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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO ‘‘LATO SENSU’’
PATRIMÔNIO GENÉTICO E BIOSSEGURANÇA, UMA AVALIAÇÃO DOS ASPECTOS SOCIOAMBIENTAIS
ÉRISSON JOSÉ CHAGAS DE CARVALHO Rio de Janeiro 2009
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO ‘‘LATO SENSU’’
PATRIMÔNIO GENÉTICO E BIOSSEGURANÇA, UMA AVALIAÇÃO DOS ASPECTOS SOCIOAMBIENTAIS
ÉRISSON JOSÉ CHAGAS DE CARVALHO
OBJETIVO:
Esta monografia tem como fim cumprir um
dos requisitos para a obtenção do título de
especialização em Direito Ambiental.
3
AGRADECIMENTOS
.
Agradeço ao Professor Francisco José de
Jesus Carrera pela orientação na elaboração,
sugestões e revisão de texto desta
monografia.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais, à minha
irmã, à minha esposa e aos meus filhos Laura
e João Miguel, pelo carinho, dedicação,
paciência e pela oportunidade que me
proporcionaram na realização deste Curso de
Especialização.
5
RESUMO
O presente trabalho tem por escopo refletir sobre a importância legal das pesquisas
científicas tendo como base o Patrimônio Genético. Tais pesquisas despontam
atualmente como a grande promessa da biomedicina despertando enorme interesse ao
Direito e à Ciência, gerando polêmico debate entre cientistas, juristas, religiosos,
pacientes e familiares. Os cientistas supõem que as técnicas que com ela se relacionam
serão capazes de revolucionar a medicina convencional. Propõe-se que sejam discutidas
as mudanças incisivas que a Ciência, a Biotecnologia e a Biomedicina são capazes de
proporcionar à coletividade, colaborando para o progresso e desenvolvimento humano. A
liberdade de pesquisa, necessária ao progresso do conhecimento, é parte da liberdade de
pensamento. Porém, relevam-se as barreiras e as limitações a serem vencidas, tais como
questões éticas, morais e religiosas.
Ao homem é garantido o direito à vida e o direito ao bem-estar. O Estado deve
zelar por esses direitos. O ato da pesquisa é lícito e necessário sob pena de enterrar-se o
princípio da dignidade humana. Destacam-se alguns efeitos das pesquisas científicas
sobre a Economia e o Direito Econômico: reflexos sociais relevantes como a melhora da
qualidade de vida, da longevidade e a busca incessante para alcançar fins terapêuticos e
profiláticos para diversas patologias. Luta-se para que o homem leve uma vida longa e
saudável, adquira conhecimento e tenha acesso aos recursos necessários para melhor
qualidade de vida. Na legislação brasileira o tema é abordado em lei ampla – lei 11.105,
de 24 de março de 2005, que trata da Biossegurança.
Palavras - chave: patrimônio genético, princípio da dignidade da pessoa humana,
Biociência, Responsabilidade.
6
METODOLOGIA
Trata-se de pesquisa descritiva. As fontes da pesquisa a serem utilizadas serão
baseadas em doutrina, leis, jurisprudências, coleta em periódicos especializados, jornais,
revistas, congressos científicos, qualquer material acessível ao público em geral e rede
eletrônica. As pesquisas serão realizadas em bibliotecas públicas e particulares, tais
como Biblioteca Nacional, Biblioteca da OAB, Biblioteca da IAB, Bibliotecas da
Universidade Candido Mendes e acervo pessoal. O procedimento inclui estudo das
produções humanas, reservadas em livros, artigos e documentos, para posterior análise
sobre o assunto tema.
7
SUMÁRIO
Capítulo I
O Patrimônio Genético........................................................... 09
1.1-Peculiaridades..................................................................... 09
1.2-A Tutela Jurídica do Patrimônio Genético................................ 17
1.3-As relações com o Direito Ambiental Internacional.................... 34
Capítulo II
Da Dignidade da Pessoa Humana e da
Biociência............................................................................... 41
2.1-O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.......................... 41
2.2-Do Biodireito....................................................................... 44
2.3-Da Bioética......................................................................... 49
2.4-Da Biotecnologia................................................................. 52
Capítulo III
Aspectos Relevantes da Responsabilidade.......................... 60
Conclusão ..............................................................................74
Referências bibliográficas...................................................... 80
8
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo geral estudar o Patrimônio Genético da Pessoa
Humana à luz da Lei de Biossegurança. Tem por objetivos específicos enfocar as
peculiaridades inerentes ao patrimônio Genético; abordar a proteção do Patrimônio
Genético; destacar as relações com o Direito Ambiental Internacional; relacionar aspectos
do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e da Biociência; enfatizar características do
Biodireito, da Bioética, da Biotecnologia; apontar relevantes caracteres sobre
Responsabilidade.
O Patrimônio Genético brasileiro, que passou a receber tratamento jurídico a partir
da Constituição Federal de 1988, conforme orienta o artigo 225, § 1 º, II e V, é um bem
ambiental de uso comum do povo brasileiro, gerenciado pelo Estado Brasileiro e
vinculado a atividades de pesquisa e mesmo econômicas destinadas principalmente a
assegurar o piso vital mínimo. A lei 11105/2005 visa viabilizar no plano infraconstitucional
a moderna visão da Constituição Federal. Destaca a necessidade de preservar a
diversidade e a integridade do patrimônio genético. Determina como ocorre a incumbência
constitucional destinada ao Poder Público para fiscalizar as entidades que se dedicam à
pesquisa e à manipulação do material genético no Brasil.
O Direito Ambiental pode cooperar para acompanhar a produção das pesquisas
científicas, impedir a comercialização e limitar o emprego de técnicas, métodos e
substâncias que comportem riscos para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente. O
avanço das pesquisas científicas relacionadas ao Patrimônio Genético pode acarretar o
uso abusivo do emprego de técnicas, métodos e substâncias que acabam representando
riscos para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente, levando à ganância e à
comercialização do Patrimônio.
9
CAPÌTULO I - O PATRIMÔNIO GENÉTICO
1.1 - Peculiaridades
O patrimônio genético passou a receber tratamento jurídico a partir da Constituição
Federal de 1988, conforme orienta o art. 225, § 1º, II e V. Há necessidade de preservar a
diversidade, a integridade do patrimônio genético brasileiro e determinar incumbência
constitucional destinada ao Poder Público, no sentido de fiscalizar as entidades que se
dedicam à pesquisa e à manipulação de aludido material genético (art. 225, II da CF). 1
Sendo assim, a produção, a comercialização, o emprego de técnicas, como a
Engenharia Genética, métodos e substâncias que comportem riscos para a vida, a
qualidade de vida e o meio ambiente serão controlados necessariamente pelo Poder
Público. Ressalta-se a existência de atividades que, pelo menos potencialmente, podem
causar significativa degradação ambiental. Restou claramente definida pela Constituição
Federal a exigência de Estudo Prévia de Impacto Ambiental (EIA), a que se dará
publicidade (art. 225, § 1º, IV) como regra básica destinada a assegurar as atividades
mencionadas no art. 225, § 1º, V. Considera-se uma ordem jurídica vinculada à economia
capitalista (art. 1º, IV, c/c o art. 170, VI, da CF), em harmonia com os critérios
constitucionais vinculados às pesquisas tecnológicas (arts. 218 e 219 da CF) e sempre
em proveito da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). 2
O patrimônio genético é um dado natural primário, que não pode jamais ser
afastado na compreensão do homem. A par do genótipo, outros fatores intervêm de modo
indefectível na formação do indivíduo e, por via de consequência, na construção da
sociedade: o meio ambiente geográfico e o meio social. O componente cultural, ou seja, o
elemento criado pelo próprio homem, é mais acentuado que o componente natural,
herdado pelo gênero humano. O homem perfaz assim, indefinidamente, a sua própria
natureza, ao mesmo tempo em que transforma a Terra, tornando-a sempre mais
dependente de si próprio.
1 Séguin, Elida; Carrera, Francisco. Planeta Terra - Uma Abordagem de Direito Ambiental. 2ª ed. RJ: Ed.Lumen Juris, 2001.
2Antunes, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 3ª Ed. Editora Lumen Juris, 1999, p.147.
10
A definição de Patrimônio Genético está prevista no § 1º do art. 7º, da Medida
Provisória 2.186/2001. Considera-se Patrimônio Genético toda informação de origem
genética, contida em amostras do todo ou de parte de espécime vegetal, fúngico,
microbiano ou animal, na forma de moléculas e substâncias provenientes do metabolismo
destes seres vivos e de extratos obtidos destes organismos, vivos ou mortos, encontrados
em condições in situ, isto é, em seu ambiente natural, domesticados ou mantidos em
condições ex situ, isto é, fora de seu ambiente natural, desde que coletados naquelas
condições, in situ existentes no território nacional, na plataforma continental ou na zona
econômica exclusiva. A Medida Provisória 2.186/2001 traz definições relevantes para o
estudo do Patrimônio Genético como a do acesso ao Patrimônio Genético, a do acesso
ao conhecimento tradicional associado e a relativa à bioprospecção. Acesso ao
Patrimônio Genético é qualquer atividade que vise à obtenção de amostra de componente
do Patrimônio Genético. Envolve atividades que objetivem isolar, identificar ou utilizar
informação de origem genética, em moléculas ou substâncias provenientes do
metabolismo dos seres vivos e extratos obtidos destes organismos, com a finalidade de
pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, visando sua
aplicação industrial ou de outra natureza. A idéia central da Medida Provisória 2.186 é
proteger e preservar o patrimônio genético estimulando as pesquisas de bioprospecção,
mas com a garantia de participação do Brasil no que se refere a eventuais benefícios e
mesmo lucros que aludido patrimônio poderá proporcionar. É aplicável apenas a espécies
originárias do Brasil e trata do conceito de patrimônio genético regulando na verdade a
informação substancial da biodiversidade (flora e fauna). 3
O Brasil é um dos países mais ricos do mundo em Patrimônio Genético. Vinte por
cento do número total das espécies terrestres vivem em território brasileiro; assim, são 56
mil espécies de plantas superiores já descritas, que correspondem a 22% do total
mundial. Já com relação aos animais, o país abriga a maior diversidade biológica do
mundo, em dois grupos: mamíferos, que representam 27% do total mundial; e peixes,
com mais de três mil espécies de água doce, duas vezes mais do que em qualquer outro
país.
3 Fiorillo, Celso Antônio Pacheco; Rodrigues, Marcelo Abelha. Manual de Direito Ambiental e Legislação Aplicável. São Paulo: Max Limonad, 1977, p.47.
11
O acesso ao conhecimento tradicional associado consiste na obtenção de
informação sobre o conhecimento ou prática individual ou coletiva, associada ao
Patrimônio Genético, de comunidade indígena ou de comunidade local. Visa à pesquisa
científica, bioprospecção ou desenvolvimento tecnológico, objetivando sua aplicação
industrial ou de outra natureza. A bioprospecção é a atividade exploratória que tem por
finalidade identificar componente do Patrimônio Genético e informação sobre
conhecimento tradicional associado, com potencial de uso comercial. 4
Foi por intermédio da medicina reprodutiva que a ciência recentemente alcançou,
com suas intervenções, o embrião humano. A reprodução humana assistida por
profissionais da medicina e da Biologia é a prática terapêutica que tem por fim promover a
realização de um projeto parental. Verifica-se por meio da união artificial dos gametas
feminino e masculino, que são as células germinativas humanas, dando origem, assim, a
um novo ser. A reprodução assistida, além de poder ser utilizada como terapia para
superar a incapacidade, ou mesmo, a dificuldade física de ordem natural do ser humano,
também pode ser utilizada para fins espúrios. Por meio dessa técnica, é permitido ao
médico identificar o conteúdo genético das células germinativas e dos embriões, sendo
possível intervenção genética para evitar o desenvolvimento de um feto portador de
determinada doença genética, bem como garantir a presença de certos fenótipos. Sobre a
reprodução humana assistida repousam os desdobramentos de maior repercussão moral
no que tange ao patrimônio genético.
A expressão pré-embrião ou embrião pré-implantatório tem a finalidade de
demonstrar, unicamente, uma das muitas fases pelas qual o embrião humano atravessa
em seu contínuo processo de desenvolvimento no período compreendido entre a
concepção e a sua efetiva implantação na mucosa uterina. Já os pré-embriões que não
são transferidos ao útero feminino podem também ser chamados de embriões excedentes
ou supranumerários. São submetidos à crioconservação ou congelamento, técnica que
permite conservar durante longo tempo os óvulos fecundados possibilitando a concreção
de uma nova gravidez na doadora do gameta ou seu implante numa mulher estéril.
4 Machado, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.54.
12
Observa-se que alcançando êxito na utilização da técnica e consumando-se a gravidez,
os embriões produzidos em excesso são deixados ao largo nas clínicas de fertilização in
vitro, sendo, após um determinado período, sumariamente descartados. Dessa maneira,
atualmente, especula-se sobre a possibilidade de estarem sendo deliberadamente
produzidos embriões em número superior ao que seria necessário para atender ao projeto
parental, com o propósito único de destiná-los à pesquisa científica, identificar anomalias
cromossômicas ou genéticas, sendo usado como matéria-prima para a indústria
cosmética e outros fins de caráter ético duvidoso.
Do ponto de vista ético, é majoritária a posição contrária à criação de embriões
com a finalidade única de serem utilizados em pesquisas e experimentos. O ideal seria se
os programas de fertilização in vitro fossem realizados sem a produção de embriões
excedentes, de modo que prevalecesse essa prioridade em relação à da eficácia médica,
a exemplo do que já ocorre na Alemanha, onde a legislação atual determina que sejam
transferidos ao útero materno todos os embriões obtidos. Na Itália, país no qual a lei de
reprodução assistida encontra-se no Parlamento, também se encaminha a proibição de
embriões excedentes. 5
Os dilemas jurídicos e éticos se impõem inexoravelmente, quando se intenciona
conceituar o que é indesejável, o que vem a ser defeito e anormalidade e quem estaria
legitimado a determinar esses pré-conceitos, esses pré-juízos. Atinge–se o cerne da
questão quando se indaga se os Estados estabelecerão um controle de qualidade que
defina quais as características que devem ter os seres humanos para integrar-se à
comunidade. Estas opções devem merecer repúdio absoluto por parte de um Estado
Social e Democrático de Direito, em cuja estrutura filosófica não pode merecer acolhida.
O respeito à dignidade humana impede todo tipo de discriminação. 6
A terapia gênica ou geneterapia consiste na supressão, alteração ou troca do gene
relacionado ao aparecimento de determinadas enfermidades, por outro, geneticamente
modificado. Os cientistas utilizam genes em lugar de drogas para tratamento de doenças
5 Lacadena, Juan Ramón. Experimentação com embriões: o dilema ético dos embriões excedentes, os embriões somáticos e os embriões partenogenéticos. In: Martinez, Julio Luis (org.). Células-tronco humanas: aspectos científicos, éticos e jurídicos. São Paulo: Loyola, 2005, p.65.
13
genéticas e não-genéticas. A terapia gênica pode ocorrer tanto nas células-tronco
humanas germinais quanto nas somáticas. Na terapia genética de célula somática, o
genoma do indivíduo é modificado, todavia, a referida alteração não é transmitida para as
gerações futuras. A finalidade terapêutica consiste em possibilitar que as células
cumpram a função para a qual foram destinadas desde o início e que, por falhas na
informação hereditária, não puderam se desenvolver. Portanto, por não comprometer o
patrimônio genético das gerações futuras e por se traduzir em uma prática que visa
proporcionar ao paciente uma melhor qualidade de vida, revela-se jurídica e eticamente
aceitável. A terapia genética em células germinativas realiza-se na fase pré-implantatória
do embrião, ou mesmo, antes da fertilização, atuando sobre o espermatozóide ou sobre o
óvulo, tendo por finalidade o tratamento das patologias nele identificadas. Contudo, a
interferência nos gametas masculinos ou femininos, bem como nas fases iniciais do
desenvolvimento embrionário, resultaria em uma modificação não só no indivíduo, mas
também alcançaria seus descendentes, posto que interfira na constituição de seu código
genético. Ao se permitir alterações de qualquer natureza em células germinais humanas,
ou no embrião ainda dotado de células não-especializadas, estar-se-ia interferindo de
maneira irreversível e imprevisível no patrimônio genético da humanidade, ameaçando,
assim, o futuro da espécie humana. 7
Para se ter uma referência jurídica possível destinada a verificar quando a vida
humana tem seu início basta verificar qual o critério normativo (cultural) destinado a
apontar quando a vida termina. A legislação brasileira adota critério específico no sentido
de definir juridicamente quando a vida termina. Conforme indica o art. 3º da Lei 9.434/97,
a morte encefálica é definida por resolução do Conselho Federal de Medicina. A morte
encefálica é caracterizada através da realização de exames clínicos e complementares
durante intervalos de tempo variáveis, próprios para determinadas faixas etárias.
Considera que a parada total e irreversível das funções encefálicas equivale à morte. Ou
seja, observada a parada total e irreversível das funções do cérebro, e por via de
conseqüência, das funções neurais, a vida termina (Resolução 1.480, de 8 de agosto de
1997). Se a vida humana termina quando pára a atividade nervosa, conclui - se que a vida
6 Martínez, Stella Maris. Manipulação genética e Direito Penal. São Paulo: Ibecrim - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, 1998, p.12. 7 Bernard, Jean. Da biologia à ética. Campinas: PSY, 1994, p.42.
14
humana começa quando se inicia a atividade nervosa. A vida humana inicia quando
começa o sistema nervoso, a saber, a partir de 14 dias de gestação. 8
A proteção da vida humana deve ser observada não só em face do que estabelece
a Lei 6.938/81, como também em decorrência do parâmetro jurídico definido na Lei
90.434/97. A diretriz antes mencionada é destinada a comandar as normas de segurança
e os mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a
manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o
armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio
ambiente e o descarte de OGMs (Organismos Geneticamente Modificados) e seus
derivados.9
Embora o genótipo seja a base sobre a qual se edifica a individualidade de um ser,
distinguindo-o dos demais seres vivos existentes, o fenótipo, isto é, a soma dos fatores
ambientais, químicos, psicológicos e culturais agindo sobre os genes é que torna cada ser
humano um projeto singular. Disso resulta que o ser humano não é apenas a soma de
seus genes. Pensar de modo oposto, anuindo a um processo de seleção, é assumir o
risco de viver uma nova eugenia.
A clonagem é a técnica por meio da qual se reproduz, por síntese artificial e
assexuada, um organismo ou parte dele, tendo por base um único substrato genético,
podendo ser classificada, conforme sua aplicação e seus fins, em reprodutiva ou
terapêutica. A natureza produz clones naturalmente. Em um determinado momento da
divisão celular dos embriões, é possível que a célula se divida e dê origem a dois seres
humanos idênticos, que recebem o nome de gêmeos monozigóticos. Já a clonagem
reprodutiva realizada pelo homem pode se dar de duas formas: imitando a natureza e
separando-se as células do embrião, produzido em laboratório, mediante a técnica de
fertilização in vitro, em estágio inicial de multiplicação celular, criando-se, assim, vários
8Silva, Reinaldo Pereira. Bioética e biodireito:as implicações de um retorno. Acta Bioethica. Revista publicada pelo Programa Regional de Bioética da Organização Panamericana de Saúde/Organização Mundial de Saúde (OPS/OMS), Santiago, v.8, nº 2, 2002, p.64. 9 Fiorillo, Celso Antônio Pacheco; Diaféria, Adriana. Biodiversidade e Patrimônio Genético. São Paulo: Max Limonad, 1977, p.45.
15
embriões com idêntico genoma e pela substituição de núcleo de um óvulo por outro
núcleo proveniente de uma célula de um indivíduo já existente.
Diversos questionamentos médicos e científicos encerram razões de ordem
biológica que obstaculizam a clonagem reprodutiva humana e demonstram a temeridade
do procedimento. No âmbito jurídico, assim como no ético, a grande preocupação acerca
da clonagem reprodutiva é que ela infrinja os princípios de autonomia, dignidade e
individualidade, bem como que seja prejudicial aos indivíduos porventura gerados, e que
coloque em risco a sobrevivência da espécie humana.
A individualidade humana não é apenas questão de princípios. Biologicamente,
representa a diversidade biológica, já que o indivíduo é único não somente em seus
sonhos, desejos e personalidade, mas também em seu patrimônio genético. A diversidade
biológica é fundamental para a sobrevivência de nossa espécie. A clonagem humana
poderia constituir uma ameaça à espécie, pois diminuiria a variabilidade genética de
nossa população. A diversidade designa a riqueza do conjunto de seres vivos, biocenose,
localizados em uma determinada área, biótopos. Preservar a diversidade e a integridade
do patrimônio genético implica a preservação de todas as espécies existentes. 10
Visando à proteção do patrimônio genético humano, a clonagem reprodutiva foi
categoricamente condenada pelas: Organização Mundial da Saúde, pela Unesco, pela
Convenção Européia sobre os Direitos do Homem e da Biomedicina e pelo Parlamento
Europeu no ano de 1997, de 1998 e 2000 e em 2005, pela Organização das Nações
Unidas sempre com fundamento no art. 1º da Declaração Universal do Genoma Humano
e dos Direitos do Homem. Em vários instrumentos internacionais aparece a idéia de que a
Humanidade possui certos interesses ou direitos em determinados âmbitos físicos ou com
relação a determinados recursos. Desse modo, ela é tida como uma entidade coletiva,
titular de direitos e interesses específicos, como é o caso da proteção dos direitos
humanos. O ser humano e suas características culturais e genéticas são um dos
elementos integrantes do patrimônio comum da humanidade. Indivíduo e humanidade se
integram em uma relação necessária, mutuamente enriquecedora. 11
10 Silva, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 1999.
11 Soares, Guido Fernando. A Proteção Internacional do Meio Ambiente. São Paulo: Manole, 2003.
16
O procedimento da clonagem terapêutica traduz sérios problemas destacando que
a liberdade com que os cientistas passaram a empregar a expressão clonagem
terapêutica na mídia acabou levando a uma banalização do conceito e contribuindo para o
aumento das ambigüidades em torno da transferência nuclear. Inexiste qualquer
evidência científica suficiente para afirmar a eficácia da clonagem terapêutica, informando
que nada se pode falar sobre sua segurança, pois os riscos potenciais, cancerígenos e
teratogênicos, capazes de causar malformações em embriões e fetos ainda estão sendo
analisados. A clonagem terapêutica somente seria terapêutica para aquele embrião que
viesse a nascer e se beneficiasse das células do seu clone. O embrião é colocado a
serviço de terceiros, portanto o adjetivo terapêutico serve como amenizador da
consciência social e mola propulsora para obter a aprovação ética da sociedade. Discute-
se se a clonagem de embriões para servir de matéria-prima de pesquisa e de fonte de
células-tronco embrionárias, além de reduzir os embriões ao status de simples
mercadorias possa acarretar riscos à mulher enquanto fornecedora de óvulos.
Recentemente no debate político e jurídico brasileiro, sob a argumentação de que
uma legislação muito restritiva ergue barreiras ao avanço científico do país, foi defendido
o direito de acesso às técnicas de produção de células-tronco embrionárias. A discussão
focalizou a legitimidade do emprego de células-tronco embrionárias na pesquisa, ou seja,
como material ou meio de investigação ou experimentação e não o aproveitamento de
células-tronco embrionárias em tratamentos eficazes e seguros de pacientes humanos
que, por ora, inexistem.
Há quem advogue a tese da utilização de embriões humanos como fonte de
células-tronco e argumentam que se trata apenas e tão-somente de um amontoado de
células disformes. Os benefícios terapêuticos futuros podem resultar da utilização dessas
células, justificando os danos causados por sua prática. Outros, porém, que se
posicionam em detrimento dessa tese, compreendem que a partir da concepção é
colocada em marcha a constituição de um novo ser humano, o embrião, e que sua
instrumentalização implica flagrante desrespeito do direito à vida e ao princípio da
dignidade humana. Trata-se, aqui, da ética da responsabilidade.
17
A divulgação sensacionalista da imprensa, no sentido de anunciar a cura de
inúmeros males que afligem a humanidade, é criticada por ter como único objetivo a
venda da notícia, gerando falsas expectativas e leva a população a interpretações
equivocadas dos fatos científicos, acarretando conseqüências negativas para a própria
sociedade.
Uma das questões mais complexas relacionadas com a proteção da diversidade
biológica é aquela que diz respeito ao acesso aos benefícios decorrentes da utilização do
patrimônio genético para fins comerciais, por aqueles que detêm conhecimentos
tradicionais associados a tal patrimônio. Um dos fatores mais importantes para a
dificuldade de enfrentamento do tema é o fato de que o conhecimento tradicional
associado necessita estar devidamente catalogado e registrado para que possa ser
provado e, consequentemente, defendido e remunerado.
1.2 - A Tutela Jurídica do Patrimônio Genético
No plano constitucional merecem destaque a tutela jurídica do patrimônio genético
humano e a tutela jurídica do patrimônio genético de outros seres vivos (do mundo
vegetal, animal, fúngico e microbiano), sempre no sentido de estabelecer tutela jurídica
vinculada a bens ambientais, na forma do que indica o caput do art. 225 de nossa Carta
Magna. A tutela jurídica do patrimônio genético da pessoa humana tem proteção
ambiental constitucional observada em face do que determina o art. 225, § 1º, II, IV e V,
iluminada pelo art. 1º, III, da Carta Magna. A matéria foi devidamente regrada no plano
infraconstitucional pela Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005, que não só regulamentou
os incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, como estabeleceu normas
de segurança, assim como mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam
organismos geneticamente modificados, os chamados Organismos geneticamente
modificados. 12
Organismos geneticamente modificados são corpos vivos (unicelulares ou
multicelulares cujos diferentes componentes funcionam como um todo para realizar
12 Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
18
processos vitais; animais, plantas, fungos e micróbios) cujo material genético – ADN/ARN
(os ácidos ADN e ARN são estruturas bioquímicas que contêm informações
determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência) tenha sido
modificado por qualquer técnica de engenharia genética na forma do que estabelece o art.
3º, V, da Lei nº 11.105/2005. 13
Em seu artigo 225, § 1º, II e V, a Constituição da República determina ao Poder
Público que preserve a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e que
fiscalize as entidades dedicadas à pesquisa e à manipulação do material genético. A Lei
Fundamental expressamente reconheceu as repercussões ambientais das atividades
relacionadas àquilo que ficou conhecido como engenharia genética ou biotecnologia. O
legislador ordinário, obedecendo à norma constitucional, fez editar as seguintes normas:
Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995; Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996; Lei nº 9.456,
de 28 de abril de 1997; Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998. Há que se considerar,
em acréscimo, que o artigo 5º, XXIX, da Lei Fundamental protege o direito de propriedade
intelectual.
A Lei de Biossegurança procurou destacar no plano jurídico ambiental a tutela
jurídica referente ao patrimônio genético da pessoa humana assegurando em sede
infraconstitucional tanto a tutela jurídica individual das pessoas humanas (como o direito
às informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à
descendência), como particularmente a tutela jurídica do povo brasileiro observado em
sua dimensão metaindividual. Esta tutela deve ser analisada no século XXI com novas
ferramentas científicas desenvolvidas em proveito da tutela dos grupos participantes do
processo civilizatório nacional (arts. 215 e 216 da CF). 14
O direito ambiental constitucional, quanto ao patrimônio genético da pessoa
humana, assegura a tutela jurídica individual das pessoas e o direito às informações
determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência abarcadas pela
Carta Magna, mas particularmente do povo brasileiro, observado em sua dimensão
13 Machado, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
14 Derani, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 1 ed. São Paulo: MAX Limonad, 1997, p.48.
19
metaindividual, analisado por meio de ferramentas científicas desenvolvidas em proveito
da tutela dos grupos participantes do processo civilizatório. 15
O uso do patrimônio genético brasileiro está adstrito ao que estabelece o art. 1º, I,
da Carta Magna (a Soberania como fundamento destinado a interpretar as normas
constitucionais em vigor) assim como ao que indica o art. 4º, I (o Princípio da
Independência Nacional, destinado a orientar as relações internacionais da República
Federativa do Brasil).
A Lei nº 11.105/2005 estruturada basicamente nos arts. 1º, I, III e IV; 3º, 218 e 219
e 225 da Constituição Federal, passa a organizar normas de segurança, assim como os
mecanismos de fiscalização vinculados às seguintes atividades ou mesmo obras descritas
no art. 1º. As obras/atividades mencionadas no art. 1º poderão se desenvolver, desde que
obedecendo às imposições constitucionais e orientadas necessariamente pelas diretrizes
apontadas em referido artigo. São diretrizes fixadas no artigo 1º da Lei nº 11.105/2005
destinadas a estruturar no plano infraconstitucional as diretrizes da Política Nacional de
Biossegurança. 16
A Nova Política Nacional de Biossegurança visa preservar a diversidade e a
integridade do patrimônio genético do Brasil, definindo critérios normativos destinados a
estabelecer a incumbência constitucional indicada ao Poder Público no sentido de
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético. Fixa
também as regras jurídicas destinadas a controlar a produção, a comercialização, assim
como o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a
qualidade de vida e o meio ambiente (art. 225, § 1º, II e V, da Constituição Federal).
A preservação da diversidade, assim como da integridade do patrimônio genético
antes mencionado, deverá estar necessariamente adaptada não só aos direitos dos
destinatários da norma constitucional por força do que estabelece o art. 1º, III, da CF
(brasileiros e estrangeiros residentes no País) como observar o uso do patrimônio
15 Silva, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. 5 ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.86. 16 Becker, Bertha K. Amazônia. Construindo o Conceito e a Conservação da Biodiversidade na Prática. Departamento de Geografia, Ig, UFRJ. São Paulo, 2001.
20
genético como bem ambiental, em face da ordem econômica do capitalismo (art. 1º, IV,
c/c o art. 170, VI, da CF).
Um dos pontos importantes da Lei nº 11.105/2005 é tornar viável no plano
infraconstitucional o apoio e estímulo às empresas que invistam em pesquisa e criação de
tecnologias adequadas ao Brasil (art. 218, § 4º, da CF) dentro de orientação
constitucional voltada preponderantemente para a solução de problemas brasileiros,
assim como para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional (arts. 3º e
218, § 2º, da CF).
A Lei nº 11.105/2005 se destina a viabilizar no plano infraconstitucional a moderna
visão da Carta Magna, que já procurava destacar no final do século passado a
necessidade de preservar não só a diversidade como a integridade do patrimônio
genético brasileiro. A norma aludida determina em referido plano jurídico de que forma a
incumbência constitucional destinada ao Poder Público, no sentido de fiscalizar as
entidades que se dedicam à pesquisa, assim como manipulação do material genético no
Brasil, deverá ser realizada concretamente. Destarte, a autorização constitucional com os
limites impostos na própria Carta Magna (arts. 1º, III, e 225, § 1º, II, IV e V, da CF) passa
a ser regulamentada pela Lei nº 11.105/2005, visando dar viabilidade jurídica à produção
e comercialização, bem como emprego de técnicas (como a engenharia genética),
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente (art. 225, § 1º, V da CF).
O patrimônio genético brasileiro é um bem ambiental de uso comum do povo
brasileiro, gerenciado pelo Estado Brasileiro e vinculado a atividades de pesquisa e
mesmo econômicas destinadas preponderantemente (mas não exclusivamente) a
assegurar o piso vital mínimo (art. 6º da Constituição Federal). Daí a constitucionalidade
do uso do patrimônio genético, não só destinado a atividades de pesquisa (§ 1º do art. 1º
da Lei nº 11.105/2005) como a atividades comerciais (§2º do art. 1º da Lei nº
11.105/2005).
O Poder Público deverá exigir, na forma da lei, o EIA (Estudo de Impacto
Ambiental) sempre que ocorrer iniciativa destinada a instalar obra ou mesmo atividade
potencialmente causadora de significativa degradação ambiental. Obra, no âmbito da Lei
21
11.105/2005, é tudo aquilo que resultar de um trabalho ou mesmo de uma ação humana
no âmbito do patrimônio genético. A Constituição Federal de 1988 entendeu ser a obra
fator fundamental vinculado à tutela dos bens ambientais (art. 225, § 1º, IV).
Tradicionalmente atividade é conceito básico de direito empresarial. A empresa se realiza
pela atividade como o sujeito se realiza por seus atos. Tanto ato quanto a atividade como
o sujeito se realiza por seus atos. Tanto ato quanto a atividade se exteriorizam por meio
de negócios jurídicos, de tal sorte que se afirma que o contrato é o núcleo básico da
atividade empresarial. A Constituição Federal de 1988 também entendeu ser a atividade
fator fundamental vinculado à tutela dos bens ambientais (art. 225, § 1º, IV).
Devem-se destacar as tutelas jurisdicionais e a proteção do patrimônio genético no
que tange às medidas de urgência. Na atual situação do planeta Terra, já muito combalido
com o efeito estufa, com o buraco na camada de ozônio, com o desmatamento
desenfreado e com a extinção de espécies, além de outras ameaças oriundas da
ganância autodestrutiva do ser humano, novas tecnologias que necessitam de atenção
redobrada no desenvolvimento de suas atividades surgem agora, dentre elas as ligadas
ao processo de interferência no Patrimônio Genético. 17
Abstratamente, não se pode eleger qual das formas de tutela é a mais eficaz ao
amparo de uma pretensão jurisdicional ambiental. Porquanto não se pode afirmar que
determinado instrumento processual é mais necessário, útil ou adequado que outro,
porque o fator determinante da eficácia da medida judicial a ser utilizada é a situação
fática consistente na possibilidade de ocorrência do dano ou na geração do evento lesivo.
A primeira diretriz da Política Nacional de Biossegurança trata do estímulo ao
Avanço Científico na área de Biossegurança e Biotecnologia. Destina-se a incitar
atividades destinadas ao desenvolvimento da sistematização do conhecimento nas áreas
de biossegurança (conjunto de estudos e procedimentos que visam a controlar os
eventuais problemas suscitados por pesquisas biológicas, assim como em face de suas
aplicações) e biotecnologia (uso da ciência aplicada para produzir organismos vivos com
características particulares, especialmente pela manipulação de material genético
17 Bonavides, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 1993.
22
diferente). Vai da inseminação artificial à engenharia genética. Merece destaque a
manipulação genética ou tecnologia de ADN recombinante, que é a alteração de genes ou
de material genético para produzir novos traços desejáveis nos organismos ou para
eliminar os indesejáveis. Cuida-se da transferência artificial de genes de um organismo
para outro semelhante ou inteiramente diferente).
A primeira diretriz fixada no art. 1º da Lei de Biossegurança estabelece no plano
infraconstitucional os critérios destinados ao cumprimento da determinação constitucional
contida no art. 218. Este impõe ao Estado o dever de promover e incentivar o
desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação tecnológica e apoiar a formação de
recursos humanos nas áreas de ciência, pesquisa e tecnologia concedendo, assim, aos
que delas se ocupem meios e condições especiais de trabalho (art. 218, §3º da CF). A
diretriz visa obviamente o progresso das ciências no Brasil (art. 218, § 1º), destinado
evidentemente a assegurar a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III. c/c o art. 218, § 1º,
da Carta Magna) dentro de uma ordem jurídica adaptada à economia capitalista (art. 1º,
IV, c/c o art. 170, VI, da CF). Daí a clara orientação da Carta Magna para estabelecer que
a pesquisa tecnológica deva estar voltada preponderantemente para a solução dos
problemas brasileiros, assim como para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional
e regional (art. 218, § 2º, c/c os arts. 3º e 170, VI, da CF).
A orientação constitucional é destinada a brasileiros e estrangeiros residentes no
país no plano dos direitos individuais e coletivos (art. 5º da CF). O Estado tem o dever de
incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica em face
dos organismos geneticamente modificados, visando desde o cidadão pesquisador (o
cientista) até entidades organizadas em proveito da pesquisa, e estabelecer as regras de
apoio e estímulo às empresas que invistam em pesquisa (art. 218, §4º, da CF).
A segunda diretriz da Política Nacional de Biossegurança destaca a proteção à vida
e à saúde humana, animal e vegetal, ou seja, diretriz destinada a impor no plano
infraconstitucional não só ao Poder Público, mas também àqueles que se dedicam às
atividades de pesquisa ou mesmo às atividades de uso comercial dos OGMs, a defesa e
preservação da vida, assim como saúde humana, animal e vegetal em face de
obras/atividades vinculadas aos corpos vivos, cujo material genético, ADN/ARN venha a
ser submetido a modificações por qualquer técnica de engenharia genética.
23
A terceira diretriz da Política Nacional de Biossegurança trata da observância do
princípio da precaução para a proteção do meio ambiente, ou seja, a diretriz é destinada a
fazer cumprir no plano infraconstitucional o que estabelece o caput do art. 225 da Carta
Magna. A Política Nacional de Biossegurança pretendeu estabelecer no plano
infraconstitucional a precaução, como princípio a ser observado no âmbito das normas de
segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos
geneticamente modificados.
Juridicamente, o princípio da precaução deverá ser verificado caso a caso, ou seja,
em face de eventual ameaça à vida em todas as suas formas. Os instrumentos do direito
processual ambiental deverão dirimir a controvérsia. O que se procura é constatar
pericialmente a eventual existência de lesão ou ameaça ao bem ambiental. Através de
perícia complexa pode-se ter resposta jurídica em face da efetiva caracterização do
princípio da precaução.
O direito de agir, garantido pelo art. 5º, XXXV, assegura, por via de conseqüência,
a possibilidade de submeter à apreciação do Poder Judiciário toda e qualquer lesão ou
mesmo ameaça ao denominado patrimônio genético no âmbito constitucional.
Mais pragmático, o Direito Processual brasileiro partiu dos exercícios teóricos da
doutrina italiana dos anos 1970 e passou a construir um sistema de tutela jurisdicional dos
interesses difusos, imediatamente operativo. A Lei 6.938 de 1981 atribuiu legitimidade ao
Ministério Público para atuação nas ações de Responsabilidade Penal e Civil, ambas de
natureza jurídica objetiva, pelos danos provocados ao Meio Ambiente. Desde 1977, uma
reforma na Lei 4.717/1965, denominada Lei de Ação Popular, considerava Patrimônio
Público os bens e direitos de valor artístico, estético, histórico ou turístico. Diversas
legislações pertinentes à defesa do Patrimônio Ambiental surgiram anterior e
posteriormente à Lei Ambiental, por exemplo: o Código Florestal (Lei 4.771/65); o de Caça
(Lei 5.197/67); o de Pesca (Decreto-lei 221/67) e o de Mineração (Decolei 227/67). Mais
tarde, surgiram também algumas Leis específicas: a Lei de Responsabilidade por Danos
Nucleares (Lei 6.453/77); a Lei do Zoneamento Industrial nas Áreas Críticas de Poluição
(Lei 6.803/80) e a Lei de Agrotóxicos (Lei 7.802/89). Iniciou-se uma fase na qual o
ambiente passou a ser protegido de maneira integral, como sistema ecológico integrado,
resguardando-se as partes a partir do todo, e com autonomia valorativa. Surgem a Lei da
24
Política Nacional do Meio-ambiente (Lei 6.938/81) e a Lei dos Crimes Ambientais (Lei
9.605/98), com responsabilização inclusive para pessoas jurídicas, concretizando-se em
lei ordinária, texto até então com previsão apenas constitucional (CF, art. 225, § 3º). Em
1995 criou-se a Lei da Engenharia Genética (Lei 8.974/95, revogada pela Lei
11.105/2005), seguida de diversas instruções normativas. Veio à luz, assim, em 1985, a
Lei 7.347, denominada Lei de Ação Civil Pública, com a finalidade de prestar tutela ao
Ambiente e ao Consumidor, na dimensão dos bens indivisivelmente considerados e,
consequentemente, dos Direitos Difusos propriamente ditos. 18
O ordenamento jurídico pátrio é composto por vasta legislação, que possui, além
dos modais deônticos consistentes em proibições, permissões ou obrigações, conceitos e
definições que geram imensas dificuldades aos operadores do Direito de forma geral,
quando da árdua tarefa de hermenêutica e aplicação, tanto do Direito Material como do
Direito Processual.
A Lei assinala os interesses protegidos, que são a saúde e a vida dos seres
humanos, dos animais e das plantas, bem como o meio ambiente, não colocando
hierarquia nessa proteção. Em se tratando de legislação processual, o panorama não se
altera diante das diversas confusões que se instauram quando se indaga qual será o
instrumento adequado ao amparo de determinadas pretensões jurisdicionais,
especialmente quanto a aspectos técnico-conceituais de institutos como as liminares, as
medidas cautelares e as antecipações de tutela.
Por força da expressa dicção legal constante do art. 273 do Código de Processo
Civil, tem o julgador franqueada a oportunidade, dentro da ímpar discricionariedade que
jamais poderá chegar aos meandros da arbitrariedade, de antecipar, sendo o caso, os
efeitos da tutela jurisdicional pleiteada, impondo-se, diante da força que a mens legis
inspira, assentar fundamental diferenciação entre os institutos da tutela antecipada e da
tutela cautelar, especialmente no que tange às liminares. 19
18 Milaré, Edis. Direito do Ambiente: Doutrina, prática, jurisprudência e glossário. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 19 Alvim, J.E. Carreira. Código de Processo Civil Reformado. Belo Horizonte: Del Rey, 1995.
25
A tutela antecipada da pretensão formulada não é medida cautelar, não visando
garantir o resultado prático da ação e nem proteger o direito do autor, dependendo de
julgamento final e que poderia perecer ou sofrer dano irreparável. A tutela suscetível de
antecipação parcial ou total deve estar limitada ao pedido formulado na inicial, e não
poderá ser concedida fora ou além dele.
Não se confundem tutela antecipada (antecipação do próprio provimento
jurisdicional) e tutela cautelar (medida Instrumental). A concessão da antecipação dos
efeitos da sentença de mérito não se confunde com a tutela cautelar, porque não se limita
a assegurar o resultado prático ou equivalente da ação, nem assegurar a viabilidade da
realização do direito afirmado pelo autor, mas tem por objetivo conceder, de forma
antecipada, o próprio provimento jurisdicional pleiteado ou seus efeitos. Ainda que
fundada na urgência (CPC, art. 273. I), não tem natureza cautelar, pois sua finalidade
precípua é adiantar os efeitos da tutela de mérito, propiciando sua imediata execução. O
que se objetiva quando se pleiteia que os efeitos do provimento jurisdicional final sejam
antecipados é a satisfação preliminar da pretensão perquirida, desde que preenchidos os
pressupostos basilares e imprescindíveis para a concessão, cuja decisão possui natureza
jurídica interlocutória. 20
São pressupostos necessários ao deferimento do pedido de antecipação dos
efeitos da tutela jurisdicional, a teor do que prescreve o art. 273 do Código de Processo
Civil, o requerimento da parte; a prova inequívoca do direito do autor; o convencimento do
Magistrado acerca da verossimilhança da alegação inicialmente expendida; o fundado
receio de dano irreparável ou de difícil reparação; a caracterização de abuso de defesa ou
manifesto propósito protelatório do réu e a possibilidade de reversão do provimento
jurisdicional antecipado.21
Deve ser consignado que o provimento concedido em caráter liminar tem natureza
jurídica diversa, porque possui a finalidade de assegurar a viabilidade de um direito, ainda
que fundado em juízo de aparência, o que ocorre em sede de cognição sumária. E a
20 Bedaque, José Roberto dos Santos. Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias de Urgência. São Paulo: Malheiros, 1998. 21 Câmara, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, v. I, 2003, p.87.
26
tutela que satisfaz, por sua vez, por estar além do assegurar, realiza antecipadamente a
pretensão, não havendo que se falar em cautelaridade, mas em satisfatividade. 22
Independentemente de serem concedidas em sede de cognição sumária e
fundadas em juízo de aparência, as liminares têm por finalidade evitar que o direito
perquirido venha a perecer durante o litígio, desde que haja a plausibilidade da existência
do direito do autor e o perigo da demora na entrega da prestação jurisdicional, podendo
ser pleiteadas nos mais variados tipos de ações que visem à proteção do Patrimônio
Genético, como a Ação Civil Pública, a Ação Popular e o Mandado de Segurança, dentre
outras.
No exato momento em que parte das opiniões da sociedade eram convergentes
quanto à necessidade de o Brasil inovar tecnologicamente sua produção, ganhou corpo
no Congresso Nacional a prioridade de aprovação da norma destinada à regulamentação,
dentre outros, do uso, pela agroindústria brasileira, dos Organismos Geneticamente
Modificados.
Assim, a Lei 11.105 apresenta diversas previsões legais até então não
contempladas. No quadro da anunciada política industrial, o Governo Federal enfatizou
ser imprescritível o aprimoramento tecnológico, visando maior competitividade interna e
externa, acentuando a existência de necessidade da produção com o uso de tecnologia
nacional, valorizando-se o trabalho dos pesquisadores pátrios, especialmente daqueles
que atuam em Instituições como a Embrapa, Universidades e outras entidades Públicas
ou Privadas.
Para o êxito dos interesses da Nação, torna-se imperiosa a existência de vários
fatores externos, como a crença no progresso da ciência, na possibilidade de evolução
permanente da tecnologia, na responsabilidade e na competência dos pesquisadores e de
todos os envolvidos nos processos de produção. Estes deverão ser convocados a
expressar publicamente suas posições de apoio ou repúdio à adoção, como variável do
progresso científico, da evolução tecnológica e da modernidade dos chamados
Organismos Geneticamente Modificados.
22 Theodoro Júnior, Humberto. As Novas Reformas do Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.56.
27
Entre os seres humanos, durante muito tempo, predominou a desproteção total,
devido à concepção individualista do Direito de Propriedade, que sempre serviu de forte
barreira à proteção do Patrimônio Genético ou, de maneira mais abrangente, do Meio
Ambiente. Essa proteção se encontra hoje, porém, no rol dos Direitos Fundamentais, o
que exige do Poder Público e da Coletividade o dever de preservá-los, Patrimônio
Genético e Meio Ambiente, para as presentes e futuras gerações. É o que determinou,
expressamente, o art. 225 da Constituição Federal de 1988. Nesse preceito
constitucional, encontram-se prescritas de forma expressa as diretrizes para proteção da
Biodiversidade, como se presume da leitura do inc. II do § 1º do referido artigo, que
destaca que para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público
preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as
entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético. 23
O ordenamento jurídico pátrio contempla a existência de diversas tutelas de
urgência, visando coibir a probabilidade ou a efetivação do ilícito e, via de consequência,
o dano, tais como as liminares em sentido amplo, as antecipatórias, as inibitórias e as de
remoção do ilícito, desde que preenchidos os pressupostos necessários, úteis e
adequados ao amparo da pretensão jurisdicional respectiva e, em especial, quando o
objetivo for evitar que danos em geral venham a ser concretizados, quando da atuação
nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados.
Devem-se destacar alguns pontos sobre a proteção do Patrimônio Ambiental e
Genético no tempo. A atuação nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente
Modificados e a possibilidade de geração de danos decorrentes de tais tipos de atividades
implicam, necessariamente, a análise dos aspectos processuais atinentes à proteção do
Patrimônio Genético ou, de maneira mais ampla, do Meio Ambiente. Mantendo-se a
atenção voltada aos direitos coletivos ou difusos, verifica-se que eles são: indeterminados
pela titularidade; indivisíveis com relação ao objeto; colocados a meio caminho entre os
Direitos Públicos e os Privados; próprios de uma sociedade de massa e resultado de
conflitos de massa; carregados de relevância política e capaz de transformar conceitos
23 Martins, Ives Gandra da Silva; BASTOS, Celso. Comentários à Constituição do Brasil promulgada em 05 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva,1988, p.54.
28
jurídicos estratificados como a legitimação, a coisa julgada, os poderes e a
responsabilidade do Magistrado e do Ministério Público, o próprio sentido jurisdição, da
ação e do processo, além da conversão da Responsabilidade Civil pelos danos causados
em Responsabilidade Civil pelos prejuízos sofridos.
O alcance social de tais direitos, como direito à ordem pública, à segurança pública
e à educação, torna-se claro em razão da atuação participativa do cidadão, ocorrendo a
existência de conflitos diversos entre o indivíduo e o Estado, que transcendem à esfera
dos direitos privados, de que é titular cada pessoa individualmente considerada, na
dimensão clássica dos direitos subjetivos, diante do estabelecimento de uma relação
jurídica básica gerada entre credor e devedor, claramente identificados. A necessidade de
tutela desses direitos pôs em relevo suas respectivas configurações políticas e deles
emergiram novas formas de gestão da coisa pública.
Uma administração participativa, como instrumento de racionalização do poder,
inaugura um novo tipo de descentralização. Mostra-se estendida ao plano social, com
tarefas atribuídas aos corpos intermediários e às formações sociais. Trata-se de uma
nova forma de limitação ao poder do Estado, em que o conceito unitário de soberania,
compreendido pela ótica da soberania absoluta do povo e por este delegada ao Estado, é
limitado pela soberania social, que é atribuída aos grupos naturais e históricos que
compõem a nação.
A teoria das liberdades públicas forjou uma nova Dimensão de Direitos
Fundamentais, evoluindo-se dos direitos clássicos de Primeira Dimensão, representados
pelas tradicionais liberdades negativas, próprias do Estado Liberal, com o correspondente
dever de abstenção por parte do Poder Público, aos de Segunda Dimensão, de caráter
econômico-social, compostos por liberdades positivas, com o correlato dever do Estado
de uma obrigação de dar, fazer ou prestar, chegando-se aos de Terceira Dimensão,
representados pelos Direitos de Solidariedade, decorrentes dos Direitos Sociais. E assim,
o que aparecia inicialmente como mero interesse, elevou-se à condição de verdadeiro
29
direito, conduzindo a reestruturação de conceitos jurídicos que se amoldassem à nova
realidade. 24
Dentre os Direitos Fundamentais de Terceira Dimensão, insere-se o direito ao Meio
Ambiente sadio e equilibrado, sendo preciso que o sistema jurídico os tutele
adequadamente, assegurando sua efetiva fruição. Partindo-se do reconhecimento da
existência dos Direitos Fundamentais de Terceira Dimensão, tornou-se mister passar à
efetivação de suas garantias, viabilizando-se concretamente as mais recentes conquistas
da cidadania. Tendo em vista que o Direito Processual tem como base a atuação
instrumental, servindo como ferramenta de consecução e amparo aos direitos ameaçados
ou violados, a renovação fez-se, sobretudo, no plano do processo. 25
Verifica-se, portanto, que de um modelo processual individualista a um modelo
social, de esquemas abstratos a esquemas concretos, do plano estático ao plano
dinâmico o processo transformou-se de individual em coletivo, ora inspirando-se no
sistema da common law, ora estruturando novas técnicas, mais aderentes à realidade
social e política subjacente.
A Constituição Federal de 1988 ressaltou a importância dos Direitos Coletivos: em
primeiro lugar, elevando ao âmbito constitucional a defesa de todos os Direitos Difusos e
Coletivos, sem limitações quanto à matéria como função institucional do Ministério
Público, autônomo e independente no Brasil, mas permitindo à lei a ampliação da
legitimação ativa (CF, art. 129, II e § 1º). Referiu-se, em seguida, à representação judicial
e extrajudicial das entidades associativas para a defesa de seus próprios membros (CF,
art. 5º, XXI). Criou o Mandado de Segurança Coletivo, atribuindo legitimação aos partidos
políticos, aos sindicatos e às associações legalmente constituídas e em funcionamento há
pelo menos um ano (CF, art. 5º, LXX); e, ainda, atribuiu funções aos sindicatos para a
defesa dos Direitos Coletivos e Individuais da categoria (CF, art. 8º, III), ressaltando por
24 Bobbio, Norberto. A era dos direitos; trad. de Carlos Nelson Coutinho. Nova ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.6ª reimpressão, p.87. 25 Comparato, Fabio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p.24.
30
fim, a existência de legitimação ativa dos índios e de suas comunidades e organizações
para a defesa de seus direitos (CF, art. 232). 26
Em 1990, surgiu a Lei 8.078/90, denominada Código de Proteção e Defesa do
Consumidor, coroando o trabalho legislativo e ampliando o âmbito de incidência da Lei da
Ação Civil Pública, com a previsão de sua aplicação a todos os Direitos Difusos e
Coletivos e com a criação de uma nova categoria de direitos, individuais por natureza e
tradicionalmente tratados apenas a título pessoal, mas conduzíveis coletivamente à
Justiça Cível, em razão de sua origem comuns e denominados Direitos Individuais e
Homogêneos. As disposições processuais constantes do Código de Proteção e Defesa do
Consumidor têm plena aplicação a todos os Direitos Difusos, Coletivos e Individuais
Homogêneos, por força do contido no art. 21 da Lei da Ação Civil Pública, de modo que
tudo o que se pode dizer em relação ao referido Código também incide em matéria
ambiental.
Historicamente o Meio Ambiente encontra-se protegido pelo ordenamento jurídico
brasileiro de forma ampla e rica em mecanismos, destacando-se todo o Capítulo VI do
Título VIII da Constituição Federal de 1988, que contempla, em seu art. 225, várias
previsões legais relativas à Biossegurança. Seis anos após a promulgação da
Constituição Federal, era sancionada a Lei 8.974, de 05.01.1995, que tratava da
Biossegurança, reforçando a visão mercadológica do Patrimônio Genético, uma vez que o
Brasil é o maior País em Biodiversidade no mundo. Tal Lei apresenta caráter de norma
geral, pois é impossível regular e tratar especificamente todos os assuntos relativos à
matéria, devido à competência concorrente prevista no art. 24 da Constituição Federal,
que prevê que cabe aos Estados e aos Municípios suplementá-la no que for necessário,
devendo sempre ser mais restritiva, mas nunca mais branda ou contrária ao dispositivo
Federal.
Na intenção de apoiar, por meio de parecer técnico conclusivo, estudando-se caso
a caso, a Lei de Biossegurança (Lei 8.974/95), foi criada, no âmbito do Ministério da
Ciência e Tecnologia, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Essa
26 Dinamarco, Cândido Rangel. Nova era do processo civil. 1. ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2004, p.58.
31
Comissão é composta por profissionais da biotecnologia e representantes dos Ministérios
do Meio Ambiente, da Saúde, da Agricultura, das Relações Exteriores, da Educação, da
Ciência e Tecnologia e de representantes das indústrias, da saúde do trabalhador e da
defesa do consumidor. Uma das polêmicas que circundaram a CTNBio gira em torno do
fato de que o Decreto 1.752, de 20.12.1995, que regulamentou a Lei de Biossegurança,
conferiu a ela a competência para exigir a realização ou não do Estudo de Impacto
Ambiental ou do Relatório de Impacto ao Meio Ambiente, em relação aos Organismos
Geneticamente Modificados.
Em 18.07.2001, entrou em vigor o Decreto 3.871/2001, que disciplinava a
rotulagem de alimentos embalados que contivessem ou que fossem produzidos com
Organismos Geneticamente Modificados, ocasião em que alguns procedimentos, em
torno dessa tecnologia, tornaram-se claros, enquanto os setores antitransgênicos
reclamavam da falta de empenho em proteger o ser humano e o Meio Ambiente. Um dos
itens do Decreto 3.871/2001 tratava da porcentagem mínima para a rotulagem, que ficou
estabelecida em 4% para o consumo humano, informando-se nos rótulos, que o alimento
continha Organismos Geneticamente Modificados, caso ultrapassado tal limite.
Respondendo aos anseios e argumentos da sociedade antitransgênica, surgiu o Decreto
4.680, de 24.04.2003, que regulamentou o Direito à Informação, assegurado pela Lei
8.078, de 11.09.1990 quanto aos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao
consumo humano ou animal que contenham ou que seja produzido a partir de
Organismos Geneticamente Modificados, sem prejuízo do cumprimento das demais
normas aplicáveis, revogando, desse modo, o Decreto 3.871/01. Entre as novidades do
novo Decreto, podem ser destacadas as seguintes: a) não apenas os alimentos
destinados aos humanos, mas também os destinados ao consumo animal deverão ser
devidamente rotulados; b) ficou estabelecido novo limite percentual para a presença
máxima de Organismos Geneticamente Modificados, fixado em 1%, o mesmo adotado
pela União Européia, uniformizando, assim, de certa maneira, as relações de exportação;
c) tanto os produtos embalados quanto os produtos a granel deverão informar se
apresentam mais de 1% de Organismos Geneticamente Modificados em sua composição;
32
d) o consumidor deverá ser informado, no local reservado para a identificação dos
ingredientes, sobre a espécie doadora do gene. 27
Quanto às singularidades da Biossegurança, historicamente destaca-se que em
24.03.2005, foi sancionada a Lei de Biossegurança (PL 2.401/2003), aprovada pela
Câmara de Deputados, entrando em vigor a Lei 11.105, de 24.03.2005. Conquanto
destinada, em tese, a regulamentar o art. 225, § 1º, incisos II, IV e V da Constituição
Federal, a Lei 11.105/2005 agrupa quatro relevantes matérias diversas: a pesquisa e a
fiscalização dos Organismos Geneticamente Modificados; a utilização de células-tronco
embrionárias para fins de pesquisa e terapia; o papel, a estrutura, as competências e o
poder da CTNBio; e, por fim, a formação do Conselho Nacional de Biossegurança
(CNBS), bem como sua organização, por meio de normas ora dispersas pelo texto
integral da Lei, ora concentradas no seu Capítulo II. O Capítulo I trata das disposições
preliminares e gerais e se configura como uma parte introdutória, verdadeiro pórtico em
que são fixados os Princípios e Normas Gerais que conferem à Lei seu travejamento
conceitual, axiológico e científico. O art. 1º apresenta um rol de normas fundamentais
quanto às normas de segurança à vida, à saúde humana, animal, vegetal e ao Meio
Ambiente, fiscalização e utilização em geral dos Organismos Geneticamente Modificados,
tanto para fins de pesquisa, como para fins comerciais, apontando, para tanto, como
princípio basilar a ser observado, o Princípio da Precaução. No art. 2º, para o
cumprimento do art. 1º e conseqüente implementação do Princípio da Precaução e, para
as atividades e projetos relacionados aos Organismos Geneticamente Modificados,
dispõe a Lei que os agentes deverão, obrigatoriamente, requererem a autorização da
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) (§ 3º), que deverá fornecer
Certificado de Qualidade em Biossegurança (§ 4º), estabelecendo a co-responsabilidade
dos agentes nas atividades e na pesquisa, quanto aos efeitos decorrentes do
descumprimento.
Já pelo art. 14 (competência da CTNBio) é reafirmado (em especial nos incisos VI,
VII, VIII, IX, X, XI e XII) competir à CTNBio o estabelecimento dos parâmetros e requisitos
de segurança e a aprovação ou não das atividades ou pesquisas com Organismos
27 Machado, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.34.
33
Geneticamente Modificados. Ao delegar este poder à CTNBio, a Lei prevê
expressamente, no inc. XIII do art. 14, que a Comissão definirá o nível de Biossegurança
a ser aplicado aos Organismos Geneticamente Modificados, aos respectivos
procedimentos e às medidas de segurança quanto aos seus usos, tudo conforme as
normas estabelecidas na regulamentação específica, inclusive quanto aos seus
derivados, o que implica dizer que, até a regulamentação da Lei mencionada, os critérios
de segurança estarão sendo estabelecidos unicamente pelos membros componentes da
Comissão.28
O patrimônio genético merece proteção jurídica em face de relacionar-se à
possibilidade trazida pela engenharia genética de utilização de gametas conservados em
bancos genéticos para a construção de seres vivos, possibilitando a criação e o
desenvolvimento de uma unidade viva sempre que houver interesse. Daí, em decorrência
do evidente impacto da engenharia genética na pecuária, na avicultura e na agricultura.
Há o entendimento constitucional de organizar as relações jurídicas advindas da
complexidade do tema.
A proteção do Patrimônio Genético e do Meio Ambiente contra a prática de
atividades apresentadoras de características lesivas ou, ao menos, que demonstrem a
possibilidade de ocorrência de lesões, deve ser efetivada em caráter de urgência, diante
da potencial possibilidade de geração de danos irreversíveis em sua integralidade. Tal
proteção é feita por instrumentos processuais que se encontram postos à disposição da
coletividade, diante da probabilidade da prática de um ilícito, de sua continuação ou de
sua repetição, bem como em face da efetivação de um ilícito, tudo visando evitar a
concretização de danos, em quaisquer de suas modalidades.
O registro de bens culturais, como parte do patrimônio imaterial da nação é uma
decorrência e aprofundamento da proteção legal estabelecida pelo Decreto-Lei nº 25/37
que cuida da proteção legal do patrimônio histórico, artístico, cultural, paleontológico,
28 Lacadena, Juan Ramón. Experimentação com embriões: o dilema ético dos embriões excedentes, os embriões somáticos e os embriões partenogenéticos. In: Martinez, Julio Luis (org.). Células-tronco.
34
material. A proteção do patrimônio imaterial é igualmente importante e estava sendo
negligenciada por muitos e muitos anos.
1.3 - As relações com o Direito Ambiental Internacional
Embora as discussões sobre normas reguladoras da Biossegurança tivessem se
iniciado na Europa na década de 1970, os debates em fóruns internacionais oficiais se
deram a partir de 1980, com a inclusão do tema no Relatório da Comissão Brundtland
sobre desenvolvimento sustentável, chamado Nosso Futuro Comum e após a Conferência
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ocorrida no Rio de Janeiro em 1992
(ECO-92). Assim, a questão passou a estar definitivamente incluída no Direito
Internacional. 29
O art. 16 da Convenção Internacional sobre Diversidade Biológica (CDB), assinada
e ratificada por mais de 170 países, reconhece a importância da biotecnologia para se
alcançar os objetivos da Convenção. Ressalta o papel que têm o acesso e a transferência
de tecnologia entre os países signatários da Convenção para a conservação e uso
sustentável da Biodiversidade, de modo que o uso de recursos genéticos não venha a
causar danos ambientais significativos.
O art. 8º, alínea g, da Convenção da Biodiversidade recomenda às partes, como
medida para prevenção e para a conservação dos recursos naturais, que estabeleçam ou
mantenham os meios para regulamentar, administrar ou controlar os riscos associados à
utilização e liberação de organismos vivos modificados, resultantes da Biotecnologia. Tais
riscos podem provavelmente provocar impacto ambiental negativo, podendo afetar a
conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica, levando também em
conta os riscos para a saúde humana.
Os capítulos 15 e 16 da Agenda 21 reforçam a importância da Biotecnologia para
se alcançar as metas de um desenvolvimento sustentado e equilibrado, que possa
29 Soares, Guido Fernando. A Proteção Internacional do Meio Ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p32.
35
proporcionar melhor atendimento à saúde, maior segurança alimentar por meio de
práticas agrícolas sustentáveis, melhor aproveitamento da água potável e dos recursos
hídricos.
A Conferência das Partes, realizada em Jacarta, Indonésia, em novembro de 1995,
visando à regulamentação da Agenda 21, fixou regras relativas à Biossegurança,
ressaltando a importância de se implementar um Guia de Condutas Técnicas de
Segurança em Biotecnologia, com o objetivo de promover a homogeneização legislativa
internacional, para melhor proteção do Meio Ambiente e da saúde humana.
Um ponto importante a respeito dos guias internacionais de boa conduta em
Biotecnologia é a indicação dos diversos meios de informação ao público sobre os riscos
biológicos. Dentre outros, podem ser destacados os seguintes: o direito da população
residente nos locais onde haverá liberação de Organismo Geneticamente Modificado de
ser informada sobre esse fato, recomendando-se ao Poder Público que promova
campanha informativa sobre o novo organismo em jornais de grande circulação ou nos
periódicos locais, ensinando os cuidados que devem ser tomados a partir do seu
lançamento; o direito de obter as informações necessárias sobre os produtos que
contenham Organismos Geneticamente Modificados ou que sejam feitos a partir deles,
sendo de suma importância a indicação de que se trata de produtos geneticamente
modificados, principalmente no caso de introdução de seqüências de DNA de uma
espécie em outra.
A Diretiva 90/220, da Comunidade Européia, ao cuidar da liberação do Organismo
Geneticamente Modificado no continente, reitera como princípio geral o uso de regras
preventivas para evitar quaisquer perigos de danos ao Meio Ambiente e à saúde humana.
Estabelece que o produto geneticamente modificado, se aprovado para consumo humano
ou animal, deverá ter instruções precisas das condições de uso nos rótulos, garantindo-se
que o produto esteja contido em embalagens adequadas. A Diretiva exige que os rótulos
desses produtos explicitem a informação sobre suas características transgênicas, do
mesmo modo que o faz o Código Brasileiro de Proteção e Defesa do Consumidor.
Um dos marcos históricos do Direito Ambiental Internacional foi a realização da
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92).
36
Esse encontro, realizado no Rio de Janeiro, contou com a participação de 178 Governos e
a presença de mais de 100 Chefes de Estado ou Governo e, além de buscar uma
consciência ambiental, foi marcante pela busca de proteção jurídica ao Meio Ambiente.
Dessa Conferência, ressaltam-se os seguintes resultados: adoção de uma Declaração de
princípios sobre ambiente de desenvolvimento; adoção de duas Convenções multilaterais
mundiais, uma sobre diversidade biológica e outra sobre alterações climáticas; a adoção
de um plano de ação na comunidade internacional referente à implementação dos
objetivos fixados na Declaração do Rio (desenvolvimento sustentável). Esse documento
ficou conhecido como Agenda 21.
Em 28.01.2000, foi firmado em Montreal, Canadá, o Protocolo de Cartagena sobre
Biossegurança, dentro da Convenção da Diversidade Biológica, após árdua negociação
entre os países exportadores de grãos, os países em desenvolvimento e a Comunidade
Européia. A assinatura do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança representa um
avanço significativo, na tentativa de se fixarem normas padrões de Biossegurança. Serve
o documento internacional como referência legislativa básica para a proteção da
diversidade biológica e da saúde humana em relação a eventuais danos que possam
advir da liberação, no meio, de Organismos Geneticamente Modificados ou da ingestão
de produtos ou alimentos transgênicos. Ficou expressamente estabelecido que nenhuma
referência no texto do Protocolo possa ser interpretada como uma submissão a qualquer
outro documento ou organização internacional. Na prática, o Protocolo de Biossegurança
tenta se desvincular das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). O Protocolo
é um compromisso dos países soberanos, que são partes da Convenção da Diversidade
Biológica, com regras mínimas de Biossegurança, ressalvando o direito de cada parte de
estabelecer normas mais rígidas ou critérios próprios para a aceitação e liberação de
sementes, grãos ou produtos geneticamente modificados. O Protocolo reconhece que os
países podem recusar a remessa de produtos transgênicos por entender que sua
introdução possa ter impactos socioeconômicos indesejáveis, além de potenciais riscos
ambientais, que deverão ser avaliados por meio de Estudo de Impacto Ambiental, a
exemplo do que determina a Constituição Brasileira em seu art. 225, inc. IV. Não obstante
o Protocolo de Biossegurança ter sido firmado e aprovado pela Conferência das Partes da
37
Convenção da Diversidade Biológica, ele ainda não se encontra em vigor, pois necessita
da ratificação a seus termos por, pelo menos, cinqüenta Estados independentes. 30
Diversos encontros vêm sendo realizados pelo mundo e cada um deles é
denominado Conferência da Convenção sobre Diversidade Biológica das Partes (COP). A
última, a COP 8, ocorreu em Curitiba, no Estado do Paraná, Brasil, no mês de março de
2006. Teve por objetivo continuar o processo iniciado na reunião ocorrida em Granada,
Espanha, no início do ano de 2006, onde o Brasil articulou a redação de um regime
favorável aos países em desenvolvimento e possuidores de megadiversidade. As
negociações realizadas na COP 8 trataram basicamente de questões comerciais de
soberania e proteção intelectual, tendo por objetivo a regulamentação do acesso
internacional aos recursos genéticos da biodiversidade (por exemplo, genes e moléculas
de plantas medicinais), o conhecimento tradicional associado ao uso desses recursos e a
repartição dos benefícios financeiros ou tecnológicos provenientes do referido acesso. As
negociações foram lideradas por dois grandes blocos: o dos Países Megadiversos Afins,
que inclui o Brasil, e o dos países desenvolvidos, no qual a União Européia é a força mais
atuante, cabendo ressaltar que os Estados Unidos assinaram, mas nunca ratificaram a
convenção, e, por este motivo, não participam das negociações, apesar de exercerem
influência sobre outros países.
Sobre a União Européia e a Diretiva 18/2001, deve-se relevar que a Europa é o
berço do Princípio da Precaução, tal como este é conhecido atualmente. Surgiu, pela
primeira vez, na década de 1960, na Alemanha, devendo ser observado que sua origem
retrocede à tradição sociolegal germânica da década de 1930. O Princípio da Precaução,
portanto, pode ser conceituado como uma parceria construtiva entre todas as áreas da
sociedade para produzir e administrar mudanças no mundo natural. Essa noção engloba
a gestão do Meio Ambiente, a prevenção de riscos, o cálculo do custo-benefício,
responsabilidades éticas, a manutenção e a integridade de sistemas naturais e a
falibilidade da compreensão humana.
30 Becker, Bertha K. Amazônia. Construindo o Conceito e a Conservação da Biodiversidade na Prática. Departamento de Geografia, Ig, UFRJ. São Paulo, 2001, p.68.
38
Ambientalistas de todo o mundo haviam identificado um outro problema que
afetava diretamente o processo de tomada de decisão e a aplicabilidade da legislação
ambiental, chamado de hipótese de implementação dos erros, que identificava a
existência de uma clara discrepância entre as previsões legais e as metas da política
ambiental, de um lado, e sua aplicação prática, de outro.
A Alemanha Ocidental começou a implementar o Princípio da Precaução em sua
legislação ambiental doméstica. A mesma linha de pensamento orientou, em 1987, o
primeiro acordo internacional, a Declaração Ministerial da Segunda Conferência
Internacional sobre a Proteção do Mar do Norte. Desde então, a Comunidade Européia
abraçou o Princípio da Precaução, criando um dos mais abrangentes corpos de leis
ambientais.
O Princípio da Precaução coibe atividades cujos efeitos ainda são desconhecidos.
Precaução é substantivo oriundo do verbo precaver-se (do Latim prae - antes e cavere-
tomar cuidado). Sugere cuidados antecipados, cautela para que uma atividade ou ação
não venha a resultar em efeitos indesejáveis. Antes se buscava primordialmente a
reparação de danos ambientais, mas agora as medidas são prioritariamente, tomadas
para evitarem-se esses mesmos danos. E isto se deu pelo simples fato de que a grande
maioria dos danos ocorridos com a natureza não é passível de reparação ou levam-se
décadas para restaurar o que foi destruído. O princípio da precaução deve ser aplicado
em caso de dúvida no que tange à possibilidade de geração de danos ao Meio Ambiente,
decorrentes da prática de determinada atividade lesiva, impondo-se a proibição da
autorização do seu exercício. 31
Seguindo a Convenção de Biodiversidade e o Protocolo de Cartagena, a União
Européia promulgou a Diretiva 18/2001, que estabelece uma estrutura legal de
Biossegurança para a liberação de Organismos Geneticamente Modificados no Meio
Ambiente. A Seção 8 do Preâmbulo da Diretiva explicitamente exige que os Estados
membros levem em conta o Princípio da Precaução ao elaborarem suas legislações de
Biossegurança. Embora a linguagem seja similar ao previsto no art. 1º da Lei de
31 Silva, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. 5 ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p35.
39
Biossegurança Brasileira, os seguintes aspectos não deixam qualquer margem de dúvida
quanto às cruciais diferenças entre ambas as Leis. Há a exigência do Relatório Sobre o
Impacto Ambiental e a exigência de Participação Pública. A exigência do Relatório Sobre
o Impacto Ambiental encontra-se abundantemente reforçada em toda a Diretiva, inclusive
nos longos e detalhados procedimentos do Anexo II. Objetivamente, a exigência da
Diretiva não só assegura uma submissão mais uniforme dos Estados-membros, como
também garante que nenhum Estado irá titubear em programar abrangentes exigências
do Rima, ao transporem a Diretiva para suas legislações nacionais. O reiterado apelo da
Diretiva é ainda complementado por um cálculo de risco detalhado e que inclui a
administração de risco, os planos de monitoramento, as interações ambientais e os
planos de respostas de emergência quanto à liberação de Organismos Geneticamente
Modificados no Meio Ambiente. O legislador europeu de fato integrou completamente o
Princípio da Precaução aos seus processos de tomada de decisões.
Devemos destacar alguns pontos sobre a biodiversidade, a proteção legislativa e
os protocolos internacionais. O direito ao Meio Ambiente é difuso e de absoluta
relevância. Dentre as questões mais polêmicas da atualidade, está a problemática da
manipulação do Patrimônio Genético de plantas e animais, havendo desconfiança geral
quanto à disseminação na natureza de Organismos Geneticamente Modificados. Deve-se
prestar a máxima atenção nas experiências a serem realizadas pelas entidades públicas
ou privadas envolvidas nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente
Modificados.
A partir da Revolução Industrial, a agressão ao meio ambiente começou a tomar
contornos de realidade preocupante para toda a sociedade, principalmente devido ao
avanço industrial, dirigido pelos grandes grupos comerciais que, por falta de uma
educação ambiental, passaram a utilizar, de maneira irresponsável, a tecnologia
alcançada, gerando graves consequências ao ecossistema. É assombrosa a velocidade
com que as inovações na área de biotecnologias, apoiadas pelas grandes empresas do
ramo de alimentação, vêm ocorrendo em matéria de manipulação do Patrimônio Genético
de plantas e animais, tornando-os mais resistentes e herbicidas, com maior
desenvolvimento em curto período de tempo e com maior capacidade de sobreviver às
40
pragas. O custo de manutenção cai vertiginosamente para os produtores; trata-se da
aplicação perfeita do binômio produtividade versus baixo custo de produção.
Todos os envolvidos nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente
Modificados estão atentos ao panorama internacional, especialmente aos avanços
tecnológicos dos mercados mundiais, como o da China e o da Índia; daquela, por ser
grande importadora de grãos e estar desenvolvendo programas de biotecnologia na área
agrícola, o que já a elevou à condição de maior produtora global de trigo, se tornando
uma grande exportadora. O Brasil realizou grande revolução agrícola nos anos 1990, com
o desenvolvimento tecnológico voltado à produção nas regiões de cerrado e continua
enfrentando as controvérsias que pairam sobre a questão atinente à utilização dos
Organismos Geneticamente Modificados.
Discute-se a possibilidade ou não de se assegurar o progresso científico e
tecnológico, sem pôr em risco a saúde da população e o Meio Ambiente, ou na
possibilidade de se contrariar procedimentos que, sob a ótica constitucional e moral, são
aplicáveis à coletividade, instaurando-se regimes jurídicos de exceção em favor de
poderosos segmentos econômicos. As respostas a tais controvérsias indicarão não só o
modelo de ordem jurídica democrática que se quer para o País, como também o grau de
respeito aos valores, objetivos e princípios estabelecidos na Constituição Federal. O
cenário de preocupações é voltado ao desenvolvimento de um modelo sustentável e
responsável em relação aos processos de obtenção, em relação aos processos de
produção e comercialização de Organismos Geneticamente Modificados. Para que haja
uma justaposição entre desenvolvimento tecnológico e proteção do Meio Ambiente, é
imprescindível que sejam mantidos os limites entre o desenvolvimento e a conservação
dos recursos naturais existentes.
41
CAPÌTULO II - DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA
BIOCIÊNCIA
2.1 - O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
O primeiro diploma jurídico internacional a proclamar a dignidade da pessoa
humana foi a Carta das Nações Unidas, de 26 de junho de 1945, que em seu preâmbulo
enuncia o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana
e de seus direitos iguais e inalienáveis, tendo como fundamento a liberdade, a justiça e a
paz no mundo. O conceito de dignidade, exclusivo do conceito humano de vida, é de
difícil delimitação, mas nem por isso impossível de ser discutido. O melhor antônimo
jurídico da dignidade seria o conceito de indignidade (que na Constituição é cristalizado
tanto no conceito de tortura quanto no conceito de tratamento desumano e degradante).
A Constituição Federal de 1988 estabelece em seu art. 1º, inciso III – a dignidade
da pessoa humana. Para melhor elucidar a expressão que permeia todo o ordenamento
jurídico brasileiro e sobre a qual se funda o Estado Democrático de Direito, exige-se
precisar o sentido e o alcance da expressão dignidade da pessoa humana, tanto no que
lhe designa a concepção filosófica, quanto no que lhe reserva a concepção jurídica. O
princípio da dignidade da pessoa humana encontra-se inserido no texto constitucional
entre os valores superiores que fundamentam o Estado. Questiona se ainda se trata um
princípio (dimensão normativa) ou valor (dimensão axiológica ou teleológica). O sentido
que se dá é unívoco, pois os doutrinadores de uma e de outra posição propugnam pela
sua força vinculante e cogente. Assim, a idéia da dignidade da pessoa humana é
verdadeira força vinculante, de caráter jurídico, apta a disciplinar as relações sociais
pertinentes. 32
Em sua concepção filosófica, dignidade termo originário do latim dignitas
(merecimento, nobreza, valor), designa a qualidade moral que infunde respeito;
consciência do próprio valor, honra, autoridade, nobreza; qualidade do que é grande,
32 Alves, Cleber Francisco. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: o enfoque da doutrina social da Igreja. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p.78.
42
elevado. Quer significar o modo de alguém proceder ou de se apresentar que inspira
respeito, solenidade, gravidade, brio, distinção, prerrogativa, título, honraria, função ou
cargo de alta graduação.
A dignidade da pessoa humana, no âmbito do pensamento clássico, correspondia à
posição ocupada pelo indivíduo na sociedade, bem como no seu grau de reconhecimento
pelos demais membros da comunidade, de tal sorte que era possível falar em maior ou
menor grau de dignidade. Por outro lado, a dignidade era tida também como qualidade
que, pelo fato de ser inerente aos seres humanos, os distinguia das demais criaturas.
Esta noção de dignidade, sustentada de modo especial no âmbito da filosofia estóica,
encontra-se, por sua vez, imediatamente vinculada à noção de liberdade pessoal de cada
indivíduo (o homem como ser livre e responsável por seus atos e seu destino), bem como
à idéia de que todos os homens, no que tange à sua natureza, são iguais em dignidade.
Partindo dessa noção, encontram no cristianismo medieval e na filosofia estóica as
origens dessa concepção, indicando que teria sido Tomás de Aquino quem
expressamente utilizou a expressão dignitas humana. Na esteira desses conceitos, no
âmbito do pensamento jusnaturalista dos séculos XVII e XVIII, a concepção de dignidade
da pessoa humana, assim como a idéia do direito natural em si, sofreu um processo de
laicização e de racionalização, conservando, no entanto, a noção fundamental da
igualdade substancial de todos os homens em dignidade e liberdade. Firma-se a partir
desse período o pensamento de Immanuel Kant e com ele a noção da autonomia ética do
ser humano, auto – nómos – capacidade de determinar normas a si mesmo – a
autonomia assim concebida, além de ser considerada o fundamento da dignidade do
homem. Conduz ao imperativo categórico de que o ser humano não pode ser tratado,
nem mesmo por ele próprio, como mero objeto, posto que, ao contrário do que ocorre
com os outros seres, no homem sua natureza racional reserva-lhe o reino dos fins, e não
o dos meios. 33
Do plano filosófico à esfera jurídica, refere-se à dignidade da pessoa humana como
um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem,
33 Sarlet, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p.71.
43
desde o direito à vida. A referência à dignidade da pessoa humana parece englobar em si
todos aqueles direitos fundamentais, os individuais clássicos e os de fundo econômico e
social. Corresponde à compreensão do ser humano na sua integridade física e psíquica,
como autodeterminação consciente, garantida moral e juridicamente. A dignidade da
pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta na
autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a
pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo
invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar. 34
A dignidade humana é um valor intrínseco, originariamente reconhecido a cada ser
humano, fundado na sua autonomia ética, tendo como base uma obrigação geral de
respeito da pessoa, traduzida num elenco de direitos e deveres correlatos. Relaciona-se à
qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo
respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade. Implica um complexo de
direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa contra todo e qualquer ato de
cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais
mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e
co-responsável nos direitos da própria existência e da vida em comunhão com os demais
seres humanos.
A concepção jurídica da dignidade da pessoa humana fundamenta-se na ética
kantiana e em sua conseqüente noção de autonomia, considerada a capacidade de saber
o que a moral exige do homem. A autonomia não funciona como a liberdade irrestrita para
atingir determinados fins, mas como o poder que tem um agente de se comportar
segundo regras de conduta universalmente válidas e objetivas, avalizadas apenas pela
razão. A dignidade humana que dela se retira, por não admitir um equivalente, assume
um valor incondicional, incomparável, para a qual somente a palavra respeito designa-lhe
a real dimensão. 35
34 Bastos, Celso. Curso de direito constitucional São Paulo: Saraiva, 2001, p.44. 35 Sarlet, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 5ª ed. Porto Alegre. Livraria do Advogado, 2005, p.68.
44
O princípio da dignidade nos obriga a um compromisso inafastável: o do absoluto e
irrestrito respeito à identidade e à integridade de todo ser humano. Isso porque o homem
é sujeito de direitos; não é, jamais, objeto de direito e muito menos objeto mais ou menos
livremente manipulável. O princípio da dignidade da pessoa humana é a razão de ser da
proteção fundamental do valor da pessoa e, por conseguinte, da humanidade do ser e da
responsabilidade que cada homem tem pelo outro.
2.2 - Do Biodireito
O Biodireito consagra o direito fundamental à vida, o princípio da dignidade e a
ética da responsabilidade como limites a serem observados no âmbito das pesquisas
científicas com células-tronco embrionárias humanas. Relaciona-se ao uso da sabedoria
científica aplicada às práticas médicas. Esses saberes segmentados revelaram, de um
lado (biológico), o conhecimento do gene, componente responsável pela transmissão da
informação hereditária; e do outro (químico), o DNA (ácido desoxirribonucléico), a
informação propriamente dita. Unidos, esses saberes originaram a Biotecnologia, ciência
da engenharia genética, conhecimento capaz de produzir e de modificar artificialmente
seres vivos. 36
Hodiernamente, pode-se conceber uma nova dimensão de direitos, que visam a
disciplinar a evolução das pesquisas no campo da Biotecnologia e devem estar norteadas
pela observação aos Princípios regidos pela Ética, pela Bioética, pelo Biodireito e pelas
normas de Biossegurança.
O Biodireito tem por premissa a positivação jurídica de permissões de
comportamentos médicos e científicos, de imputação de sanções aos comportamentos
violadores das condutas descritas nas normas respectivas. A Biossegurança tem por
prisma a contemplação legal de situações relacionadas às práticas técnico-científicas que
tenham o condão de interferir de forma direta ou indireta no Patrimônio Genético e no
Meio Ambiente. O Biodireito guarda estreita relação com o Direito Ambiental na medida
36 Ferraz, Sérgio. Biodireito constitucional: uma introdução. São Paulo: Revista de Direito Constitucional e Internacional, ano 11, nº 42, jan-mar 2003, p.28.
45
em que ambos derivam da Bioética e possuem Princípios comuns, destacando-se, dentre
eles, o da Ubiqüidade, o da Cooperação entre os Povos, o do Desenvolvimento
Sustentável, o da Preservação da Espécie Humana, o da Precaução e o da Prevenção. 37
Determinar um limite seguro, que permita harmonizar essas realidades
possibilitando que a ciência avance, sem que esse avanço configure uma ameaça para a
vida e o futuro da espécie humana, constitui a missão à qual se destina o Biodireito. Tem
como tarefa mediar a tensão dialética entre a liberdade científica e o direito fundamental à
vida, fixando pautas que permitam compatibilizar os valores essenciais assegurados a
cada indivíduo e a necessidade humana legítima de buscar novos conhecimentos. O
Direito, ciência que regula a vida em sociedade, é chamado para balizar questões
conflitantes, estabelecendo limites e condicionantes. Por isso, devem ser estabelecidos
parâmetros que permitam determinar quando tem início a vida humana e a partir de que
momento o respeito a ela se impõe frente a qualquer outro.
A biociência ou biologia compreende o estudo dos seres vivos e das leis gerais da
vida e, como área de conhecimento, é uma conquista recente do gênio humano.
Pretende-se fazer histórias da biologia no século XVIII, quando, até então, era
desconhecida por uma razão bem simples: a própria vida não existia. Existiam apenas
seres vivos que apareciam por meio de um crivo do saber constituído pela história natural.
Esse novo campo se tornaria o vértice de onde decorreriam futuros saberes, ainda mais
competentes e impositivos no ato de classificar e manipular seres vivos, a saber: a
biotecnologia. 38
Na verdade, o Direito fornece instrumentos formais a fim de que as normas éticas
se transformem em documentos e procedimentos efetivos. Mas é a ética, que é também
política, que vai questionar os valores e as práticas do Direito Positivo, introduzindo novos
valores e procurando responder aos desafios que emergem da contemporaneidade. Entre
37 Santos, Maria Celeste Cordeiro Leite dos. Biodireito: ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p.25. 38 Diniz, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p.84.
46
esses desafios certamente figura a questão da pesquisa científica em células-tronco
embrionárias. 39
O Biodireito, novo ramo do Direito que vem despontando, refere-se aos fatos e
eventos que surgem a partir das pesquisas das ciências da vida; que nascem a partir do
aumento de poder do homem sobre o próprio homem – que acompanha inevitavelmente o
progresso técnico, isto é, o progresso da capacidade do homem de dominar a natureza e
os outros homens – ou criar novas ameaças à liberdade do indivíduo, ou permitir a
criação de novas medicações.
O Biodireito trata da teoria, da legislação e da jurisprudência relativas às normas
reguladoras da conduta humana, em face dos avanços da biologia, da biotecnologia e da
medicina. Concede tratamento ao homem não só como ser individual, mas acima de tudo
como espécie a ser preservada. Originário do vocabulário grego, biós significa vida.
Contudo, não possui a mesma conotação de vida designada pela língua portuguesa. Isso
porque no uso corrente da língua portuguesa, vida é a antítese de morte e, no vocabulário
grego, a antítese de morte – thanatos – não é biós, e sim, zoé, ou seja, os gregos, por
atribuírem dois sentidos à palavra vida, possuem duas expressões distintas para designá-
los. Assim, biós corresponde ao decurso da vida, ao seu período de duração, a sua
continuidade, relaciona-se com o tempo, chronos, apresenta-se interligada, portanto, à
consideração dos meios e das condições nas quais a vida evolui, condições essas no
sentido de posse, propriedade, opulência, recursos que a vida possui para desenvolver-se
dignamente, abrangendo a vida, enquanto processo vital, a desenvolver-se em toda sua
oikos – casa onde se vive – em todo seu meio ambiente. Para a civilização grega, biós
está diretamente relacionado à ética, posto que enfatize a condição, o status do ser. 40
O Biodireito, ramo específico do Direito Público que tem por objetivo a proteção da
vida – zoé e biós – existência e subsistência – (arts. 5º e 225 da Constituição Federal de
1988), passa a determinar as fronteiras a serem observadas quando da prática da
pesquisa científica em células-tronco embrionárias. A vida, por ser um valor inerente à
39 Barth, Wilmar Luiz. Células-tronco e bioética: o progresso biomédico e os desafios éticos. Porto Alegre: Edipucrs, 2006, p.35.
47
condição humana é pressuposto e fundamento de todos os demais direitos, certo que
sem ela não há que se falar em liberdade, em igualdade, em segurança, em propriedade,
em educação. 41
O princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático e
Social de Direito alicerçado na ética kantiana, estabelece que a todas as coisas pode-se
atribuir um preço. O ser humano, ao contrário, por possuir autonomia – capacidade de
autodeterminação – possui valor – devendo, por essa razão, ser considerado sempre fim
em si mesmo e nunca meio. Seguindo esse raciocínio, dever-se-ia proibir tanto a
clonagem reprodutiva quanto a clonagem terapêutica; autorizar a diagnose genética em
caso de suspeitas de doenças graves e para as quais haja terapia.
Há um conflito entre o direito fundamental à vida (art. 5º, caput, CF/1988) e o direito
fundamental à liberdade científica (art. 5º, inciso IX, CF/1988). Havendo conflito entre a
livre expressão da atividade científica e outro direito fundamental da pessoa humana, a
solução ou o ponto de equilíbrio deverá ser o respeito à dignidade humana, fundamento
do Estado Democrático de Direito, previsto no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal.
Na ética da responsabilidade pontua-se que, se de um lado existe o direito à liberdade
científica (art. 5º, inciso IX, da CF/1988), de outro lado há o dever para com a vida, não só
das presentes (art.5º, caput, CF/1988) como também das futuras gerações, não só o
dever de promover a vida, mas, sobretudo, de promover uma vida com qualidade, uma
vida digna (art.225 da CF/1988).
A universalidade dos direitos humanos tornou-se, após as ocorrências da Segunda
Grande Guerra, tema necessário e preponderante à reflexão jurídica e filosófica mundial:
o homem é um ser universal e os seus direitos, inalienáveis e imprescritíveis, detêm a
qualidade do universal, encontrável em qualquer parte do planeta. O Direito e a Ética
40 Casabona, Carlos Maria; Meirelles, Jussara Maria Leal de; Barreto, Vicente de Paulo (orgs.). Novos temas de bioética e biodireito. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p.23. 41 Dallari, Dalmo de Abreu. Bioética e direitos humanos: a vida como valor ético. In: Garrafa, Volnei; Ferreira, Sérgio Ibiapina. (orgs.). Iniciação à bioética. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 1998, p.48.
48
funcionam como anteparos necessários que sempre regularam os excessos da ação
humana mesmo na própria Ciência.
Na verdade deve-se considerar a ambivalência do poder científico, capaz de criar,
transformar e exterminar não só o homem, mas também a humanidade, confrontando a
este poder o valor da vida humana, demonstrando sua afirmação como direito humano
fundamental ao longo da História, reservando destaque à análise de documentos
internacionais que se relacionam com o tema em questão.
A Constituição Federal de 1988 prevê a proteção do direito à vida não só com
relação às presentes gerações, como também com relação às futuras. A Constituição
trata, em caráter de supremacia, da pessoa, da vida e da liberdade. O Biodireito resulta a
Bioconstituição, que é o conjunto de normas (princípios e regras) formal ou materialmente
constitucionais, que tem por objetivo as ações ou omissões do Estado ou de entidades
privadas, com base na tutela da vida, na identidade e na integridade das pessoas, na
sáude do ser humano atual ou futuro, tendo em vista também as suas relações com a
Biomedicina. 42
Ficam consagrados como dispositivos medulares, sobre os quais se erige o
Biodireito, os arts. 5º e 225 da Constituição Federal de 1998. Individualmente
considerada, a tutela da vida está prevista no art. 5º, caput da Constituição Federal de
1988, o qual relata que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade. Já a proteção
da vida humana enquanto espécie a ser preservada restou elencada no art. 225, que
ressalta que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defender e preservá-lo.
Ao Biodireito cumpre a missão de guardar a vida humana, no sentido de proteger,
de tutelar, de assegurá-la, tanto com relação ao ser humano individualmente considerado
42 Baracho, José Alfredo de Oliveira. A identidade genética do ser humano. Bioconstituição: bioética e direito. Revista de Direito Constitucional e Internacional. São Paulo, v.8, nº 32, 2000, p.58.
49
quanto com relação ao gênero humano, tanto com relação às presentes quanto às futuras
gerações, garantindo não só a vida, mas, sobretudo, vida digna, vida com dignidade.
2.3 - Da Bioética
A bioética evolui no plano nacional e internacional. Em vários países, têm sido
criados comitês nacionais especiais de ética com o objetivo de assessorar, estudar e
elaborar a legislação a respeito. 43
A Comissão Européia instituiu o grupo de consultores sobre ética em biotecnologia
e a Unesco criou o Comitê Internacional de Bioética. A Comissão de Direitos Humanos
(na Resolução nº 1995/82, sobre direitos humanos e bioética), enfatizou a necessidade do
desenvolvimento de uma ética das ciências biológicas nos planos interno e externo e
também ressaltou a importância da cooperação internacional para assegurar que a
humanidade, como um todo, seja beneficiado pelas ciências biológicas. Conforme
solicitação da Assembléia-Geral, os códigos de ética médica foram elaborados pelo
Conselho de Organizações Internacionais de Ciências Médicas (COICM) e endossados
pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Também em parceria com o conselho, a
OMS formulou e publicou, em 1982, as Diretrizes Éticas Internacionais para Pesquisas
Biomédicas envolvendo seres humanos. 44
Na esfera regional, a União Européia e o Conselho Europeu têm desempenhado
um papel importante na promoção da bioética. Em 1996, o Comitê de Ministros do
Conselho Europeu adotou a Convenção para a proteção dos Direitos do homem e da
dignidade do ser humano em face das aplicações da biologia e da medicina. No artigo 2º,
a Convenção estabelece que os interesses e o bem-estar do ser humano devem
prevalecer sobre o interesse único da sociedade ou da ciência. Qualquer intervenção no
ramo da saúde, incluindo a pesquisa, deve ser realizada de acordo com obrigações e
normas pertinentes. Entre os princípios da Bioética consagrados na Convenção, figuram a
43 Silva, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. 5 ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.64. 44 Lacadena, Juan Ramón. Experimentação com embriões: o dilema ético dos embriões excedentes, os embriões somáticos e os embriões partenogenéticos. In: Martinez, Julio Luis (org.). Células-tronco humanas: aspectos científicos, éticos e jurídicos. São Paulo: Loyola, 2005, p.65.
50
necessidade do consentimento livre e expresso do interessado para qualquer intervenção
no campo da sáude; o direito ao respeito pela privacidade; o princípio de que a remoção,
para transplante, de órgãos ou tecidos de pessoa viva só se realize para o benefício
terapêutico do receptor e a proibição de auferir lucros com a venda do corpo humano ou
de seus órgãos. 45
Nas atividades relacionadas à bioética, a Unesco tem devotado atenção especial
ao genoma humano, priorizando questões éticas e legais ligadas à ameaça de que a
pesquisa sobre o genoma humano possa abrir as portas para desvios perigosos e
contrários à dignidade humana e aos direitos humanos fundamentais. Estabelece limites
para as intervenções na herança genética da humanidade e nos indivíduos, que a
comunidade internacional tem a obrigação moral de não transgredir. Entre os direitos do
indivíduo, a Declaração enumera os seguintes: consentimento prévio para toda pesquisa,
tratamento ou diagnóstico, proibição de qualquer discriminação baseada em
características individuais; confidencialidade da informação genética associada a uma
pessoa identificável; e o direito à justa reparação pelo dano sofrido como resultado direto
de uma intervenção sobre o seu genoma. 46
A pesquisa deve preservar o respeito pela dignidade humana, que é a base de
todos os direitos humanos, inclusive do direito à pesquisa científica. À luz da velocidade
dos avanços biotecnológicos, a biovigilância - o respeito pelos princípios de bioética, pela
sensibilidade ética na elaboração de políticas e pelo crescimento da consciência popular –
tornou-se, hoje, uma precisão absoluta. Os avanços da biologia, da medicina, da genética
e a necessidade de oferecer orientação ética e legal para prevenir abusos e assegurar
que o progresso científico e tecnológico esteja a serviço da humanidade e não viole os
direitos humanos e as liberdades fundamentais levaram ao desenvolvimento da bioética.
Esta leva em consideração o direito de todos de usufruir da maior qualidade possível de
saúde física e mental, bem como o disposto no artigo 7º do Pacto Internacional dos
Direitos Civis e Políticos que destaca que ninguém poderá ser submetido à tortura, nem a
penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Na verdade, ninguém poderá
45 Baracho, José Alfredo de Oliveira. A identidade genética do ser humano. Bioconstituição: bioética e direito. Revista de Direito Constitucional e Internacional. São Paulo, v.8, nº 32, 2000, p.58.
51
ser submetido, sem o livre consentimento, a experiências médicas ou científicas. Alcançar
os níveis exatos de saúde física e mental constitui um importante direito humano que não
pode ser realizado com plenitude sem o progresso científico. 47
A Bioética pode ser considerada como a ética da vida. Pode-se dividir a Bioética
em dois grandes ramos: Macrobioética e Microbioética. A primeira é a ética que visa ao
bem da vida em sentido amplo, direcionada ao macrossitema da vida. Está diretamente
ligada ao Meio Ambiente e ao Direito Ambiental, no sentido de que a Bioética é um
modelo de conduta que pode ser capaz de trazer o bem ao Meio Ambiente. Em
decorrência da Macrobioética, deve-se ter um código de condutas a serem seguidas em
todo tipo de ação humana, principalmente nas experimentações científicas, que podem
trazer como consequência, uma alteração benéfica ou prejudicial ao Meio Ambiente. A
Microbioética surge de uma restrição do objeto da Bioética, ou seja, é a ética da vida
humana e, portanto, é um modelo de conduta que procura trazer o bem à Humanidade
como um todo, e ao mesmo tempo, a cada um dos indivíduos componentes da
Humanidade. 48
Perante os avanços médicos, científicos e tecnológicos, têm-se utilizado os termos
Bioética e Biodireito, visando-se à proteção da vida humana, principalmente com o intuito
de proteger todos os seres humanos que estejam direta, ou indiretamente, envolvidos
com eventuais efeitos de experimentos científicos.
À Bioética cabe o papel de levantar as questões, registrar as inquietações, alinhar
as possibilidades de acerto e de erro, de benefício e de malefício, decorrentes do
desempenho indiscriminado não-autorizado, não limitado e não regulamentado de
práticas biotecnologias e biomédicas que possam afetar, de qualquer forma, o cerne de
importância da vida humana sobre a terra, vale dizer, a dignidade da pessoa humana.
Mas o papel da Bioética certamente esgota-se neste perfil, sem decidir qual a
humanidade que a atual geração quer para si e para as futuras gerações. 49
46 Bernard, Jean. Da biologia à ética. Campinas: PSY, 1994, p.32. 47 Fabriz, Daury César. Bioética e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p. 87. 48 Pegoraro, Olinto (orgs.). Ética, ciência e saúde: desafios da bioética. Petrópolis: Vozes, 2001, p.54. 49 Sgreccia, Elio. Manual de Bioética: fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Loyola, 1996, p.32.
52
2.4 - Da Biotecnologia: ciência da engenharia genética
A biotecnologia está associada ao impulso humano voluptuoso em adquirir
conhecimento, decifrando os mistérios da natureza. O progresso da biotecnologia, e da
genética, em particular, provoca inquietação pública originada em concepções errôneas
sobre a natureza e os usos da tecnologia genética. Surgem, então, pedidos para a
limitação da pesquisa nessas áreas. Os eventuais perigos das novas pesquisas nesse
campo devem ser avaliados em face do pesado ônus do sofrimento presente. Alcançar os
níveis exatos de saúde física e mental constitui um importante direito humano que não
pode ser realizado com plenitude sem o progresso científico. Entretanto, a liberdade de
pesquisa não pode ser absoluta e, se necessário, deve ser restringida. Tal necessidade
surge quando a pesquisa viola o respeito pela dignidade humana, que é a base de todos
os direitos humanos, inclusive do direito à pesquisa científica. O fato de ser quase
impossível prever todos os resultados imagináveis da pesquisa (pois mesmo as mais bem
intencionadas podem ter efeitos colaterais adversos) justifica os apelos de vigilância. Isso
é especialmente verdadeiro no que concerne à aplicação de biotecnologias não testadas
e à introdução, no meio ambiente, de novos organismos geneticamente modificados.
Portanto, à luz da velocidade dos avanços biotecnológicos, a biovigilância - o respeito
pelos princípios de bioética, pela sensibilidade ética na elaboração de políticas e pelo
crescimento da consciência popular – tornou-se, hoje, uma precisão absoluta. 50
A biotecnologia é a ciência da engenharia genética que visa ao uso de sistemas e
organismos biológicos para aplicações medicinais, científicas, industriais, agrícolas e
ambientais. Por meio dela os organismos vivos passaram a ser modificados
geneticamente, possibilitando a criação de organismos transgênicos ou geneticamente
modificados. Com os estudos de Pasteur e Koch, cientistas precursores da microbiologia,
50 Vasconcelos, Cristiane Beuren. A proteção jurídica do ser humano in vitro na era da biotecnologia. São Paulo: Atlas, 2006, p.24.
53
a biotecnologia encontrou um fértil terreno para o seu desenvolvimento, isso ocorreu mais
especificamente no século XIX, com o advento da ciência genética. 51
A segunda metade do século XX marca o início de uma nova era para as ciências
da vida. A biologia, associada à química e à medicina, deu início à biologia molecular. A
genética investiu, com sucesso, esforços visando a conceber a vida humana em uma
proveta e, quando se pensava que se tinha alcançado o ápice no que diz respeito às
conquistas biomédicas, foram oficialmente anunciadas pela comunidade científica
procedimentos de clonagem e experimentos envolvendo células-tronco embrionárias
humanas. Tais revelações provaram a presença de infinitos horizontes a serem ainda
descortinados pela ciência, bem como a necessidade de se repensar e de redimensionar
conceitos e valores, de se refletir, uma vez mais, acerca da posição do ser humano, do
conhecimento científico, da ética e do direito no mundo contemporâneo.
A engenharia genética, ou tecnologia do DNA recombinante, é um conjunto de
técnicas que possibilita a identificação, o isolamento e a multiplicação de genes dos mais
variados organismos. É uma tecnologia utilizada em nível laboratorial, pela qual o cientista
poderá modificar o genoma de uma célula viva para a produção de produtos químicos ou
até mesmo de novos seres, ou seja, organismos geneticamente modificados (OGM) (Lei
11.105/2005, art. 3º, IV e V). A engenharia genética se apresenta, então, como uma
técnica que, associada ao procedimento da fertilização in vitro, torna possível a
manipulação de células-tronco germinais humanas, compreendendo a totalidade das
técnicas capazes de interferir, alterar ou modificar a carga hereditária da espécie humana,
a saber: o diagnóstico genético pré-implantacional, a terapia genética e a clonagem, entre
outras. 52
O diagnóstico genético pré-implantacional consiste na retirada de célula de um
embrião com 8 a 16 células, com a finalidade de executar exames capazes de
51 Rifkin, Jeremy. O século da biotecnologia: a valorização dos genes e a reconstrução do mundo. São
Paulo: Makron Books, 1999, p.25.
52 Diniz, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p.84.
54
diagnosticar patologias genéticas hereditárias. Trata-se, pois de uma biópsia da célula
embrionária, que só é permitida pelo Conselho Federal de Medicina quando há forte
suspeita de doença grave. O procedimento permite analisar o material genético e chegar
ao diagnóstico de doenças congênitas, entre elas a anemia falciforme, a hemofilia, a
talassemia, a anencefelia, dentre outras. A técnica descreve um procedimento screening
de embriões, o que gera questionamentos jurídicos e éticos. Isto porque embora o
diagnóstico genético pré-implantacional tenha como fim diagnosticar moléstias com
chances de comprometer o feto durante a gestação, ou após o nascimento, tem-se
verificado que tal prática vem sendo utilizada como um meio para a escolha de
determinados traços genéticos, como por exemplo, a escolha do sexo, a cor da pele, o
coeficiente intelectual.
A engenharia genética possui conhecimentos e técnicas que permitem manipular o
ser humano nos diferentes estágios de seu desenvolvimento. Essas técnicas são menos
comuns, mas devem restar analisadas posto que, do ponto de vista científico, são
perfeitamente possíveis de serem realizadas. São elas: a partenogênese, a fecundação
interespécie e a ectogênese. A partenogênese é a técnica que possibilita a duplicação de
um óvulo sem a participação de um espermatozóide, dando origem a um ser do sexo
feminino, geneticamente idêntico à doadora do óvulo. O risco premente que advém de tal
prática é a perpetuação da descendência feminina, levando ao perigo do próprio
extermínio da espécie humana, porque impede a diversidade genética. A fecundação
interespécie, por sua vez, resvala na possibilidade de criação de seres híbridos, com
parte do patrimônio genético humano e parte de genoma de animais, bem como na
produção de quimeras, fusão deliberada de embriões, um sadio e outro com enfermidade
genética. Tais práticas são inadmissíveis jurídica e eticamente por implicarem a
manipulação de células germinais, zigoto e embrião humano, constituindo afronta à
intangibilidade do patrimônio genético humano e ato contrário à dignidade da pessoa
humana. Essa inadmissibilidade está diretamente relacionada ao fato de que a mutação
constante e natural do DNA impede que se garanta o comportamento do gene
incorporado. Tal incerteza representa grave ameaça às futuras gerações. A técnica da
ectogênese consiste na gestação integral de um embrião humano fora do útero materno,
que poderá ser artificial ou animal, prática que se espera ser alcançada em um futuro
55
próximo em decorrência dos estudos e experimentos realizados em laboratórios de
engenharia genética. 53
A engenharia genética está intimamente relacionada a, no mínimo, dois temas
ambientais essenciais: Biodiversidade e liberação de organismos geneticamente
modificados no ambiente. A biotecnologia está sendo vista como a principal ferramenta na
limpeza do meio ambiente. Os avanços gigantescos e acelerados na biotecnologia e na
engenharia genética, algumas vezes classificados causam enorme impacto sobre os
direitos humanos. O progresso da tecnologia biomédica em diversas esferas vincula-se,
em particular, ao transplante de órgão e tecidos, adultos e fetais, e à tecnologia da
reprodução. Nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, costuma haver a
crença de que, diante da expansão da ciência, não se pode escolher a natureza da
tecnologia que se vai adquirir ou desenvolver. Contudo, há sempre uma margem de
escolha possível para que o país decida quais tecnologias irá adquirir ou desenvolver. A
tecnologia permite um controle mais substantivo sobre o meio ambiente, o corpo e a
mente humana. Como todas as outras dimensões do poder, devem estar sujeita à lei. O
surgimento de novas tecnologias torna ultrapassadas soluções conhecidas. Esses
problemas crescerão neste século, dominado pela tecnologia da informação. O
desenvolvimento da tecnologia corre em paralelo com o crescimento dos impérios
empresariais dela detentores. A tecnologia sofisticada é cara, sua geração e seu controle
requerem altos investimentos, as grandes corporações empresariais costumam ter sua
propriedade. Essas corporações dão à tecnologia uma potência adicional: a combinação
das forças econômica e tecnológica. Juntas, estas representam uma falange de poder
que está bem acima da capacidade de resistência do indivíduo.
De tempos em tempos, surgem propostas com esse fim, a exemplo dos comitês de
direitos humanos, das agências de vigilância pública para monitorar novas tecnologias,
das comissões de avaliação de impacto tecnológico e dos comitês interdisciplinares.
Todos eles devem ser examinados de acordo com sua utilidade. Deve-se criar a
consciência de que a confiança tradicional nos mecanismos jurídicos para proteger as
pessoas contra a tecnologia que viola os seus direitos revela-se cada vez mais
53 Romeo Casabona, Biotecnologia: direito e bioética. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p.24.
56
inadequada. Como as estruturas e os procedimentos jurídicos tradicionais não estão
aparelhados para avaliar o material científico ou o seu impacto na comunidade, os
Tribunais não podem ser guardiães dos direitos humanos nessa seara.
No final dos anos 60, a ONU (Organização das Nações Unidas) despertou para os
perigos que os recentes avanços da tecnologia representam para os direitos humanos. A
Conferência Internacional de Direitos Humanos, realizada na cidade de Teerã em 1968,
foi a primeira a abordar esse tópico. Nos termos da Proclamação de Teerã, embora as
últimas descobertas científicas e os avanços tecnológicos tenham aberto amplas
perspectivas para o progresso econômico, social e cultural, essa evolução poderá,
paradoxalmente, comprometer os direitos e as liberdades dos indivíduos e demandará
cuidado permanente. A Conferência recomendou aos órgãos do sistema das Nações
Unidas que desenvolvessem estudos sobre a proteção da personalidade humana e da
integridade física e intelectual do ser humano, em vista do progresso da biologia, da
medicina e da bioquímica; equilíbrio a ser estabelecido entre o progresso científico e
tecnológico e o avanço intelectual, espiritual, cultural e moral da humanidade. 54
No dia 10 de novembro de 1975, por meio da Declaração sobre o uso do progresso
científico e tecnológico no interesse da paz e em benefício da humanidade, a Assembléia
Geral conclamou todos os Estados a impedir o uso dos avanços científicos e tecnológicos
na limitação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais ou em sua ingerência.
De acordo com o documento, embora o desenvolvimento científico e tecnológico ofereça
oportunidades de melhorar as condições de vida dos povos e das nações, ele pode gerar
problemas sociais e pôr em perigo os direitos humanos e as liberdades fundamentais da
pessoa. Configuram responsabilidades de o Estado estender os benefícios da ciência e
da tecnologia a todas as camadas da população e protegê-las das possíveis
conseqüências negativas do uso indevido dos avanços científicos e tecnológicos.
Cabe registrar que a Comissão de Direitos Humanos da ONU iniciou estudos
contínuos nessa área bastante negligenciada de possível violação dos direitos humanos.
Por meio da Resolução nº 1.986/9, de 10 de março de 1986, a Comissão pediu que a
54 Alves, José Augusto Lindgren. Os direitos humanos como tema global. São Paulo: Perspectiva, 2003 (Estudos; 144), p.58.
57
Universidade das Nações Unidas (UNU) estudasse os impactos positivos e negativos do
desenvolvimento científico e tecnológico sobre a promoção e proteção dos direitos
humanos e as liberdades fundamentais.
O preâmbulo da Declaração dos Direitos Humanos começa com uma referência à
dignidade inerente a todos os membros da família humana e estipula, mais
especificamente, que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e
direitos (artigo 1º); que ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo
cruel, desumano ou degradante (artigo 5º); e que todo ser humano tem o direito de ser
reconhecido, em qualquer lugar, como pessoa perante a lei (artigo 6º). O artigo 29 (1)
reconhece a importância do desenvolvimento livre e pleno da personalidade humana.
De um lado, tem-se que a pesquisa sobre o patrimônio genético deve sempre
prosseguir. Do outro, nota-se que a ampliação do conhecimento abre novas
possibilidades para o uso antiético ou controverso da tecnologia. Uma gama de avanços
biotecnológicos com atos alarmantes vem logo à mente como experiências com seres
humanos e com fetos, venda e aluguel de órgãos, uso de drogas não testadas,
engenharia genética, reprodução seletiva e escolha prévia do sexo da criança. Os bancos
de sêmen e de óvulos, a fertilização in vitro, o transplante e os embriões suscitam
problemas relevantes no campo da ética e dos direitos humanos.
Há cerca de vinte anos, defendia-se a visão de que os médicos respondiam por
uma área especializada e eram as pessoas mais indicadas para avaliar o uso ético do
conhecimento de sua especialidade. Atualmente essa atitude tem mudado
consideravelmente. É bem-vinda a discussão de questões éticas na medicina por pessoas
alheias a áreas, tais como advogados, eticistas e teólogos. Os grandes hospitais criam
comissões interdisciplinares com esses profissionais para que trabalhem lado a lado com
os médicos, para auxiliá-los nas decisões difíceis. As Universidades instituem comitês
éticos com o propósito de controlar áreas como a experimentação médica e a pesquisa
psicológica. Faz-se necessária a vigilância constante para garantir que os novos avanços
da tecnologia médica sejam mantidos dentro de diretrizes éticas.
Empresas do setor de biotecnologia desenvolvem suas atividades a partir da
utilização de células-tronco embrionárias como matéria-prima de pesquisas biomédicas.
58
Informam que, no estágio em que ocorre a extração das células, não há que se falar em
embrião, e sim em um amontoado disforme de células, portanto, não há que se falar em
vida humana. Tal comportamento colide com os argumentos dos que condenam as
pesquisa, pois segundo os quais há embasamentos jurídicos e éticos de que a utilização
de embriões excedentários ou mesmo a produção de embriões, por meio da clonagem
para derivação de células-tronco, acarreta a destruição desses e viola o direito
fundamental à vida. 55
A forte presença do setor privado em áreas que deveriam ser, essencialmente,
subvencionadas pelo setor público, entre elas a saúde, tem sido um traço característico
das sociedades capitalistas. Assim, a falta de investimento de recursos públicos nesse
âmbito acaba conduzindo a uma gradual privatização desses serviços. Muitos governos,
como os dos Estados Unidos e da Alemanha, por não quererem se envolver nas
polêmicas questões que essas pesquisas motivam, optaram por não financiá-las com
fundos públicos. Temerosos por terminarem sendo condenados ao subdesenvolvimento
tecnológico e científico, necessitando, no futuro, importar essa tecnologia patenteada de
países como China, Índia, Japão e Israel, que não assumem a mesma posição, acabam
permitindo que empresas do setor privado realizem esses experimentos.
O ser humano é considerado espécie integrante da Biodiversidade de forma mais
genérica, pois pertence ao mundo dos seres vivos que não são compostos só de DNA
(material genético - ácido desoxirribonucléico). O fundamental na composição dos seres
vivos são as proteínas. Deve-se considerar não só os possíveis acidentes, mas a
manipulação espúria, com objetivos militares, eugênicos ou de dominação sociológica,
principalmente econômica. Nunca a humanidade contou com uma força tão extrema,
ambivalente e concentrada nas mãos de poucos. Todo o esforço deve ser feito para coibir
abusos que possam ser perpetrados atualmente e principalmente no futuro.
55 Ferraz, Sérgio. Manipulações biológicas e princípios constitucionais: uma introdução. Porto Alegre: Fabris, 1991, p.86.
59
A manipulação genética tem sido utilizada para a produção de proteínas de alto
valor econômico. Muitas, dentre elas a insulina, o hormônio de crescimento são
atualmente produzidas por células em cultura. Argumenta-se que a Engenharia Genética
faria crescer a produção de grãos e, com isso, seria eliminada a fome no mundo. A
Genética mudou radicalmente nos últimos 30 anos. Novas técnicas foram desenvolvidas,
aplicando-se, sobretudo aos microorganismos. A Engenharia Genética tornou-se uma
empresa bilionária. Pesquisa-se o uso de Organismos Geneticamente Modificados em
muitas áreas diferentes, como agricultura, produtos farmacêuticos, especialmente
produtos químicos e despoluição ambiental.
A Lei 11.105/2005, denominada Lei de Biossegurança, objetiva estabelecer normas
de proteção e segurança, bem como mecanismos de fiscalização no uso de técnicas de
Engenharia Genética. Ao se referir às normas de segurança, tacitamente a disposição
legal contempla a existência de possibilidade de riscos que necessitam ser geridos,
decorrentes das atividades relacionadas à Engenharia Genética. Dessas atividades
relativas aos Organismos Geneticamente Modificados, oito são abrangidas, sendo elas a
construção, o cultivo, a manipulação, o transporte, a comercialização, o consumo, a
liberação e o descarte.
60
CAPÍTULO III – ASPECTOS RELEVANTES DA
RESPONSABILIDADE
As entidades públicas ou privadas que atuam no ramo de pesquisa e manipulação
genética devem cultuar e aplicar a Responsabilidade Social que se encontra
fundamentada na necessidade de preservação dos valores atinentes às condutas dos
seres humanos, visando à alteração, para melhor, de suas condições materiais e
espirituais de vida, abstendo-se de praticar condutas eventualmente lesivas ao ser
humano ou ao Meio Ambiente, sob pena de serem civil e solidariamente
responsabilizadas. 56
A Lei de Biossegurança adota, nesse sentido, em termos de Responsabilidade
Civil, a Teoria do Risco, que se assenta na relação de causa e efeito entre a conduta
lesiva e o dano exigindo, para a garantia do ressarcimento, a constatação da ocorrência
do evento danoso e do prejuízo dele emanado, sem aferição de culpa. Introduziu-se,
assim, no ordenamento jurídico pátrio, o Instituto da Responsabilidade Objetiva para
aquele que, por meio de sua atividade, cria um risco de dano para terceiro.
A Responsabilidade Objetiva, em relação aos danos eventualmente advindos das
atividades exercidas nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente
Modificados, está prevista na Lei 11.105/2005, que prescreve que os responsáveis pelos
danos ao Meio Ambiente e a terceiros responderão, solidariamente, por sua indenização
ou reparação integral, independentemente da existência de culpa. A existência de
previsões legais e instrumentos de natureza processual hábeis à instrumentalização e
efetivação da proteção do Patrimônio Genético e do Meio Ambiente, são imprescindíveis.
A Lei 11.105/2005 estabeleceu critérios destinados a observar a responsabilidade
civil, administrativa e criminal em decorrência de eventuais condutas ou mesmo atividades
consideradas lesivas ao patrimônio genético da pessoa humana. Ao regulamentar os
incisos II, IV e V do §1º do art. 225 da Constituição Federal, a Lei de Biossegurança
56 Vianna, José Ricardo Alvarez. Responsabilidade Civil por Danos ao Meio Ambiente. Curitiba: Juruá, 2004.
61
entendeu por bem estabelecer normas de segurança e mecanismos de fiscalização de
atividades vinculadas aos denominados organismos geneticamente modificados e seus
derivados, dispondo sobre a denominada Política Nacional de Biossegurança – PNB.
A atuação nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados
deve estar norteada pela observância estrita aos aspectos concernentes à
Responsabilidade Social e à aplicação do Princípio da Precaução, valendo observar que,
se resultarem danos efetivos, decorrentes de tal forma de agir, o autor responderá
civilmente, diante da Teoria do Risco, de forma objetiva e solidária, conforme estabelecido
pela Lei 11.105/2005. A autorização para a realização de pesquisas ou para a atuação
nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados, assim, é regida
hodiernamente pela Lei de Biossegurança, que é norma especial e deverá ser aplicada às
situações específicas, utilizando-se o Código Civil, de forma subsidiária ou supletiva, nas
situações por ela não abrangidas. A Lei 11.105/2005 necessita, portanto, de um comando
constitucional que se encontra esculpido no art. 225, de onde se presume que caberá à
coletividade agir na condição de guardiã do Meio Ambiente, devendo ser observado que o
ordenamento jurídico pátrio prevê diversas formas de tutelas para a defesa do Patrimônio
Ambiental e Genético. Lima Neto, Francisco Vieira Lima. Responsabilidade Civil das
Empresas de Engenharia Genética. Em busca de um paradigma bioético para o Direito
Civil. São Paulo: Direito, 1977. 57
O comportamento finalístico da função ambiental é propiciar uma sadia qualidade
de vida. Dá-se ênfase à questão relativa à sobrevivência e para garantir uma existência
hígida, em decorrência da preservação do equilíbrio ecológico, priorizando-se a vida em
sua plenitude, com desdobramentos nas áreas da saúde, liberdade, segurança, igualdade
de indivíduos, proteção da Biodiversidade e do Patrimônio Genético. Torna-se necessária,
assim, a apresentação dos aspectos relacionados às Responsabilidades Social e Civil,
decorrentes dos processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados,
57 Lima Neto, Francisco Vieira Lima. Responsabilidade Civil das Empresas de Engenharia Genética. Em busca de um paradigma bioético para o Direito Civil. São Paulo: Direito, 1977, p.57.
62
sendo imperiosa a menção ao que prescreve a Lei de Biossegurança no art. 1º, §§ 1º e
2º. 58
O texto legal destaca a existência de entidades responsáveis por atividades de
Pesquisa e de Uso Comercial. O destaque dado ao uso comercial defluiu da possibilidade
da comercialização de produtos derivados de plantas geneticamente modificadas, como é
o caso da soja transgênica, valendo observar que, nos demais dispositivos da Lei de
Biossegurança, são utilizadas expressões como: Instituições, Empresas e Laboratórios,
dentre outras, tornando-se mister, para melhor compreensão e objetividade, a adoção do
vocábulo entidade para a designação dos responsáveis pelo processo de obtenção de
Organismos Geneticamente Modificados, quer sejam públicos ou privados. Torna-se
necessária a limitação da matéria a ser tratada às questões relativas à responsabilização
pelos aspectos social e civil das entidades públicas ou privadas com atuação nos
processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados.
A Responsabilidade Social fundamenta-se na observância a princípios éticos e se
expressa em valores adotados em determinada organização. Consiste na forma de
condução dos negócios a serem realizados, quanto aos seus aspectos internos, como
acionistas, funcionários, prestadores de serviços, fornecedores e consumidores, dentre
outros, sem deixar de atuar como parceira e co-responsável no que tange ao
desenvolvimento social, porque ela é inesgotável na medida em que se trata de processo
educativo e evolutivo, tornando-se imprescindível a observância de uma linha de
coerência entre a ação e o discurso. A noção de Responsabilidade Social surge a partir
da idéia de que, dentro da era dos direitos do homem, a maximização dos lucros não
pode ser o único propulsor do sistema de produção. A sociedade, então, começa a
manifestar sinais de desprendimento das idéias capitalistas extremas, passando a
visualizar novas formas de vivência. A Responsabilidade Social, portanto, surge a partir
da consciência do próprio ser humano, que passa a se conhecer e se entender dentro de
um sistema maior e complexo, do qual ele é apenas mais um elemento. Tal
58 Mukai, Toshio. Direito Ambiental Sistematizado, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1992, p.81.
63
Responsabilidade, assim, apesar de instituída no ordenamento pátrio pelo art. 225 da
Constituição Federal, não pode se efetivar por meio de coação, mas imperativamente
deve estar atrelada ao íntimo do ser humano, impulsionando de forma natural condutas
preventivas, e não porque as respectivas omissões trariam consequências, como o que
ocorre na Responsabilidade Civil. O ponto-chave da idéia de Responsabilidade Social é
que ela deve estar atrelada a um complexo processo de conscientização no presente
caso, ambiental, possibilitando que cada indivíduo entenda a sua participação dentro da
sociedade e a forma como necessita agir para garantir a existência humana. 59
A construção de uma racionalidade ambiental implica a formação de um novo
saber e a integração interdisciplinar do conhecimento para explicar o comportamento de
sistemas sócioambientais complexos. O saber ambiental problematiza o conhecimento
fragmentado em disciplinas e administração setorial do desenvolvimento, para constituir
um campo de conhecimentos teóricos e práticos orientado para a rearticulação das
relações sociedade-natureza. O saber ambiental excede as ciências naturais, constituídas
como um conjunto de especializações surgidas da incorporação dos enfoques ecológicos
às disciplinas tradicionais, antropologia ecológica; ecologia urbana; saúde, psicologia,
economia e engenharia ambientais. Estende–se além do campo de articulação das
ciências, para abrir-se ao terreno dos valores éticos, dos conhecimentos práticos e dos
saberes tradicionais. A Responsabilidade Social fragmentada em cada um dos
componentes sociais deve impulsionar-se por fatores íntimos da consciência humana,
pois, de outra forma, não será possível atingir seus objetivos.
A idéia de risco surge a partir da conscientização das potencialidades de um
perigo. Dessa forma, tem-se inicialmente um perigo que, após a ciência de sua existência,
bem como do grau de sua periculosidade, é elevado à categoria de riscos. O convívio
social é marcado pela existência de riscos que podem, em alguns casos, ser gerenciados,
conhecendo-se seus componentes geradores, bem como se tendo em conta sua
probabilidade de ocorrência. Em relação aos processos de obtenção de Organismos
Geneticamente Modificados, torna-se evidente a possibilidade de existência de riscos,
59 Lima Neto, Francisco Vieira Lima. Responsabilidade Civil das Empresas de Engenharia Genética. Em busca de um paradigma bioético para o Direito Civil. São Paulo: Direito, 1977.
64
principalmente porque não são perfeitamente conhecidas as consequências de utilização
desses organismos, não havendo qualquer certeza sobre a influência e resultados destes
processos na vida e desenvolvimento das gerações futuras.
A questão que se levanta se refere à Responsabilidade Social de entidades
públicas ou privadas que se proponham a atuar nos processos de obtenção de
Organismos Geneticamente Modificados em seu aspecto intergeracional. A Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança é o órgão responsável pela análise dos produtos que
envolvam Organismos Geneticamente Modificados, sendo responsável pela fiscalização
de tais produtos.
Deve-se destacar fator componente da Responsabilidade Social de empresas,
voltado à necessidade de observância do Princípio da Precaução e consequente prática
de atitudes que certamente não tenham o condão de gerar quaisquer riscos à
humanidade e ao Meio Ambiente. Não basta a inclusão de determinada empresa em
planos de incentivo à preservação ambiental, se suas atitudes não corresponderem aos
padrões éticos da Responsabilidade Social. A empresa deve primar pelo melhor produto e
não pelo maior lucro. O melhor produto significa, por óbvio, a inexistência de riscos. É a
política do economicamente correto.
A política que se denominou o economicamente correto começou na década de
1950 nos Estados Unidos, sob a instigação de instituições religiosas. Seu campo de
incidência restringia-se às disciplinas financeiras e limitava-se basicamente à recusa de
qualquer tipo de negócio com indústrias controversas como as de armamento, tabaco,
bebidas e material nuclear. O movimento visa a conciliar a ética com o lucro. Suas
exigências cívicas e morais, despojadas de qualquer conotação caritativa, tornaram-se
muito mais abrangente. Investidores variados, indivíduos, fundos mútuos ou fundo de
pensão só realizam aplicações financeiras em empresas que respeitam o meio ambiente.
As condições humanas e sociais de seus empregados pagam salários justos, propiciam
um local de trabalho saudável e asseguram formação profissional permanente. 60
60 Aguiar Dias. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1979, v.2.
65
Deve ser desenvolvida a Responsabilidade Social, atentando-se sempre às
consequências dos atos a serem praticados, tendo-se em mira o bem-estar das futuras
gerações. Os aspectos técnicos precisam ser analisados visando salvaguardar o bem-
estar futuro da humanidade. No entanto, é preciso ter a noção clara de que a situação é
outra, uma vez que o que se discute é a produção de alimentos neste milênio, por meio
do controle do fornecimento de sementes. O mesmo poderá ser esperado com relação à
saúde animal ou humana, quando se observar que os investimentos das empresas
ultrapassaram aqueles feitos pelo sistema público de apoio à ciência e à tecnologia nos
países de vanguarda tecnológica.
Conhecimento é poder e a tecnologia pode ser dominação se a sociedade não
souber estabelecer os limites. Considera-se importante a Responsabilidade Social,
especialmente no que tange à necessidade de se alertar para os impactos, riscos e
benefícios de uma técnica poderosa, que pode modificar a vida do ser humano sobre a
terra, assim como de discutir as implicações éticas de uma ciência e de uma técnica cada
dia mais voltada à dominação econômica dos povos.
Os Organismos Geneticamente Modificados são desenvolvidos, em sua maioria,
por grandes laboratórios, interessados em fornecer aos seus clientes insumos que
melhorem a produção no campo e, consequentemente, a vida das pessoas ali residentes.
Ao mesmo tempo, essas empresas procuram conquistar a fidelidade dos produtores
rurais, fazendo-os adquirir sempre os insumos oferecidos por elas. A criação das espécies
geneticamente modificadas também ocorreu segundo esses objetivos, haja vista que a
soja transgênica, por exemplo, foi criada de modo a gerar somente frutos estéreis, que
não podem ser replantados, pois não brotarão. O produtor rural, caso deseje iniciar o
plantio de nova safra, precisará adquirir novamente as matrizes da empresa fornecedora
das sementes. Tal situação leva ao surgimento de uma dependência preocupante e
perigosa, pois a mesma empresa fornecedora das sementes modificadas é também a
mesma que investiu na pesquisa e desenvolvimento delas, detendo, portanto, as patentes
do produto. A possibilidade de surgimento de um monopólio, ou mesmo de um oligopólio,
66
no setor de fornecimento de insumos agrícolas torna-se real, o que pode provocar sérios
prejuízos à economia rural, desestruturando as propriedades familiares. 61
A capacidade de mapeamento das informações hereditárias encontradas nos
genes humanos, desenvolvida por cientistas, inaugura uma nova era de conhecimentos.
O Patrimônio Genético Humano (Genoma) compreende um direito de personalidade, pois
representa a identidade do ser humano. Assim, é parte integrante de cada um dos seres
humanos. Sua proteção é garantida pela Declaração Universal sobre o Genoma Humano
e Direitos Humanos da Unesco, restando impossibilitada a manipulação de informações
existentes nos códigos genéticos. Nesse sentido, o art. 7º estipula que se deverá
proteger, nas condições determinadas pela lei, a confiabilidade dos dados genéticos
associados com uma pessoa identificável. No mesmo sentido, a Declaração de Bilbao
afirma que a intimidade pessoal é patrimônio exclusivo de cada pessoa e deve ser imune
a qualquer intromissão. Esta proteção também consta da legislação pátria. A Constituição
Federal, em seu art. 225, § 1º, estabelece que para assegurar a efetividade desse direito,
incumbe ao Poder Público: II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio
genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de
material genético.
A última e não distante fronteira referente à Responsabilidade Social a ser
observada nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados refere-
se à utilização das referidas práticas em seres humanos. Não se pode aceitar que a
impulsão dos lucros permita que se ultrapassem os limites da integridade humana,
transformando-se por completo a sociedade na forma conhecida. Consequências sociais
dessa formas de manipulação, por exemplo, o surgimento de grupos sociais
diferenciados, a diferenciação econômica entre indivíduos conforme suas características,
ou ainda, a justificativa para o extermínio de determinada categoria humana, são
inaceitáveis. Faz-se necessário chamar a atenção para o desenvolvimento de uma cultura
de Responsabilidade Social a ser imputada e aplicada aos articuladores da Biotecnologia.
Estes, baseados em seus princípios morais, deverão rejeitar qualquer atuação que possa
vir a ser lesiva à humanidade e ao Meio Ambiente.
61 Milaré, Edis. Direito do Ambiente: Doutrina, prática, jurisprudência e glossário. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 48.
67
Embora avanços de ordem tecnológica tragam cada dia mais conforto às atividades
desenvolvidas e facilitem a aquisição de conhecimento por meios cuja rapidez é
espantosa, a submissão do ser humano aos próprios interesses sempre foi alvo de
constante preocupação. Torna seus integrantes voltados aos interesses coletivos, não
existindo espaço para o isolamento do indivíduo e tornando-se inadmissível a violação às
normas de comportamento. 62
A Responsabilidade Social das entidades públicas ou privadas, encarregadas do
processo de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados, deve ser vislumbrada
sob o prisma da forma de condução das experiências, de tal maneira que elas sejam
compreendidas como co-responsáveis pelo desenvolvimento social. Entidade socialmente
responsável, portanto, é a que possui capacidade de ouvir todos os interessados nos
resultados das pesquisas decorrentes da manipulação genética, incorporando-se suas
pretensões ao planejamento das atividades a serem desenvolvidas. Torna-se necessária
a conscientização e consequente instituição, por parte das entidades mencionadas, de
políticas de Responsabilidade Social, se os programas respectivos forem realizados de
forma autêntica, uma vez que o pragmatismo demonstra que somente assim poderão ser
alcançados resultados eficazes. A cultura da Responsabilidade Social deve ser
incorporada ao pensamento de todos os envolvidos na manipulação dos organismos a
serem geneticamente modificados, cumprindo a eles desenvolver programas sociais
voltados não apenas às suas respectivas divulgações ou como forma compensatória.
Uma cultura de Responsabilidade Social implicará compensações indiretas, como a
valorização da imagem institucional e da marca, maior confiança e lealdade do
consumidor, maior capacidade de recrutar e manter talentos, flexibilidade, capacidade de
adaptação e longevidade. 63
A Responsabilidade Social das entidades públicas ou privadas com atuação nos
processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados está fundamentada
na preservação dos valores em que se encontram assentada as condutas dos
62 Alves, José Augusto Lindgren. Os direitos humanos como tema global. São Paulo: Perspectiva, 2003 (Estudos; 144). 63 Milaré, Edis. Direito do Ambiente: Doutrina, prática, jurisprudência e glossário. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p.58.
68
componentes do corpo social, visando-se à alteração, para melhor, das condições
materiais e espirituais de vida das pessoas, característica preponderante do Estado Social
de Direito, tornando-se imprescindível a proteção do Meio Ambiente e do Patrimônio
Genético.
O Estado Democrático de Direito, por sua vez, tem como parte de seus
fundamentos, a teor do que prescrevem os incisos III e IV do art. 1º da Constituição
Federal de 1988, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da
livre iniciativa, constituindo objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, a
promoção do bem de todos (CF, art. 3º, I). Caracterizam-se como direitos inalienáveis, a
igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza; a garantia aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País à inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (CF, art. 5º), encontrando-se dentre
os direitos sociais, os concernentes à saúde (CF, art. 6º).
O fundamento maior da Responsabilidade Social das entidades públicas e privadas
envolvidas no processo de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados está
centrado no Princípio da Precaução. Este sugere cuidados antecipados e cautela para
que uma atividade ou ação não venha a resultar em efeitos indesejáveis que, se
ocorrerem, deverão ser resolvidos no âmbito da Responsabilidade Civil, com a aplicação
da Teoria da Responsabilidade Objetiva.
A Responsabilidade Civil decorre da imposição ao infrator da obrigação de
ressarcir o prejuízo causado por sua conduta ou atividade. Das relações entre os
integrantes da sociedade, surge o problema da responsabilidade, que exprime a idéia de
garantia de reparação diante de ato lesivo a direito de outrem. Responsabilidade Civil, por
sua vez, traz à tona a idéia de aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano
moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa
por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade
subjetiva), ou ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva). Tem por
fundamento a Teoria do Risco: dano, autoria do evento danoso e relação de causa e
efeito entre ambos, exigindo-se, para a garantia do ressarcimento, a constatação da
ocorrência do evento danoso e do prejuízo dele emanado, sem aferição de culpa.
69
O instituto da Responsabilidade Objetiva foi introduzido no ordenamento jurídico
brasileiro nos primórdios do século XX, por intermédio da influência de legislações de
países europeus e dos Estados Unidos. Foi no Código de Proteção e Defesa do
Consumidor que a Responsabilidade Objetiva ganhou destaque, sendo eleita como regra
para dirimir os litígios decorrentes das relações de consumo. É plenamente justa e
totalmente adequada às necessidades sociais e ambientais a adoção da responsabilidade
objetiva na Biotecnologia e/ou na manipulação genética. Lamentavelmente, ainda não se
terminou de construir o edifício da responsabilidade civil ambiental, pois não se exigiu
como condição para o exercício dessa atividade a constituição prévia de seguro.
O Código Civil de 2002, ao prever as hipóteses de Responsabilidade Civil por atos
ilícitos, consagrou a Teoria Objetiva em vários momentos, substituindo a conotação de
culpa pela idéia de risco-proveito ou de risco-criado. A Responsabilidade Objetiva
encontra-se fundada, assim, no risco, não havendo que se perquirir a existência de culpa,
porque aquele que, por meio de sua atividade, cria um risco de dano para terceiro, deve
ser obrigado a repará-lo, ainda que não tenha agido com negligência, imprudência, ou
imperícia, que são elementos caracterizadores da culpa subjetiva.
Outro aspecto importante a ser salientado é o da solidariedade passiva pelos
danos ambientais. Como o Patrimônio Genético é encampado pelo Meio Ambiente de
forma maior, também devem ser aplicados aqui os mesmos direcionamentos aplicados ao
Dano Ambiental, de forma geral. A Lei 6.938/81, em seu art. 3º, prevê que a pessoa física
ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradação ambiental, será considerada como poluidora ou
degradadora ambiental. A redação do dispositivo legal permite interpretação ampla e
inclui aqueles que diretamente causam o dano ambiental, bem como os que indiretamente
para ele contribuem, facilitando ou viabilizando a ocorrência do prejuízo. Assim, aquele
que, por razões múltiplas, se encontrar envolvido com a conduta agressiva ensejadora de
dano ambiental, será obrigado, por força da regra da solidariedade, a responder pela
indenização, ou seja, pela reparação do dano. Além de ser aplicada a Teoria do Risco ao
dano ambiental e aos danos decorrentes da atuação no processo de obtenção de
Organismos Geneticamente Modificados, há que se atribuir, também, Responsabilidade
70
Solidária às entidades públicas ou privadas e aos órgãos do Poder Público que alicerçam
a liberação das atividades de processamento daqueles organismos. 64
Por influência do Direito Francês, o Código Civil de 1916 calcou o instituto da
Responsabilidade Civil na idéia de culpa, consoante se depreende da análise do art. 159,
de onde se presume que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. As
hipóteses de responsabilidade objetiva, por sua vez, ficaram relegadas a isolados pontos
da lei codificada. Com os avanços tecnológicos, favorecidos sobremaneira pelo esforço
bélico, característico do século XX, desenvolveu-se a denominada teoria do risco, que
serviu de base à responsabilidade objetiva e cujos reflexos foram sentidos por grande
parte das leis especiais reguladoras da atividade econômica. Os proveitos e vantagens do
mundo tecnológico são postos num dos pratos da balança. No outro, a necessidade de o
vitimado em benefício de todos poder responsabilizar alguém, em que pese o coletivo da
culpa. O desafio é como equilibrá-los. Nessas circunstâncias, fala-se em responsabilidade
objetiva e elabora-se a teoria do risco, dando-se ênfase à mera relação de causalidade,
abstraindo-se, inclusive, tanto da ilicitude do ato quanto da existência de culpa.
Sob a influência dessas idéias, inúmeras leis especiais consagram a nova teoria,
sem se olvidarem da responsabilidade objetiva do Estado, prevista no § 6º do art. 37 da
Constituição Federal, admitindo a responsabilização do agente causador do dano,
independentemente da prova de dolo ou culpa. Assim, a Lei 6.938/81 no seu artigo 14, §
1º ressalta que sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o
poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os
danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério
Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade
civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
O Código Civil de 2002 consagrou expressamente a teoria do risco e, ao lado da
responsabilidade subjetiva, calcada na culpa, admitiu também a responsabilidade
objetiva. O caput do art. 927 prevê que aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar
64 Fiorillo, Celso Antônio Pacheco; Diaféria, Adriana. Biodiversidade e Patrimônio Genético. São Paulo: Max Limonad, 1977, p.56.
71
dano a outrem, é obrigado a repará-lo. Ao lado da responsabilidade decorrente do ilícito
civil ou do abuso de direito, em cujas noções se encontram inserida a idéia de culpa,
estampada nos arts. 186 e 187 do Código Civil de 2002 o magistrado poderá reconhecer
a existência da responsabilidade objetiva em duas situações previstas no parágrafo único
do art. 927. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do
dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. A primeira parte do
dispositivo em questão mantém naquilo que for compatível toda a legislação especial que
já reconhecia a responsabilidade sem culpa, e a segunda, independentemente da
ausência de definição integral, prevê, por sua vez, a responsabilidade objetiva dos
agentes empreendedores de atividades de risco. O exercício de atividades de risco
pressupõe, por óbvio, a busca de determinado proveito, em geral de natureza econômica,
que surge como decorrência da própria atividade potencialmente danosa, autorizando
falar-se em risco-proveito. Destaca-se que a teoria do risco não se justifica desde que não
haja proveito para o agente causador do dano, porquanto, se o proveito é a razão de ser
justificativa de arcar o agente com os riscos, na sua ausência, deixa de ter fundamento a
teoria. 65
Independentemente da Responsabilidade Civil ou dos riscos oriundos da prática de
atividades durante os processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados,
a responsabilidade do pesquisador é dupla, dizendo respeito à redução da probabilidade
do risco e ao consequente aumento dos benefícios esperados. O risco, mesmo reduzido,
estará presente e sempre surgirão outros resultantes da interferência nos processos
naturais, bem como que a defesa dos trabalhos de pesquisa contra interferências e
restrições não relacionadas às atividades respectivas deve ser priorizada.
A atividade das entidades públicas ou privadas, com atuação nos processos de
obtenção de Organismos Geneticamente Modificados, que resulte em danos ao ser
humano ou ao Meio Ambiente, permeia a esfera da Responsabilidade Objetiva. A
possibilidade de aplicação da Responsabilidade Objetiva em razão dos danos
65 Lima, Alvino. Culpa e Risco. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.49.
72
eventualmente advindos das atividades exercidas nos processos de obtenção de
Organismos Geneticamente Modificados em território nacional teve origem na Lei
8.974/95, que prescreve que os responsáveis pelos danos ao Meio Ambiente e a terceiros
responderão, solidariamente, por sua indenização ou reparação integral,
independentemente da existência de culpa. Tal possibilidade poderá ser estendida, ainda,
às atividades que visem à construção, ao cultivo, à produção, à manipulação, ao
transporte, à transferência, à importação, à exportação, ao armazenamento, à pesquisa, à
comercialização e ao consumo, além de abranger as questões relativas à liberação no
Meio Ambiente e ao descarte de Organismos Geneticamente Modificados e seus
derivados.
A Responsabilidade Civil, decorrente de danos causados ao ser humano e ao Meio
Ambiente quando da manipulação dos organismos a serem geneticamente modificados,
deverá estar pautada, principalmente, no Princípio da Precaução, diante do texto
expresso da Lei 11.105/2005. Prescreve ela, em seu art. 1º, ser sua finalidade
estabelecer normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a pesquisa
genética de organismos, tendo por fim a proteção à vida e à saúde humana, animal e
vegetal, bem como a proteção ao Meio Ambiente, atribuindo à CTNBio a incumbência de
apoiar tecnicamente os órgãos competentes no processo de prevenção e investigação de
acidentes e de enfermidades, verificados no curso dos projetos e das atividades com
técnicas de ADN/ARN recombinante (Lei 11.105/2005, art. 14, XVII).
Embora a Lei de Biossegurança possua previsão expressa no que tange à
modalidade de Responsabilidade Civil a ser aplicada diante de eventual resultado danoso,
decorrente da prática de condutas lesivas à coletividade e ao Meio Ambiente, nem
sempre a reparação é a solução para os problemas oriundos dos danos causados. Muitas
vezes os danos são tão profundos que se tornam irreversíveis, consistindo a cultura da
precaução em dever, não somente das entidades públicas ou privadas com atuação nos
processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados, como também de
toda a coletividade.
A Responsabilidade Objetiva deve estar atrelada à Responsabilidade Solidária das
entidades que obtêm Organismos Geneticamente Modificados por processos diversos, à
dos Órgãos Geneticamente Modificados por processos diversos e à dos Órgãos do Poder
73
Público, por exemplo, o próprio Estado, que autorizaram a existência dessas atividades,
por meio do fornecimento de estudos como o EIA (Estudo de Impacto Ambiental).
A possibilidade da existência do risco é imanente aos processos de obtenção de
Organismos Geneticamente Modificados e a consciência de tal fato toma relevo quando
da abordagem de fatores diversos, decorrentes da vida em um mundo que, por sua
própria natureza ou pela intervenção volitiva, encontra-se em constantes transformações,
tornando-se necessária a adoção de uma postura holística, evitando-se o paradoxo entre
a excessiva prudência e a demasiada liberdade tecnológica.
74
CONCLUSÃO
O patrimônio genético é um dado natural primário, que não pode jamais ser
afastado na compreensão do homem. A par do genótipo, outros fatores intervêm de modo
indefectível na formação do indivíduo e na construção da sociedade: o meio ambiente
geográfico e o meio social. O componente cultural, ou seja, o elemento criado pelo próprio
homem, é mais acentuado que o componente natural, herdado pelo gênero humano. O
homem perfaz assim, indefinidamente, a sua própria natureza, ao mesmo tempo em que
transforma a Terra, tornando-a sempre mais dependente de si próprio.
A individualidade humana não é apenas questão de princípios. Em termos
biológicos, ela representa a diversidade biológica, já que o indivíduo é único não somente
em seus sonhos, desejos e personalidade, mas também em seu patrimônio genético. A
diversidade biológica é fundamental para a sobrevivência de nossa espécie. Preservar a
diversidade e a integridade do patrimônio genético implica a preservação de todas as
espécies existentes.
Dentre os Direitos Fundamentais de Terceira Dimensão, insere-se o direito ao Meio
Ambiente sadio e equilibrado, sendo preciso que o sistema jurídico os tutele
adequadamente, assegurando sua efetiva fruição. Partindo-se do reconhecimento da
existência dos Direitos Fundamentais de Terceira Dimensão, tornou-se mister passar à
efetivação de suas garantias, viabilizando-se concretamente as mais recentes conquistas
da cidadania. Tendo em vista que o Direito Processual tem como base a atuação
instrumental, servindo como ferramenta de consecução e amparo aos direitos ameaçados
ou violados, a renovação fez-se, sobretudo, no plano do processo.
No plano constitucional merecem destaque a tutela jurídica do patrimônio genético
humano e a tutela jurídica do patrimônio genético de outros seres vivos (do mundo
vegetal, animal, fúngico e microbiano), sempre no sentido de estabelecer tutela jurídica
vinculada a bens ambientais, na forma do que indica o caput do art. 225 de nossa Carta
Magna. O Direito ao Meio Ambiente ecologicamente equilibrado foi garantido pelo art. 225
da Constituição Federal que impôs ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-
lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, erigindo-o à condição de bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.
75
A tutela jurídica do patrimônio genético da pessoa humana tem proteção ambiental
constitucional observada em face do que determina o art. 225, § 1º, II, IV e V, iluminada
pelo art. 1º, III, da Carta Magna, sendo certo que a matéria foi devidamente regrada no
plano infraconstitucional pela Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005, que não só
regulamentou os incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, como
estabeleceu normas de segurança, assim como mecanismos de fiscalização de atividades
que envolvam organismos geneticamente modificados, os chamados OGMs.
A Lei 11.105/2005 se destina a viabilizar no plano infraconstitucional a moderna
visão de nossa Carta Magna, que já procurava destacar no final do século passado a
necessidade de preservar não só a diversidade como a integridade de referido patrimônio
genético brasileiro. A norma aludida determina em referido plano jurídico de que forma a
incumbência constitucional destinada ao Poder Público, no sentido de fiscalizar as
entidades que se dedicam à pesquisa, assim como manipulação de aludido material
genético em nosso País, deverá ser realizada concretamente.
A Lei de Biossegurança procurou destacar no plano jurídico ambiental a tutela
jurídica referente ao patrimônio genético da pessoa humana assegurando em sede
infraconstitucional tanto a tutela jurídica individual das pessoas humanas (como o direito
às informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à
descendência), como particularmente a tutela jurídica do povo brasileiro observado em
sua dimensão metaindividual. Esta tutela deve ser analisada no século XXI com novas
ferramentas científicas desenvolvidas em proveito da tutela dos grupos participantes do
processo civilizatório nacional (arts. 215 e 216 da CF).
A Lei 11.105/2005 estabeleceu critérios destinados a observar a responsabilidade
civil, administrativa e criminal em decorrência de eventuais condutas ou mesmo atividades
consideradas lesivas ao patrimônio genético da pessoa humana. Ao regulamentar os
incisos II, IV e V do §1º do art. 225 da Constituição Federal, a Lei de Biossegurança
entendeu por bem estabelecer normas de segurança e mecanismos de fiscalização de
atividades vinculadas aos denominados organismos geneticamente modificados e seus
derivados, dispondo sobre a denominada Política Nacional de Biossegurança – PNB.
76
Os processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados, em
especial, devem estar pautados no Princípio da Precaução, sem se esquecer das
questões concernentes à Responsabilidade Social e Civil, uma vez que, nas últimas
décadas, em todo o planeta experimentaram-se fortes sinais de transição, como se a
natureza estivesse acordando o ser humano para um novo sentido de vida.
A nova Política Nacional de Biossegurança visa preservar a diversidade, bem como
a integridade do patrimônio genético do Brasil, definindo critérios normativos destinados a
estabelecer a incumbência constitucional indicada ao Poder Público no sentido de
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético.
O princípio da dignidade nos obriga a um compromisso inafastável: o do absoluto e
irrestrito respeito à identidade e à integridade de todo ser humano porque o homem é
sujeito de direitos; não é, jamais, objeto de direito e muito menos objeto mais ou menos
livremente manipulável. O princípio da dignidade da pessoa humana é a razão de ser da
proteção fundamental do valor da pessoa e, por conseguinte, da humanidade do ser e da
responsabilidade que cada homem tem pelo outro.
O Biodireito tem por premissa a positivação jurídica de permissões de
comportamentos médicos e científicos, de imputação de sanções aos comportamentos
violadores das condutas descritas nas normas respectivas. O Biodireito guarda estreita
relação com o Direito Ambiental na medida em que ambos derivam da Bioética e
possuem Princípios comuns, destacando-se, dentre eles, o da Ubiqüidade, o da
Cooperação entre os Povos, o do Desenvolvimento Sustentável, o da Preservação da
Espécie Humana, o da Precaução e o da Prevenção. Determinar um limite seguro, que
permita harmonizar essas realidades possibilitando que a ciência avance, sem que esse
avanço configure uma ameaça para a vida e o futuro da espécie humana, constitui a
missão à qual se destina o Biodireito.
A Biossegurança tem por prisma a contemplação legal de situações relacionadas
às práticas técnico-científicas que tenham o condão de interferir de forma direta ou
indireta no Patrimônio Genético e no Meio Ambiente. A pesquisa deve preservar o
respeito pela dignidade humana, que é a base de todos os direitos humanos, inclusive do
direito à pesquisa científica. À luz da velocidade dos avanços biotecnológicos, a
77
biovigilância - o respeito pelos princípios de bioética, pela sensibilidade ética na
elaboração de políticas e pelo crescimento da consciência popular – tornou-se uma
precisão absoluta. Os avanços da biologia, da medicina, da genética e a necessidade de
oferecer orientação ética e legal para prevenir abusos e assegurar que o progresso
científico e tecnológico esteja a serviço da humanidade e não viole os direitos humanos e
as liberdades fundamentais levaram ao desenvolvimento da bioética.
À Bioética cabe o papel de levantar as questões, registrar as inquietações, alinhar
as possibilidades de acerto e de erro, de benefício e de malefício, decorrentes do
desempenho indiscriminado não-autorizado, não limitado e não regulamentado de
práticas biotecnologias e biomédicas que possam afetar, de qualquer forma, o cerne de
importância da vida humana sobre a terra, vale dizer, a dignidade da pessoa humana.
Todo problema reside em saber o que será feito com essa capacidade crescente de
interferir na biosfera e na evolução do gênero humano. Além do patrimônio genético
existem outros fatores condicionantes básicos da vida humana e a ele se ligam
estreitamente, em uma vinculação indissolúvel entre natureza e cultura.
Devemos destacar alguns pontos sobre a biodiversidade, a proteção legislativa e
os protocolos internacionais. O direito ao Meio Ambiente é difuso e de absoluta
relevância. Dentre as questões mais polêmicas da atualidade, está a problemática da
manipulação do Patrimônio Genético de plantas e animais, havendo desconfiança geral
quanto à disseminação na natureza de Organismos Geneticamente Modificados. Deve-se
prestar a máxima atenção nas experiências a serem realizadas pelas entidades públicas
ou privadas envolvidas nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente
Modificados.
A Europa é o berço do Princípio da Precaução, tal como este é conhecido
atualmente. Tal Princípio da Precaução pode ser conceituado como uma parceria
construtiva entre todas as áreas da sociedade para produzir e administrar mudanças no
mundo natural. Essa noção engloba a gestão do Meio Ambiente, a prevenção de riscos, o
cálculo do custo-benefício, responsabilidades éticas, a manutenção e a integridade de
sistemas naturais e a falibilidade da compreensão humana.
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Além da proteção dispensada pela legislação pátria ao Meio Ambiente, existem
várias Convenções e Tratados Internacionais sobre Biodiversidade, como o Protocolo de
Cartagena sobre Biossegurança; a Diretiva 18/2001 da Comunidade Européia; a Agenda
21; a Diretiva 90/220; a Convenção da Biodiversidade (CDB) e o Protocolo de Kyoto. O
elemento norteador das diretrizes de todas as Convenções e Tratados no que tange à
proteção da Biodiversidade é o Princípio da Precaução, que consiste na base que
sustenta e torna obrigatória a análise do risco de qualquer atividade que possa ter o
condão de influir na saúde do ser humano e no Meio Ambiente, aí incluídos os processos
de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados, animais ou vegetais.
Com os avanços tecnológicos, favorecidos sobremaneira pelo esforço bélico,
característico do século XX, desenvolveu-se a denominada teoria do risco, que serviu de
base à responsabilidade objetiva e cujos reflexos foram sentidos por grande parte das leis
especiais reguladoras da atividade econômica. O Código Civil de 2002 consagrou
expressamente a teoria do risco e, ao lado da responsabilidade subjetiva, calcada na
culpa, admitiu também a responsabilidade objetiva. A atividade das entidades públicas ou
privadas, com atuação nos processos de obtenção de Organismos Geneticamente
Modificados, que resulte em danos ao ser humano ou ao Meio Ambiente, permeia a
esfera da Responsabilidade Objetiva. A possibilidade de aplicação da Responsabilidade
Objetiva em razão dos danos eventualmente advindos das atividades exercidas nos
processos de obtenção de Organismos Geneticamente Modificados em território nacional
teve origem na Lei 8.974/95, que prescreve que os responsáveis pelos danos ao Meio
Ambiente e a terceiros responderão, solidariamente, por sua indenização ou reparação
integral, independentemente da existência de culpa. Embora a Lei de Biossegurança
possua previsão expressa no que tange à modalidade de Responsabilidade Civil a ser
aplicada diante de eventual resultado danoso, decorrente da prática de condutas lesivas à
coletividade e ao Meio Ambiente, nem sempre a reparação é a solução para os problemas
oriundos dos danos causados. Muitas vezes os danos são tão profundos que se tornam
irreversíveis, consistindo a cultura da precaução em dever, não somente das entidades
públicas ou privadas com atuação nos processos de obtenção de Organismos
Geneticamente Modificados, como também de toda a coletividade.
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A busca de equilíbrio entre a existência do ser humano e a dos ecossistemas a que
pertencem, de forma a possibilitar um modo de vida sustentável para todas as espécies,
tornou-se a preocupação mais presente, num consenso que transcende às diferenças
étnicas, sociais e políticas das sociedades humanas. As mudanças geram novos
paradigmas, determinam novos comportamentos e exigem novos caminhos em relação
aos recursos da natureza e, em especial, ao Patrimônio Genético. Assim, a
Biodiversidade e precisamente o Patrimônio Genético transformaram-se em precioso
bem, cuja proteção e defesa tornaram-se imperativos para assegurar a saúde, o bem-
estar e as condições de desenvolvimento dos seres vivos.
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PÓS-GRADUANDO: ÉRISSON JOSÉ CHAGAS DE CARVALHO
AVALIADOR: FRANCISCO JOSÉ DE JESUS CARRERA
CONCEITO: _________________
Rio de Janeiro, 30 de setembro de 2009.