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SOCIODRAMA CONSTRUTIVISTA COMO ESTRATÉGIA DE
PREVENÇÃO DO SUICÍDIO1
Bianca Flávia de Carvalho Sanchez Gil2.
Célia Maria Ferreira da Silva Teixeira3.
RESUMO
O sociodrama construtivista é um método de educação preventiva usado para abordar diversos
temas. Este trabalho apresenta um estudo com o objetivo de investigar a possibilidade da
utilização desse método como uma estratégia de prevenção do suicídio. A pesquisa foi
realizada por meio da aplicação do sociodrama construtivista a um grupo de pessoas em uma
paróquia da região central de Goiânia. O estudo proporcionou aos participantes a
oportunidade de construir novas ideias e formas de enfrentamento do problema suicídio,
tornando-os multiplicadores das concepções discutidas no grupo. Dessa forma, os resultados
apontam para a importância do sociodrama construtivista como uma forma de prevenção ao
suicídio.
PALAVRAS-CHAVE: Prevenção; Suicídio; Sociodrama Construtivista.
A dinâmica do comportamento suicida
A palavra suicídio deriva do latim e significa a morte de si mesmo. Esta definição não
engloba todas as particularidades deste fenômeno complexo. Estudiosos como Werlang e
Botega (2004) compreendem o comportamento suicida em um continuum, composto por
ideações suicidas, ameaças suicidas, gestos, tentativas suicidas e suicídio.
Tendo em vista a necessidade de compreender e prevenir o suicídio, surgiu um ramo
da ciência chamado suicidologia. Nesse campo de conhecimento, Werlang e Botega (2004)
inferem que existem novas terminologias utilizadas para facilitar a compreensão do suicídio.
Um termo muito utilizado é comportamento suicida, designado para “todo o ato que o
indivíduo cause uma lesão a si mesmo, qualquer que seja o grau de intenção letal e de
conhecimento do verdadeiro motivo desse ato” (WERLANG & BOTEGA, 2004, p. 17).
1 Artigo apresentado como requisito parcial para obtenção de especialização Latu Sensu em Terapia de Casais e
Famílias IEP/PUC-GO.
2Aluna do curso de Pós-graduação Latu Sensu em Terapia de Casais e Famílias IEP/PUC-GO.
E-mail: [email protected]
3 Professora, supervisora e orientadora do curso de Pós-graduação Latu Sensu em Terapia de Casais e Famílias
IEP/PUC-GO. E-mail: [email protected]
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Algumas barreiras dificultam a prevenção do suicídio e corroboram para o estigma
social, sigilo, falta de conhecimento sobre o assunto e dificuldade em buscar ajuda. Esses
fatores contribuem para o isolamento dos indivíduos com ideação suicida e gera sentimentos
de culpa e de vergonha da família. Em muitas culturas o suicídio é visto como pecaminoso,
vergonhoso, fraco, egoísta ou manipulador, e isso contribui para o silêncio e para o
isolamento de indivíduos que apresentam pensamentos suicidas (KUTCHER & CHEHIL,
2007).
O suicídio, conforme Meleiro, Teng e Wang (2004), é um fenômeno complexo por ser
determinado pela interação de múltiplos fatores, como culturais, filosóficos, biológicos,
psicológicos, sociológicos e outros. Assim, para uma melhor compreensão, é indispensável
considerar os contextos os quais o sujeito está inserido socialmente. Evidencia-se que o
suicídio não é unicausal, pois não é determinado por um único acontecimento na vida do
indivíduo, dessa forma, a complexidade de fatores para esse desfecho deve ser lembrada
(KOVÁCS,1992; MELEIRO, TENG & WANG, 2004).
O suicídio em números
Segundo a Organização Mundial da Saúde (2000), estima-se que a cada 40 segundos
uma pessoa comete suicídio e a cada 3 segundos uma pessoa tenta suicídio. Essa é a terceira
maior causa de morte de pessoas com idade entre 15-35 anos. Cerca de um milhão de pessoas
morrem por suicídio todos os anos, trata-se de uma questão de saúde pública.
Estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2006) mostram que
em 2005, no Brasil, houve 6.724 óbitos na população masculina e 1.803 óbitos na população
feminina por suicídio. O grupo etário com maior índice de suicídio foi de 20 a 29 anos, sendo
o número da população masculina de 1.601 e na população feminina de 372. Seguido do
grupo de 30 a 39 anos, sendo 1.401 e 390, respectivamente.
Comparando suas projeções demográficas com o número de óbitos registrados nos
cartórios brasileiros, segundo o IBGE, em 2005, 15,6% das mortes ocorridas podem não ter
sido registradas (sub-registro). Da mesma forma, em relação às estatísticas do Ministério da
Saúde (MS), o IBGE estima que 13,7% dos óbitos em hospitais, no ano de 2005, podem não
ter sido notificados (subnotificação).
Um estudo epidemiológico sobre os índices de suicídio registrados entre 1980 e 2006,
em nível nacional, realizado por Lovisi (et al. 2009), demonstra os seguintes resultados:
houve quase 159 mil casos de suicídio, sem contar os casos de suicídio em crianças com
menos de 10 anos. O índice total cresceu de 4,4 para 5,7 mortes por 100.000 habitantes, ou
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seja, um crescimento de quase 30%. Os índices médios mais altos foram registrados nas
regiões Sul (9,3) e Centro-Oeste (6,1). Em outras palavras, ser homem e ter mais de 70 anos
está fortemente associado ao risco de suicídio, mas os maiores aumentos das taxas
aconteceram na faixa etária entre 20 anos e 59 anos.
Estudos do MS realizados no período entre 2000 e 2009 revelam que do total de
mortes notificadas em 2009, 12,5% foram decorrentes de causas externas, ou seja, mortes
causadas por acidentes de trânsito, quedas, suicídio e outras, representando assim, a terceira
causa mais frequente de morte no Brasil. No mesmo ano, foram registradas 9.379 mortes por
lesões autoprovocadas intencionalmente. O risco de suicídio foi mais elevado para os
indivíduos de 40 a 59 anos (7,4 óbitos por 100 mil habitantes) e entre os idosos com 60 anos
de idade ou mais (7,1 óbitos por 100 mil habitantes). Em todas essas faixas etárias, os homens
apresentaram risco de suicídio de quatro a cinco vezes maior em relação às mulheres.
Por que falar sobre suicídio?
Dentre as ações da Organização Mundial de Saúde (OMS) existe um estudo
multicêntrico que envolve países dos cinco continentes: o SUPREMISS (Suicide Prevention
Multi Site Intervention Study on Suicide). O Brasil participa deste estudo através da iniciativa
de Werlang e Botega (2004), com o escopo de levantar a situação do comportamento suicida e
estudos mais abrangentes desse fenômeno.
Embora o MS tenha normatizado Diretrizes Nacionais para Prevenção do Suicídio,
com a criação de manuais voltados a diferentes públicos, como médicos, educadores e a
população em geral, tais diretrizes não são cumpridas por falta de conscientização entre os
representantes do governo, sem ações direcionadas para efetivar estratégias de prevenção ao
suicídio, como por exemplo, políticas de capacitação de profissionais, reorganização dos
recursos disponíveis, entre outras ações.
Mitos sobre suicídio
Existem ideias errôneas construídas pela sociedade que se configuram em mitos sobre
o suicídio. Os mais comuns, apontados pela Organização Mundial de Saúde (2006), são:
Mito 1: As pessoas que falam sobre o suicídio não farão mal a si próprias, pois
querem apenas chamar a atenção. Isso é falso. Deve haver todas as precauções necessárias
diante de um indivíduo que evidencie ideação suicida, intenção ou um plano suicida. Todas as
ameaças de se fazer mal devem ser levadas a sério.
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Mito 2: O suicídio é sempre impulsivo e acontece sem aviso. Falso. Morrer pelas
suas próprias mãos pode parecer impulsivo, mas o suicídio pode ter sido ponderado durante
algum tempo. Muitos indivíduos suicidas comunicam algum tipo de mensagem verbal ou
comportamental sobre as suas ideações da intenção de se fazerem mal.
Mito 3: Os indivíduos suicidas querem mesmo morrer ou estão decididos a
matar-se. Falso. A maioria dos indivíduos que cometem suicídio conversam antes sobre os
seus pensamentos com pelo menos uma pessoa, ou ligam para uma linha telefônica de
emergência ou para um médico. Isso caracteriza uma ambivalência, pois o indivíduo procura
ajuda antes de se matar.
Mito 4: Quando um indivíduo mostra sinais de melhoria ou sobrevive a uma
tentativa de suicídio, está fora de perigo. Falso. Na verdade, um dos períodos mais
perigosos é imediatamente depois da crise, quando a pessoa está no hospital e na sequência de
uma tentativa. A semana que se segue à alta do hospital é um período durante o qual a pessoa
está particularmente fragilizada e em perigo de se fazer mal. Como um preditor do
comportamento futuro é o comportamento passado, pois a pessoa suicida, muitas vezes,
continua em risco.
Mito 5: O suicídio é sempre hereditário. Falso. Nem todos os suicídios são
associados à hereditariedade, e estudos ainda em desenvolvimento não são conclusivos. Uma
história familiar de suicídio, no entanto, é um fator de risco importante para o comportamento
suicida, particularmente em famílias onde a depressão é comum.
Mito 6: Os indivíduos que tentam ou cometem suicídio têm sempre alguma
perturbação mental. Falso. Os comportamentos suicidas têm sido associados à depressão,
abuso de substâncias, esquizofrenia e outras perturbações mentais, além de comportamentos
destrutivos e agressivos. No entanto, a proporção relativa destas perturbações varia de lugar
para lugar e há casos em que nenhuma perturbação mental foi detectada.
Mito 7: Se alguém falar sobre suicídio com outra pessoa, está transmitindo a ideia
de suicídio a essa pessoa. Falso. Falar ou perguntar a respeito de possíveis ideações suicidas
não levará o indivíduo a cometer o suicídio. Na verdade, reconhecer que o estado emocional
do indivíduo é real e tentar normalizar a situação, são componentes necessários para a redução
da ideação suicida.
Mito 8: O suicídio só acontece a outras pessoas, não a nós. Falso. O suicídio
acontece a todos os tipos de pessoas e encontra-se em todos os tipos de sistemas sociais e
familiares.
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Mito 9: Após uma pessoa tentar cometer suicídio uma vez, nunca voltará a tentar
novamente. Falso. As tentativas de suicídio são um preditor crucial do suicídio.
Mito 10: As crianças não cometem suicídio, dado que não entendem que a morte
é final e são cognitivamente incapazes de se empenhar num ato suicida. Falso. Embora
seja incomum, crianças cometem suicídio. Qualquer gesto, em qualquer idade, deve ser
levado a sério.
Os sentimentos do indivíduo em risco de suicídio
Wang e Ramadam (2004) apontam que as pessoas com vontade de acabar com a sua
própria vida apresentam sentimentos como: dor psicológica interminável, desesperança,
desamparo, rejeição, indecisão frente à vida com ambivalência, ou seja, ao mesmo tempo
deseja morrer e deseja viver.
Ainda, segundo Wang e Ramadam (2004), os sujeitos em risco podem apresentar
alguns sentimentos, como: “Não há nada que eu possa fazer”, “ninguém pode me ajudar”. Seu
estado cognitivo é constrito e representa o estreitamento das emoções, por exemplo, “o único
caminho é a morte”, “a única coisa que poderia fazer era me matar”. A consciência do suicida
passa a funcionar de forma dicotômica, tudo ou nada, “ou eu consigo alcançar esta solução
deste problema, ou eu vou me matar”.
Fatores de risco para o suicídio
O estudo dos fatores de risco para o suicídio constitui a principal estratégia, tanto para
compreender fatores que poderiam determinar este comportamento, quanto para indicar
possíveis caminhos de intervenção e assim, prevenir o comportamento suicida.
Os fatores de risco de suicídio envolvem aspectos demográficos, sociais, psiquiátricos,
características de personalidade, história médica e familiar (MELEIRO, ET AL. 2004;
WERLANG & BOTEGA, 2004).
Os fatores de risco demográficos estão relacionados à questão do gênero e da idade. O
risco é maior para o gênero masculino em faixas etárias entre 15 e 35 anos, e maior de 75
anos (MELEIRO, ET AL. 2004; WERLANG & BOTEGA, 2004).
Já os fatores sociais referem-se ao estado civil, orientação sexual, estar
desempregados e/ou com problemas financeiros, perdas recentes de parente ou amigo,
isolamento social, violência doméstica e relações conflituosas (MELEIRO, ET AL. 2004;
WERLANG & BOTEGA, 2004).
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Em relação aos fatores psiquiátricos, inclui-se: depressão, transtorno bipolar,
transtorno relacionado ao alcoolismo e outras substâncias, esquizofrenia, transtorno de
personalidade (mais frequente em pessoas com transtorno borderline), tentativa de suicídio
pregressa, comprometimento cognitivo e outros (MELEIRO, ET AL. 2004; WERLANG &
BOTEGA, 2004).
Quanto às características da personalidade, considera-se: desesperança, perda do
sentido da vida, impulsividade, pessimismo, agressividade, agitação, baixa autoestima e pouca
habilidade de resolver problemas (MELEIRO, ET AL. 2004; WERLANG & BOTEGA,
2004).
No que diz respeito à história médica, inclui-se: AIDS, presença de doenças crônicas
ou incapacitantes, presença de doenças neurológicas ou cardíacas, doenças pulmonares e
doença na próstata (MELEIRO, ET AL. 2004; WERLANG & BOTEGA, 2004).
Em relação à história familiar, diversos fatores influenciam no risco de
comportamento suicida: ter histórico de suicídio na família, história de doença mental na
família, história de violência familiar, abuso ou negligência - falta de cuidado da família
(MELEIRO, ET AL. 2004; WERLANG & BOTEGA, 2004).
No entanto, Kutcher e Chehil (2007), concluem que a apreciação de um ou mais
fatores do risco não necessariamente prediz o suicídio, porém auxilia na identificação do
sujeito que precisa de intervenção por uma equipe de saúde.
Para Werlang e Botega (2004), o suicídio é um fenômeno multifatorial complexo, que
exige uma compreensão singular de cada ato, pois não evidencia uma única causalidade, mas
uma complexidade de fatores que apresentam graus diferenciados de vulnerabilidade.
Identificar os fatores de proteção para o suicídio não assegura que é possível evitar o evento
suicida, porém facilita na construção de um plano preventivo.
Fatores de proteção para o suicídio
Os fatores de proteção são aqueles que protegem a pessoa do suicídio. Dentre tais
fatores, considera-se: apoio social, estar empregado, ter crianças em casa, crenças religiosas,
senso de responsabilidade para com a família, relação terapêutica positiva, capacidade de
resolver problemas e de adaptar-se de forma positiva entre outros. Meleiro et al. (2004);
Werlang e Botega (2004).
O manual “Prevenção do suicídio: um recurso para conselheiros” (OMS, 2006),
amplia os fatores de proteção, incluindo: crenças culturais e étnicas, envolvimento na
comunidade, uma vida social satisfatória e acesso a serviços e cuidados de saúde mental.
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A compreensão do suicídio na abordagem sistêmica
Este trabalho agrupa o enfoque do pensamento sistêmico (ESTEVES DE
VASCONCELLOS, 2002), com o intuito de compreender o suicídio em três dimensões: a)
complexidade refere-se à capacidade de entender o contexto e focalizar as interações
recursivas, ou seja, o pesquisador observa em que circunstâncias ocorrem o fenômeno e o
dinamismo das relações presentes em sistemas interligados entre si; b) instabilidade enfatiza
que o pesquisador/observador não tem afirmações definitivas sobre a realidade, isto é, no
suicídio não é possível conceber uma única causa para o ato, ou determinar um sistema para
explicá-lo; e c) intersubjetividade refere-se à inclusão da pesquisadora no processo, com suas
crenças e valores que integram ao contexto do grupo pesquisado, em prol da co-construção do
seu próprio significado da experiência, através da conversação, ou seja, a pesquisadora faz
parte da construção de significados do comportamento suicida através do diálogo.
Ao abordarem a família, Walsh e McGoldrick (1998), compreendem que há a
tendência de repetições nos padrões de funcionamento. Esses padrões incluem as crenças, os
tabus, as atitudes e as expectativas que são transmitidos para gerações seguintes. Em seus
estudos, esses autores ainda destacaram a importância de analisar a história de suicídio na
família, que possa indicar ou não a possibilidade de risco. É importante investigar as perdas
na história da família, com o intuito de entender o sentido das relações que se desenvolvem,
bem como conhecer a dinâmica familiar e as outras redes sociais do indivíduo, para assim ter
uma visão ampla desse fenômeno.
A abordagem sistêmica favorece a compreensão do comportamento suicida, em seus
diversos contextos e fatores, com isso tenta entender tudo o que está relacionado a tal
fenômeno.
Relevância desse estudo
Segundo Bertolote (2004), as projeções da OMS para o ano de 2020 apontam que
haverá mais de 1,5 milhão de óbitos decorrentes de suicídio, e 15 a 30 milhões de pessoas
tentarão o suicídio. Sendo assim, será uma morte por suicídio a cada 20 segundos e uma
tentativa de suicídio a cada um ou dois segundos.
Apesar do Ministério da Saúde ter lançado as Diretrizes Nacionais de Prevenção do
Suicídio, estas não estão vigentes nas políticas públicas de saúde. Portanto, este estudo se
insere dentro de uma proposta de prevenção e atende a Portaria de nº 1.876, de 14 de Agosto
de 2006, no sentido de conscientizar a população sobre este tema.
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Considerando-se estes dados, surgiu uma motivação por parte da pesquisadora, no que
tange a prevenção do suicídio. O intuito foi mobilizar um grupo de indivíduos desconhecidos
entre si, com o interesse em comum de tentar compreender o que leva um sujeito a dar fim a
sua própria existência. Assim, essa pesquisa foi proposta, visando à construção de um espaço
de diálogo sobre as possibilidades de prevenção, por meio de novas ideias, sentimentos e
ações sobre a temática.
Além de promover o maior conhecimento, esse estudo contribuiu para
esclarecimentos e a sensibilização dos sujeitos participantes. A metodologia poderá ser útil
para outros profissionais interessados no tema.
Objetivo Geral
Investigar a possibilidade da utilização do sociodrama construtivista, como uma
estratégia de prevenção do suicídio.
Objetivos Específicos
Conhecer qual o significado que os participantes dão ao fenômeno do suicídio;
Sensibilizar os participantes para a possibilidade de identificar os sinais de alerta do
suicídio.
Metodologia
O método utilizado foi sociodrama construtivista, idealizado por Zampieri (1996), que
se baseia em dois campos do conhecimento: o sociodrama e o construtivismo social. O
primeiro consiste em buscar o conhecimento da realidade com respostas criativas e
espontâneas, com o método de dramatização do tema-protagonista de um drama social. O
segundo busca a elaboração da realidade com o grupo, através da externalização do problema
em que o tema-protagonista é co-construído com um novo significado.
É um método de educação preventiva usado para abordar diversos temas (ZAMPIERI,
1996). Nesse estudo considerou-se o tema: “Pensando no suicídio como possibilidade de
prevenção”.
O Sociodrama é um método criado por Jacob Levy Moreno (2013). O grupo é
considerado uma entidade em si, com sua própria estrutura social e é onde os processos
individuais ocorrem, sem perder a autonomia.
O objetivo do sociodrama construtivista proposto por Zampieri (1996) é oferecer um
espaço que construa novas respostas no grupo, pela inter-relação entre seus membros, a
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pesquisadora e a equipe, capaz de possibilitar a expansão das percepções. Possui as seguintes
etapas: aquecimento, dramatização e comentários. Todas elas ocorrem dentro da situação
grupal.
As etapas do sociodrama construtivista, descrita pela autora supracitada, são:
aquecimento, dividido em: 1) Aquecimento inespecífico, que acontece quando o diretor
explica a metodologia e, prepara para o trabalho com auxílio (de ego auxiliar), com a função
de observadores sociais e atores adequadamente instruídos dos fatos. Nesse caso, utilizam-se
as técnicas de integração grupal; 2) Aquecimento específico, quando o tema do trabalho é
abordado e os papeis sociais são distribuídos. Em seguida, inicia-se a fase de dramatização,
momento em que acontece a produção grupal. Finaliza-se com a etapa comentários, com o
objetivo compartilhar as vivências ocorridas pelo grupo.
Participantes
Os participantes dessa pesquisa foram oito pessoas entre 23 e 70 anos, membros da
Paróquia Santo Antônio na cidade de Goiânia-GO. O nível escolar compreendia do Ensino
Médio completo até Nível Superior.
Materiais/Ambiente
O trabalho foi realizado na Paróquia Santo Antônio, setor Pedro Ludovico, Goiânia-
GO.
Os encontros aconteceram em uma sala dotada de infraestrutura necessária para ao
desenvolvimento da pesquisa. Foram utilizados os seguintes materiais: data-show, notebook,
caixa de som, gravador de voz, papel e caneta.
Procedimento
A coleta de dados compreendeu as seguintes ações: a) Recrutamento dos
indivíduos: Durante 3 semanas foram afixados alguns cartazes nos murais de avisos da
Paróquia Santo Antônio, como também feita a divulgação da proposta da pesquisa durante os
avisos nas celebrações. Em algumas ocasiões em que a pesquisadora estava presente, ao final
das celebrações fez uma breve explanação a respeito dos objetivos do estudo, registrou os
contatos telefônicos dos interessados e informou-os sobre o dia do início das intervenções; b)
Intervenção: cada intervenção teve a duração de aproximadamente 2 horas, totalizando três
encontros.
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No primeiro encontro foi realizado o sociodrama construtivista de Zampieri (1996).
No aquecimento inespecífico foi feito o acolhimento e dado informações a respeito desse
estudo, com relação à participação dos sujeitos, o objetivo, a duração e o período dos
encontros. Em seguida foi entregue e explicado aos participantes o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE). A assinatura do TCLE, em duas vias, foi obtida somente após os
sujeitos terem sido esclarecidos sobre todas as implicações de sua participação no estudo e
dadas todas as informações sobre a pesquisa. Após assinatura do TCLE, foi dado
continuidade no sociodrama construtivista, o qual foi gravado em áudio.
Ainda no primeiro encontro na fase do aquecimento específico, foi explanado o que é
o sociodrama construtivista. Os sujeitos foram convidados a fazerem uma escolha dentre seis
perguntas apresentadas, pela pesquisadora – diretora do sociodrama, as quais foram: Quem
morre mais de suicídio homem ou mulher? Que situações podem proteger alguém de suicídio?
Que situações podem colocar alguém em risco? Por que uma pessoa morre de suicídio? O que
se fala sobre o suicídio? É possível prevenir o suicídio? Cada participante deveria escolher a
pergunta que mais chamasse a sua atenção.
Em seguida, dividiu-se em dois grupos para a discussão das questões. Finalmente,
todo o grupo teceu comentários sobre a vivência. Alguns sujeitos ficaram satisfeitos com
algumas respostas encontradas, outros evidenciaram o interesse em conhecer mais sobre a
temática.
No segundo encontro foi feito a explanação sobre o método sociodrama
construtivista, com o intuito de esclarecer aos participantes que não estavam presentes no
encontro anterior. Foi dado o esclarecimento que haveria a participação de um novo elemento
no grupo, que funcionou como um ego auxiliar da diretora. Em seguida, ocorreu o
aquecimento específico, momento de informações sobre a epidemiologia do suicídio em nível
mundial e apresentado um fragmento do filme “As horas”. Posteriormente, foi construído no
grupo, verbalmente, ideias gerais sobre fatores de risco e de proteção da personagem do filme
e em seguida foi proposta uma dramatização.
A dramatização ocorreu a partir da formação de dois grupos para representarem uma
cena. Na cena havia dois personagens: o Personagem I seria uma pessoa em risco de suicídio;
o Personagem II seria uma pessoa que tentaria proteger o sujeito em risco (Personagem I).
Após a dramatização, todo o grupo compartilhou ideias a respeito da experiência.
No terceiro encontro o aquecimento específico se deu através de uma explanação
sobre o suicídio e sua prevenção. Em seguida, o grupo construiu frases com ideias de algumas
ações para prevenção do suicídio. Em outro momento, foi proposto ao grupo, que
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construíssem duas imagens do grupo: a primeira imagem deveria expressar o sentimento do
grupo em relação ao primeiro encontro; a segunda imagem deveria ser a representação dos
sentimentos do grupo em relação ao último encontro.
Por fim, o grupo foi convidado a redigir uma breve avaliação sobre a experiência.
Alguns participantes, espontaneamente, fizeram agradecimentos e compartilharam o que
aprenderam a partir dessa formação grupal.
Resultados e Discussão
Os resultados se basearam nos temas focados no sociodrama construtivista. As
informações trazidas pelos participantes e suas novas construções de pensamentos serão
analisadas a partir dos estudos de Meleiro (et al. 2004); Organização Mundial de Saúde
(2006); Werlang e Botega (2004), bem como da teoria do pensamento sistêmico (ESTEVES
DE VASCONCELLOS, 2002).
No primeiro encontro, a partir da formação dos subgrupos, os sujeitos discutiram as
perguntas lançadas pela diretora do sociodrama. A primeira pergunta formulada para o grupo
foi: “Por que uma pessoa morre de suicídio?” Cada participante tentou encontrar um motivo
que explicasse a possível causa de um sujeito tentar a própria morte. Veja alguns relatos:
Daiane4: “(...) A pessoa se vê sem saída, não tá enxergando possibilidades para a vida
dela, às vezes é falta de saída real, ou às vezes é falta de saída que a pessoa se percebe nessa
falta de saída (...)”.5
Ivone: “A gente falou outra questão da falta de esperança (...)”.
Daiane: “A gente trouxe a questão religiosa o fato de ter Deus, ver o sentido maior
pra vida isso dificulta mais (...) mas assim dificulta mais essa decisão”.
Telma: “Suicídio como forma de vingança pra família, ou então para alguma outra
pessoa (...)”.
É importante destacar que os discursos apresentados pelos participantes da pesquisa,
compreendem fatores isolados, como causas de suicídio. De acordo com a literatura
pesquisada (KOVÁCS, 1992; MELEIRO, TENG & WANG, 2004), o suicídio não é
unicausal, ou seja, não é determinado por um único acontecimento na vida do indivíduo.
Assim, a complexidade de fatores para esse desfecho deve ser considerada.
4 Os nomes apresentados a partir de agora são fictícios, adotados para preservar a identidade dos participantes.
5 Com o objetivo de preservar a expressão original dos participantes, as falas foram transcritas da forma como foram ditas.
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A pergunta: “O que se fala sobre o suicídio?” Se relacionou mais com uma ideia
formada pelo senso comum, que não está calcada numa informação científica, pois, de forma
geral as pessoas criam ideias sobre o suicídio. É importante destacar que ao responderem essa
questão, os sujeitos evidenciaram, novamente, a existência de uma visão unicausal para
explicar o comportamento suicida:
Denise: “(...) A família tenta simplificar, às vezes a pessoa trouxe que era drogas, mas
na verdade nunca tinha se envolvido com drogas e foi uma forma fácil da família trazer isso
(...)”.
Ivone: “Eu ouço muito mais que é por falta de Deus porque já tem um rótulo né”.
Daiane: “Outro pensamento que a gente trouxe foi o fato da pessoa ter dívida, ou
perdeu o status social”.
Como apontado, os mitos sobre o suicídio da (OMS, 2006) correspondem a ideias
errôneas relacionadas ao tema. Dentre os mitos, pode-se destacar:
Mito 6: Os indivíduos que tentam ou cometem suicídio têm sempre alguma
perturbação mental. Tal mito esteve presente nos relatos dos participantes:
Maria: “Eu já ouvi falar que sempre a depressão leva ao suicídio (...)”.
Maria: “Eu já ouvi falar que morre por problema mental”.
Daiane: “Morreu de suicídio porque era louco”.
Cabe lembrar que embora o comportamento suicida, geralmente, seja associado à
depressão, abuso de substâncias, esquizofrenia ou outras perturbações mentais,
comportamentos autodestrutivos e agressivos, a proporção relativa destas perturbações varia
de lugar para lugar e há casos em que nenhuma perturbação mental foi detectada.
Na fala abaixo pode-se perceber o que a literatura aponta como Mito 10: As crianças
não cometem suicídio dado que não entendem que a morte é final e são cognitivamente
incapazes de se empenhar num ato suicida.
Maria: “Mas tem suicídio em criança? Eu não sabia!”.
Alguns participantes sinalizaram a falta de conhecimento de suicídio em crianças, o
que leva a observar a importância de se falar sobre o tema. Como apontado pela (OMS, 2006),
embora seja incomum, crianças cometem suicídio. Qualquer gesto, em qualquer idade, deve
ser levado a sério.
Uma opinião trazida pelo grupo foi antagônica ao Mito 3: Os indivíduos suicidas
querem mesmo morrer ou estão decididos a matar-se:
Daiane: “Eu acho não sei, se a pessoa sai para comprar o chumbinho naquele tempo
todo ela tá pedindo ajuda, ela tá falando eu não acredito mais em nada, mas eu acho que
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ainda tem alguma chance, acho que ainda tem como alguém me ajudar, e tem alguma coisa
que pode acontecer”.
Observa-se a discordância com o mito, os participantes tiveram a percepção de que o
indivíduo em risco pode não ter solidez em seu desejo de morrer, pois há uma dúvida. De
acordo com a literatura, a maioria dos indivíduos que cometem suicídio conversam antes
sobre os seus pensamentos com pelo menos uma pessoa, ou ligam para uma linha telefônica
de emergência ou para um médico. Isso caracteriza uma ambivalência, pois o indivíduo
procura ajuda antes de se matar. Esse mesmo entendimento também foi encontrado no grupo,
de perceber o comportamento suicida como um pedido de socorro.
Outra questão importante evidenciada pelo grupo é referente ao Mito 5: O suicídio é
sempre hereditário:
Ivone:“Nisso não tem genética?”.
Nesse sentido, cabe esclarecer que nem todos os suicídios são associados à
hereditariedade e a fatores genéticos. Embora exista esse mito, os estudos não são
conclusivos. Corrêa e Barrero (2006) apontam que os dados de epidemiologia genética
mostram que além de fatores multicausais e ambientais, existe também uma influência
genética no comportamento suicida. Porém, qual ou quais genes responsáveis, isso os estudos
não revelam.
Ao dialogarem sobre a questão: “Quem morre mais por suicídio homem ou mulher?”,
houve divergências entre a opinião dos participantes, o que pode ser percebido nos relatos:
Daiane: “Acho que pela minha experiência é muito de igual para igual (...) ocorre
muito com homem e mulher”.
Ivone: “Acho que homens morrem mais”.
Neide: “Pra mim eu acho é adolescente”.
A discussão grupal proporcionou o seguinte entendimento:
Ivone: “(...) o homem morre mais em comparação com a mulher”.
Maria: “Então, a mulher se cuida mais, vai mais ao médico, vai mais a igreja (...)”.
Com relação a essa questão, é relevante que estudos do IBGE (2006) mostram que, no
ano de 2005¸ no Brasil, houve 6.724 óbitos na população masculina e 1.803 óbitos na
população feminina por suicídio. Esses dados reforçam estudos de Meleiro (et al. 2004);
Werlang e Botega (2004), que mostram que, o maior risco de suicídio é no gênero masculino,
portanto o homem morre mais por suicídio do que a mulher.
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A reflexão sobre o questionamento: “Que situações podem colocar alguém em risco?”,
trouxe concordância com a literatura de Meleiro (et al. 2004); Werlang e Botega (2004). Os
participantes apontaram os seguintes fatores:
Ivone: “Falta de esperança, perda do sentido da vida, pedido de ajuda (...)”.
Telma: “Despreparo de lidar com problemas”.
Telma: “Falta de habilidade da pessoa em resolver seus problemas dela”.
Maria: “Arma de fogo dentro de casa”.
Com relação à pergunta: “Que situações podem proteger alguém de suicídio?”,
inicialmente o grupo não soube responder:
Ivone: “Nós falamos pouco, não deu para chegar numa conclusão”.
Inicialmente o grupo não reconhecia os fatores que podem proteger um indivíduo
com comportamento suicida. Após as discussões, os participantes ampliaram sua percepção
sobre o fenômeno e conseguiram levantar vários fatores de proteção ao suicídio, como:
casamento, gravidez, religião, estabilidade financeira, filhos em casa, ter boa capacidade de
resolver seus problemas e ser do gênero feminino.
Como os participantes não abordaram a pergunta: “É possível prevenir o suicídio?”, a
diretora retomou a questão. Veja os relatos:
Ivone: “Eu acho que um pouco não na totalidade, mas alguma coisa sim”.
Telma: “É que 50%, outras pessoas eu acho que é possível”.
Telma: “Isso não tem haver com índole da pessoa? (...) pra mim índole é a
capacidade da pessoa de superação boa (...)”.
Neide: “(...) Em algumas situações é possível, em outras depende da pessoa também”.
De acordo com Kutcher e Chehil (2007), nem sempre é possível prevenir o suicídio, o
que é possível é identificar fatores de risco e fatores de proteção que podem ajudar a
reconhecer o sujeito que precisa de uma avaliação abrangente por uma equipe de saúde.
No segundo encontro durante o aquecimento, um participante do grupo descreveu às
pessoas ausentes no último encontro, o que havia acontecido, destacando o que haviam
aprendido sobre a temática:
Ivone: “Que é possível prevenir, em alguns casos sim outros não”.
Ivone: “Normalmente, o suicídio nos homens é mais eficaz do que o das mulheres,
apesar das mulheres tentarem em maior número”.
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Ivone: “Que o idoso corre grande risco, atualmente falou-se idoso, adolescentes e
jovens adultos”.
Ivone: “(...) Eu achei de uma forma geral, pra mim começou a ter um esclarecimento
(...)”.
Através desses relatos, pode-se perceber que houve uma ampliação na compreensão do
comportamento suicida, relacionado aos fatores de risco e de proteção.
No segundo encontro, após a exibição de um trecho do filme “As Horas”, a diretora
propôs dramatização de uma cena, contudo um dos grupos mostrou dificuldade em
representá-la. Embora o grupo tivesse sido orientado a dramatizar numa mesma cena um
personagem em risco de suicídio e outro personagem que tentaria proteger o sujeito em risco
de suicídio, a construção grupal foi de duas cenas que representou um fator de risco e outra
cena representou um fator de proteção.
Na cena com o conteúdo sobre o fator risco, foi representado um casal de idosos. A
personagem – uma senhora se via feliz com a família que construiu junto com seu cônjuge e
infeliz, ao mesmo tempo, com a sua aparência, devido à velhice: “tá muito insuportável viver
nessa forma”. Enquanto o marido foi pescar, a senhora suicidou-se inalando gás de cozinha.
No mesmo grupo, na segunda cena, representaram um fator de proteção. Uma
executiva com 40 anos de idade, não encontrava sentido de viver após a morte do esposo, e
por isso, pensava em se matar. Apesar desses sentimentos de desesperança, ela tinha uma
rotina de trabalho e teve um novo relacionamento. Temendo estar na menopausa precoce, a
executiva marcou uma consulta com sua médica ginecologista. Após alguns exames, ao saber
que estava grávida, colocou fim a seus pensamentos suicidas. Essa dramatização denota que a
personagem encontrou razões para viver, e afastou os seus pensamentos suicidas, portanto, a
expectativa de ter um filho funcionou como um forte fator de proteção.
O outro grupo representou uma cena de duas amigas conversando. A personagem em
risco de suicídio fez uma visita a uma amiga que tentou ajudá-la em seu sofrimento. Com
êxito, a mulher conseguiu convencer a amiga em risco a procurar ajuda e evitar o ato.
O grupo compartilhou seus sentimentos em relação à vivência. Algumas falas dos
participantes foram:
Ivone: “A experiência de montar essa cena (...). Os fatores de risco vêm com muito
mais facilidade”.
Ivone: “(...) Então eu tenho trabalhado na minha cabeça, para primeiro ter uma coisa
boa, mesmo diante do problema, pra depois a gente, eu parar pra ouvir o lamento, pra dar
atenção no lamento depois (...)”.
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No terceiro encontro, houve explanação sobre dados epidemiológicos, mitos, fatores
de risco, fatores de proteção e orientações sobre o que fazer quando estiver com uma pessoa
em risco de suicídio. Foi um momento esclarecedor para os sujeitos. Destacam-se os relatos:
Ivone: “Eu não tinha noção sobre esses números, eu sabia que era alto, mas não
sabia desse aumento”.
Maria: “Eu achei diferente, quando você falou que no idoso tá aumentando o número
de suicídio, eu não tinha parado para pensar nisso”.
É pertinente ressaltar a importância do estudo, na medida em que ao abordar à
temática do suicídio, os sujeitos se informaram e refletiram a respeito do tema. Isso confirma
o objetivo do sociodrama construtivista, no que se refere à proposta educativa do método.
Ainda no terceiro encontro, após a explanação dialogada, foi proposto ao grupo que
construíssem um cartaz com cinco ideias claras e objetivas sobre “algumas ações para
prevenção do suicídio”. O grupo construiu as seguintes frases:
1- “Procure melhorar as relações com seus amigos, familiares e colegas”.
2- “Procure ajuda de profissionais como psiquiatra e psicólogo”.
3- “Nunca ignore uma ameaça ou tentativa de suicídio. É um pedido de socorro”.
4- “Escute alguém, você pode salvar vidas”.
5- “Observe comportamentos das pessoas a sua volta, como: isolamento, tristeza,
agressividade, falta de esperança, pessimismo e outros”.
Para o encerramento do sociodrama construtivista, foi solicitado ao grupo construir
uma imagem que representasse como haviam chegado ao primeiro encontro e uma segunda
imagem, que representasse como se sentiam após os três encontros.
A primeira imagem construída pelo grupo foi a de pessoas que chegaram a sala e
permaneceram distantes umas das outras sem comunicação. A cena evidenciou sentimentos
de insegurança, curiosidade e medo. A segunda imagem ocorreu através da construção de um
círculo, onde todos estavam conversando, demonstrando atenção uns com os outros. A cena
evidenciou satisfação e confiança por terem aprendido estratégias de prevenção do suicídio.
Sobre a vivência, os participantes destacaram:
Denise: “A gente tava como que entrando em um lugar desconhecido, mais em um
lugar estrangeiro (...). Primeiro a gente estava conhecendo o espaço”.
Dulce: “E agora não, a gente já se conhece, já tem comunicação. Já formou o grupo
com uma liberdade, né? Com uma liberdade de falar, de expressar, com uma confiança, né?
E a gente vai levar esperança, né?”.
Maria: “A gente vai lembrar do rosto de cada um né?”.
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Assim, é possível perceber que cada um trouxe contribuições ao grupo, para que
ampliassem sua visão sobre o suicídio, vendo a complexidade desse fenômeno como
apontado na literatura (ESTEVES DE VASCONCELLOS, 2002; KOVÁCS, 1992;
MELEIRO, TENG & WANG, 2004). Veja o relato:
Ivone: “E você esclareceu junto com o grupo que nunca é uma única causa, e que a
gente não deve se martirizar: ‘- Ah eu podia ter feito isso’, porque não é só isso, são fatores
que culminam no acontecimento, para mim foi esclarecedor”.
Ivone: “(...) O que me chamou atenção também, é pensar que são muitos motivos
banais que levam ao motivo grande, né? É uma tristeza, uma ausência, é uma depressão por
idade, é uma vaidade e vai acumulando tudo. Isso realmente foi o que mais me chamou
atenção, que não é um motivo, são vários pequenos motivos que faz o todo, né”.
Em seguida, a diretora solicitou aos participantes que escrevessem o que havia
significado a experiência grupal:
“Valiosa, enriqueceu conhecimentos sobre o tema, informações úteis a nós e outras
pessoas ao nosso redor. Importante para desfazer “tabu” do suicídio e demais perdas.
Capacitou-nos para ajudar o próximo, e também tivemos a gratidão de colaborar no trabalho
eficiente da psicóloga Bianca, a quem agradecemos a oportunidade que nos ofereceu”.
“No primeiro momento, resolvi participar mais por curiosidade e para conhecer um
pouco mais. Hoje pude perceber que com pequenas ações, posso salvar vidas”.
“Achei essa experiência muito importante, pois propiciou o diálogo entre pessoas
que sequer se conheciam e levou a um debate e ampliação da consciência sobre a temática:
suicídio”.
“O maior fruto da experiência, na minha opinião, é de entendê-lo como um
movimento para a quebra de tabus sobre o tema”.
Além disso, foi discutido no grupo, a quebra de tabu proporcionada pela divulgação do
trabalho na paróquia, ocasião em que as pessoas presentes nas celebrações ouviram o aviso
dado, que convidava a comunidade daquela região a participar do trabalho. Nesse sentido, é
importante pontuar que embora centenas de pessoas tivessem tomado conhecimento da
proposta do estudo, a adesão ao grupo, foi proporcionalmente pequena, evidenciando que o
suicídio é uma temática evitada em nossa sociedade.
Considerações Finais
A autora vivenciou com o método do sociodrama construtivista a oportunidade de
construir com o grupo, novas ideias e formas de enfrentamento do problema: suicídio. Assim,
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os participantes puderam ampliar o seu conhecimento e ver a questão não mais como tabu e, à
medida que alcançaram uma visão aprofundada sobre o tema, tiveram um novo sentimento de
esperança frente à possibilidade de prevenir o ato suicida.
Os objetivos da pesquisa foram alcançados, através da utilização do sociodrama
construtivista, o que aponta para a importância desse método como uma estratégia de
prevenção ao suicídio. O estudo evidenciou um significado estigmatizado, que os
participantes davam ao fenômeno do suicídio e sensibilizou-os para identificarem os sinais de
alerta em pessoas com risco de suicídio. Além disso, se tornaram multiplicadores das ideias
discutidas no grupo, ampliando o alcance do trabalho.
Essa intervenção foi gratificante na medida em que se percebe mudança de
pensamentos em cada encontro. No início das intervenções evidenciaram medo e ansiedade
com relação à experiência de estar no grupo e de falar sobre suicídio. Após as intervenções, os
participantes se sentiram seguros e responsáveis por ajudar pessoas em riscos de suicídio. De
posse desses conhecimentos, os participantes ficaram mais interessados e motivados em
aprofundar no assunto.
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