para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

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para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha] casa e da [minha] vida UFRJ – PROURB – CiHabE | coord. Luciana da Silva Andrade Rede de Pesquisas Cidade e Moradia: UFRJ – IPPUR | coord. Adauto Lucio Cardoso UFRJ – PROURB – CiHabE | coord. Luciana Andrade USP – FAU – LabCidade | coord. Raquel Rolnik Instituto Polis | coord. Nelson Saule Jr. PUC-SP – CEDEPE – Nemos | coord. Rosangela Paz USP/São Carlos – IAU | coord. Lúcia Zanin Shimbo USP/São Carlos – IAU+ Peabiru | coord. Cibele Rizek UFMG – Escola de Arquitetura – PRAXIS UFRN – DARQ – LaHabitat | coord. Dulce Bentes UFC – DAU – LEHAB | coord. Luis Renato Pequeno UFPA – FAU – LABCAM | coord. José Júlio Lima Realização: Apoio: Apoio financeiro: 2015

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para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha] casa e da [minha] vida

UFRJ – PROURB – CiHabE | coord. Luciana da Silva Andrade

Rede de Pesquisas Cidade e Moradia:

UFRJ – IPPUR | coord. Adauto Lucio Cardoso UFRJ – PROURB – CiHabE | coord. Luciana Andrade USP – FAU – LabCidade | coord. Raquel Rolnik Instituto Polis | coord. Nelson Saule Jr. PUC-SP – CEDEPE – Nemos | coord. Rosangela Paz USP/São Carlos – IAU | coord. Lúcia Zanin Shimbo USP/São Carlos – IAU+ Peabiru | coord. Cibele Rizek UFMG – Escola de Arquitetura – PRAXIS UFRN – DARQ – LaHabitat | coord. Dulce Bentes UFC – DAU – LEHAB | coord. Luis Renato Pequeno UFPA – FAU – LABCAM | coord. José Júlio Lima

Realização:

Apoio:

Apoio financeiro:

2015

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para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha] casa e da [minha] vida

Edital MCTI/CNPq/MCIDADES Nº 11/2012 Linha temática / subtema abordado pelo projeto: TEMA 1 - Aspectos de desenho, implementação e avaliação do PMCMV: a. Qualidade de projetos arquitetônicos e urbanísticos e qualidade construtiva dos empreendimentos produzidos por meio do PMCMV. Equipe: Coordenação Geral: Luciana da Silva Andrade Supervisão de Bolsistas: Juliana Demartini e Rogério Cruz Oliveira Bolsistas: Ana Freitas; Ana Luiza Brandão; Guilherme Teixeira; Isadora Tenório; Isabela Rapizzo; Isabela Couto; Isabelle Baroni; Lucas Pacobahyba; Marcelo Borges; Mayara Frazão; StéfanySilva; Victor HuggoFernandes Pesquisadores: Daniella Burle, João Paulo Huguenin, Juliana Demartini, Marcela Abla, Rogério Cruz, Vyrna Jacomo Colaboradores: André Orioli, Rafael Veríssimo, Juliana Canedo, Jacira Saavedra, Marat Troina Consultores: Maria Laís P. da Silva – sociologia, Eliana Bessa – sociologia, Lilian Fessler Vaz – espaços culturais, Maria Paula Albernaz – projeto urbano, Rachel Coutinho – urbanismo, Paulo F. Rodrigues – estrutura, Ana Lucia Britto - meio ambiente Moradores: Leandro, Paula,Cristina, Emília, Roseane, Walter, crianças que participaram da oficina de maquetes e todos os outros que nos concederam entrevistas e responderam os questionários.

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SUMÁRIO

Lista de imagens: figuras, tabelas e gráficos 4

Apresentação 6

PARTE PRINCIPAL 10

1. Preâmbulos 11

2. Análises 13

2.1. Política Habitacional e produção da metrópole 17 2.1.1. Desenho 20 2.2. Método: parte 1 22 2.3. Para [a crítica a] o projeto 23

2.3.1. Implantação: cidade aberta X condomínio 24 2.3.2. Impactos no cotidiano 33

3. Estudo Arquitetônico-Urbanístico de Readequação 46

3.1. Pressupostos do Projeto 46 3.2. Método: parte 2 48 34 3.3. Estudo Projetivo 49 3.3.1. Escala da rua + empreendimentos 50 3.2.2. Escala dos blocos + unidades habitacionais: 52 3.4. Considerações sobre um projeto [in]viável 58

4. Esboço de uma proposta 60

4.1. Assessoria Técnica Continuada 63 4.1.1. Estratégia de implementação 64

PARTE PARALELA 74

1. Operacionalização da Pesquisa 75 2. Notas Metodológicas 85 3. Assessoria Técnica no Brasil: uma Cronologia Tentativa 93

Bibliografia 98

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Lista de Figuras: Imagens, Tabelas e Gráficos

PARTE PRINCIPAL

Figura 01:Empreendimentos MCMV na Estrada dos Palmares.

Figura 02: Municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Marcados em preto os quatro municípios objeto de aplicação de questionários pelo IPPUR e PROURB. Mapa da Fundação CEPERJ.

Figura 03: Diferença entre características do desenho urbano de conjuntos habitacionais de diferentes épocas, no município do Rio de Janeiro: a. Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, o Pedregulho (1946) - Departamento de Habitação Popular/DF; b. Conjunto Residencial Carmela Dutra (1947) - Fundação da Casa Popular/campus de experimentação de sistemas construtivos, em Guadalupe, c. Conjunto Residencial Operário de Realengo (1938) - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários/IAPI, conhecido como Moscouzinho; d. IAPI Bangu (1949) (parte inferior da imagem) e Conjunto Habitacional Dom Jaime Câmara (1971)– BNH (parte superior da imagem); e. Empreendimentos do PMCMV em Santa Cruz (2011).

Figura 04: Um exemplo do padrão urbanístico da periferia fluminense.No canto superior esquerdo, um empreendimento do PMCMV que fragmenta significativamente o tecido urbano.

Figura 05: Detalhe do padrão de loteamento ilustrado na figura anterior, com destaque para a conexão entre os lotes e a rua.

Figura 06: Sequência analítica do padrão MCMV a partir dos quatro casos estudados - a. Queimados; b. Belford Roxo; c. Triagem; d. Santa Cruz. Fonte: Ilustração da apresentação do CiHabE realizada na reunião da RPCM em abril de 2014.

Figura 07: Conjunto habitacional localizado no bairro de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. A implantação "em pente" permite o diálogo do edifício com a rua e não há espaços residuais entre os blocos.

Figura 08: Complexo de condomínios do MCMV em Santa Cruz. A implantação não dialoga com o entorno e cria vários espaços residuais.

Figura 09: Reconfiguração da implantação dos blocos desenvolvida sobre a mesma área do complexo de condomínios de Santa Cruz. Os blocos passaram a dialogar com o entorno e os espaços residuais foram substituídos por pátios com maior potencialidade para o convívio social.

Figura 10: Percurso médio entre condomínios MCMV da Estrada dos Palmares até o Centro do bairro de Santa Cruz (estação de trem).

Figura 11: Diferenças de percursos entre a configuração em condomínios e a cidade aberta.

Figura 12: Sequência de imagens mostrando a transformação do entorno do MCMV da Estrada dos Palmares, ao longo do tempo. a. 31/08/2009; b. 07/01/2010; c. 23/12/2011 e d. 18/11/2014.

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Figura 13: Edificações comerciais não planejadas oficialmente, surgidas em ambos os lados da Estrada dos Palmares. No lado oposto aos condomínios as construções são mais consolidadas. No mesmo lado, são colocadas tendas que aos poucos se consolidam.

Figura 14: Usos comerciais surgidos no interior dos apartamentos.

Figura 15: Desnível entre condomínios, que dificulta a integração futura entre eles.

Figura 16: Diversidade de famílias dos seis condomínios situados na Estrada dos Palmares, em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Figura 17: Gráfico do percentual de adequação das famílias.

Figura 18: Indicação da inflexibilidade do sistema construtivo.

Figura 19: Modificações realizadas por moradores em conjuntos habitacionais do IAPI e do BNH, localizados no bairro de Padre Miguel, situado na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Figura 20: Solução mais onerosa, por criar estrutura independente, de modo a transformar as paredes existentes de alvenaria autoportante para alvenaria de vedação. Para melhorar as condições de acessibilidade foram instalados elevadores, sendo que, de modo a não aumentar excessivamente o valor dos custos condominiais, três blocos foram conectados por uma passarela, de modo que todos seus moradores pudessem ter acesso ao elevador.

Figura 21: Solução que considerou a possibilidade da estrutura ser mista, ou seja, autoportante com reforço de armação na junção das paredes; possibilidade reconhecida como pouco provável. a. planta original do bloco; b. alterações propostas; c. solução em planta; d. fachada principal do bloco.

Figura 22: Solução que criou estrutura independente externa, mantendo a estrutura autoportante. Por meio de passarela externa foi possível alterar as configurações dos apartamentos, de modo a ajustá-los ao perfil das famílias.

Figura 23: Estudo de readequação dos condomínios. a. destacado no entorno. b. aproximado: os blocos em vermelho são os existentes. Os blocos em azul são os propostos.

Figura 24: Mapa de uso comercial ou de serviços no interior dos apartamentos. A identificação foi realizada sobre as respostas aos questionários, de modo que traduz apenas o uso comercial neles identificados.

Figura 25: a. Planta padrão dos blocos; b. Maquete eletrônica do bloco padrão.

Figura 26: a. Primeira versão do estudo de planta com circulações externas para conectar cômodos, dando flexibilidade aos apartamentos, de modo a procurar atender a diversidade de perfis de famílias. b. Maquete eletrônica, com incorporação de terraço coletivo para redução do desconforto térmico nos apartamentos do 4º pavimento e incorporação de sistema de coleta de água da chuva.

Figura 27: Esquema dos estudos de redução das passarelas.

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Figura 28: Perspectivas do estudo projetivo.

PARTE PARALELA

Figura 01: Modelo de ficha de avaliação.

Figura 02: Desenho da implantação dos empreendimentos.

Figura 03: Pranchas com síntese de uma das três propostas apresentadas na oficina.

Figura 04: Tabela de adequação das famílias.

Figura 05: Tabela de adequação das famílias (família ampliada)

Figura 06: Tabela de trabalho no domicílio.

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Apresentação Nestas páginas está relatada a pesquisa intitulada “Para além da Unidade Habitacional: pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha] casa e da [minha]vida”, que visou analisar o Programa Minha Casa Minha Vida à luz da “qualidade de projetos arquitetônicos e urbanísticos e qualidade construtiva dos empreendimentos”, como definido no subitem “a”, do Tema 1 “Aspectos de desenho, implementação e avaliação do PMCMV”, definido no Edital MCTI/CNPq/MCIDADES Nº 11/2012. Objetivamente, focamos na qualidade do projeto arquitetônico e urbanístico,

compreendendo “qualidade” especialmente como sua adequação ao perfil, necessidades e potencialidades das famílias residentes. A dimensão construtiva é analisada também sob esta perspectiva, ou seja, ela está inserida na arquitetura, explicitada quando suas particularidades afetam a organização do cotidiano dos moradores. Dito de outra forma, conforme registramos na proposta da pesquisa,

entendendo-se a cidade não apenas como produto das relações humanas, mas,

também, como um agente concorrente para o acesso aos direitos sociais,

através da oferta de habitação de qualidade inserida no contexto urbano,

pretendemos quantificar e qualificar os problemas arquitetônicos e urbanísticos

identificados no universo de conjuntos selecionados para esta pesquisa . ...

Isto será feito em três escalas: a da casa, a do conjunto e a do bairro. No que

diz respeito ao bairro, será analisada a qualidade física dos espaços públicos –

ruas e praças –, considerando as condições dos percursos e permanências dos

moradores para a realização de suas práticas cotidianas, tais como trabalhar,

estudar, ir às compras, realizar atividades físicas e de lazer, etc. Neste mesmo

sentido, será verificado em que medida a configuração espacial do conjunto

apresenta uma morfologia que permita sua integração com o bairro. Por sua

vez, no que diz respeito à casa, o programa arquitetônico das unidades

habitacionais será confrontado com o número de integrantes, o tipo de relação,

a faixa etária e as atividades desenvolvidas pelos moradores, [...]. Esta

abordagem pressupõe também a avaliação da adequação dos sistemas

construtivos utilizados às práticas socioespaciais dos moradores, bem como às

suas dinâmicas de transformação (Andrade [coord.], 2012: 09).

A peculiaridade teórico-metodológica da pesquisa, que propõe que a construção crítica seja feita a partir do próprio objeto de análise – ou seja,a obra edificada –, nos demandou a formulação de um “objetivo particular”, que foi “como crítica, realizar um projeto de readequação arquitetônico-urbanística de um dos conjuntos habitacionais pesquisados” (Andrade [coord.], 2012: 09).

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Ou seja, um dos nossos principais instrumentos de análise do Programa Minha Casa Minha Vida foi o desenvolvimento de estudos projetuais que tentaram encontrar meios de adequar os condomínios existentes à diversidade de composições familiares, às necessidades e, até mesmo às potencialidades dos moradores de um complexo de condomínios – contíguos e agrupados1– situados no extremo oeste do município do Rio de Janeiro, na Região Administrativa de Santa Cruz. Tratam-se dos condomínios Almada, Aveiros, Coimbra, Cascais, Évora e Estoril, situados na Estrada dos Palmares, no trecho ao norte da Avenida Brasil.

Figura 1: Empreendimentos MCMV na Estrada dos Palmares. Fonte: CiHabE (2013).

Esse complexo de condomínios contíguos abriga população que se situa na Faixa 1 do PMCMV (renda de 0 a R$1.600,00) e foi escolhido a partir dos quatro estudos de caso selecionados pelo Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ, segundo critérios discutidos conjuntamente2. A escolha considerou a expressão da produção do PMCMV nos municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.O município com maior produção é a capital e, em seguida, os municípios de Queimados e Belford Roxo. Respeitando a importância de se considerar a localização para a realização das análises, foram definidos os empreendimentos destes três municípios localizados em áreas mais centrais e mais periféricas. Foram, assim, selecionados dois empreendimentos no Rio – um

1 Em reunião da Rede Cidade e Moradia em 22 e 23 de agosto de 2013, foi discutido o uso dos

termos contiguidade e agrupamento para definir, respectivamente “empreendimentos de uma mesma construtora que se localizam lado a lado ou face a face e que conformam um grande empreendimento, que se encontra muitas vezes mascarado em várias pequenas operações” e “frequência de empreendimentos MCMV em uma mesma porção do território”. Para designar um grupo de condomínios contíguos e agrupados, usamos em nossa pesquisa, o termo "complexo de condomínios". 2 A pesquisa foi desenvolvida em rede, com outras 11 equipes, que estão explicitadas no item 1, em

seguida. Aqui cabe antecipar que as equipes do Rio de Janeiro – a nossa, CiHabE/PROURB e Observatório das Metrópoles/IPPUR, ambas da UFRJ, trabalharam em complementaridade.

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bem inserido e outro periférico –, um em Queimados – periférico – e outro em Belford Roxo – bem inserido3.

Figura 2: Municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Indicação (com seta)da localização dos

quatro empreendimentos nos municípios objeto de aplicação de questionários pelo Observatório das

Metrópoles/IPPUR-CiHabE/PROURB UFRJ. Indicação sobre mapa da Fundação CEPERJ.

Além desses quatro empreendimentos, a amostra também considerou um destinado às faixas mais altas de renda - faixa 2 ou 3 - e o realizado pela modalidade “Entidades”, que entretanto não tinha sido ainda ocupado até o fim da pesquisa empírica, em dezembro de 2014. O complexo de conjuntos - ou empreendimentos - habitacionais localizados na Estrada dos Palmares se caracteriza pela sua localização na área de expansão da periferia carioca. Ou seja, se situa na periferia da periferia, em faixa externa à mancha urbana. Por essa condição de segregação, pela receptividade dos moradores e pela relativa segurança para a realização dos trabalhos na área, foi por nós escolhido para o desenvolvimento da nossa análise específica. Embora

nos fosse possível realizar a pesquisa sem um contato maior com os moradores, partindo apenas das observações em campo e da aplicação dos questionários, a perspectiva de se desenvolver um diálogo próximo com a população foi um importante fator para a seleção do caso. 3 No momento da concepção da pesquisa, a questão da localização melhor inserida foi pensada

como aquela mais próxima aos centros urbanos infraestruturados. No seu desenvolvimento, fomos percebendo que esta proximidade é necessária, mas não suficiente para a boa inserção, como está mostrado mais adiante.

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A estruturação deste relatório foi feita em duas partes: uma principal e outra paralela. A parte principal apresenta o conteúdo central da pesquisa. Na parte paralela expomos de maneira mais detalhada questões relacionadas ao método e à operacionalização da pesquisa. Iniciamos a primeira parte com um item intitulado “Preâmbulos” para explicar sucintamente as bases de articulação do trabalho com as outras pesquisas Rede de Pesquisas Cidade e Moradia – RPCM. Partimos para o item seguinte, que comporta as análises desenvolvidas com sustentação na fundamentação teórica e na experiência empírica, que nesta etapa, é constituído principalmente pela análise urbano-morfológica e com

apoio de dados dos questionários aplicados em conjunto com o Observatório das Metrópoles. Em seguida, explicitamos o projeto de readequação do complexo de

condomínios, na sua particularidade de instrumento de pesquisa e não como sugestão objetiva de intervenção na área. Este item foi subdividido nos pressupostos de projeto, na sua descrição e nas análises específicas desenvolvidas a partir deste instrumento. Finalizamos a Parte Principal com o esboço de uma proposta, elaborado principalmente como consequência das análises realizadas nos itens anteriores e

de uma oficina de fechamento da pesquisa, realizada em dezembro de 20144. Aspectos do método e da operacionalização da pesquisa estão expostas na Parte Paralela. A redação da parte principal deste relatório foi realizada por Luciana Andrade, com revisão técnica de Maria Paula Albernaz. Na parte paralela estão indicados os autores do textos que a constituem.

4Tratou-se da Oficina “A Arquitetura, o Urbanismo e a Moradia Popular: o fazer projetual para além

do produto”, realizada pelo CiHabE/PROURB/UFRJ, em parceria com o Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ. O evento ocorreu entre 08 e 12 dezembro de 2014, quando foram feitas visitas de estudo nos dias 08 e 09 e, a partir do dia 10 se iniciaram uma série de debates que envolveram conferência e palestra sobre cooperativas habitacionais uruguaias e cursos de cooperativas, proferidas pelo professor e arquiteto Raúl Vallés, da FARQ UdelaR, além de palestras de Jurema Constâncio, liderança da Coordenação Nacional da União de Moradia Popular - UMP-RJ - e Alvaro Pedrotti, arquiteto, assessor técnico. O evento foi finalizado com uma entrevista realizada com o Prof. Raúl Vallés, com perguntas realizadas pelos participantes da oficina.

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PARTE PRINCIPAL

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1. Preâmbulos No contexto da Rede de Pesquisa Cidade e Moradia - RPCM, a pesquisa desenvolvida pelo CiHabE/PROURB/UFRJ apresentou como peculiaridade a intenção de aprofundar questões arquitetônico-urbanísticas nas escalas do bairro, do empreendimento e das unidades habitacionais, trabalhando em complementaridade com a pesquisa desenvolvida pelo Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ. Entre as 11 equipes que constituíram a RPCM, duas outras também apresentaram particularidades.A composta pelo IAU/USP e a assessoria técnica

Peabiruan alisou o PMCMV-Entidades, no contexto de São Paulo, e a da PUC-SP discutiu o programa sob a perspectiva do Trabalho Social.Todas as outras equipes, ainda que apresentassem particularidades em suas abordagens,debateram a questão da inserção urbana em diferentes escalas. A constituição da rede de pesquisas se deu, indubitavelmente, pelas similaridades e complementaridades das equipes, mas também foi marcada por especificidades, o que requereu a construção de nós metodológicos comuns, que articulassem todas as pesquisas. Em outras palavras, foi identificada a necessidade de busca de uma base metodológica que permitisse a comparação entre os diferentes estudos. Essa construção se deu através de, principalmente, encontros presenciais e trocas de e-mails.

Ao todo foram realizadas seis reuniões entre os representantes das 11 equipes da Rede de Pesquisa Cidade e Moradia – RPCM -5, quando foram discutidas suas identidades e particularidades metodológicas, questões gerais e específicas das regiões estudadas, além de resultados parciais e finais6. O modelo dos questionários, construídos em duas versões principais pelas equipes do Rio e de São Paulo, teve construção discutida entre as 11 equipes, sendo que a estrutura foi adequada a cada contexto, para a aplicação nas seis regiões metropolitanas. Além disto, foi criada uma estratégia de articulação temática:constituímos cinco eixos temáticos – quatro deles abordando diferentes aspectos da questão de pesquisa que reuniu a Rede e um quinto que

atravessa todos os anteriores. Estes eixos serviram para orientação e

5 Três delas foram em Brasília, na mesma ocasião das reuniões com o Ministério das Cidades e outras

três em São Paulo, sendo a última um seminário onde foram expostos os principais resultados das pesquisas. Também ocorreu uma sétima reunião entre membros das equipes que estiveram presentes no Encontro Nacional da ANPUR – ENANPUR –, ocorrido em Recife, em maio de 2013. 6 Tratam-se das Regiões Metropolitanas de Belém, Fortaleza, Natal, Belo Horizonte, Rio de Janeiro,

São Paulo, Campinas e Baixada Santista. Além destas regiões, também foram estudadas duas outras que não se constituem como metropolitanas, como a de Santarém, no Pará e a de São Carlos, em São Paulo.

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sistematização do compartilhamento de dados, análises e resultados. A temática dos eixos e seus conteúdos estão relacionados abaixo7.

Eixo 1: Arquitetura do Programa: agentes e operações do MCMV; .papéis do Ministério das Cidades, Caixa Econômica Federal, prefeituras, empresas e entidades, entre outros agentes envolvidos na produção dos empreendimentos; . as articulações entre os mesmos; . as especificidades de arranjos regionais; . o desenho do programa e possíveis implicações para seus resultados.

Eixo 2: Demanda habitacional e a oferta do Programa;

. articulação da demanda habitacional existente com a oferta produzida pelo Programa; . perfil dos novos moradores e suas origens; . o processo de cadastramento;

. as características do trabalho social realizado, e

. conflitos já identificados (estigmatização, tráfico, milícia etc.).

Eixo 3: Desenho, Projeto e Produção . características dos espaços internos dos edifícios; . as áreas externas dos empreendimentos; . tipologias, escala, implantação, estratégias de padronização e,

. adequação das propostas às demandas e perfis das famílias.

Eixo 4: Inserção Urbana e Segregação Socioespacial . consequências da implementação de grandes empreendimentos em áreas mais afastadas das cidades; . condições de acesso à cidade dos novos moradores (infraestrutura, serviços, equipamentos) e, . processos em curso, como a periferização, a guetificação, o reforço da monofuncionalidade e a privatização da urbanização.

Esse último eixo da lista trata da temática central da Rede.

O quinto eixo - Eixo 5: Política Habitacional e a produção das cidades -, com caráter fortemente transversal, foi criado de modo a costurar e sintetizar o conteúdo dos debates desenvolvidos a partir dos eixos anteriores, além de formular propostas para o enfretamento dos desafios impostos pelo PMCMV, considerando as suas características.

7 Encontra-se em organização, um livro com os conteúdos sintéticos das pesquisas das diferentes

equipes. Um dos artigos, de autoria de Beatriz Rufino, expõe de maneira mais detalhada a constituição e o conteúdo desses eixos.

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A pesquisa por nós desenvolvida teve ênfase no eixo 3 e comporta objetivamente os tópicos do eixo 4. Este foco mais direto com um dos eixos não elimina o diálogo com tópicos dos outros eixos que aparecem de forma difusa ao longo das análises e proposições. A temática sintetizada no eixo5 configura um fundamento essencial da nossa pesquisa, pois ressalta a relação entre política urbana e habitacional com o desenho urbano e arquitetônico. Desse modo, o presente relatório não está organizado pelos eixos de discussão. Ele está centrado na base que articula o eixo 5 ao 3 e todos os outros eixos são acionados sempre que encontram repercussão nos temas tratados. Em outros termos, “A Política Habitacional e a Produção das Cidades” é um tema que define os fundamentos das nossas discussões sobre “O Desenho, o Projeto e a

Produção” do PMCMV. As questões relativas à “Inserção Urbana e a Segregação Socioespacial” estão intimamente vinculadas à questão do desenho urbano e vários tópicos relativos à “Arquitetura do Programa” e a “Demanda Habitacional e a Oferta do Programa” aparecem relacionadas no conteúdo da pesquisa, de

modo não sistemático.

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2. Análises Conforme exposto no início da apresentação deste relatório, objetivamos confrontar a organização da vida das famílias moradoras com realizações que podem ser consideradas típicas do PMCMV. Esta comparação atravessou as escalas do bairro – neste caso, focada mais diretamente no entorno imediato, do conjunto e das unidades habitacionais. A fundamentação das nossas análises se baseia tanto na crítica mais geral à solução urbanística ao problema da moradia baseada na produção monofuncional massiva de unidades habitacionais, quanto em pesquisas

específicas do caso brasileiro. Vários estudos mostraram o desajuste entre soluções de grande escala empreendidas pelo poder público, além da questão da localização. Os arranjos espaciais baseados na especialização das funções e a limitação de tipologias de moradia, mesmo quando contém mais de um tipo,se revelaram inadequados às necessidades e perfil dos moradores8. Vale destacar aqui que, quando nos referimos aos tipos, estamos considerando tanto o partido adotado para o edifício residencial, quanto à configuração dos arranjos. O primeiro caso compreende as possibilidades de solução em unidades habitacionais isoladas, geminadas, em fita, em blocos de apartamentos, de diferentes configurações – barra, “H”, etc. No segundo caso, nos referimos às características internas da moradia; mais precisamente ao número de quartos – um, dois, três ou mais quartos.

Antecipam estes dois aspectos, o próprio desenho urbano, que vai dar aos moradores, maiores ou menores condições de vivência cotidiana do espaço. Ou seja, no contexto da inserção urbana, foco temático da Rede Cidade e Moradia, nossa pesquisa se centrou no fato de que, mesmo quando bem inserido na cidade, a configuração de um conjunto pode comprometer significativamente as práticas cotidianas dos moradores, aumentando distâncias e impondo limitações à produção e reprodução da vida. Antevíamos problemas que iríamos encontrar no desenho urbano de empreendimentos do MCMV. Efetivamente, no que diz respeito aos espaços físicos, já percebíamos um retrocesso mesmo em relação às produções bastante

criticadas do Banco Nacional de Habitação – BNH –, que ficavam evidenciados em três aspectos arquitetônico-urbanísticos, conforme mostrado na proposta apresentada (Andrade [coord.], 2012: 8):

no desenho dos locais de percursos e permanência dos moradores, que

se somam à ausência ou localização inadequada de equipamentos

8 Estamos nos referindo ao debate pós-moderno, que está retomado no próximo item.

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urbanos e espaços públicos, tais como escolas, creches, postos de saúde,

espaços para manifestações culturais, praças etc.;

na solução de conjuntos habitacionais assemelhados a condomínios

fechados que esvaziam os conjuntos habitacionais da possibilidade de

construção de sentido de cidade; e

nas soluções das unidades habitacionais, que pressupõem um padrão

familiar semelhante em termos de números de integrantes e composição

para todas as famílias, ignorando a expressiva diversidade que já se

sobrepõe à familiar nuclear, além de homogeneizar as atividades

cotidianas dos moradores, pressupondo que a moradia é o espaço de

atividades meramente domésticas.

As imagens abaixo mostram que, a despeito das implantações diversas, conjuntos residenciais de diferentes épocas apresentavam a abertura das quadras, como característica comum. Isto é alterado na produção mais recente do PMCMV, que fecha os blocos em condomínios.

a. b.

c.

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d.

e Figura 03: Diferença entre características do desenho urbano de conjuntos habitacionais de diferentes

épocas, no município do Rio de Janeiro: a. Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, o Pedregulho (1946) - Departamento de Habitação Popular/DF; b. Conjunto Residencial Carmela Dutra (1947) -

Fundação da Casa Popular/campus de experimentação de sistemas construtivos, em Guadalupe, c. Conjunto Residencial Operário de Realengo (1938) - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos

Industriários/IAPI, conhecido como Moscouzinho; d. IAPI Bangu (1949) (parte inferior da imagem) e Conjunto Habitacional Dom Jaime Câmara (1971)– BNH (parte superior da imagem); e. Empreendimentos

do PMCMV em Santa Cruz (2011). Fonte: Google Earth.

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Ao longo da realização da pesquisa, ratificamos, como premissa, que “a dinâmica de transformação da habitação é constante e esta deve ser flexível para adequar-se às novas demandas” e que “a (...) configuração enquanto condomínio fechado, (...) ao excluir o entorno impõe aos pobres uma espécie de auto-exclusão(Andrade [coord.], 2012: 8).

2.1. Política Habitacional e produção da metrópole O debate sobre a questão habitacional e metropolitana é amplo e envolve inúmeros aspectos, além de ser tema de diversificadas disciplinas. Não é nossa

intenção aqui fazer sua revisão. Nossa proposta é aprofundar nosso posicionamento, indicado no projeto que gerou esta pesquisa. Considerando que estamos trabalhando a questão do desenho, do projeto e da do PMCMV, nosso olhar sobre o tema “Política Habitacional e Produção da Metrópole” é atravessado pelas preocupações arquitetônico-urbanísticas. Vale lembrar que o item compreende o Eixo 5 definido pela RPCM, aqui alterado pela substituição do termo “cidade” por “metrópole” pelo entendimento que a realidade fluminense não pode ser compreendida fora do contexto metropolitano. Esta deliberação foi feita objetivamente porque estamos tratando desta parcela do território, mas também porque a Região

Metropolitana do Rio de Janeiro representa em torno de pouco mais de 70% da sua população9. Uma primeira dificuldade se impôs: se cada vez é mais difícil e até inconcebível trabalhar com um conceito ideal de cidade, muito mais é quando se trata de um conjunto de cidades que forma uma metrópole. A percepção da inadequação da idealização é tão evidente que nos coloca a questão de como nos posicionarmos para o estabelecimento das categorias que orientaram nossas análises. A paisagem - entendida na sua acepção política, social e físico-espacial - da metrópole carioca/fluminense revela a perversidade de sua estrutura.Uma primeira constatação é das intolerâncias e violência de diversas naturezas: a. do

tráfico de drogas, dos roubos e assaltos; b. contra mulheres, crianças, idosos, homo e transexuais; c. contra seguidores de diferentes religiões e seitas e também contra os não religiosos e d. do estado, particularmente a violência policial – normalmente contra os socialmente mais frágeis. Não temos como não destacar o problema do racismo, que marca a história do passado escravocrata brasileiro, e que aponta para que os números da violência se concentrem majoritariamente sobre a população negra. A esta ordem de violência mais

9Ver Plano Estadual de Habitação (Governo do Estado do Rio de Janeiro, 2012).

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19

direta, soma-se uma segunda constatação: a da violência do espaço urbano. A metrópole, altamente segregada, concentra as maiores benfeitorias urbanas numa parcela exígua do território metropolitano – notadamente a Zona Sul carioca, a cidade de Niterói, partes pequenas do Centro, Zona Norte e Oeste da capital e, parcelas ainda menores do centro de alguns de seus municípios. O sistema de transportes é extremamente precário e a política focada no automóvel individual piorou significativamente a mobilidade e a poluição urbana. A infraestrutura de serviços urbanos, notadamente o esgotamento sanitário, é de pior qualidade nos espaços periféricos e a distribuição de equipamentos de educação, cultura e lazer é bastante desigual no espaço metropolitano. Vale acrescentar que a segregação socioespacial contribui para a dificuldade de construção de um capital cultural pela população moradora das

periferias10. Mas a metrópole fluminense, como todas as outras brasileiras, não é apenas o retrato dramático do que impôs a situação periférica do País na ordem

capitalista mundial. A aproximação na sua realidade cotidiana revela potências ainda não devidamente mapeadas. Nem temos como enumerá-las. Contudo, no que tange à arquitetura e ao urbanismo, podemos apontar para a impressionante capacidade de fazer cidade, a partir de táticas (Certeau, 2008)desde a autoconstrução e autogestão individual, mutirão, negociações com comerciantes locais para a obtenção de crédito por meio da venda “fiado”11, além da apropriação dos conhecimentos técnicos aprendidos em canteiros de

obras e articulação com políticos e técnicos para obtenção de melhorias urbanísticas e habitacionais. Isto demonstra que a que a periferia supostamente caótica, apresenta um vigor que aponta para um outro projeto de cidade e metrópole12. No nosso entendimento, esse projeto contempla antes de mais nada um princípio caro à modernidade, que entretanto se perdeu, como apontou Sennett 10

Um trabalho clássico sobre a segregação urbana no Rio de Janeiro foi realizado por Abreu (1987). Para a ampliação e o aprofundamento de questões apontadas neste parágrafo ver, por exemplo, Bourdieu (coord) (2007) e Ribeiro et alli (2010). 11

É importante lembrar que as periferias brasileiras se expandiram e se consolidaram nos anos 1980, em período de crise econômica e hiperinflação. O acesso das classes populares ao crédito oficial para fins da moradia se deu de forma mais efetiva a partir das ações de meados dos anos 2000, após a criação do Ministério das Cidades, no governo de Luís Inácio Lula da Silva. Anteriormente, o único financiamento mais acessível talvez tenha sido o de aquisição de materiais de construção, oferecido pela Caixa Econômica Federal - CEF. Ainda assim, a burocracia para a concessão de crédito excluía parcela da população, que contava com sistemas não oficiais. É possível que a “venda a fiado” seja a instituição mais representativa do sistema que propiciou o acesso a moradia à parcela significativa da população. 12

Aqui nos referimos tanto a Santos (1980 e 1981) que, ainda nos anos 1960, reconheceu a potência das favelas cariocas, quanto à, de forma mais ampla, Hardt e Negri (2011), que na perspectiva de construção de um novo mundo, governado pelas multidões que o habita, cunharam a expressão altermodernidade.

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20

(1998). A concepção de direitos humanos:

... provém de uma oposição entre natureza e cultura.

Independentemente dos usos e costumes de uma sociedade, todas as

pessoas têm certos direitos básicos, por mais baixa e desfavorável que

seja sua situação nessas organizações culturais. O que são tais direitos?

Temos duas formulações canônicas deles, ambas originárias do século

XVIII: vida e liberdade e busca de felicidade; liberdade, igualdade e

fraternidade. Dentre estes direitos é mais fácil discutirmos sobre a vida,

a liberdade ou a igualdade, do que sobre a busca de felicidade e a

fraternidade. (...)E a razão pela qual não os concebemos tendo igual

peso é que já perdemos de vista a pressuposição, germinada no século

XVIII, sobre a qual se basearam: a de que a psique tem uma dignidade

natural. (...)A busca da felicidade é uma das formulações dessa

integridade psíquica; fraternidade era uma outra. É o homem natural

que possui tais direitos psíquicos, não o indivíduo. Todos os homens

poderiam exigir felicidade ou fraternidade, justamente porque o natural

era impessoal e não-individual. (Sennett, 1998: 117-118).

Esse princípio aponta para um entendimento de cidade - e metrópole – como espaço de trocas, que comporta a diversidade e seus conflitos, sem os obliterarem através da busca de falsos consensos. A ideia de cidade é a de espaço físico e social que busca a democracia radical e da justiça socioespacial13.

Em última instância, a nossa metáfora é a de uma concepção de metrópole polifônica, onde as várias vozes sejam ouvidas. Nesse sentido, mesmo que tenhamos um entendimento do Plano Nacional de Habitação – PlanHab –, concluído em 2009, como ainda fruto do planejamento moderno, uma vez que apresenta forte hierarquia na sua dinâmica de elaboração, sendo a participação quase acessória ou suplementar, reconhecemos sua tendência a traduzir polifonicamente as necessidades habitacionais da população. Mais precisamente, o PlanHab revela uma escuta que abarca de maneira mais ampla – bem mais do que o PMCMV – a diversidade de composições e necessidades das famílias.

Essa diversidade, não só apresentaria na produção de novas unidades, mas também na reabilitação de edifícios ociosos. Antes de expandir ainda mais a periferia e, até, ocupar seus vazios, o aproveitamento de terrenos e edifícios ociosos das áreas centrais infraestruturadas, deveria ser prioritária para que caminhássemos no sentido da construção de cidades e metrópoles mais justas. O PMCMV surge justamente contrariando essa lógica, ainda que tenha sofrido

13

Aqui mesclamos os conceitos de Harvey (1980) e Soja (2000).

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21

ajustes no sentido de se aproximar daquele fundamento político e das demandas dos movimentos sociais. No que diz respeito ao desenho urbano, a opção pelo condomínio reforça a perspectiva da construção daquilo que pode ser considerado como “anticidade”.

2.1.1. Desenho: Sendo o nosso foco a questão do desenho, do projeto e da produção do PMCMV- Eixo 3 -, cabe agora tecer considerações sobre configurações físico-espaciais que traduzam a possibilidade de uma cidade mais plural. A questão é

complexa, pois contrariamente ao desejado pelos idealizadores do urbanismo que segregava a cidade por funções, o espaço físico apresenta uma espécie de impotência para o equacionamento de questões sociais. Entretanto, isto não significa que estes campos do conhecimento são desnecessários, pois podem facilitar ou dificultar significativamente a vida cotidiana, ou seja, se não há efetivamente ingerência para diluir a segregação espacial, pode contribuir para não aumentá-la. David Harvey (2000) discute essa questão. Conforme sintetizou Andrade(2002: 1-2), o autor:

ao rever o fracasso das utopias sustentadas na forma espacial ou no

processo social, sugere que a alternativa para o niilismo contemporâneo

seja a construção de uma utopia espaço-temporal que é, mais

precisamente, uma utopia que trabalha o espaço e a sociedade

dialeticamente. Sua proposta se sustenta no reconhecimento do

caráter imprescindível do espaço para a vida humana. Sua

argumentação, entretanto, reside no entendimento que, por um lado, a

forma espacial tende a ser conservadora por causa das [suas]

rugosidades e, por outro, a extrema fluidez das utopias sustentadas nos

processos sociais parece se diluir na sua própria imaterialidade. Por

isso, para Harvey (2000), uma utopia dialética se faz com dinâmicas

sociais ancoradas no espaço e, ao mesmo tempo, de formas espaciais

progressistas, que procurem lidar com suas inevitáveis “rugosidades”14.

Entendendo que o conforto físico-espacial é importante para a humanidade, Harvey sustenta que a cultura do egoísmo e do consumismo característica do capitalismo tardio deve ser enfrentada a partir de dinâmicas que promovam a participação cidadã, sendo fundamental encontrar maneiras de:

“...desenvolver os mecanismos coletivos e formas culturais, necessários

14

O conceito de “rugosidade” foi usado no sentido desenvolvido por Santos (1994).

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à realização pessoal, fora das forças de mercado e do poder do dinheiro,

e [de] trazer a ordem social para o interior de uma relação melhor de

trabalho, que contemple condições ambientais e ecológicas .”15 (Harvey,

2000: 195).

É imprescindível, consequentemente, reconhecer que existem configurações físicas mais favoráveis ou não para a organização da vida. E mais amplamente, cabe enfatizar que não há neutralidade no desenho urbano, ou seja, as diferentes organizações físico-espaciais atendem aos interesses que as determinam. Mais ainda, organização da cidade segundo funções – morar, circular, trabalhar,

relaxar –, que está na base da proposta do PMCMV, ainda que bastante deturpada, foi determinada pela hegemonia capitalista do início do século XX. O projeto moderno - mais amplo que a arquitetura-urbanismo -, gestado na Europa do início do século XX para responder aos problemas urbanos

decorrentes da Revolução Industrial, foi construído para atender aos interesses burgueses, como nos mostra Topalov (1998). A classe trabalhadora resistiu a aceitar este projeto, cujas estratégias comprometiam suas táticas16. Em maior ou menor grau, entre os países que estavam no centro da economia mundial naquele momento, o projeto moderno cumpriu a função de sanear as cidades para a realização da sociedade industrial. Se este modelo atendeu

principalmente ao sistema que se supôs determinar o fim da história, ele também foi apropriado no socialismo real, como aponta Hannemann (2000). A aplicação desse modelo na realidade brasileira - e em outras realidades periféricas -, ainda que interpretado para o nosso contexto, gerou resultados mais frustrantes para a perspectiva burguesa. As grandes cidades não foram saneadas. Pelo contrário, cortiços e, depois, favelas, não só permaneceram na paisagem urbana, como outras formas periféricas de morar foram surgindo: loteamentos irregulares e clandestinos, favelização de conjuntos habitacionais, entre outras alternativas de moradia popular, são exemplos (Andrade, 2013). O esgotamento desse modelo gerou debates e proposições tanto nos países

industrializados como nos periféricos. O que ficou conhecido como pós-modernismo comportou vertentes díspares: tanto a defesa de uma arquitetura-urbanismo mais comprometida com as pessoas, quanto a radicalização da espetacularização urbana na perspectiva de mercantilização das cidades. 15

“...how to develop the collective mechanisms and cultural forms requisite for self-realization outside of market forces and money power, and how to bring the social order into a better working relation with environmental and ecological conditions.” 16

Aqui nos referimos aos conceitos de Certeau (2008 [1990]), que classifica os métodos para a realização das ações dos interesses hegemônicos como estratégias. Táticas são as alternativas encontradas por setores subalternos da sociedade para resistir a estas ações.

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A atualidade, que já não pode mais ser abarcada pelo termo propagado por Charles Jenks, coloca em cheque modelos que, entretanto, ainda são referência para intervenções urbanísticas e habitacionais. O que um olhar mais atento pode observar é que, talvez mais do que nunca, os desenhos propostos para a construção e reconstrução das cidades contemporâneas revelam os ideais de cidade nos quais há uma clara disputa do espaço urbano pelos diferentes grupos sociais. Os projetos do PMCMV, salvo raras exceções, querem a cidade segregada, onde os mais pobres ficam alijados do acesso às benfeitorias urbanas.

Para finalizar esse subitem, cabe lembrar que a questão ambiental foi incluída de maneira mais determinante aos parâmetros para pensar e projetar as cidades. Atualmente é imprescindível considerar nos projetos as questões relacionadas ao reaproveitamento da águas da chuva, á drenagem natural do solo, ao

impacto térmico e lumínico das edificações no entorno, ao aproveitamento da ventilação natural etc.

2.2. Método: parte 1 Nossa perspectiva de avaliação do PMCMV parte da observação das práticas

socioespaciais da população para o estabelecimento ou reconhecimento das categorias de análise e, posteriormente, formulação de proposições. Há, sem dúvida, a preocupação com a fundamentação teórica sobre o tema, mas não partimos de idealizações abstratas para encaixar a realidade concreta. Pelo contrário, a partir de nossa bagagem construída tanto pela formação acadêmica, quanto pela vivência de outros campos – seja pela pesquisa ou pela realização de projetos arquitetônico-urbanísticos – procuramos chegar aos casos estudados sensíveis às ordens locais que reconstroem o espaço urbano. A partir dos vestígios de reorganização espacial, que foram cada vez mais se evidenciando na medida em que voltávamos a Santa Cruz, identificamos as principais categorias para o estabelecimento do nosso diálogo com a teoria. Foi a partir desse confronto que elaboramos nossas análises e desenvolvemos o estudo projetivo,

que por sua vez gerou novas análises. Posteriormente, foram ainda desenvolvidas proposições para o enfrentamento de problemas provocados por empreendimentos do MCMV. Resumindo, temos duas dimensões de análise: a que está desenvolvida neste item, que tem o caráter de olhar externo às intervenções arquitetônico-urbanísticas do PMCMV, e a que está desenvolvida no item3, elaborada a partir do estudo projetivo de requalificação de um dos complexos de condomínios estudados.

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Essa nossa orientação teórico-metodológica é sustentada pelo pensamento de Carlos Nelson Ferreira dos Santos (1980 e 1981), atualizada por autores que exploraram as cartografias de Deleuze e Guattari (1990), particularmente Jacques (2001) e Passos et alli (2010). Para estes autores, a postura do pesquisador deve evitar as preconcepções, cuidando para que, no processo da pesquisa, não se tente encaixar a realidade nas teorias e conceitos. Eles reafirmam a necessidade da pesquisa ser orientada por questões que desnaturalizam - ou desconstroem -as verdades instituídas. Assim, o método deve ser aberto para comportar as descobertas em campo. Dessa forma, sustentamos as decisões operacionais da pesquisa17. Como

registrado anteriormente, realizamos parte do campo em conjunto com o Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ. Nossa intenção inicial era conhecer os quatro casos de empreendimentos na

Faixa 1 do MCMV – Triagem, Santa Cruz, Queimados e Belford Roxo – para então escolher aquele que seria por nós trabalhado na perspectiva de uma readequação urbanístico-arquitetônica. Entretanto, a realização da pesquisa piloto em Santa Cruz apontou para a pertinência de trabalharmos com este conjunto. Como já dito, a boa recepção dos moradores, aliada à perspectiva de relativa tranquilidade para a realização da pesquisa, antecipou nossa decisão por realizar aí um projeto de reabilitação.

Vale acrescentar que o fato de Santa Cruz ser numa localização distante do Centro do Rio de Janeiro também foi um fator importante na nossa decisão, uma vez que há a tendência desses lugares serem menos procurados para a realização de pesquisas. Valladares e Medeiros (2000) apontaram, em análises realizadas com base num extenso banco de dados sobre as pesquisas urbanas no Rio de Janeiro, que os locais pesquisados tendiam a ser aqueles próximos às áreas centrais e à localização dos institutos de pesquisa. Assim, ao optarmos por Santa Cruz como nosso caso de readequação urbanística, nos reposicionamos sobre os outros campos – Bairro Carioca-Triagem; Queimados e Belford Roxo –, que passaram a ser espécies de caso de

controle, onde poderíamos identificar similaridades e particularidades acerca da realidade físico-espacial dos empreendimentos situados na Estrada dos Palmares, Zona Oeste do município carioca. Optamos deliberadamente por não trabalhar com o empreendimento destinado às faixas de renda 2 e 3. Embora possamos afirmar que não há diferenças significativas quanto à configuração físico-urbanística, antecipamos que algumas

17

Na Parte Paralela deste relatório, apresentamos de forma mais detalhada a operacionalização da pesquisa.

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demandas observadas para a faixa 1não ocorrem em faixas superiores de renda. Por sua vez, o caso do Conjunto Esperança, realizado no contexto do PMCMV Entidades, não se apresentava ocupado até a finalização de nossa pesquisa. Entretanto, este caso se mostra exemplar na medida em que a opção de projeto– muito diferenciada dos demais - , compactuada entre lideranças da UMP-RJ, grupo de moradores beneficiários e assessoria técnica - foi por casas isoladas e por um tecido urbano aberto, o que traz consequências muito distintas em termos de vida cotidiana para os residentes e integração à cidade.

2.3.Para[a crítica a] o projeto Focando nas discussões suscitadas pela temática da Rede de Pesquisas Cidade e Moradia– Inserção Urbana – e no nosso estudo de caso específico, uma primeira questão a ser considerada é expansão da mancha urbana promovida pelos empreendimentos localizados na Estrada dos Palmares. Esta análise é complexa, pois como foi constatado pelas diferentes equipes que constituem a RPCM, este não é o único padrão de implantação de conjuntos do PMCMV. Há também empreendimentos implantados na periferia consolidada e até casos excepcionais melhor localizados em áreas mais centrais. No município do Rio de Janeiro, após a construção do complexo de condomínios, objeto de nossa pesquisa, uma mancha para impedir o espraiamento ainda

maior da cidade foi delimitada por resolução da Secretaria Municipal de Urbanismo, conjuntamente com Secretaria Municipal de Habitação, sendo formalizada por decreto municipal18. Isto é extremamente relevante para uma realidade em que o crescimento urbano já não demanda expansão, mas reaproveitamento de áreas infraestruturadas ociosas, conforme nos alertou Carlos Fernando de Andrade (2009). Nesse sentido, ainda que a questão da localização seja fundamental para a qualidade da moradia, é importante destacar que ela por si só não é suficiente para inserção urbana. Em outras palavras, a má localização compromete as condições de vida da população, mas a boa localização não garante a inserção, uma vez que é necessário verificar se o local está realmente articulado às

necessidades dos moradores e se sua configuração contribui ou não para a integração. Este último aspecto, na sua dimensão físico-espacial, é nosso objeto de reflexão uma vez que diz respeito diretamente à questão do desenho urbano.

18

Tratam-se, respectivamente, da Resolução Conjunta SMU/SMH nº 01 de 18 de maio de 2012 e do Decreto nº 36.960/2013, conforme detalhado pelo relatório coordenado por Cardoso e Lago (2015) e explicitado no mapa da página 390.

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2.3.1. Implantação: cidade aberta X condomínio fechado

A solução em condomínio fechado – conjunto habitacional cercado19, controlado por uma ou mais guaritas – fragmenta o tecido urbano e impõe uma série delimitações tanto para os moradores do empreendimento quanto para os do entorno. Se os condomínios, de modo geral,são problemas urbanos que esvaziam a urbanidade das cidades, quando são destinados à população de baixa renda eles passam a representar um drama cotidiano. A ideia de privatização da gestão do espaço coletivo – redução do papel do Estado –, pressuposto do condomínio fechado, tem impacto significativo sobre a população, uma vez que

o potencial redistributivo da gestão pública fica assumidamente eliminado nesta configuração. É curioso observar que isto tem repercussão invariavelmente direta na configuração urbanística, uma vez que o desenho dos condomínios tende a se voltar para o interior dos muros, não dialogando com o entorno. Como imagem referência imagética, para comportar a polifonia da multidão, a metrópole, as cidades –a despeito de serem diversificadas - inclusive quanto à morfologia urbana –, devem apresentar, entre outras características, um tecido aberto e permeável. Contudo, para não correr o risco de questionar os condomínios a partir de um

padrão encontrado apenas nas áreas privilegiadas de parte da RMRJ, fizemos um levantamento expedido do padrão urbanístico da periferia. A constatação é da configuração de extensas áreas que se apresentam como loteamento, ou seja, têm qualidade do que poderia ser chamado de cidade tradicional. Assim, tanto centro de bairros, loteamentos regulares, como também aqueles irregulares e clandestinos, e conjuntos habitacionais de diferentes épocas apresentam malha viária que não interdita nem amplia percursos; pelo menos não significativamente. Mesmo ocupações organizadas de terrenos urbanos e até favelas, não apresentam configuração tão fechada quanto a dos condomínios. No primeiro caso, muitas vezes o desenho se assemelha ao de um loteamento aberto, por haver um planejamento da ocupação. No caso das

favelas, a configuração labiríntica segue lógicas que tendem a promover o encontro das pessoas, o que não necessariamente amplia os percursos ou elimina a permeabilidade.

19

Nos referimos a todos os condomínios desta natureza, mesmo os de classe alta, não reduzindo a expressão conjunto habitacional aos espaços de moradia produzidos como de interesse social.

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a.

b.

Figura 04: Um exemplo do padrão urbanístico da periferia fluminense.a.No canto superior esquerdo, um empreendimento do PMCMV, que fragmenta significativamente o tecido urbano; b. as linhas

brancas acentuam o padrão urbanístico caracterizado por quadras e lotes. Fonte: Google Earth.

Diferentemente do condomínio, que se fecha para o exterior e apresenta uma malha interna, normalmente em raiz, a configuração da cidade em quadras, proporciona a possibilidade de diálogo do edifício com a rua e a multiplicidade de percursos e permanências. Isto significa potencializar as possibilidades de encontro.

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a. b.

Figura 05:a. Detalhe do padrão de loteamento ilustrado na figura anterior, b. Com destaque para a conexão entre os lotes e a rua. Fonte: Google Earth e CiHabE (2014).

É interessante observar que, se em nossas cidades várias barreiras, como vias

expressas e canais, não são trabalhadas para mitigar a fragmentação do tecido urbano, o condomínio fechado a assume, criando-a mesmo quando não existe.

a.

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29

b.

c.

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30

d.

Figura 06: Sequência analítica do padrão MCMV a partir dos quatro casos estudados.

a. Queimados; b. Belford Roxo; c. Triagem; d. Santa Cruz.

Fonte: Ilustração da apresentação do CiHabE realizada na reunião da RPCM em abril de 2014.

Na sequência acima, que mostra os quatro complexos de empreendimentos estudados, encontramos tanto situações em que os condomínios se constituem em barreiras desnecessárias, quanto aquelas em que o sítio inviabiliza a conexão.

Santa Cruz e Queimados são exemplos incontestáveis de que outra configuração mais permeável seria possível. As barreiras representadas pelas grades ou muros dos condomínios não precisariam existir. Mais adiante mostramos, para o caso de Santa Cruz, como outros desenhos para os conjuntos aumentaria a permeabilidade do espaço urbano, reduzindo significativamente os percursos.Vale destacar que a pouca permeabilidade existente entre os loteamentos vizinhos aos condomínios Valdariosa I, II e III, em Queimados, foi

decorrência de determinação institucional. Belford Roxo apresenta uma situação que dependerá da ocupação da área oposta, no lado leste da rua que conecta os condomínios. No lado oeste há uma planta industrial, o que representa uma barreira. No caso do Bairro Carioca, em Triagem, o próprio sítio se mostra inviável para o uso residencial por ser delimitado por várias barreiras – linha de trem, muro de fábrica e de quartel - que não teriam como ser transpostas pelo desenho.

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Cabe lembrar que esse último complexo de condomínios contíguos foi escolhido pela localização bem inserida, o que mostra que este aspecto não é suficiente para a integração física e também social. O fato de ser condomínio não impediu que o tráfico de drogas se instalasse no local e a sua proximidade com uma estação de metrô não se revelou funcional para os moradores. De acordo com a avaliação da equipe do Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ, isto pode ter ocorrido devido ao fato deste sistema de transporte não ter sido incorporado ainda pelos moradores. É também possível que o modal não seja utilizado pelo fato do preço da passagem de metrô ser mais caro do que a do ônibus. Cabe aqui alertar para a situação de fragmentação do espaço urbano que se

agrava quando os condomínios são delimitados por muros, em vez de grades ou cercas. A grade permite permeabilidade visual, o que contribui, em algum grau para o controle social, reclamado por Jacobs (2000), Lynch (1981) e outros vários autores.

Aqui há uma questão importante a ser ressaltada: a crença que o muro daria mais segurança aos moradores. A fantasia da segurança pelo muro alto aparece também nos loteamentos, onde moradores fecham a testada do lote com muros altos com a finalidade tanto de aumentar a privacidade, quanto de proteger da invasão de ladrões. Esta solução, entretanto, se mostra inócua e até inadequada, uma vez que para a segurança, o controle social tende a ser mais eficaz do que

as barreiras físicas. Elementos vazados, como grades ou cobogós, permitem que os eventos estranhos sejam percebidos na vizinhança, o que contribui para o constrangimento de eventuais ataques. No caso dos condomínios de Santa Cruz, há que se destacar tanto que furos têm sido feitos nas grades pelos próprios moradores - como maneira de evitar os longos deslocamentos impostos pela configuração dos condomínios,quanto também é solicitada aos síndicos a construção de outras guaritas.Voltaremos a essa questão mais adiante, mas a antecipamos aqui para ressaltar a complexidade da questão. Tanto a análise de soluções arquitetônico-urbanísticas realizadas no próprio

contexto carioca, quanto um exercício de reconfiguração dos próprios blocos de empreendimentos do PMCMV mostram que a criação de espaços de maior qualidade seria possível.

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Figura 07: Conjunto habitacional localizado no bairro de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de

Janeiro. A implantação "em pente" permite o diálogo do edifício com a rua e não há espaços

residuais entre os blocos. Fonte: Google Earth.

Figura 08: Complexo de condomínios do MCMV em Santa Cruz. A implantação não dialoga com

o entorno e cria vários espaços residuais. Fonte: CiHabE 2013.

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a.

b. Figura 09: a. Maquete de estudo, com disposição dos blocos dos seis condomínios, em Santa Cruz,

conforme obra executada. b.Reconfiguração da maquete de estudo para uma implantação dos blocos desenvolvida sobre a mesma área do complexo de condomínios. Os blocos passaram a dialogar com o

entorno e os espaços residuais foram substituídos por pátios com maior potencialidade para o convívio social. Fonte: CiHabE (2014).

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É interessante observar que o fato da disposição dos blocos não permitir observar o entorno não significa, sequer, alguma preocupação com outro parâmetro técnico, voltado para o conforto ambiental. Os blocos são dispostos em qualquer orientação solar, o que representa a possibilidade de maximização dos problemas térmicos e, consequentemente, de conservação de energia e sustentabilidade ambiental. No caso da Estrada dos Palmares, em Santa Cruz, observamos que grande número de blocos está voltado para o noroeste, o que representa uma orientação com grande incidência de sol, o que no clima do Rio de Janeiro significa um problema, particularmente no verão, quando as temperaturas chegam a mais de 40ºC na sombra. A amplitude térmica não é

desprezível, uma vez que pode chegar a menos de 15ºC no inverno, o que demanda estudos criteriosos para soluções arquitetônicas que pretendam atender a parâmetros mínimos de conforto.

Sem dúvida, a solução adotada pelas construtoras não é casual ou aleatória. Como mostra Shimbo (2011), o objetivo é a adoção de soluções construtivas e edilícias que possam maximizar os lucros na execução e gestão das obras. A eliminação dos riscos de rejeição dos projetos junto à Caixa, bem como estratégias para evitar problemas burocráticos decorrentes de eventuais ajustes de legalização dos terrenos também são observados. No caso de Santa Cruz, cada condomínio provavelmente foi construído numa faixa de terra que não

demandou desmembramentos ou remembramentos20. 2.3.2. Impactos no cotidiano Uma aproximação com o caso vai nos mostrar de forma mais clara o que representa para a vida dos moradores os problemas apontados nos desenhos urbanos dos condomínios do PMCMV. A crítica abaixo se refere especificamente à análise no complexo de condomínios de Santa Cruz, ainda que várias das considerações aqui traçadas possam ser extrapoladas para vários outros casos. É necessário assinalar que eles estão situados relativamente próximos do centro

do bairro de Santa Cruz, onde há uma estação de trem: a última do ramal que liga o Centro da Cidade à Zona Oeste. Entretanto o percurso é seccionado pela Av. Brasil, via de fluxo intenso de veículos. O trajeto de ônibus até à estação leva entre 34 a 45 minutos, envolvendo caminhada a pé, de 450 a 1370 metros, sem considerar os percursos internos nos condomínios. Vale destacar que estamos falando de uma distância média a pé de cinco km, estimado em 1h15min, sendo que, entretanto, representa uma caminhada árdua pelas características urbanísticas, particularmente a travessia da referida avenida, que demanda o 20

Conforme observou Jacira Saavedra, colaboradora nesta pesquisa.

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uso de passarela.

Figura 10: Trajeto médio por ônibus entre condomínios MCMV da Estrada dos Palmares até o

Centro do bairro de Santa Cruz (estação de trem). Fonte: Google Maps.

A questão do tempo de deslocamento a pé também é importantíssima, pois diz respeito diretamente às questões relacionadas à reprodução da vida, como levar crianças à escola, fazer comprar, realizar atividades de lazer. Existem parâmetros internacionais que estipulam as distâncias tidas ideais, que estabelecem tempos de caminhadas para o desempenho de atividades cotidianas. Towers (2005), por

exemplo, indica que creches e jardins comunitários podem ser acessados por percursos de cinco minutos em contextos de áreas densas. Andanças para a realização de compras de produtos de necessidades diárias não devem ultrapassar 10 minutos. Os desenhos indicados a seguir mostram que a configuração dos condomínios aumentam - desnecessariamente - os percursos, em maior ou menor grau, para parte significativa dos moradores, chegando a existir casos em que este aumento chega a um quilometro de distância, o que tende a ultrapassar 10 minutos de caminhada.

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36

a.

b.

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c.

d.

Figura 11: Diferenças de percursos entre a configuração em condomínios e a cidade aberta: em vermelho percurso imposto pelo condomínio; em azul, percurso reduzido, em configuração de

quadras abertas. A diferença de distância em a. foi de 420 metros, em b. 386 metros, em c. 587 metros e em d. 689 metros. Fonte: CiHabE (2014).

Não surpreende, portanto, a transgressão daqueles que resolvem o problema abrindo as cercas. Gehl (2013) mostra que a busca das pessoas pelos caminhos mais curtos ocorre mesmo nos contextos de países ricos e entre pessoas que

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38

supostamente são capacitadas para compreender a lógica do desenho urbano. Ele cita exemplos das Universidades de Harvard, nos EUA, e da Escola de Arquitetura, em Copenhague, Dinamarca. A inadequação dos conjuntos não pára aí. A monofuncionalidade do empreendimento em Santa Cruz gerou a necessidade, também previsível, de surgimento de estabelecimentos comerciais e de serviços no entorno dos condomínios, no afastamento entre a Estrada dos Palmares e o limite dos condomínios e, mesmo, no interior das unidades habitacionais.

a.

b.

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39

c.

d.

Figura 12: Sequência de imagens mostrando a transformação do entorno do MCMV da Estrada dos Palmares, ao longo do tempo. a. 31/08/2009; b. 07/01/2010; c. 23/12/2011 e d. 18/11/2014.

Fonte: Google Earth.

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40

Figura 13: Espaços comerciais não planejados oficialmente, surgidos em ambos os lados da Estrada dos Palmares. No lado oposto aos condomínios as construções são mais consolidadas. No mesmo lado, são

colocadas tendas que aos poucos se consolidam. Fonte: CiHabE (2013).

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Apenas um pequeno número de lojas foi finalizado após a ocupação dos conjuntos, sendo que o número não atende as necessidades da população, como também a própria localização, que fica numa das extremidades do complexo de condomínios. Todavia, mais do que isto, a questão do surgimento de estabelecimentos comerciais não está associada apenas à necessidade de consumo das famílias, mas também a geração de renda. E parte das atividades precisa ser desenvolvida na própria moradia, particularmente nos casos em que o trabalho doméstico é realizado paralelamente à atividade que gera recursos financeiros para a família. O cuidado de crianças, idosos e ou pessoas doentes se insere nessas situações.

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Figura 14: Usos comerciais surgidos no interior dos apartamentos. Fonte: CiHabE (2013).

No que diz respeito ao projeto arquitetônico, cabe ainda criticar a tipologia em blocos de apartamentos, uma vez que a área é periurbana e constituída basicamente de residências de um e dois pavimentos. Esta é, por sinal, uma queixa dos moradores, que reclamam a falta de quintal, o que foi identificado tanto pelas respostas aos questionários, quanto pelas conversas realizadas sem roteiro prévio. Espontaneamente, vários deles manifestaram a indignação pela

opção por blocos de apartamentos e não pela casa. Tal como mostrado anteriormente, na reorganização dos blocos, para um desenho mais adequado para os conjuntos, tentamos realizar um estudo que comportasse um loteamento na mesma área ocupada. Não foi possível comportar as mais de 1700 unidades, considerando lotes entre 125 e 150m 2 e uma praça de 10m2. Especulamos sobre a possibilidade de criação de lotes mais estreitos para a perspectiva de construção de sobrados em fita. Entretanto, além de nossas projeções indicarem a insuficiência de número de lotes, o impacto urbanístico sobre a área também seria inadequado, o que nos fez abandonar o estudo.

Voltando à configuração existente, cabe ressaltar as dificuldades impostas pela disposição dos blocos, que de modo geral são bastante próximos uns dos outros e não configuram espaços de convivência. No processo de realização do projeto de readequação, uma dificuldade complementar foi decorrente do fato da terraplanagem ter ocorrido em função das faixas de terreno que delimitam cada condomínio. Apesar da área não apresentar expressivas variações de níveis, a planificação projetada optou por cortes radicais entre os vários lotes e mesmo no interior deles.

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Figura 15: Desnível entre condomínios, que dificulta a integração futura entre eles.

Fonte: CiHabE (2013).

O último ponto a ser considerado é relativo à organização interna dos apartamentos. Já apontamos para o fato de que algumas famílias precisam desenvolver o trabalho remunerado em casa por razões diversas, mas principalmente pela necessidade de aliar atividades de reprodução com as de

produção. Aliado a isso, os resultados da tabulação dos dados do questionário mostraram uma grande diversidade de composições familiares, o que confirma a inadequação de um único tipo de arranjo interno: o "dois quartos". Acrescenta-se a isto o fato dos sistemas construtivos utilizados no PMCMV invariavelmente serem fechados, ou seja, não dialogam com outros sistemas. Porém, mais do que isto, não comportam alterações, o que significa que os moradores têm pouca flexibilidade para organizar seus espaços de vida de acordo com suas necessidades21.

21

A percepção da dificuldade imposta pelo desenho urbano e pelo sistema construtivo nos levou tecer as considerações desenvolvidas em Andrade, Demartini e Cruz (2014).

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Figura 16: Diversidade de famílias dos seis condomínios situados na Estrada dos Palmares, em

Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Fonte: CiHabE (2014).

A imagem seguinte trabalha as imprecisões indicadas em amarelo na figura anterior e aponta um percentual de adequação e inadequação.

Figura 17: Gráfico do percentual de adequação das famílias. Fonte: CiHabE (2014).

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Figura 18: Indicação da inflexibilidade do sistema construtivo. Fonte: CiHabE (2013).

A especialização do lar em mero espaço de reprodução da vida social é adequada ao rendimento do capital produtivo, por concentrar o trabalho na fábrica. Se versões deste modelo, com várias tipologias – um, dois, três e até mais quartos – já se mostraram não adequados para atender organizações de

vidas domésticas que não a de casal com até dois filhos, do mesmo sexo, sua redução à uma única tipologia – dois quartos – mostra-se ainda mais inadequada. Esse debate que desloca a questão habitacional da questão do déficit para a questão das necessidades habitacionais, bastante discutida nas reuniões da RPCM, requer que a discussão seja ampliada para a questão da propriedade. O direito à moradia não pode ser reduzido ao direito à propriedade individual – à casa própria22. Estase mostra um grande entrave por não permitir que o sistema funcione para atender as necessidades de moradia. Vários fatores concorrem para isto, mas modalidades como a propriedade coletiva e a locação/arrendamento apresentam potencial para facilitar o rearranjo.

Não surpreende, portanto, que a solução físico-espacial dos empreendimentos do PMCMV tenha nascido condenada ao fracasso arquitetônico-urbanístico, a despeito das inúmeras críticas e recomendações oriundas de várias pesquisas realizadas principalmente a partir dos anos 197023.

22

Um artigo elaborado por Mello (2013) desenvolve este tema. 23

Conforme apontado na proposta para a realização dessa pesquisa "Estudos sobre as intervenções promovidas pela população nas moradias e espaços públicos de conjuntoshabitacionais abordam diferentes aspectos que vão da análise quantitativa e qualitativa de alterações nas dimensões,

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padrão construtivo e tipologias das casas, ao levantamento e avaliação das transformações realizadas nas áreas livres de uso coletivo, passando pela caracterização das diversas formas de apropriação do ambiente construído. Dentre os trabalhos desenvolvidos no Brasil, como por exemplo, os de Silva (1984), Ornstein (1992); Medvedovski (1994) e Souza (1994); destacamos as pesquisas desenvolvidas por Carlos Nelson Ferreira dos Santos (1981), não apenas pelo seu caráter pioneiro na crítica à produção padronizada da habitação popular, como também pela ênfase que confere às dimensões simbólicas e não materiais da moradia. Outra característica fundamental do trabalho deste autor – cujos primeiros textos datam do final da década de 60 é o reconhecimento, a valorização e a incorporação das práticas sócio-espaciais dos moradores de assentamentos populares no processo projetual da habitação. Ver também o documentário produzido em 2009 por Julia Aguiar e Douglas Aguiar, intitulado “Dasgaragens”".

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3. Estudo Arquitetônico-Urbanístico de Readequação24 Neste item está explicitado o estudo projetivo de readequação do complexo de condomínios contíguos e agrupados, situado na Estrada dos Palmares, em Santa Cruz, Zona Oeste do Município do Rio de Janeiro. Este exercício projetual foi realizado de modo a tentar apontar alternativas para as questões observadas em campo e no resultado dos questionários aplicados. Cabe lembrar que não trabalhamos com a intenção de apresentar uma solução, ainda que possa conter indicações de como resolver alguns problemas identificados.O exercício de realização de um estudo de requalificação da área foi feito no sentido de aprofundar as análises. O enfrentamento efetivo das questões observadas passa

pela construção de políticas urbanas e habitacionais. Como já dito, o projeto nesta pesquisa é tomado como instrumento para aprofundar nossas análises.

3.1. Pressupostos do Projeto Vários trabalhos recentes, como At home in the City: an introduction to urban housing design, de Graham Towers (2005), Urban Ethic: design in the contemporary city, de Eamonn Canniffe(2006), Total housing: alternatives to urban sprawl, de Manuel Gausa25 (2010) e Cidade para as Pessoas, de Jan Gehl (2011)26,entre outros, têm atualizado um debate importante de referências dos anos 1960, 1970 e início da década de 1980, que procuravam alternativas para

os preceitos do que ficou conhecido como movimento moderno na arquitetura e urbanismo27.Essa atualização é acompanhada por um debate mais profundo sobre as questões ecológicas que recentemente assumiram outra qualidade em decorrência do agravamento da questão. Neste contexto, se fortaleceu a defesa da cidade compacta. Sustainable Compact City, de Paul Bæk Pedersen está neste

contexto. Por sua vez,Minha Casa, Nossa Cidade: innovating mass housing for social change in Brazil, de Marc Angélil e Rainer Hehl (2014), vai no mesmo sentido de reconhecimento da importância da lógica do que pode ser chamado como arquitetura autônoma, analisando-a a partir da realidade brasileira.

Esses autores não só reavaliaram o valor da configuração da cidade tradicional -

24

A realização dos estudos que configuraram a proposta de readequação se deu pela realização de duas oficinas de projetos e por reuniões com pesquisadores e bolsistas. Este e outros procedimentos metodológicos da pesquisa estão expostos de forma mais aprofundada na parte 2 deste relatório. 25

Referência indicada por Denise Morado, coordenadora da equipe da UFMG. 26

O trabalho original é de 2010. 27

Ver, por exemplo, Santos (1981, 1985, 1988); Lynch (1981); Alexander (2013 [1977]) e Habraken (1998). Sobre arquitetos pioneiros que colocaram em prática uma arquitetura que dialoga com os moradores vale ver LucienKroll. Ver também a produção habitacional do SAAL em Portugal, coordenada por Nuno Portas.

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que compreende várias morfologias e tempos históricos –, como também destacaram a dimensão viva dos espaços urbanos e arquitetônicos, tendo alguns realizado experiências concretas de intervenção.

Algumas premissas contidas nesses trabalhos serviram de referência para a realização de projetos de moradia coletiva, particularmente a popular, sendo que nos valemos de uma apropriação difusa. Ou seja, não tomamos seus parâmetros com rigidez, adequando-os para a realidade em questão, particularmente para a dificuldade de se trabalhar um projeto que não apresenta requisitos mínimos de qualidade urbanística e arquitetônica. Consideramos,sem dúvida, a observação das práticas socioespaciais dos

moradores, que procuram criar ou adequar seus espaços de moradia. Os vestígios de modificação dos espaços físicos dos empreendimentos de Santa Cruz, mostrados no item anterior, indicam uma tendência de incremento.Em dois anos de visitas ao local, fomos observando o crescimento das modificações,

que ameaçam chegar ao nível de complexidade observada em conjuntos habitacionais construídos em outras épocas. Conforme nos mostram Andrade e Leitão (2006), parece não haver limites para a realização de transformações, o que é confirmado por ampliações externas realizadas em pavimentos superiores de blocos de apartamentos, em diferentes conjuntos habitacionais do Rio de Janeiro.

Figura 19: Modificações realizadas por moradores em conjuntos habitacionais do IAPI e do BNH,

localizados no bairro de Padre Miguel, situado na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Acervo: CiHabE (2000).

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De fato, a readequação autogerida dos espaços de moradia nos empreendimentos realizados através da implementação de políticas públicas para população de baixa renda é uma realidade no Brasil e a observação dos contextos onde conjuntos habitacionais foram bastante modificados pelos moradores também foi importante para definir nossas diretrizes de projeto.

3.2. Método: parte 2 As propostas de readequação arquitetônico-urbanística dos empreendimentos MCMV da Estrada dos Palmares, em Santa Cruz, foram desenvolvidas segundo

uma operacionalização que envolveu a realização de duas oficinas de projeto, com a participação de alunos de graduação, na maioria, e, posteriormente, trabalho cotidiano com bolsistas de iniciação científica e extensão. Nas três dinâmicas, a orientação foi a de reconhecimento das práticas de reorganização do espaço realizadas por moradores. Foi ressaltado que as propostas não poderiam alterar significativamente as características da implantação dos condomínios, uma vez que se tratava de uma readequação. Ainda que tendo consciência de ser um projeto fictício, a intenção era que este tentasse se aproximar tanto quanto possível da realidade. A primeira oficina de projeto nos proporcionou verificar a dimensão da

dificuldade de se adequar o empreendimento (Andrade, Demartini e Cruz, 2014). Por termos contado com a participação do consultor da pesquisa especializado na questão estrutural, a opção foi de dar o foco dos estudos desenvolvidos na readequação dos blocos, especialmente para dar flexibilidade aos usos dos compartimentos e permitir a adequação à dimensão e arranjos das famílias. Apesar da dificuldade, a criatividade dos alunos apontou para alternativas que equacionam a questão da flexibilidade dos espaços. Ainda assim, mesmo a alternativa mais viável em termos de custos, se revelou complexa para ser implantada de forma autônoma pelos moradores.

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Figura 20: Solução mais onerosa, por criar estrutura independente, de modo a transformar as paredes

existentes de alvenaria autoportante para alvenaria de vedação. Para melhorar as condições de acessibilidade foram instalados elevadores, sendo que, de modo a não aumentar excessivamente o valor

dos custos condominiais, três blocos foram conectados por uma passarela, de modo que todos seus moradores pudessem ter acesso ao elevador. Fonte: CiHabE (2013).

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51

a.

b.

c.

d. Figura 21: Solução que considerou a possibilidade da estrutura ser mista, ou seja, autoportante com

reforço de armação na junção das paredes; possibilidade reconhecida como pouco provável. a. planta original do bloco; b. alterações propostas; c. solução em planta; d. fachada principal do bloco. Fonte:

CiHabE (2013).

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Figura 22: Solução que criou estrutura independente externa, mantendo a estrutura autoportante. Por

meio de passarela externa foi possível alterar as configurações dos apartamentos, de modo a ajustá-los ao perfil das famílias. Fonte: CiHabE (2013).

A segunda oficina foi focada na readequação do desenho urbano dos condomínios, no sentido de torná-los mais articulados com o entorno e em proposições para integrá-lo melhor ao bairro de Santa Cruz. Os resultados foram

mais frustrantes em termos de propostas objetivas. Entretanto, serviu para aprofundar a crítica à formação em arquitetura e urbanismo que, mesmo hoje, mais de 40 anos depois de decretado o fim do modernismo, ainda é difundida a ideia de que o arquiteto tem o poder de organizar a vida das pessoas, em termos de práticas espaciais cotidianas. Assim, nos chamou atenção o fato de que vários grupos definiram setores rígidos para o desenvolvimento das atividades do dia-a-dia.

Partimos então para empreender esforços no sentido da apresentação de estudos mais pertinentes de readequação urbanística. Em reuniões com os bolsistas de iniciação científica e extensão que integraram nossa equipe, discutimos propostas e optamos por uma solução bastante tradicional em termos de concepção de cidade, que foi a constituição de quadras com edifícios delimitando seu perímetro. Em seguida apresentamos as justificativas para as proposições desenvolvidas.

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3.3. Estudo Projetivo As principais questões a serem enfrentadas eram: a fragmentação do tecido urbano, promovida pelo desenho dos condomínios fechados - o que implica o aumento significativo de distâncias -; a necessidade de espaços para o desenvolvimento de atividades comerciais e de serviços - tanto no espaço urbano quanto no interior das moradias - como já ressaltado, para algumas famílias é imprescindível o trabalho remunerado dentro de casa -; a inadequação de parte significativa das unidades habitacionais às famílias, tanto pela sua composição e número de integrantes. Também consideramos a demanda dos

moradores por uma praça e pela construção de um centro cultural, que abrigasse espaços de capacitação, de realização de atividades culturais e de lazer, além das sedes da associação de síndicos dos condomínios e de moradores do bairro que eles identificam como Jesuítas28. Não incluímos uma escola de ensino fundamental no estudo projetivo, pois envolveria um levantamento detalhado para avaliar a demanda efetiva do local e dimensionar o porte, o que fugia do escopo da proposta desta pesquisa. Efetivamente, há a demanda, pois parte das crianças residentes nos empreendimentos MCMV de Santa Cruz estudados, vai para escola num ônibus da prefeitura municipal. As recomendações técnicas apontam para a necessidade de localização deste tipo de equipamento a até 20 minutos a pé

(Towers,2005). Para fins de maior detalhamento do estudo projetivo, dividimos as intervenções em dois conjuntos de escalas: a da rua e dos empreendimentos, e a dos blocos e das unidades habitacionais. 3.3.1. Escala da rua + empreendimentos Partindo das considerações mencionadas no subitem anterior, reorganizamos o espaço a partir da abertura dos condomínios para o entorno - reconhecendo a

28

Não encontramos referências a este bairro no cadastro da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro. A área onde está localizado o complexo de condomínios é parte do bairro de Santa Cruz. Ver: http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/arquivos/1314_bairros%20-%202014.JPG. Certamente a identificação da área como um bairro se dá por esta estar apartada do centro de bairro, formando um aglomerado com certa independência. Por sua vez, o nome atribuído é decorrente da existência de uma ponte histórica nas proximidades (3km), construída pelos jesuítas no período colonial, que atualmente não cumpre mais sua função, sendo um monumento tombado. Não empreendemos uma pesquisa aprofundada sobre o bairro, uma vez que nosso foco era na discussão morfológica que apresenta caráter mais geral entre os empreendimentos tipo do PMCMV. Para uma panorâmica sobre o bairro deSanta Cruz, ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Santa_Cruz_%28bairro_do_Rio_de_Janeiro%29

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demanda e a própria prática dos moradores. Conforme já destacado, encontramos furos em diferentes pontos das cercas que limitam os condomínios, realizados por alguns moradores - e usados por vários - para tornar as distâncias mais curtas. Outros moradores demandam aos síndicos a construção de guaritas nesses pontos, como nos foi relatado. Isto, entretanto é reconhecido pelos síndicos como elementos a onerar o condomínio29. A questão gera conflitos, uma vez que a abertura nas cercas, formadas por alambrados, representa o descontrole do espaço, fomentando o desejo de substituição das grades por muros, na ilusão que o problema seria resolvido30. Assim, o reconhecimento dos condomínios como barreiras que representam o aumento de percursos para os moradores, foi fundamental na elaboração da

proposta de readequação da configuração urbana dos conjuntos. Dividimos a área do condomínio em quadras, tornando o desenho do grupamento residencial mais permeável. Para tal, tomamos como referência o

tamanho de quadra padrão de 100 x 100 metros, que encontramos em diferentes pontos do município do Rio de Janeiro, com variações de 50 a 200m. A proposição pela configuração perimetral foi relacionada à tendência de ocupação dos afastamentos dos condomínios com espaços comerciais e de serviços. Esta vocação, observada no local ainda com materiais provisórios, pode ser aliada a imóveis residenciais térreos, mais adequados para pessoas com

necessidades especiais. De fato, a quadra fechada no seu perímetro por edificações se abrem potencialmente para a constituição de espaços comerciais e de serviços, demanda de abastecimento da população e geração de renda. Como destacado no item 2, nas nossas visitas de campo observamos que a dinâmica local já impunha maneiras alternativas, imprevistas e por vezes precárias de suprir necessidades dos moradores, particularmente com o surgimento de estabelecimentos comerciais e de serviços no lado oposto da rua onde se encontram os empreendimentos, além da existência de uma linha não-oficial de Kombis para o transporte da população.

Cabe marcar a importância do edifício que configura, ou dialoga, com o espaço urbano, formando aquilo que Gausa (2010) chama de edifício-paisagem, que potencializa os “olhos da rua” (Jacobs, 2011), ou seja, a possibilidade de controle

29

Em estudo realizado por Alcântara (2014) num condomínio do PMCMV no município de Seropédica, a inviabilidade de viver em condomínio, por várias razões, resultou na queda das grades e no abandono da guarita. 30

O trabalho final de graduação de Evelyn Correa (2014), intitulado "Mais que uma casa, uma vida.

Recomposição Urbana de Senador Camará" identificou que mesmo os muros são perfurados por moradores, quando isto representa a redução de distâncias. No caso, os condomínios foram projetados com as entradas em pontos que aumentam a distância para a estação de trem.

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dos eventos urbanos na perspectiva de promover o conforto e a segurança daqueles que vivenciam os espaços públicos31. Nesse sentido, além da falta de configuração da paisagem urbana e integração com o tecido urbano no entorno, os condomínios do MCMV apresentam uma quantidade excessiva de espaços residuais, o que dificulta o seu uso para a convivência. Mostramos que outra organização dos blocos poderia melhorar a relação dos edifícios com as ruas e potencializar os espaços de convivência. É importante lembrar que, entretanto, nos propusemos realizar um estudo de readequação que tivesse alguma ancoragem com a realidade, a despeito de não ser uma proposta efetiva de intervenção. Desse modo, procuramos manter o maior número dos blocos existentes, viabilizando a mesma quantidade de

unidades habitacionais. De qualquer modo, foi necessária a seguinte modificação: 12 blocos de apartamento– 192 unidades habitacionais - e 11 blocos de unidades para portadores de necessidades especiais (PNE)– 22 unidades habitacionais –, precisariam ser demolidos, sendo essas realocadas nas

edificações propostas para os limites das quadras. Vale ressaltar que a edificação perimetral comporta um número expressivo de possibilidades para a realocação de moradias adequadas para pessoas portadoras de necessidades especiais. Assim, resumidamente, a proposta de readequação dos empreendimentos, em sua dimensão urbanística, se focou:

- na necessidade de dar alguma permeabilidade ao complexo de

condomínios, reduzindo distâncias e, - em ampliar o diálogo entre os conjuntos e o espaço urbano, proporcionando também espaços comerciais e de serviços voltados para as ruas.

31

Aqui nos referimos também a Kevin Lynch (1981).

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a.

b.

Figura 23: Estudo de readequação dos condomínios. a. destacado no entorno. b. aproximado: os

blocos em vermelho são os existentes. Os blocos em azul são os propostos. Fonte CiHabE

(2014).

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3.3.2. Escala dos blocos + unidades habitacionais Nesta composição de escalas, o foco foi no perfil e nas necessidades das famílias. Além das observações de campo, trabalhamos com as respostas aos questionários realizados em parceria com o Observatório das Metrópoles/IPPUR-UFRJ. Preliminarmente, já era possível prever a inadequação da tipologia “sala, dois quartos”à configuração das famílias, que se confirmou bastante diversificada pela aplicação dos questionários, como pode ser visto no item 2. Vale ressaltar que este é um retrato do momento que o questionário foi

aplicado, em janeiro de 2014. Como já ressaltamos, a dinâmica das necessidades é muito intensa e é bastante possível que, se aplicássemos os questionários meses depois, encontraríamos variações nos números. Porém, pelos resultados da aplicação dos questionários realizados em outros complexos de condomínios

da RMRJ e nas outras Regiões Metropolitanas estudadas pela Rede Cidade e Moradia – RCM -, podemos afirmar que a ordem de grandeza da inadequação não se alteraria muito. Por sua vez, como apontado, a demanda dos moradores por espaços comerciais não só promoveu o surgimento de atividades desta natureza no entorno do empreendimento como também, em compartimentos das moradias. Não é

demais repetir que, muitas vezes, o trabalho realizado no interior da moradia é de extrema importância para o morador para que se possa realizar concomitantemente a atividade remunerada e de reprodução da vida, como o cuidado com as crianças, doentes e idosos32. Cabe acrescentar também que determinadas atividades demandam o armazenamento do produto do trabalho no interior da casa, por ser um bem de grande valor para o morador33. Especialmente nos condomínios ocupados pela população removida de favelas e assentamentos precários de outras partes da cidade, a presença de espaços comerciais ou de serviços mesclados às moradias já se apresenta relativamente expressiva.

32

Este aspecto nos foi ressaltado, em contexto que não o desta pesquisa, por Isabel Tostes, arquiteta da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. 33

Em conversa sobre ocupações de edifícios ociosos, Douglas Aguiar, professor da UFRGS, ressaltou a inadequação da imposição de uma tipologia estritamente residencial especialmente para as camadas populares, particularmente se referindo aos catadores de material reciclável, que tem no produto de seu trabalho um valioso bem que não pode ser armazenado em qualquer lugar.

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Figura 24: Mapa de uso comercial ou de serviços no interior dos apartamentos. A identificação foi realizada sobre as respostas aos questionários , de modo que traduz apenas

o uso comercial neles identificados. Fonte: CiHabE (2014).

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Considerando o perfil e as necessidades das famílias, partimos para a readequação dos blocos de apartamentos do conjunto. Como já dito, os blocos dos condomínios da Estrada dos Palmares são em alvenaria autoportante, como em todos os outros empreendimentos para o PMCMV da Construtora Emccamp. Por isso, os estudos para dar maior flexibilidade interna às unidades habitacionais ficaram extremamente limitados, ainda que, tenha sido possível encontrar uma solução.

O caminho estudado por um dos grupos que participaram da primeira oficina de projeto, realizada no contexto desta pesquisa, consistiu na incorporação de estruturas metálicas independentes da estrutura autoportante, que sustentariam passarelas externas, de modo a estabelecer conexões externas

entre os cômodos34.

a.

34

Os estudos desenvolvidos nesta escala foram concebidos na primeira oficina de projeto. Posteriormente foram trabalhados pela equipe de bolsistas de iniciação científica e extensão, sob coordenação dos pesquisadores Juliana Demartini e Rogério Cruz.

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b.

Figura 25: a. Planta padrão dos blocos. b.Maquete eletrônica do bloco padrão. Fonte CiHabE (2013).

a.

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61

b.

Figura 26: a. Primeira versão do estudo de planta com circulações externas para conectar cômodos, dando flexibilidade aos apartamentos de modo a procurar atender a diversidade de perfis de famílias. b.Maquete eletrônica, com incorporação de terraço coletivo para redução do desconforto térmico nos apartamentos

do 4º pavimento e incorporação de sistema de coleta de água da chuva. Fonte CiHabE (2013).

O trabalho de amadurecimento das possibilidades da articulação da passarela nos blocos resultou na redução do seu comprimento. Além disto, foram feitas especulações sobre como deveriam ser as intervenções. Uma vez que em torno de 40% das unidades se mostraram adequadas ao perfil das famílias, consideramos, como uma possibilidade, que o mesmo percentual de blocos deveria ser mantido intacto, enquanto as intervenções com as passarelas se dariam nos outros 60% (aproximadamente). Entretanto, isto implicaria a necessidade de concentração nos mesmos das famílias de perfil adequado ao tipo "dois quartos", o que não corresponde à realidade traduzida pelos

questionários. A outra perspectiva foi a de rearranjo dos espaços de moradia de acordo com a própria localização das famílias, o que é mais condizente com a premissa de aproximação com a realidade.

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Figura 27: Esquema dos estudos de redução das passarelas. Fonte CiHabe (2014)

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Figura 28: Perspectivas de uma das versões do estudo projetivo.

As propostas nessa composição de escalas procuraram ampliar a flexibilidade dos apartamentos visando ampliar as possibilidades de adequação aos diferentes arranjos familiares e também às necessidades de realização de

trabalho em casa. Num dos casos, mais objetivamente foram trabalhadas questões relacionadas ao conforto térmico e conservação de energia, sendo que, de modo geral, acabamos tratando estes aspectos de forma secundária.

3.4. Considerações sobre um projeto [in]viável Como temos afirmado, o objetivo de realização de um exercício projetual que procurasse enfrentar questões mais evidentes identificadas num dos

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empreendimentos do PMCMV voltou-se para o aprofundamento da análise e não tinha a intenção de apontar uma solução efetiva. A realização das proposições urbanísticas e arquitetônicas suscitaram algumas reflexões diretamente relacionadas ao projeto e além dele. Em relação ao projeto urbano, se a costura perimetral das quadras contribui tanto para criar condições para a realização de atividades comerciais, quanto para uma melhoria da configuração do espaço público, a necessidade de manutenção de um maior número de blocos não ajudou a qualidade interna das quadras. A proximidade entre os blocos é grande, o que reduz a potencialidade de uso dos espaços entre eles. A efetiva ampliação da qualidade do desenho urbano dependeria de uma intervenção maior no espaço, o que significaria a

demolição de um número maior de blocos. A solução dada aos blocos para aumentar a flexibilidade dos apartamentos tampouco pode ser considerada efetivamente bem sucedida, pois as circulações

externas podem representar perda de privacidade para os moradores. Além disto, a flexibilidade conseguida não permite a ampliação dos cômodos, o que só seria possível com a adoção da solução de alteração mais radical dos blocos, que adotou uma estrutura totalmente independente para os blocos, transformando as paredes autoportantes em paredes de vedação. Esta solução foi a mais onerosa e por isto descartada inicialmente.

De todo modo, no desenvolvimento das proposições projetivas de readequação do MCMV da Estrada dos Palmares, em Santa Cruz, ficaram mais evidenciados os problemas apontados anteriormente: o aumento das distâncias pela configuração dos condomínios e a falta de flexibilidade do sistema construtivo. Há também o problema do desenho e projeto dos espaços livres e a escassez de equipamentos urbanos essenciais, como escola e creche, além da demanda por locais e programas para a realização de atividades culturais, de socialização, de lazer e de formação profissional, o que ficou evidente na fala dos moradores e na solicitação de uma das lideranças do local, síndico num dos condomínios,pela realização de um projeto de centro cultural/associação de moradores, que foi realizado nesta etapa de estudo projetivo.

Por fim, os custos diretos de uma readequação se mostraram comparáveis e até superam os custos da construção de um dos condomínios - na ordem de 30 milhões de Reais. As maiores despesas são as relativas à construção das novas unidades habitacionais e espaços comerciais na periferia das quadras. Também não foram desprezíveis os custos de implementação de passarelas, que seria por volta de dois milhões de Reais.Este dimensionamento, além das próprias imprecisões inevitáveis na construção de um orçamento baseado num estudo projetivo, apresenta aquelas decorrentes da necessidade de realizar a

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readequação com o espaço habitado e nos tempos demandados pelos moradores35. É fundamental, ainda, levar em conta custos menos visíveis e até os invisíveis. É preciso dimensionar os problemas causados ao meio ambiente natural e, também, ao construído, como as consequências da inadequação para a saúde física e mental das pessoas, das famílias e dos grupos sociais, principalmente os mais vulneráveis. Em outras palavras, sem considerar outros problemas, como o da localização e do transporte, para tornar adequado o espaço habitacional inadequadamente projetado, o morador e a sociedade arcam com um custo muito alto que vai ser pago de alguma maneira. Em suma, ao qualificar e quantificar a incompatibilidade entre o projeto arquitetônico-urbanístico e o

perfil e as necessidades das famílias, a pesquisa ratifica a inconsistência, do ponto de vista destas disciplinas, da maioria das realizações do PMCMV.

35

Como os estudos desenvolvidos não tinham um detalhamento que permitisse chegar a um orçamento mais preciso, foi necessário trabalhar com várias estimativas, o que ampliou a margem de imprecisão. Também não foram desenvolvidos projetos de drenagem e saneamento, pelas suas particularidades. Além disto, como a perspectiva era de que a realização de um trabalho desta natureza fosse desenvolvido num contexto de assessoria técnica pública, não foi considerado o BDI.

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4. Esboço de uma Proposta Não há dúvidas quanto à importância do porte e da escala de abrangência do Programa Minha Casa Minha Vida. A existência de subsídios significativos para atender a população das faixas mais baixas de renda é uma novidade na política habitacional brasileira. Outros aspectos do programa podem ser considerados bem sucedidos, dentre os quais se destaca a satisfação dos moradores –a pesquisa da Rede de Pesquisas Cidade e Moradia– RPCM, neste aspecto, ratificou pesquisa anterior realizada pelo IPEA, também encomendada pela Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades. Isto é um fato que não pode ser desprezado, ainda que nossa rede ressalte a importância de

se trabalhar esta resposta associada a outras, o que relativiza a afirmação. É significativo também considerar que a casa própria é um valor quase inquestionável na sociedade brasileira, particularmente entre a população remediada e mais pobre, por representar uma espécie de garantia de segurança em períodos de instabilidade econômica da família ou do País. Não por acaso, ao tomar conhecimento da política de locação habitacional na Itália, o síndico de um dos condomínios concluiu por uma espécie de superioridade brasileira quanto a esta questão: “estamos melhor que lá, não?”, perguntou ele, revelando desconfiança de políticas de locação social36. Seja como for, se em alguns aspectos o MCMV atingiu seus objetivos, o agravamento de problemas urbanos e urbanísticos que gerou é reconhecido

pelo Ministério das Cidades. O convênio que resultou no Edital MCTI/CNPq/MCIDADES Nº 11/2012, do qual esta pesquisa faz parte, foi realizado justamente no sentido de fomentar pesquisas que analisassem, avaliassem e apresentassem proposições para a superação dos impactos para as cidades causados pelo programa. Em termos resumidos, reconhecemos a necessidade de resgate da política habitacional multisetorial, integrada à formulação de uma política urbana que busque meios efetivos de redistribuição das benfeitorias urbanas. No que diz respeito à nossa pesquisa específica que, como já destacado, está focada em questões arquitetônico-urbanísticas, as conclusões ratificam a necessidade de se repensar a prática do projeto habitacional, particularmente para a

população de baixa renda. Seu entendimento como um produto, normalmente considerado acabado, não atende às necessidades dos moradores. Isto significa a importância de se reformular estruturalmente a atual política, que se sustenta expressivamente na provisão de unidades.

36

Um casal de jornalistas italianos morou durante algum tempo no Condomínio Coimbra para realizar uma reportagem.

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No que tange a essas disciplinas, as realizações do PMCMV, tal como outros programas, particularmente o da fase inicial do Banco Nacional de Habitação – BNH –, possui pouquíssima diversidade funcional, bem como idealiza o perfil e a organização das famílias, considerando-a simplesmente como a nuclear – pai, mãe e um ou dois filhos. Entretanto, mais do que isto, representam também um retrocesso por estar alheia à implantação de uma tipologia habitacional que resulta em uma série de restrições aos moradores - entre as quais se destacam aquelas relacionadas à realização dos percursos cotidianos - bem como para a concretização de obras necessárias à adaptação da moradia ao perfil das famílias e às suas necessidades cotidianas. Isto é decorrente de vários fatores. Dentre eles destacamos:

a. a configuração em condomínio, que aumenta significativamente as distâncias dos percursos cotidianos dos moradores; b. a redução das tipologias em unidades de 2 quartos, limitando a possibilidade de organização das famílias reais;

c. o entendimento que a moradia é um espaço especializado, sendo sua função reduzida à mero espaço de repouso e atividades domésticas, e d. a falta de flexibilidade dos sistemas construtivos utilizados, que inviabiliza reformas para adequação às necessidades.

Diferentemente do idealizado na concepção de moradia do MCMV, a organização da vida familiar tem necessidades objetivas, além de diversidade e

potencialidade imprevisíveis. A dinâmica das favelas e periferias mostra isto e, salvo raras exceções, os empreendimentos do PMCMV já apontam para modificações externas, em maior escala, e internas, ainda relativamente tímidas. A dinâmica da transformação do espaço pelos moradores, por um lado, apresenta qualidades, como a de levar, pelo menos parcialmente, urbanidade para um local incipiente que surge como um depósito de famílias pobres. Por outro lado, é preocupante. Várias pesquisas já mostraram qualidades e problemas da ação popular para a transformação de conjuntos habitacionais37, mas o caso dos empreendimentos do PMCMV apresenta um agravante pelo sistema construtivo rígido. Em alguns anos, as determinações por não alteração podem ser perdidas, o que implica grande risco de desabamentos. Dada a escala da produção do MCMV, é urgente que a cultura

de assessoria técnica seja construída entre os moradores38. Efetivamente, é necessário valorizar a dimensão do desenho urbano e arquitetônico para a vida das pessoas. Não a partir de modelos criados em outros contextos, mas a partir de trocas tecnico-culturais que traduzam as necessidades da população.

37

Ver, por exemplo, Andrade e Leitão (2006). 38

Como observou Rogério Cruz, um dos pesquisadores da equipe do CiHabE/PROURB/UFRJ.

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Desse modo, a principal proposição resultante desta pesquisa é a de formulação de uma política de readequação de conjuntos do PMCMV, sustentada na ação de assessoria técnica continuada para orientar as transformações no espaço urbano e das unidades habitacionais demandadas pelos moradores.

4.1. Assessoria Técnica Continuada A ideia de assessoria técnica continuada (ATC) vai além do que determina a Lei Nº 11.888, de24 de dezembro de 2008, conhecida como Lei de Assistência

Técnica. Além da diferença conceitual entre os termos assessoria - que pressupõe um equilíbrio entre quem assessora e quem é assessorado – e assistência – que apresenta um caráter paternalista e/ou de superioridade da técnica – o serviço aqui proposto é constituído por uma rede de profissionais mais ampla do que o normalmente considerado para a AT, ou seja, arquitetos, engenheiros, técnicos sociais (assistentes sociais, sociólogos e psicólogos) e advogados. Na nossa proposta, os nós da rede comportariam outros profissionais como médicos, pedagogos, professores e tantos outros identificados como importantes em cada contexto. Mas, especialmente,a ATC seria também integrada por trabalhadores da construção civil (pedreiros, instaladores, bombeiros hidráulicos etc.) e outras atividades que possam ser identificadas como relevantes para a (re)construção do espaço. Participaria

desta equipe um profissional especialmente capacitado para difundir e implementar ações de assessoria técnica em suas comunidades. Antes de partir para o detalhamento desta proposta, precisamos fazer algumas considerações. A assessoria técnica continuada não deve ser uma exclusividade do PMCMV. É um serviço que deve atender a população que não acessa comumente os serviços dos profissionais liberais que atuam nas atividades relacionadas à produção e reforma da moradia. Por sua vez, há que se projetar empreendimentos que tenham compatibilidade urbanística com o perfil e necessidades das famílias. Não se trata de continuar empreendendo projetos inadequados como os típicos do PMCMV, para serem

consertados pelas ATC. Tanto o espaço urbano como as moradias precisam ser pensados e construídos de modo a atender as necessidades habitacionais da população. Tanto o desenho urbano como as edificações precisam ter flexibilidade para se adequarem aos diferentes perfis e demandas. A pesquisa integrante da Rede Cidade e Moradia, desenvolvida pelo LabCidade da FAU–USP, sob a coordenação de Rolnik (2014), define parâmetros urbanísticos de inserção urbana, que precisam ser considerados nos projetos para que haja um mínimo de habitabilidade. Contudo, a assessoria técnica continuada é importante mesmo quando os projetos apresentam qualidade arquitetônico-

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urbanística, pois é necessário trabalhar com as próprias modificações que inevitavelmente serão realizadas. Essa tão necessária política que produza paisagens urbanas social e ambientalmente mais adequadas é, todavia, uma luta que não terá conquistas significativas em curto prazo. Consequentemente, o padrão dos empreendimentos produzidos até hoje pelo PMCMV seguirá gerando (anti)cidades, com algumas pequenas variações entre as versões. Por isso, o desenho da proposta de implementação de assessoria técnica continuada, apresentado a seguir, é focado na requalificação dos empreendimentos, ainda que possa ser aplicado a outros contextos, desde que

observadas as especificidades das realidades dos locais. Em outras palavras, a proposta abaixo não é uma fórmula. Ela apresenta princípios que podem servir para vários contextos, que de todo modo precisam ser avaliados quanto à pertinência de aplicação tanto no que diz respeito às diversidades regionais –

geográficas, históricas, socioeconômicas e políticas – quanto às diversidades de tipos de espaços de vida – conjuntos habitacionais, favelas, loteamentos, cortiços, ocupações etc.

4.1.1. Estratégia de implementação

A possibilidade de se ter disponível uma equipe técnica que possa atuar conjuntamente com e pelos próprios moradores nas ações de readequação dos espaços urbanos e de moradia é uma das premissas da proposta aqui concebida e, por isto, a caracterizamos como continuada. A vida é dinâmica e os espaços habitacionais periféricos a revela, particularmente, na sua expressão espacial. Jacques (2002), reconhecendo isto, ressaltou que o movimento próprio dos espaços físicos das favelas deveria ser tombado, de modo que a ideia corrente de preservação seria subvertida. Esta realidade requer uma forma de conceber projetos mais próxima do cotidiano dos moradores, sendo pouco adequada a sequência especializada que separa de maneira estanque, momentos de concepção do espaço e de execução da obra.

Outra premissa da proposta é que a ação de requalificação seja também uma oportunidade de formação e capacitação dos moradores. Neste contexto , é importante que, cada vez mais, seja incorporado nas práxis a transversalidade dos saberes, incluído aí os populares. A assessoria técnica como possibilidade de iniciação e aperfeiçoamento profissional representa um potencial para geração de emprego e renda e, também, é uma oportunidade para a ampliação de valores de urbanidade39.

39

Para a discussão do que é urbanidade ver, entre outros Aguiar e Netto (2012).

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Assim, a ideia é que a ATC atue na facilitação da solução de problemas decorrentes da necessidade de readequação do espaço, na capacitação dos moradores para uma melhor atuação como diferentes profissionais da construção civil e na (re)construção de valores que promovam a relação democrática com e do espaço urbano. O entendimento é que o espaço físico pode ou não estimular práticas democráticas, sem, contudo, ser determinante delas. Para que isto ocorra,é necessário a incorporação de valores das práticas democráticas – liberdade, igualdade e, principalmente, fraternidade – nas dinâmicas socioespaciais. A conceitualização que está na base desta proposta pressupõe a formação

libertadora, nos moldes de Paulo Freire e outros pensadores da educação 40, o que sustenta a ideia de que o trabalho técnico não deve ser feito para a população pobre e sim com ela. A aparente semelhança entre as duas preposições faz uma grande diferença: num caso se provoca a passividade,

noutro se respeita as subjetividades e se estimula a capacidade de pensar e agir daqueles que estão na base da pirâmide social. Não há como não assumir o projeto político inerente à ação de assessoria técnica continuada, que vai no sentido da superação da condição subalterna das classes populares.

Embora um pressuposto desse tipo de ação seja a construção conjunta, entre moradores e assessoria, das ações que devem ser empreendidas, ensaiamos uma proposta de experiência piloto de ATC baseados na reivindicação dos moradores dos condomínios da Estrada dos Palmares por espaços de formação e capacitação profissional e cultural. Experiências piloto de Assessoria Técnica Continuada - ATC

A implementação da política de ATC pode ser iniciada pela implantação de experiências piloto, realizadas com apoio de universidades e outras instituições, como movimentos sociais e escritórios de assessoria técnica. A criação de redes que articulem grupos de diferentes regiões e profissionais

diversos - como já citado anteriormente, poderia ser estimulada por um edital que envolva vários ministérios, como o PROEXT, sendo que neste caso seu objeto seria limitado à construção das experiências de ATCs.

O passo seguinte seria a criação de curso(s) orientado(s) para três perfis de aluno, que podem,eventualmente, se confundir: - moradores; - técnicos de prefeituras, e 40

Ver Gadotti (1993).

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- (jovens) profissionais que atuam territorialmente em áreas de relevância para a readequação dos conjuntos do PMCMV. Neste último caso, estaria(m) voltado(s) ou para uma formação que os tornassem qualificados para uma avaliação da necessidade de acionamento da assessoria técnica, ou para o seu aperfeiçoamento profissional daqueles que já tenham alguma qualificação, como bombeiros, eletricistas etc. O curso deve ter caráter teórico-prático e a imprescindível articulação e diálogo entre os três perfis de aluno. A intenção é de criação de conteúdos que se entrecruzam para a promoção de trocas constantes entre os diferentes atores em processo de capacitação. Outra característica do curso são seus tempos, que não necessariamente precisarão se dar de modo sincronizado. Há

que se aprofundar o modo de operacionalização desta flexibilidade, mas a concepção é que sejam respeitadas as histórias pessoais e coletivas, bem como desejos e motivações. Deste modo, algumas pessoas ou grupos podem demandar maior carga horária para a realização do curso que outras.

Para a capacitação de moradores, pensamos inicialmente em duas linhas. Uma seria a de formação técnico-universitária para pessoas com potencial de liderança de modo a ser o principal nó articulador da assessoria técnica. Outra linha seria mais focada no desenvolvimento das habilidades e trocas de experiências práticas no âmbito da construção civil. Há a possibilidade de desdobramento desta em três vertentes:

- uma relacionada aos aspectos mais artesanais da construção - como o assentamento de alvenaria de tijolos, pintura, assentamento de azulejos e cerâmicas etc.-, e - outra voltada para a produção de componentes, particularmente a fabricação de esquadrias de ferro, alumínio e outros materiais. Aqui, cabe ressaltar o papel que um bom desenho de esquadria desempenha tanto na promoção do conforto ambiental, como na expressão estética da paisagem construída. -e a terceira voltada ao entendimento da imprescindível necessidade de adequação de instalações sanitárias, elétricas entre outras.

O foco é a formação de cooperativas tanto de moradia, como de produção, como defendem os movimentos sociais41. Outro perfil de aluno seria o técnico das prefeituras que lidam com a questão habitacional. A prioridade dada à sua inclusão no curso volta-se à sua capacitação42. O foco seria no potencial facilitador de seu papel. Além do

41

A proposta é inspirada nas cooperativas habitacionais e de trabalho uruguaias. 42

Vale lembrar que não está sendo proposto um curso específico para cada perfil de aluno, mas sim uma obrigatória mistura dos perfis na formação proposta.

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aperfeiçoamento no entendimento do tema “moradia popular” ou “habitação de interesse social”. O técnico deve ser estimulado e capacitado para contribuir na solução criativa de problemas. Entre as metas de se privilegiar esse perfil de aluno dos cursos está a sensibilização do profissional para a complexidade da questão habitacional e para identificação de potencialidades que podem ser estimuladas institucionalmente. Neste sentido, é importante o treinamento para a formulação de propostas para obter recursos de diferentes origens, particularmente os federais, que muitas vezes não são acessados por falta de capacidade técnica dos municípios, conforme reclamado por vários profissionais de organismos do governo Federal – Caixa e Ministério das Cidades, especialmente43. É um papel importante deste curso rever as bases da própria graduação dos técnicos - que, via de regra, teve o viés hegemônico,

voltado para o mercado tradicional -, e contribuir para reduzir o caráter burocrático que a atividade no setor público tende a impor. O terceiro perfil de aluno é o que vai assumir um certo protagonismo na

organização da demanda por e para assessoria técnica. A inspiração inicial é o Programa de Aperfeiçoamento Profissional (PAP), que foi realizado pelo IAB-RJ em 2001. Um grupo de arquitetos recém-egresso de faculdades foi selecionado para dar assessoria para a melhoria habitacional em favelas urbanizadas no contexto do “Bairrinho”, programa da Prefeitura do Rio de Janeiro para a urbanização de favelas de pequeno porte44. No caso de nossa proposta, é imprescindível trabalhar com equipes de formações diversas, ainda que, em se

tratando da concepção e realização de projeto de readequação edilícia, apesar do arquiteto ser uma categoria profissional indispensável neste curso.

Um componente essencial para o sucesso desta experiência é a indissociabilidade da teoria-prática, que no caso da arquitetura-urbanismo é constituída pela fundamentação da concepção, desenvolvimento do projeto e realização da obra. Deste modo, não há como existir o curso sem que se possa executar as intervenções trabalhadas. A ideia de aprender-fazendo está no cerne da proposta, associada à de participação da população. A avaliação da experiência piloto e sua a concretização das propostas de intervenção também são indispensáveis para aperfeiçoar as práticas de

intervenção, além de trocar e difundir conhecimento.

Temos a consciência de que o esboço de proposta das experiências piloto de Assessoria Técnica Continuada – ATC apresenta um caráter utópico e pode se constituir num empreendimento hercúleo. Não podemos negligenciar o fato de vários destes espaços constituídos pelos PMCMV terem sido hoje tomados pelo tráfico ou pela milícia, como observamos em campo e, também, apontaram e

43

Em várias reuniões de trabalho, em diferentes contextos, este tema é apontado. 44

Sobre o PAP ver Orioli (2015).

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aprofundaram outras pesquisas da Rede Cidade e Moradia45. Estes agentes podem ser entraves para a implantação de qualquer iniciativa, ameaçando inclusive a integridade física dos participantes. Outros agentes podem também oferecer resistência, como igrejas ortodoxas, particularmente neopentecostais, que se orientam por condutas morais que podem inviabilizar discussões sobre a organização dos espaços, especialmente os domésticos. A própria formação técnico-universitária implicará entraves, se dogmas travestidos de verdades pseudo-científicas não forem dissolvidos. Por sua vez, o isolamento de profissionais que aprenderam o ofício na prática, também pode contribuir para o fechamento em soluções que não se constituem necessariamente em sabedoria popular, mas em crenças.

Mas entraves podem representar também potencialidades. As experiências realizadas no contexto das atividades de extensão da Escola de Arquitetura da UFMG, registradas e analisadas por Lopes (2015), nos indicam a viabilidade desse

caminho. Há uma potência muito grande no próprio fato de todo morador das periferias ser um trabalhador da construção civil, pelo menos em potencial. Aqui nos referimos objetivamente à experiência dos alunos do Abricó- Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, que foi surpreendida pelo estranhamento de moradores de uma favela carioca à sua pergunta quanto a quem trabalhava com a construção

civil. Ora, a resposta era óbvia na visão deles: todos; afinal todos realizavam pelo menos um tipo de serviço nesta área. Um pouco de conhecimento sobre as periferias e favelas brasileiras nos permite afirmar que este não é um caso isolado. Considerando que cidades brasileiras demandam intervenções expressivas para que sejam transformadas em espaços com qualidade de vida para todos, é fundamental a capacitação de mão de obra para a atuação nas diferentes atividades que esta empreitada demanda. Referimo-nos objetivamente a um redesenho urbanístico-arquitetônico que torne as cidades mais confortáveis para as pessoas. O conceito de conforto passa por desde a definição clássica de conforto ambiental – térmico, acústico e lumínico -, como também pelas questões de transporte, mobilidade e acessibilidade. Outra perspectiva incorporada no conceito é a de conforto estético e

paisagístico. Cabe ressaltar a sedução que as favelas, particularmente as cariocas, exercem. Se a vinculação com a paisagem espetacular da considerada cidade maravilhosa pode desempenhar um papel para isto, não é desprezível o encantamento despertado pela organização normalmente labiríntica destes espaços, ainda que a precariedade

45

Na ocasião do fechamento desta proposta, o jornal carioca "Extra" iniciou uma série de reportagens sobre este tema. Ver: http://extra.globo.com/casos-de-policia/todos-os-condominios-do-minha-casa-minha-vida-no-rio-sao-alvos-do-crime-organizado-15663214.html

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possa preocupar. Esta referência foi aqui acionada para corroborar a potência da ação popular. A estética da favela e da autoconstrução apresenta força para constituir o que talvez seja a expressão "altermodernidade", no sentido de Hardt e Negri (2011: 116-117):

Altermodernidade tem uma relação diagonal com a modernidade.Assinala

o conflito com as hierarquias da modernidade na mesma medida que a

antimodernidade, porém orienta as forças de resistência mais claramente

para um terreno autônomo. (...). Com o termo "altermodernidade"

queremos indicar uma ruptura decisiva com a modernidade e com a relação

de poder que a define, toda vez que em nossa concepção de

altermodernidade surge das tradições da antimodernidade - mas mesmo

assim se aparta da antimodernidade toda vez que se estende mais além da

oposição e da resistência46. Neste ponto, vamos retomar ao que já foi citado anteriormente: as fabriquetas de

esquadrias de ferro e alumínio que existem em profusão nas periferias das cidades brasileiras. A alteração do tipo padrão de portas e janelas que passaram a ostentar a paisagem de nossas cidades, a partir dos anos 1970, para tipos que resolvam ou mitiguem os problemas de conforto, decorrente das questões de orientação solar, podem representar uma elevação significativa da qualidade estética e também ética da paisagem urbana brasileira. Evitar ou reduzir o uso de equipamentos mecânicos para climatização significa preservar o meio ambiente para as gerações futuras.

Vale pensar também nas possibilidades de desenvolvimento ou ampliação do uso de materiais reciclados para a confecção deste e de outros componentes da construção. Essa questão se articula com as necessidades urgentes de se rever a forma como consumimos energia. Não só os empreendimentos do PMCMV são agressões ao meio ambiente, como praticamente toda a produção do mercado imobiliário a partir de meados dos anos 1960, quando o boom da construção civil, estimulado pelo golpe empresarial militar, desconsiderou vários ensinamentos vernáculos, inclusive os reinterpretados pela arquitetura moderna. O exemplo do projeto de requalificação do Porto do Rio, denominado Porto Maravilha, já materializa o absurdo de se projetar torres de vidro nos trópicos, particularmente com o uso de

fachadas de vidro voltadas para orientações que recebem mais sol. É importante lembrar que mesmo aquelas que orientadas para a menor incidência, como a fachada sul no Rio de Janeiro, são insoladas, ainda que por pouco tempo, em alguma estação do ano, que no caso é o verão. As temperaturas altíssimas desta estação, entretanto, apontam para algum comprometimento do conforto térmico e lumínico, interna, mas, especialmente, externamente. A promessa das fábricas de vidro de que o material reduz o aquecimento interior, contribuindo para a conservação de energia, se esquece de alertar para as suas consequências para o 46

Tradução livre do espanhol.

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exterior. Com suas paredes de vidro, a requalificação do porto está nascendo já precisando de requalificação47. Essa aparente digressão tem relação com o PMCMV, uma vez que essa questão está presente também nos seus condomínios. A diferença é quanto à qualidade dos materiais e dos sistemas construtivos, mas não da qualidade da arquitetura e do urbanismo, pois ambos desconsideram os contextos socioespaciais e a morfologia dos entornos. É impressionante usarmos um sistema construtivo artesanal, como a alvenaria autoportante, que, entretanto, tem qualidade e expressão compatível com o que o pior da produção industrial do pós-guerra produziu. Insistir nesse tipo de urbanização predatória é condenar as gerações futuras a conviver com problemas socioambientais e urbanos ainda mais graves do que os que

experimentamos hoje. Esse esboço de política de Assistência Técnica Continuada - ATC - foi, portanto, concebida no sentido de criar bases para a efetiva superação do modelo de

urbanismo que não beneficia a sociedade, como um todo, e principalmente a população mais pobre. Um trabalho consistente de ATC, que respeite seus princípios básicos, pode vir a ser uma alternativa efetiva para a realização de um urbanismo alternativo. Neste sentido, vale lembrar que a ação profissional sempre deve ser no sentido de respeito e do estímulo, sempre que possível, à criação de soluções pelos próprios moradores. A democracia e o respeito à pluralidade são imprescindíveis, bem como entender as demandas dos moradores,

hierarquizando com eles as prioridades. Embora estejamos focados nos aspectos arquitetônico-urbanísticos, temos consciência de que várias questões que se apresentam não são da natureza estrita destas disciplinas. Da agronomia às artes plásticas, da medicina à informática, é difícil imaginar um campo de conhecimento que não tenha papel na melhoria da qualidade do espaço urbano. A despeito do seu caráter ambicioso e até mesmo fantasista, essa proposta tem âncoras em experiências que apresentam materialidade48. Se o já citado PAP teve vida curta, a ação da ONG Soluções Urbanas tem atuado em melhorias habitacionais há pelo menos oito anos. Há dois anos foi criado a Residência em

Arquitetura, Urbanismo e Engenharia da FA-UFBA, que é um curso lato sensu para capacitar para a assistência técnica em habitação. A já explicitada experiência da UFMG, particularmente a ação do PRAXIS49, também pode ser considerada referência. 47

Este é apenas um dos seus problemas. Sobre a questão da arquitetura produzida ver Halfen (2014) e sobre a questão da moradia nesta área ver Galiza (2015). 48

No final deste relatório, incluímos um texto que procurou compilar as experiências de assistência e assessoria técnica no Brasil. 49

Grupo de pesquisas coordenado pela professora Denise Morado, que realiza atividades de extensão assessorando ocupações urbanas entre outros grupos de moradias.

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As experiências de produção em auto ou co-gestão em São Paulo do início dos anos 1990 gera frutos até hoje – alguns de qualidade muito elevada -, ainda que seu caráter utópico original possa ter se perdido50. Em outros países da América Latina, existem experiências importantes, dentre as quais se destacam as das cooperativas uruguaias51. Para finalizar este item, é imprescindível marcar que são necessários investimentos públicos expressivos para a redistribuição das benfeitorias urbanas e do capital cultural relativo às disciplinas foco desta proposta. Entretanto este é um projeto de aplicação em longo prazo e de realização lenta, o que significa um desembolso pequeno ao longo do tempo. Neste sentido é importante ressaltar que sua

realização também poderá contar com recursos dos próprios moradores, quando as transformações não forem essenciais, entendendo que o que é essencial e prioritário também deve ser objeto de debate entre técnicos e moradores.

É fundamental, todavia, registrar que mais do que uma questão de recursos financeiros, a viabilidade de implantação de uma proposta desta natureza depende de mudanças estruturais. A denúncia que Galiza (2015) faz ao registrar que a Caixa Econômica Federal usou recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS - para a aquisição de CEPACS do Porto Maravilha, mostra que há recursos. Este tipo de operação está por ser institucionalizada por lei, o que implica a perspectiva de aplicação de mais recursos na construção de um tipo de cidade que beneficia

pouca gente. Estes e outros recursos deveriam ser investidos na melhoria da qualidade urbana dos espaços de vida, especialmente dos mais pobres, que tendem a ser os mais afetados com os problemas urbanos. O Brasil superou a condição de subdesenvolvimento, integrando atualmente uma elite intermediária – os BRICS – de países que se destacam no cenário econômico internacional. Não se podem negar os avanços na redução da extrema pobreza e o PMCMV representa o atendimento de condições mínimas de salubridade para grande parte da população. Não dá, todavia, para garantir que esta conquista supera a importância da localização e da organização flexível dos espaços como o de favelas e ocupações, por exemplo, que

50

Há uma crítica massiva à redução das experiências de autogestão à aquisição da casa própria, o que fera a ideia de transformação urbano-social inicial formulada na origem das ações paulistas de autogestão. Entretanto, há o reconhecimento que a constituição de um sentido de coletividade permanece mesmo nas experiências realizadas mais recentemente. 51

Estas experiências já foram analisadas e discutidas em trabalhos de diferentes épocas. A realização da Oficina “A Arquitetura, o Urbanismo e a Moradia Popular: o fazer projetual para além do produto” foi fundamental para a confecção dela. Em breve divulgaremos material decorrente do debates desta oficina, mais precisamente publicaremos uma entrevista que foi realizada com o Professor RaúlValles, da Universidad de la Republica e arquiteto do instituto de assessoria técnica, Hacer-Dessur. Os planos de readequação de conjuntos habitacionais implantados em Berlim e expandidas para o leste da Alemanha e o resto da Europa Oriental também contribuiu nesta proposição. Sobre este tema ver (Andrade, 2006, 2008 e 2011).

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normalmente são estratégicos para a organização produtiva e reprodutiva da vida. Como já dito, Topalov (1998) nos alertou para o fato de que o saneamento adquire mais valor no contexto dos interesses da burguesia52. A força das expressões populares brasileiras, que encantam o mundo, talvez aponte para a potência do País em liderar uma articulação supranacional para uma transformação que aponte alternativas efetivas de ruptura da lógica depredadora do capitalismo. Ou, pelo menos, para romper com os traços da colonização que imputam condições perversas de vida aos mais pobres.

52

Santos (1981) desenvolve uma rica narrativa, mostrando que esse valor não é absoluto como faz parecer o discurso técnico.

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Tudo isto é imposto por meio de uma chantagem, em nome da

utilidade. Oculta-se que a importância completa dessa utilidade é

posta a serviço da reedificação. O Capitalismo moderno leva a desistir

de toda a crítica pelo simples argumento de que é preciso ter um

teto, assim como a televisão passa sob o pretexto de que é preciso

receber informação e divertimento. E consegue apagar a evidência:

essa informação, esse divertimento e esse modo de habitat não são

feitos para as pessoas, mas são feitos sem elas, contra elas.

Internacional Situacionista

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PARTE PARALELA

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1. Operacionalização da pesquisa Nosso projeto de pesquisa foi elaborado de maneira flexível para que o processo de conhecimento da realidade existente no local de estudo pudesse admitir alterações na estrutura das etapas e nos instrumentos metodológicos, em decorrência de possíveis imprevistos. Dessa forma, a descrição da operacionalização inicialmente proposta funcionou como um roteiro preliminar, que foi alterado devido às demandas identificadas durante a imersão nos campos teórico e empírico (Andrade [coord.], 2012). É necessário mencionar que o roteiro preliminar indicava basicamente etapas

bem definidas para a operacionalização: Revisão Bibliográfica; Estudos de Caso; Projeto Arquitetônico-urbanístico de Readequação do Conjunto Habitacional (a ser escolhido); Orçamento estimativo para avaliação preliminar dos custos de readequação; desenvolvimento das análises e redação do relatório. Contudo, durante a execução da proposta, as demandas identificadas geraram a inclusão de outras etapas, sendo que algumas delas foram desenvolvidas simultaneamente - ao contrário do que sugeria a ordem da operacionalização do projeto.

OPERACIONALIZAÇÃO PREVISTA:

Por tratar-se de uma pesquisa-intervenção, o

conhecimento da realidade com a qual se

trabalhará é determinante para a definição

dos procedimentos e instrumentos a serem

adotados. A descrição da operacionalização

que se segue é, então, um roteiro preliminar

que será alterado em função das demandas

percebidas ao longo da execução da

proposta. As etapas principais para a operacionalização

da pesquisa estão listadas abaixo:

Revisão bibliográfica: Esta etapa se centrará em dois

temas: na revisão de pesquisas sobre

OPERACIONALIZAÇÃO COMO OCORREU55:

As etapas operacionais da pesquisa tiveram início após a

conclusão de duas atividades fundamentais: compra de

materiais necessários para o pleno desenvolvimento das

etapas; e seleção de bolsistas, que foi condicionada ao início

do ano letivo de 2013. Demandas identificadas durante a

execução da proposta geraram a inclusão de outras etapas,

conforme a descrição a seguir.

Reuniões semanais:

Foram realizadas reuniões semanais para discutir o

andamento das atividades de pesquisa, questões sobre

metodologia, apresentações de resultados parciais e

esclarecimento de possíveis dúvidas.

Revisão da bibliografia no contexto dos Seminários

55 Texto redigido por Isadora Tenório, com complementação de Juliana Demartini e revisão

técnica de Luciana Andrade.

Page 81: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

81

o cotidiano de moradores de

conjuntos habitacionais e em

métodos projetuais participativos. No

primeiro caso se pretende ampliar o

olhar sobre práticas sociais de modo

a aumentar a sensibilidade dos

membros da equipe para as

possibilidades que serão encontradas

no conjunto a ser selecionado para a

realização do projeto. A revisão de

métodos projetuais participativos

permitirão a atualização do

conhecimento sobre práticas desta

natureza, bem como o

aprofundamento do conhecimento

de métodos desenvolvidos em vários

momentos da crítica ao projeto

arquitetônico e urbanístico

autoritário53

. − Para essa etapa é previsto

um evento – provavelmente

uma mesa redonda – com

profissionais que atuam com

projeto participativo,

particularmente aqueles que

realizam assessoria técnica

aos movimentos sociais para

a construção da moradia por

autogestão. Este é um outro

momento de debate

conjunto com a equipe do

Observatório das

Metrópoles/IPPUR/UFRJ.

Estudos de caso:

Esses estudos de caso serão

desenvolvidos com o Observatório

das Metrópoles/IPPUR/UFRJ. Como

dito, as duas equipes articuladas

Habitação e Cidade:

Os seminários como atividade disciplinar, realizados no

PROURB/UFRJ, no primeiro semestre de2013, tiveram

enfoque na discussão de bibliografia com temas pertinentes

ao PMCMV. As discussões foram feitas a partir da leitura de

textos (livros, dissertações e teses) relacionados à política e à

produção habitacional, bem como aos aspectos arquitetônico-

urbanísticos ligados ao tema.

Visita a diversos conjuntos habitacionais:

Para iniciação dos bolsistas de iniciação científica e de

extensão na questão do projeto arquitetônico e urbanístico

da moradia popular, foram feitas algumas visitas a conjuntos

habitacionais do Rio de Janeiro, implantados em diferentes

décadas. Esta atividade viabilizou uma vivência panorâmica da

produção habitacional realizada na cidade, bem como da

transformação ocorrida em seu aspecto formal e

programático, através da apropriação dos moradores ao longo

dos anos.

Foram visitados os seguintes empreendimentos:

Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, o

Pedregulho - Departamento de Habitação Popular/DF;

Conjunto da Fundação da Casa Popular, Campus de

experimentação de sistemas construtivos, em Guadalupe.

IAP Realengo, conhecido como Moscouzinho;

IAPI Bangu;

Conjunto Habitacional Dom Jaime Câmara - BNH.

Esta visita, não só viabilizou aproximação real da

problemática, como também possibilitou à equipe uma

pequena vivência em diferentes propostas arquitetônico-

urbanísticas de HIS. No Pedregulho e no Campus de

experimentação de sistemas construtivos, foi possível entrar

nas unidades habitacionais e realizar entrevistas abertas com

moradores. Esta atividade gerou também registros

fotográficos, que foram utilizados durante o desenvolvimento

da pesquisa.

53

Alguns dos autores listados são Alexander (1977), Santos (1981 e 1988), Portas (2004) e estudos sobre a obra dos arquitetos Frei Otto e Lucien Kroll, que desenvolveram projetos residenciais abertos à participação popular na Europa. O trabalho de Ferro (1982 e 2006) também é importante para a construção de um sentido de participação mais efetivo e entendimento dos entraves à a este processo na realização do projeto.

Page 82: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

82

visam trabalhar em

complementaridade para desenvolver

uma análise que abarque desde a

compreensão da Região

Metropolitana, até a da casa. A

seleção dos casos serão definidos a

partir de critérios comuns, a saber: − Grau de inserção urbana

(maior ou menor);

− Porte do empreendimento;

− Faixa de renda, com a

seleção de pelo menos um

empreendimento na faixa de

0-3 salários mínimos de

renda familiar mensal;

− Programa geral do MCMV /

Entidades

− Empreendimentos

destinados a população

reassentada de áreas de

risco, projetos de

infraestrutura e urbanização

de assentamentos precários,

quando houver ;

− Critérios adicionais

eventuais: tipo de empresa

ou entidade promotora,

papel do poder público, tipo

de sistema construtivo, etc.

Nesta etapa, a avaliação das

características físico-espaciais dos

conjuntos se dará por sua observação

geral, capturada por imagens, e pela

aplicação de questionários para a

identificação por amostragem do

perfil das famílias.

A partir de mapas e plantas

identificaremos a qualidade da

inserção do conjunto no bairro,

verificando a existência ou não de

vazios entre a malha urbana de um e

de outro e, quando for o caso, o

Confecção de fichas de avaliação de projetos de habitação

social

Para aprofundar os estudos sobre empreendimentos

habitacionais, foram elaboradas fichas de avaliação de

projetos de habitação social, onde as informações foram

organizadas sistematicamente, através de critérios de análise

estabelecidos em três escalas(cidade, conjunto e unidade

habitacional).

O levantamento panorâmico inicial de projetos foi, além da

seleção de dois projetos visitados, feito em revistas e sites

técnicos, reconhecidos no meio profissional. Após uma

triagem do material levantado, foram selecionadas propostas

com conteúdo teórico e gráfico suficiente para o

desenvolvimento das análises - focadas em aspectos

arquitetônicos e urbanísticos, como por exemplo, materiais e

técnicas construtivas, programa arquitetônico,

dimensionamento, organização do espaço doméstico, acessos

e relação das edificações com o terreno e entorno.

Para tornar as avaliações mais próximas da realidade, foi

desenvolvida uma comparação entre as propostas de layout -

de acordo com a representação das publicações e seguindo as

dimensões dos móveis comumente adquiridos por moradores

de conjuntos habitacionais. Para isso, foi feito um

levantamento do desenho e das medidas de mobiliário em

lojas populares e refeitas as propostas de layout, com base

nas informações pesquisadas.

Os projetos avaliados foram:

Casa Balão - Guadalupe, Rio de Janeiro/Brasil;

Pedregulho - São Cristóvão, Rio de Janeiro/Brasil;

HIS Expansível - Rocinha, Rio de Janeiro/Brasil;

1º Lugar Prêmio Caixa 2009 - Santa Cecília, São

Paulo/Brasil;

Real Parque - São Paulo/Brasil;

Microchip - Axios/Grécia;

HIS Elemental - Paraisópolis, São Paulo/Brasil;

Box House - São Paulo/Brasil;

Parque Novo Santo Amaro 5 – Guarapiranga, São

Paulo/Brasil.

A partir da elaboração das fichas foram retiradas possíveis

contribuições para o projeto de readequação do conjunto do

PMCMV, tais como:

Page 83: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

83

porte e as características destes

vazios. A proximidade do conjunto

aos centros ou sub-centros de bairro

também serão considerados no raio

das atividades realizadas pelos

moradores.

Isto dará a base para a caracterização

dos espaços públicos e comunitários

vividos pelos moradores. Por meio

da aplicação de questionários serão

identificados “pontos” do espaço

urbano usados pelos moradores:

além dos locais de trabalho,

procuraremos identificar, escolas,

creches, postos de saúde, hospitais,

praças, locais de atividades sociais e

culturais, igrejas, núcleos de serviços

e comércio. Estes locais serão

identificados em mapas, bem como

os percursos realizados pelos

moradores e seus meios de

locomoção – a pé, bicicleta,

carro/moto, ônibus/van ou a

combinação deles - serão também

levantados. Com fotografias e filmes,

aliados a registros escritos e croquis,

serão observados aspectos do espaço

urbano como: tipo e dimensões de

vias carroçáveis e passeios; existência

de elementos de

sombreamento/arborização;

iluminação pública; densidade do

espaço construído; permeabilidade

entre espaço público e privado; tipo

e intensidade do trânsito de veículos,

existência de faixa de pedestres e

sinais luminosos.

Na escala do conjunto habitacional

serão observados aspectos da sua

conexão com o entorno, o que tem

relação com a configuração ou não

de condomínio fechado, com

1. Permitir maior adequação ao perfil dos moradores, através

de unidades para diferentes perfis de famílias e de

utilização de diferentes tipologias;

2. Boa estruturação e variedade de usos dos espaços livres;

3. Integração à malha urbana;

4. Utilização da topografia do terreno como partido;

5. Previsão de uso comercial interno e externo às unidades;

6. Acessibilidade integrada ao projeto dos condomínios;

7. Previsão de centro cultural / comunitário;

8. Utilização de processo participativo;

9. Implantação levando em consideração aspectos de

conforto ambiental;

10. Passarelas que criam situações de encontro entre os

vizinhos;

11. Reaproveitamento da água das chuvas para irrigação das

áreas verdes.

Exemplo de Ficha de Avaliação de Projetos de Habitação

Social:

Fig.01: modelo de ficha de avaliação

Page 84: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

84

impactos sobre o tipo de espaço

gerado no exterior. A questão da

diversidade formal e funcional

também é relevante, assim como a

identificação se os espaços livres se

configuram como abertos ou

residuais, ou seja, áreas livres que

“sobraram” na implantação do

edifício.

Por fim, para avaliação do espaço

doméstico serão identificadas

famílias pelo número de integrantes;

suas idades e sexo; tipo de

parentesco/relação etc. As atividades

cotidianas – de produção e

reprodução - também serão

levantadas, de modo a caracterizar as

necessidades e também

potencialidades das famílias e de

transformação do espaço.

Nesta etapa, devido ao número de

empreendimentos estudados, a

pesquisa se dará por amostragem e

terá caráter mais quantitativo,

embora alguns aspectos serão

analisados, inevitavelmente por um

viés qualitativo.

Cada uma das escalas abordadas será

supervisionada por um dos membros

da equipe de pesquisadores

mestrandos, mestres ou

doutorandos, apoiados por bolsistas

graduandos - para a pesquisa nos

espaços públicos do bairro, nos

espaços livres do conjunto

habitacional e nos espaços

domésticos.

Após a análise dos conjuntos

selecionados para esta etapa de

estudo de campo, um deles será

Sessões CiHabE de Cinema e Debate

Foram exibidos filmes e documentários acerca da questão

habitacional, entre eles: “Reidy – a construção da utopia” e

“Lucio Costa e a utopia moderna”. As sessões tiveram como

objetivo principal reforçar a contextualização,

problematização e debates realizados nas reuniões semanais.

É importante mencionar que as sessões foram abertas ao

público, para que outras pessoas, além dos membros da

equipe de pesquisa, pudessem fomentar as discussões sobre o

conteúdo exposto.

Aplicação de questionários em diversos empreendimentos

do PMCMV - RMRJ

Para avaliação de empreendimentos PMCMV - Faixa 1,

implantados na Região Metropolitana do Rio de Janeiro,

foram aplicados questionários elaborados pelo IPPUR, com

nossa colaboração.

Belford Roxo;

Santa Cruz;

Queimados – Parque Valdariosa I, II e III;

Bairro Carioca.

Reconhecimento do empreendimento

O recorte espacial para o desenvolvimento da proposta de

readequação arquitetônico-urbanística abrangeu o

levantamento e análise do desenho de empreendimentos do

PMCMV no Rio de Janeiro, através da observação feita no

local e da confecção de desenhos técnicos das unidades

habitacionais e sua implantação.

Esse, entre outros desenhos, como plantas baixas, cortes e

fachadas dos apartamentos e das casas térreas para PNEs, por

exemplo, foram reproduzidos por nossa equipe para o

desenvolvimento das análises previstas na pesquisa. Apenas

em meados do segundo semestre de 2013, a equipe teve

acesso às cópias dos projetos aprovados pela Caixa Econômica

Federal.

Page 85: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

85

definido para objeto de projeto de

readequação em função de sua

representatividade como conjunto

habitacional do PMCMV,

receptividade dos moradores entre

outros critérios.

− Nesta etapa, são previstas

pelo menos duas reuniões

com a equipe do

Observatório das

Metrópoles/IPPUR/UFRJ.

Uma delas será na etapa

inicial para o planejamento

da construção de

questionário e da logística

das visitas à campo. No fim

da etapa, será realizada uma

reunião para a discussão dos

resultados do estudo de

campo.

Projeto arquitetônico-urbanístico de

readequação do conjunto

habitacional:

Conhecimento do problema

específico:

Após a seleção do conjunto

habitacional que será objeto

de um projeto de

readequação, será

levantado, junto aos órgãos

pertinentes, o projeto

arquitetônico-urbanístico

que orientou a construção,

de modo a embasar uma

análise preliminar. Ao mesmo tempo, será

iniciado um

aprofundamento do estudo

de caso específico para a

avaliação das características

Fig.02: Desenho da implantação dos empreendimentos

Oficina de Intervenção MCMV – 1ª Oficina de Projeto

A Oficina de Intervenção teve como objetivo discutir aspectos

da arquitetura e do o urbanismo relacionados à produção do

Minha Casa Minha Vida, através da elaboração de propostas

projetuais de requalificação de empreendimentos localizados

em Santa Cruz - RJ.

Os participantes, alunos de graduação e pós-graduação em

Arquitetura e Urbanismo de diversas faculdades, foram

divididos em 3 grupos, de acordo com as seguintes formas de

flexibilidade da estrutura:

Estrutura original;

Estrutura original com reforço;

estrutura em laje/viga/pilar.

Pranchas da proposta mais econômica:

Page 86: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

86

físicas do conjunto nas três

escalas anteriormente

citadas. Nesta etapa, serão

integrados na equipe jovens

moradores do conjunto54

,

que serão capacitados pela

equipe para participar da

elaboração e aplicação dos

questionários e entrevistas,

bem como para a realização

de observações de campo

para o conhecimento do

perfil e necessidades das

famílias. Os procedimentos serão

similares aos desenvolvidos

no item anterior para as três

escalas de análise, sendo

que o objetivo será a

apreensão de um grupo

significativo e contíguo de

unidades habitacionais,

compreendendo um

universo representativo de

várias questões importantes

de serem consideradas num

projeto de reabilitação de

um conjunto desta natureza. Além dos instrumentos

listados para o item

anterior, poderão ser ainda

realizadas entrevistas focais

para identificar

potencialidades da área e

dos grupos sociais

moradores, do mesmo modo

como poderão ser

desenvolvidas outras

estratégias que se

mostrarem pertinentes para

a apreensão da realidade em

questão.

54

Será realizado um processo de seleção dos jovens, com critérios definidos que envolverão a inscrição na rede pública de ensino, o interesse no tema entre outros.

Page 87: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

87

Plantas com a representação

gráfica dos problemas e

potencialidades do espaço

serão confeccionadas, assim

como outros recursos para a

espacialização dos

resultados levantados nesta

análise. É considerada a

possibilidade de confecção

de uma planta digital que

permita a visualização

instantânea dos dados e

aspectos observados,

inclusive aqueles registrados

em filmes.

8.1.3. 2. Desenvolvimento do

estudo preliminar de

readequação do conjunto:

O projeto de readequação

do conjunto será

desenvolvido no nível de

estudo preliminar, com

especificações que

permitam o

desenvolvimento de um

orçamento simples. Os

conceitos e o partido para a

sua realização serão

decorrentes da pesquisa de

campo e do debate entre os

membros da equipe e,

quando possível, moradores.

Aqui vale destacar a

limitação de uma

empreitada desta natureza,

uma vez que o exercício

projetual pode gerar

expectativas nos moradores

que não poderão ser

atendidas no contexto da

pesquisa. A própria seleção

da área levará em conta a

Fig. 03: a. e b. Pranchas com síntese de uma das três

propostas apresentadas na 1ª oficina de projeto.

Jornada de Iniciação Científica, Artística e Cultural (JICTAC) /

Congresso de Extensão - 2013

Foram realizadas três apresentações na JIC que integraram a

série “Verdades e mitos sobre a qualidade na habitação

social”; “O que é realmente ruim nas moradias do PMCMV?”;

“Bastam projetos assinados?” e “Projetos assinados ou

PMCMV?”. No Congresso de Extensão foi feita uma única

apresentação com o título “Por uma qualidade urbana e

habitacional: avaliação arquitetônica e urbanística de

empreendimentos do Programa Minha Casa Minha vida na

Região Metropolitana do Rio de Janeiro”.A equipe recebeu

Menção Honrosa na JICTAC 2013 - UFRJ e também no 10º

Congresso de Extensão (2013) - UFRJ.

Page 88: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

88

possibilidade de trabalho

conjunto, mas caso se

constate uma efetiva

impossibilidade de

realização de projeto

participativo como exercício,

a equipe se limitará a

responder às demandas

reveladas nos questionários

e entrevistas. Se, por um

lado, isto comprometerá a

perspectiva de

desenvolvimento e

elaboração de métodos e

processos participativos

para a realização do projeto,

por outro lado, a simples

realização de um projeto

para readequar o conjunto

ao perfil das famílias já

permitirá um

dimensionamento

preliminar dos ônus que

recairão sobre a população

moradora para promover a

melhoria das condições de

habitabilidade dos seus

espaços de vida. − O desenvolvimento

do projeto

envolverá

momentos de

debates que

poderão ser

formalizados como

eventos – oficinas

ou seminário de

apresentação e

discussão do

projeto. Membros

da equipe do

Observatório das

Metrópoles/IPPUR/

UFRJ participarão

Realização de oficina de maquete com moradores

Foi realizada uma oficina com moradores do Condomínio

Coimbra (MCMV), em Santa Cruz (Estrada dos Palmares), com

o objetivo de coletar ideias para a concepção do projeto de

praça, em um terreno próximo ao empreendimento. Para o

desenvolvimento da maquete dos empreendimentos e

entorno, foi esperada a participação de moradores de

variadas faixas etárias, porém efetivamente os participantes

foram as crianças, a atividade foi ajustada para ter caráter

mais lúdico. Mesmo assim, informações relevantes para o

projeto foram coletadas através deste instrumento

metodológico.

2ª Oficina de projeto MCMV

A 2ª Oficina de projeto foi realizada em março de 2014 e

contou com a participação de estudantes de graduação em

Arquitetura e Urbanismo. O objetivo foi elaborar propostas de

melhorias voltadas à escala urbana dos condomínios MCMV,

de Santa Cruz - RMRJ. Nesta oficina, os participantes,

previamente divididos em seis grupos, trabalharam de forma

livre o mesmo tema, optando ou não por se aprofundar em

um tópico específico.

Antes das atividades práticas desta oficina, foi realizado um

seminário que deu início ao debate sobre questões

relacionadas à escala urbana. Participaram deste seminário,

moradores dos condomínios de Santa Cruz, um pesquisador

(sociólogo) da equipe do IPPUR/UFRJ e professores da

FAU/UFRJ.

Realização de maquete para subsidiar a oficina

Para a segunda oficina de projeto, foi realizada uma maquete

física para servir de base para os participantes da oficina.

Após as conclusões dos trabalhos das oficinas, a maquete foi

utilizada para exercícios de reorganização do bloco e base

para o desenvolvimento do projeto. Posteriormente ela foi

entregue aos moradores.

Visitas à Campo, além da aplicação dos questionários

Foram feitas outras visitas a campo, além daquelas feitas para

a aplicação dos questionários e tomada de conhecimento do

local. Foram realizados levantamentos dos usos no entorno,

como também visitas com o objetivo de levantar informações

para pensar o projeto. Os moradores demandaram projetos

Page 89: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

89

destes momentos

evento.

Orçamento estimativo para avaliação

preliminar dos custos de

readequação

Após a conclusão do projeto de

readequação será feito um

orçamento estimativo para

dimensionar os custos de

readequação do conjunto. − Tal como na etapa anterior,

a finalização do orçamento

será sucedida de uma

reunião para exposição das

avaliações preliminares.

As avaliações e análises serão desenvolvidas

por praticamente todo o tempo de

desenvolvimento do projeto de readequação

arquitetônica e urbanística do conjunto

selecionado. Reuniões quinzenais para o

debate e registro das avaliações parciais serão

realizadas. Durante os últimos meses de realização da

pesquisa será redigido o relatório que será

convertido numa publicação. A publicação

terá um correspondente com os temas

desenvolvidos pela equipe do Observatório

das Metrópoles/IPPUR/UFRJ.

tanto para uma praça, em área com previsão para a

construção de espaço comercial e escola, que não foram

construídos, quanto para um centro cultural, que abrigasse as

recém-formadas associações de moradores e de síndicos. Não

foi possível atender à primeira demanda, mas nos foi possível

desenvolver um estudo preliminar do Centro Cultural, que foi

inserido na versão final do projeto.

Desenvolvimento dos projetos

Encontram-se em etapa de finalização os projetos de

readequação dos blocos, em função dos blocos, em função

das respostas dos questionários, e de readequação da

implantação. Para finalizar a empiria da pesquisa, será

realizado o orçamento estimativo da proposta de

readequação.

Jornada de Iniciação Científica, Artística e Cultural (JICTAC) /

Congresso de Extensão

Em 2014 foi realizada uma única apresentação na JICTAC,

intitulada “Conexão de Saberes Arquitetônicos e Urbanísticos:

conhecendo moradores para pensar a readequação de

empreendimentos do MCMV”. Por neste momento o projeto

de pesquisa se confundir com o projeto de extensão, o

mesmo trabalho foi apresentado no XI Congresso de

Extensão, ressaltando as questões mais relacionadas ao

diálogo com os moradores. A equipe de bolsistas recebeu

Menção de Incentivo na JICTAC 2014– UFRJ.

Oficina A Arquitetura, o Urbanismo e a Moradia Popular: o

fazer projetual para além do produto

O objetivo da oficina foi levantar questões e discutir

proposições pertinentes à atividade do projeto de

arquitetura-urbanismo e a produção da moradia popular.

Como forma de aprofundar o debate pertinente ao projeto

arquitetônico-urbanístico, foi estabelecido um diálogo entre a

realidade brasileira atual de produção da moradia social,

representada pelo contexto carioca e gaúcho, e a experiência

uruguaia de realização de projetos com as cooperativas

habitacionais. Foram realizadas visitas de campo,à produções

autogestionárias e empreendimentos empresariais do MCMV,

além das palestras e debates. O evento foi feito em parceria com

o Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ.

Redação do relatório

Page 90: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

90

A redação do relatório foi iniciada e finalizada como esta

síntese, que será desenvolvida como relatório completo até o

prazo final da pesquisa, que é dezembro deste ano. Artigos

também estão sendo desenvolvidos.

Reuniões de pesquisa extra CiHabE/PROURB

Foram realizadas reuniões de pesquisa com membros da Rede

Nacional e com o MCidades, conforme relação abaixo:

Reunião em Brasília – março de 2013

Com MCidades e CNPq

Com equipes da RPCM

Reunião em Recife (ENANPUR) – maio de 2013

Com equipes da RPCM

Reunião em São Paulo – Agosto de 2013

Com equipes da RPCM

Reunião em Brasília – novembro de 2013

Com MCidades

Com equipes da RPCM

Reunião em São Paulo – abril de 2014

Com equipes da RPCM

Reunião em Brasília – maio de 2014

Com MCidades

Com equipes da RPCM

Seminário em São Paulo – julho/agosto de 2014

Com equipes da RPCM

Foram realizadas outras reuniões com a equipe do

IPPUR/UFRJ.

Page 91: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

91

2. Notas Metodológicas56

Em trabalho realizado junto ao Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ, foram entrevistadas 125 famílias dos seis condomínios MCMV, situados na Estrada dos Palmares, no bairro Santa Cruz. Depois de realizados, os questionários foram tabulados para que pudéssemos conhecer e entender o retrato da realidade dos moradores proporcionado por este instrumento. Os condomínios Almada, Aveiro, Cascais, Coimbra, Estoril e Évora totalizam 2712 unidades habitacionais, sendo 168 blocos com 2696 apartamentos e 16 habitações acessíveis. Os questionários foram compostos por várias perguntas, dentre as quais foi de interesse para a nossa pesquisa aquelas relacionadas ao perfil socioeconômico

das famílias e as referentes à habitação anterior e atual. Com a tabulação das entrevistas obtivemos um banco de dados das pessoas e outro de domicílios.

- Perfil das Famílias Selecionamos nos bancos de dados algumas perguntas que fossem relevantes no processo de identificação dos perfis das famílias que residem nas unidades habitacionais. Os dados utilizados para essa análise foram: empreendimento que reside, quantidade de pessoa por domicílio, posição familiar, idade, sexo, presença de deficiente na família, ocupação, bairro onde trabalha/estuda,

renda mensal, quantidade de pessoas que trabalha na família, forma de acesso ao apartamento, presença de atividade comercial em casa e local da moradia anterior, esse último dado foi trabalhado pelos bolsistas para que soubéssemos a distância em quilômetros da habitação anterior (distância encontrada com o auxílio do Google Earth a partir de um caminho existente) . A posição familiar de cada membro foi outro dado manipulado pelos bolsistas, utilizado para classificar as famílias em 12 tipos, sendo eles: unipessoal, casal sem filhos, monoparental com um filho, monoparental com dois filhos do mesmo sexo, monoparental com dois filhos de sexos diferentes, monoparental com mais de dois filhos do mesmo sexo, monoparental com mais de dois filhos de sexos diferentes, biparental com um filho, biparental com dois filhos do

mesmo sexo, biparental com dois filhos de sexos diferentes, biparental com mais de dois filhos do mesmo sexo e biparental com mais de dois filhos de sexos diferentes. Os termos utilizados para essa classificação foram adotados anteriormente pelo Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ, onde unipessoal diz respeito à presença de uma única pessoa morando na unidade habitacional,

56

Redação de Stéfany Silva, com revisão técnica de Luciana Andrade.

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92

Monoparental quando existe apenas um responsável e seus dependentes e biparental quando são dois responsáveis e seus dependentes. Além dessa classificação existe um grupo de famílias que não se enquadra nesses tipos e possuem características diversas entre si. Essas famílias são caracterizadas pela presença de avós, tios, cônjuges dos filhos e outras pessoas, classificadas como agregados. O termo adotado para designá-las foi “Família Ampliada”. Tais famílias foram analisadas separadamente, caso a caso, para que pudéssemos classificá-las como adequadas, ou não, ao apartamento de dois quartos. Procuramos, então, identificar a quantidade de cômodos que cada uma delas precisaria para viver.

A partir dessas classificações uma tabela foi montada para que pudéssemos saber o percentual de cada tipo de família em cada condomínio, numa amostragem de 125 famílias. A tabela “Tipologia Familiar” apresenta a quantidade de entrevistados em cada categoria e sua porcentagem, obtida

através de uma regra de três simples.

- Adequação e Inadequação das Famílias A partir da classificação das famílias em tipos, foi possível traçar um perfil de adequação e inadequação dos moradores relacionando o número de membros

e sua posição familiar com a quantidade de dormitórios. Considerando que o grupo que possui uma demanda por apartamentos de dois quartos estaria adequado, foram propostas novas plantas - conjugado, quarto e sala, três e quatro quartos - para a adequação dos outros grupos. Dessa maneira, em uma nova tabela, com o título de Adequação das Famílias, agrupamos os tipos de famílias com a demanda por quartos para que pudéssemos saber o percentual de cada tipo de apartamento. Depois de encontrado o valor em porcentagem, extrapolamos para o universo total de 2712 famílias afim de obtermos um valor numérico dessa demanda. Essa análise de adequação a partir da posição familiar de cada membro foi

feita a através de um estudo individual de cada família. Dessa maneira, algumas classificações de famílias só poderiam ser diagnosticadas como adequadas ou inadequadas a partir de análise mais subjetiva.

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93

Adequação das Famílias

Tipologia do apartamento

Tipologia Familiar Porcentagem Número de

Famílias

Número de Apartamentos (extrapolação)

Conjugado Unipessoal 12,00% 15 324

Quarto e sala Casal sem filhos 12,80% 16 345

2 Quartos

Monoparental com 1 filho

32,00% 40 863

Monoparental com 2 filhos do

mesmo sexo

Monoparental com mais de 2

filhos do mesmo sexo

Biparental com 1 filho

Biparental com 2 filhos do mesmo

sexo

3 Quartos

Biparental com mais de 2 filhos do

mesmo sexo

25,60% 32 690

Monoparental com 2 filhos de

sexos diferentes

Monoparental com mais de 2 filhos de sexos

diferentes

Biparental com 2 filhos de sexos

diferentes

Biparental com mais de 2 filhos de

sexos diferentes

Figura 04: Tabela adequação das Famílias.

Page 94: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

94

Adequação das Famílias (Família Ampliada)

Tipologia do apartamento Número de entrevistados Porcentagem Número de Unidades

habitacionais (extrapolação)

Conjugado - 0% 0

Quarto e Sala - 0% 0

2 Quartos 4 3,20% 86

3 Quartos 9 7,20% 194

4 Quartos 9 7,20% 194

*VALORES APROXIMADOS 17,60% 474

Fig. 05: Tabela de adequação das Famílias (Família Ampliada)

- Adequação e Atividade Comercial no Domicílio Durante as visitas de campo e posteriormente, com a análise dos dados tabulados dos questionários, a questão da presença de atividade comercial ou

de serviço em casa nos chamou atenção. Alguns morados exerciam atividades desse tipo em seu domicílio anterior e, ao se mudarem para os condomínios, não abandonaram essa prática por ser a única fonte de renda ou uma maneira de complementá-la. Essa questão foi outro fator que foi levado em consideração na análise de adequação das famílias ao domicílio. A tabela “Trabalho no domicílio” foi elaborada a partir da tabela inicial com o objetivo de visualizarmos melhor a situação dos moradores que trabalham em seu apartamento. Ao analisarmos a tabela podemos perceber que das 125 famílias entrevistadas, 14 exercem algum trabalho em seu apartamento (11,2%), e dessas famílias, apenas três teriam espaço para esse tipo de atividade em casa (2,4%). No processo de readequação dessas famílias foram

pensados espaços nos blocos destinados a atividades comerciais e de serviço, separados ou vinculados com o domicílio.

Page 95: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

Trabalho no Domicílio

Empreendimento Código da Família Atividade Tipologia Familiar Forma de Acesso Quantidade Porcentagem

Almada 2 Manicure Unipessoal Reassentamento

2 1,60% 3 Corta Cabelo Unipessoal Reassentamento

Aveiro 32

Vende sacolé, cloro e desinfetante

Monoparental com mais de 2 filhos de sexos

diferentes Reassentamento

2 1,60%

34 Vende picolé

Biparental com mais de 2 filhos de sexos

diferentes Reassentamento

Cascais 61 Lanches Biparental com mais de

2 filhos de sexos diferentes

Sorteio 1 0,80%

Coimbra

64 Vende moda íntima Unipessoal Reassentamento

3 2,40% 73 Bar do Seu Pedro Biparental com 1 filho Sorteio

82 Cabelereira Família Ampliada Reassentamento

Estoril 97

Artesanato Biparental com 2 filhos

de sexos diferentes Sorteio

3 2,40% 98 Pizza Família Ampliada Sorteio

102 Vende doces e balas Família Ampliada Sorteio

Évora

116 Vende doces,

refrigerante e cerveja Família Ampliada Sorteio

3 2,40% 120 Revendedora Avon e

Natura

Biparental com 2 filhos de sexos diferentes

Sorteio

123 Revendedora de

Roupas e Semi Joias Família Ampliada Sorteio

Total 14 11,20%

Fig. 06: Tabela Trabalho no Domicílio

Page 96: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

- Relação entre a forma de acesso e a Adequação Outro dado levado em consideração nessa análise foi a forma de acesso ao domicílio, que pode ser sorteio ou reassentamento. Formas distintas a essas , como aluguel ou cedido por um familiar, foram identificadas nas respostas dos questionários e classificadas como “outras”. Das famílias entrevistadas, 53,6% conseguiram o apartamento através de sorteio, 34,4% foram reassentadas e 12% acessaram o domicí lio de maneira alternativa. A partir desses dados foi montada uma tabela relacionando a forma de acesso ao domicílio à quantidade de adequados e inadequados.

Desse modo obtivemos um percentual de inadequação de 72,09% dos reassentados, 61,19% dos sorteados e 60% dos que acessaram de maneiras distintas. Apesar do grupo de reassentados apresentar um valor superior de inadequação em relação aos demais grupos, podemos considerar que os valores são próximos, podendo concluir que, independente da forma de acesso, a parcela de morados inadequados em suas moradias é alta. As tabelas referidas aqui serão inseridas na versão disponibilizada na página da pesquisa, no site do PROURB.

Forma de acesso ao domicílio (%)

Empreendimento Reassentamento Sorteio Outros

Almada 70,00% 15,00% 15,00%

Aveiro 72,73% 4,55% 22,73%

Cascais 0,00% 100,00% 0,00%

Coimbra 66,67% 11,11% 22,22%

Estoril 4,76% 90,48% 4,76%

Évora 0,00% 91,30% 8,70%

Total 34,40% 53,60% 12,00%

Figura 07: tabela forma de acesso ao domicílio

Page 97: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no

97

Figura 08: Gráfico forma de acesso ao domicílios

Relação entre a forma de acesso e a adequação dos domicílios para cada

família

Acesso Adequados Inadequados

Reassentados 27,91% 72,09%

Sorteados 38,81% 61,19%

Outros 40,00% 60,00%

Figura 09:

0,00%

20,00%

40,00%

60,00%

80,00%

100,00%

120,00%

Almada Aveiro Cascais Coimbra Estoril Évora

Formas de Acesso ao Domicílio

Reassentamento Sorteio Outros

0,00%

10,00%

20,00%

30,00%

40,00%

50,00%

60,00%

70,00%

80,00%

Reassentados Sorteados Outros

Relação entre a forma de acesso e a adequação dos domicílios para cada família

Adequados Inadequados

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98

3. Assessoria Técnica no Brasil: uma Cronologia Tentativa57 Talvez possamos estabelecer como marco do surgimento da assessoria técnica no Brasil a década de 1960, com o inovador trabalho de urbanização em favelas do Rio de Janeiro58, realizado pelo arquiteto e urbanista Carlos Nelson Ferreira dos Santos, Gilda Blank e equipe – Escritório Quadra -, através da Companhia de Desenvolvimento de Comunidades (CODESCO). Segundo Silva (2000) esta companhia, criada para atuar no âmbito estadual de habitação popular no Rio de Janeiro, dirigia suas ações exclusivamente à urbanização de favelas. Assim, Brás de Pina foi a primeira experiência fomentada por um aparato político-institucional, de modo que a sua viabilidade foi garantida pela alocação de recursos por parte do

governo estadual. Outra característica importante no processo de urbanização de Brás de Pina foi a iniciativa pioneira do Quadra em definir estratégias que promovessem a participação efetiva dos grupos sociais nas atividades de assessoria técnica, inclusive na fase de planejamento das intervenções. A maior parte da escassa literatura encontrada sobre este tema, no entanto, indica a década de 1970 – no contexto do Movimento pela Reforma Urbana – como marco histórico das primeiras discussões sobre a necessidade de serviços gratuitos de assessoria técnica para o setor da habitação popular. Segundo um manual59 de implantação de assistência técnica produzido pelo IAB em 2010, a primeira iniciativa oficial foi o programa de Assistência Técnica à Moradia Econômica (ATME), criado em 1976 pelo Sindicato dos Arquitetos do Rio Grande do Sul (SAERGS), com o

patrocínio do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia60 deste mesmo estado (CREA/RS). O ATME foi inicialmente coordenado pelos arquitetos Clovis Ilgenfritz da Silva, Newton Burmeister, Carlos Maximiliano Fayet e Claudio Casaccia, e os advogados Manuel André da Rocha e Madalena Borges. É importante ressaltar que Clovis Ilgenfritz da Silva foi o responsável pelo primeiro projeto de lei para assistência técnica no Brasil (Instituto de Arquitetos do Brasil-xx, 2010). Em 1980, movimentos sociais apoiados por equipes de profissionais da área da construção civil desenvolveram experiências de assessoria técnica coletiva na cidade de São Paulo, onde foram executados projetos e obras de conjuntos habitacionais em regime de autogestão. “Esta experiência expandiu-se por outros locais do país, já com financiamento público” (Instituto de Arquitetos do Brasil-xx,

2010 – P. 11). Neste contexto também estão inseridos os trabalhos desenvolvidos

57

Este item foi desenvolvido por Juliana Demartini, com revisão técnica de Luciana Andrade. 58

As experiências obtidas através deste trabalho foram transformadas em livro. Ver Santos (1981). 59

“Manual para a implantação da assistência técnica pública e gratuita a famílias de baixa renda para projeto e construção de habitação de interesse social” (INSTITUTO DE ARQUITETOS DO BRASIL, 2010). 60

É necessário esclarecer que os CREAs passaram a ser Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia no final do ano de 2010, com a criação dos Conselhos de Arquitetura e Urbanismo (CAUs), instaurados em janeiro de 2012, a partir da aprovação da Lei Nº 12.378/10 pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (BRASIL, 2010; CAU/BR, <http://www.caubr.gov.br>).

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99

pelo Laboratório de Habitação do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Belas Artes de São Paulo (Lab-Hab FAU/USP), criado por um grupo de professores em 1982. Bonduki (2014), um dos fundadores do Lab-Hab, aponta o trabalho desenvolvido por este laboratório como uma das primeiras iniciativas de assessoria técnica em apoio aos movimentos sociais, na luta por programas alternativos às iniciativas do governo naquele momento, como por exemplo, a autogestão e a urbanização de favelas. O Projeto Mutirão, realizado no contexto da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social do Rio de Janeiro nos anos 1980, realizou projetos de urbanização de favelas, com forte inspiração nos métodos de Carlos Nelson Ferreira dos Santos. E foi nos início dos anos 1990 que as experiências de autogestão na

produção da moradia foi realizado em São Paulo, durante o Governo da Prefeita Erundina. No final da década de 1990 algumas capitais brasileiras, como Porto Alegre, Campo

Grande, São Paulo, Vitória e Belo Horizonte, por exemplo, aprovaram leis municipais voltadas para a assessoria técnica em projetos e execução da habitação de interesse social. Neste momento, a noção de arquitetura como direito do cidadão e dever do Estado voltou a ganhar força no debate sobre a moradia popular. A partir disso, algumas Faculdades de Arquitetura e Urbanismo começaram a se mobilizar a favor da assessoria técnica, através de atividades de extensão universitária. Outras duas importantes ações no âmbito acadêmico foram a inclusão

de temas/conteúdos relativos ao direito à cidade e à moradia digna às grades curriculares, e a criação de Escritórios Modelo de Arquitetura e Urbanismo (EMAU), através da Federação dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo (FENEA), com o objetivo de assessorar famílias pobres nas questões construtivas, materiais e simbólicas relativas às suas moradias (Instituto de Arquitetos do Brasil-xx, 2010). A importância dos serviços de assessoria técnica elevou-se ainda mais no momento em que a moradia tornou-se direito social do cidadão brasileiro, através de uma emenda popular,de 2000, à Constituição Federal de 1988. Este fato, incluiu um capítulo com instrumentos de reforma urbana e de função social da cidade. O Estatuto da Cidade61, aprovado em seguida (setembro de 2001), foi outro grande marco na história da política urbana e social do país, por ter se estabelecido como

um forte instrumento para a assessoria técnica e jurídica gratuita voltada para a população pobre (Cunha et. al., 2007). O Ministério das Cidades, criado na primeira gestão do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2003, foi concebido com objetivo de articular as políticas setoriais, enfrentar a questão urbana, e promover condições favoráveis para a implementação dos instrumentos de planejamento. Para isso foram criadas quatro secretarias nacionais: Habitação, Saneamento, Mobilidade Urbana e Programas 61

LEI 10.257/01 – aprovada em julho de 2001 (BRASIL, 2001).

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100

Urbanos. As Conferências das Cidades, lançadas por este ministério neste mesmo ano, foram concebidas para instaurar a participação da sociedade nas orientações e encaminhamentos para a construção das políticas urbana e habitacional (Andrade, 2011). Com isso, foram fortalecidos os instrumentos de planejamento do Estatuto da Cidade (2001), com forte estímulo à elaboração dos Planos Diretores Participativos e também à elaboração de uma nova política habitacional, mais coerente com a realidade do país. Aprovada em 2004 a nova Política Nacional de Habitação (PNH), por sua vez, induziu a criação de vários instrumentos para viabilizar a moradia popular, como por exemplo, o Programa Crédito Solidário – criado pelo MCidades em 2004, para assegurar o financiamento habitacional destinado às famílias pobres

organizadas em cooperativas, sindicatos, associações ou entidades da sociedade civil organizada. A importância deste programa está no estímulo e possibilidades oferecidas à autogestão, autoconstrução e mutirão (Andrade, 2011; Salazar et. al., 2014).

A efetivação da PNH promoveu também a aprovação da Lei 11.124/05, pelo Congresso Nacional em 2005, referente ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS), ao Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) e ao Conselho Gestor do FNIHIS (CGFNHIS). O seu conteúdo, segundo Andrade (2011), resgatou antigos ideários dos que lutavam pela organização institucional do sistema de produção da moradia social, por garantir, entre outros benefícios,

elevados recursos para a produção habitacional. De acordo com Maricato (2006), o sistema de implementação da PNH foi dividido em dois subsistemas: o de Mercado e o de Habitação de Interesse Social. O subsistema de HIS, por sua vez, subsidiado pelos recursos do FNHIS, gerou condições para que estados e municípios ampliassem seus esforços em resposta ao problema do déficit habitacional, inclusive por meio de ações locais de autogestão e assessoria técnica. Ainda em 2005, o Ministério das Cidades juntamente com a Federação dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), o Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CONFEA), o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia

de Mato Grosso do Sul (CREA/MS) e a Caixa Econômica Federal (CEF), realizou o primeiro Seminário de Assistência Técnica no Brasil, onde foram expostas 79 experiências realizadas pelos 26 estados da federação e pelo Distrito Federal. Segundo Cunha (et. al., 2007), o objetivo deste seminário foi definir os caminhos a serem seguidos em busca de soluções para a problemática habitacional, tendo como foco a inclusão da assessoria técnica em programas públicos de HIS. O conteúdo deste seminário foi transformado em uma publicação, “Experiências em Assistência Técnica no Brasil”, pelo MCidades em 2007, tendo como destaque a

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101

discussão do Projeto de Lei que deu origem à Lei da Assistência Técnica gratuita em Arquitetura e Engenharia, aprovada em 2008 (SILVESTRE E CARDOSO, 2013). A Lei 11.888/08 foi concebida para assegurar “às famílias de baixa renda assistência técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de interesse social”. Conforme o § 1 do Art. 2 desta Lei, o direito à assistência técnica “abrange todos os trabalhos de projeto, acompanhamento e execução da obra a cargo dos profissionais das áreas de arquitetura, urbanismo e engenharia necessários para a edificação, reforma, ampliação ou regularização fundiária da habitação”. Em trâmite no Congresso Nacional desde 2001, sua elaboração se deu a partir de um projeto de lei (Nº 6.981/2006), concebido pelo arquiteto urbanista e deputado federal Zezéu Ribeiro, que teve como base outro projeto de lei desenvolvido

também por um arquiteto urbanista e deputado federal, Clóvis Ilgenfritz – um dos criadores do ATME (Cunha et. al., 2007). A aprovação da Lei da Assistência Técnica significou uma grande conquista no campo social da moradia popular (Andrade, 2011; Salazar, 2014).

A relevância da Lei 11.888/08 para as ações de redução do déficit habitacional (quantitativo e qualitativo) está indicada também no Plano Nacional de Habitação (PLANHAB), lançado pelo Ministério das Cidades em 2009. Silvestre e Cardoso (2013) apontam que, apesar de não especificar o sistema de operacionalização e o tratamento da responsabilidade técnica dos profissionais, o PLANHAB prevê o fornecimento de lotes, materiais de construção e assessoria técnica para a

execução, reforma e ampliação da moradia popular. Esta previsão pressupõe o aumento da demanda por profissionais da área da construção civil e, de certa maneira, consolida o papel social de arquitetos e engenheiros. Segundo o PLANHAB:

A assistência técnica é uma estratégia fundamental para a viabilização de uma parte da produção habitacional, em especial para o desenvolvimento de cooperativas e associações promotoras de habitação e para os autoconstrutores, uma vez que boa parte de prefeituras e estados não possui quadros técnicos de apoio para suprir esta orientação. Esse é um dos principais recursos que podem ser utilizados para ampliar qualificadamente o atendimento das necessidades habitacionais das populações de baixa renda

(PLANHAB, 2010 – P. 50). Entretanto, ainda em 2009 o MCidades criou o Programa Minha Casa, Minha Vida, com o objetivo de construir 3,4 milhões de unidades habitacionais a curto prazo em todo o país. Para atingir esta ambiciosa meta o governo federal alocou R$ 34 bilhões, recurso nunca antes investidos em uma única vez em programas habitacionais. “Realmente tratava-se de um feito inédito para o setor habitacional”,segundo Andrade (2011 – P. 114). A guinada na política habitacional alterou as perspectivas que vinham sendo traçadas anteriormente.

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102

De acordo com o MCidades, nas diretrizes estabelecidas para o direcionamento dos recursos e para a produção habitacional do PMCMV foram determinadas quatro modalidades classificadas por diferentes limites de renda bruta familiar mensal: Faixa 1, até R$ 1.600,00; Faixa 2, até R$ 3.100,00; Faixa 3, até R$ 5.000,00; e o Programa Habitacional Popular – Minha Casa, Minha Vida-Entidades62 (PMCMV-E), até R$ 1.395,00. Esta última modalidade, que recebe apenas 0,5% de todo o recurso destinado ao PMCMV, é voltada ao financiamento habitacional de movimentos e cooperativas habitacionais que, por sua vez, têm se apropriado deste recurso, utilizando também o auxílio de instituições ou programas de assessoria técnica para a concepção do projeto e acompanhamento da execução de seus empreendimentos. Em relação a isso, Laisa Stroher63 diz:

O resultado dessa parceria [Entidades e assessoria técnica] tem se refletido em avanços significativos se comparado à produção recorrente do programa [PMCMV], como a produção de unidades

habitacionais maiores com o mesmo recurso, previsão de áreas comuns (como áreas de lazer, espaço para atividades comunitárias, áreas para geração de renda), além de uma melhor apropriação dos moradores à nova casa, visto que as assessorias e os movimentos priorizam a participação ativa daqueles, durante todo o processo, da concepção à obra, como acreditamos que deve ser uma política de assistência técnica (Salazar et. al., 2014 – P. 7).

O PMCMV-E é a possibilidade oferecida pelo governo que mais se relaciona com a assessoria técnica, tema central da nossa discussão, por subsidiar empreendimentos habitacionais desenvolvidos por autogestão, autoconstrução, mutirão ou empreitada global, obrigatoriamente supervisionados por “assistência técnica especializada” (BRASIL, 2009). Diante disso, consideramos que estudos sobre empreendimentos executados através do financiamento viabilizado pelo PMCMV-E, podem nos proporcionar importantes subsídios para o desenvolvimento da nossa pesquisa.

62

De acordo com o MCidades, o Programa Habitacional Popular – Minha Casa Minha Vida - Entidades (PMCMV-E) foi criado para atender as necessidades de habitação da população de baixa renda em áreas urbanas, garantindo o acesso à moradia digna. O PMCMV-E funciona através da concessão de financiamentos a beneficiários organizados de forma associativa por uma Entidade Organizadora (EO), que podem ser Associações, Cooperativas, Sindicatos e outros, utilizando recursos do Orçamento Geral da União (OGU), aportados ao Fundo de Desenvolvimento Social (FDS). O programa pode ter ainda a recursos complementares de estados, do Distrito Federal e dos municípios (DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, 2009). 63

Diretora da Secretaria de Mobilização e Inserção Profissional da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA) (SALAZAR et. al., 2014).

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