st. peter's village
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SINOPSE: Diana Gomes aos 16 anos foi morar com sua avó numa pequena cidade depois que seus pais foram mortos durante um sequestro relâmpago. Nessa cidade, as pessoas acreditam na lenda de uma água milagrosa, descoberta pelo professor Pedro. Quando estranhos desaparecimentos começaram a ocorrer, o barão foge com a família para dentro da floresta e passam a viver na escondida Aldeia de Santo Pedro onde acabam morrendo, deixando órfãos três irmãos que continuaram morando na floresta. Tentando se integrar à vida nova, Diana se apaixona por um rapaz misterioso que mora dentro da floresta. Este rapaz pode estar envolvido no estranho caso sobrenatural ligado à lenda do Santo Pedro. Através de seu psicólogo, ela fica sabendo de um trágico acidente envolvendo a morte da família Baleares. Determinada a investigar com sua melhor amiga, Diana pensa que Ric, o rapaz por quem ela se apaixonou, pode ser um fantasma.TRANSCRIPT
2012
volume 01
Aldeia de Santo Pedro
Água
Volume 01
Suspense - Romance - Ficção – Sobrenatural.
Para maiores de 16 anos
Escrito por Danielle Sampol
Rio de Janeiro, RJ - 2012.
ATENÇÃO
ESTE LIVRO ESTÁ REGISTRADO NA BIBIOTECA NACIONAL
Está é uma obra original da autora,
qualquer semelhança com outras obras é mera coincidência.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Sinopse
Aos 16 anos, Diana foi morar com sua avó numa pequena cidade
depois que seus pais foram mortos durante um sequestro relâmpago.
As pessoas da cidade acreditam na lenda de uma água milagrosa,
descoberta pelo professor Pedro.
Quando estranhos desaparecimentos começaram a ocorrer, o barão
foge com a família para dentro da floresta e passam a viver na
escondida Aldeia de Santo Pedro onde acabam morrendo, deixando
órfãos os três irmãos Ram, Edie e Ric que continuaram vivendo na
floresta.
Tentando se integrar à vida nova, Diana se apaixona por um rapaz
misterioso que pode estar envolvido num estranho caso sobrenatural
ligado à lenda do Santo Pedro.
Através de seu psicólogo, Diana toma conhecimento de um trágico
acidente envolvendo a morte da família Baleares e determinada a
investigar com sua melhor amiga, ela pensa que o rapaz por quem
ela se apaixonou, pode ser um fantasma.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
“Não sei se conseguiria contar com as mesmas palavras, mas acho que
foi isso que eu entendi. Ele falou comigo sentado no velho chafariz.
Estava lindo, de cabeça baixa olhando para o chão. Mesmo sem ter visto
uma única lágrima, eu tenho certeza que ele estava chorando”.
(Diana Gomes, 1996)
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Prólogo
Sudeste do Brasil - Rio de Janeiro.
Petrópolis, 1980.
Nenhuma tarde passava despercebida para a família Baleares, a
baronesa, sempre reunia a família na varanda para o lanche.
Os garotos com suas mãos barrentas e seus pés descalços chegavam
sempre juntos rindo e se batendo um no outro. Famintos, nem se
davam ao trabalho de lavar as mãos. Tudo isso para não perder os
pães de batata que a baronesa preparava com carinho para seus três
filhos.
O ultimo a chegar à mesa era o patriarca da família Baleares, que
todos os moradores locais o chamavam de barão, embora ele não
gostasse.
Juan Baleares nasceu na Europa, mas mudou-se para o Brasil antes
de completar vinte anos. Nascido em berço ouro, ele herdou toda a
fortuna dos pais. As pessoas da pequena cidade não estavam
acostumadas com uma pessoa rica vivendo entre delas, daí bastou
uma única brincadeira para que o apelido de barão estivesse na boca
de todos. Incluindo Celina, a esposa dele, que também foi apelidada
de baronesa.
O pequeno Ram, era o mais baixo e o mais magro dos irmãos, era
também o filho mais velho da família Baleares e o mais apegado ao
pai. Edie era o irmão do meio e Ric, o caçula da família.
Edie era mais lento que os outros irmãos. Nunca tinha vantagem nos
treinamentos de combate, mas isso não era problema quando se
tratava na habilidade com as facas. Edie possuía uma mira perfeita.
Seus olhos verdes eram o xodó da baronesa, ela sempre fazia pães
de batata recheados somente para ele.
Edie também era o eterno apaziguador nas brigas entre Ram e Ric
pela atenção do barão, pais dos três irmãos.
Os garotos passavam boa parte do tempo com o pai, treinando lutas
de combates corpo a corpo e com espadas japonesas. O barão era
um grande admirador de artes marciais, mais especificamente as
japonesas. Os treinamentos com seus filhos eram realizados ali
mesmo, na grande propriedade que pertencia à família baleares.
Ram era chamado de magrelo pelos outros irmãos e isso gerava um
ódio enorme em seu coração. Sua pele era muito branca, seus
cabelos eram escuros e seus olhos muito expressivos. Ninguém
conseguia descrever ao certo a cor exata daqueles olhos, nem
mesmo a própria mãe, mesmo assim eram marcantes, exóticos,
misteriosos.
A personalidade forte de Ram o fazia constantemente brigar com Ric
por atitudes infantis, mas ninguém sabia se era consequência da
idade ou pirraça para atormentar o irmão.
Ric era o mais alto. Agia como se fosse abraçar o mundo com as
próprias mãos. Ele achava que poderia fazer de tudo sem medir as
consequências. Ao contrário de Ram que escondia tudo pelo olhar, os
olhos verdes de Ric eram como um livro aberto podendo ser lido por
qualquer pessoa.
Ele sempre escapava da propriedade em busca de conhecimento,
Ram e Edie eram mais tradicionais sempre seguindo o costume local
e as tradições da família, mas Ric era diferente, questionador e
eloquente.
A única característica que os irmãos compartilhavam juntos era o
gosto por cavalos. A propriedade dos Baleares era muito grande e a
família criava belos animais.
No entanto, estranhos desaparecimentos começaram a ocorrer de
uma hora para outra na pequena cidade, vizinha à floresta.
Pouco tempo depois dos milagres, alguns adultos, crianças e
adolescentes, desapareceram misteriosamente e as autoridades não
sabiam esclarecer se era rapto, sequestro ou assassinato, mas o fato
é que estavam sumindo e as pessoas da cidade estavam apavoradas.
A baronesa, já não permitia que os meninos andassem sozinhos fora
da propriedade sem a presença dela ou algum empregado da casa,
ela tinha medo que seus filhos também pudessem desaparecer.
Em meio ao caos, o barão formou um grupo de busca com homens de
sua estrema confiança armados com espadas e facas, ele não
suportava armas de fogo, achava que era uma medida digna de um
covarde que não dá chance de defesa ao oponente, mesmo sendo um
oponente fora da lei.
O barão era uma pessoa extremamente influente nas políticas da
cidade, era um homem rico, por isso era ele quem organizava e
tomava a frente das buscas pelos desaparecidos ignorando a polícia
local.
Quando alguém comentava os desaparecimentos, o Barão alterava
completamente seu comportamento, desconversava e ficava muito
agressivo caso alguém insistisse em comunicar as autoridades da
cidade visinha.
Achando muito estranho, a baronesa perguntou ao marido por que
demorava tanto tempo dentro da floresta fechada, já toda vez que o
seu grupo de busca partia à procura dos desaparecidos, regressava
dias depois, quase semanas.
O barão, sentindo-se pressionado, não teve como esconder a verdade
da baronesa. - Eu tenho algo muito importante a lhe contar Celina. –
Melhor sentar-se.
A baronesa parecia não acreditar nas palavras dele. As lágrimas
escorriam pelas bochechas finas que emolduravam o rosto dela. O
barão, mantendo a expressão séria, revelou-lhe que ele estava
envolvido no caso das pessoas que estavam desaparecendo.
Eles começaram a discutir e o barão tomou as esposa pelos braços,
que eram fortes como ferro fundido, e a levou até o quarto deles
ordenando que ela arrumasse as malas de toda a família.
Muito abalada obedeceu às ordens de seu marido enquanto gritava
pelos filhos. –Richard, Edgard, Ramcy, venham até aqui.
Os garotos correram até o quarto da mãe assustados, ela mãe nunca
havia gritado com eles tão alto como naquela tarde.
Quando anoiteceu começou a ventar forte parecendo que iria
arrancar árvores inteiras, até pedaços de telhado estavam voando
por toda parte e todos ouviram estrondos fortes de relâmpagos.
A família Baleares, com malas repletas de roupas e pequenos
utensílios pessoais, partia com o empregado pessoal da baronesa,
seguindo por uma estradinha que levava até a beira da floresta com
seus cavalos e uma pequena carroça de passeio enquanto o barão
permanecia na propriedade.
Era quase impossível acreditar que o empregado iria entrar com toda
a família no meio do mato, não considerando os perigos da noite que
perambulavam na floresta.
Ric e Edie estavam assustados com o que estava acontecendo, mas
Ram mantinha-se calmo à frente da caravana, ele parecia estar
ciente de tudo que estava acontecendo.
Passando algumas horas, viajando floresta adentro, a baronesa já
não sabia mais onde estava e nem por onde poderia retornar para a
cidade.De repente, quando não tinha mais estrada a caravana parou.
Eles se depararam em frente a um paredão de plantas e galhos de
árvores bloqueando a passagem e o barão atravessou por ele. Como
um passe de mágica, o paredão se abriu diante dos olhos de todos,
dando vista a uma nova estrada.
Sufocando seu pânico, a baronesa agarrou-se aos meninos que
estavam com ela na carroça tentando protegê-los, mas eles não
aceitaram. Ric e Edie desembainharam suas espadas e avançaram de
encontro ao pai, pensando que ele de alguma forma iria tentar
alguma maldade com a mãe deles. Foi à vez do pequeno Ram, que
apontou sua espada e se voltou contra os irmãos, na intenção de
proteger o pai.
A baronesa saltou da carroça de passeio e posicionou-se entre Edie e
Ric, Ram e o Barão então todos abaixaram suas espadas. A calmaria
da noite superou o ambiente enquanto o Barão falava com sua
esposa. - Calma Celina, nada de mal vai acontecer com você ou com
nossos meninos. – Ele falou limpando suas lágrimas - Estamos a
salvo e ninguém saberá onde nos encontrar.
Aceitando as palavras dele, a baronesa retornou de volta á carroça e
todos seguiram através da passagem que se abriu onde havia o
paredão.
Os meninos ainda tensos acompanharam silenciosamente seus pais e
nenhum deles teve coragem de olhar nos olhos um do outro durante
todo o resto do caminho.
À medida que eles avançavam pela passagem aberta no meio do
nada, uma nova estrada de terra se apresentou e podia-se ver
pequenas luzes de fogo que ficaram mais intensas quando eles se
aproximavam. Então as pequenas luzes de fogo se transformaram em
tochas que estavam iluminando todo o trajeto.
Quase engasgando na própria saliva, Ric espiava de soslaio
parecendo não acreditar que tudo levava a crer que ali, no meio de
uma floresta, encontrava-se uma pequena aldeia com pequenas
casas e pessoas morando dentro.
Ele imediatamente reconheceu os rostos das pessoas que seguravam
as tochas parados nas portas das casas olhando para ele com
expressões de curiosidade e medo. Eram as pessoas desaparecidas
da cidade.
Edie Mantinha-se ao lado da mãe o tempo todo, mas o pequeno Ram
caminhava de cabeça erguida ao lado do pai, sério e com sua espada
nas mãos.O barão conduziu sua família em silêncio, ninguém se
atrevia a falar.
Chegando à porta da casa principal a família não pode deixar de
notar, quando a porta foi aberta, que a casa estava completamente
mobilhada, cada cômodo pronto esperando para ser ocupado.
Foi permitido pelo Barão que os meninos explorassem a casa
enquanto o barão conduzia sua esposa até a suíte do casal.
- O que significa isso Juan? - Perguntou a baronesa. - Não estou
reconhecendo você.
– Vamos morar aqui a partir de agora, Celina. - Ele respondeu - Esse
vai ser nosso lar.
A baronesa arregalou os olhos extremamente verdes. Abalada com
tudo aquilo ela não teve coragem para se opor ao marido. - Por que
isso? - Ela perguntou.
O barão se aproximou, colocando as duas mãos enormes sobre os
ombros da mulher. - Ela existe, Celina. - A lenda é verdadeira...
- Ela existe.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
1
Água
Petrópolis (1988).
Oito anos depois...
As férias desse ano foram iguais a todas as outras, com uma única
variante, Dina não voltaria para casa quando acabassem. A triste notícia
chegou aos ouvidos dela como um verdadeiro Tsunami devastando todos
seus sentidos, por pouco ela não conseguiu ficar em pé depois que
colocou o telefone no gancho.
A cidade ficou estranha depois que descobriu que era órfã de pai e mãe.
Passando ano após ano de férias na casa da sua avó ela começou a ver
tudo por outro ângulo.
Sua avó preparou todos os papeis de transferência da nova escola e para
piorar ainda mais, teria que passar por uma mudança total de ambiente
no auge dos seus 16 anos. Com certeza isso seria motivo suficiente para
algumas consultas com psicólogo da família.
O homem era lunático, ao invés dela falar sobre o que ela estava
passando era ele quem contava histórias esquisitas sobre Pedro, antigo
morador da cidade.
Como ela não estava nem um pouco interessada em falar sobre sua vida
pessoal com o psicólogo, deixou que ele falasse enquanto o tempo
passava. Ela apenas ouvia.
Aqui na cidade, muitos anos antes de você nascer, existia uma lenda que os
antigos contavam. Uma teoria de que uma água poderia curar todas as
enfermidades. A maioria das pessoas não acreditavam que uma
determinada água que brotava dentro da floresta, ninguém sabia onde,
poderia aumentar a expectativa de vida das pessoas e até dos animais, e
quem bebesse dessa água não teria nenhuma doença, se curaria muito
rápido e poderia até viver muito mais anos de vida.
- Então quem bebesse seria imortal, como os vampiros e lobisomens? -
Ela perguntou.
- Não é exatamente desta forma, minha criança.
Na verdade, quem bebesse dessa água aparentemente se tornaria escravo
dela porque não poderia beber outro tipo de água, somente essa água
especifica. Então um professor de biologia, muito querido aqui na cidade,
começou um projeto de expedição com objetivo de descobrir o local dessa
água milagrosa.
Esse professor chamava-se Pedro, e era um homem extraordinário que
ajudava todo mundo aqui na cidade. Ministrava aulas para crianças e era
muito religioso. Professor Pedro, como lhe chamavam, junto com outros
pesquisadores, partiu numa certa manhã para dentro da floresta e nunca
mais voltou digo, não o grupo completo que partiu, os únicos que voltaram
foram Pedro e Juan.
- Nossa, que historia mais tosca. - Ela sussurrou baixinho.
A todo o tempo ela pensava que, mesmo a historia da água milagrosa
sendo tosca, era bem mais emocionante que a dela. Concluiu que a
realidade de fato, era que sua historia não tinha nenhuma emoção, era
um verdadeiro filme de terror, já que tinha morte envolvida no meio.
Enquanto o homem falava, ela o observava beber a todo o momento, um
gole de uma garrafa que ficava ao seu lado. “Bebendo em serviço à essa
hora.” Ela pensou.
Quando o tempo de análise terminou ela despediu-se do psicólogo e
marcou uma próxima sessão. “Quem sabe ele tinha outras historias mais
interessantes”, ela pensou. “Lendas definitivamente não me atraem”.
Atrasada para missa das 19hs correu tanto quanto pode aguentar. Não
estava acostumada com o tipo de ruas da cidade, embora sempre
passasse as férias por lá.
As pedras de paralelepípedos eram muito desniveladas e cobertas com
um tipo de areia que fazia com que elas escorregassem muito, Ops!
Sentindo seus joelhos ardendo, percebeu o gosto salgado das lágrimas
quando escorreram através das bochechas até chegar aos seus lábios, o
impacto dos joelhos dela ao chão fez com que ela soltasse o maior grito
de dor que ela jamais havia sentido antes.
Se ela fosse contar a alguém não saberia como descrever a dor que
sentia naquele momento e se por acaso ela pudesse contar, descreveria
talvez, que era a própria visão do inferno.
Choramingando tentou levantar-se, mas suas pernas estavam bambas
com o tombo e a dor. “Merda”. Pensou quando reparou que havia areia
dentro da sua pele.
A coloração vermelha no joelho misturada com a areia do chão causava
arrepios, quando percebeu um rapaz se aproximando lentamente, mas
ela estava tão anestesiada com a dor que não pensou que poderia ser
um assalto ou coisa assim.
- Parece que você tem um pequeno problema ai. - O rapaz falou - Eu
posso ajudar você?
- Com a dor que eu estou sentindo, aceito qualquer ajuda, mesmo vinda
de uma pessoa estranha, assim como você...
Se antes, ela estava anestesiada com a dor, agora a paralisia tomava
conta das suas funções, quando ela olhou para ele. Ficou alguns
segundos olhando para aqueles olhos verdes sedutores, que tagarelavam
na sua frente.
Em pouco tempo a visão do inferno começou a mudar radicalmente para
o retrato do paraíso. “O cara é lindo, simplesmente mais que lindo”.
Pensou. E o sorriso seguro que ele tinha era a perfeita combinação para
aquele rosto alegre que ele exibia.
- Calma, deixe-me verificar como está o seu machucado. - Ele agachou -
se ao lado dela - Me parece que isso deverá cicatrizar em pouco tempo.
- Pouco tempo? - Ela tentou rir. - Quase dá para ver o osso ai dentro. -
Falou olhando para o joelho.
- Você está exagerando, não é tão grave. - Ele debochou do que ela
havia dito. - Você vai sobreviver, deixe-me limpar o seu machucado.
O rapaz pegou um pedaço de tecido que não parecia em nada com
lenços do tipo que os cavalheiros dos filmes costumam usar, o pano
estava todo encardido e ela ficou com um pouco de nojinho por ele
colocar o tecido na ferida dela.
Puxando um cantil de água amarrado às suas costas, ele molhou o pano
e passou sobre machucado. O toque dele era delicado e ele foi bastante
gentil enquanto segurava o tornozelo dela para ter um melhor apoio na
assepsia do machucado.
Naquele instante ela não sentiu qualquer dor que pudesse ter uma vez
sentido, para ficar admirando o rapaz que estava ajudando.
- Obrigada, parece que a dor melhorou.
- Venha, vou ajuda-la a levantar, segure minha mão.
Ele pegou na sua mão e o toque que antes era delicado, passou a ser
firme para que ela pudesse se ancorar ao levantar-se, mas no meio do
movimento Dina sentiu o joelho ferido vacilar e desequilibrou.
Mais que depressa a outra mão dele que estava livre, avançou para a
cintura dela ajudando-a firmar-se em pé. Quando ela achou que iria cair
lançou as duas mãos sobre os ombros dele alcançando seu pescoço com
os braços, puxando-o forte para perto de si.
Ficaram encostados um no outro por alguns segundos, ele a olhava com
aqueles olhos sedutores e ela o olhava de volta. A respiração dele ficou
mais ofegante e ela pôde perceber que ele ficou tenso, foi ai que ela
cortou os olhares entre os dois pedindo desculpas. Ele apenas sorriu.
Foram caminhando juntos até o final da rua. Ela sentia uma pequena
dificuldade em andar e ele seguiu junto a ela caminhando ao seu lado,
segurando-a com a mão firme certificando que ela não cairia novamente.
Quando as luzes da igreja ficavam mais fortes eles pararam. Ele
vasculhou o resto da rua, a sua expressão já não era mais a mesma e o
seu sorriso havia sumido completamente, ele parecia rígido e
preocupado.
- Eu devo assistir a missa, minha avó esta esperando por mim. - Quer
conhecê-la?
- Acho que não é uma boa ideia. - Ele respondeu. - Eu preciso ir já
passei mais tempo aqui do que eu deveria. - Consegue andar ate lá
sozinha?
- Sim, acho que consigo. Obrigada. – A propósito, meu nome é Diana.
- Você mora aqui na cidade, Diana?
- Sim, com minha avó.
- Se você mora aqui, então nós somos vizinhos.
- E eu posso saber o nome do meu vizinho? - Perguntou
maliciosamente.
Ele ficou observando ela por um momento e sua expressão era curiosa.
Então uma amiga de Dina aparecia na porta da igreja com intenção de
chama-la, Dina virou-se para a amiga enquanto ele disse seu nome.
- Eu sou Richard.
- Prazer em conhecer Richard... - Diana falou enquanto virava de volta o
rosto querendo agradecer por ele tê-la ajudado, mas não havia ninguém
com ela.
Ele havia sumido.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
2
Desavenças e verdades
Ainda mancando, Dina conseguiu andar até a porta da igreja para encontrar-
se com sua amiga Angélica que ela apelidava carinhosamente e
pejorativamente de Anja.
Ela estava parada em frente a ela com cara de muitas perguntas, mas Dina
não deixou que ela abrisse a boca, tratou de pendura-se no ombro da amiga
e pediu que ela a ajudasse a caminhar até perto da sua avó.
Dois lugares ao lado dela estavam vazios esperando para ser ocupados pelas
duas. - O que aconteceu com seu joelho, querida? - Perguntou sua avó.
- Nada de mais. Respondeu Dina. - Eu apenas caí quando sai correndo para
não perder a missa.
- E o que é isso ai amarrado no seu joelho? - Perguntou Angélica. - Que
pano sujo é esse?
- É do Richard, ele me ajudou limpando o machucado. - Dina respondeu
enquanto sua avó ignorava as duas ouvindo o padre falar. - Ele deixou o
pano aqui.
– Quem é Richard? - Perguntou Angélica novamente.
- É o rapaz que me ajudou, já disse. - Quando eu caí na rua, vindo pra cá. -
Ela tentou explicar. - Você deve ter visto quando apareceu na porta da
igreja, não viu?
– Eu não vi ninguém com você na porta da igreja, Dina.
“Como Angélica não viu Richard”. Ela pensou. “Se ele estava bem ao meu
lado quando ela colocou a cabeça para fora da igreja”. Ficou pensando que
talvez Anja pudesse ser míope, ou estava muito escuro e realmente ela não
pode ver.
Dina achava impossível Anja não ter visto aquele homem forte, com um
sorriso lindo e olhos verdes que brilhavam mesmo na escuridão. Qualquer
garota teria ficado fascinada, assim como ela ficou. Também se achou idiota
por ter se esquecido de pedir o telefone dele.
Tá certo que aquela cidade pequena era um pouco atrasada comparada a
cidade grande, mas todos ali tinham telefone em casa e certamente aquele
“Deus gato” teria um telefone numa mesinha de em casa.
Enquanto isso na floresta...
- Mas onde diabos você estava com a cabeça para ir à cidade? - Não sabe
que isso pode ser perigoso?
- Não faça um drama a toa Edie, ninguém me viu. - Ric respondeu ao seu
irmão. - Eu tinha que ver como estava a nossa antiga cidade.
- Você tem certeza que ninguém viu você?
- Claro que tenho certeza, Edie.
- Então jure por nossos pais.
- Eu não vou jurar pelos nossos pais, não seja ridículo.
- Diabos, então alguém viu você. – Edie parecia irritado com ele. - Idiota.
– Talvez alguém tenha me visto, mas ela não seria capaz de me reconhecer,
esta morando à pouco tempo na cidade.
- ELA? - Edie ficou preocupado com a revelação do irmão. - Você por acaso
estava com uma mulher. - Ele jogou os braços para o ar. - Diabos, seu
idiota, deixou uma mulher ver você, ele vai acabar sabendo disso, e vai
fazer da nossa vida um inferno ainda maior.
- Relaxa Edie. - Ric fazia questão de tripudiar em assuntos sérios. - Você
tem passado muito tempo com macacos e preguiças. - Ric suspirou quando
se lembrou de Dina. – Eu conheci uma garota incrível.
Edie, sempre ficava na defensiva quando Ric sumia para explorar lugares
fora dos limites do refúgio. Desde que seus pais morreram, ele cuidou dos
seus irmãos até que a grande desavença separou de vez os meninos.
O garoto gordinho com olhos verdes e bem pequenos havia se tornado um
homem alto, ágil e forte. Com seus ombros bem definidos em cima de um
belíssimo peitoral masculino. Seus cabelos costumavam cair pela testa
tampando um pouco a visão dos olhos, mas nada que pudesse dificultar.
Quando criança era muito bom com as facas e espadas curtas, mas agora
que os anos passaram e ele cresceu tornou-se muito perigoso.
Depois que Ric ouviu todo o sermão de Edie entrou em sua pequena cabana
montada sob as raízes de uma arvore. Jogou o cantil de água que estava
nas costas num canto qualquer. Não existia nenhum luxo dentro da sua
cabana, apenas uma pequena cama feita com folhas secas aglomeradas em
baixo de um pano com tecido muito grosso e pesado.
A cabana era tão pequena que só possuía um único cômodo com aporta de
entrada e nada mais. Faltava espaço até para a cama e folhas que volta e
meia era destruída quando Ric se movia durante o sono.
Ele deitou com as costas voltadas para as folhas, ficou encarando o teto e
pensando na garota que acabara de conhecer na cidade, fora dos limites da
floresta. A lembrança do rosto dela ficaria registrada para sempre na
memória dele.
Em anos, depois que saiu da cidade e foi morar na floresta, nunca mais
havia se aproximado tanto de uma pessoa que não fosse da família ou os
outros membros de seu clã. Parecia que os acontecimentos passados ainda
ecoavam em sua mente.
Era difícil lembrar as coisas que Ram falou e fez contra ele, frequentemente
Ric era assombrado por pesadelos obscuros em que Ram o perseguia depois
que havia matado toda a sua família.
Ele acordava no meio da noite, com sua espada em punho e suas vistas
embaçadas que faziam com que ele não conseguisse distinguir a realidade
do pesadelo. Apenas uma coisa ele tinha certeza em sua mente. Ram teria
que pagar, ele não poderia ter feito todo aquele mal e ficado impune.
Na igreja...
Quase terminando a missa, as pessoas com suas cabeças baixas prestando
atenção nas palavras do padre pareciam estar em transe coletivo, não era
percebido qualquer movimento e Dina tentava adivinhar há quantos anos
aquele padre ministrava missas na mesma igreja.
Passado algum tempo o estômago dela roncava de tanta fome, ela mal
conseguia raciocinar alguma coisa quanto mais lembrar que seu joelho
estava machucado.
Olhou um estante para o lado e percebeu que sua avó dormia confortável
sentada no banco, ela achou incrível a maneira como a avó conseguia
dormir durante toda a missa sem se encostar em nada, ela até achou graça
e fiquei rindo sozinha, enquanto Anja prestava atenção absoluta nas
palavras do padre.
Quando finalmente a missa acabou todos que passavam por ela falavam
sempre a mesma coisa. - Como você está Diana? - Se precisar de alguma
coisa é só chamar. - Eu sinto muito pelos seus pais, eles eram tão jovens.
Em resposta com a cabeça, ela fazia um sinal de consentimento, mas no
fundo do meu âmago, ela não queira queria estar ali. Ela desejava sair
correndo para qualquer lugar o mais rápido possível.
Infelizmente lembrou que seu joelho estava machucado e concluiu que seria
impossível, incluindo voltar à sua casa.
Ela estava em completa negação e as pessoas falavam tanto que ela não
precisava dizer nada, apenas acenar com a cabeça.
-Boa noite Dona Augusta. - Anja despediu-se
– Boa noite Angélica, amanha você poderia acompanhar Diana e irem juntas
para escola?
– Claro que posso. - Ela respondeu. – Estarei aqui para o café da manhã,
espero que tenha pão de batata?
Dina entrou com sua avó pela porta da frente. Elas cruzaram a sala e
sentaram na cozinha. – Agora eu posso finalmente comer um pouco. - Ela
disse. – Estou morrendo de fome desde a igreja.
“Espero que não seja pecado ter assistido a uma missa pensando em
comida”. Pensava. Ela tinha se esquecido de fazer um lanche antes de ir a
análise com o psicólogo.
O cheiro dos Paes de batata da sua avó era maravilhoso, mesmo depois da
fornada ter saído muito cedo, logo depois do almoço. Ela preparava os pães
todos os dias. Todos os dias tinha pão fresco em casa.
Vó Augusta era uma excelente cozinheira tanto para doces quanto para
salgados. Todo mundo da cidade conhecia a comida que ela preparava. Ouve
uma época em que ela ministrou um curso de culinária na pastoral da igreja
onde teve muitas alunas. Quase todas as garotas da cidade aprenderam a
cozinhar com ela.
Dentre todas as alunas que ela teve, a única aluna do curso que aprendeu a
fazer o pãozinho de batata exatamente como ela fazia, também era a mais
bonita da cidade e a que casou mais jovem. Todos pensaram que ela casou
muito cedo por que estava grávida, mas com o tempo constataram que o
casal se uniu por amor.
O marido dela era um professor que não exercia a função. Ele era um
homem muito rico, viajado, proprietário de terras na Europa. Vendeu tudo e
veio morar na pequena cidade ainda jovem. Conheceu a linda menina do
curso de culinária da pastoral e se apaixonou por ela.
- Qual era mesmo o nome dela, vó? - Dina perguntou de boca cheia.
- Quem, querida?
- A menina que foi sua aluna no curso de culinária, aquela que fazia pão de
batata igual ao que a senhora faz.
– Não me lembro direito, querida, mas acho que era Celina.
– Bem, ela pode ter feito pães iguais ao da senhora naquela época, mas eu
vou aprender a fazer melhor que ela.
– Claro, querida você é minha neta e certamente tem a mão da família para
culinária.
Dina subiu para o quarto enquanto sua avó arrumava os pratos, ela não
gostava que a neta ajudasse a lavar louça, ela achava que a avó tinha medo
que ela fosse quebrar algum prato do século passado.
Reirou suas roupas e só lembrou do meu joelho quando olhou o pano sujo
que estava amarrado nele. Novamente pensou em Richard e no que ele
havia feito por ela. Sentou na cama, removeu o pano e notou que o
machucado estava praticamente curado.
“Como isso é possível” Pensou. “Esse ferimento levaria no mínimo uma
semana para criar aquela casquinha verde meio marrom.” O joelho mal
parecia que havia sequer esfolado. Se ela não visse com seus próprios olhos,
poderia jurar que tudo não passou de um sonho. Um sonho bem real.
“Melhor ir dormir, isso deve ser sono”. Ela trancou a janela foi até a cama,
puxou os lençóis, ajeitou os travesseiros, deitou e fechou os olhos.
Tarde da noite, dentro da floresta...
- Você tem certeza que ele saiu da floresta?
- Sim, Eu segui os rastros dele até a margem da estrada, mas deu perceber
que ele foi à cidade.
Ele olhou a escuridão como se pudesse enxergar o que estava se passando
na floresta. Àquela hora da noite nada que não fosse bicho conseguiria ver
um palmo na frente do nariz, mas isso não impediu que Ram tencionasse as
linhas do seu rosto, mostrando sua raiva ao saber da notícia.
- Eu não vou permitir que ele exponha nosso clã. - Sua voz era séria. - Ele
foi longe de mais, não terei pena dele como venho tendo esses anos.
– Nós podemos organizar busca e invasão ao refugio deles. - Só preciso que
dê a ordem e eu reunirei os outros.
– Não Lucaar. - Não é o momento adequado. - Ram respondeu. - Mas
quando chegar a hora, eu vou cortar a cabeça dele. - Você pode ter certeza.
Virando as costas para a floresta, vestindo trajes negros, Ram e Lucaar
retornaram à aldeia secreta.
O mesmo silêncio avassalador de quando ele pisou pela primeira vez em
Santo Pedro ainda pairava sob as tochas acesas.
Com um aceno de cabeça e um olhar que dava arrepios na espinha, as luzes
se apagaram e Santo Pedro ficou completamente escura.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Conhecendo uma nova historia
3
Seus olhos se abriram antes do relógio tocar, como costumava
acontecer na sua antiga casa. Mas esta era uma vida nova, e ela não
fazia ideia de como poderia vive-la, não depois da morte dos meus
pais.
Ficou olhando para o teto do quarto novo, que ate pouco tempo era
seu antigo quarto da casa onde ela passava suas férias. O teto tinha
uma cor em tom pastel muito clara. Olhou para a lâmpada do teto
estreitando os olhos para poder ver os feches de luz que afluíam em
varias cores e em diferentes direções.
Tomou coragem e jogou o pé pra fora da cama, depois o outro e se
levantou. Penteando os cabelos, sentiu o cheiro do café da manha
que vó Augusta preparava lá em baixo, na cozinha. O cheiro a
animou e ela desceu o mais rápido que pode a fim de pegar os pães
ainda quentinhos.
- Vó, isso aqui esta uma delicia. – Ela disse. - Anja ainda não chegou?
- Ainda não querida, mas ela deve estar chegando. Respondeu a avó
dela. - Você levantou muito cedo, bem antes do alarme tocar,
Toc- toc. - Deve ser ela lá fora.
Dina levantou da cadeira num pulo e correu para abrir a porta
encontrando a amiga por trás dela. Anja usava saia cor de rosa claro
e uma blusa branca marcando bem a cintura, tênis rasteiros para
combinar.
Ela passou os olhos pelo meu visual despojado bem informal que
Dina usava composto de bermuda jeans, blusa baby look e tênis de
academia.
- Eu só me pergunto por que de tanto drama ontem. Disse Anja. - Se
não estava a fim de assistir a missa era só dizer.
- Bom dia Angélica.
- Bom dia vó Augusta.
- O que você está falando? Dina perguntou curiosamente. – Vamos
para o canto.
- Dina, sou sua melhor amiga, certo? Ela falava junto com suas mãos
abanando na frente de Dina. - Não precisava mentir sobre seu joelho
machucado e seu amigo imaginário de ontem à noite.
- O que? Eu não menti sobre o meu... Jo-e-lho. Ela engasgou quando
olhou para baixo.
Quase entrou em estado de choque, quando lançou seu olhar
disposta provar que não havia mentido na noite passada. Engolindo
em seco o pão que mastigava, parecendo não acreditar, viu o seu
joelho absolutamente limpo, sem nenhum arranhão. Como se eu
nunca tivesse ralado no chão.
- Anja, me dê um beliscão. Ela pediu. - Bem forte.
- Você tem certeza, eu tenho a mão pesada. Respondeu Anja
ironicamente.
- Merda Anja! - O machucado estava aqui, eu tenho certeza disso.
- Olha aboca querida. Gritou vó Augusta da cozinha.
- Dina, eu sei como são os machucados, eu já me machuquei muitas
vezes, principalmente quando jogava queimado com os garotos da
rua, e posso garantir que você não se machucou. Anja não parava de
tagarelar. - Não da forma que você estava mancando ontem na
igreja.
- Eu não sou mentirosa Anja, acredite em mim, por favor, Eu caí na
rua quando estava correndo. - Escorreguei e quando estava
choramingando no chão, Richard apareceu e limpou meu machucado,
você mesma viu o pano, está lá em cima, no meu quarto.
Anja parecendo não acreditar na amiga olhou para a cozinha - É
melhor nós conversarmos sobre isso depois Dina, o cheiro está
maravilhoso, sua avó fez pães de batata?
- Fez sim, vamos pra cozinha.
Observando Anja triturar freneticamente os pães na boca, Dina não
parava de olhar para meu joelho, ela ainda não acreditava que aquela
ferida enorme estava completamente curada. Decidiu por si mesma
que não tocaria mais no assunto com ninguém ate descobrir o que
realmente havia acontecido.
Cadernos na mão e pão de batata na mochila, elas partiram rumo a
escola. Dina não estava nem um pouco ansiosa para conhecer os
outros alunos da classe, nem mesmo o professor ou professora.
Anja não parava de tagarelar sobre a igreja e sobre como ela tinha
vontade de ser uma freira.
- Eu acho que essa ideia de ser freira é uma maluquice. Comentou.
- Pois pra mim não. Respondeu Anja.
- Como isso começou? Não acredito que você teve essa ideia sozinha.
Eu não acho que a vida das freiras seja muito emocionante.
- Eu gosto de Deus, e se eu for freira vou ficar mais perto de Deus.
Anja morava com os pais na pequena cidade, desde que nasceu e, os
pais dela sempre foram moradores daqui.
Dina nunca teve contato muito próximo com eles, por que ela só
andava na companhia de Anja quando estava passando férias.
Mas, sempre achou os pais dela um pouco esquizitos, alias todos na
cidade eram esquizitos para ela.
Os pais de Anja se casaram quando eram muito jovens, o que era
outra esquisitice da cidade, parece que todo mundo aqui se casa
cedo. Porém os pais de Anja não conseguiram ter filhos ao longo de
anos depois de casados. A mãe de Anja engravidou por acaso quando
eles haviam passado dos 40 anos de idade, depois da época dos
milagres.
“Minha avó falou que há muitos anos, as pessoas da cidade de uma
hora para outra começaram misteriosamente a ter suas doenças
curadas” ela pensou, “e mulheres que antes não poderiam ter filhos
começaram a engravidar já um uma idade avançada”.
- O que você vai fazer depois da escola? Perguntou Anja
- Consulta com psicólogo. Respondeu.
- Que sorte a sua né? Anja arrumava os cabelos enquanto falava.
- Minha avó acha que eu devo fazer algumas sessões de analise para
não me tornar uma traumatizada ou uma suicida no futuro.
Anja riu da piada retórica de Dina - Eu vou ajudar minha mãe com o
bordado e depois vou na igreja ajudar o padre com os preparativos
para a grande festa.
- Vamos ter uma festa? Ela perguntei surpresa.
- Claro que vamos, vai me dizer que você não sabia da festa do
Solstício. - Toda a cidade espera por essa festa, que acontece todo
ano em julho, principalmente depois que os milagres começaram a
acontecer.
Como toda cidade tinha um santo, essa não seria diferente. Dina
Ficou muito curiosa pra saber o que era essa tal festa do solstício.
Como ela só passava poucos dias das férias de dezembro, não
conhecia as outras tradições festivas da cidade durante resto do ano.
O caminho da escola até a casa foi tranquilo, Anja comendo o que
sobrou dos pães não pôde dizer uma só palavra, o que era difícil para
ela. Comer e falar ainda eram exatamente as duas coisas que ela não
conseguia fazer juntas.
Ela deixou Anja na porta de casa e continuou andando, a casa dela
ficava poucos metros adiante. Quando finalmente chegou, parou
alguns segundos na frente da sua casa e ficou pensando. “Como eu
irei levar a vida daqui para frente”, pensou. Então pôs a mão na
maçaneta, abriu a porta e sumiu atrás dela.
***
Ram caminhava todas as manhas pelas estreitas ruas da aldeia, ele
sempre gostou de controlar e saber o que as pessoas estavam
fazendo. Mesmo com tão pouca idade, Ram já pensava como um
homem. Até então, garoto magrelo e fraco havia se tornado o mais
forte dentre os irmãos. Muito hábil com as espadas e na luta corpo a
corpo, ele comandava um grande grupo que habitava a aldeia. Seu
clã.
Santo Pedro era uma aldeia secreta que existia bem no meio da
floresta vizinha à cidade. Não podia ser vista pelo lado de fora por
que não existia uma passagem de entrada, somente quem a
conheceu e seus habitantes sabiam como entrar e sair dela.
Haviam pequenas casas, bem construídas, algumas em cima das
arvores e outras em suas raízes. Não havia energia elétrica e a
iluminação era feita através de fogo, tochas e lamparinas. A água era
cuidadosamente conduzida por bambus se assemelhando muito com
o encanamento nas cidades.
A casa principal, também a mais bonita, era a casa de Ram que por
algum tempo morou com seus pais e irmãos enquanto eram crianças.
Mas seus pais morreram e somente Ram morava na casa.
A aldeia contava com grande numero de cavalos que eram criados
pelos próprios moradores. Belos animais, eram os verdadeiros amigos
de todos que ali moravam. Cada um tinha o seu próprio cavalo e
Tobruk, era o verdadeiro destaque entre eles.
Trazido da Líbia de barco com meses de nascido, o cavalo recebeu o
mesmo nome de sua cidade natal. Sendo da raça Berbere, uma das
mais antigas do mundo. Tobruk era gracioso, completamente negro,
orelhas medianas, pernas compridas e muito fortes e uma crina
muito abundante. Seu temperamento fazia jus a sua beleza, forte
como a de seu dono, o único que montava em Tobruk era Ram.
***
- O verdadeiro dia da minha morte foi quando que ele me fez beber
esse veneno. Falou Ric com verdadeiro ódio nas suas palavras
enquanto bebia água do cantil. - Por causa desse veneno eu não
posso ir para onde eu quero.
- O que você quer? Perguntou Edie a seu irmão mais novo.
- Eu quero minha liberdade. Ele respondeu. - Eu gostaria de sair para
conhecer o mundo ou ao menos sair dessa floresta amaldiçoada,
existe uma vida lá fora para ser vivida, por mim e por você, Edie.
- Nossa vida está aqui, temos tudo o que precisamos e somos livres
pra fazer o que quisermos.
- Isso não é vida, irmão. Ric replicou novamente. - Isso é uma morte,
lenta e triste, que vivemos, nós sequer podemos morrer.
Edie abaixou a cabeça enquanto escutava seu irmão dizer mais e
mais palavras de como a vida era ruim na floresta. Edie abriu mão da
vida na casa grande em Santo Pedro, para cuidar de Ric e os outros
que renegaram fidelidade ao irmão mais velho Ram.
Ric sempre foi o irmão mais impaciente dos três e o mais apaixonado
pela vida, mesmo com o tempo passado, ele não perdeu a
curiosidade de explorar a vida, não importava onde ele estava.
Os outros que partilhavam o mesmo acampamento constantemente
presenciavam as discussões entre Ric e Edie, mas nunca interferiram,
nem mesmo quando os irmãos ameaçavam brigar fisicamente. Eles
apenas ficavam atentos para que o outro grupo que acompanha Ram
não ficasse sabendo o local exato do acampamento.
A floresta era muito grande e podia esconder uma pessoa da outra a
um metro de distancia sendo impossível acha-la. Parecia que a
floresta conspirava a favor dos foragidos, ela ajudava a esconder
quem não queria ser achado e o acampamento apesar de próximo
aos limites da cidade ficava invisível assim como Santo Pedro.
Levou muito tempo para o grupo de desertores, acertarem o local do
acampamento sem se perder. A única referencia deles era o caminho
das águas da fonte que passava por baixo de uma ponte feita de
madeira e corda. A água que passava por baixo dessa ponte era a
mais pura e cristalina água que eles jamais puderam ter visto, por
mais que fosse jogada terra escura a água nunca ficava suja, era
pura magia.
Junto a essas águas cristalinas, estava o grande segredo da região.
As águas vinham da fonte milagrosa que apenas um homem foi capaz
de encontrar. Esse homem que largou sua vida na cidade para se
dedicar completamente na busca dessa água milagrosa, que as
lendas tanto mencionavam.
Pedro era um professor de biologia na principal escola da pequena
cidade. Ele frequentava a igreja todos os domingos e fazia questão de
ajudar a todos dando aulas de reforço na pastoral da igreja. Pedro
era querido por todos, apesar de ninguém conhecer seu passado
antes dele se estabelecer na cidade.
Foi coversando com os moradores mais antigos durante algumas
reuniões na pastoral que Pedro tomou conhecimento sobre a lenda da
água milagrosa.
O clã que seguia Ric e Edie, embora não fosse tão grande como do
irmão mais velho, era um clã com hábitos diferentes e mais
tolerantes.
Composto de rapazes e meninos, eles foram raptados da cidade ainda
muito jovens e trazidos para o meio da floresta. Alguns sequer
lembravam de suas famílias. Tudo que lhes fora imposto era que eles
deveriam aceitar a nova vida.
***
Dina subiu correndo as escadas se atirando em baixo da ducha, se é
que ela podia chamar de ducha, as poucas gotas de água saindo pelo
chuveiro. Calçou seus tênis e pegou o cardigan, já que fazia frio no
final de todas as tardes.
- Vó? Ela gritou. - Vóóóóóóóóó?
Ela caminhou a passos lentos, com um pequeno sorriso em seu rosto.
- Sim querida? Respondeu sua avó.
- Estou indo para outra sessão de analise, na volta vou parar na
praça para conversar com as garotas. Saiu em disparada em direção
à porta.
- Tudo bem querida, mande lembranças à mãe de Angélica se passar
na casa dela e, Diana...
Ela parou subitamente e girou nos seus calcanhares para ver o que
sua avó queria dizer. - Sim vó.
- Eu ti amo querida.
Imediatamente ela retornou pelo mesmo caminho em direção
contrária até chegar na frente da sua avó. Ela se banhou nos braços
frágeis, mas muito acolhedores de vó Augusta. Naquele momento ela
não desejava sair nunca mais daquele abraço e nada mais importava.
- Eu também ti amo vovó. Disse com uma lagrima nos olhos.
Sentada num divã velho e desconfortável, ela observava o psicólogo
que por sua vez a observava de volta. Era estranho para ela, vê-lo
usar aqueles óculos com duas enormes lentes grossas. “Com certeza
o próximo grau dele será uma cão guia e uma bengala”. Ela ficou
pensando.
- O senhor não vai me perguntar nada? Não vai querer saber da
minha vida? Perguntou enquanto ele bebia um gole de alguma coisa
da garrafa que não saia do lado dele.
- Eu ate posso perguntar se você parar de me chamar de senhor,
vamos acabar com as formalidades, apenas chame-me de Paulo.
- OK, vamos acabar com as formalidades, Paulo. Respondendo com a
mesma cara sarcástica de volta.
Deitando no divã ela olhou para o teto sem nenhum remorso por ter
colocado os tênis em cima do móvel.
- Então, Paulo, o que vamos fazer hoje? Quer que eu fale da minha
infância ou como eu era feliz quando morava com meus pais quando
eles eram vivos?
Bebendo mais uma golada do liquido que parecia ser bebida alcoólica,
ele a fitou com aquelas lentes grossas. Ela não mostrou intimidação
mas ficou desconfiada que ele pudesse contar para sua avó que ela
não estava cooperando durante as sessões de analise. Tudo que ela
não queria nesse momento seria aborrecer ou magoar sua avó.
- Poderia me falar mais um pouco da historia do tal Pedro. Eu fiquei
interessada. Ela fingiu estar interessada.
Ele desamarrou a cara e ela quase pode ver um pequeno sorriso em
seus lábios. - Certo, vou lhe falar da grande lenda da nossa cidade,
afinal o Solstício vai chegar em algumas semanas.
Pedro e o grupo de pesquisadores passaram meses dentro da floresta
procurando a água milagrosa, e eles conseguiram achar a fonte onde
brotava uma nascente de uma água muito cristalina. Para poder
estudar mais sobre as propriedades daquela água e os possíveis
benefícios, eles construíram uma pequena aldeia perto da fonte. Mas
eles não tinham certeza se aquela era a água milagrosa.
Um dos homens que acompanhavam Pedro na expedição, tropeçou em
umas das pedras no local da fonte. Ele caiu por sobre seu quadril e
desmaiou de tanta dor, ali mesmo na beira das águas da fonte. Por dois
dias ninguém sabia onde ele estava, acharam até que ele pudesse ter
retornado sozinho para a cidade.
- Nossa, ele morreu? Ela perguntou.
Não, incrivelmente o homem não morreu. Professor Pedro que era
muito religioso, orou e implorou a Deus que o homem continuasse vivo
para que pudessem voltar a tempo à cidade. E deu a água da fonte para
ele beber. Por dias eles ficaram na pequena cidade construída bebendo
e dando de beber a água da fonte. Pedro continuava a orar a Deus
confiante que aquela água seria a água milagrosa. Passando duas
semanas, o homem com o quadril quebrado levantou e andou.
- Meu Deus, a água o curou? Isso é realmente um milagre.
Todos acharam realmente que água tinha curado o homem, tudo isso
graças às orações de Pedro, que a partir daquele momento era chamado
de santo. E o local ficou conhecido pelo nome do professor santo que fez
a água curar as doenças. A pequena aldeia foi batizada de Santo Pedro,
assim como a fonte da água milagrosa, que agora se chamava fonte de
Santo Pedro.
“Agora sim, fazia algum sentido a lenda que o pessoal esquisito da
cidade tanto falava”. Ela pensou.
- Então a festa do solstício é uma comemoração a esse São Pedro,
digo Santo Pedro?
- Sim em parte. Ele falou orgulhoso de si bebendo mais um gole da
garrafa. – Foi na mesma ocasião.
- Paulo, você me disse na sessão passada que só retornaram para
cidade apenas dois homens certo? E também me disse que quem
bebesse da água ficaria escravo dela? Logo eu concluo que eles
voltaram pra aldeia dentro da floresta ou...
- Eles morreram Diana é exatamente isso que você está pensando,
eles morreram quando chegaram aqui e o restante dos homens da
expedição também morreu no retorno pra cidade. Ele acomodava os
óculos no rosto enquanto falava. - Pedro morreu no dia seguinte que
retornou a cidade e quanto a Juan... Viveu muito.
- Mas ele ainda mora aqui na cidade? Perguntou ainda com mais
curiosidade.
- Infelizmente não Diana. Ele morreu há alguns anos. Foi uma
tragédia familiar. Uma ventania fez com que parte da casa dele
desmoronasse sobre as cabeças da família. Os próprios empregados
fizeram questão de enterrar os corpos. Pessoas muito leais.
Ela saiu do consultório muito intrigada com a historia que tinha acabo
de ouvir. Uma casa inteira havia desmoronado sobre as cabeças dos
moradores. A partir dali, ela começou a ter uma admiração pela
historia, mas não era a história de Santo Pedro, era a historia da
família. Ela queria saber quem eram os moradores da casa e onde
ficava essa casa.
Enquanto pensava em como eu iria conseguir todas as informações
de que precisava sobre a casa desmoronada e a família que morreu
nela, desceu até a única praça onde todos os adolescentes da cidade
costumavam se aglomerar.
***
Ric adorava passear a cavalo pela floresta. Longas horas passavam
despercebidas quando os dois, correndo entre as arvores, pareciam
ser apenas um só. Ric conduzia seu cavalo até o limite mais alto da
floresta, onde podia ver o mar e o porto da cidade logo abaixo.
Desmontando, Ric passava longos minutos observando as nuvens que
pairavam sobre “Céu”, seu cavalo.
Céu, não parecia grande coisa, perto dos outros cavalos, mas sua
lealdade com Ric era incontestável. Céu parecia ler os pensamentos
de Ric e entendia o que ele queria somente com um aceno de cabeça.
Na maioria das vezes Céu não parecia ser cavalo.
- Ate que enfim você apareceu, estou morrendo de fome. Perguntou
Edie acendendo uma discreta fogueira. - Trouxe alguma coisa para a
janta?
- Acho que me esqueci de caçar na volta para o refugio. Respondeu
Ric um pouco sem graça por ter voltado de mãos vazias da galopada
com Céu.
- Você sabe que não vivemos somente de água e frutas. Como pode
esquecer, você não tem fome?
Edie muito irritado pegou um porco do mato que os outros habitantes
do refugio conseguiram abater na floresta.
- Esse ai parece que vai ficar delicioso, certo Edie? Espero que não
demore muito a assar.
- Por que você não come sonhos? Já que fica tanto tempo sonhando
acordado, podia ao menos se alimentar deles, isso pouparia menos
trabalho para mim.
Ric ficou sorrindo pelo canto da boca enquanto sentava-se juntos aos
outros ao redor da fogueira. Todos os dias naquela mesma hora,
conforme o refugio escurecia, o resto do grupo do clã de Ric se reunia
em volta do fogo.
As chamas tremeluziam em cores diferentes a cada labareda, os
estalos que a madeira fazia enquanto o fogo a queimava eram os
únicos sons que se podia ouvir no local. Os rostos dos homens
iluminados pela luz do fogo mostravam uma nostalgia quase
imperceptível. Até que a carne estivesse completamente assada e
pronta para comer ninguém falava nada.
Longe dali, o mesmo ritual acontecia em Santo Pedro. Uma enorme
fogueira na travessa principal da aldeia reunia o clã de Ram.
Todos estavam sentados em volta dela olhando para as chamas. A
nostalgia avassaladora era mutua para todos, dentro da aldeia e no
refugio fora dela.
- A carne esta pronta Ric, vamos repartir, corte os pedaços. Edie
falou ao seu irmão quebrando o silencio da noite que acabava de
baixar sobre a floresta.
Com um movimento gracioso e forte, Ric levantou a sua espada e
desferiu o primeiro golpe sobre a carne queimada pelo fogo, partindo
o corpo em dois pedaços.
O corpo de Ric, iluminado pela luz amarela das chamas, era digno de
uma pintura. Com seus músculos bem desenhados, se harmonizavam
perfeitamente dentro da calça preta, única peça de roupa que ele
vestia.
O calor da proximidade da fogueira fazia o corpo de Ric suar,
mostrando um tipo de brilho especial combinado com aquela luz
amarelada. Terminando de cortar o porco do mato em vários
pedaços, Ric deixou Edie fazer a partilha entre os demais membros
do clã.
- Será que eles ainda se lembram de nós, Edie? Não passaram tantos
anos assim depois de saímos da cidade. Perguntou Ric enquanto
mastigava a carne.
- Pode ser que sim, tenho minhas duvidas. Nosso pai disse que
provavelmente não deveriam procurar a gente depois que partimos,
mas eu nunca perguntei por que.
- Eu não me lembro dos rostos das pessoas que moravam na cidade,
Edie, não lembro os nomes das pessoas. Eu era muito novo para
registrar algo na minha memória. - Você se lembra de alguma coisa?
Diga alguma coisa de mim, como eu era em nossa casa na cidade.
- Ric, você era um garoto muito impertinente.
Vivia atormentando Ram e discordando de tudo que ele fazia. Não me
admira que ele tentasse ti matar cada vez que tinha oportunidade. Só
por que ele era mais fraco que você, não lhe dava o direito de ter coberto
os cabelos dele com e mel e depois jogado penas da galinha preferida de
mamãe em cima dele.
Demorou três dias para ele retirar por completo todas aquelas penas e o
mel. Pior foi papai ter perseguido nós três com chicote, foram três dias
dormindo escondidos com os cavalos, malditos três dias.
Nosso pai só desistiu de nos bater por que mamãe implorou que ele não
fizesse. Ela sempre tirava a gente das enrascadas causadas por você.
- fale da mamãe Edie, eu não consigo me lembrar dela assim como
você.
Ric, nossa mãe era um anjo, com cabelos cor de fogo, tipo esse aqui da
fogueira. Os olhos dela eram da cor dos seus e dos meus, verdes assim
como a cor da floresta. A pele dela era branca e pelo que eu me lembre
tinhas sardas no rosto dela. Ela me dizia que o rosto dela era como
arroz doce com canela, sardas na pele branca.
Nossa mãe fazia todos os tipos de doces que a gente gostava, e ela fazia
um pão de batata delicioso...
- Eu me lembro das sardas dela, eu acho que consigo me lembrar
disso. Edie eu lembro dos cabelos dela também eram compridos.
- Ainda bem que você consegue lembrar dela Ric. Nossa mãe não
ficaria feliz, onde quer que ela esteja agora, se soubesse que os filhos
não lembram mais dela.
- Eu fico me perguntando se ele ainda se lembra dela, Edie.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
A casa
4
Quando ela abriu os olhos pela manha, estava completamente
determinada a conhecer mais sobre a história da casa desmoronada e
quem morou nela antes da tragédia. Curiosamente Dina criou uma
completa fascinação pela historia que Paulo havia lhe contado em seu
consultório durante a analise.
Alem da curiosidade, ela tinha muita pena das pessoas que morreram
soterradas, nem ao menos tiveram um enterro digno, já que os próprios
empregados se propuseram a fazer. “Foi muito triste”, pensou em como
deve ter sido esse enterro e se ao menos teve um velório.
Desceu as escadas, e não encontrou sua avó na cozinha e em nenhum
outro cômodo da casa. Provavelmente ela já deveria ter saído bem antes
do relógio tocar. De certa pensou que era o dia da feira, sendo franca,
era a única feira que acontecia na cidade.
Não era uma feira comum, do tipo que acontece nas cidades mais
modernas onde as pessoas encontram somente frutas, legumes, comida
em geral e com pessoas chamando aos gritos os fregueses para frente
das suas barracas. Na cidade grande, a feira também tem um cheiro
forte que sempre a fez enjoar, quando ela passava por perto.
Mas lá era diferente, a feira da pequena cidade era um evento semanal,
onde se podia encontrar de tudo. Começava antes do galo cantar, e
acabava com o cair da noite. Artesãos de cidades vizinhas traziam para
vender seus trabalhos manuais, donos de sítios locais exibiam suas
frutas e legumes exóticos. Queijos, manteigas, carnes e vinhos, de todas
as regiões próximas eram encontrados aqui, assim como a arte local.
Mas sua vó não tinha esquecido dela, deixou pronto o café da manha
com leite e chocolate, e uma cesta com pãezinhos ainda quentes. Dina
mordeu alguns e guardou outros para escola, certamente ela não
esqueceria de Anja, caso contrario sua mente iria ser torturada do
começo ou fim da aula.
Arrumou-se rapidamente. Vestiu seu jeans surrado combinando com
uma mini blusa em tom pastel, ela nunca gostou de cores fortes, calçou
seus tênis preferidos e não esquecendo do bloco com suas anotações
voou através das escadas.
Descer as escadas correndo, era um hábito infantil que ela não pretendia
largar tão cedo.
Encontrando Anja pelo caminho seguiram juntas em direção à escola que
não ficava muito longe. Tudo lá ficava perto, absolutamente não existia a
necessidade de fazer grandes caminhadas para qualquer lugar que fosse.
A cada duas ou três quadras sempre se chegava a algum lugar.
Na porta da escola os alunos estavam aglomerados em frente ao portão
comendo doces e falando sobre diversos assuntos, a vida alheia parecia
ser o foco principal das conversas entre eles.
O som da campainha tocou e uma correria frenética coordenada, seguiu
em diferentes direções, cada aluno entrava em sua sala correspondente.
Sentando-se ao lado de Anja como de costume enquanto a professora
tentava dar bom dia aos alunos ainda agitados.
- Dina, ontem à noite lá na praça, você quase não falou. Perguntou Anja
curiosamente. - Conte-me o que quer que esteva na sua cabeça, não
seja egoísta.
- Eu não estava pensando em nada de mais. Ela respondeu. - Só não
tinha assunto para falar com o pessoal.
- Qual é, sou sua amiga, lembra? - Claro que você estava tramando
alguma coisa ai na sua cabeça. Anja replicou de volta. -A propósito,
trouxe pão de batata da vó Augusta né?
- Claro, estão aqui comigo. Dina respondeu com um sorriso. - Eu jamais
esqueceria de você.
- E eu jamais deixaria você esquecer de mim Dina. As duas Sorriam
juntas.
A ultima pessoa que entrou na sala de aula, foi uma garota de estatura
mediana, aparentemente com a mesma idade que Anja e Dina. Ela tinha
um ar de antipatia e praticamente ninguém a chamou para que sentasse
ao seu lado.
- LORENA. Falou a professora. - Sente-se por favor, eu gostaria de
começar a minha aula.
Dando um suspiro debochado, ela se dirigiu para o fundo da sala onde
haviam alguns lugares vazios. Lorena era muito vaidosa, trajava um
vestido cumprido até a metade das coxas seguindo mais embaixo, uma
sapatilha combinando a mesma cor.
Seus cabelos, insuportavelmente negros como seus olhos, estavam
presos em um elegante rabo de cavalo. Anja e Dina não ficaram
reparando muito mais nela.
Ainda com um sorriso nos lábios, as amigas baixaram as cabeças para
escrever os capítulos do livro que iriam cair na prova. Estudar nesta
escola, era um pouco mais fácil que as outras escolas onde Dina havia
estudado.
Olhando pelo canto dos olhos ela reparou Anja escrevendo com atenção
profunda e a cabeça mergulhada em seu caderno, soltando um pequeno
suspiro e pensou em Richard.
***
Ric e Edie estavam galopando em fuga floresta adentro. O som dos
cascos se enterrando no solo era como um pulsar constante de coração
batendo em ritmo acelerado. Driblando os galhos e troncos das arvores
eles se afastavam cada vez mais de seus perseguidores. Até que a
vegetação se fechou e não era mais possível cavalgar.
O clã de Ram se aproximou e encurralou os dois irmãos, que se puseram
a frente de seus cavalos com suas espadas em punho. Céu bufando com
seus olhos arregalados, ameaçando atacar quem se aproximasse. Lucaar
foi o primeiro a levantar a espada contra Ric enquanto Edie dava um
salto lateral atacando o outro membro do clã.
Luccar era muito forte, e batia com sua espada tentando cortar algum
membro de Ric, mas Ric sabia manejar sua espada muito bem, bloqueou
todos os golpes com a sua lamina contra atacou Luccar em golpes tão
rápidos que somente uma pessoa muito bem treinada poderia fazer.
- Ele mandou você no lugar dele. Perguntou Ric batendo com sua espada
sobre o ombro direito de Luccar.
- Ele não precisa me mandar vir aqui matar você. Respondeu Lucaar com
agressividade. - Eu venho por vontade própria e com muito bom gosto.
- Então você é um tolo se acha que pode comigo.- Disse Ric. - A
propósito, como vai a sua orelha, ou o que restou dela ?
Com ódio nos olhos, Lucaar estreitou as vistas e lembrou do ultimo
combate que ele e Ric haviam travado algum tempo atrás. Ric cortou um
pedaço da orelha de Luccar com sua espada. Quase não dava para
perceber, por que o cabelo de Luccar era terrivelmente liso e comprido
até os ombros.
Edie lutava contra dois adversários ao mesmo tempo. Deste pequeno ele
sempre foi muito hábil. Edie usava duas espadas ao mesmo tempo, uma
em cada mão. Seus oponentes, apesar de estarem em maior numero,
não estavam conseguindo dar conta de Edie e foram facilmente
encurralados contra as pedras. Um deles teve seu ombro cortado por
uma das laminas de Edie, que fez com que desistissem da luta.
Lucaar, duelando com Ric, viu que estava sozinho e agora seriam os dois
irmãos contra ele. Com um salto para trás aterrissando no alto de uma
pedra apontando sua espada ainda com ódio no olhar.
Luccar também recuou. - Isso não termina aqui Ric.
- Pode apostar que não Lucaar. Se aproximando, Edie pode perceber que
Ric havia machucado o joelho.
- Vamos sair daqui, disse Edie. - Eles podem voltar com maior numero.
- Eu não tenho medo deles Edie, sempre estarei preparado a qualquer
hora que eles decidirem aparecer.
- Que seja, vamos embora diabos.
Montando em seus cavalos os irmãos se afastaram do local da luta, tudo
parecia calmo naquele momento. A única coisa que se podia escutar
eram os pássaros nos galhos das arvores. A vida na floresta naquela
hora da manhã era muito diversificada e muitos pássaros costumavam
cantar ali.
Acariciando Céu durante o galope, Ric reparou no seu joelho machucado
e imediatamente se lembrou de Diana. Ele jamais esqueceria dela, dos
olhos e os cabelos castanhos que ela tinha, tudo estava bem registrado
em sua mente.
Foi então que Ric decidiu que iria tornar a vê-la, ele decidira sair
novamente da floresta e tentar encontra-la. Mas seu único pensamento
era, onde ele iria acha-la. A cidade fora da floresta não era muito grande
mas seria um desafio achar Diana.
Esperando anoitecer, Ric deixou Céu esperando nas margens da floresta,
em um local discreto com mato alto. Ninguém poderia ver o cavalo ali.
Foi caminhando a passos cautelosos pelas ruas da cidade. Alguns
minutos depois ele se aproximou da igreja onde havia deixado Diana
mancando pela ultima vez. Ele tinha esperança que talvez ela pudesse
passar pelo mesmo caminho novamente.
Passeando as vistas procurando um local adequado, ele percebeu que na
lateral da igreja estava uma pequena construção ainda não terminada.
Não havia iluminação e Ric achou que seria um local bem apropriado
para esperar Diana passar.
Sentou em alguns montes de pedra de brita e ficou observando tudo o
que estava em sua volta. Ele achou o local familiar, ele já havia passado
por aquela rua antes, muito antes de encontrar Diana, muito antes de
aquela construção começar.
Ele podia lembrar daquela igreja, mas não conseguia assimilar em que
tempo ele passou por ali ou com quem ele passou por ali. Tudo aquilo
deixava Ric muito confuso então ele decidiu só pensar em Diana.
Duas horas se passaram e Ric acabou adormecendo ali mesmo onde teve
um sonho relâmpago com Diana.
“Os dois estavam galopando por uma grama muito verde. Ric galopava em
Céu e Diana galopava em outro cavalo. O passeio romântico dos dois não
durou muito tempo, pois um homem de capa preta e arco e flecha nas mãos
apareceu como um passe de mágica, disparando flechas na direção de Ric.”
De subido, Ric despertou do pequeno cochilo com as batidas do sino da
igreja anunciando o final da missa. De repente a rua que antes estava
deserta, agora circulavam pessoas por toda parte. Ric observou famílias
saindo da igreja, crianças de mãos dadas com suas mães, casal de
namorados voltando para casa. Toda uma vida se passando na sua
frente e foi ali, no meio dos garotos e garotas que ele pode ver Diana.
Seu coração acelerou tão rápido que ele pode senti-lo na garganta. Uma
euforia incontrolável tomou conta de todo seu corpo. Diana estava
passando exatamente na calçada da construção, onde Ric estava
escondido. Ele não pode fazer qualquer alarde por que Diana estava na
companhia de Anja e sua avó.
Decidiu então que iria segui-la. Ric precisava saber onde Diana morava,
ele foi se afastando cada vez mais e mais da floresta, ele jamais tinha
passado tanto tempo longe. À medida que elas caminhavam Ric
observava Diana falar e gesticular com os braços.
Cauteloso e paciente, Ric parou a poucos metros da casa de Diana. Anja
não entrou se despediu ali mesmo na porta e desceu rua abaixo. Elas
bateram a porta da entrada e a luz no interior do andar de baixo da casa
se ascendeu. Levou alguns minutos para que as luzes se apagassem e a
casa ficasse em silencio.
Ric olhou a casa por todos os ângulos do lado de fora e mais uma vez
sua respiração parou quando Diana abriu a janela do andar de cima. Ele
soube na mesma hora que ali era o quarto onde ela dormia. Ela ficou
olhando as ruas do alto de sua janela, cabelos balançando por causa do
vento.
Parecia que os pensamentos de Diana iam tão longe quanto o vento
podia ir. Ela olhava para frente e cada vez que virava a cabeça o vento
moldava seus cabelos de forma diferente. Lá de baixo Ric contemplava a
vista da garota que estava na janela, era uma visão que ele pensou que
talvez guardaria pelo resto de sua vida.
Não aguentando a tentação de ver Diana sozinha na janela, ele avançou
andando até parar na frente da casa, onde ela poderia vê-lo.
Foi exatamente isso que aconteceu, ela olhou para baixo e avistou
Richard. Os olhos dela se arregalaram no mesmo instante em que
reconheceu o rapaz. Fazendo sinal com as mãos ela pediu que ele
esperasse ate ela descer.
-Meu Deus, falando baixinho, será que estou vendo coisas, aquele ali é o
Ric ? não pode ser ... Vou me beliscar... Não, vou descer agora e falar
com ele.
Pegou o moletom e desceu tão rápido que quase caiu da escada. Sua avó
já estava no quarto, provavelmente dormindo, e Dina pensou onde ela
arranjava tanto sono depois de ter dormido na igreja enquanto o padre
falava.
Ajeitou meu shortinho e vestiu o moletom ali mesmo, por cima da
camiseta antes de abrir a porta encontrando Ric parado atrás dela.
Prendendo a respiração enquanto ele lhe dava boa noite e, foi ai que
derramou sobre ele uma serie de perguntas sobre, por que ele sumiu no
ultimo encontro, ou por que ele não apareceu no dia seguinte ou se ele
sabia explicar por que o seu joelho se curou tão rapidamente.
- Diana, Você gostaria de passear?
De súbito aceitou a proposta de Ric e bateu cuidadosamente a porta
atrás dela para que sua vó não notasse sua ausência.
Ele estendeu uma das mãos em sua direção, a principio ficou um pouco
insegura mas passou no momento seguinte que sentiu o calor da mão
dele. Naquele momento descartou qualquer possibilidade de Richard ser
um fantasma ou vampiro por que fantasmas não pegam nas mãos e
vampiros são frios, pelo menos era assim que ela lia nos livros de
fantasia.
Seguiram andando tranquilamente e ela não deu conta que ele a estava
conduzindo para perto da entrada da floresta. Pararam na frente de um
antigo chafariz onde não brotava absolutamente nenhuma água.
Richard ficou parado olhando para o pequeno chafariz e com uma voz
rouca disse a ela. - Eu costumava brincar aqui quando era pequeno,
disso eu me lembro bem.
- Richard você brincou aqui? Deve ter ficado todo empoeirado e sujo.
- Diana, pode me chamar de Ric se estiver tudo bem pra você.
- Sem problemas, e você pode me chamar de Dina. Adeus às
formalidades.
Com um sorriso travesso no olhar, ele apontou onde poderiam ficar
sentados. Pegou um pouco de ar e continuou falando sobre o chafariz.
- Dina, quando eu brincava aqui, havia muita água. As crianças da cidade
vinham aqui pra tomar banho de chafariz. Era muito bom.
- Você tomava banho de chafariz aqui quando era criança? Ric você esta
me surpreendendo. E o que mais?
- Eu não me lembro de muita coisa, sai da cidade ainda pequeno e não
lembro claramente.
No mesmo momento ela lembrou que na noite em que se conheceram,
Ric havia dito que eram vizinhos. - Você me disse que somos vizinhos
como pode me dizer que saiu da cidade? Perguntou impertinentemente.
Ric ficou um pouco abalado com a pergunta inesperada. Tentando
parecer o mais casual possível, ele colocou a mão sobre o ombro dela e a
olhou com aqueles olhos verdes encantadores, o que a fezeram
endurecer completamente.
- Eu mudei da cidade para um lugar mais isolado, mas ainda assim
continuamos vizinhos. Fale-me um pouco de você agora?
Distraída pelo toque da mão dele não percebendo que ele mudara de
assunto, Dina começou a tagarelar sobre sua vida. Falou sobre a morte
dos pais, sobre a vida com a avó e como ela estava se sentindo.
Ele a ouviu atentamente e algumas vezes, comentava coisas sobre a
cidade, da época em que ele era um garotinho. Ele também disse que
tinha um cavalo e ela ficou muito curiosa para poder conhecê-lo e Ric
combinou que um dia iria trazer Céu para passear com ela.
- Céu? Ela perguntou. - Ric o seu cavalo chama-se Céu?
- Sim, respondeu orgulhoso. - Quando ele galopa não tem limite que o
faça parar, então já que o céu é o limite, não tive ideia melhor do que
chama-lo de Céu.
Ela ficou encantada com as coisas que ele falava. Quando percebeu,
estava totalmente à vontade ao lado de Ric, tão a vontade que não deu
conta que a sua perna estava tão próxima a ponto de encostar na dele.
Ela podia sentir a respiração dele muito próxima de sua boca e ficou
envergonhada pois estava olhando diretamente para os lábios de Ric.
- Acho que esta ficando tarde, minha avó pode acordar e perceber que
eu saí, melhor eu voltar pra casa.
Ele acenou com a cabeça e se afastou lhe dando espaço para que ela
pudesse se levantar. Ficou ereta na frente dele com as maçãs do rosto
coradas, provavelmente ele não deve ter percebido pois a luz estava
muito fraca.
Ele se aproximou um pouco mais e pegando novamente na mão dela a
puxou para perto do seu corpo e me olhou novamente com aqueles olhos
verdes. - Vou leva-la em segurança ate sua casa.
- Tudo bem, mas eu posso ir sozinha se for algum incomodo para você.
- Você não vai sozinha, Dina, eu jamais deixaria você voltar sozinha para
onde quer que você fosse a essa hora da noite.
Concordando com a cabeça, voltaram de mãos dadas até a casa dela. No
caminho ela o fiz prometer que voltaria outras vezes e ele não negou.
Chegando na porta de casa, ele ficou olhando ate que ela estava lá
dentro. - Sã e salva Dina, como prometido. Falou cheio de sorrisos.
- Shhhhhh, minha avó pode acordar e você não vai querer conhece-la
agora à noite, quer?
- Não vamos apressar as coisas Dina.
Sorrindo para ele, pediu que esperasse um momento na porta enquanto
ela correu até a cozinha, separou alguns pães de batata, que sua vó
havia preparado e colocou num pano de prato bordado por Anja.
Quando voltou com o farnel, ele olhou com interesse em saber o que
tinha dentro. – O que tem ai?
- São pães de batata que minha vó sempre faz. Respondeu. - Para você
fazer um lanche na volta pra casa ou em casa. Tem bastante até para
dividir.
- Obrigado Dina.
Pegando o farnel das mãos dela eles se tocaram novamente e ela não
soube descrever o que sentia naquele momento. Ele abaixou a cabeça e
pousou um beijo molhado sobre sua testa, virou nos calcanhares e foi
embora, ela fechou a porta ainda sentindo a saliva de Ric na pele dela.
Subindo as escadas em direção ao quarto, jogou o moletom ao lado da
cama e se atirou sobre o colchão. Deitando de barriga pra acima
permaneceu com os olhos fechados. Dina estava completamente feliz
que eu havia conhecido Ric.
***
Descendo a rua, já na entrada para floresta, com um singelo assobio,
Céu apareceu logo após o chamado de Ric. Ao se aproximar, o cavalo
farejou o cheiro dos pães que Dina embrulhou para ele.
- Calmo ai amigão, isso não é para você. Sussurrou Ric, acariciando as
orelhas de Céu.
Logo após montar, os dois seguiram em direção ao refugio. Estava
escuro e não era seguro galopar. Ric ainda parecia intrigado com a
atitude de Dina em presentear pães. Ele nunca havia conhecido uma
garota que fizesse isso por ele, a grande verdade da historia de Ric, era
que ele nunca chegou tão perto assim de uma garota.
O coração de Ric batia tão forte que quase podia se comparar as batidas
do coração de Céu. Ele mal estava no meio da floresta e já pensava em
vê-la novamente. Com Dina, Ric se sentia livre e quase podia esquecer
que era um fugitivo, no meio de uma floresta. Com os olhos verdes
fechados, Ric pensava em Dina, queria estar com ela.
Céu parou subitamente e um relincho forte fez com que Ric sonhando
acordado desse conta que estava na frente de um pesadelo. A poucos
metros à frente, uma silhueta sinistra estava parada. Ric sacou sua
espada, estreitou os olhos e reconheceu de imediato a figura de um
homem montado em outro cavalo.
Ram se aproximou montado em Tobruk. Os dois irmãos ficaram se
encarando por um longo tempo, estudando um ao outro. Ram estava
vestido de preto da cabeça aos pés. Tobruk já era todo negro e os dois
juntos pareciam formar uma figura só.
- Olá Tobruk, você cresceu bastante. Falou Ric se dirigindo ao cavalo de
Ram ironizando a situação.
Tobruk respondeu bufando ferozmente enquanto sapateava seus cascos
na terra. Ram fez com que eles se aproximassem um pouco mais e os
cavalos estavam frente a frente, Céu e Tobruk... Ric e Ram.
- Veio me fazer uma visita maninho? Perguntou Ric ainda com muito
deboche nas palavras.
- Eu quem deveria perguntar a você, maninho, falou Ram. - O que você
fazia fora da floresta?
- Não é da sua conta.
- Claro que é da minha conta, Ram disse um pouco mais irritado. - Você
sabe muito bem que ninguém tem permissão para sair da floresta. –
Essa é a regra.
- Essa era a regra de nosso pai, respondeu Ric. - E ele não esta mais
aqui graças a você, claro.
- Não vamos começar uma discussão há essa hora, falou Ram com um
brilho sinistro nos seus olhos.
- E se eu quiser uma discussão?
- Então eu vou ter que matar você, infelizmente.
- As palavras querer e conseguir estão a um quilometro de distancia,
meu caro irmão mais velho, você sabe muito bem que eu sou difícil de
matar.
- Não me desafie garoto, estou tendo paciência com você há muitos
anos. Falou Ram se aproximando um pouco mais. - Não vou ser mais tão
paciente.
Ric levantou a espada e atentou um único golpe em direção a Ram, mas
Ram também era muito bem treinado e sacou sua espada bloqueando o
golpe de Ric. O barulho do aço das espadas fez com que os cavalos se
afastassem e ficassem inquietos.
Ram, era o irmão mais velho de Ric e aparentemente o mais forte dos
irmãos. A espada de Ram brilhava tanto quando os seus olhos. Um som
do que parecia ser uma coruja dispersou a tensão entre os dois, e
começaram a se afastar um do outro cuidadosamente.
- Hoje não haverá luta, Ric. Mas você sabe que não vai ser adiado por
muito mais tempo.
- Por que você não volta para a aldeia e meu deixa em paz senão eu
terei de matar você. Ric falou ironicamente com Ram.
- Você sempre foi à tristeza do nosso pai, e mesmo depois dele ter
morrido, continua sendo. Você não mudou nada, ainda é um garoto
egoísta que nunca pensou na família.
- Eu nunca precisei pensar na família, por que você já pensava por todos
nós, você que é o egoísta, Ram.
- Você matou nossa mãe. Ram, puxou as rédeas de Tobruk e caminhou
para longe de Ric lentamente sem nenhum remorso nas palavras ao
acusar o irmão.
Ric abaixou a cabeça e deixou Céu conduzir os dois até o acampamento
no refugio, onde Edie esperava ansioso pela volta do irmão. Os outros
homens do refugio se aproximaram para ver se Ric estava ferido, mas a
única ferida que Ric possuía no momento eram, as que foram feitas pelas
palavras de Ram.
- Eu não matei minha mãe Edie, você precisa acreditar em mim.
- Diabos eu não acredito. Você encontrou com ele?
- Sim, na volta pra acampamento. Ele me acusou de ter matado nossa
mãe. Mas você sabe que isso não é verdade.
- Claro que não é verdade, a culpa não foi de ninguém.
Ric sentou perto da fogueira apoiando os cotovelos sobre as coxas. Edie
sentou ao seu lado enquanto os outros se afastaram para dentro de suas
pequenas cabanas. Foi então que Edie reparou um pano estranho
bordado à mão.
- O que é isso?
- São pães que Dina me deu, você pode comer se quiser eu não tenho
fome.
Curiosamente Edie esqueceu do irmão que estava lamentando ao seu
lado e abriu o pequeno embrulho se deparando com pãezinhos de um
aroma maravilhoso. Levando um pedaço ate a boca ele mastigou com
calma e com os olhos fechados ele permaneceu mastigando até que se
lembrou completamente.
- Ei Edie, o que foi? Perguntou Ric com os olhos arregalados diante do
irmão.
- Onde foi mesmo que você disse que conseguiu isso?
- Foi Dina que me deu, já disse. O que foi?
Edie pegou mais um pães e pôs na boca, dava para perceber que seus
olhos igualmente verdes como de Ric estavam brilhando. Lágrimas
escorreram. - Você não comeu nenhum?
- Já falei que não estou com fome.
- Esses pães tem o mesmo gosto dos pães que nossa mãe fazia, parece
que eu estou voltando ao passado.
Ric arregalou seus olhos vendo que seu irmão chorava. Ele não fazia
ideia do gosto dos pães de batata que sua mãe fazia por que era muito
pequeno naquela época. Mas mesmo assim pegou um e mordeu.
Ficou mastigando e olhando para cima. Depois que engoliu, olhou para
Edie e disse. - É muito gostoso, mas eu não consigo ligar o gosto à
mamãe, me desculpe.
Ric levantou os braços e agarrou o irmão, os dois ficaram ali abraçados
por alguns segundos, naquele momento uma coruja passou voando por
cima deles e as chamas da fogueira ficaram mais fortes. A coruja voou
até um velho tronco de arvore e lá ficou observando com aqueles olhos
arregalados em tons de amarelo e marrom.
Após soltar o abraço, os irmãos olharam para o fogo durante algum
tempo e a chama do fogo era alta e as labaredas salpicavam em todos os
lados.
- Essa Dina? - Me conte sobre ela. Perguntou Edie com um pouco mais
de curiosidade sobre a garota que Ric conheceu.
Os dois se sentaram e Ric começou a falar sobre a menina que ele
encontrou sentada no chão com um enorme machucado no joelho. Ele a
descreveu por completo, falou dos grandes olhos castanhos que ela
tinha, cabelos compridos e lábios carnudos. Edie ficou encantado com a
descrição que Ric estava dando sobre a misteriosa garota que aparecera
simplesmente do nada na vida dele.
Ric era tão detalhista que a apresentação de Dina tomaria o resto da
noite. A coruja permaneceu em seu lugar no topo do velho tronco seco e
as labaredas das chamas da fogueira salpicavam cada vez mais.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Desafeto da escola
5
Um lindo pássaro pousou sob o galho mais próximo da cabana de
Ric anunciando o amanhecer na floresta. A ave cantava uma linda
melodia. As cores do pássaro se destacavam entre as folhas verdes
da mata.
Ric colocou a cabeça para fora da pequena cabana, seus olhos ainda
se acostumando com a claridade permaneceram cerrados até que
foram banhados pela água que estava armazenada em uma pequena
construção feita de bambus. Junto com Ric os outros homens
também se aproximaram para lavar seus corpos.
Ric apenas vestia o que antes fora uma calça cortada na altura dos
joelhos. O tecido estava velho e desgastado. Enquanto se lavava,
filetes de água escorriam para baixo de seu corpo, descendo primeiro
pelo seu pescoço, depois passando pelo seu peitoral e escorregando
até abaixo do abdome. Os músculos dos braços de Ric se contraiam
involuntariamente à medida que ele se movimentava para terminar
de se lavar. Compartilhando o mesmo lavabo os outros homens
faziam a mesma coisa.
Edie aproximou-se todo coberto com roupas verde escuro ordenando
a todos que se vestissem, seria dia de buscar água na fonte.
- Temos que sair agora, nós não podemos correr o risco de encontrá-
los lá na fonte ou mesmo, pelo caminho.
Os homens concordaram fazendo sinal com a cabeça e correram para
suas cabanas a fim de se vestir apropriadamente para a ocasião.
Pegar água na fonte não parecia uma tarefa assim tão fácil quanto se
imagina. A fonte, nada mais era, que a tal fonte milagrosa que Pedro
descobriu no passado. Todos precisavam beber daquela água, caso
contrário, não sobreviveriam, não por falta de água para beber, mas
que estavam condenados a beber exclusivamente daquela água.
A fonte não ficava perto do refugio e eles tinham que levar garrafas
para serem cheias com a água milagrosa, cada um armazenava sua
própria água, por questão de sobrevivência, cada um era responsável
pela sua hidratação.
O maior perigo que poderia ocorrer nessa busca, era o grupo
encontrar com Ram e seu clã, na fonte ou à caminho dela. Já que
eles também precisavam beber da mesma água.
Sorvendo vários goles da água, Edie pergunta a Ric se ele não
poderia conseguir mais daqueles pães que Dina havia lhe dado.
Estranhando a pergunta de Edie, Ric sorriu e jogou água na cabeça
do irmão. - Hei Edie, estou achando estranho você querer conhecer a
Dina, já perdeu o interesse pelos macacos e pelas preguiças? Falou
sorrindo.
Edie ficou todo molhado, mas não mostrou qualquer raiva, apesar de
não ter apreciado nem um pouco a atitude de Ric. - Eu não quero
conhecer essa tal Dina. Respondeu. - Só estou pedindo que você
arrume mais daqueles pães. Jogando água em Ric. - Estou cansado
de ter que comer a porcaria que você faz. Rebateu rindo.
Então Ric voltou a jogar água em cima de Edie, com um pouco mais
de força e os dois se atracaram nas margens da fonte. Estavam
prestes a cair das pedras localizadas na margem quando alguém do
clã pediu silencio. – Shhhhh ousam, outras pessoas estavam se
aproximando.
Imediatamente todo o grupo de Edie e Ric levantaram suas garrafas,
algumas cheias, outras ainda vazias e correram para baixo da ponte
que passava por cima do pequeno riacho que brotava a alguns
metros da fonte da água. A velha ponte não era o melhor
esconderijo, mas era a única opção que eles encontraram naquele
momento.
Todos ficaram amontoados em silencio e o som de cavalos puderam
ser ouvidos muito próximos. Quase todo o clã de Ram estava
chegando e passaram por cima da ponte com o mesmo objetivo de
abastecer suas garrafas com água. Eles não perceberam que havia
pessoas escondidas em baixo da ponte, então eles passaram direto
até chegar à fonte de santo Pedro.
Os cavalos do clã de Ric e Edie esperavam por eles em outro canto ali
próximo na floresta, então eles caminharam silenciosamente para
não serem vistos nem por Ram nem por quem quer que fosse. Caso
contrário haveria luta. Montando em seus cavalos todos retornaram
para o acampamento no refúgio.
***
Na escola Dina tentava chamar atenção de Anja enquanto a
professora tentava explicar trigonometria. Anja morria de medo de
ser chamada atenção por uma professora, aliás, Anja morria de medo
de tudo que era considerado errado. Anja era do tipo de garota
certinha do bem.
- Psiu, Anja. Depois da aula vamos tentar encontrar a casa
desmoronada.
- Que casa, Dina? Não vê que estamos no meio de uma aula de
trigonometria. Apesar dessa matéria já ter sido dada ano passado.
- Então, eu preciso que você me ajude a encontrar a casa, tenho que
descobrir o que aconteceu de verdade e como você mora aqui há
mais tempo que eu ficaria mais fácil.
- Professora, essas duas meninas estão tirando minha atenção. Falou
Lorena que estava sentada a duas cadeiras de distancia de Dina e
Anja.
A professora parou a aula e se aproximou das duas meninas que
ficaram caladas olhando cada uma para seu próprio caderno. A turma
toda voltou sua atenção para a professora, Lorena, Dina e Anja.
Lorena, com ar debochado em seu rosto apontou para as meninas
reclamando à professora que elas estavam conversando assuntos
extracurriculares, como se ela se interessasse mesmo por isso. Na
verdade ela queria ver as amigas serem chamadas à atenção.
Levando uma bronca na frente de todos os alunos, Dina e Anja não
se falaram mais durante o resto da aula. Anja com as bochechas
vermelhas de vergonha abaixou a cabeça e não tirou mais os olhos
de seu caderno enquanto Dina, com a raiva brotando através das
orelhas, permaneceu calada o resto da aula.
Lorena sorrindo ao lado de Adan, seu colega de classe, pareceu não
se importar nem um pouco com a reação de Dina ou de Anja. Longos
minutos se passaram ate que o sinal tocasse anunciando o final da
aula. Era hora de ir para casa.
Na saída da escola, Dina e Anja conversaram sobre a bronca da
professora. - O que aquela ridícula tinha intenção de fazer? Perguntou
Dina enquanto abria a mochila para alcançar um pão de batata.
- Eu não sei Dina. Respondeu Anja. - Lorena sempre foi assim, desde
pequena, ela não muda.
- Pode ser, mas se ela se meter comigo de novo, não vai prestar,
você sabe que eu não tenho sangue frio.
Anja tentou manter as coisas calmas - Espero que ela não se meta
com você mesmo. Ela disse. - Por que você vai me meter no meio
disso e meus pais vão acabar se metendo na secretaria da escola.
Dina deu um soco de leve no ombro da amiga. - Anja, não seja
covarde. Falou sorrindo enquanto Lorena se aproximava. – Falando
no diabo, lá vem ela.
- Ignore Dina, por favor. Implorou Anja.
Lorena passou pelas duas garotas. Estava abraçada aos seus
cadernos rindo alto para chamar à atenção para si então deu meia
volta e parou exatamente na frente de Anja. - Espero que você não
atrapalhe mais minha aula. Sussurrou Lorena perto de Anja.
- Eu não estava atrapalhando a aula. A outra respondeu.
- Quem estava falando era eu. Disse Dina apontando o dedo na
frente do nariz de Lorena.
- Oh, advogado de defesa, quem seria você? Perguntou Lorena à
Dina. - Ahhh não precisa responder, eu acho que já sei... É a pobre
órfã que acabou de vir morar na cidade. Lorena continuou falando
alto para que o resto dos alunos próximos pudesse ouvir. – Ah sim, e
que mora com a velha cozinheira da igreja.
- Ei, minha avó não é cozinheira da igreja, ela deu aulas na pastoral.
Respondeu Dina com sangue fervendo nas veias. - Tenha respeito
quando fala da minha avó.
- Ou o que? Perguntou Lorena.
Sem responder mais nada, Dina partiu pra cima de Lorena agarrando
em seus cabelos. Deixando cair todo o material que carregava nos
braços, Lorena tentou empurrar Dina, mas era tarde de mais.
Dina puxou Lorena tão forte, que ela estava com joelhos dobrados no
chão. Mesmo Dina sendo um pouco mais baixa que Lorena, parecia
ter mais força e todos os alunos da escola começaram a gritar:
BRIGA... BRIGA... BRIGA. No minuto seguinte uma aglomeração
cercava Dina, Lorena e Anja.
Conseguindo se libertar dos agarrões de Dina, Lorena conseguiu
socar a barriga dela fazendo-a recuar e quando Lorena tentou pegar
nos cabelos de Dina, Anja se colocou entre elas ameaçando Lorena
com seus cadernos de capa dura cor-de-rosa.
Concluindo que estava em desvantagem, Lorena recolheu seu
material que estava caído no chão e se afastou. Seu amigo Adan que
só chegou logo após a briga ter terminado, tentou ajudar Lorena que
o afastou dela, explodindo de raiva. - Não toque em mim seu idiota,
onde você estava quando eu precisei de você? Falou Lorena para
Adan enquanto caminhavam para longe do local.
Anja ajudou Dina a se recompor enquanto o inspetor dispersava os
alunos fora da escola. - Obrigada Anja, eu estava conseguindo dar
conta sozinha da vadia com rabo de cavalo, mas já que você se
meteu obrigada pela ajuda.
- Tudo bem Dina, vamos embora logo antes que ela resolva voltar.
- Ninguém fala de minha avó daquela forma... Nem de forma alguma.
E as duas saíram da escola.
No caminho de casa, Dina explicou para a Anja a historia que o
psicólogo havia lhe contado na outra sessão, foi depois disso que ela
estava disposta a encontrar a casa desmoronada.
- Eu acho que já ouvi minha mãe dizer alguma coisa sobre essa casa
Dina, não estou certa, mas posso perguntar a ela hoje à noite, depois
que voltar da igreja.
- Ótimo, já é uma grande ajuda na minha investigação. Falou Dina à
amiga. - Também vou perguntar para minha avó sobre essa casa,
talvez ela conheça, afinal é uma casa desmoronada aqui na cidade,
as pessoas devem conhecer quem morou lá.
Dina passou a tarde toda perguntando a todas as pessoas que ela
encontrava pela rua e não conseguiu descobrir nada sobre o endereço
da casa desmoronada, ninguém sabia de nada ou não queria dizer.
Ela perguntou ao dono da padaria e nada, o vendedor da casa de
aves também não sabia, mas Dina não estava disposta a desistir da
investigação. - Eu não vou descansar até encontrar alguém que me
diga alguma coisa. Dina falou com sigo mesmo baixinho. – Eu vou
saber quem morou naquela casa.
***
Mais tarde, na floresta. Ric atirou três facas na direção de Edie, mas
não conseguiu acertar nenhuma delas. Edie se movimentava como
muita velocidade ao se esquivar dos golpes. As facas arremessadas
fincaram na terra enquanto Edie executava um belo salto mortal para
trás.
Então começaram a lutar corpo a corpo, um contra o outro. Os chutes
laterais semicirculares que Edie desferia eram bloqueados por Ric
com seus antebraços que contra golpeava no mesmo tempo com
chute giratório acertando seu calcanhar na lateral da cabeça de Edie.
- Vá com calma, isso é apenas um treinamento. Reclamou Edie
apalpando sua cabeça.
Ric sorriu para ele. - Vai querer que eu pegue leve com você? Tudo
bem. Ele disse com as mãos na cintura. – Eu achei que o treinamento
deveria ser serio não brincadeira de criança.
Edie assumiu novamente uma posição de combate e com a guarda
alta ele esperou que Ric investisse outro golpe. Horas mais cedo, eles
haviam voltado da fonte, mais nervosos do que de costume. Poucas
vezes, houve encontros entre o clã de Ram e o deles.
Se esconder em baixo da ponte causou tamanha frustração em Ric,
que o fez ficar calado o resto da manha. Agora os irmãos estavam
treinando e Ric deixava os pensamentos negativos tomarem conta da
sua mente, fazendo com que ele se distraísse e fosse atingido pela
lamina da espada de Edie.
- Cara eu acertei você. Gritou Edie olhando para o sangue do irmão
que escorria pelo braço.
- A culpa foi minha, resmungou Ric – Eu deveria ter prestado mais
atenção, vamos continuar, fique em guarda.
- Não seja infantil, idiota, se não cuidarmos disso poderá ficar pior.
- Edie... Edie... Brincou Ric, quase desmaiando. - Sempre o irmão
protetor.
Quando Edie percebeu que Ric, enquanto falava abaixou-se na raiz
grossa de uma árvore, pálido e com lábios embranquecidos correu
para pegar uma garrafa cheia com a água que haviam trazido mais
cedo da fonte de santo Pedro. Deu de beber ao irmão e jogou um
pouco sobre o corte feito pela sua espada.
Em poucos minutos Ric retomou a cor e como um verdadeiro milagre,
o corte foi fechando, a carne aberta curando e em pouco tempo Ric
estava em pé novamente. Edie observava o braço do irmão que antes
expunha um corte profundo e agora não passava de um arranhão.
Edie mais aliviado percebeu que Ric não mostrava nenhuma gratidão,
nem pelo gesto do irmão, nem pelo milagre da água. Ric sentia
verdadeiro ódio cada vez que precisava beber água ou usa-la para se
curar. - Você bem que poderia se mostrar um pouco mais de gratidão
por eu salvar a sua vida. Falou Edie.
- Não faça drama, eu sabia o tempo todo que você iria me ajudar.
Respondeu Ric sarcasticamente. – você não vive sem mim. Falou,
Enquanto virava em direção a sua cabana.
- Ei, para onde você esta indo, vai escurecer em três horas.
Perguntou Edie.
- Eu vou ver a Diana.
- já que vai até lá, arriscar seu pescoço e do resto do nosso clã,
poderia ao menos trazer mais daqueles pães.
Ric não respondeu ao irmão. Continuou caminhando em direção a sua
cabana. No caminho vez uma breve pausa para acariciar Céu que
estava a poucos metros dali. Chegando à porta da cabana, olhou para
dentro e mergulhou para dentro.
***
Já anoitecendo na cidade. Anja estava em casa bordando panos de
prato. Em sua família era normal que as mulheres aprendessem a
arte de bordar. Anja adorava passar horas na poltrona da sala
bordando quando não estava na companhia de Dina falando pelos
cotovelos.
O pai de Anja trabalhava com construção civil e todos os dias, na
saída do turno esperava a mãe de Anja na porta da igreja para
voltarem juntos. Mesmo quando não era hora da missa, a mãe de
Anja sempre que podia estava na lá.
Quase anoitecendo os pais dela entraram pela porta. Anja estava
acabando de se arrumar para ir ao encontro de Dina. O pai de Anja
era um homem de aparência rústica com idade beirando os 60 anos.
Sua pele era bem queimada do sol devido ao trabalho. Construção
civil era o oficio que a maioria dos moradores da cidade exercia.
Anja entrou no quarto enquanto sua mãe guardava o terço de prata
na gaveta. A mãe de Anja era uma mulher bonita apesar da idade.
Estava vestida com uma saia comprida em cor bege e um cardigã
combinando em tom mais escuro. Seus cabelos eram compridos até a
metade das costas e presos em forma de trança.
Anja sentou na cama e perguntou a sua mãe se ela conhecia os
moradores que morreram soterrados numa casa que desabou sobre
suas cabeças. A mãe de Anja, franzindo a testa com desconfiança,
achando estranha, a pergunta da filha.
- Não me lembro bem filha, que casa você está se referindo, por que
você quer saber disso agora?
- Nada de mais mãe. Respondeu Anja casualmente. – Dina ficou
interessada em saber sobre o que aconteceu por lá, e curiosidade de
quem veio morar aqui na cidade recentemente.
- Filha, pelo que eu me lembre, era uma família jovem que morava
lá. Revelou a mãe dela. – Eu sempre levava bordados para vender
naquela casa, a baronesa gostava do meu trabalho. Completou
parecendo puxar pela memória.
- Baronesa, como assim? - Por acaso eram pessoas da realeza que
moravam lá?
- Seu pai saberia explicar melhor que eu. – As pessoas que moravam
lá ao que parece eram de outra terra, Europa talvez.
Anja logo deduziu que uma baronesa seria casada com um barão.
Satisfeita com a informação que sua mãe havia lhe fornecido, saiu
correndo do quarto. - Xau pai, xau mãe. Despediu-se batendo a porta
atrás de si.
Apesar de gostar de missa e bordados, Anja nunca foi uma garota
cem por cento devagar. Como toda adolescente, Anja gostava de
andar as pressas sempre que tinha um compromisso, seja ele qual
fosse.
Já era o começo da noite, mas a cidade ainda não estava
completamente escura. As pessoas estavam de deslocando do
trabalho para casa e o comercio estava praticamente de portas
fechadas. Enquanto quase todo mundo estava entrando em sua casa
anja estava saindo dela, se dirigindo para casa de Dina.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Beijo no chafariz
6
Ric, do lado de fora da sua cabana, assobiou chamando Céu. O cavalo
respondeu rapidamente ao chamado de seu dono. Quando Ric não
estava galopando, Céu costumava pastar por ali mesmo, sempre
próximo ao acampamento do refugio.
Céu era um cavalo branco, mas podia jurar que a tonalidade certa de
seus pelos eram de um acinzentado, quase prata. Era muito difícil
dizer a cor exata de um animal de cor clara no meio da floresta.
Especialmente à noite. O que mais chamava atenção no cavalo era a
sua crina muito comprida e muito abundante.
Ric se aproximou de Céu vestindo uma calça verde tão escura que
quase não dava para perceber a cor. Sua blusa de gola V com
mangas compridas completavam o estilo casual. Seus cabelos
rebeldes com mexas desordenadas trepidavam com o balanço do
galope de Céu.
Cada vez que Ric pensava em Dina, uma explosão de euforia tomava
conta do seu corpo fazendo seu coração bater em tom mais
acelerado. Ric estava tão ansioso para encontrar Dina, que não
percebeu que estava sendo seguido por Ram e Lucaar.
Eles estavam escondidos numa parte alta da floresta, onde era
possível ver, sem ser visto. Estavam vestidos com roupas
completamente pretas, incluindo capuz onde apenas os olhos
estavam à mostra. Os olhos de Ram brilhavam no escuro, como dois
vagalumes.
Já os olhos de Luccar eram negros e estreitos. Era absolutamente
impossível ver qualquer expressão naqueles olhos. Lucaar sempre foi
o braço direito Ram, desde pequeno. Eles se tornaram amigos logo
depois que Luccar chegou a Santo Pedro.
Muito rebelde, não quis fazer amizade com ninguém, mas Ram
conseguiu, não se sabe como, conquistar o coração do garoto. Hoje
Lucaar ocupa o posto mais confiável no clã de Ram.
Fora da floresta, Dina sentou à mesa da cozinha enquanto vó Augusta
preparava a janta e a massa dos pães para fornada da manhã
seguinte.
- Vó, a senhora sabe alguma coisa sobre a casa que desmoronou
matando os moradores aqui na cidade?
Vó Augusta parou um momento antes de responder. - Querida, eu
não lembro bem, isso foi há muito tempo, se você não comentasse
agora talvez eu não me lembrasse de que essa tragédia aconteceu.
- É que o psicólogo comentou por alto sobre esse acontecimento, digo
essa tragédia.
Enquanto as duas falavam, Anja bateu na porta muito ansiosa para
dizer a Dina sobre as informações que sua mãe lhe falou mais cedo,
antes de sair de casa.
- Boa noite, dona Augusta. – Oi Dina, vamos para o seu quarto,
tenho informações sobre a tal casa.
As duas subiram correndo as escadas e se dirigiram para o quarto de
Dina. Sentaram-se de frente uma para outra na cama e Anja
começou a falar. - Minha mãe já entrou naquela casa.
- Como é que é me explica isso direito, o que sua mãe fazia lá?
- Minha mãe vendia bordado para a dona da casa, a baronesa.
Continuou. - Minha mãe disse que a baronesa gostava muito do
bordado dela.
- Isso é uma ótima informação Anja, talvez as pessoas se lembrem
da baronesa ao invés da casa. Falou Dina euforicamente. – Vamos
descer e perguntar para minha avó sobre essa baronesa.
As duas desceram as escadas correndo juntas quase despencando lá
de cima. Era realmente incrível como adolescentes daquela idade
gostam de viver perigosamente, ainda mais quando se tratava de
escadas.
- Vó. Gritou Dina já entrando na cozinha seguida de Anja.
As duas não encontraram vó Augusta. Ficaram olhando uma para
outra, sem entender como ela desapareceu enquanto elas estavam
no quarto. Onde ela está? Perguntou Dina.
- Estou aqui em cima querida, Gritou vó Augusta do segundo andar
da casa.
- Como ela foi parar lá em cima, sem que nós pudéssemos perceber?
Perguntou Anja com espanto. – Sua avó faz ginástica?
- Se ela faz eu não sei, mas vou subir lá falar com ela. Respondeu
Dina saindo em disparada em direção às escadas novamente, Anja foi
atrás.
As duas voltaram pelo mesmo caminho que fizeram quando desceram
do quarto de Dina. Tentando pisar no mesmo degrau, o pé direito de
Dina assentou sobre o pé esquerdo de Anja, fazendo com que seu
próximo passo avançasse tropeçando nos degraus seguintes.
Desequilibradas, as duas caíram na base da escada, uma em cima da
outra.
O ruído da queda fez com que vó Augusta descesse as pressas para
ver o havia acontecido no andar de baixo. Descendo devagar vó
Augusta se deparou com as duas meninas sentadas no chão rindo
uma da cara da outra por causa do tombo. - Ainda bem que nós não
nos machucamos. Falou Anja quase chorando de tanto rir.
- Meninas tomem cuidado. Advertindo vó Augusta às meninas. - Por
que vocês tem que fazer tudo correndo?
- Desculpe vó, eu estava muito ansiosa para perguntar para a
senhora sobre aquela casa novamente. Falou Dina. – Anja me trouxe
informações da mãe dela.
Quando Dina se levantou vó Augusta já estava no andar de baixo
com uma fotografia nas mãos. Dina olhou para a fotografia que
parecia ser mais velha que sua própria idade. Vó Augusta mostrou a
fotografia para Dina. A neta pegou o retrato nas mãos e reconheceu
duas das pessoas que estavam na foto.
- Essa aqui é a senhora vó? Perguntou Dina e em seguida apontou
para outra pessoa na foto. – Este é o padre daqui da igreja, certo?
- Isso mesmo querida. Respondeu vó Augusta apontando para uma
terceira pessoa na foto. – Essa de vestido claro é Celina, que fez o
curso de culinária na pastoral, era ela quem morava na casa que
desmoronou.
- Será que essa Celina deve ter conhecido a tal baronesa? Indagou
Anja.
- Sim, com certeza se ela morou lá, claro que conhecia. Afirmou Dina.
Com um sorriso no olhar, respondendo em tom melancólico, vó
Augusta respondeu as meninas. - Queridas, Celina era a baronesa.
Com os olhos arregalados diante da surpresa, as meninas ficaram
caladas alguns segundos antes de perguntarem. - A senhora conhecia
a baronesa, conhecia as pessoas que moravam na casa?
Vamos sentar que eu vou explicar a vocês com mais calma. Se minha
memória não me falha...
Celina era a minha aluna e a mais aplicada na pastoral. O curso de
culinária estava tão vazio antes dela se matricular que eu quase desisti
das aulas. Mas depois que Celina se matriculou, outras meninas
também se animaram com o curso.
Muitas meninas tinham curiosidade em estar perto de uma baronesa.
Uma baronesa muito jovem, podia se dizer. Ela casou antes dos 16 anos
e na época das aulas ela já tinha dois filhos, o pequeno Ramcy e Edgard.
Seu marido, o barão Juan era quase 15 anos mais velho. Ele morava na
Europa e por causa das muitas terras que ele comprou aqui na cidade, os
moradores o chamavam de barão e Celina de baronesa.
A primeira coisa que Celina aprendeu comigo foi a receita dos pães de
batata. Depois de alguns dias ela me falou que depois que aprendeu, os
preparava em casa e toda família adorava, principalmente Edgard.
Quando seu ultimo filho nasceu ela parou de frequentar as aulas por que
o barão teve que viajar em um projeto científico, eu acho. Mas ela sempre
que podia, vinha aqui me ver com seu filho mais novo.
Quando o barão voltou da viagem, Celina nunca mais veio aqui. Nós nos
víamos esporadicamente na missa e festas do solstício. Os garotos foram
crescendo e, como eu quase não os via, não sei a aparência que eles
ficaram, mas tenho certeza que se estivessem vivos, hoje seriam rapazes
muito bonitos.
Depois que o barão voltou de viagem, muita coisa mudou aqui na cidade,
milagres começaram a acontecer. E alguns anos depois, numa noite de
muito vento e tempestade, a casa deles desmoronou toda em cima das
cabeças de Celina e das crianças. Os empregados disseram que o barão
ainda tentou salvar a família, mas uma coluna pesada caiu sobre ele
também. A família toda morreu ali, à noite.
Na manha seguinte os empregados, logo após terem enterrados os corpos
dos seus patrões, desceram aqui para o centro da cidade para dar a
triste noticia. Disseram que os corpos da família foram enterrados nas
terras atrás da casa, bem próximo à entrada da floresta. Nem eu e nem
ninguém daqui teve coragem de subir até lá para velar ou mesmo para
deixar flores e tributos no pequeno cemitério da família.
Dina e Anja com os olhares molhados permaneceram caladas
enquanto vó Augusta subia lentamente para o segundo andar, com o
retrato nas mãos.
- Meu Deus, isso foi uma desgraça total. Morrer soterrado em sua
própria casa. Choramingou Dina. – Isso é muito triste.
Anja levantou para ir embora. - Depois desta historia, eu acho que
vou para casa dormir, Xau Dina.
Saindo da casa de Dina, Anja seguiu silenciosa para a casa dela. Toda
aquela historia havia deixado Anja abalada e ela só tinha vontade de
deitar em sua cama e dormir.
Dina ficou na cozinha mais algum tempo, tentando digerir a historia
que sua avó acabara de lhe contar. Sozinha, Dina subiu as escadas
de sua casa bem de vagar, em ritmo de câmera lenta, deu boa noite
a sua avó e bateu a porta de seu quarto.
Agora ela estava sentada no peitoral de sua janela os braços
cruzados sobre suas pernas, cabeça baixa chorando. A tragédia da
casa a fez lembrar que seus pais também foram mortos em uma
tragédia. Nem todos os casos de sequestro resultam em morte, mas
infelizmente aconteceu na cidade onde eles moravam.
Perto da cassa dela, Ric soltou Céu no mesmo lugar da outra noite
que encontrou Diana. Andou pelas ruas cuidadosamente observando
quem poderia supostamente passar por ai. Ram e Luccar estavam em
seu encalço a metros atrás dele, mas Ric não percebeu os dois, por
que só pensava em Dina.
Quando estava quase na frente da casa de dela, Ric pode ver que ela
ainda estava sentada na janela. Dessa vez ela não percebeu Ric por
que estava chorando de cabeça baixa. Ric se agachou para pegar
pequenas pedrinhas no chão e começou a lançar em direção á Dina
certificando que somente iriam bater nas portas da janela, foi quando
Ram, de longe, viu Dina pela primeira vez.
Os olhos de Ram se estreitaram para uma melhor visualização.
Lucaar permanecia tenso ao seu lado, sair da floresta naquela hora,
ainda era uma manobra perigosa, mesmo para eles dois. Ram puxou
o capuz que cobria todo seu rosto. Deixando a brisa refrescar o suor
dos cabelos por baixo do tecido. Seu semblante permanecia sério,
impenetrável.
Dina sentiu o trepidar das janelas e olhou para baixo. Pode ver Ric
com algumas pedrinhas ainda em suas mãos. Ric fez sinal para ela
descer ao seu encontro. Ram e Lucaar observavam atentamente aos
movimentos de Ric, quando a garota abriu a porta da casa. Ric pode
perceber que Dina estava chorando e quis saber o que acontecera.
- Ei Dina, estava chorando o que houve?
- Eu estava um pouco triste. Ela respondeu. – Não se lhe contei, eu
sou órfã de pai e mãe, por isso eu vim aqui morar com minha avó.
Ric aproximou-se de Dina e pegando em sua mão, a chamou para um
pequeno passeio até o velho chafariz. - Por que não vamos andar um
pouco? Ele disse. - Assim você me conta um pouco mais.
Eles andaram até o chafariz, sentaram e Ric tocou o rosto de Dina.
Os olhos dela ainda estavam vermelhos por causa das lagrimas que
escorreram. Ram e Lucaar acompanharam toda a cena até o chafariz,
então decidiram voltar para a floresta.
- Você estava chorando de saudades pelos seus pais? Perguntou Ric
acariciando o rosto de Dina.
- Acho que sim. Ela respondeu. - Minha avó me contou uma historia e
eu meio que me lembrei deles. Falou com o rosto totalmente apoiado
nas mãos de Ric.
A intimidade entre os dois aumentou e Ric estava com os braços
enrolados em torno de Dina. Seu queixo sobre a cabeça dela, e a
cabeça dela descansando sobre o peito dele. Dina estava tão relaxada
que podia ouvir as batidas do coração de Ric e ritmo acelerado.
- Eu não gostaria de competir com você nesse momento, mas talvez
faça você ficar mais a vontade pra se abrir comigo se desejar, eu
também sou órfão de pai e mãe. Revelou Ric.
- Você também não tem pais? Perguntou Dina. – Então você sabe
como eu estou me sentindo.
- Meus pais morreram quando eu tinha 13 anos. Continuou Ric. – Eu
fui criado pelo meu irmão do meio daí então.
Dina se afastou dos braços de Ric e ficou interessada pelo relato da
historia dele. Eles estavam muito próximos com as mãos
entrelaçadas e as coxas encostadas, a dele na dela.
- Minha amiga acha que você não existe, ela acha que eu vi coisas na
primeira vez que nos encontramos. Falou Dina olhando nos olhos
verdes de Ric.
- Mas eu estou aqui com você, não estou?
- Sim, mas eu não sei nada sobre você, só agora descobri que é órfão
como eu. Qual seu nome, e sobrenome?
Ric pensou um segundo e dando de ombros a si mesmo, respondeu à
pergunta de Dina que o olhava com muita esperança de conhecer
mais um pouco sobre ele.
- Eu me chamo Richard Baleares, muito prazer, e o seu?
- Eu me chamo Diana Gomes e o prazer é todo meu, senhor Baleares.
Ric ficou tenso quando escutou a garota dizer as palavras Senhor e
Baleares. - Só retire o senhor, meu pai era chamado de senhor por
todo mundo.
- Então está bem, Ric. Melhor assim?
- Claro. Ele respondeu. - Assim e muito melhor.
Os dois ficaram rindo um para o outro algum momento, quando Ric
ficou serio em frente a ela. Olhando nos olhos castanhos que ela
exibia ele umidificou os lábios e olhou para boca de Dina, ela ficou
absolutamente imóvel sem saber como reagir. Ric se aproximou
lentamente de Dina, mais e mais perto.
Ela fechou os olhos, não conseguia encarar a situação. Ele encostou o
nariz na bochecha dela e vagarosamente foi deslizando para próximo
da sua nuca tentando sentir o cheiro dos cabelos castanhos dela.
Dina sentiu um arrepio que começou no pescoço, sob o toque da
língua de Ric, terminando nas suas coxas. Ela jamais havia ficado tão
próxima de um rapaz antes e tentou se afastar dele, mas ele então a
puxou para mais perto e encostou seus lábios nos dela. Foi um beijo
longo e carinhoso.
Quando Dina abriu os olhos, Ric estava com os braços em volta dela.
O beijo fez com que ela esquecesse completamente qualquer
pensamento ou dor. Ric passou as mãos pelos cabelos dela,
mergulhando os dedos naquele mar de ondulações castanhas. Dina
um pouco envergonhada jogou as mãos para trás da cabeça de Ric
laçando seu pescoço e puxando para perto de si.
Um som de ave passou por cima das cabeças deles fazendo com que
a corrente que os atraia se quebrasse e afastando seus corpos. Uma
coruja de grande porte piou ali perto quando fez um voo rasante,
pousando no topo do chafariz.
- Melhor eu voltar para casa, minha avó pode acordar e ficar
preocupada se não me encontrar.
- Vou levar você pra casa. Ele disse.
- Não precisa, eu posso voltar sozinha.
- Que espécie de homem eu seria se deixasse você voltar sozinha pra
casa, à noite. – Me de sua mão.
Dina e Ric entrelaçaram suas mãos e seguiram andando devagar em
direção a cada dela. Ric permaneceu calado todo o percurso e Dina
imaginava qual seriam os pensamentos dele. Na frente de sua casa,
Dina igualou sua altura com a de Ric quando ficou em cima do degrau
da porta. Os dois estavam com seus olhares na mesma direção.
- Boa noite Ric.
- Boa noite Dina.
Quando a garota colocou a mão na maçaneta da porta, Ric puxou-a
tão rápido para si que ela não pode ter tempo para raciocinar ao
movimento. Ele encostou Dina na porta e pressionou seu corpo
contra o dela. Aquele beijo foi diferente do beijo do chafariz, eles
estavam em pé com seus corpos totalmente encostados um no outro.
Dina pode sentir o coração de Ric batendo embaixo do peito
encostado ao dela.
- É assim que eu dou boa noite. Falou Ric afastando o peso do corpo
dele contra o dela.
Ela abriu a porta com cuidado para não acordar a sua vó e fechou a
na frente de Ric. Subiu depressa as escadas e em silencio foi para a
janela. Ric estava embaixo esperando ela aparecer. Com um aceno
de mão ele foi embora.
Já em Santo Pedro, Ram conversava com Luccar em frente à
fogueira. Comendo carne assada no fogo e bebendo suco de fruta.
- Você acha que ele conhece essa garota há muito tempo? Perguntou
Lucaar enquanto arrancava um pedaço de carne queimada com a
boca.
- Eu não faço ideia de como ele a conheceu e há quanto tempo ele a
conheceu. Respondeu Ram. – Mas ele não pode colocar tudo a
perder, não depois de tantos anos.
- Você já sabe o que vai fazer?
- Eu não sei. Respondeu Ram estreitando os olhos brilhantes
contrastando com a luz amarela da fogueira. – Mas amanha é um
novo dia. Vou resolver isso.
- Eu não acho que exista uma forma para separar o que quer que
esteja acontecendo entre os dois. Falou Lucaar. - Resolver isso não
parece ser uma tarefa fácil.
- Você sabe muito bem qual é a forma mais fácil que eu costumo
resolver as coisas que não me agradam. Falou Ram. – Eu vou matar
essa garota.
Luccar deu um sorriso antes de colocar outro pedaço de carne na
boca.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Encontro inesperado
7
Quando Dina passou pelo portão da escola depois da aula, seu rosto
ainda exibia expressões da raiva que sentia de Lorena. Ela
confrontava Dina diariamente durante as aulas. Tentando não se
concentrar em Lorena, Dina conversava com Anja sobre o endereço
da casa desmoronada que possivelmente, elas teriam que descobrir.
- O que você vai fazer depois do almoço? perguntou Anja. – vamos
andar por ai pra tentar descobrir o endereço da tal casa?
- Depois do almoço tenho consulta com psicólogo, respondeu Dina. –
provavelmente vamos perder o dia, hoje tem missa esqueceu?.
- claro que não, eu jamais esqueceria o dia de ficar mais perto de
Deus.
Dina fez uma cara debochada enquanto se dirigia para casa. Anja
acompanhava Dina, já que as duas moravam perto uma da outra.
Dina gostava muito de Anja e para não magoar a amiga, ela preferia
ficar calada quando Anja começava a falar em religião. Mesmo na
pequena cidade onde as duas moravam, sendo um estado laico, a
grande maioria das pessoas praticava o catolicismo e não tolerava
muito a opinião sobre outras religiões.
Dina frequentava a missa católica, mas desde pequena, ela
simpatizava pelo espiritismo, junto com seus pais. Quando tinha seis
anos, ela passou por experiências ruins, como visões de pessoas
mortas, daí então, seus pais a levaram em um local onde as praticas
espirituais ajudavam as pessoas resolverem esse tipo de problema.
Dina melhorou e eles continuaram a frequentar o local desde então.
A primeira garota a chegar em casa foi Anja, enquanto Dina seguiu
em frente. Antes de Anja abrir a porta, ele teve uma estranha
sensação de que estava sendo observada.
Tirando a mão da maçaneta, ela virou a cabeça lentamente por cima
de seu ombro direito e depois virou o resto do corpo até estar de
costas para porta.
Lucaar estava longe, escondido atrás de uma árvore, dessas que
ficam encostadas nas calçadas, para fazer sombra nas ruas. Lucaar
olhava Anja com certa curiosidade, uma garota de cabelos louros
cacheados era mesmo de se chamar atenção. Se dando por satisfeita,
comprovando que não havia ninguém por perto, Anja virou de volta
para a maçaneta da porta, abriu e entrou.
Chegando a casa, Dina jogou os cadernos em cima do sofá da sala e
subiu correndo as escadas, quando chegou ao seu quarto estava
praticamente só de calcinha e sutiã. Dina gostava de andar pela casa
a vontade, já que só moravam ela e sua avó ali.
Depois de um banho rápido Dina desceu correndo as escadas
novamente. Sua avó estava esperando para o almoço, a mesa estava
pronta. Vó Augusta cozinhava muito bem, mesmo que somente para
duas pessoas ela fazia questão de pôr um banquete sobre a mesa.
Arroz branco, salada verde, carne assada e batatas coradas. O feijão
preto era opcional, mas Dina fazia questão de colocar feijão sobre o
arroz. Era como fazia quando morava com seus pais.
- vou aprender a cozinhar como à senhora vovó. – isso está muito
bom.
- certamente querida, vou te ensinar primeiro a fazer arroz branco.
Enquanto Dina mastigava sua avó enchia um copo de mate gelado
com duas rodelas de limão. Era a bebida que Dina mais gostava.
Quando as duas estavam terminando a refeição, Dina recomeçou o
assunto da casa desmoronada.
- Vó, a senhora sabe o endereço da casa desmoronada?
- por que você quer saber querida, você não pretende ir lá não é ?
- NÃO... É que eu pensei que talvez pudesse passar em frente só
para matar minha curiosidade. – afinal, faz parte da historia da
cidade, não é mesmo?
- eu acho melhor você deixar esse interesse para lá querida, vamos
deixar os mortos descansarem em paz.
Dina terminou de engolir a ultima garfada e com um pequeno gesto
com a cabeça respondeu a sua vó.
- Sim vovó, vou me concentrar em outra coisa.
Elas terminaram de comer e Dina ajudou retirar os pratos da mesa.
Enquanto voltava ao seu quarto para escovar os dentes, vó Augusta
lavava toda a louça.
- estou saindo para a sessão com o doutor Paulo, xau vó.
- xau querida, mas me diga quem é esse doutor Paulo, eu não o
conheço...
Dina não escutou as perguntas da sua avó, estava mais que
apressada para chegar à sessão com o doutor Paulo, seu psicólogo.
Andar na rua naquela hora da tarde era um pouco desconfortável
para Dina, pois o sol era muito forte.
Andando sozinha pelas ruas com os olhos cerrados por conta da luz
do sol, Dina não percebeu que estava sendo seguida por Ram. Ele
estava a metros de distancia dela, sozinho na outra calçada. Lucaar
estava escondido mais atrás. Eles foram acompanhando a garota até
a porta de um prédio de dois andares.
Entrando no consultório, a secretaria anunciou e Paulo a recebeu
pessoalmente, convidando-a para se sentar no divã, velho.
- boa tarde senhorita Diana. Cumprimentou e logo em seguida bebeu
um gole da garrafa ao lado. – O que vamos falar hoje.
- Que tal o senhor me dizer algo sobre a casa que desmoronou sobre
as cabeças da família ?
Paulo ficou tenso, a primeiro momento, mas depois sorriu e
respondeu calmamente para Dina.
- Nós já falamos sobre essa tragédia outro dia, que tal falar em algo
mais moderno.
- E que tal o senhor me dizer o endereço da casa ? Insistiu Dina.
- Falar sobre o endereço da casa não seria assunto para nossa
sessão.
Dina percebeu que Paulo não estava querendo responder as suas
perguntas, então tentou desviar o assunto para outra investida antes
do tempo da sessão terminar.
- é que eu fiquei muito interessada pela historia da água, e já que a
casa estava relacionada a ela, eu pensei que talvez pudesse fazer um
trabalho para escola.
- que tipo de trabalho ?perguntou Paulo começando a se interessar.
- aula de artes, o professor mandou os alunos desenharem paisagens
da cidade. – eu desenho um pouco bem, e pensei em retratar o local
da casa que desmoronou tipo os escombros que restaram dela.
- Mas por que você não falou isso antes, vou lhe dar o endereço, mas
me prometa que vai me mostrar o desenho.
- Claro que sim.
- Então vamos lá, disse Paulo. - Sobre o quê você gostaria de falar ?
Uma hora depois, Dina estava a caminho de casa. Ainda restavam
algumas horas da missa começar. Dina tinha em sua mão um papel
escrito o endereço da casa desmoronada.
Dispersa em seus pensamentos Dina escorregou novamente no
mesmo lugar onde conheceu Ric, mas desta vez não caiu. A
derrapada fez com que Dina soltasse o papel com endereço no chão.
Mas que depressa ela abaixou para pegar, quando uma leve brisa
passou e empurrou o papel mais próximo dos seus pés. Ela agarrou
tão forte o papel que conseguiu amassar um pouco. Ao levantar com
o papel nas mãos, pronta para escorrega-lo para sua bolsa, ficou com
seu o nariz apontado para Ram.
O susto foi grande, mas Dina não pode deixar de reparar naquele
homem lindo que estava em sua frente. Com camiseta branca e
calças claras combinando. Ela reparou nos braços dele incrivelmente
fortes, assim como o resto da musculatura muito bem distribuída em
todo seu corpo.
Levantando a cabeça, ela fixou a atenção nos olhos de Ram. De
imediato ela arriscou dizer que eram de cor azul bem claro, mas logo
desistiu, pela confusão dos tons de cores que saltavam daqueles
olhos.
-Boa tarde. Falou Ram.
- Boa tarde. Respondeu Dina, se perguntando de qual paraquedas ele
havia caído.
- onde está indo com tanta pressa ?
- não estou com pressa, só estou andando rápido. Dina respondeu
um pouco mais segura. – É que eu fico com medo de encontrar
estranhos que possam me fazer mal.
- nesta cidade não existem pessoas estranhas, todos se conhecem.
- Eu não conheço você. Argumentou Dina. – a propósito, eu quase não
conheço ninguém aqui nessa cidade. Pensou.
- Eu sou Bob, muito prazer. Apresentaram-se Ram com um nome
falso.
- Muito prazer... Bob. – eu sou Dina.
Ele levantou a mão e a deixou estendida na frente de Dina. Com
muita insegurança, ela estendeu a mão dela também, e os dois se
tocaram.
A mão de Bob era muito pesada, grossa, com dedos fortes. Dina
achou a mão dele muito bonita, mas afastou o toque rapidamente.
Ela se apressou em dizer que tinha que voltar para casa e Bob se
ofereceu para caminhar ao seu lado, acompanhando-a.
Dina olhava para frente o tempo todo, evitava olhar para Bob. Sim,
ele era muito bonito, mas Dina tinha medo daquele homem. Que
caíra de para quedas de algum lugar. De vez em quando ela olhava
para cima curiosa se perguntando se realmente havia possibilidade
dele ter mesmo caído de paraquedas.
Enquanto Bob pensava na maneira que iria matar Dina, fixava seu
olhar na garota o tempo todo. Ele não se importava que ela estivesse
se sentindo mal por estar sendo observada por ele.
Eles foram andando até a porta da casa de Dina, o que a fez ficar
muito aliviada por ele ter que ir embora.
- Bem, chegamos. Obrigada por me acompanhar ate aqui.
- Dinaaaaa, queridaaaaa. Cuidado ai em baixo. Gritou vó Augusta da
janela de Dina. – Estou limpando as janelas.
Bob olhou para cima e viu a velha com metade do corpo para fora da
janela. Um balde antigo feito de madeira, também estava no peitoral
da janela, cheio de água.
Quando Dina chegou mais perto para se despedir dele, Bob
pressentiu algo errado e olhou para cima novamente. Viu que vó
Augusta desequilibrou e deixou o balde cair lá de cima, da janela.
Com um rápido movimento ele avançou em direção a Dina
empurrando-a contra a parede, elevando a outra mão sobre a própria
cabeça, defendendo e impedindo que o balde, pesado, partisse a
cabeça dele em dois.
Luccar pode ver tudo de seu esconderijo, mas continuou no mesmo
lugar, observando que Ram tinha total controle da situação. Dina
ficou surpresa, com o rápido movimento de Bob e caminhou
lateralmente afastando-se da frente da porta.
- meu Deussss, vocês estão bemmmmm? perguntou vó Augusta lá de
cima, ainda na janela. – vou descer... Vocês se machucarammm ?
- Não vó... Está tudo bem aqui em baixo, o balde não caiu em cima
da gennnnnte. Respondeu Dina, com olhos arregalados voltados para
Bob.
O balde havia aberto um enorme ferimento no antebraço de Bob,
sim, aquele era um ferimento que podia ver o osso por baixo da pele
aberta.
Bob não fez absolutamente nenhuma expressão de dor. Dina se
aproximou e tirou sua camiseta revelando um belo top vermelho por
baixa dela.
Bob ficou desconfiado com a atitude de Dina, mas deixou que ela
continuasse o que estava fazendo. Dina colocou a sua camiseta em
cima do ferimento de Bob, na tentativa de estancar o sangue.
Bob observava com muita atenção a todos os movimentos de Dina,
incluindo para o seu tronco vestido somente com um TOP vermelho.
A barriga de Dina era reta como uma tábua, sem nenhuma ondulação
e sua cintura se assemelhava muito a imagem de um violão.
Dina não percebeu que Bob olhava para ela, ela estava totalmente
concentrada em seu ferimento.
- Vamos a um hospital. Esse ferimento está profundo.
- Não precisa, isso vai curar logo. Rebateu Bob, olhando para a
camiseta de Dina enrolada em seu braço.
- Você é louco ? Isso vai infeccionar.
- Você esta preocupada comigo ? perguntou Bob olhando
profundamente para Dina.
- Claro que estou. - O balde da minha casa caiu em cima de você. -
Você poderia ter morrido, o balde é muito pesado.
Bob apertou os lábios e deu um pequeno sorriso para Dina,
aproximando-se dela, pegou na sua mão.
- Eu agradeço muito a sua preocupação moça. Disse Bob beijando a
mão dela. – Eu devolverei a sua roupa em breve.
Naquele momento Dina não sentia mais medo daquele homem que
antes fez com que ela ficasse apavorada. Dina, apesar de muito
preocupada com o ferimento dele, não pode deixar de perceber que
ele era um homem bem educado. Lindo e educado.
- Xau Dina, a gente se vê.
- xau Bob, cuida disso ai.
Vó Augusta abriu a porta falando muito por causa da queda do balde.
Dina voltou-se para ela tentando acalmar, mas vó Agusta estava
muito preocupada.
- Calma vó, não aconteceu nada. Bob fez uma defesa samurai e o
balde não matou ninguém.
- Quem e Bob? perguntou Vó Augusta. – Não tem ninguém aqui alem
de você e eu.
Dina girou de volta para rua e, Bob não estava mais lá. Tinha sumido.
- Ele estava aqui, agorinha mesmo. Respondeu Dina. “É a segunda
vez que isso me acontece em menos de uma semana”. Pensou.
- Ele foi embora então? - Onde está sua camisa ? - Você não andou
nas ruas assim ?
- Não vó, como eu disse, Bob cortou o antebraço quando se defendeu
do balde e eu tirei a camisa para estancar o sangue. – Ele deve ter
isso ao hospital e prometeu que vai trazer minha camisa de volta.
- OH meu Deus, ele foi ao hospital ? - Eu gostaria de poder me
desculpar com ele querida. – Você sabe onde ele mora, vamos a casa
dele nos desculpar com os seus pais.
- Não foi nada de mais, ele nem reclamou do ferimento. – Eu não sei
onde ele mora vó. - Quando ele voltar, a senhora fala com ele.
- Espero que ele volte mesmo. – Vamos entrar querida, é hora do
lanche. Mais tarde teremos encontro na igreja.
Elas entraram com a porta fechando atrás delas.
***
Ram encontrou Luccar dentro da floresta. Eles se aproximaram e
Luccar olhava para Ram com um sorriso sarcástico. Enquanto Ram
soltava a camisa de Dina do seu braço, Luccar arremessava um cantil
com água de Santo Pedro na direção dele.
- O que foi aquilo, perguntou Luccar. – Pensei que você iria mata-la
na primeira oportunidade.
- Eu quis investigar ate onde ela sabia, respondeu Ram enquanto
derramava água de santo Pedro em cima do ferimento.
Em poucos segundos, como mágica, o ferimento começou a fechar.
As fibras da pele começaram a se aproximar como uma costura
invisível. A água de santo Pedro curou o ferimento de Ram.
- Por que não deixou que o balde caísse na cabeça dela
- Não pensei nisso, respondeu Ram com o ferimento totalmente
curado. – O balde foi mais rápido que eu.
- É uma garota bonita, não é mesmo? - Ela tirou a camisa só pra
ajudar você.
Ram ficou olhando para a camisa de Dina em suas mãos. Era macia e
estava suja com seu próprio sangue. Realmente a atitude da garota
mexeu com os pensamentos dele. Enrolando o tecido com as mãos,
Ram o guardou com cuidado no bolso e montou em Tobruk.
- Cale a boca, disse Ram se dirigindo a Lucaar. – Vamos voltar para
santo Pedro.
E os cavalos dispararam para dentro da floresta.
***
Dina estava terminando de se arrumar, ela havia combinado com
Anja que iria passar na casa dela para irem juntas ao encontro jovem
da igreja. Vó Augusta dessa vez iria ficar em casa. Quando estava
lavando a janela, se molhou um pouco e acabou pegando um
resfriado, o que era perigoso na idade dela.
- Querida, não se esqueça de perguntar onde os pais de Bob moram.
– Eu quero me desculpar por hoje.
- Tudo bem vovó. – Estou saindo, xauuuuu.
Dina passou pela porta apressadamente e seguiu rua abaixo. Anja
provavelmente estaria esperando por ela na porta de casa. Dina se
lembrou do endereço que conseguira mais cedo com Paulo, e
pretendia combinar com Anja, delas irem juntas na casa
desmoronada.
Caminhando a passos curtos, Dina observou uma pequena pedrinha
rolando na sua frente, ignorou e continuou andando. Mais uma
pedrinha rolando, e depois outra. Intrigada ela olhou na direção de
onde as pedras estavam sendo arremessadas e um belo rapaz estava
parado olhando para ela.
- Oi Ric, como eu não percebi você. Falou Dina intrigada, pensando
novamente nos paraquedas. – Estou indo encontrar Anja, desse vez
você vem comigo para ela ver você.
Ric pensou um pouco, e concluiu que não havia problema em
conhecer outra garota.
- Tudo bem Dina, vamos lá conhecer sua amiga anjo.
- É ANJA. – O nome dela é Angélica.
Ric deu de ombros concordando e seguiu junto com Dina até a casa
da amiga dela. Anja estava em pé balançando freneticamente a mão
no cabelo, esperando por ela.
- Está atrasada, acusou Anja. – trouxe meus pães de batata, certo?.
Enquanto Anja tomava fôlego antes de começar a tagarelar com
Dina, ficou absolutamente imóvel. Ric saía por trás de Dina
encostando-se na mureta de entrada da porta. Cruzando os braços na
frente do peito, deu boa noite a Anja. Calada, olhou Ric da cabeça até
os pés.
Era um homem lindo, encostado olhando para ela, com aqueles olhos
verdes....
- MARAVILHOSOS.
- O que ? Perguntaram os dois juntos olhando em direção à Anja.
- Nada. – Eu disse que está na hora, o encontro vai começar em
quarenta minutos.
Se aproximando da amiga, Anja deu um sorriso torto para Ric e
arrastou Dina para um ângulo distante o suficiente para que ela
pudesse euforicamente falar.
- Onde foi que você encontrou esse gato? Aqueles olhos são
realmente de verdade?
- Esse é o cara que falei naquela noite, lembra? - Quando eu disse
que havia machucado meu joelho.
- Ta bom, só esqueceu de mencionar que ele é lindo. – Será que ele
tem um irmão?
Ric podia ouvir tudo o que as meninas estavam falando. Deus alguns
passos mais perto e mexeu com elas.
- Eu posso ouvir vocês, sabiam ?
No mesmo instante elas pararam de cochichar e posicionaram em
frente a ele.
- Eu só estava dizendo a Anja que eu conheci você outro dia. – Ela
mora aqui na cidade dede que nasceu e parecer não lhe conhecer.
Ric ficou calado alguns segundos pensando numa reposta convincente
quando um grupo de jovens que ia para o encontro na igreja, passou
pela porta da casa de Anja. Dentre eles estavam Lorena e Adan.
No mesmo momento Dina e Anja esquecerem completamente de Ric
e direcionaram toda sua atenção para Lorena.
- Olha só quem está ali parada na porta... A órfã. Debochou Lorena
para Adan.
- Olha só quem está passando, respondeu Dina. – A princesa vaca da
turma.
- Não fale desse jeito Dina, é feio ofender as pessoas.
- Só se a vaca estivesse aqui.
Anja olhou para Dina com expressão seria, mas rapidamente girou a
cabeça para Lorena.
- quem você chamou de vaca ?
- quem você chamou de órfã ?
Adan começou a rir baixinho com as replicas entre as duas e Lorena
deu uma leve cotovelada em seu ombro. Então ele se recompôs e
estreitou as vistas para Dina e Anja.
Ric não pode deixar de notar que Adan iria comprar a briga de
Lorena. Avançando um passo colocou-se na frente de Adan.
- Eu não acho legal um homem grandinho como você se meter em
conversas de meninas.
- Você acha é, eu não ligo a mínima para o que você acha.
Foi a vez de Adan se aproximar de Ric.
- receio que se você insistir em se meter com elas eu vou, ter que me
meter com você.
- Estou morrendo de Medo cara.
- Calma Ric. Disse Dina segurando seu braço. –Ele é um idiota,
vamos embora.
Adan então partiu para cima de Dina puxando-a com agressividade
para fora da varanda da casa de Anja.
- Quem é idiota ?
O puxão foi tão forte que ela tropeçou duas vezes antes de cair sobre
suas mãos e joelhos. Os outros garotos da turma de Lorena
começaram a rir de Dina fazendo com que ela fizesse cara de choro.
Quando Adan tentou se aproximar novamente sentiu uma mão
segurando seu ombro impedindo mais um passo e no segundo que
ele virou a cabeça, foi atingido no queixo por um soco de Ric.
- Eu não gosto de covardia. – Que tal alguém do seu tamanho, ou um
pouco maior?
O golpe foi tão forte que Adan cambaleou, mas Ric não o deixou cair
no chão, torcendo o braço de Adan até que ele gritasse de dor.
- Agora peça desculpas a ela.
- Não precisa Ric, já passou. Implorou Dina.
- Sim, precisa sim. – PEÇA DESCULPA. – AGORA.
Adan ajoelhado aos pés de Ric, uma mão no chão o outro braço
sendo torcido com um golpe de arte marcial não consegui falar nada
que fosse diferente de um chiado de dor.
- Pare Ric, por favor. – Você vai quebrar o braço dele.
- que seja então.
- PARE. Gritou Dina. – PARE AGORA OU NÃO VOU MAIS FALAR COM
VOCÊ.
Ric soltou Adan com tanta força que ele caiu de nariz sobre o chão de
terra batida. Lorena correu em direção ao corpo de Adan caído,
ajudando-o levantar. A expressão frustrada causada pelo golpe de
Ric, fez com que ele se mantivesse de cabeça baixa.
- Tire a mão de mim Lorena. Eu posso muito bem me levantar
sozinho.
O restante do grupo que os acompanhava foi se dispersando
vagarosamente em silêncio, Deixando para trás apenas Lorena e
Adan. Dina com as mãos em frente a boca, tentando sufocar o choro
olhou para Ric aterrorizada com que ele tinha feito. Anja se manteve
imóvel o tempo todo, parecendo não acreditar na situação, aquele
homem lindo também era muito forte.
Adan levantou a cabeça e fixou olhar em Dina e Ric.
- vocês um dia vão pagar por isso.
- Espero que esteja satisfeita, sua órfã vingativa. Gritou Lorena –
Covardes precisam de guarda-costas.
Virando as costas para Anja seguiu logo atrás de Adan que segurava
o braço torcido com a outra mão.
- Por que você fez isso com ele. - Podia ter quebrado o braço dele.
- Ele iria ti machucar, eu defendi você dele.
- Bem... Dina... Vou entrar enquanto vocês discutem de quem é a
culpa. Sussurrou Anja girando nos calcanhares seguindo para dentro
da sua casa.
- Mas não precisava ter feito aquilo. Que tipo de pessoa é você ?
Ric se aproximou de Dina e olhou bem dentro dos olhos dela.
- Sou do tipo que sobrevivi.
- É melhor você ir embora, estou atrasada para o encontro jovem na
igreja. Dina sussurrou com a cabeça baixa. – Nós podemos conversar
outro dia. – Amanha.
Ric pareceu concordar com ela, mas continuou calado. Dando um
passo para encurtar a distancia, esticou a boca na direção dos lábios
Dina, mas ela virou seu o rosto.
- Xau Ric.
Cerrando os punhos ele apenas deu as costas e andou em direção à
entrada da trilha que seguia para a floresta. No mesmo tempo Dina
entrou na casa a fim de encontrar com Anja.
Tomado de ódio Ric socava todas as arvores que estavam pela frente.
Nem Céu parecia estar por perto naquele momento. Sangrando pelos
anéis dos punhos ele não parecia se importar, continuando a bater
mais forte a cada tronco que surgia na sua frente.
Quando já estava bem longe da cidade, floresta à dentro. Ric parou
de andar e sentou numa pedra, olhando para a paisagem escura que
o cercava puxou um cantil cheio com água de santo Pedro. Bebeu um
gole e jogou o restante nos punhos sangrando. À medida que a água
caia o ferimento parava de sangrar e as suas mãos ficaram
completamente curadas.
Saindo da casa de Anja, Dina ainda estava muito abalada com a briga
de Ric e Adan. As meninas caminharam juntas a passos
sincronizados.
- Ei Dina, onde você achou esse guerreiro ninja?
- Eu o conheci na noite que machuquei meu joelho. – E você não
acreditou, lembra?
- Tá certo, agora eu acredito. Mas me conte como o conheceu. – Que
força. – Que olhos. – Que lindo.
- Ei calma ai, eu vi primeiro. – Digo ele, me achou primeiro. – Não sei
de onde nem como ele apareceu, mas na noite que eu saí do
psicólogo eu levei um tombo feio e cortei meu joelho. – Ric
simplesmente apareceu do nada me oferecendo ajuda.
- Apareceu do nada como ? - Com mágica, Como um fantasma ?
Um arrepio subiu pela coluna de Dina quando Anja falou aquela
palavra. Fantasmas eram muito comuns na infância de Dina. Foi uma
época tensa que e graças a Deus tinha passado.
- Não acho que ele seja um fantasma, ainda mais com aqueles olhos
verdes.
As duas garotas começaram a rir.
- Viu como ele defendeu você ? - Ele gosta de você.
- Parece que sim. – E eu o mandei embora.
- você não fez isso, fez?
- Fiz sim, eu não sabia o que fazer... Ai ele chegou mais perto, eu
achei que ele iria me beijar de novo e, eu dei XAU pra ele.
- Beijar de novo? - Ele já beijou você antes?
- Errr beijou.
- E você não me conta uma coisa dessas. – Como pode esconder isso
de mim.
- Eu ia contar pra você, só não tive tempo. – Eu estava pensando que
seria mais interessante contar a você outra coisa.
- O que pode ser mais interessante que um beijo daquele homem
lindo?
- O endereço da casa desmoronada, por exemplo. – Eu consegui.
Anja ficou calada por apenas um segundo, mas continuou a andar. As
duas tagarelaram até a entrada da igreja. O Encontro jovem havia
começado há alguns minutos antes, então elas se apressaram.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Os pensamentos de Ric
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Continuei a caminhar sozinho ignorando completamente os
chamados de Céu que me seguia um pouco mais distante, sabendo
perfeitamente que quando eu estou nervoso, não gosto que fiquem
ao meu lado.
Depois que a água curou meus ferimentos, após ter socado cada
arvore que aparecia na minha frente, eu fiquei pensando no que
havia feito. Longos anos longe da sociedade me transformaram em
um homem perigoso.
Como pude ter perdido a cabeça. Como pude me expor na frente de
todas aquelas pessoas, na frente de Dina.
O que ela está pensando sobre mim agora. Eu não posso perdê-la, eu
não posso ficar longe dela. Eu me sinto sufocado, quando penso que
ela não vai querer me ver nunca mais. O cheiro do cabelo dela ainda
está presente nos meus pensamentos ainda posso senti-los entre
meus dedos.
Desde que mamãe morreu, nunca mais tive contato com outra
pessoa como eu tenho com Dina.
[Flashback]
A vida com meu pai em santo Pedro não era a vida que eu queria ter
tido. Todos os dias antes do café da manha nós tínhamos que treinar
duro, muito mais forte que o treinamento que tínhamos quando
morávamos fora da floresta, na cidade.
Mamãe já não possuía o mesmo sorriso, estava sempre com o
semblante triste dia após dia. À medida que o tempo passava, meu pai
parecia ficar cada vez mais louco e Ram estava ficando mais forte que
eu ou Edie juntos.
Ram já não falava comigo da mesma forma como ele falava na antiga
casa. Mesmo com nossas brigas diárias, por causa das besteiras que eu
fazia, ele sempre se aproximava, mas desde que papai prometeu dar
sua espada para um único filho, Ram decidiu que a espada tinha que
ser dele.
Minha mãe fazia de tudo juntar a gente, mas ela não conseguia de jeito
nenhum. Eu e meus outros dois irmãos, estávamos ficando distantes
um do outro. Nada podia reunir a família.
Meu pai era muito arbitrário. Obrigava todo mundo a beber da água de
santo Pedro, apesar dele odiar esse nome. Minha mãe foi a única pessoa
que ele não forçou a beber, mas eu acho que ele deveria ter forçado.
Talvez se ela tivesse bebido da água de santo Pedro, ela ainda
estivesse viva, e aqui comigo.
Talvez com minha mãe ao meu lado eu saberia como tratar melhor
Dina. Ela merece que eu a trate bem. Ela merece que eu a trate com
amor. Mas eu não sei amar, eu não sei estar com uma garota.
A única coisa que eu aprendi foi lutar e sobreviver nessa floresta
maldita, a qual eu estou condenado a ficar até minha morte.
Eu preciso vê-la, eu preciso estar com ela. Tenho que fazê-la me
perdoar, mas eu não sei como vou fazer. Eu não sei como falar com
ela, eu não sei como dizer a ela para não se afastar de mim.
Dina me olhou como se tivesse medo de mim. Eu não quero que ela
tenha medo de mim. Eu sei como é ter medo de alguém, eu tive
medo do meu pai, todos os dias que morávamos em santo Pedro.
Ele me obrigava a beber da água todos os dias. Ele forçava Edie a beber
também, só Ram não era forçado a beber da água, só Ram era o único
que não mostrava medo pelo meu pai. Teve momentos que mamãe
aparentava estar com medo dele também.
Ter medo é uma condição insuportável quando eu era criança, a cada
olhar e a cada passo que meu pai dava perto de mim, um arrepio
pavoroso subia pelas minhas costas.
Quando não estava satisfeito, meu pai nos cortava de propósito só pra
ver a água curando de volta. Apesar de a cura ser imediata, a dor que
sentíamos com o aço da espada dele era insuportavelmente de morrer.
Antes de chegar ao acampamento preciso esfriar minha cabeça e o
lago parece ser uma boa ideia. Não imagino alguém do clã de Ram
vindo aqui há essa hora. Edie provavelmente deve estar preocupado
comigo, mas eu não estou com paciência para ouvi-lo reclamar sobre
onde eu estive, ou o que eu fiz com aquele cara.
O lago está calmo e a temperatura da água está agradável. Na pedra
grande, ali pertinho da margem parece um bom lugar para deixar
minhas roupas. Uma das coisas que eu mais gosto aqui nesta floresta
maldita é o banho no lago.
Nadar sob a luz da lua, absolutamente nu, seria uma coisa que faria
meu pai me bater durante uma semana inteira. Mas ele está morto e
os mortos não batem em ninguém.
Eu poderia trazer Dina para conhecer o lago, pode ser que ela me
perdoe. Quem sabe ela até nade comigo. Isso me parece uma boa
ideia. Nadar com Dina aqui seria maravilhoso. Está de decidido, vou
trazê-la aqui.
QUE BARULHO FOI ESSE.... Melhor eu mergulhar e pegar minhas
roupas. Minha espada está aqui, vou desembainha-la devagar, sem
ruído.
AHHHHHH Céu... É apenas você. Eu podia ter machucado você, meu
amigo.
Nadar aqui e pensar em Dina me acalmou bastante, mas ainda não
estou satisfeito com o que aconteceu. Melhor voltar para o
acampamento ou Edie vai me torturar o resto da noite. Se eu chegar
em silencio talvez ele não perceba que eu cheguei.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Fantasmas do passado
9
- Te vejo depois do almoço então, tenho que fazer algumas
anotações sobre a festa do solstício. – Por que você não se oferece
para organizar junto comigo?
- Eu não sou muito boa para organizar festas Anja, eu acabei de
chegar na cidade, lembra? - Não esquece que você prometeu ir
comigo ver a casa desmoronada.
- Como poderia esquecer Dina. – Você comenta comigo a cada cinco
minutos.
- Certo.
Elas saíram da escola juntas abraçadas aos seus cadernos. Estavam
tão alegres com os assuntos da festa e da casa desmoronada que
esqueceram completamente de Lorena e Adan.
- Ei Dina, reparou como Lorena ficou calada durante toda a aula. –
Adan não apareceu na escola hoje, matou aula.
- Você tinha que me lembrar disso. – Agora acabou com o resto da
minha manhã.
Dina preferia não ter lembrado do que aconteceu na noite passada. A
lembrança de Ric quase quebrando o braço de Adan a deixava com
estomago embrulhado. Nunca tinha presenciado uma briga quando
morava na cidade grande e em menos de quinze dias morando na
pequena cidade ela havia brigado com Lorena na porta da escola e
visto Adan brigar com Ric na porta da casa de Anja.
- Vou entrar, Disse Anja mergulhando para dentro de casa. – Mais
tarde eu apareço na sua casa.
- Vou esperar.
Enquanto Dina seguia rua a cima para sua casa, Anja emergiu da
porta da casa dela e ficou observando a rua. Estava tudo calmo, mas
Anja tinha a impressão de que alguém estava vigiando.
Lucaar estava observando Anja a uma boa distancia sem que ela
pudesse vê-lo. Desta vez ele não saiu da floresta acompanhando
Ram, um impulso que nem mesmo ele podia compreender fez com
que uma imensa vontade de ver Anja surgisse em sua mente.
Anja não viu nada, estalou os lábios e entrou batendo a porta atrás
dela.
- Oi Vó, cheguei. Falou Dina entrando em casa como o próprio
furação Katrina.
- Você conseguiu descobrir quem são os pais daquele rapaz querida?
Dina sequer tinha perguntado a alguém sobre os pais de Bob.
- Não vó, ninguém conhecia os pais dele. - Não se preocupe, noticia
ruim chega rapidinho.
- Você esta com fome? - Eu preparei bife com batatas fritas.
- Obaaaa, em alguns minutos estarei ai em baixo.
Dina havia acabado de sair do banho, ainda estava com seus cabelos
molhados, mas não se importando em molhar as suas roupas vestiu
um shortinho jeans combinando com uma bonita blusa branca com
um cavalo estampado na frente.
O cavalo estampado na blusa era de um tom acinzentado e os olhos
estavam ornamentados com paetês azuis. Sua mãe deu a ela de
presente e Dina adorava aquela blusa.
Calçando tênis cano baixo, Dina correu em direção as escadas que
levavam ao primeiro andar da casa. Parando na frente da escada ela
olhou para baixo e com um sorriso audacioso, saltou à escada
aterrissando na metade dela, entre os degraus. Ainda sorrindo para si
mesma, outro salto e estava no andar de baixo.
Vó Augusta ouviu o barulho da aterrissagem de Dina na sala.
- Querida, você está bem? - Você caiu?
- To bem vó. – Onde estão as batatas fritas.
Embora a refeição não ter durado muito tempo, as duas
permaneceram sentadas conversando. Relembraram o tempo que os
pais de Dina eram mais jovens. Eles se conheceram ali na mesma
cidade.
A mãe de Dina era filha de costureira. Mãe solteira que trabalhava
muitas horas na frente da máquina só para poder ter o que comer
todos os dias. A conversa sobre o passado dos pais de Dina
aproximava as duas, neta e avó. Entretanto, Dina não parava de
espiar o relógio. Anja provavelmente bateria na porta a qualquer
momento.
Dina estava fascinada com a ideia de conhecer o local onde a casa da
havia desmoronado, onde a família com três filhos havia sido
soterrada viva. Depois de anos como estariam os escombros com
ação do tempo. Tudo isso era uma duvida para Dina.
Vó Augusta ouve uma batida na porta. Junto à impaciência de Anja
por trás dela. Não se sentindo ofendida pela atitude da adolescente,
dá espaço para ele entrar com sorriso nos lábios marcados com as
linhas da idade.
- entre querida, Diana está na cozinha.
Anja deslizou da porta de entrada até a porta da cozinha para ver
Dina absorta em seus pensamentos.
- Dina, vamos ou não ver a casa?
- shhhhh, fale baixo, minha vó proibiu de ir lá. – Vamos dizer que
vamos a biblioteca.
- Você sabe que eu não gosto de mentir.
- Não vamos mentir. – Realmente vamos a biblioteca.
- Fazer o que?
- Na volta, quero pesquisar sobre as pessoas que moravam lá, deve
ter alguma coisa que possa dar mais informações.
As duas seguiram para fora da casa e Dina retirou da sua mochila o
papel com endereço que Paulo havia lhe dado na ultima sessão. Elas
desceram ruas e subiram ruas até pararem na porta de um moinho
velho.
- Tem certeza que você sabe onde fica esse endereço. Perguntou
Dina enquanto secava o suor da testa com a gola da camisa.
- Claro que tenho, é no final daquela rua de terra ali. – Minha mãe
não quis ajudar. - Enrolou para me falar onde era a casa, mas deixou
escapar que ficava logo depois do velho moinho.
- Se sua mãe tivesse dito onde ficava a casa, me pouparia tempo e
eu não teria que ter prometido um desenho para o doutor Paulo.
- Quem é esse Paulo?
- O psicólogo da cidade ué. – Você mora aqui há mais tempo que eu
e não sabe.
- O único psicólogo da cidade é o doutor Cipriano. - Não sei quem é
Paulo. – Será que ele se aposentou?
- Não importa, vamos logo com isso.
Dina seguiu Anja e as duas subiram a rua de terra. Foi uma
caminhada longa de 15 minutos a passos cansados.
- Será que estamos chegando? - Eu não aguento mais caminhar.
- Não vim até aqui para desistir agora que estou tão perto Anja. –
Estamos quase no final do morro.
- Se eu soubesse que essa rua levava na subida de um morro, teria
calçado um tênis mais confortável. – Essas sandálias estão me
matando, meus pés estão imundos.
Quando chegaram lá em cima avistaram um grande portão de ferro
todo enferrujado. Compondo o portão o muro ainda cercava toda a
propriedade. Velho e com vegetação grudada nele, não se podia ver o
que realmente o muro cercava. Dina e Anja espicharam os olhos em
todas as direções admirando a imensidade que era aquilo tudo. De
um lado a descida do morro que terminava na cidade, do outro lado a
floresta quase encostando na lateral do muro.
Elas se aproximaram do grande portão e Anja observou uma letra
entalhada nele. Apesar de todo aquele ferrugem proveniente da ação
da chuva e outros fatores do tempo podia-se ler muito bem a letra B.
- O que deve ser esse B? perguntou Anja tirando pedrinhas que
entraram em sua sandália.
- Acho que deve ser a inicial de barão.
- O que?
- BARÃO. – O dono disso tudo aqui não se chamava barão?
- É pode ser. – Como vamos entrar agora.
- Pelo portão. Ou você acha que alguém se lembrou de trancar depois
que foi embora. – Depois que sepultou toda uma família.
Anja deu com ombros e abriu espaço para que Dina avançasse na sua
frente. Colocando a mão na maçaneta, deu um leve giro e empurrou
de vagar fazendo o portão ceder. Caindo do lado de dentro da
propriedade fez um enorme estrondo e os pássaros levantaram voo.
As duas levaram um baita susto e giraram suas cabeças em todas as
direções pra ver se alguém havia escutado o barulho da queda do
portão.
- Mas que merda Dina.
- Ei, olha o palavreado. – É você quem diz que não devo usar certas
palavras.
- Desculpa, mas não tinha como eu ficar calada. – Você destruiu o
portão, e agora?
- Quem vai reclamar com a gente ?
- Não tinha pensado nisso.
– Vamos entrar logo antes que você se arrependa.
- Merda, já me arrependi.
- Olha a boca suja.
A duas meninas seguiram para dentro rindo uma da outra. O portão
ficou lá no chão. Estava longe, mas elas puderam ver onde era à
entrada da casa. Logo depois da entrada do portão podia-se imaginar
o que antes havia sido um jardim frontal, no chão uma passadeira
feita de pedras achatadas pareciam um grande tapete cinza que
levavam até a entrada principal da casa. Nas laterais podia notar que
na época o local era destinado às baias dos cavalos.
A propriedade não parecia ser uma fazenda, nem mesmo chegava
perto de ser um sitio. Mas, era muito grande o espaço físico do lado
de fora da casa. Tão grande que cavalos podiam caminhar soltos. À
medida que elas se aproximavam da casa uma imagem triste tomou
conta do campo de visão de Anja e Dina. Os escombros da casa já
eram possíveis de ver.
Dina ficou parada ali na frente olhando tudo que estava em volta.
Anja caminhava de um lado para outro não sabendo onde colocar o
pé para firmar-se parada. Dina viu os restos de degraus de uma
escada que levava ao andar de cima, embora estivesse destruído
ainda restava uma laje onde se podia andar. Olhando mais para a
direita pode ver em baixo de uma coluna uma poltrona ou o que
parecia ser uma poltrona, por causa do resto de tecido junto com
madeira podre.
Plantas cresciam por entre os tijolos e telhas quebrados espalhados
pelo chão. Uma ou duas paredes ainda sobreviveram em pé, ou o que
sobrou delas. O escombro estava misturado á mobilha velha de
madeira estragada e acessórios que adornavam a casa. Até louça
podia ser reconhecida no chão.
Molduras quebradas também estavam espalhadas por toda parte. A
família tinha muitos quadros e perdeu tudo. Em meio a todo aquele
passado destruído, Dina e Anja caminharam para dentro pulando
cada pedra, cada tijolo e cada móvel quebrado. Passo a passo
conseguiram chegar num cômodo que foi reconhecido imediatamente
como a cozinha da casa.
O forno artesanal, não havia sido destruído. Construído com pedra e
argila parecia ser a única coisa que restou em pé.
- Meu Deus. Falou Anja fazendo sinal da cruz. – Realmente não tinha
como alguém sobreviver a esse desmoronamento.
- Eu fico imaginando se eles morreram na hora ou ficaram
agonizando algum tempo. – As crianças e a baronesa estavam na
casa. – Minha avó disse que o barão morreu um pouco depois
tentando ajudar.
- Venha Anja. – Vamos tentar ir lá em cima.
- Ficou louca, não tem nada lá em cima. – Só um resto de escada e
uma laje que pode desabar a qualquer momento.
- Se você não quiser eu vou sozinha. – Lá deveriam ser os quartos. –
Eu gostaria de ver.
- Eu não vou mesmo. – Irei ficar observando você daqui de baixo. –
Se acontecer alguma coisa eu dou cobertura. – Alguém terá que
buscar por socorro.
Dina transpôs os escombros até chegar na base da escada.
- Essa eu não vou poder subir correndo. Falou baixinho em tom que
Anja não pode perceber.
- tenha cuidado, por favor. Disse Anja com as mãos agarradas ao
crucifixo, baixinho sem que Dina pudesse ouvir.
Dina colocou o pé no primeiro degrau e nada aconteceu. Tomou
coragem e colocou o outro, e mais um, e mais um. Quando estava no
ultimo degrau antes de pisar no andar superior viu um objeto
brilhando em baixo de uma tábua apodrecida. Escorregou a mão por
baixo da tabua e suspendeu um cordão dourado e um pingente com
um pequeno retrato.
Era a fotografia da baronesa com uma criança no colo. Dina ficou
alguns segundos olhando a foto enquanto deu mais um passo para
estar completamente no segundo andar da casa. Sentindo um
estranho pressentimento, recuou de imediato de volta a escada. No
mesmo instante tudo o que sobrou do segundo andar da casa
começou a desabar. Mais que depressa Dina desceu o restante dos
degraus como descia em sua casa. Anja lá de baixo gritou o mais alto
que pode.
- Dina cuidadoooooo.
Dina parecendo um gato conseguiu passar pelo ultimo degrau com
um salto aterrissando próximo ao caminho que levava de volta a
cozinha. Agarrando Anja pela mão as duas ficaram olhando a laje
desabar.
- Não caiu completamente, veja. – Foi só aquela parte onde você
pisou.
- É depois da escada está um buraco. – Não tem como eu passar por
ali.
Anja virou-se assustada para Dina.
- Você não pretende voltar ali, certo?
- Bem, acho que agora que você comentou, não pretendo mais ir lá
mesmo.
- O que é isso na sua mão? Perguntou Anja olhando para o cordão
enrolado na mão de Dina.
- Eu achei lá em cima antes de começar a cair. – Acho que é ouro
puro. – É bem pesadinho e tem uma foto da baronesa aqui no
pingente.
Anja verificou o cordão e viu que atrás do pingente tinha um brasão
com a letra B entalhada. A imagem da letra era muito parecida com a
imagem que elas virão no portão de ferro caído na entrada da
propriedade.
- Você não vai ficar com isso Dina. – Você não pode ficar com isso.
- Claro que eu não vou ficar com o cordão. – Minha avó disse que
tem um cemitério aqui na casa, onde a família foi enterrada.
- Sim e daí. Perguntou Anja.
- Daí que eu pretendo deixar esse cordão lá.
Anja pareceu não acreditar nas palavras de Dina e começou a
tagarelar gesticulando com os braços.
- Dina, você é maluca. – Até ai eu sei, mas pegar um cordão e ir
atrás de um cemitério é um pouco de mais, até pra você.
- Não faz drama Anja. – Vamos lá, por favor. - Chegamos até aqui. –
Agora vamos explorar tudo.
Anja assentiu e depois balançou a cabeça inúmeras vezes até que
elas duas estava do lado de fora, nos fundos da casa desmoronada.
Seguiram andando à procura do cemitério onde a família teria sido
enterrada pelos empregados da casa.
- Como vamos achar ? - Aqui é muito grande. – Pode estar em
qualquer lugar. Resmungou Anja.
- Vovó disse que estava perto da floresta, ou algo parecido. – Então é
lá que devemos começar a procurar.
Elas perambularam pelos fundos da propriedade a fim de achar o
cemitério. Dina estava determinada. Anja estava completamente fora
de sintonia. Caminhando cada vez mais distante da entrada da
propriedade, elas se aproximaram dos arredores da floresta. Onde
não existia muro dividindo as terras. A vegetação da floresta estava
praticamente invadindo a propriedade. Já não se podia definir onde
era floresta e onde era propriedade da casa.
Em meio a alguns arbustos Dina conseguiu visualizar algo muito
parecido com uma lapide. Estava coberta com musgo ou alguma
outra planta que ela não sabia qual era. Mas a única certeza que ela
tinha era que havia achado o cemitério.
- Ali. – Achamos.
- Onde?
- Ali atrás daqueles galhos. – Vamos lá Anja. – Corra.
Dina começou a correr em direção ao cemitério, Anja seguiu logo
atrás com passos mais cautelosos. Dina e Anja pararam em frente da
lápide. Ficaram em silencio alguns instantes até que Dina girou a
cabeça ao redor percebendo outras lápides.
- Cinco túmulos. – Cinco pessoas enterradas aqui. Contou Dina,
- O barão, a baronesa e os três filhos. Acrescentou Anja.
- Ótimo, me ajude a identificar qual é o tumulo da baronesa. – Vou
colocar o cordão sobre ele.
As garotas começaram a arrancar os galhos e plantas com as
próprias mãos. Insetos começaram a sair das raízes à medida que
elas retiravam toda a vegetação que crescia sobre as lápides.
Dina, com as mão cordadas por causa das plantas, abaixou a cabeça
na base de uma lápide. Começou a retirar a folhagem de baixo para
cima e pode perceber que havia um epitáfio. Na placa estava escrito
apenas o nome de uma pessoa, possivelmente de um dos membros
da família. Dina passou a mão por cima da placa para comprovar que
talvez o nome escrito pudesse ser da baronesa.
Enquanto Anja com medo dos insetos, limpava outra lápide ao lado
de forma mais lenta com todo cuidado para que nenhum deles
pulasse em seu cabelo.
À medida que Dina limpava a placa conseguia ver letra após letra, e
quando aplaca ficou completamente limpa ela viu que era o nome de
um homem que estava escrito nela.
Seu coração começou a bater mais acelerado, ela ficou totalmente
amedrontada e confusa Quando leu o nome. E foi ali que Dina caiu
sentada, parecendo não acreditar nas letras que formavam aquele
nome.
- Richard Baleares. – Não pode ser. Sussurrou baixinho.
Subitamente, Dina se levantou e saiu correndo para longe do
cemitério, passando por Anja que, sem entender nada correu atrás de
Dina.
Com os pensamentos confusos e uma lembrança do passado, Dina
parou, sem fôlego, próximo a um tronco de arvore seco, caído no
chão.
Anja conseguindo alcançar Dina, parecendo um pimentão vermelho
por causa da corrida.
- Dina o que ouve? Perguntou Anja com suas bochechas
avermelhadas.
Dina sentou-se no chão de costas viradas para o tronco. Com seu
corpo todo tremendo ela abraçou seus joelhos, afundou a cabeça
entre eles e começou a chorar. Tudo o que vinha na sua mente eram
duas imagens.
O nome na lápide: RICHARD BALEARES e Ric se apresentando na
noite em que se beijaram pela primeira vez.
... Eu me chamo Richard Baleares, muito prazer...
Anja ainda não estava entendendo a reação de Dina encolhida no
chão.
- Dina, me diz o que houve. – O que aconteceu? - Você se cortou com
um galho seco? - Algum inseto lhe mordeu?
Com os lábios trêmulos e a boca completamente seca Dina se
esforçou ao máximo para tentar explicar à amiga o que estava
acontecendo.
- Ele é um fantasma Angélica. – É um espírito. – Isso não pode estar
acontecendo comigo novamente. – Não quando meus pais não estão
por perto para me ajudar.
Anja com os pelos da nuca arrepiados levantou a cabeça achando
esquisito o que a amiga estava revelando e com as mão na cintura
perguntou impertinentemente.
- Quem é fantasma ? - Sobre o que você esta falando ?
Dina enxugou as lagrimas com as mãos sujas e tentou explicar
melhor à Anja.
- Anja, Ric é um fantasma. – Eu vi o nome dele escrito na placa de
epitáfio da lápide. RICHARD BALEARES.
- Mas o que exatamente Ric tem haver com esse Richard?
- Anja acorda. – o nome do Ric é RIHARD BALEARES. – São a mesma
pessoa.
Anja pensou um momento, coçou a cabeça e respondeu à amiga.
- Pensou na possibilidade de um homônimo? - isso acontece muito.
- Anja ele é um fantasma. – Acredite. – Quando eu era criança eu
podia ver espíritos por ai, você não se lembra?
- Sim, claro que eu me lembro sim. – Você até viu o fantasma do
falecido da sapataria, ficamos com medo de sair na rua um bom
tempo e... – Pera ai... AGORA EU ESTOU COM MEDO. – Ric é um
fannnnntasma.
- É que eu estou tentando lhe dizer faz cinco minutos.
- VAMOS SAIR DAQUI DINA. – Esse lugar é amaldiçoado. – VAMOS
LOGO, ANDA.
- Mas e o cordão? - Eu ainda não...
- DEIXA ESSA DROGA PRA LÁ. – Vamos embora. – Você quase
morreu no desabamento a pouco lá na casa e agora viu a lápide de
um fantasma. – Isso é um aviso de Deus. – Vamos.
Enquanto Dina se levantava, Anja começou a correr. Em pouco tempo
as duas estavam alcançando o grande portão de ferro caído no chão.
Sem olhar para trás elas saltaram sobre o portão como um cavalo de
equitação salta o obstáculo na prova.
Elas só pararam de correr quando a inclinação da ladeira de terra
tornou-se perigosa. Uma queda lá de cima não faria bem a saúde de
nenhuma das duas. Já estava quase anoitecendo quando as duas
estavam no centro da pequena cidade novamente.
- E agora o que faremos? Perguntou Anja.
- Não sei de você. – Eu vou continuar caminhando, por que não
aguento mais correr. – Acho que nenhum fantasma vai perseguir a
gente agora.
- Eu sei muito bem para onde vou. Afirmou Anja.
- Onde?
- Para a igreja. – Onde mais?
- Anja o que especificamente você vai fazer na igreja? Perguntou
Dina olhando para Anja.
- Eu vou orar pela alma de Ric ou Richard seja lá quem ele seja. –
Não quero um fantasma puxando meu pé por ter violado seu leito de
morte. – Muito menos enquanto eu durmo.
- Melhor não comentar isso com ninguém Anja. – Não queremos fazer
alarde e não queremos que as pessoas nos chamem de loucas.
- certo, vou orar em pensamento. – Xau Dina, nos vemos amanha. –
Vá pra casa, não fique na rua.
- Como se eu tivesse com quem ficar na rua. Dina resmungou
baixinho enquanto Anja andava depressa em direção à igreja.
Dina se dirigiu a passos rápidos em direção a sua casa, ao contrario
de Anja muito cautelosa e zelosa, Dina não parava de penar no nome
da lapide. RICHARD BALEARES.
Quando Anja estava quase na porta de igreja reparou um vulto
escuro na construção que ficava mesma rua, um pouco mais adiante.
Anja estremeceu quando o vulto se movimentou em direção a ela. A
menina de cabelos louros congelou ali mesmo.
À medida que o vulto se aproximava, a forma de uma figura
masculina surgia e a cada passo mais próximo, um homem vestido
de preto desde os calçados até a blusa gola V, aparecia diante de
Anja.
- Boa noite moça? Cumprimentou Luccar
Anja permaneceu congelada, muda.
- Desculpe se eu lhe assustei. – Não era minha intenção.
Respirando fundo e levando as mãos por entre as mechas louras
assentando os fios rebeldes. Anja conseguiu soltar uma palavra.
- Oi.
- Você está tão assustada assim por minha causa?
Um pouco mais relaxada, a loura conseguiu falar com o estranho.
- Na verdade eu estava muito assustada mesmo. – Ainda estou. –
Não queria ver um fantasma, digo espírito ahhhh deixa pra lá.
- Fantasma? - Espírito? Perguntou Lucaar intrigado com a beleza da
garota.
Anja não estava tão arrumada e suas sandálias estavam muito sujas
por causa da caminhada sobre terra com Dina até a casa
desmoronada.
Mas Lucaar fixou sua atenção nas madeixas louras quase cacheadas
que escorriam até a metade das costas dela. A pele branca queimada
de sol combinava com os olhos cor de mel que Anja exibia em seu
rosto.
- Desculpe, mas eu não tenho tempo agora. - Preciso urgentemente
rezar por uma pobre alma. Falou Anja em tom de desabafo.
- Tudo bem eu não pretendo atrasar a senhorita. – A propósito.
Acrescentou Luccar.
- O que? Perguntou Anja olhando para ele enquanto subia o primeiro
degrau da igreja.
- Reze também pela minha alma moça.
Anja ficou parada olhando para o rapaz que virou em direção a
escuridão da rua e caminhou até que ela não pudesse mais vê-lo.
Soltando um suspiro profundo ela virou em direção à porta da igreja
e mergulhou para dentro.
Enquanto Anja já estava segura dentro da igreja, Dina ainda
perambulava pelas ruas. Estava tão desavisada que tomou o caminho
mais longo até sua casa. Ela caminhava numa calçada com
praticamente nenhuma iluminação. Beirando a calçada a escuridão da
floresta fazia companhia para ela que não estava prestando atenção
em nada que estivesse ao seu lado.
Quando se deu conta que estava andando para mais distante da sua
casa, Dina avistou o antigo chafariz em que ela e Ric haviam se
beijado. Um arrepio eriçou os pelos do braço dela e imediatamente
fez com que ela tomasse o caminho direto para casa. Tudo que ela
menos queria que acontecesse naquele momento era ver um
fantasma.
Quando criança Dina conseguia ver coisas que outras pessoas não
viam. Espíritos de gente que ela não conhecia apareciam para ela.
Durante o dia e especialmente à noite.
Quanto os pais de Dina, após leva-la em uma serie de médicos de
varias especialidades, finalmente acreditaram nas coisas que ela
falava e decidiram levar a menina em um centro espírita para falar
com uma Yalorixá. Era um passado que ela não queria lembrar, não
quando estava passando pela mesma experiência novamente.
Decidida deixar toda a historia da casa desmoronada de lado como
sua avó havia prevenido, juntamente com a possibilidade de ter visto
o fantasma de um dos filhos de sua ex-aluna. Dina começou a colocar
os pensamentos em ordem quando topou de frente com Ric.
O susto foi tão grande que ela soltou um grito forte e os pássaros que
estavam dormindo nos galhos das arvores da floresta ali do lado,
começaram a voar de um lado para outro.
- Calma Dina. – O que houve? perguntou Ric tranquilamente.
- Sai daqui. – Nãoooooooo de novo não. – Gritou Dina fazendo sinal
enxotando Ric com as mãos.
- Dina, se é sobre ontem, me desculpe. – Eu não queria machucar
aquela cara.
Dina caminhou para trás dobrando os joelhos no chão.
- ME DEIXE EM PAZ. – Pai nosso, que estais no céu...
- Dina, agora você esta me deixando preocupado. – Quer se levantar,
por favor.
- Não toque em mim. – Fantasmas não tocam nas pessoas, só as
assustam. – fantasmas não beijam. Falou Dina em tom de desespero
com a cabeça mergulhada entre as mãos.
- Eu não sou um fantasma.
No mesmo momento Dina levantou a cabeça.
- Como?
- Dina, eu sou um idiota. – Mas fantasma eu não sou.
Limpando seus joelhos enquanto levantava, Dina olhou bem dentro
dos olhos de Ric. Chegou mais perto e pode ver que o verde daqueles
olhos sedutores estavam lá bem vivos e no mesmo instante
constatou que ele não era de fato, um fantasma.
- Quem é você? - Se você não é um fantasma me diga quem é você.
- Eu sou Richard, não se lembra? - Falei com você outro dia.
- MENTIROSO. – Você não pode ser quem diz que é. - Me diga a
verdade. – AGORA.
- Eu estou dizendo a verdade. – sobre o que você está me acusando?
Ric tentou se aproximar de Dina, mas ela recuava a cada passo que
ele movia na direção dela.
- não me toque. – Eu vi o que você fez com Adan ontem. – Não
chegue perto de mim.
- Eu jamais machucaria você Dina. – Eu vim aqui hoje exatamente
para pedir desculpas sobre o que eu fiz ontem.
- Me diga quem é você. – O que é você? - Um bandido, estelionatário
ladrão de bancos ? - Me diga a verdade.
Ric ficou parado alguns segundos antes de segurar com as duas mãos
nos ombros de Dina que se encolheu tentando se soltar do aperto.
- Dina eu sou Richard. – Você tem que acreditar em mim.
- Eu não posso acreditar em você, me solta. - Você não é Richard.
- Por que você acha isso.
- Richard Baleares está morto.
Naquele momento quem congelou foi Ric. Soltando imediatamente
Ric abaixou as mãos e fixou os olhos verdes em direção à boca de
Dina.
- O que você está dizendo? - Eu não estou morto, eu estou vivo bem
aqui na sua frente. – Você falou alguma coisa sobre mim para
alguém? - Alguém disse que eu estava morto.
- Quem faz perguntas aqui sou eu. – Richard Baleares está morto. –
Eu vi o tumulo dele hoje à tarde.
A expressão de Ric mudou para um semblante triste misturado a uma
raiva selvagem e Dina pode ver que os olhos dele estavam brilhando
por causa das lagrimas que relutavam em sair.
- Eu não estou morto. Falou Ric em tom baixo. – Por muitas vezes eu
desejei estar morto. – Por muitas vezes eu quis morrer, mas eu estou
vivo infelizmente.
- Eu não acredito em você.
- De que túmulo você esta falando Dina?
- O Tumulo de RICHARD BALEARES e do resto da família dele. –
Todos os túmulos estão lá. – Os cinco lápides correspondentes a toda
à família.
- A família? Perguntou Ric parecendo não acreditar no que ela dizia.
- Exatamente, a família. – O barão, a baronesa e os três filhos mortos
no desmoronamento da casa.
- Desmoronamento? A minha casa desmoronou? Ric engolia a seco
cada palavra pronunciada.
- Sua casa? perguntou Dina descrente. – Está mentindo de novo.
Ric caminhou ate o velho chafariz e sentou no degrau da base, Dina o
seguiu e ficou em pé parada na frente dele.
- Dina, onde foi que você viu essa casa?
- Subindo á rua depois do velho moinho. – Tudo aqui parece ser
velho.
- Não pode ser. Murmurou Ric. – Minha casa não caiu, ela estava em
pé quando nós saímos. – Você viu a casa errada.
- Eu vi a casa certa. – Tinha um enorme portão de ferro na entrada
com a letra B entalhada nele. Dina já parecia estar mais calma. – E
eu achei isso lá dentro. Ela mostrou o cordão com o pingente à Ric.
Ric avaliou o cordão e tomou da mão de Dina, a fazendo ficar
novamente nervosa.
- Essa é minha mãe Dina. – Onde você encontrou isso, foi meu pai
quem deu a ela.
- Estava no andar de cima... - Nos escombros.
Ric ficou olhando fixo para o pingente, Dina não tinha certeza, mas
podia jurar que ele estava chorando. Comovida com a reação de Ric,
ela sentou-se ao seu lado.
- E esse no colo dela sou eu.
Dina parecia não acreditar no que estava ouvindo, era muita
informação para processar depois do susto mais cedo no pequeno
cemitério.
- me conte a verdade Ric. – Se você quer que eu acredite em você,
precisa me contar toda a verdade.
- Agora nem mesmo eu sei o que é verdade agora Dina. – Só sei até
a parte que saímos da casa durante a noite. – Durante a tempestade.
Na noite da tempestade, quando eu tinha sete anos, meu pai ordenou
que nossa família fizesse as malas. Minha mãe estava apavorada, eu e
meus irmãos também. Saímos no meio da noite em uma pequena
caravana com as empregadas de minha mãe e alguns cavalos.
Meu pai levou a gente para dentro da floresta e nos obrigou a morar lá.
Nós nunca mais pudemos sair da floresta desde então.
- Eu não consigo acreditar em você, mas eu quero acreditar. – è
difícil acreditar quando se tem uma prova tão real... - quando se tem
cinco túmulos.
Ric parou de olhar para o pingente com a foto da mãe e olhou serio
para Dina. Ela deu um pequeno passo se afastando com medo
daqueles olhos verdes que não estavam nem um pouco sedutores.
Ric puxou um cantil de água pendurado em suas costas e o colocou
em cima da mureta do chafariz. Deu um passo na frente de Dina e
sacou uma faca de selva com tamanho suficiente para deixa a garota
apavorada.
- Calma Ric, o que você vai fazer com essa faca.
- Você dá mais valor a provas que palavras não é? - Eu vou lhe dar a
prova real que você deseja.
Ric levantou a faca apontando na direção de Dina. Ela fechou os olhos
e colocou as mãos na frente bloqueando a distancia entre eles
tentando se defender. Enquanto ele empunhava a faca em sua
direção, Dina soltou um grito sufocado.
- Não por favorrrrrrr.
Com um golpe certeiro Ric passou a lamina cortando a pele da sua
coxa fazendo o sangue escorrer pela sua perna. Dina piscou varias
vezes tentando compreender a atitude dele.
- O que você fez? - Por que você fez isso? Falou Dinas chorando com
as mãos nos cabelos.
Ric segurou Dina pelo braço e puxou perto dele. Ele tentou sair do
aperto das mãos dele, mas não conseguiu.
- Me solta, me deixa em paz. – Seu LOUCO.
Enquanto Ric segurava forte em Dina que se debatia para soltar,
alcançou o cantil que ele havia deixado no chafariz e derramou água
de santo Pedro sobre o ferimento.
- Aqui está sua prova Dina.
Dina parou de tentar escapar das mãos de Ric e ficou imóvel quando
viu que o ferimento parou de sangrar no mesmo instante que a água
tocou a pele dele.
- Eu não acredito. – isso não é possível. – Ric você esta trapaceando.
- veja com seus próprios olhos então.
Dina se aproximou de Ric e se abaixou na altura do ferimento onde a
lâmina passou. Alisando as mãos pela coxa dele por cima da calça
que ele usava, ela enfiou os polegares dentro do buraco no tecido
cortado junto com a pele e rasgou toda a perna da calça de Ric
revelando o ferimento.
- A sua pele esta curando bem diante dos meus olhos. Disse Dina.
Ela podia ver a carne vermelha com uma brecha no meio se fechando
das extremidades para o meio. Ric derramava mais água e mais o
corte se fechava.
- Ric essa água por acaso é...
- Água de santo Pedro. - Sim Dina.
- Então a lenda é verdadeira. – Termine de me contar o resto da sua
historia.
Meu pai era o barão e minha mãe era a baronesa. Eu sou terceiro filho,
na minha frente vieram Edie e Ram. Como eu disse meu pai obrigou
toda a família a viver na floresta depois que ele descobriu a água que
cura. Meu pai saiu em expedição para procurar a fonte da água
acreditando que ela existia.
Meu pai começou a ficar louco e nunca mais me deixou ou qualquer um
de nossa família sair da floresta. Ele temia que nós pudéssemos morrer
se caso bebêssemos de oura fonte de água. Então depois que minha
família abandonou a casa nunca pode voltar.
- isso e tudo que eu sei Dina. – A parte que você me contou sobre a
casa ter desmoronado ou os túmulos eu juro que não sabia.
- Como você não sabia?
- Eu não sabia até este momento. – Como você ficou sabendo sobre a
casa ou os túmulos.
- essa é a lenda aqui da cidade.
- Cidade tem uma lenda? perguntou Ric com olhos incrédulos.
- Sim, a lenda de santo Pedro que descobriu a água milagrosa. A
água de santo Pedro.
- Foi meu pai que descobriu a fonte da água Dina, e não esse Pedro.
Pedro trabalhou para meu pai na Europa e depois de muitos anos ele
veio morar aqui na cidade e meu pai arrumou emprego para ele na
escola. Eu não sei o que ele fazia para meu pai na Europa, mas aqui ele
era professor. Ele estava na expedição com meu pai, ele ajudou meu pai
a voltar pra cidade depois que ele foi curado depois que caiu da pedra.
Mas ele brigaram por algum motivo e logo em seguida Pedro morreu.
Minha mãe me contou isso. Minha mãe morreu na floresta pelo veneno
de uma cobra. Ela esta enterrada na floresta, perto da na aldeia.
Meu pai também morreu na floresta, não sei onde ele esta enterrado,
mas posso garantir que ele não esta no sob o tumulo na nossa antiga
casa.
- Que aldeia você esta falando Ric?
- Aldeia de santo Pedro, era assim que meu pai chamava. – eu não
fazia ideia que era o mesmo Pedro da lenda da cidade.
- Por que seu pai não contou sobre a lenda ou deixou vocês voltarem
pra cidade ?
- meu pai era insano Dina. – Ele me obrigava a beber essa droga de
água todos os dias. – Ele me cortava todos os dias só pra ver a água
curando, era o prazer dele. – Eu nunca mais pude ir a escola ou ter
amigos. – Eu nunca pude conhecer uma garota... – Como eu conheci
você.
“Coitado”. Pensou Dina. Ele era torturado pelo próprio pai.
Ric sentou novamente, mas dessa vez na mureta do chafariz. Dinda
sentou ao seu lado. Eles permaneceram silenciosos, olhando para o
céu azul escuro que a noite apresentava.
- Me fale sobre essa lenda Dina. – Por favor, me fale sobre a minha
casa.
Dina começou a revelar toda historia que ela acumulou desde que
chegou à cidade para morar definitivamente. A noite estava muito
calma e era possível escutar os sons dos animais enquanto ela falava.
Ric a ouvia atentamente e de vez em quando virava a cabeça e
passava a mão sobre os olhos enxugando lágrimas.
- E isso é tudo que eu sei Ric. – Minha avó não me contou mais nada
e o meu psicólogo também não abriu mais a boca pra falar nesse
assunto.
- Sempre que podia eu dava minhas escapulidas nos arredores da
cidade, mas nunca me passou pela cabeça falar com ninguém. – Por
isso eu nunca soube dessa lenda.
- Por que você nunca voltou na sua antiga casa Ric? - Está morando
tão perto.
- Eu não tive coragem de aparecer por lá. – Tive medo de que
alguém ainda estivesse morando na casa e poderia me reconhecer.
- Mas você era o único que não sabia de nada? - Alguém mais? -
Seus irmãos talvez.
- Não meus irmão não poderiam ... Saber ... De ... Nada.
Ric respondeu picando as palavras por se dar conta de um único
detalhe que ele havia esquecido. Na noite em que eles saíram às
pressas de casa, um de seus irmãos parecia estar ciente das coisas
que estavam acontecendo.
- Ram sabia Dina.
- Quem sabia?
- Ram sabia o tempo todo. – Ele apoiava meu pai o tempo todo.
Mesmo depois que fomos morar em santo Pedro ele sempre mostrou
muita segurança.
- Ric, quem é esse tal Ram?
- É meu irmão mais velho. – Ele também está vivo e ainda vive em
santo Pedro.
Ric deixou Dina no chafariz e dirigiu-se para perto da floresta. Céu
apareceu no mesmo instante que escutou seu assobio.
- aonde você vai Ric.
- Lidar com Ram.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Um banho no Lago
10
Depois que Ric entrou na floresta Dina voltou para casa um pouco
mais aliviada por ter descoberto toda a verdade, ou pelo menos uma
parte dela. Decidida a não contar nada à sua avó, a garota subiu
direto para o quarto sem jantar. No seu quarto enquanto ela olhava
através da janela, pensava na historia do rapaz.
Na floresta, Ric fazia Céu galopar irresponsavelmente por entre as
árvores. Ele estava disposto a confrontar Ram, para saber o resto da
verdade. Céu saltou por cima de alguns troncos de arvores
aterrissando na estrada ainda dentro da floresta. Fazia muito tempo
que ele não passava por aquele caminho que um dia ele havia
decidido nunca mais passar.
A estrada estava livre e Céu pode galopar com mais velocidade. À
medida que Céu galopava avançando para o final da estrada Ric
ficava mais determinado. O cavalo parou quando a estrada
encontrou-se sem saída. Ric passou a mão em sua espada que estava
atrelada aos arreios de Céu. Eles permaneceram imóveis olhando
para o paredão de galhos e troncos que se formavam no final da
estrada.
Outro rapaz da idade de Ric surgiu por trás do paredão empunhando
uma espada e logo em seguida outro emergiu do mesmo lugar. Os
dois rapazes vestidos de preto, lado a lado, com suas espadas
olhavam para Ric.
- Aqui é proibido. Alertou um dos rapazes em voz de comando. –
Você não pode passar por aqui.
- Não me diga o que eu posso ou não fazer. Respondeu Ric com o
polegar afastando sua espada da bainha.
- A aldeia é proibida para você. – Temos ordens para não deixar
ninguém entrar.
- Então vamos resolver isso do jeito difícil.
Desmontando de Céu, ele desembainhou a espada por completo e
ergueu de forma ofensiva fazendo os dois rapazes se separarem. Ric
começou a duelar sozinho contra os dois.
Mesmo estando em menor numero, Ric era muito bom. Todo o
treinamento de guerreiro que ele pode aprender com o pai e praticar
os seus irmãos foi superior à técnica dos rapazes que não
conseguiram impedir Ric de usar a lamina da sua espada contra eles.
Um terceiro rapaz, bem mais jovem emergiu do paredão e pode ver
os corpos dos outros dois caídos no chão enquanto Ric limpava o
sangue da lamina da sua espada. O rapazinho foi percebido por Ric e
na tentativa de voltar para dentro do paredão foi agarrado por Ric.
O pânico nos olhos do garoto não impediu que Ric estocasse sua faca
de selva na clavícula dele. Um grito de dor ecoou pelas arvores da
floresta enquanto o sangue descia pelo peito dele.
- Você vai dar um recado para ele. Falou Ric ao garoto que chorava
de dor. – Diga ao meu irmão que ele vai ter que me dar algumas
respostas. O garoto ainda chorava. – Diga que ser for preciso eu
passarei por aqui e irei buscá-lo em Santo Pedro ou em qualquer
inferno que ele esteja.
Ric soltou o garoto ainda sangrando e permitiu que ele mergulhasse
através do paredão. Ele tinha absoluta certeza que o recado seria
dado a Ram. Alguns minutos depois que o garoto sumiu pelo paredão
de troncos, galhos e musgos, Céu se aproximou. Ric ainda com
expressões de ódio no rosto montou e galopou em direção ao
acampamento do refugio.
Quando Céu parou no acampamento somente Edie estava em frente
à fogueira, os outros já se encontravam em suas pequenas cabanas
de um único cômodo.
Edie estava pensativo quando Ric se aproximou e sentou-se ao seu
lado. A chama amarela do fogo iluminava os dois.
- Eu matei dois membros do clã de Ram hoje. – Antes de vir para o
refugio.
- Você o que? Perguntou Edie virando-se de frente para Ric. – Eles
atacaram você?
- Não. – Eu os ataquei. Respondeu Ric singularmente. – Enviei um
recado para Ram. Quero falar com ele.
- Como sempre o pequeno Ric ainda é o irresponsável da família.
Disse Edie.
- Nossa casa esta no chão Edie, eles derrubaram ela. Ric falou. – Eles
colocaram túmulos com nossos nomes. – Ele fingiu que morremos.
- Ric você está delirando ? - Tomou sol de mais.
- Dina viu nossa casa desmoronada Edie. – Ela viu os túmulos.
- O que você contou para essa garota Ric? - Não venha me dizer que
você contou para ela sobre nós? - Sobre a água.
- Não contei nada Edie. Ela descobriu sozinha. – Você sabia que essa
cidade tem uma lenda sobre aquele cara?
- Que lenda Ric? - Que cara?
- Aquele homem que trabalhava pro nosso pai, que dava aula na
escola. – Professor Pedro. – A cidade acha que foi ele quem descobriu
a fonte milagrosa. – Esclareceu Ric ao irmão. – O professor morreu e
tornou-se santo para a cidade. – A água milagrosa é chamada de
AGUA DE SANTO PEDRO.
- Santo Pedro? Edie perguntou curiosamente. – Mesmo nome que
papai deu a aldeia?
- Sim. - Isso mesmo. Ric acenando com a cabeça.
- Pensei que papai só estava fazendo uma homenagem ao seu ex-
empregado. Concluiu Edie. – Já que ele ajudou a encontrar a fonte
milagrosa e a construir a aldeia.
Ric olhava para as chamas amareladas do fogo, Edie olhava para ele
com traços melancólicos e ao mesmo tempo curiosos quando afundou
a mão no bolso e puxou a joia de ouro que Dina havia encontrado na
antiga casa deles.
Edie pegou a joia e com ela o pingente com o retrato da mãe. Seus
olhos igualmente verdes como do irmão brilharam contrastando com
a iluminação das chamas.
- É a mamãe Ric. Reconheceu Edie. - É ela mesma aqui na foto e
você no colo dela.
- Eu não me lembrava dela, mas quando vi esse retato reconheci
imediatamente Edie. – Ela estava tão bonita.
- Me conte o que você sabe Ric.
Ric começou a contar a mesma historia que Dina havia contado
antes. As chamas flamejavam em tons amarelados contrastando com
a pele dos dois durante a conversa. Ric falou sobre a lenda da água
que a cidade acreditava, falou sobre o professor Pedro ser uma
pessoa querida, falou sobre a historia do desmoronamento da casa e
dos túmulos no quintal dos fundos. Edie ouviu tudo atentamente.
- Anos se passaram e só agora ficamos sabendo dessa versão da
historia. – Por que você acha que papai fez isso Ric.
- Por que ele era um insano covarde, Edie. – Aposto que foi ele quem
mandou derrubar a casa. – Não seria possível outra pessoa fazer
isso.
- Não quero mais falar nesse assunto agora. Falou Edie. – Preciso
dormir e pensar no que você me falou. – Melhor você dormir
também. – Essa Dina é de confiança ? - Ela não vai falar a ninguém
sobre a gente ?
- Claro que não Edie. – Eu confio em Dina. – Vou deitar e tentar
dormir. – Amanha vai ser um dia difícil. – Ele virá até nós.
Quando o sinal tocou pela manha todos os alunos se direcionaram
para suas salas de aula. Dina e anja passaram por Lorena e sentaram
nos mesmos lugares de sempre.
- Então Dina. Perguntou Anja. – O Ric já é mais um fantasma. – A
água curou mesmo a ferida dele ? - Não foi um truque mágico.
- Não Anja foi como um milagre. – Você deveria ter visto. – A pele
dele fechando à medida que ele derramava a água sobre ela.
- MENINAS, VAMOS PRESTAR ATENÇÃO NA AULA POR FAVOR. Pediu
a professora de biologia.
- A lenda é verdadeira mesmo. Sussurrou Anja. – Não são boatos.
- Sim, pelo que eu vi ate agora é verdadeira.
CLASSE,
VAMOS FAZER UM TRABALHO SOBRE BOTANICA E VAMOS FAZER A
PESQUISA NA FLORESTA. “AULA IN NATURA”. FORMEM TRIOS.
- Ah droga, trios? falou Dina. – Podia ser duplas. – Quem vamos
chamar pra ficar com a agente.
- Posso ficar com vocês no grupo? perguntou uma menina muito doce
que sentava duas cadeiras ao lado.
- Errr pode Carla, fique com a agente. Respondeu Anja olhando para
Dina que assentiu com a cabeça.
CLASSE,
VAMOS COMEÇAR A PESQUISA DEPOIS DE AMANHA.
Adan e Lorena não conseguiram achar uma terceira pessoa para
formar o trio. Então eles permaneceram em dupla.
- O que você vai fazer depois da aula Adan? perguntou Lorena.
- Vou me matricular numa escola de defesa pessoal, quer vir comigo?
- Eu não gosto de lutar, mas acho que você precisa mesmo. – Depois
daquele dia...
- Não vamos falar sobre aquele dia Lorena. – É exatamente por isso
que eu vou aprender a me defender.
CLASSE,
ABRAM O LIVRO NA PAGINA 87. ESSAS VÃO AS PLANTAS QUE
DEVEM PESQUISAR NA FLORESTA. COMECEM A TRABALHAR.
- Dina, eu vou encomendar meu vestido hoje à tarde, para a
comemoração do Solstício. – Vamos juntas?
- Eu não posso tenho psicólogo. Respondeu Dina com cara de
desdenho.
Naquela mesma manha bem cedo, Edie acordou antes de todo mundo
e saiu em silencio com seu cavalo. Ele foi diretamente para a fonte da
água de santo Pedro, sabia que encontraria o clã de Ram naquele
horário.
Foi exatamente isso que aconteceu. Tão logo Edie chegou na ponte
Ram pode vê-lo. Montado em Tobruk, Ram se aproximou de Edie. Os
dois estavam tensos e preparados para lutar se fosse preciso.
- Você sabe o que ele fez noite passada. Falou Ram se dirigindo a
Edie. – Ele matou dois dos meus vigilantes e feriu um garoto. – Eu
não vou tolerar isso.
- Eu sei. – Mas não foi por este motivo que eu estou aqui. – Eu sei
sobre nossa antiga casa, sobre o cemitério falso nos fundos da
propriedade Baleares. – Ric sabe também.
- Então está explicado por que o nosso caçula teve um ataque
existencial. – E a forma que ele encontrou, foi matar meus homens. -
Bem típico dele mesmo.
- Você sabia. Afirmou Edie.
- Como você acha que as pessoas não iriam procurar a gente? - papai
teve que encontrar um jeito de ninguém vir atrás de nós.
- Você sabia o tempo todo. Reafirmou Edie – Você nunca contou isso
pra gente. – Nem mesmo depois que eles morreram.
- Vocês tinham a cabeça muito fechada para entender as razoes de
nosso pai. Disse Ram. – Vocês não iam cooperar.
- Nós NUNCA iríamos cooperar com aquele doido. – Vejo que ele não
era o único doido da família.
- Se nossa mãe estivesse viva, falou Edie. – Ela teria morrido de
desgosto. – Você era filho dela também. Você devia ter respeitado
ela.
- Não coloque nossa mãe no meio da sua fraqueza.
- Você é louco Ram. – Tão louco quanto nosso pai foi.
- Ele vai pagar por ter matado meus homens.
- Não se aproxime do Ric. – Estou recomendando que não vá ser bom
para sua saúde que você fizer alguma coisa contra ele.
Ram não falou mais nada à partir dali. Puxou as rédeas de Tobruk e
virou de volta partindo com seu clã para longe da ponte. Edie
retornou sumindo na floresta.
O sinal de saída tocou e Anja, Dina e Carla se dirigiram para o portão.
No caminho toparam com Lorena e Adan. Os cinco ficaram se olhando
alguns segundos e Adan deu a primeira quebra de silencio.
- Xau Lorena. Disse ele. – Depois nos falamos.
Lorena com seus cabelos seguros por um impecável rabo de cavalo
assentiu com a cabeça e olhou para as três. Dina enrijeceu o corpo
esperando uma resposta malcriada de Lorena, mas ao invés disso, ela
apenas olhou-a de cima em baixo girou nos calcanhares e atravessou
o portão de saída da escola.
- UFA! – Pensei que ela iria puxar outra briga. Desabafou Anja.
- Por que a Lorena é implica com vocês? Perguntou Carla.
- Porque ela é uma vaca insuportável. Respondeu Dina. – Vamos
embora antes que ela resolva voltar.
As três meninas saíram rindo pelo portão da escola, Anja e Dina
tomaram uma direção oposta de Carla. A menina se despediu e
caminhou em direção em sua casa.
- Acho que a Carla é legal. Anja começou a tagarelar. – Pode ser que
ela seja uma peça fundamental no nosso grupo de biologia. – Será
que ela vai à comemoração do Solstício? – Com quem será que ela
vai?
Anja falava e Dina olhava para o chão enquanto caminhava. Estava
completamente, isoladamente imersa em seus pensamentos. Tudo
era uma grande novidade para ela... Sobre a água, sobre a lenda,
sobre a casa desmoronada... Sobre Ric.
- Dina você escutou alguma palavra que eu disse?
- o que?
- O que você acha da Carla? – Eu perguntei três vezes.
Dina ate aquele dia nunca havia reparado direito em Carla. Era uma
menina calma para falar e parecia estar sempre disposta em ouvir
mais que comentar. Era da mesma idade de Dina, tinha cabelos
crespos, castanhos. Olhos grandes em tom castanho como seus
cabelos, mas seus lábios eram enormes, parecia uma longa estrada
de curva bem sinuosa.
- Eu acho que ela deve ser legal. Respondeu Dina finalmente.
- Xau Dina. – Vou fazer a encomenda do meu vestido. – Você deveria
fazer o seu, pode não ter mais tempo para a costureira aprontar se
ficar em cima da hora.
- Xau Anja, eu tenho que ir ao psicólogo hoje à tardinha.
De tarde Dina caminhou pelas ruas em direção ao consultório do
senhor Paulo. A secretaria informou Dina que ele não estava.
- Como assim ele não veio hoje? – Ele nunca falta.
- Bem... Ele não aparece por aqui desde ontem. – Não telefonou e
não deu mais noticia.
- Ele sumiu?
- Não tem necessidade de dizer que ele sumiu. – Seria imprudente. –
Vou remarcar você para outro dia.
- Ok. Respondeu Dina.
Ela saiu com uma sensação estranha na cabeça. Não era uma atitude
comum de Paulo sumir assim. Ele nunca havia faltado uma sessão
com ela. “Bem, já que não tenho psicólogo vou ate a casa
desmoronada novamente. Pensou”.
Se apressando pelas ruas em direção aos limites da cidade, quando
ela estava quase chegando próximo ao velho moinho avistou Lorena
e Adan juntos de novo. Dina estava sozinha e temeu que eles dois
fizessem alguma coisa contra ela. Desta vez Ric não estaria ali para
defendê-la.
Dina se escondeu atrás de um canteiro de plantas, era alto o
suficiente para ela não ser vista enquanto os dois passavam pela
outra calçada tranquilamente.
- Adan, você tem certeza que vai se matricular nas aulas de defesa
pessoal? Perguntou Lorena incrédula.
- Claro que vou. – Agora mesmo.
Eles pararam em frente ao um estúdio de dança e artes marciais. A
aparência do imóvel era num estilo antigo com os tijolos aparecendo
em alguns ângulos. Adan entrou e Lorena continuou caminhando logo
após despedir dele.
Dina esperou que Lorena estivesse numa distancia consideravelmente
segura para sair de trás do canteiro e seguir com seu objetivo na
casa desmoronada.
Lorena continuou caminhando tranquilamente quando dobrou a
esquina esbarrou num homem alto franzino com um par de óculos
enormes. Por causa do encontro ela relaxou os braços e deixou cair o
livro da escola.
O homem abaixou imediatamente para pegar o livro no chão e
entrega-lo a Lorena.
- me desculpe senhorita.
- Eu estava distraída. – E você apareceu do nada.
Quando o homem estava com o livro de Lorena em mãos, percebeu
que ela estudava na escola da cidade. Ficou parado um instante
olhando para Lorena.
- Você estuda naquela escola indo em direção à igreja? Perguntou o
homem acomodando os enormes óculos no nariz.
- Sim. – Por quê?
- Já lecionei lá. – Mas isso foi há muitos anos. – você deveria ser uma
criancinha.
- É mesmo? – Desdenhou Lorena. - Qual matéria?
- Eu acho que conheço a senhorita de algum lugar. – qual seu nome?
- Veiga, Lorena Veiga.
- Você era filha do J.J? – perguntou o homem.
- Como você sabe que ele morreu?
O homem pronunciava as palavras em tom de melodia para Lorena.
- Eu conheci seu pai. - respondeu. – Um grande homem. - Morreu na
expedição em busca da água de santo Pedro.
- A maldita água milagrosa. Exclamou Lorena com raiva nas suas
palavras. – Se ele não tivesse partido nessa expedição maldita ele
ainda estaria vivo.
- meus pêsames senhorita. – Vou indo. – A gente se vê pela cidade.
- xauxinho... Respondeu Lorena fazendo a mesma cara de desdenho
que ela sempre fazia para as pessoas.
Enquanto Lorena virava as costas em direção a sua casa, Paulo
seguiu por outro caminho andando sorridente e despreocupado.
“Consegui chegar finalmente, pesou Dina.”
O portão ainda estava caído exatamente como Anja e Dina haviam
deixado no outro dia. Ela passou por ele e caminhou pela lateral
diretamente para os fundos da casa desmoronada. Enquanto dava a
volta por fora recordava as imagens das coisas destruídas de quando
passou lá dentro.
Passando pelo tronco caído o qual havia chorado depois de ter visto o
tumulo de Ric, continuou avançando em direção ao suposto falso
cemitério, encontrando novamente as lápides. Passou pela que
estava escrito o nome de Richard, deu mais uns passos e viu a lapide
escrita Ramcy Baleares.
- Ou esse é o nome do barão ou é um dos irmãos de Ric. Falou para
si mesma.
- Esse é meu irmão. Respondeu uma voz calma logo atrás de Dina.
- RIC. Gritou Dina assustada. - Não faça mais isso. – Quer me matar
de susto.
- Desculpa Dina. – Você tinha perguntado e... Eu só respondi.
- Eu não perguntei para você. Falou Dina se recompondo do susto. –
Eu perguntei para mim mesma.
- É que eu não tenho muito habito de falar comigo mesmo. Ric
sorrindo para ela. – Eu geralmente penso comigo. – Assim as pessoas
não me assustam.
- Você é bobo. Dina abriu um enorme sorriso para Ric.
Ele se aproximou e pegou em sua mão. Dina olhou para os olhos
dele, toda a sedução daquele verde estava ali novamente refletindo
para ela. Com a outra mão ele apontou para lapide ao lado e
conduziu Dina a ate ela.
- Esse é nome do meu irmão Edie. Apontou a lapide escrita EDIGARD
BALEARES.
- E essas são as lapides da minha mãe e do meu pai. Completou Ric.
De repente Dina ficou calada, seus lábios grudados em linha lutando
para não abrir um enorme sorriso. Ric viu como Dina fazia um grande
esforço para prender o riso e perguntou curioso.
- O que foi?
- É que você está me apresentando formalmente os túmulos. Falou
rindo escondendo com a mão na frente. – E não tem ninguém morto
ai em baixo.
Ric levantou uma sobrancelha em resposta à conclusão de Dina.
- Você está zombando de mim? Perguntou sorrindo.
- Não Ric, me desculpe. Dina não podia segurar mais o riso. – tem
que concordar que se não fosse trágico seria cômico. - me desculpe
mesmo. Ela ria sem parar.
O riso de Dina foi tão contagiante que Ric começou a rir junto com
ela. Eles sentaram sobre os túmulos falsos e gargalharam alguns
minutos. Foi contagiante.
Céu se aproximou quando Ric estava bem próximo à Dina e suas
duas mãos na cintura dela. Quando Dina viu o cavalo branco
acinzentado, parou de rir no mesmo momento.
- Clama Dina. Falou Ric. – Ele não vai machucar você. Fazendo sinal
chamando que Céu. – Esse é o meu melhor amigo. O cavalo chegou
mais perto. – Pode tocar nele.
Dina olhava admirada para o animal, mas não estava segura quanto
a tonar nele ainda. O cavalo se aproximou mais quando Dina
estendeu a mão. Céu cheirou a mão de Dina, a mesma que Ric tinha
tocado e reconheceu o cheiro do dono imediatamente. Soltou um
bufo e balançou o rabo mostrando que estava tudo bem.
Dina tocou no queixo do animal. Ric chegou perto e pousou sua mão
sobre a mão de Dina conduzindo-a pelo corpo de Céu. Enquanto Dina
admirava todo esplendor do cavalo pegou na mão de Ric e puxou-o
para si. Ric estava trás de Dina, uma mão no seu quadril enquanto a
outra junto com Dina alisava o pêlo do animal.
O peito de Ric tocava as costas de Dina, ela podia sentir a respiração
dele por trás de seu ombro. As palavras dele sussurravam ao pé do
ouvido dela.
- Está sentindo? Sussurrou no ouvido de Dina. – Ele gosta de você
também. - O pêlo dele é macio. Ric parava a mão dela na altura da
barriga de Céu. - Está sentindo a respiração dele? Sussurrou mais
uma vez. – sinta a respiração dele na sua mão.
Dina estremeceu.
- Eu sinto.
Ric soltou a mão de Dina e junto à outra, segurou forte o quadril dela
virando-a de frente para ele. Pressionando Dina ao corpo de Céu, Ric
olhou nos olhos castanhos dela e pousou um leve beijo sobre os seus
lábios. A noite estava chegando e ficando quente, não estava
ventando.
- Dina, eu gostaria de leva-la um lugar especial. Falou depois que
interrompeu o beijo. – Você gostaria de ir comigo?
- Claro.
Ric montou e posicionou Céu próximo a uma lápide. Fez sinal para
Dina subir na garupa usando a lapide como degrau. A principio ela
ficou insegura, mas quando encontrou os olhos dele, toda a
insegurança que existia ali foi embora.
- Eu vou pisar na lapide? Perguntou Dina, receosa. – Isso seria uma
profanação.
- Não tem ninguém ai em baixo. Ele respondeu. - Você mesma disse.
Esticando o braço para ela.
Dina decorou seus lábios com um sorriso e com dois movimentos
estava na garupa do cavalo abraçada à Ric. Eles galoparam em
campo livre da propriedade Baleares. Dina grudou sua bochecha nas
costas de Ric. Pelo caminho ele observou os restos da sua antiga
casa, mas rapidamente deslocou sua atenção para frente como se
estivesse virando uma pagina da sua vida.
“Onde ele estaria me levando” pensou Dina. Quando o cavalo chegou
à beirada da floresta ela suspirou achando que o passeio havia
terminado, mas Céu deu um pequeno salto para dentro na mata. Os
olhos de Dina estavam tão atentos quanto suas mãos segurando a
cintura de Ric. Medo e espírito aventureiro estavam misturados na
barriga dela.
Céu não estava mais galopando por que as plantas estavam muito
densas e Ric sabia que seria perigoso se sele tropeçasse e quebrasse
a perna. O maior pesadelo de um cavalo é ter uma perna quebrada. À
medida que Céu andava Ric e Dina apreciavam o balanço do
movimento do seu quadril. Ric soltou uma das mãos das rédeas dele
e repouso-a sobre a coxa de Dina.
Era uma experiência totalmente nova para ela. Andar á cavalo dentro
da mata, na garupa de um homem forte e lindo, assim como era a
primeira vez que alguém tocava na coxa dela daquela forma.
Finalmente eles chegaram ao lago.
Anoiteceu completamente e a única iluminação era da lua que parecia
estar conspirando em favor deles. O reflexo nas águas do lago era
perfeito, como um grande espelho no chão virado para cima.
- É lindo aqui. Comentou Dina enquanto descia do cavalo. – Que
lugar é esse.
- Eu venho aqui sempre. Respondeu ele abrindo os dois botões de
sua camisa. – Vamos nadar?
- Nadar? Pareceu espantada. – Eu não vim preparada para nadar.
- Nem eu não achei que iria encontrar você. – Então somos dois
despreparados.
Ele puxou a camisa exibindo a musculatura perfeita do abdômen.
Dina virou o rosto um pouco sem graça enquanto ele colocava os
polegares nas calças para retira-la.
- NÃO FAÇA ISSO. Ela gritou assustando Ric. – Não tire, por favor.
Ela continuou com as maças do rosto avermelhadas. - Eu nunca vi
um garoto tão à vontade assim.
- Tudo bem. Ric respondeu com um sorriso. – Você vem?
Dina ainda corada de vergonha se aproximou da água e um lampejo
de pensamentos passou por sua mente. “O que eu teria a perder?
Perdi meus pais, estou morando aqui nessa cidade pequena, esse
gato semi nú me chamando para nadar com ele. O que pode dar
errado?”...
Antes de tirar a camisa certificou que estava de top, e por baixo do
seu jeans ela coincidentemente usava uma calsinha box preta, muito
parecida como um short de academia. Ric não estava olhando para
Dina tirar a roupa, estava imerso literalmente sob a água do lago
tranquilamente.
Ela colocou os pés na água, não estava fria e não estava quente, a
temperatura estava agradável. Quando Ric se aproximou ela já
estava afundada ate o pescoço.
- O que você acha Dina? Ele perguntou a ela. – Está gostando do
lago?
- É lindo. Respondeu ela nadando estilo costas devagar. – por mim eu
nunca mais voltava para a cidade. Completou. – Eu ficaria aqui para
sempre.
Ric fechou seu semblante logo após ter escutado as palavras de Dina.
Ele executou duas braçadas até ficar frente a frente com ela.
- Você não sabe o que está falando. Ele disse a ela. – Você Não
gostaria de ficar aqui para sempre. Ele afirmou segurando-a pelos
quadris. – A vida tem que ser aproveitada lá fora, na cidade.
Puxando-a para um abraço debaixo d´água. – Fora dessa floresta.
Dina claramente entendeu a mensagem que ele estava passando. Ela
sabia que ele não podia sair da floresta por muito tempo. Ela sabia
que não existia outra água que ele pudesse beber.
- Ric, mes desculpe. Ela o abraçou. – Eu esqueci completamente da
sua situação.
- Sem problemas Dina. Ele a beijou intensamente.
Eles estavam completamente à vontade no lago, nadando e se
beijando. Então Dina sente um movimento fora do lado. Entre as
arvores.
- O que foi? Perguntou Ric em alerta. – Viu alguma coisa ?
- Não tenho certeza, mas me pareceu que eu vi um cavalo ali nas
arvores.
- Você tem certeza ? ele perguntou. – Pode ser Céu.
- Não, acho que vi um cavalo preto. Acho que tenho que certeza que
vi um cavalo preto.
- Dina vista suas roupas. Ric ordenou. – Vou leva-la para casa.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Faça uma oração para mim
11
Pela manha o sol iluminava o quarto completamente. Quando ela
chegou em casa noite passada “às escondidas” esqueceu de fechar a
janela antes de fechar os olhos para dormir. Andar a cavalo com Ric e
nadar com ele no lago fez Dina ter sonhos que ela teria vergonha de
contar a alguém, até mesmo para sua melhor amiga Anja.
Totalmente desperta, levantou-se e entrou no banheiro.
- Bom dia querida. Cumprimentou a avó pondo uma xícara de café na
mesa. – Dormiu bem? Perguntou capciosamente.
- ERRR... Sim vó. Respondeu Dina envergonhada. – Dormi como uma
pedra.
- Tome seu café querida. – Não vá se atrasar. Reservando pães de
batata para levar. – Anja deve bater a qualquer momento.
Ela bebeu apenas um gole de café quando Anja bateu na porta. Dina
correu para abrir.
- Estou saindo vó. Pegou a mochila e os pães. – Vamos. Arrastou
Anja pelo braço.
- Pra que tanta pressa? Perguntou Anja. – Calma temos tempo.
- Preciso lhe falar sobre ontem. Despertando a curiosidade em Anja.
- O que aconteceu ontem? Perguntou ela. – Aconteceu sem eu estar
presente?
- Eu não tive sessão com psicólogo. Elas caminhavam de vagar. –
Então eu voltei no cemitério.
- Você fez o que? O rosto de Anja enrijeceu. – Você está maluca? –
Voltou lá sozinha?
Elas estavam no portão de entrada da escola quando Dina parou na
frente de Anja sorrindo enquanto contava toda a experiência que ela
teve com Ric noite passada.
- Então ele me levou para o lago e nós nadamos juntos. Dina sorria
com uma pontinha de vergonha nas bochechas.
- Vocês nadaram juntos? Anja parecia não acreditar. – Nadaram sem
roupa? Anja falou mais baixo. – Vocês fizeram aquilo? Sussurrou.
- NÃOOO. Respondeu alto para a amiga. – Nós não fizemos aquilo.
Com as mãos atracadas a seus cadernos. – Anja, você tem uma
mente muito criativa, pra não falar poluída. Ela riu.
Elas entraram na sala junto com os outros alunos. Antes que a
professora surgisse pela porta da sala Anja perguntou a Dina.
- Mas você e o Ric... Cochichou. – Dentro da água não tem
gravidade, você sabe.
- Anja? Dina olhava para ela. - Está começando a me preocupar, e
aquela historia de ser freira? Perguntou sorrindo.
BOM DIA CLASSE!
ABRAM SEUS CADERNOS E COMECEM A COMPOR A PESQUISA DE
GRUPO QUE VAMOS FAZER AMANHA NA FLORESTA.
Dina voltou sua atenção para a professora. Ela não havia se dado
conta de que a pesquisa de escola seria dentro da floresta. Onde
morava Ric e Edie e... Ram.
- Anja, a pesquisa vai ser na floresta. Virou para a amiga. – Isso
pode ser perigoso. – Eles moram na floresta.
- Não devemos entrar tanto assim na floresta Dina. Explicou Anja. –
Vamos ficar em alguma trilha.
- Como você sabe?
- Eu já pesquisei na floresta. – É um campo perto do chafariz
desativado, não vai ter arvores, o campo é aberto.
Enquanto elas falavam Carla entrou na sala de aula um pouco
atrasada e sentou perto de Anja e Dina. Quando passou por Lorena
esbarrou em sua mesa fazendo com que uma caneta caísse no chão.
- Desculpe. Abaixou e pegou a caneta.
Lorena olhou para Carla com o mesmo desdenho que ela olhava todo
mundo, todo dia. Tomou a caneta das mãos de Carla e virou o rosto
de volta à Adan. Carla se aproximou das colegas de grupo sem graça
por Lorena ter feito aquilo com ela.
- Olá meninas. Cumprimentou Dina e Anja.
- Oi Carla. Disseram ao mesmo tempo.
Carla puxou a cadeira para completar o grupo e elas começaram a
trabalhar na pesquisa de biologia.
Quando o sinal soou os alunos se levantaram freneticamente e o
barulho das cadeiras arrastando no chão só incomodava a professora.
CLASSE, DE VAGAR POR FAVOR.
Dina, Anja e Carla se apressaram para fora da escola. Apesar de Dina
estar completamente à vontade na presença de Carla não fez
nenhum comentário sobre Ric e todo o resto. Elas caminharam juntas
até que a direção para casa de Carla ficou oposto das outras duas.
- Xau meninas, amanha é o grande dia. Carla despediu-se. – Não
esqueçam de vestir calças amanha. – Tem muitos insetos na floresta.
Dina e Anja acenaram para Carla e caminharam de volta para suas
casas. Anja tagarelava sobre o vestido para a comemoração do
Solstício quando enquadrou Dina com outra pergunta sobre ela e Ric.
- Lá vem você novo. Parou na frente de Anja. – Não fizemos nada e
Ric não encostou em mim. Completou. – Ele é um cavalheiro, me
respeitou o tempo todo.
- Jura?
- Juro. – Satisfeita?
- Não muito. Falou em devaneio. – Esse Ric deve ser um bocó.
Terminou rindo.
- O que você faz quando está na igreja? Perguntou boquiaberta. –
Você realmente reza? Você conta ao padre no confessionário que tem
esses pensamentos? Dina estava começando a rir.
Anja também soltou o riso e despediu de Dina. Quando eles estavam
bem distantes uma da outra, Anja parou.
- Dina, vamos preparar os nossos vestidos? Gritou. – passo na sua
casa no final da tarde.
Dina fez sinal positivo para Anja e seguiu andando quando avistou
uma figura sentada no banco de alvenaria mais adiante. Bob estava
olhando para ela. Foi reconhecido imediatamente pelos olhos que
naquela hora do dia tornavam muito claros. Dina podia afirmar que
Bob não tinha olhos se ela não o conhecesse.
- Boa tarde. Ele cumprimentou quando ela estava mais perto. – Tudo
bem moça?
- Oi Bob. Respondeu enquanto passeava os olhos no braço dele. –
seu braço melhorou? Ela já não tinha mais certeza qual braço ele
havia ferido com o balde. – Minha vó ficou preocupada.
- Meu braço está bem. Respondeu ele. – Não foi nada de mais como
eu disse naquele dia.
- Minha vó queria saber quem são seus pais para perguntar como
você estava. Ele abriu espaço para ela sentar. – Mas pelo visto, você
está muito bem. – Você trouxe minha blusa?
Ram não planejava falar com Dina, por isso não estava com a blusa
dela. Ele olhava para ela com os mesmo olhos de um animal
selvagem quando olha para sua presa.
- Eu deixei em casa. Respondeu em tom calmo.
- Tudo bem, mas não se esqueça de trazer. – Minha vó vai ficar
perguntando. – Você lembra onde eu moro?
- Claro que sim. Nunca me esqueço um lugar... Nunca me esqueço
um rosto.
Dina corou com a resposta de Bob. Já era hora do almoço e ela
estava com fome. Eles se levantaram e caminharam juntos em
direção à casa de Dina. Ela observava como ele andava e esqueceu-
se de Ric enquanto caminhava ao lado dele.
Bob vestia uma calça marrom bem escuro e uma camiseta preta. Por
falta de mangas os músculos dos braços dele estavam expostos. Os
raios de sol iluminavam seus cabelos escuros e seus olhos estavam
cerrados por causa da claridade excessiva. Próprio de quem possui
olhos claros e Bob tinha os olhos mais claros que Dina jamais havia
visto.
Durante a caminhada para casa Dina lembrou em voz alta que sua vó
não estaria em casa para o almoço. Bob aproveitou a deixa para
convida-la para caminhar mais um pouco em sua companhia. Eles
andaram lado a lado e quando Dina avistou o chafariz onde deu o
primeiro beijo em Ric, sentiu uma sensação que estava traindo e
puxou Bob para outro local.
Bob quase não falava e Dina, apesar de estar à vontade ao seu lado,
também sentia medo. Eles pararam em frente a uma construção
antiga. Dina não distinguia o que era aquilo, mas Bob soube
descrever. Ele contou a ela que naquele lugar era a antiga casa do
ferreiro. Ele fabricava ferraduras para os cavalos da cidade.
Dina não entendia por que aquele lugar era tão especial a ponto de
Bob ficar nostálgico. Eles se sentaram em outro banco de alvenaria
que estavam espalhados em toda a cidade. A barriga de Dina
começou a roncar de fome e ela lembrou que trazia pães de batata
na mochila.
Ela escorregou a mochila para seu colo e puxou de dentro dela o
pacote com os pães. Bob olhava Dina com atenção.
- Está servido? Dina ofereceu a ele. – São uma delicia minha vó que
faz.
Bob olhou para o alimento nas mãos dela e levou alguns segundo
pensando se seria prudente ou não aceitar. Logo concluiu que não
seria problema e dar algumas mastigadas no pão.
Quando Bob deu a primeira mordida reconheceu o gosto, mas não
soube identificar de onde ele conhecia. Deu outra mordida enquanto
Diana tagarelava sobre como sua vó os preparava para puxar
assunto. Bob parecia apreciar o pão quando Dina sem querer, soltou
a parte em que queria aprender a fazê-los tão bem quanto a
baronesa fazia. Bob engasgou.
- Cuidado. Engasgou com o pão? Perguntou preocupada. – Eu não
tenho uma garrafa com água por aqui. Ela deu tapinhas nas costas
dele. – Vamos procurar algo para você beber.
- Não precisa. Ainda engasgado. – Eu trouxe minha água. Ele puxou
um pequeno frasco que estava no bolso lateral abriu e bebeu.
Até aquele momento Dina não tinha reparado na pequena garrafa
que ele portava. Sentindo-se melhor depois que bebeu alguns goles,
ele abaixou a garrafa, então foi a vez de Dina querer beber também,
o sol estava forte e o tempo muito quente.
- Você não pode beber isso. Ele negou água a ela. – Essa água está
quente e com gosto ruim. Escondeu a garrafa - Melhor não beber
dela.
Dina assentiu com a cabeça.
- Vamos procurar algo para beber. Levantou. - Estou sedenta.
Bob caminhou com ela a procura do que ela pudesse beber, apesar
da preocupação em alguma outra pessoa reconhece-lo aparentava
tranquilidade todo o tempo. Numa esquina próxima Dina avistou uma
quitanda e chamou Bob para entrar com ela, ele disse que iria
esperar por ela do lado de fora.
Quando Dina saía da quitanda carregando em sua mão uma garrafa
de água de coco localizou Bob do outro lado da calçada encostado ao
muro de forma casual. Estava esperando por ela com seus braços
cruzados em frente ao seu peito. De longe ela pode reparar na
luminosidade dos olhos dele. “Acho que são azuis claros”, ela pensou.
Antes que ela pudesse estar totalmente do lado de fora da quitanda
Adan entrou e esbarrou em sua mão deixando cair toda água de
coco. A principio Dina olhou para chão vendo a água escorrer pela
calçada e no seguinte instante em que levantou seus olhos
reconheceu o rapaz da suas escola.
- Desculpa. Pediu com medo da reação dele. – Eu não vi você
entrando.
- Você sempre está no meu caminho. Rebateu com ódio. – Sempre
você. Lembrando à noite em que brigou com Ric.
Dina ainda que morrendo de medo, não deixou transparecer a fim
que Adan não tomasse vantagem da situação e nem precisou. Ele
segurou Dina pelo punho e puxou a garota para o lado de fora da
quitanda. Bob observou tudo e calmamente atravessou a rua na
direção deles.
Enquanto Adan intimidava Dina Bob tocou no ombro dele fazendo-o
girar a cabeça em sua direção.
- O que foi? Perguntou Adan a Bob. – Não se meta nisso.
- Eu acho que a moça não quer ser tocada por você. Bob estava frio
como uma geleira.
Pelos seus olhos eram capazes de transparecer o um instinto cruel.
Tanto Dina como Adan repararam.
- Eu vou pedir que você solte a moça. Ordenou que Adan soltasse
Dina.
Bob era bem mais alto e muito mais forte que Adan que percebeu
isso rapido, soltando Dina e se afastando lentamente sem retirar os
olhos de cima dele. Dina se posicionou ao lado de Bob e ficou olhando
para Adan.
- Por que você me persegue? Perguntou.
- Eu não persigo você. Respondeu Adan. – Eu só odeio você. Soltou
as palavras rancorosas. – Desde o dia que o seu outro guarda costas
quase quebrou o meu braço.
- Ric não iria quebrar o seu braço. Rebateu Dina enquanto Bob olhou
de soslaio para ela. – Eu pedi desculpas. - Ele não conseguiu
controlar a força dele. Continuou. – E você me empurrou no chão.
- Você a empurrou no chão? Perguntou Bob. – Eu teria quebrado seus
dois braços.
Adan girou nos calcanhares e saiu reclamando baixo alguma coisa
como: Esse ai também vai pagar. Dina olhou para Bob agradecido por
ele ter defendido ela e ao mesmo tempo ficou aterrorizada com a
declaração que ele tinha feito para o Adan.
- Você não quebraria os dois braços dele certo? Perguntou ela. - Era
apenas uma brincadeira, né?
- sim, era uma brincadeira. Respondeu Bob não pretendendo
estender o assunto. – Me fale sobre esse Ric.
Dina gelou diante da pergunta dele. Ela havia prometido a Ric que
não contaria a ninguém, apesar de ter contato para Anja. Mas Dina
não considerava que Anja pertencesse ao grupo dos “ninguém”,
então concluiu que se contasse uma parte, não teria problema, Bob
provavelmente não associaria Ric à lenda e muito menos a casa que
desmoronou.
- Ric é o meu namorado. Soltou sem pensar.
- Namorado? Bob levantou uma sobrancelha. – Não sabia que você
tinha namorado. Tentou mais informações. – Está namorando muito
tempo esse Ric.
- Estamos há pouco tempo. Ela tinha se arrependido.
- Então não é nada serio? Bob insistiu.
- É sim. – Eu sou uma garota seria.
- Nunca duvidei disso. Bob respondeu singularmente.
Dina já estava ficando nervosa com as perguntas dele e disse que
estava na hora de ir para casa encontrar com Anja para a prova do
vestido. Dina ainda não tinha nem mesmo feito o pedido à costureira.
Bob acompanhou Dina até a rua da casa dela.
No caminho de volta Dina ficava se perguntando em que Bob
pensava, ele era muito calado e concluiu que se ele não falava muito
seria por que estava pensando.
Ram só pensava em como Dina era impulsiva. Ele observava o jeito
dela caminhar e a forma como ela movimentava as mãos. Os cabelos
dela balançavam com o vento. Ele se lembrou do corpo que ela
revelou tirando a própria camisa para estancar uma ferida que iria
curar sem muita preocupação, mas ela ficou preocupada com ele, ela
quis ajuda-lo.
Agora, ele sabia que ela estava encontrando seu irmão mais novo
com certa frequência, seus pensamentos começaram a ficar confusos
Ele olhava para a garganta dela e calculava em quanto tempo levaria
para ela morrer depois que ele cortasse.
- O que você está pensando Bob? Ela perguntou. – Você está tão
calado.
Ele pigarreou algumas vezes antes de responder a ela. Estava tão
concentrado em mata-la que teve que pensar em alguma reposta
casual.
- Não tem muita coisa para fazer na cidade, não é?
- Não muita, mas teremos uma comemoração. Dina respondeu. – A
festa do Solstício será em menos de duas semanas eu acho.
- Ainda realizam esta festa aqui?
- Sim, Você já participou?
- Algumas vezes. Ele assentiu. – Mas foi há muito tempo.
- Essa será minha primeira. – falando nisso tenho que encontrar Anja
para encomendar meu vestido.
Eles continuaram caminhando de volta à casa de Dina.
Anja saiu de casa pretendendo encontrar Dina na casa dela e mais
uma vez, pelo caminho, sentiu a estranha sensação de que estava
sendo observada. Desta vez Anja parou, uniu as mãos junto ao peito,
abaixou a cabeça e começou a rezar.
“Querido Deus, sei que me põe à prova frequentemente e eu aceito meu
destino... Se por acaso esta for minha hora, estou pronta...”.
- Olá moça. Luccar estava parado ao lado dela.
- AHHHHHHHHH MERD... Gritou Anja assustada. – Diabos.
- Calma moça. Ele falou levantando as duas mãos. - Parece que você
viu um... Eu queria dizer fantasma, mas se você prefere diabo, tudo
bem.
- Você me assustou. Anja estava com os lábios brancos. – quando foi
que você se... Materializou aqui?
Luccar achou divertido o pânico da garota e pediu desculpas. Quando
ela ficou mais calma eles seguiram juntos, rumo à casa de Dina.
- Por que você estava de cabeça baixa? Perguntou ele quebrando o
gelo do silencio.
- Eu estava fazendo uma oração. Ela respondeu naturalmente
desconfiada.
- Você faria uma oração por mim?
- Claro, não se nega oração a ninguém. – Deus não nega a ninguém.
Lucaar parou e ficou olhando fixamente para Anja. Que garota
extraordinária, ele pensou. Reparou nos cabelos dela, nos olhos dela,
na boca dela e ficou maravilhado. Ela, seguramente ficou assustada.
- Qual seu nome? Ele perguntou.
- Anja.
- Anja? – Só?
- Angélica. Ela corrigiu. – E o seu?
- Luccar. Respondeu pegando as duas mãos dela.
- Lucaar... Luc?
- Não. Ele acariciou as duas mãos dela. - Eu não gosto de
diminutivos. – Ninguém deve ser diminuído, começando pelo nome.
Falava enquanto acariciava as mãos dela.
- Certo. Anja concordou para do mesmo lugar. – Lucaar.
- Você também deveria ser chamada pelo seu nome Angélica. – Não
se deixe ser diminuída. – Você é um anjo, e um anjo jamais é
diminuído.
Levou alguns segundos para Anja processar as palavras de Luccar,
ela parecia estar em transe enquanto ele acariciava as mãos dela. Ele
se aproximou, chegou bem perto dela. Quando passava as mãos dela
nos lábios dele, ela saiu do transe.
- Pare. Ela puxou as mãos com força. – Não chegue perto de mim. -
Não dessa forma.
- Eu não estava fazendo nada de mais.
- Então continue NÃO fazendo nada de mais. Ela o advertiu.
Eles continuaram andando até a porta da casa de Dina quando ele se
despediu dela. Ela ficou observando ele se afastar enquanto batia na
porta da casa.
Mesmo achando um desaforo o comportamento de Lucaar, ainda
assim ela pensava nele. Impaciente ficou ali mesmo, do lado de fora
ansiosa, esperando que a amiga aparecesse logo.
Cerca de vinte minutos se passaram quando Dina acompanha de Bob
dobraram a esquina.
Eles encontraram Anja esperando na porta impaciente. Quando ela
avistou Bob ao lado de Dina estalou os lábios e se aproximou. Ficou
paralisada olhando para o rosto de Bob. Esqueceu Lucaar de
imediato.
- Bob, essa é minha amiga Anja. – Anja esse é o Bob.
Bob sorriu para Anja, se despediu de Dina caminhou de volta para
longe delas e seguiu sozinho pela rua. Já estava quase escurecendo.
- quem é esse Deus grego que você achou? - Ele tem um irmão?
Dina confirmou em pensamento que Bob era mesmo lindo, mas que
seria impossível dele ter parentesco com Ric. A primeira diferença
entre os dois era que Ric não a amedrontava, enquanto Bob causava
calafrios profundos nela, ate quando estava sorrindo.
O Ric de Dina transparecia um sorriso alegre e fulgaz, sempre pronto
para uma aventura, mas o sorriso de Bob era uma fortaleza
impenetrável, era seguro, cuidadoso. Ate mesmo a cor dos olhos
entre os dois era impossibilitada de qualquer comparação.
- Dina você está bem?
- O que? Despertou dos pensamentos. – falou alguma coisa?
- Nós chegamos à casa da costureira. – Pode, por favor, parecer
normal?
Dina deu de ombros abrindo espaço e Anja pode tocar a campainha.
Uma senhora apareceu depois que a porta abriu. A costureira usava
um lenço cobrindo os cabelos, fita métrica por cima dos ombros e
alguns alfinetes espetados na manga da blusa.
“Depois ela reclama que eu não sou normal”. Pensou Dina.
- Olá queridas. A costureira apontou cadeiras para as meninas
sentarem. – Essa ai é sua amiga, Angélica?
- Sim tia. Respondeu à loura. – Essa é Dina – Também vai participar
da comemoração.
- Que cor você quer o vestido? Perguntou a costureira.
Dina ficou em duvida para responder, ela nunca havia passado por
uma prova de roupa antes e muito menos escolher a cor do vestido.
Na cidade grande onde ela morou, os vestidos já estavam prontos
para serem comprados, ela os escolhia pelo valor não se importando
a cor dele.
- Tia eu quero o meu vestido em dourado com braço. Pediu Anja –
Vai logo Dina, não temos muito tempo, está ficando tarde.
- Dourado Anja? Questionou Dina. – Não acha que chama muita
atenção. – Essa cidade é um pouco... Pequena.
- Dina. – Quando se tem oportunidade de uma festa grande, a gente
aproveita. – Tia ela vai querer o dela em tom verde.
- Verde? A costureira conduziu Dina para tomar as medidas. –
Excelente escola. Anja foi atrás.
- Por que verde. Sussurrou Dina para Anja.
- Porque verde é da cor dos olhos de Ric. Anja sorria. – Você vai com
ele não é?
Enquanto a costureira tomava suas medidas, Dina abaixou a cabeça
pensando em quanto seria bom ficar com Ric na comemoração. Ao
mesmo tempo estava preocupada que talvez ele pudesse não aceitar.
As pessoas poderiam reconhecê-lo na festa.
“Se ele não ficar perto dos mais velhos, ele não será reconhecido. Ela
pensou. Basta ele ficar perto de gente jovem e vai ficar tudo bem.
Concluiu”.
- Vou falar com ele sobre a festa.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Somos órfãos
12
As meninas deixaram a casa da costureira logo após escolherem as
cores dos vestidos e tirarem todas as medidas. Já era tarde da noite
quando elas caminhavam pelas calçadas da cidade. Anja sorria muito
e mal podia esperar pela festa de comemoração do solstício, mas
Dina não parecia satisfeita com seu vestido.
- O que foi Dina? Perguntou quando finalmente parou de tagarelar.
- Eu nunca fui numa festa assim Anja. – Não sei como usar um
vestido longo.
- Não acredito que Diana Gomes nunca foi a uma festa de vestido.
Anja ria enquanto falava. – Na cidade grande não existem festas?
- Claro que existem, mas eu não frequentava. – Eu não era muito
popular.
Anja entrelaçou seu braço ao de Dina e puxou-a para perto dela.
- Dina.
- O que?
- Vamos ser amigas para sempre não é? – Nunca vamos esquecer
uma da outra não é mesmo?
Dina parou e ficou frente a frente com Anja. – Claro que sempre
vamos ser amigas. – Aconteça o que acontecer, sempre seremos
amigas. – Mesmo morando longe uma da outra.
Anja abraçou Dina ali mesmo e as duas choraram. Todos os anos
quando Dina passava as férias com a avó era com Anja que ela
confiava seus segredinhos de menina. Anja também esperava ansiosa
pelas férias por que sabia que sua amiga viria da cidade. Agora por
uma fatalidade do destino que provocou a morte dos pais de Dina
elas estariam juntas definitivamente.
- Vamos logo pra casa. – Sua casa, quis dizer. Anja limpou as
lagrimas.
- Minha casa?
- É. – Não é lá que tem os melhores pães de batata da cidade?
- Eu chego lá primeiro que você. Dina já estava olhando para a rua.
- Corrida? Perguntou Anja. – Como nos tempos de criança?
- Simmmmmmmmmm.
Dina saiu correndo e Anja disparou logo atrás.
Em Santo Pedro, na grande fogueira que era acesa todas as noites,
Ram não parecia querer dizer qualquer palavra, Lucaar um pouco
mais distante ditava as ultimas orientações ao resto do clã enquanto
a luz amarela das chamas iluminava o rosto dele. Ele observava cada
labareda de fogo se movimentar em ritmo aleatório sobre os estalos
da madeira sendo queimada. Lucaar finalmente se aproximou.
- Ela disse que está namorando ele. Disse Ram.
- Mais um motivo para mata-la. – E mata-lo também.
- Essa é uma ideia que não sai da minha cabeça. Ram não tirou os
olhos das chamas. - O fato é que eu não quero mata-la.
Lucaar não questionou as palavras de Ram, apesar deles serem
amigos há vários anos o respeito pelo líder do clã foi uma das coisas
que ele havia aprendido desde que passou a viver em Santo Pedro.
O treinamento exaustivo contava com lições de respeito hierárquico
na aldeia. O barão fez questão de plantar nas cabeças de todos os
moradores, guerreiros ou não, de que quem mandava na aldeia
absolutamente era o líder do clã, Ram.
- Qual vai ser o novo plano? Perguntou Lucaar enquanto arremessava
um pedaço de graveto nas chamas.
- Continuar de onde meu pai parou. Ram respondeu. – E ela será o
meu bônus.
Eles ficaram conversando em frente à fogueira. Enquanto isso na
igreja da cidade, vó Augusta despedia-se de padre Santiago. Algumas
vezes depois da missa ela se trancava na sala com ele e ficavam
conversando por muito tempo.
- Boa noite Santiago.
- Boa Noite Augusta.
A noite passou tão rápido que Dina não acordou com o som do
despertador pela manhã. Ela só acordou quando sentiu o colchão
balançar com o peso de mais um corpo sentando sobre ele.
- Acorde querida. Vó Augusta passava as mãos pelos cabelos dela. –
Vai chegar atrasada na escola. – Não era hoje a pesquisa na floresta?
- A pesquisa? Levantou a cabeça se perguntando que horas eram. –
Tenho que sair rápido. – Que horas são?
Sem ficar para esperar a resposta da avó, Dina correu para o
banheiro. Passando alguns minutos ela já estava pronta na cozinha
engolindo freneticamente o café da manha. Anja também estaria
atrasada já que ninguém ouviu baterem na porta.
- Anja telefonou querida. – Ela disse que encontraria você na porta da
escola.
Dina agarrou nas alças da mochila e escorregou para fora da casa tão
rápido que mal conseguiu se despedir da avó. Vestida com uma calça
verde musgo e regata branca ela partiu a caminho da escola. Quando
finalmente conseguiu chegar toda a turma estava do lado de fora do
portão e a professora organizando os grupos.
CLASSE ATENÇÃO, VAMOS CAMINHAR ATÉ ENTRADA DA FLORESTA
NA PARTE NORTE DA CIDADE. UMA VEZ QUE ESTIVERMOS DENTRO
DA MATA, TODOS TERÃO QUE FICAR JUNTOS SEM SAIR DA TRILHA.
- Trilha? Dina pensou. – Mas eu pensei que a pesquisa não seria
dentro da floresta. - Anja?
- Eu não tenho nada haver com isso. – A ultima vez foi no campo.
- A professora quer que a pesquisa seja num ambiente mais real.
Respondeu Carla se aproximando das meninas.
CLASSE, VAMOS COMEÇAR A ANDAR. FIQUEM PERTO E NÃO
ABONDONEM SEU GRUPO.
A turma seguiu andando pelas ruas até o lado norte da cidade onde
começava a floresta. Avistando a trilha a professora orientou que
cada grupo formasse uma fila indiana enquanto estivesse na trilha.
Dina estava à frente do grupo e quando ia passar o pé no mato
Lorena avançou na frente batendo seu ombro em Dina fazendo-a
desequilibrar.
- Ei, olha por aonde anda. Dina se recompôs.
- E se eu não olhar? Respondeu Lorena. – Vai fazer o que?
Dina não estava com paciência para tolerar os insultos de Lorena no
começo do dia. – Eu vou arrancar seus cabelos, sua estúpida.
- Quem você esta chamando de estúpida? Lorena virou de volta
olhando para Dina com as mãos na cintura.
- Dina, calma. Choramingou Anja. – Não vale a pena. Completou
Carla.
Adan estava atrás de Lorena e quando percebeu que a situação iria
ficar tensa tratou de se afastar o mais longe possível.
- A única estúpida aqui, está com as mãos na cintura olhando pra
mim. Dina se dirigia a Lorena.
- Eu vou mostrar a você quem é estúpida.
As duas se pegaram na trilha e nem mesmo a professora que estava
á frente na fila não pode ver as meninas atracadas. Os outros alunos
da turma que estavam próximos ficaram parados olhando as meninas
brigarem.
Anja não sabia o que fazer para separar as meninas. Carla tentou
puxar Dina e foi arranhada por alguma unha. A briga estava igualada
para as duas até que Dina conseguiu empurrar Lorena pelo queixo
fazendo-a cair sentada na trilha, Adan observava de longe. Dina
ajoelhou sobre Lorena e segurou a gola da camiseta dela.
- Nunca mais me provoque. Dina a ameaçou.
- Solte ela Dina, por favor. Pediu Anja.
- Me larga sua órfã selvagem. Esbravejou Lorena.
Dina queria agredir Lorena, mas quando viu que os alunos estavam
olhando e Anja implorava atrás dela, levantou e deu espaço para a
outra levantar.
- Nunca mais me provoque.
Carla sorrindo arrastou Anja e Dina através da trilha deixando Lorena
pra atrás.
- Não sei por que essa menina me persegue. – Não sei por que ela
vive me chamando de órfã.
- Ela é louca. Respondeu Carla. – Ela também é órfã... De pai.
Anja e Dina ficaram olhando para Carla, curiosas.
- Como você sabe disso? Perguntaram as duas juntas.
- Como vocês duas não sabem disso, pergunto eu. Carla respondeu
enquanto seguia pela trilha. – Todo mundo sabe que o pai de Lorena
morreu na expedição com o Santo.
- Santo? Dina torceu o lábio e franziu a testa para Carla.
- O Santo, meninas... Continuou. – Santo Pedro. – Aloww.
Dina deu de ombros e continuou caminhando pela trilha, Anja ainda
tremia por causa da briga entre Lorena e a amiga. Carla tomou a
frente do grupo na trilha enquanto Dina e Anja conversavam baixo
para que ela não percebesse.
- Como você me esconde uma informação dessas, Anja?
- Tudo bem, eu não sabia. – Nunca passou pela minha cabeça quem
foram os filhos das pessoas que morreram na expedição. – Pra ser
sincera eu nem acreditava que essa lenda era verdadeira.
Carla virou para as meninas. – Estamos quase chegando.
A turma toda parou depois de uma caminhada de vinte minutos. Os
garotos estavam falando tão alto que a professora teve que chamar
atenção deles. Dina e as meninas sentaram nas pedras fora da trilha.
Cada grupo possuía um binóculo e uma prancheta para fazer as
anotações.
A vegetação baixa estava misturada aos grandes troncos das arvores
que eram tão altas ao ponto de tapar toda a luz do sol em cima
delas. Algumas meninas não foram preparadas para a pesquisa
dentro da floresta, seus shortinhos e saias minúsculas não impediram
que mosquitos e outros insetos fizessem a vida delas muito
desconfortável.
O grupo de Dina estava preparado, todas vestiam calças e Carla
levou consigo repetente para as partes do corpo que ficaram fora da
roupa. Os garotos da turma com seus iPods conectados a pequenas
caixas de som interromperam o silencio da mata, fazendo com que
outras pessoas soubessem que havia gente ali.
Edie estava de pé escovando Xerife, seu cavalo. Edie tranquilamente
passava as mãos na pelagem vermelha de animal. O balançar dos
braços dele fazia sua musculatura mexer de forma majestosa.
Vestindo apenas uma calça velha, desbotada e furada no joelho, Edie
expunha um tronco rígido de abdome impecável.
Toda a tranquilidade do momento acabou no segundo em que Marcos
apareceu afoito respirando forte. Edie olhou para ele ainda
escovando.
- O que foi?
- Tem gente na floresta. Marcos respondeu preocupado. - Não é o clã
de Ram. – Gente da cidade.
Foi a vez de Edie ficar preocupado. Largando o escovão no chão
vestiu uma camisa escura e um capuz cobrindo todo o rosto, só era
possível ver o verde dos olhos dele através do capuz. Pegou sua
espada, algumas facas curtas e saltou sobre dorso de xerife.
- Avise os outros. Ordenou. – Onde está Richard?
Dina anotava tudo que as outras meninas falavam cuidadosamente.
Qualquer planta ou bicho que fosse reconhecido por elas era
protocolado na prancheta. Já passava do meio dia e todos pararam
suas pesquisas para o almoço improvisado no meio da mata. Carla
puxou Dina e Anja para comer um pouco mais afastado onde algumas
pedras formavam uma espécie de mesa com cadeiras. As meninas
abriram suas mochilas e revelaram seu almoço.
- O que tem ai? – Eu trouxe torta salgada. Sem maionese, seca - É
politicamente correta.
- Aposto que Dina trouxe pães de batata. Anja sorriu enquanto
mastigava empanados feitos pela mãe dela.
- Eu trouxe limonada e pão de batata. – Acertou.
As meninas devoravam a comida e ofereciam uma para outra. Entre
uma mastigada e um gole de limonada Dina olhava em sua volta
pensando se Ric estaria por ali. Em meio aquele momento relaxado
todas as três garotas perceberam que um animal se aproximava, era
enorme e seu pelo completamente negro. Anja e Carla congelaram
vendo que o enorme bicho andava em direção a Dina. Soltando um
bufo ele parou na frente dela.
Tobruk abaixou a cabeça e suas narinas se alargaram tentando
aspirar o cheiro do pão nas mãos de Dina. Logo ela percebeu o
interesse do enorme cavalo e lentamente esticou o braço diminuindo
a distancia entre o alimento e a boca dele.
Ric andava ali perto e também percebeu a presença de pessoas
estranhas na floresta. Quando ele finalmente chegou próximo onde
Dina estava com as meninas, Tobruk ainda estava lá. Temendo pela
segurança delas Ric saltou de trás de uma árvore, Tobruk percebeu o
movimento e assustado levantou as duas patas dianteiras na direção
dele tentando golpea-lo.
Dina se afastou com as meninas enquanto Ric afugentava o cavalo.
Carla ficou totalmente imóvel atrás de Anja enquanto Dina gritava
com Ric.
- Ele não tentou me machucar. Ele só queria comer o pão.
Ric parecia não ouvir uma só palavra que ela dizia e continuou
sacudindo os braços diante de Tobruk na esperança que ele recuasse,
mas por ser o cavalo de Ram, com personalidade tão forte quanto ao
de uma onça selvagem, qualquer tentativa contra sua vontade
parecia ser inútil.
Por muito pouco Tobruk não acertou os cascos na cabeça de Ric. Os
movimentos de esquiva do rapaz eram muito ágeis e ele conseguia
driblar cada vez que o cavalo golpeava ao vento sem sucesso. Foi
uma verdadeira cacofonia de gritos dentro da mata, Dina gritava com
Ric, Ric gritava com Tobruk e o cavalo gritava ao vento dando coices
e golpeando com os cascos dianteiros.
Anja com olhos arregalados aproximou os lábios no ouvido de Carla.
– Venha. Sussurrou. – Vamos rezar.
Carla torcendo os lábios para Anja ignorou o pedido. – Você só pode
estar brincando? . Ela perguntou sem nenhuma resposta.
Em meio a todo o alvoroço, Anja olhava na direção onde estavam os
outros alunos da classe temendo que eles pudessem ter ouvido e
viessem checar o que estaria acontecendo ali, mas quem apareceu no
local foi Céu e Edie montado em Xerife. Quanto Tobruk percebeu a
presença de mais dois cavalos cessou os ataques imediatamente,
soltou seu bufo e disparou mata à dentro.
Com o silencio reestabelecido, Dina se aproximou de Ric para checar
se ele estava ferido, quando deu conta de outro rapaz encapuzado
montado no cavalo vermelho alazão. Edie estava rígido enquanto
olhava para as meninas que o olhavam de volta.
- Quem é esse Ric? Sussurrou Dina, desconfiada sem tirar os olhos
dele e do cavalo.
- Esse é meu irmão Edie. Respondeu esticando o braço sobre o ombro
dela.
Edie ainda rígido retirou o capuz, desmontou Xerife e deixou que as
rédeas deslizassem até o chão. Aproximou-se de Ric olhando fixo
para as meninas, mais precisamente em Carla que abaixou a cabeça.
Ric puxou Dina para próximo do irmão, Anja ficou calada no mesmo
lugar.
- Edie, essa é a Diana. – Esse é meu irmão Edgard.
- Prazer. Dina respondendo com um sorriso torto – Aquelas ali atrás
são Carla e Angélica.
Edie não mostrou nenhum sinal de satisfação ao conhecer as
meninas, virando as costas de volta para o cavalo respondeu
secamente. – O que elas estão fazendo aqui? . Montou de volta em
Xerife.
- O que vocês faziam na floresta Dina? Perguntou Ric curioso não se
importando com a frieza do irmão.
Ela olhou para Edie e ignorou completamente a expressão fria que ele
persistia em exibir. – Estamos fazendo uma pesquisa para escola.
Respondeu. – O resto da classe está mais distante, espero que não
tenham ouvido a bagunça com o cavalo preto.
- Vamos sair daqui. Chamou Edie. – Antes que mais alguém nos veja.
Puxando as rédeas de Xerife, seguiu na mesma direção que Tobruk
havia tomado sumindo por trás das arvores.
- Não liga pra ele Dina. Ric falou enquanto alisava os cabelos
castanhos de Dina. – Ele é muito mal humorado, mas é boa pessoa.
Ric sorriu também para as outras meninas. – Aquele cavalo que lhe
atacou era Tobruk. Ele falou olhando diretamente nos olhos dela. – É
o cavalo do meu irmão, Ramcy.
“O cavalo de Ram”, Dina pensou. – Ele não me atacou, ele só estava
cheirando os pães que eu trouxe de casa, só isso.
- Ele poderia ter matado você Dina. Ric respondeu de volta.
Anja e Carla perceberam que ele e ela iriam discutir um pouco e se
afastaram para dar privacidade aos dois.
- Estou dizendo que ele não me atacou.
- Dina, aqui na floresta também é o território de Ram e seu clã. Ric
parecia serio desta vez. – Ele é mau, o cavalo dele é mau, o clã dele
é mau. Ele engoliu em seco. – Se Tobruk estava aqui, provavelmente
Ram também estava perto. – É muito perigoso estar aqui e eu não
sei o que faria se Ram fizesse alguma coisa a você.
Ric não queria discutir com Dina e preferiu beija-la ao invés de falar.
Dina aceitou o beijo e o abraçou de volta. Eles ficaram algum tempo
abraçados quando as duas meninas voltaram interrompendo o
momento.
- A professora está convocando a classe. Disse Anja. – Nós vamos
voltar para a cidade.
- Devo ir com elas. Falou para ele ainda abraçada. – A gente
conversa mais tarde. Eles se despediram com outro beijo.
As meninas deram um aceno rápido para Ric e voltaram para junto
dos alunos. – Não vamos contar o que aconteceu para ninguém, ok?
Dina falou olhando para Carla.
- Certo, será nosso segredo. Respondeu. Anja somente concordou
com a cabeça.
Chegando ao local onde a classe se preparava para retornar à cidade,
Dina, Anja e Carla recolheram suas mochilas e fizeram o caminho de
volta. Nenhuma das três meninas comentou sobre o episodio na
floresta, assim como o resto dos alunos ficaram calados na volta para
cidade.
Quando a turma toda estava reunida em frente à escola, o dia já
estava quase acabando. Cada um despediu de seu companheiro de
grupo e aos poucos não restava quase ninguém ali.
Lorena e Adan voltaram para casa juntos. Os passos lentos indicavam
que o dia havia sido cansativo dentro da floresta. Lorena parecia não
ter se conformado em perder a briga para Dina naquela manha. – Ela
me paga. Reclamou. – Eu vou descontar a vergonha que ela me fez
passar.
Adan continuou olhando para o chão. – Eu também espero que esse
dia chegue logo. Respondeu.
- Você ainda esta praticando defesa pessoal? Ela perguntou curiosa. –
Não tenho visto mais você pela praça a noite.
- Eu venho treinando todos os dias. – Nunca mais vou deixar que
ninguém me humilhe novamente.
Eles estavam no centro da cidade, estava escuro, já era noite. –
Aquelas lâmpadas são para a festa? Perguntou Adan.
Ela olhou para cima e viu que alguns homens da prefeitura estavam
trabalhando na ornamentação da festa do Solstício. – Sim, deve ser
isso mesmo. Ela respondeu olhando para Adan. – Você já tem um
par?
Lorena perguntou tão casualmente não percebendo que sem querer,
estava afirmando que poderia ir com Adan à festa. Ela não negaria
que Adan era um rapaz muito bonito. Cabelos dourados, olhos claros
e feições dignas de um príncipe. Adan não era tão alto, mas seu
corpo fazia presença em qualquer lugar que fosse.
Seu pai também morreu na expedição que Pedro liderou em busca da
água. Mas assim como os outros, ninguém sabia exatamente sobre
como eles haviam morrido. Se quer foram encontrados os corpos dos
pais de Lorena e Adan.
- Então? Você já tem um par para festa? Perguntou Lorena na porta
de sua casa.
- Ainda não. Respondeu ele. – Vamos juntos? Perguntou a ela.
- Vou pensar. Ela deu um sorriso rebelde para ele quanto abria a
porta de casa. – Boa noite Adan.
Ele ficou sorrindo sozinho enquanto a via bater a porta atrás de si.
– Boa noite Lorena.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Segredos na igreja
13
Três dias se passaram...
Dina degustava tranquilamente seu desjejum enquanto vó Augusta
terminava de lavar a louça da primeira refeição do dia. Era uma
manhã fresca de sábado e todos os moradores da pequena cidade
esperavam pela grande comemoração do Solstício de inverno que
aconteceria em poucos dias.
- Quando vai pegar seu vestido querida? Vó Augusta perguntou
enquanto secava as mãos no avental. – Já deve estar pronto.
Dina respondeu olhando pela janela pensando há quantos dias ela
não falava com Ric. – Essa semana, eu acho. – Anja vai comigo fazer
a ultima prova.
A avó da menina assentiu com a cabeça e se dirigiu para fora da
cozinha deixando o avental na mesa em frente à neta. – Vou à igreja
falar com padre Santiago querida. – Provavelmente voltarei na hora
do almoço. – Você vai encontrar Angélica hoje? Dina saiu da cozinha
e foi em direção à escada. – Sim vó.
Subiu correndo os degraus e quando já estava dentro do quarto olhou
pela janela. Lá embaixo não havia ninguém olhando para cima,
esperando ela aparecer. “Onde Ric estaria?” Ela pensou. Meio minuto
depois ela estava trocando a calça do pijama pelo shortinho jeans e
camiseta de algodão. Mergulhou os pés no tênis e desceu correndo a
escada. Vó Augusta já havia saído para a igreja. “O que ela foi fazer
lá a esta hora da manha?” Pensou.
Quando abriu a porta ela pode observar que os pássaros
cantarolavam pendurados nos fios de energia assim como nos galhos
das arvores. Cada passo dado ela podia ver as pessoas com a alegria
estampada em seus rostos. As ruas estavam ficando bonitas com as
ornamentações temáticas para a festa.
Passando pela porta da igreja, Dina se dirigiu para casa de Anja.
Enquanto isso vó Augusta de reunia com padre Santiago na sacristia.
- Como estão os preparativos para a festa, Santiago? Ela perguntou.
- Você sabe o que eu penso sobre rituais pagãos. Respondeu com um
sorriso. – Mas acho que a tudo vai ficar muito bonito por aqui.
Augusta puxou a cadeira e sentou perto do padre. Soltando um longo
suspiro ela começou a falar.
– Dina uma vez me perguntou sobre a casa dos Baleares, eu disse a
ela da melhor forma que ela não deveria ir lá. O padre se sentou
próximo a ela e continuou ouvindo o que ela dizia. – Conheço minha
neta e tenho certeza que ela foi mesmo assim, e levou Angélica com
ela.
O padre pensou por um momento antes de responder. – Lá não
existe nada que possa fazê-la pensar ao contrario Augusta. Tudo
ficou perfeito. – Até os túmulos são perfeitos.
- Mas se ela cavar os túmulos, se ela descobrir? Augusta estava com
as duas mãos cruzadas em frente ao peito. – Eu não consigo falar
com o Doutor, achei que o psicólogo seria a melhor opção para
proteger Diana do passado terrível que aquele homem provocou na
cidade. – O barão quem deveria ter morrido e não o Pedro.
O padre consolou Augusta. – Eu sei que foi errado o barão ter
derrubado a casa de propósito. – E eu também sei que foi errado ele
ter forjado a morte de toda a família e se escondido na floresta todos
esses anos. O padre levantou os olhos para a imagem de Cristo
crucificado.
– Mas eles não devem estar vivos, quem conseguiria viver na floresta
todos esses anos? Existem animais, existem doenças na floresta e
eles nunca mais fizeram contato. Ele voltou o olhar pra ela. – Estão
mortos.
- Eu vi Ramcy com Diana outro dia. Augusta revelou ao padre.
- O que? – Não pode ser você tem certeza? O padre não podia
acreditar no que a avó de Dina estava afirmando. – Ramcy era o filho
mais velho do barão.
- Ele mesmo Santiago, o primogênito de Celina está vivo e
conversava com Diana na minha porta em plena luz do dia.
Foi a vez de Augusta levantar e tocar na imagem de Cristo. – Eu
estava limpando a janela e reconheci o rapaz de longe. – Fiquei
atordoada e deixei o balde cair. – Tenho certeza de que o balde
atingiu um deles e quando desci, Diana estava completamente
intacta. Augusta tremia enquanto falava. – Ramcy não estava mais
lá.
- Calma Augusta.
- Mas que calma você quer que eu tenha Santiago? Ramcy se
apresentou a minha neta com outro nome. – O barão está tramando
alguma coisa, ele vai fazer alguma coisa com a minha neta. –
DIABOS.
O padre alcançou as duas mãos nos ombros dela. – Eu sei que você
está nervosa, mas não esqueça que você esta na casa do Senhor. –
Eu vou tentar entrar em contato com Cipriano, fique calma mulher.
Augusta estava chorando temendo não só que Diana descobrisse
sobre a fraude da casa Baleares, mas também que ela pudesse correr
risco de vida. – Ele virá atrás de nós Santiago, ele virá atrás de mim.
- Ele nunca perdoou nós termos ficado do lado de Pedro. – Aquele
demônio dizia que o nosso santo tentou matar ele depois que matou
toda a expedição.
Ela enxugou as lagrimas enquanto continuava a desabafar com o
padre Santiago. – Tudo por causa da água que o Santo Pedro
descobriu. Agora ele quer vingança. Já passaram quase dez anos,
mas eu me lembro como se fosse ontem.
O barão foi o primeiro a retornar da expedição em busca da água. Ele
estava sujo e com as roupas rasgadas, não falava coisa com coisa.
Quando saiu da floresta sozinho todos perguntaram sobre os outros
homens que viajaram com ele, mas ele só sabia dizer que estavam
mortos. O barão ficou trancado em casa, isolado da cidade por dois dias
até que o professor Pedro saiu da floresta. O pobre Pedro lamentava
muito sobre a grande perda na busca da água. Ninguém aqui na cidade
acreditou que a lenda pudesse ser verdadeira, as pessoas preferiam
acreditar que Pedro era um santo, mas ele insistia em dizer que a lenda
era verdadeira enquanto o barão dizia ser falsa. As pessoas ficaram
divididas entre as duas versões e optaram que verdadeira ou não, Pedro
era um verdadeiro santo.
- Eu sempre a creditei que ele era e sempre será um santo.
Depois que ele saiu da floresta e confirmou a morte de todos os outros
membros da expedição, a cidade ficou em luto coletivo pelos pobres
homens que morreram na floresta. Pedro começou a fazer pequenos
milagres, ele curava os ferimentos das pessoas, a própria mãe de
Angélica que nunca pode ter filhos engravidou.
Foi sorte ela não ter morrido porque as outras mulheres que
engravidaram na mesma situação morreram depois que seus filhos
nasceram esse foi o maior dos milagres. A baronesa gostava muito da
mãe de Angélica, comprava todos os bordados dela.
- Celina contou tudo a você não foi Augusta? Perguntou Santiago.
Sim, quando o barão levou a família forçada para a floresta, Celina
enviou mensagem através de um empregado de confiança dizendo que
estava bem e que estava viva na floresta. Foi um tremendo susto que eu
levei quando o empregado me mostrou o bilhete, eu mesma achei que
era mentira, só acreditei quando ela falou sobre um ingrediente secreto
que eu coloco na receita do pão de batata. A partir daí eu agradeci a
Deus por ela e a família estarem vivos.
Eles estavam todos vivendo escondidos na Aldeia de Santo Pedro dentro
da floresta. A mesma que era mencionada na historia pelo próprio Pedro
antes de morrer.
- Eu juro que pensei que o barão matou nosso santo, mas quando
encontraram o corpo dele queimado por velas dentro de casa ao lado
de um bilhete escrito pelo próprio punho, conclui que ele preferiu
estar perto do Nosso Senhor.
- Suicídio é contra as leis da bíblia.
- O barão e Pedro eram tão amigos, nunca entendi por que eles não
se falaram mais desde que voltaram da expedição. Suspirou vó
Augusta.
Meses depois Celina conseguiu sair da floresta, nós nos encontramos
aqui mesmo, foi a ultima que nós a vimos. Ela revelou que foi Juan, o
barão quem estava por trás dos desaparecimentos dos meninos da
cidade. Celina disse que o barão estava transformando a Aldeia de
Santo Pedro em uma grande fortaleza povoada por guerreiros treinados,
ele estava ficando louco.
Padre Santiago pegou nas duas mãos de Augusta. – Tudo vai ficar
bem. – Vamos resolver isso sem precisar fazer qualquer alarde.
Augusta estava inconsolável. – Ele voltou para fazer tudo de novo
Santiago.
***
Dina e Anja passaram o dia inteiro juntas. Anja ensaiou passos da
coreografia que iria tocar na festa para os casais dançarem juntos na
frente dos juízes. Anja era graciosa, mas Dina parecia ter dois pés
esquerdos.
- Mais uma vez Dina, por favor. Anja precisaria de muita paciência
para ensinar Dina. – Agora... Um, dois, vai à frente... Um, dois, volta
a trás.
- Eu já devo ter feito isso umas mil vezes e ainda não aprendi. Dina
sentou. – Melhor a gente parar por hoje.
- OK, você quem sabe. – Mas vamos treinar mais amanha
combinado?
Dina concordou com a cabeça passando as mãos nos pés, estavam
doloridos de tanto treinar com Anja. – minha avó saiu hoje de manha
para a igreja. – O que será que ela queria falar com o padre?
Anja se desmontou nas almofadas ao lado da amiga e ligou o mp3
nas caixas de som. – Eu não faço ideia, talvez ela esteja se
confessando ou programando algum curso para o próximo verão. O
som que saltava das pequenas caixas estava em volume baixo mais
pode chamar atenção de Dina.
- Eu adoro essa musica Anja. – Me faz lembrar Ric. – Não o vejo há
vários dias. Ela deitou a cabeça na mesma almofada da amiga. –
Como vou falar com Ric sobre a nós irmos juntos a festa se não sei
onde ele está. - Será que devo ir na floresta procura-lo?
Anja se levantou e andou até a porta principal da casa. Os ouvidos da
loura eram simplesmente ótimos para perceber as coisas. – Acho que
ouvi alguém bater palmas lá fora. Dina ficou esperando deitada nas
almofadas da sala com o mp3 da amiga.
Anja voltou correndo – Dina... Você não imagina quem está lá fora,
adivinha.
Dina deixou cair o mp3 sobre as almofadas e ficou sentada. Seu
coração começou a acelerar esperando que a amiga dissesse as
palavras que ela queria ouvir. Os olhos de Anja estavam brilhando
tanto quanto da amiga correspondendo à felicidade entre elas. – O
Ric está ai fora? - Me diga que é ele.
Anja sorrindo balançou a cabeça para cima e para baixo concordando
com a amiga. – Sim - O gato está ai fora esperando por você amiga.
– Vai lá, o que está esperando?.
Dina levantou por completo enterrando os pés de qualquer jeito nos
tênis. Arrumou as mechas castanhas e no segundo seguinte estava
do lado de fora da porta encontrando os olhos verdes sedutores que
há dias ela não via.
Ric estava olhando para ela com o mesmo sorriso libertino de
sempre, como se ele tivesse se despedido dela na mesma manha
daquele mesmo dia. Ela desceu o degrau da varanda e parou em
frente a ele, agora a distancia entre os dois era menor que um
palmo. O calor do corpo de Ric era capaz de evaporar toda a
transpiração dela naquele espaço, mas ela ficou no mesmo lugar
completamente hipnotizada pelo brilho verde do olhar dele.
Ric segurou Dina pela cintura e trouxe-a para junto do seu corpo e
ela pode sentir de fato todo o calor daquele homem. – Onde você
esteve? Ela perguntou. – Porque você sumiu?
- Eu tive que lidar com Ram, estive procurando ele na floresta.
Respondeu Ric agora com as duas mãos no rosto dela.
- Eu pensei que você tinha se esquecido de mim. Ela sussurrou para
ele.
Ele pousou os lábios nos dela com leveza fazendo com que ela
fechasse os olhos. Delicadamente ele beijou a curva do queixo dela e
sussurrou de volta em seu ouvido. – Eu jamais esqueceria você Dina.
– Você é presença constante nos meus pensamentos.
Ela virou a boca em direção à dele e o beijou forte. Foi um beijo
longo entre os dois. Anja estava observando tudo do lado de dentro
da janela da casa, ela estava sorrindo sozinha pela alegria da amiga.
- Como você sabia que eu estava aqui? Ela perguntou para ele.
- Eu fui até sua casa e as luzes estavam apagadas.
- A casa estava apagada? Dina perguntou. – Minha avó também não
está em casa?
- Não tinha ninguém em casa Dina.
De repente Dina se abateu de preocupação com vó Augusta, já
escurecera e ela ainda estava na igreja, ou ela poderia estar em
outro lugar.
Ric percebeu no mesmo instante a preocupação da garota e sugeriu
acompanha-la até casa. – Vamos à sua casa Dina, eu levo você até
lá. Ele disse. – Céu está aqui perto.
Dina suspirou um segundo se lembrando do passeio com Ric pela
floresta montada em Céu. Foi um momento maravilhoso que ela
gostaria muito de repetir.
– Não vai dar. Respondeu ela. – Antes vou passar pela igreja e falar
com padre, se minha avó estiver lá pretendo descobrir porque ela
passa tanto tempo com ele.
Ric tombou a cabeça para o lado e retorceu um sorriso de resposta a
ela. – Você é uma garota que gosta de fazer as coisas por si própria,
não é mesmo? – Não tem medo de andar sozinha por ai?
- Não, o que pode acontecer comigo? Ela respondeu sorrindo de
volta. – A igreja é logo ali depois das ruas de terra. Nada vai
acontecer comigo.
Ric passou as mãos nos cabelos dela. – Você é incrível Dina, eu
jamais poderia imaginar que iria encontrar uma garota assim como
você. Agora ele estava com as duas mãos nos cabelos dela.
– Você me faz sentir livre e me ajuda esquecer o pesadelo da floresta
e do meu passado. Já com o corpo encostado ao dela, mal havia
espaço entre eles. – Sinto que com você eu poderia sair daqui, dessa
cidade. Ele a beijou.
Depois que Ric sumiu na floresta, Dina despediu de Anja e caminhou
pelas ruas semi-iluminadas em direção à igreja. Fazia frio e ela havia
deixado o cardigan junto com a bolsa na casa de Anja.
Ela envolvia seu corpo com os próprios braços, a respiração estava
mais ofegante. À medida que ela apressava os passos percebeu um
vulto na outra calçada.
Uma imagem escura que destoou na pouca iluminação que dividia
espaço com a folhagem, a calçada estava encostada na floresta, um
local muito convidativo para que algum animal ou pessoa com más
intenções surgisse inesperadamente.
Dina apressou os passos, estava quase correndo quando escutou um
bufo e parou. Imóvel, virou a cabeça lentamente e depois o corpo
deparando com a imagem de um animal grande e negro.
“É o cavalo de Ram”, ela pensou. “Ric disse que o nome dele é
Tobruk”.
Menos tensa, Dina virou de volta e continuou a caminhar. Tobruk,
majestoso, seguia atrás dela lentamente. Os quatro cascos no chão
soavam uma melodia pertinente, e a garota começou a ficar
preocupada.
Dina virou novamente para o cavalo, o movimento assustou o animal,
mas sua reação foi bufar forte para ela. Ele arrastava uma pata
dianteira no chão provocando um som arranhado com o casco.
Ela ficou absolutamente imóvel, quase não respirava de tanto medo
que estava sentindo.
Deslizando as pernas para o lado Dina caminhou lateralmente, tão
lento que quase não se percebia que ela saia do lugar, Tobruk a
olhava com desconfiança. “Calma Dina.” Pensou consigo mesma.
“Lentamente, vire-se e ande com calma”... Ela começou a correr em
direção a sua casa, que não estava muito longe.
Sem olhar para trás era possível ouvir o som dos cascos galopando e
cada vez chegando mais perto. “Ele é mau, o cavalo dele é mau...”
Ela pensava nas palavras que Ric dissera.
Quase na porta de casa Dina tropeçou, mas dessa vez não caiu,
conseguiu equilibrar e continuou correndo como se sua vida
dependesse disso. Talvez dependesse.
Ao alcançar a maçaneta ela lembrou que deixara sua bolsa na casa
de Anja, com a chave dentro. Tobruk já estava a um metro de
distancia dela. Com medo do monstruoso animal, Dina grudou as
duas mãos no rosto e virou para a madeira antiga da porta, Tobruk
alongou o pescoço e com as duas narinas enormes, começou a
cheirar Dina. Cheirou as costas causando cócegas na garota, depois
subiu para o cabelo e, finalmente estacionando no bolso do short
jeans que ela vestia.
Mais aliviada ela virou-se cautelosamente e deixou que o cavalo a
cheirasse. – O que você quer? Ela perguntou. – Gostou do meu
cheiro? O cavalo tentava sem sucesso enfiar a língua dentro do bolso
do short dela.
Dina, muito cuidadosa, escorregou a mão devagar e mergulhou no
bolso trazendo para fora migalhas de pão de batata. “O pedaço que
caiu no chão na casa de Anja” ela pensou. “Eu enfiei no meu bolso ao
invés de jogar no lixo, é isso que ele quer.” Ela concluiu.
Tobruk lambeu as migalhas de pão na mão dela e quando acabou
soltou um bufo. – Você quer mais? Ela perguntou. – Vou pegar mais
lá dentro, assim que minha avó abrir a porta.
Após algumas batidas ela se conformou que não havia ninguém em
casa, e o cavalo não parava de cheirar e bufar para ela. Dina já
estava ficando nervosa diante da expectativa do animal, já não havia
mais migalhas em seu bolso e ele se mostrava cada vez mais
agitado.
Quando o desespero estava aparente, Dina temia que o cavalo a
mordesse. Ela pensou em tirar o short e deixa-lo no chão para
distrair o animal. “Isso é ridículo” ela pensou, “não vou ficar de
calcinha na porta de casa por causa de um cavalo que gosta de
comer pães”.
Foi ai que Tobruk começou a mordiscar as alças do short dela, o
desespero a dominou totalmente e ela começou a abaixar o short,
tirou uma perna após a outra ate estar completamente, só de
calcinha.
Deixando o short caído no chão, sendo inspecionado por Tobruk, Dina
foi andando de vagar pela da lateral da casa, “espero que ele não
venha atrás de mim” ela não parava de pensar.
Com toda a sua atenção voltada para o cavalo destruindo seu short,
ela já estava alcançando a rua dos fundos da casa, mas Dina só
percebeu que não estava sozinha quando esbarrou em Bob.
- Ahhhhhhhhhhhh. Gritou de susto
- Calma, sou apenas eu. Falou Bob tranquilamente enquanto Dina se
recompunha do susto. – O que houve? Ele perguntou.
Pensando em como iria descrever a razão por ela estar do lado de
fora da casa vestindo blusa e calcinha ela falou sem pensar - Tem um
cavalo na porta da minha casa, ele é perigoso. Ela sabia qual era o
cavalo e a quem ele pertencia. – Fiquei com medo e vim aqui atrás.
“Não acredito que eu disse isso” ela pensou.
Levantando uma sobrancelha enquanto olhava para ela de forma
curiosa. – E você veio aqui atrás desse jeito? Ele apontou o indicador
para baixo da cintura dela. – Vermelha é uma cor muito bonita. Ele
ignorou completamente o fato dela ter dito que um cavalo estaria na
porta da casa dela.
Foi a vez das bochechas de Dina ficarem vermelhas. – Ai merda, não
olhe, vire pra lá. Falou vergonhosamente enquanto tentava puxar a
blusa mais abaixo tentando esconder o que ele já havia visto. “Como
ele apareceu aqui?” Pensou. “Ai que vergonha, isso não pode estar
acontecendo”.
- É a segunda vez que você me mostra suas roupas intimas. Ele
soltou um risinho maldoso enquanto olhava para ela. – Primeiro da
cintura pra cima e agora da cintura pra baixo. – Está tentando me
seduzir? Foi a primeira vez que Bob pareceu ser um rapaz normal.
Dina já não sabia mais o que fazer e resolveu voltar para a porta de
casa. “Antes o cavalo me ver seminua do que ele”, concluiu.
Bob retirou a blusa revelando toda a musculatura por baixo dela,
Dina por um segundo esqueceu a situação e passou os olhos no mapa
musculoso do tronco dele. Era simplesmente lindo, perfeito.
Quando caiu em si, seu rosto ficou corado novamente enquanto Bob
entregava sua blusa a ela num gesto de solidariedade.
- Pegue, é mais comprida do que a sua. Ele voltou a ficar serio
novamente.
- Obrigada. Ela vestiu a blusa dele rapidamente. – Quando o cavalo
sair de lá eu entro e devolvo sua blusa.
- Não tem nenhum cavalo lá Dina. Ele apontou para a entrada da
casa dela. – Cavalos não perambulam pelas ruas a essa hora da noite
e não ficam na porta das casas das pessoas.
“Não tem cavalo?” Ela pensou. “Mas tinha um cavalo enorme lá na
porta, o cavalo de Ram”. Ela avançou em direção a entrada da casa
encontrando apenas o short mordido no chão. “Ele foi embora”
Concluindo que era melhor não explicar mais nada à Bob e esquecer
a historia do cavalo, ela o agradeceu. – Obrigada pela camisa, eu
devo ter me enganado. – Acho que foi um cachorro. Ela bateu na
porta depois que percebeu que as luzes internas estavam acesas. Sua
avó, enfim estava em casa.
Bob estreitou os olhos em direção a ela. – Você confundiu um
cachorro com um cavalo? Ele perguntou entendendo que ela estava
escondendo o que tinha visto. – Parecem ser de tamanhos diferentes.
Dina tentou explicar o que parecia inexplicável. – Eu devo ter
confundido, foi de repente... O cachorro me assustou.
- Deve ter sido um cachorro bem grande.
Ela pegou o short no chão enquanto vó Augusta caminhava na casa
em direção à porta. – Obrigada mais uma vez, mas só vou devolver
sua camisa quando você devolver a minha. Ela tentou mudar o
assunto
- Tudo bem. Ele respondeu bem serio. A vó da garota destrancava a
porta – Combinado. Acenou com a cabeça e caminhou em direção as
ruas sumindo na escuridão.
- Oi vó. Ela entrou correndo em direção as escadas.
- Querida isso ai é um vestido?
Dina, bastante nervosa pensou numa reposta convincente para
aquele momento, mas acabou gritando do andar de cima. – Onde a
senhora estava até agora?
- Amanha conversaremos querida. Vó Augusta não sabia o que
responder a neta. Dina já estava em seu quarto sentindo-se mais
aliviada. – Tudo bem vó, boa noite. Trancou a porta do quarto e
retirou a camisa de Bob.
A camisa era de um tecido rústico, parecia ter sido feita a mão. Ela
reparou os pequenos botões de madeira e então aproximou a peça de
roupa em direção ao seu nariz. “Será que tem o cheiro dele?” Ela não
parava de pensar. No mesmo segundo ela afastou a roupa. “Não seja
ridícula Dina.” Ela soltou a camisa no chão, fechou a janela e
caminhou para o chuveiro.
Ram já estava longe suficiente da casa dela. Atravessou para a
calçada próxima à floresta, sua pele clara contrastava com o reflexo
da baixa iluminação que a cidade exibia à noite. Não se ouvia ruído
ou piar de qualquer animal e Ram ficou à vontade para soltar um
pequeno chamado em forma de assobio.
Em poucos instantes Tobruk emergiu da mata e se aproximou de
Ram. Alisando o cavalo com uma das mãos enquanto a outra retirava
pequenas folhas da crina do animal.
– Comparar você a um cachorro não foi legal meu amigo. Ram
montou no cavalo. – Você gosta dela? O cabalo bufou trotando para
dentro da mata. – Quando ela estiver na Aldeia você poderá brincar o
quanto quiser.
Eles galoparam floresta à dentro para encontrar com Edie esperando
na entrada secreta de Santo Pedro.
- É um pouco tarde para uma visita, ainda mais quando não é
desejada. Ram falou primeiro.
Tobruk bufava para Xerife e este o ignorava completamente.
- Tenho percebido que você está perambulando pela cidade. Foi a vez
de Edie falar. – E quanto a historia do perigo da exposição?
- Perambulando não seria o termo correto caro irmão do meio. –
reconhecendo o campo soaria melhor.
- O que você quer dizer com reconhecendo? Edie falava calmamente
enquanto olhava serio para Ram. – Você já conhece a cidade muito
bem.
- As coisas mudaram caro irmão. O olhar de Ram era frio, seguro,
profundo. – Existem pessoas novas morando na cidade, mais
meninos... Garotas que gostam de passear pela floresta.
- O que exatamente você está pensando? – Me fale agora.
- Não é óbvio?
- Diga logo. Edie estava impaciente.
- Está na hora de renovar a população da minha aldeia.
- Sua aldeia?
Ram ignorando a pergunta continuou. – Minha aldeia está precisando
de novos guerreiros e principalmente novas garotas. Os guerreiros
andam muito solitários.
- Você não pode estar falando serio. Edie já havia concluído o
propósito do irmão. – Ele morreu, e eu espero muito que aquele
sonho insano esteja lá, debaixo da terra, junto com ele.
- Nosso pai pode estar morto, mas o desejo dele de fundar um
povoado perfeito, livre de qualquer doença que já existiu, ainda está
bem vivo. Os olhos de Ram brilharam no meio da escuridão. Os
cavalos pareciam mais agitados. – Vou continuar de onde meu pai
parou.
- Você está ficando louco igual a ele. Edie começou a se afastar. – Eu
não vou permitir que você comece todo aquele pesadelo novamente.
- Quem não está comigo é meu inimigo.
Edie puxou as rédeas de Xerife - Então vamos ser inimigos. E os dois
galoparam para longe deixando Ram sozinho com Tobruk.
Ram antes de passar pela entrada secreta olhou para trás e seus
olhos brilharam novamente.
– Pode apostar com isso irmão.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
A cidade se prepara
14
Incrivelmente a cidade começou a ficar a agitada com os
preparativos da festa do Solstício de inverno que aconteceria em
poucos dias. Todos os moradores ajudavam a enfeitar as ruas das
suas casas, até o prefeito da cidade que quase não dava as caras
apareceu com seu discurso memorizado e politicamente correto.
Uma grande fogueira estava planejada para ser montada na praça
principal. Era tradição acender a fogueira pouco antes da meia noite.
As pessoas que moravam na cidade tinham o habito de colocar
bilhetes entre a madeira com pedidos e agradecimentos para que
pudessem ser queimados no momento em que fogueira fosse acesa.
Bandeiras e lampiões eram pendurados nas arvores e nos postes e
ate a igreja ficou bonita. O padre apesar de não gostar nem um
pouco do apelo da festa, organizava barracas com comidas típicas da
região. Tudo estava ficando perfeito e ao que parecia essa festa era
muito esperada.
Infelizmente na mesma ocasião, as pessoas aproveitavam para
homenagear seus mortos, mais precisamente as pessoas que
morreram durante a busca da água milagrosa e as que
desapareceram anos atrás. Todos os parentes dos mortos e
desaparecidos também colocavam bilhetes da fogueira.
Até a escola estava enfeitada, os próprios alunos se encarregavam da
decoração para o evento. Dina e Anja estavam na aula de educação
física treinando com arco e flecha.
Anja não gostava nem um pouco de manusear armas, muitos menos
as antigas. – Não entendo porque a professora gosta que a gente
aprenda a usar isso. Anja largou tudo no chão. – Eu definitivamente
vou reprovar em educação física.
Dina ergueu o arco posicionou a flecha por baixo do anel da corda e
puxou-a para trás usando os três dedos do meio. Quando a corda
estava próximo à sua bochecha, mirou no alvo quase 20 metros de
distancia e disparou. Por pouco a flecha não acertou o alvo central,
mas foi um bom tiro.
A professora e os outros alunos bateram palmas para ela. – Excelente
tiro Diana. Falou a professora. – Que acha de entrar para o time de
arco.
- Obrigada, mas não estou interessada. Dina respondeu lembrando
quando treinava arco com seu pai. Ele frequentava um clube de arco
e flecha antes de morrer no sequestro relâmpago.
- Se mudar de ideia me avise garota. A professora soprou forte o
apito e gritou. – ACABOU NOSSO TEMPO - TODOS PARA O
CHUVEIRO, você não Adan. Ela apontou para o material. – Você vai
arrumar isso tudo.
Adan olhou torto para a professora mais não falou nada,
silenciosamente recolheu tudo e depois encontrou os outros garotos
no vestiário.
Depois que Dina e Anja estavam fora da escola, conversavam com
Carla sobre os vestidos que iriam usar na festa.
- Quem vai ser seu par? Perguntou Carla.
- Eu não tenho um par. Anja pensava em Luccar vestido de traje
combinado com o vestido dela.
- Eu vou com Ric.
As duas garotas olhavam para ela. – Você já falou com ele?
Perguntou Anja. – Quem é Ric mesmo? Perguntou Carla.
Dina ficou um pouco tonta olhando para as duas e respondeu
prontamente. – Ric é o cara da floresta que assustou o cavalo preto,
de olhos verdes. Falou olhando para Carla. - Ainda não falei com ele
Anja, mas falarei hoje.
Carla desconversou e despediu das meninas. – Preciso ir pra casa,
minha mãe está me esperando.
- Xau Carla. – Xau Carla.
As duas meninas que ficaram continuaram conversando depois que a
outra saiu. - Como você vai fazer para encontrar com ele? Perguntou
Anja.
- Eu vou à floresta procurar por ele. Ela respondeu.
- E como você espera encontrar ele na floresta. Anja parecia
preocupada com Dina.
- Eu pretendo ir dentro da floresta, onde fizemos a pesquisa da escola
e simplesmente vou gritar o nome dele.
- Você está louca? Perguntou Anja. Seu coração estava batendo mais
forte. – Você não vai fazer isso, vai?
- Claro que vou, tem uma ideia melhor?
Anja estava certa de que Dina pretendia realmente ir à floresta
procurar por ele, então tentou convencê-la a não ir sozinha. - Irei
junto com você. Ela falou.
Dina não queria colocar Anja em perigo, pois sabia que Ram também
estaria na floresta. – Tudo bem. Respondeu. – Mais tarde eu passo na
sua casa. Dina estava determinada a encontrar Ric, mesmo que isso
significasse contar uma mentira para sua melhor amiga.
No caminho de volta pra casa, depois da escola, elas caminhavam
juntas. Anja tagarelava sem parar enquanto Dina a ouvia
atentamente, em meio às palavras da amiga loura, ela reparou um
homem familiar que caminhava rapidamente por trás de alguns
andaimes na calçada que eram usados para enfeitar a cidade.
Reconhecendo Paulo imediatamente, agarrou no braço de Anja e a
chamou. – Vamos ali comigo, rápido.
- Ir para onde? Perguntou Anja quase engasgada com suas próprias
palavras. – Eu estava no meio da descrição do meu vestido de festa
e...
- Anja, eu preciso correr. Interrompendo a amiga. – Você vem
comigo ou não?
- Eu não posso. Ela respondeu. – Tenho que ir à igreja encontrar
minha mãe, ela esta fazendo os bordados do altar.
- Nos encontramos mais tarde Anja, xau. Dina se despediu não dando
chance de resposta para amiga.
- Aonde ela vai com tanta pressa? Anja nunca entedia a velocidade
com que Dina resolvia as coisas.
Quase na porta da Igreja Anja viu Lucaar na calçada lateral
encostado com os braços cruzados olhando para ela. Naquela hora do
dia ela percebeu o quanto Lucaar era bonito, seus cabelos brilhavam
com a luz do sol e a pele dele era muito branca, contraste perfeito
para seus olhos escuros.
Ela caminhou em direção a ele, seus passos eram temperados e
desconfiados. – Oi. Ela teve coragem de falar. – O que você esta
fazendo aqui?
- Estava passando e resolvi parar aqui para ver você. Ele respondeu
se aproximando dela. – Lhe dar um beijo de boa tarde, talvez. Ele já
estava tão perto que sua mão alcançou uma mecha rebelde de cabelo
louro e escondeu atrás da orelha dela.
Anja de afastou não permitindo que suas mãos fossem além da
mecha de seu cabelo. – Eu não vou beijar você. Ela respondeu.
- Mas poderia. Ele a devorava com seus olhos.
- Não conte com isso. Ela rebateu de novo. – Eu não conheço você,
apenas sei o seu nome e isso não é suficiente para eu beijar você.
- Está indo para igreja. Ele mudou de assunto. – Fez aquela oração
para mim?
Anja abaixou a guarda e respondeu com um sorriso orgulhoso.
– Claro que fiz, mas hoje eu não vim aqui para fazer oração alguma.
Ela continuou. – Vim ajudar nos preparativos para festa.
- O solstício? Ele perguntou.
- Sim, o Solstício. Respondeu caminhando em direção à porta de
entrada da igreja. – Xau Luccar, eu tenho que ir agora.
- Mais uma coisa.
Ela parou no meio da escadaria da igreja e virou-se para ele. – Vai
me pedir para fazer outra oração para você?
- Não. Ele respondeu sério. – Vou pedir que guarde uma dança para
mim no dia da festa. Virou de volta para a rua e foi embora deixando
Anja sem poder falar qualquer palavra de resposta.
Anja piscou duas vezes pensando em dançar com Lucaar na festa,
caindo em si deu de ombros e desapareceu atrás das portas da
igreja.
Enquanto isso, Dina percorria as calçadas onde estavam os
andaimes, na esperança de não perder Paulo de vista. Ele caminhava
tranquilamente não percebendo que estava sendo seguido por ela.
- PAULO. Ela gritou.
O homem parou de andar no mesmo instante em que ouviu seu
nome sendo pronunciado pelo grito da garota. – Diana. Ele disse
abrindo um sorriso sarcástico. – Posso ajuda-la com alguma coisa?
Suas palavras eram quase sussurros.
- Não vai mais fazer analise comigo? Dina se aproximou
ingenuamente do homem. – Sua secretária disse que o senhor sumiu.
- Eu não sumi. Ele respondeu. - Minha secretária não informou
direito, eu precisei viajar e não tive tempo de cancelar as consultas.
- Tá certo. – Quando vejo o senhor então?
Ele acomodou os enormes óculos no rosto. – As consultas estão
canceladas por tempo indeterminado. Ele respondeu.
- Mas Paulo, minha avó disse que...
- Eu telefono para ela depois Diana. Interrompeu. – Agora me deixe
ir, preciso visitar um amigo que está doente.
“Ele está estranho”. Ela pensou, mas fez sinal com a cabeça
parecendo concordar e despediu-se.
- Então está certo, você fala com minha avó e remarcamos quando
estiver disponível.
- Sim. Ele respondeu apressadamente. – Aproveite o Solstício, é uma
bonita festa. Adeus.
- xau. “Com certeza ele é um estranho”. Pensou.
Enquanto voltava pelas ruas adornadas com bandeiras e enfeites, ela
percebeu que estava perto do velho chafariz e lembrou que havia
esquecido completamente de Ric. “Vou à floresta falar com ele”.
Quando ela notou uma imagem branca acinzentada flutuando por
dentro das folhagens próximas à calçada.
“É o Céu”. Ela reconheceu o cavalo de Ric. “Se ele esta por aqui, Ric
também está aqui”. Concluiu que ele estava por perto.
- Céu, venha aqui. Ela chamou o cavalo que prontamente
reconhecendo – a se aproximou. – Bom garoto.
Ela deslizava as mãos sobre o pelo do cavalo sentindo uma conexão
entre os dois. Estava maravilhada em poder tocar naquele enorme
animal. – Você sabe onde está o Ric.
- Desse jeito vou ficar com ciúmes. Ric falou enquanto emergia das
árvores.
Dina abriu um enorme sorriso em resposta a ele. – Ele gosta de mim,
me deixou toca-lo sem que você estivesse aqui.
Foi a vez de Ric se aproximar dela. – Não é difícil gostar de você
Dina. Ele tocou a cintura dela com as duas mãos. – Difícil seria estar
longe de você.
Ela pousou as mãos nos ombros dele enquanto o ouvia falar.
– Eu senti sua falta. Ele disse e finalmente a beijou.
O tempo que eles passaram juntos voou e logo anoiteceu. Dina
resolveu falar com Ric sobre eles irem juntos à festa.
- Sabe que logo estaremos comemorando o Solstício aqui na cidade,
não é? Ela iniciou o assunto. – Você já participou alguma vez?
Ele pensou um pouco antes de responder a ela. – Eu me lembro
vagamente, era pequeno demais para sair sozinho nessas festas,
minha mãe nunca me deixou participar sem que ela estivesse me
acompanhando. – Acho que somente Ram frequentou essa festa.
- Mas você já foi? Mesmo com sua mãe? Ela insistiu.
- Sim, lembro que havia barracas de comidas e uma fogueira muito
grande no centro da praça.
Dina abaixou a cabeça e começou a falar sobre o vestido que ela e
Anja encomendaram. – A costureira está terminando meu vestido.
- Você vai à festa Dina? Com um vestido? Ric pareceu se interessar.
- Sim eu vou com Anja, nós não temos um par e...
- Eu vou com você. Ele a interrompeu antes que ela pudesse terminar
de falar.
- Você quer ir comigo?
Ele alcançou a mão dela e trouxe em direção a sua boca, seus lábios
tocaram a pele dela fazendo-a tremer por dentro. – Nada me deixaria
mais feliz que estar com você no Solstício.
O vento soprava fraco e balançava os cabelos dela lentamente. Dina
se encolheu por causa do frio, mas logo foi acolhida pelos braços dele
em torno de seu corpo. Ela se aninhou na imensidão do peito de Ric e
teve a sensação de que poderia ficar ali para sempre.
Os dois permaneceram sentados no velho chafariz se abraçando e se
beijando. Apenas um poste de luz muito fraca iluminava Dina e Ric.
Quando o acaso parecia estar em favor dos dois, fez a lâmpada do
poste queimar convenientemente.
A única iluminação do local era da lua que não estava na sua fase
mais forte. Ric olhou para Dina e ela pode perceber que seus olhos
estavam brilhando. “Lindos” ela pensou. Com o braço muito forte ele
conseguiu puxa-la para o seu colo e ela não fez nenhuma objeção,
pelo contrario segurou-o pelos cabelos de leve e jogou um beijo
sedutor nos lábios dele.
Ric deslizava as mãos pelas costas dela e o toque dele fez com que
ela sentisse arrepios. Quanto mais eles se apertavam um no outros
mais queriam diminuir o espaço entre eles, que já não existia.
Em meio a toda aquela paixão, Céu se aproximou bufando e os dois
se soltaram com certa resistência.
- O que ele tem? Ela perguntou enquanto Ric acariciava o cavalo.
- Ele sentiu a presença do inimigo. Ele respondeu. – Estão por perto.
- Você tem inimigos? Dina não entendia que o clã de Ram era o
inimigo direto dele, de Edie e de seu clã.
- Dina. Ele se aproximou dela e tocou o arco do seu queixo com as
duas mãos. – Ram e seu grupo são meus inimigos desde o momento
que eu fui embora de Santo Pedro para viver no acampamento
refugiado, Ram jurou que se eu não voltasse para ele e para a Aldeia
ele iria me caçar e me matar.
A partir daquele momento Dina entendeu a preocupação de Ric com
sua segurança e a dela. – Como eu consigo achar você? Ela
perguntou antes que ele pudesse sumir na escuridão da mata.
Ele desceu do cavalo e retornou para ela. – Eu sempre estarei por
perto a partir de agora e vou observar você de longe para garantir
sua segurança. Ele a beijou depois disso e montou novamente no
cavalo.
- Vá para casa, vou vasculhar a área.
Dina voltou para casa e trancou a porta. Andou pelo interior da casa
até achar sua avó lendo um livro tranquilamente na cama.
- Boa noite querida.
- Boa noite vovó. Ela respondeu. – Outro dia a senhora passou muito
tempo na igreja.
Augusta pensou um pouco antes de responder a neta. – Estive
conversando com Padre Santiago sobre os preparativos para a
comemoração. Vou preparar doces para as barracas. Por que o
interesse?
- Nada, é que eu fiquei preocupada com a senhora.
- Como está o seu vestido? Quando fica pronto?
- Anja vai comigo experimentar antes da costureira fazer o
acabamento. Ela sentou ao lado da avó na cama. – Vó, como é essa
festa?
Augusta suspirou olhando para a janela fechada do seu quarto, as
cortinas balançavam com o pouco de vento que passava por ela.
– A festa é uma comemoração muito bonita, querida. O Solstício
anuncia o nosso inverno e simboliza o renascimento. As pessoas da
cidade lembram-se de seus filhos e maridos que desapareceram anos
atrás. Ninguém nunca mais os viu novamente.
Dina abaixou a cabeça e lembrou-se de Ric. “Ele foi uma das pessoas
que desapareceram”, ela pensou, “ele e sua família”.
- Eu preparei pães de batata para você querida, estão na cozinha.
- Obrigada. Ela falou enquanto derramava um abraço apertado na
sua avó e foi para a cozinha.
Parando na beirada da escada que levava para o primeiro andar olhou
para baixo e deu um sorriso. “Dessa vez eu vou me superar”. E ela
desceu as escadas em três movimentos.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Ram
15
Toda a escola estava em ritmo de festa, os alunos ansiosos e os
professores preocupados. Só Dina não mostrava qualquer tipo de
preocupação com o Solstício, ela não parava de pensar em Ric e por
sua vez, Ram também participava dos pensamentos dela.
Anja quando não estava tagarelando estava rezando. Lorena parecia,
mesmo que de longe, ter dado uma trégua e Adan, depois que
começou a praticar defesa pessoal, nunca mais passou por perto. Ele
sempre ficava de longe observando as coisas, a única pessoa com
quem ele falava na escola era Lorena.
- Amanha vamos experimentar nossos vestidos, disse Anja muito
eufórica. – mal posso esperar para vesti-lo, e você? Não está louca
para se ver num vestido de festa?... – Dina, acorde?
Dina parecia estar em outra dimensão. – O que foi? Desculpe-me, eu
não ouvi você falar. – Ric vai comigo sim, já falei com ele.
- Eu disse que amanhã nós vamos experimentar nossos vestidos, eu
não perguntei sobre o Ric, ela retrucou. – Espere ai, você foi à
floresta ontem? Sozinha?
- Não, respondeu Dina. – Ric encontrou comigo aqui na cidade, não
precisei ir procura-lo.
O sinal tocou e os alunos levantaram enquanto a professora tentava
falar. CLASSE, TODOS SABEM QUE HAVERÁ RECESSO DE UMA
SEMANA NA ESCOLA POR CAUSA DO SOLSTÍCIO. APROVEITEM O
TEMPO E NOS VEMOS SEMANA QUE VEM.
Anja adorava quando não havia aula. - Uma semana sem escola, que
beleza. Ela achava que poderia se dedicar mais na igreja, fazendo
orações extras.
- Você é louca, Anja. Dina respondeu torcendo os lábios para o canto
da boca. – Só mesmo você pra falar uma coisa assim, achar bom não
ter aula pra ficar na igreja.
Elas saíram da escola para encontrar o dia cinza do lado de fora. –
Acho que vai chover, falou Anja. – Olhe aquelas nuvens.
Dina olhou para cima, viu o céu em tom cinza e lembrou-se do cavalo
de Ric. – O Céu é assim, cinza, ela disse.
- Geralmente o céu é azul, respondeu Anja. – Mas hoje está cinza por
causa da chuva que vem por ai.
Dina olhou para Anja e lembrou que não havia comentado com a
amiga sobre o cavalo de Ric. – Anja, Céu é o cavalo de Ric, a cor dele
é branco acinzentado.
Anja olhou para ela com sorriso retórico. - Não brinca que seu
príncipe tem um cavalo branco? Perguntou. – Você esqueceu-se de
falar isso comigo? Dando um tapa carinhoso no ombro da amiga.
- Sei lá, acho que foi. E as duas começaram a se estapear uma na
outra como duas crianças brigando por causa de boneca.
Enquanto as meninas trocavam tapas, puxões e beliscadas de
amizade, uma carroça passou por elas e o homem gritou para as
duas abrirem espaço. Elas pularam na calçada quase no mesmo
segundo em que ouviram o grito do homem.
Dina olhou para o cavalo preto atrelado a carroça e o comparou com
Tobruk. “É bem mais baixo e mais magro”, ela pensou. “Claro que
não é ele”. No mesmo momento ela havia se lembrado de que não
comentou com Ric na noite passada, o fato de que Tobruk a seguiu
até a porta de sua casa, claro que se tivesse comentado, não
mencionaria a parte em que ela retirou o short e ficou só de blusa e
calcinha na rua. – Eu preciso contar para ele isso.
- Contar o que? Perguntou Anja.
- Esqueci-me de contar para Ric que o cavalo de Ram me seguiu
outro dia até a porta de casa.
- Cavalo de Ram?
- Tobruk, o cavalo preto da floresta, lembra? Que Ric pensou que
estava nos atacando.
- Agora me lembro. Ele foi até sua casa? Perguntou anja assustada
Dina rapidamente se apressou para ir ao encontro de Ric. – Tenho
que ir, minha avó está me esperando.
- Calma eu vou com você esqueceu que estávamos indo juntas?
Reclamou Anja.
Dina mais uma vez se lembrou que não poderia colocar a vida da
amiga em risco e encontrar Ric representava perigo, já que Ram
poderia estar passeando pela cidade também.
- Anja, vamos nos encontrar mais tarde, ela tentou convencer à
amiga. – Tenho que fazer umas coisas com minha avó, eu me
esqueci de falar com você mais cedo.
Deixou a amiga para trás falando sozinha e andou rápido na direção
de casa.
- TÁ BOM, gritou Anja para Dina. – Nos vemos mais tarde então.
Ao invés de Dina ir direto para sua casa tomou o caminho da rua de
baixo e seguiu direto para entrada da floresta, a mesma que a
professora havia levados os alunos para pesquisa em campo. Dina
percorreu a estreita trilha entre a vegetação. Minutos após ter
entrado na floresta conseguiu chegar onde o grupo da escola havia
parado.
Sozinha e rodeada por arvores e plantas ela circulou o olhar em volta
tentando escolher qual direção ela iria a partir dali. Dentro da floresta
tudo parecia dar em lugar algum e tudo era igual.
As pedras cobertas com uma fina camada verde, folhas secas no chão
contrastando com folhas recém-caídas, troncos de arvores de
diversas espessuras e muito mosquito, ela estava tão decidida em
encontrar Ric para falar sobre Tobruk que esqueceu completamente
de usar calças e aplicar repelente no corpo.
Quando estava no limite da sua paciência Dina simplesmente fez o
que dissera a Anja no dia anterior. Tomou um bom fôlego e quando ia
gritar o nome de Ric percebeu uma movimentação entre as
folhagens.
Novamente ela vislumbrou o que parecia ser a imagem de um animal
muito grande andando pela floresta. Estava claro e ela teve certeza
que o animal realmente era grande e preto. Paralisada ela observou o
animal se aproximar de onde ela estava.
Não havia nenhum local que ela pudesse correr para se esconder, ela
estava completamente cercada por árvores e plantas. O animal se
aproximou e ela o reconheceu imediatamente. Olhou para cima e
pensou em tentar agarrar algum galho de arvore para se defender,
mas nada parecia favorável.
Tobruk saiu da mata fechada e apareceu diante dela. “Oh meu Deus,
eu não tenho nenhum pão de batata aqui comigo”, ela pensou
enquanto caminhava lentamente para trás tentando ficar longe do
cavalo. Tobruk estava inquieto, bufava forte e relinchava, ela nunca
havia escutado o cavalo relinchar. – Calma ai rapaz, ela disse
baixinho para ele. – Só me deixe ir embora.
O cavalo parecia saber o que estava fazendo, cada passa que ela
dava para trás o cavalo dava um passo a frente e balançava forte a
cauda. “O que eu vou fazer agora?” Ela estava completamente
dominada pelo medo do animal, que talvez pudesse atacar com uma
das patas, ou até mesmo morde-la de verdade.
Tobruk sem dar qualquer alarde empinou as duas patas dianteiras e
relinchou forte, foi ai que Dina não se aguentou no lugar e tentou
correr para dentro da mata onde a vegetação era mais densa e talvez
o cavalo não fosse capaz de segui-la.
No mesmo instante que ameaçou correr foi interceptada por um
rapaz vestindo calças pretas e camisa da mesma cor. Ela parou na
sua frente e levantou a cabeça estacionando o olhar no rosto dele.
Era Bob.
Ela estava não agradecida por não estar sozinha ali na floresta com o
cavalo que não percebeu como ele a havia encontrado e o que ele
estaria fazendo lá.
- Bob? Ela falou pousando as duas mãos na própria barriga, todo o
medo que ela estava passando fez com que sentisse dores
abdominais. – Cuidado com o cavalo, vamos correr pra dentro da
mata.
Bob estava calmo e impediu com o seu corpo que ela tentasse dar
mais um passo tentando fugir. – Calma Dina viu outro cachorro? Ele
perguntou.
- Não, dessa vez é serio Bob, o cavalo é perigoso saia da frente,
VAMOS LOGO.
Tobruk se aproximou obrigando Dina a recuar... Agora era Bob que
estava perto do cavalo e ela sentiu que ele estava em perigo. –
Cuidado Bob, não se mexa. Ela levantou os braços para o alto
tentando chamar atenção do cavalo para que o rapaz pudesse
escapar do animal.
- Dina, ele não vai atacar. Bob respondeu. – Ele só ataca quando está
em perigo... Na maioria das vezes.
Dina não estava entendendo por que Bob estava agindo daquela
forma, ele não parecia ter medo do cavalo, pelo contrario ele parecia
conhecer Tobruk. – O que você quer dizer, ela perguntou enquanto
jogava a bolsa com os cadernos no chão. – Ele não vai atacar?
Bob se aproximou de Tobruk, o cavalo bufou e empinou as patas
dianteiras novamente, dessa vez na frente dele, mas ainda assim ele
continuou se aproximando do animal. “Ele vai tocar no cavalo”, ela
pensou. “Isso é loucura, a menos que...”.
Ela engoliu em seco quando ele passou uma mão na crina de Tobruk
e a outra coçou o focinho dele. “Se ele está fazendo carinho no cavalo
de Ram... Então... Ele só pode ser...” ela pensava.
– Você é o Ram. Ela finalmente disse as palavras quase sufocadas
pelo nó em sua garganta.
- Muito Bem Dina. Ram respondeu com um leve sorriso nos lábios. –
Matou a charada.
- Você é o Ram. Ela falava enquanto um flashback passava em sua
mente. – Você me enganou esse tempo todo. Lembrou-se de quando
ele apareceu e levou-a até a porta de casa. - Você mentiu para mim.
Lembrou-se quando o balde caiu em seu braço. – Você... me fez
pensar que era outra pessoa.
- Eu tive que usar outro nome para me aproximar de você. Ele falou
enquanto soltava Tobruk e caminhava na direção dela. – Bob é um
nome que eu odeio, eu poderia ter inventado outro, mas agora que
você já sabe quem eu sou...
- NÃO SE APROXIME DE MIM, ela gritou. – ME DEIXE IR EMBORA.
Ram estava quase um passo de proximidade de Dina quando ela
correu pelo lado para encontrar Ram a encurralando novamente.
- Me deixe em paz, eu não tenho medo de você. Ela falou a mentira
tentando acreditar nela.
Ram segurou Dina pelos braços e trouxe-a de volta para sua frente,
atrás deles estava um grande tronco de uma velha arvore e ela não
teria como sair dali. Ram estava olhando fixo para ela, encarando-a
com seus olhos sinistros em tom que ela jamais poderia descrever.
Sua expressão mostrava que ele estava falando serio. – Você vai
comigo, ele disse.
- NÃO. Ela gritou enquanto olhava nos olhos dele.
- Então não tenho outra escolha, vou leva-la à força.
- Ela disse não, Ram. A voz de Ric ao longe ecoou até os ouvidos
deles. Céu emergia da mata com Ric montado nele. - Solte ela,
agora.
Ram olhou dois segundos para Dina antes que voltar-se para Ric com
a espada desembainhada. Ela pode reparar no brilho da lamina da
espada dele e mesmo com as mãos por cima, conseguiu ver o cabo
preto todo trabalhado. Era uma linda Katana, como a que Ric
empunhava só que muito mais imponente.
Ric saltou de Céu que correu para a floresta a fim de provocar
Tobruk. Os dois irmãos estavam encarando um nos olhos do outro
com os braços rígidos empunhando cada um, sua espada.
Dina estava chocada com a imagem de dois homens que estavam
prestes a lutar entre si, na frente dela. “Eles vão se matar” ela
temeu.
- Ric, cuidado. Ela temia por ele, mas também temia por Ram, ela
não queria ver ninguém sangrar.
Eles chocaram suas laminas, uma vez e depois outra. Ric levantou a
espada e lançou-a sobre a cabeça de Ram sendo bloqueada pela
espada dele. O contra golpe veio no mesmo caminho com muito mais
potencia e agressividade fazendo com que Ric deslocasse todo seu
corpo para trás formando uma ponte, e a espada de Ram passou
direto, ao vento.
Dina estava tensa e não sabia o que fazer correr ou ficar ali era uma
decisão que ela não sabia a qual tomar. Ram usou um golpe marcial
chutando a perna de Ric fazendo com que ele caísse no chão soltando
sua espada.
Ram firmou-se em cima do irmão colocando suas duas pernas uma
em cada lado - Está na hora de você aprender a ultima lição
irmãozinho, disse Ram estocando a ponta da espada na direção da
cabeça de Ric.
Deitado, deslocou a cabeça para o lado tão rápido que a ponta da
espada fincou no chão. – Errou, gritou Ric. Ele estava tão perto da
lamina que pode reconhecer a Corta-Relâmpago nas mãos de Ram. –
Você está tentando me matar com a espada do nosso pai? Ele falou
rangendo os dentes com raiva. – Você está usando *Kaminari Wo Kiru
contra seu próprio sangue?
*Tradução em Japonês para Corta-Relâmpago.
No segundo em que Ram relaxou os músculos, Ric golpeou-o por
baixo agarrando seus ombros revertendo a posição entre o dois. Era
Ram que estava em baixo de Ric, mas isso não o fez entregar a luta,
muito pelo contrário, ele puxou uma segunda arma que
aparentemente estava escondida em sua cintura.
Ric por cima desarmado, forçando Ram sobre o chão que estava por
baixo, espada numa mão e uma faca na outra, Dina ainda não sabia o
que fazer. Ela nunca, jamais, havia presenciado uma luta entre duas
pessoas. “Eles vão se matar”, ela pensou novamente.
Ela tentou procurar por alguma coisa pesada que talvez pudesse
bater ou jogar sobre Ram na tentativa de dar alguma vantagem para
Ric, mas quando voltou à atenção novamente para os dois, eles já
estavam lutando em pé e Ric conseguiu, como ela não soube,
recuperar a sua espada.
Uma segunda pessoa emergiu das arvores, ela não conhecia, mas
sabia que não estava do lado de Ric porque se posicionou contra ele
também desembainhando uma espada. Ela não viu seu rosto porque
estava atrás de um tecido preto, só conseguia-se ver os olhos que ela
nem tentou adivinhar o tom da cor, mas reparou que os cabelos dele
eram lisos, pretos e compridos até quase os ombros.
Lucaar atacou Ric. Eram dois contra um, a luta estava desigual. Dina
ficou ainda mais desesperada do que já estava, ela não podia fazer
nada e isso a estava sufocando por dentro. Ela não sabia lutar com
espadas, não conhecia nenhum golpe marcial para ajudar Ric. “Sou
uma inútil”, ela pensou, “o que posso fazer?”.
Ric já demonstrava sinais de cansaço e Ram estava disposto a matar
o irmão. Mas era Lucaar que desferia os golpes mais fortes, ele
sempre odiou e prometeu acabar com Ric, principalmente depois que
Ric cortou um pedaço de sua orelha em outra luta entre os dois.
Dina estava pensando em arremessar pedras em Ram e Lucaar, ela
estava disposta a ajudar Ric, que já estava ferido, as lâminas dos
dois haviam cortado em três ou mais locais do seu corpo. Quando
Ram conseguiu ferir Ric gravemente no pescoço ela soltou um grito.
– RIC... NÃO.
Tudo parecia estar perdido, Dina chorava baixo sem poder fazer nada
e Ric lutava até as ultimas forças, mas um objeto foi lançado de
dentro da mata aterrissando no ombro de Lucaar fazendo-o deixar
cair sua espada. Edie e o resto do seu clã saltaram por trás dos
troncos das arvores. Ram e Luccar estavam em desvantagem
numérica. Acuados decidiram fugir, mas Ram ainda ficou para
encarar os dois irmãos.
- Hoje foi declarada a guerra entre nós, ele disse. – Vocês não vão
me impedir de continuar de onde meu pai parou.
Ric ainda consciente e não pode ficar calado. – Então é esse seu
plano? Você vai começar o pesadelo novamente? Ele sangrava muito
e Dina se aproximou para ajuda-lo. – Calma, ela disse. – Eu estou
aqui, e eles vão embora.
- O pesadelo só existe na sua cabeça sonhadora, falou Ram. – Vou
duplicar o numero de habitantes em Santo Pedro e vou transformar
todos em guerreiros. Parou um segundo para olhar Dina. – E esposas
de guerreiros.
Ric tentou levantar sem muito sucesso, estava muito cansado e
ferido. – Não se atreva a tocar nela, ele ameaçou Ram. – Vou matar
você se chegar perto dela.
- CHEGA, gritou Edie. – Os idiotas acabam aqui, vá embora Ram, eu
não vou conseguir segurar meus homens por mais tempo.
Todo o clã de Ric e Edie estava a posto para atacar Ram, eles o
odiavam porque o pai dele era o Barão, que os raptou de suas casas,
ainda pequenos e os levou para Santo Pedro.
Ram ajudou a treinar todos e alguns ainda guardavam marcas pelo
corpo feitas por ele. Nem todos puderam usar a água para curar, por
que Ram dizia que as marcas o fariam memorizar e não deixariam
esquecer quem mandava ali.
- SAIA, gritou Edie novamente. - Saiba que não vamos deixar que
você siga em frente com seu plano.
- É mesmo? Perguntou Ram em tom debochado. – Não tem como
vocês estarem em vários lugares ao mesmo tempo. Não quando o dia
acaba tão rápido.
Ram virou para a mata e sumiu nela sem deixar qualquer rastro que
pudesse ser seguido. Edie por sua vez, não deixou que os homens do
seu clã o seguissem.
- Você está bem Ric? Perguntou Edie ao irmão.
- Ele está ferido, respondeu Dina segurando a cabeça de Ric
enquanto eles falavam.
- Edie, você trouxe a água? Perguntou Ric, quase sem poder falar.
Edie ordenou que um dos homens do clã trouxesse seu cantil preso
na cela de Xerife. Abriu a tampa e derramou uma porção da água
sobre a garganta de Ric. Imediatamente a água começou a fazer seu
papel e o ferimento lentamente começou a curar. – Beba um pouco,
falou Edie. – Vai ajudar a curar mais rápido.
Esperaram um momento até que Ric começou a sentir-se melhor, já
podia ficar sentado sem que Dina apoiasse a sua cabeça.
- A culpa é toda sua, falou Edie a ela.
- Desculpe, perguntou Dina. – Como?
- O que você estava fazendo aqui? Ele trouxe você aqui? Edie
perguntou secamente para Dina.
- Não, ele não me trouxe aqui, ela respondeu. – Eu via aqui procurar
por ele, completou.
- Como eu disse a culpa é sua Edie afirmou. – Desde que você
apareceu, só causou problemas na cabeça desse idiota.
- Ei, vai com calma Edie, falou Ric tentando se levantar. – A Dina não
tem nada haver com isso.
- Acho que o idiota aqui é ele, ela respondeu para Ric enquanto
olhava torto para Edie. – Ao invés de reclamar deveria estará
ajudando você.
Edie virou-se para Dina expressando raiva no olhar, ela percebeu que
Edie havia puxado o mesmo tom de cor dos olhos de Ric. Verdes. O
resto do clã se aproximou de Dina e os homens começaram a olhar
para ela, ela teve a impressão que estava sendo observada.
- Você vai ficar parado ai ou vai ajudar o Ric? Perguntou a Edie com
autoridade.
- Você é insuportável, falou Edie.
- Eu tenho personalidade, ela respondeu de volta.
Ric já estava bem melhor e tentou apaziguar a discussão entre Edie e
Dina. – Calma, vocês dois, não briguem por mim. Ele se aproximou
de Dina e abraçou-a. – Obrigado por se preocupar comigo e Edie,
obrigado por chegar na hora certa.
- Temos que ir embora, AGORA, falou Edie sem paciência. – Você vai
lavar ela daqui ou eu levo?
- Eu não vou com você a lugar nenhum, falou Dina se recusando a ir
com Edie. – Prefiro dormir na floresta.
- Como quiser, respondeu Edie virando as costas para os dois
caminhando de volta para o refugio, o resto do clã o seguiu.
- Eu vou leva-la, falou Ric assobiando para chamar o cavalo. – Venha
Dina, Céu desta por perto.
Edie voltou de repente. – Cuidado, eles podem estar esperando
exatamente isso, falou ao irmão.
- Vamos ter cuidado Edie. Eu prometo.
Ric segurou Dina pela mão e a puxou para dentro da mata onde Céu
os aguardava. – O que ele tem contra mim? Ela perguntou para Ric.
- Ele e assim desde sempre Dina. Respondeu Ric enquanto montava
no cavalo. – Sempre tenso e todo certinho, e ele não tem muito
contato com garotas. Ric puxou Dina pelo braço ajudando ela montar
na garupa de Céu. – Ele deve estar com ciúmes por eu estou com
você.
- Ele nunca vai ter uma garota, ela falou enquanto agarrava forte a
cintura dele.
Quando eles chegaram à beirada da floresta próxima a casa de Dina,
desmontaram e continuaram a caminhar a pé. – Eu preciso falar com
você uma coisa. Falou Dina à Ric com uma expressão triste.
- O que foi? Perguntou ele.
- Eu fui enganada por Ram, ela respondeu. – Eu o conhecia, quer
dizer, eu o conhecia por outro nome há bastante tempo.
- Você o que? Ele perguntou enquanto parava em frente a ela.
- Ram se apresentou com o nome de Bob, e nós passeamos pela
cidade.
- Você passeou com ele?
- Passeamos... Algumas vezes, ela respondia as perguntas dele com
ar de arrependimento. – E nós conversamos na porta da minha
casa...
- Ele foi à sua casa? Ric estava perplexo.
- Sim, ele foi, mas só duas vezes. Ela disparou sem pensar. – A
primeira vez foi quando o balde da minha avó caiu em cima dele
contando-lhe o braço, ai eu tirei minha blusa e enrolei no braço
dele...
- VOCÊ TIROU SUA BLUSA PARA ELE? Os olhos de Ric estavam
mudando o tom de verdes para quase vermelhos, e ele rangia os
dentes.
- Retirei, ela respondeu arrependida por ter revelado o episódio do
balde e da blusa. – Mas foi por que ele estava sangrando muito, eu
tentei ajudar, eu não sabia que ele era o Ram quer dizer, eu não
sabia que Bob era o Ram...
- Você tirou a blusa na frente dele, Ric continuava a repetir o fato de
ela ter tirado a blusa. – E a segunda vez que ele foi lá?
Já consciente que não deveria revelar que teria retirado o short, ela
preferiu esconder essa parte. – A segunda vez, foi quando o cavalo
dele me seguiu até a porta de casa.
- Tobruk seguiu você? Ric achou estranho. – Por que ele seguiria
você?
- Eu acho que ele gosta de pão de batata, na floresta, aquela vez que
você tentou espanta-lo, ele havia farejado o cheiro do lanche que eu
levei. Ele foi direto aos pães de batata.
“Pães de batata”, Ric se lembrou de quando Edie disse que a mães
deles fazia pães de batata para os filhos. Ram já era dono de Tobruk
e deve ter dado para ele comer. “Ele cresceu e lembrou-se do gosto,
por isso foi atrás dela”. – Dina, não ande mais por ai com pão na
bolsa.
Ric estava irritado com o fato de Ram ter se passado por Bob para se
aproximar de Dina e mais irritado ainda com o fato dela ter retirado a
blusa para estancar a ferida dele. – Ele usou a água na sua frente?
Perguntou Ric. – Quando você retirou a blusa na frente dele. Ele
odiava isso.
- Não, por isso mesmo que eu retirei minha blusa, ele estava
sangrando e eu tentei ajudar. Ela colocou as mãos na cintura e olhou
para ele com raiva. – Richard Baleares, vamos esquecer a parte que
eu retirei minha blusa, por favor.
- É difícil esquecer esse fato, ele retrucou. - No outro dia, lá no algo,
você ficou envergonhada em tirar a roupa na minha frente e...
- QUER PARAR, ela gritou com ele.
- Tá bom.
Eles ficaram calados um segundo, cada um olhava em uma direção
diferente. – Ric me desculpe, ela quebrou o silencio. – Eu não contei
nada para você porque julguei o fato sem importância. Ela olhou para
ela enquanto ela continuava a falar. – Além disso, eu nunca tive
qualquer empatia com ele, pelo contrario, ele me causava medo, um
medo que eu não sabia de onde vinha.
- O Ram causa medo nas pessoas desde pequeno, Ric respondeu. – O
esporte preferido dele era aterrorizar quem estivesse ao lado dele.
- Então, por isso mesmo que eu o ignorei completamente, ela disse. –
Bob, digo Ram, aparecia do nada e nós conversávamos um pouco,
depois ele ia embora, nada mais.
- Sobre o que vocês conversavam?
- Sobre nada, ele perguntou onde eu morava, e depois perguntou se
eu iria à comemoração do Solstício. Nada importante.
Ric achava muito estranho Ram se aproximar de Dina sem nenhuma
razão. – O que ele quis dizer antes de fugir? Ela perguntou. – O que
ele quis dizer quando mencionou que o dia acabaria rápido?
- Eu não faço ideia Dina. Ele deixou escapar uma pista, mas eu não
sei o que ele quis dizer.
- Bem, quando o dia acaba, já é noite, certo? Ela concluiu. – Mas os
dias acabam sempre na mesma hora...
- Não no Solstício de inverno, ele a interrompeu. – É quando a noite é
mais longa... Espere, Se a noite é mais longa, então...
- O dia é mais curto, Dina completou a frase de Ric. – É isso.
- Ram vai atacar a cidade no dia da comemoração do Solstício. Ric
matou a charada. – Dina, você não pode ir nessa festa, vai ser
perigoso.
Dina arregalou os olhos e lembrou-se de sua avó perguntando sobre
o vestido e também se lembrou de Anja que estava muito feliz com a
festa que iria acontecer. – Ric, as pessoas que eu amo vão estar na
festa, minha avó, Anja. Eu não posso deixa-las correrem risco.
- Mas você é quem não pode correr esse risco, ele segurou nos
ombros dela com as duas mãos. – Ram atacará a cidade com seu clã,
vai querer levar você, vai rapta-la e leva-la para Santo Pedro. Como
meu pai fez com nossa família, como fez com minha mãe.
- Calma Ric, ela o interrompeu. – Isso não vai acontecer.
- Como você sabe? Ele continuou. - Meu pai fez isso e Ram vai fazer
isso com você também. Vai leva-la a força para Santo Pedro, vai
obriga-la a beber da água e você nunca mais poderá sair, não só da
aldeia, mas da floresta e estará aprisionada para sempre.
Dina não havia pensado e tão pouco analisado as consequências por
aquele ângulo. Realmente ela não gostaria de ficar aprisionada em
qualquer lugar que fosse e muito menos por um homem como Ram.
Por outro lado ela não podia abandonar as pessoas que ela gostava,
seus amigos. Ela precisava fazer alguma coisa. – Mas você vai estar
lá para me proteger.
Ric olhou para ela e começou a rir enquanto falava. – Você acha
mesmo que eu posso proteger você de Ram e um clã inteiro de
homens maus?
- eu acho que você pode com a ajuda do seu clã e de seu irmão mal
humorado. Ela respondeu de volta.
- Dina não me provoque, você sabe que eu não fujo de uma boa
aventura, ele olhava para ela com um sorriso irônico. – Quer mesmo
fazer isso?
Dina sabia que a resposta certa não era a opção que ela estava
dando a ele, mas ela tinha certeza de que era dever dela proteger a
amiga e a avó das maldades de Ram. – Quero fazer isso. Ela
respondeu.
Quando eles estavam na quase em frente à casa dela, notaram as
luzes acesas. – Melhor eu não passar daqui, sua avó pode me ver.
- Certo, ela respondeu. – Amanha nos encontraremos depois do
almoço, esperarei no chafariz. Ela se despediu enquanto ele se
afastava. – A propósito... Ele virou para ouvir o que ela iria dizer. –
Quem era o outro cara que escondia o rosto? Com cabelos pretos na
altura do ombro?
- Aquele e Lucaar, braço direito de meu irmão. Ele respondeu. – Acho
que o cargo de irmão se encaixaria perfeitamente a ele com Ram,
Fique longe dele.
- Certo.
- Estou falando sério, Dina. Fique longe ele. Ric falou apontando o
dedo para ela. – Há um tempo passado, eu multilei um pedaço da
orelha dele, e ele jurou se vingar de mim. Isso significa fazer mal a
você.
- Tudo bem Ric, não vou me aproximar dele. Prometo. Ela caminhou
até quase perto da porta de casa quando Ric a chamou. – Dina...
Ela virou para ele. – O que foi?
- Se um dia decidir retirar a blusa novamente não se esqueça de me
chamar, ele disse enquanto corria de volta para dentro da mata.
Dina agachou rapidamente e tentou arremessar uma pedra na
direção dele, mas ele já havia sumido. “Miserável”, ela pensou com
graça e sorrisos no rosto. Abriu a porta da casa cuidadosamente e
entrou. Para seu alivio sua avó estava tomando banho e ela pode ir
direto para o quarto.
Enquanto tirava as roupas muito sujas de terra e plantas da floresta,
caminhou até a beirada da janela e suspirou um segundo. Não havia
ninguém lá baixo, na frente da casa e muito menos na rua onde ela
morava. Puxou um lado da cortina e quando esticou a mão para
puxar a outra estreitou os olhos novamente para a rua e pode ver
mais adiante um cavalo preto caminhando tranquilamente ao lado de
uma pessoa, um homem.
“Ram está rondando minha casa”, ela pensou enquanto continuava
observando pela janela. O homem montou no cavalo e, com apenas
um único galope rápido, entrou na mata próximo onde Ric também
havia entrado e sumiu do alcance da visão dela.
“Amanha é outro dia”. Deitou na cama do jeito que estava sem vestir
roupas limpas e sem tomar banho. Ela apenas fechou os olhos e
tentou dormir, os acontecimentos na floresta ainda estavam na sua
memória, a imagem de Ram ferindo Ric não parava de repetir na
cabeça dela.
- Amanha é outro dia. Ela falou alto para si mesma.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Uma manhã de surpresa
16
Já eram quase onze da manha quando Anja abriu os olhos, outra
vantagem de quando não se tem aula, era acordar mais tarde que o
de costume. “Hoje é dia de ir à costureira”, ela pensou. Espreguiçou-
se um pouco mais na cama e levantou de vagar.
Sentando numa pequena cadeira em frente ao espelho que
completava a cômoda, passou a escova nos cabelos loiros e deslizou-
a com movimentos lentos e graciosos. Vestiu uma saia de tecido fino
na medida dos joelhos combinando com uma blusa em tom amarelo
claro, mergulhou os pés nas sapatilhas para encontrar com sua mãe
na cozinha.
- Meu pai chegou em casa muito tarde ontem à noite? Ela perguntou
a mãe. – Ele não foi se encontrar com a senhora na porta da igreja,
não e?
- Filha, ontem nós tivemos um pequeno desentendimento.
- Outra vez? Anja perguntou enquanto bebia um copo de leite.
- Mas já passou. A mãe dela respondeu. – Está tudo certo agora não
se preocupe.
Anja deu um suspiro retórico para a mãe e levantou-se da mesa.
Quando saiu pela varanda da sua casa percebeu que algo estava
estranho. Olhou para as calçadas enquanto andava na direção da
casa de Dina e viu uma pequena aglomeração de moradores da
cidade em frente à casa dela. Uma viatura da policia também se
encontrava no local.
Assustada, Anja começou a correr na mesma direção, “Dina”, ela
pensava, “Aconteceu alguma coisa com Dina ou com a avó dela”.
Chegando quase na porta da amiga, ela avistou vó Augusta do lado
de fora da casa conversando com um policial e o padre Santiago, os
rostos deles não mostravam qualquer satisfação com o que quer que
houvesse acontecido, em alguns momentos vó Augusta escondia a
boca com uma das mãos enquanto padre Santiago tentava consolar.
Anja tentou sem sucesso aproximar-se da casa porque as pessoas
curiosas não davam qualquer espaço para que a loura passar.
- VÓ AUGUSTA, ela gritou. – O QUE ACONTECEU? ONDE ESTÁ DINA?
Vó Augusta virou a cabeça para encontrar Anja, nadando entre a uma
pequena multidão que estava começando a se formar na frente da
casa. – Angélica, respondeu vó Augusta.
- DINA... ONDE ELA ESTÁ?
Anja estava prestes a iniciar uma confusão para tentar se aproximar
da casa quando pode ver entre as pessoas uma figura conhecida de
cabelos castanhos. Dina estava lá, parada na porta perfeitamente
bem, sem qualquer arranhão.
- Dina.
- Anja.
A loura conseguiu, depois de alguns empurrões e cotoveladas chegar
perto de Dina que estava com os braços esticados prontos para o
abraço da amiga. – O que aconteceu? Ela perguntou. – Você está
bem, não está?
- Sim estou bem, respondeu Dina choramingando. – Encontraram um
corpo na mata, próximo a estação rodoviária.
Anja paralisou quando escutou a palavra corpo. – Você quis dizer
uma pessoa morta?
- Isso mesmo, respondeu enquanto limpava as lagrimas que
escorriam pela bochecha. – Quem morreu foi meu psicólogo. Ela falou
pensando nas palavras que Ram disse antes de fugir pela floresta.
“Foi ele”, ela pensou.
- Santo Deus, quem mataria um psicólogo?
Vó Augusta se aproximou das amigas junto ao policial. – Meninas, é
perigoso andar por ai, disse o homem fardado.
- Nós vamos tomar cuidado, respondeu Dina não tão conformada. –
Nós podemos ir agora? Temos hora marcada com a costureira.
- Está tudo bem policial? Perguntou vó Augusta. – Elas podem ir?
- Podem, ele respondeu.
As meninas subiram para o quarto de Dina enquanto o policial se
afastou. Vó Augusta permaneceu ali conversando com o padre.
– O homicídio aconteceu há muito tempo, mas o policial disse que o
responsável ainda pode estar andando pela cidade. Disse Augusta
muito nervosa. – É ele Santiago, é aquele mostro de novo, eu disse a
você que ele iria fazer alguma coisa.
- Calma Augusta, foi a vez do padre falar. – Eu prefiro pesar que foi
ao acaso, uma mera e infeliz coincidência.
- Ele era o medico da minha neta Santiago, isso foi um aviso.
Os dois tentavam conversar baixo sem deixar qualquer impressão
que sabiam informações sobre a morte do psicólogo. As meninas
desceram do quarto e se despediram da avó e do padre.
- Xau vó, disse Dina enquanto passava com Anja às pressas pela
porta da frente. – Vamos ver meu vestido.
- Certo querida, cuidado. O enterro acontecerá antes do anoitecer.
Dina parou um instante e olhou para sua avó com uma lembrança na
cabeça. “Enterro”, ela pensou. Lembrando que antes dos seus pais
serem mortos, a levaram para fazer um tratamento espiritual, ela
mal conseguia passar na frente de um cemitério, quanto menos ir a
um enterro.
- Vó, se a senhora não se incomoda, eu prefiro não ir ao enterro. Ela
pediu com expressão tímida das lembranças do passado.
- Tudo bem querida, não tem problema.
Dina abriu um enorme sorriso para responder a avó. – Obrigada.
Girou nos calcanhares e saiu agarrada ao braço de Anja. – Mas eu
prometo que Anja vai me ajudar a fazer uma oração para o Paulo.
Augusta achou estranho Dina ter mencionado o nome Paulo a ela. –
Você ouviu direito Santiago? Ela perguntou ao padre. - Quem é
Paulo?
O padre coçou a pouca barba e pensou antes de responder. – Eu não
sei quem é Paulo, ela está se confundindo.
- Como pode se confundir com o enterro do medico dela. Não haverá
outro enterro aqui não é?
- Claro que não Augusta, vamos fazer apenas um enterro. De onde
ela conhece esse Paulo? É o medico dela também.
- Santiago, ela chamou atenção do padre. – O psicólogo de minha
neta chama-se Cipriano, eu não conheço nenhum Paulo.
- Então ela deve ter confundido os nomes Augusta, ele respondeu. –
Adolescentes são assim, avoados.
- Pode ser mais ainda estou preocupada que essa morte aconteceu
inesperadamente. Foi ele Santiago, foi o barão quem matou ele. Ela
abrir a porta da casa e convidou o padre para entrar. – vamos tomar
uma xícara de café e falamos lá dentro.
As meninas estavam á caminho da casa da costureira. Antes de tocar
a campainha Dina puxou Anja pelo braço. – Eu preciso falar com
você.
- O que foi? Perguntou Anja.
- Eu sei quem matou meu psicólogo. Ela respondeu à amiga. – Foi
Ram quem o matou?
Anja ficou piscando algumas vezes antes de abrir a boca. – Como
você sabe disso? Ela parecia não acreditar. – Ram é o irmão de Ric,
certo?
- Certo.
-Será que Ric sabe disso?
Foi então que Dina se deu conta de toda a situação. Ric era seu
namorado, Ram era irmão de Ric e Ram havia assassinado
covardemente seu psicólogo. Um momento de angustia assolou seu
coração e imediatamente ela começou a chorar.
- Foi culpa minha, ele morreu por minha culpa.
- Claro que não foi. Falou Anja tentando consolar a amiga. – Você
não tem nada haver com isso. Ela abraçou Dina com força. – pare de
chorar.
Foi a segunda vez que Dina estava com medo. A primeira vez que ela
passou por tamanha emoção foi quando encontrou o tumulo com o
nome de Ric escrito na lapide. Completamente abalada e com medo
do que poderia acontecer dali para frente ela sentou na caçada, Anja
sentou-se junto a ela.
- Calma Dina, vai ficar tudo bem.
- Não vai ficar, Anja. Ela respondeu enquanto secava as lagrimas. –
Eu lhe contei como foi, se não se lembra eu conto novamente.
Quando o barão, pai de Ric, Ram e Edie, achou a fonte da água
milagrosa, queria ficar com ela somente para ele, então ele construiu
uma aldeia secreta no meio da floresta para ficar perto da localização da
fonte dessa água. Só que a aldeia precisava ser povoada então ele
começou a raptar as pessoas aqui da cidade.
Quando as pessoas começaram a desconfiar ele pegou toda a família, e
fugiu para a aldeia escondida na floresta. Como estratégia para que
ninguém desconfiasse, ele derrubou a casa e forjou a morte de todos, a
dele também. Até túmulos ele mandou colocar no fundo do quintal para
dar realidade à falsa morte.
Ele era maluco, maltratava a família, batia nos filhos, Ric me disse que
era esfaqueado pelo pai varias vezes, só não morria por que a água era
usada para curar as feridas. O barrão obrigava as pessoas a beber da
água para não poderem voltar para a cidade.
Mas ele morreu depois de alguns anos e Ram, o filho mais velho tomou
a cidade. Ric e Edie junto com mais alguns homens não concordaram e
fugiram da aldeia para viver no refugio escondido dentro da floresta. Por
isso Ram prometeu que iria matar Ric e quem estivesse contra ele.
- Dina eu me lembro, falou Anja. – Mas não entendo a ligação do seu
psicólogo ao Ram.
- Eu conheci Ram ontem. Dina revelou
- Você o conheceu? Como?
Dina mais uma vez deu um suspiro profundo, quando lembrou que
havia sido enganada por Ram que a fez acreditar que ele era Bob, um
amigo.
- Anja, lembra-se do Bob?
- Claro que eu lembro, aquele gato maravilhoso que você me
apresentou de olhos cor de...
- Anja, ele é na verdade se chama Ram.
- Nossa, que coincidência, ele tem o mesmo nome do... O QUE? Foi a
vez da loura ficar preocupada.
Dina a olhava com um mar de lagrimas nos olhos e lábios apertados,
balançava a cabeça em sinal positivo para a amiga acreditar no que
ela havia pensado sobre Bob.
- Bob é o Ram, irmão de Ric.
- Não pode ser, Dina. Anja se levantou e começou a andar na calçada
de um lado para o outro. – Você ficou perto dele e estava correndo
risco, como você soube?
- Eu fui á floresta ontem sozinha. Ela respondeu e de imediato viu a
decepção no rosto da amiga. – Me desculpe por não ter lhe contato e
não ter levado você comigo.
- Como você pode fazer isso? Você prometeu para mim que iríamos
juntas à floresta.
- Anja, me desculpe. Ela tentou se explicar. – Eu decidi por acaso, e
eu não queria que você corresse algum risco, jamais me perdoaria se
algo ruim acontecesse a você.
- Estou irritada com você. Você me traiu, sou sua amiga.
- Por você ser minha amiga que eu não te levei comigo. Estava
procurando Ric e o Tobruk apareceu, logo depois Bob apareceu, digo
Ram apareceu, e foi ai que eu descobri.
- Estou quase lhe perdoando, continue.
- Ele queria me levar forçada para a aldeia, para Santo Pedro. Ele
queria que eu fosse com ele, mas Ric apareceu e houve luta, Ram
quase afundou a espada na cabeça de Ric, na minha frente. Imagine
se você estivesse lá.
Anja olhou-a com expressão triste depois abriu os braços e enrolou-
os em torno de Dina. – Oh amiga, obrigada por me proteger.
- Quando Ram fugiu, disse que iria continuar a fazer o que o pai dele
fazia quando era vivo. Dina continuou falando. – Ele iria voltar a
raptar pessoas, e deu a entender que iria matar se fosse preciso.
Depois que Anja finalmente entendeu a gravidade sobre o que sua
amiga estava falando não se deixou abalar. – Temos vestidos para
experimentar. Levantou e se recompôs junto à amiga. – Não vamos
deixar que eles acabem com nossa festa. Esticou o braço, caminhou
até a porta e tocou a campainha.
Foi ai que Dina lembrou que não havia mencionado que Lucaar
também estava na floresta ao lado de Ram, e que eles eram amigos.
Mesmo ela não ter conseguido ver o rosto dele, ela precisava alertar
a amiga.
- Anja, tem uma coisa que eu preciso falar com você.
- Tem mais?
- Sim, tem mais. Outra pessoa estava lá com Ram, pertencia ao
mesmo grupo que ele...
De repente a porta se abriu e atrás dela estava a costureira
sorridente em ver as meninas. – Olá garotas, vieram ver
experimentar as belezinha que eu fiz?
Quando Dina deu por si, estava sendo empurrada por Anja para
dentro da casa. Ela não pode falar mais sobre o assunto da floresta,
não na presença da costureira.
As duas puderam reconhecer seus vestidos ali mesmo, na sala.
- Lindos. Disse Anja.
Dina olhou de cima a baixo para o seu vestido verde em tonalidades
claras e escuras. Ela se aproximou da peça e tocou nela
delicadamente. O tecido era fino, macio e ela nunca havia vestido
uma peça de roupa assim. Pela primeira vez ela desejou estar bonita,
e vestida para uma festa, não importava que fosse uma festa de rua
numa pequena cidade. Ela queria estar bonita para Ric. “Lindo”, ela
pensou.
Quando deu conta Anja já estava dentro do vestido dela e estava
perfeitamente, deslumbrantemente bonita. O vestido era branco com
tons dourados adornando as curvas e siluetas de Anja, ela realmente
parecia um anjo.
- Como eu fiquei? Perguntou a loura.
- Está perfeita, está linda.
- Experimente o seu, vamos, quero ver como você fica vestida de
menina.
Dina ficou rindo sem graça e minutos depois estava vestida com a
peça da mesma coir dos olhos de Ric. Quando Anja virou do espelho
para ela abriu a boca e fez um gracioso elogio. – Uau, você está...
Simplesmente... Maravilhosa.
Dina andou de um lado para o outro pela sala imitando um manequim
de passarela. – Gostou mesmo? Por algum momento ela havia
esquecido a recente morte do seu médico.
- As duas estão ótimas. Disse a costureira enquanto apalpava os
vestidos delas procurando algum defeito. – Acho que não preciso
fazer nenhum arranjo, sempre acerto no tamanho.
- Não precisa mesmo. Falou Anja. – Estão perfeitos, o que você acha
Dina?
Ela estava distraída olhando seu reflexo no espelho, segurava as
saias e fazia pequenos movimentos ondulados. O tecido verde parecia
um oceano se movimentando levemente.
- Dina, ela quer saber se você gostou do seu vestido. Perguntou Anja
novamente quebrando a distração da amiga.
- Ahh... Sim, eu gostei muito. Ela respondeu. – Podemos leva-los
para casa?
A costureira sorrindo deslizou uma gaveta para fora da estante da
sala. – Só deixe-me empacotá-los.
As meninas despedirem-se e retornaram cada uma com seu vestido
nos braços. Ainda era dia. No caminho de casa Dina tentou
novamente falar com amiga sobre Luccar.
- Anja, você precisa saber mais uma coisa sobre o que aconteceu na
floresta, sobre Ram.
Anja estava radiante pensando na festa e como ela ficaria com seu
vestido novo, mas lembrou que teria um compromisso. – Dina eu
preciso ir para a igreja, vou ajudar com os preparativos do velório.
- Mas eu preciso lhe falar...
- Agora não Dina, por favor. Ela interrompeu a amiga. – Toda essa
historia com morte e com esse Ram psicopata andando por ai me
deixou muito confusa, ajudar no velório vai desgastar ainda mais,
depois você me fala o que mais eu preciso saber.
Conformada que Anja não estava disposta a ouvir, Dina não teve
outra escolha senão em concordar, ela falaria sobre Luccar em outro
momento. – Tudo bem, amanha falamos. Vou para casa.
- Você não vai mesmo aparecer no velório?
- Não mesmo, não quero correr o risco de ver mais um fantasma.
Respondeu Dina. – Vou para casa e ficar trancada no quarto.
Dina tomou o caminho de sua casa deixando Anja ainda falando -
Então combinamos falar amanhã... Vou fazer uma oração para o
doutor Cipriano por nós duas.
Dina já estava longe, mas pode escutar o nome que Anja havia dito.
“Quem é Cipriano?” Ela pensou. Anja só pode estar delirando por
causa da morte. Mesmo assim continuou caminhando até chegar em
casa. Estava tudo tranquilo, nem parecia o mesmo local tumultuado
pela descoberta do corpo naquela manhã.
Na porta estavam sua avó Augusta e o Padre Santiago. “Ele ainda
está aqui?” Ela se perguntou. – Oi vó.
- Olá querida, já voltou?
- Olá Diana. Cumprimentou o padre.
Dina apontou para o vestido enquanto entrava em casa. – Trouxe
meu vestido, a senhora quer ver?
- Mas tarde eu vejo com você querida. Ela respondeu a neta. – Estou
terminando de falar com o padre, tem comida no fogão.
Dina achou estranho sua avó não querer abrir o pacote e ver o
vestido de festa que ela encomendara, mas foi por pouco tempo, logo
depois de comer foi para o quarto. Deixou o vestido ainda no pacote
em cima da cama, retirou as roupas e entrou no chuveiro. Vó
Augusta ficou conversando com o padre na porta de casa.
- Não podemos facilitar para ele, Santiago. Ele matou o doutor e virá
atrás de nós. Ela temia pela vida da neta. – Ele descobriu que nós
sabíamos sobre a aldeia e sobre a fonte, aquele empregado que
Celina mandou trazer a mensagem deve ter falado com ele, agora ele
vai nos matar.
- Não posso pensar nisso agora Augusta, tenho um velório antes do
anoitecer. Falou o padre.
- Você viu como estava o corpo dele, Santiago? Você viu o doutor?
- Infelizmente eu vi. O corpo estava um pouco enegrecido, mas deu
para perceber que ele havia sido atacado por trás, alguém bateu na
cabeça dele com alguma coisa pontuda.
O padre fez um sinal da cruz e despediu-se de vó Augusta enquanto
ia embora. – Nos vemos mais tarde na igreja? No velório?
- Sim até mais tarde.
O padre voltou-se para o caminho da igreja enquanto vó Augusta
fechava a porta atrás dela.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Quatro dias para a festa
17
Ram passeava pelas ruas de Santo Pedro todas as manhas antes do
sol nascer. Era um ritual que ele adquirira com seu pai desde que
foram morar na aldeia. Era uma caminhada isolada, nem mesmo
Luccar o acompanhava. Passos lentos e cuidadosos, através do chão
batido de terra misturado com areia. Por cada porta que ele passava
a certeza de que tudo ali estava sob seu domínio.
Os primeiros raios de sol penetravam por entre a vegetação da
floresta de encontro à pele dele. Fazia frio todas as manhas, mas
Ram fazia questão de caminhar trajando apenas uma calça expondo o
tronco musculoso ao sereno. No final da caminhada, onde a estrada
principal da aldeia acabava, ele mantinha-se parado observando tudo
em sua volta.
De onde ele estava era possível ver Santo Pedro mesmo que de
longe. Seus olhos em tom muito claro estreitavam-se para aumentar
o campo de visão. Conforme o dia ia clareando, os moradores da
aldeia saiam de suas casas para executar as tarefas incumbidas a
eles. A maior parte das pessoas que habitavam a aldeia era
masculina, apenas quatro mulheres residiam ali, mas estavam velhas
de mais para o trabalho duro que a aldeia impunha aos seus
moradores. “Está na hora de começar de onde meu pai parou” ele
pensou.
Quando Ram retornou da caminhada encontrou Lucaar na porta da
sua casa. - Eu gostaria de trazer a amiga da garota para cá.
Perguntou Lucaar. – Para viver comigo.
- A loura? Perguntou Ram.
- Sim, ela mesma. Respondeu Lucaar.
Ram subiu os degraus de acesso à porta de entrada de sua casa
enquanto pensava. Parando diante de Lucaar respondeu. – Tem
minha permissão, é bom que Dina não fique sozinha aqui.
Lucaar sorriu enquanto Ram virava as costas ao entrar em casa. “Vou
procurar Angélica”. Ele pensou.
Na cidade...
Anja terminava seu café da manhã. Ela estava pronta para encontrar
Dina logo cedo. Dessa vez quem iria encontrar com ela em sua casa
seria a amiga de cabelos castanhos. A mãe de Anja estava muito
ocupada preparando os bordados para a festa do Solstício. O pai de
anja havia saído muito cedo para finalizar os últimos acertos da
construção onde ele trabalhava.
Anja escovou os dentes após terminar o café e foi para a varanda da
casa esperar pela amiga. Distraída do lado de fora, a loura percebeu
que alguém estava na calçada poucos metros adiante, quase na
esquina da rua de onde ela morava.
Anja imediatamente reconheceu o homem que estava parado na
calçada com meia parte do corpo encostado no muro, de braços
cruzados. O cabelo dele era preto, liso, brilhoso, quase encostando
nos ombros. Desta vez ele não estava vestindo roupas escuras.
Incrivelmente Lucaar havia combinado uma calça cor de areia bem
larga e camisa branca. Anja desceu os degraus que conduziam a
saída da varanda da frente para rua, enquanto Lucaar caminhava de
encontro a ela.
- O que você está fazendo aqui a essa hora da manhã. Ela perguntou.
– Não está muito cedo pra você?
Lucaar tentando parecer casual arriscou um singelo sorrio entre os
lábios. – Não existe hora quando se tem vontade de encontrar
alguém. Ele respondeu.
Anja fez cara de quem não se importava com a resposta dele, mas no
fundo sabia que estava gostando do cortejo de Lucaar. De longe
conseguiu avistar Dina chegando.
- Não posso ficar conversando. Falou Anja. – Minha amiga e eu temos
assuntos a tratar.
Lucaar voltou-se para a rua e deparou com Dina descendo pela
calçada. “Ela não vai me reconhecer”, ele pensou. “Ela não viu meu
rosto”.
Quando Dina estava bem próxima percebeu que Anja falava com um
rapaz em frente a sua casa. “Com quem ela está falando?” Pensou.
Continuou a caminhar em direção da amiga e do rapaz e foi ai que
seus passos começaram a ficar mais lentos e sua respiração ficou
mais forte.
- Oi Dina, Venha conhecer meu amigo. Chamou Anja.
Dina respondeu com um aceno de cabeça e continuou andando
normal. Ela parou na frente dos dois e deu bom dia.
- Bom dia moça. Cumprimentou Lucaar. “Ela não me reconheceu”.
Pensou ele.
- Oi Anja, nós combinamos de sair juntos agora de manhã, não é?
- Sim. Respondeu a amiga, nós vamos assim que eu despedir do meu
amigo aqui.
Dina estava certa de que conhecia aquele rapaz de algum lugar, ela
estava muito desconfiada. “O cabelo dele é muito parecido com o
cabelo de Lucaar”, ela pensou.
- Vocês se conhecem de onde mesmo?
- Nós nos conhecemos daqui. Respondeu Anja.
Lucaar estava certo que Dina não o reconheceria, mas preferiu não
apostar tanto nisso e tentou uma pequena desculpa para sair dali.
- Preciso ir. Tenho que lidar com algumas pessoas. Ele disse a elas.
Dina aproximou-se dele muito suspeita. – Você tem que ir agora? Ela
perguntou chegando cada vez mais perto. “Ric disse que mutilou
orelha de Lucaar”, ela se lembrou das palavras dele.
- Eu volto em outra hora. Respondeu Lucaar tentando se afastar de
Dina.
- Seu cabelo é muito bonito, você deixou ele crescer bastante. Disse
Dina já com o braço esticado em direção à orelha de Lucaar.
Sem dar chance de ele responder qualquer coisa, ela passou a mão
levantando os cabelos dele fazendo aparecer a orelha mutilada.
Lucaar imediatamente afastou a mão dela, mas Dina já havia
comprovado que o rapaz que estava diante dela era o mesmo da
floresta que ajudou Ram.
Agora Lucaar sabia que ela o havia reconhecido. Dina ficou enrijecida
olhando para Lucaar enquanto Anja não entendia a situação.
- O que está acontecendo? Perguntou Anja. – Vocês dois se
conhecem?
Lucaar ficou calado olhando para Dina e ela teve medo que expor a
amiga. – Não, eu apenas gostei do cabelo dele. A resposta de Dina
surpreendeu Lucaar.
Eles permaneceram se olhando nos olhos por alguns instantes até
que Lucaar quebrou o silencio. – Vou deixar as duas resolverem o
compromisso, falamos outra hora. Ele disse.
- Certo falamos outra hora, respondeu Dina olhando pra ele.
Anja também se despediu do rapaz. - Xau, de noite podemos
conversar...
- NÃO... Interrompeu Dina.
- Não? Perguntou Lucaar tranquilamente.
- Por que não Dina? Também perguntou Anja. – Por quê?
Dina tentou pensar numa resposta convincente para que Anja não
insistisse em encontrar Lucaar à noite. “Pense rápido Dina”, ela
pensou. – Bem... Eu gostaria que você fosse à igreja comigo...
- Igreja? Perguntou Anja quase não acreditando nas palavras dela.
- Sim... Igreja, respondeu Dina quase gaguejando. – Eu queria fazer
uma oração pela morte no meu médico e, você sabe que eu não sei
fazer isso sozinha Anja.
Dina sabia que a amiga nunca trocaria a igreja por alguém. A loura
abriu um sorriso e imediatamente desmarcou com Lucaar, ele
concordou prontamente sorrindo para Dina. – Tudo bem, você venceu
por hoje, Dina. Prazer em conhecê-la, ele disse. – Mas outro Dina
você não poderá impedir que eu veja sua amiga.
Anja ficou envergonhada e puxou Dina com ela. – Vamos lá pra
dentro comer algo, ainda tem café da manha na mesa. Xau, Lucaar.
Ele acenou com a cabeça e foi embora, enquanto elas desapareciam
pela porta, Dina olhando para trás sendo puxada pela amiga.
- Onde você o conheceu? Ela perguntou.
- Dina, não e só você que pode conhecer garotos. Respondeu Anja
indignada. – Ele simplesmente apareceu na rua e falou comigo, como
todo garoto normal faz quando quer conhecer uma garota.
Dina temia pela amiga, ela não suportaria se algo acontecesse com
ela e agora Lucaar estava por perto. – Ele sempre vem aqui falar com
você? Perguntou.
- Nós nos encontramos algumas vezes, acho que vou chama-lo para
a festa.
- Não...
- Lá vem você de novo, por que não? Por acaso está com ciúmes, de
mim ou dele?
- Não é isso Anja.
- Você quer ser o centro das atenções sempre, tá na hora de deixar
alguém ter um relacionamento, já que você tem o Ric.
Dina tentou acalmar a amiga, ela nunca havia brigado com Anja. –
Calma, é que você não o conhece, pode ser perigoso encontrar
estranhos...
- Você encontrou um estranho também... Até beijou ele se não me
falha a memória e ainda foi com ele para um lago nadar sem roupas
e...
- Tá bom, não vamos entrar nesse assunto. Interrompeu Dina. – Só
estou preocupada com você, mas se você quer ir com ele à festa
vamos fazer um encontro juntas, eu e Ric e você com...
- Lucaar. Completou Anja mais calma e parecendo que havia
esquecido completamente a briga com Dina.
- Ótimo, disse Dina. – Vamos fazer isso.
- Ótimo, respondeu Anja de Volta. – Agora vamos.
Elas estavam a caminho da porta quando Dina parou bloqueando a
saída. “Eu não posso fazer isso com ela”, pesou. “Eu tenho que contar
tudo para ela poder se defender se ele tentar algo”.
- Ande logo Dina, está parada ai por quê?
- Anja, vamos para seu quarto, eu preciso lhe contar algo.
Elas retornaram para dentro fechando a porta, chegando no quarto
de Anja, sentaram e Dina contou tudo sobre Lucaar acrescentando ao
que ela já havia contado antes sobre a briga dos irmãos na floresta.
Longas horas se passaram e elas finalmente saíram da casa, Anja
muito abalada por ter chorado o dia inteiro depois que ficou sabendo
a verdade sobre Lucaar.
- Mas ele nunca fez nada comigo. Ela disse. – Até pediu para eu fazer
uma oração por ele.
- Ele perigoso, Anja. Dina consolou a amiga. – Ele estava tentando
ganhar sua confiança pra depois fazer alguma coisa.
- O que ele queria fazer comigo?
- Eu não sei. Respondeu Dina. – Ram quer me levar para algum lugar
e eles são do mesmo grupo, deve quer levar você também.
- Levar para onde?
Enquanto isso na floresta...
Ric discutia com Edie sobre Ram querer raptar as pessoas. – Eu não
vou permitir que ele leve Dina para Santo Pedro.
- Não é somente sobre ela que estamos falando. Disse Edie. – Ele não
pode levar mais ninguém para lá. O idiota, agora quer bancar o barão
e raptar pessoas.
- Nosso pai era louco, Edie, agora Ram está ficando louco também.
Disse Ric com raiva do irmão mais velho. – É essa maldita água
envenenada, acabou com a sanidade do nosso pai.
Edie tentava acalmar Ric inutilmente, ele temia que o irmão mais
novo influenciasse os outros membros do grupo a entrar em
confronto direto com Ram e seu clã. – Você não vai fazer nenhuma
idiotice? Perguntou.
Ric encarou Edie engolindo em seco. – Ele tentou me matar com a
Corta-Relâmpago, se eu não tivesse sido rápido ele teria afundado a
espada na minha cabeça. A raiva de Ric tomou conta de todo seu
corpo, ele cerrou os punhos enquanto dizia. – Eu nunca vou me
esquecer disso.
Edie saiu batendo os calcanhares para longe de Ric reclamando baixo
alguma coisa sobre “é claro que ele vai fazer alguma idiotice ou não
seria meu irmão”...
Ric chamou Céu, o cavalo logo atendeu ao assobio dele. Ric montou
no cavalo e os dois galoparam para longe do acampamento do
refúgio.
Edie também estava caminhando para longe do acampamento, Xerife
o acompanhava. Os dois andavam lado a lado até se aproximarem
das margens da cidade. Já estava escuro e Edie deixou Xerife
escondido dentro da mata enquanto caminhava pelas ruas da cidade.
Fez uma pausa quando se aproximou do velho e aposentado chafariz,
o mesmo em que Dina e Ric haviam se beijado. Continuou
caminhando para longe até o final da rua. Estava bem escura e Edie
avistou uma imagem muito familiar, sentada no banco, esperando
por ele.
- Pesei que você não viesse hoje.
- Eu nunca deixei de vir, hoje não seria diferente. Respondeu Edie.
- Está aborrecido?
- Qual dia eu não em aborreço com aqueles dois idiotas? – Eu
preferia ter sido filho único.
- Disso eu sei bem, venha aqui perto, senti sua falta.
- Eu também senti sua falta, Carla. Respondeu. – Não consigo passar
um dia longe de você.
- E não foi isso a nossa vida toda? Ela respondeu. – Desde pequeno,
você sempre foi atrás de mim.
Edie sentou ao lado dela e os dois se abraçaram. – Eu sempre irei
atrás de você. Depois que falou eles se beijaram ardentemente.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Três dias para a festa
18
Logo pela manha, Anja saiu de casa, correndo em direção à casa de
Dina. Pelo caminho, andando tranquilamente na mesma calçada
estava Lorena. Anja passou por ela tão próximo que a fez assustar.
- Ei, olha por onde anda. Reclamou Lorena.
Anja por um segundo olhou para trás, mas não deu absolutamente
nenhuma atenção à menina alta de cabelos negros, seguiu correndo
para a casa da amiga.
“Lá vai a santinha do pau oco”, pensou Lorena enquanto ajeitava os
cabelos presos em um irritante rabo de cavalo que ela insistia em
usar todos os dias. Ignorando Anja, Lorena atravessou à rua e entrou
numa porta que conduzia a um sobrado.
Subindo a pouca escadaria que terminava em uma enorme sala de
artes marciais, estavam o instrutor e alguns rapazes treinando
movimentos de defesa pessoal. A turma era pequena e Lorena
identificou Adan entre eles. O rapaz louro estava usando calça de
moletom azul escura e camiseta branca, muito suada a camiseta
transparecia o tronco bem musculoso.
- ATENÇÃO TURMA, ordenou o instrutor. - FORMAÇÃO.
Todos os alunos perfilaram-se em frente a ele e executaram um
movimento com a cabeça em sinal de cumprimento.
- DISPENSADOS... NÓS VEMOS DEPOIS DO SOLSTÍCIO.
Os rapazes apertaram as mãos uns dos outros e Adan foi para perto
de Lorena. – Não fique muito perto, está suado. Disse ela com as
duas mãos levantadas impedindo que ele se aproximasse.
Adan sorriu, revelando uma enorme acarada branca - O que a trás
aqui? Perguntou ele enxugando-se com uma toalha de rosto.
- Eu quis ver com meus próprios olhos onde você se escondia todos
os dias.
Adan alcançou a bolsa e mergulhou a toalha dentro dela. Os dois
sentaram na recepção do Dojô*
(*local de prática de artes marciais, pode ser chamado também de Dojan
ou Tatame. Pode ser considerado apenas o piso onde se pratica a arte ou
todo o local propriamente dito, variando de arte para arte e país de
origem).
- A festa acontecerá daqui a quatro dias. Disse Lorena. – E nós
vamos nos candidatar a rei e rainha da festa.
- Outra vez? Perguntou Adan.
- Claro, vou inscrever nossos nomes. Xau.
Adan segurou pelo braço dela impedindo que ela fosse embora. –
Dessa vez você não vai me fazer de bobo como ano passado. Lorena
piscou para ele, puxou o braço de volta e foi embora sem falar nada.
Parando na porta de saída olhou de soslaio e viu que ele estava
olhando para ela rindo sozinho.
Enquanto isso na casa de Dina...
- Calma Anja, ele vai aparecer. Tentou consolar vó Augusta junto
com Dina. – Ele sempre fez isso, brigava com sua mãe e sumia.
O pai de Anja havia brigado com a mãe dela, recentemente e era de
costume sair de casa e passar alguns dias dormindo fora até esfriar a
cabeça antes de retornar.
- Mas ele nunca passava tanto tempo fora, ele não voltou até agora.
Respondeu Anja soluçando. - Eu tenho medo que alguém tenha feito
alguma coisa contra ele...
Dina fez uma careta para que Anja não revelasse nada sobre Lucaar
ou Ram ou até mesmo Ric. ”Ela não pode falar nada, minha avó está
aqui”, pensou. Anja entendeu a careta da amiga e se conteve não
falando mais nada.
- Por que você acha que alguém fez alguma com seu pai Angélica?
Perguntou vó Augusta desconfiada.
- Errr... Nada vó. Interrompeu Dina. – Ela está assim por causa da
morte do meu médico.
Anja olhou para a amiga indignada com a desculpa que deu a avó
dela. – Sim dona Augusta, eu estou abalada por causa disso. Falou
enquanto olhava para Dina.
- Vou até a sua casa ficar com sua mãe, enquanto isso vocês duas
comam um pouco. Disse vó Augusta enquanto pegava seu cardigã. –
Ele vai voltar logo, Angélica, não se preocupe.
Depois que ela saiu, as duas começaram a conversar. – Foi ele Dina.
Falou Anja primeiro. – Foi ele quem pegou meu pai, depois que você
reconheceu, foi Lucaar.
- Também pode ter sido Ram quem fez isso. Preciso falar com Ric
sobre isso.
- Eu vou com você.
- Anja, isso pode ser perigoso, não quero que você se arrisque.
- É o meu pai.
A Dina lembrou-se de como foi a sensação em perder um pai e
concordou com a amiga. – Certo, marquei com Ric no velho chafariz
depois do almoço, vamos esperar aqui e quando der a hora certa,
vamos prá lá.
A duas almoçaram lá mesmo na casa de Dina, vó Augusta ainda não
havia retornado da casa de Anja. – Vamos logo. Pediu Anja.
Quando chegaram ao chafariz encontraram Ric sentado na beirada,
esperando sorridente. – Olá Dina... Hei Anja, tudo bem com você...
Ele percebeu imediatamente que alguma coisa estava acontecendo e
logo seu semblante mudou. – Me conte o que aconteceu.
As duas sentaram ao lado de Ric e quando Dina acabou de contar
sobre a morte do seu psicólogo, o estranho interesse de Lucaar em
Anja e agora o sumiço do pai dela, ele finalmente falou. – Vocês
acham que Ram é quem está por trás disso?
- Eu também pensei a mesma coisa. Disse Dina.
- Não, aquele mostro pegou meu pai. Falou Anja choramingando. –
Por que isso está acontecendo meu Deus, por quê?
Dina abraçava Anja tentando consola-la, mas parecia impossível
consolar a loura. Ric mostrava muita raiva enquanto Dina não saia de
perto da amiga. – Pensando bem, eu tenho um palpite de que seu pai
não foi pego por Ram ou por Lucaar. Falou Ric.
- Você acha mesmo isso Ric? Perguntou Anja cheia de esperanças.
- Sim, eu pensei melhor. Ele respondeu. – Não é o estilo de Ram
fazer uma coisa assim, não quando existe risco.
- Mas Lucaar pode ter feito isso. Disse Dina.
- Sim, depois que soube que Dina o reconheceu lá na porta da minha
casa. Completou Anja.
- Pouco improvável. Disse Ric. – Lucaar pode ser o que for, mas ele
obedece às ordens de Ram, definitivamente, ele não faria uma ação
isolada assim.
- Então, se não foram eles os responsáveis pelo sumiço do meu pai,
quem foi?
Dina passou a mão no ombro da amiga. – Anja, seu pai sempre
some, você mesma me disse isso. Pode ser apenas uma coincidência,
só isso.
Ric também se aproximou de Anja e enxugou uma lágrima que
escorria pela bochecha dela. – Eu também acho que seja isso, Anja.
Depois que Dina e Ric conseguiram acalmar Anja, caminharam em
direção a casa dela. Pele caminho, já na rua onde as meninas
moravam avistaram de longe, vó Augusta retornando da casa de
Anja, mas pela direção que ela estava indo, não parecia que ia pra
casa. – Ela está indo para a igreja? Perguntou Dina.
- Sim. Respondeu Anja. – Pelo menos a igreja fica por aquele lado.
Elas tentaram esconder Ric para que vó Augusta não o reconhecesse,
mas era tarde de mais, ela já havia visto as meninas e estava
caminhando em direção a elas. – Olá queridas, está ficando tarde.
Falou vó Augusta. – Quem é o rapaz que está com vocês duas?
Dina e Ric endureceram, sem saber o que responder. “Tomara que
ela não o reconheça”, pensou Dina. – Boa noite senhora.
Cumprimentou Ric. – Eu estava acompanhando as duas meninas até
a casa delas.
Anja e Dina gelaram enquanto vó Augusta falava com ele. – E você
quem é?
- Sou da cidade vizinha. Respondeu ele. – Vim para o enterro do
doutor que encontraram morto, mas chegamos tarde demais, já
enterram ele.
- Ele era seu doutor?
- Sim, meus pais estão retornando está noite, por isso eu devo me
apressar.
- Pode deixar, eu levo as meninas para casa. Disse vó Augusta.
- Sim senhora, boa noite.
As meninas se despediram dele. - Boa noite – Boa noite. E ele seguiu
rua abaixo caminhando até que elas não puderam mais vê-lo.
Dina suava frio e Anja engolia em seco. “Ainda bem que ela não
perguntou o nome dele e nem o nome dos pais dele”, pensou Dina.
- Qual é o nome desse rapaz? Perguntou vó Augusta.
- Marcos, disse Anja. – Vinicius, disse Dina logo em seguida.
As duas se olharam sem saber o que falar enquanto vó Augusta
esperava uma resposta. – Marcos Vinicius. Respondeu Dina
finalmente. – Nós o encontramos ali na pracinha onde toda a turma
jovem se encontra, vó. O conhecemos hoje e ele se voluntariou para
nos trazer até a casa de Anja.
- E os pais...
- Eu não perguntei quem eram os pais dele. Interrompeu Dina. - Ele
é inofensivo.
Vó Augusta olhou para as duas e pensou por alguns instantes antes
de responder. - Tudo bem querida, agora vamos. “Muito estranho,
esse rapaz me parece familiar”, pensou vó Augusta.
Elas caminharam de volta para a casa de Anja, deixando a menina
bem na porta de entrada. – Falei com sua mãe Angélica, ela disse
que sabe onde seu pai pode estar.
Mais aliviada Anja abriu um sorriso. – Graças a deus. Respondeu
enquanto se despedia de Dina e da avó dela. – Depois falamos e,
obrigada por ser minha amiga, Dina.
- Agora vamos Diana. Chamou vó. Elas caminharam de volta pra
casa.
- Onde a senhora estava indo quando nos encontramos, vó?
- Estava indo à igreja falar com padre Santiago, mas falo com ele
amanha. Agora vamos.
As duas caminharam de volta para casa. No caminho, dava para
perceber na rua transversal, que em frente à prefeitura estava um
aglomerado de pessoas. Dina ficou curiosa para saber o que estava
acontecendo lá. – O que é aquilo lá na frente da prefeitura?
Perguntou.
- Não sei bem o que é querida, vamos lá matar nossa curiosidade.
Respondeu vó Augusta sorridente.
Elas já estavam em frente ao prédio, onde se encontrava a secretária
do prefeito carregando um tipo de urna em suas mãos. Havia muitos
jovens no local e Dina conseguiu reconhecer uma garota alta de
cabelos escuros, presos a um rabo de cavalo, era Lorena.
As duas se encararam por alguns segundos antes do prefeito sair do
prédio e acomodar-se em frente a grande mesa, sobre ela a urna que
a secretária dele havia colocado.
- O que está acontecendo? Perguntou Dina novamente à vó. – Para
que serve aquela urna ali na mesa, haverá uma votação?
- Sim. Respondeu uma moça desconhecida que estava próxima. –
Mas não hoje, estão penas recolhendo as cédulas dos candidatos a rei
e rainha da festa.
- Haverá um rei e rainha da festa do Solstício? Perguntou Dina à
desconhecida.
- Sim, todos os anos escolhemos os candidatos, sua neta vai se
candidatar, Augusta?
- Não sei, Elisa. Respondeu vó Augusta. – Você quer colocar seu
nome lá, Diana?
Por alguns segundos, Dina sonhou com ela sendo eleita rainha da
festa e Ric o rei, mas logo caiu em si respondendo a sua vó. – Acho
que não quero, fica para ano que vem.
Dina não conseguia pensar em outra coisa que não fosse em Ram, ou
em Lucaar ou água de Santo Pedro. Ela temia pela segurança da
amiga, agora que sabia que Lucaar mostrou interesse por ela.
Lorena se aproximou da urna e depositou duas cédulas, uma com o
próprio nome e a outra provavelmente com nome de Adan. Logo em
seguida passou por entre as outras pessoas e foi embora ignorando
Dina completamente.
- Vamos para casa, vó. Pediu Dina
Avó e neta entraram pela porta e foram até a cozinha. – Vou fazer a
janta, querida, vai querer franco ou peixe?
Dina não mostrava muito interesse pela comida. – Não estou com
fome, vó. Respondeu. – Vou subir e tentar dormir.
- Ainda é cedo para dormir.
- Mesmo assim vou ficar deitada. Falou enquanto saia da cozinha. –
Como Anja deve estar agora? Perguntou à avó. – Espero que ela
esteja bem.
Chegando ao primeiro degrau da escada, ela olhou para cima e dessa
única vez, ela subiu bem devagar, degrau por degrau até chegar ao
seu quarto.
Na casa de Anja...
- Vou ficar esperando ele voltar. Disse Anja à sua mãe. – Pode ir pro
seu quarto se quiser, eu vou ficar aqui na sala.
- Angélica, eu já falei com você. Disse a mãe dela. – Seu pai
provavelmente deve estar na antiga casa dos teus bisavôs, é longe,
por isso ele não voltou ainda, deve estar esfriando a cabeça.
Anja temia pelo pai dela por que sabia que a casa dos bisavôs ficava
muito perto, quase dentro da floresta, e a casa estava em péssimo
estado. – Aquilo não é uma casa, é uma cabana. Ela respondeu à
mãe. - Ele pode estar com fome e com frio.
- Filha, amanhã eu vou atrás dele. Disse sua mãe. – Vou trazê-lo de
volta para casa.
-Promete, mãe?
- Prometo.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Dois dias para a festa
19
No acampamento do refúgio...
Ric treinava com seu irmão e outros poucos rapazes que compunham
seu clã. Era uma manhã calma e todos praticavam os ensinamentos
que aprenderam quando crianças, os mais jovens seguiam os mais
velhos. Ric orientava o treino com as espadas e Edie orientava o
treino com as facas.
As árvores locais com troncos grossos eram os alvos. Tudo ali era
improvisado e precário, não existia um local adequado, eles
praticavam entre as árvores no meio da floresta. Folhas e cipós
enrolados, pendurados em galhos, simulavam os sacos de pancadas
que as academias da cidade possuíam em suas salas de treino de
artes marciais. Mas, nada disso era motivo para que eles ficassem
abalados, ao que parecia eles preferiam estar ali, naquelas condições,
do que estar sob o comando de um arbitrário.
Quando Edie dava o comando finalizando o treinamento, todos eles
apertavam as mãos cumprimentando uns aos outros. Ric fazia
questão de apertar a mão de todos sem exceção, ele era muito
querido entre o grupo.
- BOM TRABALHO AMIGOS, falou Ric a todos. – HOJE O TREINO FOI
MUITO PRODUTIVO, PARABENS, FAMÍLIA.
- Alguém saiu machucado? Perguntou Edie. – Precisam de um pouco
de água, perguntou rindo.
Todos os membros do clã responderam sorrindo à Edie. – NÃO
SENHOR. Disseram juntos.
Voltaram para o núcleo do refugio conversando e brincando entre
eles. A grande maioria era composta por rapazes da mesma idade de
Ric e Edie, eles cresceram juntos em Santo Pedro, mas antes de
serem levados à força para a lá, eram filhos de moradores comuns na
cidade, estudavam na mesma escola e brincavam na praça quando
eram crianças.
Quando foram raptados de suas famílias, a vida deles girou cento e
oitenta graus, não podiam mais brincar, não podiam mais ser
crianças comuns. Foram submetidos a treinamentos severos que o
barão impunha a todos os moradores da aldeia.
Quase não havia mulheres em Santo Pedro, as poucas que existiam
eram, além da baronesa, algumas empregadas e duas mães que
ajudavam a cuidar dos garotos quando o barão não estava
atormentando eles. Sem falar que todos foram obrigados a beber da
água da fonte para que nunca mais pudessem voltar para cidade.
Depois que a baronesa morreu por causa do veneno, muito tóxico, de
uma aranha, não demorou muito para que o barão também viesse a
falecer e seu filho mais velho tomasse o controle de Santo Pedro.
Essa foi a deixa para Ric e Edie organizarem uma fuga coletiva, e
quem não estava disposto a ficar debaixo do comando de Ram iria
sair da aldeia. Ele ficou muito irritado e considerou desertores os que
saíram acompanhando os irmãos, jurando todos de morte.
- AMIGOS, PEÇO ATENÇÃO DE TODOS, falou Ric ao clã. – Em alguns
dias haverá luta, na cidade. Todos do grupo voltaram os olhares para
Ric. – Meu irmão, Ram, está tramando contra os moradores da
cidade, ele vai raptar pessoas e leva-las para Santo Pedro assim
como meu pai fez com vocês há anos, eu não vou permitir que isso
aconteça.
Os rapazes permaneceram em silencio enquanto Ric falava. Edie
estava apreensivo, ele não podia prever a reação deles, mas Ric
continuou. – Nenhum de vocês é obrigado a confrontar Ram e seu
clã.
- Eu quero ir confrontar Ram. Falou um dos rapazes. – Eu não quero
que ele faça outra pessoa passar o que eu passei naquela maldita
aldeia. – Eu também quero ir, disse outro rapaz. – Eu também vou,
disse outro.
Então todos os membros do grupo do clã de Ric estavam dispostos a
confrontar Ram fora da floresta. Seria a primeira vez que eles, desde
que foram raptados, retornariam à cidade. Edie ficou com medo de
que algum deles pudesse ter alguma recaída caso encontrasse ou
fosse reconhecido por algum parente lá.
Ric temia por Dina e por Anja, ele sabia que os alvos principais do
irmão mais velho seriam elas duas.
Enquanto isso, em Santo Pedro...
Existia uma sala especifica para os treinamentos de todo o clã de
Ram. O local era impecável, o barão fez questão de montar um dojô
tipicamente japonês na aldeia, no meio da floresta. Todas as práticas
com facas e espadas, assim como os combates corpo a corpo eram
realizados lá.
Lucaar coordenava o treinamento e Ram participava diretamente dos
combates com os membros do clã. Volta e meia ele combatia contra
dois ao mesmo tempo, ninguém conseguia derrotar Ram. Os
habitantes de Santo Pedro o obedeciam não por que ele era o filho
herdeiro do barão, mas por ele ser um excelente e habilidoso
guerreiro.
Nos combates com espadas, toda atenção era voltada para a
magnífica Corta Relâmpago, que brilhava a cada golpe desferido.
Depois que o barão morreu, Ram apoderou-se da espada, alegando
que por ser o filho mais velho, teria o direito legal. Ric nunca
manifestou qualquer vontade de ter a espada, já Edie sempre a
desejou e esse poderia ser o único motivo de desavença entre eles
dois.
Quando Ram não estava usando a espada, a Corta Relâmpago
descansava escondida numa pequena sala em seu quarto,
absolutamente ninguém tinha permissão para entrar lá. Nem mesmo
Lucaar.
Ao terminar o treinamento, Ram deixava o clã e caminhava para sua
casa, mantinha-se calado até estar sozinho no seu quarto. Era um
cômodo grande, com cama para duas pessoas. Móveis velhos,
rústicos, pesados, que o pai dele havia deixado como herança.
Assim que ele entrou retirou a camisa suada e jogou no chão em
frente à cama. Caminhou até a parede ao lado da cômoda, lá havia
uma porta de correr que mal podia ser percebida. Ram deslizou a
porta lateralmente revelando outra sala dentro do quarto. Então
conduziu a Corta Relâmpago para dentro, colocando-a em cima de
um pedestal especifico para espadas.
Ele voltou fechando a porta atrás de si, e antes de mergulhar em sua
cama retirou a única peça de roupa que havia em seu corpo,
deixando a calça junto à blusa suada no chão. Seu corpo exibia além
das curvas musculares, marcas de luta cicatrizadas que ele não fez
questão que a água curasse. Então ele fechou os olhos, e repousou.
Lucaar aproveitou a ausência de Ram, pegou seu cavalo e foi para
cidade, ele queria encontrar Anja, mais uma vez. Ela estava em casa
quando ele apareceu na porta da casa dela. Ficou parado do lado de
fora algum tempo antes que a garota notasse sua presença. A mãe
de Anja havia lhe dito que sabia onde o pai dela poderia estar e que e
que iria atrás dele e que logo ele estaria em casa.
Anja teve medo de sair, mas Lucaar não mostrou nenhum
comportamento que justificasse que a garota tivesse medo dele. Ela
abriu a porta com calma, um pouco insegura, tímida e ao mesmo
tempo curiosa.
- O que você está fazendo aqui. Perguntou. – Eu não quero mais falar
com você, minha mãe pode vir aqui e ver você, vá embora.
- A sua amiga lhe contou, não foi? Disse Lucaar fazendo sinal com a
mão para que ela saísse de casa.
- Você me enganou. – Você...
- Está errada. Ele interrompeu. - Eu não enganei você.
- Você e aquele Ram mataram o medico de Dina. Ela afirmou.
- Sobre o que você está falando?
- Você me pediu para fazer uma oração e eu fiz, você estava aqui
comigo o tempo todo e você... Vocês mataram uma pessoa.
- Angélica, nós não matamos ninguém. Quem morreu?
- Fique longe de mim, nunca mais chegue perto de mim, ou da minha
casa ou da minha família ou... De Dina.
Ela bateu a porta deixando Lucaar do lado de fora. Muito intrigado ele
decidiu se concentrar na morte do tal medico que Anja mencionara.
Ele desconhecia completamente a morte dessa pessoa. “Melhor voltar
para a Aldeia, contar isso”, ele pensou.
Enquanto isso no refugio...
Edie falava inutilmente com Ric sobre ele ir à festa com Dina. – É
arriscado você ficar com ela lá no meio das pessoas. – Sem falar que
você pode ser reconhecido por alguém.
- Ninguém vai me reconhecer, Edie. Retrucou Ric. – Eu era muito
novo quando deixamos a cidade, as pessoas não vão me reconhecer,
e eu acho que você também não seria reconhecido.
Edie parou um instante e perguntou. – Você acha mesmo que eles
não me reconheceriam?
- Claro, eles lembraram-se de um gordinho e desajeitado. Falou
rindo. - Ou você esqueceu-se de como era sua forma quando criança.
Edie ficou irritado com Ric e arremessou uma faca, fincando no tronco
de uma arvore ao lado da cabeça do irmão, fazendo irmão rir cada
vez mais alto.
- Ahhhhh, você se lembra de quando era gordinho...
- Eu vou ti matar, idiota.
Ric começou a correr pelo refugio enquanto Edie tentava acerta-lo
com facas, pedras ou que ele conseguisse pegar. – Errou. – O
gordinho do pão de batata da mamãe não consegue me pegar.
Edie com certeza já estava irritado com Ric quando finalmente
conseguiu acerta-lo com uma pedrada atrás da cabeça.
- Ai, isso doeu. Reclamou Ric. – Está sangrando.
- Agradeça por não ter acertado você com uma faca, idiota.
Edie não falou mais nada e enquanto caminhava de volta, reclamava
do irmão mais novo. – Eu não tenho mais obrigação de aguentar, as
infantilidades dele. – Era só o que me faltava, ele ficar me lembrando
de como era meu corpo quando eu era um garoto. – Ainda arranco
aquela língua, só fala besteiras. – Estamos falando de coisas sérias e
ele só tripudia...
Ric mesmo sangrando na cabeça ainda sorria com as reclamações do
irmão. – EU TAMBÉM TI AMO. Gritou.
Sentou-se num tronco seco e alcançou seu cantil com a água e
derramou sobre sua cabeça. A água imediatamente fez seu papel e
curou a ferida. Olhando para as folhas das árvores ele pensou em
Dina, e como ela ficaria bonita em um vestido. Quando caiu em si
lembrou-se que não tinha o que vestir para festa. “Preciso arrumar
uma roupa para acompanhar Dina”, pensou.
Em Santo Pedro...
Luccar se reuniu com Ram e outros membros do clã, ele falou sobre a
morte de uma pessoa na cidade e todos negaram dizendo que não
sabiam do que se tratava.
- Ninguém aqui fez nada contra alguém da cidade, nem mesmo
sabíamos dessa morte. Falou Patrick, um dos membros mais velhos
do clã de Ram. – Aposto que foram os refugiados.
- O que mais você sabe sobre esse homem que morreu, Lucaar?
Perguntou Ram.
- Não sei muita coisa, a informação que tenho é que ele era o médico
da garota.
Patrick levantou-se da mesa onde estavam reunidos. – Por isso
mesmo, foi o Richard que fez isso, ele estava envolvido com ela...
- Como você tem tanta certeza? Perguntou Lucaar encarando-o. –
Você sabe de alguma coisa que nós não sabemos?
- Você está duvidando de mim? Perguntou Patrick encarando de
volta. – Quer resolver isso lá fora?
Enquanto os dois discutiam, Ram pensava sobre o assunto, parecia
não importar-se com a troca de ameaças entre Lucaar e Patrick.
Quando os dois estavam prestes a começar brigar, ele teve que
intervir.
- Calem-se os dois, precisamos descobrir mais sobre esse homem
que morreu, por que ele morreu e quem o matou.
Patrick não gostava de Lucaar e muito menos da calma com que Ram
conduzia as coisas. – Mas senhor, eu apenas gostaria de...
- Eu já dei minhas ordens, e espero que elas sejam obedecidas.
Interrompeu Ram. - Agora vá.
- Certo senhor, me desculpe, irei até a cidade.
- Não, Lucaar é quem vai à cidade, você não sairá da aldeia.
Respirando fundo Patrick assentiu com a cabeça e saiu da sala de
reuniões que ficava atrás do Dojô. – Sim, senhor.
Lucaar ficou olhando para Patrick até que ele estava fora da sala
junto com os outros membros que participavam da reunião. – Não
confio nele, nunca confiei. Ele disse a Ram. – Não entendo por que
ainda o deixa estar aqui.
- Aprendi uma coisa com meu pai. Respondeu Ram. – Devemos
manter nossos amigos perto e os inimigos mais perto ainda.
Ram estava muito pensativo. – Não acho que foi alguém do clã de
meus irmãos, eu penso que existe outra pessoa por trás disso.
- Alguém em mente?
- Não, por isso precisamos saber mais informações sobre esse morto.
Respondeu Ram. – Não podemos deixar de nos preocupar com a
segurança da Aldeia e a fonte da água, se alguém estiver tramando
alguma coisa, nós poderemos morrer, todos nós.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Um dia para a festa
20
Era véspera do Solstício e uma euforia coletiva pairava sobre a
cidade. Fazia frio, mas ninguém estava preocupado com a
temperatura, o único assunto comentado era a festa, e o grande
chamariz do evento seria, além da eleição do rei e rainha, a grande
fogueira que seria acesa pouco antes da meia noite.
Dina colocou seu vestido verde de festa no cabideiro fora do guarda
roupa. Os sapatos que ela iria usar foram emprestados por Anja, que
calçava o mesmo número que ela. Dina não podia deixar de pensar
em como seria estar ao lado de Ric, sozinha ela arriscou alguns
passos que havia ensaiado com Anja, para não passar vergonha se
caso Ric a chamasse para dançar. Ao mesmo tempo ela lembrou que
ela não estaria na festa para se divertir, já que Ram iria tentar
alguma coisa durante o Solstício.
“O que será que ele vai aprontar?” Ela pensou.
- Você estará muito bonita amanhã, querida. Falou vó Augusta
encostada na porta do quarto de Dina.
- Obrigada, vó. Respondeu ela. – Eu nunca participei de uma festa
assim, minha mãe alguma vez participou?
Vó Augusta pensou por uns instantes e pediu que Dina a seguisse até
seu quarto. – Venha querida, vou lhe mostrar uma coisa.
A neta seguiu até o quarto da avó e sentou na cama enquanto vó
Augusta arrastava um enorme baú posicionando-o ao lado. Ela abriu
o baú e começou a retirar peças antigas de roupa de cama. Lá no
fundo, começaram a surgir roupas masculinas e femininas.
- De quem são essas roupas, vó?
Vó Augusta sorrindo começou a abrir as roupas e espalha-las por
cima da cama. Um lindo vestido curto azul foi primeiro e depois
algumas blusas decoradas em crochê, todas em tom pastel e,
finalmente um belo traje de festa masculino.
Dina olhava todas aquelas roupas em silêncio sem perceber uma
lágrima escorrendo. Ela estava certa que aquelas roupas foram
usadas por pessoas que ela amou muito.
– Eram dos meus pais? Perguntou emocionada.
- Sim. Respondeu a avó. – Quando eles eram mais jovens, da sua
idade. - Cresceram e deixaram as roupas aqui, eu guardei tudo.
A garota pegou uma das blusas, levou até o rosto e ficou alisando a
bochecha com o tecido fino. – Minha mãe usou isso na minha idade?
- Ela usou tudo isso, querida. E esse traje aqui, foi seu pai quem usou
quando dançou com sua mãe pela primeira vez no Solstício. Ela deu
uma pequena pausa antes de continuar. – Depois disso, eles nunca
mais se desgrudaram.
Dina soltou a blusa e voltou à atenção para o lindo traje escuro de
festa que o seu pai havia usado para dançar com sua mãe. “Foi ai
que eles se apaixonaram”, pesou.
- Diana, com quem você vai à festa, quem vai ser seu par? Perguntou
Vó Augusta.
Ela ficou nervosa com a pergunta repentina e antes que pudesse
pensar numa resposta convincente, elas ouviram alguém batendo na
porta da frente da casa.
- OLÁÁÁÁ, HOW DE CASA. Gritou Anja do lado de fora.
A interrupção de Anja foi muito bem vinda pela amiga. ”Salva por um
anjo”, ela pensou.
- JÁ ESTOU INDO. Respondeu Dina com um grito tão forte que fez
sua avó assustar. – Combinei de encontrar com Anja, vó. – Depois
falamos.
Ela saiu correndo do quarto da avó, mergulhou os pés nos tênis cano
curto e se atirou escada abaixo descendo o mais rápido que pode
para encontrar Anja ansiosa para entrar. - Por que demorou tanto,
estou horas esperando aqui fora.
Dina riu e tentou puxar Anja para rua, mas a loura escorregou para
dentro da casa da amiga. – Preciso falar com sua avó.
- Falar o que? Perguntou Dina. - Acho que não é uma boa hora.
- Por que não? Insistiu Anja.
- Ela estava me perguntando sobre a festa. Falou sussurrando. - E
quem seria meu par...
- Olá Angélica, tudo bem com você? Como vai sua mãe?
- Olá dona Augusta, é sobre isso que eu vim. – Minha mãe vai atrás
de meu pai hoje, ela disse que ele pode estar na antiga cabana dos
meus avós, na floresta.
- Você disse floresta? Perguntou Dina nervosa. – Onde fica essa
cabana?
- Era a antiga cabana onde os avós de Angélica moravam, querida. –
Eles morreram e a cabana ficou lá vazia.
- É Dina, meu pai toda vez que briga com minha mãe, vai lá e fica
alguns dias até esfriar a cabeça para voltar para casa. – Minha mãe
decidiu que vai lá buscá-lo.
- Você acha mesmo que não é perigoso? Perguntou Dina esquecendo
que a avó estava ao lado. – Você sabe que temos que tomar cuidado.
- Cuidado com o que querida? Perguntou vó Augusta.
As duas amigas ficaram se encarando sem saber o que responder. Vó
Augusta ficou parada com os braços cruzados esperando por uma
resposta quando Anja finalmente falou.
- É aquele rapaz do outro dia que estava nos acompanhando até
minha casa, a senhora lembra?
- O Rapaz dos olhos verdes? Perguntou vó Augusta olhando para a
neta. – Por que não me disse antes?
Dina ficou gelada ali mesmo onde estava, não acreditando que Anja
havia dito aquilo. “Como ela pode ter dito isso” pensou.
Tentando parecer o mais natural possível, Dina respondeu a avó. - É
que a senhora sempre fica perguntando quem são os pais dos
garotos que eu encontro, e eu fiquei com medo de responder.
- Não precisava ter medo de falar comigo, querida. - Eu achei aquele
rapaz muito educado e acho que ele seria um bom acompanhante
para você na festa.
Dina e Anja ficaram olhando uma para a outra desconfiadas com a
reação de vó Augusta. Ela simplesmente aceitou que sua neta fosse à
festa acompanhada por um rapaz desconhecido sem ao menos fazer
perguntas sobre a família dele.
- Vamos para o meu quarto Anja, quero lhe mostrar meu vestido.
- Mas eu já sei como é seu vestido. Respondeu Anja. – Nós pegamos
juntas na casa da costureira...
- Mas eu quero lhe mostrar como ele combina com os sapatos.
Interrompeu Dina.
- Dina, eu também seu como são os sapatos, eu que emprestei...
- ANJA... Vamos logo.
- Tá bom, não precisa gritar, xau Dona Augusta.
Enquanto as meninas subiram para o quarto, vó Augusta telefonou
para o padre Santiago.
- Alô, Santiago?
– Sou eu. Respondeu o Padre do outro lado da linha.
– É Augusta quem está falando, preciso encontra-lo agora na igreja.
- Estarei esperando na sacristia.
Ela desligou o telefone e subiu para trocar as roupas. Antes de entrar
no seu quarto avisou as meninas que iria sair.
- A senhora vai demorar muito?
- Não sei querida, preciso acertar com o padre os últimos detalhes
das barracas de festa, tem comida pronta na cozinha, não me
esperem.
- Tudo bem. Respondeu Dina enquanto sua avó desaparecia da porta
do seu quarto.
Voltando a conversar com Anja, Dina perguntou à amiga. - Como
você teve coragem de falar para ela que eu iria com Ric?
- Eu fiquei nervosa e achei que ela não iria se lembrar dele, já que o
conheceu ainda bebê. Respondeu Anja enquanto ligava o walkman de
Dina. – Foi tudo que eu consegui pensar.
Dina não estava chateada com a amiga, ela só pensava em como iria
aparecer na festa com o Ric ao seu lado. Mesmo que sua avó não o
reconhecesse, outras pessoas poderiam reconhecê-lo. Eles teriam
que ficar longe das pessoas mais velhas enquanto estivessem na
festa e ainda sim, vigiar caso Ram tentasse alguma coisa.
- Lucaar me encontrou ontem. Falou Anja.
Dina engoliu em seco quando ouviu a amiga pronunciar o nome dele.
– Ele tentou alguma contra você? Perguntou.
- Não, ele queria falar comigo, mas eu não saí de casa, estava de dia
e ele nem tentou se aproximar da porta.
- Ainda bem que ele não tentou nada contra você.
- Eu o mandei ir embora, não quero vê-lo nunca mais.
- Por que eu tenho a ligeira impressão que vamos vê-lo novamente.
Falou Dina suspirando. – Eu preciso encontrar Ric, lá no chafariz e
contar isso a ele.
As duas se levantaram e foram para a rua. No caminho elas
avistaram vó Augusta caminhando de vagar, quase na porta da
igreja.
Dina apressadamente puxou Anja para atrás do muro. – Ela não pode
ver você passando sozinha, ela vai perguntar onde eu estou. Falou
Dina à Anja.
- Certo, vou para casa por outro caminho, pela rua de trás. Se por
acaso sua avó for à minha casa e perguntar sobre você, direi que
você foi à costureira levar uma peça de roupa para mim enquanto eu
espero minha mãe voltar.
Dina sorriu para a amiga e assentiu com a cabeça. – Obrigada, se
cuide no caminho de volta, Vou encontrar–me com Ric.
Elas separaram-se e tomaram caminhos opostos. Enquanto isso na
igreja, vó Augusta conversava com padre Santiago na sacristia.
- Ainda bem que Diana vai estar na festa com um rapaz muito
educado. – Assim eu fico despreocupada com a segurança dela.
- Você acha mesmo que o barão vai aprontar alguma coisa durante o
Solstício, Augusta? Perguntou o padre. – Haverá muitas pessoas, até
o prefeito estará na festa.
- Eu espero tudo daquele homem, Santiago. – Acho que você deveria
estar preocupado também.
-Calma Augusta, vamos estar atentos. – Agora me fale sobre esse
rapaz que vai estar com sua neta na festa.
- Eu não o conheço, mas olhei bem nos olhos dele e tenho certeza de
que é um bom rapaz. – Você sabe que eu não me engano com as
pessoas, não sabe?
- Se você acha que ele é um bom rapaz, então é.
- Alguma coisa nos olhos daquele rapaz era familiar. Disse vó
Augusta enquanto limpava os óculos. – Aqueles olhos verdes me
fizeram lembrar alguém.
- Vamos para o pátio ver como andam as montagens das barracas.
O padre e Vó Augusta foram para o pátio da igreja onde outras
senhoras estavam coordenando os homens que estavam pré
montando as barracas para a festa. A igreja estava linda.
Enquanto isso, no chafariz...
Dina e Ric se abraçavam intensamente, parecia que eles não se viam
fazia dias. Dina com os braços em volta do pescoço dele e Ric
passando a mão pelos cabelos dela.
- Eu senti muitas saudades de você. Disse Ric a ela. – Cada minuto
que eu fico na floresta longe de você, parece uma eternidade.
- Eu também conto os momentos para estar com você. Ela disse. –
Hoje mesmo quando eu estava olhando para o meu vestido...
Ela parou de falar quando percebeu que Ric desviou o olhar para os
pássaros que estavam nas arvores. – O que houve? Ela perguntou.
- Dina, eu não tenho uma roupa de festa para acompanhar você.
Respondeu Ric. – Todas as roupas que eu tinha, estão em Santo
Pedro, só tenho roupas velhas e surradas que consegui carregar para
floresta.
Os dois ficaram em silêncio por um momento, quando Dina lembrou-
se que havia uma roupa que Ric poderia usar na festa. “O baú da
minha avó”, pensou, “A roupa que meu pai usou na festa do Solstício
podem caber em Ric”.
- Eu acho que posso resolver isso. Falou Dina com entusiasmo. –
Amanhã antes de começar a festa, minha avó vai estar ocupada com
as barracas da igreja, então você vai à minha casa, encontrar comigo
e Anja, nós combinamos de nos arrumar lá.
- Você vai me deixar ver o seu quarto? Perguntou Ric cheio de malicia
no olhar.
Ela sorriu para ele enquanto tentava dizer alguma coisa. Os olhos de
Ric faziam com que ela ficasse sem palavras, o brilho verde malicioso
que ele exibia fazia o tempo parar e nada mais importava.
Infelizmente Dina criou coragem para quebrar o encanto do
momento. - Preciso lhe falar.
- O que foi?
- Lucaar foi à casa de Anja ontem, durante o dia.
- Ele teve coragem de ir lá? – O que ele fez a ela?
- Ele não fez nada a ela. Respondeu Dina. – Ela o mandou embora, e
simplesmente ele... Foi.
- Estranho, ele foi embora muito fácil.
Dina segurou o arco do queixo dele com as duas mãos e perguntou
seriamente.
– Ric, me diga a verdade. – O que Lucaar pode querer com Anja?
Ric olhou de volta para ela, pegando as duas mãos e levando ao seu
peito e, com certo receio ele respondeu. – Eu acho que ele quer
raptar Anja e leva-la para Santo Pedro.
Dina puxou as mãos para si e olhou para o lado. “Não”, ela pensou.
ALDEIA de SANTO PEDRO
Água
Solstício
21
Acabara de amanhecer na cidade, e tudo estava pronto. Os enfeites
pendurados nas ruas, barracas armadas no pátio da igreja e na praça
central e a madeira empilhada para compor fogueira.
Um pequeno palanque estava montado ao lado da igreja, certamente
ali seria um bom o local para os músicos tocarem. As poucas pessoas
que andavam pelas ruas àquela hora da manhã, eram os homens que
viraram a noite trabalhando para que tudo estivesse pronto logo
cedo. Enquanto isso, o resto da cidade ainda dormia.
Na floresta...
Todo o clã de Ric estava acordado. Seus rostos estavam muito sérios,
e seus corpos tensos. Eles não sabiam o que poderia acontecer a
partir daquele dia. Edie estava pensativo, temia que algo de ruim
acontecesse, temia pelos homens que há muito tempo não saiam da
floresta. A possibilidade de algum deles encontrar conhecidos na
cidade era grande. Ele precisava tomar conta daquele grupo.
Edie separou uma quantidade de facas para escondê-las pelo seu
corpo e limpou sua espada. Não era exatamente a espada que ele
gostaria de ter em suas mãos, mas era uma excelente espada.
A espada que ele queria ter, era a mesma espada que Ram havia
tomado para si, que seu pai trouxe do Japão em uma de suas
viagens. A Corta Relâmpago estava escondida em Santo Pedro e Edie
sabia que Ram a levaria para fora e lutaria com ela se fosse preciso e
ele pretendia tomar a espada das mãos de Ram a qualquer custo.
Absorto em seus pensamentos demorou um pouco para perceber que
Ric estava próximo, conversando com Marcos, outro membro do clã.
Eles estavam combinando qual seria o melhor caminho para retornar
a floresta se caso fosse necessária uma fuga.
Edie caminhou para perto do irmão e colocou uma mão no ombro
dele, Ric virou para falar com Edie enquanto Marcos se afastava para
aprontar suas armas. Os dois irmãos se olharam algum tempo e
depois caminharam juntos para o centro do acampamento. Sentaram
num velho tronco de árvore e permaneceram em silêncio. Somente
era possível ouvir o som da mata.
Após algum tempo Ric quebrou o silêncio. – Hoje o dia vai ser curto.
- E a noite vai ser longa. Respondeu Edie.
- Não sabemos o que pode acontecer hoje à noite, Edie. Falou
enquanto olhava para a vegetação à sua volta. – Não sabemos o que
ele será capaz de fazer.
- Eu me pergunto o que você será capaz de fazer. – Não nossa mãe
não iria gostar caso um irmão ferisse o outro.
- Nossa mãe não está aqui, Edie. – E eu não vou pensar duas vezes
se ele machucar Dina.
- Não é somente sobre ela que estamos falando, existem outras
pessoas na cidade que ele pode ferir e eu quero saber até onde você
será capaz de chegar.
- Se for necessário, Edie. Ele parou um instante antes de continuar. –
Se for necessário, eu afundarei minha espada em Ram.
- Eu imaginei que você responderia isso. Disse Edie lamentando. – Eu
sabia que um dia vocês dois iriam se matar. – Desde crianças vocês
se odiavam e agora vão ter a chance de tirar suas diferenças.
Ric abaixou a cabeça enquanto ouvia o irmão. Ele sabia que Edie
estava certo, mas não concordou, apenas continuou calado mais
alguns instantes antes de mudar o foco do assunto.
- Você acha que eles têm alguma coisa haver com a morte do médico
da cidade?
- Sinceramente, Ric. Respondeu Edie. – Eu acho em parte que eles
possam ter matado o médico, mas só se o médico ultrapassou o
limite da floresta perto de Santo Pedro.
- Também pensei a mesma coisa. – Não acredito que eles tenham ido
até a cidade matar o médico sem motivo aparente. Concluiu Ric. – O
pai de Anja também sumiu, ela e Dina estão pensando que foram
eles.
- Isso é muito estranho, Ric. – Uma morte e um desaparecimento
recentes, não é o estilo de Ram.
- Mas se não foram eles, foi outra pessoa. Concluiu Ric - Quem está
por trás disso? – Qual é a ligação entre o médico de Dina e o Pai de
Anja?
- A única ligação que eu consigo pensar é que eles eram velhos e
conheciam nossos pais. Conheciam a gente. Respondeu Edie.
- Você se lembra do pai de Anja, como ele era, porque eu não me
lembro dele.
- Eu tenho uma vaga lembrança, acho que ele trabalhou na nossa
antiga casa...
- Que foi derrubada! Interrompeu Ric, lembrando com raiva dos
escombros da casa onde ele viveu quando era criança.
- Sim, isso é mais uma coisa que eu pretendo saber, quem derrubou
nossa casa.
- Ele deve saber.
- Ric, você atribui a culpa de tudo em cima de Ram.
- Ele é o mais velho, Edie. – Ele não saia do lado do nosso pai, aposto
que ele sabe muito mais coisas do que você imagina.
Os dois irmãos continuaram conversando quase toda à manhã,
enquanto o clã preparava-se para o que fosse necessário. Muitos
deles partilhavam uma vingança em comum, Ram e Lucaar.
Os dois haviam torturado os rapazes do clã quando eram crianças
motivadas pelo barão, agora eles estavam grandes o suficiente para
devolver a tortura em forma de vingança.
Ric levantou-se e chamou Céu. O cavalo prontamente atendeu o
chamado.
- Aonde você vai? Perguntou Edie curiosamente, mas já sabendo
onde o irmão pretendia ir.
- Vou ver a Diana. – Xau Edie, nos encontraremos durante a festa.
Respondeu enquanto montava no cavalo
- Idiota. – Por que eu ainda pergunto. Reclamou Edie enquanto Ric já
havia sumido na mata.
Na cidade...
Dina aguardava ansiosamente que as horas passassem o mais rápido
possível. Assim sua avó iria para a igreja aprontar as barracas da
festa, deixando a casa livre para que ela recebesse Ric.
- A que horas você vai se arrumar para sair, vó?
- Logo depois do almoço, querida. – Por quê?
- Só curiosidade, Anja vai se arrumar aqui em casa e nós vamos
juntos para festa.
- Aquele seu amigo estará esperando você na lá?
- Sim.
Dina não parava de olhar para o relógio, ainda faltava muito para a
hora combinada com Anja. Ela andava de um lado para o outro no
quarto, ansiosa e inquieta.
Ela temia pela amiga, mas não estava certa se deveria revelar o que
Ric lhe dissera no dia anterior. A possibilidade de Lucaar estar
tramando levá-la para Santo Pedro à força a deixava tensa. Então por
fim, ela decidiu que não iria contar nada.
Deitou-se na cama e enquanto esperava, fez uma pequena reflexão
de tudo o que havia acontecido desde a chegada dela até agora.
Lembrou-se do primeiro dia na escola e da primeira consulta com
Paulo, seu psicólogo. Lembrou-se do tombo na rua de paralelepípedo,
quando viu Ric pela primeira vez e o banho no lago juntos.
Lembrou-se da primeira briga que ela teve com Lorena na porta da
escola e Ric quase ter quebrado o braço de Adan. Lembrou também
da primeira vez que andou sobre os escombros da casa desmoronada
e do susto que levou quando leu o nome de Ric numa lápide no
cemitério nos fundos da casa. Ela começou a rir sozinha quando
achou que Ric era um fantasma, mas o sorriso foi breve porque
lembrou que Ram a havia enganado se fazendo passar por Bob.
Em suas lembranças não pôde esquecer-se de Céu e Tobruk, dois
cavalos belíssimos com personalidades completamente diferentes.
Lembrou-se da lenda da água de Santo Pedro que Paulo lhe contara e
da sua morte repentina há poucos dias. Ela começou a chorar com
remorso por não ter ido nem ao funeral nem ao enterro dele.
Enxugando as lágrimas ela lembrou que avó abriu um baú revelando
as peças de roupas que foram usadas pelos seus pais. Agora ela
estava ali, deitada na cama, esperando que Anja emergisse pela
porta para retirá-la da inquietude do clima.
Finalmente vó Augusta despediu-se. Estava arrumada para festa,
mas antes iria à igreja aprontar as barracas. – Estou saindo, querida.
– Você vai ficar bem em casa, sozinha?
- Sim, vó. Respondeu alegremente. – Estou esperando Anja.
Vó Augusta bateu a porta da rua e seguiu em direção à igreja, Dina a
observava pela sua janela. Quando não pode mais acompanhar a
caminha da sua avó que já estava distante, virou os olhos para o
outro lado e seu coração quase parou.
Ela reconheceu, não tão longe, um certo rapaz alto, musculoso com
um sorriso no rosto, então desceu o mais rápido que pode para
encontrá-lo mais próximo a sua casa.
Ele ficou parado do outro lado da calçada e Dina fez um sinal com a
mão chamando Ric. Ele atravessou à rua e a encontrou na porta da
casa dela. – Entre. Convidou Dina.
Ric estava sorrindo, mas ficou receoso ao entrar na casa de Dina. –
Você está sozinha em casa. Perguntou.
- Sim, minha avó acabou de sair. – Vamos logo, não vai ficar parado
ai fora tanto tempo, alguém pode ver você entrando e contar para
ela.
Ric respirou fundo e entrou na casa de Dina. Ficou olhando para a
sala, encostado na porta, enquanto a garota tentava puxá-lo para
dentro, mas ele a ignorou enquanto caminhava pela sala. Olhou os
móveis com cuidado, tocou na televisão e ascendeu a luz de um
pequeno abajur ao lado da poltrona de leitura no canto da sala.
- O que houve Ric? Perguntou Dina curiosamente. – Você está bem?
Ele não respondeu, mantilha o olhar fixado nos quadros que a avó de
Dina exibia na sala, então se aproximou de um e alongou o braço
para tocar na moldura dourada. Delicadamente ele alisou a madeira
da moldura com a ponta dos dedos.
- Ric. Dina o chamou novamente.
Quebrando o transe ele olhou para ela, seus olhos brilhavam com
possíveis lágrimas que se controlaram para não saltar deles. – Dina,
esse quadro.
- Você está bem? Perguntou novamente. - O que tem esse quadro?
Ela andou até o quadro e olhou a imagem pintada nele. Era um
quadro velho em pintura a óleo, com traços fortes de um garoto bem
jovem junto a um cavalo preto. Ela nunca havia reparado nos
quadros da casa, muito menos naquele quadro antigo que ficava na
parede mais distante da sala.
- O que tem esse quadro?
- Quem o pintou foi minha mãe. Revelou Ric para surpresa de Dina.
Ela recuou um pouco e sentou-se no sofá Ric sentou ao lado dela e
pegou em sua mão. – Foi minha quem pintou, mas eu não sei como
ele veio parar aqui na sua casa.
- Como você sabe que foi ela quem pintou?
Ele levantou e apontou com o dedo para as duas letras no canto da
pintura. C.B. – Está vendo essas iniciais, são da minha mãe. –
Celina Baleares.
Dina olhou para as letras pintadas no quadro e fez um gesto com as
duas mãos mostrando que não sabia como o quadro havia parado na
casa dela. – Eu não imaginava que esse quadro fosse da sua mãe,
Ric. – Também não sei como minha avó o conseguiu. – Quem é o
garoto na tela?
Ric cerrou os lábios antes de responder com certa decepção. – É o
Ram e Tobruk.
- O que, não pode ser. Ela disse incrédula. – Ai já é de mais para
minha cabeça, como pode um quadro que sua mãe pintou estar na
minha casa e com o retrato de Ram nele? – Você viu sua mãe
pintando esse quadro?
- Dina, quando Ram tinha essa idade eu era muito pequeno e se ela
pintou na minha frente, eu não me lembro. – A única lembrança que
eu tenho é que ela gostava muito de pintar.
Dina olhou mais uma vez a imagem de Ram na tela do quadro
enquanto Ric continuava a contar. – Quando fomos para Santo Pedro,
ela disse a meu pai que o quadro havia ficado em nossa antiga casa.
Ele fez uma pausa ao se aproximar de Dina. – Meu pai ficou muito
chateado, porque era da época em que ele trouxe Tobruk da Líbia
para dar de presente para Ram.
Eles ficaram parados olhando o quadro mais alguns instantes antes
de Dina chamar Ric para seu quarto. – Vamos subir.
Os dois subiram juntos as escadas até chegarem ao segundo andar
da casa. Ric ainda tenso continuou cautelosamente seguindo atrás
dela. Quando entraram no quarto de Dina, ela pegou na mão dele e o
levou até a janela onde ela podia ver toda a movimentação da frente
da sua casa. – É por aqui que eu vejo você lá embaixo. Falou sorrindo
tentando deixa-lo mais relaxado.
Ele sorriu de volta e encostou-se no parapeito da janela. Dina estava
ao seu lado e ele segurou em sua cintura puxando-a para perto. Os
dois admiraram juntos toda a paisagem que ficava à frente da janela
do quarto até que Dina sentou na cama.
Ric sentou ao lado dela e tocou as mechas do cabelo que
cascateavam até os ombros, depois com a outra mão tocou com o
polegar os traços de todo o queixo dela e os dois começaram a se
beijar.
Dina abraça Ric com desejo e ele retribuía cada caricia que ela fazia
com um pouco mais de vontade. Eles estavam inclinados até que
Dina deixou seu corpo tombar sobre o colchão. Ric acompanhou o
movimento mantendo seu peito sobre o dela. Os dois estavam tão
juntos que pareciam apenas uma pessoa uma pessoa deitada. A
ingenuidade do corpo deles dava lugar a uma paixão ardente que
ambos sentiam um pelo outro. Ric retirou a camisa quando o clima já
estava quente entre eles, então Anja bateu á porta.
Ric e Dina se levantaram rapidamente da cama. - Quem está
batendo? Perguntou Ric. – Será que sua avó voltou?
- Não. Respondeu Dina tentando tranquilizar Ric. – É Anja quem está
lá embaixo.
- Como você sabe?
- Minha avó tem a chave da porta, ela não iria bater. – Não do jeito
que ela está batendo lá embaixo. – JÁ VOU, ESPERE...
Ric ficou rindo sozinho enquanto acompanhava Dina até o andar de
baixo. Quando a porta foi aberta Anja entrou tagarelando através
dela. – Por que demorou tanto? – Você sabe que odeio ficar
esperando na porta e...
Calou-se subitamente quando viu Ric encostado numa das paredes
com braços cruzados. – Estou interrompendo alguma coisa?
Perguntou Anja quando percebeu que ele estava sem camisa.
Ric abriu a boca para responder. - Na verdade...
- Não interrompeu nada, Anja. Respondeu Dina antes que Ric
pudesse completar. – Estávamos esperando você chegar.
Anja levou a mão até a boca tentando esconder um sorriso
debochado. – Tudo bem, eu volto mais tarde...
- NÃO... Gritou Dina. – Não precisa ir embora, não estávamos
fazendo nada, só esperando você chegar.
- Tá bom. Falou Anja ainda sorrindo. Então ela pegou as bolsas que
havia trazido de casa e os três subiram para o quarto de Dina.
Ao entrar no quarto, Anja jogou as bolsas no chão e começou abrir o
zíper da maior, lá de dentro puxou seu vestido e o pendurou no
cabideiro junto ao vestido da amiga. Ric estava pouco à vontade, mas
tentou agir o mais natural possível enquanto esperava sentado na
cama de Dina.
- Dina eu vou tomar um banho. Falou Anja. – Minha mãe saiu cedo
para encontrar meu pai na casa da floresta, então preferi tomar
banho aqui.
- Certo. Respondeu Dina. – Quer uma toalha?
- Eu trouxe a minha. Respondeu enquanto trancava a porta do
banheiro.
Mais uma vez eles estavam sozinhos no quarto e Dina sentou-se na
cama junto ao Ric. – Estou curiosa.
- Com o quê?
Ela apertou os lábios, respirou fundo e continuou falando. – Quando
você entrou em casa, agiu de uma forma estranha, o que foi aquilo?
- Dina. Sussurrou o nome dela. – Quando meus pais morreram eu
fugi de Santo Pedro. – Deixei tudo o que me pertencia lá, e vivi na
floresta desde então. Ele parou de falar para olhar seu reflexo no
espelho em cima da penteadeira. – Passei muito tempo na floresta e
quando entrei na sua casa recordei da vida que eu tive. Ele abaixou a
cabeça e continuou falando. – Haviam móveis na minha casa, nas
duas casas em que morei, uma aqui na cidade e a outra na Aldeia. –
Haviam quadros... Eu possuía uma vida, assim como você.
- Ric.
- Eu tinha uma vida normal, como qualquer outro garoto, mas meu
pai com sua estupidez tirou isso de mim. – Eu não achava que
sentiria tanta falta disso enquanto estava na floresta, mas quando
entrei aqui, percebi que sinto falta dessa vida que me foi roubada.
Dina percebeu o quanto Ric sofria por causa da loucura do pai dele,
então o abraçou. Estavam juntos quando Anja abriu a porta do
banheiro.
- Ei, eu estou aqui. Interrompendo o casal. – Vocês disseram que eu
não estava atrapalhando.
- E não está. Respondeu Dina ainda olhando para Ric. – Fique aqui,
vou pegar uma coisa para você.
Ela deixou Anja tagarelando com Ric em seu quarto enquanto corria
para o quarto da avó. Arrastou o baú e abriu a fechadura. Procurou o
traje de festa masculino que havia sido usado pelo seu pai e o levou
para Ric.
- Experimente isso.
- O que é isso, Dina? Perguntou Anja.
- É uma roupa para Ric usar na festa.
- Dina? Perguntou Ric. – Onde você arrumou isso?
- Experimente primeiro, depois falamos.
Ric entrou no banheiro com as roupas e a vestiu. Já estava
escurecendo e as meninas começaram a se arrumar também. Quando
finalmente ele saiu do banheiro as duas garotas arregalaram os
olhos, não parecia ser a mesma pessoa que havia entrado no
banheiro minutos antes.
Ele vestia uma calça preta em tecido fino, um pouco mais justa que
as calças que ele costumava usar, combinando uma camisa social
com mangas compridas de linho azul claro, e por cima de tudo um
belíssimo blazer masculino cor grafite. Ric estava lindo.
- E ai, como eu estou?
As duas demoraram alguns segundos para responder e Anja foi a
primeira a falar. – Ric, você está perfeito. Não está, Dina?
- Sim, ficou ótimo. Falou enquanto circulava ao redor dele. – Coube
direitinho em você.
- De quem é essa roupa, Dina? Ele perguntou.
Ela ficou receosa ao responder, mas tomou coragem e revelou que
pertenceram ao pai dela.
- Dina eu não posso usar isso. – São as roupas do seu pai, você
deveria guardar.
- Eu prefiro que você as use. Falou limpando uma pequena lágrima
que relutava em sair dos olhos. – Ele não vai usar isso onde ele está.
Ele segurou na mão dela e a fez girar em círculos. – O que está
fazendo? Ela perguntou enquanto ele a girava.
- Está tão preocupada comigo que se esqueceu de você. – Está linda.
Os dois ficaram se olhando enquanto Anja pigarreava para chamar à
atenção. – Lembrem-se que eu continuo aqui.
Os três começaram a rir. Dina ligou o rádio e direcionou a antena
para a janela, terminaram de se arrumar enquanto ouviam as
baladas de sucesso na radio local.
As meninas penteavam seus cabelos, mas Ric parecia estar prestando
mais atenção na bela canção que estava tocando no radio.
- Você gosta? Perguntou Anja.
- Sim. Respondeu Ric. – É uma boa musica, quem está cantando?
- Não acredito que você não conheça.
- ANJA. Falou Dina. – Ele mora na floresta, não existe energia elétrica
lá.
- Oh, me desculpe Ric. – É que eu não me acostumo com esse
detalhe, você vive numa floresta...
- Tudo bem, Anja, sem problemas.
- Nunca me imaginaria vivendo numa floresta...
- ANJA. Gritou Dina novamente.
Ric balançou a cabeça sorrindo em sinal que estava tudo bem com as
observações de Anja. – Fique tranquila, Dina. – Eu vivo na floresta
escondido do mundo, é normal que ela pense assim. Ele aumentou o
volume do radio. – Quem está cantando?
- É um grupo que está fazendo maior sucesso do momento, são
estrangeiros. Respondeu Anja. – Você fala inglês?
- Compreendo um pouco, meu pai nos ensinou quando era vivo.
- Seu pai falava inglês? Perguntou Dina.
- Sim. – E também falava espanhol e libanês.
- Você também?
- Não. Respondeu rindo. – Só inglês e apenas compreendo, qual é o
nome dessa música?
Dina olhou para Anja esperando que ela revelasse o nome da música,
mas a loura pensou e não sabia dizer. – Desculpem-me.
- Sem problemas. - É linda. Repetiu Ric. – Você também gosta, Dina?
Ela gostava da musica, mas não era a sua preferida. – Eu gosto de
outra que eles cantam, mas é velha e não me lembro do nome,
quando tocar aviso a vocês.
- Já está na hora. Anunciou Anja. – Vamos
Os três, prontamente arrumados para a festa do Solstício, saíram da
casa de Dina e caminharam cautelosamente para a praça central.
Dina, durante toda à tarde, havia esquecido completamente de Ram.
Agora ela estava tensa e a cada passo que ela dava para frente um
arrepio lhe subia pela espinha à medida que eles se aproximavam.
Já haviam pessoas circulando por toda parte, todas arrumadas
apropriadamente para a ocasião. As barracas completamente
enfeitadas iluminavam a praça principal da pequena cidade. Era
possível encontrar todo o tipo de comida e bebida, mas o atrativo
principal da festa era a banda composta de jovens da cidade vizinha.
Dina, Ric e Anja misturaram-se junto às outras pessoas e tentaram
parecer o mais casual possível, sempre atentos a qualquer
aproximação de alguém mais velho. Ric não poderia ser reconhecido
por ninguém.
Quanto mais tarde ficava mais pessoas chegavam à praça. Dina falou
com sua avó no portão lateral da igreja, onde estava o pátio, e lá
haviam mais barracas vendendo mais comidas, bebidas não alcoólicas
e prendas confeccionadas pelas próprias senhoras da pastoral.
- Está tudo bem, querida? Perguntou vó Augusta. – Quer alguma
coisa para comer?
- Não estou com fome, só vim avisar que já estou na festa com Anja
e...
- Aquele rapaz está com você? – Ainda não me falou o nome.
Dina pensou um pouco e respondeu. – Ricardo.
- Tudo bem, divirta-se. Falou enquanto observava o movimento das
barracas do pátio.
Ela retornou o centro da praça para encontrar Ric e Anja, havia
deixado os dois próximos à fogueira ainda apagada. Pelo caminho
esbarrou em uma garota alta com cabelos escuros. – Me desculpe.
A garota havia desequilibrado, mas logo se recompôs, então se virou
para encará-la. – Vê se olha por onde anda. Falou Lorena para
surpresa de Dina que não respondeu à grosseria dela, apenas ficou
olhando com expressão séria.
Lorena estava usando um vestido um azul marinho, justo na cintura,
decorado com pedras brilhantes bem pequenas. Desta vez seu cabelo
não estava preso a um rabo de cavalo irritante, estava solto e muito
bem penteado. Uma fivela discreta um pouco acima da orelha
terminava a combinação.
- Você pode me dar licença, eu quero passar. Pediu Dina
impertinentemente.
- Vá pelo outro lado, estou bem aqui. Respondeu Lorena.
- Um dia vou descobrir, porque você é assim.
- Assim como?
“Insuportável”. Pensou Dina, mas antes que pudesse responder,
Adan, muito bem vestido, estacionou-se ao lado de Lorena. – Algum
problema? Perguntou enquanto a encava.
- Eu não tenho medo de você. Falou para Adan.
- É mesmo? Onde está seu guarda costa agora?
Antes que Dina pudesse responder, reconheceu em meio à multidão
aglomerada uma figura conhecida. Um rapaz alto com cabelos
compridos passeava tranquilamente entre as pessoas. “Lucaar”. Ela
pensou e logo concluiu que Ram também poderia estar perto.
- Não tenho tempo para vocês dois, estúpidos. Falou para Lorena e
Adan enquanto virava as costas para seguir por outro caminho que a
levasse até Ric e Anja.
- Quem ela pensa que é? – Como ela teve coragem de nos chamar de
estúpidos?
Adan deu de ombros e puxou Lorena para próximo à urna com os
nomes dos candidatos. Eles estavam mais preocupados com a eleição
do rei e rainha da festa que com Dina.
Ela finalmente chegou ao local onde a amiga estava tranquilamente
conversando com Ric. – Anja eu vi Lucaar andando por ai.
A loura virou-se para Dina quase não acreditando. – Você tem
certeza, meu Deus.
- Se Lucaar está por aqui, então Ram também está. Disse Ric.
Os três começaram a caminhar entre as pessoas, tentando achar
Ram ou quem quer que fosse de seu clã. Ric havia deixado sua
espada duas ruas depois da praça, mas não estava desarmado,
estava com facas escondidas por baixo do blazer.
A banda começou a tocar músicas românticas e cada casal que
estava na festa se aproximou para dançar fazendo com que Anja se
separasse de Ric e Dina, ela não estava mais conseguindo vê-los, não
com tanta gente tão próxima.
Anja ficou parada onde estava no meio dos casais agarrados se
movimentando em ritmo romântico. Ela estava com medo que Lucaar
pudesse fazer alguma coisa contra ela. Estava atenta a qualquer
pessoa que se aproximasse de forma estranha. Então sentiu uma
mão em torno de sua cintura, leve o suficiente e firme o suficiente
para que ela não pudesse se afastar.
- Você... Ela sussurrou.
Lucaar estava em sua frente olhando-a diretamente. Ele estava serio,
mas não aparentava hostilidade em seu olhar. Ela engoliu em seco e
quando pensou em gritar, ele pousou dedicadamente o dedo
indicador sobre os lábios dela, impedindo que soltasse qualquer
palavra.
- Lembra-se que eu pedi que guardasse uma dança para mim? Ele
perguntou enquanto direcionava a outra mão entrelaçando seus
dedos nos dela.
Puxou-a para perto dele e começaram a se movimentar. Anja estava
dançando com Lucaar ao som romântico da banda, ela não tentou
falar mais nada. Calada, apenas acompanhou a dança.
- O que você quer? Ela perguntou.
- No momento, quero terminar esta dança com você. Respondeu
Lucaar.
- E depois?
- Só quero pensar nesse momento. – Que tolo perderia a
oportunidade de dançar com um anjo.
A banda continuou tocando...
Dina e Ric não conseguiam achar Anja. Ric segurava forte na mão de
Dina para não perdê-la também. Estava escuro e a única iluminação
era das lanternas artesanais que enfeitavam a festa.
- Onde ela está? Perguntou Dina, aflita.
- Calma, vamos achá-la. – Edie está por aqui, ele está observando
tudo.
Num canto escuro qualquer da festa...
Edie beijava Carla ardentemente, os dois encostados no muro. Ele a
apertava entre seu corpo e o cimento, ela com as duas pernas
entrelaçadas na cintura dele. Os dois pareciam não se importar com o
que se passava na festa, nem a música romântica fazia com que Edie
soltasse as mãos das coxas de Carla. – Temos que voltar para festa,
eles podem sentir nossa falta. Ela disse.
- Só mais um pouco. Ele falou enquanto passava os lábios pelo
pescoço dela. – Eu gosto quando você fica nessa posição.
Ela abriu as pernas separando os dois e ficou em pé na frente dele
enquanto fechava alguns botões que foram abertos durante os
abraços. – Está na hora de nós voltarmos.
- Tá bom. Falou Edie mal humorado. – Vamos voltar, mas antes eu
quero mais um. Ele segurou-a pelos cabelos e a puxou aproximando
suas bocas para um ultimo beijo.
A banda ainda soava lindas músicas românticas, mas Ric junto com
Dina perambulavam entre os casais à procura de Anja. Logo perto da
fogueira, ainda apagada, Anja continuava dançando com Lucaar e
Dina conseguiu avistá-los.
- Achei ela. Falou com Ric.
- Onde?
- Ali, daquele lado da fogueira. – Ela está com Lucaar, meu Deus.
Ric soltou a mão de Dina e seguiu apressadamente para a direção em
que Anja estava. Lucaar havia percebido e se antecipou, beijou a mão
de Anja e saiu andando calmamente dentre as pessoas.
Dina ficou sozinha, parada no mesmo lugar em que Ric havia soltado
sua mão quando a banda parou de tocar dando espaço para o
prefeito da cidade subir ao microfone e pedir atenção.
Foi que ai que todas as pessoas da cidade pareciam querer se
aproximar do palanque onde o prefeito estava. Todo mundo se
apertando e Dina não sabia nem onde Anja estava e nem onde Ric
estava, ela mal conseguia se mexer no meio daquela pequena
multidão que se aglomerou de repente à sua volta.
Então o prefeito começou a falar...
“Boa noite a todos, eu espero que estejam gostando do Solstício de
1988. Esta noite, escolheremos o rei e a rainha da festa, mas antes
falaremos um pouco do passado...”.
Enquanto o prefeito falava, Dina sentiu a presença de alguém
próximo, ela virou a cabeça devagar e percebeu que Ram estava a
dois corpos dela. Então ela começou a andar desconfortavelmente
entre as pessoas, Ram a seguia da mesma forma.
“Há muito tempo atrás, nossos moradores mais ilustres da cidade
partiram busca da água milagrosa...”.
Dina fugia de Ram, mas parecia impossível tentar qualquer passo
mais rápido no meio da multidão. Empurrões e cotoveladas não
faziam efeito, então ela decidiu andar abaixada na altura da canela
das pessoas enquanto ouviam atentamente o prefeito falar. Ram
ficou confuso, mas logo conseguiu encontrar por onde Dina havia
passado.
Ric já estava com Anja e os dois olhavam para todos os lados
procurando por onde Dina poderia estar. Ela continuava abaixada,
quase engatinhando na tentativa de confundir Ram.
Após ter falado sobre toda a historia da lenda da água milagrosa, o
prefeito chamou sua secretaria e pediu que ela trouxesse a urna com
os nomes dos candidatos. A urna foi aberta e os nomes foram
anotados em papeis separadamente para que fossem distribuídos aos
jurados. Enquanto os jurados conversavam entre si o prefeito tornou
a falar novamente, desta vez sobre a família de Ric.
“Meus amigos, o Solstício também relembra à morte de uma família
muito estimada aqui na cidade. É de conhecimento de todos que os
Baleares tiveram suas vidas abreviadas por uma fatalidade...”.
Naquele momento o qual o prefeito falava Ram, Edie e Ric pararam
instantaneamente por um momento para ouvir as condolências do
prefeito. Foi a oportunidade para Dina distanciar-se ainda mais de
Ram. Ela levantou-se por uns minutos e esticou o pescoço para ver
onde ele estava, mas não conseguiu encontrá-lo. Procurou em volta e
pôde reconhecer Ric e Anja, mas os dois estavam longe o suficiente
para ela demorar algum tempo para aproximar-se deles. – RIC. Ela
gritou chamando por ele.
- DINA. Ele respondeu de volta enquanto tentava ir de encontro a ela.
Nesse meio tempo Ram pode ver a localização de Dina e retomou a
perseguição. Edie identificou Ram de longe e começou abrir caminho
agressivamente entre as pessoas.
Logo que o prefeito acabou de fazer as condolências lembrando a
família Baleares que morreu soterrada em sua própria casa, chamou
os jurados para anunciar o novo rei e rainha da festa.
“Nosso júri já tem o resultado da votação... Nós já temos o rei e a
rainha do Solstício de 1988. Vou abrir o envelope”.
Dina já estava muito próxima à fogueira da festa que iria ser acesa
um pouco antes da meia noite. Pessoas haviam colocado bilhetes
entre a madeira com pedidos e agradecimentos, era uma tradição
local.
“O rei a rainha da festa são... Esperem eu abrir o envelope”.
Dina estava ao lado da fogueira onde havia mais espaço para andar
livremente, já que as pessoas estavam amontoadas mais próximas
do palanque onde estava o prefeito. Ram conseguira achar o local em
que ela estava e Ric, com mais sorte, estava muito mais próximo.
Edie tentava freneticamente correr para perto de Ram.
O prefeito abriu o envelope e retirou o papel com os nomes.
“E o rei a rainha da festa do Solstício de 1988 são...
Lorena Veiga e Adan Àvila... Palmas para eles”.
Todos bateram palmas para o novo casal enquanto Lorena e Adan
subiam no palanque para serem coroados. Dina circulava a fogueira
fugindo de Ram quando tropeçou em uma lata de liquido inflamável.
A lata vazia estava bem ao lado da fogueira, mas ela ignorou. – Ric,
me ajude. Ela gritou.
Ram estava próximo à fogueira e levantou o braço como se fizesse
um tipo de sinal para alguém. Ric conseguiu sair do meio da multidão
e estava correndo na direção de Dina. Lorena e Adan haviam sido
coroados rei e rainha da festa. Vó Augusta batia palmas de longe ao
lado do padre tranquilamente sem perceber que Dina estava em
perigo.
Ram viu que Dina havia corrido pra trás da fogueira e fez outro sinal
com o braço. Ric conseguiu finalmente chegar ao centro da praça
onde estava a fogueira e Dina atrás dela. Todo o resto das pessoas
da cidade estavam felizes, quando um som estrondoso fez com que
toda a atenção em Lorena e Adan fosse dispersa.
Uma explosão de dentro da fogueira fez com que a madeira usada
para sua construção saltasse contra tudo o que estava ao seu redor.
Um corre-corre tremendo, e a pequena multidão da cidade não sabia
o que fazer. Pessoas foram atingidas pelos estilhaços da madeira e
ficaram feridas. Ric havia caído por causa da explosão, mas levantou-
se apressadamente. Um enorme pedaço de madeira queimada
acertou Dina por trás da cabeça fazendo com que ela desmaiasse.
- DINAAAAAA. Gritou Ric.
EPíLOGO
Na manha seguinte, as pessoas ainda se perguntavam se alguém
sabia responder por que a fogueira havia explodido misteriosamente.
Padre Santiago tentava consolar vó Augusta, mas ela parecia estar
inconsolável.
Lorena e Adan não mostraram qualquer pesar pelo que havia
acontecido na festa da cidade. O prefeito foi ferido, mas nada que
pudesse interferir em sua saúde.
Quando a policia apareceu, quase meio dia, não foi para averiguar a
ocorrência da noite passada. Eles estavam ali para chamar alguém
que pudesse reconhecer dois corpos encontrados numa velha casa na
floresta.
- Oh meu Deus. Falou vó Augusta. – O senhor tem certeza policial?
- Sim senhora, foram encontrados mortos, os dois corpos juntos.
- Como eles morreram, policial?
- Ao que parece... Alguém cortou a garganta deles. – Podemos ir
agora para fazer o reconhecimento?
- Sim, vou pegar minha bolsa e avisar ao padre Santiago que os pais
de Anja foram assassinados.
Continue acompanhando a história no segundo livro “Refúgio”
da
Trilogia Aldeia de Santo Pedro
Danielle Sampol