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PROJETO MOEDA SOLIDÁRIA NA MATEMÁTICA:
CONSTRUINDO ATITUDES, PROCEDIMENTOS E
CONCEITOS
Loraci Maria Birck
3ª Coordenadoria de Educação/RS
Carmen Teresa Kaiber
Universidade Luterana do Brasil – ULBRA
RESUMO
Este artigo apresenta uma investigação realizada junto a um grupo de estudantes
da Escola Municipal de Ensino Fundamental Pedro Jorge Schmidt, situada no
meio rural do Município de Estrela/RS, a partir do projeto Moeda Solidária na
Matemática: Proposta de Projeto para Alunos de 7ª e 8ª Série. Tem como objetivo
investigar a viabilidade do desenvolvimento de conteúdos procedimentais,
atitudinais e conceituais matemáticos a partir do mencionado projeto. O projeto
Moeda Solidária na Matemática envolveu estudos multidisciplinares sobre temas
como economia solidária, clube de trocas, modelo econômico neoliberal, e a
organização e realização de feiras de trocas solidárias, no âmbito das quais foram
trabalhados os conteúdos mencionados. Teoricamente o projeto está ancorado nos
referenciais da Etnomatemática, Educação Matemática Crítica e Economia
Solidária. Metodologicamente a investigação se insere em uma perspectiva
qualitativa, com elementos que a caracterizam como uma pesquisa-ação. O espaço
das feiras se revelou propício para o desenvolvimento de relações de
solidariedade, criatividade e diálogo, como também, para o desenvolvimento de
conteúdos conceituais e procedimentais matemáticos relativos a operações com
números naturais e racionais, comparação de grandezas, realização de operações
de câmbio, organização de espaços e resolução de problemas no contexto
solidário.
Palavras–chave: economia solidária, educação matemática, projetos
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educativos, matemática e cidadania.
ABSTRACT
This article presents the results of an investigation with pupils of a grammar
school, Escola Municipal de Ensino Fundamental Pedro Jorge Schmidt, in the
rural area of the municipality of Estrela, state of Rio Grande do Sul, Brazil, based
on the Project Solidarity Economy in Mathematics: A Proposal of a Project for 7th
and 8th
grade pupils. The aim was to assess the possibility to develop procedural,
behavioral and conceptual mathematics contents, using the project. The project
included transdisciplinary studies about themes like solidarity economy, swap
clubs, the neoliberal economic model, and the organization and conduction of
community swaps, which were the events used to work the contents cited. In its
theory, the project is built on the landmarks of Ethnomathematics, Critical
Mathematics Education, and Solidarity Economy. The study was carried out under
a qualitative perspective, with elements that characterize it as an action-research
investigation. The events mentioned were proved to promote the develop
relationships based on solidarity, creativity and dialogue, as well as conceptual
and procedural mathematics contents associated with operations using natural and
rational numbers, comparison between values, exchange operations, organization
of spaces and solution of problems embedded in the community context.
Keywords: solidarity economy, mathematics education, educational projects,
mathematics and citizenship.
1 Introdução
No mundo existem, atualmente, muitos clubes de trocas onde grupos de pessoas trocam
entre si produtos, saberes e serviços de forma recíproca, em um clima de solidariedade e
cordialidade. Para facilitar este intercâmbio pode ser criada uma moeda social, que é um
instrumento ou vale simbólico, produzida conforme a identidade do grupo. O clube de trocas,
com a moeda social, se legitima e se organiza para promover a participação da população
mais excluída do mercado de trabalho (PRIMAVERA, 2001).
No Brasil e no Rio Grande do Sul também existem clubes de trocas solidárias. Segundo
Goerck (2010), a quantidade de experiências no Brasil soma 21.857 empreendimentos
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solidários e, no Rio Grande do Sul, 2.085. Esses empreendimentos estão organizados em
associações, grupos informais e cooperativos com localização geográfica no meio rural ou
urbano, sendo que, no Brasil, 48% dos empreendimentos localizam-se no meio rural, 35% no
meio urbano e 17% são rurais e urbanos.
Tais clubes promovem oportunidades de desenvolvimento, possibilitando aos grupos
envolvidos a participação ativa na construção de alternativas para uma melhoria da qualidade
de vida de suas famílias, nos bairros mais pobres e, principalmente, no meio rural.
Por outro lado, percebe-se que a escola pode se constituir em local de apoio para o
desenvolvimento de atividades e ações que contemplem não só o trabalho com conteúdos
conceituais, relacionados ao currículo estabelecido formalmente, mas também, oportunizar
novos conhecimentos que podem estimular a participação cidadã e contribuir na
sustentabilidade da família.
É neste contexto que o Projeto Moeda Solidária na Matemática foi desenvolvido junto
aos estudantes de sétima e oitava séries da EMEF Pedro Jorge Schmidt, situada no meio rural
do Município de Estrela/RS, a partir das aulas de Matemática, buscando construir
conhecimentos conceituais matemáticos aliados a conhecimentos procedimentais e atitudinais
que contribuam para a formação cidadã da comunidade onde a escola se insere, a qual é
constituída, em sua maioria, por famílias que praticam a agricultura familiar em propriedades
rurais.
Teoricamente, o trabalho encontrou respaldo nos referências da Etnomatemática
(D’AMBRÓSIO, 2007), na Educação Matemática Crítica (SKOVSMOSE, 2007) e nos
pressupostos da Economia Solidária (ADAMS, 2010). O desenvolvimento do projeto, na
escola, segue os pressupostos dos Projetos de Trabalho conforme proposto por Hernández
(1998). A investigação encontrou nos pressupostos da pesquisa qualitativa o caminho
metodológico mais adequado.
Assim, este artigo apresenta resultados obtidos a partir das ações desencadeadas por
meio de estudos multidisciplinares, organização e realização de feiras de trocas solidárias,
onde os envolvidos desenvolverem ações onde foi possível colocar em prática elementos da
economia solidária ofertando produtos, saberes e serviços para atender necessidades dos
integrantes do grupo, além de desenvolver conteúdos conceituais matemáticos.
2 Conhecendo a Economia Solidária
A Economia Solidária, como prática pedagógica, teve seus primeiros espaços na
América Latina, nos anos 1980. Nunes (2010) apresenta esses primeiros espaços, lembrando
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Moacir Gadotti e Paulo Freire, dizendo:
Para discutir a Economia Solidária como prática Pedagógica, Moacir Gadotti,
educador popular, contextualiza a questão no plano histórico, produzindo desta
forma um amplo e profundo estudo do que vem a ser a Economia Solidária no
mundo (...). Nesta ocasião, o educador Paulo Freire (1921–1997), elaborou uma
introdução para o programa em que demonstra sua extraordinária capacidade de
desvendar o potencial desta nova maneira de praticar a economia, ao dizer que ela
“representa algo de novo e esperançoso para o futuro da educação popular da
América Latina e para uma nova ordem econômica mundial” (NUNES, 2010, p. 8).
De acordo com o autor, esse fato repercutiu na educação enfatizando novos valores,
novas práticas que reforçam o processo de aprendizado na ajuda mútua, na solidariedade.
Reforça, também, a necessidade do desenvolvimento de conhecimentos que contribuam para a
preservação e recuperação dos recursos naturais colocados à disposição das pessoas e dos
grupos menos favorecidos. Nesse sentido Nunes (2010), pondera que esse aprendizado abre
um leque de possibilidades na prática do campo econômico, que busca um comércio justo
entre produtores e consumidores.
É com esse espírito que o Projeto Moeda Solidária na Matemática busca promover um
processo de aprendizagem para exercitar a solidariedade e possui como principal elemento as
trocas a partir das ofertas e necessidades de cada participante do grupo.
A Economia Solidária, de acordo com Adams (2010), apresenta um modo de vida
solidária e sustentável, inspirados nas experiências de pequenos grupos que vivem em
situações precárias e empobrecidas. As práticas sociais, consideradas insignificantes para a
lógica de acumulação do mercado capitalista, constituem em espaços reais e potenciais de
formação para um novo modelo de vida em sociedade.
O autor relata, também, que no campo da educação da Economia Solidária, os processos
educativos exigem uma postura de autonomia e de protagonismo emancipador dos sujeitos
envolvidos. O educador, sem imposição, coloca-se como um problematizador, um orientador,
um coordenador facilitador de situações de aprendizagem.
Neste contexto, o grupo de alunos do projeto Economia Solidária na Matemática,
deixaram-se envolver participando do processo, colocando-se num espaço de trabalho
coletivo, interativo, que pode ser potencializado com mediações pedagógicas favoráveis a
partir do ensinar e aprender mútuo. Assim os estudantes tiveram que se relacionar com todos
os envolvidos de maneira afetiva, dialógica para atender necessidades próprias e dos outros.
Adams (2010, p.20) refere-se a esse processo dizendo “Trata-se de um processo que
transcende a reflexão racional para envolver as relações humanas na sua totalidade, na
dimensão afetiva, psicológica, espiritual, ética, política e social.”
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Esse convívio pode gerar mudanças entre os participantes do grupo, promovendo o
cuidado uns com os outros, o qual poderá se estender para outras estruturas da sociedade
rompendo com relações autoritárias, dominadoras, impositivas que podem gerar a violência
nas escolas.
Assim, o Projeto Moeda Solidária na Matemática tem, também, a pretensão de levar o
grupo a refletir sobre essas questões possibilitando um ambiente onde mudanças possam
ocorrer, como um reflexo do conhecimento construído.
3 Matemática e construção da cidadania
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 2001), o ensino de
Matemática prestará sua contribuição para a construção da cidadania à medida que forem
exploradas metodologias que priorizem a criação de estratégias, a comprovação, a
justificativa, a argumentação e o espírito crítico. Tais metodologias devem, ainda, favorecer a
criatividade, o trabalho coletivo, a iniciativa pessoal e a autonomia advindas do
desenvolvimento da confiança na própria capacidade de conhecer e enfrentar desafios.
Ao propor uma educação comprometida com a cidadania os PCN elegeram, baseados
no texto constitucional, princípios segundo os quais orientam a educação escolar na busca da
dignidade da pessoa humana, igualdade de direitos, participação e co-responsabilidade pela
vida social.
Sendo assim, entende-se que um projeto educativo comprometido com a formação
integral do cidadão deve se inspirar no que a Constituição preconiza e estabelecer
mecanismos de efetivação para os mesmos. É nessa perspectiva que o Projeto Moeda
Solidária na Matemática foi realizado, buscando estabelecer um contexto de ação e interação
onde a participação, criação de regras de convivência, possibilita o exercício de direitos e
deveres, preparando os envolvidos para o exercício da cidadania. Essas ideias encontram
respaldo nas afirmações de D’Ambrósio:
Uma boa educação não será avaliada pelo conteúdo ensinado pelo professor e
aprendido pelo aluno. (...) Espera-se que a educação possibilite, ao educando, a
aquisição e utilização dos instrumentos comunicativos, analíticos e materiais que
serão essenciais para o seu exercício de todos os direitos e deveres intrínsecos à
cidadania (D’AMBRÓSIO, 2007, p. 66).
Assim, também o Programa Nacional de Educação Fiscal – PNEF (BRASIL, 2009), no
que se refere às questões sociais, aponta grandes desafios para a educação com a finalidade da
construção da cidadania como:
Converter problemas em oportunidades; organizar-se para defender os interesses da
coletividade e solucionar coletivamente problemas por meio do diálogo e da
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negociação, respeitando as regras, as leis e as normas estabelecidas; (...) ser crítico
diante dos meios de comunicação e saber ler e identificar quem fala e o que defende;
ter capacidade para localizar, acessar e usar a informação acumulada; ter capacidade
de planejar, trabalhar e decidir em grupo (BRASIL, 2009, p. 17).
Alinhado com essas ideias o desenvolvimento do projeto buscou oportunizar espaços de
negociação onde cada participante teve que respeitar as regras criadas pelo grupo e solucionar
em conjunto as dificuldades e problemas que eventualmente surgiram durante o processo do
estudo, da organização e realização das feiras de trocas.
4 Aspectos Metodológicos
Considerando que o presente estudo busca investigar a viabilidade do desenvolvimento
de conteúdos procedimentais, atitudinais e conceituais matemáticos, a partir do Projeto Moeda
Solidária na Matemática, como forma de estabelecer relações entre a Matemática e
necessidades que emergem do cotidiano da comunidade, encontra-se na pesquisa qualitativa o
respaldo necessário para o desenvolvimento das ações de investigação.
A pesquisa qualitativa possui características tais como: o ambiente natural é sua fonte
direta e o pesquisador é o seu instrumento chave, os dados coletados são predominantemente
descritivos, a preocupação com o processo é maior do que com o produto, a análise dos dados
tende a seguir um processo indutivo e o significado que as pessoas dão às coisas são focos
essenciais para o pesquisador (BOGDAN e BIKLEN, 1999).
Ao delinear os procedimentos metodológicos da pesquisa, encontrou-se na pesquisa-
ação o aporte necessário para estabelecer as estratégias de investigação. A pesquisa-ação é
uma pesquisa qualitativa com características próprias, que propõe mudanças por meio da ação
e compreensão, amparadas na pesquisa. De acordo com Richardson (2007),
Tal como o nome implica, a pesquisa-ação visa produzir mudanças (ação) e
compreensão (pesquisa). A consideração dessas duas dimensões, mudanças e
compreensão, podem dar uma importante contribuição na elaboração do projeto de
pesquisa. Assim, as possibilidades de uso são muito grandes, desde um professor em
uma pequena escola numa região afastada dos centros urbanos, até um estudo
sofisticado de mudança organizacional com uma grande equipe de pesquisadores
financiado por importantes organizações. Cohen e Manion (1990), apontam três
possibilidades: o professor individual que trabalha em uma sala de aula para
produzir determinadas mudanças ou melhorias no processo de ensino-aprendizagem;
a pesquisa feita por um grupo que trabalha solidariamente, assessorados ou não por
um pesquisador externo e, em último lugar, um professor ou professores que
trabalham com um pesquisador ou uma equipe de pesquisa com um relacionamento
permanente (RICHARDSON, 2007, p.1 ).
A análise das características do processo de pesquisa-ação permitiu vislumbrar a
possibilidade de utilizá-lo no desenvolvimento do Projeto Moeda Solidária na Matemática,
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uma vez que se tem a pretensão de produzir compreensão e conhecimento por meio da
investigação, mas, fundamentalmente produzir mudanças.
Um dos aspectos importantes a ser destacado na pesquisa-ação é a relação educação e
sociedade. Segundo Mion e Saito (2001) para transformar a realidade, visando à emancipação,
é preciso ousar e desafiar as concepções dominantes. De acordo com os autores uma ação
educacional que pretende avançar para além da racionalidade técnica, não pode limitar-se a
olhar para relação educação e sociedade de forma não problemática, como se a escola
estivesse aí apenas para transmitir saberes acumulados e formar mão de obra “qualificada”.
Nesse sentido o Projeto Moeda Solidária na Matemática pretende estabelecer condições
para o desenvolvimento de conhecimentos conceituais, procedimentais e atitudinais, buscando
transformar relações na comunidade com forte apelo às relações de solidariedade, onde se
pode ver no outro um companheiro na troca de produtos, serviços e saberes. E essa
transformação deverá acontecer de maneira questionadora, em algumas situações conflitantes
com condutas e ações institucionalizadas, mas, pacífica entre o grupo que realizará as trocas.
Uma vez que, o principal objetivo da pesquisa-ação, segundo Richardson, (2007), é a
mudança de práticas dos participantes, bem como sua compreensão, melhorando a situação
onde se produz essa prática, considera-se fundamental envolver todos os participantes no
processo, assegurando a organização democrática da ação, oportunizando a mudança dos
participantes e comprometendo-os com a mesma.
Assim, considerando as etapas propostas pela pesquisa-ação, descritas por Richardson
(2007), diagnóstico, ação, avaliação e reflexão, o trabalho inicia com o processo de
sensibilização envolvendo ao máximo todos os participantes do grupo (no caso estudantes e
professores). Nessa etapa ocorreram contatos com professores da escola convidados a
participarem do projeto, sensibilização dos estudantes, formação de pequenos grupos de
trabalho, organização e conscientização dos membros do grupo no sentido de uma
responsabilidade compartilhada por todos os integrantes.
Já o processo de avaliação acompanha uma reflexão do realizado, dos acertos e
desacertos, a percepção e expectativas dos participantes sobre as atividades e resultados
obtidos durante o processo. A avaliação foi uma constante para que se pudessem compreender
as contradições no desenrolar das atividades. No caso do Projeto Moeda Solidária na
Matemática, o processo de avaliação/reflexão foi realizado em diferentes âmbitos, porém
articulados: uma etapa do processo de avaliação/reflexão foi encaminhada pela pesquisadora
junto ao grupo de alunos participantes no projeto; em outro momento esse processo foi,
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também, realizado junto com o grupo de professores da escola colaboradores do projeto.
Considera-se importante estabelecer que no Projeto Moeda Solidária na Matemática o
caminho metodológico vai ser construído tendo a pesquisa–ação como delineamento para as
ações de investigação, mas a organização, estruturação e desenvolvimento do projeto junto ao
grupo de alunos vão seguir os pressupostos teóricos dos Projetos de Trabalho propostos por
Hernández (1998).
4.1 Locus e sujeitos da investigação
A investigação teve como ambiente a Escola Municipal de Ensino Fundamental Pedro
Jorge Schmidt. A escola situa-se na Linha Delfina no Município de Estrela/RS e acolhe
alunos de diversas comunidades do interior mesmo.
Os estudantes são de procedência cultural diversificada, uma vez que a comunidade é
composta por famílias de origem italiana, alemã, afro-brasileiros e indígenas (que vivem às
margens da BR 386). Porém, a predominância é de famílias de origem alemã, as quais têm a
sua renda e o sustento da pequena propriedade rural por meio da agricultura familiar, onde
cultivam hortaliças e árvores frutíferas. As famílias, via de regra, são constituídas de pais,
filhos e avós sendo que, no convívio das mesmas, predomina o espírito comunitário e
solidário. As famílias italianas, afro-brasileiros e indígenas buscam seu sustento como
cortadores de mato e trabalhos diversos.
A Escola, que é de primeiro grau completo, possui uma horta que abastece a cozinha
central da Prefeitura Municipal. Técnicas agrícolas é parte constituinte do currículo, onde os
estudantes aprendem, praticam e partilham conhecimentos sobre o plantio correto de
hortaliças e chás, sem agrotóxicos. Conta com 15 professores, 8 funcionários e 200 alunos
distribuídos nos turnos manhã e tarde.
Os sujeitos envolvidos na pesquisa, além do professor pesquisador, são 31 alunos da 7ª
Série em 2010 e 30 alunos da 8ª Série em 2011. Destaca-se que, basicamente, os mesmos
estudantes que participaram do projeto em 2010 o fizeram, também, em 2011, a exceção de
uma pequena movimentação de dois estudantes reprovados e um transferido. Também
fizeram parte do projeto e da investigação os professores de Matemática, Educação Artística,
História, Informática, Técnicas Agrícolas e Português.
Ao longo do desenvolvimento das diferentes fases da investigação e alinhado com os
pressupostos da pesquisa qualitativa, o ambiente da sala de aula e da realização das feiras (as
quais serão detalhadas posteriormente) se constituiu em fonte de pesquisa para o estudo. A
coleta de dados foi realizada por meio de observações durante as práticas, análise dos
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trabalhos realizados pelos estudantes, gravações em áudio e vídeo das atividades realizadas,
aplicação de questionários e entrevistas com os envolvidos (alunos, professores e comunidade
escolar). Todas as observações e dados obtidos em conversas e na própria convivência com o
grupo foram registrados em diário de campo.
5 O Projeto Moeda Solidária na Matemática
O Projeto Moeda Solidária na Matemática desenvolvido na escola, foi estruturado em
quatro fases. Na primeira fase foram realizados estudos e pesquisas multidisciplinares. A
segunda, se caracterizou pela organização de duas feiras de trocas com a formação dos
grupos, criação da moeda e regras, pesquisa da oferta e necessidades, organização da tabela de
valores, confecção de cartões e a organização do ambiente. Na terceira fase as feiras de trocas
foram realizadas. Já a quarta fase se caracterizou mais pela reflexão sobre os conhecimentos
adquiridos, através da resolução de atividades contendo questões de conteúdos conceituais
matemáticos, de conhecimentos na economia solidária, de conteúdos atitudinais e questões
avaliativas do trabalho realizado. A Figura 1 apresenta o cronograma e descrição das fases e
atividades do projeto.
FASES ATIVIDADES DESCRIÇÃO
1ª Fase
Sensibilização e
Estudos
(36h)
Estudos e pesquisas
multidisciplinares
com a participação
das disciplinas de
Português,
Matemática, História,
Educação Artística,
Técnicas Agrícolas e
Informática.
Português: leitura da cartilha “Economia Solidária: outra
economia a serviço da vida acontece” e apresentação de um
trabalho escrito.
Matemática: resolução de situações problema envolvendo a
linguagem da Economia Solidária e estudo sobre as principais
moedas existentes no mundo.
História: estudos sobre características do neoliberalismo, críticas,
pontos positivos, globalização e sua influência na nossa vida e na
economia. Produção de charges e de um texto.
Educação Artística: estudos, aprofundamentos e simulações sobre
Economia Solidária e clubes de trocas.
Técnicas Agrícolas: pesquisa das épocas de plantio e construção
de uma tabela de seleção.
Informática: pesquisas sobre Economia Solidária utilizando a
Internet.
Estudo extraclasse: estudos adicionais durante quatro manhãs,
sendo duas na escola e duas na Comunidade da São Jacó.
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2ª Fase
Organização do
Projeto
(10h)
Formação dos grupos,
criação da moeda,
construção de regras,
pesquisa da oferta,
pesquisa das
necessidades,
organização da tabela
de valores, confecção
de cartões e a
organização do
ambiente.
Formação de Grupos: os 31 alunos organizaram-se em oito
grupos de trabalho: Moeda, Oferta, Procura, Justiça, Cálculo,
Câmbio, Solidariedade e Ambiente. Cada grupo recebeu tarefas a
partir dos estudos realizados, objetivando as feiras.
Criação da Moeda: construção da Moeda Economia Legal com a
participação de todos por meio de opiniões e votação.
Construção e Criação de Regras: criação de regras com a
participação de todos, coordenados pelo grupo Justiça.
Pesquisa da Oferta: pesquisa dos produtos, saberes e serviços que
cada um gostaria de ofertar.
Pesquisa das Necessidades: pesquisa sobre os produtos, saberes e
serviços que cada um gostaria de trocar.
Organização da Tabela de Valores: discussão sobre medidas e
valores das ofertas e organização da tabela.
Confecção de Cartões para Feira Virtual: construções de fichas
contendo desenho da sua oferta e o valor em Eco Legal.
Organização do Ambiente: negociação do espaço e organização
de oito estandes no salão comunitário para realizar as feiras
solidárias.
3ª Fase
Feiras de Trocas
Solidárias
(6h)
Realização de duas
feiras: uma feira
virtual de trocas em
dezembro de 2010 e
uma feira real de
trocas realizada em
maio de 2011.
Considerada uma fase
de ação.
Feira Virtual: No espaço do salão comunitário, situado ao lado da
escola foram organizados oito estandes, com a devida
identificação. Organização das fichas contendo os produtos,
saberes e serviços que cada um tinha para ofertar. Revisão dos
valores e regras. Soma das ofertas a fim de trocar, esse valor, em
moeda, Eco Legal, no câmbio. Apresentação da oferta. Realização
das trocas com a possibilidade de trocar produto por produto, saber
e serviço, saber por serviço e vice-versa, ou ainda com a moeda.
Redistribuição da moeda no grupo. Avaliação por escrito. Limpeza
do local.
Feira Real: Após a realização da feira virtual, os estudantes
entraram em férias com a tarefa de cultivar os produtos,
objetivando a feira real. Voltando das férias, os estudantes
revisaram suas tarefas nos grupos, realizaram reflexões sobre as
práticas da feira virtual e criaram novas regras. Os passos desta
feira foram os mesmos da feira virtual, o que diferenciou é que,
nesta feira, os estudantes apresentaram, de fato, os produtos,
saberes e serviços a serem trocados.
4ª Fase
Sobre os
conhecimentos
construídos
(4 h)
Aplicação dos
instrumentos de
investigação.
Reflexão sobre os
conhecimentos
adquiridos.
Resolução de atividades constantes de dois instrumentos de
investigação/avaliação. Um contendo dez questões de conteúdos
conceituais matemáticos envolvidos no projeto e outro contendo
dez questões sobre conhecimentos na economia solidária, seis
questões envolvendo conteúdos atitudinais e quatro avaliativas do
trabalho realizado.
Figura 1 – Fases e atividades do Projeto Moeda Solidária.
5.1 Sobre o desenvolvimento do Projeto Moeda Solidária
A partir dos estudos e das discussões em grupo, realizados na primeira fase do projeto, a
produção escrita dos estudantes já dava indícios de que os mesmos estavam apropriando-se de
conhecimentos referentes às temáticas trabalhadas (descritas na Figura 1). Respondendo ao
questionamento do que entendia por economia, a estudante JAS a define como uma atividade
social, demonstrando domínio sobre a questão. A manifestação da estudante pode ser vista na
Figura 2.
V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 11 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de Janeiro, Brasil
Figura 2: Visão de economia da estudante JAS.
Os estudantes se posicionaram, também, com relação à idéia de sustentabilidade e os
limites do crescimento econômico, o que pode ser visto na manifestação da estudante GS
apresentado na Figura 3.
Figura 3: Manifestação da estudante GS sobre sustentabilidade.
A estudante aponta, ainda, as inicitivas econômicas solidárias como caminho para a
sustentabilidade, conforme relato apresentado na Figura 4.
Figura 4: Manifestação da aluna GS sobre sustentabilidade.
Considera-se que as manifestações dos estudantes sobre as questões estudadas e debatidas,
bem como os debates em grupo, evidenciaram que os mesmos apropriaram-se das idéias e
conceitos trabalhados. Percebeu-se, também, um posicionamento crítico sobre as questões
discutidas, o que ficou evidente quando os estudantes confrontavam elementos do que
estavam estudando com a realidade econômica e social do seu entorno.
V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 12 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de Janeiro, Brasil
Na segunda fase do projeto os estudantes estabeleceram grupos de trabalho para a organização
das feiras solidárias conforme já descrito (Figura 1). Desenvolveram, também, atividades
como criação da moeda, estabelecimento de regras, pesquisa sobre oferta, necessidades,
organização do ambiente e da tabela de valores dos produtos, saberes e serviços a serem
ofertados nas feiras, entre outros. Considera-se que essa fase teve como destaques a criação da
moeda a ser utilizada nas feiras, a construção das regras de funcionamento das mesmas e a
confecção da tabela de valores. A Figura 5 apresenta a moeda criada para as feiras,
denominada Economia Legal (Eco Legal), a partir do estudo das principais moedas do mundo.
A relação estabelecida com o Real foi de 1 Eco Legal=1 Real.
Figura 5: Moeda Eco Legal criada pelos estudantes.
Com relação à criação de regras para o funcionamento das feiras, os estudantes as
construíram a partir de um amplo debate coordenado pelo grupo Justiça, prevalecendo valores
da solidariedade, honestidade, respeito, organização, colaboração, partilha e justiça. No
processo de criação das regras foi discutido que as mesmas deveriam referir-se a uma feira
específica. Quando da realização de outra feira essas regras poderiam ser rediscutidas e
adaptadas.
Já a construção da tabela de valores exigiu do grupo uma pesquisa do que cada
participante dispunha para ofertar, bem como suas necessidades. Como foram criadas cédulas
de 1/2, 1, 2 e 5 Ecos Legais, ficou estabelecido que o valor dos produtos, saberes e serviços a
serem ofertados tomariam como referência esses valores da moeda criada. A tabela foi
construída classificando os produtos conforme medidas de massa, unitária, dúzia e de
capacidade, ficando estabelecidos preços por kilograma, por dúzia, por unidade e por litro.
Todo o trabalho de organização dos grupos, da criação da moeda, das regras entre
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outros demandou um trabalho intenso, tanto individual quanto em grupo, e estabeleceu um
espaço para o desenvolvimento de conteúdos atitudinais, procedimentais e conceituais
matemáticos pretendidos com a realização do projeto.
5.2 Sobre a Feira Virtual
A chamada Feira Virtual foi organizada como preparação para a Feira Real. Recebeu
essa denominação porque, nessa feira, os produtos, saberes e serviços não existiriam de fato,
sendo ofertados a partir da criação de cartões com as ofertas. Na tarde do dia 13 de dezembro
de 2010, no espaço do Salão Comunitário próximo à escola foram organizados oito estandes,
um para cada grupo, com a devida identificação. Os estudantes, ao chegarem, dirigiam-se ao
seu grupo organizando as fichas contendo os produtos, saberes e serviços que cada um tinha
para ofertar. Inicialmente realizaram uma revisão da lista de preços estabelecidos previamente
e das regras. Realizaram, também, uma atividade individual onde cada um teve que atribuir
valores à sua oferta efetuando a soma, a fim de trocar esse valor em moeda Eco Legal. Já com
a moeda na mão, cada grupo apresentou sua oferta. A seguir realizaram suas trocas com a
possibilidade de trocar produto por produto, saber e serviço, saber por serviço e vice-versa, ou
ainda realizar trocas com a moeda. O clima foi de intensa participação e interação. A Figura 6
apresenta os cartões confeccionados para a feira virtual.
Figura 6: Cartões da Feira Virtual
Para finalizar a feira foi realizada uma discussão reflexiva sobre as ações ocorridas na
feira, comparadas às regras criadas. Nessa discussão ficou clara a diferença entre o sistema
econômico vigente e a Economia Solidária. Como exemplo cita-se o caso do aluno LG que
realizou suas trocas adquirindo seus produtos, saberes e serviços e posteriormente vendeu
tudo novamente com a intenção de ficar com dinheiro. Já a aluna LU, que realizou suas trocas
conforme as regras, ao final, tinha um valor menor em relação a sua oferta inicial. A
conclusão do grupo é que, o valor que sobrava para LG é parte do que faltou para LU.
5.3 A Feira Real
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Após a realização da feira virtual os estudantes entraram em férias com a tarefa de
cultivar os produtos objetivando a feira real. A feira aconteceu no dia 10 de maio de 2011. Os
passos da feira real foram praticamente os mesmos da feira virtual. Porém, nessa feira, os
estudantes apresentaram, de fato, os produtos, saberes e serviços.
Ao final da feira foi realizada uma avaliação, em grupo, sobre o resultado das trocas
realizadas. Cada participante organizou, por escrito, os produtos, serviços e saberes
disponibilizados e as trocas realizadas. Foi constatado que nem todos os produtos foram
trocados, o que acarretou sobras. Outro fato é que os grupos contribuíram para a montagem de
uma cesta que foi doada. Por esses motivos quatro grupos decidiram dividir a moeda
adquirida nas trocas, em partes iguais, bem como os produtos restantes.
5.4 Sobre os conhecimentos adquiridos
Após a realização das feiras, e objetivando sistematizar conhecimentos que foram
trabalhados na preparação e realização das mesmas, 30 estudantes resolveram um conjunto de
questões, das quais se apresenta um exemplo na Figura 7.
Um grupo, de quatro pessoas, ganhou na loteria um prêmio de R$ 6000,00. Na hora da compra do bilhete,
cada um dos integrantes contribuiu com o valor que dispunha no momento, da seguinte maneira: R$ 1,00;
R$ 2,00; R$ 3,00 e R$ 4,00. O que é mais justo?
( ) A) Dividir o prêmio de maneira igual para todos?
( ) B) Dividir o prêmio proporcional ao que cada um contribuiu?
Mostre o que cada um dos elementos do grupo ganharia nas opções A e B.
Figura 7: Exemplo de questão.
Nas soluções apresentadas, 10 estudantes responderam que dividiriam o prêmio de
maneira igual para todos, 17 responderam que dividiriam o prêmio proporcional ao que cada
um contribuiu, um marcou as duas opções e 2 não responderam. Referente aos cálculos
realizados, 23 estudantes acertaram os itens A e B, 5 erraram pelo menos parte do cálculo e 2
não responderam. A Figura 8 mostra exemplo de solução apresentada pelo estudante JF.
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Figura 8: Soluções apresentadas pelo estudante JF.
Outra questão resolvida pelos estudantes, no contexto da feira, referiu-se a cálculos com
frações e números decimais, para troca de laranjas e bergamotas. Na tabela de valores os
estudantes determinaram o valor de uma laranja em 0,20 Ecos Legais e uma bergamota no
valor de 0,25 Ecos Legais. No entanto, as moedas criadas eram ½ Eco Legal, 1 Eco Legal, 2
Ecos Legais e 5 Ecos Legais. A situação de trocas envolvia a seguinte questão: Tamara trouxe
para a feira laranjas e bergamotas. Na tabela de preços uma laranja custa 1/5 Eco Legal e uma
bergamota, ¼ de Eco Legal. Um colega trocou laranjas por 2 Ecos Legais e bergamotas por 5
Ecos legais. Quantas laranjas e quantas bergamotas o colega levou? A solução do estudante
GS é apresentada na Figura 9.
Figura 9: Solução apresentada pelo estudante GS.
Nas soluções apresentadas, dezesseis estudantes acertaram a questão e apresentaram
cálculos com o raciocínio semelhante à GS, cinco estudantes apresentaram apenas a resposta
(10 laranjas e 20 bergamotas). Quando indagados como haviam chegado a essa resposta,
responderam que realizaram o cálculo mentalmente. Um estudante relatou que contou nos
dedos, sendo que quatro estudantes erraram a questão, um errou pelo menos parte do cálculo e
quatro não responderam.
Com relação aos conhecimentos referentes à Economia Solidária, a discussão emergiu
da solução de questões como as apresentadas na Figura 10. Inicialmente foi solicitado que os
estudantes que marcassem as questões com verdadeiro ou falso, para posterior discussão no
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grande grupo.
Figura 10: Soluções apresentadas pelo estudante TAL.
As respostas dadas e as discussões desencadeadas após a solução da questão
evidenciaram um domínio significativo dos estudantes sobre os princípios e características da
Economia Solidária de maneira satisfatória. No item 1 da questão apresentada na figura 10,
dos trinta estudantes que participaram da atividade, vinte seis marcaram o item como
verdadeiro, um marcou como falsa, um marcou um x e dois estudantes não responderam. No
item 2, vinte três marcaram a afirmação como falsa, cinco marcaram verdadeira e dois não
responderam. No item 3, vinte e oito marcaram a afirmação como verdadeira e dois não
responderam. Já no item 4, vinte e oito marcaram como verdadeira e dois não responderam.
Além do desempenho satisfatório em relação às respostas dadas na questão, destaca-se que
em posterior discussão sobre a mesma os estudantes apresentaram respostas e argumentações
que deram indícios que, de fato, haviam se apropriado das idéias e princípios que servem de
base a economia solidária.
Foi possível perceber que, além dos conhecimentos sobre economia solidária, da
realização dos procedimentos e ações desencadeados, da solução de problemas matemáticos,
no contexto das feiras, o grupo teve a oportunidade de validar atitudes de justiça e
solidariedade envolvendo ações de comprometimento com o grupo. A manifestação do
estudante VJ, que pode ser vista no quadro da Figura 11, corrobora essa ideia.
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Figura 11: Questionamento e manifestação do estudante VJ.
Quando da realização de uma avaliação sobre a condução do trabalho no
desenvolvimento do projeto, novamente os estudantes deram demonstrações de que, pelo
menos no âmbito do trabalho, os princípios norteadores da economia solidária estavam bem
presentes. O estudante DAI ao avaliar a maneira como foi conduzido o trabalho, relata e
manifesta o que foi bom e o que poderia melhorar, o que pode ser visto na Figura 12.
Figura 12: Relato e manifestação do estudante DAI.
Todo o processo de estudos, organização, realização das feiras de trocas solidárias e a
investigação exigiu dos educandos e educador intensa participação, interação e articulação.
6 Considerações finais
Ao analisar as práticas e as manifestações dos estudantes participantes do projeto, foi
possível perceber que cada um apresenta maneiras próprias de se expressar, organizar e agir.
Um aspecto importante a ressaltar refere-se à postura autônoma e responsável com que se
conduziram ao longo do trabalho. Além disso, foi possível perceber que, entre os participantes
do grupo, existiu um relacionamento solidário e comprometido com a totalidade.
No que se refere aos conteúdos procedimentais e conceituais matemáticos envolvidos,
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relacionados a operações com números naturais e racionais, comparação de grandezas,
operações de câmbio, operações com variáveis, organização de espaços e a resolução de
problemas foram fortemente trabalhados ao longo do projeto, sendo que os estudantes
apresentaram desempenho bastante satisfatório.
No que se refere às possíveis transformações que o desenvolvimento do projeto pode ter
desencadeado, considera-se como aspecto relevante o fato do mesmo ter ocorrido durante um
período que abrangeu dois anos letivos, 2010 e 2011, com a realização das duas feiras de
trocas, o que possibilitou que a temática fosse discutida e vivenciada durante um período de
tempo que pode se considerar longo para um projeto escolar.
Considera-se que no período de realização e no âmbito do projeto os estudantes
envolveram-se com a proposta, vivenciaram a possibilidade de trocas solidárias, discutiram e
refletiram sobre a possibilidade da mesma fazer parte da rotina da comunidade. As
manifestações de aprovação às propostas da Economia Solidária não foram unânimes, mas
abrangeram grande parte dos envolvidos. Se de fato essas ideias vão, de alguma forma,
transformar a comunidade da Linha Delfina só a continuidade de projetos de investigação
poderão indicar.
Referências
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