2007), a educação está em constante debate, mas
ainda são poucas as produções científicas que exploram a Educação Matemática na
EJA, e os poucos trabalhos produzidos acabam não chegando às secretarias, aos
professores e, consequentemente, demoram a chegar às salas de aula.
O que se observa é que cada vez mais se acentua a dificuldade dos alunos
em relacionar os conteúdos matemáticos com situações reais do seu cotidiano. A
Matemática parece se tornar apenas uma perda de tempo para estes alunos, que
não percebem sua importância. Essa falta de conexão gera uma desmotivação por
parte do aluno que se vê desinteressado em estudar algo que ele não entende como
aplicar ou como utilizar de forma prática (ANDRADES, 2010).
Segundo Carreira (2005, p. 124):
A escola pode e deve proporcionar aos alunos experiências diversas de utilização da Matemática em contextos reais. Se não o fizer, estará a esconder um dos aspectos importantes da própria Matemática e a limitar a formação dos alunos quanto à compreensão do que é a Matemática e quanto à capacidade de usá-la com espírito crítico e autoconfiança.
Miguel (2010) ressalta que os jovens e adultos que retornam ao ambiente
escolar "trazem para a escola várias experiências vivenciadas no seu cotidiano que
exigem reconhecimento de números, contagem e cálculos" (p. 3) e, muitas vezes,
surpreendem o professor pela estratégia usada e sua eficácia na resolução de
problemas. De acordo com Kooro e Lopes:
Muitos jovens e adultos dominam noções matemáticas que foram aprendidas de maneira informal ou intuitiva. Esse conhecimento que o aluno da EJA traz para o espaço escolar é de grande importância, devendo ser considerado pelo educador como ponto de partida para a aprendizagem das representações simbólicas convencionais (KOORO; LOPES, 2007, p. 99).
Conforme Pereira (2012), a participação da Educação Física no processo
interdisciplinar vem sendo discutida desde a sua inclusão no currículo escolar até os
dias atuais, tendo ótimos resultados, pois a Educação Física é considerada pela
maioria dos alunos como sua disciplina favorita. Para o autor, trabalhar a
Matemática com a Educação Física em uma proposta interdisciplinar pode levar a
um aprendizado mais prazeroso devido à percepção que o aluno vai ter da presença
da Matemática em contextos que ele gosta como o esporte.
Segundo Ferreira (2006), não há como ensinar um jogo ou um desporto sem
utilizarmos da pura Matemática, como as medidas e as figuras geométricas da
quadra, a divisão das equipes, a soma de pontos, etc. Enfim, a matemática está
presente em nosso meio, porém, podendo passar despercebida e é nesse ínterim
que a interdisciplinaridade assume o seu papel fundamental.
3 METODOLOGIA
O presente trabalho assume os pressupostos da pesquisa-ação que, segundo
Engel (2000, p. 182), surge da necessidade do elo entre teoria e prática. Ele afirma
que a "pesquisa-ação procura unir a pesquisa à ação ou prática, isto é, desenvolver
o conhecimento e a compreensão como parte da prática". De acordo com Tripp
(2005, p. 447), a “pesquisa-ação é uma forma de investigação ação que utiliza
técnicas de pesquisa consagradas para informar a ação que se decide tomar para
melhorar a prática”. Essa investigação-ação está pautada em um ciclo básico
composto de 4 fases: "Planeja-se, implementa-se, descreve-se e avalia-se uma
mudança para a melhora de sua prática, aprendendo mais, no decorrer do processo"
(TRIPP, 2005, p. 446), conforme representado na Figura 1.
Figura 1: Representação em quatro fases do ciclo básico da investigação-ação. Fonte: Tripp (2005, p. 446)
Para o desenvolvimento da presente pesquisa, primeiramente foi realizada
uma pesquisa bibliográfica acerca das perspectivas curriculares para a EJA, de
modo a subsidiar as tarefas propostas. Posteriormente foi feita a elaboração e
aplicação das tarefas interdisciplinares envolvendo conceitos e conteúdos
matemáticos explorados a partir de uma quadra de basquete. Por fim, foi feita a
análise dos resultados obtidos através destas tarefas, verificando aspectos
relevantes que podem e devem permear a prática de professores de Matemática
que atuem nesta modalidade de ensino.
4 DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES 4.1 ATIVIDADE I: Perfil dos Alunos e seu Conhecimento Sobre Assunto
A atividade consistiu de um questionário com 13 questões, cujo objetivo foi
facilitar a identificação do conhecimento dos educandos, suas trajetórias escolares,
suas relações com a temática pretendida de abordagem e alguns aspectos sociais e
culturais de suas vidas, de modo a auxiliar no desenvolvimento das demais
atividades e na construção dos conhecimentos matemáticos.
A turma compunha-se de 12 alunos, sendo 58% do sexo feminino e 42% do
sexo masculino. A média da idade da turma era de 36 anos, variando entre 19 a 55
anos. 50% da turma trabalhava como empregada doméstica, 17% como mecânico,
17% autônomo, 8% trabalhava em madeireira em serviço braçal e 8% era ex-
motorista afastado por problemas de saúde. A maioria dos alunos (92%) morava em
bairros distantes da escola e do centro da cidade.
Em média, os alunos ficaram sem estudar por 19 anos, com esse período
variando entre um e 35 anos, cujos motivos, em grande maioria, relacionavam-se
com o trabalho. Quando questionados sobre reprovação escolar, 67% relataram que
já tivera ao menos uma reprovação quando no ensino regular, sendo que desses,
87% reprovaram em uma das séries/anos finais do ensino fundamental. Todos os
alunos relataram ter optado pelo ensino noturno em virtude de trabalhar durante o
dia. A maioria relatou gostar de frequentar a escola para ter um convívio social,
ampliar sua rede de amizades e também buscar aperfeiçoamento para um futuro
melhor.
Na que se refere à comunicação, 17% dos alunos não possuíam computador
em casa e apenas 8% não tinham acesso à internet, já que alguns faziam uso a
partir de celulares.
Já com relação à disciplina preferida, 33% responderam História, 17%
Educação Física e Ciências e 8% responderam Inglês, Artes e Matemática (em
cada), sendo que 8% relataram não ter uma preferência. Apesar de apenas 8% dos
alunos apontarem a Matemática como disciplina favorita, 67% relataram gostar da
mesma. Quanto à disciplina mais importante para sua formação, 57% dos alunos
apontaram o Português e 43% a Matemática como a disciplina mais importante.
Já com relação ao conhecimento da modalidade esportiva basquete, 58%
respondeu não conhecer este esporte, 42% respondeu conhecer, mas nunca
praticaram este esporte.
Com o presente questionário foi possível perceber que os alunos não tinham
afinidade tanto com a Matemática quanto com o basquete, sendo que a maioria dos
alunos tinha pouco ou nenhum conhecimento sobre este esporte, diferentemente do
contexto para o qual o projeto havia sido pensado inicialmente. Isso constitui um
obstáculo e gerou a necessidade de uma introdução sobre a temática e o conteúdo
que seria trabalhado com eles antes do desenvolvimento das demais atividades,
para que os resultados obtidos fossem satisfatórios e pudessem alcançar os
objetivos propostos inicialmente.
4.2 ATIVIDADE II: Unidades de Medidas
O objetivo dessa atividade foi conhecer as várias unidades de medidas de
comprimento e sua aplicabilidade, a partir da confecção do metro, para possibilitar a
medição da quadra de basquete. Ela foi iniciada com uma conversa sobre o
conhecimento que os alunos tinham sobre medidas e sistemas de medidas de
comprimento. A partir disso, foi confeccionado conjuntamente um “metro” de papel
(Figura 2) e seus submúltiplos, dividindo-o em 10 partes iguais, por meio de
dobraduras, obtendo o decímetro, posteriormente o centímetro, e por último o
milímetro. Para tanto, foi utilizado a régua, pois se tornou difícil fazer as medidas
corretas usando apenas a dobradura, pois a espessura do papel era muito grande e
o último decímetro acabava ficando menor, devido a isso, marcamos com a própria
régua os decímetros. Os milímetros foram marcados somente no primeiro decímetro.
Figura 2: Parte do metro de papel confeccionado por um dos alunos.
Após esse trabalho, foram utilizados os metros construídos pelos grupos para
a construção do decâmetro. Com essas construções foi possível a explicação do
que acontece no Sistema Métrico Decimal, no qual cada unidade de comprimento é
dez vezes a unidade imediatamente inferior e um décimo da unidade imediatamente
superior.
A maioria dos alunos teve dificuldade no manuseio da régua, pois, não tinham
a coordenação motora fina muito apurada e, em alguns casos, o comprometimento
da visão também atrapalhou, dificultando as marcações, principalmente dos
centímetros e milímetros. Somente um educando não soube utilizar adequadamente
a régua, começando suas medidas no um, pois, segundo ela, o zero representava a
inexistência de valores. Isso provavelmente ocorre porque no Ensino Fundamental
(anos iniciais), quando os alunos aprendem sobre os números naturais, o processo
da contagem inicia-se no um e o zero não tem uma função no início da contagem, o
que não acontece para a aferição das medidas, em que há um intervalo entre zero e
um, que constitui o um, ou seja, a ideia de contagem dos números naturais não se
transfere para as medidas, em que se utilizados racionais. Isso ocasionou a
confecção de um metro com 90 cm. Após esta atividade, ficou evidente que os
alunos não tinham conhecimento das unidades de medidas, sendo essa atividade de
fundamental importância para o desenvolvimento das demais.
4.3 ATIVIDADE III: Medidas da Quadra de Basquete
O objetivo dessa atividade foi utilizar adequadamente o metro confeccionado
(Figura 2) para aferir as medidas da quadra de basquete, adaptá-las em escala e
comparar com as medidas oficiais.
Além do metro construído, foi utilizado um barbante para facilitar a medida do
comprimento da circunferência e das semicircunferências da quadra de basquete
(Figura 3 A e B).
Figura 3: Alunos do EJA, fazendo a medição da circunferência e semicircunferência da quadra (A) e medindo as linhas da quadra de basquete com o metro confeccionado por eles (B).
A atividade foi desenvolvida em um ginásio de esporte, para que os alunos
obtivessem as medidas das dimensões da quadra de basquete e construíssem um
"esboço", representando-a com as respectivas medidas.
Os alunos não tiveram grandes dificuldades para medir cada parte da quadra,
sendo que, quando surgiu alguma dúvida, o professor auxiliou no esclarecimento.
Foi possível observar que a maioria dos alunos demonstrou boa noção de medidas e
de como medir cada parte da quadra, exceto a semicircunferência e a circunferência
central da quadra, que exigiu o auxílio do barbante e depois a medição deste. Uma
dúvida comum foi com relação à espessura da linha da quadra e definição de como
realizar a medição. Foi definido um padrão comum, já que sua espessura tinha 5 cm,
o que poderia originar divergências.
Posteriormente os alunos construíram o esboço da quadra em um papel
milimetrado (Figura 4), utilizando a escala de um metro para um centímetro. Foi
utilizada régua para a construção dos quadriláteros e compasso para as
circunferências e semicircunferências. Os alunos tiveram dúvidas na marcação das
medidas decimais, não exatas. Alguns alunos tiveram dificuldade em enxergar os
milímetros, devido a problemas de visão, além de dificuldade em manusear o
compasso, já que a grande maioria nunca havia utilizado um.
A B
Figura 4: Esboço de uma quadra de basquete confeccionado por um aluno.
Os alunos realizaram uma pesquisa na internet sobre as medidas oficiais da
quadra de basquete (Figura 5), a fim de verificar se as medidas obtidas nas
medições correspondiam àquelas oficiais. Foi possível verificar que dois alunos
tinham dificuldade de manusear o mouse e sabiam utilizar parcialmente o
computador. Superadas essas dificuldades, com o auxilio do professor e dos
colegas, comparou-se as medidas da quadra de esportes oficial e o esboço
construído pelos alunos e constatou-se que a quadra do colégio onde foi realizada
essa atividade tinha praticamente todas as medidas da quadra oficial.
. Figura 5: Esboço de uma quadra de basquete com medidas oficiais.
Percebemos que, possivelmente, o aproveitamento dessa atividade poderia
ter sido melhor se a identificação das medidas da quadra oficial na internet tivesse
sido realizada antes da realização das medições na quadra de basquete do ginásio,
uma vez que oito alunos não conheciam o esporte e os demais tinham um
conhecimento parcial dele, o que originou dificuldade na identificação das linhas da
quadra que compunham, de fato, a quadra de basquete3.
4.4 ATIVIDADE IV: Figuras Geométricas da Quadra de Basquete
O objetivo dessa atividade foi conceituar perímetro e calcular o perímetro das
figuras geométricas da quadra de basquete (retângulo e circunferência).
Com os dados da quadra do ginásio e as medidas oficiais, os alunos
determinaram o comprimento total dos lados (contorno) e identificaram a forma
geométrica das diferentes linhas de sinalizações na quadra de basquete (quadra
toda, garrafão, linha dos 3 pontos, circunferência central). A partir desses dados, foi
formulado o conceito de perímetro como a soma dos lados de qualquer figura que,
no caso do círculo, é o comprimento da circunferência.
Nessa aula os alunos não tiveram dificuldade na realização das atividades.
Alguns denominaram o retângulo por quadrado. E observou-se que optaram pela
adição à multiplicação, nos cálculos dos perímetros dos retângulos, bem como
revelaram dificuldades em cálculos mentais. Todos conseguiram conceituar
perímetro. Porém, no cálculo do perímetro da circunferência e da semicircunferência,
foi preciso explicar que os valores não deram exatos porque não foi utilizado um
instrumento de precisão para a obtenção das medidas, por isso, houve diferença
entre resultados dos valores coletados por eles na quadra do ginásio com as
medidas oficiais obtidas da internet (Figura 6).
3 O ginásio em que foram realizadas as medições possuía uma quadra poliesportiva, com linhas
delimitando áreas para diferentes esportes: basquetebol, futsal, voleibol, etc.
Figura 6: Cálculo do perímetro das figuras geométricas na quadra de basquete feita por um aluno.
4.5 ATIVIDADE V: Construção do π (pi)
O objetivo dessa atividade foi construir a ideia de aproximação para o valor de
π (pi), de forma a justificar sua utilização nos cálculos de perímetro da circunferência
e área do círculo.
Com os dados obtidos na realização da tarefa três, foi efetuado o cálculo para
a obtenção do quociente entre as medidas do comprimento e do diâmetro das
circunferências e semicircunferências, com o objetivo de construir uma tabela de
regularidades, conforme Figura 7. Também foram medidos e determinados os
mesmos quocientes de prato, copo, pires entre outros objetos circulares. Após
executados ao menos cinco cálculos, os alunos compararam os resultados na
intenção de que percebessem que esse quociente aproximava-se do valor 3,14.
Antes de iniciar as atividades foi explicado que os valores que obteriam seriam
aproximados, devido à imprecisão dos instrumentos de medição.
Figura 7: Tabela de regularidade na obtenção aproximada do π, feita por um aluno.
É possível observar na Figura 7 que o aluno cometeu alguns erros nos
cálculos dos exercícios. Na semicircunferência, o valor do comprimento (5,46 m)
corresponde somente à metade da circunferência, sendo necessário multiplicar por
dois para obtenção do quociente próximo a 3,14. Já no cálculo do pires, por não ser
utilizado um instrumento de precisão para obtenção das medidas, o quociente não
se aproximou do valor de π.
Para a dedução do algoritmo do comprimento da circunferência foi solicitado
que os alunos realizassem a prova real da divisão. Com isso, foi possível mostrar
que com essa “fórmula” seria possível obter o comprimento, ou seja, isolando o
comprimento em um dos membros da equação (Figura 8).
Figura 8: Fórmula do comprimento da circunferência registrado por um aluno.
4.6 ATIVIDADE VI: Conceito de Área
O objetivo dessa atividade foi construir o conceito de área, estabelecer a
relação entre o cálculo de área dos quadriláteros com as medidas dos lados e
utilizar adequadamente as unidades de medidas na resolução de problemas
envolvendo área.
Para iniciar essa atividade foi utilizado o metro confeccionado (na segunda
atividade), barbante, giz e a quadra de basquete do ginásio. Os alunos dividiram a
metade da quadra com quadrados de 1 m². Para isso, marcaram nas laterais
espaços de 1 m e esticaram o barbante que serviu como guia para riscar a quadra
com o giz. O mesmo procedimento foi repetido perpendicularmente a essas linhas
formando assim quadrados de 1 m². Depois desses procedimentos foi discutido o
conceito de metro quadrado. A partir disso, eles foram questionados sobre a
possibilidade de determinação de quantos metros quadrados caberiam naquela
quadra, sem a necessidade de traçar o restante da quadra. Logo após isso, foi
solicitado que verificassem alguma regularidade ou possibilidade de se determinar o
total de quadrados que caberia em cada um dos retângulos, levando em
consideração a percepção do princípio de multiplicação dos lados para obtenção da
quantidade de quadrados. Com isso, foi possível mostrar na quadra que para
qualquer delimitação que for feita no formato retangular, basta multiplicar o lado
maior pelo lado menor para se obter o número de quadrados existentes nessa
delimitação (Figura 9).
Figura 9: Conceito de área trabalhado com os alunos.
A prática e contextualização facilitou e auxiliou no aprendizado do conteúdo,
pois, os alunos relacionaram o conteúdo lecionado com a medição de outros objetos
como: a medição de um terreno, a medição da área de uma casa, etc.
4.7 ATIVIDADE VII: Área de círculo
O objetivo dessa atividade foi deduzir a fórmula da área do círculo por meio
da decomposição do círculo em triângulos e comparação com a área do retângulo.
Para realização dessa atividade, inicialmente foi retomado a “fórmula” para a
determinação do comprimento da circunferência e realizada a decomposição do
círculo em triângulos (4, 8, 16, 32 e 64 triângulos), como se fossem pedaços de
pizza (Figura 10), com as quais foi construída uma figura retangular, uma vez que já
na tarefa anterior discutiu-se a forma para determinar a área desta figura
geométrica.
Figura 10: Decomposição do círculo em triângulos.
Nessa atividade os alunos foram divididos em duplas e cada uma construiu
uma circunferência de raio 10 cm em um papel sulfite e trabalhou com uma das
divisões (4, 8, 16 e 32 triângulos). Vale ressaltar que a divisão de 64 partes não foi
confeccionada pelos alunos, em virtude da demanda de trabalho e tempo. Por isso,
essa decomposição foi feita pelo professor e levada pronta para a aula.
Após a confecção dessa atividade, foram "montados" os retângulos com os
“pedaços de pizza”, um ao lado do outro, para a visualização de que, quanto maior
fosse o número de divisões, mais a representação se aproximaria de um retângulo
de lados medindo a metade do comprimento da circunferência (πr) e o raio da
circunferência (r). Assim, a área da circunferência, a partir da área do retângulo,
seria dada pelo produto dessas duas medidas, ou seja, πr*r=πr². Com essa atividade
fica clara a importância do uso do material didático para a fixação da aprendizagem,
pois todos sabiam a fórmula e como utilizá-la nos exercícios subsequentes.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A interdisciplinaridade é uma importante ferramenta para a escola que
deseja oferecer um ensino de qualidade para seus alunos. No ensino da Matemática
essa ferramenta mostra-se de extrema importância, pois, a maioria das outras
disciplinas utiliza a matemática de forma direta ou indireta. Trabalhar em uma
perspectiva interdisciplinar na EJA é de fundamental importância, pois os alunos, por
serem adultos, trazem uma bagagem de conhecimento adquirido no seu dia a dia
que os fazem questionar sobre a aplicabilidade de tudo que lhe é ensinado. A união
de duas disciplinas aparentemente distintas possibilita que o aluno compreenda de
forma mais clara o que está sendo ensinado, enfatizando assim, a importância do
conteúdo lecionado para situações concretas.
Porém, ao pensar essa temática, o professor de Matemática precisa
conhecer o perfil dos alunos, para que o contexto escolhido seja familiar à turma. Ao
analisar o perfil dos alunos e seu conhecimento sobre o assunto, foi possível
perceber a falta de intimidade com tema proposto. Isso ocorreu porque, ao elaborar
a unidade didática do PDE, não se tinha qualquer noção de como seria o perfil dos
alunos da EJA onde a proposta seria aplicada. Assim, recorreu-se a experiências
anteriores para pautar o projeto, cuja efetivação foi comprometida. Assim, o ideal
seria a adaptação da temática à realidade encontrada, ação a qual, a estrutura do
PDE não possibilita, e que fez com tentássemos estratégias de aproximação e
familiarização da temática com os alunos da turma em que trabalhamos, de modo a
viabilizar o trabalho.
Com o desenvolvimento das atividades foi possível verificar como se podem
explicar conteúdos considerados para muitos alunos como de difícil compreensão,
como a Geometria, de forma mais prática, utilizando para tanto as medidas da
quadra de basquete, por exemplo. Ao trabalhar este conteúdo os alunos puderam
compreender diferentes conceitos matemáticos, bem como, associar as medidas da
quadra de basquete a outras medidas presentes no seu cotidiano como: as medidas
de uma casa, de um terreno, distância percorridas até a escola e outras. Parece-
nos que, a partir do momento que o aluno consegue aplicar o conteúdo lecionado
em seu cotidiano e fazer relações desse conhecimento em diferentes contextos, seu
aprendizado se torna algo significativo e concreto.
Isso também reforça a importância da visualização nas aulas de Matemática
da EJA. Os educandos sempre questionam a aplicabilidade de tudo que lhe é
ensinado e, a partir do momento que ele trabalha, observa e pensa sobre um
conteúdo, suas percepções mudam. Assim, quando se apresenta um processo de
visualização o qual fundamenta as discussões o aluno começa a vislumbrar
possibilidades de aplicação desse conteúdo em seu cotidiano, o que contribui para
sua aprendizagem.
Apesar de se tratar de alunos concluintes do ensino fundamental, algumas
dificuldades elementares foram percebidas, como: confusão entre retângulos e
quadrados, preferência à adição à multiplicação, dificuldades com cálculos mentais e
algoritmos, dificuldades em lidar com números decimais, dificuldades nas medições
e nos cálculos, e dificuldade no manuseio/uso de régua e compasso.
Pensamos que, a confusão entre retângulo e quadrados deve-se ao fato de
que, o conhecimento que os alunos têm na EJA, originado na prática e pouco
sistematizado, acaba por gerar equívocos, pois, diferenciar quadrado e retângulo
parece não ter relevância para eles. Com isso, percebe-se a importância de se
trabalhar o conceito dessas figuras, não apenas apresentando suas diferenças, mas,
problematizando-as para que o educando possa vislumbrar as aplicações práticas
delas.
Já com relação à preferência dos alunos pela adição ao invés da
multiplicação, isso se deve porque na maioria dos cálculos (realizadas em situações
práticas dos alunos), a multiplicação pode ser entendida com uma soma de parcelas
iguais. Os educandos recorrem ao processo aditivo por não terem desenvolvido o
pensamento multiplicativo. Isso aponta a importância de o professor de Matemática
desenvolver atividades que estimulem o aluno a trabalhar a multiplicação ao invés
da adição, ou seja, propor situações onde a estratégia aditiva não solucione o
problema, obrigando o aluno a pensar a multiplicação.
Em relação às dificuldades com cálculos mentais e algoritmos, o professor
deve ter em mente que nem sempre um aluno do EJA (adulto) vai ter mais facilidade
com cálculos mentais e menos com algoritmos, ou vice-versa. A turma da EJA
constitui um grupo heterogêneo, reunindo pessoas com experiências e aprendizados
diversos, onde uns terão mais facilidade com cálculos mentais e outros mais com
algoritmos, como foi observado no presente trabalho. Por isso, o professor da EJA
não deve priorizar uma dificuldade ou estratégia em detrimento de outras. É preciso
avaliar cada aluno individualmente percebendo suas dificuldade e potencialidades e,
a partir disso, explorar e desenvolver cada uma delas.
Acreditamos que as dificuldades em lidar com números decimais devem-se
à complexidade desse assunto e a não exploração deles nas práticas sociais. O
conhecimento matemático exigido dos alunos em seu cotidiano, geralmente, não
proporciona a utilização dos números decimais, limitando-se muitas vezes aos
naturais. Nas práticas sociais, tende-se a desenvolver estratégias alternativas para
não utilização dos decimais, recorrendo-se, por exemplo, a aproximações ou
arredondamentos que possibilitam estimar valores utilizando somente números
inteiros (e positivos, em geral). Tal situação patenteia a importância da exploração
dos números decimais nos processos de escolarização da EJA, explicitando a nova
ideia de número que constitui os racionais e os aspectos aritméticos que os
permeiam.
No que se refere às dificuldades de medições e cálculos, o professor deve
tomar o cuidado de verificar se o aluno está medindo e calculando de forma correta,
para que isso não venha comprometer, por exemplo, tarefas envolvendo a
percepção de padrões e regularidades. Ao realizarem medições e cálculos
equivocados acerca do comprimento e diâmetro da circunferência da quadra (e dos
outros objetos), comprometeram o processo de aproximação do valor de π (pi).
E em relação à dificuldade no manuseio/uso de régua e compasso, deve-se
levar em conta que tão importante quando trabalhar com conceitos e cálculos
matemáticos é trabalhar com materiais que envolvem a matemática. Tanto a régua
quanto o compasso (de modo geral) não são objetos utilizados com frequência pelo
aluno em seu cotidiano e isso acaba comprometendo a sua habilidade no manuseio
desses instrumentos nas aulas de Matemática.
Vale salientar que um dos elementos que pode ser associado às dificuldades
inerentes das próprias características desse alunado é que a Geometria, onde são
trabalhados esses conceitos e utilizados instrumentos como régua e compasso, é
sempre explorada no último bimestre e, geralmente, acaba ficando comprometida
em virtude da insuficiência da carga horária. Com isso, para que essas dificuldades
sejam superadas pelos alunos, o professor de Matemática deve ter em mente todas
essas dificuldades e trabalhar para que cada uma delas seja superada.
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