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Relatório de Estágio
Golpes de Arco na Aprendizagem e Performance do Violino:
O Papel dos Excertos de Orquestra no Aperfeiçoamento
da Técnica de Arco
Félix Manuel Alonso Duarte
Mestrado em Ensino de Música
Julho de 2018
Orientador: Professor Doutor Tiago Neto
Relatório de Estágio
Golpes de Arco na Aprendizagem e Performance do Violino:
O Papel dos Excertos de Orquestra no Aperfeiçoamento
da Técnica de Arco
Félix Manuel Alonso Duarte
Relatório Final do Estágio do Ensino Especializado, apresentado à Escola Superior de
Música de Lisboa, do Instituto Politécnico de Lisboa, para cumprimento dos requisitos à
obtenção do grau de Mestre em Ensino de Música, conforme Decreto-Lei n.º 79/2014, de
14 de maio.
Julho de 2018
Orientador: Professor Doutor Tiago Neto
i
Índice Geral
Índice Geral ....................................................................................................................... i
Índice de Figuras ............................................................................................................. iii
Índice de Tabelas ............................................................................................................ vii
Índice de Gráficos .......................................................................................................... viii
Agradecimentos ............................................................................................................... ix
Resumo I ........................................................................................................................... x
Abstract I ......................................................................................................................... xi
Resumo II ....................................................................................................................... xii
Abstract II ...................................................................................................................... xiii
Lista de Termos e Abreviaturas ..................................................................................... xiv
PRIMEIRA PARTE - PRÁTICA PEDAGÓGICA .......................................................... 1
1. Caracterização da Escola .............................................................................................. 1
1.1. História ............................................................................................................... 1
1.2. Meio envolvente ................................................................................................. 2
1.3. Instalações e equipamentos ................................................................................ 3
1.4. Projeto Educativo ............................................................................................... 4
1.4.1. Missão e objetivos gerais ............................................................................ 4
1.4.2. Oferta Educativa ......................................................................................... 5
1.5. Órgãos de gestão................................................................................................. 7
1.6. Comunidade Educativa ....................................................................................... 7
1.6.1. Alunos ......................................................................................................... 7
1.6.2. Pessoal docente ........................................................................................... 8
1.6.3. Pessoal não docente .................................................................................... 9
1.6.4. Associação de Pais e Encarregados de Educação ..................................... 10
1.7. Protocolos e Parcerias ....................................................................................... 10
1.8. Análise SWOT.................................................................................................. 11
2. Prática Educativa ........................................................................................................ 13
2.1. Classe de Violino da Escola de Música do Conservatório Nacional ................ 13
2.1.1. Aluna A ..................................................................................................... 14
2.1.2. Aluna B ..................................................................................................... 16
2.1.3. Aluno C ..................................................................................................... 18
3. Reflexão Final ............................................................................................................ 21
ii
SEGUNDA PARTE - INVESTIGAÇÃO ...................................................................... 24
Introdução ....................................................................................................................... 24
4. Contextualização ........................................................................................................ 25
5. As Escolas Violinísticas ............................................................................................. 26
5.1. Importância da mão direita no domínio do arco ............................................... 35
5.2. Colocação e funcionamento da mão direita ...................................................... 37
6. A construção do som .................................................................................................. 40
6.1. Golpes de arco e arcadas .................................................................................. 41
6.2. Classificações dos variados golpes de arcos .................................................... 43
6.2.1. Golpes de arco longos ............................................................................... 44
6.2.2. Son filé ...................................................................................................... 44
6.2.3. Legato ....................................................................................................... 45
6.2.4. Détaché ..................................................................................................... 47
6.2.5. Golpes de arco curtos ................................................................................ 53
6.2.6. Golpes de arco atirados e saltados ............................................................ 58
6.2.7. Golpes de arco saltados (sautillé) ............................................................. 59
6.2.8. Golpes de arco atirados (Spiccato) ........................................................... 63
6.2.9. Golpes de Arco Mistos ............................................................................. 68
7. Metodologia de Investigação ...................................................................................... 70
7.1. Problemática e Justificação do Tema ............................................................... 70
7.2. Excertos de Orquestra como Ferramenta Pedagógica ...................................... 73
8. Análise de Resultados ............................................................................................... 108
8.1. Entrevistas ...................................................................................................... 108
8.2. Questionário ................................................................................................... 131
8.2.1. Análise de dados do questionário ........................................................... 131
9. Reflexão Final .......................................................................................................... 144
Anexos .......................................................................................................................... 150
iii
Índice de Figuras
Figura 1 - Golpe de Arco - Bariolage ............................................................................. 27
Figura 2 - Son Filé: Exemplo musical do 2º and. da Sonata "Kreutzer", para violino
e piano de L.V. Beethoven (c.197 a 200) ..................................................... 44
Figura 3 - Legato: Exemplo musical da peça "L'Abeille", op. 13, n.º 9 de F.
Schubert (c. 1 a 3) ........................................................................................ 45
Figura 4 - Détaché: Exemplo musical da peça "Prelude and Allegro" in the style of
Pugnani – F. Kreisler (c. 1 a 2) .................................................................... 47
Figura 5 - Grande détaché: Exemplo musical do 4º and. da Sonata para violino e
piano de C. Franck (c. 237 a 238) ................................................................ 48
Figura 6 - Pequeno détaché: Exemplo musical do 1º and. da Sonata “Kreutzer” de
Beethoven ..................................................................................................... 48
Figura 7 - Quadro de Golpes de Arco provenientes do Détaché segundo Flesch ........... 49
Figura 8 - Tremolo: Exemplo musical ............................................................................ 49
Figura 9 - Détaché acentuado: Exemplo musical do 1º and. da Sonata "Kreutzer" de
Beethoven (c. 85 a 87) ................................................................................. 49
Figura 10 - Portato: Exemplo musical do 1º and. do Concerto para violino de F.
Mendelssohn, op. 64 (c. 139 a 141) ............................................................. 50
Figura 11 - Détaché Porté: Exemplo musical da Ciaccona da 2º Partita para Violino
Solo de J.S. Bach (c. 160 a 162) .................................................................. 51
Figura 12 - Détaché Lancé: Exemplo musical do Double da 1ª Partita para Violino
Solo de Bach (c. 1 a 3) ................................................................................. 51
Figura 13 - Fouetté: Exemplo musical do 2º and. da Sonata "Kreutzer" de Beethoven
(c. 196) ......................................................................................................... 52
Figura 14 - Grand Détaché Porté: Exemplo musical do 1º and. da 5ª Sonata para
violino e piano de C. Santoro (c. 1 a 4) ........................................................ 52
Figura 15 - Détaché do tipo "duro": Exemplo musical do 1º and. da 4ª Sonata para
violino e piano de Santoro (c. 1 a 5) ............................................................ 53
Figura 16 - Martelé: Exemplo musical do 1º and. da Sonata “Kreutzer” de Beethoven
(c. 19 a 23).................................................................................................... 54
Figura 17 - Staccato/Staccato "Preso": Exemplo musical da Introdução e Rondó
Caprichoso, op. 28 C. Saint-Saëns (c.88 a 89) ............................................. 55
Figura 18 - Quadro de Golpes de Arco de Staccato segundo Mariana Salles ................ 56
Figura 19 - “Arco Viotti": Exemplo musical do 1º and. do Concerto n.º 22 para
Violino em Lá m de G.B. Viotti (1 c. antes da letra C) ............................... 56
Figura 20 - Staccato Volante: Exemplo musical da peça Havanaise, op. 83 de
Saint - Saëns (c. 117 a 118) .......................................................................... 57
Figura 21 - Spiccato volante: Exemplo musical do 3º and. do Concerto para Violino,
op. 64 de Mendelssohn (4 c. antes da letra M)............................................. 58
iv
Figura 22 - Spiccato: Exemplo musical do 1º and. da Sonata em Mi menor para
Violino e Piano de Mozart (c. 8 e 9) ............................................................ 58
Figura 23 - Sautillé: Exemplo musical da peça Moto Perpétuo, op. 11 para Violino
e Piano de N. Paganini (c. 1 a 4) .................................................................. 60
Figura 24 - Ricochet: Exemplo musical do 2º and. da Sonata “Kreutzer” de
Beethoven (c. 82 a 83) ................................................................................. 61
Figura 25 - Saltati: Exemplo musical da peça Travessura, op. 5 para Violino Solo
de S. Salles (c. 32) ........................................................................................ 62
Figura 26 - Arpejos em Ricochet: Exemplo musical da peça Cascata de M. Salles
(c. 9 a 2)........................................................................................................ 62
Figura 27 - Ricochet e Arpejos Controlados: Exemplo musical do 1º and. do
Concerto para Violino, op.64 de Mendelssohn (c. 34 a 36 da cadência) ..... 63
Figura 28 - Spiccato Cantabile: Exemplo musical da Ciaconna da 2ª Partita para
Violino Solo de Bach (c.169 a 170) ............................................................. 65
Figura 29 - Spiccato Percursivo: Exemplo musical da 9ª variação do 24º Capricho
de Paganini (c. 109 a 111) ............................................................................ 65
Figura 30 - Spiccato "duro": Exemplo musical da Dança Miudinho da 4ª Bachiana
Brasileira para Violino Solo de H.Villa-Lobos (c.1 a 8).............................. 66
Figura 31 - Collé: Exemplo musical do 2º and. da Sonata “Kreutzer” de Beethoven
(c. 42 a 44).................................................................................................... 66
Figura 32 - Stacato sur place: Exemplo musical do 7º estudo de R. Kreutzer para
Violino Solo ................................................................................................. 67
Figura 33 - Arpejos Atirados: Exemplo musical do 1º Capricho para Violino Solo
de Paganini (c. 1 e 2) .................................................................................... 67
Figura 34 - Variadas articulações e golpes de arco para exercitar o 2º estudo de
Kreutzer ........................................................................................................ 69
Figura 35 - Excerto n.º 1: 4º andamento da 39ª Sinfonia de W. A. Mozart, c. 1 - 40 ..... 75
Figura 36 - Exercício em détaché da introdução (c. 1 a 4) ............................................. 76
Figura 37- Exercício de articulações e golpes de arco nas respetivas cordas soltas
(c. 1 e 2)........................................................................................................ 76
Figura 38 - Exercício de subdivisão incorporando os respetivos golpes de arco
(c. 1 a 4)........................................................................................................ 77
Figura 39 - Exercícios em galope, alternados em legato/détaché e legato/spiccato
(c. 16 a 19).................................................................................................... 78
Figura 40 - Exercícios em galopes inversos, alternados em legato/détaché e
legato/spiccato (c. 16 a 19)........................................................................... 78
Figura 41 - Exercícios em colcheia/tercina de semicolcheia, alternados em
legato/détaché e legato/spiccato (c. 16 a 19) ................................................ 78
Figura 42 - Exercícios em tercina de semicolcheia/colcheia, alternados em
legato/détaché e legato/spiccato (c. 16 a 19) ................................................ 79
v
Figura 43 - Excercíos de deslocação no segundo tempo alternandos em
détaché/staccato (c. 16 a 19) ........................................................................ 79
Figura 44 - Excercíos de deslocação no terceiro tempo alternandos em
détaché/staccato (c. 16 a 19) ........................................................................ 79
Figura 45 - Excercíos de deslocação no quarto tempo alternandos em
détaché/staccato (c. 16 a 19) ........................................................................ 79
Figura 46 - Exercício de suspensão e preparação de transição (c. 28 a 31) .................... 80
Figura 47 - Exercício de afinação em cordas dobradas e em détaché (c. 16 a 19) ......... 81
Figura 48 - Excerto n.º 2: Scherzo - Sonho de uma Noite de Verão de F. Mendelssohn,
c. 17 a 99 ...................................................................................................... 82
Figura 49 - Exercício de subdivisão e controlo e definição do spiccato nas respetivas
cordas soltas (c. 1 a 4) .................................................................................. 83
Figura 50 - Exercício de definição do spiccato nas respetivas cordas soltas (c. 1 a 4) ... 83
Figura 51 - Exercício de suspensão e preparação de transição (c. 1 a 4) ........................ 84
Figura 52 - Exercício de legato para a coordenação entre as duas mãos (c. 41 a 44) ..... 85
Figura 53 - Exercício de détaché para a coordenação entre as duas mãos (c. 41 a 44) . 85
Figura 54 - Exercício em galope com colcheia em détaché (c. 48 a 51) ........................ 85
Figura 55 - Exercício em colcheia com galope em détaché (c. 48 a 51) ........................ 85
Figura 56 - Exercício em colcheia com duas semicolcheias em détaché (c. 48 a 51) .... 86
Figura 57 - Exercício em duas semicolcheias com colcheia em détaché (c. 48 a 51) .... 86
Figura 58 - Exercício com deslocação na 2ª semicolcheia em détaché/staccato
(c. 48 a 51).................................................................................................... 86
Figura 59 - Exercício com deslocação na 3ª semicolcheia em détaché/staccato
(c. 48 a 51).................................................................................................... 86
Figura 60 - Exercício com deslocação na 4ª semicolcheia em détaché/staccato
(c. 48 a 51).................................................................................................... 86
Figura 61 - Exercício com deslocação na 5ª semicolcheia em détaché/staccato
(c. 48 a 51).................................................................................................... 86
Figura 62 - Exercício com deslocação na 6ª semicolcheia em détaché/staccato
(c. 48 a 51).................................................................................................... 86
Figura 63 - Exercício em síncopas em détaché (c. 76 a 79) ............................................ 87
Figura 64 - Exercício de afinação e ligação entre as cordas (c. 87) ................................ 88
Figura 65 - Excerto n.º 3: 3º andamento da 4ª Sinfonia de J. Brahms, c. 1 - 44 ............. 89
Figura 66 - Exercício em cordas soltas para a definição dos golpes de arco (c.1 a 4) .... 90
Figura 67 - Exercício de galope (c. 8 e 9) ....................................................................... 91
Figura 68 - Exercício de galope inverso (c. 8 e 9) .......................................................... 91
Figura 69 - Exercício de colcheias e semicolcheias (c. 8 e 9)......................................... 91
Figura 70 - Exercício de colcheias e semicolcheias (c. 8 e 9)......................................... 91
vi
Figura 71 - Exercício de semicolcheias e colcheias (c. 8 e 9)......................................... 92
Figura 72 - Exercício de deslocação no 2º tempo (c. 8 e 9) ............................................ 92
Figura 73 - Exercício de deslocação no 3º tempo (c. 8 e 9) ............................................ 92
Figura 74 - Exercício de deslocação no 4º tempo (c. 8 e 9) ............................................ 92
Figura 75 - Exercício de afinação em détaché (c. 8 e 9) ................................................. 92
Figura 76 - Exercício de mudança de posição em glissando em détaché (c. 29 a 31) .... 93
Figura 77 - Exercícios de extensão de 4º e 1º dedos em détaché (c. 42 e 43) ................. 94
Figura 78 - Exercícios de golpes de arco (c. 32 a 34) ..................................................... 94
Figura 79 - Excerto n.º 4: Adagio do 3º andamento da 9ª Sinfonia de A. Bruckner
(c. 57 a 64).................................................................................................... 95
Figura 80 - Exercício de legato nas respetivas cordas soltas (c. 57) ............................... 96
Figura 81 - Exercício de suspensão e preparação de transição (c.57) ............................. 96
Figura 82 - Exercício de afinação em détaché (c.57) ...................................................... 97
Figura 83 - Excerto n.º 5: Don Juan de R. Strauss, c. 1 - 62 ........................................... 98
Figura 84 - Exercício de staccato em cordas soltas (c. 1) ............................................. 100
Figura 85 - Exercício de deslocação na 1ª semicolcheia (c.1) ...................................... 100
Figura 86 - Exercício de deslocação na 2ª semicolcheia (c. 1) ..................................... 100
Figura 87 - Exercício de deslocação na 3ª semicolcheia (c.1) ...................................... 100
Figura 88 - Exercício de deslocação na 4ª semicolcheia (c. 1) ..................................... 100
Figura 89 - Exercício em de síncopas em détaché (c. 6) ............................................... 102
Figura 90 - Exercício de galope com colcheias em détaché (c. 6) ................................ 102
Figura 91 - Exercício de colcheia com galope em détaché (c. 6) ................................. 102
Figura 92 - Exercício de semicolcheias com colcheia em détaché (c. 6) ...................... 102
Figura 93 - Exercício de colcheia com semicolcheias em détaché (c. 6) ...................... 102
Figura 94 - Exercício de suspensão preparatória de transição (c. 6) ............................. 102
Figura 95 - Exercício de suspensão preparatória de transição cada 2 tempos (c. 6) ..... 103
Figura 96 - Exercícios de ritmo para a precisão e afinação das últimas duas notas
na transição do c. 35 para 36 ...................................................................... 104
Figura 97 - Exercícios de ritmo para a precisão e afinação das últimas três notas
na transição do c. 35 para 36 ...................................................................... 104
Figura 98 - Exercícios de mudança de posição com glissando e nota de passagem (c. 35) . 105
Figura 99 - Exercício de suspensão preparatória de transição reduzida gradualmente (c.35) . 105
Figura 100 - Exercício de spiccato nas respetivas cordas soltas (c. 52 a 59) ................ 106
Figura 101 - Exercício de spiccato repetindo cada nota num grupo de tercinas (c. 52) 106
Figura 102 - Exercício de cordas soltas nas respetivas cordas e com os respetivos
golpes de arco ........................................................................................... 107
vii
Índice de Tabelas
Tabela 1 - Distribuição de alunos 2016/2017 ................................................................... 8
Tabela 2 - Distribuição de pessoal docente para a EAMCN ............................................. 9
Tabela 3 - Distribuição de pessoal não docente na EAMCN ............................................ 9
Tabela 4 - Quadros de objetivos ..................................................................................... 13
Tabela 5 - Violinistas entrevistados .............................................................................. 109
Tabela 6 - Professores de violino entrevistados ............................................................ 123
viii
Índice de Gráficos
Gráfico 1 - Questão n.º 1: Quantos anos tens? .............................................................. 132
Gráfico 2 - Questão n.º 2: Que grau frequentas? .......................................................... 133
Gráfico 3 - Questão n.º 3: Há quantos anos estudas violino? ....................................... 134
Gráfico 4 - Questão n.º 4: Praticas cordas soltas no teu estudo? .................................. 135
Gráfico 5 - Questão n.º 5: Conheces algum dos seguintes golpes de arco? Quais? ...... 136
Gráfico 6 - Questão n.º 6: Exercitas golpes de arco em cordas soltas?......................... 137
Gráfico 7 - Questão n.º 7: Aperfeiçoas golpes de arco em estudos esecificos como
Kreutzer, Dont, Mazas, Fiorillo ou Rode? ................................................. 138
Gráfico 8 - Questão n.º 8: Já ouviste falar em excertos de orquestra? .......................... 139
Gráfico 9 - Questão n.º 8.1: O teu professor trabalha excertos de orquestra contigo? . 140
Gráfico 10 - Questão n.º 8.2: Se não, tens ou terias interesse em abordá-los como
forma de estudo? ...................................................................................... 141
Gráfico 11 - Questão n.º 9: Consideras que o estudo de excertos de orquestra pode
ser também uma forma de exercitar golpes de arco? ............................... 142
Gráfico 12 - Questão n.º 10: Gostarias ques os excertos de orquestra fossem: ............ 143
ix
Agradecimentos
Todo este trabalho não poderia ter sido realizado sem a importante contribuição de
inúmeras pessoas e instituições nas quais estou imensamente grato.
Em primeiro lugar, à Escola Superior de Música de Lisboa, que me admitiu e recebeu
como aluno de Mestrado em Ensino de Música entre 2016 e 2018 e ao Professor Doutor
Tiago Neto, por toda atenção, dedicação e profissionalismo com que sempre se entregou.
À Escola Artística de Música do Conservatório Nacional, que se disponibilizou para me
acolher no âmbito do Estágio do Ensino Especializado e à Professora Joana Cipriano, por
toda a sua colaboração e apoio durante o estágio.
Aos fantásticos músicos e professores, por quem nutro uma profunda admiração e
respeito que aceitaram gentilmente fazer parte das minhas entrevistas, são eles: Alexandre
Correia, Augusto Trindade, Erik Heide, Evandra Gonçalves, James Dahlgren, Jorge
Teixeira, Luiz Filipe Coelho, Nuno Meira e Paula Carneiro.
Ao meu professor, Joaquim Matos, com quem dei os primeiros passos no violino e me
acompanhou durante doze anos da minha formação pela qual lhe estou muito agradecido
e que, mais uma vez, voltou para fazer parte da minha formação, desta vez como
entrevistado para o meu Relatório de Estágio.
Aos meus caríssimos amigos e colegas Sara Llano e Rui Cristão que, desde o início, se
mostraram motivados e se disponibilizaram para contribuir também para este trabalho
como entrevistados.
Ao meu grande amigo Tomás Costa, por todas as suas dicas e sugestões que me foram
preciosas.
À minha família, que sempre me apoiou, em especial à minha irmã Rita que foi
incansávelmente dedicada na ajuda à realização deste trabalho.
Por último, à minha maravilhosa namorada Bruna Moreira que esteve sempre ao meu
lado, com uma paciência interminável, e oferecendo um indispensável apoio e ajuda em
todos os momentos.
x
Resumo I
Por todo o seu passado histórico até aos dias de hoje, a Escola Artísitca de Música do
Conservatório Nacional (EAMCN) é uma escola pública de ensino artístico que se destaca
como um exemplo de excelência em Portugal e como uma das principais e mais ativas
referências no panorama da formação musical.
Para além de toda a apresentação e caracterização que será feita desta instituição, o
objetivo deste trabalho irá também debruçar-se sobre a prática de ensino desenvolvida na
classe da professora Joana Cipriano com três alunos de graus de ensino contrastantes (4º
ano de escolaridade/iniciação, 2º e 8º graus), da qual fui ouvinte e observador.
De acordo com a evolução e características singulares de cada aluno avaliadas ao longo
do ano no âmbito do estágio, haverá lugar para uma reflexão e consequentes conclusões
sobre toda a atividade analisada durante os vários momentos, tanto no que diz respeito ao
trabalho desenvolvido pela professora, como pelos alunos.
Por último, e talvez o mais importante, partilharei a experiência que vivi também como
professor com estes alunos e os resultados, que obtive com os contributos que pude
oferecer nas três aulas leccionadas durante o ano letivo inteiro.
xi
Abstract I
For all its historical past to the present day and its geographical location, EAMCN is a
public school of artistic education that stands out as an example of excellence in Portugal
and as one of the most active references in the panorama of music education.
In addition to all the presentation and characterization that will be made of this institution,
the objective of this work will also cover the teaching practice developed in the class of
the teacher Joana Cipriano with three students of different levels of education (4th year
of school/initiation, 2nd and 8th degrees), of which I was both a listener and an observer.
According to the evolution and unique characteristics of each student evaluated
throughout the year within the scope of this internship, there will be room for a reflection
and consequent conclusions about all the activity analysed during the various moments,
both with respect to the work developed by the teacher, as well as by the students.
Last but not least, I will share the experience that I also lived as a teacher with these
students and the results I got from the contributions I was able to offer with only the three
classes that I taught during the entire school year.
xii
Resumo II
A investigação que irei desenvolver terá como objetivo a abordagem aos vários golpes de
arco que são executados e praticados na aprendizagem violinística e, em particular, a
contribuição que a prática de excertos de orquestra pode oferecer para o estudo da técnica
de arco. Concretamente, será uma forma mais aprofundada de conhecer melhor todo o
tipo de golpes de arco que podemos usufruir na prática violinística e poder entender mais
pormenorizadamente como funciona a sua mecânica.
Em relação à prática de excertos de orquestra, procurarei explorar se esta pode (ou não)
influenciar no aprimoramento da técnica de golpes de arco e que impacto poderá ter na
evolução do aluno. Para enriquecer esta pesquisa serão realizadas entrevistas a violinistas
profissionais (portugueses e estrangeiros), solistas, instrumentistas de orquestra e
professores de violino de diferentes níveis de ensino.
Para complementar a investigação, serão também levantados dados, por inquérito,
dirigidos a professores e alunos de algumas escolas e conservatórios de música do país,
relativos à importância que é dada ao estudo e prática dos golpes de arco.
A partir das opiniões e resultados das entrevistas e inquéritos realizados será feita uma
reflexão final onde se apontarão as principais conclusões do estudo.
Este trabalho destina-se, não só aos alunos iniciantes e aos que ainda procuram melhorar
a sua técnica de mão direita no que toca ao domínio dos golpes de arco, mas também a
todos os professores que diariamente refletem sobre a melhor maneira de ensinar e
melhorar a forma como transmitem o conhecimento relativo à abordagem de um domínio
sólido dos golpes de arco.
Palavras-chave: violino, técnica de arco, golpes de arco, excertos de orquestra
xiii
Abstract II
The research that I will develop will aim at the approach to the various strokes that are
performed and practiced in violin learning and in particular the contribution that the
practice of orchestral excerpts can offer for the study of bow strokes. Concretely it will
be a more in-depth way to better know the different types of bow strokes that we can
apply in the violinistic practice and to be able to understand in more detail how its
mechanic works.
Regarding the practice of orchestral excerpts, I will try to explore whether this may (or
may not) influence the improvement of the bowing technique and what impact it may
have on the progresso of the student. To enrich this research, interviews will be conducted
with professional violinists (portuguese and foreigners), soloists, orchestra
instrumentalists and violin teachers from different levels of education.
To complement the research, will also be collected by survey, directed to teachers and
students of some music schools and conservatories in the country, regarding the
importance that is given to the study and practice of bow strokes.
Based on the opinions and results of the interviews and surveys carried out, a brief final
reflection will be made so that some conclusions may be drawn up.
This work aims not only at beginning students and those who still seek to improve their
right-hand technique in the field of bow strokes, but also to all the teachers who search
every day on the best way to teach and improve the way they pass the knowledge
regarding to a solid domain of bow strokes.
Keywords: violin, right hand technique, bow strokes, orchestral excerpts
xiv
Lista de Termos e Abreviaturas
AME – Academia de Música de Espinho
AMPB – Academia de Música de Paços de Brandão
ARTAVE – Escola Profissional e Artística do Vale do Ave
ASE – Ação Social Escolar
CMCGB – Conservtório de Música Calouste Gulbenkian de Braga
CMP – Conservatório de Música do Porto
D – Detaché
EGEAC – Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural
EAMCN – Escola de Música do Conservatório Nacional
EPABI – Escola Profissional de Artes da Beira Interior
ESART – Escola Superior de Artes Aplicadas
ESMAE – Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo
ESML – Escola Superior de Música de Lisboa
FCSH – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
INATEL – Instituto Nacional para o Aproveitamento dos Tempos Livres
IPL – Instituto Politécnico de Lisboa
L – Legato
PE – Projeto Educativo
PSP – Polícia de Segurança Pública
QZP – Quadro Zona Pedagógica
SERE – Sistema Educativo de Registro Escolar
Sp – Spiccato
St – Staccato
UÉ – Universidade de Évora
UNL – Universidade Nova de Lisboa
1
PRIMEIRA PARTE - PRÁTICA PEDAGÓGICA
1. Caracterização da Escola
1.1. História
A Escola Artística de Música do Conservatório Nacional surge da iniciativa de um projeto
de reforma do ensino da Música em Portugal pelo compositor, pianista e pedagogo João
Domingos Bomtempo que, nos anos trinta do século XIX, procurou fundar a primeira
instituição pública portuguesa de ensino da música que não estabelecesse ligações com a
igreja. Só depois de muitos acontecimentos e alterações relativos a estatutos e cargos nas
várias direcções e após a proclamação da República em 1910, o antigo Real Conservatório
de Lisboa passa a denominar-se Conservatório Nacional de Música.
Em 1919, através da intervenção do Diretor; Vianna da Motta - pianista - e do Subdiretor;
Luís de Freitas Branco - compositor, musicólogo e pedagogo - dá-se a mais importante
das reformas no ensino da música em Portugal graças à inclusão de disciplinas de Cultura
Geral como História, Geografia, Línguas e Literatura Francesa e Portuguesa. O campo
musical foi também engrandecido com a introdução das Ciências Musicais, que
compreendem História da Música, Acústica, Estética Musical, Leitura de Partituras,
Entoação de Solfejo, e do desenvolvimento das classes de Composição, Instrumentação
e Direção.
Posteriormente a este período áureo da Escola de Música, em 1930 sucede um inverso no
desenvolvimento do ensino musical, oriundo dos vários cortes orçamentais que
provocaram o abandono de algumas disciplinas e da adesão de muitos alunos.
Apenas em 1971 surge uma Comissão Orientadora liderada por Madalena Perdigão,
nomeada pelo Ministério da Educação, que vem reformular toda a parte pedagógica que
tinha ficado “adormecida” desde 1930. Graças a esta intervenção foi possível a criação
de um novo plano de estudos que, contrariamente ao anterior, elevava o número de anos
de estudo, inovando o repertório para todos os instrumentos e acrescentando ainda novas
classes de instrumento como, Flauta de Bisel e Alaúde, que anteriormente não constavam
nos planos curriculares. Outro ponto significativo foi também a afiliação experimental do
ensino integrado da Música em parceria com a Escola Secundária Francisco Arruda que
durante dois anos (1972-1974) se inseriu no Conservatório Nacional.
2
Depois da Revolução de 25 de Abril de 1974, a Escola de Música do Conservatório
Nacional agrupa três professores, Francisco Brito e Cunha, Elisa Lamas e Teresa Vieira,
juntamente com três alunos, Maria José Artiaga, João Vieira Caldas e António Wagner
Diniz e constitui uma Comissão Diretiva. Já os cargos de administração e gestão estavam
ao cuidado do Ministério da Educação.
Entretanto, em 1986, pelo Decreto-Lei n.º 310/83, toda a educação geral e artística passa
a estar introduzida numa estrutura mais abrangente às outras áreas de estudo, onde a
música passa a ser dividida em nível secundário (escolas de formação geral) e nível
superior (Universidades/Institutos Politécnicos - mais especializado). Verifica-se assim
uma distribuição de conteúdos e objetivos repartidos consoante a faixa etária à qual cada
aluno corresponde. Um dos exemplos mais significativos é a criação de Escolas
Superiores de Dança e de Música, e à Escola Superior de Teatro e Cinema em Lisboa.
Neste seguimento, foi também criada a Escola de Música do Conservatório Nacional,
onde se passou a leccionar o ensino básico e secundário. Apesar de a direção ter sido
liderada por diversas Comissões Executivas e Diretivas do Ministério durante muito
tempo, em 2009 esta instituição volta a ser representada por um Diretor, tendo a
Professora Ana Mafalda Correia Pernão assumido esse cargo.
Atualmente, mantém o estatuto como uma das principais e mais ativas instituições do
ensino da música em Portugal, e passa a denominar-se Escola Artística de Música do
Conservatório Nacional (EAMCN). (PE, EAMCN, 2016/2017, p. 2 e 3)
1.2. Meio envolvente
A EAMCN está localizada no Bairro Alto em Lisboa, na zona do antigo Convento dos
Caetanos, e caracteriza-se por ser um dos focos mais dinâmicos do bairro. Trata-se de um
lugar com bastante facilidade de acesso aos transportes públicos (autocarro, metro,
elétrico, barco e comboio) e encontra-se bem no centro da cidade. A sua proximidade à
zona do Chiado – onde estão sedeados centros culturais como Teatro Nacional de São
Carlos, Teatro Municipal de São Luiz, Teatro da Trindade – INATEL, Museu de São
Roque, Museu do Chiado e galerias de arte – enriquece culturalmente ainda mais o meio
envolvente e poderá naturalmente propiciar a promoção de parcerias benéficas para a
formação dos alunos.
3
A atividade da EAMCN estende-se também por outros três pólos: Loures e Amadora, a
partir de 2004 e no Seixal, desde 2013/2014. Já em 2008 foi promovido a partir desta
Escola, o projeto da Orquestra Geração, no qual a EAMCN realiza a orientação do
trabalho a nível técnico e pedagógico.
Mesmo passando por um momento de alguma estabilidade, a EAMCN não desiste da
reivindicação de uma posição mais adequada às suas competências e ainda de uma
requalificação (prometida) do seu edifício e respetivo salão de concertos.
1.3. Instalações e equipamentos
O edifício da EAMCN situa-se na zona do antigo Convento dos Caetanos, em pleno
Bairro Alto e apresenta-se com um átrio principal e a entrada para o Salão Nobre que,
apesar de parecerem reabilitados muito recentemente, receberam a sua última intervenção
na década de 1990. Embora alguns espaços tenham sido recuperados desde 2013, o
projeto de requalificação de todo o edifício pela Parque Escolar permanece ainda em
situação de concurso, não havendo ainda uma data definida para o início das obras.
O Salão Nobre funciona como sala de apresentação pública dos alunos e também é
utilizado para a realização de alguns eventos, em especial para concertos de música de
câmara, por possuir excelentes condições acústicas. Por apresentar estas características
tão vantajosas este espaço é requisitado também para provas ou concursos fora do âmbito
escolar. Por último, é de mencionar que o Salão Nobre é também reconhecido pelo seu
valor arquitetónico e artístico.
Outra secção da escola de grande importância é a biblioteca que, naturalmente, tratando-
se de um espaço de consulta e estudo, é conhecida por possuir um valioso arquivo de
partituras e recursos audiovisuais que lhe atribui um estatuto único no contexto do
panorama musical nacional. É também utilizada para audições de alunos, concertos,
conferências e outras atividades.
A nível tecnológico, a EAMCN tem à sua disposição, na maioria das suas salas de
disciplinas teóricas - tanto da formação geral como da artística - projetores de vídeo,
computadores e vários sistemas de som (leitores de CDs e colunas).
4
É de realçar também que os alunos podem usufruir de instrumentos emprestados pela
escola e que esses instrumentos recebem uma constante manutenção por parte de luthiers
de corda e sopro, afinadores de piano e organeiros.
1.4. Projeto Educativo
O Projeto Educativo (PE) apresenta-se como um dos órgãos de formação e execução da
autonomia da escola. Resume-se a um documento que se debruça sobre os propósitos e
finalidades segundo as quais a escola visa a desempenhar o seu papel educativo. Tal como
descreve o Decreto-Lei n.º 75/2008 de 22 de abril, artigo 9, alínea a, o PE é o documento
que consagra a orientação educativa (…) no qual se explicitam os princípios, os valores,
as metas e as estratégias segundo os quais o agrupamento de escolas ou escola não
agrupada se propõe cumprir a sua função educativa. (PE, EAMCN, 2016/2017, p.1)
Para além do PE, também o Regulamento Interno é um documento essencial para toda a
mecânica da atividade escolar tal como o Plano Anual de Atividades desenvolvido em
prol do PE.
1.4.1. Missão e objetivos gerais
Como podemos testemunhar no PE. 2016/2017 projetado pela EAMCN, a sua missão
educativa debruça-se sobre qualificar os alunos através de uma sólida formação nas suas
múltiplas vertentes, humanística, científica, histórica, ética, ecológica, estética, artística e
musical, capacitando-os para uma opção profissional como músicos. (PE, EAMCN,
2016/2017, p.6)
Conclui-se que, claramente, a EAMCN procura promover um nível de ensino de
excelência, em todas as matérias formativas, aliado a uma exigência e rigor que
proporcionem uma eficácia das competências a adquirir em cada período letivo. Há
também uma importante preocupação de aprimorar e solidificar uma base de formação
musical para que se possam formar músicos de excelência e qualificados para o futuro.
Outro aspeto relevante para a EAMCN passa por estimular toda a comunidade envolvente
para a Música, por forma a atingir um maior número candidaturas para a escola e,
consequentemente, conseguir enquadrar cada vez mais alunos e famílias na vida cultural
e musical da cidade de Lisboa e de todo o país.
5
1.4.2. Oferta Educativa
A EAMCN possibilita um ensino aos seus alunos que engloba todos os instrumentos
previstos na legislação em vigor:
- A partir dos 6 anos: Viola Dedilhada, Alaúde, Violino, Viola, Violoncelo, Contrabaixo,
Harpa (cordas), Percussão, Piano, Órgão, Acordeão (teclas), Flauta de Bisel, Flauta
transversal e Clarinete (madeiras);
- A partir dos 8 anos: Oboé, Fagote (madeiras), Trompete, Trompa, Trombone, Tuba
(metais) Cravo (teclas) e Guitarra Portuguesa (cordas).
Na mesma linha do ensino de instrumento, juntam-se também as Classes de Conjunto,
incluindo Coro, Orquestra, Música de Câmara e outros Agrupamentos Instrumentais e/ou
Vocais que venham a ser aprovados em conselho pedagógico. Destes agrupamentos,
destacam-se:
Coros
• Pequenos Cantores do Conservatório Nacional - grupo formado para a interpretação
de obras avançadas para coro infantil.
• Ensemble Peregrinação - grupo que se dedica à música sacra dos séculos XVI e XVII
e canções tradicionais do mundo em língua portuguesa.
• Coro Geral do Conservatório Nacional - grupo de alunos desde os doze anos de idade
até ao final do curso.
Música de Câmara
• Grupo de Percussão do Conservatório Nacional - grupo criado para dar a conhecer o
repertório escrito para percussões mistas e preparar os alunos para futuros
percussionistas/intérpretes.
6
Orquestras
• Orquestra do Conservatório Nacional - grupo de alunos instrumentistas de corda e
sopros, selecionados em função dos projetos anuais a desenvolver. Possibilita também
a oportunidade de alunos finalistas poderem executar obras concertantes a solo.
• Orquestra Jovem do Conservatório Nacional - reúne de maneira geral os alunos das
cordas do 3º ciclo do ensino básico, com intuito de os prepararem para o trabalho de
orquestra.
• Orquestra de Sopros do Conservatório Nacional - é o agrupamento com mais anos de
experiência da escola e junta alunos de sopros e percussão, proporcionando a
oportunidade de tocarem em conjunto repertório para esta formação.
Na EAMCN o regime de ensino é repartido por 3 tipos de cursos:
• Cursos de Iniciação: abrange alunos entre os 6 e os 9 anos que frequentam o 1º ciclo
da escolaridade obrigatória, onde o objetivo é potencializar as capacidades dos alunos
na área da música, para poderem depois ingressar nos cursos de música oficiais, onde
as suas escolhas se adaptam às aptidões desenvolvidas até aí.
• Cursos Básicos: regulado pela Portaria 691/2009 de 25 de Junho, este curso possibilita
um amadurecimento das capacitações musicais, em especial na área do instrumento
ou canto, abrindo caminho para o patamar seguinte no curso secundário, caso seja do
seu interesse. Com uma duração de 5 anos, inicia-se no 1º grau/5º ano de escolaridade.
• Cursos Secundários de Música e Canto e Cursos Profissionais de nível IV como
regularizado pelo Despacho 65/SERE/90 (curso vocacional): de acordo com a
legislação em vigor para os cursos profissionais de música, este curso de
características mais aplicadas, funciona como rampa de transição para a entrada no
ensino superior de música.
Atendendo à legislação atual, os cursos básicos e secundários de Música e Canto podem
ser realizados através dos seguintes regimes de frequência:
• Integrado - todas as disciplinas do currículo da EAMCN são frequentadas.
• Articulado – apenas estão integradas as disciplinas da componente de formação
vocacional e da área de projeto, no curso básico, e apenas as disciplinas das
componentes vocacional e específica, no nível secundário.
7
• Supletivo – apenas as disciplinas da componente de formação vocacional, no curso
básico, e no curso secundário as disciplinas de formação específica e vocacional.
1.5. Órgãos de gestão
Enquanto instituição de ensino a EAMCN é gerida por quatro órgãos:
• Direção - composta por uma diretora, um subdiretor, três adjuntos e três assessores.
Trata-se do órgão executivo que se responsabiliza por todas as gestões e decisões da
escola.
• Conselho Geral - composto por um presidente, sete professores, duas pessoas não
docentes, dois alunos, quatro encarregados de educação, dois representantes da
Autarquia e três representantes da Comunidade.
• Conselho Pedagógico - composto por uma presidente e dez representantes de
Departamentos Curriculares. Este grupo tem como função toda a coordenação e
supervisão das atividades da escola.
• Estruturas de Orientação Educativa - composta por seis coordenadores referentes
às Iniciações, Diretores de Turma, Tutores, Ensino secundário, Ensino básico e
Projeto educativo.
1.6. Comunidade Educativa
1.6.1. Alunos
Foi concluído pela EAMCN que desde 2000/2001 houve um ligeiro aumento do número
de alunos que decidiram frequentar o regime integrado e articulado, ainda assim o regime
supletivo apresenta uma maior dimensão, em particular no ensino secundário.
No ano letivo de 2016/2017, a distribuição de alunos realizada em Lisboa (sede),
Amadora, Loures e o Seixal por curso, nível e regime foi a seguinte (PE, EAMCN,
2016/2017, p. 8).
8
Tabela 1 - Distribuição de alunos 2016/2017
Fonte: PE, EAMCN, 2016/2017, p. 8
É de salientar que uma parte considerável dos alunos pertencentes à EAMCN, residem
em concelhos fronteiriços. Tem sido também cada vez mais frequente a chegada de alunos
de variadas nacionalidades e de diferentes origens geográficas e socioeconómicas, entre
os quais, muitos são apoiados pela Associção Social Escolar (ASE). Outra particularidade
é também a presença de sete alunos com necessidades educativas especiais no ensino
integrado.
1.6.2. Pessoal docente
O quadro de docentes referente ao ano letivo de 2016/2017 apresenta-se com 227
professores, sendo que 46% do total fazem parte do regime de contratação anual (PE,
EAMCN, 2016/2017, p. 8).
9
Tabela 2 - Distribuição de pessoal docente para a EAMCN
Fonte: PE, EAMCN, 2016/2017, p. 8
* Docentes do quadro de outras instituições e que leccionam na EAMCN em acumulação
** Contabiliza-se aqui o professor que presta serviço na EAMCN e na Orquestra Geração
*** Contabilizam-se aqui os 2 professores que prestam serviço na Orquestra Geração e completam horário na EAMCN
**** Incluindo a psicóloga, que sendo partilhada com a Escola Secundária de Pedro Nunes, não possui um vínculo
laboral com a EAMCN.
1.6.3. Pessoal não docente
O pessoal não docente engloba um total de vinte sete integrantes, constituídos por um
Chefe de Serviços de Administração Escolar, cinco Assistentes Técnicos, e vinte e um
Assistentes Operacionais (PE, EAMCN, 2016/2017, p.10).
Tabela 3 - Distribuição de pessoal não docente na EAMCN
Fonte: PE, EAMCN, 2016/2017, p.10
10
1.6.4. Associação de Pais e Encarregados de Educação
A Associação de Pais e Encarregados de Educação foi criada em 1991, e em 2007, foi
igualmente constituída no pólo de Loures. Esta associação coopera com a Escola
frequentando os conselhos de turma e o conselho geral, contribuindo com iniciativas
próprias e apoiando as variadas atividades elaboradas pela escola.
1.7. Protocolos e Parcerias
A EAMCN tem desenvolvido laços institucionais bem-sucedidos e criado protocolos e
parcerias com as seguintes entidades:
• Câmara Municipal da Amadora
• Câmara Municipal de Loures
• Câmara Municipal de Lisboa
• Câmara Municipal do Seixal
• Câmara Municipal de Sintra
• Câmara Municipal de Sesimbra
• Cultivarte
• Fundação Calouste Gulbenkian
• Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural
• Instituto Nacional para o Aproveitamento dos Tempos Livres
• Escola Superior de Música de Lisboa – Instituto Politécnico de Lisboa
• Escola Profissional de Artes da Beira Interior
• Faculdade de Ciências Sociais e Huamans
• Grupo de Música Contemporânea de Lisboa
• Instituto Piaget – Almada
• Universidade de Évora
Parcerias
• Associação de Amigos da Escola de Música do Conservatório Nacional
• Rotary Club Lisboa-Estrela
• Instituto Cervantes
• Institut Franco-Portugais
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• Palácio Foz
• Teatro Nacional de São Carlos
• Teatro Nacional Dona Maria II
• Biblioteca Nacional
• Santa Casa da Misericórdia de Lisboa
• Centro Nacional de Cultura
• Polícia de Segurança Pública – Escola Segura
• Instituto Português da Juventude
• Associação de Pais e Encarregados de Educação da EAMCN
1.8. Análise SWOT
Em termos teóricos, sigla SWOT provém da junção dos termos ingleses Strengths
(Forças), Weaknesses (Fraquezas), Opportunities (Oportunidades) e Threats (Ameaças),
e a sua análise visa defender o estudo estratégico que permite estabelecer a relação
existente entre os pontos fortes e fracos, as oportunidades e as ameaças de uma
organização.
Apresentam-se de seguida os pontos fortes e as oportunidades.
Forças: Boa localização e acessibilidade, oferta educativa abrangente, Direção e Corpo
Docente competentes, ambiciosos, ativos, dedicados e em sintonia, inúmeros protocolos
e parecias com entidades importantes.
Oportunidades: Proximidade a focos culturais como Teatro Nacional de São Carlos e
Teatro Municipal de São Luiz, que enriquecem o meio artístico, empréstimo de
instrumento aos alunos, aulas de apoio para alunos com mais dificuldades, promoção
regular de masterclasses e outras atividades artísticas.
A EAMCN, enquanto escola de referência no panorama musical português, tem
preservado e desenvolvido a tradição e herança que lhes foram deixadas desde a sua
criação, enriquecendo cada vez mais a sua identidade até aos dias de hoje como a
conhecemos.O facto de se situar na capital do país, e localizando-se num centro de intenso
ambiente artístico e cultural, torna a EAMCN muito apetecível como instituição de
ensino, atraindo e motivando muitas crianças a se candidatarem para realizarem os seus
estudos.
12
Para além de promover um ensino que prima pela sua qualidade, em todas as vertentes da
formação do aluno, desenvolvendo uma prática exigente e rigorosa, a EAMCN oferece
também um sistema de ensino abrangente a vários tipos de cursos desde Iniciação, Básico,
Secundário e Profissional que podem ser frequentados nos regimes Integrado, Articulado
e Supletivo.
Outro ponto forte a ter em conta é a variedade de possibilidades de escolha que se pode
adotar na aprendizagem de um instrumento, desde os instrumentos de corda (incluindo
guitarra portuguesa, harpa, alaúde e viola dedilhada), todos os sopros, percussões e teclas
(incluindo órgão, cravo e acordeão) e a voz. Muitos destes instrumentos podem ser
emprestados pela escola a alguns alunos mais desfavorecidos.
Graças a esta diversidade de instrumentos foi possível a criação de grupos de música de
câmara, grupos de coro, grupo de percussão, orquestra de cordas, orquestra de sopros e
orquestra sinfónica de alunos. Consequentemente, estes grupos representam e promovem
a escola diversas vezes e através de apresentações públicas em salas de concerto como o
Teatro Camões, Teatro São Jorge, Teatro da Trindade, entre outros, não só mostrando o
bom trabalho que vem sendo realizado por professores e alunos e a motivação que liga
ambos, como também sensibilizam a comunidade envolvente.
Parte do sucesso deste bom funcionamento e organização deve-se também à Direção da
EAMCN que foi desenvolvendo novas estratégias e traçando metas para dar continuidade
a um percurso educativo ambicioso e objetivo, e ao incansável e dedicado corpo docente
que tem lançado excelentes alunos para o mundo da música e que têm ingressado em
reputadas universidades. Para alunos com mais dificuldades, é-lhes dada uma atenção
especial através de aulas de apoio para que se mantenham estáveis e motivados. É de
realçar também a constante realização de masterclasses e outras atividades artísticas para
que os alunos se apresentem ao público e amadureçam como músicos.
Outro ponto muito importante, fruto do trabalho competente desenvolvido pela Direção,
trata-se das várias parcerias e protocolos que conseguiu criar com várias câmaras
municipais, e importantes instituições e salas de concerto que apoiam a atividade artística
da escola.
13
2. Prática Educativa
Na medida em que os encarregados de educação concordaram que os seus educandos
participassem no meu estágio e visto que será relatado todo o percurso de trabalho dos
mesmos ao longo do presente ano letivo, foi decidido omitir os seus nomes e associá-los
a um grupo de letras (A, B, C) para que o seu anonimato permaneça assegurado. Também
foi solicitada uma autorização aos encarregados de educação que me permitisse gravar
algumas aulas para a posterior análise da prática pedagógica desenvolvida.
2.1. Classe de Violino da Escola Artística de Música do Conservatório Nacional
Sob a orientação da professora Joana Cipriano, desempenhei neste estágio o meu papel
como observador, tendo selecionado três dos seus alunos de diferentes graus: 4º ano de
escolaridade, 2º e 8º graus. O facto de terem a sua aula de violino no mesmo dia e em
horários seguidos uns dos outros e de corresponderem a graus contrastantes, facilitou a
minha tarefa e proporcionou um trabalho mais fluído e descontraído para o meu estágio.
Nos três quadros seguintes são referidas as aptidões e objetivos exigidos, relativamente
aos graus dos alunos mencionados, delineados segundo o regulamento da EAMCN.
Tabela 4 - Quadros de objetivos
4º ano 2º grau 8º grau
• Afinação
• Regularidade rítmica
• Postura do corpo e mãos
• Funcionamentodo arco:
• Utilização do arco em toda a sua
extensão
• Utilização de todos os dedos da mão
esquerda
• Sonoridade clara
• Desenvolvimento da
representação/antecipação auditiva/ musical
• Postura do corpo e mãos
• Afinação
• Regularidade rítmica
• Funcionamento do arco: utilização do arco
em toda a sua extensão: detaché, legato,
martelé e staccato
• Uso das dinâmicas básicas (forte, mezzo
forte, piano)
• Conhecimento elementar dos harmónicos
naturais
• Cordas dobradas (com uma corda solta)
• Sonoridade clara
• Afinação
• Regularidade rítmica
• Articulação e clareza (flexibilidade)
• Funcionamento da mão esquerda:
vibrato, mudanças de posição,
harmónicos, etc.
• Conhecimento de todo o mecanismo do
arco
• Sonoridade
• Abordagem formal e estilística
• Respeito ao texto musical (dinâmica,
fraseado)
• Velocidade de leitura e compreensão
musical (na leitura à 1º vista)
• Apresentação do programa e atitude em
palco
Fonte: Provas de admissão e avaliação, EAMCN, p. 3, 8, 27
14
Dos três alunos em questão, cabe-me apontar que apenas o do 8º grau realizou trabalho
de excertos de orquestra com o respetivo trabalho de golpes de arco, tendo mesmo que
apresentar obrigatoriamente a interpretação de dois excertos em exame por regulamento
da escola.
2.1.1. Aluna A
A Aluna A iniciou-se no violino há 4 anos com a professora Joana Cipriano no ano letivo
de 2014/2015, no 1º ano de escolaridade. Neste momento encontra-se no 4º ano de
escolaridade, e desde o início do ano letivo que se mostrou um pouco irregular, revelando
sinais de falta de estudo.
Alguns dos sinais menos positivos passaram por dificuldades na direção do arco,
resultantes também de pouca flexibilidade no pulso direito, que aparentava estar um
pouco preso e, consequentemente também alguma desorganização da distribuição do
arco.
O repertório escolhido para combater estes problemas durante o 1º período direcionou-se
para os estudos n.º 1, 2, 3 e 4 de F. Wohlfahrt, especialmente para trabalhar certas zonas
do arco e a flexibilidade da mão direita. A nível técnico realizou também alguns
exercícios de H. Schradieck com Dó natural e Dó sustenido para exercitar a mão esquerda,
e também foram trabalhadas as escalas de Sol, Lá e Si Maior, com os respetivos arpejos
como consolidação do trabalho conjunto das duas mãos, não apresentado quase falhas na
afinação. Como peça de desenvolvimento musical foi-lhe entregue o 1º e 3º andamentos
do Concertino opus 35 de O. Rieding, no qual se defendeu bastante bem, inclusive
tocando de memória.
Já no 2º período começou a sentir-se maior envolvimento e mais sinais de estudo por parte
da Aluna A, pois no mês de maio (3º período), ela seria submetida a uma prova de aptidão
para prosseguir na escola e ingressar no 1º grau (5º ano de escolaridade), que de certa
maneira “pressionou” de forma positiva na atitude da aluna que acabou por mudar
completamente os seus resultados.
Começou a trabalhar as 2ª e 3ª posições, sempre com exercícios de nota de preparação,
acabando por aplicar esta nova matéria nas escalas de Dó e Ré Maior, e continuou também
com mais estudos de Wohlfahrt, exercitando alguns “jogos” de dedos da mão esquerda,
15
algumas extensões, e foi-lhe introduzido também o martelé, como um novo golpe de arco,
dando continuidade ao trabalho da correção na mão direita.
No 3º período deu-se o culminar de uma grande evolução, em que a aluna se mostrou de
tal maneira empenhada, que passou de frágil a uma aluna muito segura, passando na prova
de aptidão já referida anteriormente com 93%.
A nível de repertório, o salto de nível foi significativo, tendo realizado a escala de Ré
Maior, duas notas em cada arco, e arpejos em duas arcadas. Para dar continuidade ao
trabalho do martelé, exercitou o estudo n.º 3 de H. Kayser, tendo tocado de memória.
Como peça musical, debateu-se muito bem com a peça Infant Paganini de E. Mollenauhr,
com uma exigência que abrangia aspetos técnicos como mudanças de posição, incluindo
a 4ª posição, harmónicos, pizzicato de mão esquerda, muitos meios tons, mudanças de
andamento, tendo também tocado inclusive numa aula lecionada por mim, de memória
também, praticamente sem erros. A sua mão direita num espaço de um ano, teve uma
evolução significativa, apresentando muito mais flexibilidade, melhor gestão de arco, e
uso completo do mesmo. Todas as decisões de escolha de exercícios e repertório foram
claramente acertadas e decisivas por parte da professora Joana Cipriano, tendo mantido
sempre uma postura muito próxima e atenciosa com a aluna, mas ao mesmo tempo
exigente e rigorosa.
Em relação às 3 aulas nas quais acompanhei a aluna A mais de perto como professor
estagiário, posso apontar, tendo em conta a sua idade, que tentei sempre ser muito
paciente e tranquilo com a aluna, usando muitas alusões a imagens para transmitir da
melhor maneira a mensagem que pretendia, tendo a aluna correspondido de uma forma
natural e correta a praticamente tudo o que lhe exigia. Através do trabalho de escalas (Lá
M, Dó M e Ré M), aproveitei para me concentrar na técnica de arco, procurando que
usasse o mesmo na sua totalidade, de forma clara e bem distribuída, e também alguma
atenção com a mão esquerda, em pequenos aspetos da colocação de dedos e afinação.
Ainda dentro da parte técnica, tive a oportunidade de trabalhar dois estudos de Wohlfahrt
(n.º 4 e n.º 10) e um estudo de Kayser, onde foi possível trabalhar golpes de arco como
detaché e staccato, que me possibilitaram tentar ajudar a aluna a soltar um pouco do
bloqueio da mão direita que lhe condicionava a flexibilidade do seu movimento.
16
Como foi referido anteriormente, a sua evolução durante o ano foi constante, e culminou
com a execução de memória da peça Infant Paganini de Mollenauhr na minha 3ª aula com
ela, em que demonstrou uma liberdade na mão direita e consequente controlo da mesma,
e a própria mão esquerda mostrou-se bastante ágil perante as dificuldades da peça.
Não tive grandes comentários a fazer porque a sua prestação tinha sido muito boa,
contudo corrigi-lhe um pouco a postura da cabeça para não vir a sofrer mais tarde com
possíveis lesões, e alertei-lhe para ir tendo alguma atenção com esse aspeto.
Apesar de ser uma aluna bastante jovem, e da timidez ser um fator normal, creio ter
conseguido criar alguns diálogos e interação durante as aulas.
Se a Aluna A continuar a trabalhar desta forma e mantiver este nível de progressão, creio
que poderá atingir um patamar de qualidade muito interessante.
2.1.2. Aluna B
A Aluna B começou desde os 4 anos com a professora Joana Cipriano em Setúbal, tendo
depois passado para a Metropolitana e, por fim, ingressou na EAMCN, sempre com a
mesma professora já há 8 anos.
Esta aluna demonstrou ser dos típicos casos de alunos com grande talento e de usufruir
de muitas facilidades, mas que peca por ser algo preguiçosa e não estudar tanto como
deveria.
Com o pouco que se dedica - não obstante, consegue melhores resultados que muitos dos
seus colegas. Apesar de tudo, quando se aproximam momentos decisivos de avaliação, a
professora confronta seriamente a aluna, e esta estuda e, inclusive apresenta as obras de
memória e fá-lo de forma muito consistente. Pode dizer-se que a Aluna B é também muito
cerebral e inexpressiva a tocar, o que em termos musicais a prejudica um pouco.
A nível de repertório foi-lhe exigido dominar todas as escalas, segundo o método de C.
Flesch, podendo qualquer uma ser pedida pela professora nas aulas durante todo o ano
letivo. No 1º período, para além das escalas, trabalhou também em termos técnicos os
estudos de R. Kreutzer n.º 7, 10, 12 e 13 e também os estudos de J. F. Mazas n.º 3 e 6. A
nível musical e técnico executou também os 1º e 2º andamentos do Concerto n.º 7 de C.
A. Bériot, no qual pôde exercitar bastante conteúdo de cordas dobradas como oitavas e
17
sextas e, no andamento lento, houve espaço para praticar o vibrato e a temática mais
musical, visto ser um dos seus pontos menos positivos.
Relativamente ao 2º período, continuou com estudos de Mazas (7 e 8) e de Kreutzer (3 e
9), trabalhou também o Concerto n.º 9 de Bériot e, como se apresentou a um concurso da
escola, teve de preparar uma peça portuguesa “Berceuse” de Frederico de Freitas, onde
ficou suplente, atrás do vencedor.
No 3º período, mudou para um violino inteiro, levando algum tempo a ambientar-se.
Trabalhou o estudo de Kreutzer n.º 12 e, para reforçar os objetivos musicais, foi-lhe
entregue a peça Légende de H. Wieniawsky, que apresenta muitas cadências, tentanto
explorar o lado mais interpretativo e solístico, muitas mudanças de andamento, vibrato
contínuo, e relativamente a termos técnicos, surgem também passagens de trilos de 8as
dedilhadas e também o golpe de arco staccato volante.
Em termos gerais foi-me permitido observar durante todo o ano letivo, que a Aluna B
apresentou alguma tensão no polegar na forma como segura o arco, prejudicando um
pouco a liberdade dos outros dedos, acabando por compensar com alguns movimentos
em excesso no pulso.
Foi notória também alguma desorganização na mão direita, especialmente no que toca à
gestão do arco, realçando como um dos pontos menos controlados e, a incorreta
distribuição do arco quando se confronta com uma mudança de posição, desiquilibrando
assim a frase no que toca ao som e à continuidade da linha melódica.
A professora Joana Cipriano foi sempre bastante interventiva e desafiadora, tentando
sempre retirar o melhor da aluna, mas a postura um pouco distante da mesma, foi sempre
um obstáculo em termos de reação.
Quanto às 3 aulas que leccionei com a Aluna B, curiosamente só conseguimos sempre
trabalhar uma obra ou um estudo em cada aula, porque o conteúdo nunca estava 100%
bem preparado, portanto agi sempre com muita paciência e calma, tentando resolver os
problemas em questão e, oferecendo ferramentas para que pudesse trabalhar certos
aspetos.
18
A nível de repertório foi-me possível ver com ela o estudo n.º 7 de Kreutzer, onde foi
trabalhada pacientemente a afinação e mudanças de posição, mostrando claras
debilidades neste último aspeto.
Expliquei calmamente que deveria pensar no gesto da mão esquerda sempre em bloco,
sem pressionar demasiado os dedos da mão esquerda na corda durante as mudanças de
posição, e exercitar os saltos de posição sempre em glissando. A Aluna B apesar de não
conseguir executar com eficácia no momento, compreendeu bem como deveria estudar.
Outras duas obras que se trabalharam em aula foram o 1º andamento do Concerto n.º 7
de Bériot e a peça Légende de Wieniawksy. Dos pontos menos positivos que considerei
trabalhar mais a fundo com a Aluna B, destacaram-se a afinação, as mudanças de posição
e a gestão do arco. Insisti bastante nestes pontos, quando poderia ter avançado, mas era
importante solidifica-los o melhor possível, tomando algum tempo até que a aluna
mostrasse sinais de compreensão e interiorização das soluções para os mesmos.
Realizamos alguns exercícios lentos de escuta da afinação, especialmente em cordas
dobradas, ou em saltos para o registro agudo para exercitar novamente as mudanças de
posição. Houve também espaço para exercícios lentos de arco, visto que a Aluna B tinha
alguma dificuldade em conservar a quantidade de arco, prejudicando sempre a nível de
som as notas finais de cada arcada.
Com o objetivo de melhorar algumas passagens específicas, recorreu-se a alguns ritmos
e deslocações, que permitiram à Aluna B conseguir executar essas passagens mais
desafiantes de uma forma mais segura e eficaz. A comunicação entre nós foi
relativamente pouca, porque a Aluna B colocava rapidamente em prática o que lhe era
pedido e porque a sua personalidade não permitiu uma interação mais próxima.
Porém, a Aluna B é uma violinista talentosa, mas a necessitar de alguma motivação para
que possa estudar mais e render como deveria.
2.1.3. Aluno C
O Aluno C entrou diretamente para o 1º grau na EAMCN, tendo começado a estudar com
o professor Manuel Gomes durante meio ano e, o outro meio ano com o professor Pedro
Meireles. Só no 2º grau é que viria a ingressar na classe da professora Joana Cipriano,
19
mantendo-se como aluno da mesma durante 7 anos, sendo o ano presente o seu último
como aluno.
Mostrando-se um aluno muito talentoso, com uma cultura musical bastante desenvolvida,
decidiu neste último ano seguir composição e começou também a ter aulas de canto. Por
apresentar tantas facilidades, especialmente a nível de leitura, é um aluno que também
não estuda muito, ficando muito aquém das expetativas e, consequentemente obtém notas
muito abaixo do nível que poderia alcançar. Contudo, quando se foca, é capaz de
momentos de qualidade.
Dos 3 alunos seleccionados, ele foi o único que não trabalhou mais do que era suposto
para cada período, justificando novamente, a sua postura desinteressada. A nível de
repertório, teve também de dominar todas as escalas, e quanto ao 1º período trabalhou os
estudos n.º 8 de F. Fiorillo, n.º 2 e 5 de P. Rode e n.º 2 de J. Dont. Quanto a repertório
mais musical foi-lhe atribuído a Giga da 2ª Partita de J. S. Bach e o 1º andamento do
Concerto de S. Barber. Executou ainda dois excertos de orquestra, 4º andamento da 39ª
Sinfonia de W. A. Mozart e 3º andameto da 4ª Sinfonia de J. Brahms, onde se trabalhou
com destaque alguns golpes de arco.
Quanto ao 2º período, trabalhou o 3º andamento da 2ª Sonata de Luís de Freitas Branco e
a peça virtuosa Tambourin Chinois de F. Kreisler, onde demonstrou uma facilidade
enorme com o spiccato. A nível de estudos exercitou-se com o n.º 9 de Fiorillo, n.º 7 de
Rode e n.º 4 de Dont, e realizou ainda outros excertos de orquestra, um da Carmen de G.
Bizet e, outro da Madame Butterfly de G. Puccini. Realizou também pela primeira vez
uma escala em 4 oitavas, a de Sol M.
Por fim no 3º período, tendo de realizar uma prova de aptidão artística, em que a escolha
do repertório é à escolha do aluno, o mesmo optou por compôr a sua própria peça, que
reuniu vários temas de diferentes óperas.
Relativamente ao que pude observar deste aluno, é bastante díficil aceitar que, com as
capacidades que tem, não aproveite mais do que aquilo que faz e, que nem prossiga os
seus estudos de violino no Ensino Superior. O seu rendimento geral não foi muito
satisfatório, mas percebe-se que se houvesse maior interesse e envolvência por parte do
Aluno C, ele teria atingido outro patamar.
20
Muitas questões de afinação, de clareza de som ou de passagens técnicas devem-se
claramente à falta de estudo e, torna-se evidente que as suas facilidades não cobrem o tipo
de dificuldade que o repertório já deste nível lhe impõe. A professora tentou desde sempre
exigir mais dele e, mostrar-lhe o valor que tinha e onde podia chegar se estudasse mais,
mas não havia muito a fazer. Apesar de ele ser um aluno bem disposto, embora
desleixado, tinha uma boa relação com a professora e interessava-se nas aulas, havendo
um diálogo constante.
Quanto às aulas que passei com ele, gostei bastante do trabalho que realizámos juntos,
porque senti sempre entusiasmo da parte dele, vi resultar muitas coisas que lhe ia pedindo
e, sentia também da parte dele satisfação por conseguir resultados.
O Aluno C, no conjunto das 3 aulas tocou a escala de Sol M em 4 oitavas, o estudo de
Fiorillo n.º 14, o estudo n.º 2 de Rode, excertos de orquestra do 4º andamento da Sinfonia
n.º 39 de Mozart, 3º andamento da Sinfonia n.º 4 de Brahms, Abertura da Flauta Mágica
de Mozart e uma obra escrita pelo próprio aluno com temática operática.
No que toca a questões técnicas, tanto na escala como no estudo, foi notório haver alguma
desorganização da mão esquerda relativamente às mudanças de posição que eram sempre
um pouco imprecisas. Daí que o meu foco de atenção se virou bastante para esse aspeto,
procurando não só aprimorar as mudanças, mas também a própria afinação. Realizamos
bastantes exercícios em glissando e com notas de passagem, até o Aluno C sentir a
confiança necessária para atingir o ponto de chegada exato de cada posição.
Ainda nos estudos, outro aspeto que saltou mais à vista nos excertos de orquestra, foi a
escassa gama de dinâmicas usada pelo Aluno C. O som tinha qualidade, mas suava
sempre igual, pelo que solicitei que me mostrasse contrastes extremos para que atingisse
uma veradeira diferença entre um forte e um piano. Exemplifiquei como usar e sentir o
peso do arco para cada uma das dinâmicas e como em termos sonoros teria um grande
impacto na música. O Aluno C foi reagindo pouco a pouco, mas foi claramente nos
excertos de orquestra que sentiu a diferença dinâmica, e sorria bastante porque estava a
perceber que as coisas começavam a resultar e a soar melhor e mais interessante.
Nos excertos de orquestra aproveitei para trabalhar um pouco alguns golpes de arco que
precisavam um pouco mais definição e articulação, em especial o spiccato e o staccato.
Realizamos exercícios em cordas soltas para nos podermos concentrar primeiro na mão
21
direita e isolar o seu movimento, e depois então juntar com a mão esquerda. Fomos
sempre tocando juntos, para dar confiança ao Aluno C e as coisas iam melhorando. Para
cada aspeto, fiz questão de lhe explicar como estudar e ter a certeza de que ele entendia
exatamente o que eu pretendia, e pedia-lhe para que exemplificasse para saber que o iria
praticar corretamente durante o estudo.
De tudo o que se trabalhou, fiquei com a sensação de que os excertos de orquestra foi o
tipo de repertório que mais o motivou, muito provavelmente por alguns excertos estarem
relacionados com ópera, género musical com que ele se identifica bastante, mas também
porque eu desfruto imenso a dar aulas de excertos de orquestra e talvez tenha contagiado
o Aluno C com o meu entusiasmo.
O Aluno C é de facto um aluno e violinista interessante e com potencial, mas a sua
vontade de querer seguir composição, influenciou significativamente a falta de estudo e
os respetivos resultados, que ficaram sempre abaixo do nível que ele poderia alcançar.
3. Reflexão Final
A realização deste estágio revelou-se uma experiência extremamente produtiva por tudo
o que observei, ensinei e aprendi. É cada vez mais claro que ensinar é das profissões mais
desafiantes e difíceis do mundo e de enorme responsabilidade uma vez que se trata da
educação e da construção do futuro de alguém. Portanto, é fundamental ajuizar tudo o
que se diz e como se diz em cada situação específica.
Aprender também é crescer, por isso é muito importante ensinar de forma a incutir
confiança, vontade, gosto e sentido de responsabilidade, porque tudo isso acabará também
por contribuir para elevar a autoestima e desenvolver as competências académicas de cada
aluno. Apesar de corresponder aos pais a missão de educar e de ajudar os seus filhos a
tomarem as decisões mais importantes, de certo modo, como a escola acaba por funcionar
como uma segunda casa, poderá ser que então, a nós professores, também nos possa ser
atribuída uma simbólica missão de orientar e apoiar os nossos alunos, não só no contexto
escolar, mas também no contexto mais pessoal, visto que se influenciam constantemente
e interferem no rendimento dos alunos.
A escola é essencial na vida de uma criança porque, não só ensina e prepara para o futuro,
como também oferece vivências e convivências que marcam toda a fase da juventude e,
22
apesar de não haver um momento em que se pare de aprender, é importante que os
primeiros passos da aprendizagem sejam feitos de forma bem direcionada, construtiva e
saudável. É crucial que desde o princípio se consiga despertar o interesse por aprender e
querer saber sempre mais. Para alimentar este desejo pelo conhecimento, pode dizer-se
que o trabalho conjunto entre pais e professores pode contribuir bastante se em ambas as
partes existir uma orientação atenta e um apoio e motivação constantes.
No que toca à minha experiência como estagiário, posso afirmar que, enquanto
observador, foi-me muito útil ir conhecendo e analisando como funcionava cada aluno,
para que a minha interação com eles nas aulas dadas por mim fosse mais produtiva. Foi
também enriquecedor captar e compreender as várias estratégias usadas pela professora
Joana relativamente à sua postura para com os alunos, quer a nível de exigência, quer a
nível de relação. A relação professor-aluno mostrou ser, mais uma vez, chave de um bom
funcionamento de aula, visto haver uma empatia entre ambos, baseada no respeito e
admiração, aliada à confiança e conexão com o professor.
Enquanto professor estagiário, cumprindo três aulas com cada aluno, posso apontar que,
apesar de ter sido pouco tempo para criar um laço com os alunos, foi uma experiência
positiva uma vez que senti algum à vontade quanto à minha presença e ao tipo de
abordagem que lhes fui apresentando. Procurei sempre ir ao fundo das questões dos
problemas de forma direta, mas tranquila e paciente, sugerindo os mais variados
exercícios e estratégias, com o objetivo de, não só resolver as inúmeras questões, mas
também de mostrar como as analisar e estudar, de maneira a desenvolver o seu próprio
raciocínio.
Um ponto favorável dentro da pedagogia que apliquei foi a alusão a imagens para explicar
certos aspetos, resultando positivamente na compreensão dos mesmos e ganhando
também alguma empatia com os alunos.
Já um aspeto menos conseguido, e que pretendo melhorar futuramente, é o facto de, na
maioria das vezes, falar demasiado enquanto exponho as minhas ideias, acabando
também por me repetir um pouco. Algo que pode ajudar é, claramente, permitir que os
alunos interajam mais, questionando-os e motivando-os para que possam também
partilhar a sua opinião acerca de resoluções de todo o tipo de obstáculos que forem
surgindo.
23
Apesar de ser já uma afirmação cliché, não posso deixar de acrescentar que, enquanto se
ensina também se aprende muito porque, por vezes, tentar resolver problemas pelos quais
nunca passamos obriga-nos a procurar respostas e ajuda-nos a crescer, expandindo o
nosso conhecimento.
24
SEGUNDA PARTE - INVESTIGAÇÃO
Introdução
Como afirma Robert Gerle,
A superior bow technique, no matter how easy and natural the artist make it
appear, is the result of an untold number of contrasting, yet complementary
motions and their combinations. It is the sum of a constantly changing
balance of forces, a sensivite and delicated adjustment of bow-speed and
pressure, of constant alternations of tension and release between the muscles
and the bow. (2011, p.15)1
Passaram já 22 anos desde que iniciei o estudo do violino, mas foi claramente na última
década que comecei a aprofundar em pormenor a importância e complexidade que o arco
representa na interpretação violinística. Um dos principais impulsionadores da minha
motivação para o aperfeiçoamento da técnica da minha mão direita com o arco, em
especial com golpes de arco, foi a aprendizagem e prática de excertos de orquestra.
Mesmo antes de ingressar no ensino superior, realizei audições para orquestras de jovens
e cursos de verão, onde fui submetido à execução de excertos de orquestra, sendo um dos
métodos mais prediletos de avaliação da técnica e compreensão musicais, por parte dos
júris.
No princípio, poderia pensar-se que os excertos de orquestra exigidos nas provas, seriam
para mostrar como cada um conseguiria interpretar uma ou outra passagem das obras que
fossem a ser executadas durante o estágio de orquestra e assim decidir-se quem viria a ser
o chefe de naipe e os restantes lugares de tutti. Mas, a verdade é que nos eram postos à
prova também outros excertos para além do repertório que se viria a tocar nos estágios e
que, de modo geral, na maioria das orquestras jovens, foram sendo utilizados como
modelos standard para estas audições.
Pouco a pouco, fui-me apercebendo que, na verdade, cada excerto de orquestra tinha o
seu propósito, na medida em que cada um exigia individualmente determinados aspetos
1 “Uma técnica de arco de qualidade, por mais fácil e natural que o artista a faça parecer, é o resultado de
um número infindável de movimentos contrastantes, porém complementares em todas as suas combinações.
É a soma de um equilíbrio de forças em constante mudança, um ajuste sensitivo e delicado da velocidade e
pressão do arco, de constantes alternâncias de tensão e de libertação entre os músculos e o arco.” Tradução
livre do autor.
25
e que aos olhos do júri, revelavam por completo o nível que cada instrumentista
apresentava. Falamos não só de domínio da técnica de arco, incluindo golpes de arco,
fraseado, distribuição de arco, precisão rítmica, mudanças de arco e afinação, mas
também - e não menos importante - de uma cultura musical que deve ser educada, e como
se deve interpretar os vários estilos do repertório sinfónico.
Aparentemente, os excertos de orquestra apresentam-se tecnicamente desafiantes e, ao
mesmo tempo, reúnem componentes musicais que poderão constituir um valioso
mecanismo pedagógico para a nossa forma de tocar, juntamente com todo o trabalho
técnico de base que normalmente é realizado como escalas, arpejos, estudos técnicos, etc..
Para mim foi, sem dúvida, estimulante e enriquecedor a inclusão de excertos de orquestra
no meu método de estudo e contribuiu em especial para o meu aperfeiçoamento de golpes
de arco – tema principal desta investigação. De certa maneira, também me aproximou
mais do repertório sinfónico, o qual tenho um enorme prazer de interpretar também por
ser uma prática de conjunto, e me deu a conhecer muitas obras primas da história da
música que me cultivaram bastante como músico.
O propósito desta investigação foca-se em apresentar os estudos e conclusões
desenvolvidas por parte de alguns autores em relação à importância que os excertos de
orquestras podem desempenhar no nosso método de trabalho e, mesmo o quão precoce
poderia ser introduzido dentro do processo de aprendizagem, com destaque para o
contributo que pode oferecer para o aperfeiçoamento dos golpes de arco. Procurarei
recolher também opiniões junto de violinistas de orquestra nacionais e internacionais e
professores de violino e alunos dentro do panorama nacional para enriquecer esta
investigação e poder fundamentar a importância deste tema.
Espero com esta investigação retirar benefícios sobre esta prática e acrescentar mais
conhecimento a mim próprio para, também, poder aplicá-la como ferramenta pedagógica
e influenciar outros violinistas e professores e, consequentemente, alunos.
4. Contextualização
No início do século XVI, o violino surge como um instrumento relacionado com o
entretenimento e alegria, mostrando relevância essencialmente como música para dança.
Mas, na transição para o século XVII, o violino começa a ganhar uma outra dimensão,
26
sendo que o seu primeiro registro com um papel mais relevante data de 1607, em Itália,
quando Cláudio Monteverdi utiliza um dueto de violinos na invocação central da sua
Favola in musica, Orfeo (The book of violin, p.60).
Com a progressão do instrumento que se foi revelando ao longo das eras, houve uma
enorme interesse e necessidade em criar métodos, livros, tratados e documentos onde
pudesse ser explorada e explicada a sua técnica de execução. Nomes como Giuseppe
Tartini (1692-1770), que escreveu Regole per arrivare a saper ben suonare il violino em
1760, Pietro Locatelli (1693-1746), L’Arte del Violino, em 1733, e Francesco Geminiani
(1680-1762), The art of playing on the violin, em 1751, foram os mais sonantes no que
toca à documentação literária mais importante sobre o violino, sendo que o último método
mencionado, apesar de origem italiana, foi publicado em Londres em língua inglesa.
Também outro tratado de reconhecida importância foi o Versuch einer Gründlichen
Violinschule por Leopold Mozart (1719-1787) de 1756, ano em que precisamente
nasceria seu filho Wolfgang Amadeus Mozart.
Já no século XX destacam-se dois fulcrais tratados para a base violinística. São eles Kunst
des Violinspiel de Carl Flesch (1873-1944), de 1928, e Principles of Violin Playing and
Teaching de Ivan Galamian (1903-1981), datado de 1962.
5. As Escolas Violinísticas
A par do aparecimento dos vários documentos que foram desenvolvidos sobre a técnica
violinística, estão associadas também escolas violinísticas que, ao longo dos tempos,
foram explorando as suas próprias filosofias e metodologias de ensino e que, de certa
forma, se influenciaram umas às outras. O trabalho desenvolvido por estas escolas
baseava-se essencialmente em técnicas que abordavam a postura corporal, forma de pegar
e usar o arco, colocação e funcionamento da mão esquerda, método de estudo,
interpretação, etc..
É importante realçar que, para que uma escola violinística fosse criada teria de ser por um
especialista na matéria que dominasse claramente toda a função teórica e prática e que
todos os seus apontamentos sobre cada aspeto fossem meticulosamente fundamentados.
Não poderia ser encarado sequer como uma variação de outra escola já definida, todas as
novas ideias teriam de ser consolidadas cientificamente e consequentemente as suas
resoluções apresentarem resultados. (Garcia, 2015)
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Outra questão a realçar é o facto das escolas violinísticas serem qualificadas por meio do
espaço geográfico a que os vários violinistas e pedagogos se situavam no momento e não
porque correspondiam à sua respetiva nacionalidade. Como afirma Hartnack:
Basta lembrar, por exemplo, que o violinista Leopold Auer (1845-1930),
húngaro, por mero acaso se estabeleceu em São Petersburgo, e por isso é visto
como fundador da escola russa. Como seria se ele tivesse lecionado em
Madrid, na Espanha? Falaríamos numa escola ibérica, ou espanhola?
(Hartnack, 1967, p.21).
As escolas violinísticas que foram marcando as várias eras da evolução da técnica do
violino são:
• Escola italiana antiga ou escola romana (Séc. XVII) – considerada a primeira
escola, foi desenvolvida por Tartini e Corelli, sendo este último compositor e violinista
o principal impulsinador. Foi crucial nos avanços violinísticos iniciais atingidos pelos
primeiros violinistas de maior referência como Biagio Marini, Giovanni Battista,
Vitali, Torelli, entre outros, que acabaram por difundir este estilo por toda a Europa.
Esta escola destacou-se pela importância dada ao domínio da técnica de arco,
especialmente a nível de sonoridades, dinâmicas e respetivo fraseado, o que levou
muitas vezes a associar o discurso musical do violino à voz humana. (Riedo, 2014,
p.103).
Outras características predominantes nesta escola passam pelo uso mais assumido de
cordas duplas, da corda sol (que até ao momento não tinha sido tão explorada), uso de
harmónicos, arpejos, scordatura, apontamentos de tempo rubato e também técnicas
de golpe de arco como o surgimento do tremolo, staccato e bariolage (ver imagem 1)
- o arco oscila entre duas cordas de forma rápida - sendo Corelli o principal
impulsionador desta técnica. (Wilk, 2011, p.205).
Figura 1 - Golpe de Arco - Bariolage
Fonte: L’Abbé le Fils, 1761, p.79
28
• Escola francesa antiga (Séc.XVIII) – surge na sequência da escola italiana criada por
Corelli. Nomes como Jean Baptiste Anet, Jean-Féry Rebel, Du Val, François Francoer,
Jean-Pierre Guignon - este último integrou os “24 Violons du Roi” (orquestra de cordas
ao serviço da corte francesa do fim do séc. XVI até meados do séc. XVIII) - deram
origem a esta escola, destacando-se como os principais violinistas franceses daquela
altura.
Apesar de haver uma influência da escola italiana, os violinistas franceses eram já
detentores de capacidades e talentos musicais bastante desenvolvidos. Mesmo antes
dos violinistas italianos se terem radicado em França, trazendo e acrescentando alguns
conhecimentos, já os violinistas franceses tinham deixado a sua marca musical além-
fronteiras. (Garcia, 2015)
• Escola Alemã Antiga (Séc.XVIII) – representada especialmente por Leopold Mozart
com o seu método - Versuch einer Gründlichen Violinschule. Nele estão apresentadas
16 regras de arcadas que funcionam como uma ferramenta pedagógica para a execução
das obras do período Mozartiano. Este documento abrange exercícios de teoria musical
e técnica violinística desde mudanças de posição exigentes, trabalho das mesmas até à
7ª posição e cordas dobradas.
Leopold Mozart dava também uma enorme importância ao arco em questões de
sonoridade e fraseado e insistia que o intérprete devia procurar expressar-se com
Affekt, ou seja, com emoção e só aí conseguiria encontrar o tipo de arcada apropriado:
One element [necessary to this] was an education broad enough to encompass
the study of literature and especially poetry, for a cantabile style should be
the aim of every instrumentalist, and poetry was the key to good phrasing in
music. (Halliwell, 1998, p.23-24)2
Em relação à mecânica do braço direito, Leopold destaca: “(...) emphasis on the
freedom of the right elbow and hand, stressing the need to keep the bowing arm low
2 “Um elemento [necessário para isto] era uma educação suficientemente ampla para abranger o estudo da
literatura e especialmente a poesia, para um estilo cantabile. A poesia era a chave para um bom fraseado
na música e deveria ser o objetivo de todo instrumentista.” Tradução livre do autor.
29
but recommending that the violin be tilted towards the E-string side - thereby allowing
for a freer wrist action.” (Mozart, 1756, p.57)3
Quanto à maneira de segurar o arco, o indicador encostava a sua falange distal (última)
à vara do arco enquanto os outros dedos se posicionavam como um ângulo quase reto
em relação ao arco. No movimento do arco não havia quase nenhuma pronação do
antebraço. (Garcia, 2015)
• Escola Piamontesa ou Italiana moderna (Séc.XVIII) - Esta escola foi, de certa
maneira, movida para França, tendo como seus representantes Jean Marie Léclair e
Giovanni Battista Viotti (provavelmente o fundador). Era privilegiada uma forma de
execução mais simples em prol do virtuosismo, realçando a beleza do canto no violino,
procurando sempre uma solidez técnica na mão esquerda e, em especial, uma sensação
de relaxamento e liberdade no braço direito para que se pudessem realizar golpes de
arco com grande mestria. Grandes figuras como Joseph Haydn e Félix Mendelssohn,
“beberam” destes conhecimentos e grande parte dos estudos e obras que esta escola
produziu, serviram como referência para toda a música que viria a ser criada tanto para
a vertente camerística como para a vertente orquestral na Áustria durante essa época.
(Garcia, 2015)
• Moderna Escola Francesa (Séc. XVIII) - fundada pelos três primeiros professores
do Conservatório de Paris - Pierre Rode, Pierre Baillot e Rudolphe Kreutzer - grandes
violinistas e pedagogos que juntos escreveram os importantes Méthode de violon du
Conservatoire, em 1802, e o Art du violon, em 1834. Dois métodos importantíssimos
que espelhavam todo mecanismo sobre a técnica violinística, desde como segurar o
violino e o arco, ao funcionamento das mãos esquerda e a direita, como era feita a
divisão e gestão de arco, as variedades de golpe de arco, som e nuances, ornamentos e
todo o tipo de exercícios para a consolidação da base violinística. Em relação à
colocação da mão direita no arco, é explicado que
L'archet doit être soutenu par tous les doigts; on aura soin de placer le coté
et le bout du pouce contre la hausse et en face du doigt du milieu. La baguette
3 “(...) ênfase na liberdade do cotovelo direito e da mão, enfatizando a necessidade de manter o braço
curvado em baixo, mas recomendando que o violino esteja inclinado em direção na direção da corda Mi -
permitindo assim uma ação de pulso mais livre.” Tradução livre do autor.
30
doit être possé sur le milieu de la deuxième phalange de l'index. Il faut éviter
de séparer ce doigt des autres quidoivent être dans une position naturelles,
c'est à dire, qu'il ne faut ni plier, ni tendre. (Baillot, Rode, Kreutzer, 1802,
p.5-6)4
É também referenciada a importância do dedo mindinho no que toca ao
posicionamento da mão direita:
C'est principalement le petit doigt qui soutiendra tout le poids de l'archet
lorsque la hausse sera près du chevalet; à mesure qu'elle s'en éloignera le
petit doigt cessera de soutenir la baguette et restera simplement posé dessus
sans la moindre roideur ainsi que les autres. (Baillot, Rode, Kreutzer, 1802,
p.7)5
Foi sem dúvida uma escola com enorme reconhecimento artístico e musical em toda a
Europa, influenciando ainda o estilo de composição em vários países.
• Escola Franco-Belga (Séc.XIX) – surge devido à proximidade geográfica dos três
grandes conservatórios de Paris, Bruxelas e Liège onde houve um enorme intercâmbio
de professores e influências. O seu mais célebre criador e representante foi Charles
Auguste de Bériot, seguindo-se nomes como Charles Dancla, Jacques Mazas, Henri
Vieuxtemps, Henryk Wieniawsky, Eugene Ysaÿe que contribuíram significativamente
para a história da literatura do violino através de muitos métodos, documentos e obras
musicais que, hoje em dia, são referências do repertório violinístico, em especial do
virtuoso.
Viriam a ser professores de grandes violinistas do século XX como Ginette Neveu,
Arthur Grumiaux, Christian Ferras, entre outros. As características desta escola
centravam-se essencialmente na independência dos dedos, no equilíbrio da
distribuição da força muscular, forte exploração de posições agudas e sonoridades
projetantes com o arco a “entrar bem na corda” (Claudio, 1999, p.81).
4 “O arco deve ser apoiado por todos os dedos; Ter atenção em colocar a parte lateral do polegar contra o
início do talão e em frente ao dedo médio O arco deve pousar no meio da segunda falange do dedo indicador.
Deve-se evitar separar demasiado o dedo indicador dos outros dedos, que devem permanecer numa posição
natura, isto é, nem demasiado estendidos, nem demasiado curvos.” Tradução livre do autor. 5 “É sobretudo o dedo mindinho que sustem todo o peso do arco assim que o talão se aproxima do cavalete;
e à medida que o talão se afastar do cavelete, o dedo mindinho deixará de suster o peso do arcoe descansará
apenas pousado sobre o arco, relaxado assim como os outros.” Tradução livre do autor.
31
Comparativamente com a Escola Alemã, em que o indicador se apoiava com a última
falange na vara, na Escola franco-belga o indicador apoia-se na falange central, sendo
que os outros dedos devem apresentar-se o mais natural possível, nem encolhidos, nem
esticados. Outro ponto de observação importante referenciado nesta escola é, o facto
de o pulso se apresentar mais alto que o arco e o cotovelo mais baixo. Um exercício
muito usado na altura pelos professores para educar esta posição era o uso de um livro
debaixo do braço direito (Claudio, 1999, p.81).
• Escola Alemã (Séc.XIX) – seguindo os princípios já desenvolvidos por Viotti, esta
escola surge pela inicativa de Louis Spohr, Ferdinand David e Joseph Joachim, grandes
violinistas, compositores e pedagogos que contribuíram com grandes composições
sinfónicas, camerísticas, concertos e peças a solo para violino. É de destacar o método
de violino desenvolvido em 1831 por Spohr - Violin-Schule-, onde o domínio da mão
direita é o foco das atenções, sendo apresentados estudos e exercícios para cada parte
do arco (ponta, meio e talão) e com dinâmicas incluídas. São também referidos os
vários golpes de arco com exemplos e respetivas explicações de como funcionam, para
além de mudanças de posição, estudo de escalas, vibrato, pizzicatos, harmónicos,
trilos, cordas dobradas, etc..
Em relação às outras escolas, a forma de segurar o arco, na escola alemã, debruça-se
sobre a colocação conjunta dos dedos indicador, o do meio e o anelar e com a primeira
falange de cada um dos três dedos, apoiada sobre a vara; o cotovelo e o pulso
funcionam como mecanismo de articulação para o movimento correto do arco
(Claudio, 1999, p.89).
• Escola Húngara (Séc. XIX) - inicia-se com o violinista húngaro Joseph Bohm. Este,
uma vez que estudou com o seu pai em Budapeste e, posteriormente com Pierre Rode,
cria uma ligação entre a escola húngara e a francesa. Fruto dos ensinamentos de Bohm,
despontaram violinistas húngaros como Joseph Joachim, Leopold Auer, Carl Flesch,
Jenő Hubay que mais tarde viriam a lecionar em Berlim (Joachim), na Rússia e
América (Auer), na Suíça e Inglaterra (Flesch) e em Bruxelas e Budapeste (Hubay).
De entre os violinistas que mais tarde realizaram os seus estudos na Academia de
Budapeste com Hubay, podemos ainda identificar nomes como Tibor Varga, Joseph
Szigeti, Sandor Vegh, entre outros. Todos estes grandes violinistas, que ficaram com
32
os seus nomes aclamados na história do violino e que representaram elementos chave
no mundo musical não só como solistas, mas também como pedagogos, fazem parte
da longa lista de violinistas oriunda da escola húngara. (Garcia, 2015)
• Escola Checa (Séc. XIX-XX) – apresenta como principal representante o violinista e
pedagogo Otakar Ševčík. Grande entendedor de anatomia e fisiologia da mão e do
braço, utiliza os seus conhecimentos para contribuir nos seus métodos; entre os quais
se destacam Schule der Violintechnik (1883) e Schule der Bogentechnik (1903), que
apresenta quatro mil exercícios para o arco, entre outros. O contributo dos seus
métodos passa pela resolução e solução para os variados problemas técnicos e na
progressão dos mesmos (Claudio, 1999, p.95).
• Escola Russa (Século XIX) – a sua maior figura é Leopold Auer, discípulo da escola
húngara. A sua escola baseia-se mais na parte experimental e prática, deixando um
pouco ao lado a vertente científica. “Only as the result repeated experiment can the
individual player hope to discover the best way in which to employ his fingers to obtain
the desired effect.” (Auer, 1921, p.36)6. Quanto à forma de pegar no arco, é utilizado
bastante contacto com o indicador na vara do arco, encostando a segunda falange do
dedo. Os restantes dedos mantêm-se praticamente perto uns dos outros, criando uma
espécie de ângulo mais agudo posicionalmente com a vara do arco. Já o mindinho, só
entra em contato com a vara quando o arco é tocado na parte inferior. Também o
antebraço é alvo de uma pronação enfatizada. Contudo, Auer fez questão de apontar
que esta forma de usar o arco se deve à sua experiência acumulada.
When I say that the hand should be lowered - or rather that the wrist should
be allowed to drop when taking up the bow - and that as a consequence the
fingers will fall into position on the stick naturally and of their own accord, I
am expressing a personal opinion based on long experience. (Auer, 1921,
p.36)7
Auer faz também referência aos golpes de arco, nomeando o detaché e o son fillé como
as bases de todos os outros golpes desenvolvidos: “The détaché, together with the
6 “Apenas com o resultado de uma experiência repetitiva, o indivíduo pode esperar descobrir a melhor
maneira de colocar os dedos para obter o efeito desejado.” Tradução livre do autor. 7 “Quando digo que a mão deve posicionar-se abaixo - ou melhor, que o pulso deve cair quando estiver a
pegar no arco - e que, como consequência, os dedos se vão encaixar no arco naturalmente e por conta
própria, estou a expressar uma opinião pessoal, baseada na experiência acumulada.” Tradução livre do
autor.
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“spun” or sustained tones – sons fillé the French call them – which we have described
in the preceding chapter, forms the Foundation of all bow technique.” (Auer, 1921,
p.69)8
• Escola Franco-belga-russa (Séc. XIX) – desenvolvida por Carl Flesch e seguida pelo
seu discípulo Max Rostal, foca-se em especial numa maneira mais simples e natural
de usar o arco, em que a mão direita permanece relaxada e o dedo indicador repousa
com a segunda falange sobre a vara do arco. O dedo anelar e do meio permanecem
perto um do outro, enquanto o mindinho se mantém curvo. Já o polegar permanece por
entre o dedo médio e o dedo anelar. Na opinião de Flesch e Rostal, o elemento que
diferenciava e caraterizava as variadas escolas como a antiga alemã, russa e franco-
belga, era a forma de colocação do dedo indicador na vara do arco em cada uma das
escolas, o que iria definir consequentemente o posicionamento de todos os outros
dedos e também o nível de pronação do antebraço. A crítica mais relevante observada
por Flesch relativamente à escola antiga alemã é, no seu entender o mau hábito do
cotovelo se colocar tão baixo e junto ao corpo.
Com Flesch e Rostal, o mecanismo do braço direito foi sempre trabalhado no sentido
de alcançar uma técnica de excelência que privilegiasse a melhor sonoridade e
expressividade, através do mais pequeno esforço gestual. Mais concretamente, os
movimentos lentos realizados pelo braço direito eram produzidos por articulações
maiores e os movimentos mais rápidos por articulações mais pequenas. A partir destas
ideias aprimoradas, alguns golpes de arco começaram finalmente a ser distinguidos
com mais clareza, como por exemplo a diferença entre o spicatto e o sautillé que,
apesar de tecnicamente e mecanicamente opostos, nem sempre foram bem distinguidos
e interpretados por alguns teóricos do violino. Inclusive, a estruturação do ricochet e
o stacatto normal e stacatto volante foi melhorada no que toca ao uso da técnica de
arco.
Toda esta precisão do uso do arco, desde uma boa gestão da divisão do arco na
execução, ponto de contacto correto do arco nas cordas e a sua inovadora técnica de
8 “O détaché, juntamente com a rotação ou notas sustentadas – ao que os franceses chamam de sons fillé –
tal como foi descrito no capítulo anterior, forma a fundação de toda a técnica de arco.” Tradução livre do
autor.
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acordes, enalteceu a técnica do braço direito para um nível mais elevado. (Garcia,
2015)
• Escola Americana (Século XX) – surge com a figura de Ivan Galamian - violinista
iraniano e grande pedagogo - que desenvolveu novas ideias violinísticas que foram
posteriormente apontadas pelos seus alunos no seu livro Principles of Violin Playing
and Teaching. Os seus princípios fundamentam-se numa metodologia mais rigorosa e
programada, com ideias mais fixas em relação à forma como são passados os
ensinamentos, desvalorizando um pouco a tendência para a naturalidade individual de
adaptação ao instrumento.
Para Galamian, algo ainda mais importante do que a particularidade de cada aspeto
técnico no violino era, na verdade, a interdependência entre os vários gestos,
funcionando como uma reação mutuamente automática, daí o seu System of Spring
(Sistema de Molas). “To understand the functioning of the bow, one has to realize from
the very outset that the whole right arm technique is based on a system of springs.
These react in much the same way as do mechanical springs.” (Galamian, 1962, p.44)9
Relativamente à forma de segurar o arco, Galamian recomenda uma colocação dos
dedos específica:
The four fingers on top of the bow stick should rest there with the same slight
distance between them that is natural when the hand hangs loosely suspended
from the wrist and completely relaxed (…) The worst mistake of all is to press
the fingers against each other, thus creating a great deal of unnatural and
useless tension. (Galamian, 1962, p.47)10
Um dos pontos talvez mais fulcrais da sua pedagogia passa por explicar que, para que
exista a já referida interdependência dos vários movimentos, o controlo mental deve
prevalecer sobre a física e a mecânica violinísticas, havendo uma antecipação de
ordens dirigidas aos movimentos do corpo.
9 “Para entender o funcionamento do arco, é preciso perceber desde o início que toda a técnica do braço
direito é baseada num sistema de molas. Este reage da mesma maneira que as molas mecânicas.” Tradução
livre do autor. 10 “Os quatro dedos devem descansar em cima do arco com a mesma distância entre eles, de forma natural,
como quando a mão está suspensa do pulso e completamente relaxada (...) O pior erro de todos é pressionar
os dedos uns contra os outros, criando assim uma grande e inútil quantidade de tensão.” Tradução livre do
autor.
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The key to facility and accuracy and, ultimately, to complete mastery of violin
technique is to be found in the relationship of mind to muscles, that is, in the
ability to make the sequence of mental command and physical response as
quick and as precise as possible. Therein resides the fundamental principle
of violin technique that is being overlooked and neglected by far too many
players and teachers. (Galamian, 1962, p.2)11
5.1. Importância da mão direita no domínio do arco
Na opinião de Galamian, a técnica violinística é crucial para o desempenho do violinista
e deve ser bem construída e trabalhada para que, a nossa mente possa controlar e
determinar todos os gestos envolvidos durante a execução e consigamos produzir o tipo
de interpretação que se pretende para cada obra.
Technique is the ability to direct mentally and to execute physically all of the
necessary playing movements of the left and right hands, arms and fingers. A
complete technique means the development of all of the elements of the
violinistic skill to the highest level. (…) Without the mastery supplied by an
adequate interpretive technique, a player can neither properly lead nor
properly follow. (Galamian, 1962, p.5)12
A nível de trabalho técnico, é aconselhado por muitos violinistas que, inicialmente, se
deve realizar o trabalho da técnica de mão esquerda em separado com o da direita, tal
como afirma Flesch:
(...) at the start, bowing and finger technique are entirely separated from each
other: the pupil should continue with bowing exercises upon the open strings
until he has gained a certain amount of bowing ability and until his tonal
sense and feeling have been awakened and development of same becomes
noticeable. (Flesch, 1928, preface)13
11 “A chave para a facilidade e precisão e, em última análise, para completar o domínio da técnica do violino
pode ser encontrada na relação da mente com os músculos, isto é, na capacidade de tornar a sequência do
comando mental e da resposta física tão rápida e precisa quanto possível. Aí reside o princípio fundamental
da técnica do violino que está a ser negligenciado por muitos violinistas e professores.” Tradução livre do
autor. 12 “Técnica é a capacidade de direcionar mentalmente e executar fisicamente todos os movimentos de
execução necessários das mãos, braços e dedos das mãos esquerda e direita. Uma técnica completa significa
o desenvolvimento de todos os elementos da técnica violinística ao mais alto nível. (…) Sem uma mestria
fornecida por uma técnica interpretativa adequada, um executante não consegue nem liderar nem seguir
devidamente.” Tradução livre do autor. 13 “(...) no início, a técnica de arco e da mão esquerda são completamente separadas uma da outra: o aluno
deve continuar com exercícios de arco em cordas soltas até que tenha adquirido uma certa quantidade de
habilidade de manuseamento do arco e até que seu senso tonal tenha sido despertado e o desenvolvimento
do mesmo se torne perceptível.” Tradução livre do autor.
36
Claramente pela busca da mecânica correta do uso do arco e de um som bonito com
qualidade, Auer realça a prioridade de a mão direita ser a primeira das duas mãos a ser
ensinada.
Even on the open strings alone he must learn to produce a clear, round tonem
capable of dynamic shading…Until this has been accomplished, the student´s
attention should not be diverted through the additional difficulties of learning
how to set the fingers. (Auer, 1925, preface)14
Como indica Galamian, “We now turn our attention to the problems of the right hand,
which generally cause most of the trouble for violinist.” (Galamian, 1962, p.44)15
A técnica da mão direita é a que maioritariamente se torna um obstáculo na evolução de
um violinista e na sua forma de tocar. Mesmo sendo detentores de uma destreza e
agilidade na mão esquerda e sermos possuidores de uma afinação pontual, não havendo
um respetivo domínio sólido da mão direita, de onde resulta a construção do som, e não
conseguindo produzir uma boa sonoridade e projeção, não será então possível alcançar a
verdadeira qualidade como violinistas. Já Flesch mencionava que
The mechanical aspects of using the bow are more complicated than those of
the left arm. The reason is that the fingers of the left hand come into direct
contact with the string, while the right arm can only act upon the string
through the stick of the bow and the bow hair. (Flesch, 1928, p.34)16
A abordagem de que o arco alcança uma complexidade maior por ter de haver um
primeiro contato da mão direita no arco antes de chegar ao violino, quando por outro lado,
os dedos na mão esquerda caem diretamente no braço do violino, faz com que a
importância e dificuldade do domínio da mão direita do arco se sobreponha sobre a mão
esquerda. Para não falar de todo o conjunto de movimentos, gestos, sensações, que são
implicados no mecanismo do braço direito em execução com o arco.
Apesar de toda a perícia empregue na mão esquerda, desde escalas, arpejos, cordas
dobradas, vibrato, extensões, etc, será sempre o arco que dará vida a todas essas notas
14 “Mesmo nas cordas soltas, o aluno deve aprender a produzir uma sonoridade clara e redonda, capaz de
uma grande variedade de dinâmicas ... Até que isso seja feito, a atenção do aluno não deve ser desviada
para dificuldades adicionais de aprender a ajustar os dedos.” Tradução livre do autor. 15 “Agora centramos a nossa atenção para os problemas da mão direita que, geralmente, apresentam a maior
parte das dificuldades para o violinista.” Tradução livre do autor. 16 “Os aspectos mecânicos do uso do arco são mais complicados que os do braço esquerdo. Pelo facto de
que os dedos da mão esquerda entram em contacto direto com a corda, enquanto o braço direito só pode
atuar sobre a corda através da vara e das cerdas do arco.” Tradução livre do autor.
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criadas a partir destes elementos técnicos e que aprimorará a parte musical na qual
estamos ao serviço como instrumentistas.
The virtuosity of the left hand, even if developed as far as possible, will always
carry the stamp of a certain artistic steritily, whereas the bow, by its multiple
faculties, will give everyone the possibility of translating the most subtle and
profund elements in the interpretations of Art. (Gerle, 2011, p.9)17
5.2. Colocação e funcionamento da mão direita
É unânime para muitos dos grandes violinistas, o quão importante é o papel do arco na
execução e interpretação de um violinista, e o facto de envolver uma série de mecanismos
físicos para que a sua ação seja bem-sucedida. Como aponta Richard Gerle, “The manner
of holding the bow if of such fundamental importance that is no exaggeration to say that
there can’t be successful or advanced bow technique without a correct, efficient and
relaxed bow-hold.” (Gerle, 2011, p.20)18
Mas, para que todo este procedimento funcione de forma sólida, natural e eficaz, é crucial
a forma como a mão direta se encaixa no arco, como todos os dedos se posicionam e
atuam e como todos os músculos e articulações devem reagir e agir em função de tudo
que o arco produz. Auer opina que,
The bow is held and drawn by the right hand and the entire tone production
together with its innumerable dynamic possibilities and characteristic effects
are dependet upon its skillful use. As a natural consequence great importance
attachés to three fundamental needs: (a) action of the right-hand thumb and
fingers; (b) pliancy and flexibility of the wrist, and (c) proper attitude and co-
operation of the lower and upper arm. (Auer, 1925, p.12)19
Apesar de defender esta base e de terem sido desenvolvidas outras formas de se usar o
arco pelas variadas escolas violinísticas já referidas, Auer acredita que esta questão é
muito pessoal, por sermos todos diferentes, e cada violinista deve atender às suas
17 “O virtuosismo da mão esquerda, mesmo elevado ao maior nível possível, carregará sempre um certo
estereótipo artístico, ao passo que o arco, pelas suas múltiplas funcionalidades, dará a possibilidade de
expressar os elementos mais subtis e profundos nas interpretações artísticas.” Tradução livre do autor. 18 “A maneira de segurar o arco é de tal forma importante e fundamental que não é exagero dizer que pode
haver técnica de arco bem-sucedida ou avançada sem um arco correto, eficiente e relaxado.” Tradução livre
do autor. 19 “O arco é segurado e desenhado pela mão direita e toda a produção de sons, em conjunto com as suas
inúmeras possibilidades dinâmicas e efeitos característicos, dependem do seu uso habilidoso. Como
consequência natural, é atribuída grande importância a três necessidades fundamentais: (a) ação do polegar
e dos dedos da mão direita; (b) flexibilidade do pulso e (c) atitude e cooperação adequadas da parte inferior
e superior do braço.” Tradução livre do autor.
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condições físicas e encontrar o seu conforto natural. “Exact and unalterable rules as to
one particular manner of holding the bow cannot and should not be laid down, as much
depends upon personal opinion, and individual needs owing to differently shaped and
proportioned arms, muscles and fingers.” (Auer, 1925, p.12)20
Entre todas as pedagogias e teorias exploradas à volta da mão direita, o aspeto mais
importante que todas as escolas apresentam em comum é uma sensação de relaxamento,
flexibilidade e liberdade quando o arco é usado, para que todo o seu gesto funcione de
forma natural e fácil. Nomes como Auer, Flesch, Galamian, Gerle, Perlman são
apologistas deste princípio.
A nível de posicionamento dos dedos, o indicador é considerado pelos violinistas um dos
mais importantes na ação da mão direita. Na opinião de Auer, o indicador representa o
papel de monitorizar a maleabilidade do arco para a execução de golpes de arco e, para
além disso, é também um dos principais responsáveis pela construção do som e respetivos
conjuntos de dinâmicas e cores, através do direcionamento do peso do braço para o
indicador que entra em contato com as cordas. Também Flesch fala na questão de ser o
indicador que faz a ponte entre o peso que vem das costas, passando pelo braço, antebraço
e pulso e que, através do indicador, conecta com as cordas produzindo o som. Afirma
também que este processo de “transmissão” de peso é mais beneficiado se o cotovelo se
mantiver à mesma altura dos dedos ou acima, mas nunca abaixo. Acima de tudo, a ideia
é que os dedos estejam sempre relaxados em todas as ações que praticam.” Rigid pressure
from the fingers themselves is absolutely to be rejected.” (Flesch, 1928, p.38)21
Outro dos dedos mais referenciados é o mindinho. Na idealização de Galamian, o
mindinho deve mostrar-se flexível e numa posição curva junto ao dedo anelar pois, se
estiver rígido ou esticado, pode levar ao bloqueio dos outros dedos e da própria mão
direita.
The fourth finger is placed close enough to the third finger that a slight curve
forms at each joint. If it is stretched too far our toward the end of the stick,
20 “Regras exatas e inalteráveis quanto a uma forma particular de segurar o arco não podem e não devem
ser estabelecidas porque dependem muito da opinião pessoal e das necessidades individuais relativas aos
braços, músculos e dedos de formas e proporções diferentes.” Tradução livre do autor. 21 “A pressão rígida dos próprios dedos deve ser absolutamente rejeitada.” Tradução livre do autor
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the curves cannot form, and it becomes stiff and rigid, losing thereby its
springlike action. (Galamian, 1962, p,46)22
Para Flesch, o mindinho funciona como uma espécie de moderador de tensão na qual o
indicador está sujeito quando o arco é levantado.
Já Auer esclarece que o mindinho tem uma função menos participativa, sujeitando-se ao
equilíbrio das partes superior e inferior da mão. Apesar de nas escolas violinísticas
anteriores ser defendido que o mindinho deve sempre permanecer pousado na vara, Auer
referencia que nas escolas Russa e Franco-Belga esta ideia perde um pouco esse sentido.
Atendendo à já mencionada visão de que cada violinista apresenta constituições físicas
diferentes, poderá, por alguma circunstância, haver situações de exceção em que o
mindinho poderá levantar como por exemplo, na execução de alguns golpes de arco.
Quanto ao polegar, Auer aponta que deve ser o maior alvo de atenção por parte dos
violinistas. Para além de sustentar o arco, cria um amortecimento no equilíbrio
descendente dos dedos quando há mudanças de arco.
Of all the fingers the thumb demands the most attention. Its main function is
to support the bow and counter-act the downward pressure upon the stick by
the other fingers. It must be firmly set, with protruding first joint between the
upper edge of the nut and the stick. (Auer, 1925, p.12)23
Por último, tanto o dedo anelar como o dedo médio apresentam um papel mais passivo,
repousando sobre a noz do arco e não demasiado afastados um do outro. De certa forma,
dão alguma estabilidade no ato de segurar o arco.
Torna-se evidente que o desempenho individual de cada dedo é essencial para a mecânica
do funcionamento da mão direita e que todos devem atuar em função uns dos outros, de
forma livre e descontraída.
The correct bow grip must be a comfortable one: all fingers are curved in a
natural, relaxed way; no single joint (knuckle) is stiffened; and the correctly
22 “O quarto dedo é colocado perto o suficiente do terceiro, formando uma ligeira curva em cada articulação.
Se esticarmos longe demais até o final do arco, as curvas não se podem formar, tornando-se rígidas e
perdendo assim sua ação de molas mecânicas.” Tradução livre do autor. 23 “De todos os dedos, é o polegar que exige mais atenção. A sua principal função é apoiar o arco e contrariar
a pressão descendente sobre a vara exercida pelos outros dedos. Deve ser firmemente ajustado, com a
primeira articulação saliente entre o canto superior do talão (noz) e a vara.” Tradução livre do autor.
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resulting flexibility must allow all of the natural springs in the fingers and the
hand to function easily and well. (Galamian, 1962, p.47)24
6. A construção do som
Segundo Flesch, o som surge a partir da vibração das cordas que resulta do contato do
braço direito sobre elas através do arco; (…) the right arm has the task of putting the
strigns into vibration. A tone is the result of regular, periodic vibrations of a certain
frequency. Irregular vibration produce noise. (Flesch, 1923, p.62)25
Para Gerle, existem dois pontos essenciais para uma boa construção de som: o lado
mecânico (arco) e o lado fisiológico (o próprio violinista). Seguindo a mesma perspetiva
de Flesch, Gerle sugere a velocidade do arco, pressão do arco e a distância do talão como
os três elementos chave que caracterizam o lado mecânico. Nesta linha, Galamian fala no
elemento artificial que compreende toda a ação do arco e no elemento natural que
corresponde então à parte física do violinista usada no movimento do arco:
“Violinistically, they are partly artificial (such as the resilience of the bow hair and the
flexibility of the bow stick) and partly natural (such as the joints of the shoulder, elbow,
wrist, fingers, and thumb.” (Galamian, 1962, p.44)26
Em relação ao elemento artificial (o arco), Galamian realça a importância da qualidade
das cerdas que o arco possui como um fator a ter em conta, tal como também no momento
da execução, ter em atenção se as próprias cerdas estão, ou não, muito esticadas
provocando mais tensão no equilíbrio do arco, o que pode desfavorecer a qualidade do
som. Outro aspeto a ter em consideração, é a importância de ter um arco que apresente as
condições qualitativas que permitam ao violinista usufruir ao máximo das suas
capacidades, tanto a nível de projeção, diferentes cores, controlo da velocidade aplicada
e obviamente favorecer na execução de golpes de arco. Por outro lado, se o violinista não
for detentor de uma técnica competente e apresentar uma disponibilidade física que não
24 “A forma de segurar o arco deve ser confortável: todos os dedos devem estar curvados de maneira natural
e relaxada; nenhuma das articulações deve estar endurecida e a correta flexibilidade resultante deve permitir
que todas as "molas naturais" nos dedos e a mão funcionem bem e facilmente.” Tradução livre do autor. 25 “O braço direito tem a tarefa de colocar as cordas em vibração. Um som é o resultado de vibrações
regulares e periódicas de uma certa frequência. Uma vibração irregular produz ruído.” Tradução do autor. 26 “Violinisticamente, são parcialmente artificiais (como a elasticidade das cerdas do arco e a flexibilidade
da vara) e parcialmente naturais (como as articulações do ombro, cotovelo, pulso, dedos e polegar).”
Tradução livre do autor.
41
permita tocar de forma livre e relaxada, será mais difícil tirar partido de um arco, mesmo
que este seja de condições excelentes.
Quanto ao elemento natural, Galamian alia a funcionalidade corporal dos violinistas em
relação ao uso do arco, com o próprio mecanismo que o ser humano utiliza para andar,
para que se perceba a naturalidade e o relaxamento que devem ser implicados:
Flexibility in the arm, and fingers is natural for their functioning as is
flexibility in the legs, feet, and toes in the process of walking. There should
be na appearance of ease in the bowing, and it shoul not resemble the stiffness
that would accur i fone were to try to walk without bending the proper joints.
(Galamian, 1962, p.45)27
Podemos concluir que a junção de uma atitude corporal tranquila, aliada a uma técnica de
mão direita livre, flexível e consistente, explorada a partir de um arco que apresente
características favoráveis em sintonia com o violinista, criam condições para que o
funcionamento do arco e a respetiva produção de som possam apresentar resultados
positivos.
6.1. Golpes de arco e arcadas
A partir de toda a mecânica desenvolvida pela mão direita, para além do som que é
produzido pelo arco nas cordas, é possível também explorar variadas sonoridades através
de determinados acentos ou articulações que enriquecem ainda mais o texto musical. A
isto damos o nome de “golpes de arco”.
Antes de especificar e explicar os vários golpes de arco que foram desenvolvidos e
identificados por alguns violinistas, é relevante mencionar o conceito de “arcadas” que,
apesar de na prática se interligar com os “golpes de arco”, por vezes são incorretamente
associados como “sinónimos”. Pelas palavras de Salles;
Definimos o termo arcada como ato de ir e vir, a direção do movimento do
arco. Pode ser para cima, ou seja começando o movimento na ponta em
direção ao talão e indicado com o sinal , ou para baixo, do talão à ponta,
indicado pelo sinal (Salles, 1988, p.20).
27 “Flexibilidade no braço e dedos é tão natural para o seu funcionamento como é a flexibilidade nas pernas,
pés e dedos no processo de caminhar. Deveria haver uma aparência de facilidade no arco, e isso não deveria
ser semelhante à rigidez que seria tentar andar sem dobrar as articulações adequadas.” Tradução livre do
autor
42
Quando mencionamos “arcadas”, definimos o sentido da nota ou dos conjuntos de notas
nas direções para “baixo” ou para “cima” ou então, as notas aparecem “ligadas” ou
“separadas”. Segundo Mariana Salles, os primeiros apontamentos de arcadas
(baixo/cima) só começaram a surgir a partir do século XIX;
A execução das arcadas para baixo e para cima, anterior ao século XIX,
funcionava mediante convenções ditadas pela tradição, não escrita, da “regra
do arco para baixo” (rule of down-bow), formulada pelos italianos por volta
do início do século XVII. (Muffat, 1980, p.132 cit.in Salles, 1998, p.21)
A “regra do arco para baixo” instituía que as arcadas para baixo seriam usadas para
sublinhar os tempos fortes, e as arcadas para cima, os tempos fracos. Esta regra
fundamentava-se no facto de a arcada para baixo apresentar mais peso devido a questões
da gravidade e do próprio relaxamento natural do braço direito que recaía sobre o arco.
Com o desenrolar dos tempos, este princípio foi perdendo força e tornou-se desapropriado
para uma prática mais avançada. Apesar de tudo, é de referir que houve influência da
“regra do arco para baixo” numa arcada moderna, em que se tocam várias notas para
cima, que acaba por ser um golpe de arco posterior - spicatto volante.
À semelhança dos golpes de arco, a marcação de arcadas é algo muito pessoal, prática
esta que cada intérprete acaba por adequar às suas aptidões técnicas e que vai de encontro
com as suas ideias musicais. Ou seja, de violinista para violinista, podemos encontrar
perspetivas diferentes em relação a uma obra específica, o que nos poderá proporcionar
interpretações musicais distintas e que, de certa maneira, enriquecerá ainda mais o meio
violinísitco pela enorme variedade de visões musicais que podemos encontrar.
Já no que toca a grupos instrumentais, como orquestras, a responsabilidade de decidir
uma arcada ou um golpe de arco numa passagem específica da obra em contexto, fica ao
cargo do concertino ou dos respetivos chefes de naipe, tentando ajuizar aquilo que melhor
poderá favorecer o grupo em contributo à música. Apesar de Salles afirmar que:
“Maestros não devem impor arbitrariamente suas próprias arcadas à orquestra.” (Salles,
1998, p.23), nem sempre este julgamento deve ser considerado válido. Segundo a
experiência de orquestra que tenho, de vários ensaios em orquestras nacionais e
internacionais que tive a oportunidade de assistir e participar, posso constatar que muitos
maestros tinham auferido anteriormente de uma formação como instrumentista de cordas.
43
A partir dessa formação, ganharam bagagem suficiente que lhes permite compreender o
suficiente sobre estes assuntos para poderem conferenciar com os chefes de naipe e
acabarem por ser eles mesmos a definir arcadas ou golpes de arco de determinadas
secções orquestrais, de maneira a obterem o resultado sonoro pretendido no conjunto dos
naipes das cordas. Também o mesmo maestro pode tomar diferentes decisões nas mesmas
passagens das mesmas obras, mas em diferentes orquestras, pelas caraterísticas singulares
que cada uma apresenta na sua forma de tocar, devido às diferenças entre os músicos que
cada uma reúne.
Contudo, sendo o concertino um líder e conhecedor das caraterísticas técnicas e musicais
do seu naipe, tem como função a decisão de definição das arcadas. (Salles, 1998, p. 23).
Pelo que se pode refletir, é a partir então da ação das arcadas que há uma direção de som
construída a partir do contacto das cerdas do arco nas cordas que se movimenta nos dois
sentidos, baixo/cima e cima/baixo como já foi referido. Partindo destes movimentos,
surgem os variados golpes de arco, daí a sua ligação.
6.2. Classificações dos variados golpes de arcos
Duas das fontes mais referenciadas e dirigidas à análise dos vários tipos de golpes de arco
destacam-se nas obras já anteriormente referidas - The Art of Violin Playing, de 1928 por
Carl Flesch e Principles of Violin Playing and Teaching, de 1962 por Ivan Galamian.
Sobre Flesch, Salles considera que
A habilidade para “diagnósticos” preciosos transformou-o em um dos
maiores professores de todos os tempos, conduzindo os problemas técnicos e
musicais para um caminho racional. Sua escola foi registada em livros e
tratados que formam a base da escola violinística desde século. (Salles, 1998,
p.17)
Relativamente aos golpes de arco, Flesch definiu a sua filosofia numa divisão de quatro
categorias de golpe de arco:
• Long Strokes – golpes de arco longos (Flesch, 1928, p.46);
• Short Strokes – golpes de arco curtos (Flesch, 1928, p.49);
• Bouncing (springing) and thrown bow strokes – golpes de arco atirados e saltados
(Flesch, 1928, p.54);
44
• Mixed Bowings – golpes de arco mistos (Flesch, 1928, p.59).
6.2.1. Golpes de arco longos
A primeira categoria distinguida por Flesch, denominada de “golpes de arco longos”, é
definida pelo gesto contínuo do arco, não apresentando qualque corte na linha sonora. Os
três golpes de arco associados a esta categoria são: son filé, legato e détaché
6.2.2. Son filé
Começando pelo son filé, também conhecido por spun note, em inglês; suono filato, em
italino ou mesmo gesponnene ton, em alemão (Salles, 1998, p.37), era classificado como
(…) a note sustained by a single stroke the bow long enough to receive a
singing character. Its duration varies between 1 and 15 seconds. When it is
less than a second it passes over into the détaché, but from 15 seconds
upwards it is used less in playing than for purposes os study. (Flesch, 1928,
p.64)28
Figura 2 - Son Filé: Exemplo musical do 2º and. da Sonata "Kreutzer", para
violino e piano de L.V. Beethoven (c.197 a 200)
Fonte: Salles, 2004, p.60
Este golpe de arco é especialmente usado como exercício onde a velocidade deve ser
controladamente lenta ao longo de todo o arco, com um contacto na corda muito pouco
aderente, produzindo um som quase superficial. Segundo Cassorti (1880, p.24), o estudo
deste golpe de arco favorece a persistência do controlo do arco na corda, podendo auxiliar
principalmente os estudantes de violino que sofrem de problemas de nervosismo durante
uma performance.
Em relação a este golpe de arco, Mariana Salles realça ainda a importância do tipo de
vibrato utilizado (lento/rápido, amplo/menos amplo) e de que forma é produzido o vibrato
28 “(…) Uma nota sustentada por um único golpe de arco, longo o suficiente para produzir um carácter
cantabile. A sua duração varia entre 1 e 15 segundos. Quando é menos de um segundo, passa para a détaché
mas, a partir de 15 segundos é mais usado no estudo do que na execução normal.” Tradução livre do autor.
45
(pulso, braço, mão), para acrescentar um toque de cantabile na execução do golpe de arco.
Outro aspeto também destacado por Mariana Salles é que, um excelente domínio deste
golpe de arco permite um maior controlo do arco sobre a expressão do som, especialmente
nos pianos. Isto para dizer que, por exemplo, em muitas orquestras, quando lhes é
indicado tocar um piano, a maior parte das vezes recorrem à Sulla Tastiera quando, por
norma, esta indicação surge como uma mudança de timbre e não de dinâmica.
Normalmente, o son filé não apresenta qualquer indicação gráfica, mas, em situações em
que a dinâmica exigida é piano, Mariana Salles recomenda que o golpe de arco seja
aplicado e deva ser efetuado perto do cavalete de maneira a enriquecer a qualidade de
som.
6.2.3. Legato
Quanto ao legato, Flesch sublinha parecenças com o son filé, mas diferem em relação à
quantidade de notas usadas; “(…) a greater or lesser sustaining of the bow-stroke, but
differs from the latter inasmuch as here i tis not a single note, but a sucession of notes,
uninterrupted by pauses, which have to be produced.” (Flesch, 1928, p.65)29
Figura 3 - Legato: Exemplo musical da peça "L'Abeille", op. 13, n.º 9 de F.
Schubert (c. 1 a 3)
Fonte: Salles, 2004, p.59
A mudança de notas numa só arcada contrasta com a execução de uma só nota por arcada
em relação ao son filé. Como o próprio nome indica – legato – há uma ligadura que une
o conjunto formado por várias notas seguidas, originando uma longa linha melódica sem
interrupções e, esta linha produzida pelo arco não deve ser “incomodada” pela ação que
ocorre na mão esquerda. Segundo Mariana Salles,
A dificuldade do legato está, basicamente, na coordenação da digitação e mudança de
corda. (Salles, 2004, p.57)
29 “(...) uma maior ou menor sustentação do golpe de arco mas, difere do último na medida em que aqui
não é uma única nota mas sim uma sucessão de notas que devem ser produzidas sem interrupção de pausas.”
Tradução livre do autor.
46
Em relação às mudanças de arco, há que ter um especial cuidado de antecipação, em que
o arco se aproxima pouco a pouco da corda para qual vai mudar, de maneira a que não
seja necessário um movimento de grande amplitude do braço e antebraço, mas sim um
gesto mais curto e simplificado por parte da mão e pulso que sobem e descem, imitando
um gesto ondular e não horizontal.
Para a realização deste golpe de arco é, também, aconselhável pensar-se numa
distribuição definida do arco para cada nota ou grupo de notas para que a velocidade do
arco seja gerida em função do valor de cada figura. Flesch afirma que a quantidade de
arco usada no legato deve também ser pensada em função das indicações musicais
impostas nas obras pelos compositores:
(…) the portion of bow for each note should be in the direct proportion to the dynamic.
(Flesch, 1928, p.47)30
Outro aspeto a mencionar em relação a compositores, em especial L.V. Beethoven e J.
Brahms, é que muitas vezes as suas obras apresentam-nos frases com longas ligaduras
(uma escrita tipicamente pianística) que, por vezes, na prática se tornam “sufocantes” na
sustentação do arco. Nestas situações, o violinista vê-se um pouco “obrigado” a procurar
alternativas de modo a tornar a execução mais respirável a nível de gestão de arco, mas,
ao mesmo tempo, tentando não desconstruir a ideia de escrita pensada pelo compositor.
A decisão de arcada que ficar definida deve servir sempre a música.
30 “(…) A quantidade do arco para cada nota deve estar em proporção direta com a dinâmica.” Tradução
livre do autor.
47
6.2.4. Détaché
Para Flesch, este golpe de arco é um dos primeiros que deve ser ensinado, devido à
importância com que contribui para uma base sólida da técnica do arco;
This most important fundamental stroke, in contrast to the legato, is
characterized by the fact that, contrary to the legato, the various notes are
separated one from the other through change of bow; however, the separation
must take place only by means of a pause, unavoidably consequente upon the
change bow. (Flesch, 1928, p.66)31
Tambén Mariana Salles associa este golpe de arco a um movimento “primário” visto que,
basicamente é o primeiro gesto que uma criança realiza quando contacta com o violino e
o arco pela primeira vez. Trata-se de um gesto similar ao de um baloiço que vai e volta.
Graças a este movimento, torna-se possível o desenvolvimento e realização de todos os
outros golpes de arco, daí a importância do aprimoramento da sua técnica.
Como foi referido por Flesch, por oposição ao legato, em vez de uma ligação das notas,
há uma separação delas que é feita com a mudança de arco, parecendo haver um corte
entre as notas quase inaudível, mas não uma paragem. Basicamente, é um tipo de legato,
mas com uma arcada diferente para cada nota.
O détaché caraterizado por Flesch, estende-se em três tipos:
• Détaché com o arco todo – apresentando-se como um meio termo entre o détaché e
o son filé. Dentro das duas categorias, a sua ligação a uma delas enquadra-se consoante a
duração da arcada. A nível técnico, pode melhorar o domínio do arco e desenvolver a
projeção sonora, servindo como excelente exercício para estudantes que toquem com
pouca quantidade de arco e sejam mais inibidos na maneira de tocar.
Figura 4 - Détaché: Exemplo musical da peça "Prelude and Allegro" in the style of
Pugnani – F. Kreisler (c. 1 a 2)
Fonte: Pinto, 2016, p.148
31 “Este golpe, fundamental e importante, em contraste com o legato, é caracterizado por serem várias notas
separadas umas das outras devido à mudança de arco. No entanto, a separação deve ocorrer apenas por
meio de uma pausa, inevitavelmente consequência da mudança de arco.” Tradução livre do autor.
48
• Grande détaché – tipo de détaché em que deve ser utilizado pelo menos metade do
arco e a sua realização só funciona num tempo que seja lento. Apesar de o ideal da sua
execução ser na metade superior do arco, podem surgir também situações que seja mais
viável tocar na parte inferior. Em comparação ao pequeno détaché, utiliza um movimento
muscular mais extenso.
Figura 5 - Grande détaché: Exemplo musical do 4º and. da Sonata para violino e
piano de C. Franck (c. 237 a 238)
Fonte: Flesch, 1928, p.47
• Pequeno détaché – também referenciado como o básico détaché, é considerado um
dos golpes de arco mais utilizados e fundamentais para uma técnica de arco sólida. A sua
zona ideal de execução é na parte superior do arco, entre o meio e a ponta.
Figura 6 - Pequeno détaché: Exemplo musical do 1º and. da Sonata “Kreutzer” de
Beethoven
Fonte: Salles, 2004, p.64
Dentro deste terceiro tipo, podemos associar ainda mais dois golpes de arco. São eles o
tremolo e o détaché francês, sendo que este último fará uma espécie de “ponte” para a
próxima categoria de golpes de arco que Flesch define como golpes de arco curtos. Tal
como ele explica; “The French détaché has the advantage over the German with regard
to its greater impulsion, as well as in its increased carrying power of tone; but the
disadvantage of inferior possibilities of expression.” (Flesch, 1928, p. 68)32
32 “O détaché francês tem vantagem sobre o alemão no que diz respeito à sua maior impulsão e ao seu
maior poder de som; mas a desvantagem de ter menos possibilidades de expressão.” Tradução livre do
autor.
49
Figura 7 - Quadro de Golpes de Arco provenientes do Détaché segundo Flesch
Fonte: Salles, 2004, p.40
Em relação ao tremolo, este golpe de arco trata-se de uma repetição frenética da mesma
nota através de curtos movimentos em détaché preferencialmente na ponta do arco,
produzidos pelo movimento rápido e flexível do pulso. Segundo Flesch, o tremolo surge
apenas associado à categoria dos golpes de arco longos, precisamente por também não
apresentar qualquer interrupção entre as notas (Flesch, 1928, p.49).
Figura 8 - Tremolo: Exemplo musical
Fonte: Flesch, 1928, p.49
Para além destas categorias de détaché definidas por Flesch, também Galamian e Salles
associam outros golpes de arco referentes ao détaché, como o détaché acentuado, portato
ou louré, détaché porté, detaché lancé, fouetté, grand détaché porté, détaché tipo duro.
O detaché acentuado, tal como o conceito indica, é determinado por uma acentuação
originada pela junção da velocidade e peso do arco no princípio do golpe em si. Por
norma, apresenta um papel de enfâse de algumas notas, por entre secções de détaché
simples. Podemos reconhecer a sua identificação gráfica através dos acentos indicados
em certas notas.
Figura 9 - Détaché acentuado: Exemplo musical do 1º and. da Sonata "Kreutzer"
de Beethoven (c. 85 a 87)
Fonte: Salles, 2004, p.66
50
O portato ou louré, trata-se no mínimo de um golpe de arco polemicamente interessante,
devido às várias abordagens que se lhe atribuem pelas mais variadas opiniões de cada
autor. Por um lado, Galamian classifica o portato como uma derivação do détaché que
corresponde à categoria das “arcadas longas” segundo Flesch. Por outro, é visto como
associado ao staccato, no entender de Flesch, tendo em conta que há uma ligeira
separação entre cada nota por uma pausa significativamente audível, o que leva Flesch a
associa-lo à categoria das “arcadas curtas”. Já Galamian acredita que este golpe de arco
não passa de uma sequência de golpes de arco em détaché porté realizados numa arcada
só, evidenciando que o détaché pode por vezes ser inflexionado por alguma influência do
portato durante a execução e daí parte então a derivação entre os dois golpes de arco,
originando ainda um golpe de arco que acaba por ser intermédio destes dois, o détaché
porté.
Figura 10 - Portato: Exemplo musical do 1º and. do Concerto para violino de F.
Mendelssohn, op. 64 (c. 139 a 141)
Fonte: Salles, 2004, p.70
No ponto de vista de Mariana Salles, tal como pensa Galamian, o portato também provém
do détaché, no sentido em que o portato acaba por ser a evolução do détaché executado
pelo arco antigo (anterior ao arco Viotti-Tourte). Este arco antigo reproduzia o détaché
como um efeito de onda, o que se aproxima um pouco ao resultado sonoro do atual
portato. A diferença face ao arco antigo era que, neste o movimento era regular e contínuo
(tal como no détaché atual) e, com o arco moderno é necessário recorrer ao movimento
de pronação do antebraço.
Num trecho musical, o portato pode ser identificado através da presença de traços que
sublinham as notas, ou por cima ou por baixo delas, com ligação ou separadas.
O anteriormente já referido por Galamian - détaché porté, usufrui nos dias de hoje de um
papel de protagonismo na interpretação da música barroca, tendo contribuído para uma
melhoria significativa na maneira de tocar grande parte do repertório barroco, onde este
51
golpe de arco se faz representar por asteriscos por cima das notas, funcionando como o
portato, mas com cada nota em arcos separados.
Figura 11 - Détaché Porté: Exemplo musical da Ciaccona da 2º Partita para
Violino Solo de J.S. Bach (c. 160 a 162)
Fonte: Salles, 2004, p.70
Outros dois tipos de détaché, mas apenas distinguidos por Galamian, são o détaché lancé
e o fouetté. O primeiro destes golpes de arco está anotado graficamente na partitura
através da marcação de um traço e um ponto por baixo de cada nota e carateriza-se por
um gesto de velocidade no arco, sem acento, que depois perde força até ao final.
Relativamente à sua zona de execução, assemelha-se ao pequeno détaché, mas, no que
toca à mecânica do braço direito, o antebraço apresenta uma função mais influente na
elaboração do som, sendo que os dedos e o pulso funcionam como toque final para tornar
o som mais redondo. Contrariamente, no pequeno détaché é reservada uma finalidade
muito mais importante na mecânica dos dedos e do pulso para a qualidade de som.
Figura 12 - Détaché Lancé: Exemplo musical do Double da 1ª Partita para Violino
Solo de Bach (c. 1 a 3)
Fonte: Salles, 2004, p.73
Já o fouetté, proveniente do détaché acentuado, é visto mais como um ataque inicial de
uma nota de passagem numa secção de détaché, quando esta necessita de ser mais
sublinhada. Por vezes o fouetté é utilizado como recurso ao golpe de arco martelé, uma
vez que se trata de um movimento subitamente mais rápido e enérgico e a sua definição
de articulação torna-se mais eficaz para o resultado pretendido. Efetuado na parte superior
do arco, este golpe de arco resulta de um erguer e entrar na corda para cima precisamente
antes do início da arcada que se segue, e não no fim da arcada anterior. Para além de
poder ser introduzido em passagens de détaché, também surge associado com o legato ou
o son filé.
52
Figura 13 - Fouetté: Exemplo musical do 2º and. da Sonata "Kreutzer" de
Beethoven (c. 196)
Fonte: Salles, 2004, p.74
Por último, é importante também realçar, dois tipos de détaché, identificados por Mariana
Salles que, apesar de não constarem na técnica “convencional” violinística, são bastante
comuns na cultura musical brasileira. Um dos golpes de arco é o grand détaché porté,
sendo um meio-termo entre o grand détaché e o portato, onde é aplicada uma quantidade
de arco que pode variar entre apenas meio arco ou mesmo o arco todo, aliada a uma
inflexão do portato que surge através da pronação do antebraço. Podemos encontrar a sua
referência nas partituras através de um sublinhado por cima ou por baixo das notas tal
como no portato.
Figura 14 - Grand Détaché Porté: Exemplo musical do 1º and. da 5ª Sonata para
violino e piano de C. Santoro (c. 1 a 4)
Fonte: Salles, 2004, p.75
Quanto ao détaché do tipo “duro”, que provém do détaché lancé, em que o antebraço
apresenta um papel preponderante visto que o pulso e os dedos não têm qualquer
intervenção na mecânica deste gesto. O som resultante deste golpe de arco soa
“rudimentar” e “antiquado” e a sua execução é realizada no meio do arco, tal como no
détaché simples.
53
Figura 15 - Détaché do tipo "duro": Exemplo musical do 1º and. da 4ª Sonata para
violino e piano de Santoro (c. 1 a 5)
Fonte: Salles, 2004, p. 76
6.2.5. Golpes de arco curtos
Na segunda categoria de golpes de arco definida por Flesch, podemos encontrar o martelé
e o stacatto que apresentam caraterísticas de acentuações nas notas e nas pausas,
produzidas pela velocidade e alguma pressão que é atribuída ao arco durante a sua
execução. Flesch clarifica esta categoria como
(…) a stroke separated from the proceding and the following one by a plainly
noticeable pause. The interruption is used to exert a strong pressure on the
string by means of the bow-stick, a pressure which coincides with the
beginning of the stroke, and thus produces a kind of secondary noise which I
call the pressure while the pause between the two notes utilized for the
purpose of producing this mute pressure should be called the pressure pause.
(Flesch, 1928, p. 68)33
O martelé, proveniente do italiano martellato, corresponde ao conceito “martelado” na
língua portuguesa o que, de certa maneira, espelha o tipo de articulação que impulsiona
este golpe de arco. Esta articulação “martelada” é distinguida por um acento de natureza
percussiva, oriunda do peso produzido pelo braço em contacto com a vara do arco. Esse
peso conserva-se numa “pausa de pressão”, segundo Flesch, que se liberta e ganha força
através do movimento de pronação do antebraço, em sentido horizontal do arco,
concluindo com um aliviar da tensão, seguida de uma nova “pausa de pressão” que irá
preparar o ataque do golpe precedente.
33 “(…) Um golpe separado do anterior e do seguinte por uma pausa claramente perceptível. A interrupção
é usada para exercer uma forte pressão na corda por meio do arco, uma pressão que coincide com o início
do golpe e, assim, produz um tipo de ruído secundário que eu chamo de pressão, enquanto que a pausa entre
as duas notas utilizadas com a finalidade de produzir essa pressão deve ser chamada de pausa de pressão.”
Tradução livre do autor.
54
Apesar de a metade superior do arco ser a mais comum na execução deste golpe de arco,
na opinião de Galamian, o martelé pode ser utilizado com todo o tipo de quantidade ou
mesmo em qualquer zona do arco.
Figura 16 - Martelé: Exemplo musical do 1º and. da Sonata “Kreutzer” de
Beethoven (c. 19 a 23)
Fonte: Salles, 2004, p. 79
Para a habitual execução do martelé na ponta, Galamian sugere uma colocação de braço,
dedos e mão direita relativamente distinta do que é a posição normal, no sentido de tornar
o contacto da pressão na vara do arco menos esforçada e mais produtiva. Isto é, o pulso
coloca-se numa posição mais baixa enquanto o antebraço se apresenta um pouco mais
pronado e automaticamente a estrutura dos dedos acaba também por baixar.
Por norma, se o martelé for executado com grande quantidade de arco, é o braço que
assume a responsabilidade do impulso do gesto, deixando os dedos e o pulso com um
papel menos ativo e mais direcionado para a formulação da produção sonora. Já em
situações em que o martelé assume menores frações de arco e o próprio som perde corpo,
são necessários movimentos menos amplos, que são então agora conduzidos pelos dedos
e pulso.
Este golpe de arco só é executado em tempos metronómicos não demasiado rápidos; caso
contrário, são aconselháveis golpes de arco alternativos como o stacatto preso, collé,
fouetté ou o détaché acentuado.
Para além do martelé “simples”, o mais comum na linguagem violinística, Galamian faz
referência também a um outro tipo de martelé: martelé sustentado. Este tem como
particularidade a ausência de pausas entre cada nota, havendo sempre uma ligação do som
até ao início do ataque de arco procedente. Galamian descreve este tipo de martelé como
uma espécie de détaché “expressivo” que apresenta um acento inicial de martelé.
Como foi referido, o outro golpe de arco desta categoria associa-se do staccato que,
segundo Flesch, se carateriza como um conjunto de golpes de arco em martelé, tocados
numa só arcada, a partir de vários “acentos de pressão” consoante o número de notas a
55
tocar nessa mesma arcada: In the case of staccato there are as many pressure accents per
one horizontal forearm movement as there are notes to play. (Flesch, 1928, p.50)34 O
aparecimento e desenvolvimento deste golpe de arco terá resultado de uma busca de
alternativa ao martelé, quando este é executado já num andamento mais rápido, para lá
do praticável. A dificuldade do staccato, comparativamente com o martelé, destaca-se
pelo facto de unificar o movimento de pronação com o gesto horizontal do braço que,
contrariamente no martelé, funcionam independentes um do outro. A sua mecânica
funciona através de oscilações que partem dos dedos, mãos e braço direito, oriundas de
uma tensão muscular intencional para se obter este efeito.
Apesar de muitos violinistas considerarem o staccato uma das bases para o sucesso de
uma boa técnica de arco, Flesch aponta que mesmo grandes violinistas do passado não o
dominavam e que tal afirmação não deve ser levada tão seriamente.
Neither Joachim or Sarasate were masters of a normal staccato. On the other
hand, we often will find mediocre violinists who, though their bow technique
in other respects may be found waiting, posses an admirable staccato. Hence
its importance with regard to technique as a whole should not be
exaggerated. (Flesch, 1928, p.69)35
Figura 17 - Staccato/Staccato "Preso": Exemplo musical da Introdução e Rondó
Caprichoso, op. 28 C. Saint-Saëns (c.88 a 89)
Fonte: Salles, 2004, p. 91
A partir do staccato ou stacatto preso, surgem associados, exclusivamente por Flesch, os
tipos de staccato tenso e arco viotti.
34 “No caso do staccato, há tantos acentos de pressão, causados pelo movimento horizontal do antebraço,
quanto notas para tocar.” Tradução livre do autor. 35 “Nem Joachim nem Sarasate eram mestres de um staccato dito normal. Por outro lado, muitas vezes
encontraremos violinistas medíocres que, embora sua técnica de arco em outros aspectos possa ser limitada,
possuam um staccato admirável. Por isso, a sua importância em relação à técnica como um todo não deve
ser exagerada.” Tradução livre do autor
56
Figura 18 - Quadro de Golpes de Arco de Staccato segundo Mariana Salles
Fonte: Salles, 2004, p.79
Em relação ao staccato tenso, como o próprio nome indica, há um endurecimento do
braço que provoca contrações convulsivas nos músculos do mesmo que contribuem para
a ação deste golpe de arco. A única particularidade reside no facto de não poder ser tocado
em andamento lento pois o movimento é realizado de forma “eletrizante”.
Quanto ao “arco Viotti”, outra derivação do staccato, trata-se da junção de duas notas em
staccato, numa arcada só, destacando sempre a segunda nota com uma acentuação;
The so-called “Viotti stroke” is a variant of the staccato. This is a repeated
staccato, divided in two, the speed possibilities of which lies between a
moderate staccato and a customary martelé; characteristic of this stroke,
aboveall, is the robust accentuation of the second note forming the strong
beat of the bar, secured by a strong expenditure of bow, as well as the
pauseless joining of the accented note to the short note following it. (Flesh,
1928, p. 72)36
Figura 19 - “Arco Viotti": Exemplo musical do 1º and. do Concerto n.º 22 para
Violino em Lá m de G.B. Viotti (1 c. antes da letra C)
Fonte: Salles, 2004, p.92
36 “O chamado "arco de Viotti" é uma variante do stacatto. Este, é um staccato repetido, dividido em dois,
cujas possibilidades de velocidade estão entre um staccato moderado e um martelé normal e característico
deste golpe. Acima de tudo, é a acentuação robusta da segunda nota formando o tempo forte do compasso,
assegurado por um gasto de arco forte, bem como a junção, sem pausas, da nota acentuada à nota curta que
a segue.” Tradução livre do autor.
57
Ainda dentro da categoria do staccato, Mariana Salles destaca o staccato volante,
realçando algumas semelhanças com o staccato preso visto que ambos se executam a
partir de uma progressão de notas articuladas numa só arcada. Contrariamente, no
staccato volante o arco tem a liberdade de poder sair da corda cada vez que uma nota é
tocada e o tipo de pressão utilizado durante o staccato preso a partir do movimento de
pronação do braço é agora alterada no staccato volante, pelo movimento de supinação,
na qual o movimento horizontal do arco não deve ser perturbado. A nível de postura, este
golpe de arco pode tornar-se mais facilitado se o cotovelo e o pulso permanecerem mais
elevados comparativamente com o staccato preso.
Por apresentar uma combinação entre staccato preso (com algumas acentuações
caraterísticas de martelé) e “golpes de arco de tipo atirado ou saltado”, o staccato volante
levanta uma dualidade de opiniões entre os autores, visto que Flesch identifica este golpe
de arco na categoria a seguir, a dos “golpes de arco atirados e saltados”.
Figura 20 - Staccato Volante: Exemplo musical da peça Havanaise, op. 83 de Saint
- Saëns (c. 117 a 118)
Fonte: Salles, 2004, p.93
Também procedente do staccato volante, a partir da formulação feita por Mariana Salles,
surge o spiccato volante. Tal como o staccato volante, este é produzido através de uma
sequência de notas na mesma arcada, normalmente para cima, mas em spiccato. O arco
vem do ar e é atirado na corda num gesto um pouco mais elevado que no staccato volante,
numa velocidade moderada.
Ao contrário staccato volante, o spiccato volante é um golpe claramente vertical,
executado na parte inferior do arco, favorecendo uma fluência e regularidade no
movimento do arco, especialmente em passagens de longa de duração, permitindo
conservar a mesma conceção sonora.
58
Figura 21 - Spiccato volante: Exemplo musical do 3º and. do Concerto para
Violino, op. 64 de Mendelssohn (4 c. antes da letra M)
Fonte: Salles, 2006, p. 92
6.2.6. Golpes de arco atirados e saltados
Na terceira categoria de golpes de arco, Flesch identifica como “atirados e saltados”, na
qual são abrangidos “golpes de arco curtos”, com uma pequena separação entre eles e que
saem da corda (ao contrário do martelé).
Associados aos conceitos destes golpes de arco, surge o spiccato (pertencente aos
“atirados”) e o sautillé (pertencente aos saltados). Para explicar o porquê do emprego dos
conceitos saltados e atirados em prol do spiccato e sautillé, Flesch refere que
The Spring and thrown types differ one from the other in point of origin as
well as in regard to their tonal effects. (…) Hence, instead of the indefinite
general terms spiccatto or sautillé hitherto used, we shall employ the
unmistakable term: springing and thrown strokes. (Flesch, 1928, p.73)37
Figura 22 - Spiccato: Exemplo musical do 1º and. da Sonata em Mi menor para
Violino e Piano de Mozart (c. 8 e 9)
Fonte: Flesch, 1928, p.57
Em relação à diferença dos dois conceitos, Flesch aponta que nos golpes de arco atirados
o violinista é quem assume a função ativa do gesto, enquanto o arco se limita a
37 “Os tipos (de golpe de arco) saltados e atirados diferem um do outro no ponto de origem, assim como em
relação aos seus efeitos sonoros. (…) Assim sendo, em vez de os termos gerais indefinidos “spiccato” ou
“sautillé” usados até hoje, deveremos usar o termo inequívoco: golpes (de arco) saltados e atirados.”
Tradução livre do autor.
59
“responder”. Por outro lado, nos golpes de arco saltados, o arco apresenta um papel mais
ativo e o violinista apenas controla o movimento. Estes gestos são melhor compreendidos
a partir da velocidade que for exigida a ser executada. Por norma, num tempo lento, sendo
a velocidade do arco lenta, o violinista necessita “atirar” o arco, usando um gesto maior
do antebraço, enquanto num tempo mais rápido, em que a velocidade do arco se torna
mais rápida também, o violinista utiliza gestos mais pequenos, mais com a mão e pulso,
o arco acaba por “saltar” por ele próprio.
6.2.7. Golpes de arco saltados (sautillé)
Apesar das semelhanças com o spiccato, o sautillé, como já foi referido, é normalmente
executado em tempos mais rápidos e a sua mecânica muscular, comparativamente ao
spiccato é diferente, visto que o arco salta na corda, sem levantar e voltar a pousar em
cada nota como acontece no spiccato. Como refere Galamian, o “saltar” do arco acontece
graças à elasticidade do arco e da vara contudo, as zonas de execução deste golpe diferem
de arco para arco.
The task of jumping is left principally to the resiliency of the stick. This
bowing is best when played around the middle of the bow, somewaht lower
when i tis slower and louder, somewhat higher when i tis faster and softer.
The choice of place will differ with diferent bows owing to their dissimilar
conditions of elasticity. (Galamian, 1962, p.77)38
38 “A tarefa de saltar é deixada principalmente para a resiliência da vara. Este golpe de arco funciona melhor
quando tocado no meio do arco, um pouco mais baixo quando é mais lento e mais forte, um pouco mais
alto quando é mais rápido e mais piano. A escolha do lugar será diferente com diferentes arcos devido às
suas diferentes condições de elasticidade.” Tradução livre do autor.
60
Figura 23 - Sautillé: Exemplo musical da peça Moto Perpétuo, op. 11 para Violino
e Piano de N. Paganini (c. 1 a 4)
Fonte: Salles, 2006, p. 87
Mariana Salles afirma também que, de certa maneira, um sautillé mais lento corresponde
a um spiccato rápido e que, em termos de movimento, o sautillé, equipara-se a um détaché
em tempo rápido mas executado com moderada pressão na zona central do arco.
Entrando, em pormenor, usando um détaché em que baixamos completamente o peso do
contacto do indicador na vara, contrabalançando com a pressão do mindinho ou do dedo
anelar, podemos alcançar o sautillé. Portanto, o sautillé acaba por ser fruto de um gesto
horizontal que, através da elasticidade do arco, dá origem a um efeito “saltado”
espontâneo.
Galamian também realça bastante o elo entre o sautillé e o détaché, explicitando que um
ajuda à prática do outro. “To practice the sautillé, start with a small and fairly fast detaché
near the middle of the bow, then turn the stick perpendicurarly above the hair so that all
of the hair contacts the string.” (Galamian, 1962, p.77)39
Associado ao sautillé, podemos encontrar ainda o ricochet, saltati e arpejos em ricochet,
que têm em comum o facto de serem todos golpes de arco que abrangem mais do que
uma nota por arco.
O richochet, tal como o sautillé, surge também através da elasticidade da vara mas parte
de um impulso dado na primeira nota, “atirando” o arco para a corda e colocando-o a
saltar num movimento “descontrolado” que engloba várias notas numa só arcada.
39 “Para praticar o sautillé, comece com um detaché pequeno e bastante rápido perto do meio do arco,
depois vire a vara perpendicularmente acima das cerdas para que todas cerdas entrem em contacto com a
corda.” Tradução livre do autor.
61
Figura 24 - Ricochet: Exemplo musical do 2º and. da Sonata “Kreutzer” de
Beethoven (c. 82 a 83)
Fonte: Salles, 2006, p. 97
A velocidade deste golpe é gerida consoante a zona do arco que se utilize e depende da
altura para a qual é preparado o impulso. Se for realizado mais no sentido da ponta o gesto
torna-se mais rápido, enquanto que, na zona do meio perde velocidade. Em relação à
questão do impulso para o salto que é controlado pela resistência oferecida pelo dedo
indicador, quando o arco embate na corda, se o salto for mais alto, o ricochet torna-se
mais lento, se for mais baixo, é mais rápido.
Para além de termos de “calcular” bem o tipo de impulso para o salto e a respetiva
velocidade que queremos atribuir ao golpe de arco, também é importante saber adequar
estes dois fatores ao número de notas que temos de executar num só golpe portanto, a
quantidade de arco a utilizar está dependente da quantidade de notas que haja para tocar
em cada situação específica.
Apesar de este golpe de arco poder ser executado tanto para baixo como para cima, é
assumidamente mais simples para baixo e até mais aconselhável para quem inicia a sua
aprendizagem. Acima de tudo, no ricochet há que procurar que o arco salte
espontaneamente e não querer fazer com que ele salte através do esforço do violinista.
Seguido do ricochet, dentro da categoria dos golpes de arco saltados, surge o saltati, ou
jetée como Mariana Salles menciona. Este golpe de arco baseia-se num conjunto de notas
em ricochet numa só arcada, normalmente executada para baixo. O grande desafio para
o seu domínio passa pelo controlo da coordenação dos saltos do arco para as várias cordas
com a digitação da mão esquerda. O seu movimento parte com o arco na vertical e vai
inclinando até ao fim do golpe, no sentido do cavalete.
62
Figura 25 - Saltati: Exemplo musical da peça Travessura, op. 5 para Violino Solo
de S. Salles (c. 32)
Fonte: Salles, 2006, p.97
Por último, nesta categoria podemos encontrar também os arpejos em ricochet, também
conhecidos por springing arpeggios, em que Flesch define como: “Springing arpeggios
is the name we usually give to broken chords which, covering a range of from two to four
strings, are each played with a springing bow stroke.” (Flesch, 1928, p.76)40 O facto de
existir mudança de corda em cada nota executada dentro deste golpe de arco, torna a
realização dos saltos entre as notas mais graves para as mais agudas muito mais facilitado.
Utilizando a menor amplitude de arco possível, o gesto de mudança de corda deve ser
meramente mecanizado pela articulação do ombro, mantendo o braço e o pulso com uma
ação mais passiva.
De maneira geral, os arpejos em ricochet devem ser executados em andamento rápido e
a acentuação do tempo forte vem sempre na arcada para baixo, na nota mais grave do
arpejo.
Figura 26 - Arpejos em Ricochet: Exemplo musical da peça Cascata de M. Salles
(c. 9 a 2)
Fonte: Salles, 2004, p.98
40 “Arpejos em ricochet é o nome que costumamos dar aos acordes quebrados que, cobrindo um intervalo
de duas a quatro cordas, são tocados com um toque de arco saltitante.” Tradução livre do autor.
63
Nesta mesma linha, Mariana Salles destaca também o ricochet e arpejos controlados,
usados como recurso interpretativo. Surgem em secções em que o ricochet e os arpejos
em ricochet “naturais” apresentam algumas irregularidades de tempo, alargando o
princípio ou parte final das figuras rítmicas envolventes e, pouco a pouco, o tempo antes
praticado volta a ser recuperado. Basicamente, funciona como um ponto de transição para
“cantar” o início de uma nova frase e depois voltar a lançá-la progressivamente até ao
andamento anteriormente executado. Portanto, em comparação com o ricochet e arpejos
em ricochet “naturais”, são executados em tempos mais lentos, solicitando um maior
domínio do “saltar” do arco para cada nota.
A sua representação gráfica é feita através de pontos e ligaduras por baixo das notas.
Figura 27 - Ricochet e Arpejos Controlados: Exemplo musical do 1º and. do
Concerto para Violino, op.64 de Mendelssohn (c. 34 a 36 da cadência)
Fonte: Salles, 2004, p.99
6.2.8. Golpes de arco atirados (Spiccato)
Apesar de estarem enquadrados na mesma categoria, os golpes de arco saltados e golpes
de arco atirados apresentam diferentes formas de fazer saltar o arco, o que os torna algo
diferentes. Em relação aos golpes de arco atirados, Flesch sublinha que
These are far more numerous than the bouncing strokes, above all for the
reason that the latter can basically only occur in the middle, where the bow
can jump itselfm while the former can be produced in almost any part of the
bow. This, of course, presupposes the necessary technical ability. (Flesch,
1928, p.57)41
41 “Estes são muito mais numerosos do que os movimentos saltitantes, acima de tudo, pelo facto de que
estes últimos só podem ocorrer, basicamente, no meio do arco onde possa saltar sozinho. Enquanto o
primeiro pode ser produzido em quase qualquer parte do arco. Isto, obviamente, pressupõe a capacidade
técnica necessária.” Tradução livre do autor.
64
Portanto, nos golpes de arco saltados, comparativamente com os golpes de arco atirados,
há uma consciência mais acentuada por parte do violinista quando este introduz o arco na
corda e depois o retira, controlando assim todo o gesto que o arco desenha para fazer
saltar o arco, ao contrário dos golpes de arco atirados, em que o arco acaba por saltar
sozinho.
É precisamente no spiccato, um dos principais golpes de arco saltados, que resulta o
processo anteriormente referido. O arco inicia fora da corda, entra em contato com ela e
determina o fim de cada nota quando o arco volta a sair da corda. Este percurso do arco
é comparado a um semicírculo, especialmente pela combinação de movimentos
horizontal e vertical que são utilizados na prática deste golpe de arco. Como explica
Galamian, o uso de mais ou menos horizontalidade ou verticalidade no gesto, vai definir
o caráter do spiccato.
If the horizontal componente is emphasized more than the vertical one, then
the arc will be flatter: (desenho). In this case, the tone will have more
substance and will be rounder, softer, more vowel-like. If the vertical
componente is more prominente, the arc is narrower and deeper: (desenho)
and consequently the tone is sharper, more accented, and percussive.
(Galamian, 1962, p.75)42
A nível de amplitude, segundo Galamian, o spiccato pode atingir uma enorme
diversidade, desde muito curto a muito largo; “It is used mainly in the lower two-thirds;
when broad and slow, more towards the lower part; when fast and short, more towards to
the middle or even slightly above the middle.” (Galamian, 1962, p.75)43
Para além do spiccato mais usual que é executado por norma entre o meio do arco e o
talão, Mariana Salles aponta outros tipos de spiccato desenvolvidos a partir de diferentes
combinações do uso dos movimentos vertical e horizontal do arco e também executados
em outras zonas do arco como: spiccato cantabile, spiccato percussivo, spiccato duro e o
collé.
42 “Se a componente horizontal for mais enfatizada que a vertical, o arco será mais achatado. Neste caso, o
som terá mais substância, será mais redondo, mais suave e mais parecido com a vogal. Se o componente
vertical é mais proeminente, o arco é mais estreito e mais profundo e, consequentemente, o som é mais
nítido, mais acentuado e percussivo.” Tradução livre do autor. 43 “É usado principalmente nos dois terços inferiores do arco. Quando largo e lento deve ser executado mais
para a parte inferior do arco; quando rápido e curto, deve ser executado mais para o meio ou mesmo
ligeiramente acima do meio do arco.” Tradução livre do autor.
65
O spiccato cantabile, é um tipo de spiccato com uma variante mais horizontal que vertical
em que o arco se conserva mais “colado” à corda. O termo cantabile, surge associado a
um vibrato delicado que é atribuído a cada nota, caraterizando o tipo de som produzido.
No que toca à sua execução, num tempo mais lento, o spiccato cantabile é produzido na
metade inferior do arco e à medida que se torna mais rápido, aproxima-se mais da zona
do meio do arco.
Figura 28 - Spiccato Cantabile: Exemplo musical da Ciaconna da 2ª Partita para
Violino Solo de Bach (c.169 a 170)
Fonte: Salles, 2004, p. 80
Contrariamente ao spiccato cantabile, o spiccato percussivo, baseia-se claramente na
verticalidade e a sua execução é feita na ponta do arco. Trata-se de um golpe de arco
especialmente associado a peças virtuosísticas, surgindo em secções em que cria uma
alternância com pizzicatos de mão esquerda.
Figura 29 - Spiccato Percursivo: Exemplo musical da 9ª variação do 24º Capricho
de Paganini (c. 109 a 111)
Fonte: Salles, 2004, p.82
Já o spiccato duro, tradicional do brasil, apresenta-se com uma variante vertical um pouco
mais pronunciada que o spiccato “normal”, mas com tendência para uma maior
quantidade de arco usada, justificando também uma variante bastante horizontal. A
junção acentuada destas duas variantes faz com que o arco salte excessivamente,
provocando uma sensação de descontrolo. O facto de também ser tocado perto do talão,
torna a sua produção sonora um pouco “rústica” e “ríspida”, daí spiccato “duro”.
66
Figura 30 - Spiccato "duro": Exemplo musical da Dança Miudinho da 4ª Bachiana
Brasileira para Violino Solo de H.Villa-Lobos (c.1 a 8)
Fonte: Salles, 2004, p.83
Por último, o collé, classificado como um intermédio entre a “elegância” do spiccato e o
“caráter resoluto e penetrante” do martelé segundo Galamian, tocado na parte inferior do
arco, é um golpe de arco que, tal como o spiccato, começa “fora da corda” e quando entra
em contato com esta, dá-se um acento muito semelhante ao praticado no martelé.
Galamian, em termos práticos, compara este acento com um pizzicato, pelas caraterísticas
do acento se assimilarem a um puxão da corda através do dedo. Comparativamente ao
próprio martelé, como já foi referido anteriormente, o collé é um golpe de arco mais eficaz
em passagens de andamentos mais rápidos, sendo mais aconselhável o seu uso em prol
do martelé.
Figura 31 - Collé: Exemplo musical do 2º and. da Sonata “Kreutzer” de Beethoven
(c. 42 a 44)
Fonte: Salles, 2004, p. 85
Voltando aos golpes de arco mencionados por Flesch, na categoria de golpes de arco
atirados, surge ainda referenciado o staccato volante (já explicado anteriormente),
staccato sur place e os arpejos atirados.
O staccato sur place é um golpe de arco que realça cada nota envolvida, repetindo o
mesmo movimento curto para cima ou para baixo sempre na mesma zona do arco, não
gastando qualquer quantidade do mesmo, tal como explica Flesch;
67
I use this somewhat strange-sounding expression to designate a succession of
rather slow “thrown” bowings, produced with one bow-stroke, by the wrist,
in such a way that arm or hand return tonelessly to the point of departure
after each note; hence, to all appearences, there is no expenditure of bow at
all. (Flesch, 1928, p.78)44
Figura 32 - Stacato sur place: Exemplo musical do 7º estudo de R. Kreutzer para
Violino Solo
Fonte: Flesch, 1928, p.128
Como afirma Flesch, os arpejos atirados são um golpe de arco que surge como alternativa
de execução mais lenta em relação aos arpejos em ricochet. “The thrown arpeggios, too,
owe their existance solely to the need of a comparatively slow tempo.” (Flesch, 1928,
p.78)45
Figura 33 - Arpejos Atirados: Exemplo musical do 1º Capricho para Violino Solo
de Paganini (c. 1 e 2)
Fonte: Flesch, 1928, p.59
44 “Uso esta expressão algo estranha para designar uma sucessão de arcadas “atiradas” e relativamente
lentas, produzidas com um golpe de arco, pelo pulso, de tal maneira que o braço ou a mão regressam
silenciosamente ao ponto de partida depois de cada nota; assim sendo, no que diz respeito às aparências,
não ocorre qualquer gasto de arco”. Tradução livre do autor. 45 “Os arpejos atirardos são necessários devido à existência de um ritmo comparativamente lento.”
Tradução livre do autor
68
6.2.9. Golpes de Arco Mistos
Por fim, a última categoria de golpes de arco definida por Flesch, compreende em si os
golpes de arco mistos que, como o próprio conceito subentende, abrange todos os géneros
de golpes de arco existentes conciliados entre si.” The number of possible combinations
of the bowings wich we have discussed so far is limitless, the best-known listening or
selection of 4000 variants is contained in the school of bowing technique by Ševčík.”
(Flesch, 1928, p.59)46
Outra grande referência onde podemos encontrar todo o tipo de golpes de arco e arcadas
com variadas acentuações, é no estudo número dois de Kreutzer, que partindo do modelo
do primeiro compasso, vão-se desenvolvendo todo o tipo de abordagens, tornando cada
exercício mais desafiante que o anterior.
46 “O número de combinações possíveis de golpes de arco que discutimos até agora é ilimitado. A seleção
mais conhecida é de 4000 variantes e está contida na Escola de técnica de arco de Sevcik.” Tradução livre
do autor.
69
Figura 34 - Variadas articulações e golpes de arco para exercitar o 2º estudo de
Kreutzer
Fonte: Kreutzer, 1913, p.4
70
7. Metodologia de Investigação
7.1. Problemática e Justificação do Tema
Para amadurecer e solidificar a técnica de arco da mão direita e também a da mão esquerda
não basta aprender a mecânica dos seus gestos e praticá-los isoladamente. É necessário
também aplicá-los e exercitá-los em escalas, arpejos, estudos, etc., para poder, de facto,
interiorizar e automatizar todos os movimentos técnicos para que então possamos entrar
no campo do repertório violinístico mais desenvolvido como concertos, sonatas e outras
peças e também no repertório camerístico e sinfónico.
Em todo este vasto repertório, podemos encontrar todo o tipo de abordagens técnicas
desafiantes, desde passagens em escalas, arpejos, mudanças de posição, cordas dobradas,
trilos, harmónicos, pizzicato de mão esquerda e os mais variados golpes de arco.
Grandes violinistas e pedagogos ativos entre os finais do século XVIII até à 2ª metade do
século XX (já anteriormente referidos) como Pierre Gaviniès (1728-1800), Rodolphe
Kreutzer (1766-1831), Pierre Rode (1774-1830), Niccoló Paganini (1782-1840), Heinrich
Kayser (1815-1888), Henryk Wieniawski (1831-1880), Franz Wohlfahrt (1833-1884),
Henry Schradieck (1846-1918), Leopold Auer (1845-1930), Otakar Ševčik (1852-1934),
Carl Flesch (1873-1944), Ivan Galamian (1903-1981), entre tantos outros, foram
determinantes na produção de obras e estudos que ajudaram muitos violinistas a
desenvolver e aperfeiçoar grande parte da base técnica.
Nomes como Kreutzer, Kayser, Wohlfahrt, Schradieck ou Ševčik tiveram uma particular
ação ao focarem-se mais num aspeto singular de cada vez, isto é, cada estudo ou exercício
por eles delineado apresentava um determinado aspeto técnico e repetia-o durante todo o
fragmento de maneira a poder consolidá-lo através do mesmo padrão repetitivo. Ou seja,
todo o estudo podia estar direcionado para um golpe de arco específico como por
exemplo, ser todo ele escrito em staccato ou spiccato, exercitando mais a mão direita, ou
então ser baseado só em trilos ou mudanças de posição para desenvolver a mão esquerda.
Por outro lado, obras como os “Vinte e quatro estudos para violino” de Gaviniès (1794),
“Vinte e quatro caprichos para violino solo” de Paganini (1818), “Dez estudos-caprichos
da Escola Moderna opus 10” de Wieniawsky (1854), elevaram a prática da técnica
violinística para um nível acima, conjugando com um lado musical mais desenvolvido a
71
nível de interpretação. Ainda que vistos como “estudos técnicos”, estas obras são
consideradas já como parte do repertório virtuoso, sendo mesmo escolhidas para serem
executadas em recitais ou até concursos.
Posteriormente, e complementando as obras já referidas, outros violinistas e pedagogos
criaram também métodos que, a partir da introdução de variados exemplos do repertório
violinístico, desenvolveram mecanismos e exercícios para o aperfeiçoamento técnico de
determinadas secções.
O livro A Violinist’s Book do violinista e pedagogo Joseph Szigeti, aponta algumas
observações em relação à técnica e interpretação e lança algumas dicas de como exercitar
certas passagens de inúmeras obras violinísticas. Leopold Auer, violinista, pedagogo e
compositor já anteriormente referido, através da sua coletânea de 8 livros - Graded
Course of Violin Playing - apresenta uma abordagem detalhada dos aspetos mais técnicos
como golpes de arco, cordas dobradas, harmónicos, trilos, que surgem nos concertos,
sonatas e outras peças violinísticas de vários compositores. Também Simon Fischer,
violinista e pedagogo australiano, através do seu livro Practice, sugere duzentos e
cinquenta modos de estudo para trabalhar a técnica violinística, através das mais
conhecidas obras de literatura escrita para violino, onde cada exemplo é demonstrado e
explicado com os respetivos exercícios.
Apesar de todas estas preciosas fontes e ferramentas de estudo estarem disponíveis para
a prática violinística, é de realçar a ausência do uso de excertos de orquestra para o
desenvolvimento da mesma.
Ai-Wei Chang, que frequentou doutoramento na vertente “Doctor of Musical Arts, na
Univerdidade do Norte do Texas, refere na sua dissertação - Utilizing Standard Violin
Orchestral Excerpts as a pedagogical tool: An Analytical Study Guide With Functional
Exercises - que apenas nos últimos 50 anos é que os excertos de orquestra começaram a
ser utilizados como um recurso pedagógico.
Uma das primeiras obras de referência no que toca à introdução de excertos orquestrais
no estudo violinístico, mencionada por Ai-Wei Chang, trata-se de Using Orchestral
Excerpts as Study Material for Violin, datada de 1966, por James E. Smith, violinista e
professor americano. A partir de uma seleção de alguns dos excertos orquestrais mais
solicitados para provas de admissão orquestra, James E. Smith destaca em cada um deles
72
o aspeto técnico a ser trabalhado e classifica cada excerto com um determinado patamar
de exigência consoante a sua dificuldade.
Na mesma linha, William Starr - violinista e pedagogo americano - cria Twenty-Six
Composers Teach the Violinist de 1980, onde vários fragmentos musicais de peças a solo,
música de câmara ou mesmo repertório sinfónico vêm complementar o papel de trabalho
mais técnico, realizado nas escalas e estudos. Das vinte seis peças que se apresentam neste
livro, apenas seis são excertos orquestrais.
Já em 1995, Robert Baldwin – Director of Orchestral Activities at the University of Utah
and conductor of the Salt Lake Symphony – lança um interessante artigo, com o nome
Orchestral Excerpts as Etudes, em que lança a proposta de aliar excertos de orquestra
como ferramenta pedagógica, ao trabalho técnico já utilizado pelos professores, como
escalas e estudos, durante as aulas semanais. A ideia é, não só construir a técnica pelo
processo tradicional em que as escalas e os estudos funcionam como rampa para o restante
repertório violinístico, mas sim também complementá-la com o estudo de excertos
orquestrais que, para além de ajudar a progredir técnica e musicalmente, ao mesmo tempo
permitirá dar conhecer e introduzir os alunos no campo do repertório sinfónico.
Susan C. Brown - violinista, violetista e maestrina americana - desenvolve em 2004 o
método String Player´s Guide to the Orchestra, onde recorre também a excertos de
orquestra, usufruindo dos seus elementos rítmicos e de toda a variedade de arcadas que
percorrem cada excerto, convertendo estes dois elementos em exercícios de escalas. Não
havendo uma intenção necessariamente ligada à vertente musical, o objetivo destes
exercícios destina-se prioritariamente à prática do estudo de golpes de arco e respetivas
articulações, através de escalas adaptadas a partir das linhas melódicas dos excertos. O
único contra visível é que, para além de não haver uma preocupação musical em relação
a estes exercícios, também não há qualquer referência de tempo, zona do arco ou
dedilhações. Fica tudo isto ao critério do professor, inclusive o estilo de execução a ser
adotado, consoante o compositor em questão.
73
7.2. Excertos de Orquestra como Ferramenta Pedagógica
Partindo das obras de alguns autores, os excertos de orquestra podem funcionar como um
auxiliar pedagógico no que toca à prática e desenvolvimento de um instrumentista. Para
além de apresentarem todo o tipo de elementos e desafios técnicos como golpes de arco,
variadas articulações, mudanças de posição, entre outros, há também uma enorme
diversidade musical a ser explorada através do estilo implícito no excerto em questão, no
domínio dinâmico, tipo de vibrato, fraseado, etc.. Exercitando todo este tipo de
pormenores e sabendo gerir este tipo de trabalho dentro do estudo, como afirma Ai-Wei
Chang, os excertos poderão servir como uma preciosa ferramenta com vista a uma boa
progressão técnica e musical. “Therefore, incorporating orchestral excerpts into daily
practice will help students cultivate advanced musical ideas and will strengthen violin
technique with this comprehensive method” (Chang, 2014, p.9)47.
De seguida, será feita uma seleção de excertos de orquestra onde irei partilhar a minha
ideia de trabalho relativamente a como se podem exercitar os vários aspetos técnicos e
musicais de cada excerto, com especial ênfase à mecânica dos golpes de arco.
Em meu entender, apesar de o estudo/prática de excertos de orquestra poder não ser uma
estratégia indispensável para o aperfeiçoamento dos golpes de arco, considero que, tendo
em conta a diversidade de desafios técnicos e o tipo de trabalho que se pode realizar com
este tipo de repertório, os excertos de orquestra poderão constituir uma excelente
estratégia para que os golpes de arco possam ser exercitados e aperfeiçoados, ainda que
de forma indireta.
Os excertos em estudo foram selecionados com base nas escolhas mais frequentes,
exigidas por júris de orquestra, para audições de orquestras profissionais ou para
orquestras jovens internacionais, e tendo em conta a diversidade de estilos e interpretação
musical, variedade de golpes de arco, articulações e outros elementos técnicos em
questão. Como fonte de trabalho irei também utilizar alguma informação retirada dos
vídeos realizados por Nathan Cole: Online Classical Violin School with Nathan Cole,
relativamente a excertos de orquestra, de como o próprio os executa e partilhando
47 “Portanto, incorporar excertos orquestrais na prática diária ajudará os alunos a cultivar ideias musicais
avançadas e fortalecerá a técnica do violino com este método abrangente.” Tradução livre do autor.
74
preciosos conselhos acerca de como podem ser exercitadas as passagens mais desafiantes
e delicadas.
Serão então analisados o 4º andamento da 39ª Sinfonia de W. A. Mozart, Scherzo do
Sonho de uma Uma Noite de Verão de F. Mendelssohn, Don Juan de R. Strauss, 3º
andamento da 4ª Sinfonia de J. Brahms (partes de 1ºviolino), e o Adágio da 9ª Sinfonia
de A. Bruckner (parte de 2º violino).
Para esta análise serão apresentados exercícios selecionados através da minha reflexão
pessoal, a partir do excerto original.
Considero importante apontar que durante a descrição dos exercícios dos excertos de
orquestra, irei utilizar termos violinísticos como: “começar da corda”, “a partir da corda”,
“soar mais à corda” e “a sair da corda”. Os termos “começar da corda” ou “partir da
corda”, significam que o arco inicia o seu movimento a partir do contacto com a corda.
Relativamente ao termo “soar mais à corda”, é quando é necessário que o arco em vez de
saltar em demasia, possa saltar igualmente, mas estando mais próximo da corda
resultando num meio termo entre essas duas situações. Por outro lado, o termo “sair da
corda”, corresponde à situação em que o arco não deve estar totalmente em contacto na
corda, mas sim fora dela, saltando.
Por último, a todos os exercícios doravante apresentados para cada excerto, cada golpe
de arco será representado, a título exemplificativo, pela seguinte legenda: D – Detaché;
L – Legatto; St – Staccato; Sp – Spiccato.
75
Figura 35 - Excerto n.º 1: 4º andamento da 39ª Sinfonia de W. A. Mozart, c. 1 - 40
Fonte: Arquivo pessoal do autor, a partir de cópias disponibilizadas por diversas
orquestras de jovens e profissionais; parte de 1º violino.
Uma vez que se trata de um tipo de música muito associado à ópera e ao teatro e, neste
caso, dentro de uma temática festiva e de divertimento, deve atender-se desde logo ao
tipo de caráter que se quer transmitir. Dentro deste ambiente pode pensar-se num tipo de
som mais leve e “vivo”, utilizando um tipo de spiccato mais horizontal, onde o arco se
mantém mais perto da corda, não saltando demasiado.
Como exercício para se conseguir obter este spiccato, inicialmente pode começar-se por
praticar a primeira frase do excerto (início até ao compasso 8) em detaché e, aliviando
pouco a pouco a aderência na corda e soltando mais o pulso, o arco acabará por saltar
espontaneamente (ver Figura 36).
76
Figura 36 - Exercício em detaché da introdução (c. 1 a 4)
Contudo, é importante manter o arco perto da corda, ou seja, não deve haver uma intenção
para que o arco salte, mas sim libertar o detaché e dar espaço ao arco para saltar.
Nesta primeira frase é muito importante a coordenação entre a mão esquerda e o arco.
Para além das várias mudanças de corda, temos também alternância de articulações com
notas separadas em spiccato e em legato.
Foi referido anteriormente por vários autores e violinistas que as duas mãos, inicialmente,
se devem exercitar separadamente. Portanto, não só a introdução, mas também ou
opcionalmente todo o excerto, pode ser trabalhado em cordas soltas.
Para começar, podem exercitar-se apenas as articulações e golpes de arco numa só corda
solta à escolha. De seguida, o mesmo exercício nas várias cordas em que o arco vai tocar
normalmente com a música, sem usar os dedos mão esquerda (ver Figura 37). Isto criará
uma independência entre as duas mãos e permitirá à mão direita funcionar em “piloto-
automático” para depois nos podermos concentrar no texto musical a partir da mão
esquerda.
Figura 37- Exercício de articulações e golpes de arco nas respetivas cordas soltas
(c. 1 e 2)
Do compasso 9 com anacruza até ao compasso 15 volta a repetir-se o mesmo tema inicial,
mas com uma resolução diferente para a própria secção, onde a grande diferença se
destaca pela dinâmica e intensidade do caráter. Desta segunda vez em que o tema repete
temos uma dinâmica assumidamente forte, ao contrário do piano do princípio em que, em
termos de mão direita, o arco deve ser tocado quase à corda e usar um pouco mais de
quantidade de arco para conseguirmos atingir uma maior intensidade no som,
77
contrastando com a leveza da introdução. Para resolver esta questão do domínio do
contraste de dinâmicas, Nathan Cole recomenda começar por se trabalhar primeiro a
secção em forte, com o arco a começar “da corda” e mantendo-se perto dela. Para a parte
inicial em piano, este autor aponta que simplesmente se deve utilizar um pouco menos de
arco e automaticamente encontraremos a dinâmica ideal para o piano da introdução.
Outro aspeto importante a apontar em toda esta secção antes referida é o perigo de haver
tendência para se acelarar nos compassos 2, 4, 10, 12, na transição da semínima pontuada
para as semicolcheias. Para evitar a precipitação, pode ajudar não tentar ligar as duas
figuras com o arco mas sim haver uma respiração entre elas, ou seja, parar um pouco o
arco antes de executarmos as semicolcheias. Um bom exercício para resolver este
obstáculo, juntamente com o auxílio do metrónomo, passa por subdividir a semínima com
ponto em 3 colcheias, e praticá-las primeiro em arcos separados (ver Figura 38).
Conseguindo interiorizar a subdivisão, voltamos de novo à semínima pontuada, não
esquecendo sempre a pequena respiração antes das semicolcheias que poderá contribuir
para uma maior precisão na estabilidade do tempo.
Figura 38 - Exercício de subdivisão incorporando os respetivos golpes de arco
(c. 1 a 4)
Seguindo para o compasso 16, volta a surgir cruzamento de cordas com articulações de
notas ligadas e separadas onde é necessária uma excelente coordenação entre a mão
esquerda e a mão direita. O facto da linha melódica se apresentar em arpejo obriga a ter
reflexos maiores entre as duas mãos, aumentando a dificuldade.
Desde logo, para facilitar o trabalho de arco, este não deve usar uma grande amplitude
entre a mudança de cada corda porque isso só iria dificultar mais ainda. É essencial manter
o arco sempre com o ponto de contacto o mais próximo possível entre duas cordas para
que a mudança seja assim facilitada. O pulso deve ter uma ação mais ativa que o antebraço
para simplificar o gesto.
A nível de articulações, há um cruzamento de cordas em legato nas duas primeiras notas
e o resto das notas em spiccato, sendo que, para um bom legato pode ajudar gastar um
78
pouco mais de arco, utilizando mais antebraço e não esquecendo o bom ponto de contato
entre as duas cordas. Depois, para o spicatto, deve ser o pulso a dar o impulso para as
mudanças de corda das notas que se seguem. Mais uma vez, não deve haver uma intenção
de fazer o arco saltar, mas sim soltar o pulso e, através do seu impulso e tocando numa
zona do arco favorável - podendo a zona entre o talão e o meio ser uma das mais
aconselháveis - o arco saltará espontâneamente.
Para exercitar esta passagem, não só a nível de golpe de arco e articulações, mas também
para fortalecer a agilidade da mão esquerda e assim se atingir uma boa coordenação entre
as duas, sugiro exercícios de ritmos, em especial em “galope” ou “galope ao contrário” e
com a figura de colcheia e três tercinas de semicolcheia e ao contrário (ver Figuras 39 a
42).
Figura 39 - Exercícios em galope, alternados em legato/detaché e legato/spiccato (c.
16 a 19)
Figura 40 - Exercícios em galopes inversos, alternados em legato/detaché e
legato/spiccato (c. 16 a 19)
Figura 41 - Exercícios em colcheia/tercina de semicolcheia, alternados em
legato/detaché e legato/spiccato (c. 16 a 19)
79
Figura 42 - Exercícios em tercina de semicolcheia/colcheia, alternados em
legato/detaché e legato/spiccato (c. 16 a 19)
Outro bom exercício que pode contribuir para uma boa coordenação das duas mãos é o
das deslocações, em que o tempo forte é marcado na segunda, na terceira ou na quarta
semicolcheia alternadamente, para que todas as notas atinjam a mesma clareza. A nível
de trabalho de golpes de arco, para a execução dos exercícios dos ritmos, pode aplicar-se
uma alternação entre legato/détaché e depois legato/spiccato (dentro da mesma figura)
durante os ritmos mencionados anteriormente. Para o exercício das deslocações pode
executar-se um compasso em détaché e o mesmo repetido em spiccato, sendo que o
acento deve ser sempre tocado em staccato para realçar a deslocação (ver Figuras 43 a
45).
Figura 43 - Excercíos de deslocação no segundo tempo alternandos em
detaché/staccato (c. 16 a 19)
Figura 44 - Excercíos de deslocação no terceiro tempo alternandos em
detaché/staccato (c. 16 a 19)
Figura 45 - Excercíos de deslocação no quarto tempo alternandos em
detaché/staccato (c. 16 a 19)
C.16
80
Nos compassos 20, 28, 30, 32 e 34 há um cruzamento de cordas repetitivo que pode, por
vezes, atrapalhar ou prender um pouco o pulso ou mesmo o antebraço pelo gesto em si.
Segundo Nathan Cole, deve pensar-se a primeira mudança da corda Ré para a corda Lá
com o braço e entre a corda Lá e Mi ser o pulso a atuar, de maneira a haver um equilíbrio
muscular distribuído e evitar tensão neste movimento.
Para contrariar e favorecer a sua liberdade e porque, caso contrário, esse bloqueio também
pode afetar o som, muitos violinistas recorrem ao fraseio musical, através de crescendos
neste caso em específico que, embora não estando indicados, faz sentido no que toca ao
desenrolar da frase. As duas primeiras semicolcheias começam com pouco arco e vai-se
começando a usar mais quantidade consoante o crescendo, favorecendo um gesto mais
livre e contribuindo para um adequado discurso musical. À medida que este motivo se
vai repetindo, a intensidade vai aumentando, criando um crescendo progressivo até ao
final da frase. O crescendo deste motivo irá criar uma “ponte” para uma escala
descendente que se repetirá também nos compassos 21, 29, 31, 33, 35 e 37.
Esse mesmo crescendo atinge o seu clímax na primeira nota das escalas descendentes que
são executadas em spiccato. Por uma questão de controlo após o crescendo, as duas/três
primeiras notas das escalas descendentes devem ser executadas mais à corda para
estabilizar o início da escala, acabando depois o arco por saltar nas notas restantes.
A transição para as escalas, pode estudar-se lentamente o compasso anterior com o
crescendo e parar um pouco antes da escala para dar um tempo de preparação. Depois,
tocar lentamente as duas/três primeiras notas em détaché e as outras em spiccato.
Seguidamente, tocar tudo seguido do compasso anterior até às notas de détaché e fazer a
pausa antes do spiccato (ver Figura 46), e partir de fora da corda o resto da escala. À
medida que se forem encurtando estas pausas, a passagem ficará mecanizada, mais
respirável e soará mais clara.
Figura 46 - Exercício de suspensão e preparação de transição (c. 28 a 31)
81
Outro aspeto que também pode ser trabalhado é afinação, especialmente em sítios em que
há uma rápida mudança de cordas como, por exemplo, passagens de arpejos nos
compassos 16, 18, 22, 23. Um dos melhores exercícios é, sem dúvida, estudar em cordas
dobradas, ou seja, ir juntado calmamente as notas que se vão seguindo umas às outras, e
ouvir bem os intervalos em détaché (ver Figura 47). Pode também posteriormente
trabalhar-se com diferentes ritmos para ganhar velocidade. Estes mesmos exercícios
podem também ser exercitados nos compassos 20, 30, 32, 34.
Figura 47 - Exercício de afinação em cordas dobradas e em detaché (c. 16 a 19)
Depois de ter tudo isto bem trabalhado, é crucial estudar com metrónomo, começando
por um tempo mais lento e ir aumentando pouco a pouco até se atingir o tempo pretendido,
por forma a que o tempo e ritmo se enquadrem bem um com o outro, de forma estável e
regular.
82
Figura 48 - Excerto n.º 2: Scherzo - Sonho de uma Noite de Verão de F.
Mendelssohn, c. 17 a 99
Fonte: Arquivo pessoal do autor, a partir de cópias disponibilizadas por diversas
orquestras de jovens e profissionais; parte de 1º violino.
O excerto do Scherzo da obra Sonho de uma Noite de Verão é um excerto que tem algumas
parecenças com o excerto de Mozart, pela sua vivacidade e por apresentar alguns
elementos clássicos. Mas o seu caráter é mais de fantasia e dançante, daí esta obra se fazer
acompanhar muitas vezes por bailados.
83
Voltamos a abordar o spiccato, neste caso um pouco mais curto, fluído e algo “agitado”
e algumas intervenções de staccato por intermédio de alguns acentos e sforzandos.
Para iniciar este excerto de orquestra, segundo Nathan Cole, a primeira colcheia deve
começar “da corda” e, nas semicolcheias seguintes, o arco, vindo do ar da colcheia
anterior, acaba por saltar comandado por um gesto horizontal do antebraço sendo que,
durante a execução das semicolcheias o arco salta mas mantém-se sempre muito junto à
corda.
Como o mesmo antes também afirma, um dos grandes problemas deste excerto é a
tendência para apressar e, logo desde início, é muito importante começar-se com uma boa
pulsação e sentido rítmicos. Claramente, também é muito importante dominar a forma
como iniciámos o spiccato e como o aplicamos no fraseado.
Alguns exercícios que podem ajudar a ganhar eficácia e estabilidade para este início
passam por trabalhar, em primeiro, o golpe de arco em cordas soltas com a subdivisão de
cada compasso ou seja, seis semicolcheias e também com o ritmo original (ver Figuras
49 e 50). Procurar um spiccato leve, bem articulado e regular, com um impulso do
antebraço e pulso e dedos de mão direita suficientemente flexíveis para permitirem a
liberdade do gesto.
Figura 49 - Exercício de subdivisão e controlo e definição do spiccato nas
respetivas cordas soltas (c. 1 a 4)
Figura 50 - Exercício de definição do spiccato nas respetivas cordas soltas (c. 1 a 4)
De seguida, voltando ao texto original, experimentamos tocar a primeira colcheia seguida
de uma pequena pausa antes de atacarmos as semicolcheias, para criarmos uma espécie
de respiração, para evitar precipitação (ver Figura 51). Pouco a pouco vai-se encurtando
a pausa até atingirmos o timing desejado.
84
Figura 51 - Exercício de suspensão e preparação de transição (c. 1 a 4)
Nathan Cole refere também que para o sucesso desta introdução é necessário criar uma
rotina, ou seja, praticar a entrada deste primeiro compasso várias vezes para que depois
num momento de prova seja algo natural. Também aponta que, em orquestra é o maestro
que mostra a anacruza ou a respiração antes de se iniciar esta obra e aí temos de ir com
ele. Mas, tocando este excerto de orquestra isoladamente, podemos ser nós a criar a nossa
própria respiração e entrada dando um outro conforto de sermos nós a decidir quando e
como começamos.
Uma outra dica que me parece também poder ajudar para o fraseio e estabilidade rítmica
nesta introdução é pensar musicalmente de dois em dois compassos, e não pensar
compasso a compasso, lançando a frase, e permitindo uma fluência natural do fraseado e
do spiccato.
Os compassos 24 e 28, por apresentarem características de anacruza, às vezes, podem
soar apressados por haver uma intenção de se querer direcionar demasiado a frase, o que
cria alguma instabilidade na pulsação. Portanto, algo que pode ajudar é pensar numa
pequena respiração entre a primeira semicolcheia e o resto da figura para dar algum
espaço e estabilidade à passagem.
Para dificultar ainda mais a questão do controlo do spiccato, surgem duas secções que
vão aliar mudanças de posição e cruzamento de cordas. Nos compassos 41 ao 54 é
necessário, inicialmente, escolher uma boa dedilhação que evite ter demasiadas mudanças
de posição, para facilitar a sua execução.
Para se conseguir solidificar bem a dedilhação juntamente com o spiccato e as várias
mudanças de corda, sugiro começar a praticar-se lentamente a passagem e primeiro em
legato ou seja, as semicolcheias de cada compasso ligadas num arco, para dar tempo à
mão esquerda de mecanizar bem a dedilhação e para a mão direita se ir adaptando aos
85
vários cruzamentos de corda e de seguida experimentar em détaché, já com as
semicolcheias separadas como está o original (ver Figuras 52 e 53)
Figura 52 - Exercício de legato para a coordenação entre as duas mãos (c. 41 a 44)
Figura 53 - Exercício de détaché para a coordenação entre as duas mãos
(c. 41 a 44)
Dentro da prática em détaché, para fortalecer ainda mais a coordenação entre as duas
mãos, pode exercitar-se a passagem com ritmos, por exemplo colcheia pontuada
semicolcheia e ao contrário, colcheia duas semicolcheias e ao contrário e com deslocações
(ver Figuras 54 a 62), tal como no excerto de Mozart. Quando já bem dominado em
détaché, começa-se então a introduzir o spiccato, utilizando também os mesmos ritmos e
deslocações.
Figura 54 - Exercício em galope com colcheia em détaché (c. 48 a 51)
Figura 55 - Exercício em colcheia com galope em détaché (c. 48 a 51)
86
Figura 56 - Exercício em colcheia com duas semicolcheias em détaché (c. 48 a 51)
Figura 57 - Exercício em duas semicolcheias com colcheia em détaché (c. 48 a 51)
Figura 58 - Exercício com deslocação na 2ª semicolcheia em détaché/staccato (c. 48
a 51)
Figura 59 - Exercício com deslocação na 3ª semicolcheia em détaché/staccato (c. 48
a 51)
Figura 60 - Exercício com deslocação na 4ª semicolcheia em détaché/staccato (c. 48
a 51)
Figura 61 - Exercício com deslocação na 5ª semicolcheia em détaché/staccato (c. 48
a 51)
Figura 62 - Exercício com deslocação na 6ª semicolcheia em détaché/staccato (c. 48
a 51)
87
A outra secção igualmente exigente, também do género desta anteriormente referida, está
presente do compasso 71 (com anacruza) até ao compasso 99.
O grande destaque que diferencia esta parte em relação às outras passagens de spiccato,
é o facto de ser em pianíssimo, o que tem influência na cor do som, num tipo de spiccato
mais curto, adequado ao caráter da dinâmica, e num ponto de contato do arco mais
próximo da escala.
Apesar do tipo de spiccato se iniciar mais curto, à medida que a passagem se vai
desenvolvendo surgem outros elementos dinâmicos (crescendo/diminuendo) do
compasso 77 para o 78 e do 85 para o 86, em que a quantidade de arco no spiccato
aumenta e volta a diminuir e a própria aderência na corda também, de maneira a expressar
esses elementos.
Algo também exigente nesta secção é, claramente, o cruzamento de cordas nos compassos
75, 76, 83, 84, 87, 88, 91 e 92, em que acontecem mudanças de corda de três em três
semicolcheias. Há o risco de o som não sair com clareza, de algumas notas se ouvirem
menos que outras, do spiccato não soar regular entre a mudança das cordas e de,
consequentemente, a própria afinação poder sair prejudicada.
Um princípio muito importante é o pulso assumir o controlo das mudanças de corda e não
haver grande atividade no antebraço, favorecendo um gesto mais curto e simples.
Estudar com ritmos e deslocações em détaché é muito importante também para ajudar na
coordenação; e como as mudanças são feitas de três em três semicolcheias, sugiro que se
exercite com ritmos de “galope mais colcheia” e ao inverso, colcheia-duas semicolcheias
e ao inverso, tal como nos últimos exercícios apontados, e com síncopas (semicolcheia,
colcheia, semicolcheia), conforme indicado na Figura 63.
Figura 63 - Exercício em síncopas em detaché (c. 76 a 79)
Para ajudar com a afinação nesta mesma passagem, aconselho trabalhar calmamente com
cordas dobradas em détaché, especialmente as notas que fazem a transição entre as duas
cordas, escutando bem os intervalos (ver Figura 64).
88
Figura 64 - Exercício de afinação e ligação entre as cordas (c. 87)
A nível de staccato, temos dois exemplos com diferentes articulações que são destacados
por acentos nos compassos 22, 23, 29, 31, 74 e 82, e por sforzandos nos compassos 63,
65, 67. Auditivamente soam parecidos, mas é importante destacar a diferença. Os acentos
devem ser mais pronunciados com a acção do indicador no arco, como uma espécie de
“mordente” em que o arco tem mais aderência na corda por um curto espaço de tempo,
enquanto que os sforzandos se produzem mais através de uma velocidade de arco
momentânea, executada pelo antebraço e utilizando também um pouco mais de
quantidade de arco em relação aos acentos.
Por último, para se conseguir expressar com mais rigor o estilo e o caráter deste excerto,
é crucial respeitar muito bem as dinâmicas e todo o tipo de fraseado delineado pelo
compositor, o qual enriquece ainda mais esta obra.
89
Figura 65 - Excerto n.º 3: 3º andamento da 4ª Sinfonia de J. Brahms, c. 1 - 44
Fonte: Arquivo pessoal do autor, a partir de cópias disponibilizadas por diversas
orquestras de jovens e profissionais; parte de 1º violino.
O excerto do terceiro andamento da 4ª sinfonia de J. Brahms trata-se de um Scherzo, com
caraterísticas assumidamente românticas e que, apesar de a nível sonoro se mostrar um
andamento imponente logo na introdução, Brahms apontou como Allegro Giocoso, ou
seja, algo “brincalhão”. Nathan Cole afirma que a introdução do andamento, leva-nos a
assumir “an accent in every beat, no charm, no character”48, ou seja, cada tempo é
sublinhado por um acento mas quando surgem os pontos de articulação por cima de
algumas notas, que é o caso dos compassos 6, 7, 8 e 10, vê mais como spiccato de forma
a soar mais leve e fora da corda, “dots off the string to give lightness and character”49, do
48 “… um acento em cada tempo, sem elegância, sem carácter.” Tradução livre do autor. 49 “… pontos de articulação fora da corda para dar leveza e carácter.” Tradução livre do autor.
90
que em staccato e à corda, estando assim mais direcionado para o caráter giocoso que
Brahms escolheu para este andamento e para o próprio estilo de scherzo.
Este excerto apresenta muitas caraterísticas interessantes a serem trabalhadas, incluindo
diferentes golpes de arco, qualidade de som, cruzamento de cordas, domínio de
dinâmicas, gestão do arco e destreza da mão esquerda.
Logo na introdução, temos escrito um fortíssimo mas, segundo Nathan Cole, deve ser um
som mais generoso e cheio do que propriamente demasiado projetante e “rasgante”. No
seu vídeo, Cole executa uma distribuição inteligente e eficaz do arco nos quatro primeiros
compassos, dando um impulso em staccato na primeira nota do começo até ao meio do
arco, projetando o som da nota mais com velocidade do que propriamente com pressão
na corda. Faz também uma espécie de crescendo nas colcheias seguintes em legato com
um pequeno acento de articulação, para atingir as semínimas do segundo compasso com
mais intensidade, através dos acentos indicados e com mais quantidade de arco, para
mostrar a diferença entre as semínimas e as colcheias e de certa maneira o contraste entre
staccato e legato.
Embora estes compassos não apresentarem grande dificuldade técnica, podem ser
exercitados em cordas soltas para automatizar bem a gestão do arco e a velocidade a
utilizar, bem como o próprio som que se pretende produzir, pois é muito importante
assumir logo desde início uma entrada consciente do que se pretende deste excerto, desde
estilo, caráter e interpretação (ver Figura 66).
Figura 66 - Exercício em cordas soltas para a definição dos golpes de arco (c.1 a 4)
Nos compassos 6, 7, 8 e 10, conforme já tinha referido Nathan Cole, o tipo de articulação
indicado por cimas das notas remete a um spiccato mais leve, com o arco a sair da corda.
O golpe de arco desses compassos pode ser exercitado com ritmo de tercinas e síncopas
de um tempo em spiccato. Nesses mesmos compassos, incluindo o 9º, intercalam-se
cruzamentos de corda em legato, o que faz com que seja uma passagem que nem sempre
sai totalmente limpa aos executantes a nível de clareza das notas nas mudanças de corda
e da própria afinação devido à falta de precisão nas mudanças de posição.
91
Nesta passagem, algo que pode ajudar é não gastar demasiado arco pois não iria favorecer
nas mudanças de corda, que são algo rápidas. Assim, o ideal para haver uma boa ligação
entre as cordas, favorecendo um bom legato é, mais uma vez utilizar o pulso, com um
gesto mais pequeno e com um bom ponto de contacto do arco entre as duas cordas,
contribuindo para um cruzamento de cordas limpo.
A nível técnico, a passagem pode ser trabalhada utilizando ritmos como galopes e ao
inverso, misto de colcheias com semicolcheias, e com deslocações em détaché e depois
em legato - quatro a quatro como no original (ver Figuras 67 a 74). Em relação à afinação,
sugiro exercitarem-se os compassos 8 e 9 em cordas dobradas em détaché (ver Figura
75). Todos os exercícios referidos anteriormente podem ser aplicados em casos
semelhantes, como os dos compassos de 22 a 28.
Figura 67 - Exercício de galope (c. 8 e 9)
Figura 68 - Exercício de galope inverso (c. 8 e 9)
Figura 69 - Exercício de colcheias e semicolcheias (c. 8 e 9)
Figura 70 - Exercício de colcheias e semicolcheias (c. 8 e 9)
92
Figura 71 - Exercício de semicolcheias e colcheias (c. 8 e 9)
Figura 72 - Exercício de deslocação no 2º tempo (c. 8 e 9)
Figura 73 - Exercício de deslocação no 3º tempo (c. 8 e 9)
Figura 74 - Exercício de deslocação no 4º tempo (c. 8 e 9)
Figura 75 - Exercício de afinação em detaché (c. 8 e 9)
No compasso 29, apesar de ser o mesmo esquema de linha melódica como nos compassos
anteriormente referidos, a passagem surge sem ligadura. Querendo manter o mesmo
caráter de leveza, antes mencionado por Nathan Cole, nesta secção podemos pensar num
spiccato fluído perto da corda entre os compassos 29 e 31 e, a partir do compasso 32 a
93
35, o arco vai colando mais à corda para realçar o crescendo progressivo que nos leva ao
mesmo tema inicial.
Antes de trabalhar esta passagem do compasso 29 ao 31 com os mesmos ritmos,
deslocações e cordas dobradas, pode trabalhar-se o ritmo do arco em détaché em cordas
soltas, com pouco arco, mas nas cordas onde vão cair os respetivos dedos para mecanizar
bem o gesto da mão direita. Este mesmo processo pode repetir-se também para os
compassos 42 e 43.
Para trabalhar as várias mudanças de posição que se vão sucedendo do compasso 29 ao
31, pode realizar-se o exercício de nota de passagem com glissando em détaché a partir
da última semicolcheia, que antecede a passagem para a posição seguinte, automatizando
a distância e o espaço que a mão deve percorrer em bloco para chegar à posição pretendida
de forma eficaz e afinada (ver Figura 76).
Figura 76 - Exercício de mudança de posição em glissando em détaché (c. 29 a 31)
Uma observação importante a fazer em relação aos compassos 42 e 43, juntamente com
os compassos 19 e 26, destina-se à dedilhação da mão esquerda que pode ser facilitada
por meio de extensões trabalhadas em ritmos (ver Figura 77), para facilitar a transição da
mudança de posição. Esta técnica destina-se principalmente à manutenção do legato da
frase musical e para evitar saltos de posição desnecessários, sendo que é importante
manter a mão relaxada para facilitar abertura entre os dedos. No inicío, pode ser um pouco
doloroso e desconfortável para quem não está habituado ou tem dedos mais pequenos,
mas, exercitando lentamente com alguns ritmos em détaché, a mão e os próprios dedos
acabarão por se habituar, até que se torne natural. O processo da extensão funciona com
a permanência de um dos dedos na corda ainda na posição anterior à extensão, permitindo
ao dedo que realizará a extensão fazer a ponte para a nova posição pretendida,
“arrastando” consigo rápida e suavamente o resto da mão para o novo espaço posicional
da nova posição.
94
Figura 77 - Exercícios de extensão de 4º e 1º dedos em détaché (c. 42 e 43)
Um compasso que merece particularmente atenção no que toca à sua execução é o
compasso 19. É uma passagem propríca uma certa precipitação da sextina para a
semínima, devido à mudança súbita de dinâmica, ou então, um acento no início da sextina
o que faz com que se note um diminuendo demasiado cedo e não se sinta o piano súbito.
Uma sugestão, como Nathan Cole aponta, é não pensar em nenhum acento, mas sim,
entrar bem com o arco na corda, especialmente nas três primeiras notas da corda sol e,
com a velocidade do arco e o peso do braço, criar um forte generoso que vai relaxando
até ao final da sextina, fazendo a ponte para o piano.
Por último, mas não menos importante, é toda a secção que vai desde o compasso 29 ao
34 e também incluindo os compassos 41, 42 e 43, que pode inicialmente ser estudada em
legato e détaché lentamente e, à medida que for ficando mais dominado, alivia-se a
pressão, solta-se o pulso e o arco acabará por saltar num spiccato quase à corda (ver
Figura 78).
Figura 78 - Exercícios de golpes de arco (c. 32 a 34)
C.42
C.32
95
Figura 79 - Excerto n.º 4: Adagio do 3º andamento da 9ª Sinfonia de A. Bruckner
(c. 57 a 64)
Fonte: Arquivo pessoal do autor, a partir de cópias disponibilizadas por diversas
orquestras de jovens e profissionais; parte de 1º violino.
Tal como aponta Phillip Huscher: “The Adagio was the last movement Bruckner
completed, and it carries us very near the crisis of tonality from which Schoenberg
eventually would not retreat.”50 Daí pode retirar-se que, o excerto do Adágio da 9ª de
Bruckner é um excerto de orquestra especialmente complexo a nível harmónico, levando
a uma atenção muito focada na afinação. A par da afinação, também o timbre do som
pede bastante sensibilidade, focando-se em dinâmicas intermédias, e o próprio golpe de
arco em legato exige bastante mestria devido às constantes mudanças de corda durante
todo o excerto de orquestra. Um outro aspeto que podemos observar no vídeo de Nathan
Cole a executar este excerto de orquestra, relativamente ao som e fraseado, é o pequeno,
mas presente. vibrato que aplica em cada nota e que se vai adequando, em termos de
intensidade, ao tipo de direção musical que a frase toma e consoante as dinâmicas que se
apresentam.
Como foi referido, a afinação é um dos maiores desafios deste excerto de orquestra;
assim, é muito importante uma dedilhação que nos ofereça estabilidade e conforto para
50 “O Adagio foi o último andamento que Bruckner completou e leva-nos muito perto da crise de tonalidade
da qual Schoenberg, eventualmente, não recuaria.” Tradução livre do autor.
96
que possamos ter a liberdade de “cantar” e vibrar cada nota e deixarmos o arco fazer o
seu trabalho de condução da frase e do som.
Para o trabalho do arco, neste caso o legato, pode praticar-se primeiro só em cordas soltas,
nas respetivas cordas em que os dedos vão cair, fazendo sempre uma boa transição entre
cada mudança de corda para que soe o mais ligado possível (ver Figura 80). Para que isto
aconteça, é importante que não haja demasiada amplitude na mudança da posição do
antebraço entre as cordas, mas sim que o ângulo de mudança do arco seja mínimo, sendo
que o ponto de contacto do arco deve centrar-se devidamente entre as duas cordas para
que, simplesmente com o movimento do pulso, seja possível realizar-se a mudança de
forma limpa, quase imperceptível e sem acentos.
Figura 80 - Exercício de legato nas respetivas cordas soltas (c. 57)
O exercício seguinte, introduzindo agora as notas da mão esquerda, será a execução até
ao momento da mudança de corda, parando o arco antes dessa mudança (ver Figura 81).
Nessa pausa, a mão esquerda coloca-se já preparada na corda seguinte a ser executada,
juntamente com o arco que também muda de corda. A ideia é dar um espaço de tempo de
antecipação, quer da mão esquerda, quer da mão direita para que depois, no tempo final,
as duas mudanças sejam feitas automaticamente e de forma natural. Assim, não só o arco
deve ser exercitado em prol de um bom legato mas também a mão esquerda, que deve
mudar de corda sempre com um dedo de apoio na corda anterior que não levanta até o
dedo seguinte na nova corda, estar já posicionada. Para que haja um excelente legato das
duas partes, ambas devem estar perfeitamente sincronizadas.
Figura 81 - Exercício de suspensão e preparação de transição (c.57)
No âmbito da afinação, o mesmo exercício com pausa entre a transição de dedos de uma
corda para a outra pode ser utilizado, antecipando assim a sua colocação antes de serem
C.577
C.577
97
tocados. Por fim, tocando as duas cordas em simultâneo, podemos verificar se os vários
intervalos estão afinados (ver Figura 82).
Figura 82 - Exercício de afinação em détaché (c.57)
Outro aspeto a ter em conta é a gestão do arco. Esta deve ser pensada através da
velocidade do arco que se aplica e consoante o tempo e o fraseado que se escolhe no
desenrolar do excerto. Algo que por vezes pode acontecer, é algumas notas podem perder
legato e soarem um pouco portato por serem demasiado sublinhadas ou haver alguma
acentuação inconsciente. Daí a velocidade do arco ser importante para a fluência e
regularidade de um legato limpo, sem “distúrbios” no som. De maneira a poder
aperfeiçoar a transparência do legato e para que todas as notas alcancem o mesmo
balanço, pode exercitar-se o excerto com deslocações referidas atrás.
Ainda no que se refere à gestão do arco, é importante realçar as diferenças de dinâmicas
impostas no excerto, recorrendo também a mudanças de cores no som. Logo na
introdução, o arco entra na corda com alguma generosidade em mezzo forte, embalado
com alguma velocidade de arco. Já no terceiro compasso, aparece-nos um mezzo piano,
mostrando um outro motivo musical, onde a cor deve ser mudada em relação aos dois
primeiros compassos, através de um pequeno alívio do peso do arco e com o arco a
aproximar mais para a zona da escala/ponto, para realçar a diferença. Posteriormente, esse
mezzo piano vai-se desenvolvendo, progressivamente, num crescendo nos compassos
seguintes, voltando o arco a ser usado com mais quantidade e o som a ganhar mais corpo.
Até que, alcançando os agudos, vemos a frase voltar a diminuir à medida que a linha
melódica vai descendo, que o arco vai encurtando a nível de quantidade, mas mantendo
algum peso com aderência na corda para garantir um pianíssimo com alguma
“substância”, fechando assim a frase.
C.57
98
Figura 83 - Excerto n.º 5: Don Juan de R. Strauss, c. 1 - 62
Fonte: Arquivo pessoal do autor, a partir de cópias disponibilizadas por diversas
orquestras de jovens e profissionais; parte de 1º violino.
99
O excerto do Don Juan de R. Strauss é, segundo Nathan Cole: “Maybe the most important
excerpt in every list”,51 dos excertos mais requisitados, quer para orquestras de jovens,
quer para orquestras profissionais, talvez por exigir um pouco de tudo a quem o interpreta.
Aspetos técnicos como: pitch, rythm, character, quality of sound, controlling quiet
notes52, são alguns dos apontados por Nathan Cole que caracterizam o desafio deste
excerto. A nível de golpes de arco, pode afirmar-se que abrange também bastante
variedade (staccatto, détaché, legato e spiccato), o que obriga o executante a mostrar um
enorme domínio do arco nas várias vertentes.
Um dos primeiros pontos que salta à vista e deve prevalecer durante todo o excerto é, sem
dúvida, o caráter heróico e brilhante que tanto carateriza esta obra. Este caráter é
evidenciado logo desde o primeiro compasso com uma anacruza imponente que vai do
primeiro tempo do compasso até ao seu segundo. Como afirma Nathan Cole: “In the
begining the most important is not to get every single note out with expert quality but the
character.”53 Ou seja, neste início, o principal foco de atenção não deve recair sobre a
clareza de som, mas sim no seu caratér. Isto pode ser conseguido com alguma pressão do
arco na corda antes de se iniciar e, quando parte deve funcionar com um staccato tenso,
como que “mordendo” a corda. Idealmente, e também sugerido por Nathan Cole, pode
começar-se a passagem na parte superior do arco, sendo que as três primeiras
semicolcheias são geridas a nível do arco nesta mesma parte superior do arco. A partir da
quarta semicolcheia há uma espécie de impulso que lança o resto das semicolcheias num
crescendo até ao segundo tempo do primeiro compasso. Para obter o tipo de staccato
tenso que é pretendido para este primeiro compasso, pode exercitar-se em cordas soltas,
pensando em sentir bem o peso do braço sobre o arco que irá recair sobre o indicador que
faz a ligação do arco com a corda, obtendo assim o tipo de som mordente desejado para
este golpe de arco (ver Figura 84). O exercício das deslocações pode também ser benéfico
para esta passagem, de modo a se sentir que todas as notas são importantes e a haver um
maior equilíbrio no som (ver Figuras 85 a 88). Estes mesmos exercícios podem ser
repetidos para os compassos 37 e 50, onde as dificuldades são semelhantes às do primeiro
compasso.
51 “Talvez o excerto mais importante de todas as listas.” Tradução livre do autor. 52 “afinação, ritmo, carácter, qualidade de som e controlo das notas em piano” – Tradução livre do autor. 53 “No início, o mais importante não é tocar todas as notas com especial qualidade, mas sim, entender o
carácter.” Tradução livre do autor.
100
Figura 84 - Exercício de staccato em cordas soltas (c. 1)
Figura 85 - Exercício de deslocação na 1ª semicolcheia (c.1)
Figura 86 - Exercício de deslocação na 2ª semicolcheia (c. 1)
Figura 87 - Exercício de deslocação na 3ª semicolcheia (c.1)
Figura 88 - Exercício de deslocação na 4ª semicolcheia (c. 1)
Um aspeto muito importante a referir em relação aos compassos 2 a 5, associado ao
caráter do excerto e ao próprio fio condutor musical, é o facto de que, por vezes, quando
aparecem pausas e notas longas, por norma, há uma tendência para se cortar ou deixar o
som morrer devido à pausa. O mesmo acontece com as notas longas ou mesmo finais de
frase que não são devidamente valorizados. Relativamente a esse aspeto, Cole expressa
101
que para manter o espírito desta obra é determinante: “(…) sing throw without breaks,
singing quality (…)”.54 As pequenas pausas desempenham um papel meramente de
respiração, e não propriamente de silêncio e é importante valorizar as notas com elegância
e qualidade de som, dando uma ideia de constante continuidade, onde a frase flui sem
interrupções.
A única pequena exceção que se pode apontar em relação à ideia anterior acontece nos
compassos 7 e 8, onde é importante saber mostrar a diferença de valorização de figuras,
neste caso entre a semínima do compasso 7 e a colcheia com acento do compasso 8. A
colcheia deve ser claramente mais curta que a semínima, apesar do acento, e é importante
mostrar essa diferença. Em termos de golpe de arco, poderíamos pensar na semínima em
détaché e a colcheia em staccato para ajudar na distinção uma da outra.
Durante todo o excerto, muitas das passagens que o percorrem são em tercinas, todas com
diferentes articulações e golpes de arco. No compasso 6, as tercinas apresentam-se
originalmente numa longa ligadura em legato, mas Cole separa essa ligadura em dois
arcos por uma questão de maior liberdade e projeção no som, uma vez que as duas
primeiras tercinas são tocadas na corda Mi e as outras duas na corda Lá.
Para o legato sair bem definido e com um som “cheio”, é importante velocidade de arco
e o uso do mesmo em toda a sua extensão para cada arcada e pensar num crescendo no
final de cada terço do arco, para não perder som e manter o fortíssimo escrito. Uma vez
mais, pode ser trabalhado em cordas soltas para monitorizar o gesto. É também essencial
evitar um acento no início de cada arcada para manter a ideia da ligadura.
Em relação à mão esquerda, não só para esta passagem, mas também para todas as outras
em tercinas independentemente das suas articulações, pode trabalhar-se com diferentes
ritmos em détaché desde “galope com colcheia” e o inverso, síncopas, colcheia
semicolcheias e vice-versa, deslocações, paragens entre cada tercina e depois entre cada
dois grupos de tercinas (ver Figuras 89 a 95).
54 “(…) Cantar sem pausas, cantando qualidade (…)”. Tradução livre do autor.
102
Figura 89 - Exercício em de síncopas em détaché (c. 6)
Figura 90 - Exercício de galope com colcheias em détaché (c. 6)
Figura 91 - Exercício de colcheia com galope em détaché (c. 6)
Figura 92 - Exercício de semicolcheias com colcheia em détaché (c. 6)
Figura 93 - Exercício de colcheia com semicolcheias em détaché (c. 6)
Figura 94 - Exercício de suspensão preparatória de transição (c. 6)
C.6
103
Figura 95 - Exercício de suspensão preparatória de transição cada 2 tempos (c. 6)
Todos estes excercíos mencionados devem ser utilizados também para a passagem
semelhante dos compassos 32 a 35.
Nos compassos 23 a 26, segundo Nathan Cole, as tercinas devem permanecer à corda,
não como a introdução onde é usado um staccato mais cerrado, mas sim em détaché, não
sendo demasiado concentrado porque existe um crescendo no final dos compassos 24 e
26, o que obriga a gastar mais arco para abrir o som. Assim, para ainda haver margem
para crescer nesses compassos, não é necessário começar demasiado forte desde início,
mas pensar mais no caráter e na direção da frase.
Já nos compassos 32 a 37, surge uma das secções mais desafiantes do excerto. Inicia-se
com tercinas ligadas tempo a tempo, em legato, que passam a separadas, em détaché, no
compasso 34 e nos últimos dois tempos do compasso 35 subdividem-se em
semicolcheias, culminando num arpejo no registo agudo.
A chave para o sucesso nestes compassos passa por uma pulsação rítmica estável, sabendo
frasear e sublinhar algumas notas para poder controlar um pouco melhor toda esta secção.
As primeiras tercinas ligadas funcionam simplesmente com o impulso natural da
velocidade do arco em cada arcada, de preferência sem mudanças de corda para
simplificar o legato. De seguida, nas tercinas separadas em détaché, é determinante não
usar muito arco para facilitar as mudanças de corda e, muito importante, saber direcionar
sempre os vários arpejos até à nota aguda de cada grupo – sublinhando-a -, dando uma
impressão de respiração para iniciar o arpejo seguinte. Este pensamento poderá dar a
sensação de que a passagem não é tão rápida e que, acima de tudo, está controlada. Nas
semicolcheias finais, como a subdivisão fica mais rápida, pode pensar-se cada grupo de
quatro notas isoladamente, utilizar o crescendo indicado para gastar mais arco e,
novamente, sentir que a passagem fica mais lenta e segura até ao fim da frase.
104
Como foi referido anteriormente, este tipo de passagens em tercinas pode ser trabalhado
com ritmos e deslocações para que tanto a mão esquerda como a direita fiquem bem
sólidas e funcionem coordenamente, mas, acima de tudo, devem ser exercitadas
lentamente para dar tempo à mente e mecânica do corpo para absorverem todos os gestos.
Também se deve estudar com pausas entre cada tempo inicialmente e, depois com pausas
entre grupos de figuras para exercitar os reflexos de saltos e mudanças de posição
(especialmente nos compassos 35 e 36) ou mesmo de mudanças de corda.
Para esta passagem dos compassos 35 e 36, que apresenta um salto da quarta posição para
a nona posição em arpejo, há sempre o perigo das últimas três notas saírem algo
desafinadas; pelo que, Nathan Cole recomenda começar pela nota mais aguda e estudar
no sentido inverso. Primeiro só as duas últimas notas, para procurar encontrar o tipo de
som que queremos - limpo, intenso e brilhante - e depois de bem trabalhado, acrescentar
a antepenúltima nota e exercitar essas mesmas três notas lentamente e com ritmos,
tomando consciência da velocidade do arco e da aderência na corda que queremos instituir
(ver Figuras 96 e 97). De seguida, trabalhar a passagem do salto de posição na última
figura desse compasso com alguns glissandi lentos e notas de passagem e alguns ritmos
e, à medida que se for ganhando velocidade, utilizar a pausa antes do salto para dar tempo
à mão de perceber o espaço que tem que percorrer e ir encurtando essa pausa até ficar
automático (ver Figuras 98 e 99).
Figura 96 - Exercícios de ritmo para a precisão e afinação das últimas duas notas
na transição do c. 35 para 36
Figura 97 - Exercícios de ritmo para a precisão e afinação das últimas três notas na
transição do c. 35 para 36
105
Figura 98 - Exercícios de mudança de posição com glissando e nota de passagem (c.
35)
Figura 99 - Exercício de suspensão preparatória de transição reduzida
gradualmente (c.35)
Por último, a outra passagem final também em tercinas e igualmente exigente, acontece
do compasso 52 a 62. Trata-se de uma secção delicada em spiccato e pianíssimo e no
registo agudo.
Nathan Cole realça a importância de sabermos escolher o sítio certo do arco, um sítio
onde possamos saltar, dentro da dinâmica e caráter pretendidos. É precisamente por aí
que se deve começar por exercitar esta passagem, procurando a zona certa do arco e
experimentando só tercinas em spiccato e cordas soltas (ver Figura 100). Posteriormente,
podemos praticar o spiccato introduzindo agora a mão esquerda, usando cada nota numa
figura de três tercinas de maneira a irmos juntando e trabalhando lentamente a junção e
coordenação das duas mãos (ver Figura 101). Os exercícios de notas de passagem,
glissandis e de paragem antes da mudança de posição, juntamente com alguns ritmos,
como já foram apontados noutros exemplos anteriores, são cruciais para a segurança,
velocidade e destreza da mão esquerda.
106
Figura 100 - Exercício de spiccato nas respetivas cordas soltas (c. 52 a 59)
Figura 101 - Exercício de spiccato repetindo cada nota num grupo de tercinas (c.
52)
Outras duas secções a considerar, com variados golpes de arco, articulações e
acentuações, são os compassos 9 a 16 e 20 e 21, que se tornam exigentes também em
contexto da afinação por passarem por um registo bem agudo em que os espaços entre os
dedos da mão esquerda se tornam mais reduzidos.
Em termos de golpes de arco, é crucial conseguir diferenciar os legatos dos staccatos a
partir das articulações e padrões rítmicos impostos pelo compositor. Sempre que surgem
galopes com ligadura devem soar legato, mas quando temos a figura de colcheia com
pausa de semicolcheia e semicolcheia, que soa bastante parecido com a figura anterior, aí
deve haver uma interrupção no som devido à pausa e à semicolcheia seguinte, que é
enfatizada com um acento pelo compositor - deve soar em staccato, criando o contraste
com o galope normal. Em relação à gestão do arco, à exceção dos pequenos momentos
de staccato, todas as figuras longas e galopes devem ser tocadas com todo o arco, muito
cantabile e expressivo. Todo o ritmo e os respetivos golpes de arco podem ser trabalhados
em cordas soltas para automatizar bem a mão direita e dar espaço para o foco na mão
esquerda (ver Figura 102).
107
Figura 102 - Exercício de cordas soltas nas respetivas cordas e com os respetivos
golpes de arco
Em relação à mão esquerda, é importante escolher uma dedilhação eficaz que não
comprometa a afinação. Sendo que há várias opções e a escolha é algo muito pessoal, é
determinante que seja feito um trabalho muito lento e repetitivo de mudanças de posição
com notas de passagem para dar tempo ao ouvido de escutar e interiorizar bem o intervalo
em si e para garantir um salto de posição confiante, à medida que se for subindo o tempo
até alcançar o pretendido.
Uma observação importante por parte de Nathan Cole também para este excerto em
especial, mas que pode servir para todos os outros, é o facto de ser fundamental sabermos
aquilo que está a acontecer à nossa volta enquanto tocamos o excerto, isto é, como se
estivessemos nesse preciso momento a tocar no meio da orquestra e a captar tudo aquilo
que os outros instrumentos tocam. Neste excerto específico em que há muitas pausas para
contar, conseguir imaginar o que estão os outros instrumentos a tocar na obra pode ser
benéfico para o executante entrar após as pausas com mais confiança e a não perder o
caráter da obra que tem vindo a ser desenvolvido.
Por exemplo no compasso 17, onde são repetidas sextinas durante quatro compassos,
pode ser mais fácil entrar na anacruza do compasso 21 se conseguirmos ouvir
interiormente a parte importante da orquestra nesse momento, uma vez que, para nós,
esses compassos não passam de um acompanhamento. No compasso 9, antes dessa
entrada, há uma anacruza dada por outro instrumento que, se a imaginarmos, funciona
como um impulso para se iniciar com uma atitude confiante. Também na secção dos
compassos 40 a 49 onde, tradicionalmente, se toma mais tempo e o caráter relaxa um
pouco é igualmente essencial saber o que acontece antes ou depois para poder
complementar a frase a tempo e no sítio certo.
108
Como se pode constatar, o estudo de excertos de orquestra abrange uma enorme variedade
de aspetos técnicos, musicais e estilísticos, que “obrigam” a um tipo de abordagem
cuidadosa e detalhada no que toca à execução de cada excerto em particular. Se for
executado, por exemplo, o mesmo golpe de arco em excertos diferentes, podemos
entender que acabará por ser tocado de forma distinta devido ao estilo ou compositor que
é abordado. Assim, não só são trabalhados os vários golpes de arco, como também são
enquadrados à imagem de cada compositor conforme a tradição que lhe é atribuída na sua
interpretação. Há, claramente, uma aproximação ao repertório sinfónico, mas também
uma introdução à forma de interpretar cada compositor, seja a respeito de tipo de som,
fraseado, caráter, uso e gestão do arco, seja em termos rítmicos ou articulações, seja em
golpes de arco. Estes aspetos poderão servir como um complemento para o
amadurecimento e motivação na aprendizagem violinística.
8. Análise de Resultados
8.1. Entrevistas
Para acrescentar e enriquecer esta investigação, foram feitas entrevistas a seis
instrumentistas de orquestra, nacionais e estrangeiros, com alguma experiência a
leccionar, e a seis professores de violino dentro do panorama nacional.
As entrevistas decorreram sob minha orientação pessoal, permitindo total liberdade de
justificação e desenvolvimento de opinião relativamente às questões impostas aos
entrevistados, dando espaço ainda a algumas observações pedagógicas e técnicas
relacionadas com o tema em debate.
Os primeiros seis entrevistados são três músicos portugueses de orquestras nacionais e
três músicos estrangeiros de orquestras internacionais:
109
Tabela 5 - Violinistas entrevistados
Nome Escola Contexto Profissional
Erik Heide
Entrevista- 18/5/2018
• Aluno de Milan Vitek e Tim
Frederiksen na Royal Danish Academy
of Music (Copenhaga-Dinamarca).
• 14 anos de experiência como instrumentista
de orquestra e 12 como docente.
• Concertino na Copenhagen Philarmonic e na
Danish National Chamber Orchestra.
Concertino Convidado na Orquestra
Gulbenkian e Hamburg Staatsoper. Professor
de Música de Câmara na Royal Danish
Academy of Music (Copenhaga).
Evandra Gonçalves
Entrevista- 2/6/2018
• Aluna de Alberto Gaio Lima na
Artave, de Zofia Woycicka na ESMAE,
de Gerardo Ribeiro na Northwestern
University (Chicago-EUA) e de Robert
Lipsett na University of Southern
California (Los Angeles-EUA).
• 17 anos de experiência como instrumentista
de orquestra e 16 anos como docente.
• 1º violino Tutti na Orquestra Sinfónica do
Porto Casa da Música
James Dahlgren
Entrevista- 31/3/2018
• Aluno de Zaven Melikian no
Conservatório de São Francisco (EUA).
• 30 anos de experiência como instrumentista
de orquestra e anos como docente
• Concertino na Real Filarmonia de Galícia e
professor na Sun Valley Summer Symphony
(EUA) e Escuela de Altos Estudios Musicales
em Santiago de Compostela (Espanha)
Jorge Teixeira
Entrevista- 22/5/2018
• Aluno de Leonor Prado EAMCN e de
Tibor Varga Academie Superior des
Archets de Sion (Suiça).
• 27 anos de experiência como instrumentista
de orquestra e 30 anos como docente.
• Segundo Violino Tutti na Orquestra
Gulbenkian e professor na Escola de Música
Nossa Senhora do Cabo
110
Luíz Filipe Coelho
Entrevista- 22/2/2018
• Aluno de Elisa Fukuda na Escola
Fukuda de São Paulo (Brasil), de Ulf
Wallin na Hochschule Für Musik Hanns
Eisler (Berlim-Alemanha), de Zakhar
Bron no College of Music Pitea (Pitea-
Suécia) e de Guy Braunstein na
Universität der Künste Berlin (Berlim-
Alemanha).
• 6 anos de experiência como instrumentista de
orquestra.
• Primeiro Violino Tutti na Berliner
Philarmoniker.
Paula Carneiro
Entrevista- 18/6/2018
• Aluna de Aníbal Lima na Academia
Nacional Superior de Orquestra
• 7 anos de experiência como instrumentista de
orquestra
• Chefe de Naipe dos 2ºs violinos na Orquestra
Sinfónica Portuguesa
Fonte: Elaboração do autor
As questões lançadas a estes primeiros entrevistados foram pensadas em prol de uma
visão violinística enquanto instrumentistas de orquestra, tendo em conta o seu percurso e
sobre como avaliam a questão golpes de arco/excertos de orquestra:
• Quais os golpes de arco mais importantes na base técnica de um violinista?
• Quais os exercícios ou estratégias mais indicadas para exercitar esses golpes de arco
em especial?
• Que benefícios pode trazer o estudo de excertos de orquestra para a prática e
desenvolvimento dos diferentes golpes de arco?
• Poderá a prática de excertos de orquestra levar o intérprete a um tipo de estudo mais
rigoroso e pormenorizado destes mesmos golpes de arco quando inseridos noutro
repertório?
• Enquanto membro do júri numa audição de orquestra, considera a clareza e
regularidade da execução dos golpes de arco como um dos principais pontos de
avaliação e crítica numa performance em prova?
111
• Antecipar a aprendizagem dos golpes de arco (e a respectiva consciencialização por
parte do aluno), posteriormente contextualizada na abordagem aos excertos de
orquestra, pode favorecer o sucesso da performance numa audição de orquestra?
• A par dos métodos, estudos, caprichos e peças virtuosas, poderiam os excertos
orquestrais ser acrescentados na base do trabalho técnico da aprendizagem do arco e
dos respectivos golpes de arco? Poderia trazer benefícios? E porquê?
• Considera que seria importante introduzir excertos de orquestra na aula individual de
violino ou mesmo como uma disciplina no próprio plano curricular?
• A qualidade de um arco pode fazer a diferença no aperfeiçoamento dos golpes de arco?
Golpes de arco mais importantes da base técnica violinística
De uma forma geral, entre estes seis entrevistados foram referindo vários os golpes de
arco como sendo os mais importantes, mas os que mais coincidiram entre si foram o
détaché e o legato. Na opinião de Evandra Gonçalves, não existe concretamente uma
hierarquia em termos de importância relativamente aos golpes de arco mas, enquanto
professora, acredita ser fundamental desenvolver, controlar e compreender o détaché
antes de introduzir outros conceitos e técnicas de arco, uma vez que os movimentos e
sensações de contacto no détaché servem de ponto de partida para outros golpes de arco
como por exemplo, o spiccato. Destaca também o legato como um dos primeiros passos
a serem trabalhado na aprendizagem de forma a que os movimentos de mudança de
direção, sem alterar articulação (e consequentemente o fraseado), se tornem o mais
naturais possível.
Erik Heide e Luiz Coelho destacam a importância do bom contacto do arco na corda e
das mudanças de arco suaves sem acentos involuntários que possam atrapalhar a frase.
Por seu turno James Dahlgren, Paula Carneiro e Jorge Teixeira apontam outros golpes de
arco também importantes para a base violinística como son filé, staccato e spiccato. James
acrescenta ainda o ricochet, jeté, collé, explicando que todos eles são igualmente
necessários para um uso adequado e flexível do arco e que, no seu entender, a escola
112
Franco-Belga é a grande referência para a maioria dos violinistas de hoje porque fornece
uma excelente estrutura no que toca ao domínio do arco para todos os propósitos.
Exercícios/Estratégias para o exercício dos golpes de arco mencionados
As respostas oferecidas pelos entrevistados englobam variados exercícios, métodos e
filosofias de trabalho no que toca ao estudo e prática dos golpes de arco.
Em primeiro lugar, algo bastante interessante e a ter em conta é a parte mental, que é
abordada por Erik Heide e Luiz Coelho.
Erik Heide realça a importância de haver sempre uma razão para o que se está a estudar
e, acima de tudo, como se está a estudar ou seja, estar disponível e focado para saber em
que sítio temos ou devemos ter o arco, saber usá-lo lentamente durante o estudo, estar
disponível para aperfeiçoar as mudanças de corda e controlar bem a distância entre as
cordas. Para ele, estudar escalas, pode ser uma preciosa ajuda, aplicando todos estes
pensamentos e conceitos.
Também Luiz Coelho acrescenta que se deve “separar” os dois lados do cérebro, isolando
os movimentos da mão direita dos da esquerda, ou seja, começando primeiro por exercitar
apenas a mão direita através de cordas soltas, controlando o movimento do braço direito
como se fosse um compasso (de geometria).
Falando de exercícios mais práticos, relativamente ao détaché, Evandra Gonçalves
considera essencial trabalhar o movimento repetitivo de mudança de direcção, não apenas
no meio do arco, mas também na ponta e talão, bem como nas diferentes cordas
(associando o movimento horizontal com o vertical). Relativamente ao spiccato, Evandra
afirma ter adoptado um processo gradual em que este parte sempre do movimento de
détaché, através de uma relação inversamente proporcional entre a quantidade de arco e
velocidade. Tal como acontece com outros golpes de arco, incorpora escalas, exercícios
de mecânica de mão esquerda ou mesmo estudos específicos para golpes de arco (Kayser,
Mazas, Kreutzer, Rode, Ševčík, Gerle) para os exercitar.
113
Quanto ao son filé, Jorge Teixeira salienta que o movimento do braço deve ser mínimo e
deve adaptar-se à pega do arco de forma fixa, mas descontraída, e o som deve manter-se
sustentado e com qualidade.
Partindo do son filé, segundo o Jorge Teixeira, o détaché acaba por ser executado da
mesma forma mas com mais velocidade de arco e, como ele próprio explicou, o
movimento do braço em cada arcada (para baixo) deverá sujeitar-se a três fases: 1 - ao
talão, o braço deve ser utilizado como um bloco inteiro até bem antes do meio; 2 - a partir
dessa zona do arco, a articulação do cotovelo deverá ser ativada no sentido de só o
antebraço se mover até a um palmo da ponta; 3 - ao chegar a este local do arco o pulso
deverá estar fletido (como que a empurrar) e o braço deverá estar praticamente estendido.
Quando a arcada vai para cima, o processo repete-se, mas pela ordem inversa. Um
exercício passado ao Jorge Teixeira pelo seu professor Tibor Varga, para uma
interiorização separada dos movimentos deste golpe de arco, passa pela execução de uma
síncopa (num andamento lento) e, de seguida os mesmos movimentos ligados entre si por
uma semibreve.
Ao nível do spiccato, Jorge Teixeira determina dois caminhos para o aprender e o
exercitar: partindo de um détaché rápido no meio dor arco, aliviando progressivamente o
peso do mesmo e, também, a partir de um jeté inicialmente lento e vertical, que vai
aumentando a velocidade e diminuindo a altura, também de forma progressiva. Como
estudo, acrescenta que podem repetir-se estes mesmos exercícios segurando o arco ao
contrário pegando na ponta.
Na opinião de James Dahlgren, os métodos de Ševčík opus 2 e 3 poderão ser ideais como
exercícios introdutórios, seguidos de uma série de métodos de vários autores como
Mazas-Kreutzer-Rode-Dont-Paganini 24 Caprices, tal como mencionou Evandra
Gonçalves, que James Dahlgren considera oferecerem a maior parte da variedade técnica
que encontramos na vida profissional diária.
Para Paula Carneiro, todo o método com que estudou com o professor Aníbal Lima, foi
para ela o que o mais a ajudou a melhorar e a evoluir através da técnica de arco e, como
trabalhar todos os dias para a sua vida profissional. Desde exercícios com uma borracha,
elástico, lápis, cordas soltas, ritmos e deslocações, que foram desenvolvidos num livro
feito pelo próprio professor Aníbal Lima.
114
Benefícios do estudo de excertos de orquestra para a prática e desenvolvimento dos
variados golpes de arco
James Dahlgren e Erik Heide partilham da opinião de que os excertos não devem ser
estudados demasiado cedo, uma vez que podem mesmo prejudicar a técnica se esta ainda
não estiver bem desenvolvida e criar alguns complexos em relação a certos aspetos em
que não se seja tão bem-sucedido. Erik Heide prefere dar concertos aos seus alunos até
desenvolver uma técnica mais sólida, antes de os fazer enfrentar pela primeira vez
excertos de orquestra como a 39ª Sinfonia de Mozart ou Don Juan de Strauss. Contudo,
considera que podem começar-se a trabalhar certos excertos menos exigentes, como por
exemplo de sinfonias iniciais de Haydn e Mozart, como primeira abordagem.
Quanto a James Dahlgren, considera que os excertos de orquestra são um excelente ponto
de partida para começar a compreender a razão pela qual é tão importante ser possuidor
de uma completa técnica de arco porque, pela sua experiência, tocar em orquestra exige
um alto nível de domínio do arco, o que, consequentemente, no seu ponto de vista, faz
dos excertos de orquestra o trabalho mais exigente que podemos “enfrentar” no estudo do
violino.
Evandra Gonçalves, apesar de apresentar a mesma linha de pensamento de que numa
primeira abordagem aos diferentes golpes de arco talvez prefira outro tipo de
exercícios/repertório, defende que numa fase mais avançada, usufruir de um grupo de
excertos selecionados para abranger diferentes golpes de arco, pode ser uma forma
“rentável” de estudar. Considerando a pulsação um dos pontos mais difíceis de controlar
na execução de determinados golpes de arco, em particular no spiccato e, tendo em conta
que essa estabilidade é um ponto crucial na preparação de excertos, Evandra Gonçalves
então, acredita que se o objetivo de estudo passar por exercitar um golpe de arco, este
pode ser realizado recorrendo a excertos de orquestra.
Para Jorge Teixeira podem haver benefícios com o estudo de excertos de orquestra, por
estes funcionarem como simuladores que preparam individualmente o aluno para o
conjunto, tornando os seus objetivos pedagógicos bem claros, motivando-o e
antecipando-lhe assim a ideia de uma futura carreira profissional. Contudo, a sua prática
pode não ser suficiente por si só para aperfeiçoar os golpes de arco se não houver uma
115
prática regular de orquestra, visto que esta prática engloba uma sincronização de
dedilhações e arcadas que se apresentam como desafios permanentes e imperativos.
Na opinião de Luiz Coelho, o músico deve ser completo, portanto, todo o tipo de
repertório, incluindo excertos de orquestra, está relacionado com a técnica do violino.
Como músico de orquestra, destaca a importância de excertos de orquestra pois trata-se
de uma forma mais delicada de tocar e, apresenta um conceito de som diferente que se
deve desenvolver, recorrendo a gestos mais pequenos. Nesta linha de pensamento, para
Luiz Coelho é importante haver uma atenção constante a todos os movimentos, pois todos
eles se refletem diretamente no som e, se esse cuidado não for tido em conta, corremos o
risco de estar a prejudicar a técnica violinística.
Também Paula Carneiro considera que o melhor benefício é não haver um limite para a
evolução na técnica de arco e conseguir perceber como trabalhar e melhorar. Afirma
também que um excerto orquestral é bastante completo a todos os níveis, mas a nível de
arco, há bastantes técnicas a serem aplicadas muito rapidamente e é uma boa forma de o
aluno aprender a mudança rápida de, por exemplo, um détaché para um spicatto.
Influências da prática de excertos de orquestra noutro tipo de repertório, enquanto
estudo de golpes de arco
Todos os entrevistados assumiram que o estudo de golpes de arco dentro da prática de
excertos de orquestra pode criar algum impacto no que toca à execução de golpes de arco
dentro doutro tipo de repertório.
Evandra Gonçalves afirma que, “se a prática dos excertos de orquestra for realizada com
o rigor desejado, esta desenvolve no instrumentista uma exigência, concentração, sentido
crítico e auto-correcção provavelmente superior do a qualquer outro tipo de repertório.
Enquanto violinista, Evandra Gonçalves aponta que se conseguir controlar o spiccato no
último andamento da 39ª Sinfonia de Mozart ou no Scherzo da 2ª Sinfonia de Schumann,
provavelmente não terá problemas em consegui-lo noutro tipo de repertório a solo ou, se
trabalhar o legato e sonoridade num excerto de uma Sinfonia de Brahms, certamente que
esse trabalho se fará notar na interpretação das obras de outro repertório.”
116
Já Jorge Teixeira evidencia que golpes de arco aprendidos nos excertos de orquestra
podem ser reutilizados no repertório do violino (ou do instrumento) e vice-versa. Dá como
exemplo que o jeté pode ser introduzido aos alunos através do reportório violinístico e
ser aplicado em orquestra, mas, por exemplo, como se utiliza muito spiccato em excertos
de orquestra, poderá então aí ser praticado e, naturalmente, ser aplicado com sucesso
noutro tipo de repertório.
Tanto Erik Heide, como James Dahlgren, Paula Carneiro e Luiz Coelho, não se alongaram
na resposta, apenas respondendo que os excertos de orquestra são, de facto, uma boa
influência porque tocar excertos de orquestra exige um tipo de técnica mais delicada e
aperfeiçoada, o que só vai contribuir quando este tipo de abordagem for aplicada noutro
tipo de obras.
Crítica e avaliação de golpes de arco enquanto júri de orquestra
De uma forma geral, na opinião dos entrevistados, os golpes de arco não são um dos
pontos de maior crítica numa audição de orquestra. As suas prioridades enquanto jurados
recaem mais para a afinação, o som e o ritmo. Contudo, alguns falam que os golpes de
arco contribuem de forma significativa para a qualidade de som e definição de articulação,
daí terem um papel importante também.
Para Erik Heide, não há apenas uma forma de julgar as coisas, mas sim uma mistura de
todos os aspetos. Ele afirma ainda que, em fase de cortina onde não há um contacto visual
com os candidatos, se ouve um pouco de tudo e se está à espera dos erros. Mas que,
quando já passada essa fase e se pode “confrontar” visualmente os candidatos, apreciam-
se outros aspetos, saltando-lhe mais à vista a afinação e o ritmo. Quanto aos golpes de
arco, é algo que se pode discutir dentro do júri porque nem todas as orquestras tocam do
mesmo modo, mas o candidato deve conseguir convencer o júri com aquilo que executa.
Também para Luiz Coelho, não há um ponto mais importante que outro, mas considera
que mesmo com uma execução perfeita de golpes de arco, se o candidato tiver um som
feio ou não for musical, no seu ponto de vista, não é aceitável. Obviamente, se a técnica
de mão direita não estiver sólida também é negativo porque não dá para compensar uma
mão direita que não tenha todos os problemas resolvidos, segundo Luiz Coelho. De um
117
modo geral o que aprecia mais numa audição é um som bonito, precisão rítmica e um
bom domínio de todos os golpes de arco que se apresentem.
No entender de James Dahlgren, as coisas funcionam por passos. Primeiro aponta a
afinação como mais importante, afirmando que, mesmo que tudo o resto esteja muito
bem, se a afinação não estiver lá tudo o resto ficará arruinado. De seguida, o ritmo – não
havendo regularidade e precisão, tudo fica instável. Por último, menciona o estilo da obra
e a consideração pelas indicações do compositor. Apesar de não apontar os golpes de arco
como um dos primeiros pontos de avaliação, considera serem igualmente importantes,
contribuindo também para o aprimoramento dos outros aspetos referidos.
Para Jorge Teixeira, a sonoridade e afinação são os itens fundamentais que mais
contribuem para a expressão musical e o caráter de um candidato. Em relação aos golpes
de arco, aponta que quando bem executados permitem uma maior e melhor sonoridade e,
por consequência, uma melhor audição e prazer do próprio executante, melhorando a sua
auto-exigência na afinação e capacidade de articulação. Realça também que, na situação
de cortina, onde não é possível observar diretamente o candidato, o controlo da sua mão
direita influência totalmente a sua prestação global final.
Na opinião da Evandra Gonçalves, como referiu anteriormente, a própria estabilidade da
pulsação é um dos aspectos mais importantes a ter em conta na execução de excertos
orquestrais e, no caso dos instrumentistas de cordas, isso não pode ser dissociado do
domínio técnico do arco. Está de acordo portanto, com a afirmação de que os golpes de
arco são um dos seus pontos de avaliação mais crítica numa prova. Também considera
muito importante a própria qualidade do som produzido nos diferentes golpes de arco,
especialmente no que toca ao contraste de estilos de cada repertório e à própria interação
e resposta com a mão esquerda.
Paula Carneiro é a única que realça mesmo a importância dos golpes de arco na execução
de uma prova, pois considera fundamental o seu domínio para todo o tipo de desafios a
que o trabalho de orquestra se propõe.
118
Sucesso na performance em provas de orquestra derivado da antecipação da
aprendizagem dos golpes de arco contextualizada com uma futura abordagem aos
excertos de orquestra
Todos os entrevistados mostraram concordar com esta questão, contudo, ficou implícito
que se trata de um longo processo que deve ser feito com “pés e cabeça”.
Jorge Teixeira afirmou que a aprendizagem deve ser bem planificada e adaptada à
evolução de cada aluno na assimilação dos vários golpes de arco, dando como exemplo
que, sem um bom détaché se torna impossível aprender spiccato ou staccato. Jorge
Teixeira fez também questão de tocar num ponto importante e, a meu ver, com muita
razão, de que “antecipação” não deve ser sinónimo de “precipitação”, o que vai de
encontro com a sua primeira afirmação.
Já Evandra Gonçalves não considera que se trate do termo “antecipar” porque, na sua
perspetiva, os golpes de arco fazem já parte integrante da aprendizagem. Ela questiona
mesmo como se podem abordar questões de articulação e fraseado sem que se relacione
com técnica de arco e mesmo golpes de arco. Portanto, defende que partindo do princípio
que as questões interpretativas também devem ser abordadas desde o início, também os
golpes de arco funcionam da mesma maneira, mas sempre de forma progressiva.
Quanto a James Dahlgren, este entende que se um bom professor tiver os conhecimentos
certos e tiver um bom método de trabalho no que toca ao desenvolvimento de um aluno,
ainda que este tenha apenas 4 anos, o professor entenderá imediatamente a necessidade
para iniciar o processo de aprendizagem e desenvolvimento de uma boa estrutura, com a
quantidade adequada de tensão nos ombros e nas mãos visto que, na sua opinião, tensão
em demasia é o maior obstáculo para uma qualidade de execução no violino.
Luiz Coelho acrescenta que, as crianças não analisam música o suficiente e acabam
também por não entender bem os golpes de arco implícitos em certas obras. Portanto,
usando o seu exemplo de que começou muito cedo a resolver todas as questões de mão
direita em especial, recomenda que este trabalho seja feito desde as primeiras etapas e
que as crianças comecem a tomar mais consciência para poderem adquirir uma boa
estrutura e evitar problemas futuros.
119
Paula Carneiro acredita que sendo a técnica de arco bastante complexa, antecipar e
consciencializar as questões de técnica, poderá ajudar a resolver mais rápido qualquer
problema da mão direita do aluno e irá contribuir para uma evolução mais sólida de um
violinista.
Na mesma linha de pensamento, Erik Heide aponta que é fundamental começar-se cedo
a desenvolver técnica de arco e, acima de tudo, passar as ferramentas certas para que o
estudo da mesma seja eficiente e esteja sempre em progressão.
Excertos de orquestra como base do trabalho técnico da aprendizagem do arco e
golpes de arco
De praticamente todas as opiniões recolhidas, podemos concluir que a introdução de
excertos de orquestra deve ser pensada apenas quando os alunos apresentarem uma
estrutura mais sólida e capacidades mais desenvolvidas.
Na perspetiva de James Dahlgren, o estudo de excertos de orquestra deveria começar no
fim do nosso processo de aprendizagem porque, segundo ele, representam parte do
repertório mais difícil que podemos encontrar numa performance. Ele explica que essa
dificuldade se traduz pelo facto de termos de tocar sozinhos perante um júri para
ganharmos um emprego e a pressão psicológica pode tornar-se esmagadora. Portanto,
para ele, os excertos de orquestra não deveriam fazer parte do trabalho de base, mas,
enquanto formos desenvolvendo toda a nossa estrutura técnica, devemos ter consciência
que um dia teremos de enfrentar o excerto de orquestra do Scherzo da 2ª Sinfonia de
Schumann.
Coincidindo com a opinião de James Dahlgren, também Luiz Coelho aponta que os
excertos de orquestra “vivem” de uma grande complexidade de movimentos que
influenciam o tipo de som criado pela orquestra e que só com tempo vão amadurecendo.
Além disso, refere que todo o tipo de abordagens que encontramos nos excertos de
orquestra também surgem nos métodos, mas deve ser aplicado de uma forma mais subtil:
por exemplo, o spiccato em excertos deve ser mais piano, não tão fora da corda e com
movimentos mais pequenos. Mas, comparativamente com os estudos, a parte musical nos
excertos pode contribuir na busca da essência do que é pretendido como golpe de arco.
120
Como já tinha referido na 3ª pergunta, Erik Heide acredita que alguns excertos podem
não ser benéficos para o desenvolvimento da técnica de arco se utilizados demasiado
cedo, mas acredita que alguns mais simples e menos complexos poderão ser introduzidos
como forma de estudo.
Evandra Gonçalves considera que os excertos de orquestra não podem substituir os
estudos e métodos referidos, mas, tendo já o aluno dominado certas questões de mão
esquerda em determinados excertos, no seu entender, poderá ser interessante e benéfico
utilizá-los. Evandra Gonçalves aponta um exemplo: um spiccato de uma Abertura de
Mozart é diferente de uma peça de Wieniawsky, portanto esse trabalho iria contribuir
bastante.
Também Paula Carneiro destaca que apesar de os estudos e métodos já serem muito
completos como ferramentas de trabalho, acredita os excertos de orquestra devem ser
introduzidos lentamente durante o percurso de aluno, até aos 16 anos e, a partir dessa
idade é fundamental começar a trabalha-lhos de forma mais intensiva.
Curiosamente, Jorge Teixeira evidencia que será muito mais previsível que um aluno
toque muito mais os excertos orquestrais na sua vida musical do que o reportório
normalmente preconizado nos programas pedagógicos, pelo que, os excertos podem ter
um papel mais objetivo e que vai de encontro a uma situação mais “real”.
Importância da introdução de excertos de orquestra como aula individual ou
disciplina autónoma
Tanto Erik Heide como Evandra Gonçalves afirmam já viver essa experiência nas escolas
onde leccionam, quer em Universidades, quer em Escolas Profissionais, onde existem
classes individuais e de grupo e os alunos estão sujeitos a provas da disciplina de excertos
de orquestra dentro do plano curricular.
Na mesma ideia, Paula Carneiro considera importante uma Escola Superior ter uma
disciplina de excertos de orquestras no plano curricular.
Na opinião de Jorge Teixeira, esta questão dependerá bastante dos objetivos pedagógicos
de cada instituição, mas também do mercado de trabalho. Apesar de poderem ser
121
utilizados como um utensílio pedagógico, segundo Jorge Teixeira, se não existirem
lugares de orquestra disponíveis para colocar os alunos como candidatos, não se
justificará, no seu ponto de vista, o investimento de tempo e dinheiro especificamente
numa disciplina de excertos de orquestra, quando temos orquestras
inexistentes/inacessíveis.
Quanto a Luiz Coelho, afirma ter tido excertos de orquestra como disciplina e que foi
benéfico pessoalmente; porém acredita que o aluno deve já estar avançado o suficiente
com o instrumento antes de iniciar o trabalho com excertos de orquestra.
Na opinião de James Dahlgren, seguindo o seu raciocínio nas questões anteriores, os
excertos de orquestra só deveriam ser usados como uma disciplina de aula após uma
Licenciatura, depois de se ter enfrentado repertório como os concertos de violino de
Brahms ou Tchaikowsky. Para justificar a sua opinião, sugeriu a seguinte analogia:
“Devemos estudar primeiro Geometria e Álgebra antes de estudarmos Trigonometria ou
Cálculo”.
Importância de um Bom Arco
Em relação a esta questão, os entrevistados opinaram de forma diferente e bem pessoal,
curiosamente, como a escolha de um bom arco que se adapte a cada indivíduo.
Para Paula Carneiro, é muito importante ter um bom arco, mas é necessário trabalhar-se
para desenvolver uma técnica de mão direita sólida, de maneira a que a qualidade do arco
venha acrescentar algo mais ao estudo já desenvolvido.
Luiz Coelho partilhou a experiência de já ter experimentado muitos arcos caros que não
eram bons, e assumiu nunca ter adquirido um muito caro. Na sua perspectiva, a escolha
do arco tem a ver com o violino que se tem, procurando encontrar a combinação perfeita
entre ambos.
Por outro lado, Erik Heide afirma ser muito importante ter um bom arco, mais do que ter
um excelente violino. Considera ainda que é fundamental ser detentor de uma boa técnica
de arco e, acima de tudo, saber como todos os gestos funcionam. Ainda assim, um bom
arco ajuda muito a dominar vários aspetos. Erik Heide confessou ter tido o seu primeiro
122
arco com uma qualidade já considerável aos 13 anos, pertencente ao seu professor, e que
imediatamente sentiu uma enorme diferença.
A propósito da intervenção de um professor, James Dahlgren evidencia a importância de
o professor ajudar o aluno a escolher um bom arco para que a aprendizagem do violino
seja feita com mais qualidade e eficácia. Realça também que um bom arco não irá garantir
que o estudante aprenda a tocar tudo eximiamente, mas um mau arco irá certamente
prejudicar a forma de tocar.
Na opinião de Evandra Gonçalves, a qualidade do arco em termos de equilíbrio e clareza
pode fazer diferença na execução, mas, tão ou mais importante que o próprio arco, é a
própria qualidade das cerdas que também pode influenciar e muito o sucesso de
determinados golpes de arco.
Na opinião de Jorge Teixeira, um bom arco pode ter impacto, mas não é determinante
porque, sendo um item tão pessoal, o seu valor intrínseco pode variar conforme a
habituação do instrumentista ao próprio arco.
Sendo assim, Jorge Teixeira justifica que o arco apresenta um conjunto de características
que devem ser tidas em conta, como o peso total, peso em cada parte do arco, as suas
dimensões, idade, forma da madeira, qualidade das cerdas e do próprio encerdamento,
entre outros, e a sua manobralidade passará sempre pela assimilação destes fatores por
parte do instrumentista, podendo levar meses/anos.
Jorge Teixeira refere também que as próprias caraterísticas morfológicas do
instrumentista e da sua capacidade/desenvolvimento técnico momentâneo, poderão
influenciar a escolha sempre muito pessoal de “um bom arco”. No entanto acredita, que
esta adaptação se faça mais rapidamente com um arco que apresente as melhores
características atrás referidas permitindo facilitar ao violinista a execução e controlo do
maior número de golpes de arco possíveis.
As entrevistas seguintes destinaram-se a seis professores de violino de diferentes escolas
do país, com faixas etárias variadas, de maneira a comparar consoante a experiência já
adquirida por cada um, as várias abordagens em relação a este tema.
123
Tabela 6 - Professores de violino entrevistados
Nome Escola Contexto Profissional
Alexandre Correia
Entrevista- 10/6/2018
• Aluno de Carlos Fontes na AMPB
e de Augusto Trindade na ESART.
• 17 anos de experiência como
docente.
• Professor no CMP e AME.
Augusto Trindade
Entrevista- 27/5/2018
• Aluno de de Zofia Kuberska-
Woycicka na ESMAE e de Vladimir
Ovcharek no Conservatório de São
Petersburgo.
• 22 anos de experiência como
docente.
• Professor na ESART e na AMPB.
Joaquim Matos
Entrevista- 5/5/2018
• Aluno de Alberto Gaio Lima no
CMCGB e de Gerardo Ribeiro na
ESMAE.
• 27 anos de experiência como
docente.
• Professor no CMCGB.
Nuno Meira
Entrevista- 20/5/2018
• Aluno de António Soares na
ARTAVE e de Ani Shnarch em
Royal College of Music (Londes-
Inglaterra)
• 13 anos de experiência como
docente.
• Professor na ARTAVE.
Rui Cristão
Entrevista- 24/4/2018
• Aluno de Khatchatour
Amirkhanian na ESML e de
Valentim Stefanov na UÉ
• 7 anos de experiência como
docente.
• Professor na AMA
Sara Llano
Entrevista- 1/5/2018
• Aluna de António Anjos na ESML. • 10 anos de experiência como
docente.
• Professora na EAMCN
Apesar de alguma semelhança entre as perguntas das duas entrevistas, ou mesmo a
repetição de uma das perguntas, esta segunda entrevista, destinada exclusivamente a
professores de violino, tem um propósito mais direcionado para a pedagogia e a filosofia
de trabalho desenvolvida nas aulas com os alunos:
124
• Qual o timing ideal para aprendizagem de golpes de arco?
• Quais os golpes de arco mais necessários durante as fases iniciais da aprendizagem do
violino?
• Quais as principais estratégias de estudo/aprendizagem para um bom domínio das
variadas técnicas de arco?
• Como lidar com a eventual “frustração” resultante do possível insucesso nas fases
iniciais da aprendizagem dos golpes de arco?
• Qual a motivação para introduzir a prática de excertos de orquestra no aperfeiçoamento
do estudo de golpes de arco?
• Quais os impactos da introdução de novos ou já abordados golpes de arco na prática
de excertos de orquestra?
• Considera que seria importante introduzir excertos de orquestra na aula individual ou
mesmo como uma disciplina do plano curricular?
Timing para aprendizagem de golpes de arco
A opinião em relação a esta questão aparece dividida entre dois grupos. Sara Llano, Nuno
Meira e Augusto Trindade consideram que o melhor timing seria durante o início da
aprendizagem/iniciação, enquanto que Rui Cristão e Joaquim Matos partilham opiniões
diferentes.
Rui Cristão considera que o melhor timing para a aprendizagem de golpes de arco é o
momento em que o aluno revela maior domínio sobre arco, conseguindo usá-lo todo e, ao
mesmo tempo, demonstra flexibilidade nos dedos da mão direita.
Na opinião de Joaquim Matos, não existe um “timing ideal”, mas podem haver pontos
que demonstrem que ainda não é o momento. Joaquim Matos aponta problemas de
125
postura, descontração e relaxamento como pontos a adquirir antes de se introduzirem
golpes de arco. Depois de alcançados, poderá então ser o timing certo.
Para Alexandre Correia, o timing estará diretamente relacionado com a idade e o estado
de evolução do aluno, nomeadamente quanto ao controlo técnico que já possui, sendo que
quanto maior for esse controlo, mais possibilidades terá em assimilar de forma correta
novos conceitos no que diz respeito aos golpes de arco. Contudo, acredita que ao final de
dois anos de aprendizagem, o aluno conheça e consiga executar os golpes de arco de base
mais simples da técnica violinística.
Golpes de arcos mais necessários durante o início da aprendizagem
De uma forma geral todos os entrevistados, consideram o legato, o détaché e o staccato
como os golpes de arco mais necessários.
Sara Llano e Rui Cristão apontam ainda o martelé, que apresenta algumas semelhanças
com o staccato, utilizando menos arco.
Joaquim Matos explica que através do legato é trabalhada a pressão e velocidade de arco,
tentanto manter a regularidade de ambas durante a arcada, e a partir deste mesmo golpe
de arco chega-se ao détaché. Quanto ao staccato, Joaquim Matos aponta que neste golpe
de arco trabalham-se pequenas quantidades de arco, com alguma pressão e velocidade no
arco, caracterizadas por interrupções entre cada nota. A partir deste golpe de arco
desenvolve-se o martelé.
Estratégias de estudo para um bom domínio das variadas técnicas de arco
Sara Llano e Augusto Trindade mencionam a necessidade de compreensão e
automatização dos movimentos necessários e das zonas de arco preferenciais à execução
dos golpes de arco, a partir da demonstração do professor e também do próprio resultado
sonoro, quando surgem alterações na mudança de articulação. Augusto Trindade realça
também a importância de quais os passos a percorrer até à sua realização e os exercícios
adequados para tal.
126
Também na mesma linha, Rui Cristão aponta para uma supervisão constante em aula por
parte do professor e de uma progressão faseada dos exercícios em aula.
Segundo Alexandre Correia, as peças e os estudos, podem servir de estratégia para
trabalhar golpes de arco de forma isolada; contudo, acredita que cordas soltas podem
resultar num tipo de estratégia mais eficaz, podendo trabalhar todo o tipo de golpes de
arco. Por outro lado, em termos de motivação, acredita que uma peça ou um concerto
possam “seduzir” mais o aluno do que trabalhar cordas soltas ou estudos, devido à
presença mais variada de características estéticas e musicais.
Na mesma perspetiva, Joaquim Matos aponta também como estratégia incontornável a
realização dos golpes de arco em cordas soltas até se alcançar o seu domínio e, depois,
então executá-los nas escalas.
Na opinião de Nuno Meira, deve ser interiorizada a necessidade de um bom domínio de
arco. A partir daí, a estratégia de ensino vai sendo adaptada a cada aluno de diferentes
maneiras consoante cada caso.
Estratégias contra a frustração do possível insucesso no início da aprendizagem de
golpes de arco
Na opinião de Augusto Trindade e Sara Llano, é necessário entender as razões para as
anomalias, rever estratégias, criar novas alternativas e conseguir agir com paciência e
persistência, esperando poder resolver este tipo de problemas numa fase posterior, na qual
o aluno demonstre outro tipo de competências, maturidade e mesmo auto-crítica.
Rui Cristão afirma que é natural que as falhas apareçam no início da aprendizagem e que,
para ele, a melhor estratégia passa por transmitir directamente os erros ao aluno,
moldando a sua evolução com a capacidade de resposta que cada um possa vir a oferecer
na aula.
Numa variante mais prática, Joaquim Matos recomenda que se reforce o domínio de
golpes de arco mais simples, ao mesmo tempo que se pratiquem exercícios que ajudem a
dominar golpes de arco mais difíceis. Oferece como exemplo o spiccato, que requer uma
127
atenção maior quanto à flexibilidade nos dedos e no pulso, referindo exercícios
específicos.
Na perspectiva de Nuno Meira, como a frustração se manifesta de diferente forma nos
vários alunos, o professor vê-se “obrigado” a uma mutação de estratégia de acordo com
as características de cada aluno, de maneira a minimizar e eliminar as consequências da
frustração.
No entender de Alexandre Correia, a palavra de incentivo e o fazer acreditar é
fundamental para erguer os ânimos, pois os resultados nem sempre aparecem de forma
imediata, e há que saber lutar para ultrapassar os problemas. Também é importante, na
sua ótica, voltar a explicar de novo ou as vezes necessárias todo o processo e, acredita
também que tocando com o aluno e demonstrando bem o gesto do golpe de arco que
poderá alcançar bons resultados para contornar a situação.
Motivação para a introdução da prática de excertos de orquestra no
aperfeiçoamento do estudo de golpes de arco
De forma unânime, todos os entrevistados assumiram que a prática de excertos de
orquestra pode ser motivadora e aliciante para os alunos, enumerando vários factores.
Na opinião de Nuno Meira, o facto de ser uma prática ligada à orquestra e podendo ser
feita em conjunto, contribui para uma atitude mais encorajadora e confortável por parte
dos alunos que, não estando tão expostos individualmente, retira pressão e poderá, com o
tempo, favorecer uma execução mais eficaz de certos golpes de arco.
Para Rui Cristão e Augusto Trindade, os excertos de orquestra, comparativamente com
outro tipo de exercícios, podem ser mais interessantes e motivadores por serem mais
práticos e musicais do que apenas técnicos e repetitivos e, para além de permitirem
exercitar golpes de arco, exploram também outros aspectos que muitas vezes contribuem
para o amadurecimento e consolidação da aprendizagem dos mesmos. Rui Cristão
também acredita que os excertos, por representarem obras icónicas do repertório clássico,
funcionam como mais um estímulo para a execução deste tipo de obras sinfónicas.
128
No entender de Joaquim Matos, o estudo de excertos de orquestra funciona como um
reforço motivador do aperfeiçoamento dos golpes de arco em que os alunos aproveitam
como mais um meio para os poderem aplicar.
Segundo Alexandre Correia, no repertório mais avançado surgem determinados golpes
de arco, que podem ser aprendidos e trabalhados em alguns excertos de orquestra. Refere
como exemplos o spiccato, sautillé, entre outros, dos quais podem ser bastante
desenvolvidos e aperfeiçoados, dentro da aprendizagem de muitos dos excertos mais
utilizados no repertório orquestral.
Por outro lado, na perspectiva de Sara Llano, a necessidade de praticar e dominar alguns
dos excertos de orquestra, funciona como um objectivo motivacional para a apresentação
dos mesmos em provas de admissão para orquestras de jovens ou, futuramente,
profissionais. Apesar desta ideia, considera que os excertos de orquestra constituem uma
literatura interessantíssima com novas abordagens que surgem no percurso dos
instrumentistas, apresentando toda uma panóplia de dificuldades imensas às quais não se
presta atenção no devido momento. Portanto, considera que o estudo de excertos deve ser
encorajado e introduzido nos programas de violino, mesmo como substituto de alguns
tipos de estudo que acabam por trabalhar o mesmo tipo de problemas, mas que acabam
por não ser tão executados em público.
Impactos da introdução de novos ou já abordados golpes de arco na prática de
excertos de orquestra
De uma maneira geral, todos os entrevistados acreditam que esta abordagem pode
acrescentar algo no desenvolvimento da aprendizagem dos golpes de arco, ou mesmo
consolidá-los.
Na perspectiva de Joaquim Matos, os excertos de orquestra apresentam aspectos técnicos
e musicais desafiantes que merecem ser aprofundados e desenvolvidos e, havendo um
bom domínio de golpes de arco, pode retirar-se maior partido dos excertos de orquestra.
Apesar de nunca ter introduzido um golpe de arco novo num excerto de orquestra,
Augusto Trindade afirma que, para a execução de excertos de orquestra, pressupõe-se que
o aluno disponha de condições técnicas mínimas e suficientes para a execução dos
129
mesmos. Portanto, introduzindo apenas os golpes de arco que o aluno já conhece, poderá
consolidá-los melhor na execução dos excertos.
Por outro lado, Nuno Meira vê com bons olhos esta abordagem pois, como a duração de
um excerto é mais curta que uma obra ou estudo, provavelmente a duração da
aprendizagem destas competências será mais rapidamente absorvida e eficaz.
Relativamente à resposta de Sara Llano, podemos entender que os impactos são bastante
positivos, no sentido em que muitos das anomalias a nível da técnica de arco são expostas,
quando no repertório mais solístico passam despercebidas. Sara Llano acrescenta ainda o
quão surpreendente é a quantidade de alunos que chega ao final de um 8º grau e não sabe
executar um bom spiccato, sendo que o seu único confronto com este golpe de arco foi
durante o estudo do Scherzo de “Sonho de uma noite de Verão” de Mendelssohn.
Relativamente aos novos golpes que se introduzem a partir dos excertos, Rui Cristão
afirma poderem contribuir para a evolução da técnica do aluno. Quanto aos golpes de
arco já conhecidos, pode ser uma maneira de aperfeiçoamento e de cimentar ainda mais
o trabalho já desenvolvido.
Também Alexandre Correia considera os impactos podem ser extremamente positivos,
porque tendo em conta que o aluno já aprendeu a dominar, ou pelo menos teve contato
com, determinados golpes de arco num contexto diferente de repertório, automaticamente
a velocidade de aprendizagem de uma peça ou concerto estará necessariamente facilitada
porque os conceitos referidos não terão que ser introduzidos como sendo novos, mas sim
como algo que poderá ser aperfeiçoado e adaptado à peça, concerto ou estudo em questão.
Considera que seria importante introduzir excertos de orquestra na aula individual
ou mesmo como uma disciplina do plano curricular?
As respostas a esta questão foram unânimes, confirmando a aceitação e interesse que
existe em relação à introdução de excertos na aula ou como disciplina.
Segundo Nuno Meira, os excertos de orquestra seriam mais um “instrumento” de apoio
ao professor no que toca ao ensino, tanto como elemento de aula, como aula individual.
130
Quanto a Rui Cristão, os excertos de orquestra seriam melhor aproveitados como
suplementos nas aulas individuais, para que o professor pudesse explicar este método de
trabalho específico. Aponta também que os excertos podem mesmo ser uma boa
ferramenta de iniciação ao método de estudo para qualquer obra orquestral.
Sara Llano acredita que seria muito importante a criação de uma disciplina de excertos
dada por um professor conhecedor do repertório “standard” de orquestra e que isso
poderia conseguir resultados. Acrescenta ainda que lamenta não haver estas aulas, por
questões de programação curricular, mas que na EAMCN, os professores têm o cuidado
de exigir a execução dos mesmos nas provas técnicas, o que Sara Llano considera um
passo importante e mais próximo do que ainda pode ser feito.
Na opinião de Joaquim Matos, a aula individual pode não oferecer o espaço necessário
para os excertos de orquestra de uma forma sistemática; contudo, acredita que estes
podem ser usados ocasionalmente como auxílio de alguns aspetos técnicos e musicais.
Realça também que os excertos orquestrais deveriam ser integrados como disciplina
obrigatória no ensino superior.
Também Alexandre Correia declara que trabalha excertos de orquestra com os alunos nas
aulas, mas admite que com o escasso tempo de aula, não é o ideal porque na maior parte
das escolas, os excertos de orquestra não estão contemplados nos programas da disciplina
de instrumento, e há prioridade de trabalho para outro tipo de obras que considera serem
essenciais ao desenvolvimento de um aluno. Perante esta situação, Alexandre Correia
aponta à criação de uma disciplina de leitura de excertos de orquestra como uma solução
importante e benéfica para os alunos.
Seguindo esta mesma ideia, Augusto Trindade afirma já existir a disciplina de excertos
orquestrais na ESART, onde os alunos são também submetidos a exames.
131
8.2. Questionário
Para além das entrevistas a músicos de orquestra e professores de violino, foi também
elaborado um questionário a alunos entre o 5º e o 8º graus dentro do panorama nacional,
através da plataforma online google documents, tendo sido recolhidas quarenta e uma
respostas de alunos de escolas públicas e profissionais. Os inquiridos pronunciaram-se de
forma anónima, revelando apenas a idade, os anos de estudo completados do questionário,
e o grau que frequentam presentemente.
Foram apresentadas doze perguntas de resposta fechada, em que três das quais se
reservaram à caracterização de perfil de cada inquirido, de acordo com o que foi apontado
no parágrafo anterior, seguindo-se quatro perguntas direccionadas ao trabalho que é
realizado com o arco, e as últimas cinco relativamente às perspectivas e ideias no que toca
à abordagem dos excertos de orquestra.
8.2.1. Análise de dados do questionário
Perguntas de identificação
Das primeiras três perguntas, de cariz identificativo, obtiveram-se os seguintes resultados:
Questão n.º 1: Quantos anos tens?
• 12% (5) dos inquiridos têm 15 anos.
• 29% (12) dos inquiridos têm 16 anos.
• 22% (9) dos inquiridos têm 17 anos.
• 22% (9) dos inquiridos têm 18 anos.
• 7% (3) dos inquiridos têm 19 anos.
• 2% (1) dos inquiridos têm 21 anos.
• 2% (1) dos inquiridos têm 23 anos.
• 2% (1) dos inquiridos têm 24 anos.
132
Gráfico 1 - Questão n.º 1: Quantos anos tens?
Fonte: Elaboração do autor
Este gráfico 1, podemos concluir que, apesar das idades entre o 5º e o 8º grau
normalmente se situarem entre os 15 e os 18 anos, há um interesse significativo pela
aprendizagem ou continuidade do estudo do violino fora da faixa etária habitual, podendo
corresponder a alunos supletivos ou mesmo a estudantes que tenham voltado atrás na
preferência do curso.
Questão n.º 2: Que grau frequentas?
• 5% (2) dos inquiridos frequentam o 5º grau.
• 20% (8) dos inquiridos frequentam o 6º grau.
• 29% (12) dos inquiridos frequentam o 7º grau.
• 46% (19) dos inquiridos frequentam o 8º grau.
12%
29%
22%
22%
7%
2% 2%2%
15 anos 16 anos 17 anos 18 anos 19 anos 21 anos 23 anos 24 anos
133
Gráfico 2 - Questão n.º 2: Que grau frequentas?
Fonte: Elaboração do autor
O Gráfico 2 aponta para uma acentuada maioria de alunos do 8º grau, seguindo-se de
forma decrescente os 7º, 6º e 5º graus, possivelmente possuindo um maior conhecimento,
interesse e motivação relativamente ao tema em questão.
Questão n.º 3: Há quantos anos estudas violino?
• 12% (5) dos inquiridos estudam violino há 5 anos.
• 7% (3) dos inquiridos estudam violino há 6 anos.
• 7% (3) dos inquiridos estudam violino há 7 anos.
• 15% (6) dos inquiridos estudam violino há 8 anos.
• 7% (3) dos inquiridos estudam violino há 9 anos.
• 20% (8) dos inquiridos estudam violino há 10 anos.
• 15% (6) dos inquiridos estudam violino há 11 anos.
• 15% (6) dos inquiridos estudam violino há 12 anos.
• 2% (1) dos inquiridos estudam violino há 15 anos.
5%
20%
29%
46%
5º grau 6º grau 7º grau 8º grau
134
Gráfico 3 - Questão n.º 3: Há quantos anos estudas violino?
Fonte: Elaboração do autor
No Gráfico 3, entende-se que os alunos que estudam violino há mais de oito anos, 24
alunos no total, terão iniciado provavelmente os seus estudos de violino desde o 1º ano
de escolaridade e os restantes, que estudam violino à menos de 8 anos, num total de 17,
presumivelmente terão começado a aprender violino a partir do 5º ano/1º grau.
Perguntas sobre o trabalho realizado com o arco
As próximas 4 perguntas vão de encontro ao tipo de estudo desenvolvido com o arco, em
relação à prática de golpes de arco e do seu conhecimento dos mesmos.
Os resultados foram os seguintes:
Questão n.º 4: Praticas cordas soltas no teu estudo?
• 17% (7) dos inquiridos praticam cordas soltas muitas vezes.
• 46% (19) dos inquiridos praticam cordas soltas algumas vezes.
• 32% (13) dos inquiridos raramente praticam cordas soltas.
• 5% (2) dos inquiridos nunca praticam cordas soltas.
12%
7%
7%
15%
7%20%
15%
15%
2%
5 anos 6 anos 7 anos 8 anos 9 anos 10 anos 11 anos 12 anos 15 anos
135
Gráfico 4 - Questão n.º 4: Praticas cordas soltas no teu estudo?
Fonte: Elaboração do autor
Segundo os resultados do Gráfico 4, está demonstrado que a prática de cordas soltas não
é de todo uma prioridade para os inquiridos uma vez que a opção “muitas vezes” foi
apenas assinalada por 7 alunos. Contudo, a maior percentagem deste gráfico recaiu sobre
a opção “algumas vezes”, abrangendo 19 dos inquiridos, tornando esta prática algo casual
e não totalmente esquecida, o que também se vem a justificar com os restantes 13
inquiridos que assinalaram a opção “raramente”. Apenas 2 alunos confirmam a ausência
desta prática.
Questão n.º 5: Conheces alguns dos seguintes golpes de arco? Quais?
• 100% (41) dos inquiridos conhecem o legato, detaché e o staccato.
• 97,6% (40) dos inquiridos conhecem o spiccato.
• 92,7% (38) dos inquiridos conhecem o martelé
• 75,6% (31) dos inquiridos conhecem o portato.
• 90,2% (37) dos inquiridos conhecem o ricochet.
• 51,2% (21) dos inquiridos conhecem outros golpes de arco.
17%
46%
32%
5%
Muitas vezes Algumas vezes Raramente Nunca praticam
136
Gráfico 5 - Questão n.º 5: Conheces algum dos seguintes golpes de arco? Quais?
Fonte: Elaboração do autor
Os resultados do Gráfico 5 evidenciam um conhecimento unânime por parte dos
inquiridos por três golpes de arco: legato, detaché e staccato. Logo a seguir surgem como
mais conhecidos o spiccato, o martelé e o ricochet. O golpe de arco com menos
reconhecimento por parte dos inquiridos foi o portato, apenas com 31 respostas positivas.
Um registo interessante a focar são também as 21 respostas que resgistram um
conhecimento mais extenso de outros golpes de arco.
Questão n.º 6: Exercitas golpes de arco em cordas soltas?
• 76% (31) dos inquiridos afirmaram que os exercitam.
• 24% (10) dos inquiridos não os exercitam.
41 4038
31
37
21
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Legato, detaché e sraccato
spiccato martelé portato ricochet outros
137
Gráfico 6 - Questão n.º 6: Exercitas golpes de arco em cordas soltas?
Fonte: Elaboração do autor
Através do Gráfico 6, pode concluir-se que a grande maioria dos inquiridos, num total de
31 respostas positivas, utilizam as cordas soltas para exercitar golpes de arco. Os restantes
inquiridos poderão não exercitar golpes de arco em cordas soltas mas, possivelmente,
utilizam outro tipo de estratégias.
Questão n.º 7: Aperfeiçoas golpes de arco em estudos específicos como Kreutzer, Dont,
Mazas, Fiorillo ou Rode?
• 83% (34) dos inquiridos responderam afirmativamente que o fazem.
• 17% (7) dos inquiridos responderam negativamente que o fazem.
76%
24%
Sim Não
138
Gráfico 7 - Questão n.º 7: Aperfeiçoas golpes de arco em estudos esecificos como
Kreutzer, Dont, Mazas, Fiorillo ou Rode?
Fonte: Elaboração do autor
A partir do Gráfico 7, conclui-se que a grande maioria dos inquiridos (34 alunos),
recorrem aos estudos indicados para poderem exercitar golpes de arco, visto serem fontes
preciosas para o aperfeiçoamento dos mesmos. Os restantes inquiridos, tendo respondido
negativamente, poderão usar outro tipo de estratégias para exercitarem golpes de arco ou
então poderão utilizar este tipo de estudos para trabalhar outros aspectos.
Perguntas de abordagem aos excertos de orquestra
Questão n.º 8: Já ouviste falar em excertos de orquestra? (pequenas secções de obras para
orquestra que são exigidas nas provas de admissão para orquestras de jovens e
profissionais, nas quais são exploradas as capacidades individuais do violinista, tanto a
nível técnico como musical).
• 98% (40) dos inquiridos admitiram já ter ouvido falar em excertos de orquestra
• 2% (1) dos inquiridos admitiu não ter ouvido ainda falar em excertos de orquestra.
83%
17%
sim não
139
Gráfico 8 - Questão n.º 8: Já ouviste falar em excertos de orquestra?
Fonte: Elaboração do autor
Como se pode observar no Gráfico 8, é claramente notório o reconhecimento e talvez até
alguma proximidade com esta prática. Apenas um dos inquiridos não estava familiarizado
com excertos de orquestra.
Questão n.º 8.1: O teu professor trabalha excertos de orquestra contigo?
• 41% (17) dos inquiridos afirmaram que os seus professores trabalham excertos de
orquestra com eles.
• 59% (24) dos inquiridos negaram que os seus professores trabalham excertos de
orquestra com eles.
98%
2%
sim não
140
Gráfico 9 - Questão n.º 8.1: O teu professor trabalha excertos de orquestra
contigo?
Fonte: Elaboração do autor
Através do Gráfico 9, verificou-se que, apesar de haver um número significativo de
inquiridos (17) que desenvolvem um trabalho de excertos de orquestra com os seus
professores, há ainda um número superior de inquiridos que não realiza este trabalho com
os seus professores, provavelmente por os professores não considerarem relevante ou não
ser ainda o momento adequado, ou porque poderão existir outras prioridades.
Questão n.º 8.2: Se não, tens ou terias interesse em abordá-los como forma de estudo?
• 93% (38) dos inquiridos assumiu interesse em abordar excertos de orquestra como
forma de estudo.
• 7% (3) dos inquiridos assumiu não apresentar interesse na sua abordagem como forma
de estudo.
41%
59%
Sim Não
141
Gráfico 10 - Questão n.º 8.2: Se não, tens ou terias interesse em abordá-los como
forma de estudo?
Fonte: Elaboração do autor
Perante o Gráfico 10, podemos concluir que há um enorme interesse pela abordagem de
excertos de orquestra como forma de estudo, tanto da parte dos inquiridos que já os
trabalham com os seus professores, como também da parte dos que afirmaram que não
trabalhavam. Apesar de três dos inquiridos terem mostrado desinteresse em relação a esta
questão, há claramente uma motivação assumida por todos os restantes.
Questão n.º 9: Consideras que o estudo de excertos de orquestra pode ser também uma
forma de exercitar golpes de arco?
• 98% (40) dos inquiridos admitiram que o estudo de excertos de orquestra pode resultar
como exercício de golpes de arco.
• 2% (1) dos inquiridos admitiu que o estudo de excertos de orquestra pode não resultar
como exercício de golpes de arco.
93%
7%
Sim Não
142
Gráfico 11 - Questão n.º 9: Consideras que o estudo de excertos de orquestra pode
ser também uma forma de exercitar golpes de arco?
Fonte: Elaboração do autor
De acordo com o Gráfico 11, praticamente todos os inquiridos, à excepção de um,
concordaram que os excertos de orquestra também poderão funcionar como uma
ferramenta pedagógica no estudo dos golpes de arco.
Questão n.º 10: Gostarias que os excertos de orquestra fossem:
• 47% (19) dos inquiridos assumem que gostariam que fossem uma parte da aula de
violino.
• 27% (11) dos inquiridos assumem que gostariam que fossem uma disciplina
individual.
• 22% (9) dos inquiridos assumem que gostariam que fossem uma disciplina coletiva.
• 5% (2) dos inquiridos assumem não ter preferência por nenhuma das opções anteriores.
98%
2%
sim não
143
Gráfico 12 - Questão n.º 10: Gostarias ques os excertos de orquestra fossem:
Fonte: Elaboração do autor
Como se evidencia no Gráfico 12, a maior percentagem das afirmações recai sobre os
excertos de orquestra poderem ser uma parte da aula de violino, com 19 respostas por
parte dos inquiridos, o que demonstra que os excertos podem funcionar como parte do
programa de violino, neste caso direccionado para a parte orquestral, onde eventualmente
se poderão também exercitar alguns golpes de arco. Uma fracção mais baixa dos
inquiridos, num total de 11, demonstram vontade de poder ter “excertos de orquestra”
como disciplina individual, expressando provavelmente uma vontade de se poderem focar
de forma mais séria e pormenorizada numa aula mais longa e exclusivamente dedicada
aos excertos de orquestra. Ainda com uma significativa percentagem, 9 dos inquiridos
sugerem que gostariam que “excertos de orquestra” pudesse também ser uma disciplina
colectiva que, embora havendo semelhanças com a de orquestra ou de naipe, seria uma
disciplina igualmente de grupo, mas unicamente direccionada para excertos de orquestra.
Por último, apenas dois inquiridos, desvalorizaram estas três hipóteses mencionadas.
46%
27%
22%
5%
Parte da aula de violino Disciplina individual Disciplina colectiva Sem preferência
144
9. Reflexão Final
Concluída a investigação, posso afirmar que o seu balanço foi bastante positivo e
satisfatório relativamente aos conhecimentos absorvidos através de todas as fontes e
metodologias pesquisadas e selecionadas, de toda a informação transmitida por grandes
músicos e professores que tiveram o detalhe e atenção em se prestarem a partilhar toda a
sua opinião e experiência em relação a este tema, e também a oportunidade de poder saber
e compreender o que alunos de hoje em dia e futuros músicos e professores do nosso país
ou mesmo “além fronteiras”, opinam e perspetivam acerca da abordagem do tema em
questão.
Inicialmente o tema foi pensado com base na minha experiência como estudante e músico
de orquestra e, naquilo que fui aprendendo, apercebendo-me e ganhando com o trabalho
que fui desenvolvendo com os excertos de orquestra relativamente à técnica de arco, na
qual acredito poder fazer a diferença no campo formativo do violino.
Após a investigação compreendi que, de facto, os excertos de orquestra, embora
representarem curtos fragmentos, são considerados repertótio já bastante exigente para
certos níveis, especialmente para alunos ainda em desenvolvimento. Contudo, para além
de apresentarem não só uma enorme variedade de golpes de arco, também trabalham
música, estilo, dinâmicas, articulações, ao contrário de muitos estudos que, por norma,
apresentam quase sempre o mesmo golpe de arco na integral do mesmo, não sendo muito
ricos musicalmente nem dinamicamente.
Não pretendo querer substituir estudos por excertos, porque como já foi dito, o nível de
dificuldade é diferente, e os estudos são claramente insubstituíveis, porque foram criados
para construir as várias etapas de aprendizagem a serem dadas pelos jovens estudantes.
Não obstante, como foi apontado por alguns entrevistados, devido às caraterísticas que os
excertos apresentam no seu todo, poderão ser mais motivadores que os estudos, por
apresentarem mais desafios, serem musicalmente mais interessantes e estarem associados
ao repertório de orquestra, o que de forma geral pode agradar a todos os estudantes por
ser uma atividade de conjunto. Como forma de simplificar a questão da dificuldade que
os excertos podem representar ainda para muitos dos estudantes, foi também exposta a
possibilidade de se trabalharem excertos mais simples e acessíveis às capacidades dos
alunos.
145
Seria como por exemplo, se se pudesse dar uma aula de naipe de orquestra, mas
individualmente, partindo do particular para o geral, poderia contribuir para um melhor
desempenho do conjunto, se cada um individualmente estivesse bem sólido. Como um
professor de naipe não pode estar atento a todos individualmente, há sempre alunos que
ao tentarem tocar alguma peça específica de orquestra, podem não estar a usar a técnica
de arco corretamente, vão ganhando vícios e tudo se vai tornando numa “bola de neve”
de problemas.
Portanto, a questão de se poder ter uma aula individual de excertos de orquestra, ou se
poder trabalhar um pouco dos mesmos durante a aula de instrumento, seria talvez mais
importante do que se possa pensar, porque resolveria muitos problemas e,
fundamentalmente poderia evitar muitos mais.
Se pensarmos no repertório que temos que “enfrentar” nas nossas carreiras, isto se
decidirmos trabahar para uma carreira de instrumentista de orquestra, iremos necessitar
estudar não só concertos, sonatas, peças ou estudos, mas também excertos de orquestra.
Portanto, esta linha de pensamento poderia motivar mais os professores a apresentarem e
introduzirem aos alunos excertos de orquestra durante a sua aprendizagem, de forma a
começarem a moldar-se a eles e também “cultivarem-se” relativamente ao repertório
sinfónico.
Como já referi, não tenho intenção de enfatizar os excertos em relação a todos os outros
métodos, estudos, peças, concertos ou sonatas, dos quais todos os alunos devem passar
porque fazem parte da base violinística. Pretendo, sim, salientar que eventualmente
poderia fazer diferença acrescentar os excertos, ainda que mais simples para começar, ao
trabalho desenvolvido com os estudantes de violino.
Enquanto estudante, posso afirmar que me apercebi de como era tocar verdadeiramente
com todo o rigor e clareza, e, acima de tudo, sensibilidade (dinâmica e de qualidade de
som) a partir de excertos de orquestra. Por todos os pormenores que envolvem e pela
maneira específica como devem ser tocados, desde ritmo, regularidade, estilo,
articulações, e também algo essencial a forma como os golpes de arco são usados por
cada compositor em cada período da história da música.
Muitos podem defender que os excertos de orquestra são a última coisa a ser estudada
para lá de todo repertório violinístico, mas não é por acaso que existem excelentes
146
orquestras de jovens como a Gustav Mahler Jugendorchester ou a European Union Youth
Orchestra, que exigem os excertos mais complexos e mais tarde grande parte desses
jovens acabam por ganhar lugares de trabalho em excelentes orquestras profissionais.
Partindo desta linha, volto a sublinhar que os excertos podem contribuir (e bastante) não
só para o aperfeiçoamento dos golpes de arco, mas também para uma formação
violinística mais completa.
Apesar de existirem em Portugal algumas Universidades, Conservatórios, Escolas
profissionais e Academias que já apostam na disciplina individual de “excertos de
orquestra”, considera-se necessário haver mais iniciativa e disponibilidade para “investir”
mais nesta atividade.
É importante mencionar também que, dos questionários respondidos por um número
considerável de alunos de todo o país, há um enorme interesse em poder integrar e
trabalhar de forma mais intensiva os excertos de orquestra.
Por último, desejo que o objetivo e a mensagem desta investigação possam fazer sentido
para futuros leitores, e que funcionem como um impulsionador motivacional para o
trabalho dos professores que pode ainda ser mais desenvolvido, tanto com alunos, como
posteriormente pelos alunos.
147
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150
Anexos
Anexo 1 - Documentos de Autorização dos Entrevistados (Ver CD)
Anexo 2 - Planos de aula e fichas de observação (Ver CD)
Anexo 3 - Guia de entrevista a violinistas de orquestra
Anexo 4 - Guia de entrevista a professores de violino
Anexo 5 - Questionário aos alunos
151
Anexo 3 - Guia de entrevista a violinistas de orquestra
• Quais os golpes de arco mais importantes na base técnica de um violinista?
• Quais os exercícios ou estratégias mais indicadas para exercitar esses golpes de arco
em especial?
• Que benefícios pode trazer o estudo de excertos de orquestra para a prática e
desenvolvimento dos diferentes golpes de arco?
• Poderá a prática de excertos de orquestra levar o intérprete a um tipo de estudo mais
rigoroso e pormenorizado destes mesmos golpes de arco quando inseridos noutro
repertório?
• Enquanto membro do júri numa audição de orquestra, considera a clareza e
regularidade da execução dos golpes de arco como um dos principais pontos de
avaliação e crítica numa performance em prova?
• Antecipar a aprendizagem dos golpes de arco (e a respectiva consciencialização por
parte do aluno), posteriormente contextualizada na abordagem aos excertos de
orquestra, pode favorecer o sucesso da performance numa audição de orquestra?
• A par dos métodos, estudos, caprichos e peças virtuosas, poderiam os excertos
orquestrais ser acrescentados na base do trabalho técnico da aprendizagem do arco e
dos respectivos golpes de arco? Poderia trazer benefícios? E porquê?
• Considera que seria importante introduzir excertos de orquestra na aula individual de
violino ou mesmo como uma disciplina no próprio plano curricular?
• A qualidade de um arco pode fazer a diferença no aperfeiçoamento dos golpes de arco?
152
Anexo 4 - Guia de entrevista a professores de violino
• Qual o timing ideal para aprendizagem de golpes de arco?
• Quais os golpes de arco mais necessários durante as fases iniciais da aprendizagem do
violino?
• Quais as principais estratégias de estudo/aprendizagem para um bom domínio das
variadas técnicas de arco?
• Como lidar com a eventual “frustração” resultante do possível insucesso nas fases
iniciais da aprendizagem dos golpes de arco?
• Qual a motivação para introduzir a prática de excertos de orquestra no aperfeiçoamento
do estudo de golpes de arco?
• Quais os impactos da introdução de novos ou já abordados golpes de arco na prática
de excertos de orquestra?
• Considera que seria importante introduzir excertos de orquestra na aula individual ou
mesmo como uma disciplina do plano curricular?
153
Anexo 5 - Questionário aos alunos
154
155