reforma politica 0315

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Senado Federal - Março de 2015 REFORMA POLÍTICA TOMO I BASES PARA UMA RECONSTRUÇÃO POLÍTICA BRASILEIRA Ampla Reformulação dos Sistemas Eleitoral e Partidário e da Geopolítica, baseada na opinião especializada e nas aspirações da sociedade. TOMO II COMPONENTES DA REFORMA POLÍTICA A Palavra de Especialistas e da Sociedade Opiniões e Citações. Senador FERNANDO COLLOR

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reforma política

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  • Senado Federal - Maro de 2015

    REFORMA POLTICA

    TOMO I

    BASES PARA UMA RECONSTRUO POLTICA

    BRASILEIRA

    Ampla Reformulao dos Sistemas Eleitoral e

    Partidrio e da Geopoltica, baseada na opinio

    especializada e nas aspiraes da sociedade.

    TOMO II

    COMPONENTES DA REFORMA POLTICA

    A Palavra de Especialistas e da Sociedade

    Opinies e Citaes.

    Senador FERNANDO COLLOR

  • SUMRIO

    TOMO I - BASES PARA UMA RECONSTRUO POLTICA BRASILEIRA

    I - PREMISSAS .......................................................................................................................... 1

    1. O que se deve responder 2. O que se deve conceituar 3. O que se deve definir como parmetros

    II - ENTRAVES ............................................................................................................................ 6

    III - CERTEZAS ............................................................................................................................ 8

    IV - PONTOS-CHAVES ............................................................................................................... 10

    V - PROPOSTAS ....................................................................................................................... 14

    VI - OBJETIVOS E EFEITOS DAS PROPOSTAS ............................................................................ 20

    VII - ANEXOS ............................................................................................................................. 22

    1. Simulao de Calendrio Eleitoral de Adaptao e Consolidao 2. Proposta de Novos Limites de Composio das Cmaras Municipais 3. Proposta de Composio da Cmara Federal e Assembleias Legislativas

    TOMO II - COMPONENTES DA REFORMA POLTICA

    I - Manifestaes populares de junho de 2013 ..................................................................... 1

    II - Democracia e Poderes do Estado ...................................................................................... 6

    III - Reforma Poltica ................................................................................................................ 15

    IV - Parlamentarismo X Presidencialismo ................................................................................ 34

    V - Poltica, polticos e poder .................................................................................................. 36

    VI - Assembleia exclusiva, Plebiscito e Referendo ................................................................... 44

    VII - Representao poltica; crise de representatividade; governabilidade; despotismo

    indireto .............................................................................................................................. 52

    VIII - Governo, Sistema Poltico e Sistema Eleitoral ................................................................... 59

    IX - Partidos/Sistema partidrio; fragmentao ...................................................................... 65

    X - Voto Facultativo/Obrigatrio ............................................................................................ 76

    XI - Modelo de Voto: proporcional, majoritrio, distrital, distrital misto ............................... 80

    XII - Lista Fechada ..................................................................................................................... 92

    XIII - Financiamento de campanhas, propaganda e pesquisa eleitoral ..................................... 93

    XIV - Coligaes ........................................................................................................................ 109

    XV - Fidelidade Partidria ........................................................................................................ 114

    XVI - Reeleio, mandatos e renovao ................................................................................... 117

    XVII - Reduo dos atores polticos e dos candidatos; proporcionalidade na Cmara ............. 122

    XVIII- Suplncia e durao do mandato de senador ................................................................. 125

    XIX - Clusula de barreira, de desempenho ou de excluso .................................................... 127

    XX - Voto destituinte (Recall) .................................................................................................. 130

    XXI - Reestruturao poltica do Distrito Federal e Reforma Geopoltica ............................... 134

  • Senado Federal - Maro de 2015

    BASES PARA UMA RECONSTRUO

    POLTICA BRASILEIRA

    Ampla Reformulao dos Sistemas Eleitoral e Partidrio e da Geopoltica, baseada na opinio

    especializada e nas aspiraes da sociedade.

    TOMO I

  • Senador FERNANDO COLLOR

    Senado Federal Maro de 2015

    SUMRIO

    TOMO I - BASES PARA UMA RECONSTRUO POLTICA BRASILEIRA

    I - PREMISSAS .......................................................................................................................... 1

    1. O que se deve responder

    2. O que se deve conceituar

    3. O que se deve definir como parmetros

    II - ENTRAVES ............................................................................................................................ 6

    III - CERTEZAS ............................................................................................................................ 8

    IV - PONTOS-CHAVES ............................................................................................................... 10

    V - PROPOSTAS ....................................................................................................................... 14

    VI - OBJETIVOS E EFEITOS DAS PROPOSTAS ............................................................................ 20

    VII - ANEXOS ............................................................................................................................. 22

    1. Simulao de Calendrio Eleitoral de Adaptao e Consolidao

    2. Proposta de Novos Limites de Composio das Cmaras Municipais

    3. Proposta de Composio da Cmara Federal e Assembleias Legislativas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 1

    I PREMISSAS: (1) o que se deve responder antes de se tentar reformar o sistema

    poltico;

    (2) o que se deve conceituar; e

    (3) o que se deve definir como parmetros.

    1. So quatro as perguntas bsicas que devem ser respondidas como premissas

    para uma reforma poltica de profundo alcance, de resultados visveis e capaz

    de resolver, de fato, os principais problemas identificados e sentidos pela

    sociedade.

    a) Quem faz a reforma?

    Constitucionalmente, cabe exclusivamente ao Congresso Nacional proceder

    a reforma poltica, pois trata-se de alteraes de leis e do prprio texto

    constitucional. Por isso, a proposta de uma assemblia exclusiva gera

    questionamentos de ordem constitucional e de legitimidade. Alm do mais,

    a prpria criao de uma assemblia depende da aprovao do Congresso

    Nacional.

    A opo de uma comisso de especialistas, sem mandato parlamentar, pode

    at ser viabilizada por iniciativa de criao da instncia pelo prprio

    Legislativo. Contudo, as propostas oriundas da comisso serviriam to

    somente de base inicial, uma espcie de anteprojeto a ser discutido e

    votado posteriormente pelas duas Casas do Congresso.

    Qualquer outra opo, seja de iniciativa do Executivo, do Judicirio ou

    mesmo popular, fatalmente dever tramitar e ser deliberada pelo

    Congresso.

    A exceo recai nos casos em que, pela omisso do Legislativo, recorre-se ao

    Judicirio para dirimir dvidas levantadas acerca da interpretao de

    determinados pontos legais ou constitucionais, via de regra pela falta de

    regulamentao. Ao se manifestar, o Judicirio normalmente o Supremo

    Tribunal Federal cria jurisprudncia e interpretao definitiva. o que vem

    ocorrendo nos ltimos anos em vrias questes de cunho eleitoral e

    partidrio.

    I - Premissas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 2

    b) O que reformar?

    A efetivao de uma reforma poltica passa necessariamente pela alterao

    de leis ordinrias (por maioria simples), leis complementares (por maioria

    absoluta) e de vrios dispositivos constitucionais (pelo voto favorvel de 3/5

    dos deputados e senadores).

    No nvel infraconstitucional, a principal legislao a ser reformada

    composta pela:

    - Lei n 4.737/65 - Cdigo Eleitoral;

    - Lei Complementar n 64/90 Lei das Inelegibilidades;

    - Lei n 9.096/95 Lei dos Partidos Polticos;

    - Lei n 9.504/97 Lei das Eleies;

    - Lei Complementar n 135/10 Lei da Ficha Limpa

    No mbito constitucional, os Captulos IV e V (arts. 14 a 17) so dedicados

    aos direitos e partidos polticos, e constitui parte do sistema eleitoral e

    partidrio. Contudo, vrios outros dispositivos podem ser objeto de

    modificaes para atender a uma profunda reforma poltica, a comear pelo

    Ttulo III Da Organizao do Estado , dividido em sete Captulos e

    composto pelos arts. 18 a 43. Mais importante ainda o Ttulo IV Da

    Organizao dos Poderes, especialmente seu Captulo I Do Poder

    Legislativo (arts. 44 a 75). O Captulo II trata do Poder Executivo (arts. 76 a

    91) e o Captulo III, do Poder Judicirio (arts. 92 a 126).

    Observa-se que o art. 60, em seu 4 dispe que no ser objeto de

    deliberao a proposta de emenda tendente a abolir: a) a forma federativa

    de Estado; b) o voto direto, secreto, universal e peridico; c) a separao dos

    Poderes; e d) os direitos e garantias individuais. So as chamadas clusulas

    ptreas.

    Uma opo, alm das modificaes constitucionais, seria consolidar toda a

    legislao eleitoral e partidria em um ou dois novos cdigos, aos quais

    seriam tambm agregadas eventuais leis paralelas existentes, bem como

    revogadas as atuais.

    I - Premissas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 3

    c) Como reformar?

    A alterao da legislao eleitoral e partidria, alm da Constituio Federal,

    demanda necessariamente a apresentao, discusso e aprovao de

    projetos de lei ordinria e complementar (PLs) e de propostas de emenda

    Constituio (PECs). Se aprovados, os projetos de lei devem ainda ser

    sancionados pelo Presidente da Repblica, ao contrrio das PECs que, se

    aprovadas pelo Congresso Nacional, sero promulgadas pelas Mesas

    Diretoras das respectivas Casas, sem nenhuma interferncia do Poder

    Executivo.

    Os projetos de lei podem ser apresentados por qualquer parlamentar

    individualmente, assim como por qualquer comisso, pelo Presidente da

    Repblica, pelo STF, pelos Tribunais Superiores, pelo PGR e pelos cidados,

    na forma e nos casos previstos na prpria Constituio (iniciativa popular).

    J o texto constitucional pode ser emendado por proposta de: a) 1/3, no

    mnimo, dos membros da Cmara ou do Senado; b) do Presidente da

    Repblica; e c) de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades

    da Federao.

    d) Quando reformar?

    Talvez a melhor resposta seja inverter a pergunta, ou seja: quando no se

    deve reformar? De preferncia, em ano eleitoral e fim de legislatura (como

    o caso de 2014), quando os esforos e atenes esto todos voltados para as

    eleies, especialmente pelos congressistas, cuja grande maioria concorrer

    nos pleitos.

    Reformar implica tambm abrir mo de algo, mexer em regras, benefcios e

    vantagens, o que gera um custo poltico inaceitvel por qualquer poltico,

    ainda mais quando candidato.

    Por outro lado, sabe-se que dificilmente uma ampla reforma se concretiza

    em apenas um ano. Portanto, das quatro perguntas, esta a que tem menor

    significado e importncia.

    A rigor, a reforma poltica a depender de quem de fato a far e em que

    profundidade se dar , deve ser feita em qualquer ocasio. O momento de

    incio dela, sim, que deve ser objeto de maior reflexo, de modo a no

    esvazi-la antes de comear de fato.

    I Premissas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 4

    Mesmo em ocasies mais favorveis, como no incio de legislatura

    coincidindo com o incio do mandato de um novo presidente da Repblica, a

    histria mostra que as tentativas no tiveram sucesso.

    Contudo, se houver amplo apoio da sociedade e coincidncia de propostas,

    a reforma pode se dar a qualquer tempo, por meio de um abrangente

    acordo poltico.

    2. O principal conceito que se deve ter em mente para uma reforma poltica a

    distino entre reforma poltica e reformas eleitoral e partidria,

    especialmente aquelas de ocasio, em que, na prtica, s se vislumbra a

    prxima eleio ou quando se assume o discurso de mudar para deixar tudo

    como est.

    O prprio Congresso acaba por assumir posturas desse tipo, assumindo a

    natureza de pequenas alteraes das regras como mini-reforma eleitoral, por

    exemplo.

    Reforma poltica abrange aspectos da organizao institucional do pas que vo

    alm das regras eleitorais e partidrias, a comear pelo sistema de governo,

    passando pela estrutura, independncia e relao entre os poderes e

    alcanando a prpria organizao do Estado, em nosso caso a organizao

    federativa.

    Contudo, outros conceitos devem ser levados em conta para melhor conceber

    uma reforma poltica: o conceito de sistema e o de instituio.

    SISTEMA entendido como o conjunto de elementos de tal modo coordenados

    que constituem um todo cientfico unitrio ou um corpo doutrinrio e, ainda,

    que o todo no constitudo pela soma das partes, mas pela funo especfica

    de cada elemento dentro do conjunto1.

    Em outra vertente, por sua importncia e continuidade, sempre se considerou

    que a deliberao poltica deveria ser cuidadosamente institucionalizada. Por

    INSTITUIO entende-se a coleo ordenada e mais ou menos formal de

    funes e hbitos humanos isto , de expectativas encadeadas de

    comportamento que redunda numa organizao ou prtica estvel, cuja ao

    pode ser prevista com certa margem de segurana. Governos, universidades,

    hospitais, tribunais e firmas comerciais so organizaes desse tipo; as

    votaes, o casamento, a propriedade e a lei representam algumas dessas

    1 A.L. de Souza Franco, Enciclopdia Luso Brasileira de Cultura.

    I Premissas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 5

    prticas. Institucionalizar uma prtica, um processo ou servio mud-los de

    uma atividade informal e insuficientemente organizada, para outra altamente

    organizada e formal.2

    3. Os parmetros para uma reforma poltica devem ser definidos a partir daquilo

    que se tem certeza que de plena concordncia (para ser mantido ou

    institudo) e discordncia da populao (para ser revogado ou alterado).

    Somente com o amplo apoio da sociedade e suas entidades representativas,

    que se ter uma chance de avanar na reforma poltica. A prpria mdia tende a

    seguir ou refletir os anseios mais contundentes da populao, e dificilmente se

    colocar contrria a alguma medida naquele sentido.

    Ademais, imprescindvel condicionar a reforma poltica aos parmetros da

    coeso, integralidade e coerncia. Assim, de acordo com o conceito de

    sistema, conclui-se que a estrutura poltica (ou o sistema poltico), a partir

    das regras eleitorais e partidrias, no deve ser modificada pontualmente e

    menos ainda sem correlao e coordenao entre seus institutos e

    componentes, sob o risco de haver conflitos e contradies ou at mesmo

    inaplicabilidade. Necessita-se, assim, de uma unidade lgica entre todas as

    propostas.

    Desse modo, como os sistemas so compostos de instituies que cumprem

    diferentes funes, pode-se concluir que, da compatibilidade entre eles

    depende a estabilidade de ambos, assim como de sua incompatibilidade

    decorrem, necessariamente, a entropia e as crises que os afetam. Em relao

    aos sistemas polticos, a incompatibilidade de seus componentes afeta dois de

    seus requisitos: a governabilidade e a legitimidade dos regimes a que se

    referem.

    Por fim, a combinao entre sistemas e entre eles e as instituies constitui o

    que Thomas Kuhn definiu como paradigmas que podem ser classificados por

    suas caractersticas. Portanto, a identificao desses paradigmas referentes ao

    sistema poltico desejado o principal parmetro a ser analisado e perseguido.

    2 Karl Deutsch, Poltica e Governo.

    I Premissas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 6

    II ENTRAVES: que condicionantes impedem ou dificultam a concluso de uma

    verdadeira e profunda reforma do sistema poltico?

    A resposta passa necessariamente pelos termos excesso e diversidade.

    Excesso de agentes polticos e excesso de partidos, conjugados com a diversidade de

    interesses e a diversidade de propostas.

    Lembre-se que tais condicionantes no se restringem arena federal

    responsvel pela promoo e execuo da reforma poltica, ou seja, os trs poderes da

    Unio. Os atores polticos, especialmente os parlamentares federais, tero sempre em

    mente os interesses regionais, estaduais e municipais, pois deles depende sua

    sobrevivncia poltica.

    Assim, sempre haver a participao e a presso de governadores, prefeitos,

    deputados estaduais e vereadores em qualquer que seja a proposta de reforma

    poltica, notadamente no que tange ao sistema eleitoral.

    Considerando que o Brasil hoje possui mais de 30 partidos polticos em

    funcionamento e quase 70 mil agentes polticos s de parlamentares nos trs nveis

    federativos, percebe-se a dimenso do problema. O mesmo se repete quanto

    diversidade de interesses e propostas, sempre a reboque exatamente do excesso de

    partidos e de agentes polticos. Em resumo, com tantas ingerncias e interesses em

    jogo, no h pacto federativo, menos ainda poltico, que viabilize uma reforma poltica

    profunda.

    Existem ainda neste palco de conflitos os inmeros setores da sociedade

    organizada. Os chamados grupos de presso representativos, em menor ou maior

    escala, dos diversos segmentos (econmicos, sociais, profissionais, religiosos etc)

    sempre tero voz ativa e influncia no debate e definio das reformas desejadas, sem

    falar da prpria mdia formadora de opinio, mesmo que difusa e distorcida.

    Em suma, uma rede de atores e interesses que, na prtica, acabam por

    inviabilizar qualquer acordo consensual ou ao menos majoritrio. Da a relevncia dos

    integrantes do Congresso Nacional, no s como os responsveis pela deliberao das

    reformas, mas tambm como representantes e espelho dos entes federativos e da

    sociedade em geral.

    II - Entraves

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 7

    Sabe-se que quanto maior o nmero de atores (hoje em 513 deputados e 81

    senadores), maior a representatividade e legitimidade; porm, menor a

    governabilidade e a capacidade de negociao e, consequentemente, de um acordo

    poltico factvel.

    Contudo, o principal entrave est na mxima de que ningum altera uma regra

    para prejudicar a si mesmo, bem interpretada nas palavras do ex-primeiro ministro de

    Luxemburgo, Jean-Claude Juncker, acerca da crise econmica europeia: Todos

    sabemos como superar a crise; apenas no sabemos como fazer isso e ganhar a

    prxima eleio. Isso porque a legislao eleitoral brasileira a nica em que o

    beneficirio o prprio legislador.

    Ao transportar o raciocnio para a seara eminentemente poltica, fica clara a

    comparao: nenhum poltico se prope alterar as regras pelas quais ele chegou ao

    poder, em qualquer que seja o nvel. Da a descrena de se ter um corpo de

    parlamentares, sofrendo todas as influncias possveis e sempre pensando em sua

    sobrevivncia poltica, capaz de modificar regras que podero lhe trazer prejuzos. Ou,

    como diz o cientista poltico Lencio Martins Rodrigues, ningum faz reforma poltica

    para beneficiar o adversrio.

    Desse raciocnio, extraem-se apenas duas solues factveis para se aprovar

    uma reforma poltica ampla e autntica: ou se institui um corpo deliberativo exclusivo

    e alheio aos mandatos parlamentares, ou seja, um grupo que legalmente no poder

    se candidatar a nenhum cargo aps a reforma; ou que as regras modificadas somente

    entrem em vigor depois de um determinado tempo (ou legislaturas), de modo que no

    atinjam os atuais e os subsequentes mandatos eleitorais.

    Diante das restries constitucionais e mesmo de legitimidade que a primeira

    hiptese enfrentaria como uma assembleia exclusiva para reforma poltica , resta

    apenas a segunda hiptese: uma espcie de quarentena para as novas regras, que

    pode ser de uma, duas ou at trs legislaturas.

    Somam-se a isso tudo a complexidade, a diversidade e as dificuldades da

    matria que, via de regra, impedem um debate qualificado, sistmico at mesmo de

    especialistas e agentes polticos interessados e, mais ainda, uma efetiva participao

    popular.

    II - Entraves

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 8

    III CERTEZAS: o que j se sabe sobre o que a populao quer e o que ela no quer.

    Alguns aspectos e caractersticas do sistema poltico brasileiro so, de h muito,

    notoriamente questionados ou mesmo rejeitados pela sociedade, no somente como

    mostram diversas pesquisas, mas, sobretudo, pelas manifestaes de rua mais

    recentes.

    Contudo, mais do que uma reformulao das regras do sistema eleitoral e

    partidrio, o que a populao espera e almeja principalmente uma mudana nas

    prticas polticas e, mais ainda, nas condutas dos polticos. Trata-se de um objetivo

    inalcanvel simplesmente com a chamada reforma poltica, pois um fim que requer

    um processo de amadurecimento poltico-institucional, e cultural, em que o Brasil

    apenas engatinha, mesmo depois da consolidao democrtica.

    Porm, a simples alterao de algumas regras, instrumentos e mecanismos

    pode ser, ao mesmo tempo, um incio e um meio facilitador para se atingir a melhoria

    do universo de nossas instituies polticas, suas relaes e seu funcionamento.

    Assim, algumas certezas (pesquisas e formadores de opinio) devem ser

    elencadas como forma de torn-las parmetros para solucionar os problemas delas

    decorrentes.

    1. A populao considera excessivo(a):

    1.1. O nmero de partidos polticos.

    1.2. A quantidade de atores polticos, notadamente aqueles com mandato.

    1.3. A estrutura administrativa em geral (excesso de ministrios e secretarias

    no plano federal, p.ex.).

    1.4. O nmero de cargos polticos de livre nomeao (comissionados).

    1.5. A quantidade de eleies (uma a cada dois anos) e de candidatos.

    1.6. O tempo de campanha eleitoral.

    1.7. A quantidade de recursos miditicos e financeiros nas propagandas

    eleitorais.

    1.8. A quantidade de propaganda partidria ao longo do ano.

    1.9. A quantidade das chamadas mordomias polticas.

    1.10. O pragmatismo e o fisiologismo nas coligaes partidrias, ou seja, sem

    qualquer coerncia poltica ou ideolgica.

    III - Certezas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 9

    2. A populao rejeita:

    2.1. O poltico profissional3 (perpetuao no poder, com vrios mandatos

    consecutivos, utilizando-se da poltica como meio para fins particulares).

    2.2. O deputado eleito com poucos votos, fruto do atual sistema proporcional

    e de coligaes partidrias.

    2.3. Ser taxada para financiar campanha poltica (financiamento pblico, alm

    dos j existentes, como o fundo partidrio, o tempo de rdio e TV e a

    estrutura poltica disponvel advinda dos mandatos).

    2.4. O financiamento poltico por parte de empresas (pessoas jurdicas).

    2.5. O partido escolhendo a ordem dos nomes que sero eleitos.

    2.6. O uso de parlamentares em cargos executivos.

    2.7. O nepotismo na poltica.

    2.8. A mudana de domiclio eleitoral de polticos visando novos mandatos.

    2.9. A mistura de eleies regionais (estados e municpios) com as federais.

    2.10. Polticos e agentes pblicos despreparados e inexperientes para o

    exerccio de cargos e mandatos.

    3. A populao deseja:

    3.1. Maior renovao dos quadros polticos.

    3.2. Maior fidelidade partidria.

    3.3. Maior compromisso dos polticos e dos partidos com o eleitor e as promessas

    de campanha.

    3.4. Maior poder para fiscalizar os governos e a atuao dos polticos eleitos

    (accountability e transparncia), com maior participao nas decises polticas.

    3.5. Maior clareza nas propostas e ideologias partidrias.

    3.6. Regras mais claras e simples quanto ao sistema eleitoral, experimentando ainda

    o voto distrital.

    3.7. Candidatura avulsa, em decorrncia do descrdito dos partidos polticos.

    3.8. Possibilidade de cessar o mandato parlamentar antes de seu trmino (voto

    destituinte).

    3.9. Maior representatividade, sentido e conseqncias do voto em branco (que

    hoje se equivale ao voto nulo, fruto de erro ou simples protesto).

    3.10. O voto facultativo.

    3 Diferente do profissional da poltica, que faz da poltica o prprio fim da sua atuao.

    III - Certezas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 10

    IV PONTOS-CHAVES: principais institutos a serem modificados, por meio de emendas

    constitucionais e alteraes na legislao complementar e ordinria pertinente.

    1. Voto obrigatrio

    2. Reeleio

    3. Sistema eleitoral

    4. Sistema partidrio

    5. Mandato/Legislatura

    6. Representao parlamentar

    7. Campanha e financiamento eleitoral

    8. Configurao dos Estados, DF e Municpios

    9. Pacto federativo

    10. Metodologia de aprovao e aplicao das reformas

    IV Pontos-chaves

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 11

    LEGISLAO

    Dispositivos constitucionais pertinentes

    Constituio da Repblica Federativa do Brasil

    Cdigo Eleitoral

    Lei no 4.737/1965

    Leis complementares

    Lei Complementar n 35/1979 (Lei orgnica da Magistratura - TSE)

    Lei Complementar no 64/1990 (Lei de Inelegibilidade)

    Lei Complementar n 75/1993 (Estatuto do Ministrio Pblico - Eleitoral)

    Lei Complementar no 78/1993 (Disciplina fixao do n de Deputados)

    Lei Complementar no 135/2010 (Lei da Ficha Limpa)

    Leis ordinrias

    Lei no 9.096/1995 (Lei dos Partidos Polticos)

    Lei no 9.259/1996 (Altera Lei 9.096/95)

    Lei no 9.504/1997 (Lei das Eleies ou Lei Eleitoral)

    Lei no 11.300/2006 (Lei das Eleies regula propaganda e financiamento das

    campanhas)

    Lei no 12.034/2009 (Minirreforma Eleitoral de 2009)

    Lei no 12.875/2013 (Altera Leis dos Partidos e das Eleies)

    Lei no 12.891/2013 (Lei da Minirreforma Eleitoral de 2013)

    IV Pontos-chaves

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 12

    Outras normas correlatas

    Lei no 1.207/1950 (Lei Joo Mangabeira Direito de Reunio)

    Lei no 4.410/1964 (Prioridade dos fatos eleitorais na justia)

    Lei no 5.782/1972 (Prazo para filiao partidria)

    Lei no 6.091/1974 (Lei Etelvino Lins Transporte de eleitores)

    Lei no 6.236/1975 (Exigncia de alistamento pela rede de ensino)

    Lei no 6.996/1982 (Utilizao de processamento eletrnico)

    Lei no 6.999/1982 (Requisio de servidores pblicos)

    Lei no 7.444/1985 (Lei do Processamento Eletrnico do Eleitorado)

    Lei n 8.429/1992 (Sanes por enriquecimento ilcito)

    Lei no 9.709/1998 (Lei da Soberania Popular)

    Decreto-Lei no 201/1967 (Responsabilidade de prefeitos e vereadores)

    Decreto no 4.199/2002 (Informaes institucionais a partidos e candidatos)

    Decreto no 7.791/2012 (Compensao fiscal art. 52 Lei 9.096/95)

    Resoluo TSE n 21.538/2003 (Alistamento eleitoral)

    Resoluo TSE n 21.634/2004 (Ao de impugnao de mandato eletivo)

    Resoluo TSE n 22.142/2006 (Processamento de reclamaes e representaes)

    Resoluo TSE n 22.408/2006 (Registro em urna e destino de votos de candidatos

    impugnados/inelegveis)

    Resoluo TSE n 22.503/2006 (Acesso gratuito ao rdio e TV)

    Resoluo TSE n 22.526/2006 (Vaga obtida em eleio proporcional do Partido)

    Resoluo do TSE no 23.282/2010 (Criao/Fuso/Extino de partidos)

    IV Pontos-chaves

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    Senador FERNANDO COLLOR 13

    Resoluo do TSE no 23.390/2013 (Calendrio Eleitoral)

    Resoluo do TSE no 23.396/2013 (Apurao de crimes eleitorais)

    Resoluo do TSE no 23.398/2013 (Direito de resposta)

    Resoluo do TSE no 23.400/2013 (Pesquisas eleitorais)

    IV Pontos-chaves

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    Senador FERNANDO COLLOR 14

    V PROPOSTAS:

    A) Reforma poltica, eleitoral e partidria

    1. Instituio do voto facultativo e da candidatura avulsa para os mandatos

    executivos, sendo esta a ser regulamentada por lei ordinria.

    2. Instituio da legislatura e do mandato de seis anos para todos os cargos

    eletivos, tanto nos executivos quanto nos legislativos.

    3. Fim do instituto da reeleio para os cargos executivos (prefeito, governador e

    presidente da Repblica) e permisso de uma nica reeleio para o mesmo

    cargo de mandato parlamentar (vereador, deputados e senador), vedado o

    exerccio total de mais de seis mandatos parlamentares, consecutivos ou no,

    em qualquer nvel.

    4. Eleies a cada trs anos, sendo, alternadamente, federais (presidente da

    Repblica, senadores e deputados federais) e estaduais (governadores,

    prefeitos, deputados e vereadores).

    5. Reduo e fixao definitiva do nmero total de deputados federais em 307,

    com o mnimo de 3 por estado, sendo a definio do nmero de cadeiras por

    unidade federativa com base na proporcionalidade possvel dentro desse

    universo, e de senadores para dois por estado e DF. Em consequncia, pela

    proporcionalidade, o mesmo para deputados estaduais, mantida a atual regra: 3

    vezes o nmero de deputados federais, com redutor a partir do 12 CF, art. 27

    (ver Anexo III). No caso de vereadores, adoo do mnimo de 9 (para municpios

    at 25 mil habitantes) e mximo de 35 (mais de 5 milhes de habitantes),

    conforme Anexo II, dentro de uma nova composio estadual e municipal

    proposta (reforma geopoltica). Em caso de Territrios, (CF, art. 45, 2) o

    nmero de deputados federais passa a ser de 2.

    6. Eleio mista em dois turnos para deputados federais, sendo no 1 turno a

    votao no partido (eleio proporcional) e, no 2 turno, votao no nome do

    candidato com base em lista aberta partidria (eleio majoritria), de acordo

    com a proporcionalidade de vagas de cada partido alcanada no 1 turno. No

    caso, a lista partidria poder conter no mximo trs vezes o nmero de

    cadeiras alcanadas. Na hiptese de no 1 turno um ou mais partidos no

    alcanarem o coeficiente eleitoral, e ainda houver cadeiras disponveis,

    prevalecer o sistema de maioria relativa na ordem decrescente do nmero de

    votos obtido por cada agremiao.

    V - Propostas

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    Senador FERNANDO COLLOR 15

    7. Eleio distrital (majoritria) em turno nico (maioria relativa) para deputados

    estaduais, podendo cada partido concorrer com um candidato por distrito. O

    segundo candidato mais votado em cada distrito fica como suplente do

    candidato mais votado do mesmo distrito.

    8. Eleio majoritria em turno nico (maioria relativa) para vereadores, sendo o

    dobro do nmero de vagas o limite mximo de candidatos por partido ou

    coligao, e possibilidade (por lei estadual) de adoo do voto distrital em

    municpios com mais de 250 mil habitantes.

    9. Eleio majoritria em dois turnos para senador, sendo no 1 turno, por maioria

    relativa, para escolha dos quatro mais votados e, no 2 turno, tambm por

    maioria relativa, para definio dos dois titulares e dos dois suplentes (1 e 2

    suplentes, de acordo com a votao recebida), ficando estes livres para

    concorrer a outras eleies. No 1 turno o eleitor pode votar em at dois

    candidatos e, no 2 turno, em apenas um. Em caso de um suplente assumir o

    mandato de senador, poder ele concorrer reeleio. No havendo suplentes

    para assumir o restante do mandato de senador (hiptese, p. ex., de os

    suplentes se elegerem a outro cargo eletivo durante o mandato do titular),

    assumir o suplente de deputado que tenha recebido o maior nmero de votos

    na eleio anterior.

    10. Instituio do direito no-representao mediante a considerao do voto

    branco para efeito de definio da proporcionalidade partidria na eleio de

    deputados federais, instituindo, assim, a possibilidade de no se preencher

    cadeiras, de acordo com o percentual de votos brancos no 1 turno das eleies

    proporcionais. Assim, neste caso (deputados federais), para efeito de votos

    vlidos sero considerados o total de votos dados menos os votos nulos. (Obs: o

    que a primeira vista pode parecer um perigo representao parlamentar, ser

    bastante minimizado com a adoo do voto facultativo, que tende a reduzir

    bastante o nmero de votos brancos e nulos).

    11. Perda do mandato, por meio de renncia obrigatria, no caso de parlamentar

    assumir cargo executivo. Nesta hiptese, o respectivo mandato renunciado

    continuar contando para as limitaes previstas quanto reeleio (uma nica

    vez) e ao nmero mximo de mandatos exercidos (seis).

    V - Propostas

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    12. Instituio do voto destituinte (recall), sempre durante as eleies, a cada trs

    anos, para os mandatos parlamentares (vereadores, deputados e senadores),

    constitudo de trs fases: (1) requerimento de inteno com justificativa (nos

    doze meses anteriores eleio correspondente metade do mandato, at dois

    meses antes da eleio) perante a justia eleitoral, por iniciativa de 3% do

    eleitorado (municipal ou estadual); (2) defesa por escrito por parte do

    parlamentar; e (3) em caso de validao das assinaturas e recusa da justificativa

    pela justia eleitoral, incluso do nome do parlamentar para votao destituinte

    na eleio correspondente metade do mandato, necessitando de maioria

    absoluta dos votos para confirmar a destituio. Se confirmada a destituio, a

    respectiva cadeira fica vaga at a prxima eleio para o cargo. No caso de voto

    destituinte, proibida qualquer campanha oficial a favor ou contrria. Em caso

    de renncia do parlamentar antes da votao destituinte, assume o mandato o

    suplente, para o qual, nesta condio, no so aplicadas as regras limitadoras

    de reeleio e exerccio do mandato.

    13. Fixao de novas idades mnimas para assuno de mandatos pblicos, da

    seguinte forma: 40 anos para presidente e vice-presidente da Repblica e

    senador; 35 anos para governador e vice-governador; 30 anos para deputado

    federal, prefeito e vice-prefeito; 24 anos para deputado estadual; e 21 anos

    para vereador.

    14. Filiao a outro partido somente aps cumprida metade do mandato, com

    proibio de mudana no perodo de um ano antes da eleio, sendo permitida

    a nova filiao na janela de dois anos somente nos casos de incompatibilidade

    ideolgica comprovada perante a justia eleitoral e de fuso, incorporao ou

    extino de partidos. Na hiptese de expulso do partido, a transferncia

    poder se dar a qualquer momento.

    15. Fim das coligaes partidrias nas eleies proporcionais (deputados federais).

    16. Proibio de participao na eleio subseqente no caso de mudana de

    domiclio eleitoral de candidato.

    17. Obrigatoriedade de renncia ao mandato do candidato que decidir concorrer

    eleio na metade de seu mandato.

    18. Proibio de novo partido de participar da eleio subseqente ao seu registro,

    no atingindo a hiptese de fuso de partidos existentes.

    19. Fim da cota mnima de 30% de mulheres candidatas por partido, deixando o

    tema a critrio de regras internas de cada partido ou coligao.

    V - Propostas

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    20. Proibio, no horrio e propaganda eleitorais, de manifestao e exibio de

    materiais de ataques, acusaes, difamaes, injrias, calnias ou ofensas de

    natureza pessoal ou partidria que visem a desmoralizar os adversrios, e

    proibio de campanha com programao em escala e molde publicitrios e de

    marketing no rdio e TV, permitindo-se apenas a gravao, de contedo

    propositivo, de imagens e udios do candidato, aliados polticos ou do partido

    (no caso das eleies proporcionais no 1 turno) e debates ao vivo promovidos

    pelas emissoras de rdio e TV.

    21. Igualdade no tempo de rdio e TV para as campanhas majoritrias e

    proporcionais no 1 turno (partidos) e proporcional ao percentual obtido para o

    2 turno das eleies de deputados federais, e fim do horrio poltico gratuito

    no rdio e TV nos anos no eleitorais.

    22. Financiamento (1) pblico restrito ao fundo partidrio devido s legendas com

    representao parlamentar federal e (2) privado, exclusivo a doao de pessoas

    fsicas, limitada individualmente a 10 salrios mnimos. Os valores do fundo

    partidrio destinados a cada partido e da arrecadao de pessoas fsicas

    devero ser disponibilizados e divulgados anualmente em rede nacional de

    rdio e TV para fins de conhecimento e controle por parte do eleitor.

    23. Instituio de tetos para gastos de campanhas eleitorais, de acordo com os

    cargos, a ser regulamentada por lei. Partidos que extrapolarem o teto fixado ou

    receberem recursos de qualquer ordem na forma no prevista na lei (caixa 2),

    fica impedido de participar das eleies subsequentes.

    24. Instituio de penas pecunirias (multas) e administrativas (proibio de

    participao de contratos e convnios com a administrao pblica) para

    pessoas jurdicas condenadas, com sentena transitada em julgado, por doao

    ilegal de campanha poltica.

    25. Cassao definitiva dos direitos polticos de quem for condenado em sentena

    transitada em julgado, incluindo a proibio do exerccio de qualquer cargo ou

    funo pblicos, sem prejuzo da Lei da Ficha Limpa (impedimento eleitoral

    durante 8 anos por condenao em colegiado).

    26. Fim da prerrogativa de foro para crimes comuns praticados por autoridades

    pblicas.

    V - Propostas

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    27. Aplicao das novas regras eleitorais e partidrias de forma progressiva,

    sistmica e adaptativa, com incio de vigncia a partir de duas legislaturas (8

    anos) aps a aprovao das reformas pelo Congresso Nacional (exemplo de

    calendrio no Anexo I).

    28. Restrio da edio de medida provisria somente para os casos de abertura de

    crditos extraordinrios para atender despesas imprevisveis e urgentes

    decorrentes de guerra, comoo interna ou calamidade pblica, facultado ao

    Executivo, nos demais casos de relevncia e urgncia, o uso do instituto da lei

    delegada ou o pedido de urgncia constitucional a projetos de lei de sua

    autoria.

    B) Reforma geopoltica

    1. Aumento do nmero de estados (de 26 para 34), com a diviso, pelos critrios

    de extenso territorial e concentrao populacional, dos seguintes estados,

    p.ex.: PA/AM, PA, MA, PI, BA, MG e MT, incluindo a criao do Estado do

    Planalto PN (parte do atual DF e entorno contido em GO e MG).

    2. Reduo do nmero de municpios, adotando-se o critrio de um mnimo

    populacional (entre 10 e 15 mil habitantes, de acordo com a regio) para

    constituir municpio, devendo os atuais municpios que no atenderem ao

    critrio ser incorporados a outro(s) fronteirio(s) de maior identidade quanto ao

    perfil socioeconmico, at atingir a populao mnima.

    3. Reduo do DF, mediante parte a ser anexada ao entorno (GO/MG) para formar

    o estado do Planalto (PN). O DF passaria a ser constitudo apenas pelas regies

    administrativas do Plano Piloto (incluindo os setores Sudoeste e Noroeste),

    Parkway, Lagos Sul e Norte, Cruzeiro, Octogonal, Candangolndia e Ncleo

    Bandeirante, p.ex.

    4. Extino da representao parlamentar distrital (Cmara Legislativa do DF) e da

    figura do governador, e criao da prefeitura do DF (escolha do prefeito por

    eleio direta) e manuteno das representaes no Senado (2) e na Cmara

    dos Deputados (3), que constituiro a Comisso Mista do Distrito Federal, no

    mbito do Congresso Nacional, para tratar das questes legislativas e

    oramentrias atinentes ao DF, bem como da fiscalizao e do controle do

    executivo local e federal.

    V - Propostas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 19

    5. Repactuao federativa quanto repartio das receitas tributrias (arts. 157 a

    162 da CF), de modo a promover melhor a descentralizao das polticas fiscais

    e administrativas, por meio da diminuio da dependncia de estados e

    municpios em relao Unio, e dos municpios em relao aos estados (ex.

    novos percentuais para repartio de receitas, com aplicao progressiva ao

    longo de 10 anos - Unio: de 60 para 40%, Estados: de 24 para 30% e

    Municpios: de 16 para 30%).

    V - Propostas

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    Senador FERNANDO COLLOR 20

    VI OBJETIVOS E EFEITOS DAS PROPOSTAS:

    1. Reduo da quantidade de cargos, agentes e atores polticos e de candidaturas

    em geral, em todos os nveis.

    2. Aumento da alternncia do poder e da renovao dos quadros polticos em

    todos os nveis.

    3. Reduo do nmero de partidos polticos (clusula de barreira natural).

    4. Desestmulo criao de novos partidos e incentivo fuso e incorporao

    entre os existentes.

    5. Aumento da governabilidade.

    6. Aperfeioamento da democracia representativa e direta.

    7. Maior dinmica e celeridade no processo legislativo.

    8. Valorizao dos partidos e ideologias polticas, especialmente no nvel federal

    para debate de questes globais, sem prejuzo da preferncia pela escolha

    majoritria e da proporcionalidade partidria.

    9. Aproximao do eleitor com o eleito no mbito regional (estados e municpios),

    com maior controle do mandato e valorizao do debate de questes locais.

    10. Diminuio do personalismo nas eleies, do fisiologismo poltico e do

    clientelismo de um modo geral.

    11. Maior responsabilidade e compromisso pblico por parte da classe poltica e

    dos partidos.

    12. Valorizao e incremento da fidelidade partidria.

    13. Melhoria na proporcionalidade da representao dos estados na Cmara dos

    Deputados (nos extremos SP e RR, p. ex. de 70/8 de hoje para 66/3, ou seja,

    de 1/8,75 para 1/22).

    14. Maior clareza e entendimento das regras eleitorais por parte do eleitor,

    especialmente quanto s eleies proporcionais: voto no partido e depois voto

    no candidato (a dificuldade de compreenso do atual modelo que o voto no

    partido est embutido, quase que escondido, no voto dado ao candidato).

    15. Maior interferncia, participao e controle por parte da sociedade, em todos

    os nveis e sentidos, em relao atividade poltica em geral e do financiamento

    e gastos de campanha em particular.

    16. Aumento do intervalo entre as eleies, gerando menor custo e maior produo

    legislativa.

    17. Maior equilbrio entre candidatos e partidos nas disputas eleitorais

    VI Objetivos e efeitos das propostas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 21

    18. Reduo do tempo e dos gastos de campanha eleitoral.

    19. Aperfeioamento das campanhas eleitorais com aumento da qualidade dos

    debates (prevalncia do cunho propositivo sobre o modelo de desconstruo

    de adversrios e partidos).

    20. Racionalizao do debate eleitoral (separao das discusses de temas de nvel

    federal em relao s de temas de nveis estaduais e municipais).

    21. Racionalizao das administraes estaduais e municipais com uma melhor

    redefinio geopoltica das unidades federativas, com real potencial de

    desenvolvimento de regies menos desenvolvidas.

    22. Economia nas despesas pblicas e maior racionalizao da distribuio

    tributria entre os entes federativos.

    23. Racionalizao da representao, configurao e administrao do Distrito

    Federal.

    24. Maiores chances de aprovao das propostas pelo Congresso Nacional, tanto

    pelo intervalo para incio de vigncia das novas regras, como pelo maior

    entendimento, aceitao e presso da sociedade.

    25. Melhor entendimento, divulgao e adaptao s novas regras em funo da

    aplicao por etapas e a mdio e longo prazos.

    VI Objetivos e efeitos das propostas

  • Reforma Poltica Tomo I Bases para uma reconstruo poltica brasileira

    Senador FERNANDO COLLOR 22

    1. Simulao de Calendrio Eleitoral de Adaptao e Consolidao

    2. Proposta de Novos Limites de Composio das Cmaras Municipais

    3. Proposta de Composio da Cmara Federal e Assembleias Legislativas

    Anexos

  • ANEXO I SIMULAO DE CALENDRIO ELEITORAL DE ADAPTAO E CONSOLIDAO

    Cargo (anos de mandato)

    2014 2016 2018 2020 2022 2023 2026 2029 2031

    PR (4) Pref (4) PR (5) Gov (6) (Fim Sen 1/3) PR (6) Gov (6) PR (6) Gov (6)

    Gov (4) Ver (4) Gov (2)* Dep E. (6) Sen (6) Dep E. (6) Sen (6) Dep E. (6)

    Sen 1/3 (8) Sen 2/3 (5) Pref (6) Dep F. (6) Pref (6) Dep F. (6) Pref (6)

    Dep F. (4) Dep F. (5) Ver (6) Ver (6) Ver (6)

    Dep E. (4) Dep E. (2)* (Fim Gov DF)

    Dep D. (4) Dep D. (2)* (Fim Dep D.)

    (*) ou prorrogao dos atuais mandatos (4 + 2)

    - Eleies, a partir de 2020, de 3 em 3 anos (federais e estaduais/municipais). - Eleies em 2018 de ajuste (mandatos de 5 e 2 anos), com possibilidade de reeleio do presidente da Repblica e governadores, sem incidncia das novas regras para

    os cargos legislativos (limitao do nmero de mandatos e uma nica reeleio para o mesmo cargo). - Eleies em 2020 e 2023 de consolidao (mandatos de 6 anos), sem possibilidade de reeleio para presidente da Repblica, governadores e prefeitos. Em 2020

    passa a valer a nova composio das assemblias legislativas e cmaras de vereadores. - Em 2020 o ltimo ano de mandato dos deputados distritais (extino da Cmara Legislativa do DF) e do governador do DF. Nesse ano, o DF passa a contar com

    prefeito, eleito diretamente pela populao. Tambm em 2020 os prefeitos e vereadores sero eleitos j com a nova conformao municipal (reduo do nmero total de municpios em funo das incorporaes e fuses para atenderem ao mnimo de 10 a 15 mil habitantes), e os deputados estaduais dentro da nova composio reduzida.

    - A partir de 2022, o Senado passa a contar com 2 senadores por unidade federativa (fim do mandato dos senadores do 1/3), sendo que em 2023 passa a ter eleio nica sempre de 2 senadores por estado e DF. Em 2023 tambm passa a valer a nova composio da Cmara dos Deputados (reduo do n de cadeiras por estado e DF).

  • ANEXO II

    LIMITES COMPOSIO CMARAS MUNICIPAIS

    Populao N Vereadores

    At 25 mil 09

    De 25 a 50 11

    De 50 a 100 13

    De 100 a 200 15

    De 200 a 350 17

    De 350 a 500 19

    De 500 a 750 21

    De 750 a 1000 23

    De 1000 a 1500 25

    De 1500 a 2000 27

    De 2000 a 3000 29

    De 3000 a 4000 31

    De 4000 a 5000 33

    Acima de 5000 35

  • ANEXO III

    COMPOSIO CMARA FEDERAL E ASSEMBLEIAS LEGISLATIVAS

    (considerando a atual configurao federativa)

    UFs Deputados Federais Deputados Estaduais4

    Atual Proposta Atual Proposta

    AC 08 03 24 09

    AL 09 05 27 15

    AM 08 05 24 15

    AP 08 03 24 09

    BA 39 21 63 45

    CE 22 13 46 37

    DF 08 05 24 15

    ES 10 06 30 18

    GO 17 09 41 27

    MA 18 09 42 27

    MG 53 32 77 56

    MS 08 03 24 09

    MT 08 05 24 15

    PA 17 11 41 33

    PB 12 06 36 18

    PE 25 13 49 37

    PI 10 05 30 15

    PR 30 16 54 40

    RJ 46 25 70 49

    RN 08 05 24 15

    RO 08 03 24 09

    RR 08 03 24 09

    RS 31 18 55 42

    SC 16 11 40 33

    SE 08 03 24 09

    SP 70 66 94 90

    TO 08 03 24 09

    Totais 513 307 1059 705

    Diferenas -206 (-40,15%) -354 (-33,42%)

    4 Para o clculo do nmero de deputados estaduais, manteve-se a atual regra constitucional de trs vezes o nmero

    de deputados federais, com redutor a partir do 12 (36) CF, art. 27.

  • Senado Federal - Maro de 2015

    COMPONENTES DA REFORMA POLTICA

    A Palavra de Especialistas e da Sociedade

    Opinies e Citaes

    TOMO II

  • Senador FERNANDO COLLOR Senado Federal - Maro de 2015

    SUMRIO

    TOMO II - COMPONENTES DA REFORMA POLTICA

    I - Manifestaes populares de junho de 2013 ..................................................................... 1

    II - Democracia e Poderes do Estado ...................................................................................... 6

    III - Reforma Poltica ................................................................................................................ 15

    IV - Parlamentarismo X Presidencialismo ................................................................................ 34

    V - Poltica, polticos e poder .................................................................................................. 36

    VI - Assembleia exclusiva, Plebiscito e Referendo ................................................................... 44

    VII - Representao poltica; crise de representatividade; governabilidade; despotismo

    indireto .............................................................................................................................. 52

    VIII - Governo, Sistema Poltico e Sistema Eleitoral ................................................................... 59

    IX - Partidos/Sistema partidrio; fragmentao ...................................................................... 65

    X - Voto Facultativo/Obrigatrio ............................................................................................ 76

    XI - Modelo de Voto: proporcional, majoritrio, distrital, distrital misto ............................... 80

    XII - Lista Fechada ..................................................................................................................... 92

    XIII - Financiamento de campanhas, propaganda e pesquisa eleitoral ..................................... 93

    XIV - Coligaes ........................................................................................................................ 109

    XV - Fidelidade Partidria ........................................................................................................ 114

    XVI - Reeleio, mandatos e renovao ................................................................................... 117

    XVII - Reduo dos atores polticos e dos candidatos; proporcionalidade na Cmara ............. 122

    XVIII- Suplncia e durao do mandato de senador ................................................................. 125

    XIX - Clusula de barreira, de desempenho ou de excluso .................................................... 127

    XX - Voto destituinte (Recall) .................................................................................................. 130

    XXI - Reestruturao poltica do Distrito Federal e Reforma Geopoltica ............................... 134

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 1

    A voz das ruas no unssona. Trata-se de um concerto dissonante, mltiplo, com elementos

    progressistas e de liberdade, mas tambm de conservadorismo e brutalidade, alis presentes

    na prpria sociedade brasileira.

    As propostas alternativas ao modelo dominante precisaro ter seu tempo de formulao e

    experimentao. E como diz Mauro Luis Iasi: Devemos apostar na rebelio do desejo.

    Aqueles que se apegarem s velhas formas sero enterrados com elas.

    Raquel Rolnik (arquiteta e urbanista)

    As jornadas de junho podem indicar o esgotamento do ciclo poltico da transio democrtica,

    iniciado em fins dos anos 1970. Depois de junho, possvel que estejamos perante uma zona

    cinzenta, politicamente indecisa. Ou consolidamos um regime democrtico, ou recuamos para

    formas semiditatoriais, como no perodo de 1946 a 1964.

    Enquanto os protestos desmaiavam nas ruas j cansadas no fim do ms, algo se insinuava no

    ar. O roteiro previsvel do teatro da poltica brasileira se tornou incerto.

    Lincoln Secco (historiador)

    H um dficit de democracia participativa que precisa ser resolvido. S votar e esperar quatro

    anos no adianta mais. Uma reforma poltica que se concentre em ferramentas de

    participao popular pode ser a sada. Muitos desses jovens esto descontentes, mas no

    sabem o que querem. Apenas o que no querem. Neste momento, por mais agressivos que

    sejam, boa parte deles est em xtase, alucinada com a diverso que estar na rua e com o

    poder que acreditam ter nas mos. Mas, ao mesmo tempo, com medo. Pois, cobrados de uma

    resposta sobre insatisfao, no fundo, no fundo, conseguem perceber apenas um grande

    vazio.

    Leonardo Sakamoto (jornalista e cientista poltico)

    I Manifestaes populares de junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 2

    As manifestaes do meio do ano so ndice claro de que o povo brasileiro considera

    insatisfatria a forma como seus representantes enfrentam essa tarefa. Elas condenam a

    aparente desconexo que eles tm com as demandas complexas da heterognea sociedade

    brasileira. O resultado perigoso o desgaste generalizado das instituies de governo e da

    crena no valor da poltica, fundamentos da democracia.

    Jos Garcez Ghirardi (professor de Direito da FGV-SP)

    No j histrico junho de 2013, as ruas foram ocupadas pelos cidados. Foi um grito contra

    tudo que est a. Contra os corruptos, contra os gastos abusivos da Copa do Mundo, contra a

    impunidade, contra a pssima gesto dos servios pblicos, contra a violncia, contra os

    partidos polticos.

    Dois poderes acabaram concentrando a indignao popular: o Executivo e o Legislativo.

    Contudo, o Judicirio deve ser acrescido s vinhas da ira.

    Marco Antnio Villa (historiador e socilogo)

    O rescaldo dos protestos (de junho de 2013) e no esqueamos que eles tm causas foi

    antes a criao de um vago sentimento mudancista do que um movimento poltico com

    conscincia sobre o que se quer mudar.

    Fernando Henrique Cardoso

    Houve um pouco de tudo nas ruas de junho, mas no houve quem dispusesse as diferentes

    reivindicaes numa agenda que pudesse ser traduzida politicamente e determinasse as

    aes governamentais.

    Na ausncia de respostas do sistema poltico, de providncias governamentais e de ganhos

    organizacionais dos prprios manifestantes, as ruas refluram e hibernaram. Mostraram sua

    juventude, sua forma poltica surpreendente, seu ativismo miditico que se vale de redes

    sociais e celulares. No encontraram pontes e braos que as projetassem para o centro do

    Estado, porque os que os que esto no Estado no conseguem sentir as ruas e quem est nas

    ruas no acredita que o Estado esteja interessado em ouvir ou dialogar. As ruas hibernaram,

    mas permanecem vivas, em condies de mobilizao latente, fiis ao mix de

    hipermodernidade, injustia e caos que as qualifica.

    I Manifestaes populares de junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 3

    ilusrio achar que a bonana prevalecer depois da inesperada tempestade. A insatisfao

    de parte expressiva da populao mistura-se hoje com a resignao tradicional e com um

    encantamento submisso ao poder do Estado. A combinao dessas trs vertentes poltico-

    culturais a insatisfao, a resignao, o encantamento nitroglicerina pura. Desaguar de

    algum modo nas eleies de 2014.

    Marco Aurlio Nogueira (professor de Teoria Poltica)

    Uma leitura das recentes mobilizaes indica que o tema central da disputa a desigualdade,

    como foco em seus mecanismos e processos de produo. E o principal campo das disputas

    no so mais as relaes trabalhistas, como na poca fordista, e sim a universalizao e

    melhoria dos servios pblicos, o direito cidade. (...) O clamor das ruas para reinventar a

    democracia, criar novas institucionalidades, garantir o acesso pblico informao e uma

    ampla e efetiva participao cidad na gesto das polticas pblicas, recuperar o sentido de

    representao que tm os mandatos parlamentares. Submeter a Justia ao controle

    democrtico.

    Silvio Caccia Bava (Associao Latino-Americana de Organizaes de Promoo do

    Desenvolvimento ALOP)

    Todas as manifestaes dos ltimos tempos, em que as pessoas sabem o que no querem

    mas no sabem o que querem, e o que pensam querer no sabem como fazer, so a prova

    inequvoca de que h algo que no vai bem, no governo e no pas.

    A maioria do povo que vai s ruas pede transparncia, honestidade no trato da coisa pblica e

    reformas. (...) Tanto o governo como o Congresso no perceberam a mensagem ou fingiram

    no perceber.

    A presidente props um plebiscito, que o povo no pediu. O Congresso criou uma Comisso

    de Reforma Poltica sem consultar a sociedade.

    Ives Gandra da Silva Martins (jurista)

    difcil saber exatamente que mudanas eram buscadas, para alm daquela questo inicial

    relacionada a servios (reduo da tarifa de transporte). Foi um fenmeno que se colocou

    com algo ftil, imitao de algo que ocorria pelo mundo afora e que acabou em uma retrica

    esquisita.

    Fbio Wanderley dos Reis (cientista social da UFMG)

    I Manifestaes populares de junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 4

    O quadro que temos a partir de 2013 paradoxal. De um lado, o mundo poltico reafirmando

    as prticas que favorecem a poltica profissional e desconectada dos interesses do povo. De

    outro, uma mobilizao na sociedade que pode desembocar em um projeto de lei com

    milhes de assinaturas que poder incomodar o mundo poltico e, sobretudo, ampliar o

    interesse e a conscientizao do eleitorado sobre a necessidade de aperfeioar nosso sistema

    poltico.

    ........................................

    As manifestaes das ruas de junho de 2013 no foram suficientes para acelerar o processo

    de forma verdadeiramente consequente e a tempo de promover mudanas significativas no

    cenrio a curto prazo. No entanto, sem a mobilizao da sociedade como provado na lei n

    9.840 (sobre compra de votos) e na Lei da Ficha Limpa - no iremos longe.

    Nosso sistema poltico est doente e precisa de reformas urgentes. A mdio prazo, a

    situao da poltica no Brasil poder ser insustentvel. Sua deteriorao pode levar o pas

    para uma soluo autoritria ou, no mnimo, para uma performance econmica inferior ao

    nosso potencial. As manifestaes de junho de 2013 j assustaram investidores e contribuem

    para a reduo do ritmo de crescimento da economia do pas. Pode ser pior no futuro.

    Ao ver o Brasil de hoje, inacreditvel que possamos voltar a cair no buraco autoritrio. No

    entanto, valem algumas observaes. A primeira que nem tudo evolui para melhor. O Brasil

    uma prova de avanos e retrocessos dentro dos mesmos contextos polticos. Como na era

    Vargas e mesmo no perodo ps-regime militar. A segunda observao a de que o

    autoritarismo no pode ser estereotipado. Um regime autoritrio no significa ter um general

    no poder. Pode ter o apoio dos militares ou no. Depende das circunstncias. O autoritarismo

    se revela no clientelismo, no nepotismo e no privilgio de uns em detrimento da maioria. So

    fatos corriqueiros no Brasil de hoje.

    Em que pese o avano da democracia no pas, o Brasil ainda terreno frtil para o

    autoritarismo, presente nos escndalos polticos e no tratamento que o cidado recebe de

    servidores do Estado. Nosso vis autoritrio disfarado por uma superficial cordialidade e

    por muitas palavras. O alerta presente nas dependncias aeroporturias de que o eventual

    desrespeito ao servidor pblico pode resultar em cadeia emblemtico. Somos inferiores,

    como cidados, aos cidados que servem ao Estado todo-poderoso.

    I Manifestaes populares de junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 5

    O corporativismo e o clientelismo so formas de autoritarismo que esto incrustadas na vida

    nacional. O autoritarismo escorado em algum sucesso econmico e forte intervencionismo

    estatal pode transformar uma sociedade mal-educada e com baixa conscientizao poltica

    em uma sociedade de bovinos. Portanto, todo cuidado pouco. Vale lembrar um velho ditado

    irlands: O preo da liberdade a eterna vigilncia. No temos, infelizmente, vigiado

    adequadamente o pouco que temos de liberdade.

    Murillo de Arago (advogado, mestre em Cincia Poltica e doutor em Sociologia)

    No foi por meros 20 centavos de reduo nas passagens de nibus urbanos que milhes de

    pessoas tomaram as ruas em 2013. H uma insatisfao generalizada com a m qualidade dos

    servios pblicos. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributao (IBPT),

    entre os pases com maior carga tributria do mundo, o Brasil o ltimo colocado (29) no

    ranking de retorno de impostos do ponto de vista do bem-estar capturado pela sociedade. Ao

    no receber a contrapartida pelos tributos escorchantes que paga, o cidado brasileiro

    expropriado daquilo que seu, e obrigado a pagar duas vezes pelo servio que seria obrigao

    do poder pblico plano de sade, escola particular, transporte privado, segurana particular

    com alarmes e cercas altas, numa longa lista de servios mal prestados ou nem prestados pelo

    poder pblico. Mas nem todos podem se dar ao luxo de pagar duas vezes. A maioria tem

    mesmo que se conformar com filas, apertos, sustos e descaso. (...)

    A Pesquisa Nacional Datafolha/IA comprovou: o governo que o brasileiro quer o governo

    que entrega eficincia.

    Paulo Rabello de Castro (economista)

    I Manifestaes populares de junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 6

    Considera-se a democracia uma espcie de paradigma, que est a e acabou-se. E vamos

    seguindo com um regime absolutamente hipcrita, a chamar democracia a uma situao em

    que os cidados no tm outro papel seno o de votar. (...) O que chamamos de democracia

    comea a assemelhar-se tristemente ao pano solene que cobra a urna onde j est

    apodrecendo o cadver. Reinventemos, pois, a democracia antes que seja demasiado tarde.

    Jos Saramago (escritor portugus)

    Superadas as restries liberdade e diferena caractersticas do perodo militar, ganhou-se

    compreensvel primazia em nosso discurso poltico a perspectiva que acentua o objetivo

    democrtico da igualdade. O veculo privilegiado para promov-la so, como se sabe, as

    polticas pblicas, cuja consecuo demanda agilidade decisria.

    Decorre da o perigo da impacincia de alguns setores com o funcionamento daquelas

    instncias cuja lgica dialogal, como so o Parlamento e o Judicirio. (...) Essa diferena em

    tempos e dinmicas, no entanto, essencial para a democracia. Legitimamente praticada, ela

    protege a pluralidade de idias, aperfeioa a formulao de polticas e traa, no limite, a linha

    que separa modos democrticos e autoritrios de promover a igualdade. O desafio das

    democracias conciliar esses valores, garantindo eficincia de gesto e respeito divergncia.

    O maniquesmo tacanho que tem prevalecido em nosso debate poltico arrisca a fazer

    esquecer que tais valores so complementares, no excludentes, e devem ser conciliados.

    Produzir tal conciliao, sempre difcil e provisria, tarefa primordial das instituies.

    Quando so incapazes de faz-la, a democracia adoece.

    As manifestaes do meio do ano so ndice claro de que o povo brasileiro considera

    insatisfatria a forma como seus representantes enfrentam essa tarefa. Elas condenam a

    aparente desconexo que eles tm com as demandas complexas da heterognea sociedade

    brasileira. O resultado perigoso o desgaste generalizado das instituies de governo e da

    crena no valor da poltica, fundamentos da democracia.

    Os poderes da Repblica tm por funo promover e defender exatamente essas bases da

    vivncia democrtica. Seus conflitos recentes preocupam no pelas tenses que revelam, mas

    porque parecem muitas vezes motivados pela defesa de agendas e interesses cuja articulao

    com o bem coletivo nem sempre evidente. Preocupam porque parecem contribuir muito

    pouco para a tarefa urgente de revitalizar a democracia brasileira.

    Jos Garcez Ghirardi (professor de Direito da FGV-SP)

    II Democracia e Poderes do Estado

    junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 7

    As jornadas de junho podem indicar o esgotamento do ciclo poltico da transio democrtica,

    iniciado em fins dos anos 1970. Depois de junho, possvel que estejamos perante uma zona

    cinzenta, politicamente indecisa. Ou consolidamos um regime democrtico, ou recuamos para

    formas semiditatoriais, como no perodo de 1946 a 1964.

    Carlos Mariguella denominava esse tipo de regime de democracia racionada. Uma idia que

    merecia se tornar um conceito explicativo dos regimes brasileiros que no so exatamente

    uma ditadura aberta, mas tambm no se tornam democrticos. Assim, podemos definir

    democracia racionada como uma forma semilegal em que a violncia contra os pobres e os

    opositores se combina com aes autoritrias dentro da legalidade, e os escassos direitos so

    distribudos a conta-gotas para os setores mais moderados da oposio.

    A histria republicana do Brasil se resume, portanto, a ciclos em que a democracia racionada

    substituda por ditaduras abertas que rasgam as garantias constitucionais quando o

    movimento popular aparece como ameaa ordem.

    A grande questo que junho nos props a seguinte: a atual democracia racionada se

    esgotou? A resposta ser crucial para o futuro democrtico do Brasil. A regresso, tal qual em

    outras etapas de nossa histria, no seria exatamente como antes.

    O PT no tem mais o que apresentar de novo porque isso significaria dar o seguinte passo:

    desagradar ao capital financeiro e substituir a democracia racionada pelo regime da

    abundncia de direitos. Tambm no pode continuar indefinidamente com sua poltica de

    conciliao de classes. A democracia racionada dos partidos no consegue mais comportar em

    seu estreito crculo as contradies sociais que ela mesma engendrou. Uma vez mais estamos

    diante do dilema: mais democracia ou mais um passo atrs.

    Lincoln Secco (historiador)

    Num texto escrito entre 1814 e 1820, Benjamin Constant contrapunha genial formulao de

    Montesquieu uma nova questo. O problema, escreveu ele, no a diviso dos Poderes, mas

    a quantidade de poder que se deve dividir entre eles. Hoje as prerrogativas de governo no

    podem ser mais divididas apenas entre os Poderes do estado, mas tm, para que a

    democracia sobreviva poliarquia, de ser partilhada entre eles e a sociedade.

    Marco Maciel

    II Democracia e Poderes do Estado

    junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 8

    A maioria das pessoas no sabe, por exemplo, que a misso institucional do Parlamento

    organizar, democrtica e pacificamente, as contradies que a sociedade no pode nem deve

    assumir, sob pena de retorno da barbrie, com estado permanente de guerra.

    Em lugar de esclarecer e informar, no Brasil faz-se a opo pelo denuncismo, muitas vezes

    inconsequente, e miditico. A denncia que no tenha carter didtico, identificando os

    problemas e apontando as solues, vira luta poltica.

    (...) Segundo Norberto Bobbio, a democracia um conjunto de regras (as chamadas regras do

    jogo) para a soluo dos conflitos sem derramamento de sangue, e o bom governo

    democrtico consiste, acima de tudo, no rigoroso respeito a estas regras. Essas regras,

    amadurecidas ao longo de sculos de provas e contraprovas, encontram-se hoje, quase por

    toda parte, constitucionalizadas. Diz, ainda, que o comportamento eleitoral no existe fora

    das leis que instituem e regulam as eleies. Na democracia o respeito s regras to

    importante quanto o prprio resultado do jogo.

    Antnio Augusto de Queiroz (analista poltico Diap)

    Estamos entrando no limiar de um novo sculo, que significa tambm o incio de um novo

    milnio, com instrumentos como o voto, o princpio da separao dos poderes e instituies

    como os partidos que j completaram mais de duzentos anos e que, em boa parte do mundo,

    terminaram significando mais injustia, mais opresso, mais indiferena e mais alienao,

    alm de mais violncia. Os beneficirios de tais e tantas distores, que terminam nivelando a

    atividade poltica ao nvel da criminalidade e da inobservncia dos mais elementares

    princpios ticos, no pe em questo s a incapacidade dos sistemas, das instituies e das

    organizaes polticas em se modernizar e se auto-limitar. Pe em dvida a prpria

    democracia como sistema imaginado um dia como o ideal do governo do povo, para o povo e

    pelo povo. Somos cada vez mais governados por decises autocrticas, por bordes e jarges

    que no nos estimulam a pensar, ponderar e criticar. Mas que, sem dvida, nos ensinam a

    contest-los, a refut-los e, inconscientemente, a no aceit-los seno como instrumentos de

    opresso, injustia e desigualdade. Parece fora de dvida que os sistemas polticos tornam-se

    cada vez mais anacrnicos e incapazes de dar respostas s nossas inquietaes, ante a

    indiferena do poder apegado aos formalismos de suas prprias contradies.

    O que est em jogo no apenas a eficincia, utilidade e racionalidade dos sistemas e das

    instituies polticas, mas os prprios princpios em que se baseia a democracia, como o

    constitucionalismo, concebido, essencialmente, como uma forma de controlar o poder que,

    pelo visto, j no se consegue controlar, nem mesmo quando se trata de cont-lo nos limites

    da lei e, menos ainda, da tica. Como reformar essas prticas, processos e instituies o

    II Democracia e Poderes do Estado

    junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 9

    desafio com que nasce o novo sculo, se que algum quer mesmo reform-las. (Texto de

    1998)

    ....................................

    Aos momentos de humilhao e perda de protagonismo, o Congresso tem reagido sempre

    com uma ampliao nominal de poderes, que pode ser constatada pelo simples confronto das

    diferentes Constituies democrticas que se seguiram aos textos de cunho autoritrio. So

    poderes nominais porque o Congresso, na maioria das vezes, no tem condies efetivas de

    materializ-los, nem de exerc-los. Em uma palavra, o Parlamento brasileiro, nos perodos de

    normalidade democrtica, continua antagonista do poder, recusando-se, mesmo quando no

    controlado pelo Executivo, a assumir o papel de protagonista, que a maioria dos Parlamentos

    dos pases desenvolvidos j exerce, graas a um sistema eleitoral e partidrio compatvel com

    as democracias de massa contemporneas.

    ..................................

    Democracias podem conviver com oligarcas e autocratas. Mas impossvel que sobrevivam

    sem democratas. O resultado dessa sndrome, de que padecemos h quase dois sculos,

    que produz aqui a abertura ao contrrio. (...) Transitamos com mais desenvoltura da

    democracia para a ditadura, do que da ditadura para a democracia. Em outras palavras, como

    nossas democracias foram simples extenses das ditaduras que as geraram, terminam se

    transformando em portas abertas para novas aventuras. O que explica a permanente

    pendularidade entre autoritarismo e populismo. Uma velha e cansativa litania que se repete

    ao longo do tempo.

    ....................................

    Se a democracia continua a ser a plantinha tenra a que h algumas dcadas se referiu

    Otvio Mangabeira, isto se deve menos nossa cultura que pequena tradio de

    cultivarmos hbitos e posturas tpicos dos sistemas democrticos em que as leis e costumes

    so menos obra dos atores diretamente interessados no processo, do que do desejo e

    aspiraes da opinio pblica. Por isso que andamos to devagar, sempre que se trata de

    reformar hbitos, prticas e costumes. As eleies esto neste caso e o recurso de

    desqualificar os adversrios, tambm. Aqui, j sabemos, temos que andar devagar para,

    segundo o velho ditado, no quebrar o santo democrtico que, como se sabe, de barro e,

    pelo visto, ainda mal cozido.

    ................................................

    (...) A concluso inevitvel que a licenciosidade do regime militar se transformou na

    libertinagem do Estado Novo, em plena democracia. Como isto (medida provisria) no existe

    II Democracia e Poderes do Estado

    junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 10

    em nenhum outro pas democrtico do mundo, a concluso fatal que estamos

    contaminando a legitimidade da democracia brasileira, com instrumentos ilegtimos de nossa

    prpria autocracia. (...)

    A dvida que persiste se a ilegitimidade dos meios no contamina a legitimidade dos fins.

    Por melhor e mais pura que tenha sido a inteno dos constituintes de 1987, fica difcil

    explicar como um regime democrtico pode conciliar as virtudes da democracia e dos

    instrumentos democrticos de governo, com os defeitos de origem dos mecanismos dos

    regimes autocrticos. Em nosso caso, o pior que conseguimos juntar num mesmo

    instrumento, licenciosidade e libertinagem perfeitamente compreensveis nos sistemas que

    so contrafaes democrticas, mas incompatveis, sem duvida, com toda e qualquer genuna

    democracia que pretenda ter este nome e adotar as suas prticas.

    .............................................

    (...) Continuamos um simulacro de democracia, recheada de prticas autoritrias que se

    incorporam vida, rotina e cultura contempornea de nosso pas, ante o estupor de uns, a

    indiferena de alguns e o conformismo de todos. Adiamos as medidas que todos reclamam e

    contemporizamos com as deformaes que terminam fazendo do que deveria ser uma

    democracia, um mero espasmo democrtico. Poderamos recorrer a dezenas ou centenas de

    exemplos que se transformaram na rotina do quotidiano. Dois, no entanto, parecem-me

    suficientes e bastantes para nos convencermos dos riscos a que estamos sujeitos: o

    espetculo mesquinho e desqualificado da disputa pela direo das duas Casas do Congresso

    de um lado, e a sobrevivncia das medidas provisrias do outro.

    Octaciano Nogueira (cientista poltico)

    Democracias existem onde h governos geis e eficientes, atuando sobre sociedades livres e

    organizadas. Governos fortes agindo sobre sociedades fracas e desarticuladas so, via de

    regra, ditaduras ou autocracias. Governos lerdos e ineficazes, dirigindo sociedades frgeis e

    desorganizadas, geram democracias esclerosadas, as demosclerosis que , justamente, o

    nosso caso. Nessas democracias, apenas formais e aparentes, no existem partidos, mas sim

    aquilo que os japoneses chamam de zoku giin, isto , tribos polticas, aglomerados de

    interesses que s funcionam durante as eleies, para proveito dos donos e caciques. So ou

    no assim os nossos partidos?

    Alpio Severo (jornalista e professor)

    II Democracia e Poderes do Estado

    junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 11

    As democracias operam melhor quando incluem um mercado razoavelmente eficaz de ideias,

    que s funciona quando os cidados tm informaes seguras e existem altos nveis de

    transparncia e honestidade.

    John J. Mearsheimer (professor de Cincia Poltica e terico das relaes internacionais norte-

    americano, em Why Leaders Lie: the Truth about Lying in International Politics)

    Num estado democrtico, a moralidade pblica no apenas obrigao moral ou jurdica, mas

    tambm uma obrigao poltica por excelncia imposta pelo princpio que regula a vida do

    governo democrtico, e que o distingue de toda outra forma de governo at hoje existente, o

    princpio do poder pblico.

    Norberto Bobbio (jurista, filsofo poltico e senador vitalcio italiano, em LUtopia Capovolta)

    A crise dos Estados atuais manifesta-se sobretudo na falta de lideranas democrticas com

    sentido moral. Podem ser contados nos dedos os polticos, magistrados, parlamentares que

    merecem o ttulo de estadista.

    Roberto Romano (professor de tica e Filosofia Poltica)

    (...) nesse momento assistimos ao questionamento das instituies democrticas, partidos e

    governos. No o questionamento da democracia, como querem alguns, mas o

    questionamento dessa democracia, desses partidos polticos, desses governos que a esto.

    Silvio Caccia Bava (Associao Latino-Americana de Organizaes de Promoo do

    Desenvolvimento ALOP)

    Talvez a dimenso mais preocupante da recesso democrtica tenha sido o declnio da

    autoconfiana, energia e eficcia democrtica nos EUA e no Ocidente em geral. Aps anos de

    hiperpolarizao, impasse e corrupo por meio de financiamento de campanha, as principais

    democracias do mundo esto cada vez mais disfuncionais, com fechamento de governos e a

    inabilidade de aprovar coisas bsicas como um oramento.

    Larry Diamond (professor da Universidade de Stanford, especialista em democracia)

    II Democracia e Poderes do Estado

    junho/2013

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Ci%C3%AAncia_Pol%C3%ADticahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Rela%C3%A7%C3%B5es_internacionaishttp://pt.wikipedia.org/wiki/Povo_dos_Estados_Unidoshttp://pt.wikipedia.org/wiki/Povo_dos_Estados_Unidoshttp://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_pol%C3%ADtica
  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 12

    Segundo o filsofo italiano Norberto Bobbio, para um regime democrtico, o estar em

    transformao seu estado natural: a democracia dinmica, o despotismo esttico. Isso

    mostra a vida em sua dinmica contra o eixo dominante em seu interesse. o que torna a

    democracia uma escolha de modelo poltico vivo. Mas para isso o cidado precisa votar. um

    momento sagrado para o futuro democrtico. Ento, como explicar que, no Brasil, cerca de

    20% da populao no votou no primeiro turno das eleies (2014)? uma questo para

    pensar.

    No h um modelo de governo perfeito. No entanto, dentre todos, a democracia o melhor

    deles. Os modelos de dominncia sempre se mostram capazes de despertar conflitos graves

    em face das diferenas de objetivos e de interesses pessoais, inevitveis na natureza humana.

    Muito tempo no poder traz desgaste nas relaes e o antagonismo, que se vo tornando

    insuportveis.

    Estamos vivendo no Brasil um longo perodo de dominncia, centrado num esprito negativo

    da diviso de classes, em constantes ataques maniquestas, que tem levado manuteno do

    poder. O Brasil vive o perigo da dominncia, que o melhor para a situao, a qual lutar para

    mant-lo. Os que tm maior discernimento ressaltam a importncia das mudanas e, no caso

    democrtico, o enfrentamento vir pela competncia na defesa das convices. Mas como

    fazer isso num pas que tem regies to distintas em termos de desenvolvimento e culturas?

    (...) Sabe-se que que a democracia d expresso a dois valores que nos so caros: liberdade

    (certamente) e igualdade (difcil, em face das classes sociais to distantes, mas aceita, mesmo

    a custo alto, para que seja concedida a todos). Somente a boa poltica permite amenizar os

    conflitos sociais.

    Na lembrana do nascedouro dos modelos polticos, tem-se hoje a percepo de que a

    democracia venceu. E ela pressupe a alternncia.

    Luiz Carlos Corra Carvalho (presidente da Associao Brasileira do Agronegcio ABAG)

    As medidas provisrias deformam o regime democrtico: o Executivo legisla e o Parlamento

    fica no discurso. As leis so da pior qualidade e as MPs recebem penduricalhos que nada tm

    a ver com elas para possibilitar negociaes feitas por pequenos grupos a servio de lobistas.

    Jos Sarney

    II Democracia e Poderes do Estado

    junho/2013

  • Reforma Poltica Tomo II Componentes da reforma poltica

    Senador FERNANDO COLLOR 13

    (...) o Brasil um dos raros casos de regime presidencialista de governo em que um indivduo

    indivduo porque no pode se dividir tem a curiosa e insustentvel prerrogativa

    depertencer a dois poderes ao mesmo tempo. No Brasil, o cidado eleito pelo voto para

    represent-lo no Legislativo, com toda a naturalidade atravessa a Praa dos Trs Poderes e

    segue para o Executivo, como ministro do Executivo, que lhe d as ordens, que pode nome-

    lo e demiti-lo quando quiser. No perde o mandato, usa do artifcio formalista do pedido de

    licena e finca os ps em duas canoas.

    (...) A promiscuidade institucional, verdadeiro insulto vontade soberana do povo, esbulho

    praticado com a conivncia geral, repetido vontade nos estados e municpios, tem

    consequncias perversas para a democracia, pois atenta contra a Constituio e o livre

    exerccio dos poderes, que havero de ter assegurada a independncia recproca caso

    desejem manter a legitimidade.

    (...) Dir-se- que essa uma prtica antiga, uma das peculiaridades do presidencialismo

    brasileira, outra jabuticaba. Pois bem, trata-se de estelionato institucional, de charlatanice

    bem-sucedida, que urge revogar. Seria a primeira e mais importante medida de revitalizao

    do Parlamento, testemunho de respeito vontade do povo.

    (...) (Assim), quando um deputado ou senador julgar que servir melhor Repblica ocupando

    cargo no Executivo, ou no Judicirio, perder ipso facto o mandato legislativo.

    Flavio Flores da Cunha Bierrenbach (ex-deputado, ex-ministro do STM e ex-procurador do

    estado de So Paulo)

    O sistema poltico brasileiro caracte