paridade de gÊnero no poder legislativo … · de 5% do fundo partidário em promoção e difusão...
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PARIDADE DE GÊNERO NO PODER LEGISLATIVO BRASILEIRO E
COMPARADO
Aluna: Raquel Martins de Sousa
Orientadora: Adriana Vidal de Oliveira
1. Introdução:
Somente há pouco mais de 80 anos as mulheres brasileiras tiveram o direto ao voto
consolidado constitucionalmente, em 1934. Fato este, garantido através de muita luta pelas
sufragistas, onde podemos, por exemplo, citar Leolinda Daltro1, fundadora do Partido
Republicano Feminino, que persistiu para que um senador apresentasse o primeiro projeto de
lei, em 1919, em favor do sufrágio feminino, ainda que pioneiramente Francisca Senhorinha Diniz tenha trazido este assunto logo após a proclamação da República2.
A primeira deputada eleita pela Câmara dos Deputados foi Carlota Perez de Queiroz,
em São Paulo, 1934. Antonieta de Barros foi a primeira deputada estadual negra na
Assembleia de Santa Catarina (1935). A primeira senadora foi Eunice Michiles (AM), eleita
suplente, tendo assumido o cargo em 1979, em vista da morte do titular. Já Laélia de
Alcântara foi a primeira senadora negra da história e a terceira parlamentar, formando a
bancada ao lado de Eunice Michiles, em 1981. Laélia, em sua rápida passagem pelo Senado, lutou contra o aborto e o racismo.
Carlota Pereira Queiroz — primeira deputada federal — 1934
Ocorre que, ter conquistado o direito ao voto e cadeiras no parlamento brasileiro não
foram suficientes para a real inserção da mulher nos espaços políticos e de poder. A disputa
por esses espaços nunca deu-se de maneira igualitária entre homens e mulheres. Diante disto,
a necessidade de intervenção jurídica a fim de minimizar esta disparidade trouxe a aprovação
da Lei que garantiu a cota de gênero. Instituir cotas no sistema político configura em uma
modalidade de ação afirmativa cuja finalidade é, além de remediar as desvantagens históricas,
aliviando as condições resultantes de um passado discriminatório, efetivar aceleradamente a
inserção das mulheres no mundo político-partidário para que a distribuição de gênero no parlamento se aproxime da real distribuição na sociedade.
O sistema de cotas de gênero, difundido em todo o mundo visando a garantir vagas
para as mulheres no sistema político, foi adotado pelo Brasil a partir do enunciado normativo
[1] Leolinda de Figueiredo Daltro foi uma professora, feminista e indigenista baiana. Em 1910, juntamente com outras
feministas, entre elas a escritora Gilka Machado, Leolinda fundou o Partido Republicano Feminino. [2]Assim que houve a proclamação da República, Francisca Senhorinha Diniz alterou o nome do seu jornal, que passava a ser
O Quinze de Novembro do Sexo Feminino e destinou uma coluna fixa sobre o tema em todas as edições.
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do art. 10 par 3º da Lei 9504/97, no qual estabelece normas para as eleições que com a
redação que lhe foi dada pela lei 12034/2009, dispõe que “do número de vagas resultantes das
regras previstas neste artigo cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e
máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”. Além disso, é prevista a aplicação mínima
de 5% do Fundo Partidário em promoção e difusão da participação política de mulheres e a
utilização de pelo menos 10% do tempo de propaganda partidária em TV e rádio para
promover e difundir a participação das mulheres na política.
2. Objetivo:
O primeiro objetivo do trabalho consiste em analisar o real fator que influi no
predomínio dos perfis masculinos para os cargos legislativos e consequentemente, nos
recorrentes baixos índices de representatividade de mulheres na Câmara dos Deputados e
Senado Federal, o que contraria o princípio da igualdade, constitucionalizado no ordenamento
jurídico, e a ausência de igualdade de gênero na composição dos espaços políticos.
Logo após, procuraremos entender porque mesmo como a lei de cotas vigente, o Brasil
não consegue aumentar a elegibilidade das mulheres no Poder Legislativo, questionando se
existe efetivamente um compromisso com a igualdade de gênero na política, em comparado
com outros países que conseguem garantir a participação feminina no parlamento.
3. Metodologia:
O trabalho, desde seu início, foi realizado com reuniões presenciais e leitura de
bibliografia acerca das teorias feministas. Após muito debate escolheu-se o presente tema
levando em conta o cenário político brasileiro atual, em que vemos paulatinamente regredir a
representatividade da mulher na política.3
A presente pesquisa tem por finalidade fazer uma discussão sobre a participação
feminina na política Brasileira, em comparado com a Bolívia e Canadá. Esta primeira,
escolhida pois é o país com percentual mais alto de mulheres no sistema parlamentar, na
América Latina. O Canadá por sua vez, adotou recentemente a paridade de gênero nos mais
altos cargos de seu governo.
Em meados do ano passado, a paridade de gênero foi inclusa na pauta da reforma
política4. Reivindicada por representantes das bancadas femininas, defenderam a cota de no
mínimo 30% das cadeiras do Legislativo para as mulheres e que, a cada eleição esta suba mais
5%.
4. Política de cotas no mundo:
Instituir uma política de cotas de gênero na política é uma iniciativa que, além de
outros alcances, responde a esforços mundiais para promover a igualdade de gênero. Surgiu
em uma conjuntura de busca pela “democracia partidária”. O termo cotas eleitorais de gênero
foi consolidado pela Declaração de Atenas de 1992 serviu de marco para reivindicação por
maior participação de mulheres no Poder Legislativo, a princípio na Europa e expandiu-se
pelo mundo um pouco mais tarde.
[3] Recentemente, o presidente interino Michel Temer apresentou seu governo composto apenas por homens.
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/05/1770420-ministeriado-de-temer-deve-ser-o-primeiro-sem-mulheres-desde-geisel.shtml [4] http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/488283-BANCADA-FEMININA-DEFENDE-INCLUSAO-DE-
COTA-PARA-MULHERES-NA-REFORMA-POLITICA.html
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A criação dessas cotas, estabeleceu5 mundialmente um patamar de 30% para
considerar a presença mínima de mulheres no parlamento. No levantamento6 realizado com
cerca de 188 países, conseguimos identificar que a maioria deles adota alguma política de
cotas e que, naqueles onde não há cotas previstas em legislação, estas são praticadas por
iniciativas dos próprios partidos.
Um estudo comparativo entre alguns países mostra que apenas a aplicação da lei não é
suficiente para que haja incremento na quantidade de cadeiras ocupadas por mulheres. É
preciso capacitar, criar programas de apoio, além de realizar campanhas de incentivo, a fim de
despertar as condições para que elas participem dos processos decisórios do país. É
necessário, especialmente, dar acesso a recursos de financiamento de campanha, abrir espaços
nos partidos políticos para a atuação das mulheres, assegurar em lei punição aos partidos que
não cumprem o que determinam as ações afirmativas, entre outras medidas.
As cotas adotadas pelos países podem ser:
• Cotas obrigatórias previstas em lei ou cotas adotadas voluntariamente pelos partidos.
As cotas instituídas podem ser administradas da seguinte forma:
• Reserva de vagas nas listas partidárias por mandamento legal: Sistema no qual uma
parte das vagas nas listas é definida em lei. Exemplos de países que adotam esse sistema:
Brasil, Argentina, Bolívia, Equador, França, Irlanda e México. Note-se que nem sempre a
reserva de vagas na lista garante que as mulheres ocuparão as posições de elegibilidade. A
relação é favorável à participação das mulheres de modo incontestável apenas quando os
países definem na lei eleitoral a alternância de gênero, o que só é possível em listas pré-
ordenadas ou fechadas.
• Reserva de cadeiras nas Casas legislativas: As vagas são preenchidas por meio de
uma lista eleitoral à parte, composta apenas de mulheres, e os assentos são distribuídos de
acordo com a votação que cada partido obtém em relação à lista. Adotam essa modalidade
Afeganistão, Bangladesh, China, Eritreia, Jordânia e Quênia. Também é possível reservar as
vagas e estabelecer cotas de ocupação, independentemente da forma de apuração. Não seria
possível no chamado sistema distrital, praticado nos Estados Unidos, mas, nos demais
sistemas, seria viável uma cota desse tipo.
• Reserva voluntária de vagas em lista partidária: corresponde a uma prática
disseminada nas mais diversas democracias, sendo predominante naquelas mais consolidadas
do mundo.
Atualmente, 54 países adotam cotas legais sobre seus processos eleitorais para as
Câmaras Baixas7 ou Únicas de seus parlamentos , expandindo-se o número para 60 quando se
consideram os países que também adotam esse tipo de cota para a Câmara Alta e/ou para o
nível subnacional.
[5] Resolução do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas estabeleceu, em 1990, a meta de alcançar 30% de
mulheres em posições de tomada de decisões, em todos os níveis, até 1995, e 50% até 2000. [6] Dados do IPU (Inter-Parlamentary Union) [7] IDEA, IPU, Stockholm University. Atlas of Electoral Gender Quotas, 2013. (Acessível em:
http://www.idea.int/publications/atlas-of-electoral-gender-quotas/)
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O simples aumento quantitativo de candidatas não gera o necessário resultado de
aumento de parlamentares eleitas, sendo fundamental que a lei disponha de mecanismos que
(i) estabeleça incentivos ou sanções para o cumprimento ou descumprimento das disposições
legais, de forma suficiente para afetar a avaliação dos selecionadores partidários na sua
análise de custobenefício de adimplência; e (ii) garanta as condições de exigibilidade das
candidatas por meio da criação de critérios de posicionamentos e classificações para as listas partidárias.
4.1. Cotas eleitorais de gênero no Brasil:
No Brasil, a legislação eleitoral e partidária estimula a participação feminina na
política através dos seguintes meios:
• Estabelece um percentual mínimo de 30% de candidaturas de cada sexo8.
• Impõe a aplicação de, no mínimo, 5% dos recursos do Fundo Partidário na
criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das
mulheres9.
• Determina que, no mínimo, 10% do tempo de propaganda partidária gratuita no
rádio e na televisão seja destinado à promoção e à difusão da participação política feminina10.
Na prática a regra significa que no mínimo, 30% das vagas deveriam ser preenchidas
por mulheres. No entanto, esse percentual nunca foi alcançado. No gráfico abaixo podemos
perceber que embora o Brasil tenha assistido uma elevação na representação política das
mulheres para o cargo de deputada federal desde meados do século passado, esse percentual
oscila entre números bastante pífios.
[8] (artigo 10, § 3º, da Lei 9.504, de 1997)
[9] (artigo 44, inciso V, da Lei 9.096, de 1995, com redação dada pela Lei 12.034,w de 2009)
[10] (artigo 45, inciso IV, da Lei nº 9.906, de 1995, com redação dada pela Lei 12.034, de 2009)
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Figura 1 – Quantidade e porcentagem de mulheres eleitas para o cargo de deputada federal – Brasil, 1945-2014. (Fonte: Tribunal Superior Eleitoral. Baseado em Oliveira, 2011).
No senado, podemos verificar que nas eleições de 2014, onde concorreram ao cargo
34 mulheres e 138 homens. Saíram vitoriosas 5 delas e 22 deles. Isso corresponde a 18,5% de
mulheres eleitas, conforme tabela abaixo. Dado que estas 5 juntaram- se às outras sete
previamente eleitas, temos no senado 1211 mulheres, ante 69 homens o que leva a percentual
de 14,8%. Recorde de representação feminina no senado até hoje.
Figura 2 – Proporção de mulheres e homens eleitos/as para o cargo de senador/a nas eleições de 2014 – Brasil. (Fonte: Secretária Especial de Políticas para Mulheres)
O que é portanto, determinante, para que ainda que com sistema de cotas, não haja
garantia do percentual mínimo de mulheres nestes espaços? Segundo o último censo do
IBGE, quase cinquenta e um por cento da população brasileira é do sexo feminino. Apesar de
sermos maioria populacional, e, portanto, termos relevância quantitativa, não temos a
relevância qualitativa e principalmente no que tange à representatividade parlamentar. Não
participamos da elaboração de leis e normas. Estamos inseridas no meio de produção, em
duplas, quiçá triplas jornadas de trabalho, no entanto, estamos fora dos meios que definem o
futuro de nosso país.
A pequena presença da mulher na política vem seguida do senso comum que tenta
justificá-la por meio de falsas afirmações como a que esta deve-se ao “desinteresse da
mesma” ou que ela não tem “vocação para a política” ou ainda que “mulher não vota em
mulher” baseadas em estereótipos machistas e sexistas que resultam de séculos de
discriminação imposta ao gênero feminino. Logo, o processo de inserção da mulher na
política inicia-se na desconstrução desta cultura de discriminação para que verdadeiramente e
de forma democrática, as mulheres ocupem os espaços políticos e de poder proporcionalmente
à sua quantidade e papel na sociedade. Além disso, o perfil do potencial candidato a ser eleito
[11] Fonte: https://www25.senado.leg.br/web/senadores/em-exercicio
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tende a seguir características tradicionais como masculina, pertencer a certos grupos étnicos,
sociais e econômicos. Em sistemas eleitorais como no Brasil, onde são estabelecidas listas
abertas para os pleitos proporcionais, cria um ambiente onde a importância maior não é ter
uma vaga para concorrer, mas sim o capital político e principalmente financeiro para garantir
sua concorrência.
Isso faz com que fatores objetivos e subjetivos rompam com a ideia de paridade que
parte de uma concepção de justiça democrática na qual todos os sujeitos de uma sociedade
possam interagir uns com os outros como pares. Como condição objetiva temos a distribuição
de recursos materiais para que estes sejam independentes entre si. Neste contexto já sabemos
que as mulheres pertencem ao grupo onde formas e níveis de dependência econômica
institucionalizam a exploração e autorizam a enorme disparidade de concentração de riqueza,
renda e tempo livre. Já a condição subjetiva vem da institucionalização de normas culturais
que efetivam esta paridade entre os sujeitos e garantam igual oportunidades no campo social.
Além do que, como Judith Butler explica em sua teoria, isto ocorre a partir da
naturalização do processo de constituição das identidades de gênero12. É possível então
perceber que o gênero está continuamente demarcando o processo do papel que cada um teria
na sociedade. Os papéis de poder, ao que podemos ver, estão sempre nas mãos do homem,
que dentro da relação de gênero e sexo biológico está na posição de dominação social.
A garantia institucional do direito de voto e de participação nas esferas de poder (cotas
e paridade) convive com elementos patriarcais na cultura política que, relacionados a déficits
em sistemas políticos, eleitorais e partidários, incidem restritivamente, no acesso das mulheres
a cargos eletivos e à vida pública.
Ainda em relação à legislação eleitoral, entre a participação feminina e as regras
eleitorais estão presentes fatores que tem sido observados em experiência internacional.
Alguns dispositivos legais podem influenciar e determinar uma efetiva participação das
mulheres no poder legislativo, como por exemplo, o financiamento democrático de campanha.
O financiamento privado de campanhas estabelece um viés excludente da participação de
mulheres. Os Estados Unidos, por exemplo, que possui este modelo de financiamento tem a
menor participação destas, entre as democracias consolidadas13.
No que tange à aplicação dos recursos do Fundo Partidário na promoção da
participação feminina e a utilização de 10% do tempo de TV e rádio 14, segundo informações
do TSE, alguns partidos não vêm cumprindo o que estabelece a Lei, ou se cumprem, não
fazem o devido registro:
As informações de despesas foram obtidas exclusivamente dos demonstrativos publicados na página eletrônica do TSE, apresentados a este
tribunal pelos próprios partidos. Uma vez que as contas ainda não foram
julgadas, não foi objeto dessa análise a regularidade na aplicação dos
recursos em programas da mulher, o que poderia impactar no percentual aplicado.
Informa-se que o PCO não recebeu recursos do Fundo Partidário no
exercício de 2010 e que os partidos PPL, PSD e PEN somente foram registrados no TSE em 2011 e 2012.
[12] O argumento central da teoria feminista produzida por Butler é desenvolvido a partir dos atos performativos, uma vez que eles, a
princípio, possuem a função de naturalizar o processo de constituição das identidades de gênero. Tal diferenciação se reflete até mesmo na
divisão do trabalho e ao se compreender esse mecanismo é possível entender, posteriormente, as diferenças entre as expectativas sociais em
relação ao comprometimento de homens e mulheres em seus núcleos familiares, entre outras questões. [13] Dados do IPU [14] Art 44 Lei 9.096 de 1995.
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Dados TSE
De acordo com os dados podemos ver que o determinado em Lei não vem sendo
cumprido pela maioria dos partidos e portanto, não tem auxiliado na efetivação da
participação feminina no legislativo. Isto ocorre também em razão da falta de sanção legal
rígida por parte dos órgãos executivos, dificultando cada vez mais a paridade de gênero no
Brasil.
Infelizmente, os números só têm piorado diante deste cenário excludente e
absolutamente não democrático nem republicano. Em 2014, 9,9% das cadeiras ocupadas na
Câmara dos Deputados eram compostas por mulheres. Já no Senado Federal, estas ocupavam
18,5% das mesmas. Levantamentos feitos em Dezembro/2014 pela Inter-Parliamentary Union
(União Interparlamentar Mundial) apresentam o Brasil na 158ª posição dentre os 188 países.
Quando comparado com seus vizinhos latino-americanos a situação continua torpe,
apresentando a penúltima pior situação, perdendo apenas para o Haiti. Temos menos mulheres
no Legislativo que o Oriente Médio. Apesar de o Brasil ter sua primeira presidente mulher, a
UIP alerta que a representação democrática está abaixo dos padrões internacionais.
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Tratando-se da América Latina, a Bolívia é o país com maior representatividade
feminina no Parlamento, com 53,1% de representantes na Câmara e, 47% no Senado. O país
foi o único entre seus vizinhos a implementar a lei de paridade aplicada pela primeira vez nas
eleições de 2014, na qual todas as listas de candidatura devem alternar homens e mulheres.
Recentemente, o Canadá implementou um novo governo em que metade dos
ministérios são compostos por mulheres, pela primeira vez. As mulheres receberam pastas
estratégicas, como de Comércio Internacional. O Ministro ainda deu como resposta às
indagações sobre esta “escolha” o motivo de o governo do Canadá precisar ter “cara de
Canadá.” Em suma, num país onde 50,4% da população é composta por mulheres, pela
primeira vez há representatividade deste quantitativo governando o país.
4.2. Representatividade feminina no Legislativo da Bolívia e Canadá
Segundo dados da União Interparlamentar, a América Latina sempre apresentou baixo
índice na representatividade feminina no Parlamento até os anos 2000. A partir daí os
números começaram a mudar e em 2014, o continente americano já havia ultrapassado os
demais continentes, inclusive o da Europa, que até 2006 liderava o ranking com 29 % de parlamentares femininas.
Fonte: IPU (2015) *Países com sistema Unicameral
**Dados não disponíveis
Conforme tabela acima vemos que o Brasil foi o país que menos evoluiu nos números.
E hoje, a Bolívia é o país das Américas que possui a porcentagem mais alta de participação
feminina no Legislativo, destacando-se assim por seu alto grau de inclusão das mulheres na
política.
De acordo com o Código Eleitoral boliviano, tanto a lista de candidaturas principal
quanto a de suplências com mais de uma candidatura para eleições na Câmara dos Deputados
deve incluir, de maneira alternada, igual número de homens e mulheres. Se a lista é composta
por um número ímpar de candidaturas, a preferência deve ser dada à mulher. A Bolívia adota
o bicameralismo, com a adoção do sistema misto, de lista fechada. Na Câmara dos Deputados,
a porcentagem de mulheres é de 53%. Já no Senado, a porcentagem é de 47%. Além disso, as
cotas são aplicadas na mesma proporção nas eleições regionais.
Este modelo deu-se à cobrança do movimento de mulheres na Bolívia, desde 1980,
onde deram início à Confederação Nacional de Mulheres Campesinas e Indígenas da Bolívia
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Bartolina Sisa15, que surge a partir da “dupla discriminação” sofrida pelas mulheres
campesinas, que passaram a sentir a necessidade de lutar pelos direitos fundamentais e pela
participação feminina na tomada de decisão. Desta forma, entre os objetivos seguidos pelo
grupo estão a “adoção da igualdade de gênero como forma de vida entre homens e mulheres”
e também a eliminação de “barreiras mentais discriminatórias”16.
Em 2009, com a reformulação da política de cotas, ficou obrigatório que as
candidaturas deveriam ser alternadas entre homens e mulheres, estabelecendo assim a política
de paridade e alternância que tem surtido efeito. No ano passado, a Câmara dos Deputados
elegeu, a primeira mulher como presidenta da Casa. Esta mobilização e reivindicação por
parte das mulheres, acirrou a necessidade de aumento de políticas publicadas voltadas a este
grupo aprovando, por exemplo, normativas para que as mulheres tenham direito à propriedade
da terra, o que antes não estava consolidado17.
Desde então, através destas políticas, a Bolívia tem conseguido garantir a efetividade
desta paridade nos espaços de poder, comprovando assim que apenas implementar cotas de
gênero não é suficiente se não vier acompanhada de ações que visem a eliminar a
discriminação histórica sofrida pela mulher.
Ainda na América, recentemente o Canadá nomeou um governo igualitário na
formação do Governo de Trudeau que venceu a eleição em outubro do ano passado com
promessas de renovação e igualdade. O governo, que tem 30 ministérios, foi dividido entre 15
homens e 15 mulheres. Além de ser composto proporcionalmente por mulheres e homens, o
ministério também é diverso na questão religiosa e pela primeira vez também é composto por
Mulçumanos e pertencentes das Primeiras Nações.18 Ao ser indagado do motivo deste
governo, Trudeau respondeu que é “Um governo que é imagem do Canadá.”
Diante de um cenário mais democrático e inclusivo, as mulheres se viram na condição
de reivindicar mais direitos. Recentemente, um grupo de feministas pediram ao primeiro-
ministro canadense que preenchesse as vagas do senado exclusivamente com mulheres até
que existisse de fato uma paridade nesta casa.
Vemos que à medida em que espaços são conquistados, as mulheres ganham força
para pleitear mais avanços.
[15] Bartolina Sisa era esposa de Túpac Katari, importante líder do movimento indígena [16] Agencia Plurinacional de Comunicación [17] Constituição de 2009 normatizou direitos das mulheres à propriedade de terra. Antes esse direito pertencia apenas aos homens. [18] Primeiras Nações, são conhecidas as etnias nativas que habitavam o Canadá, antes da chegada dos europeus.
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Conclusão:
Analisando ainda o que já foi tratado é possível afirmar que os sistemas de cotas de
representação têm mostrado um bom resultado, principalmente nos países, que contam com
maior atuação dos grupos de mulheres. Foi a partir da busca pelos direitos da mulher, que
muitas perceberam na atuação política uma forma institucionalizada de representar seus
interesses, influenciando diretamente políticas públicas, como foi o caso da Bolívia.
Dessa forma, é preciso levar em conta que no Brasil, a falta de envolvimento com a
política local é quase cultural e não apenas um mal relacionado às mulheres, porém, os
homens acabam vendo maiores possibilidades na carreira política enquanto, devido questões
anteriormente levantadas como a dupla jornada e a falta de interesse político, as mulheres
tendem a buscar outras áreas de atuação. Assim sendo, não se pode imaginar que uma
modificação no sistema político seria o mais apropriado, como a alteração de cotas partidárias
para cotas de acentos reservados por exemplo. Pelo contrário, não ocasionaria grandes
mudanças, pois não haveria alteração na estrutura, seria algo imposto e não modificado,
podendo assim ocasionar a ocupação das cadeiras, por mulheres que não venham a defender
interesses femininos. Do mesmo modo, a cultura patriarcal fortemente enraizada na população
brasileira somada a um sistema eleitoral de lista aberta, afeta diretamente a eleição das
mulheres. Ou seja, a prática comum de “preencher” as vagas destinadas às mulheres, acaba
colocando nas listas, mulheres que nem sempre têm um histórico de atuação na política, ou
em causas inerentes ao público feminino, ou a sociedade em geral. Isto ficou evidenciado por
exemplo, na Assembleia Constituinte, onde parte das mulheres Constituintes não tinham
ligação nenhuma com o movimento feminista. Parte delas conseguiu relevante apoio popular
em virtude de terem desempenhado funções assistencialistas em governos de seus maridos (OLIVEIRA, 2012)19.
Desse modo, a criação de cotas de assento no Brasil, poderiam apenas alterar o cenário
dessa prática, de dentro dos partidos para as assembleias legislativas. Assim, a chamada para
atuação das mulheres na política deve se dar de forma mais complexa e anterior a filiação das
mesmas. A elaboração de projetos e incentivos a criação de grupos regionais que tratem de
temas importantes à mulher, são formas de se criar uma boa base para a autonomia da política
feminina, além de dar espaço para discutir o papel exercido pela mulher na sociedade. Os
países analisados já provaram que organizações de mulheres têm exercido importante
influência nas políticas públicas e feito valer a lei de cotas. O Brasil já deu o primeiro passo
com a adoção da lei, agora é hora de tornar público questões de interesse das mulheres que há
muito vêm sendo pautadas pelo movimento feminista, instigando a classe a dialogar a respeito e posicionarem-se.
Enquanto que no Brasil ainda se faz necessária a conscientização social da importância
da participação feminina, na Bolívia as mulheres têm atuado cada vez mais em projetos
pautados neste tema, buscando maior participação nas esferas decisórias, interesse esse que
surge a partir do momento que percebem que sua atuação no mercado de trabalho é tão
importante para a economia local quanto é a do homem, e que por esse motivo deveriam ser
tratadas como cidadãs, com o mesmo respeito que era dado aos demais. Ou seja, fica claro
que é a partir do “empoderamento” feminino que surge a conscientização de que a igualdade
de gênero é necessária, e que um meio de se alcançar isso seria através da política. Do mesmo
[19] OLIVEIRA, Adriana Vidal. A Constituição da Mulher Brasileira Uma análise dos estereótipos de gênero na Assembleia Constituinte de 1987-1988 e suas consequências no texto constitucional. 2012. pg 204.
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modo, a atuação dos movimentos sociais é de grande importância para uma percepção
positiva da sociedade em relação as modificações que devem ser realizadas. Quanto aos
países que adotaram a lei de cotas partidárias, mas ainda não presenciaram grandes mudanças,
como é o caso do Brasil, se faz necessário fortalecer projetos voltados para diminuição da
desigualdade de gênero e dar maior atenção às demandas levantadas pelo movimento
feminista de forma a permitir que as mulheres tomem consciência de sua importância nas bancadas e passem a se envolver cada vez mais na esfera política.
Deve-se considerar, também, a plataforma de ação das candidatas mulheres e o que
vem sendo proposto nessas campanhas, com o objetivo de analisar se questões de interesse do
público feminino vêm sendo abordadas, de modo que essas quando eleitas, exerçam uma
política de ideias e não apenas de presença.
Conclui-se que muito antes da modificação do sistema de cotas brasileiro, uma maior
atenção a questões de igualdade de gênero se faz necessária, do mesmo modo que uma melhor
análise da presença de mulheres dentro dos partidos, também é importante, já que, uma vez
que existam filiadas e candidatas, mesmo que em número inferior aos homens, logo, o
problema não está na entrada de mulheres nesse meio.
No atual cenário político em que a primeira presidenta eleita foi afastada de seu cargo
e substituiu-a seu vice Michel Temer, temos um governo onde nenhum ministério é ocupado
por mulheres. Desta forma percebemos que os baixos índices de representatividade feminina
no Congresso Nacional brasileiro em suas tendências atuais não sofrerão alteração e melhora
significativa sem as devidas intervenções. Demonstram ainda que a preocupação da ONU e
outros entes internacionais é fundamentada sob a denotação da naturalidade com que lidam
com a desigualdade de gênero no atual governo. Busca-se aqui esclarecer o significado da
representação de mulheres e oferecer argumentos adicionais à ideia de que tais práticas
representativas diferenciadas são um importante instrumento de inclusão política.
A procuradoria Especial da Mulher no Senado Federal tem como proposta a“reserva
de vagas na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, nas Assembléias Estaduais, na
Câmara Legislativa do Distrito Federal e nas Câmaras Municipais, começando com 30% e
elevando-se gradualmente até que a plena equidade seja alcançada (50%). A proposta inclui
ainda o financiamento democrático de campanha com reserva de 30% dos recursos do Fundo
Partidário para financiar candidaturas femininas e a previsão legal de punição para os partidos
que não cumprirem as leis quanto a cotas de gênero.”20
Superar os fatores que influenciam a baixa participação das mulheres no Poder
Legislativo deve ser a principal intervenção a ser feita. No que tange à situação a mulher na
sociedade a elevada carga de trabalho, com a tripla jornada; o caráter machista da sociedade e
o domínio masculino dos partidos políticos são os principais desafios. Quanto às leis
afirmativas as falhas são, na ineficiência dentro do atual sistema brasileiro de cotas; a baixa
alocação de recursos nas campanhas das mulheres; a falta de punição aos partidos que não
cumprem a legislação e a falta de formação e campanhas de conscientização.
Referências:
<http://www.ipu.org/wmn-e/world.htm>
[20] http://www12.senado.gov.br/senado/procuradoria/
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HARAWAY, D., Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da
perspectiva parcial.
YOUNG, I. M., Representação Política, Identidade e Minorias.
OLIVEIRA, Adriana Vidal. A Constituição da Mulher Brasileira Uma análise dos
estereótipos de gênero na Assembleia Constituinte de 1987-1988 e suas consequências no
texto constitucional. Rio de Janeiro, 2012. Tese de Doutorado. Faculdade de Direito, PUC
RIO.
SANTOS, Marina França. A Importância Da Diversidade De Gênero Nos Tribunais
Superiores Brasileiros: o princípio da imparcialidade forte a partir da standpoint theory. Rio
de Janeiro, 2016. 303p. Programa de pós-graduação. Faculdade de Direito, PUC RIO.
DE VASCONCELLOS, Luciana Carpilovsky. O compromisso político-partidário com a
igualdade de gênero.Rio de Janeiro, 2015.86p. Monografia. Faculdade de Direito, PUC RIO.
Procuradoria Especial da Mulher do Senado Federal. + Mulheres na Política.