reportagem meninos de kichute - #pf

3
Do papel ao filme O livro Os Meninos de Kichute acaba de ganhar versão em cinema. Márcio Américo, escritor do livro e co-roteirista do filme, conta como narrou a história de um tênis que marcou época 07 Beto, protagonista do filme, com seu sonho de se tornar jogador de futebol Fotos: Divulgação/Site Oficial

Upload: gabriela-pereira

Post on 11-Mar-2016

228 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

Reportagem produzida por Gabriela Pereira para a revista Ponto Final.

TRANSCRIPT

Page 1: Reportagem Meninos de Kichute - #PF

Do

papel

ao

filme

O livro Os Meninos de Kichute acaba de ganhar versão em cinema. Márcio Américo, escritor do livro e co-roteirista do filme, conta como narrou a história de

um tênis que marcou época

07

!"#!$%

&'()'*+,(-./*0123040

Beto, protagonista do filme, com seu sonho de se tornar jogador de futebol

Fotos: Divulgação/Site Oficial

Page 2: Reportagem Meninos de Kichute - #PF

08

&'()'*+,(-./*0123040

!"#!$%

Gabriela S. PereiraDécada de 1970. Repressão, milagre

econômico, Copa do Mundo e um time de futebol em um bairro de uma cidade do interior. Esse é o resumo da infância de muitos “jovens de 40 anos”, inclusive o de Márcio Américo, escritor, humoris-ta de stand-up e autor do livro Os Meni-nos de Kichute. Para muitos jovens, o tê-nis Kichute não tem relevância alguma, porém, pais, irmãos e até mesmo avós conhecem a simples marca de tênis que carimbou uma década. “Se você falar com qualquer pessoa de 40 em diante, quando se fala Kichute dá para perceber que é uma palavra mágica que remete diretamente à infância das pessoas dessa idade. Porque era o tênis mais popular dos anos 70”, conta Márcio Américo.

O livro narra a história de Beto, menino de 12 anos que sonha em ser jogador de futebol, ou como o próprio personagem diz: ”o goleiro da seleção brasileira”. O sonho do garoto é inter-rompido pelo seu pai, que, cuja religião não permite participações em competi-ções. Estruturado em contos, o livro é um romance escrito em 2000 por Amé-rico, com a intenção de retratar a sua infância na Rua Ivaí em Londrina. “Eu queria escrever sobre a minha infância, mas a primeira coisa que eu pensei antes de começar a escrever é que essa fase é igual para todos. Então, o que é que eu

“No dia em que eu comprei o meu primeiro KichuteVocê não faz ideia qual era a força do meu chute.

Driblei quase o time inteiroMeia lua no goleiro

Levantei, dei de voleio.Mas agora estou por cima, com meu pisante invocado.

Chuto tudo que encontro preciso tomar cuidado...”(Letra: Meu primeiro Kichute - Arganaz)

O time de Beto chega com seus Kichutes novos para mais uma pelada no campinho, onde nem sempre levavam a melhor

Page 3: Reportagem Meninos de Kichute - #PF

09

!"#!$%

&'()'*+,(-./*0123040

A produção do roteiro foi pautada inteiramente no livro Os meninos de Ki-chute. Em relação às locações da filma-gem, Américo explica que foram feitas reproduções fiéis aos locais onde a his-tória se passou. “As locações são as que estão no livro, a escola, o ferro velho, a casa do Beto, a rua. O Lucas esteve aqui esse ano para conhecer os lugares em que se passa a história: Grupo Escolar Rui Barbosa, o campinho do Pinga San-gue e a minha antiga casa.” Apesar do enredo do livro se passar em Londrina, as filmagens foram feitas em Piracaia, interior de São Paulo. Segundo Améri-co, a estrutura do local se adequava ao desejado, já que o estado de conservação dos antigos lugares não estava agradá-vel. “Nós achamos um grupo escolar lá [Piracaia] muito bonito que ficou melhor até do que se fosse feito aqui em Lon-drina. A casa do Beto nós construímos, compramos peroba do Paraná e nossa cenógrafa construiu a casa. O cinema era uma boate antiga que foi toda adereçada com cartazes de cinema da época”, conta Márcio Américo.

Lançamentos

O lançamento do filme ainda não tem data confirmada, mas a previsão é lançá-lo próximo a Copa do Mundo deste ano. Já o livro de Márcio Américo, após a filmagem do filme, ganhou nova versão, que será lançada no final de abril, com nova capa, novas histórias, mas ainda recheado de saudosismo. Mais informa-ções sobre o filme no site: http://meni-nosdekichute.uol.com.br/site/index.php

Tênis no pé. Bola no chão. Anos 70, Kichute. Bom resumo? Para muitos sim. Se você tem menos de 30 anos, provavelmente nunca ouviu o nome da marca que marcou a infância de muitas crianças, cada qual a sua maneira. Mistura de tênis, chuteira e preço bom. O calçado era produzido no Brasil, teve seu ápice entre os anos de 1978 e 1985. Suas vendas ultrapassaram a marca de 9 milhões de pares por ano. Pouco? Enganou-se quem disse sim. Uma época de recessão, inflação em alta e pouco dinheiro no bolso. Mudou de ideia? Pois é, Kichute foi a sensação nacional, sem sombra de dúvidas.

A turma do Kichute usava o tênis em qualquer ocasião, a diferença estava apenas na forma de amarrar. O cadarço do calçado era grande e por isso devia ser bem ajustado a cada lugar: para missa, apenas um laço; para o aniversário de amigos um bom nó e para o jogo de futebol com os amigos do bairro, o cadarço tinha de ser entrelaçado na canela e finalizado com um bom nó. Apesar de seu sumiço, o tênis nunca deixou de ser produzido e com revival dos anos 80 é utilizado em desfiles de moda de grifes nacionais.

Ki... o quê?

vou falar da minha infância que vá inte-ressar um leitor?” Esse foi o start para o escritor tratar de um assunto um pouco mais profundo: a luta de classes.

É com os olhos de um garoto de 12 anos que as desigualdades de uma época são retratadas. Enquanto famílias intei-ras de classe média e alta se preocupa-vam com as exigências do governo, bair-ros afastados e com uma renda baixa não viviam a repressão imposta pelo regime. “Me ocorreu que eu poderia falar de luta de classes, o pobre contra o rico, o boni-to contra o feio, o forte contra o fraco. E isso funcionou muito, então consegui com isso dar voz ao personagem. Uma criança falando com a inexperiência de uma criança e de forma muito bem hu-morada. Tem um trecho que o Beto fala que ele catalogou os pés dos meninos da Rua Ivaí: ‘Eu podia classificá-los e en-tendê-los. Começavam com os meninos descalços, os de chinelo, os de gongo, os de Kichute e os de tênis Adidas’”.

Do livro ao filme

Em uma visita à Londrina, ao desen-rolar da uma gravação do documentário, Heróis da Liberdade, em 2005, Lucas Amberg, formado em Cinema pela Es-cola de Cinema de Los Angeles, co-nheceu o livro de Márcio Américo. Foi saudosismo à primeira vista, logo após a leitura da obra o contato foi feito com o autor: “O título mexeu com ele. Ele me ligou e falou que queria comprar o direi-to do livro, nós conversamos e coloquei um adendo: eu posso te vender os direi-tos, mas eu quero fazer o roteiro junto.”

“As pessoas com mais de 40 anos vão se emocionar ao rever a sua realidade

no cinema”, afirma Márcio Américo, escritor do livro e co-roteirista