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  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO ESCOLA DE EDUCAO FSICA E ESPORTE

    INFLUNCIA DE DIFERENTES ESTRATGIAS DE PROVA NA RECUPERAO FISIOLGICA E NO DESEMPENHO DE CICLISTAS

    TREINADOS

    Eduardo Rumenig de Souza

    SO PAULO 2011

  • INFLUNCIA DE DIFERENTES ESTRATGIAS DE PROVA NA RECUPERAO FISIOLGICA E NO DESEMPENHO DE CICLISTAS

    TREINADOS

    EDUARDO RUMENIG DE SOUZA

    Dissertao apresentada Escola de Educao Fsica e Esporte da Universidade de So Paulo, como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em Educao Fsica.

    .

    ORIENTADOR: PROF. DR. BENEDITO PEREIRA

  • i

    AGRADECIMENTOS

    O caminho da ps-graduaao longo e penoso. Os atalhos que por ventura so

    utilizados usualmente resultam em fracassos. Portanto, nesse percurso estamos sempre vidos

    por algum que possa nos aconselhar um rumo a seguir. Nessa primeira encruzilhada encontrei

    dois bons amigos ainda no perodo em que cursava a graduao, a saber, os professores Joo

    Fernando Laurito Gagliardi e o grande amigo Rmulo Cssio de Moraes Bertuzzi. Foram eles

    que ampliaram [e continuam ampliando] meu horizonte, fazendo reconhecer minhas

    limitaes e, sobretudo, minhas possibilidades. Serei eternamente grato aos dois por tudo que

    fizeram, sem nunca esperar retribuio.

    Posteriormente, com a ajuda dessas duas figuras centrais, fui aos poucos galgando

    espao na Escola de Educaao Fsica da Universidade de So Paulo. Inicialmente contando

    com o auxlio da Profa. Maria Augusta Pedutti Dal`Molim Kiss, que cedeu seu espao e tempo

    para que pudesse amadurecer minhas idias. Obviamente no poderia esquecer o responsvel

    pelo laboratrio, Edson Degaki e todos os residentes de medicina do esporte que

    compartilharam meus momentos de angstia e desespero.

    Nesse perodo fiz grandes amigos, mas por timidez ou oportunidade nunca declarei

    minha admirao e apreo. Portanto, aproveito o espao para protestar meus sinceros votos.

    Inicialmente, ao grande amigo Nilo Massaru Okuno, que sempre demonstrou sabedoria,

    sinceridade, humildade, honestidade, tica, dignidade, rigorosidade epistemolgica e

    competncia acadmica. A resistente Carla S. Batista, que nunca emudeceu, mesmo nos

    momentos mais difceis de sua vida [e sei que foram muitos]. Os amigos Wonder, Clio Sales,

    Salomo Bueno e Leonardo Pasqua, sempre dispostos a me auxiliar nas horas de necessidade,

    alguns inclusive participando como sujeitos dessa pesquisa.

    No poderia deixar de incluir a compreenso e pacincia dos amigos que por tantas

    vezes foram solcitos no trabalho, permitindo a conciliao da vida acadmica e profissional.

    Minha sincera gratido aos amigos Alexandre Luzzi e Vitor Tessuti.

    Tambm incluo meus votos de agradecimento a todas as pessoas que participaram

    direta ou indiretamente dessa pesquisa. Espero que possa retribuir a ajuda que me prestaram,

    pois sem vocs no seria possvel concluir esse trabalho. Em especial, gostaria de destacar a

    Profa. Dra. Marlia Cerqueira Leite Seelaender e seu orientando Marcus Vincius Giampietro.

  • ii

    Os votos se estendem ao Prof. Dr. Benedito Pereira, que acreditou no meu projeto e na

    minha capacidade de realiz-lo. Portanto, registro o apreo e gratido ao meu orientador

    Benedito Pereira e desejo sinceramente que suas angustias acadmicas sejam compreendidas

    algum dia.

    Finalmente, gostaria de agradecer as pessoas que me educaram com muito amor e

    trabalho para que me tornasse uma pessoa digna. Aos meus pais Francisco Ribeiro e Zeazelita

    Maria. Tambm registro minha gratido aos meus irmos Diego Vincius, Aline Caroline e a

    minha esposa Luciana Domenech. A vida seria ainda mais difcil e o futuro improvvel se no

    houvesse vocs.

    Que a sorte sem mrito pouco vale

    Um tolo nunca o entenderia;

    Tivesse ele a pedra filosofal

    E inda o filsofo pedra faltaria.

    Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832).

  • iii

    SUMRIO

    Pgina

    LISTA DE TABELAS ............................................................................................................................ v

    LISTA DE SIGLAS, ABREVIAES E SMBOLOS ................................................................... viii

    LISTA DE ANEXOS .............................................................................................................................ix

    RESUMO ................................................................................................................................................. x

    ABSTRACT .......................................................................................................................................... xii

    1 INTRODUO .............................................................................................................................. 1

    2 OBJETIVOS ................................................................................................................................... 3

    2.1 Objetivos gerais .......................................................................................................................... 3

    2.2 Objetivos especficos .................................................................................................................. 4

    3 REVISO DE LITERATURA ...................................................................................................... 4

    3.1 Conceitos no esporte e no treinamento fsico ........................................................................... 4

    3.2 Ciclismo: Aspectos gerais sobre a modalidade ........................................................................ 7

    3.3 Aspectos fisiolgicos do ciclismo e suas implicaes para o treinamento ........................... 11

    3.4 Regulao da estratgia de prova: bioenergtica e complexidade ....................................... 19

    3.5 Estresse fisiolgico e recuperao: Aspectos bioenergticos e cardiorrespiratrios ............. 28

    3.6 Sistema nervoso autnomo e central: Conexes para o controle cardiovascular ............... 32

    3.7 Variabilidade da frequncia cardaca e demanda metablica ............................................. 35

    3.8 Tempo limite na frequncia cardaca mxima e desempenho esportivo ............................. 38

    4 METODOLOGIA ........................................................................................................................ 42

    4.1 Amostra ..................................................................................................................................... 42

    4.2 Procedimentos experimentais ................................................................................................. 43

  • iv

    4.3 Mensurao da frequncia e variabilidade cardaca e lactato sanguneo ........................... 44

    4.4 Teste mximo progressivo e teste contra-relgio de 3 km .................................................... 45

    4.5 Tempo limite na FC mxima e estratgia de prova .............................................................. 46

    4.6 Cintica da frequncia cardaca .................................................................................................. 48

    4.7 Anlise da VFC......................................................................................................................... 49

    4.8 Anlise estatstica ..................................................................................................................... 50

    5 RESULTADOS ............................................................................................................................ 50

    5.1 Anlise da estratgia de prova ................................................................................................ 52

    5.2 Teste contra-relgio de 3 km ................................................................................................... 59

    5.3 Variabilidade da frequncia cardaca .................................................................................... 70

    5.4 Correlaes entre marcadores fisiolgicos e desempenho .................................................... 74

    6 DISCUSSO ................................................................................................................................ 75

    6.1 Tempo limite na frequncia cardaca mxima ...................................................................... 76

    6.2 Estratgia de prova de 20 km ..................................................................................................... 79

    6.3 Teste contra-relgio de 3km .................................................................................................... 85

    7 CONSIDERAES FINAIS ...................................................................................................... 88

    REFERNCIAS .................................................................................................................................... 89

    ANEXOS .............................................................................................................................................. 105

  • v

    LISTA DE TABELAS

    Pgina

    TABELA 1 - Classificao dos ciclistas considerando as caractersticas do treinamento e os

    anos de experincia dos ciclistas. ....................................................................16

    TABELA 2 - Caractersticas antropomtricas e etria dos ciclistas amadores. .....................51

    TABELA 3 Caractersticas fisiolgicas dos ciclistas e tempo limite na frequncia cardaca

    mxima. ............................................................................................................52

    TABELA 4 Potncia mecnica mdia em funo da distncia total da prova. ...................55

    TABELA 5 Caracterizao da frequncia cardaca em funo da estratgia de prova de 20

    km. ...................................................................................................................58

    TABELA 6 Caracterizao da resposta cintica de recuperao da frequncia cardaca em

    funo da estratgia de prova. ..........................................................................59

    TABELA 7 - Resposta cintica de recuperao da frequncia cardaca em funo da

    estratgia de prova aps teste contra-relgio de 3 km. ....................................69

    TABELA 8 - Ajuste linear da fc de recuperao nos testes cr3km em funo da estratgia de

    prova. ...............................................................................................................70

  • vi

    LISTA DE FIGURAS

    Pgina

    FIGURA 1 - Aptido aerbia de ciclistas em funo do tipo de terreno. ...............................8

    FIGURA 2 - Caractersticas antropomtricas dos atletas em funo da competio. ............9

    FIGURA 3 - Ilustrao do comportamento alosttico do organismo durante o ano. ...........12

    FIGURA 4 - Distribuio da potncia externa durante o perodo de treinamento fsico do

    atleta. ................................................................................................................17

    FIGURA 5 - Modelo de treinamento fsico para modalidades predominantemente aerbias.

    .........................................................................................................................18

    FIGURA 6 - Descrio das principais estratgias de prova adotadas em modalidades

    modalidade esportiva predominantemente aerbias. .......................................20

    FIGURA 7 - Depresentao da cadeia transportadora de eltrons mitocaondrial na situao

    de repouso (estado 4) e exerccio (estado 3). ...................................................23

    FIGURA 8 - Caracterizao dos mecanismos envolvidos na elaborao e controle da

    estratgia de prova. ..........................................................................................25

    FIGURA 9 - Simulao da estratgia de prova e seus mecanismos de regulao durante

    uma tarefa de longa durao. ...........................................................................26

    FIGURA 10 - Esquematizao hierrquica dos processos envolvidos na regulao da funo

    cardaca. ...........................................................................................................33

    FIGURA 11 - Economia de movimento de dois corredores submetidos a mesma intensidade

    de esforo. ........................................................................................................40

    FIGURA 12 - Representao grfica do protocolo experimental ...........................................44

    FIGURA 13 - Caracterizao das estratgias de provas adotadas pelo ciclista num teste de 20

    km. ...................................................................................................................47

    FIGURA 14 Caracterizao da potncia, trabalho mecnico, tempo total e cadncia em

    funo da estratgia de prova. ..........................................................................53

    FIGURA 15 Caracterizao da potncia mecnica para as diferentes estratgias de prova.54

    FIGURA 16 Caracterizao do lactato sanguneo em funo da distncia e da estratgia de

    prova. ...............................................................................................................56

    FIGURA 17 Caracterizao da percepo subjetiva de esforo em funo da distncia e da

    estratgia de prova. ..........................................................................................57

  • vii

    FIGURA 18 Representao grfica das variveis mecnicas e do tempo total durante os

    testes contra-relgio de 3 km. ..........................................................................60

    FIGURA 19 - Representao da potncia mecnica durante teste contra-relgio de 3 km. ...61

    FIGURA 20 - Caracterizao da velocidade empregada durante teste contra-relgio de 3 km.

    .........................................................................................................................62

    FIGURA 21 Representao grfica da cadncia adotada durante teste contra-relgio de 3

    km. ...................................................................................................................63

    FIGURA 22 - Caracterizao da durao do teste contra-relgio de 3 km. ...........................64

    FIGURA 23 Representao da percepo de esforo durante teste contra-relgio de 3 km.

    .........................................................................................................................65

    FIGURA 24 Representao do comportamento do lactato sanguneo mediante teste contra-

    relgio de 3 km. ...............................................................................................66

    FIGURA 25 - Caracterizao das variveis mecnicas e fisiolgicas mediante teste contra-

    relgio de 3 km. ...............................................................................................68

    FIGURA 26 - Anlise do comportamento da variabilidade da frequncia cardaca no teste

    tempo limite na frequncia cardaca mxima. .................................................71

    FIGURA 27 - Anlise do comportamento da variabilidade da frequncia cardaca no teste

    contra-relgio de 3 km. ....................................................................................72

    FIGURA 28 Anlise do comportamento da variabilidade da frequncia cardaca nos testes

    de estratgia de prova de 20 km. ......................................................................73

    FIGURA 29 Anlise do comportamento da variabilidade da frequncia cardaca nos testes

    de estratgia de prova de 20 km. ......................................................................74

  • viii

    LISTA DE SIGLAS, ABREVIAES E SMBOLOS

    [Lac] Concentrao de lactato sanguneo

    CR3KM Teste contra-relgio de 3 km

    EG Eficincia grosseira

    EP Estratgia de prova

    FC Frequncia cardaca

    FCmax Frequncia cardaca mxima

    FCOFF Resposta cintica cardaca de recuperao

    HF Componente espectral de alta frequncia

    LF Componente espectral de baixa frequncia

    Lim1 Primeiro limiar metablico

    Lim2 Segundo limiar metablico

    O2 Oxignio

    SamplEn Amostragem entrpica

    SNA Sistema nervoso autnomo

    TLim[FCmax] Tempo limite na intensidade correspondente a FC mxima

    TLim[VO2max] Tempo Limite na intensidade correspondente ao VO2max

    VFC Variabilidade da frequncia cardaca

    VO2max Consumo mximo de oxignio

    VO2rec Consumo de oxignio de recuperao

  • ix

    LISTA DE ANEXOS

    Pgina

    ANEXO I - Digitalizao da carta de aprovao do comit de tica em pesquisa da escola

    de educao fsica e esporte da universidade de so paulo. .............................105

    ANEXO II - Cpia do termo de consentimento informado fornecido a todos os atletas que

    participaram do estudo. ....................................................................................106

    ANEXO III - Digitalizao da ficha do aluno, do planejamento individualizado aprovado e

    relatrio de atividades acadmicas. ..................................................................111

  • x

    RESUMO

    INFLUNCIA DE DIFERENTES ESTRATGIAS DE PROVA NA RECUPERAAO

    FISIOLGICA E NO DESEMPENHO DE CICLISTAS TREINADOS

    Autor: EDUARDO RUMENIG DE SOUZA

    Orientador: PROF. DR. BENEDITO PEREIRA

    Esforos fsicos prolongados em ritmo dinmico parecem promover menor demanda

    metablica, estresse fisiolgico e cardiovascular comparado a tarefas em ritmo constante.

    Contudo, os mecanismos no so completamente descritos. Alm disso, sugere-se que o tempo

    que o indivduo capaz de suportar um exerccio em intensidade mxima (TLim[FCmax])

    correlaciona-se com o desempenho no ciclismo. Assim, os objetivos do presente estudo foram

    verificar como a estratgia de prova (EP) influencia nas respostas fisiolgicas, no controle

    autonmico cardiovascular e no desempenho de tarefas aerbias subseqentes.

    Adicionalmente, verificar se o TLim[FCmax] correlaciona-se com o desempenho em teste contra-

    relgio de 3 km (CR3KM). Participaram desse estudo oito ciclistas treinados masculinos. Aps

    avaliaes antropomtricas e familiarizao com os cicloergmetros, os indivduos foram

    submetidos: (i) teste mximo progressivo para determinao da potncia aerbia mxima e dos

    limiares metablicos; (ii) teste TLim[FCmax]; (iii) teste de 20 km adotando diferentes EP, mas

    mantendo a potncia mdia em todas as sesses; (iv) teste CR3KM realizado 30 minutos aps as

    EP. A frequncia cardaca (FC), a variabilidade da FC, a percepo de esforo (PSE) e o

    lactato sanguneo [Lac] foram registrados em todas as situaes experimentais. A

    transformada de Fourier e a amostragem entrpica foram empregadas para analisar a VFC, ao

    passo que a FC foi descrita por funo exponencial. Adicionalmente, a ANOVA two way

    (estratgia de prova x distncia) e a correlao produto momento de Pearson foram utilizadas

    para comparaes estatsticas. Para todas as anlises, foi assumido um p < 0,05. Os principais

    achados foram que o TLim[FCmax] no correlacionou-se o desempenho do CR3KM, a EP no

    modificou o teste CR3KM subseqente. No entanto, houve menores incrementos de [Lac], FC e

    PSE na EP positiva. Possivelmente o incio rpido na EP positiva reduz o dficit anaerbio de

    oxignio, reduzindo a contribuio glicoltica nesse perodo inicial. Finalmente, a VFC

  • xi

    apresentou menor complexidade imediatamente aps a tarefa, comparado ao repouso e aos

    minutos finais de recuperao, indicando maior redundncia do sistema na tentativa de evitar

    eventos catastrficos ao organismo.

    Palavras-chave: Estratgia de prova. controle autonmico cardaco. frequncia cardaca.

  • xii

    ABSTRACT

    INFLUENCY OF THE PACING STRATEGY ON THE PHYSIOLOGIC RECOVERY

    AND PERFORMANCE OF TRAINED CYCLISTS

    Author: EDUARDO RUMENIG DE SOUZA

    Adviser: PROF. DR. BENEDITO PEREIRA

    Prolonged physical efforts in variable pacing promote lower metabolic demand,

    physiological and cardiovascular stress compared with workouts in even pacing. However, the

    mechanisms is not completely understanding. Additionally, one suggests that the period of

    time that someone can support exercises in maximal intensity (TLim[FCmax]) could be correlate

    with performance on the cycling. Thus, the objectives of this study were verified if the pacing

    strategy (EP) could influence the physiological responses, cardiovascular autonomic control

    and the performance of the subsequent aerobic exercises. Additionally, to verify the

    correlation between TLim[FCmax] with the performance on time trials of 3 km (CR3KM). Eight

    male trained cyclists took part of this study. After anthropometric tests and familiarization

    with the ergometers, the subjects were submitted: (i) maximal progressive test to determinate

    the maximal aerobic power and metabolic thresholds; (ii) TLim[FCmax] test; (iii) 20 km test

    taken different EP, but keeping the average power output in all sessions; (iv) CR3KM test

    performed 30 minutes after EP. The heart rate (FC), the heart rate variability (VFC), the

    perceived of effort (PSE) and the blood lactate [Lac] were recorded in all experimental tests.

    The fast Fourier transformer and the sample entropy were used to analyze the VFC, whilst the

    FC was analyzed employing exponential function. Further, the ANOVA two way (pacing

    strategy x distance) and the Pearson product moment correlation were used to statistical

    comparison. For all the analysis, we assumed p < 0,05. The mains finding were that

    TLim[FCmax] did not correlate with performance on the CR3KM and the EP did not modify the

    subsequent CR3KM test . However, there was lower increment for [Lac], FC and PSE on

    positive EP. Possibly the fast start in the positive EP reduce the anaerobic oxygen deficit,

    narrowing the glycolytic contribution on the initial effort. Finally, the VFC showed lower

    complexity immediately after the workout than the rest and the last minutes of recovery,

  • xiii

    suggesting higher redundancy of the system, probably trying avoid catastrophic occurrence to

    the organism.

    Keywords: Pacing strategy. autonomic cardiac control. heart rate.

  • 1

    1 INTRODUO

    Em atividades esportivas de mdia e longa durao, superior a 10 minutos

    (ATKINSON, OLIVER, ST CLAIR GIBSON & TUCKER, 2007), a distribuio do trabalho e

    do gasto energtico parece variar consideravelmente ao longo da tarefa (ABBISS, QUOD,

    MARTIN, NETTO, NOSAKA, LEE, SURRIANO, BISHOP & LAURSEN, 2006; GARCIN,

    DANEL & BILLAT; 2008). Essa distribuio usualmente denominada estratgia de prova

    (EP).

    Particularmente no ciclismo, existem evidencias que apontam a importncia da EP para

    o sucesso em uma competio (AISBETT, LEROSSIGNOL, MCCONELL, ABBISS &

    SNOW, 2009). Tamanha a influencia da EP para o desempenho que alguns atletas possuem

    diretores de prova para coordenar o ritmo do atleta na competio, como o caso do ciclista

    Lance News Armstrong, documentado pela Discovery Channel no vdeo Lance Amstrong:

    Resistncia e Tecnologia.

    Porm, existem controvrsias sobre a EP que deve ser adotada nesses eventos de longa

    durao, pois numa mesma ocasio os atletas podem realizar provas com exigncias

    metablicas e caractersticas fsicas distintas. Por exemplo, perseguies, largadas de massa,

    sprints e contra-relgios, com distncias que variam de 200 m a 100 km so comumente

    observadas. Alm disso, o terreno, percurso, condies ambientais, experincia em

    competies, fatores piscocognitivos e fisiolgicos do atleta e da equipe tambm podem

    interferir na deciso sobre que EP adotar.

    Apesar dos diversos fatores que influenciam na deciso da EP, algumas proposies

    so observadas (ATKINSON et al., 2007). Especificamente, esses autores destacam que em

    situaes onde as variaes ambientais e topogrficas so discretas, como por exemplo em

    veldromos, os ciclistas vencedores so aqueles que adotam uma EP constante ou ligeiramente

    randmica; sendo o oposto observado em ambientes instveis com grandes variaes de

    terreno.

    No entanto, mesmo EP constantes em ambientes controlados podem resultar em

    prejuzo no desempenho. PALMER, BORGHOUTS, NOAKES e HAWLEY (1999)

    observaram que ciclistas que adotavam uma EP constante em ambiente laboratorial

  • 2

    apresentavam maior depleo de glicognio muscular comparado a EP randmica (65 vs.

    49%).

    Similarmente, BILLAT, WESFREID, KAPFER, KORALSZTEIN e MEYER (2006)

    verificaram menor consumo de oxignio (VO2), frequncia cardaca (FC) e lactato sanguneo

    ps-esforo ([Lac]) em corredores numa prova de 10 km quando a velocidade era determinada

    de forma autnoma comparado a velocidade constante, mesmo que essa ltima fosse

    estabelecida a partir da velocidade mdia individual da situao autnoma. importante

    destacar que a situao autnoma apresentava maior variabilidade da velocidade.

    Considerando que a EP implica em alteraes no desempenho, possivelmente o

    estresse fisiolgico desencadeado pelo esforo e, conseqentemente a recuperao ps-

    esforo, tambm pode apresentar comportamento distinto em funo da EP adotada.

    Apesar da ausncia de marcadores padro-ouro de estresse fisiolgico, a variabilidade

    da FC (VFC) associada a funes matemticas no-lineares pode ser utilizada como indicador

    indireto do sistema nervoso autnomo cardaco (SNA) (TASK FORCE OF THE EUROPEAN

    SOCIETY OF CARDIOLOGY THE NORTH AMERICAN SOCIETY OF PACING

    ELECTROPHYSIOLOGY, 1996). Por sua vez, esse parece depender de processos

    metablicos, endcrinos, cognitivos e corticais (CRITCHLEY, CORFIELD, CHANDLER,

    MATHIAS & DOLAN, 2000), que de certo modo poderia fornecer informaes acerca do

    estresse cardiovascular promovido pelo esforo.

    Inclusive, KIVINIEMI, HAUTALA, KINNUNEN e TULPPO (2007) demonstraram

    que a VFC parece ser sensvel a sesso de esforo e que poderia ser usado inclusive para

    periodizar sesses de treinamento aerbio, alm de servir como indicador do perodo

    necessrio para recuperao do atleta. Portanto, apesar de no haver um marcador de

    referncia para as respostas estressoras promovidas pelo esforo fsico, a VFC poderia ser

    sensvel a diferentes EP e indicar possveis alteraes no comportamento autonmico

    cardaco.

    Finalmente, outros fatores alm da EP e da recuperao do atleta parecem interferir no

    desempenho durante um evento competitivo. Nesse sentido, a predio do desempenho tem

    sido algo que mobiliza dezenas de pesquisas e recursos. O consumo mximo de oxignio

    (VO2max) e o segundo limiar metablico (Lim2) obtidos a partir de um teste mximo so

    comumente utilizados nessas pesquisas, mas suas limitaes j foram discutidas em trabalhos

  • 3

    anteriores (BENTLEY, HOPPELER & WEIBEL, 1998; KAYSER, 2003; NEWELL,

    HIGGINS, MADDEN, CRUICKSHANK, EINBECK, MCMILLAN & MCDONALD, 2007).

    No intuito de suprir essas limitaes, sugeriu-se analisar o tempo que o indivduo

    consegue suportar uma tarefa na intensidade correspondente ao VO2max, por relacionar

    potncia aerbia e economia de movimento num nico teste, denominado tempo limite no

    VO2max (BILLAT & KORALSZTEIN, 1996; MIDGLEY, MCNAUGHTON & CARROLL,

    2006). Todavia, o TLim[VO2max] apresenta alto custo, visitas ao laboratrio e recurso humano

    especializado.

    Considerando que a FC possui relao direta com o VO2, possvel que o uso do

    tempo limite na intensidade correspondente a FC mxima (TLim[FCmax]) pudesse ser

    empregado como uma ferramenta acessvel para analisar os efeitos do treinamento e predizer o

    desempenho de ciclistas, e em situaes de campo, onde o acesso a tcnicas mais sofisticadas

    difcil.

    Desse modo, os objetivos do presente estudo foram (i) verificar o uso do TLim[FCmax]

    para predizer o desempenho em teste contra-relgio de 3 km e (ii) verificar a influncia de

    diferentes EP sobre: (1) a recuperao do sistema autonmico cardaco, e (2) o desempenho

    em tarefas subseqentes.

    O uso de indicadores para quantificar possveis efeitos de diferentes EP no estresse

    fisiolgico do organismo ou mesmo predizer o desempenho esportivo pode contribuir para

    elucidar algumas questes desse tpico que tem sido alvo de investigaes e controvrsias no

    cenrio mundial.

    2 OBJETIVOS

    2.1 Objetivos gerais

    1) Verificar a influncia de diferentes estratgias de prova sobre o desempenho

    subsequente em teste contra-relgio de 3 km.

    2) Verificar a influncia de diferentes estratgias de prova sobre a recuperao

    autonmica cardaca do atleta.

    3) Verificar o uso do teste tempo limite na intensidade correspondente a frequncia

    cardaca mxima como preditor do desempenho em prova contra-relgio de 3 km.

  • 4

    2.2 Objetivos especficos

    1) Verificar possveis diferenas em relao cintica da FC de recuperao em funo

    da manipulao da estratgia de prova;

    2) Verificar possveis diferenas em relao ao lactato sangneo de recuperao em

    funo da manipulao da estratgia de prova;

    3) Descrever o comportamento da variabilidade da frequncia cardaca de recuperao

    em funo da manipulao da estratgia de prova.

    3 REVISO DE LITERATURA

    3.1 Conceitos no esporte e no treinamento fsico

    Para iniciarmos a reviso dos assuntos que permeiam o presente estudo, ser

    importante definir alguns conceitos no intuito de evitar desentendimentos. LOURENO

    (2001) nos alerta sobre o perigo dos conceitos, pois segundo o autor as palavras so smbolos

    dotados de significado, que podem causar desentendimentos e impedir o progresso da rea

    quando no submetidos a reflexes crticas e padronizaes.

    Isso comumente observado na Educao Fsica e no Esporte, com o uso de termos

    como fora explosiva, potncia, resistncia aerbia, capacidade aerbia, endurance,

    flexibilidade, flexionamento, apenas para justificar a incluso desse captulo e citar alguns

    exemplos que resultam em discusses improdutivas que prejudicam a rea.

    Iniciaremos com o conceito de homeostase, que por definio significa estabilidade dos

    sistemas fisiolgicos por meio de mecanismos regulatrios integrados (RECORDATI &

    BELLINI, 2004). Todavia, tanto em situaes de repouso quanto durante o exerccio fsico, o

    organismo encontra-se distante do equilbrio ou do comumente utilizado steady state. Na

    termodinmica, equilbrio significa nenhuma troca de matria e energia com o ambiente

    (RECORDATI & BELLINI, 2004).

    O organismo pode ser compreendido como um sistema aberto que troca

    constantemente matria, energia e informao com o ambiente (RECORDATI & BELLINI,

  • 5

    2004). Portanto, para organismos vivos no existe equilbrio termodinmico, sendo que esse

    estgio s atingido quando a vida se extingue.

    Portanto, no presente estudo empregaremos alostase para referir os processos

    fisiolgicos que ocorrem para manter a vida e, cujo significado estabilidade por meio da

    mudana (MCEWEN & WINGFIELD, 2003).

    Todavia, essas mudanas que ocorrem para manter a atividade do organismo acarretam

    um custo metablico, que por sua vez desencadeia alteraes fisiolgicas no organismo, um

    fenmeno comumente descrito como estresse. Considerando que esses fatores estressores

    podem prejudicar ou potencializar o funcionamento do organismo, dividi-se a resposta

    alosttica em carga e sobrecarga alosttica.

    No primeiro caso (carga alosttica) h um prejuzo na alostase do organismo

    desencadeado por um agente estressor. No entanto, esse prejuzo suprimido e a resposta

    observada o comportamento alosttico normal do organismo, potencializando o sistema que

    foi submetido ao estresse. Poderamos destacar como exemplo de carga alosttica o processo

    catablico promovido pelo treinamento de fora e sua subseqente supresso, causando

    hipertrofia muscular.

    J a sobrecarga alosttica descreve um acmulo de carga alosttica que compromete o

    funcionamento normal do organismo e o torna suscetvel a uma srie de distrbios

    patofisiolgicos (MCEWEN & WINGFIELD, 2003). Isso comumente observado em

    situaes onde o atleta no suporta a carga de treinamento, desenvolvendo sndromes como o

    overreaching, supertreinamento, ou ainda leses por estresse do sistema msculo-esqueltico.

    Outra distino que nos parece importante envolve os conceitos de eficincia e

    economia. Usualmente, eficincia refere-se energia livre necessria para produzir uma

    determinada quantidade de trabalho (SALTHE, 2007). Devido a limitaes metodolgicas, as

    medidas de trabalho, calor e energia durante exerccio fsico dinmico no podem ser obtidas

    de forma direta. Desse modo, o termo empregado economia, que por sua vez descreve a

    demanda energtica para suportar uma determinada carga mecnica (SAUNDERS, PYNE,

    TELFORD & HAWLEY, 2004).

    Entretanto, observa-se na literatura o emprego do termo eficincia grosseira (EG), que

    utiliza medidas indiretas como o consumo de oxignio (VO2) para estimar a energia livre

    necessria para realizar uma dada quantidade de trabalho mecnico. Considerando que o VO2

  • 6

    no pode quantificar a energia livre necessria para realizar trabalho mecnico, o conceito

    empregado ser economia de movimento.

    Com relao ao estresse, MCEWEN e WINGFIELD (2003) o definem como um estado

    de excitao que implica em alterao da alostasia do organismo. Essa excitao pode ser de

    natureza fsica ou psicolgica, sendo resultado da avaliao individual [consciente ou

    inconsciente] entre a demanda e os recursos disponveis para atender a essa demanda

    (SLUITER, FRINGS-DRESEN, MEIJMAN & VAN DER BEEK, 2000).

    Logo, o organismo possui capacidade de suprimir o estresse, ainda que de modo

    temporrio. Contudo, essa resposta ao estresse depender da experincia e, consequentemente,

    memria, tipo, durao e repetio do estmulo estressor, alm de condies ambientais e

    fisiolgicas do organismo (GREENWOOD & FLESHNER, 2008).

    A dificuldade em quantificar o estresse deflagrado pelo exerccio fsico e a grande

    variao entre os indivduos se deve, em grande parte, por esses fatores. No existe uma

    relao de dose-resposta linear do organismo submetido ao estresse do exerccio, o que torna a

    prescrio do treinamento fsico uma tarefa extremamente complexa.

    Exposio por longos perodos a agentes estressores pode resultar em alteraes

    estruturais e funcionais do organismo. Essa resposta denomina-se adaptao, habituao ou

    ainda ajustamento. Na teoria evolucionista, adaptao refere-se a mudanas irreversveis na

    estrutura ou funo da clula, ou ainda na expresso ou silenciamento de alguns genes

    (SOUZA JUNIOR & PEREIRA, 2008).

    Todavia, o conceito foi reformulado e observa-se o emprego de adaptao mesmo em

    situaes que desencadeiam mudanas reversveis no organismo (MCEWEN, 2000;

    HAWLEY & STEPTO, 2001). Assim, o termo empregado no presente estudo ser adaptao,

    entendendo-a como processo reversvel, como por exemplo, os desencadeados pelo

    treinamento fsico.

    Para finalizar, o conceito de fadiga tambm tem gerado conflitos na literatura

    especializada e nas discusses acadmicas. No presente estudo, adotaremos a definio

    proposta por ENOKA e DUCHATEAU (2008), que considera fadiga como uma gradual

    reduo na capacidade contrtil do msculo ou a interrupo de uma tarefa motora,

    desencadeada por um dficit motor, percepo ou declnio da atividade mental....

    Nesse sentido, a fadiga seria iniciada a partir da primeira contrao muscular, visto que

    contraes subsequentes j estariam comprometidas. Os mecanismos precursores da fadiga

  • 7

    no so bem delimitados, mas parecem depender, sobretudo, do tipo de tarefa realizada,

    intensidade e durao do estmulo (ENOKA & DUCHATEAU, 2008).

    Prolongar a discusso para os demais conceitos empregados no esporte e no

    treinamento fsico foge ao interesse do estudo. Por isso, o captulo inclui apenas os conceitos

    mais utilizados nos tpicos seguintes.

    3.2 Ciclismo: Aspectos gerais sobre a modalidade

    O Ciclismo uma das formas mais econmicas de locomoo humana terrestre,

    requerendo menor quantidade de energia por unidade de massa (JEUKENDRUP, CRAIG &

    HAWLEY, 2000). Existem diferentes bicicletas adequadas para cada competio, destacando

    o bicicross, a estrada, mountain bike, pista, paraolmpico e cicloturismo, sendo que a primeira

    (bicicross) foi reconhecida recentemente como esporte olmpico em Pequim (2008). Contudo,

    o presente estudo se restringir apenas a competies de estrada, pois os procedimentos

    experimentais se assemelham mais a essa modalidade.

    O ciclismo de estrada possui um nmero considervel de investigaes cientficas,

    sobretudo nas ltimas duas dcadas. Essas investigaes podem ser subdivididas em dois

    tpicos principais. O primeiro seria orientado para o desenvolvimento de equipamentos para

    melhorar a eficincia mecnica do atleta; incluindo roupas, capacetes, sapatilhas, pneus,

    rolamentos, configurao da bicicleta, o material que a compe. O segundo seria em relao

    ao treinamento fsico e incluiria periodizao do treinamento, EP, estratgias nutricionais e

    biomecnicas do atleta.

    Em suma, essas estratgias de treinamento e o desenvolvimento de tecnologias so

    direcionados a reduo das cargas resistivas impostas pela natureza ou pelo prprio

    equipamento, ou ainda para aumentar a potncia mecnica ou metablica do atleta.

    Apesar do ciclismo ser considerado uma modalidade individual, a vitria do atleta

    depende de um trabalho conjunto da equipe, onde cada integrante possui uma funo

    especfica. Basicamente, a especialidade do ciclista pode ser definida quanto ao terreno

    (JEUKENDRUP, CRAIG & HAWLEY, 2000) ou funo (CRAIG & NORTON, 2001).

    Em relao ao primeiro (terreno), os ciclistas podem ser subdivididos em (i) terrenos

    planos (TP), (ii) aclive (A), (iii) contra-relgio (CR) e (iv) todos os terrenos (TT). Ciclistas

    especialistas em TP apresentam maiores valores para potncia mecnica e VO2max (L.min-1),

  • 8

    ao passo que especialistas em A demonstram caracterstica fisiolgica inversa, quando

    expressos em unidades absolutas (FIGURA 1 - modificada de JEUKENDRUP, CRAIG &

    HAWLEY, 2000).

    FIGURA 1 - Aptido aerbia de ciclistas em funo do tipo de terreno.

    Porm, TP e CR apresentam maior estatura, massa e rea de superfcie corporal

    comparado aos demais. Logo, quando consideramos a potncia aerbia expressa em termos

    relativos, ou seja, W.kg-1, ciclistas A apresentam maiores valores (6,47 W.kg-1) seguidos de

    CR (6,41 W.kg-1), TT (6,35 W.kg-1) e finalmente TP (6,04 W.kg-1).

    Quanto funo, ciclistas sprinters possuem menor estatura, ao passo que contra-

    relogistas e perseguidores possuem maior estatura e relao tronco / perna, reduzindo o arrasto

    causado pela resistncia do ar e possibilitando maiores braos de alavanca (170 vs. 165 mm) e

    relao de marchas (CRAIG & NORTON, 2001). A figura abaixo retrata graficamente a

    massa corporal e a estatura de ciclistas, sendo verificado comportamento similar para atletas

    do gnero feminino.

  • 9

    Modificada de CRAIG e NORTON, 2001; sendo que designa valor mdio de cada varivel em cada evento; valor mdio dos 4 melhores colocados em cada evento; e valor mdio de 4 ltimos colocados em cada evento.

    FIGURA 2 - Caractersticas antropomtricas dos atletas em funo da competio.

    Apesar das diferenas de algumas variveis antropomtricas entre os ciclistas, a

    quantidade de gordura corporal similar entre os atletas, sendo aproximadamente 10%. De

    fato, elevaes na massa gorda poderiam resultar em prejuzo no desempenho, por promover

    maior custo energtico nos perodos de acelerao, maior resistncia dos rolamentos da

    bicicleta do atleta e aumento da rea frontal, resultando em maior resistncia do ar (CRAIG &

    NORTON, 2001).

    Essa ltima a maior fora resistiva, representando 90% de toda a resistncia

    encontrada pelo ciclista acima de 30 km.h-1 (FARIA, PARKER & FARIA, 2005b) e

    aumentando numa progresso exponencial quadrtica em funo da velocidade (ATKINSON,

    DAVISON, JEUKENDRUP & PASSFIELD, 2003). Logo, a potncia deveria aumentar numa

    funo cbica, sendo resultado da velocidade e da resistncia do ar. Contudo, numa situao

    indoor o expoente est em torno de 2,6 (BASSETT, KYLE, PASSFIELD, BROKER &

    BURKE, 1999), visto que outras foras interferem na relao entre potncia e velocidade.

  • 10

    A resistncia dos rolamentos da bicicleta e atrito so os fatores que menos interferem

    na potncia mecnica, ao passo que a gravidade seria a fora que mais influenciaria aps a

    resistncia do ar (ATKINSON et al., 2003). Por isso, em terrenos ngremes os ciclistas

    produzem uma potncia elevada e uma velocidade reduzida. Isso justifica o fato de ciclistas

    UH possurem baixa estatura e massa corporal, mas elevada razo potncia/massa corporal.

    Em relao s caractersticas fisiolgicas, ciclistas de estrada possuem valores elevados

    de VO2max ( 75 mlO2.kg-1.min-1) e uma razo potncia/massa corporal de aproximadamente

    5,5 W.kg-1, sendo est ultima utilizada como critrio de seleo no ciclismo profissional e

    como ferramenta de predio do desempenho (FARIA, PARKER & FARIA, 2005a).

    O Lim2 tambm pode ser empregado como preditor do desempenho. Usualmente

    ciclistas possuem o Lim2 muito prximo do VO2max (aproximadamente 90% do VO2max).

    Isso possibilita que esses atletas mantenham uma potncia elevada por longos perodos de

    tempo, sendo fundamental para o sucesso numa competio (FARIA, PARKER & FARIA,

    2005a).

    Todavia, apesar das melhores equipes disporem de recurso financeiro e humano para

    realizar todas as medidas supracitadas, a maior parte dos atletas amadores utilizam como

    parmetro a FC ou medidas que podem ser extradas a partir dessa varivel, devido a sua

    praticidade administrativa, baixo custo financeiro e a facilidade em manusear o equipamento.

    Isso destaca a importncia de se investir em tecnologias que utilizam a FC para prescrio e

    controle do treinamento fsico.

    Enfim, fica evidente a importncia de investigaes orientadas para caracterizar e

    potencializar os fatores biomecnicos e fisiolgicos que podem melhorar o desempenho dos

    atletas. Muitas vezes um pequeno detalhe na posio do atleta ou mesmo um equipamento

    acoplado a bicicleta ou ainda a roupa que o atleta utiliza pode resultar em alterao

    significativa do desempenho. Inclusive, existe um impasse na modalidade sobre priorizar

    investimentos e esforos para o desenvolvimento de equipamentos ou para o treinamento

    fsico e a estratgia nutricional desses atletas (JEUKENDRUP & MARTIN, 2001).

    No cenrio mundial, as grandes equipes so compostas por profissionais de diversas

    reas (engenheiros, fsicos, mdicos, fisiologistas, biomecnicos, ex-atletas, nutricionistas)

    para estruturar a rotina e os equipamentos desses atletas. A universidade deveria ser o

    principal plo de desenvolvimento dessas tecnologias e conhecimento cientfico do esporte,

  • 11

    mas incapaz de adequar-se ao modelo multidisciplinar, segue obsoleta e distante do esporte

    competitivo.

    Portanto, os avanos que ocorrem na modalidade so oriundos de investimentos

    privados. A maior contribuio das universidades brasileiras, quando h alguma, fornecer

    profissionais qualificados para trabalhar nesses grandes centros tecnolgicos.

    Em suma, pesquisas na rea esportiva na quase totalidade das universidades brasileiras

    so um fim em si mesma, pois no atendem os exigentes critrios do esporte de nvel

    competitivo, nem tampouco as categorias de base e amadora.

    Esse apenas um dos fatores que fazem com que o esporte de alto nvel brasileiro

    permanea marginalizado no cenrio mundial, apesar do vasto recurso humano disponvel e de

    condies climticas favorveis para o treinamento durante todo o ano.

    3.3 Aspectos fisiolgicos do ciclismo e suas implicaes para o treinamento

    O exerccio fsico desencadeia uma srie de adaptaes funcionais e estruturais no

    organismo que podem interferir positivamente no desempenho esportivo, ou comprometer a

    integridade fsica do atleta, ocasionando sndromes (como overreaching ou supertreinamento)

    ou mesmo leses do aparelho locomotor (FARIA, PARKER & FARIA, 2005a)

    Essas respostas adaptativas, ainda que reversveis, so obtidas submetendo os

    indivduos a situaes estressoras que se repetem por um determinado perodo de tempo. Por

    sua vez, essas sesses de treinamento desencadeiam alteraes na resposta alosttica do

    organismo (MCEWEN & WINGFIELD, 2003), promovendo melhora da capacidade aerbia

    ou da fora muscular, por exemplo.

    Todavia, essa mudana alosttica que desencadeia uma srie de alteraes fisiolgicas

    no organismo usualmente so suprimidas, fazendo com que o mesmo retorne prximo aos

    valores de base pr-esforo (FIGURA 3a). Essa resposta denominada carga alosttica.

    Inversamente, quando existe a incapacidade do organismo de recuperar-se dos efeitos do

    agente estressor, instaura-se a sobrecarga alosttica. Seria essa ltima que comprometeria o

    desempenho e a sade do atleta, repercutindo em respostas como infeces, sndromes de

    supertreinamento, amenorria, distrbios do sono ou apetite ou mesmo leses (FIGURA 3b).

  • 12

    Na figura, EG = energia disponvel; EI = energia necessria para manter as funes fisiolgicas e atividades inerentes sobrevivncia; EE = energia mnima requerida para manter a alostase do organismo. Na imagem 1a, EG aumenta no vero, ao passo que EI e EE apresentam comportamento inverso. A exposio a algum agente estressor desencadeia uma carga alosttica (E0), que no compromete o funcionamento do organismo. Na figura b, a sobrecarga alosttica ultrapassa EG, propiciando o surgimento de doenas. Modificada de MCEWEN e WINGFIELD, 2003.

    FIGURA 3 - Ilustrao do comportamento alosttico do organismo durante o ano.

    No entanto, o comportamento alosttico do organismo no um simples mecanismo de

    dose-resposta, e por isso o exerccio fsico no estruturado apenas sobre tal preceito. As

    diversas variveis que interferem na adaptao e recuperao do organismo no permitem

    estabelecer consenso sobre como conduzir a sesso de esforo ou o treinamento fsico.

    Por exemplo, ABBISS et al. (2006) submeteram ciclistas a dois protocolos de 180 km,

    simulando a maratona ironman da Austrlia, sendo que um grupo pedalava a favor enquanto

    outro pedalava contra o vento. Esperava-se que houvesse reduo no desempenho dos atletas

    pedalando contra o vento, pois conforme descrito anteriormente, a resistncia do ar constitui a

    maior fora resistiva exercida sobre o ciclista.

    No entanto, apesar de no descreverem diferenas significativas para a potncia

    externa (239 25 vs 203 20 W), cadncia (89 6 vs 82 8 rpm) e velocidade (36,5 0,8 vs

    33,1 0,8 km . h-1) em relao direo do vento, constatou-se maiores valores de desvio-

    padro para o torque (6,8 1,6 vs 5,8 1,3 N.m) e velocidade (2,1 0,5 vs 1,6 0,3 km.h-1)

    contra o vento comparado a favor do vento.

  • 13

    A alterao na condio ambiental resultou em maior variao da velocidade e torque,

    mas no comprometeu o desempenho dos atletas. Entretanto, por que a maior variabilidade do

    torque e da velocidade auxiliaria na manuteno do desempenho? possvel que a maior

    variabilidade dessas variveis reduzisse o estresse fisiolgico inerente ao exerccio fsico ou

    tornasse o indivduo mais econmico? O indivduo poderia se tornar mais econmico numa

    nica sesso de esforo ou demandaria maiores perodos de treinamento?

    As respostas permanecem desconhecidas, porm indivduos expostos ao treinamento

    fsico prolongado demonstram algumas alteraes que podem influenciar na economia de

    movimento. Por exemplo, HOPKER, COLEMAN e WILES (2007) submeteram 32 ciclistas,

    divididos igualmente em treinados e recreacionais a um protocolo de esforo em

    cicloergmetro, consistindo de dois testes a 50 e 60% da potncia mecnica mxima

    individual e na potncia absoluta de 150 W. Durante os testes, analisou-se o VO2 e

    quantificou-se o trabalho mecnico para obteno da EG.

    Os atletas treinados demonstraram valores superiores de EG comparado aos

    sedentrios (5,1% para intensidade fixa de 150 W, 8,8 e 8,9% para as intensidades a 50 e 60%

    da potncia mecnica mxima individual, respectivamente). Portanto, claramente os atletas

    apresentavam maior economia de movimento, mesmo quando a carga era determinada de

    modo relativo potncia mecnica mxima. Alm disso, quanto maior a intensidade de

    esforo, maior era a discrepncia entre treinados e sedentrios considerando a economia de

    movimento.

    Contudo, no estudo de HOPKER, COLEMAN e WILES (2007) a cadncia de pedal

    no foi fixada, observando diferena significativa entre os atletas e sedentrios (94 6 rpm vs

    69 4 rpm). WOOLFORD, WITHERS, CRAIG, BOURDON, STANEF e MCKENZIE

    (1999) demonstraram que a cadncia de pedal poderia influenciar na economia de movimento

    dos ciclistas, principalmente em funo do padro de recrutamento de unidades motoras,

    sendo que maiores cadncias repercutem em maior recrutamento de fibras do tipo II

    (ETTEMA, 200).

    Conforme demonstrado por KRUSTRUP, FERGUSON, KJAER e BANGSBO (2003)

    in vitro, fibras tipo II parecem ser mais eficientes em termos bioenergticos. Alm disso,

    maiores cadncias reduziriam a fora aplicada sobre cada ciclo de pedal, diminuindo a fadiga

    promovida pelo esforo fsico.

  • 14

    Nesse sentido, a maior economia dos atletas treinados que adotavam maiores cadncias

    de pedal os tornariam mais econmicos em funo do maior recrutamento de fibras tipo II. No

    entanto, controvrsias existem a respeito do tipo de fibra mais eficiente, pois diversos

    trabalhos relatam que h um menor custo metablico em ciclistas que apresentam maior

    porcentagem de fibras tipo I (PRINGLE, DOUST, CARTER, TOLFREY, CAMPBELL &

    JONES, 2003; MOGENSEN, BAGGER, PEDERSEN, FERNSTROM & SAHLIN, 2006).

    Num outro estudo, realizado por PALMER et al. (1999) seis ciclistas desempenharam

    dois testes contra-relgio de 20 km em dias separados e com intervalo de 7 dias entre cada

    teste. O primeiro teste foi realizado adotando uma intensidade dinmica, sendo cinco sesses

    de 20 minutos a 40 e 85% do VO2pico, separado por um intervalo de 10 minutos, onde os

    atletas mantinham uma potncia externa correspondente a 65% do VO2pico. No segundo teste,

    os atletas percorriam novamente 20 km, porm na potncia mdia do teste dinmico, ou seja,

    65% do VO2pico (232 44 W).

    Apesar de PALMER et al. (1999) imporem a intensidade de esforo em ambas as

    situaes, o exerccio intermitente promoveu menor depleo de glicognio muscular

    comparado ao constante (74 17 vs. 102 10 mM/kg). Alm disso, a solicitao das fibras

    tipo I e II apresentou comportamento distinto, sendo que na tarefa intermitente a depleo de

    glicognio muscular foi superior nas fibras tipo II (20% vs. 15%) e inferior nas fibras tipo I

    (59% VS. 98%), comparado ao exerccio constante.

    Logo, a tarefa executada de modo dinmico resultou em maior mobilizao de

    glicognio muscular, sobretudo em funo do padro de recrutamento empregado para realizar

    a tarefa. Possivelmente, ao longo da tarefa as fibras de contrao rpida e lenta apresentam

    prejuzo na eficincia contrtil das pontes cruzadas de miosina de forma distinta (BARCLAY,

    1996).

    BARCLAY (1996) submeteu o msculo sleo (fibra lenta) a um protocolo de fadiga

    que consistia em trinta sries de contrao isomtrica, com intervalo de 5 s entre cada srie e

    durao da contrao de 1 s, sendo que para o msculo extensor longo do dedo (ELD) (fibra

    rpida) a durao da contrao era de 0.2 s.

    Aps o protocolo de fadiga, observou-se reduo de 15% na eficincia contrtil do

    msculo ELD e 9% para o sleo. Portanto, maior reduo na eficincia contrtil para fibras

    tipo II. Alm disso, houve reduo na curva fora-velocidade para ambos os msculos, sendo

    mais pronunciada nas fibras rpidas.

  • 15

    Na ocasio, sugeriu-se que a fadiga seria resultante da diminuio do pH intracelular,

    acarretando prejuzo na hidrlise de PCr, resultando em menor capacidade de trabalho

    mecnico e maior dissipao de calor. O prejuzo na hidrlise de PCr reduziu a velocidade de

    relaxamento da fibra, que por sua vez modificou a curva fora-velocidade, prejudicando

    inclusive a contrao subseqente. Possivelmente o menor pH e o prejuzo na hidrlise de PCr

    tambm reduziria a recaptao de Ca++, prejudicando o relaxamento das estruturas contrteis e,

    portanto, a contrao subseqente (BARCLAY, 1996; ALLEN, LAMB & WESTERBLAD,

    2008).

    Possivelmente, o exerccio desempenhado de modo dinmico promoveu maior

    alternncia no recrutamento de unidades motoras, mas no foi suficiente para reduzir a fadiga

    e os processos por ela desencadeados, elevando a reduo do pH celular, o prejuzo na

    hidrlise de PCr e a menor recaptao de Ca++. Consequentemente haveria maior reduo da

    eficincia contrtil dos msculos envolvidos na tarefa.

    A hiptese da maior reduo na eficincia contrtil apresentada por BARCLAY

    (1996), associado aos resultados apresentados por PALMER et al. (1999) parecem suportar

    evidencias de maior demanda metablica durante exerccios que apresentam variabilidade da

    intensidade. Contudo, deve haver uma amplitude de variao tima, de modo que situaes

    que promovessem variaes superiores ou inferiores a esse valor crtico desencadeariam maior

    estresse fisiolgico e prejuzo ao desempenho.

    O prprio treinamento fsico parece obedecer a uma lgica similar, pois a periodizao

    das sesses, as cargas, o volume, a intensidade de exerccio e at mesmo o perodo de

    recuperao apresentam certa variabilidade.

    Analisando volume e frequncia de treinamento em nvel mundial, ciclistas de estrada

    percorrem anualmente cerca de 35.000 km, com uma frequncia semanal de 5 8 vezes, ao

    passo que ciclistas treinados possuem uma frequncia semanal de 2 a 3 vezes, percorrendo

    cerca de 18.000 km por ano. Maiores detalhes podem ser obtidos na tabela 1 abaixo.

  • 16

    TABELA 1 - Classificao dos ciclistas considerando as caractersticas do treinamento e os

    anos de experincia dos ciclistas.

    Categoria Treinado Amador Elite Classe mundial

    Frequncia semanal 2 a 3 3 a 7 5 8 5 8

    Durao da sesso (min) 30 60 60 240 60 360 60 360

    Experincia (anos) 1 3 a 5 5 a 15 5 a 30

    Competies (anual) 0 a 10 0 a 20 50 a 100 90 a 110

    Modificado de JEUKENDRUP, CRAIG e HAWLEY (2000).

    Usualmente o treinamento do ciclista (amador ou profissional) subdivido em perodo

    bsico, evoluo e polimento, e nos trs momentos existe incrementos e depresses da

    frequncia, volume e intensidade do exerccio para garantir uma carga alosttica adequada.

    Especificamente, o perodo bsico composto por grandes volumes e intensidade

    moderada. Geralmente essa intensidade estabelecida a partir de um teste mximo

    progressivo. A partir disso, utilizando algum marcador fisiolgico de desempenho como

    VO2max, Lim2 ou ainda a FC correspondente a algum desses parmetros, estabelece-se a

    intensidade da sesso de treinamento (FARIA, PARKER & FARIA, 2005a). Nesse primeiro

    momento, o maior incremento ocorre no volume.

    Quando no mais possvel aumentar o volume, inicia-se um incremento na

    intensidade do exerccio. Nesse perodo o atleta ingressa na segunda fase do treinamento, a

    evoluo. Essa fase iniciada prximo s competies menos importantes, sendo que nesse

    momento o treino intermitente comea a ficar mais presente na rotina do atleta.

    O treinamento intermitente realizado prximo ou mesmo supra VO2max (FARIA,

    PARKER & FARIA, 2005a) e resulta em aumento, tanto da capacidade quanto da potncia

    aerbia. Dentre as principais adaptaes associadas a esse tipo de treinamento, podemos

    destacar a maior oxidao de cidos graxos e reduo no uso de carboidratos, maior atividade

    de enzimas oxidativas e glicolticas e menor prejuzo ocasionado por fadiga.

  • 17

    DUPONT, BLONDEL, LENSEL e BERTHOIN (2002) demonstraram que mesmo o

    treinamento intermitente supra VO2max, com uma razo esforo pausa de 15 s, promoveu

    melhora da potncia aerbia mxima e do tempo que o indivduo suportava no TLim[VO2max].

    Portanto, o uso do treino intermitente parece ser interessante e deve compor uma parcela

    significativa do programa do atleta.

    A fase final, denominada polimento, seria uma diminuio sistemtica tanto no volume

    quanto na intensidade de exerccio. ATKINSON, DAVISON e NEVILL (2005) sugeriram que

    atletas bem treinados parecem obter maiores ganhos com uma reduo exponencial da

    intensidade do esforo, ao passo que fisicamente ativos se beneficiam de uma reduo linear.

    Os autores sugerem ainda que incluir pelo menos um dia por semana sem nenhum tipo de

    exerccio fsico e reduzir cerca de 80% da carga de treinamento seria suficiente para promover

    20% de melhora no desempenho esportivo de um atleta. Um exemplo anual de treinamento e

    conseqente reduo da intensidade de esforo apresentado na figura 4.

    Modificada de ATKINSON et al. (2003); sendo que descreve um ciclistas amador e um ciclista profissional.

    FIGURA 4 - Distribuio da potncia externa durante o perodo de treinamento fsico do

    atleta.

  • 18

    Alm de potencializar o desempenho dos atletas, o treinamento periodizado tambm

    reduz a probabilidade de distrbios relacionados ao excesso de exerccio. SEILER e

    KJERLAND (2006) propuseram que o treinamento parablico, onde predominam sesses com

    intensidade inferior ao primeiro limiar metablico, seguido de intensidades superiores ao

    segundo limiar e por ltimo menores quantidades de trabalho em intensidades entre o Lim1 e o

    Lim2 resultam em melhor desempenho e menor risco de acometimento associado prtica de

    exerccio fsico comparado ao treinamento no limiar de lactato (FIGURA 5).

    Modificado de SEILER e KJERLAND (2006). A figura a esquerda descreve o treinamento baseado no limiar de lactato. A figura direita o treinamento polarizado.

    FIGURA 5 - Modelo de treinamento fsico para modalidades predominantemente aerbias.

    Portanto, tanto a sesso de exerccio quanto o treinamento periodizado deve estar

    fundamentados em preceitos fisiolgicos, minimizando o risco de acometimentos dos atletas.

    So evidenciados entre os ciclistas leses e sintomas como: (i) sndrome patelofemoral, (ii)

    hiperatividade simptica, (iii) distrbios de sono e apetite, (iv) reduo da FCmax, (v)

    distrbios hormonais, principalmente elevao de hormnios estressores como cortisol e

    catecolaminas, (vi) transtornos de ansiedade e depresso (FARIA, PARKER & FARIA,

    2005a).

    A FC e os parmetros obtidos a partir do sistema nervoso autnomo cardaco parecem

    fornecer indcios de hiperatividade simptica, que por sua vez estaria relacionado a distrbios

    hormonais, do sono ou apetite. Portanto, alm de no exigir recursos sofisticados e onerosos,

  • 19

    sua utilizao no exige um ambiente laboratorial estril. Por isso, pesquisas dirigidas para

    melhor compreenso do comportamento de indicadores do sistema autonmico cardiovascular

    podem contribuir para reduzir os acometimentos promovidos pelo exerccio exacerbado, alm

    de auxiliar na prescrio e controle da sesso de esforo.

    3.4 Regulao da estratgia de prova: bioenergtica e complexidade

    Embora existam inmeras possibilidades de EP, quatro modelos gerais tm sido

    descritos na literatura (FIGURA 6). Em linhas gerais, tarefas de longa durao em

    modalidades como ciclismo e corrida usualmente iniciam a prova em um ritmo que

    superestima a demanda metablica, seguido de uma reduo como forma de poupar energia e,

    finalmente, h uma elevao da velocidade ou da potncia. Inclusive, o sprint final do atleta

    pode ser superior a intensidade inicial, garantindo que a fadiga exacerbada ocorra apenas no

    final do percurso (RAUCH, ST CLAIR GIBSON, LAMBERT & NOAKES, 2005). Essa EP

    usualmente denominada estratgia parablica (FIGURA 6d).

    Por exemplo, FOSTER, HOYOS, EARNEST e LUCIA (2005) observaram que todos

    os indivduos adotavam uma EP parablica no ciclismo, ao passo que no kaique BISHOP,

    BONETTI e DAWSON (2002) observaram que remadores iniciavam o trajeto em maior

    velocidade e a reduziam linearmente em funo do tempo (FIGURA 1a). Considerando que na

    maior parte dos eventos os atletas possuem experincia, caractersticas fsicas e fisiolgicas

    semelhantes, e que a modulao da EP seja, em parte, dependente dessas variveis, muito

    provvel que haja similaridades do ritmo de prova entre os atletas numa mesma competio.

  • 20

    Na figura, as estratgias de prova denominam-se 6 a = tudo / nada, 6 b = incio lento, 6 c = contnuo e 6 d = parablica. Modificada de ST CLAIR GIBSON, LAMBERT, RAUCH, TUCKER, BADEN, FOSTER e NOAKES (2006).

    FIGURA 6 - Descrio das principais estratgias de prova adotadas em modalidades

    modalidade esportiva predominantemente aerbias.

    A determinao da EP durante uma tarefa tem sido atribuda a fatores centrais

    (GUNNAR & QUEVEDO, 2007), perifricos (ALLEN, LAMB & WESTERBLAD, 2008) ou

    ambos (NOAKES, ST CLAIR GIBSON & LAMBERT, 2005). Todavia, a investigao do

    tema torna-se demasiadamente complexa em funo da ausncia de tecnologia capaz de

    esclarecer os mecanismos que interferem na modulao da EP pelo indivduo.

    Algumas pesquisas orientadas a questo tem apresentado resultados curiosos e inserido

    novas questes sobre o assunto. Por exemplo, BILLAT et al. (2006) solicitaram a corredores

    profissionais (VO2max 60,5 4,9 ml.kg-1.min-1) que percorressem 10 km no menor tempo

    possvel, dando autonomia para determinarem a EP. Posteriormente, os atletas realizaram o

    mesmo percurso na velocidade mdia individual, calculada a partir da prova anterior.

    Verificou-se que o VO2 (53 4 vs 48 5 ml.kg-1.min-1), o percentual do VO2max

    (87,4% 8,2% vs 78,8% 8,7%), o [Lac] de recuperao (7,5 1,0 vs 6,6 0,9 mM) e a

  • 21

    FCmax (169 14 bpm vs 165 13) apresentavam valores superiores no protocolo de

    velocidade constante comparado corrida de ritmo variado.

    A concluso foi de que as informaes fisiolgicas ignoradas durante a corrida em

    velocidade constante resultaram em maior estresse do sistema cardiorrespiratrio, evidenciado

    a importncia da EP para reduzir a demanda metablica e garantir a concluso da tarefa. Visto

    que o tempo requerido para completar a tarefa, distncia e as condies ambientais eram

    similares, possvel que a EP dinmica fizesse com que os indivduos realizassem a tarefa de

    modo mais econmico, expresso pelo menor percentual do VO2max, resultando em menor

    VO2 e FC.

    Outras evidncias tambm apontam indcios de maior estresse fisiolgico quando a

    tarefa imposta por agentes externos. LANDER, BUTTERLY e EDWARDS (2009)

    verificaram que a EP constante comparado a EP autnoma promoveu maiores valores para

    temperatura corporal (38,7 0,3 vs. 38,5 0,2 C), [Lac] ps-esforo (6,2 2,5 vs. 5,2 2,2

    mM) e resposta eletromiogrfica integrada.

    Possivelmente, o fato de impor um ritmo de prova promoveria maior estresse e

    conseqentemente maior elevao da atividade simptica acarretando maior liberao de

    catecolaminas plasmticas. Por sua vez, a elevao srica dessas substncias aumentariam a

    atividade lipoltica, resultando em menor eficincia mitocondrial e maior estresse

    cardiovascular.

    FERNSTROM, BAKKMAN, TONKONOGI, SHABALINA,

    ROZHDESTVENSKAYA, MATTSSON, ENQVIST, EKBLOM e SAHLIN (2007)

    observaram que ultramaratonistas apresentavam prejuzo na funo mitocondrial aps 24 h de

    exerccio fsico a 60% do VO2max em funo da elevao srica de cidos graxos livres.

    Resumidamente, os atletas recebiam a mesma dieta 3 dias antes do teste, que consistia em 52%

    de carboidrato, 31% de lipdios e 18% de protenas e, na noite anterior ao teste, permaneciam

    em jejum para que na manh seguinte executassem 24 h de exerccio fsico. Esse ltimo

    consistia de 12 blocos subdivididos em 4 blocos de corrida, kaique e ciclismo. Cada bloco

    tinha durao de 110 minutos de exerccio separado por um perodo de repouso de 10 minutos.

    Durante a tarefa, foi permitido ingerir uma soluo energtica padronizada (59% de

    carboidrato, 29% de lipdio e 12% de protena).

    A bipsia muscular realizada aps o teste foi utilizada para (i) avaliar a expresso

    protica de UCP3 mitocondrial, translocador dinucleotdeo de adenina e cadeia pesada de

  • 22

    miosina; e (ii) isolar a mitocndria contida nos msculos envolvidos na tarefa. Depois de

    isoladas, as mitocndrias foram submetidas a duas solues distintas para avaliar a atividade

    respiratria. A primeira continha 10 M de palmitoil carnitina e 2 mM de malato, ao passo que

    a segunda soluo continha 5 M de palmitoil carnitina e 4 mM de piruvato.

    A eficincia da fosforilao oxidativa (razo P/O) foi estimada pela quantidade de

    ADP dividido pelo VO2 mitocondrial. Alm disso, amostras de sangue foram coletadas nos

    ltimos 15 minutos de exerccio e 24 h aps o esforo fsico para anlise da concentrao de

    cidos graxos.

    Dentre os principais resultados, verificou-se elevao substancial de cidos graxos

    sanguneo, que perdurou por aproximadamente 24 h aps a concluso do esforo.

    Supostamente, essa elevao seria desencadeada por um aumento de catecolaminas

    plasmticas, resultando em maior atividade lipoltica. Concomitantemente, observou-se maior

    oxidao lipdica e menor eficincia mitocondrial.

    A reduo na eficincia mitocndrial acompanhada de elevao na concentrao srica

    de cidos graxos e peroxidao lipdica poderia aumentar a produo de EROs, que por sua

    vez induziria a elevao da expresso de protena desacopladora 3 (UCP3), aumentando o

    vazamento de prtons na tentativa de reduzir o estresse oxidativo. Assim, o prejuzo na

    eficincia bioenergtica seria um mecanismo protetor contra a peroxidao lipdica

    (FERNSTROM et al., 2007). A figura 7 descreve o comportamento da cadeia transportadora

    de eltrons durante o repouso (estado 4) e o exerccio (estado 3).

  • 23

    No estado mitocondrial de repouso (estado 4) h uma alta presso de O2 e reduzida taxa de fluxo de eltrons na cadeia mitocondrial, aumentando a produo de EROs (figura 7a). Por outro lado, a maior atividade mitocondrial (estado 3) resulta em queda na presso de O2 e elevao na taxa de fluxo de eltrons, acarretando menor produo de EROs (figura 7b). Durante o exerccio fsico intenso, a mitocndria assume o estado 3. Modificado de (BARJA, 2007).

    FIGURA 7 - Representao da cadeia transportadora de eltrons mitocaondrial na situao de

    repouso (estado 4) e exerccio (estado 3).

    Considerando que no estudo de BILLAT et al. (2006) o trabalho mecnico total e a

    potncia/velocidade foi similar, possvel que situaes onde o indivduo capaz de impor

    sua prpria EP resulte em menor estresse fisiolgico, especificamente no sistema

    cardiorrespiratrio e maior eficincia bioenergtica. Assim, o menor VO2 e FC verificado

    quando os indivduos modulavam de forma autnoma a EP poderia ser resultado de mudanas

    na eficincia mitocondrial, promovendo menor VO2 sistmico.

    Por outro lado, recentes teorias tm atribudo a fatores centrais a modulao da EP

    durante competies de longa durao, sobretudo indicando o sistema nervoso central (SNC)

    como regulador/integrador de todos os processos fisiolgicos, psquicos e ambientais.

  • 24

    Mecanismos corticais e subcorticais integrados a periferia corporal e ao ambiente

    seriam responsveis pela antecipao da exausto durante o esforo, garantindo a execuo da

    tarefa sem acarretar riscos vida. Primeiramente, mecanismos de controle atuariam

    previamente ao esforo, considerando informaes como caractersticas do evento e do

    ambiente, nvel de experincia e condies fisiolgicas do organismo.

    Durante a realizao do esforo, a regulao ocorreria via feedbacks aferentes

    (metablicos, mecnicos, pressricos), enviando informaes da periferia corporal ao SNC,

    que adicionaria as informaes sobre ambiente, caractersticas da prova e do indivduo para

    modular o padro de recrutamento motor dos msculos envolvidos na tarefa (ST CLAIR

    GIBSON et al., 2006). Desse modo, o indivduo seria capaz de modificar continuamente a EP

    para assegurar a concluso da prova (NOAKES, ST CLAIR GIBSON & LAMBERT, 2005).

    Informaes previamente ao inicio do esforo que fornecessem parmetros como

    durao e/ou distncia, associada experincia do indivduo e as condies fisiolgicas e

    psicolgicas do atleta modulariam uma EP padro, sendo esse processo denominado

    teleantecipao (ALBERTUS, TUCKER, ST CLAIR GIBSON, LAMBERT, HAMPSON &

    NOAKES, 2005).

    Durante o exerccio, vias aferentes sinalizariam ao SNC as mudanas fisiolgicas no

    organismo, permitindo ao indivduo ajustar-se para garantir a concluso da tarefa no menor

    tempo possvel. A figura 8 esboa o provvel mecanismo.

  • 25

    Na imagem, (A) descreve a teleantecipao envolvendo ambiente, condies fisiolgicas e psicolgicas do organismo; (B) seria a modulao inicial da intensidade de esforo considerando o perodo restante para concluir a tarefa; (C) elaborao da PSE de referncia; (D e F) mensagens aferentes so enviadas para o SNC para serem processadas considerando o perodo restante para concluir a tarefa; (E) e modularem a PSE consciente; (G) A PSE consciente equiparada a PSE de referncia; (H) a intensidade do esforo modificada periodicamente modulando o padro de recrutamento motor para garantir a concluso da tarefa. Modificada de TUCKER (2009).

    FIGURA 8 - Caracterizao dos mecanismos envolvidos na elaborao e controle da estratgia

    de prova.

    Assumindo que a teleantecipao implica em memria e que os centros envolvidos

    com memria esto localizados nos ncleos da base e regies corticais (ATKINSON et al.,

    2007; BEAR, CONNORS & PARADISO, 2008), possvel que a EP seja previamente

    programada de forma inconsciente e, durante a tarefa, centros superiores ajustem essa

    programao.

  • 26

    Especificamente, vias aferentes que monitoram as respostas fisiolgicas do organismo,

    tais como frequncia respiratria e cardaca, acidose e taxa metablica, parecem ativar tlamo

    e hipotlamo. Fatores ambientais como temperatura e umidade so processados no crtex

    somatosensorial. J a memria parece envolver hipocampo, amgdala e crtex temporal

    (BEAR, CONNORS & PARADISO, 2008).

    Todas essas regies supostamente envolvidas na teleantecipao seriam encarregadas

    de definir uma EP estvel, ao passo que as vias aferentes sensoriais seriam responsveis pela

    conduo de informaes oriundas de metaborreceptores, barorreceptores, nociceptores,

    termorreceptores e mecanorreceptores que corrigiriam em tempo real a EP, regulando o padro

    de recrutamento motor, repercutindo na velocidade ou a potncia mecnica ao longo da tarefa.

    Portanto, provas de longa durao apresentariam um comportamento cclico de

    estabilizao instabilizao estabilizao que permitiria a concluso da tarefa no menor

    tempo possvel, como representado na figura 9 (ST CLAIR GIBSON et al., 2006).

    Sendo que C corresponde a programao previamente ao inicio do esforo (teleantecipao), ao passo que U reflete os ajustes dependentes de aferncias (comando central). Modificada de ST CLAIR GIBSON et al. (2006).

    FIGURA 9 - Simulao da estratgia de prova e seus mecanismos de regulao durante uma

    tarefa de longa durao.

  • 27

    Evidentemente, todos os processos envolvidos na regulao da EP previamente e

    durante a tarefa so dependentes de informaes inerentes a competio e consolidao dessas

    informaes na memria (GARCIN, DANEL & BILLAT, 2008). Um estudo recente

    descrevendo a importncia de informaes corretas sobre a tarefa na constituio da referncia

    foi realizado por pesquisadores sul-africanos.

    Nesse estudo, MICKLEWRIGHT, PAPADOPOULOU, SWART e NOAKES (2009)

    dividiram a amostra em trs grupos. Todos realizavam a mesma tarefa, que consistia num teste

    contra-relgio de 20 km repetido trs vezes em dias distintos, com um intervalo de 3 a 7 dias

    entre cada sesso. No entanto, havia algumas particularidades entre os testes e entre os grupos.

    O grupo (A) realizava as duas primeiras sesses (CR1 e CR2) sem nenhuma

    informao a respeito da tarefa (durao, distncia, cadncia, velocidade ou potncia). O

    grupo (B) tinha acesso a todas as informaes, descritas de modo correto. O grupo (C) recebia

    informaes incorretas sobre a tarefa. No entanto, o erro era sistemtico para todas as

    variveis (5% maior que os valores reais). Na terceira sesso (CR3) era fornecido a todos os

    grupos informaes corretas sobre a tarefa, em tempo real, no intuito de avaliar a importncia

    da experincia na EP.

    O grupo A (grupo cego) apresentou maiores valores comparando os testes 2 e 3 para

    potncia (135 43 vs 145 54), cadncia (91 9 vs. 87 12) e velocidade mdia (27 4 vs

    28 4); alm de menor durao para concluir a tarefa. Para o grupo C (informaes falsas)

    detectou-se diferena significativa apenas para cadncia mdia (90 11 vs 85 9)

    comparando as situaes 2 e 3. O grupo B, que recebeu informao correta em todas as

    situaes no apresentou diferena entre as sesses.

    Logo, a teleantecipao e a informao correta durante a tarefa associado experincia

    so importantes para o indivduo elaborar a EP, visto que os grupos privados desses

    parmetros modificaram sua EP quando recebiam informao correta. Alm disso, fica

    evidente como a ausncia dessas informaes pode interferir de modo significativo no

    desempenho do atleta.

    Se o desempenho e as respostas cardiorrespiratrias podem ser modificados em virtude

    das informaes sobre a tarefa e EP, possvel que a recuperao fisiolgica do organismo

    tambm apresente comportamento distinto em funo do ritmo empregado previamente

    durante o esforo. Os parmetros autonmicos e cardiovasculares tm sido apontados como

  • 28

    possibilidade para quantificar o estresse fisiolgico e o subseqente perodo de recuperao

    necessrio para uma resposta alosttica adequada.

    3.5 Estresse fisiolgico e recuperao: Aspectos bioenergticos e cardiorrespiratrios

    Estabelecer o perodo de recuperao necessrio para que o atleta esteja apto a receber

    um novo estmulo aps uma sesso de exerccio demasiadamente complexo, em virtude das

    particularidades existentes entre os indivduos e entre as tarefas. Aspectos como clima,

    altitude, tipo de exerccio fsico, volume, intensidade e frequncia do treinamento, experincia,

    ritmo circadiano, dieta, caractersticas morfolgicas, fisiolgicas e psicolgicas influenciam no

    perodo necessrio para recuperao do organismo. Isso justifica a quantidade de investigaes

    orientadas questo, na maioria das vezes controversa (SLUITER, FRINGS-DRESEN,

    MEIJMAN & VAN DER BEEK, 2000; LAC & MASO, 2004; BORRESEN & LAMBERT,

    2008).

    Algumas evidncias apontam que aps a execuo de exerccios aerbios intensos, h

    elevao do VO2 (LAFORGIA, WITHERS & GORE, 2006), maior FC (JAVORKA, ZILA,

    BALHAREK & JAVORKA, 2003) e menor VFC de recuperao (CASTIES, MOTTET & LE

    GALLAIS, 2006; BORRESEN & LAMBERT, 2008) comparado ao perodo previamente a

    tarefa. Algumas vezes, esse quadro pode perdurar por at 24 h (LAFORGIA, WITHERS &

    GORE, 2006).

    Sobre o VO2 de recuperao (VO2rec), h muito descrito sua relao com a durao e

    intensidade do esforo (LAFORGIA, WITHERS & GORE, 2006). Inicialmente, HILL e

    LUPTON (1923) sugeriram que o comportamento exponencial do VO2 de recuperao

    (VO2rec) estaria associado remoo de lactato produzido durante o exerccio. Alguns anos

    mais tarde, essa hiptese foi contestada por MARGARIA, EDWARDS e DILL (1933), que

    descreveram que a cintica do VO2rec seria resultado da refosforilao oxidativa.

    Atualmente, o VO2rec tem sido descrito como resultado de um fenmeno mais amplo,

    associando os dois anteriores a alteraes na temperatura corporal, metabolismo de cidos

    graxos e eficincia mitocondrial. possvel que a reduo na eficincia mitocondrial e a

    maior concentrao sangnea e metabolizao de cidos graxos sejam os responsveis pelo

    maior VO2 de base observado no perodo de recuperao.

  • 29

    Talvez a cintica do VO2rec seja o resultado de diversos fatores expressos numa nica

    varivel. Como proposto por MARGARIA, EDWARDS e DILL (1933), a primeira fase do

    VO2rec corresponderia a refosforilao oxidativa, ao passo que a segunda seria resultante da

    remoo de metablitos e catecolaminas. Finalmente, a terceira fase da cintica do VO2, que

    persistiria por at 24 horas, seria resultante da menor eficincia mitocondrial na tentativa de

    reduzir a peroxidao lipdica no organismo, desencadeando valores de VO2rec superiores aos

    valores de base pr-esforo.

    A cintica de recuperao da FC (FCOFF) apresenta um comportamento similar ao do

    VO2rec (BEARDEN & MOFFATT, 2001), alm de ser uma varivel pouco invasiva, de baixo

    custo financeiro e sensvel a intensidade do esforo (BORRESEN & LAMBERT, 2008).

    Entretanto, os mecanismos envolvidos na FCOFF parecem ser distintos e dependentes,

    inclusive, do SNA.

    A FCOFF assume um comportamento exponencial que pode variar dependendo da

    intensidade do esforo adotada (RUMENIG, BERTUZZI, NAKAMURA, FRANCHINI,

    MATSUSHIGUE & KISS, 2007). Em intensidades acima do Lim2, comumente descrito como

    domnio muito pesado de esforo, a FCOFF pode ser caracterizada por duas fases. A primeira

    (fase rpida) reflete a restaurao da atividade autonmica vagal, ao passo que a fase

    subsequente (fase lenta) reflete a retirada simptica e remoo de catecolaminas e metablitos

    sangneos (JAVORKA et al., 2003).

    Alm da intensidade do esforo, outros fatores como (i) aspectos hemodinmicos,

    estruturais e funcionais cardacos (ACHTEN & JEUKENDRUP, 2003), (ii) fatores inerentes

    ao SNA (GREEN, WANG, PURVIS, OWEN, BAIN, STEIN, GUZ, AZIZ & PATERSON,

    2007), (iii) caractersticas do indivduo, tais como aptido fsica, idade, sexo, e (iv) tipo de

    exerccio e volume de treinamento (AUBERT, SEPS & BECKERS, 2003) podem interferir na

    resposta cintica do ritmo cardaco.

    Por exemplo, HAUTALA, TULPPO, MAKIKALLIO, LAUKKANEN, NISSILA e

    HUIKURI (2001) investigaram o efeito do exerccio fsico prolongado sobre a VFC,

    submetendo 10 esquiadores cross country a um protocolo de 75 km. Analisando a VFC

    previamente, 24 h e 48 h aps a concluso da competio, verificaram que o componente

    espectral de alta frequncia (HF), representativo da resposta autonmica parassimptica, foi

    significativamente inferior no primeiro dia comparado ao perodo anterior ao teste. O

    componente espectral de baixa frequncia (LF), representativo da modulao simptica

  • 30

    (apesar de no haver consenso sobre essa afirmao), apresentou comportamento inverso. No

    segundo dia ps-esforo, houve uma acentuao do componente parassimptico, mas no foi

    suficiente para reduzir a FC em relao aos valores pr-competio.

    Num estudo mais recente, KIVINIEMI et al. (2007) utilizaram a VFC para prescrever o

    treinamento fsico aerbio. No referido artigo, dividiram o grupo em treinamento

    preestabelecido (n = 8), treinamento orientado pela VFC (n = 9) e controle (n = 9);

    submetendo os dois primeiros a 4 semanas de exerccio fsico aerbio. O grupo com o

    programa preestabelecido desempenhava uma sesso semanal de 40 minutos, com intensidade

    moderada (65% da FCmax) e duas de 30 minutos com alta intensidade (85% da FCmax).

    O grupo VFC desempenhou o treinamento baseado na VFC diria, iniciando com

    intensidade moderada (65% da FCmax; 40 min) seguido de alta intensidade (85% da FCmax;

    30 min). Caso a VFC apresentasse reduo do espectro, indicando elevao simptica ou

    retirada vagal, repetia-se o treinamento de intensidade moderada. Se a reduo da VFC

    persistisse, o indivduo permanecia em repouso por at dois dias. Por outro lado, se o exerccio

    de alta intensidade no resultasse em diminuio da VFC, repetia-se o treinamento, seguido do

    exerccio de intensidade moderada.

    O grupo VFC obteve maiores ganhos para o VO2max, Lim2 e componente espectral

    HF da VFC comparado ao grupo periodizado e ao grupo controle, evidenciando que a VFC

    sensvel s respostas desencadeadas pela sesso de esforo.

    Alm disso, utilizando a VFC foi possvel individualizar as cargas e maximizar os

    benefcios promovidos pelo treinamento prolongado. Isso demonstra que tanto para a

    recuperao quanto para a prescrio da sesso de esforo, a VFC pode ser empregada.

    Provavelmente, exerccios aerbios alteraram a resposta autonmica cardaca em

    vrios nveis de regulao. Por exemplo, elevam a excitabilidade dos receptores muscarnicos

    no ndulo sinusal (MCARDLE, KATCH & KATCH, 2003, p. 339); aumentam a eficincia

    contrtil do miocrdio, principalmente em funo da maior liberao, trnsito e recaptao de

    clcio (BUENO, FERREIRA, PEREIRA, BACURAU & BRUM, 2010), promovem alteraes

    estruturais como aumento da cavidade cardaca e hipertrofia miocrdica, repercutindo

    inclusive em reduo da FC durante o repouso, exerccio e acelerando a cintica de

    recuperao.

    Portanto, tanto sesses de exerccio quanto o treinamento fsico prolongado

    desencadeiam modificaes no VO2rec, na FCOFF e VFC. Esses indicadores, sensveis a

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    intensidade e volume de esforo, alm de caractersticas fisiolgicas particulares de cada

    indivduo, poderiam ser utilizados para descrever como a manipulao da EP influencia no

    desempenho e na recuperao desses atletas (AUBERT, SEPS & BECKERS, 2003).

    As alteraes na resposta autonmica cardaca tambm so dependentes da atividade

    do SNC, sobretudo via eixo hipotalmico hipofisrio adrenal (HHA) (SLUITER et al.,

    2000). Alm do SNA, o eixo HHA e as respostas neuroendcrinas por ele desencadeadas

    interferem em diversos fenmenos fisiolgicos, incluindo metabolismo, atividade imunolgica

    e resposta inflamatria (GUYTON & HALL, 2007).

    No SNC, exposio a situaes estressantes promovem liberao de corticotropina em

    regies extra-hipotalmicas, especificamente no terminal estriado do ncleo rubro. Em

    animais, essa regio est associada a transtornos de ansiedade (GRILLON, DUNCKO,

    COVINGTON, KOPPERMAN & KLING, 2007). A liberao de corticotropina induz a maior

    atividade do eixo HHA e do SNA simptico, resultando em elevao do cortisol, presso

    sangunea e FC (GRILLON et al., 2007).

    O cortisol pode ainda potencializar a ao de corticotropina no ncleo rubro, excitando

    as respostas comportamentais associadas ao estresse, como alerta, ansiedade ou medo

    (GRILLON et al., 2007). Essas emoes so largamente observadas entre os atletas em

    eventos competitivos, principalmente previamente ao incio do evento.

    No metabolismo de substratos, o cortisol previne a reesterificao de cidos graxos

    (URHAUSEN, GABRIEL & KINDERMANN, 1995), que como citado anteriormente,

    apresenta elevao em virtude da maior atividade catecolaminrgica sobre os adipcitos

    (FERNSTROM et al., 2007). Alm disso, atua no catabolismo protico e na gliconeognese

    heptica, favorecendo a manuteno da glicmica, igualmente importante durante o esforo

    (URHAUSEN, GABRIEL & KINDERMANN, 1995).

    importante destacar que exerccios com intensidade superior a 60% do VO2max e

    executados por mais de 20 minutos so suficientes para promover elevao do cortisol

    sanguneo (URHAUSEN, GABRIEL & KINDERMANN, 1995) e as repostas fisiolgicas

    supracitadas. Contudo, intensidades inferiores a 60% do VO2max sustentadas por longos

    perodos e que resultem em mudanas na glicemia tambm so capazes de induzir a elevao

    de hormnios contrarregulatrios (SLUITER et al., 2000). Tarefas de curta durao e

    intensidade elevada tambm promovem elevao srica de cortisol.

  • 32

    Nesse sentido, os mecanismos desencadeadores parecem ser dependentes de acidose

    metablica (DUCLOS, CORCUFF, RASHEDI, FOUGERE & MANIER, 1997).

    Provavelmente quimiorreceptores perifricos sinalizariam ao SNC alteraes no pH celular,

    resultando em liberao de adrenocorticotropina (ACTH), que por sua vez estimularia a

    produo de cortisol (VIRU & VIRU, 2004).

    Portanto, mecanismos centrais corticais e subcorticais, o aparato cardiorrespiratrio e a

    periferia do organismo se integrariam para promover uma carga alosttica que mantivesse a

    glicemia estvel, mobilizando AGL como substrato energtico e estimulando o crtex motor e

    o SNA simptico para promover o recrutamento de unidades motoras dos msculos inerentes a

    tarefa e elevar as respostas inotrpicas e cronotrpicas cardacas. Subsequentemente deveria

    haver um perodo para que essas respostas retornassem prximo aos valores de base,

    prevenindo uma sobrecarga alosttica e conseqente reduo do desempenho.

    Possivelmente, os ndices obtidos a partir da anlise indireta do comportamento do

    SNA cardaco esclaream algumas questes referentes a esses processos descritos acima,

    sendo importante abordamos as particularidades da regulao cardaca.

    3.6 Sistema nervoso autnomo e central: Conexes para o controle cardiovascular

    O SNA constitui uma complexa rede de neurnios e gnglios re