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TQP REVISTA Vilão A casa que virou bar e hoje é tradição em Londrina A difícil escolha entre o simples e o exclusivo QUAL O SEU NOME? Profissões do passado desaparecem com o passar do tempo EXTINÇÃO A história de Leonardo, morador de rua há 10 anos PERFIL Ano 1 - Dezembro de 2011

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Produção de Karina Constancio, Guilherme Popolin, Mônica Alves e Marina Dias. (2011)

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Vilão A casa que virou bar e hoje é tradição em Londrina

A difícil escolha entre o simples e o

exclusivo

QUAL O SEU NOME?

Profissões do passado

desaparecem com o passar do tempo

EXTINÇÃO

A história de Leonardo, morador de rua há 10 anos

PERFIL

Ano 1 - Dezembro de 2011

A Revista TQP (Tem que pensar) é a conclusão de um trabalho realizado ao longo de 2011. Durante todo o ano, produzimos textos que envolveram diversas temáticas. No meio da

produção, podemos destacar artigos, crônicas, resenhas críticas e, por último, uma grande reportagem que nos fez trabalhar junto ao jornalismo literário. Também não podemos esquecer da oportunidade de cada estudan-te ter sua própria coluna, escrevendo sobre o que gosta e com maior liberdade estrutural e proximidade com o leitor.

A revista se apresenta para você, leitor, em quatro edi-ções independentes, cada uma feita de acordo com o perfil da equipe de produção. O resultado de uma de-las, você pode conferir aqui. Não viemos nos classificar como isso ou aquilo, o nosso conteúdo faz isso por si só. É uma revista para quem gosta de música, cinema, cultura e comportamento. Para aquele pessoal que não vive de rótulos, mas se deixa levar por aquilo que interessa e se mantém aberto a novas possibilidades.

Desejamos uma ótima leitura. Que ela seja leve e di-vertida, ou, melhor, instigante!

Karina ConstancioEditora Chefe

Expediente:Equipe de Repórteres, Editores e

Diagramadores: Guilherme Popolin, Karina Constancio, Marina Dias e Mônica Alves

Editora Chefe: Karina Constancio

DA REDAÇÃO

Fotos e Ilustrações: Imagens Google

Professor Orietntador: Lauriano BenazziDisciplina: Técnicas de Reportagem e

Entrevista III

ÍNDICE

A tradição do Vilão Bar . 28

DA REDAÇÃO 3. A Revista TQP

CRÔNICAS

11. Estamos a procura. Cadê você?21. O não-pecado25. Darwin quer te adicionar33. Mude ou fique mudo37. Rotina43. De quebrar as pernas46. Pratique já48. O primeiro...de muitos?

COLUNAS

Sua nova banda preferida12. Sua nova versão preferida24. Divas Agora é moda 13. Semanas de moda ou de celebridades35. Novos ares e o mercado de luxo

Não viu ainda?32. Alma em suplício42. The Sound of Music

Cinturas e Saboneteiras 36. O que é beleza para você?47. Mulheres

RESENHAS CRÍTICAS

14. Esquizofrenia Pós-Guerra22. Quase Famosos34. Versão condensada do mundo44. Mas não é verdade

REPORTAGENS ESPECIAIS

6. Qual o seu nome? 16. Profissões em extinção38. A luta pelo semelhante

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REPORTAGEMMÔNICA

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REPORTAGEMMÔNICA

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REPORTAGEMMÔNICA

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REPORTAGEMMÔNICA

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Estamos a procura Cadê você?N

ão está fácil para ninguém. Posso falar, com conhecimento de causa, que nós mulheres te-mos que conviver com um problema que está aí escancarado para quem quiser ver: a falta de

homem! Estatísticas mostram que o número de homens é inferior ao do sexo oposto. Dizem até que a diferença pode chegar a 4 milhões. Quatro milhões: Ok!?! Agora tira daí: os casados, os gays, os que não fazem o seu tipo e aqueles que não querem nada com coisa nenhuma. O número de opções cai significativamente.

As causas disso? Pode ser um problema genético: alguma coisa está dando errado na hora de juntar os cromossomos e sempre entra mais um X ao invés de um Y. Deve ser algo na água, sabe. E o pior é que além de faltar homem, os que estão aí formados – com o X e o Y onde devem estar – nem sempre atendem aos nossos requisitos básicos para um futuro relacio-namento. Ou seja, além do problema de quantidade, entra aí um problema maior que é o de qualidade.

Procura-se: homem solteiro, bonito, inteligente, emprega-do (ou empresário) e que ainda leve a vida com bom humor (coloque aqui aquelas características que não podem faltar para você). Ninguém? Não, mesmo? (…) É, gente está compli-cado. Será que somos nós que estamos muito exigentes?

Espero que não.

Pode ser ingenuidade da minha parte, mas ainda quero um mundo em que possamos escolher o pai dos nossos filhos sem aquela lógica do “se não tem tu, vai tu mesmo”. Sem dar um jeitinho brasileiro porque ele é casado ou não quer casar com você de papel passado. A tão famosa liberdade inclui, princi-palmente, a liberdade de escolha. E para se ter essa liberdade, precisamos de opções.

Aliás, pode ser que a liberdade, na verdade, nos atrapalhe. Na época dos nossos avós, quando a liberdade de escolha era pequena ou até nula parece que os casamentos davam mais certo. Pelo menos, aparentemente. Os casais se arranjavam conhecendo um pouco um do outro e, agora, completam bo-das de ouro com filhos, netos e até bisnetos, que podem não viver essa mesma realidade.

Estranho, né? Também acho. Esse assunto merece um aprofundamento muito maior do que eu posso dar, mas de uma coisa podemos ter certeza. O mundo mudou, nós muda-mos e parece que a coisa ficou mais difícil. Toda essa dinâmica do relacionamento exige de nós um comportamento bastante diferenciado do anterior. A liberdade nos exige o conheci-mento. Conhecer, palavra relativamente pequena, mas que é bastante complicada de ser aplicada. Implora que os dois en-volvidos estejam abertos para que ela ocorra.

Alguém disponível?

por Karina Constancio

CRÔNICA

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COLUNA

Sua nova banda preferidapor Marina Dias

Hoje vamos falar de versões. Não covers, versões.

Bom, na minha definição (ui!) fazer uma versão de uma música é fazer uma re-leitura, transformar. E cover é o que tem a pretensão de ser igual ao original (mas quase sempre é pior). Então essa é uma lista de bandas que fazem versões.

Não, nada a ver com cinema. Nou-velle Vague é um projeto francês onde vários músicos se juntam para fazer versões de clássicos do punk e do new wave. Começa a música, um violãozi-nho com cara abertura de novela do Manoel Carlos, então uma voz doce começa a cantar meio sussurrado: “God save the queen/her facist regi-me/it made you a moron/a potential H bomb”. Nouvelle Vague transforma bandas como Sex Pistols, Clash, The Cure, New Order, Buzzcocks e Cramps em bossa nova. E não é que dá certo?

2. Nouvelle vague

1. PomPlamooSeSó vendo para entender. Pompla-

moose é uma dupla que faz videoson-gs. Eu explico: tudo que você ouve é o que aparece no vídeo (as versões são lançadas no Youtube). Então se na versão de Single Ladies, da Beyonce, dá pra ouvir várias vozes femininas, o vídeo mostra três imagens simultâne-as de Nataly Dawn. Se na introdução de Beat It, do Michael Jackson, dá pra ouvir um piano e um bumbo, no vídeo aparecem imagens simultâneas de Jack Conte – a outra metade do Pom-plamoose – tocando cada um dos ins-trumentos. Não entendeu nada? Joga no YouTube.

3. PuPPiNi SiSterSBlondie, Destiny’s Child e The Ban-

gles em versão anos 40, na voz de três moças. Bonito de ouvir. De clás-sicos dos anos 40 a grandes sucessos das pistas, como “I will survive”: tudo fica com cara de saloon, num ritmo inspirado em jazz, swing e big bands americanas. Aqui em Londrina, temos as Cluster Sisters, que fazem um som bem nessa linha das Puppini Sisters.

4. the BaSeBallSTrês moços, músicas recentes em versão rockabilly. Quase uma versão mas-

culina das Puppini Sisters. Os moços são da Alemanha e lançaram seu primeiro disco em 2009. Strike! foi relançado em 2010, como Strike! Back! Este ano, o lançamento é Strings ‘n’ Stripes. Entre as versões, Umbrella, de Rihanna, Hot ‘n’ Cold, de Katy Perry e Crazy in Love, que também tem uma versão feita pelas Puppini Sisters.

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COLUNAMÔNICA

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RESENHA CRÍTICA

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O filme “Boa Noite, e Boa Sorte” (Good Night, and Good Luck) foi lançado em 2005 e dirig-ido por George Clooney. Retrata o período de “caça às bruxas” realizada pelo senador

Joseph McCarthy, época que ficou conhecida também como Macartismo. O senador investigava e punia os simpatizantes e participantes do movimento comuni-sta. O filme, mostra o ano de 1953, quando o jornalista Edward Murrow (David Strathairn) e seu produtor Fred Friendly (George Clooney) transmitem reportagens con-tra a política do senador McCarthy pela rede de televisão CBS. A famosa frase de fechamento de Murrow em seu progama, “Boa noite, e boa sorte” significa boa sorte aos americanos frente ao Macartismo. Por seu forte apelo e impacto serviu também de título ao filme de Clooney.

Edward Murrow e Fred Friendly acreditavam nas liberdades fundamentais americanas, e viam no sena-dor Joseph McCarthy a figura de um homem que bus-cava destruir as liberdades genuínas do povo em causa

Esquizofrenia pós-Guerra

própria. McCarthy destruía os outros com mentiras, mas em seguida ele próprio foi destruído pela verdade. Murrow, jornalista veterano com uma carreira sólida, foi acusado por McCarthy de participar de grupos subver-sivos, após fazer denúncias sobre o Macartismo. O jor-nalista obteve apoio dos produtores, repórteres e dos líderes da rede CBS, apesar de perder patrocinadores.

Uma das críticas à Murrow era sobre a perca da objetividade em seus comentários. O jornalista nada mais fazia do que argumentar e relatar os fatos. Nos últimos anos, poucos repórteres ousaram assum-ir uma posição semelhante à de Murrow. Nos EUA, no auge do furacão Katrina, alguns repórteres de campo, sentiam que a linha das declarações do gov-erno não eram condizentes com o que estava acon-tecendo, e falavam sobre isso em suas reportagens.

Clooney co-estrela seu próprio filme, como Fred Friendly, produtor de Murrow. Ele e Murrow compartil-ham as mesmas crenças sobre McCarthy, e estão cientes

do risco que correm pelas denúncias e reportagens contra o senador. O outro personagem principal é o próprio McCa-rthy. Clooney emprega imagens de noticiários reais de McCa-rthy, portanto, desempenha a si mesmo. É assustador vê-lo em discurso completo, e patético vê-lo perto de colapso du-rante as audiências do Exército-McCarthy.

Política e a polêmica da notícia como negócio se tornam a atmosfera domi-nante. O filme é quase claustrofóbico, sentimento potencializado pela escolha da gravação em preto e branco. O roteiro conta também com a história paralela de Shirley e Joe Wershba (Patricia Clarkson e Robert Downey Jr.), que trabalham para a CBS News e mantêm seu casamento em segredo, porque a política da empresa proíbe o emprego de casais casados.

Além do casal, o filme é inteiramente sobre a vida inte-rior da CBS News. Cada se passa no edifício da CBS, com ex-ceção de um banquete, um bar, um quarto e as imagens de noticiário. Murrow e Friendly circulam em três espaços: seus escritórios de produção, o estúdio de televisão e os escritóri-os de seu chefe William Paley (Frank Langella), que dirigia a rede com mãos de ferro, mas concedeu independência e liberdade à Murrow, cedendo à pressão dos anunciantes.

O filme não é uma obra que mostra apenas os abusos de McCarthy, mas sobre o processo pelo qual Murrow e sua equipe passam na produção do noticiário. É um jogo que os jornalistas devem aprender a se comportar. Há pequenos

momentos de humor. Depois de uma transmissão repleta de perigos potenciais, Murrow espera até que ele esteja fora do ar e então não há o menor movimento possível de sua boca. Muitos discutem se poderia ter sido quase que um sorriso. Os sentimentos de Murrow são revelados quase em código.

Como diretor, Clooney faz coisas inter-essantes. Uma delas é a gravação em preto e branco, escolha certa para autenticar um período de factual. As cenas são separadas por uma cantora de jazz (Dianne Reeves), que é vista cantando em um estúdio. Suas músicas evocam um tempo de lounges ao som do piano, bebidas e muitos cigarros.

Além de recontar um período polêmico da história norte-americana, Clooney se dirige ao então governo atual de George W. Bush, presidente dos EUA na época em que o filme foi lançado. Bush tentava ofi-cializar leis para permitir a vigilância de seus cidadãos em nome da luta contra o terrorismo, cujo caminho mais curto seria a manipulação da liberdade de imprensa.

Boa Noite, e Boa Sorte é um filme político e artístico que defende a liberdade de imprensa e a liberdade democrática. Clooney faz o passado e presente dialogarem, na contramão das produções de Hollywood. O filme serve como tentativa de interromper que soviéticos, latino-americanos e outros pov-os apareçam como vilões em jornais, livros e filmes. O discur-so final aborda questionamentos sobre uma mídia que tenta transpor a mente do telespectador. E isso continua até hoje.

O filme serve como tentativa de interromper que

soviéticos, latino-americanos e outros povos apareçam

como vilões em jornais, livros e filmes

Como diretor, Clooney faz coisas interessantes. Uma delas é a gravação em preto e branco

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Profissões em

extinçãoPor Guilherme Popolin

Atividades comuns durante todo o

século XX tendem a desaparecer em decorrência do modo de vida contemporâneo

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O sociologo Max Weber já dizia que o trabalho dignifica o homem, lá no sé-culo XIX. O trabalho, ou a realização de tarefas, faz parte da natureza humana

na busca pela sobrevivência. Sobreviver em tem-pos mais remotos, significava caçar, colher frutos e legumes ou pescar, para garantir a alimentação do dia, e assim, seguir com a luta diária contra ani-mais ferozes e adversidades climáticas que mina-vam a vida dos homens de uma hora para a outra.

A evolução da espécie apenas mudou a for-ma, mas a busca pela sobrevivência continua até hoje. Com o desenvolvimento da cultura e a es-truturação da sociedade baseada nas divisões de gênero, as tarefas do dia-a-dia se segmentaram. Sobreviver, hoje em dia, significa ganhar dinheiro para garantir condições básicas e dignas de vida.

Inúmeras foram as profissões que surgiram ao longo da história humana. Algumas resistem até hoje, e outras, simplesmente desaparece-ram. As múltiplas profissões presentes na socie-dade são vulneráveis à mutação constante das

necessidades da sociedade. Após a Revolução In-dustrial, a mecanização e a evolução da produ-ção em série, muitas tarefas realizadas manual-mente foram erradicadas pra sempre. Extintas.

Uma das primeiras necessidades, sentida pelos homens primitivos, foi a de proteger os pés das bai-xas temperaturas, insetos e pedras presentes no solo. Não é possível afirmar quando o primeiro sa-pato foi produzido. Feito, provavelmente, com pele de animais não se parecia muito com o que conhe-cemos hoje como sapato, mas a função primordial era a mesma. Além da proteção dos pés, nossos an-cestrais conseguiram correr mais rápido e com mais segurança ao fugir de predadores ou durante a caça.

No princípio dos tempos a mente do ser hu-mano se desenvolvia no ritmo da evolução nas necessidades. Os objetos que facilitavam o dia a dia foram surgindo. É o caso da agulha, que teve grande contribuição na história dos sapatos. Com ela, os pedaços de pele foram reunidos e ajusta-dos para melhor o encaixe nos pés de seus donos.

O conceito primordial sobre sapatos mudou

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desde sua invenção. Hoje, ao pensar em sapatos, pensamos em estilo, moda, tendência, fetiche, e por último, a necessidade de proteger os pés. As grandes indústrias de calçados e a globalização mu-daram os hábitos da população. Algumas pessoas resistem e ainda procuram consertar um sapato an-tigo antes de comprar um novo. E assim, uma das profissões mais clássicas do mundo resiste e tenta sobreviver em meio às rápidas mudanças de há-bitos e transformações tecnológicas: o sapateiro.

O sapateiro Sebastião Picotti, 68, dono de uma sapataria na cidade de Rolândia, a cerca de 20 km de Londrina, trabalha há mais de meio sécu-lo produzindo e consertando calçados. Acompa-nhou todas as mudanças que aconteceram duran-te todo esse tempo. Aos 15, começou a trabalhar em uma sapataria que hoje não existe mais, onde aprendeu o ofício e as técnicas da profissão. Co-meçou aos poucos, com alguns consertos simples. Depois, passou a fazer algumas botinas e sapatos personalizados sob encomenda. Mais tarde foi para o exército, e quando voltou começou a trabalhar em outra sapataria. Foi sua primeira e única car-teira assinada. Logo depois, o senhor orgulhoso

de sua história, abriu seu próprio estabelecimento e passou a ter total autonomia em seu trabalho.

Seo Picotti, como é conhecido e chamado pe-los conhecidos da cidade, percebeu que com a popularização das lojas que vendem calçados industrializados o movimento começou a dimi-nuir. A fabricação de sapatos feitos à mão pre-cisou terminar, Seo Picotti percebeu que era humanamente impossível concorrer com as má-quinas das indústrias. Ficou só com o conserto.

A qualidade dos produtos industrializados é bai-xa e inferior. Plástico e tecidos sintéticos, unidos so-mente por uma cola, não chegam perto dos materiais usados por Seo Picotti quando montava de forma ar-tesanal os sapatos das encomendas. A qualidade era ótima e garantida, como ele mesmo diz. Na época em que os jovens usavam sapatos no estilo social, e tênis era raro e artigo de luxo, o movimento e a quan-tidade grande de trabalho na sapataria era grande.

“Os velhos vão morrendo, e os mais jovens não se interessam por isso”. As palavras de Seo Picotti refle

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tem a realidade não só do sapateiro, mas de outras profissões. Além da falta de interesse e da facilida-de da compra de produtos novos, o principal motivo do ofício de sapateiro caminhar para a extinção é a falta de novos profissionais exercendo a atividade.

Seo Picotti transformou um dom em profissão. Para o sapateiro, o que ainda sustenta o ofício são os clientes que viraram amigos. Muita gente que ele atende até hoje são os mesmos que há mui-tos anos. Laços de amizade se formaram, o que deixa o cliente mais fiel. O vínculo do profissional com o cliente, principalmente quando se tem o respaldo de vários anos, é considerado pelo bar-beiro José Gomes do Nascimento, 80, como fun-damental para se manter na profissão há 54 anos.

Nascimento repetiu a história de milhões de bra-sileiros: cresceu no interior de Pernambuco, sofreu com a seca nordestina e deixou toda a família para vir ao Estado do Paraná há cerca de 60 anos em busca de melhores condições de vida. Passou por algumas cidades, trabalhando na lavoura dos mais variados tipos de cultura. Levava duas profissões ao mesmo tempo: peão e barbeiro. A última, que servia para complementar a renda aos finais de semana, apren-deu com o pai e os tios, ainda em seu estado de origem.

No início da década de 60, chegou a Rolândia/PR e começou a trabalhar em um salão. Em 1962, ad-quiriu o seu próprio estabelecimento, onde traba-lha até hoje. Se orgulha ao dizer que criou os filhos e sustentou sua casa apenas com a renda do salão.

O barbeiro, que em toda sua carreira fez apenas dois cursos, como o de técnico de cabeleireiro do SESC -Londrina, é aposentado, mas continua traba-lhando porque gosta do que faz. Com tantos anos na mesma profissão, Nascimento avalia que hoje vivemos em uma época de imediatismo, em que o tempo, muitas vezes, vale mais que qualidade. Para

ele o número de clientes antigos também é maior. A maioria são os mesmos há muito tempo. Difícil um jovem procurar um barbeiro, ao invés de um salão de cabeleireiro e muitos fazem a barba em casa. Para o barbeiro, isso acontece por que hoje os salões de cabeleireiro investem e oferecem vá-rios outros serviços. Muita gente pensa que bar-beiro é só para fazer a barba. Isso restringiu ain-da mais o público, que antes era apenas formado por homens, mas hoje, vão somente os mais velhos

Profissões e profissionais diferentes sempre os-cilarão entre o popular e o que está fora de moda, dependendo das necessidades e da cultura de cada sociedade. Sapateiros, alfaiates, barbeiros, en-tre outros ofícios tão comuns no século XX, estão desaparecendo, como consequência de uma for-ma de encarar o mundo em que somente o que é novo e moderno é valorizado. Mas, não são ape-nas profissões que estão sendo extintas e esqueci-das, o talento do homem e o contato pessoal têm cada vez menos espaço em uma sociedade em que, principalmente os mais jovens, só estimam pelo o que é imediato, cômodo e padronizado.

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CRÔNICA

por Marina Dias

CRÔNICA

o não-pecadoPorque é uma grande sacanagem classificar uma coisa

tão boa como pecado

Queria entender porque a gula é um dos sete pecados capitais. Pecado é sacanear os outros,

não oferecer chocolate pro amigo, falar de comida boa quando o colega do lado tá com o estômago roncando. Pecado é falar que é pecado saborear um pão doce e me-lequento feito com todo o amor do mundo por uma bondosa senhorinha de oitenta e tantos anos.

Porque a pessoa nasceu numa família onde o que cozinha mais ou menos bem faz a melhor bacalhoada de todos os tem-pos. Como faz pra explicar pra um ser des-ses que gula é pecado? A criança aprende a socializar nos almoços de domingo, acei-ta até o pão remelento que o mendigo que passa na rua oferece. Cadê o pecado? Pe-cado é colocar abobrinha na pizza.

Pecado é viver de regime, ter distúr-bio alimentar, doença celíaca. Pecador foi quem inventou as papinhas de bebê indus-trializadas, junto com as mães que juram que a criança consegue viver só disso. Te-nho dó daquelas crianças amareladas que nunca provaram nada feito em casa. Peca-do é sair descobrindo doenças e mais do-enças relacionadas à alimentação. Pecado é essa perseguição que sofrem as frituras, coitadas.

Vai perguntar pra sua avó – aquela se-nhora saudável, forte, lúcida e que ainda vai enterrar um monte de gente – o que mais se usava na cozinha na época dela. Banha de porco. Olha lá a Velha Guarda da Portela. Um bando de centenários criados a torresmo. Tão aí, firmes e fortes, sam-bando. Pergunta se lá tem algum macrobi-ótico. Não tem.

Pecado é essa moçada de hoje não saber fritar um ovo. As vovozinhas vão morrer e levar pro túmulo todas as melho-res receitas do universo. Não vai ter mais nada. Mas enquanto isso, deixa o pessoal comer. Todo mundo vai morrer mesmo. E é bem melhor morrer de comer do que mor-rer de raiva ou ganância. W

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RESENHAMÔNICA

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RESENHAMÔNICA

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COLUNA

Sua nova banda preferidapor Marina Dias

Se você não aguenta mais Lady Gaga e Beyoncé le-vando a fama de gran-

des cantoras do nosso tempo, não fique triste. Nem tudo está perdido. Tem uma mulherada cantando muito por aí. Cantando mesmo. Sem bizarrices, grandes espetáculos ou bundas à mostra. Segue uma lista de moças que merecem a sua atenção:

Florence está famosa. “Dog Days Are Over” é hit. Funciona tanto no meu des-pertador quanto em pista de festa indie. Florence estourou com o primeiro disco, Lungs (2009) e neste ano lançou “Ce-remonials”. O “The Machine” do nome refere-se à banda que toca com a canto-ra, formada por talentosos multi-instru-mentistas.

2. FloreNce+the machiNe

1. adeleTalvez você já conheça, porque “Set

Fire to the Rain” é a melhor música para cantar a plenos pulmões de 2011. Se você não conhece, Adele tem 23 anos e dois discos lançados. Adele é a prova de que músicas bonitas saem de cora-ções partidos. Não vou mentir: ao es-cutar “21”, o último disco, bate até uma depressãozinha, mas a voz da moça faz valer a pena.

3. vv. BroWNV. V. Brown veio do soul, mas tem

algo pop. Impossível escutar “Crying Blood” e não ter vontade de dançar por aí. V. V. Brown tem cara de anos 50, voz poderosa e por mais que as influências de soul sejam claríssimas, a música é atual. “Travelling like the light” (2009) é um disco para ouvir no repeat. No ano que vem, a cantora lança “Lollipops and Politics”. O primeiro single, “Children” é deliciosamente pegajoso.

4. eliZa doolittleSe isso fosse uma lista de “o que es-

cutar no verão”, Eliza Doolittle estaria aqui. Deve ser por isso que faz tanto sucesso na Inglaterra, seu cinzento país de origem. A música de Eliza é ensola-rada, tem cara de praia, piscina, tarde no parque, férias. Quem não conhece pode começar por “Pack Up”, que tem a participação de Lloyd Wade e uma bela banda de R&B.

5. caro emeraldMinha descoberta musical preferida dos últimos tempos.

Caro Emerald é holandesa e lançou seu primeiro disco – “De-leted scenes from the cutting room floor” – no começo de 2010. Tem um pouco de jazz, soul e alguma coisa de tango. Na banda, os clássicos instrumentos de sopro dividem es-paço com um DJ. Caro Emerald se veste como as divas de Hollywood dos anos 50 e cita Clark Gable e Fred Astaire em “That Man”, uma de suas melhores músicas.

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VILÃO

A casa que virou bar

| POR_KARINA CONSTANCIO| FOTOS_ANNA THEODORA

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Lembro da primeira vez que fui ao Vilão. Não faz tanto tempo assim, mas algumas coisas já foram esquecidas e muita coisa mudou. Não podemos di-zer o mesmo do lugar, há 33 anos o Vilão é desse

mesmo jeito que a gente conhece e continua na Rua Sergipe, entre a Belo Horizonte e a Santos. De fora, ninguém fala que é um bar e pode passar desapercebido por quem anda sem prestar muita atenção ou na correria dos tempos modernos. O motivo é que na frente fica a casa do proprietário do bar, o em-presário Willian Amador Bueno de Moraes, aliás dono do local pelos mesmos 33 anos de existência. Quem, como eu, também fica curioso para saber o que o espera além daquele portão e toma a decisão de ultrapassá-lo, se depara com um universo pouco usual.

Até chegar ao bar propriamente dito, percorremos um ca-minho todo ajardinado, como se fosse um labirinto, mas sem a opção de se perder. Algumas mesas colocadas em pontos es-tratégicos nos dão a possibilidade de beber um vinho ou sabo-rear algumas das delícias da casa à luz da lua. Se você quer algo mais intimista, é convidado a ir mais ao fundo.

Ao entrar no bar do Vilão, é como se você fizesse uma viagem no tempo. A decoração o leva para algumas décadas passadas. Peças antigas, centenas de vinis, meia-luz e o som ambiente com jazz e blues - saídos do mesmo aparelho Quasar que inaugurou o recinto - nos dão a sensação de estar em um daqueles pubs londrinos. Na parede, relógios. Muitos. De to-dos os tamanhos e peculiaridades.

Os objetos são um show a parte, a maioria bem antigos e esquisitos. Podemos ver desde o telefone preto saído da déca-da de 60, a máquina registradora que fica no caixa até o, já cita-do, gramofone responsável pela música que embala a viagem. Na ponta do balcão, há um castiçal que guarda parafinas de 15 anos de queima de velas. Não tem como observar tudo de uma vez só e isso, talvez, seja o diferencial do lugar. A cada ida ao Vilão você se surpreende e descobre novos detalhes.

O clima acolhedor e aconchegante do espaço, transformam o bar em um lugar perfeito para curtir a companhia. Por isso, muitos o consideram como lugar de casal. E, realmente, é um ótimo programa para aproveitar a dois, mas essa visão é um tanto quanto simplista. O ambiente também é o ponto certo para relaxar com os amigos, ouvindo boa música e com a ga-rantia de bebida e comida para todos os gostos. Quem sabe até para o tradicional “aquece” pré-balada?

Nessas três décadas que o Vilão faz parte da vida dos lon-drinenses, muitas histórias não serão esquecidas e tem uma história, particularmente, que merece ser contada: a do pró-prio Willian. Não tem como falar sobre o Vilão, sem falar do homem atrás do balcão. A trajetória da vida do empresário vai de encontro e se mistura com história do bar.

Há 33 anosO Vilão é um dos bares mais tradicionais de Londrina, faz

parte da cidade e da vida dos londrinenses há 33 anos. O dia 24 de janeiro de 1978, inauguração do Vilão, não foi escolhi-do por acaso, era a data de aniversário da primeira mulher de Willian. Lilian é natural de Rolândia, conheceu Willian em São Paulo - ambos trabalhavam na Avon - e foi uma irmã dela, dona

de uma escola de inglês por aqui, que sugeriu ao casal que se mudasse para Londrina a fim de tratar melhor da bronquite as-mática da primeira filha, Júlia.

A cunhada sugeriu que ele abrisse um bar porque “em Lon-drina não tinha bar”. “Na verdade, até tinha, era um cantinho na frente do Mater Dei, mas pessoas ficavam na frente do bar. Dentro do bar mesmo não tinha ninguém”, conta Willian. A ideia, então, era montar um negócio onde as pessoas fossem para dentro do bar.

Ele queria abrir um bar diferente daqueles convencionais, de preferência em “algum lugar esquisito, com porão”. Pelo menos diferente dos padrões brasileiros. O Vilão vai de en-contro com o formato do pubs, algo bastante inovador para época. Desde a escolha da casa na Sergipe até a decoração do lugar servem pra confirmar que o objetivo inicial foi alcançado. Willian revela que o grande segredo do bar é iluminação. Ela não agride e nem compete com demais elementos do espaço. Ao contrário, é o convite para se deixar levar por esse universo que envolve o Vilão.

A decoração é mesma, nunca mudou. “Só vou acrescentan-do algumas peças que eu ganho.” Para Willian, a decoração é como se fosse uma história em quadrinhos, cada cantinho é di-ferente e transmite uma sensação diferente. Eu acrescento que no todo cada quadrinho se completa. Quem repara no lugar, diz com certeza que tudo aquilo foi pensado previamente.

“Ao entrar no bar do Vilão, é como se você fizesse uma viagem no tempo. A decoração o

leva para algumasdécadas passadas. Peças

antigas, centenas de vinis, meia-luz e som ambiente

com jazz e blues”

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Willian garante que não. “Eu arrumo soluções para aquilo que tenho na mão. Muita coisa aqui foi pegada do lixo ou veio por doação. Sempre vejo possibilidade em tudo, até no bura-co”.

Esse pensamento de Willian contribuiu para que o Vilão per-manecesse no quadro de bares da cidade e, mais ainda, com o destaque e reconhecimento merecido. Toda obra bem sucedi-da, tem um mentor.

O homem atrás do balcão“O bar me deu três mulheres e muitas alegrias” . Paulistano,

publicitário, avô e pai de 6 filhos. O filho mais novo é apenas alguns meses mais velho que seu único neto. Inteligente, visio-nário e com um humor ácido, Willian é quem administra o Vilão desde sua inauguração. Está ali porque gosta. Já pensou em lar-gar tudo e seguir outro caminho. “Mas eu ia fazer o quê? Não seria tão feliz como sou hoje”.

Tem uma vida diferente. Não assiste televisão por esses mes-mos 33 anos. “Essas coisas só servem para alimentar ilusões”. Ele vive o real. Logo bem cedo já vai fazer as compras do dia. Dorme durante a tarde. Lê jornal quando dá tempo. Por volta das18h, vai para o Vilão e fica lá até de madrugada, depende do dia e do movimento.

Trabalha sentado em uma cadeira de barbeiro da marca Fer-rante. Um pouco acima tem um objeto onde ele pendura brin-cos que as mulheres, por uma razão ou outra, perderam no bar. Cada brinco, uma história que dentre muitas Willian já presen-

ciou. As que ele mais se diverte são, sem dúvidas, as brigas de casais. “Teve uma mulher que chegou aqui, o cara estava con-versando comigo. Ela olhou pra ele, olhou pra mim, olhou pro copo e olhou pro celular. Eu pensei: vai jogar o celular dentro do copo. Não. Ela pegou o copo e jogou a bebida em cima do cara”. Ele conta que isso acontece direto e que já fica esperto quando vê esse tipo de movimentação. “Eu já vou fechando a conta”.

Mas nem tudo são brigas, muita gente também se conheceu no Vilão. Willian já perdeu as contas de quanto casais se forma-ram no seu bar. “Até hoje vem gente aqui tirar fotos, trazer os filhos. É muito legal”. E a tradição de família não está envolvida apenas com os clientes. A atual cozinheira é filha da primeira cozinheira que o Vilão teve.

O segredo da tradição, para Willian, é o trabalho. “As pes-soas ficam esperando as coisas acontecerem, mas nada cai do céu. Tudo vem por meio do trabalho. Trabalho é o que funcio-na”. Segundo ele, é por isso que muitos bares não dão certo. “As pessoas querem ganhar dinheiro fácil e bar dá trabalho. Dá muito trabalho”.

Willian também não deixa tudo a cargo da tradição, está an-tenado com o o mundo a sua volta. Ele não nega a importân-cia de ir se adaptando com o tempo, pois as coisas mudam e é necessário acompanhar essa mudança. “Inovar, mas sempre mantendo a tradição, as pessoas gostam disso. Elas vêm aqui e querem aquele mesmo beirute que eu faço há 33 anos. Casa da mãe, sabe? E quem não gosta da casa da mãe?”

Willian Moraes: “O bar me deu três mulheres e

muitas alegrias”

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Por guilherme PopolinFotos: Google

Roteiro turbulento

Lançado em DVD recentemente, “Alma em Suplício”, tem como personagem principal Mildred Pierce (Joan Crawford), homônimo do título original. Mildred é uma dona de casa dedicada e separada, que não mede esforços para garantir o bem estar das filhas, sobretudo, da mais velha, Veda Pierce (Ann Blyth). A relação entre mãe e filha é tão forte, que ambas desejam o mesmo homem, Monte Beragon (Zach-ary Scott), sedutor e sócio de Mildred no ramo dos restaurantes – que são um suces-so. Se tudo vai bem na vida profissional, a vida pessoal é cheia de turbulências. Mil-dred perde a caçula, Kay Pierce (Jo Ann Marlowe), vítima de pneumonia, precisa administrar os negócios e lidar com a outra filha, ambiciosa e egoísta. Quando Mildred descobre a relação que Veda mantém com Monte Beragon, que aparece morto no início, assume para si a culpa da morte.

Renasce uma estrela

Apesar de um roteiro instigante e uma direção brilhante, o grande trunfo de “Alma em Suplício” é a atuação de Joan Crawford. Com a carreira estagnada, aos 41 anos, a atriz relançou sua carreira e marcou o seu nome definitivamente na história do cine-ma ao ganhar o Oscar de melhor atriz, em 1946, após viver Mildred Pierce na telona. O elenco de coadjuvantes contribui, mas o mérito é unicamente de Joan Crawford, com uma atuação forte, intensa e cativante.

Não viu ainda? A explicação

A partir da coluna de hoje vocês acom-panharão algo diferente. O nome “Não viu ainda?” tem mais sentido quando falamos de clássicos, aqueles filmes que todos de-veriam assistir, por um motivo ou outro. Quem nunca perguntou ou ouviu essa per-gunta quando o assunto era algum filme daqueles marcantes, eternos e que nunca perdem o brilho, passe o tempo que for? É claro que existem aqueles considerados pela crítica, ou pela grande maioria, como “clássicos”, mas que não é para você. Além das qualidades técnicas e inovações, um filme ganha esse mérito quando ele te en-volve, marca um momento e emociona.

Alma em Suplício

É difícil encontrar um filme que prenda a sua atenção do começo ao fim. “Alma em Suplício” (Mildred Pierce), de 1945, dirigido por Michael Curtiz - que também dirigiu Casablanca,de 1942 – apresenta um diretor ousado logo no início.A primeira cena mostra o clímax da história,choca os mais fracos e envolve os mais curiosos. E surge uma perguntaSerá que o filme vai ter elementos suficientes para manter o inter-esse e atenção de quem assiste até o fim? A resposta é: Sim. A trama se desenvolve em meio a flashbacks, empolgante e com uma surpresa atrás da outra. A fotografia em preto e branco e a estética film-noir, torna o filme ainda mais atraente.A primei-ra cena mostra o clímax da história, choca os mais fracos e envolve os mais curiosos.

COLUNA

Não viu ainda?

CRÔNICAMÔNICA

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CRÍTICA

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versão condensada do mundoem seu primeiro livro, a jornalista vanessa Bárbara conta a história - e as histórias

- do terminal rodoviário do tietê, o maior da américa latina

O Livro Amarelo do Terminal (Cosac Naify, 2008) é uma livro-reportagem sobre o

Terminal Rodoviário do Tietê. Trata-se do trabalho de conclusão de curso da jornalista Vanessa Bárbara. O TCC não só virou livro como ganhou o Prêmio Jabuti. Vanessa conta em detalhes a história, o cotidiano e as histórias do maior terminal rodoviário da América Latina.

Nascida em 1982, a jovem autora também é colaboradora da Revista Piauí, colunista de televisão na Folha de São Paulo e editora do almanaque virtual “A Hortaliça”. Em 2008, lançou em parceria com Emílio Fraia o livro “O Verão de Chibo”.

Vanessa trata o terminal como “uma versão condensada do mundo” e explora muito bem todos os funcio-nários, passageiros, divisões, seções, plataformas, almoxarifados e a lingua-gem do lugar. O livro vai da história do terreno onde foi construído o ter-minal até diálogos entre passageiros que a autora ouve durante o tempo em que se infiltrou no lugar.

Os relatos dos passageiros e fun-cionários se misturam com os relatos da autora, que passa de observadora a personagem da história. Com uma narrativa leve e engraçada, Vanessa

tas de um papel de baixa gramatura, fazendo referência às passagens de ônibus antigas e às paginas amarelas das listas telefônicas, onde as pessoas buscam informações. Para os capítu-los que descrevem a construção, inau-guração e consolidação do terminal, é usado papel branco auto-copiativo, com referência ao papel mimeogra-fado.

Além do material usado para a im-pressão do livro, o texto também tem interferências gráficas. Recortes de jornais e livros, citações grifadas, tre-chos escritos em fontes que simulam tintas de carimbos.

Todos esses detalhes fazem o ter-minal saltar aos olhos do leitor. A des-crição da movimentação no Carnaval e no Natal, a fala das atendentes, o andar cansado dos passageiros, tudo fica perfeitamente visível. Mérito da narrativa envolvente combinada com os recursos gráficos, que ressaltam o que é contado.

Bárbara acaba se identificando como parte daquele pequeno universo que constrói em sua reportagem.

O projeto gráfico do Livro Amarelo do Terminal pode facilmente ser usa-do como argumento contra os e-books e tablets. O ditado de não julgar o li-vro pela capa, cai por terra. É um livro amarelo, com uma capa cheia de cola-gens de bilhetes, manchetes, placas e avisos. Quase uma síntese gráfica do conteúdo.

As páginas – amarelas – são fei-

por Marina Dias

ServiçoO Livro Amarelo do TerminalAutora: Vanessa BárbaraEditora: Cosac NaifyAno: 2008253 páginasPreço: R$ 48,00

Div

ulga

ção

COLUNA MÔNICA

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COLUNA

O que é beleza para você?Apesar de ser um termo bastante discutido e utilizado

por nós no cotidiano, é uma pergunta difícil de ser respon-dida. Estamos a todo tempo classificando o que é belo, o que é feio, aquilo que agrada ou desagrada nosso olhar. Porém, o conceito que julga coisas concretas se mostra um tanto quanto subjetivo.

Ditadura do beloCultivamos uma noção de belo que nos é imposta até

de modo imperceptível. Somos obrigadas a buscar inces-santemente aquele corpo magro, sequinho e sem celulites. A ter um cabelo bom, uma pele de pêssego e um bumbum durinho. Haja fôlego, haja dinheiro para manter esse cor-pinho. Quem disse que isso é bonito? Com certeza alguém que não tem noção do quanto é difícil estudar, trabalhar, cuidar da casa e ainda no fim do dia arranjar tempo para hidratar o cabelo, fazer as unhas e ir à academia.

A beleza ideal. Isso existe?Não estou falando para gente liberar geral e sair toda tra-

balhada no desleixo pela rua. Ao contrário, devemos, sim, nos sentir bem e a vontade com nossa aparência. Eu sei que isso faz bem e deixa a gente feliz. O que está errado é achar que para ser bonita a gente tem que ter o corpo e o rosto das “Angels” da Victoria’s Secret. A beleza é muito mais que o parecer. Também está intimamente ligada ao sentir.

por Karina Constancio

Cinturas e Saboneteiras

Pela beleza realO primeiro passo para ser bonita, é se sentir bonita. E

para isso não é preciso de muito. Olhe no espelho, o que você mais gosta em você? Valorize. O que você menos gos-ta? Disfarce. A moda está aí para ser nossa aliada, não nossa inimiga. Sabe aquele batom vermelho? Aquele salto bafôni-co? Eles podem ser a pílula instantânea de auto estima. Você não é bonita, é linda! Com suas qualidades e defeitos, de tpm ou exalando bom humor. Espalhe essa ideia.

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CRÔNICA

RotinaO hábito de lembrar e refletir no dia a dia

Acordou com o desper-tador fazendo o seu show diário, irritante como sempre. Cochilou

um pouco, levantou, tomou seu café, escovou os dentes, se trocou e partiu rumo ao ponto de ônibus. Enquanto esperava, conectou os fones de ouvido em seu aparelho de mp3 e apertou o play. No dia anterior tinha adicionado músicas “novas”, porque não aguen-tava mais ouvir as mesmas canções há três meses.

Antes que começasse a tocar a pri-meira, o ônibus chegou. Entrou, car-regando sua bolsa como se fosse um fardo pesado, e tudo que mais queria na vida era um banco para se sentar. Encontrou lá no fundo, ao lado de uma senhora, um que estava desocupado. Acomodou-se e, finalmente, começou a ouvir suas canções.

E aconteceu mais uma vez. A trilha de sua infância tocava e remetia ao tempo mais feliz de sua vida. As lem-branças chegavam aos poucos, acom-panhadas de lágrimas nostálgicas. O primeiro dia na escola, as tardes na casa de sua avó e as brincadeiras com seu cachorro. Até mesmo o cheiro do bolo que sua mãe fazia parecia estar ali. Uma época em que a única preo-cupação era brincar. E era bem feliz daquele jeito.

Silêncio. Sua infân-cia tinha sido inter-rompida. Na playlist aleatória tocava agora uma balada. O coração bateu mais forte, e a única coisa que con-seguia se lembrar era do primeiro beijo, até então o maior acontecimento de sua vida. O que não

esperava é que sua adolescência se-ria cheia desses momentos, intensos e marcantes. O contato com o mundo real pela primeira vez, com as pessoas, com as situações. Experiências nem

sempre felizes, mas que possibilitaram ao adulto de hoje existir.

Quase chegando ao seu destino começou a pensar se existiria uma música que em alguns poderia fazer lembrar-se dos dias atuais. Não sabia. Se deu conta de que todas as suas lem-

branças, com suas respectivas trilhas sonoras, não tinham sido planejadas.

Ninguém planeja isso. Muitas vezes a música mais improvável marca uma si-tuação, e só resta se acostumar e con-viver com ela.

Todo dia pensava nesses aspectos. O que mais fazia em sua vida era vi-ver sua rotina, convivendo e se acos-tumando com os fatos. Queria um dia poder bater de frente com o que não concordava, se permitir viver ao seu tempo e ao seu modo, sem as cobran-ças e imposições da sociedade.

O ônibus parou, se levantou e des-ceu. Seria mais um dia para conviver e se acostumar. Quem sabe amanhã não faria algo diferente? Ou depois de amanhã? Ou depois?

O coração bateu mais forte, e a única coisa que conseguia

se lembrar era do primeiro beijo,

até então o maior acontecimento de sua

vida

Foto: Googlepor Guilherme Popolin

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PERFILA lutA pelo semelhAnte

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por Marina Dias

A história de um ex-morador de rua que aprendeu a lidar com toda a revolta, tristeza e amargor de sua condição, deu a volta por cima e passou a lutar para que menos pessoas passassem pelo mesmo sofrimento

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Todos usavam uma fita cor-de-rosa no peito. Senhoras com camisetas cor-de-rosa, iluminação cor-de-rosa. Era a abertura do “Outubro Rosa”, ação re-alizada no país inteiro em apoio à luta contra o câncer de mama. O Outubro Rosa encheu a casa, mas não estava nem perto de ser a pauta principal do dia.

Passada a solenidade, a Câmara se esvaziou. Permaneceram os jornalistas, um grupo de advogados notadamente tensos e cinco rapazes em uma das ga-lerias. Uma emissora de tv foi embora. Os vereadores decidiriam em seguida se seria ou não aberta uma comissão processante contra o Prefeito Barbosa Neto e seu vice, José Joaquim Ribei-ro. Os dois poderiam ser investigados por conta de supostas irregularidades na contratação de uma empresa para o treinamento da Guarda Municipal. Caso fossem provadas, as denúncias poderiam derrubar o prefeito e seu vice. A CP não foi aberta.

É comum que um grupo vá até a Câmara de Vereadores quando algo de seu interesse será discutido para pres-sionar os vereadores. Nesse caso, o as-sunto era de interesse da cidade toda, mas só cinco caras estavam sentados nas galerias. Londrina é uma cidade com muitas entidades que represen-

tam a sociedade civil. Naquela ocasião, a única entidade representada era o Movimento dos Moradores de Rua.

Um dos cinco rapazes era Leonardo Aparecido Gomes, de 36 anos. Leonar-do um dos representantes do Movi-mento dos Moradores de Rua de Lon-drina. Ele vive em um quarto alugado nos fundos de um boteco no centro da cidade. Leonardo conta que foi criado em um orfanato e nunca conheceu a fa-mília. “Fiquei muito revoltado e fui mo-rar na rua”, diz ao relembrar o que o fez ir para a rua, em meados dos anos 90.

No fim do ano de 1992, Londrina virou pauta do noticiário nacional por conta de um arrastão feito no Calçadão por um grupo de moradores de rua. Em 1993, na gestão de Luiz Eduardo Cheida, a cidade ganha uma política de atenção à popu-lação de rua. Na época, Márcia Lo-pes era secretária de assistência so-cial. “Os meninos ficavam embaixo da rampa da Ca-tedral. Eles viviam cheirando cola, não tinham nenhum tipo de proteção, hábitos de higiene ou segurança. Então começamos um pro-jeto de atuação com os moradores de

PERFIL

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No dia 4 de outubro deste ano, uma terça-fei-ra, a sessão da Câmara Municipal de Londrina tinha em pauta a votação e um assunto que

poderia mudar os rumos da política no município. Por volta das três da tarde, a casa estava cheia. Um verea-dor, famoso por promover o que é chamado pelos cor-redores da Câmara de “Sessão da Tarde”, passava uma comovente história veiculada no “Domingão do Faus-tão”. Outro comentava uma festa que acontecia naque-le momento do outro lado do mundo, em Osaka, Japão. Um terceiro parabenizava a UEL pelos seus 40 anos de vida.

rua”, relembra.Leonardo estava nesse grupo de

aproximadamente 20 pessoas. Todos com um perfil parecido: sem vínculos com a família, usuários de drogas – principalmente cola –, baixa ou nenhu-

ma escolaridade e muitas passagens pela polícia. A re-cuperação do gru-po se deu através de um processo de aproximação e inclusão feito pela equipe da Secreta-

ria de Assistência Social, com apoio do Movimento Nacional dos Moradores de Rua. O contato dos meninos e meninas de rua com o esporte foi muito impor-

“Ergui minha cabeça dentro da cadeia. Falei pros ladrões que não ia

mais viver na rua”

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Muitas pessoas

acabam indo morar na rua

por terem perdido seus

vínculos familiares

tante. Sobretudo com a capoeira. Már-cia Lopes conta que a Secretaria levou o grupo para participar de uma roda de capoeira na Festa da Uva em Guarave-ra. “Foi a primeira relação deles com a sociedade que não fosse de agressão e violência mútua. A sociedade, que dizia que eles não tinham jeito, de repente se coloca em volta deles para aplaudí-los.”

Foi só em 2003 que o Brasil ganhou uma política nacional de atenção à po-pulação em situação e rua. Em 2008, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome divulgou uma pes-quisa feita em 71 municípios brasileiros sobre os moradores de rua. Nas cidades pesquisadas, foram registrados 31922 moradores de rua. Predominantemen-

te homens entre 25 e 44 anos.O grupo de moradores de rua que

começou a ser atendido na década de 90 em Londrina tomou diferentes ru-mos. Alguns morreram ou estão presos e outros conseguiram sair das ruas se reintegrar à socie-dade, como Leo-nardo. Ele conta que foi na prisão que resolveu sair da rua. “Ergui mi-nha cabeça dentro da cadeia. Falei pros ladrões que não ia mais viver na rua, que ia pro-curar um canto pra mim e montar um projeto. Deu certo”, conta. A decisão está ligada à conversão de Leonardo,

graças ao trabalho de um grupo reli-gioso dentro da cadeia. Em liberdade, o ex-morador de rua foi convidado para integrar o movimento dos Moradores de Rua de Londrina.

O movimento se reúne todas as quartas-feiras e por não ter sede pró-pria ou recursos, conta com alguns apoiadores. Eles reivindicam melhorias na qualidade e no tratamento recebido nos abrigos e melhorias nas políticas de atendimento à população de rua do município. Leonardo sabe que para ser ouvido, o movimento deve ser atuante. Por isso a presença na Câmara de Vere-adores e a atuação junto ao Ministério Público. “Em todo lugar o movimento está. Sessão da Câmara, passeatas...hoje você levou sorte que eu não tinha nenhum compromisso!”, brinca.

Leonardo anda pelo centro de Lon-drina conversando com os moradores de rua. “Converso com eles, anoto tudo no meu caderno e depois levo para Curitiba (para a sede do movimento no Paraná). Londrina tem uns 300 mo-radores de rua. Fora os que vem de outras cidades”, explica. Márcia Lopes descreve a vida de Leonardo como uma trajetória de sobrevivência. “Ele é um sobrevivente. Começou a se engajar e a lutar para que outras pessoas não pas-sem pelo sofrimento que ele passou. É uma referência de alguém que sobrevi-veu e está engajado politicamente.”

Leonardo ainda tem pendências com a justiça, mas conseguiu ser solto para responder o processo em liberdade. Enquanto isso, estuda, procura empre-go e atua no Movimento dos Morado-

res de Rua. “Quero ter um futuro me-lhor”, diz. Leonar-do acredita que não estaria vivo se tivesse continuado a morar na rua. A história dele é de luta, superação e

força de vontade. Uma lição que pro-va que dá sim para mudar de rumo na vida, mesmo quando quase nenhuma situação lhe é favorável.

“É uma referência de alguém que sobreviveu

e está engajado politicamente”

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Por guilherme Popolin

The Sound Of Music Você pode não ter asssitido ao filme,

mas com certeza já ouviu a canção “Do-Re-Mi”, tema de “A noviça rebelde” (The Sound Music), drama musical, dirigido por Robert Wise, em 1965. Considera-do como um dos principais musicais da história do cinema, a trilha sonora é o elemento mais marcante, com suas mú-sicas divertidas e empolgantes, que em-balam as quase três horas de duração.

A história

Sob a sombra do nazismo, no final da década de 30, na Áustria, a noviça Maria (Julie Andrews) vive em um convento, mas encontra dificiculdades em seguir as nor-mas impostas pelas freiras, por ser de um espírito livre e impulsivo. Maria vai traba-

lhar como governanta na casa do capitão Von Trapp (Christopher Plummer), viúvo, com sete filhos e com um rígido e imposi-tivo sistema de educação. A noviça, atra-vés de suas músicas, leva alegria ao lar da família Von Trapp, conquista o carinho e respeito das crianças, além de se apai-xonar pelo capitão, que estava compro-metido com a baronesa (Eleanor Parker).

Para entreter

A principal característica de “A noviça rebelde” é a sua leveza, com um rotei-ro simples e até divertido, encabeçado por Ernest Lehman. Foi feito para en-treter e atingiu seu objetivo, pois conta-giou e contagia até hoje quem assiste, mesmo aqueles mais resistentes com a longa duração e com a data em que foi produzido. No final, não tem como não

sair cantarolando e arriscando uns pas-sos, com as músicas de autoria de Ri-chard Rodgers e Oscar Hammerstein II.

Prêmios

Apesar de se prolongar em suas sequ-ências finais, com a mudança do espírito leve que acompanhou todo o filme, para uma aura mais sombria, com ênfase no nazismo que avançava na Áustria, “A novi-ça rebelde” conseguiu várias indicações e venceu muitas premiações. A mais impor-tante delas foi o Oscar de melhor filme, em 1966. No mesmo ano levou as está-tuetas de melhor diretor, melhor monta-gem, melhor som e melhor trilha sonora, além de outras cinco indicações. O álbum com a trilha sonora foi merecidamente nomeado ao Grammy de melhor álbum.

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Não viu ainda?

COLUNA

CRÔNICACRÔNICA

de quebrar as pernasPorque temos essa mania besta de achar que estamos acima de tudo e sabemos

de tudo, até que alguém nos dá uma rasteira joga na cara a realidadepor Marina Dias

Estive pensando nessas coisas que nós ouvimos e passamos, dias, se-manas, meses remoendo. Coisas

que as vezes são ditas sem querer, mas nos fazem perder o rumo e repensar certos pon-tos da vida. Ou, como eu costumo dizer, coi-sas que te quebram as pernas. É aquilo que a gente ouve inesperadamente e, por mais que tenha sido dito sem a mínima pretensão de causar impacto, nos deixa no chão, como se fosse um golpe certeiro em cada joelho.

Uma das pessoas que mais me quebrou as pernas, hoje tem seis anos de idade. Foram dois longos anos de espera até que ela e a irmã chegassem. Eu acompanhava tudo de longe, até o dia que soube que, finalmente, as duas já estavam na casa dos meus tios. E que eram minhas primas. Então elas vieram visitar. Em meia hora, já conheciam grande parte da família imensa onde elas vieram pa-

rar. E para todos os efeitos, chamavam quem viam pela frente de “tia” e “tio”, porque na cabeça delas, primo é quem tem a mesma idade. Então eu virei a tia-prima.

Criança só quer saber de correr por aí e fazer bagunça, então a tia-prima, que não curte muito correr, não era lá muito interes-sante para aquelas duas meninas que tinham acabado de ganhar uns 10 primos corredores e bagunceiros. Até que eu resolvi assistir “O Mágico de Oz”. A menina mais nova se in-teressou por aquela coisa de casa voando, bruxa, espantalho e sapatos de rubi.

Até que chegou a hora da pausa para tomar alguma coisa e ir ao banheiro. A meni-na é boa de papo. Me descrevia o quarto dela, que eu já conhecia. “É, eu conheço seu quarto, já fui na sua casa”, eu disse. “Não foi não, tia! Eu não lembro de você lá!” Ela segu-rava um copo d’água com as mãos gordinhas

e enquanto eu falava, ela dava longos goles. “É que quando eu fui, você e a sua irmã ain-da não tinham chego”. Ela fala muito rápido, as vezes é difícil entender. “Ah, eu ainda morava na casa lar. Ô tia, cê sabe quantas crianças tem lá na casa que eu morava?” “Não…” e antes que eu perguntasse quantas eram, antes mesmo que eu pensasse no que ela tinha dito, ela arregala os olhos escuros e diz: um monte! Larga o copo na pia e sai correndo pra sala, sem imaginar o que tinha me causado.

Um monte de crianças. Um monte de crianças que talvez não encontrem uma família que as queira. Um monte de crian-ças que passaram por coisas que a gente, que sempre teve tudo, nem imagina. E eu, que achava que sabia alguma coisa, acabei desconcertada depois de ouvir duas palavras de uma pessoa de quatro anos.

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RESENHA CRÍTICA

mas não é verdade

Realidade ou Ficção? Se você é jornalista, não hesitaria em escolher a primeira op-ção. Na verdade, isso é sua obrigação. O trabalho do jornalista está intimamente li-

gado a realidade e não tem como se separar dela. Lógico que a representação do real elaborada por qualquer tra-balho jornalístico não é uma cópia fiel do fato, depende do olhar do observador. Porém, a base para qualquer jornalista é trabalhar com a verdade. É essa discussão que o filme Shattered Glass, intitulado em português como “O preço de uma verdade”, levanta. O filme dirigi-do por Billy Ray foi lançado em 2003 e teve seu roteiro baseado no artigo de Buzz Bissinger escrito para a revis-ta Vanity Fair em setembro de 1998.

O longa é baseado na história do jornalista Stephen Glass (Hayden Christensen) . Jovem que com seus vinte e poucos anos conseguiu se destacar no meio jornalís-tico como redator da respeitada revista “The New Re-plubic”, assim como da “Rolling Stones”, da “George” e da “Harper’s”. Seus artigos mostravam a criatividade e domínio da escrita, o que o fez ganhar importância na redação da “The New Repulic”. O que os editores não perceberam é que os esquisitos e surpreendentes acon-tecimentos que marcavam os artigos de Glass, também eram fantasiosos. Dos 41 artigos publicados, 27 eram ficção. “Hack Heaven” (O Paraíso dos Hackers), sua últi-ma reportagem para a revista, despertou a desconfian-ça de um jornalista da Forbes Digital, Adam Penenberg (Steve Zahn), que resolveu checar as fontes utlizadas. A partir disso, a farsa de Stephen Glass começa a ser des-coberta.

O filme retrata de forma satisfatória e envolvente a trajetória do jovem jornalista, do auge até sua queda. O recurso narrativo de utilizar o próprio Glass para contar a sua história, insere o público na mente do personagem e revela a complexidade de sua personalidade. Ele vivia num mundo criado por si mesmo. Pode-se notar uma tendência de colocar o jornalista como um louco e com

POR_ KARINA CONSTANCIO

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RESENHA CRÍTICA

vários problemas emocionais. Está aí o ponto chave. Esses problemas são mostrados como uma justificativa para os atos cometidos por ele, enquanto, na verdade, Stephen Glass percebeu uma deficiência na checagem de dados da equipe da “The New Republic” e conseguiu tirar proveito disso. A ambição do jornalista é a justifica-tiva para os seus atos.

O principal ponto levantado pelo filme é a ética jorna-lística e o compromisso com a verdade, mas essa discus-são não precisa parar nas redações, ela deve ser estendi-da. Até que ponto estamos dispostos a ir para conseguir o nosso objetivo? É possível que uma mentira se esgote nela mesma ou ela sempre vem acompanhada de outra mentira? Stephen Glass não trabalha mais como jorna-lista. Em 2003, ele escreveu seu primeiro romance que conta a história de um jovem e ambicioso jornalista que inventa personagens e fatos para conseguir o sucesso profissional. O livro dele não é ficção.

Fotos do filme - Google

Título Original: Shattered GlassGênero: Drama

Direção: Billy RayTempo de Duração: 103 minutosAno de Lançamento (EUA): 2003Elenco: Hayden Christensen, Chloë

Sevigny, Steve Zahn

FICHA TÉCNICA

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CRÔNICAPOPOLIN

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Pratique já!Separe seus apetrechos, mande a vergonha embora e abuse do fetiche

CRÔNICA

por Guilherme Popolin

Fetiche. Impossível ler essa palavra e não pensar na velha e boa sacana-gem, seja a dois, a três,

ou o quanto a sua imaginação permi-tir. Todo mundo tem, impossível ne-gar. Se ainda não tem, aguarde o seu momento, porque mais cedo ou mais tarde você vai descobrir o seu.

Pode ser por um objeto, lugar, fan-tasia ou pessoa. As opções são tantas e você pode ter mais de um. Olha só que delícia. Mas se sua vida é tão ani-mada quanto a de uma alface e você está em dúvida se tem, ou não, o fe-tiche por algo, faça o seguinte: bus-que lá no fundo da sua mente, algo

que sempre quis ter, fazer ou receber, mas que está lá escondido.

Provavelmente o achado será mui-to prazeroso. Não tem sentido escon-der algo que, se usado, só vai trazer coisa boa. Muita gente esconde –al-gumas pra sempre – por que tem medo ou vergonha. Em alguns casos é aconselhável procurar um psicólogo, mas recomendaria somente em casos graves. É o caso de quem sente pra-zer em ouvir insetos esmagados. Mas se você apenas quer o seu vizinho, se lambuzar no chantilly, usar um chico-te e praticar um voyeurismo de leve, tá tudo bem.

O voyeurismo até dá, mas o bom

mesmo é colocar em prática o seu fe-tiche com ajuda de alguém. Não existe necessidade de climão ou constrangi-mento em expor o que tem vontade para o seu parceiro (a). Com certeza a outra pessoa também tem o fetiche dela. Não sendo um banho romano, tem mais é que curtir. Ou até pode ser o tal banho, vai que você gosta.

Fetiche não tem a ver apenas com sexo. Mas como foi escrito no começo, impossível separar os dois, formam um casal tão lindo. Que continuem sempre juntos, felizes para sempre e, o mais importante, bem safadinhos.

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COLUNA

por Karina Constancio

Cinturas e Saboneteiras

Não dá pra negar que a ima-gem feminina mudou ao longo do tempo. A mulher construiu um novo jeito de

se mostrar para o resto do mundo, retir-ou de pauta aquela visão de fragilidade e submissão. O título de sexo frágil se rev-elou como uma mentira absurda. E isso não aconteceu do nada, é consequência da ação de uma série de mulheres que conseguiram inverter o rumo das coisas e construir uma nova fase na história. A fase dirigida e interpretada por nós.

Pensando nisso, resolvi fazer uma lista de quatro mulheres que de alguma forma contribuíram para essa mudança e conseguiram ser influentes na música, na política, na religião, na moda, no cin-ema ou na literatura. (Já antecipo que foi difícil escolher só quatro e que vai faltar muita gente importante).

1 . Madre Teresa de CalcutáConsiderada a “missionária do século XX, tornou-se um dos maiores símbolos de generosidade em todo o mundo.

2. Marilyn MonroeImortalizada como símbolo de sensualidade, ela é citada como a maior estrela de Hollywood de todos os tempos.

“Mulheres comportadas, raramente fazem história”

Marilyn Monroe

3. Coco ChanelRealmente, uma mulher a frente de seu tempo, seu estilo dita tendências até hoje na moda mundial. O cárdigã, o vestido preto e as pérolas tornaram-se sua marca registrada, uma marca que formou um im-pério.

“Vista-se mal e notarão o vestido. Vista-se bem e notarão a mulher”

Coco Chanel

4. Madonna Rainha do Pop, se tornou a segunda maior artista de todos os tempos, de acordo com a revista Billboard, e uma das 25 mulheres mais influentes do mundo, segundo a Times.

“ A razão pela qual intolerância, sex-ismo, racismo e homofobia existem é o medo. As pessoas têm medo de seus

próprios sentimentos.” Madonna

“Por vezes sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de

água no mar. Mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota”

Madre Tereza de Calcutá

Dezembro de 2011 - Revista TQP |47

CRÔNICA

Não consigo dormir. Viro de um lado, viro do outro e parece que minha cama nunca foi tão descon-fortável como agora. Tento fingir que não sei o motivo para toda essa insônia, mas os meus

pensamentos insistem em me trair. Aquela ligação não sai da minha cabeça: - “Estava pensando, a gente podia fazer alguma coisa amanhã, né?”. Claro que a gente podia, achei que você nunca fosse perguntar. Lógico que minha resposta não foi essa, segurei a ansiedade e apenas concordei sem dar muita bandeira. É, mas essa atitude polida foi até desligar o telefone. Agora estou aqui, sem dormir e preocupada com as mil coisas que podem acontecer e que ainda não aconteceram.

É a síndrome do primeiro encontro. E quando eu digo “primeiro encontro”, eu estou falando daquele primeiro en-contro marcado. Esse é o pior. Porque aquele primeiro encon-tro surpresa, que acontece por obra do famoso destino... ah, esse se desenvolve sem muitas atitudes planejadas, não tem toda aquela “pré-ocupação” e por isso, se desenrola de forma mais natural.

Geralmente, o primeiro encontro marcado implica em um jantar, almoço ou algo que envolva comida. E, sério, comer na frente de alguém é algo muito intimo. Sem contar que tem sempre o risco de rolar um alface no dente ou o cara palitá-los depois da refeição. Aí tem a opção de sair para beber e junto com ela o risco de exagerar na dose e dar bafão ou “fazer a Sandy” e ele te achar uma chata.

Depois também tem o drama de quem vai pagar a conta. Esse aí é velho e ainda rende muitas dúvidas. Eu pago? Ele paga? Pelo menos me ofereço para pagar, né? Meio a meio? Cheguei a conclusão que o melhor é ir preparada para pagar a sua parte, insistir e se ele não aceitar, seja a primeira a desistir e acabe com aquele sufoco.

E a volta para casa? Se ele tiver carro, problema resolvido. Se você tiver carro, problema mais que resolvido. Agora se não tiver, vamos dividir o táxi ou cada um vai para o seu lado? Ou ainda, vamos mesmo voltar para casa? Aí o dilema chegou no seu ápice. É o eternizado pelos filmes de sessão da tarde: “Você quer entrar?”.

Além de tudo isso, ainda tem todos aqueles dramas de que roupa usar, como se comportar e o medo de ele não gostar tanto assim de você depois de te conhecer melhor. Talvez cer-tas coisas devessem vir com manuais, mas acho que a graça toda ia ficar perdida. Não consigo dormir. Viro de um lado, viro do outro e parece que minha cama nunca foi tão desconfor-tável como agora...

O primeiro...de muitos?por Karina Constancio

48 | Revista TQP - Dezembro, 2011