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Anais Eletrônicos do 14º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia – 14º SNHCT
Belo Horizonte, Campus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
08 a 11 de outubro de 2014 | ISBN: 978-85-62707-62-9
UNIVERSAIS DE FILOSOFIA, HISTÓRIA E GEOGRAFIA DAS CIÊNCIAS
... E O EXEMPLAR FÉRTIL DA CIÊNCIA GEOGRÁFICA
Dante Flávio da Costa Reis Júnior*
1. INTRODUÇÃO
Podemos definir que, tradicionalmente, o âmbito da Filosofia da Ciência (FC) lida com
averiguação de “confiabilidades”. A confiabilidade “lógica” das proposições explicativas, e a
“utilitária” das operações técnicas. Por sua vez, no domínio da História da Ciência (HC)
trataríamos, comumente, dos papéis-chave jogados por personagens e/ou instituições:
concepção de ideias e sua retransmissão. Como “terceiro âmbito”, apesar de que ele tende a
estar oculto nas tradições bibliográficas de FC e HC, poderíamos ainda demarcar o setor
investigativo da “Geografia da Ciência” (GC) – como subcampo que se incumbiria de
examinar questões a ver com “contexto espacial”: a interpretação especialmente local,
regional ou nacional daquelas proposições e/ou operações referidas acima.
Neste texto de comunicação, por se tratar de um Simpósio concebido para a discussão do caso
histórico das chamadas Ciências Humanas, desejamos apresentar um balão de ensaio que
reputamos interessante (e sobretudo por se tratar de um caso esquecido pela literatura em FC e
HC): a ciência geográfica. Nosso propósito é, primeiramente, destacar o que julgamos ser os
principais aspectos identitários dos estudos trisetoriais, de FC, HC e GC; e, em seguida,
demonstrar de que formas estes aspectos têm podido (ou poderiam, virtualmente) ser
explorados por eventuais interessados em historiografia ou epistemologia da Geografia.
2. OS UNIVERSAIS DE FC, HC E GC
2.1 FC: embasamento filosófico, limites epistêmicos e complexo causal
2.1.1 A orientação: ou, o “embasamento filosófico”
Este primeiro universal de Filosofia da Ciência refere-se a uma já bastante longeva
modalidade de reflexão, a qual pretende denotar os sistemas de pensamento que “alicerçam”
e, por isso, definem matrizes orientadoras dos gêneros de discurso que o cientista verbalizará.
* Doutor em Ciências; Professor Adjunto do Departamento de Geografia (Instituto de Ciências Humanas,
Universidade de Brasília).
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O debate em torno do assunto tem antecedentes célebres. Mais contemporaneamente, porém,
um nome ilustre é o de Alexandre Koyré (1892-1964), autor de um texto-marco grandemente
recorrido a partir da segunda metade do séc.XX. O “De l’influence des conceptions
philosophiques sur l’évolution des théories scientifiques” é a versão textual de uma
conferência que Koyré proferiu na reunião da Associação Americana para o Progresso da
Ciência (Boston, 1954); e apareceu sob a forma de capítulo num dos mais importantes livros
de autoria de Koyré: nos Études d’histoire de la pensée philosophique, editado em 1961.
Ali é veiculada a ideia de que as teorias são produtos sempre influenciados por uma
infraestrutura ou “horizonte” filosófico; e que tal influência talvez até seja mais intensa do
que a que se dá no “sentido contrário”, digamos assim. Neste sentido, o pensamento científico
de personagens tais como Descartes e Kant seria altamente tributário de suas respectivas
visões filosóficas do mundo. E, nesse mesmo espírito de interpretação, os sistemas de
pensamento atribuídos aos filósofos do Círculo de Viena, a Mach, a Comte, a Bacon e a
pensadores mais pretéritos ainda, teriam respingado de algum modo nos empreendimentos
intelectuais das ciências em geral. As ideias metafísicas de “harmonia do mundo”, de
“imutabilidade divina”, por exemplo, ver-se-iam reencarnadas em muitas das explanações
físicas acerca da mecânica planetária e da conservação do movimento.
O postulado basilar inerente a esse princípio geral da orientação ou embasamento filosófico
reside, então, na concepção de que o pensamento científico nunca se desenvolve no vácuo;
ele, na verdade, estará sempre inscrito num “quadro de ideias”. E, por ser assim, a própria
transição entre tradições de pesquisa (marcada por aquilo que o historiador chamará
“revoluções”) já deve, muito provavelmente, prever na escala do substrato ou “subestrutura”
uma correspondente mudança de atitude filosófica. A transição entre os mundos físicos
aristotélico e ptolomaico teria, assim, derivado da gradativa passagem de uma filosofia da
“ordem cósmica” a uma filosofia da “geometrização” – aparentemente, respondendo por uma
relativa alteração na ideia de conhecimento (do sensualista ao intelectual/abstrato).
É fora de dúvida que a obra de Einstein foi inspirada por uma meditação filosófica
e dele poder-se-ia dizer que, como Newton, foi tão filósofo quanto físico. É
perfeitamente claro que sua negação terminante, e até apaixonada, do espaço
absoluto, do tempo absoluto, do movimento absoluto [...] fundamenta-se em um
princípio metafísico. (KOYRÉ, 1979: 69).
2.1.2 As fronteiras e linguagens identitárias: ou, os “limites epistêmicos”
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Este segundo universal remete às tentativas (esforços recorrentes, por ser tema irresistível ao
olhar intérprete) de definir o preciso domínio de atuação das disciplinas. De hábito, esse estilo
de análise vai expor também a condição de “interface” do campo disciplinar em questão com
demais ciências – e isso, normalmente, na intenção de desenhar as possibilidades de tráfego
epistemológico entre as vizinhanças: trânsito de conceitos, teorias, técnicas.
Essa tendência à demarcação de âmbitos tem, como se depreende, íntimo parentesco com
outra datada propensão: a classificação das ciências. Apesar de possuir, é claro, antecedentes
bem mais longínquos (aristotélicos, depois baconianos, p.ex.), o séc.XIX testemunharia
notáveis empreendimentos com essa intenção: o clássico Cours de philosophie positive, de A.
Comte (1830), o Essai sur la philosophie des sciences, de A.-M. Ampère (1834) e o The
classification of the sciences, de H. Spencer (1864) – obras nas quais, sob terminologias
distintas (cosmológico/noológico, abstrato/concreto), são definidos os setores particulares das
ciências físicas e humanas (ABBAGNANO, 2003). Ainda assim, a defesa da existência de um
denominador comum estaria presente em declarações igualmente célebres. É que o respeito a
procedimentos fundamentais acabaria aproximando aqueles setores; por exemplo, a
enunciação de afirmações seguida de testes de verificação – ou seja, o entendimento de que os
fatores “hipótese” e “critério de confirmação” pertenceriam ao quadro processualístico de
toda e qualquer disciplina pretendida científica (HEMPEL, 1974).
De todo modo, malgrado a recorrência dos discursos pró-ecumenismo, mantém-se íntegra a
ideia de “setorização”; a noção de que haveria “irredutíveis especificidades” aos domínios
físico e humano. Por exemplo, estas: as ciências sociais procuram a “compreensão”; têm
dificuldade em escapar de especulações metafísicas; praticam, irresistivelmente, abordagens
relativistas; e ostentam “certa resistência” às práticas de abstração matemática (RAVOUX,
2004). Por consequência (em lógica opositiva), as naturais possuiriam como peculiaridades, o
anseio de explicação causal, o comprometimento com a verificação empírica, o
autoconvencimento da universalidade/reprodutibilidade do fenômeno e a grande afinidade
com a linguagem lógico-abstrata. Sendo assim, haveria pontos de divergência, tanto quanto de
convergência. Dentre os primeiros, a possibilidade de manipular/combinar as variáveis em
questão; dentre os últimos, o fato de que, a rigor, todo objeto de estudo pertence (e deveria,
portanto, ser restituído) a uma família ou conjunto maior e complexo de fenômenos.
E a distinção entre essas classes de interesse investigativo é mesmo um tanto antiga:
Je viens de classer toutes les vérités qui se rapportent au MONDE MATÉRIEL; je
vais maintenant faire un travail semblable à l’égard des vérités relatives à LA
PENSÉE, considérée, soit en elle-même, soit dans les signes par lesquels les
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hommes se transmettent leurs idées, leurs sentiments, leurs passions, etc.; soit dans
tous les développements qu’elle prend à mesure que les sociétés humaines se
développent elles-mêmes. Les divisions et subdivisions de ces véritées forment les
sciences auxquelles j’ai donné le nom de noologiques. (AMPÈRE, 1843: 1, grifo do
autor).
2.1.3 A causalidade e a indeterminação: ou, o “complexo causal”
Este terceiro universal de FC tem a ver com a reflexão sobre até que ponto ou em que
circunstâncias o cientista, em sua atividade investigativa, está diante de fenômenos passíveis
de explicação por meio de relações de causa-efeito enunciáveis de um modo suficientemente
simples. Ou se, por outro lado, se defronta com processos que, de tão intrincados, dão a
entender que se trata de dinâmicas incorporadoras de imprevisibilidade ou, quem sabe, de
situações em que o intelecto e/ou os instrumentos disponíveis simplesmente não capturam a
totalidade de variáveis supostas – o que pode levar o cientista a sugerir níveis graduais de
indeterminação. Em todo caso, sem que se caia na tentação de decretar a não-causalidade,
pode-se trabalhar com uma imagem (menos drástica) de “bruma causal”.
O mais expressivo dilema do determinismo possivelmente resida na observação de que
“escolhas livres” na natureza tenderão a ensejar ações/efeitos distintos; e isso constrange o
ideal preditivo da ciência moderna. O acolhimento do fato é bastante remoto em Filosofia; é
pré-socrático. Mas parece só ter sido pacífica e friamente racionalizado em Ciência com as
mecânicas estatística e quântica e com o evolucionismo neodarwinista – quando, então, um
olhar mais contemporâneo vai matematizar a ocorrência de sistemas cuja dinâmica é não-
linear; e que, de modo curioso, conseguem ser “criativos” diante da fatalidade do irreversível.
A partir do séc.XIX a mecânica clássica/newtoniana passaria a estar restrita a alguns setores
do mundo. Seria revogada para a explanação dos setores onde há flutuações, assimetria
passado/futuro, sensibilidade a condições iniciais. A causalidade mesma não chega a ser
abolida, é claro. (Isso simplesmente repeliria o olhar científico sobre o mundo e seus setores.).
Todavia, parecerá oportuno lidar com a abordagem de “populações”, a qual, insinuada por Ch.
Darwin e L. Boltzmann, sugere haver informações que não são vistas quando miramos as
trajetórias individuais. Já quando observamos o agregado, sim. Trata-se das “propriedades
emergentes” – que à visão clássica (de causalidade linear) escapam.
I believe that we are therefore indeed at the beginning of a “New Physics”. Until
now, our view of nature was dominated by the theory of integrable systems, both in
classical and quantum mechanics. This corresponds to an undue simplification. The
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world around us involves instabilities and chaos, and this requires a drastic revision
of some of the basic concepts of physics. (PRIGOGINE, 1990: 29-30).
2.2 HC: contexto social e consonâncias efêmeras
2.2.1 A sociologia do conhecimento: ou, o “contexto social”
Este universal de História da Ciência, colocado nesses termos genéricos, acaba adquirindo de
fato uma condição de aspecto inquestionável. Pois que se trata aqui dos fatores de época –
designativo bastante amplo, e que remete às várias formas de “condicionamento”; por
exemplo, aquelas derivadas de uma atmosfera política que possa ter promovido (ou inibido)
tanto as operações técnicas, quanto as proposições explicativas do cientista.
Um autor que explorou questões especiais do assunto foi Robert K. Merton (1910-2003). Ele,
portanto, inscreve-se celebremente no moderno discurso que desconstrói a imagem de ciência
como atividade blindada às paixões e vicissitudes do meio social. Ela, neste sentido, descida
de uma “torre de marfim”, não estaria imune a ações restritivas e repressivas; assim como seu
praticante não teria sempre posturas ilibadas. (Aliás, seriam perfeitamente naturais as atitudes
competitivas e, não raras vezes, pretensões mais “espúrias”.). Contudo, haveria um “ethos”
correspondente à atividade; um complexo de normas legitimado institucionalmente, e depois
internalizado pelo grupo – o que só denota e reforça, pois, seu caráter sociológico (dada a
evidente “estrutura de controle”, operada pelo imperativo da comunicação).
The abuse of expert authority and the creation of pseudo-sciences are called into
play when the structure of control exercised by qualified compeers is rendered
ineffectual. (MERTON, 1973: 277).
O universal envolve o fato da ciência estar embebida num meio de processos sociais
complexos (dele absorvendo, então, demandas e regulamentos), mas não menos o fato de que
ela retroage (dando sustentação ou questionando o sistema social instaurado). Por outro lado,
esse largo âmbito que é a discussão sociológica também pode convidar o historiador das
ciências a se perguntar em que medida a atividade científica restaria, ainda assim, “objetiva”.
Quer dizer, apesar do poder normativo (em geral concentrado e redifundido a partir de certos
centros de desenvolvimento técnico), que margem ainda haveria para escaparmos dos valores
de circunstância e época? Diferentemente, é claro, de dizer que seria possível suprimir os pré-
juízos ideológicos (hipótese que nenhum sociólogo da ciência toleraria), a “objetividade” não
poderia se evidenciar pela simples ação de explicita-los sem pudor? (VARSAVSKY, 1975).
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2.2.2 Os padrões de evolução: ou, as “consonâncias efêmeras”
Este segundo universal de HC é, a exemplo do anterior, colocado aqui em termos bastante
genéricos, mas com o propósito de salientar sua indubitável relevância.
Nos referimos aos estudos, há muito empreendidos pela comunidade de historiadores da
ciência, que procuram identificar na linha do tempo a ocorrência de temporadas ao longo das
quais determinadas tendências interpretativas e procedimentais parecem cativar a adesão da
maior parte dos praticantes de uma dada ciência. Assim sendo, este universal chama a atenção
para a condição interina/provisória daquilo que nos habituamos a chamar “paradigma”. Mas o
historiador praticante do universal também poderá, não raras vezes, nos demonstrar outras
situações pertinentes – tal como o caso intrigante da manifestação de uma “coexistência” de
modelos rivais, sem que necessariamente se perceba a adesão preponderante a um deles.
De qualquer maneira, como o tema tem discussão longeva no estudo histórico das ciências,
encontramos autores cujas reflexões a respeito, conquanto possam assemelhar-se por admitir
o caráter transitório dos protótipos descritivos, propõem mecanismos distintos para que estas
mudanças teóricas se deem. Um trio especial de autores costuma ser referido como o que
estabelece os fundamentos mais essenciais para o debate da questão na cena de pós-guerra: K.
Popper, I. Lakatos e T. Kuhn. O primeiro, entendido como o mais normativo dos três, define
uma dinâmica de proposições que são seguidas de testes crescentemente rigorosos até que sua
refutação (uma espécie de desígnio final, mas que se tenciona com boa-fé e rigor lógico)
venha a nos trazer uma teoria mais bem-sucedida que a precedente. O segundo refina a
proposta popperiana: por meio da ideia de estrutura programática, define um núcleo de
hipóteses a ser, o mais possível, preservado do ímpeto falsificador; logo, de vez que admite a
existência de uma hierarquia de proposições, insinua que o cientista teria de recrutar para a
linha de frente aquelas que pareçam não comprometer o conteúdo nuclear, e, assim, favorecer
sua rotina de atividades. O terceiro, provavelmente o mais popular do trio, ganhou
notoriedade por ter incorporado em seu modelo um elevado teor de elementos sociológicos. A
começar pela passionalidade ou subjetivismo que poderão estar embutidos nas atitudes dos
praticantes. Deste modo, períodos de transição entre duas tradições de pesquisa tenderiam a
prever comportamentos que, em realidade, seriam difíceis de associar ao estatuto da
racionalidade lógica: rivalidades cegas, alinhamentos dogmáticos, oportunismos de toda sorte.
Quer dizer, as temporadas de conflituosidade (previsíveis, no modelo kuhniano, até que um
próximo período de suficiente consenso se instale) não se caracterizam necessariamente por
um jogo que levará à vitória aquela proposição cujos aderentes provaram, com tempero e
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parcimônia, sua superioridade lógica – desmistificação esta compartilhada por um quarto
também notabilizado personagem (o mais impertinente), P. Feyerabend (CHALMERS, 1993).
Preconception and resistance seem the rule rather than the exception in mature
scientific development. Furthermore, under normal circumstances they characterize
the very best and most creative research as well as the more routine. Nor can there
be much question where they come from. Rather than being characteristics of the
aberrant individual, they are community characteristics with deep roots in the
procedures through which scientists are trained for work in their profession.
Strongly held convictions that are prior to research often seem to be a precondition
for success in the sciences. (KUHN, 1970: 357).
2.3 GC: conjuntura local
2.3.1 A dimensão tópica da ciência: ou, a “conjuntura local”
Este universal, que a bem dizer sintetiza num atributo só as características inerentes a esse
âmbito de investigação que podemos denominar Geografia da Ciência, costuma ficar
encoberto pelas célebres tradições dos estudos de filosofia e de história das ciências.
Trata-se aqui, no mais das vezes, de estudos atraídos pelo fato de que um mesmo ideário ou
práticas científicos (estilos de abordagem, expedientes técnicos) são apreendidos e
retransmitidos de modos distintos, de acordo com especificidades do lócus de manifestação –
sendo que isso poderá se dar numa mesma época ou com defasagens temporais (considerando
como parâmetro, é claro, a ocorrência original daquilo que se entenderá como manifestação
genuína). Noutras palavras, estudos de GC põem na alça de mira as “idiossincrasias” do lócus
em questão, procurando desvendar o motivo pelo qual o ideário (e/ou a prática) da ciência sob
análise acabou sendo incorporado(a) de um modo peculiar – dando, portanto, uma impressão
de “releitura particular”, endógena ... ou, quem sabe, melhor adjetivando, “indígena”.
Um notável movimento que se enquadra nas preocupações teóricas em GC são os chamados
“Science Studies” (SS) – os quais exemplificam bastante bem o questionamento dos cânones
interpretativos vigorantes até os anos 1950. Entre os estatutos principais dos SS encontramos
a recusa categórica da velha distinção entre os contextos de descoberta e de justificação e a
saliente ênfase na máxima de que ciência seria mesmo algo praticado localmente – quando,
então, fatores tais como biografia e instrumento poderiam jogar um papel realmente
determinante na viabilização dessa prática (VIDEIRA, 2005). Haveríamos, então, de sondar a
natureza peculiar dos ambientes em que ela é exercitada; quem os constrói e por que. A fim
de captar os detalhes decisivos, empreender quase que uma “etnografia” dos laboratórios.
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Não ternos escolha [...] se quisermos aplicar nossa primeira regra metodológica: se
os cientistas, que seguimos como se fôssemos sombras, entram em laboratórios,
então também ternos de entrar [...] (LATOUR, 2000: 106).
3. OS “REBATIMENTOS” NO CASO DA CIÊNCIA GEOGRÁFICA
3.1 FC(G): “substrato”, “território/fronteiras” e “nuvem”
Com propósitos mais linguístico-literários que propriamente por precisão científica, nos
valeremos de expressões que farão alusão “geográfica” aos seis universais apresentados há
pouco. Isso se dará mediante metáforas que exprimem fenômenos de interesse corrente de
geógrafos físicos ou humanos.
3.1.1 “Substrato”
Embora não sejam tão frequentes as pesquisas consagradas especialmente ao diagnóstico das,
digamos assim, “filosofias subjacentes às geografias”, tem havido entre os epistemólogos da
Geografia uma aceitação tácita em torno da questão. Toda escola de pensamento geográfico
estaria assentada sobre um substrato de ordem filosófica. Sua epistemologia sedimentada
sobre horizontes ontológicos (CAPEL, 1981; JOHNSTON, 1986; AITKEN; VALENTINE,
2006). O tema, porém, caberia ser mais atentamente examinado, a fim de medirmos os graus
(decerto variáveis) de introjeção dos sistemas de pensamento filosófico nos raciocínios e
práticas geográficos.
Até que ponto, p. ex., a Fenomenologia se viu sustentando o juízo interpretativo dos
geógrafos que, a partir dos anos 1970, se preocupariam com a percepção do meio ambiente e
o papel das experiências afetivas na relação entre homens e lugares? Uma forma especial de
enxergar elos de correspondência entre a filosofia desenvolvida por Edmund Husserl (1859-
1938) – e prosseguida/remodelada por nomes como o de Maurice Merleau-Ponty (1908-1961)
– e a ciência geográfica sob a forma de uma de suas vertentes (intitulada “humanista”) é
mediante a detecção de harmonias entre certas cláusulas ou “preceitos” do sistema filosófico e
determinados atributos ou “premissas” da escola científica; o que em geral se traduz pela
potencialidade que o sistema acaba tendo enquanto orientador do método a ser empregado
pelo cientista (REIS JÚNIOR, 2011). Sendo assim, uma seara potencial de investigações seria
aquela em que o filósofo da ciência geográfica avaliaria os efetivos proveitos que seus
praticantes poderiam tirar daquelas cláusulas – no caso da Fenomenologia, os preceitos da
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intersubjetividade, da redução eidética, da intencionalidade, etc. (NOGUEIRA, 2005). Por
conseguinte, uma inspiração filosófica poderia estar, enquanto substrato, dando amparo ao
tratamento conceitual e metodológico do fenômeno espacial em Geografia.
Deliberadamente, o cientista poderá sair à caça da orientação paradigmática que estaria
enraizando o terreno científico. A correspondência cláusulaatributo (ou,
preceitopremissa) pode prender a atenção do filósofo da ciência num plano eminentemente
teórico: o da reflexão sobre a procedência originária de tal ou tal estilo de
atividade/procedimento. Por detrás das “proposições teóricas” poderíamos, então, buscar o
“pano de fundo” – constituído, talvez, de concepções metafísicas. Sondar a fundo as camadas
estratigráficas (uma espécie de subsuperfície filosófica) que dão sustentação àquilo que
eclodirá à superfície (nas conjecturas e operações do cientista).
A filosofia monista de Haeckel exerceu forte influência em Ratzel, pois, por questões
políticas e territoriais, associadas ao forte impacto dos postulados positivistas e
mecanicistas, mais o problema que os postulados darwinianos colocavam para os
impérios, pois com o primado da competição e da evolução colocava um problema
sério para a manutenção política das extensas áreas coloniais. (VITTE, 2009: 28).
3.1.2 “Território/fronteiras”
Este é um tema de assídua presença na literatura que trata da identidade epistemológica da
Geografia. E a razão mais forte para que isso se dê é precisamente o fato desta disciplina,
desde períodos pré-científicos, já desenhar para si uma destinação bifacial: lugares e/ou
homens. Daí, sem que se tenha definido essa “licença” em regulamento, muitos geógrafos
passariam a estudar especialmente os fenômenos do quadrante físico; enquanto outros tantos,
as características regionais dos povos; e ainda alguns, embora em menor número, se
empenhariam em desvendar as ações coordenadas dos fatos natural e cultural. Em meio a
estes últimos, personagens que deram um esboço precursor das abordagens que, no futuro,
seriam denominadas “ecológicas” – isto é, apresentando povos e lugares em relações de
mútua dependência. Tal parece ser o caso, p.ex., de Ibn-Khaldun, e já no séc.XIV (DIKSHIT,
2013). Diante, então, da tremenda abertura de temas que, teoricamente, pode estar na alça de
mira do geógrafo, desde muito cedo se manifestarão ponderações acerca das espécies de
“cuidado” que este profissional deve ter para (talvez em vão) salvaguardar uma mínima
identidade linguística e metodológica. No entanto, mais intrigante que esse longevo status de
disciplina estilhaçada – o que, aliás, tende a suscitar nas vizinhanças uma imagem de não-
ciência, ou então de mero saber enciclopédico –, é o fato de que dessas mesmas ponderações
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derivam ideias extremamente antagônicas: uma, de preocupação ou mesmo consternação;
outra, de autoelevação, quase soberba. A Geografia não teria mais como demarcar para si um
território autônomo, dentro de cujos limites ela agiria com soberania (a despeito, é claro, das
trocas que sempre se dão através de fronteiras porosas). Ou ... a Geografia seria excepcional
exatamente porque teria nascido num contexto em que o juízo científico recomendava a
fragmentação disciplinar (ela, por isso, teria sido “indisciplinada” ... quando ansiou
transgredir a imposição das disjunções). Parece-nos que isso a torna, em todo caso, um prato-
cheio para estudos de Filosofia da Ciência. E ainda mais porque, considerando a conjuntura
atual – em que se preconizam atitudes mais ecumênicas, de livre-trânsito e amplas trocas e
compartilhamentos –, averiguam-se casos pioneiros. Isto é, a história mais pretérita já nos
notifica de iniciativas dianteiras nesse projeto que hoje chamamos, correntemente, de
transdisciplinar.
[...] a Geografia foi impossibilitada (pelo caminho que assumiu) de construção
unitária e mesmo de um lugar preciso entre as ciências. Isso, nos parece, dificultou,
para a Geografia, a construção de um método, pois propunha-se a unidade
natureza-sociedade num contexto científico onde estas dimensões disjuntas
perseguiam métodos diferentes. Hoje esta perspectiva de conjuntividade inicia seus
alicerces, para além da Geografia no âmbito das demais ciências.
(SUERTEGARAY, 2003: 46).
3.1.3 “Nuvem”
São seculares as considerações acerca da estrutura causal operando por trás dos fenômenos de
interesse da Geografia. No período moderno, duas escolas nacionais emblemáticas ilustrariam
vieses opostos neste histórico debate: a germânica, dando a entender a possibilidade de
explanarmos sobre a relação homem-meio via princípios causais rígidos (determinação
linear); e a francesa, por sua vez desabonando a razão muito sistematizadora (combinação
complexa). Uma terceira via – anglo-saxônica e de pós-guerra –, mesclando talvez o que
havia de perspicaz nas primeiras duas, abriria para a ciência geográfica trilhas de acesso a um
tratamento mais fino da complexidade subjacente aos processos que investiga: o estocástico.
Intuímos ser conveniente aprofundar estudos comparativos que examinem as intersecções e as
disjunções das geografias clássica e teorética. Daí, a hipótese sugerida (de que a New
Geography, buscando o controle e a previsão dos fenômenos, teria conservado o que havia de
útil nos insights alemão e francês) pode vir a explicar o fato de que as “emergências” e
“concomitâncias” – há muito atraindo a atenção desta ciência – vêm recebendo uma leitura
matemático-abstrata por meio de modelos probabilísticos. Isto é, a nova geografia teria
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recuperado da primeira escola o anseio por uma explicação causal, e da segunda, o certo
receio de ossificar a realidade em questão. Teria despertado, assim, uma empresa explicativa
sustentada sobre modelos que incorporam o fator incerteza. Modelos pelos quais o que se
descreve é uma soma compacta ... feita dos pequenos (e, quando isolados, inevitavelmente
obscuros) particulados.
[...] le fonctionnement d’un système territorial est le résultat de processus qui se
déroulent à des échelles spatiales différentes. Or, la résultante de la combinaison de
ces dynamiques imbriquées est généralement méconnue car complexe, en effet, les
phénomènes observés à l’échelle macro ne sont pas la somme de ceux intervenant à
l’échelle micro. Parallèlement, les processus se déroulent à des échelles temporelles
variables – temps longs et temps courts – mais concomitants et s’expriment avec des
délais de réaction et des anticipations. (VOIRON; CHÉRY, 2005: 3).
3.2 HC(G): “ambiente” e “conflito”
3.2.1 “Ambiente”
Possivelmente o ângulo de abordagem mais recorrente nas pesquisas brasileiras em história
do pensamento geográfico é o que incide nas questões a ver com o condicionamento de época.
Trate-se da preocupação em demonstrar o papel que um dado personagem jogou, digamos,
para a difusão de novas teorias, ou trate-se do interesse em comprovar o relevo que certa
instituição teve, p.ex., no estímulo a novos ritos procedimentais, as pesquisas invariavelmente
vão procurar realçar o peso determinante dos agentes e episódios de conjuntura.
Ricos levantamentos acerca da criação de ambientes propícios à manifestação/reprodução dos
saberes geográficos têm aparecido em anais de congresso e compilações de programas de pós-
graduação há pelo menos duas décadas. São estudos tópicos que pretendem apontar os fatores
responsáveis pelo surgimento de cursos universitários, entidades de representação, institutos
de pesquisa, etc. – e que, por atribuírem significância à atmosfera cultural (constituição de
novos imaginários), ao panorama político-econômico (transformação do modelo produtivo) e
ao cenário social (surgimento de novos anseios), acabam contribuindo para a “história
institucional da geografia brasileira” (MACHADO, 2000: 137).
Sobre a associação da Sociedad Mexicana de Geografía com a política e os governos, Luz
Bernal aponta:
[...] las sociedades científicas desempeñaron papeles de diverso peso e importancia
en su relación con el poder. Los gobiernos y las empresas [...] encontraron en las
asociaciones a los peritos y estudiosos que podían asesorarlos en la solución de
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problemas específicos. Y también, el vehículo para efectuar acciones de promoción
política y partidista. [...] Aquí obviamente destacaron las relaciones de las
sociedades de geografía con los gobiernos, pues como es bien sabido, la disciplina
suele emplearse como indispensable herramienta política, por sus objetivos de
amplio espectro y por sus alcances metodológicos. Aspectos ambos, que
reconocieron los ideólogos mexicanos del siglo XIX. (BERNAL, 2003: 156).
3.2.2 “Conflito”
O tema das mudanças científicas em Geografia, embora saliente, não é expressivo em número
de estudos dedicados a ele. Por consequência, predomina entre os discursos o refrão da
fraseologia kuhniana (“paradigma-crise-revolução”); no entanto, os estudos históricos desta
disciplina tendem a replica-lo sem maiores ponderações. Corre-se o risco, portanto, de
veicular informações contraditórias, porque inconciliáveis com a proposta genuína de Kuhn.
Consideramos, neste sentido, que seria conveniente apropriarmo-nos de modo menos
superficial dos modelos de evolução científica; e a fim, justamente, de procedermos a leituras
mais balizadas sobre como se dão as disputas teóricas em Geografia. Por felicidade, certos
pesquisadores fogem à regra e cumprem o requisito: percebem, p.ex., que a história particular
desta disciplina pode prever eventos de “infidelidade” circunstancial dos usuários, tanto
quanto de “simultaneidade” conjuntural de teorias que se pretendem excludentes.
Adriano Figueiró preocupou-se em examinar o caso dos estudos de climatologia, divulgados
pela Revista Brasileira de Geografia ao longo de quase cinquenta anos. Verificou que o
ajustamento a um esquema evolutivo em que há convergência de comportamentos não é
exatamente o predicado da comunidade de climatologistas do país.
Analisada a seqüência histórica de aparecimento de artigos vinculados a um ou
outro paradigma [climatologia “descritiva” ou “dinâmica”], foi possível concluir
que a produção geográfica brasileira na área da climatologia, quando confrontada
com as idéias propostas por Thomas Kuhn apresenta uma série de
incompatibilidades [...] (FIGUEIRÓ, 2011: 155).
3.3 GC(G): “lugar”
3.3.1 “Lugar”
Até mesmo pelo evidente fator semântico, os assuntos pertinentes à Geografia da Ciência
poderiam ter um magnífico aproveitamento desde a ótica do geógrafo. Mas o desperdício de
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trilhas investigativas fecundas parece ser um mal atávico de que padece este profissional. E o
terreno fértil da GC parece ser mais um campo do qual ele, inadvertido, desvia seu olhar.
Ironicamente, há uma multiplicidade de casos interessantes que, guardando uma ampla
interface com a perspectiva dos estudos históricos, se manifestam na evolução da ciência
geográfica. (Uma evolução tomada em seu aspecto “locacional”, bem entendido.). Para
ficarmos num assunto-chave mais evidente, temos o caso da incorporação defasada dos
ideários atinentes a uma dada escola de pensamento. Noutras palavras, o fato de que, a
depender dos elementos conjunturais (manifestos em um país, em uma região), certa atitude
metodológica ou viés de abordagem é assimilado de um modo muito particular – isto é, em
conformidade com demandas/expectativas deste contexto –, ou então só se dá depois de
transcorrido um tempo determinado (absolutamente necessário este, a fim de que um novo
contexto engendre os elementos conjunturais propícios a acolher a, digamos assim, “novidade
tardia”). Senão, como explicar a retransmissão à distância daqueles ideários? Distâncias
propriamente geográficas e apreciáveis (de uns a outros continentes); e até mesmo a distância
morosa definida pela história (de uns a outros regimes).
Même si les vidaliens doivent leur renommée mondiale à leurs excellentes études ou
monographies régionales, cette caractéristique de leur école n’a jamais été
reconnue au Japon. Dans ce pays, les études régionales, plutôt locales, ont été
effectuées par des professeurs des écoles normales dans chaque département [...]
Mais très peu de ces travaux ont été écrits par des universitaires et ceux-ci
préféraient faire des études thématiques plutôt que régionales. (NOZAWA, 1998:
222).
La géographie japonaise [...] s’est développée sous la très forte influence de la
géographie allemande, et le Japon en a tiré ses idées géopolitiques. [...] la
géographie française n’a malheureusement pas été assez forte au Japon durant la
guerre pour empêcher le développement de cette géopolitique.
Celle-là [geografia francesa] a été considerée comme un antidote contre la
géographie fasciste ou la géopolitique. (NOZAWA, 1998: 223).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cumprindo o rito de introdução deste nosso promissor Simpósio Temático (cujo título,
ademais, já sintetiza a magnitude do que ambicionamos aqui tratar – “História, Filosofia e
Geografia das Ciências Humanas”), esta comunicação pretendeu não mais que sumariar os
elos de correspondência entre a tradicional pesquisa histórico-epistemológica em ciências
(normalmente, físicas) e o campo disciplinar – ainda pouco cultivado, assim entendemos – da
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Geografia. Pareceu-nos que se a abertura de exposições trouxesse à audiência o caso
emblemático de uma disciplina esquecida pela literatura corrente em História da Ciência,
instauraríamos um empolgante bom-começo para nossas vindouras discussões.
Porque, como dissemos, por mais que computemos já um número razoável de pesquisas que,
de algum modo, têm tornado os geógrafos brasileiros mais familiarizados com o quadro de
temas caros aos historiadores e filósofos da ciência (fato atestado, p.ex., pela existência de
encontros nacionais de “história do pensamento geográfico”), há todo um largo espectro de
abordagens que permanecem intocadas. E estamos convictos que, se por um lado boa parte
desta nossa condição de “debutantes” – pelo menos se nos comparamos aos historiadores da
Química ou das ciências médicas – deve-se à histórica pouca apetência dos geógrafos a
romperem sua endogenia e frequentar fóruns diversos dos seus, por outro, a criação de um
“ST” consagrado às Ciências Humanas, dentro de um célebre Seminário que reúne
pesquisadores das mais variadas procedências, poderá ajudar à recuperação do tempo perdido.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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