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PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL

PARA SABER MAIS

IPHAN/ MinC

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PRESIDENTA DA REPÚBLICA DO BRASIL

Dilma Rousseff

MINISTRA DE ESTADO DA CULTURA

Ana de Hollanda

PRESIDENTE DO IPHAN

Luiz Fernando de Almeida

DEPARTAMENTO DO PATRIMÔNIO IMATERIAL

Célia Maria Corsino

COORDENAÇÃO-GERAL DE IDENTIFICAÇÃO E

REGISTRO

Ana Gita de Oliveira

COORDENAÇÃO-GERAL DE SALVAGUARDA

Teresa Maria Cotrim de Paiva-Chaves

CENTRO NACIONAL DE FOLCLORE E

CULTURA POPULAR

Cláudia Márcia Ferreira

FICHA TÉCNICATEXTO E REDAÇÃO FINAL

Natália Guerra Brayner

REVISÃO DE CONTEÚDO

Maria Cecília Londres Fonseca

REVISÃO E ATUALIZAÇÃO DE CONTEÚDO

PARA 3ª EDIÇÃO

Natália Guerra BraynerRívia Ryker Bandeira de Alencar

CAPA

Detalhe das fotos: Liga Independente debonecos de Olinda, de Passarinho; Rodado jongo de Tamandaré, de FranciscoCosta; Oficinas Maramara, de DeniseGrupione e Porta-lápis - Setor Coraci.Acervo Etnográfico do Programa deArtesanato do Instituto deDesenvolvimento Sustentável Mamirauá-IDSM.

Desenhos iconográficos: Hector JulioParide Bernabó (Carybé).

PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO

Raruti Comunicação e Design/Cristiane Dias

Instituto do Patrimônio Histórico eArtístico NacionalDepartamento do Patrimônio ImaterialSEPS Quadra 713/913 Sul/Bloco D -4º Andar. Brasília-DF. CEP 70390 135Telefones: (61) 2024 5401 / 2024 5402www.iphan.gov.br

3ª Edição revista e atualizadaBrasília, março de 2012.

I59p Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).Patrimônio Cultural Imaterial : para saber mais / Instituto do Patrimônio Histórico e

Artístico Nacional ; texto e revisão de, Natália Guerra Brayner. -- 3. ed. -- Brasília, DF :Iphan, 2012.

36 p. : il. ; 21 cm.

ISBN: 978-85-7334-210-9

1. Patrimônio Cultural. 2. Patrimônio Imaterial. I.Brayner, Natália Guerra. II. Título.

CDD 363.69

C R É D I T O S

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S U M Á R I O

APRESENTAÇÃO 05

INTRODUÇÃO 07

PATRIMÔNIO DE QUEM E PARA QUÊ 12

CUIDANDO DO QUE É NOSSO 18

O INVENTÁRIO NACIONAL DE REFERÊNCIAS CULTURAIS – INRC 20

O REGISTRO DOS BENS CULTURAIS DE NATUREZA IMATERIAL 22

O INVENTÁRIO NACIONAL DA DIVERSIDADE LINGUÍSTICA - INDL 25

O PROGRAMA NACIONAL DO PATRIMÔNIO IMATERIAL – PNPI 27

A SALVAGUARDA DE BENS CULTURAIS REGISTRADOS 28

O IPHAN CUIDA E NÓS...TAMBÉM! 30

APOIO E FOMENTO 31

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 34

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A P R E S E N T A Ç Ã O

“Patrimônio é tudo o que criamos, valorizamos equeremos preservar: são os monumentos e obras de arte,e também as festas, músicas e danças, os folguedos e as

comidas, os saberes, fazeres e falares.Tudo enfim que produzimos com as mãos, as idéias e a

fantasia”.

Cecília Londres

Ao propor práticas e estratégias para a salvaguarda de bensculturais de natureza imaterial, o Iphan enfrenta o desafio detrabalhar na perspectiva de reconhecimento e valorização dasdiversificadas e dinâmicas referências culturais de diferentesgrupos formadores da sociedade brasileira.

A presente publicação se propõe a divulgar as diretrizes einstrumentos que norteiam e tornam possíveis as atividades deidentificação, registro e salvaguarda do patrimônio imaterial. Dessemodo, o Iphan pretende também promover uma reflexão críticasobre essa política, de forma que todos os leitores percebam aimportância da contribuição de cada um de nós, por meio dacriatividade e do diálogo permanente, para o aperfeiçoamentodessas estratégias e instrumentos de salvaguarda e sua adequaçãoaos contextos específicos de cada bem cultural.

Artesanato produzido por herdeiros de Mestre Vitalino. Feira de Caruaru, Caruaru-PE. Aurélio Fabian, 2005.Acervo Iphan.

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Ao lado: Baiana de Acarajé na Festa de Santa Bárbara. Largo do Pelourinho, Salvador-BA. FranciscoMoreira da Costa, 2004. Acervo Iphan. Nesta página: Peixes. Yrowaite Wajãpi, 2000. Espinha deanaconda e sapos. Kumai Wajãpi, 1983. Espinha de anaconda. Waivisi Wajãpi, 1983. Arte gráficakusiwa do povo indígena Wajãpi do Amapá.

I N T R O D U Ç Ã O

Entende-se por cultura todas as ações por meio dasquais os povos expressam suas “formas de criar, fazere viver” (Constituição Federal de 1988, art. 216). Acultura engloba tanto a linguagem com que aspessoas se comunicam, contam suas histórias, fazemseus poemas, quanto a forma como constroem suascasas, preparam seus alimentos, rezam, fazem festas.Enfim, suas crenças, suas visões de mundo, seus saberes e fazeres.Trata-se, portanto, de um processo dinâmico de transmissão, degeração a geração, de práticas, sentidos e valores, que se criam erecriam (ou são criados e recriados) no presente, na busca desoluções para os pequenos e grandes problemas que cadasociedade ou indivíduo enfrentam ao longo da existência.

As pessoas fazem parte de diferentes grupos sociais, cujo alcancepode ou não ser local: o grupo da igreja, o grupo de fundadoresda cidade, o grupo dos comerciantes, o grupo das mulheres, ogrupo dos seringueiros, entre outros. Assim, durante sua vida, aspessoas constroem suas identidades ao se relacionarem umascom as outras em diferentes contextos e situações. A identidade deuma pessoa é formada com base em muitos fatores: sua históriade vida, a história de sua família, o lugar de onde veio e ondemora, o jeito como cria seus filhos, fala e se expressa, enfim, tudoaquilo que a torna única e diferente das demais.

Algo semelhante acontece com um grupo social. As pessoas decada grupo social compartilham histórias e memóriascoletivas, visões de mundo e modos de organizaçãosocial próprios. Ou seja, as pessoas estão ligadas por umpassado comum e por uma mesma língua, por costumes,crenças e saberes comuns, coletivamente partilhados. Acultura e a memória são elementos que fazem com que

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as pessoas se identifiquem umas com as outras, ou seja,reconheçam que têm e partilham vários traços em comum. Nessesentido, pode-se falar da identidade cultural de um grupo social.

Quando alguém é identificado como wajãpi, por exemplo,apresenta uma série de características deste povo indígena como ojeito de falar, o uso de adereços ou pinturas no corpo, o modo deconstruir casas, as formas de celebrar, de narrar os mitos que sãocontados pelos mais velhos aos jovens. No Brasil, existem cerca de220 povos indígenas diferentes, com costumes, tradições, línguase histórias também diferentes. Quanto mais se conhece e aprendesobre esses povos, mais se aprende a identificar e valorizar asdiferenças entre eles.

Nem sempre, porém, as pessoas “falam” tão claramente para asoutras sobre a sua identidade. Não porque tenham vergonha ounão se sintam identificadas com os aspectos da sua cultura. É quepara elas tudo é vivido de forma tão natural, no dia-a-dia, que, anão ser que precisem se defender contra o preconceito, ou seafirmar entre pessoas que ainda não as conhecem, não sentemnecessidade de anunciar suas características particulares, suasmarcas de distinção, o que as diferencia de outros grupos sociais,de outras comunidades. O que torna uns diferentes dos outros, àsvezes, pode ser reconhecido nas coisas mais simples, como asvárias maneiras de fazer farinha, os diferentes modos de construirbarcos, de tecer redes, de fazer renda, de contar uma história.

O modo de ser das pessoas, sua cultura, vai muito além dasaparências que reconhecemos à primeira vista, ou seja, de seu

À esquerda: Feira de Flandres na Feira de Caruaru. Aurélio Fabian, 2003. À direita: Rua José Paulino,bairro do Bom Retiro, São Paulo-SP. João Bacellar, 2005. Acervo Iphan.

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PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 9

modo de vestir, dos lugares que freqüentam, de seus costumes ecrenças. Por exemplo, tomemos os motoboys, que percorrem asruas das cidades com seus capacetes e suas roupas de couro.Quando tiram essa sua roupa, no seu tempo livre, provavelmentevão se dedicar às mais variadas atividades: uns vão freqüentar umculto religioso, outros vão a bares, outros a bailes funk ou forrós,etc. Provavelmente, a grande maioria vai frequentar algumasdessas e muitas outras atividades. Tomemos outro exemplo: umapessoa que migrou do sertão nordestino para uma cidade grandedo sudeste certamente vai assimilar novos hábitos e costumes,talvez até mude algumas de suas crenças e valores, mas é muitoprovável que conserve traços e apego à sua cultura de origem, oque a tornará ao mesmo tempo próxima mas, por outro lado,diferente das pessoas que permaneceram em sua terra natal. Domesmo modo, reconhecer que todos os povos produzem cultura eque cada um tem uma forma diferente de se expressar é aceitar adiversidade cultural. Ou seja, é reconhecer que não existemculturas mais importantes, ou melhores que outras, e sim culturasdiferentes!

O Brasil é um país de grande diversidade cultural. Issoporque, na nossa história, vários grupos étnicos e sociaisparticiparam da formação do país e ofereceram diferentescontribuições culturais: povos indígenas, portugueses, holandeses,italianos, africanos, árabes, japoneses, judeus, ciganos, entreoutros. As culturas que essaspessoas trouxeram nos seusmodos de ser, nas suas visõesde mundo, nas suas memórias,foram transformadas no con-tato com outras culturas jáaqui presentes e tambémcausaram transformações nes-sas culturas. Dessa forma,participaram da formação dacultura brasileira, tão plural ericamente diversa.

Liga Independente de Bonecos, Olinda-PE. Acervo Iphan.

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Durante um longo período, essadiversidade cultural do Brasil nãofoi valorizada. Afirmava-se,quando muito, uma identidadenacional formada a partir dacontribuição de três raças: aindígena, a portuguesa e aafricana. Isso começou a mudarquando, na década de 1920 doséculo XX, um grupo de artistase intelectuais se reuniu no queveio a se chamar de MovimentoModernista, que passou a bus-car e a valorizar as diferentesraízes da cultura brasileira.Integrantes desse movimentotambém participaram, em 1937,da criação do então Serviço doPatrimônio Histórico e ArtísticoNacional – SPHAN, entre osquais merece destaque o es-critor e pesquisador Mário deAndrade. Hoje, com o nome deInstituto Histórico e ArtísticoNacional, o Iphan desenvolveações de preservação do pa-trimônio cultural em todo oterritório nacional.

Ao longo destes mais de 70anos de existência, o Iphan temtrabalhado no sentido dereformular e aperfeiçoar suasestratégias de atuação paraatender aos novos desafios edemandas que surgem, na

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Mário de Andrade(1893-1945) estudou literatura,música, artes plásticas, folclore,arquitetura e foi também umgrande escritor brasileiro. Eleviajou pelo país filmando,fotografando e escrevendosobre danças, canções,“causos”, lendas, etc. A obradeixada por Mário de Andradeevidencia que ele procuravaassociar conhecimento ereflexão com ações dereconhecimento e valorizaçãoda cultura enquanto elementoessencial da identidade denosso povo. Mário de Andradefoi autor do anteprojeto decriação Serviço do PatrimônioArtístico Nacional e participoudas primeiras ações realizadaspor essa instituição. Entre 1941e 1945, foi diretor da regionaldo Iphan em São Paulo.

Ainda na primeira metade doséculo XX, outros importantespesquisadores da culturapopular, como CâmaraCascudo (1898-1986), GilbertoFreyre (1900-1987), SílvioRomero (1851-1914) e ÉdisonCarneiro (1912-1972), tambémproduziram conhecimento edocumentação de festas,costumes, técnicas de produçãode barcos, tecidos, rendas,enfim, de saberes e fazeresenraizados no cotidiano dascomunidades pelo Brasil afora.

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PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 11PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 11

medida em que as noções de cultura, povo, identidade, nação epatrimônio são reinterpretadas e ampliadas. Isso significa dizer queo entendimento do que é patrimônio cultural é construído aolongo do tempo, a partir de reflexões sobre as experiências depreservação e pesquisas realizadas pelo próprio Iphan e tambémpor outras instituições, nacionais e internacionais, que atuam nessecampo, assim como a partir da observação e incorporação deiniciativas dos diferentes setores da sociedade.

Tambor de Crioula no Maranhão. Edgard Rocha, 2005. Acervo Iphan.

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PATRIMÔNIO DEQUEM E PARA QUÊO patrimônio cultural de um povo éformado pelo conjunto dos saberes,fazeres, expressões, práticas e seusprodutos, que remetem à história, àmemória e à identidade desse povo. Apreservação do patrimônio culturalsignifica, principalmente, cuidar dosbens aos quais esses valores sãoassociados, ou seja, cuidar de bensrepresentativos da história e da culturade um lugar, da história e da cultura deum grupo social, que pode, (ou, maisraramente não), ocupar um deter-minado território. Trata-se de cuidar daconservação de edifícios, monumentos,objetos e obras de arte (esculturas,quadros), e de cuidar também dos usos,costumes e manifestações culturais quefazem parte da vida das pessoas e quese transformam ao longo do tempo. Oobjetivo principal da preservação dopatrimônio cultural é fortalecer a noçãode pertencimento de indivíduos a umasociedade, a um grupo, ou a um lugar,contribuindo para a ampliação doexercício da cidadania e para a melhoriada qualidade de vida.

A idéia de patrimônio não está limitadaapenas ao conjunto de bens materiaisde uma comunidade ou população, mastambém se estende a tudo aquilo que éconsiderado valioso pelas pessoas,

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A NOÇÃO DE PATR IMÔN IOAO LONGO DO TEMPO

A palavra patrimônio vem de pater, quesignifica pai. Tem origem no latim, umalíngua hoje morta que deu origem àlíngua portuguesa. Patrimônio é o que opai deixa para o seu filho. Assim, apalavra patrimônio passou a ser usadaquando nos referimos aos bens ouriquezas de uma pessoa, de uma família,de uma empresa. Essa idéia começou aadquirir o sentido de propriedadecoletiva com a Revolução Francesa noséculo XVIII.

Naquele momento, muitosrevolucionários queriam destruir todas asobras de arte, castelos, prédios e objetospertencentes à nobreza, assim como ostemplos que lembravam o poder doclero. Alguns intelectuais manifestaram-se contra esta atitude, argumentandoque, além do valor econômico eartístico, aqueles monumentos e objetostambém contavam a história do povo daFrança, dos camponeses, doscomerciantes, dos pobres. Ou seja, ovalor histórico daqueles bens ia além dahistória dos reis, do clero, dos nobres ede toda a corte francesa. Assim, essesbens deveriam ser preservados nointeresse de um conjunto maior depessoas: para a população quecompunha a nação francesa.

A noção de patrimônio histórico surge,portanto, vinculada à noção decidadania.

A idéia de um patrimônio cultural quefosse reconhecido como de interesse dahumanidade começou a ser pensadapouco depois da II Guerra Mundial(1939-1945), durante a qual váriosmonumentos preciosos, situados emquase todos os países envolvidos noconflito, foram destruídos, o quesignificou uma perda sem retorno para oconhecimento de culturas antigas e dahistória dessas nações.

Mas essa idéia só se tornou efetivaquando foi anunciado que ia ser

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PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 13

mesmo que isso não tenha valor paraoutros grupos sociais ou valor demercado.

Mas como é possível saber o que é opatrimônio cultural de um grupo social,de vários grupos, de uma comunidade,de uma sociedade inteira, de umanação? Será que tudo é patrimônio?Como é possível saber o que é tãovalioso para uma sociedade que elaqueira conservar para as futuras ge-rações? Como será que acontece essaescolha?

Vamos pensar um pouco na casa deuma pessoa: existem objetos que sãoconsiderados importantes pela família ecolocados na sala de visitas de formaque todos aqueles que visitem a casapossam ver esses objetos. Um vaso écolocado sobre a mesa seja porque éconsiderado bonito, seja porquepertenceu aos pais ou avós do dono dacasa, ou por alguma outra razão que sóos moradores da casa conhecem. Àsvezes, também estão expostas, em localvisível, fotos de família ou de viagensrealizadas pelos donos da casa, imagensque contam um pouco da vida daquelaspessoas. Muitas vezes objetos sagradosganham destaque, como a imagem deum santo, por exemplo.

Tudo o que se escolhe mostrar para osamigos que serão recebidos é sele-cionado a partir de uma história que se

construída, no sul do Egito, a grandebarragem de Assuam, cujas águas, queiam tornar férteis terras desérticas nasmargens do rio Nilo, iam tambéminundar belos e antiqüíssimos templos etúmulos de faraós. Como o governoegípcio não tinha condições de financiar,sozinho, a transposição desses benshistóricos para outro local próximo, oentão Ministro da Cultura da França, oescritor André Malraux, lançou um apelopara a comunidade internacional,dizendo que aqueles bens culturais nãopertenciam apenas ao Egito, mas faziamparte da história e da cultura dahumanidade, e que, portanto, eraresponsabilidade de todos os paísescontribuírem para sua salvaguarda. Esseapelo foi acolhido pela UNESCO, órgãoda Organização das Nações Unidas, quecoordenou os esforços para essa ação. Apartir daí, foi elaborada a Convençãopara a Proteção do Patrimônio Mundial,Cultural e Natural (1972), e criada a Listado Patrimônio Mundial. Hoje há mais dequase 1.000 bens inscritos nessa Lista.

No entanto, com o passar dos anos, foificando evidente que só estavam sendoinscritos na Lista do Patrimônio Mundialbens considerados de valor excepcionalselecionados conforme os critérios devaloração das culturas européias, comopalácios, igrejas, conjuntos urbanos,enfim, edificações feitas nos estilosdocumentados pelos historiadores dasculturas do Ocidente. Ficavam de fora,assim, manifestações que indígenas dasAméricas, e tribos da África e daOceania, por exemplo, consideravam suamaior riqueza, como rituais, narrativassobre sua origem, lugares da naturezausados como templos, formas defabricar objetos, etc.

Foi, portanto, a partir de uma análisecrítica dos limites da Lista do PatrimônioMundial que a UNESCO começou adesenvolver uma série de programas quelevaram à elaboração da Convençãopara a Salvaguarda do PatrimônioCultural Imaterial (2003).

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quer contar, da vontade de compartilhar a beleza de algum objeto,do desejo de mostrar o quão importante são determinadas crençaspara as pessoas daquela casa. Dessa forma, todos os que a visitampodem conhecer um pouco melhor as pessoas que ali vivem:descobrem alguns de seus gostos, um pouco de seu passado, sobreo que acreditam.

O patrimônio cultural de uma sociedade é também fruto de umaescolha, que, no caso das políticas públicas, tem a participação do

Estado por meio de leis, instituições epolíticas específicas. Essa escolha é feita

a partir daquilo que as pessoasconsideram ser mais importante, maisrepresentativo da sua identidade, dasua história, da sua cultura. Ou seja,são os valores, os significadosatribuídos pelas pessoas a objetos,

lugares ou práticas culturais que ostornam patrimônio de uma coletividade(ou patrimônio coletivo).

Detalhe da peça “Conjunto de Jongo”. Idalina da CostaBarros, Taubaté. Acervo do Museu Edison Carneiro.

Círio de Nazaré, Belém-PA. Francisco Costa. Acervo Iphan.

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PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 15

Por exemplo, as famosas panelas de barro do Espírito Santo sãovaliosas porque, além de proporcionarem um modo de ganhar avida para muitas artesãs do bairro de Goiabeiras, em Vitória, noEspírito Santo, são produto de uma atividade tradicional, deorigem indígena, repassada de mãe para filha ao longo de séculos.Isso a torna elemento fundamental para a memória e a identidadecultural desse grupo e desse lugar.

Os significados atribuídos aos bens culturais, assim como àspráticas a eles associadas, podem se transformar ao longo dotempo e também podem variar de uma pessoa para outra, deuma família para outra, de um bairro para outro. Temos assim, porexemplo, os diversos grupos que brincam o boi não apenas noMaranhão, mas também no Piauí e em vários outros estadosbrasileiros. Podemos citar também as festas de São João e astradicionais brincadeiras de roda e de pião que ocorrem por todoo país e apresentam variações de forma e significado de um lugarpara outro. Independentemente dos mais diversos significadosque possam ser atribuídos a uma manifestação ou bem cultural,considera-se patrimônio aquele que é reconhecido pelo grupo

Paneleiras de Goiabeiras, Vitória-ES. Acervo Iphan.

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social como referência de sua cultura, de sua história, algo queestá presente na memória das pessoas do lugar e que faz parte doseu cotidiano.

Ritual xamanístico Maraká dos Asuriní do Xingu. Renato Delarole, 1978. Acervo Iphan.

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Nem sempre toda a comunidade está de acordo com a escolhafeita sobre aquilo que será declarado patrimônio. Como já foi dito,para algumas pessoas, ou coletividades, algumas coisas são maisimportantes do que para outras. Também há de se considerar que,muitas vezes, a preservação de um bem cultural pode serinterpretada como algo que atrapalha os interesses de alguém, dealgum grupo ou da coletividade como um todo.

Isso implica numa busca contínua por soluções negociadas quepermitam a preservação e a valorização dos bens e práticasculturais, em meio a conflitos e disputas de interesses e de valores:qual história deve ser lembrada e contada, quais belezas devem servalorizadas e preservadas, quais costumes são mais significativospara as pessoas do lugar. Nessas disputas também estão em jogoprojetos para o futuro: manter as árvores da cidade ou ampliar asruas para o fluxo do trânsito, aceitar que atores profissionaisdesempenhem papéis na representação do bumba-meu-boi oumanter apenas brincantes locais?

PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 17

Produção da viola-de-cocho. Francisco Moreira da Costa, 2004. Acervo Iphan.

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Detalhe da peça “Casa de Farinha”de Sólon, Museu doMamulengo, PE. Luis Santos/Reflexo. Acervo Iphan.

C U I D A N DO DO QU E É N O S S O

Somente quando se sente parte integrante de uma cidade ou deuma comunidade é que o cidadão dá valor às suas referênciasculturais. Essas referências são chamadas de bens culturais epodem ser de natureza material ou imaterial. Os bens culturaismateriais (também chamados de tangíveis) são paisagensnaturais, objetos, edifícios, monumentos e documentos. Os bensculturais imateriais estão relacionados aos saberes, àshabilidades, às crenças, às práticas, aos modos de ser das pessoas.

Assim, o Iphan trata de preservar o patrimônio cultural tanto denatureza material quanto imaterial. Dentro do Iphan, oDepartamento do Patrimônio Imaterial, como já diz seu próprionome, cuida da preservação dos bens culturais de naturezaimaterial. Na preservação deste tipo de bem cultural importa cuidardos processos e práticas, importa valorizar os saberes e osconhecimentos das pessoas. São os ofícios e saberes artesanais, asmaneiras de pescar, caçar, plantar, cultivar e colher, de utilizarplantas como alimentos e remédios, de construir moradias, asdanças e as músicas, os modos de vestir e falar, os rituais e festasreligiosas e populares, as relações sociais e familiares que revelamos múltiplos aspectos da cultura cotidiana de uma comunidade.

A Constituição Federal de 1988, artigos 215 e 216, ampliou anoção de patrimônio cultural ao reconhecer a existência de bensculturais de natureza material e imaterial, e, também aoestabelecer outras formas de preservação – como o registro e oinventário – além do tombamento, instituído pelo Decreto-lei no.25, de 30 de novembro de 1937, e que é adequado principalmente

à proteção de edificações, paisagens e conjuntos históricosurbanos. Nesses artigos da Constituição, reconhece-se também a

necessidade de se incluir, no patrimônio a ser preservadopelo Estado em parceria com a sociedade, bens

culturais que sejam referências dos diferentesgrupos formadores da sociedade brasileira.

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PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 19

Art. 215. Art. 215. O Estado garantirá a todos opleno exercício dos direitos culturais e acesso àsfontes da cultura nacional, e apoiará e incentivaráa valorização e a difusão das manifestaçõesculturais.• § 1º O Estado protegerá as manifestações dasculturas populares, indígenas e afro-brasileiras, edas de outros grupos participantes do processocivilizatório nacional.• § 2º A lei disporá sobre a fixação de datascomemorativas de alta significação para osdiferentes segmentos étnicos nacionais.• § 3º A lei estabelecerá o Plano Nacional deCultura, de duração plurianual, visando aodesenvolvimento cultural do País e à integraçãodas ações do poder público que conduzem à:I - defesa e valorização do patrimônio culturalbrasileiro;II - produção, promoção e difusão de bensculturais;III - formação de pessoal qualificado para agestão da cultura em suas múltiplas dimensões;IV - democratização do acesso aos bens decultura;V - valorização da diversidade étnica e regional.Art. 216. Constituem patrimônio culturalbrasileiro os bens de natureza material eimaterial, tomados individualmente ou emconjunto, portadores de referência à identidade,à ação, à memória dos diferentes gruposformadores da sociedade brasileira, nos quais seincluem:I - as formas de expressão;II - os modos de criar, fazer e viver;III - as criações científicas, artísticas etecnológicas;

IV - as obras, objetos, documentos, edificações edemais espaços destinados às manifestaçõesartístico-culturais;V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico,paisagístico, artístico, arqueológico,paleontológico, ecológico e científico.• § 1º O poder público, com a colaboração dacomunidade, promoverá e protegerá o patrimôniocultural brasileiro, por meio de inventários,registros, vigilância, tombamento edesapropriação, e de outras formas deacautelamento e preservação.• § 2º Cabem à administração pública, na formada lei, a gestão da documentação governamentale as providências para franquear sua consulta aquantos dela necessitem.• § 3º A lei estabelecerá incentivos para a produçãoe o conhecimento de bens e valores culturais.• § 4º Os danos e ameaças ao patrimônio culturalserão punidos, na forma da lei.• § 5º Ficam tombados todos os documentos e ossítios detentores de reminiscências históricas dosantigos quilombos.• § 6º É facultado aos Estados e ao Distrito Federalvincular a fundo estadual de fomento à cultura atécinco décimos por cento de sua receitatributária líquida, para o financiamentode programas e projetos culturais, vedadaa aplicação desses recursos nopagamento de:I - despesas com pessoal e encargossociais;II - serviço da dívida;III - qualquer outra despesa corrente nãovinculada diretamente aos investimentosou ações apoiados.

Com o objetivo de criar instrumentos adequados ao reconhecimento eà preservação de bens culturais imaterias, que são de naturezaprocessual e dinâmica, tais como as “formas de expressão”, e “osmodos de criar, fazer e viver”, citados no Art. 216 da ConstituiçãoFederal de 1988, o Iphan coordenou os estudos que resultaram naedição do Decreto 3.551, de 04 de agosto de 2000, que “institui oRegistro de Bens Culturais deNatureza Imaterial e cria o ProgramaNacional do Patrimônio Imaterial”. Nesse mesmo ano, o Iphantambém consolidou o Inventário Nacional de Referências Culturais.

Em 2010, um novo instrumento passou a ser utilizado para oreconhecimento e a valorização das línguas portadoras de referênciaà identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadoresda sociedade brasileira: o Inventário Nacional da DiversidadeLinguística – INDL (Decreto nº 7.387, de 09 de dezembro de 2010).

Artesanato produzido por herdeiros de Vitalino. Arquivo Raruti.

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Balaio grande. Setor Coraci, Reserva de Desenvolvimento SustentávelAmaná-AM. Acervo Etnográfico do Programa de Artesanato do Instituto de

Desenvolvimento Sustentável Mamirauá-IDSM.

O Inventár io Nacional deReferências Culturais- INRC

O Inventário Nacional de Referências Culturais – INRCé um instrumento de conhecimento de bens culturais dequalquer natureza. Mas, o que é um inventário?

Fazer um inventário é fazer um levantamento, umalistagem descritiva dos bens de uma pessoa. No caso,quando se fala em inventariar os bens culturais de umlugar ou de um grupo social está se falando emidentificar bens culturais que remetem às referênciasculturais desse lugar ou grupo.

Para que se possa preservar um bem cultural, éimportante saber não apenas que ele existe, mastambém se a manifestação cultural é praticada pelapopulação local, se as pessoas têm dificuldade ou nãoem realizá-la, que tipos de problema a afetam, comoessa tradição vem sendo transmitida de uma geraçãopara outra, que transformações têm ocorrido, quemsão as pessoas que hoje atuam diretamente namanutenção dessa tradição, entre vários outrosaspectos relativos à existência daquele bem cultural.

Todas essas informações são importantes para que sepossa identificar quais são os principais problemas que aspessoas enfrentam para manter viva uma manifestaçãocultural e o que pode ser feito para que um determinadobem cultural não deixe de existir. Ou seja, o primeiropasso para se preservar alguma coisa é conhecê-la. OInventário Nacional de Referências Culturais é uminstrumento para conhecer e documentar bensculturais, como também para conhecer o valor atribuídopelos grupos sociais a esses bens. Assim, aorealizar esse trabalho de inventário, o Iphan está,

“Referências são asedificações e sãopaisagens naturais. Sãotambém as artes, osofícios, as formas deexpressão e os modos defazer. São as festas e oslugares a que a memóriae a vida social atribuemsentido diferenciado: sãoas consideradas maisbelas, são as maislembradas, as maisqueridas. São fatos,atividades e objetos quemobilizam a gente maispróxima e quereaproximam os que estãolonge, para que se revivao sentimento de participare de pertencer a umgrupo, de possuir umlugar. Em suma,referências são objetos,práticas e lugaresapropriados pela culturana construção de sentidosde identidade, são o quepopularmente se chamade raiz de uma cultura.”

In: Iphan. InventárioNacional de ReferênciasCulturais. Manual deAplicação. Fev./2000.

Qual o significadodessas leis edecretos? De queforma o Iphanestá trabalhandohoje? E nós,cidadãos, comopodemosparticipar?

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ao mesmo tempo, documentando e identificando problemas esoluções para a salvaguarda das manifestações culturais.

Como assim?Por exemplo, quando alguém escreve um diário ou tira fotografiasem uma viagem, essa pessoa está registrando coisas queaconteceram em sua vida, paisagens e lugares em que esteve emomentos vivenciados junto com familiares e amigos. Ao seinventariar um bem cultural, trata-se de descrever e documentaruma manifestação cultural por meio da realização de entrevistas,produção de textos, fotografias, desenhos, gravações sonoras,filmagens, entre outros recursos de documentação. Trata-se tambémde levantar todas as fontes de informação possíveis já produzidassobre aquele bem. Produz-se assim um conhecimento atual decomo é aquele bem cultural e também uma memória das coisas queforam vistas e estudadas durante a realização do inventário.

Por que esses registros documentais de uma manifestação culturalsão importantes? Porque uma dança, um canto, um jeito de se vestirvai se transformando com o passar do tempo. Às vezes, umaexpressão cultural pode deixar de existir porque tudo aquilo que faziacom que ela existisse se transformou, foi destruído ou esquecido.

Nos estados do Mato-Grosso e Mato-Grosso do Sul, as tradiçõesculturais do cururu e do siriri - rodas de música e dança realizadascomo diversão ou em dias de festa de santos católicos - dependemde uma série de fatores para continuar ocorrendo. Entre outros,depende de que os mais jovens queiram aprender a fazer e a tocara viola-de-cocho, um instrumento musical fabricado peloscurureiros de forma artesanal. Além da transmissão dessa tradiçãoaos mais jovens, é também importante a preservação de espéciesvegetais que servem de matéria-prima para produção da viola, poishá o risco de extinção de algumas destas espécies. Nesse sentido,estudos têm sido feitos para que o manejo de matérias-primas nãoprovoque a extinção de certos tipos de plantas e, em alguns casos,para que a matéria-prima tirada da natureza passe a ser substituídapor produtos industriais.

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IX Encontro de Jongueiros. Grupo de Caxambu de Miracema,RJ. Francisco Moreira da Costa, 2004. Acervo Iphan.

Outras dificuldades podem ocorrer. Porexemplo, pode ser que os espaços ondeuma festa costumava acontecer nãoexistam mais, ou estejam destinados aoutros fins, pode ser que a matéria-primapara a produção de um determinadobem não esteja mais acessível.

Entretanto, essas dificuldades podemser superadas quando as pessoasquerem manter viva uma tradição. E seé esse o desejo das pessoas, elasprecisam lutar por isso e buscar apoionos órgãos governamentais, nasassociações, nos Conselhos de Culturalocais, empresas que possam patrocinareventos ou atividades, entre outros.

Assim, ter uma manifestação culturaldocumentada (por meio de descriçõestextuais, fotos, vídeos, desenhos, entreoutros) pode servir a diversos fins: como

fonte de pesquisa, como referências do passado para quepossamos entender quem somos hoje, como memória de umamanifestação cultural que não mais ocorre, mas que permaneceviva na memória das pessoas e que pode vir a ser reorganizada.

O Registro de Bens Culturais deNatureza Imater ia l

Outro instrumento de que se dispõe para a preservação dopatrimônio cultural é o Registro de Bens Culturais de NaturezaImaterial, já mencionado. Por meio do Registro se reconhece queum bem faz parte do patrimônio cultural da nação brasileira,juntamente, por exemplo, entre tantos outros, com as cidades deOuro Preto, em Minas Gerais, de Olinda, em Pernambuco, e o Plano

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Cachoeira de Iauaretê – Lugar sagrado dos povos indígenas dos RiosUaupés e Papuri. Ana Gita de Oliveira, 2005. Acervo Iphan.

Piloto de Brasília, no Distrito Federal. O Registro se efetiva por meioda inscrição do bem em um ou mais de um dos seguintes Livros:

Livro de Registro dos Saberes – para a inscrição deconhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano dascomunidades;

Livro de Registro das Celebrações – para rituais e festas quemarcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, doentretenimento e de outras práticas da vida social;

Livro de Registro das Formas de Expressão – para o registro dasmanifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas; e

Livro de Registro dos Lugares – destinado à inscrição de espaçoscomo mercados, feiras, praças e santuários, onde se concentram ereproduzem práticas culturais coletivas.

Os bens inscritos em um ou mais de um desses Livros de Registrorecebem o título de Patrimônio Cultural do Brasil. Esse reco-nhecimento, por meio do instrumento do Registro, de bens eexpressões representativos da diversidade cultural brasileira,significa mais do que a mera atribuição de um título. Tem comoefeito a obrigação, por parte do poder público, de documentar edar ampla divulgação a esse bem, de modo que toda a sociedadepossa ter acesso a informações sobre sua origem, sua trajetória eas transformações por que passouao longo do tempo; seus modosde produção; seus produtores; omodo como é consumido e comocircula entre os diferentes gruposda sociedade, entre outros aspec-tos relevantes. Ou seja, consistena identificação dos significadosatribuídos ao bem e na produçãode vídeos ou material sonorosobre suas características e con-texto cultural.

PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 23

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A inscrição de bens nos Livros de Registro do Iphan contribui,portanto, para o reconhecimento e a valorização do papel de umadeterminada manifestação cultural na formação da culturabrasileira. Esse ato contribui também para estimular o envol-vimento da sociedade na tarefa de preservar esses bens, e paracriar condições para um apoio efetivo na sua salvaguarda por partede instituições públicas e privadas, em nível federal, estadual emunicipal, de organismos internacionais e, sobretudo, de cadacidadão.

O Ofício das Paneleiras de Goiabeiras, em Vitória, no EspíritoSanto, foi o primeiro bem cultural a ser registrado comoPatrimônio Cultural do Brasil no ano de 2002. Alguns Registros

foram produzidos a partir de inventários. Pode-semencionar, por exemplo, alguns inventáriosrealizados no âmbito do Projeto Celebrações eSaberes da Cultura Popular que, entre 2001 e2006, foi desenvolvido pelo Centro Nacional deFolclore e Cultura Popular – CNFCP, unidadevinculada ao Departamento do Patrimônio

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Acima: Rodas das Paparutas da Ilha de Paty. Maragogipe, BA. Luiz Santos, 2004. Acervo Iphan. Abaixo:Panela. Comunidade Jarauá, Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá-AM. AcervoEtnográfico do Programa de Artesanato do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá-IDSM.

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Imaterial do Iphan1. O inventário de identificação e referen-ciamento dos feijões gerou o Registro do Ofício das Baianas deAcarajé. Da mesma forma, o Modo de Fazer Viola de Cocho noMato Grosso e Mato Grosso do Sul e o Complexo Cultural doBumba Meu Boi do Maranhão também foram registrados a partirde inventários. Muitos outros bens já foram registrados e a listacompleta pode ser consultada no sítio eletrônico do Iphan(www.iphan.gov.br), onde também é possível acessar o Banco deDados de Bens Culturais Registrados – BCR.

O Inventár io Nacional da Divers idadeLinguíst ica – INDL

No Brasil de hoje são faladas cerca de 210 línguas. Os gruposindígenas falam cerca de 180 línguas e as comunidades dedescendentes de imigrantes, cerca de 30 línguas. Além disso,usam-se, pelo menos, duas línguas de sinais de comunidadessurdas, línguas crioulas e práticas linguísticas diferenciadas nascomunidades remanescentes de quilombos, muitas já reconhecidaspelo Estado brasileiro, e também em outras comunidades afro-brasileiras. Há uma ampla riqueza de usos, práticas e variedades noâmbito da própria língua portuguesa falada no Brasil.

Acima: Artesanato com sementes e miçangas. Parque Indígena Tumucumaque-PA. D. Grupioni, 2006.Acervo Iphan. Abaixo: Porta-lápis. Setor Coraci, Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá-AM. Acervo Etnográfico do Programa de Artesanato do Instituto de Desenvolvimento SustentávelMamirauá-IDSM.

1. O Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, que constituía um setor da FUNARTE desde1985, foi incorporado à estrutura do Iphan em 2004 e vinculado ao Departamento do PatrimônioImaterial deste Instituto como unidade autônoma de preservação e salvaguarda do patrimônio dacultura popular. Seu acervo de objetos de arte, conhecimentos e documentação foi reunido em seisdécadas de experiência institucional, que teve origem nas atividades da Comissão Nacional deFolclore, criada em 1947, transformada depois na Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, em1958, e no Instituto Nacional do Folclore, em 1980.

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O Inventário Nacional da DiversidadeLinguística – INDL é um instrumento deidentificação, documentação, reconhe-cimento e valorização das línguasportadoras de referência à identidade, àação, à memória dos diferentes gruposformadores da sociedade brasileira. Seuobjetivo é mapear, caracterizar, diagnosticar e dar visibilidade àsdiferentes situações relacionadas à pluralidade linguística brasileira,de modo a permitir que as línguas sejam objeto de políticaspatrimoniais que colaborem para sua continuidade e valorização.

O INDL prevê que o Ministério da Cultura, por meio do Iphan, atuede forma compartilhada como os Ministérios da Educação, Justiça,Ciência e Tecnologia e Planejamento, Orçamento e Gestão.

As línguas inventariadas recebem o título de “Referência CulturalBrasileira”, a ser expedido pelo Ministro da Cultura, e, com isso,fazem jus a ações de valorização e promoção por parte dopoder público.

Porta-lápis boto. Comunidade Jarauá, Reserva deDesenvolvimento Sustentável Mamirauá-AM. AcervoEtnográfico do Programa de Artesanato do Institutode Desenvolvimento Sustentável Mamirauá-IDSM.

Bordados de bumba-meu-boi. Márcio Vasconcelos. Acervo do CNFCP/Iphan.

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Grafismo imenu do povo indígena Tiriyó. Parque IndígenaTumucumaque-PA. D. Grupioni, 2006. Acervo Iphan.

O Programa Nacional doPatr imônio Imater ia l – PNPI

O Decreto de nº 3.551/2000 criou o Programa Nacional do Patri-mônio Imaterial. Este programa é uma maneira do governo federalapoiar e fomentar, por meio do estabelecimento de parcerias,projetos de identificação, reconhecimento, salvaguarda e promo-ção do patrimônio cultural brasileiro.

Os objetivos do PNPI são o de implementar uma política nacional deinventário, registro e salvaguarda de bens culturais de naturezaimaterial; contribuir para a preservação da diversidade cultural dopaís e para a divulgação de informações sobre o patrimônio culturalbrasileiro para toda a sociedade. O Programa tem ainda os objetivosde captar recursos; promover a constituição de uma rede deparceiros; incentivar e apoiar iniciativas e práticas de preservaçãodesenvolvidas pela sociedade por meio de seleção de projetos.

Em 2011, o Edital deSeleção de Projetos doPNPI foi reconhecido pelaOrganização das NaçõesUnidas para a Educação,a Ciência e a Cultura –UNESCO como um pro-grama que melhor refleteos princípios e objetivosda Convenção para aSalvaguarda do Patrimô-nio Imaterial, instrumentointernacional aprovadopela Conferência Geralda UNESCO em 2003.

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A salvaguarda de bensculturais registrados

Os bens culturais registrados são necessariamente inventariados,documentados e estudados. Esses estudos ajudam a identificarquais problemas ameaçam a continuidade da existência dessesbens e também de que forma sua produção, circulação evalorização podem contribuir para melhorar a vida das pessoas quecom eles se identificam.

Para que um bem seja registrado como Patrimônio Cultural doBrasil, é preciso incluir no processo recomendações para asalvaguarda daquele patrimônio, ou seja, indicações do queprecisa ser feito para que aquele bem cultural seja preservado.

Para os bens Registrados como Patrimônio Cultural do Brasil temsido elaborados, junto com os grupos produtores destasmanifestações e com instituições públicas e/ou privadas, projetos

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Dançarinos de frevo, PE. Acervo Iphan.

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que envolvem uma série de ações necessárias à sua preservação. Apartir do Registro o desafio é o da interlocução permanente entreEstado e sociedade para elaboração de um planejamentoestratégico com ações de curto, médio e longo prazo a seremexecutadas de modo compartilhado. Este planejamento estra-tégico é chamado de plano de salvaguarda pelo Iphan.

O plano de salvaguarda indica de que forma o Estado e asociedade agirão, a partir daquele momento para preservar, ascondições que permitem a continuidade da manifestação culturalregistrada. Nesse processo de formulação e implementação dosplanos de salvaguarda, tão importante quanto o compro-metimento das instituições envolvidas com a execução das açõesacordadas, é a participação dos grupos e segmentos produtores dobem cultural em todas as etapas de formulação do plano e derealização das ações previstas. Para tanto, o Iphan apoia ações quepossibilitem e/ou fortaleçam a autodeterminação e a organizaçãodos grupos detentores desses saberes e práticas para a gestão dasalvaguarda de seus patrimônios.

Bandeiras de Festa de São João, Corumbá – MS. Isabella Banducci Amito, 2006. Acervo Iphan.

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O IPHAN CUIDA E NÓS. . . TAMBÉM!

Vimos então algumas formas utilizadas para se promover apreservação dos bens culturais do nosso país: identificar,documentar, registrar, salvaguardar.

Quando o Iphan registra um bem, entre outras coisas, ele se obrigaa continuar promovendo a documentação de tudo que acontececom essa manifestação cultural e a continuar apoiando a existênciadessa prática. Entretanto, para que a preservação realmenteocorra, deve haver interesse e envolvimento das pessoas do lugarem cuidar de seus patrimônios. Preservar o patrimônio culturalbrasileiro é responsabilidade não só do Ministério da Cultura, doIphan e de órgãos públicos, mas também de organizações coletivasem geral e dos cidadãos. O conjunto de bens declaradosPatrimônio Cultural do Brasil é um patrimônio de todos e todos sãoresponsáveis por cuidar destes bens para que as gerações futurastambém possam conhecê-los.

É por isso que os planos de salvaguarda dos bens registrados comoPatrimônio Cultural do Brasil contêm propostas de ações queenvolvem órgãos públicos, entidades privadas e também as própriaspessoas do lugar onde a manifestação cultural acontece. A ideia éque se construa uma consciência e um respeito por tudo aquilo que

precisa ser preservado para que o bem continue a existir e, aomesmo tempo, que se explore o potencial desse bemcultural para o desenvolvimento da região e para amelhoria da vida das pessoas.

Assim, é fundamental desenvolver ações que contribuampara o desenvolvimento da cidadania, que apontemcaminhos para as formas como essas manifestaçõesculturais podem contribuir para a superação das

desigualdades econômicas tendo em vista um maiordesen-volvimento econômico e social de umadeterminada região.

Artesanato produzido por herdeiros de Mestre Vitalino.Arquivo Raruti.

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A PO IO E FOMENTO

Como já mencionado, o governo federal, por meio do ProgramaNacional do Patrimônio Imaterial-PNPI, busca apoiar e fomentarprojetos de identificação, reconhecimento, salvaguarda epromoção do patrimônio cultural brasileiro.

Quando se fala em apoio e fomento, isso significa dizer que o Iphanpode contribuir como parceiro no trabalho de instituições e gruposlocais que querem preservar bens e práticas que identificam comosignificativos (ou “patrimônio”), de diferentes formas: repassandoinformações e conhecimento, sugerindo a busca de novos parceiros,auxiliando na divulgação de informações sobre os bens culturais,entre outras. Muitas ações são realizadas a partir do diálogo e da

Seu João do Boi e os netos, Calango e Nêgo, de São Braz. Santo Amaro da Purificação, BA. LuizSantos, 2004. Acervo Iphan.

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negociação com as pessoas que propõem projetos aos Editais doPrograma Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI) ou com os gruposlocais, geralmente representados por associações (de moradores,associações de amigos de um determinado bem cultural, etc). Ouseja, prefeituras, associações comunitárias, Organizações Não-Governamentais, secretarias estaduais ou municipais,micro-empresas, enfim, todo e qualquer tipo de instituição, públicaou privada, pode, junto com o Ministério da Cultura e o Iphan,promover ações de preservação de nossos bens culturais.

Desde 2005, por meio dos Editais do Programa Nacional doPatrimônio Imaterial – PNPI, o Iphan tem repassado recursos parainstituições públicas e privadas que apresentam projetos demapeamento, promoção e apoio ao patrimônio cultural imaterial.Os projetos assim fomentados são sempre escolhidos a partir decritérios de seleção estabelecidos de acordo com os objetivos elinhas de ação do PNPI.

Muitas vezes, ações de salvaguarda eficazes nascem de propostaspouco complexas. Por exemplo, em 2003, o Iphan foi procuradopor pessoas preocupadas com o desaparecimento de um tipo derenda produzido por mulheres do município de Marechal Deodoro,em Alagoas, conhecido como Bico de Singeleza. A preocupação sedevia ao fato de que apenas uma senhora, já bastante idosa, sabiacomo produzir essa renda. Em parceria com a prefeitura local ecom a Secretaria Estadual de Cultura foram realizadas oficinas deaprendizagem do Bico de Singeleza ministradas por Dona Marinitapara outras mulheres da localidade. Hoje, pouco tempo após arealização dessas oficinas, a renda está sendo produzida por umnúmero maior de artesãs, contribuindo para a melhoria dos ganhosdas famílias envolvidas nesse processo e também para apermanência desse bem cultural entre nós.

Em qualquer ação de inventário, documentação e salvaguarda debens culturais é fundamental a participação das pessoas queidentificam aquela tradição cultural como sua. Somente com o

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envolvimento dessas pessoas e com a parceria de instituições locaisé possível pensar numa preservação que seja realmente eficaz.

Além do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial-PNPI, outrosprogramas governamentais têm estimulado as expressões culturaisbrasileiras e contribuído para a sua divulgação. Sob coordenaçãodo Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular – CNFCP, oPrograma de Apoio a Atividades Artesanais-PACA, promove avalorização de artesãos, a preservação de tecnologias tradicionais ea melhoria das condições de produção e comercialização deprodutos.

Cuidar do nosso patrimônio imaterial é tarefa que cabe não apenasa órgãos governamentais. No nosso cotidiano também podemospromover a preservação desse patrimônio: ensinar aos nossosfilhos o valor dos bens culturais; procurar conhecer e valorizarnossos mestres e artistas locais; envolver-se, direta ou indi-retamente, na luta pela preservação dos patrimônios ameaçadosde desaparecimento; acompanhar as ações dos órgãos gover-namentais em prol da preservação das manifestações culturaislocais; entrar em contato com os agentes governamentais, propor,sugerir; conhecer as associações civis que existem no lugar ondemoramos e procurar saber se estas associações se preocupam como patrimônio. Ir além: formar uma associação, reunir um grupo deamigos, falar, discutir, se informar, ajudar a divulgar informações.

A preservação do patrimônio culturalvisa, antes de mais nada, a promover,por meio da preservação de práticasculturais e de processos de produção,o exercício da cidadania e umamelhor qualidade de vida para aspessoas no presente.

Vasilha para transportar água. Asuriní do Xingu. WagnerSouza e Silva. Acervo Iphan.

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R E F ERÊNC IAS B I B L IOGRÁF I CAS

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PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, PARA SABER MAIS 35

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