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2a edição dessa revista publicada pela GOLE/PCR.

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Música para ver: influência do som na percepção de um filme

O primeiro comentário de Orson Welles às al-terações feitas pela Universal Studios no pri-meiro corte de A marca da maldade (1958) foi o seguinte: “eu suponho que a música que está agora de fundo na sequência de abertura seja temporária...”. As reticências estão presentes no protocolo que Welles enviou à Universal após ver a cópia que terminou servindo de base para a primeira versão do filme, lançada em fevereiro de 58. A música a que o diretor se refere é uma suíte jazzística com divisão rítmi-ca de salsa composta por Henry Mancini es-pecialmente para a cena: um plano-sequência de pouco mais de 3 minutos que começa com a ativação de uma bomba-relógio — o tique-taque servindo de metrônomo para o bongô que marca o ritmo — e termina com a explosão de um carro presen-ciada pelo personagem principal Var-gas (Charlton Heston) e sua esposa Su-san (Janet Leigh). Em termos melódicos, o que começa apenas com a apresentação da frase principal logo se torna, através de contrafra-ses e variações pontuando cada momento, a

TEXTO Leo FalcãoFOTO Reprodução do filme

Magnolia/Playart Home Vídeo

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própria tensão crescente da cena. Welles nem mesmo comenta a qualidade da música. Ape-nas ressalta que tinha concebido a trilha so-nora como incidental: uma colagem de ritmos latinos e efeitos sonoros reforçando os sons presentes na cena de forma mais realista.

Essa perspectiva em relação ao uso da mú-sica encontra outro exemplo conhecido no recente movimento Dogma 97, promovido pe-los dinamarqueses Lars von Trier e Thomas Vinterberg, que buscavam estabelecer uma dramaturgia cinematográfica mais próxima do “real”. Qualquer elemento “externo” à cena deveria ser evitado, senão banido do filme. Para tanto, eles rodavam seus filmes em câ-mera digital, sempre na mão, sem o suporte de luzes de apoio que modificassem a luminosi-dade do ambiente e, é claro, sem a inserção de efeitos ou trilha sonora. Seria o extremo de um cinema que assume o real como sua unidade expressiva e que se torna mais verdadeiro na medida em que evita esses tais elementos de “metadiscurso” — aspectos artificializados de construção da mensagem que enfatizam certas informações ou expressões na cena (recursos de fotografia como manipulação de luz e cor, efeitos visuais e sonoros, trilha sono-ra ao invés de uma música incidental, etc.).

O que Welles (na cena descrita acima) e os estatutos do Dogma 97 não descartam como elemento de metadiscurso, no entanto, é algo que é pragmaticamente imperceptível e está intimamente ligado à fluência da linguagem visual no cinema: a montagem. Podemos de-fini-la como a junção sucessiva de um plano a outro — o que define sua própria duração

—, formando a sequência de imagens que dá sentido ao filme. Em outras pa-lavras, é estabelecer a mensagem nar-rativa a partir da ordem das imagens. A montagem está para o filme assim como o ritmo está para a música. Sem

uma coisa, a outra não existe. Mesmo em pla-nos-sequência, existe um início e um fim do plano — este corte já se caracteriza como

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montagem. É o que, aliado ao enquadramento da câmera, “manipula”, por assim dizer, uma parte da realidade para dar-lhe um sentido dentro de um contexto narrativo. Esta lógica de raciocínio legitima o uso da música, o que aliás acontece desde a gênese do cinema, antes mesmo de existir o som sincrônico que começou a dar mais realismo aos filmes.

Para entender o porquê de uma ligação tão íntima com o cinema, bastaria pensar como a música é criada e se manifesta nas nossas vi-das: o ritmo, não apenas no pulso cardíaco que nos deixa vivos, está por toda parte. É a partir dessa relação do ser humano com a natureza que a música é sistematizada e (re)criada. O cinema, por sua vez, surge como um aparato capaz de registrar a realidade de uma forma nunca antes imaginada: a imagem não ape-nas é capturada em suas formas, mas também em seus movimentos. É, por assim dizer, uma emulação da percepção e do pensamento. No início, a técnica cinematográfica se restringe à gravação da imagem, deixando o suporte auditivo como anexo à sua expressão. Logo nas primeiras apresentações públicas do ci-nema, recorreu-se à execução de música ao vivo durante as sessões para preencher essa carência.

O que talvez tenha nascido como um mero paliativo para o desconforto da ausência de som, logo se torna mais um elemento expressivo de uma lin-guagem que delineava sua natureza múltipla. Os mesmos parâmetros dra-máticos usados em formas de arte preceden-tes começam a ser aplicados, e o advento da montagem potencializa seus usos. A possibili-

No cinema mudo, a música era um paliativo contra a au-sência de som. Com o tempo, se tornou um importante ele-mento expressivo dos filmes.

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dade de um maior realismo, seja pela apura-ção técnica, seja pela maior familiaridade do público com o meio, não deixa de assimilar es-sas potencializações. Ao contrário, o amadu-recimento da narrativa cinematográfica passa pela maturação dos seus vários aspectos.

Para refletir sobre esse ponto, mais do que ponderações harmônicas e melódicas sobre construção de climas dramáticos, gostaria de pensar em exemplos práticos, destacando cinco momentos comuns aos filmes.

ABERTURA

À revelia de Welles, a suíte composta por Mancini cumpre o papel de favorecer a entra-da do espectador no filme. Contextualiza com a base rítmica, constrói tensão com os temas melódicos e varia harmonicamente com o de-correr da cena. Outros dois exemplos me vêm à mente: As bicicletas de Belleville (2003), de Sylvain Chomet, e Kill Bill - Vol. 1 (2003), de Quentin Tarantino.

No primeiro caso, o número musical funciona como uma espécie de prólogo, introduzindo a estética nonsense da animação. O refrão é repetido pelas personagens-título (do francês, Les Triplettes de Belleville, as “trigêmeas”), intercalando coreografias e passagens instru-mentais absurdas. Logo, o prólogo cede lugar à história, sendo apenas um programa de TV observado pelos protagonistas, Madame Sou-za e seu neto Bruno.

No segundo, há um uso curioso da canção “Bang Bang”, de Sonny Bono, executada ape-

nas pela voz de Nancy Sinatra e uma guitarra cuidadosamente tocada, for-mando um dueto intimista. O prólogo cuida de contextualizar e estabelecer a tensão, apresentando a personagem numa situação extrema e sugerin-

do sua morte, num tiro brusco que conduz à dissolução da imagem para um fundo preto, sobre o qual aparecem o nome do diretor e o

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título do filme. A canção é melancólica e em-presta aos créditos iniciais do filme um clima solene, sempre se relacionando com o prólo-go: My baby shot me down.

TENSÃO

Em qualquer forma narrativa, é a tensão dra-mática que sustenta o interesse do especta-dor. Isto pode ser feito de várias maneiras, sobretudo através da música, que dentro da sua própria estrutura já comporta certas convenções de tensão: tons menores, ritmos marcados, crescente intensidade harmônica. Compositores como Bernard Hermann lidavam muito bem com esses recursos, construindo temas perturbadoramente inesquecíveis (ou inesquecivelmente perturbadores) como a su-íte para Psicose (1960) e tantos outros filmes de Hitchcock.

Um estabelecimento de tensão menos eviden-te, pelo menos a princípio, está no uso de um elemento musical constante no filme, sempre remetendo a um conflito temático intrínseco. A única nota executada no piano em momen-tos-chave de De olhos bem fechados (1999), de Stanley Kubrick, ou a canção preferida de um demônio (“Time Is On My Side”, dos Rolling Stones) em Possuídos (1998), de Gre-gory Hoblit.

DISTENSÃO

A boa dosagem entre tensão e distensão pode ser crucial para manter a plateia interessada. O caráter lúdico da música geralmente fun-ciona bem — é só pensar nos números musicais em filmes como Cantando na chuva (1952), de Stanley Donen e Gene Kelly, e Os irmãos cara-de-pau (1980), de John Landis. Em Brincando de se-duzir (1996), de Ted Demme, há um momento interessante de distensão quando o grupo de amigos, liderados por Willie (Timothy Hutton), cantam “Sweet Caroline” de Neil Diamond

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para a recém-chegada prima do dono do bar, Andera (Uma Thurman). Bill Murray e Scar-let Johanson cantando “More Than This”, de Brian Ferry, num karaokê japonês em Encon-tros e desencontros (2003), de Sofia Coppola, é outro evento memorável, assim como “Tiny Dancer”, de Elton John, resolve um conflito perene crucial em Quase famosos (2000), de Cameron Crowe.

Enquanto lembrança afetiva e técnica, no en-tanto, há um momento que mistura distensão e tensão do qual me lembro sempre que pen-so em música no cinema: a canção de Aimee Mann “Wise Up”, cantada pelos nove perso-nagens principais bem no meio do filme Mag-nólia (1999), de Paul Thomas Anderson.

DESFECHO

É também comum o uso de música na conclu-são de um momento dramático ou mesmo de uma narrativa. Esta conclusão, é claro, pode ser traduzida em triunfo ou derrota, alegria ou tristeza. O tema criado por John Williams para a série dos filmes de Indiana Jones (1981, 1984, 1989 e 2008), de Steven Spielberg, sig-nifica o triunfo do personagem principal na cena, pontuando um movimento para a sua resolução positiva.

Outro desfecho muito lembrado é Ferris Buel-ler (Matthew Broderick), personagem princi-pal de Curtindo a vida adoidado (1986), de John Hughes, celebrando o fim de seu dia de folga em cima de um carro alegórico, cantando a versão dos Beatles para “Twist and Shout”.

Impagável mesmo, no entanto, é a cena final de A vida de Brian (1979), de Terry Jones e do grupo humorístico inglês Monty Python. A música de Eric Idle, “Always Look On The Bright Side Of Life”, tenta dar um pouco de ânimo

ao recém-crucificado protagonista vivido por Graham Chapman, resumindo a essência do humor sarcástico do grupo.

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CRÉDITOS FINAIS

O filme, porém, nem sempre acaba na última cena. A música escolhida para iniciar os cré-ditos finais geralmente direciona uma percep-ção final. Dois exemplos me fazem pensar na propriedade disto.

O primeiro é a música-tema executada pelo Tihuana para o filme Tropa de Elite (2007), de José Padilha. A letra talvez devesse estabele-cer uma isenção ou, no mínimo, uma ambigui-dade moral para o desfecho do filme. O clima todo da música, porém, e o corte brusco para os créditos, dá uma certa sensação de legiti-mação do gesto final de um dos protagonistas, eticamente questionável. Aqui, é mais o clima da música que conta.

Um uso similar, porém, muito mais adequado, justamente por deixar mais clara sua posição, ocorre com “Paint it black”, dos Rolling Sto-nes, para o final do filme de Stanley Kubrick, Nascido para matar (1987). A reflexão em off do protagonista-narrador, aliviado por sobre-viver a uma experiência extrema de guerra, ganha um adicional de desolação na letra depressiva sobre uma base rítmica agressi-va, porém enxuta. Há de se pensar se mesmo esse alívio será o suficiente.

Por fim, mais uma coisa: parece-me que há um certo engano em tomar como verdade a má-xima de que uma trilha sonora ideal é aquela que “não aparece”, ou que é quase impercep-tível. Esta conclusão apressada dá-se ao fato de que uma trilha se encaixa perfeitamente no filme quando é assimilada harmonicamente à sua linguagem, de uma maneira que a cena é lida como um todo, e não em compar-timentos ou chamando a atenção para um ou dois elementos que se desta-cam em relação aos outros. Talvez de-vamos, portanto, reformular a máxima para uma trilha que torna o filme mais perceptível ainda.

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Leo Falcão é cineasta, músico e professor (não necessariamente nessa ordem).

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