universidade fumec mestrado acadêmico em administração

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UNIVERSIDADE FUMEC MESTRADO ACADÊMICO EM ADMINISTRAÇÃO INTEGRAÇÃO DO IFMG: CENTRALIZAÇÃO, DESCENTRALIZAÇÃO E DESCONCENTRAÇÃO OLÍMPIA DE SOUSA MARTA Belo Horizonte 2012

Author: trankhuong

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  • UNIVERSIDADE FUMEC

    MESTRADO ACADMICO EM ADMINISTRAO

    INTEGRAO DO IFMG: CENTRALIZAO, DESCENTRALIZAO E

    DESCONCENTRAO

    OLMPIA DE SOUSA MARTA

    Belo Horizonte

    2012

  • OLMPIA DE SOUSA MARTA

    INTEGRAO DO IFMG: CENTRALIZAO, DESCENTRALIZAO E

    DESCONCENTRAO

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-

    Graduao Mestrado Interinstitucional

    Acadmico em Administrao MINTER -

    FUMEC/IFMG da Universidade FUMEC como

    requisito parcial para obteno do ttulo de

    Mestre em Administrao.

    Orientador: Prof. Dr. Daniel Jardim Pardini

    rea de Concentrao: Gesto Estratgica das

    Organizaes.

    Linha de Pesquisa: Estratgia em Organizaes

    e Comportamento Organizacional.

    Belo Horizonte

    2012

  • Ficha Catalogrfica

    Elaborada por Olvia Soares de Carvalho. CRB/6: 2070

    Marta, Olmpia de Sousa. M375i Integrao do IFMG: centralizao, descentralizao e 2012 desconcentrao. / Olmpia de Sousa Marta ; Orientador, Daniel Jardim Pardini. -- 2012.

    111f. : il. ; 30 cm.

    Dissertao (mestrado) Universidade FUMEC. Faculdade de Cincias Empresariais, 2012.

    Inclui bibliografia.

    1. Desenvolvimento organizacional Estudo de casos. 2. Empresas Fuso e incorporao - Estudo de casos. I. Pardini, Daniel jardim. II. Universidade FUMEC. Faculdade de Cincias Empresariais. III. Ttulo.

    CDU: 65.011.8

  • PARA

    Benedito (meu pai)

    Di de tanto medir a distncia,

    saber que no vou te tocar,

    alm da lembrana.

    A tua falta sol sem calor.

    Est aqui, mas se foi.

    Virou estrela, a nossa estrela no cu.

    BETO GUEDES

    Geralda (minha me)

    Foste fiel aos meus passos e tropeos e fizeste,

    fizeste com que eu acreditasse em recomeos,

    levantando-me das quedas quando eu s sabia

    cair dos sonhos. ALUSIO SANTIAGO JNIOR

    Roberto, Rosilene, Sebastiana, Bernadete e

    Ronaldo (meus irmos)

    Do que posso lembrar era uma tarde antiga dentro

    de outra tarde, em que aquecamos a nossa

    infncia num pequeno tapete e almofadas de l,

    perto da caixa de surpresas... ALUSIO SANTIAGO JUNIOR

    Gilberto (meu namorado)

    Minha vida, nossas vidas

    formam um s diamante CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

  • AGRADECIMENTOS

    A gratido no nos tira nada, ela dom em

    troca, mas sem perda e quase sem objeto. A

    gratido nada tem a dar, alm do prazer de

    ter recebido.

    ANDR COMTE-SPONVILLE

    Deus, pela onipresena em minha vida, dando-me sade, pacincia

    e a vitria de chegar aqui.

    Anjos de Deus que intercederam pelas minhas necessidades e

    aflies.

    Professor Daniel Pardini, pela pacincia e competncia

    profissional durante a orientao.

    Gestores do IFMG, pela iniciativa do projeto em parceria com a

    FUMEC.

    Prof. Neimar, pelo incentivo e contribuio.

    Direo do campus Ouro Preto, pelo espao cedido para o curso

    dos crditos e pelas caronas nos finais de semana.

    Direes dos campi Ouro Preto e So Joo Evangelista, que

    abriram as portas para a coleta dos dados, bem como cederam

    espao e documentao para que as anlises fossem realizadas.

    Servidores que, gentilmente, concederam entrevistas. Obrigada!

    Colegas de Ouro Preto, pelo acolhimento, carinho e ateno (os

    cafezinhos, os biscoitinhos e muito mais...).

    Pedro Paulo e Mnica, que partiram, antes da ltima estao,

    deixando-nos a saudade e a tristeza dos seus lugares vazios.

    Colegas do mestrado, obrigada por me suportaram por um ano.

    Em especial Naliana, pelas noites em que dividimos pousada e

    pelas ricas conversas de final de dia e noite adentro.

    queles a quem considero meus amigos, por acreditarem em

    mim.

    Todas as pessoas que me prestaram socorro no desespero pela

    busca de dados.

  • A sabedoria gerencial comea com a conscincia

    de que no h um sistema timo de administrar.

    TOM BURNS

  • RESUMO

    Com o objetivo de analisar os movimentos de centralizao, descentralizao e

    desconcentrao para identificar suas vantagens e desvantagens nos processos de mudana

    organizacional, este estudo focou a criao do Instituto Federal de Educao, Cincia e

    Tecnologia de Minas Gerais IFMG, a partir da fuso de trs antigas autarquias: Centro

    Federal de Educao Tecnolgica de Ouro Preto, Centro Federal de Educao Tecnolgica

    de Bambu e Escola Agrotcnica Federal de So Joo Evangelista. Para relatar a evoluo

    organizacional das instituies analisadas, utilizou-se o estudo de casos mltiplos,

    aplicando-se os componentes do tringulo de Pettigrew (1973) como mtodo de anlise

    dos dados. Ao final, apurou-se que a maior desvantagem da gesto do IFMG a

    morosidade decorrente da centralizao de determinadas atividades administrativas vitais

    ao pleno funcionamento dos campi. Constatou-se que tais atividades eram realizadas nas

    antigas autarquias, apontando as consequncias da perda de autonomia pelos campi. As

    opinies divergem entre a ampliao da desconcentrao, pelo monitoramento constante

    das atividades e a implantao de sua efetiva descentralizao. Embora a maioria dos

    entrevistados atestem que a administrao adotada pelo IFMG descentralizada, as

    discusses revelaram a presena da centralizao e da desconcentrao, atestando um

    modelo gerencial de perfil misto, ou seja, uma gesto ao mesmo tempo centralizada,

    descentralizada e desconcentrada. Na linha dos conceitos de centralizao,

    descentralizao e desconcentrao, concluiu-se que no vivel gesto do IFMG adotar

    o processo gerencial puramente descentralizado, tendo em vista tratar-se de uma instituio

    formada por vrias unidades administradas por vrios gestores locais, mas com apenas um

    gestor responsvel pela prestao de contas das aes realizadas o reitor. Sendo assim, o

    controle por parte da gesto central necessrio, como tambm necessria a

    desconcentrao ou descentralizao do maior nmero possvel de aes, de forma a

    garantir o atendimento s demandas dos campi. Os resultados ora alcanados atestam que

    os dois anos de existncia do IFMG no representam tempo suficiente para avaliar as

    vantagens e desvantagens dos processos que conformam o seu modelo de gesto, e

    sugerem que a implantao do programa Enterprise Resource Planning ERP ir

    aperfeioar o gerenciamento dos processos, tornando o controle mais eficiente. Esta

    pesquisa atuou no sentido de contribuir com o processo gerencial do IFMG, haja vista as

    dificuldades naturais oriundas da unio dessas trs instituies de culturas e tamanhos

    diferentes, todas sadas de um exerccio de autonomia de gerenciamento, dificuldades estas

    consequentemente refletidas no dia-a-dia de suas gestes administrativas.

    Palavras-chave: integrao, IFMG, centralizao, descentralizao, desconcentrao.

  • ABSTRACT

    The focal point of this study is the Federal Institute of Education, Science and Technology

    of Minas Gerais, IFMG. IFMG is a melding of three former learning institutions; the

    Federal Center of Technological Education of Ouro Preto, the Federal Center of

    Technological Education of Bambu, and the Federal Agrotechnical School of So Joo

    Evangelista. This study is an analysis of the movements involving centralization or

    decentralization of this institution and allowed us to identify any strengths or weaknesses

    in the processes affecting organizational change. To better understand the organizational

    development of the IFMG analysis, we used the multiple case study method of applying

    the components of the triangle (Pettigrew: 1973) as a method of data analysis. At the

    conclusion of my analysis, it was clear that the biggest drawback regarding the general

    management of IFMG was the length of time it took to accomplish specific administrative

    activities which are critical to a well-functioning campus; a direct result of the

    centralization of duties. It was discovered that these administrative activities were carried

    out more quickly and efficiently when the campus was managed with a more hands-on and

    autonomous mandate. Because of the complexity of the study, opinions differed regarding

    the expansion of decentralization into the daily operations of the campus and the constant

    monitoring of activities that were required to make decentralization affective. As a group,

    the majority of respondents agreed that the administration model adopted by IFMG was

    being decentralized, but in more personal conversations, the study also revealed a strong

    presence of centralization regarding administration duties and activities. In other words,

    the managerial model had a strong presence of both centralized and decentralized

    mandates; it blurred the lines authority. When studying the dramatic differences between

    centralization, decentralization and devolution of administration models, it became clear

    that it is not feasible to adopt the administration management model of decentralization

    currently in place at IFMG. Today, IFMG is a single institution that is made up of three

    separate entities with numerous on-site managers that are tasked with the daily operation of

    their individual campuses. However, there is only one general manager, the Dean of

    Schools, who is actually accountable for all the actions taken across the three separate

    campuses. The study reveals that either the Dean of Schools needs to relinquish some of

    his authority, or a singular management model of centralization be put in place that

    removes the blurred lines of accountability between upper management of each campus

    and the Dean of Schools for IFMG. Regarding the study itself; it could be debatable if two

    years is sufficient time to collect and analyze the data exposing the advantages and

    disadvantages of the current IFMG management model. I also need to mention that some

    of the findings of this study are already being improved through the implementation of

    processes being initiated by ERP (the Enterprise Resources Planning) group. It is the

    intent of ERP to improve all managerial procedures that would make administrative

    decisions more efficient.

    Keywords: integration, IFMG, centralization, decentralization, deconcentration.

  • LISTA DE FIGURAS

    FIGURA 1 A rede federal no Brasil (situao em dez/2008) .............................. 24

    FIGURA 2 Os institutos federais do Estado de Minas Gerais

    (situao em dez/2008) ..................................................................... 25

    FIGURA 3 Organograma do campus aps a criao dos institutos federais ....... 25

    FIGURA 4 Organograma do IFMG/reitoria (situao em 2011) ....................... 28

    FIGURA 5 Instituto Federal de Minas Gerais IFMG (situao em 2011) ....... 29

    FIGURA 6 Modelo de anlise de Pettigrew ....................................................... 42

    FIGURA 7 Logo do IFMG Campus Ouro Preto ............................................. 53

    FIGURA 8 Logo do IFMG Campus So Joo Evangelista ............................... 66

    FIGURA 9 Logo do IFMG Campus Bambu ................................................... 79

  • LISTA DE QUADROS

    QUADRO 1 Elementos do modelo Pettigrew (1973) ................................ 50

    QUADRO 2 Sntese dos movimentos de centralizao, descentralizao e

    desconcentrao nos processos gerenciais: vantagens e

    Desvantagens ...... ................................................................... 95

    LISTA DE TABELAS

    TABELA 1 Estratificao da amostra por cargo ocupado .................................. 48

  • LISTA DE SIGLAS

    ABNT

    APAE

    Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    Associao de Pais e Amigos Excepcionais

    BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

    CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

    CD Cargo de Direo

    CEAD Centro de Educao Aberta e Distncia

    CEFET Centro Federal de Educao Tecnolgica

    CEFET-OP Centro Federal de Educao Tecnolgica de Ouro Preto

    CF Constituio Federal

    CGPP Coordenao Geral de Produo e Pesquisa

    CGPEX Coordenao Geral de Pesquisa e Extenso

    CGRH Coordenao Geral de Recursos Humanos

    CONIF

    CPA

    Conselho dos Institutos Federais

    Comisso Prpria de Avaliao

    DAP Diretor de Administrao e Planejamento

    DRH Departamento de Recursos Humanos

    EAF Escola Agrotcnica Federal

    EAFB Escola Agrotcnica Federal de Bambu

    EAFSJE Escola Agrotcnica Federal de So Joo Evangelista

    ERP Enterprise Resource Planning (Gerenciamento de Recursos Planejados)

    ETF Escola Tcnica Federal

    ETFOP Escola Tcnica Federal de Ouro Preto

    FAPEMIG Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de Minas Gerais

    FG Funo Gratificada

    IFMG Instituto Federal de Educao, Cincia e Tecnologia de Minas Gerais

    LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    LOA

    MEC

    Lei Oramentria Anual

    Ministrio da Educao

    PAD Processo Administrativo Disciplinar

    PNDE Plano Nacional de Desenvolvimento Econmico

    PROEP Programa de Expanso da Educao Profissional

  • PROPLAN Pr-Reitoria de Planejamento e Oramento

    RH Recursos Humanos

    SETEC Secretaria de Educao Tecnolgica

    SIDEC Sistema Integrado de Descentralizao de Crdito

    SISPLAN Sistema de Planejamento Participativo

    TCU Tribunal de Contas da Unio

    UFOP Universidade Federal de Ouro Preto

    UNED Unidade de Ensino Descentralizada

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ................................................................................................. 15

    1.1 Objetivos ............................................................................................................. 17

    1.1.1 Objetivo geral ...................................................................................................... 17

    1.1.2 Objetivos especficos .......................................................................................... 18

    1.2 Justificativa .......................................................................................................... 18

    1.3 Estruturao textual ............................................................................................. 18

    2 FUNDAMENTAO TERICA ..................................................................... 20

    2.1 Histrico do surgimento e estruturao da educao profissional e

    tecnolgica no Brasil e em Minas Gerais ............................................................. 20

    2.1.1 A criao dos institutos federais de educao, cincia e tecnologia .................. 23

    2.1.2 IFMG: constituio e funcionamento .................................................................. 26

    2.2 Os movimentos de centralizao, descentralizao e desconcentrao no

    processo de mudana em instituies de ensino tecnolgico .............................. 31

    2.2.1 A centralizao ..................................................................................................... 31

    2.2.2 A descentralizao ............................................................................................... 32

    2.2.2.1 A perspectiva constitucional da descentralizao ............................................... 36

    2.2.3 A desconcentrao ............................................................................................... 37

    2.2.3.1 Desconcentrao versus descentralizao ............................................................ 38

    2.2.4 O modelo de Pettigrew ......................................................................................... 42

    3 METODOLOGIA .............................................................................................. 45

    3.1 Tipo de pesquisa quanto abordagem ................................................................. 45

    3.2 Tipo de pesquisa quanto aos fins ......................................................................... 46

    3.3 Tipo de pesquisa quanto aos meios ..................................................................... 46

    3.4 Unidades de observao e sujeitos da pesquisa .................................................. 48

    3.5 Instrumentos de coleta de dados .......................................................................... 49

    3.6 Tratamento e anlise dos dados ............................................................................ 50

    3.7 Anlise de contedo ............................................................................................. 51

    4 ANLISE DE RESULTADOS ......................................................................... 52

    4.1 Campus Ouro Preto .......................................................................................... 53

    4.1.1 Contexto interno ................................................................................................. 53

    4.1.2 Contexto externo .................................................................................................. 55

    4.1.3 Contedo .............................................................................................................. 58

    4.1.4 Processos: centralizao, descentralizao e desconcentrao

    aes e reaes .................................................................................................... 61

    4.2 Campus So Joo Evangelista .......................................................................... 66

    4.2.1 Contexto interno ................................................................................................. 66

    4.2.2 Contexto externo .................................................................................................. 69

    4.2.3 Contedo .............................................................................................................. 71

    4.2.4 Processos: centralizao, descentralizao e desconcentrao

    aes e reaes ..................................................................................................... 73

  • 4.3 Campus Bambu ................................................................................................ 79

    4.3.1 Contexto interno ................................................................................................. 79

    4.3.2 Contexto externo .................................................................................................. 82

    4.3.3 Contedo .............................................................................................................. 84

    4.3.4 Processos: centralizao, descentralizao e desconcentrao

    aes e reaes ..................................................................................................... 86

    4.4 Consolidao dos trs casos ............................................................................... 90

    4.4.1 Contexto interno ................................................................................................... 91

    4.4.2 Contexto externo ................................................................................................... 92

    4.4.3 Contedo ............................................................................................................... 93

    4.4.4 Processos: centralizao, descentralizao e desconcentrao

    aes e reaes ...................................................................................................... 94

    5 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................ 100

    REFERNCIAS ................................................................................................. 103

    APNDICE ..........................................................................................................111

  • 15

    1 INTRODUO

    No momento em que o Brasil vive a implementao da rede de ensino pblico

    federal, cuja proposta abranger todo o pas com unidades de educao tecnolgica, torna-

    se pertinente a realizao de um estudo sobre o tema, com abordagem centrada na

    reestruturao das unidades de ensino tecnolgico, constituda de uma rica e profcua srie

    de aes destinadas a possibilitar maior acesso da populao a esse tipo de ensino.

    Nesse sentido, esta pesquisa abrange, especificamente, a anlise da histria da

    integrao do Instituto Federal de Educao Cincia e Tecnologia de Minas Gerais

    IFMG, e das possveis mudanas ocorridas nas antigas autarquias que se fundiram para

    constitui-lo, transformando-se em seus campi, para melhor compreenso dos movimentos

    das principais decises gerenciais quanto estruturao dessas unidades, focada no

    cumprimento dos objetivos educacionais e administrativos propostos. Com esta

    abordagem, pretende-se contribuir com um modelo estrutural de gesto pblica voltada

    para o ensino.

    Tem-se alguns artigos publicados sobre os institutos federais, mas ainda no se sabe

    de documentos que, alm de mencionar a instituio desses institutos, abordem tambm os

    processos decisrios que definem sua atuao na educao brasileira. Desde a criao das

    escolas de aprendizes e artfices, em 1909, vrias aes foram realizadas com vistas a

    aprimorar o ensino tcnico voltado tanto para a rea industrial como para a agropecuria.

    Foram vrias as transformaes at se alcanar um modelo ideal que atendesse ao ensino

    tcnico profissionalizante da mo de obra. tambm objetivo dos institutos ofertar ensino

    de nvel superior (tecnologias, bacharelados e licenciaturas) e ps-graduao.

    A legislao da educao profissional tecnolgica aponta que o ensino no Brasil se

    desenvolveu de acordo com as necessidades de cada poca. O surgimento da era industrial

    propiciou a criao de cursos tcnicos voltados para a indstria brasileira, pois, at ento, o

    pas possua um perfil exclusivamente agrrio. A Lei de Diretrizes e Bases da Educao

    Nacional LDB de 5.692/71 (BRASIL, 1971) trouxe transformaes no currculo das

    escolas tcnicas, aumentando o nmero de matrculas e oferta de novos cursos.

    Em 1978, a transformao das escolas tcnicas federais do Paran, de

    Minas Gerais e do Rio de Janeiro em Centro Federal de Educao Tecnolgica CEFET

    deu incio a representativas mudanas na educao profissional. Anos mais tarde, vrias

    outras instituies de ensino tcnico e tecnolgico surgiram, ampliando o nmero de

    cursos nessas reas. A partir desses movimentos, comeou a histria dos institutos federais

  • 16

    de educao, cincia e tecnologia, culminando com a sua criao em 29 dezembro de 2008,

    pela Lei n 11.892 (BRASIL, 2008).

    Visando compreender em profundidade tal integrao, empreendeu-se, com este

    estudo, uma breve pesquisa da rede federal de educao tecnolgica, fundamentando-se na

    descrio de seu processo evolutivo, no Brasil e em Minas Gerais, e na anlise da

    formao do IFMG, um de seus importantes componentes.

    Assim, pautada no objetivo de analisar os movimentos de centralizao,

    descentralizao e desconcentrao e as vantagens e desvantagens desses movimentos no

    processo de mudana estrutural do Centro Federal de Educao Tecnolgica de Ouro

    Preto, do Centro Federal de Educao Tecnolgica de Bambu e da Escola Agrotcnica

    Federal de So Joo Evangelista, instituies educacionais fundidas para a criao do

    IFMG, este estudo ancora-se na conceituao desses movimentos como forma de

    processos da gesto pblica.

    Uma vez que a organizao institucional depende de decises gerenciais, para que

    os objetivos propostos sejam alcanados com sucesso necessrio definir metodologias

    que norteiem as aes do modelo de gesto adotado. Neste sentido, h que se considerar

    que os processos decisrios podem conter mais de um movimento gerencial, ou seja, de

    centralizao, descentralizao e desconcentrao, conforme ser analisado neste estudo.

    Segundo entendimento de Bastos (1975), Cretello Jnior (1998), Fernandes (1999)

    e Rivas (1991), na centralizao, a deciso est no nvel da unidade central, cujas

    atividades so estabelecidas por um pequeno grupo de decisores. Sendo assim, o conceito

    de centralizao retrata a tomada de deciso a partir de uma nica unidade tambm

    chamada de centro, aqui representada pela reitoria, que centraliza a gesto do IFMG.

    Quanto aos processos de descentralizao e desconcentrao, os autores citados e

    Tobar (1991) os definem como transferncia de autoridade. A diferena entre os dois est

    na questo da autonomia decisria, pois, enquanto na descentralizao prevalece a

    autonomia das unidades descentralizadas, ou seja, os grupos que esto nas unidades locais

    possuem autonomia para definir as linhas gerenciais, na desconcentrao a transferncia de

    autoridade para as instncias locais ocorre com autonomia limitada ou at mesmo sem

    autonomia (TOBAR, 1991; FLEURY, 2006; ALVES, 2007). Essa aparente semelhana

    acaba incentivando o uso acentuado da desconcentrao como uma faceta da

    descentralizao (TOBAR, 1991; MATOS; 1996; LIMA, 2004; ABRUCIO, 1997).

    A escolha do processo de gesto centralizado, descentralizado ou desconcentrado

    pressupe o estudo de um conjunto de fatores interligados para sua efetivao, tais como:

  • 17

    geogrficos, socioculturais, polticos e administrativos. Em se tratando da gesto pblica,

    centralizar, descentralizar ou desconcentrar objetiva possibilitar o melhor atendimento e

    imprimir qualidade nos servios pblicos ofertados ao cidado. A deciso por um desses

    trs processos tem fortes implicaes nos programas governamentais e, muitas vezes, pode

    estar associada a estratgias para a definio, escolha e execuo de metas do governo e

    dos meios mais eficientes para se gastar os recursos destinados a esses planos.

    Para entender os movimentos gerenciais da estrutura organizacional das unidades

    analisadas foram realizadas entrevistas com servidores que participaram direta e

    indiretamente da criao do IFMG, os quais relataram as vantagens e desvantagens dos

    movimentos.

    Visando, pois, analisar os movimentos de gesto e as vantagens e desvantagens

    consequentes desses movimentos no processo de mudana estrutural das antigas autarquias

    que se transformaram em campi do IFMG, esta pesquisa objetivou responder ao seguinte

    problema de pesquisa: de que maneira se manifestam os movimentos de centralizao,

    descentralizao e desconcentrao e quais as vantagens e desvantagens decorrentes

    desses movimentos no processo de criao do Instituto Federal de Educao, Cincia e

    Tecnologia de Minas Gerais IFMG, a partir da fuso de instituies federais de ensino?

    Para responder ao problema de pesquisa, optou-se pela investigao das principais

    mudanas de gesto no mbito de uma estruturao organizacional pelos processos de

    centralizao, descentralizao e desconcentrao, realizadas nas antigas autarquias

    transformadas em campi do IFMG. Para relatar a evoluo organizacional das instituies

    analisadas foi utilizado o mtodo de estudo de casos mltiplos (JOIA, 2004), constitudo

    de coleta dos dados para anlise dos referidos movimentos nos processos gerenciais,

    aplicando-se os componentes do tringulo de Pettigrew (1973), com base em anlises

    documentais e entrevistas para obteno das informaes necessrias.

    1.1 Objetivos

    1.1.1 Objetivo geral

    Analisar os movimentos de centralizao, descentralizao e desconcentrao para

    definir suas vantagens e desvantagens no processo de criao do Instituto Federal de

    Educao, Cincia e Tecnologia de Minas Gerais IFMG, a partir da fuso de instituies

    federais de ensino.

  • 18

    1.1.2 Objetivos especficos

    1 Contextualizar as mudanas na gesto e estruturas de poder realizadas nas

    autarquias que originaram o IFMG;

    2 levantar os processos e fluxos de atividades gerenciais e pedaggicas

    adotados na mudana estrutural; e

    3 analisar os movimentos de centralizao, descentralizao e

    desconcentrao no contexto da mudana estrutural, relacionando as

    vantagens e desvantagens acarretadas com a mesma.

    1.2 Justificativa

    Considerando-se a atribuio de competncia que dada pela Constituio Federal

    s instituies pblicas de ensino de prestar servio educacional gratuito e de qualidade, o

    estudo da centralizao, da descentralizao e da desconcentrao relaciona-se matria

    prestao de servios pblicos, mesmo nela no se esgotando. Toda a atuao

    administrativa do Estado pode ser enquadrada como atuao centralizada ou

    descentralizada e concentrada ou desconcentrada, conforme a organizao e as tcnicas de

    repartio de atribuies adotada por suas diferentes administraes.

    Dada a importncia de estudar os modelos gerenciais das instituies que oferecem,

    gratuitamente, a qualificao de mo de obra para atender s necessidades do pas, o

    presente estudo focou a integrao do Instituto Federal de Minas Gerais IFMG, a partir

    da fuso de unidades federais de ensino tcnico e tecnolgico do Estado, como parte de um

    grande projeto do governo federal para propagar a educao tecnolgica. Assim, optou-se

    pela abordagem dos processos gerenciais em deciso respaldada tanto pelo potencial

    investigativo do processo de mudana oriundo dessa fuso de natureza institucional, como

    pela condio desta autora de servidora efetiva do IFMG, o que facilita seu livre acesso s

    informaes.

    1.3 Estruturao textual

    Esta dissertao de mestrado, textualmente estruturada segundo as normas da

    ABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas para trabalhos cientficos, compe-se

    de oito partes: (1) Introduo; (2) Fundamentao Terica; (3) Metodologia; (4) Anlise de

  • 19

    Resultados; (5) Consideraes Finais; (6) Referncias; e (7) Apndice.

    Na Introduo (Captulo 1), tem-se a apresentao e contextualizao do tema em

    anlise, a definio do problema de pesquisa, dos objetivos e da metodologia textual.

    Atuando como base de sustentao do confronto entre teoria e prtica realizado na

    Anlise de Resultados, a Fundamentao Terica (Captulo 2), cujo objetivo apresentar

    os apoios tericos que fundamentaram a pesquisa de campo, constituda de um breve

    histrico do surgimento e estruturao da educao profissional e tecnolgica no Brasil e

    em Minas Gerais, bem como da criao do IFMG, seguido da conceituao dos termos

    centralizao, descentralizao e desconcentrao e da descrio do Modelo

    Pettigrew (1973) recurso metodolgico que embasou a anlise do processo de

    transformao das trs unidades analisadas, transformadas em campi do IFMG.

    Na Metodologia (Captulo 3), os mtodos cientficos utilizados na pesquisa so

    apresentados em seus contedos essenciais: (a) caracterizao quanto abordagem, quanto

    aos fins e quanto aos meios; (b) unidades de observao e sujeitos da pesquisa; (c)

    instrumentos de coleta de dados; (d) tratamento e anlise dos dados; e (e) anlise de

    contedo.

    Na Anlise de Resultados (Captulo 4), tem-se o confronto entre teoria e prtica,

    por meio da descrio analtica dos documentos e das entrevistas com servidores das

    unidades pesquisadas, visando a identificao das vantagens e desvantagens dos

    movimentos em cada processo analisado, metodologicamente organizada na forma do

    modelo Pettigrew (1973), de forma a demonstrar o entrelaamento entre esses dois plos

    antagnicos, que culmina nos resultados alcanados.

    Nas Consideraes Finais (Captulo 5) so sintetizados os achados da pesquisa,

    com base no problema levantado e nos objetivos almejados, de forma a se concluir sobre

    sua eficcia cientfica.

  • 20

    2 FUNDAMENTAO TERICA

    A administrao pblica exerce suas funes administrativas por meio de rgos,

    pessoas jurdicas e agentes pblicos. Visando garantir uma efetiva atuao do Estado,

    estabeleceu-se formas de distribuir as competncias estatais. E no processo de organizao

    dessa atribuio de competncias, tanto possvel encontrar a presena de centralizao

    (ou descentralizao) quanto a de concentrao (ou desconcentrao) do poder de deciso.

    Segundo Gournay1

    (1978 apud Alves, 2007, p. 155-157), ao resumir

    conceitualmente os trs termos constitutivos do tema em estudo, a centralizao se

    manifesta quando as atividades administrativas ficam a cargo das unidades centrais.

    Quanto descentralizao, ela predomina em situaes em que o exerccio de aes

    administrativas e funes confiado a agentes locais, com autonomia para a tomada de

    decises. J no processo de desconcentrao no h autonomia, o poder de deciso

    diminudo, diferentemente daquelas unidades administrativas resultantes do processo de

    descentralizao.

    Com vistas ao objetivo de analisar tais movimentos administrativos para definir

    suas vantagens e desvantagens no processo de mudana ocorrido para a criao de uma

    instituio federal de ensino tcnico e tecnolgico a partir da fuso de escolas tcnicas

    federais, importante se faz contextualizar o tema, a partir do resgate da histria da

    educao profissionalizante em nosso pas, destacando-se a sua evoluo no Estado de

    Minas Gerais.

    2.1 Histrico do surgimento e estruturao da educao profissional e tecnolgica

    no Brasil e em Minas Gerais

    A discusso sobre educao profissional preconiza a era da rede federal de ensino.

    Em 1808, as transformaes sociais, econmicas e polticas advindas da transferncia da

    Corte Portuguesa para o Brasil contriburam para a criao de instituies que, mantidas

    por sociedades privadas sob o apoio do Estado, deram o primeiro passo para o processo de

    aprendizagem, no pas, com a formao de artfices naturais da terra (FONTES, 1985).

    Com a finalidade de serem instrumentos de poltica voltados para as classes

    desprovidas, em 1909, foram criadas dezenove escolas de aprendizes e artfices no governo

    1 GOURNAY, Bernard. Introduo cincia administrativa. Ed. reimp. Lisboa: Europa/Amrica, 1978. 372

    p.

  • 21

    do ento presidente da Repblica Nilo Peanha. Um de seus objetivos era qualificar a mo

    de obra e manter o controle social dos cidados jovens que viviam em situao de risco

    social, sensveis aos vcios e hbitos nocivos sociedade como um todo. Essas dezenove

    escolas deram origem aos Centros Federais de Educao Tecnolgica CEFETs, e

    surgiram em um contexto onde o domnio do capital agrrio-exportador dava lugar

    industrializao. Por isso, no perodo de 1930-1945, a economia brasileira sofreu

    significativa alterao em seu eixo, passando de atividade agroexportadora para atividade

    industrial. Em 1937, essas escolas foram transformadas em liceus industriais e, em 1942,

    os liceus passaram a se chamar escolas industriais e tcnicas.

    A partir desse mesmo ano, vrias mudanas foram implementadas educao

    profissional, dentre elas, a oferta, pelas Escolas Industriais e Tcnicas, de formao

    profissional em nvel equivalente ao secundrio (BRASIL, 2008).

    Em meados do sculo XX, com a promulgao da Constituio Federal de 1946,

    foram criadas as escolas agrcolas, com base no modelo escola-fazenda, visando a

    formao dos filhos dos pequenos produtores rurais em tcnicos agrcolas, ento

    subordinadas Superintendncia de Ensino Agrcola e Veterinrio do Ministrio da

    Agricultura. A transferncia de subordinao ao Ministrio de Educao e Cultura MEC

    ocorreu em 1967, quando tambm passaram a fazer parte da Rede de Educao

    Profissional. Em 1979, as escolas agrcolas receberam a denominao Escola Agrotcnica

    Federal (BRASIL, 2008).

    Na dcada de 1950, por meio de diversos atos legais, foi estabelecido o ajustamento

    e a reformulao da rgida estrutura educacional herdada do perodo autoritrio

    (WERMELINGER; MACHADO; ARMNCIO FILHO, 2007). Ocorreu que, com o

    surgimento da indstria automobilstica nacional, em 1956, a rea da educao foi

    priorizada com investimentos na formao de profissionais visando ao cumprimento das

    metas de desenvolvimento do pas. Em 1959, teve incio o processo de transformao das

    Escolas Industriais e Tcnicas em autarquias com autonomia didtica e de gesto, ento

    denominadas Escolas Tcnicas Federais. Essa nova realidade intensificou gradativamente

    a formao de tcnicos, cuja mo de obra tornou-se indispensvel diante da acelerao do

    processo de industrializao.

    Portanto, quando da publicao da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    em 1961 (BRASIL, 1961), que previa muitas inovaes, a educao cotidiana j as

    praticava, como por exemplo: a equivalncia entre o ensino mdio e os cursos de

    aprendizagem em cooperao com empresas. Completando esse ciclo de iniciativas na

  • 22

    educao, em 1971, foi promulgada pelo governo federal a Lei n 5.692 (BRASIL, 1971),

    instituindo o ensino de segundo grau de profissionalizao obrigatria. Porm, a falta de

    estrutura para implantao dos cursos tcnicos e a falta de pessoal docente habilitado

    fizeram com que o governo, alguns anos depois, editasse outro instrumento legal,

    eliminando o carter obrigatrio da profissionalizao (WERMELINGER; MACHADO;

    FILHO, 2007). Naquele mesmo ano, surgiu o primeiro Plano Nacional de

    Desenvolvimento Econmico PNDE, prevendo programas especficos que contriburam

    para a implantao de cursos tcnicos em reas correlatas. Ainda em 1971, a LDB 5.692

    (BRASIL, 1971) transformou, obrigatoriamente, todo o currculo do segundo grau das

    escolas tcnicas em tcnico-profissional, aumentando o nmero de matrculas e

    implantando novos cursos tcnicos.

    Em 1978, trs Escolas Tcnicas Federais - do Paran, de Minas Gerais e do

    Rio de Janeiro - foram transformadas em Centro Federal de Educao Tecnolgica

    CEFET. A essas instituies foi conferida a atribuio de atuar em nvel mais elevado de

    formao, cabendo-lhes formar engenheiros de operao e tecnlogos (BRASIL, 2008).

    O desenvolvimento de novas tecnologias agregadas produo e prestao de

    servios, contribuiu para o crescimento e implementao da rede federal de educao

    tecnolgica. Na dcada de 1980, um novo cenrio econmico e produtivo foi estabelecido,

    ajustando-se demanda tcnico-operacional surgida. Nesse cenrio, as aes

    governamentais consistiram em diversificar programas e cursos para elevar os nveis da

    qualidade do ensino (BRASIL, 2008).

    No ano de 1994, a Lei Federal n 8.948 (BRASIL, 1994) instituiu no pas o sistema

    nacional de educao tecnolgica com vistas transformao das demais escolas tcnicas

    federais em centros federais de educao tecnolgica, os CEFETs, sinalizando que as

    escolas agrotcnicas federais tambm poderiam ser integradas ao processo de cefetizao.

    Essa transformao foi promovida, considerando-se as instalaes fsicas, os laboratrios e

    equipamentos, as condies tcnico-pedaggicas e administrativas, bem como os recursos

    humanos e financeiros essenciais ao funcionamento da nova instituio (BRASIL, 1994).

    A partir de 1995, um movimento de mudanas nas instituies federais de educao

    profissional atendeu ao objetivo de promover uma reforma curricular. Em 1996, foi

    aprovada a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional Lei n 9.394/96

    (BRASIL, 1996) e, em 1997, o Decreto n 2.208/97 regulamentou os artigos da citada lei

    que tratam, especificamente, da educao profissional.

  • 23

    A partir de 1999, ocorreu a efetiva implantao dos novos CEFETs oriundos da

    transformao das escolas tcnicas e agrotcnicas federais. Inspirado por esse projeto

    educacional de cefetizao, o governo brasileiro firmou convnio com o Banco

    Interamericano de Desenvolvimento BID, visando a implantao do Programa de

    Expanso da Educao Profissional PROEP. Em 2002, o PROEP propiciou a

    transformao de duas unidades analisadas nesta pesquisa em Centros Federais de

    Educao Tecnolgica, entrando para a histria do avano da educao profissional:

    Escola Agrotcnica Federal de Bambu e a Escola Tcnica Federal de Ouro Preto.

    Em 2003, com a publicao do Decreto Presidencial n 4.877/03, o Ministro da

    Educao passou a nomear os gestores (diretor-geral) das escolas tcnicas e agrotcnicas e

    dos centros federais de educao tecnolgica aps o processo de escolha feita pela

    comunidade escolar de cada autarquia. A vigncia do decreto possibilitou a

    descentralizao de autoridade, resultando na primeira eleio do principal cargo nessas

    instituies federais de ensino.

    Em 2004, as instituies que compunham a rede federal de educao tecnolgica

    ganharam autonomia para criar e implantar cursos em todos os nveis de ensino. Nessa

    mesma poca, as escolas agrotcnicas federais, que at ento ofertavam somente os cursos

    tcnicos (nvel mdio), receberam autorizao excepcional para ofertar cursos superiores

    de tecnologia.

    As mudanas, as inovaes e o explcito crescimento da necessidade de mo de

    obra qualificada evidenciaram a urgente necessidade de expandir a educao profissional e

    tecnolgica no pas. Nesse cenrio, o governo decidiu ampliar a oferta da educao,

    aumentando o nmero de escolas federais de educao profissional e tecnolgica.

    A expanso da rede federal se deu em duas fases. A primeira iniciada em

    2006, com a implantao de novas unidades em Estados ainda desprovidos da

    existncia de uma instituio da rede. A segunda, iniciada em 2007 sob o tema: Uma

    escola tcnica em cada cidade-plo do pas. A partir da expanso e evoluo do ensino,

    emergiu a nova institucionalidade que culminou com a criao, em dezembro de 2008, dos

    Institutos Federais de Educao, Cincia e Tecnologia.

    2.1.1 A criao dos institutos federais de educao, cincia e tecnologia

    Documentos do Ministrio da Educao atestam que a rede federal de educao

    tecnolgica est espalhada por todo o territrio nacional, com a finalidade de qualificar

  • 24

    profissionais para os diversos setores da economia do pas, realizar pesquisas e

    desenvolver novos processos, produtos e servios em colaborao com o setor produtivo.

    Com o advento da Lei n 11.892/2008 (BRASIL, 2008), 31 centros federais de educao

    tecnolgica (CEFETs), 75 unidades descentralizadas de ensino (UNEDs), 39 escolas

    agrotcnicas federais, 7 escolas tcnicas federais e 8 escolas vinculadas a universidades

    deixaram de existir para formarem os Institutos Federais de Educao, Cincia e

    Tecnologia. Assim, a rede federal passou a ser constituda pelas seguintes instituies: (a)

    38 Institutos Federais de Educao, Cincia e Tecnologia; (b) 2 Centros Federais de

    Educao Tecnolgica; (c) 25 Escolas Tcnicas Vinculadas a Universidades Federais; e (d)

    1 Universidade Tecnolgica Federal, conforme Figura 1:

    FIGURA 1 A Rede Federal no Brasil (situao em dez/2008)

    Fonte: www.mec.gov.br

    Na Figura 2, observa-se que o Estado onde esto concentrados o maior nmero de

    institutos federais Minas Gerais, possuidor de 5 unidades em regies bem diversas, cada

    uma delas constituda de seus respectivos campi.

  • 25

    FIGURA 2 Os Institutos Federais do Estado de Minas Gerais (situao em dez/2008)

    Fonte: www.mec.gov.br

    Antes da legitimao dos Institutos Federais, as unidades de ensino tecnolgico

    apresentavam estruturas departamentalizadas, constitudas de um diretor geral, diretores de

    departamentos e coordenadores. Cabia aos diretores dos departamentos responderem,

    juntamente com o diretor-geral, pela gesto pedaggica e administrativa. O cargo de

    diretor geral representava a instncia mxima das instituies.

    Pela Lei n 11.892, de 29 de dezembro de 2008, que criou os institutos federais, sua

    autonomia encontra-se na natureza jurdica de autarquia, na prerrogativa de criao e

    extino de cursos e na emisso de diplomas. Os institutos federais so organizados em

    estrutura multicampi, ou seja, tendo uma reitoria como rgo executivo e vrios campi

    (BRASIL, 2008). O organograma dos campi possui a mesma estrutura departamentalizada,

    porm com a figura da reitoria, representada pelo reitor, acima do diretor geral (FIG. 3).

    FIGURA 3 - Organograma do campus aps a criao dos Institutos Federais

    Fonte: ESTATUTO DO IFMG

    Diretor-Geral CEFET/EAF

    Chefia de Gabinete Depart./Diretoria de Ensino (podendo ter mais de uma)

    Departamento de Administrao/Planejament

    o

    Coordenaes-Gerais

    Setores

    Coordenaes-Gerais

    Setores

    Reitor (reitoria)

  • 26

    Para Fernandes (2009), nesse momento em que h uma reorganizao da rede

    atravs da criao dos institutos federais, torna-se importante compreender que as

    estruturas departamentalizadas no so adequadas nova proposta de gesto. Para o autor,

    o novo construdo a partir do aperfeioamento da cultura existente. Sendo assim, no

    processo organizacional da reitoria, h que se buscar a essncia das funes institucionais

    estratgicas e tticas.

    Nesse sentido, reitoria competiro as funes de definio de polticas,

    superviso e controle. Para tanto, necessrio uma estruturao que congregue

    um gabinete e rgos de assessoramento para assistncia imediata ao reitor, alm

    de unidades administrativas que devero trabalhar matricialmente vinculadas aos

    rgos afins dos campi. Dessa forma a estrutura compreende as cinco pr-

    reitorias previstas na legislao, cujas atuaes so requeridas para as principais

    reas de estrutura e funcionamento da instituio (FERNANDES, 2009, p. 7).

    Ressalta-se o entendimento de Pugh e Hickson (2004, p. 24) sobre organizao: O

    que fazia e faz muita diferena para as caractersticas de uma organizao o seu tamanho

    e o seu grau de dependncia de outras organizaes. Pesquisas do Grupo de Aston

    apontam que quanto maior a organizao, maior a quantidade de funes especializadas,

    maior a padronizao e a formalizao de documentos, e tanto mais elevado o grau de

    complexidade na estruturao das atividades e quanto mais burocratizada, tanto maior o

    poder de deciso. O contrrio, quanto menor, quanto mais dependente de outra, menos

    autonomia na tomada de decises. E nesse caso, os estudos revelam que as poucas decises

    a serem tomadas tendero a ser mais centralizadas do que descentralizadas (PUGH;

    HICKSON, 2004).

    2.1.2 IFMG: constituio e funcionamento

    O Instituto Federal de Educao, Cincia e Tecnologia de Minas Gerais ou,

    simplesmente, Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG), quinta instituio federal de

    ensino profissionalizante do estado oriunda do processo de fuso de dois CEFETs e uma

    EAF foi formado pelas autarquias: Centro Federal de Educao Tecnolgica de Ouro Preto

    CEFET-Ouro Preto, Centro Federal de Educao Tecnolgica de Bambu CEFET-

    Bambu, e Escola Agrotcnica Federal de So Joo Evangelista EAFSJE transformadas

    em seus respectivos Campi.

    Nesse processo de fuso, outros trs campi foram agregados ao IFMG, a saber:

    Governador Valadares, Congonhas e Formiga, sendo os dois ltimos advindos da

  • 27

    transformao das Unidades Descentralizadas de Ensino de Congonhas (que integrava o

    CEFET-Ouro Preto) e de Formiga (que integrava o CEFET-Bambu), totalizando, pois,

    seis campi, na composio de sua nova estrutura (BRASIL, 2008), a saber: Bambu,

    Congonhas, Formiga, Governador Valadares, Ouro Preto e So Joo Evangelista.

    O estatuto do IFMG, em seu o art. 5, prev os objetivos da instituio para o

    alcance das metas propostas pela gesto educacional. Alm de ministrar a educao

    profissional regular (cursos tcnicos e tecnolgicos), o IFMG oferta cursos de formao

    inicial e continuada para os trabalhadores, visando mant-los atualizados em suas

    profisses. Com vistas formao de profissionais para a educao bsica e para os

    diversos setores da economia, tambm oferta cursos de licenciatura e bacharelado. A

    realizao de pesquisas aplicadas e o desenvolvimento de atividades de extenso

    constituem, tambm, instrumentos que orientam as aes do instituto, tendo em vista ser

    uma instituio de ensino superior de cunho social (BRASIL, 2008).

    O Decreto n 6.986/2009 regulamenta o processo de escolha dos dirigentes dos

    Institutos Federais, determinando que essas organizaes sejam administradas por um

    reitor, nomeado pelo Presidente da Repblica. Cada campus que integra o IFMG ser

    administrado por um diretor geral nomeado pelo reitor.

    Conforme rege o estatuto, a organizao administrativa do Instituto Federal de

    Minas Gerais compreende: rgos Colegiados, Reitoria e Campi que, por sua vez, so

    assim constitudos: 1 - rgos Colegiados: (a) Conselho Superior, e (b) Colgio de

    Dirigentes; 2 - Reitoria (rgo executivo): (a) Gabinete, (b) Pr-Reitorias: i -

    Administrao, ii - Ensino, iii - Extenso, iv - Pesquisa, Inovao e Ps-Graduao, e v -

    Planejamento e Oramento, (c) Diretorias Sistmicas, (d) Auditoria Interna, (e) Ouvidoria

    Geral, (f) Procuradoria Federal e (g) Assessoria de Relaes Internacionais; 3 Campi

    (considerados sede para fins de legislao educacional), representados na Figura 4.

  • 28

    FIGURA 4 - Organograma do IFMG/reitoria (situao em 2011)

    Fonte: ESTATUTO DO IFMG.

    A reitoria, sede do IFMG localizada em Belo Horizonte, o rgo executivo

    superior responsvel por planejar, administrar, gerir, coordenar e superintender as

    atividades do Instituto, com anuncia do reitor. As pr-reitorias tambm so rgos

    executivos, com objetivos que preveem planejamento, organizao, controle, superviso e

    fomento das aes correlatas a cada uma. Os colegiados, a saber: comit de ensino, comit

    de pesquisa, inovao e ps-graduao, comit de extenso e comit de administrao e

    planejamento do suporte gesto administrativa e acadmica. O conselho acadmico

    um rgo consultivo e deliberativo no mbito do campus, cuja funo colaborar para o

    aperfeioamento do processo educativo e zelar pela correta execuo das polticas do

    IFMG. Os demais colegiados tm finalidade consultiva.

    Atualmente, o IFMG composto por nove campi: Bambu, Betim, Congonhas,

    Formiga, Governador Valadares, Ouro Branco, Ouro Preto, Ribeiro das Neves e So Joo

    Evangelista; um ncleo avanado: Sabar; e quatro unidades conveniadas: Joo

    Monlevade, Pompu, Piumhi e Oliveira, todos vinculadas reitoria (FIG. 5).

    Reitor (gabinete)

    Chefia de Gabinete

    Pr-Reitorias

    Diretorias Sistmicas

    Campi

    Coordenaes

    Setores

    Auditoria Interna

    Procuradoria Federal

    Cons. Superior Colg. Dirigentes

  • 29

    FIGURA 5 Instituto Federal de Minas Gerais - IFMG (situao em 2011)

    Fonte: www.ifmg.edu.br (adaptado para este estudo)

    Conforme apurado na investigao documental e anlise das entrevistas, a estrutura

    organizacional das atividades administrativas e acadmicas do IFMG est organizada na

    forma de fluxos.

    No mbito das aes administrativas, o planejamento oramentrio anual do IFMG

    comea pelo Colgio de Dirigentes composto dos diretores-gerais dos campi e pr-reitores,

    por tratar-se do rgo que define as polticas institucionais para o ano subsequente. A

    coordenao dos trabalhos fica a cargo da Pr-Reitoria de Planejamento e Oramento

    PROPLAN, que d incio ao planejamento participativo nos campi, com a formalizao do

    processo e reunies com todos os centros de custos. Nessas reunies, so apresentados os

    procedimentos metodolgicos, cronograma de atividades, limites oramentrios, dentre

    outras informaes relevantes para o desenvolvimento do trabalho. Cada campus

    dividido em centros de custos, ou seja, cada setor, cada coordenao, cada diretoria um

    centro de custo. Os centros de custos informam seu planejamento por meio do Sistema de

    Planejamento Participativo SISPLAN, uma plataforma que funciona via web. Aps o

    prazo determinado para o planejamento das despesas de custeio e capital para o ano

    seguinte, os diretores gerais aprovam e os campi enviam o oramento PROLAN atravs

    do SISPLAN. Quando necessrio, h adequaes, muito embora, ao longo do ano, haja

    momentos pr-determinados para a reprogramao do planejamento. Os limites

    oramentrios de cada campus so estabelecidos pela matriz do Conselho dos Institutos

    Federais CONIF, que utiliza como principal fonte de referncia o nmero de matrculas

    ponderadas e o nmero de alunos em regime de internato. Uma vez aprovado pelos

    Campi

    Unidades conveniadas Ncleo avanado

    Reitoria (sede)

    http://www.ifmg.edu.br/

  • 30

    responsveis no campus e pela PROPLAN, o planejamento do campus encaminhado ao

    reitor para anlise e aprovao e, em seguida, apresentado ao colgio de dirigentes.

    A execuo do planejamento anual (aquisies e/ou contrataes) realizada de

    forma conjunta pelas Pr-reitorias de Administrao e de Planejamento e Oramento. Os

    processos referentes s aquisies previstas na Lei n 8.666/93 (BRASIL, 1993), realizadas

    na modalidade de tomada de preo, prego eletrnico, concorrncia e carta convite,

    ocorrem na reitoria, pela equipe da Pr-Reitoria de Administrao, tendo como parmetro

    o planejamento anual. Finalizado o processo licitatrio na reitoria, os empenhos so

    encaminhados aos campi, que solicitam a entrega das mercadorias e/ou prestao dos

    servios e, posteriormente, encaminham as notas fiscais para pagamento na Pr-Reitoria de

    Planejamento e Oramento. Com objetivo de dar agilidade aos processos, emergncias

    como dispensa de licitaes previstas na Lei n 8.666/93 (BRASIL, 1993), capacitao de

    servidores, suprimento de fundos, pagamentos de dirias e assistncia estudantil so feitas

    diretamente pelos campi, desde que cadastradas em Sistema Prprio para Descentralizao

    de Crdito SIDEC e encaminhadas reitoria para aprovao e deliberao.

    A execuo das atividades pedaggicas atividades fins do IFMG, ocorre nos

    campi. As regulamentaes so expedidas pelo Ministrio da Educao e pelo Comit

    Acadmico, que tem representao de todos os campi na pr-reitoria de ensino. O processo

    de criao de novos cursos, bem como de extino, iniciado no campus, observada a

    legislao pertinente. A proposta dever ser aprovada pelo Conselho Acadmico, que o

    rgo colegiado mximo do campus. A Pr-Reitoria de Ensino poder emitir parecer para

    subsidiar, mas o poder de deciso do conselho superior.

    Conforme j mencionado neste trabalho, so sujeitos da presente pesquisa apenas

    os campi Ouro Preto, Bambu e So Joo Evangelista, por serem as antigas autarquias que

    deram origem ao IFMG, onde foram vivenciadas mudanas administrativas refletidas nos

    processos gerenciais. Mudanas estas motivadoras dos movimentos de centralizao,

    descentralizao e desconcentrao a serem evidenciados no confronto estabelecido pela

    anlise de documentos pblicos sobreposta anlise crtica dos depoimentos prestados por

    servidores ocupantes e no ocupantes de cargos comissionados, participantes diretos e

    indiretos do processo de criao do IFMG, apresentadas na Anlise de Resultados.

  • 31

    2.2 Os movimentos de centralizao, descentralizao e desconcentrao no

    processo de mudana em instituies de ensino tecnolgico

    Tais movimentos foram desencadeados com o surgimento e estruturao da rede

    federal tecnolgica no Brasil e em Minas Gerais, com base em um arranjo situacional dos

    Institutos Federais caracterizado por uma estrutura em rede, para integrar sistemicamente

    as diversas organizaes de ensino atravs de um ncleo central no mbito nacional,

    atravs da Secretaria de Educao Profissional e Tecnolgica do Ministrio da Educao, e

    no espao regional os vrios campi, atravs de uma Reitoria.

    2.2.1 A centralizao

    A centralizao o processo no qual as atividades so definidas no nvel da

    unidade central, e estabelecidas por um pequeno grupo de agentes de deciso. Diz respeito

    forte concentrao de autoridade nas mos de um nico grupo de pessoas (RIVAS, 1991;

    CRETELLO JNIOR, 1998; FERNANDES, 1999). Bastos (1975), em uma concepo

    mais enftica, entende que a centralizao um instrumento que tem por alvo tudo

    dominar.

    Mintzberg (1973) atesta que uma organizao que tende a adotar o processo de

    centralizao apresenta uma pequena hierarquia, possui pouca ou nenhuma tecnoestrutura,

    a assessoria de apoio pequena e os departamentos so muito parecidos. Nesse tipo, o

    poder est nas mos de quem est no topo da hierarquia, dispensando, assim, planejamento

    e ou outros procedimentos semelhantes. Em contrapartida, segundo Mintzberg (1973), essa

    organizao apresenta flexibilidade quando o gerente o proprietrio. Nesse caso, os

    processos podem ter participao dos envolvidos, mas sob o controle gerencial (PUGH,

    HICKSON, 2004).

    No entendimento de Chandler (1962), em uma organizao centralizada, promove-

    se a especializao das habilidades visando o aperfeioamento dos profissionais

    especialistas, mas a prtica, a execuo das aes desses profissionais permanecer sob o

    controle dos proprietrios, ou seja, dos que se encontram no topo da hierarquia. No

    entanto, com o crescimento, essa organizao, mesmo sob o controle de uma gesto

    centralizada, dever adotar um sistema de capacitao da mo de obra, colocando o

    conhecimento ao alcance de mais pessoas, criando, assim, uma estrutura inovadora

    (PUGH; HICKSON, 2004).

  • 32

    Caupers (1995) e Amaral (2006) elencam algumas vantagens trazidas por sistemas

    centralizadores no mbito de entidades governamentais, pelas razes: (a) asseguram a

    unidade do rgo no tratamento de assuntos estratgicos; (b) garantem a igualdade na ao

    poltica e administrativa desenvolvida pelos governos ou gerentes; e (c) permitem que haja

    melhor coordenao do exerccio da funo administrativa. Tais vantagens explicam

    porque h modelos de administrao centralizadores que obtiveram sucesso no Brasil,

    ainda que parciais, adotando estruturas organizacionais em que unidades especficas

    controlam toda a gesto de recursos tcnicos, financeiros e humanos (SANTOS, 2001).

    Por outro lado, a centralizao traz alguns inconvenientes, a saber: (a) pode

    provocar o gigantismo da unidade central; (b) tornar ineficiente a ao administrativa

    pela sobrecarga de atividades; e (c) impedir que a comunidade exera o direito de ir e vir

    com autonomia, podendo, em algumas situaes, vir a desrespeitar possveis liberdades de

    participao popular dessa comunidade, fazendo com que a soluo para os problemas

    locais dependa, exclusivamente, do sistema administrativo que se encontra nas mos da

    unidade central, prejudicando a execuo das atividades rotineiras das unidades locais

    (CAUPERS, 1995; AMARAL, 2006).

    Os malefcios de processos centralizados so tambm lembrados no estudo de

    Bryce2 (1964 apud Matos, 1996, p. 65). O conselheiro do governo canadense aponta

    algumas causas do fracasso administrativo de empresas que utilizam sistemas

    centralizadores, a saber: (a) incompreenso das funes da alta direo; (b) insuficincia de

    pessoal administrativo; (c) falta de administradores com experincia; (d) falta de delegao

    das aes; e (e) falta de atividades conscientes, que se traduzem em objetividade (MATOS,

    1996, p. 65).

    2.2.2 A descentralizao

    Utilizado na Administrao Pblica, a finalidade desse instrumento desenvolver

    ferramentas de gesto que reestruturem o rgo ou instituio, diminuindo os custos e

    aumentando a eficincia e a eficcia das aes das polticas pelo deslocamento de

    competncias e de poder de deciso para as unidades locais (COSTA; OLIVEIRA;

    TEODORIO, 2008; FARIA, 2009).

    2 BRYCE, Murray D. Desenvolvimento industrial: um manual para acelerar o processo econmico. So

    Paulo: Pioneira, 1964. 310 p.

  • 33

    Em mbito governamental, o fenmeno descentralizao vem sendo concebido

    como mecanismo de reduo das funes bsicas e indispensveis ao Estado e como

    sinnimo de democratizao da administrao pblica e da burocracia por meio da

    multiplicao de estruturas de poder. Pode-se considerar uma continuao que vai da

    simples transferncia de competncias a uma complexa reestruturao do poder decisrio.

    Em um conceito mais abrangente, a descentralizao consiste tambm em garantir as

    liberdades, preservando as identidades locais e proporcionando a participao de cidados

    nos processos decisrios das polticas pblicas, aproximando-os dos gestores, gerando

    maior controle das aes e soluo dos problemas das administraes. Trata-se, pois, de

    um mecanismo que facilita a mobilizao das iniciativas e fomenta o surgimento de

    parcerias, de aes integradas e de articulao dos atores envolvidos no processo

    (CASTRO, 1991; TOBAR, 1991; CAUPERS, 1995; AMARAL, 2006).

    Na descentralizao, os grupos que esto nas unidades locais possuem determinado

    grau de autonomia para definir as aes administrativas. Na perspectiva da deciso

    poltica, a descentralizao redefine as relaes de poder, na medida em que so

    transferidas as decises e funes, o que incentiva a criao de estruturas formais

    administrativas panejadas e organizadas (VIEIRA, 1971; LCIO, 2009). Assim,

    pertinente dizer que a descentralizao est associada redistribuio do poder poltico e

    reduo do papel e das responsabilidades da unidade central, autonomia esta que passa a

    ser instrumento predominante para tomadas de deciso nas unidades locais (CORAGGIO,

    19943; BRUGU; GOM, 1998

    4 apud CARNEIRO, BRASIL, 2007).

    Nesse mesmo sentido, Lobo (1990) define a descentralizao como sendo uma

    distribuio de poderes financeiros e funcionais do governo central ao local, que envolve

    questes como redistribuio de poder e deslocamento de centros decisrios.

    O surgimento de novas unidades de uma organizao ou instituio em regies

    locais conduz transferncia de recursos para os gestores locais. Assim, a

    descentralizao, como instrumento de reestruturao do poder, consolida-se com o

    deslocamento do fluxo de poder poltico, administrativo, financeiro e tecnolgico da

    unidade central para as demais unidades gestoras locais. Neste movimento, ficam limitadas

    unidade central apenas as altas funes polticas (BASTOS, 1975; TEIXEIRA, 19915;

    3 CORAGGIO, Jos L. Economia urbana: la perspectiva popular. Quito: Ponencias del Instituto Fronesis,

    1994. 140 p. 4 BRUGU, Quim; GOM, Ricard (Coord.). Gobiernos locales y polticas pblicas: bienestar social,

    promocin econmica y territorio. Barcelona: Ariel, 1998. 284 p. 5 TEIXEIRA, Snia Maria Fleury. Perspectivas da descentralizao dos sistemas de sade na Bolvia. Revista

  • 34

    TIEZZI, 20046; OLIVEIRA, 1999

    7 apud SOARES, 2005; NARDI, 2008). So exemplos

    de administrao descentralizada as autarquias, as sociedades de economia mista e as

    fundaes pblicas (FERNANDES, 1999).

    A descentralizao proporciona, tambm, a expanso da lgica democrtica, em

    que so ampliadas as possibilidades de negociao, ou seja, as decises sobre os conflitos

    das unidades locais pertencem prpria localidade. A descentralizao seria, ento, a

    multiplicao das instncias de negociao e de conciliao, uma estratgia que alivia a

    carga da unidade central, deixando que os problemas locais sejam abordados e tratados

    pelas gestes locais (TOBAR, 1991, p. 9; MELO, 1996; LCIO, 2009).

    Consequentemente, o processo da transferncia de responsabilidades e recursos aos

    gestores das unidades locais facilita o ajuste da oferta de bens e servios s demandas de

    comunidades, ao buscar aquelas solues mais adequadas s especificidades regionais,

    com menor custo de fornecimento (SANTOS, 2002; CARNEIRO, BRASIL, 2007). Nesse

    contexto, a prpria populao passa a ter interesse em participar dos processos decisrios

    relativos distribuio dos recursos pblicos.

    Resende e Teodsio (2008) argumentam que a descentralizao um dos pontos

    centrais da reforma do Estado, uma vez que auxilia na redefinio do papel estratgico do

    governo para que a prestao de servios pblicos adquira maior flexibilidade e

    proximidade da populao. Para Oates (1985), a efetiva participao da populao nas

    decises do governo legitima o aumento dos impostos da localidade, pois estes devero

    retornar em forma de recursos para atender s demandas locais (OATES, 1985). Num

    processo descentralizante, as estruturas polticas e administrativas locais possuem

    autoridade para formular as diretrizes da administrao, desempenhar suas funes e

    promover os servios locais a partir de recursos financeiros disponibilizados (VIEIRA,

    1971; COSTA, 1998; SOUZA, 2007).

    Esse dilogo que atrela a descentralizao participao popular entendido entre

    os autores de forma dicotmica. Para Belmartino et al.8 (1990 apud Tobar, 1991), no h

    relao que condicione um elo entre participao e descentralizao, fazendo com que uma

    ao seja necessria outra, porm elas se realimentam mutuamente. O prprio Tobar

    de Administrao Pblica, v. 25, n. 4, p. 135-175, out./dez.1991. 6 TIEZZI, S. A organizao da poltica social do governo Fernando Henrique. So Paulo em Perspectiva, v.

    18, n. 2, p. 49-56, 2004. 7 OLIVEIRA, Cleiton et al. A municipalizao do ensino no Brasil. Belo Horizonte: Autntica, 1999.

    8 BELMARTINO, S.; BLOCH, C.; LUPPI, I.;QUINTEROS, Z.T.; TRONCOSO, M.C. Mercado de trabalho

    y mdicos de reciente graduacin. Centro de Estudios Sanitarios y Sociales (CESS)/Associacin Mdica de

    Rosrio/ OPS-Oficina Regional de la OMS-Representacin de Argentina, n. 14, 65 p., 1990.

  • 35

    (1991) atesta que a participao popular a nica forma de saber se a descentralizao no

    est sendo formulada como forma de restrio de espao pblico. A descentralizao no

    existe por si s, mas em consonncia com muitas variveis de natureza econmica, social

    ou poltica (VIEIRA, 1971).

    Falleti9 (2005 apud Oliveira e Pontes, 2009) tambm destaca que a descentralizao

    em um modelo federativo pode ocorrer sob o aspecto administrativo, poltico e fiscal

    transferido da unidade central s locais. No se deve negar, no entanto, que a implantao

    do processo descentralizante envolve conflitos e negociaes complicados, uma vez que a

    proposta do modelo de gesto que cada um dos gestores locais participantes mantenha

    em seu poder um rol de competncias e atribuies em determinadas reas.

    Faz-se importante ressaltar que o rgo central exerce um papel decisivo na gesto

    do processo de descentralizao. Handy (1979) revela que a funo da unidade central

    orientar e influenciar as decises da organizao como um todo. Um dos princpios das

    aes de delegao que a alta administrao no exera funes que possam ser

    realizadas por outros nveis. Para isso, necessrio um considervel nvel de confiana

    entre os gestores (PUGH; HICKSON, 2004).

    Cabe salientar, no entanto, os perigos e desvantagens oferecidos pela

    descentralizao. Lobo (1990), Tobar (1991), Costa (1998) e Santos (2001) apontam que o

    processo de descentralizao implantado precipitadamente pode levar a gesto central a

    alguns riscos, principalmente, se for baixo o grau de confiana entre as unidades central e

    local. Segundo Costa (1998), relatrio do Banco Mundial prev trs ciladas que podem

    ocorrer em decorrncia das deficincias oriundas do processo de descentralizao:

    1 perda do controle das aes por parte da unidade central em consequncia

    da ingerncia das unidades locais;

    2 surgimento de tenses por causa das disparidades regionais, no caso de

    existir um tratamento individualizado s unidades locais, respeitando-se

    suas especificidades; e

    3 administrao sob influncias de interesses particulares por parte dos

    gestores locais, tornando a administrao menos sensvel e responsvel.

    9 FALLETI. A sequential theory of decentralization Latin American cases in comparative perspective.

    JSTOR-Latin American Perspectives, v. 20, n. 2, 2005.

  • 36

    2.2.2.1 A perspectiva constitucional da descentralizao

    No Brasil, a primeira tentativa de reforma gerencial da administrao pblica

    ocorreu no final dos anos de 1960, por meio do Decreto-Lei n 200, no ano de 1967. O

    Decreto-Lei promoveu a transferncia das atividades de produo de bens e servios para

    as autarquias, fundaes, empresas pblicas e sociedades de economia mista. Foram

    institudos como princpios de racionalidade administrativa: o planejamento, o oramento,

    a descentralizao e o controle dos resultados (BRESSER PEREIRA, 1997). O processo de

    descentralizao na administrao pblica se intensificou ao final dos anos de 1970 (incio

    da crise do Estado) e incio dos anos de 1980, legitimando-se com a redefinio dos papis

    do Governo Federal, Estadual e Municipal, com a promulgao da Constituio Federal

    em 1988 CF/1988 (SANTOS, 2001; MONTEIRO; FERREIRA, 2008).

    A emancipao de municpios brasileiros, aps a promulgao da CF/1988,

    permitiu melhor atendimento populao em suas necessidades bsicas, proporcionando

    crescimento e desenvolvimento aos municpios, ampliando a autonomia administrativa,

    poltica e financeira, por torn-los entes federativos10

    . Assim, a descentralizao um dos

    fundamentos bsicos da reforma do Estado. Nesse contexto, os governos locais tm maior

    capacidade de alocar eficazmente os bens pblicos, de forma que os benefcios sejam

    usados em prol da comunidade local (COSTA, OLIVEIRA, TEODORIO, 2008;

    GALVARRO et. al, 2009). Mas, para Filippim e Abrucio (2008, p. 4): os resultados

    prticos dessa descentralizao ainda esto longe de configurar uma significativa

    autonomia decisria no mbito local, notadamente nos municpios, porque nem sempre os

    municpios alcanam capacidade administrativa e recursos tcnicos (equipamentos,

    recursos humanos e conhecimento especializado) necessrios descentralizao.

    H de se observar que a disparidade existente no Brasil, em razo do seu tamanho e

    diferenas regionais (econmico-social), representa um fator restritivo ao processo

    descentralizante. Os contrastes regionais, s vezes, no permitem igualdade na distribuio

    de benefcios das polticas descentralizantes. A desigualdade territorial no processo de

    municipalizao anula o principal objetivo da descentralizao, que permitir maior

    liberdade alocativa aos governos e sociedades locais. Por essa e outras razes, a

    descentralizao em pases caracterizados por extremas desigualdades, como o Brasil, fica

    10

    Unidade dotada de autonomia poltica, com capacidade para elaborar a prpria Lei Orgnica (RAMOS,

    Diego da Silva. Municpios brasileiros: natureza de ente federativo? Juris Way, 10 dez. 2010. Disponvel em:

    http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=5169 . Acesso em: 13 fev. 2012).

    http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=5169

  • 37

    limitada, podendo ser afetada por fatores como a diversidade na capacidade financeira e

    administrativa dos municpios (GALVARRO et. al, 2009). Alguns municpios brasileiros,

    inclusive, no possuem capacidade para promover a expanso da arrecadao de impostos,

    para financiar outras atividades que no sejam as relacionadas ao pagamento de servidores

    pblicos, ou para promover atividades relacionadas prestao de servios de sade e

    educao, ainda que possuam recursos transferidos para esse fim (SOUZA, 2002).

    2.2.3 A desconcentrao

    A desconcentrao consiste na delegao de atribuies, funes e competncias

    pela unidade central s regionais, com dependncia direta do grupo que se encontra no

    centro, sem que haja poder decisrio. um mecanismo de transferncia de encargos e

    tarefas entre unidades administrativas locais. Pelo processo de desconcentrao, tudo que

    for realizado na localidade ser por ordem do rgo central (TOBAR, 1991; MELO, 1996;

    CRETELLO JNIOR, 1998; OLIVEIRA, 199911

    apud SOARES, 2005). A deciso

    confere s unidades locais poderes decisrios de pequeno grau (CAUPERS, 1995;

    AMARAL, 2006).

    Para Alves (2007), o que determina a desconcentrao o grau de autonomia dado

    ao poder local para a tomada das decises. Segundo o autor, o processo se assemelha

    centralizao, uma vez que as aes geradas no abdicam das orientaes e decises do

    centro. A desconcentrao transfere competncias e responsabilidades s unidades locais,

    mantendo o poder de deciso na gesto central.

    No entanto, Caupers (1995) e Amaral (2006) apresentam conceitos que, em sua

    essncia, assemelham a desconcentrao descentralizao, pois, em graus, a

    desconcentrao pode ser intensa, conduzindo as unidades locais a se transformarem em

    rgos independentes, deixando de ser subalternas; ou pode ser relativa e menos intensa,

    quando o controle institucional mantido sob a responsabilidade do poder central.

    11

    OLIVEIRA, Cleiton et al. A municipalizao do ensino no Brasil. Belo Horizonte: Autntica, 1999.

  • 38

    2.2.3.1 Desconcentrao versus descentralizao

    A mera transferncia de autoridade de uma esfera superior outra inferior por si s,

    sem a autonomia nas tomadas de deciso, no caracteriza a descentralizao (TOBAR,

    1991). muito frequente o uso inadequado do termo descentralizao em um processo

    de desconcentrao, uma vez que esses termos no so sinnimos (LUBAMBO, 200012

    apud LIMA; RCKERT, 2005).

    O que difere o conceito de desconcentrao do conceito de descentralizao ,

    justamente, a variao em graus, conforme abordam Caupers (1995) e Amaral (2006). De

    um lado, tem-se a desconcentrao, onde as funes so distribudas pela unidade central

    s locais. Essas instncias dependem diretamente das decises da unidade central. De

    outro, tem-se a descentralizao, onde ocorre a mesma distribuio de funes e

    atividades, porm no se tratando de delegar tarefas, e sim de obter determinado grau de

    autonomia para as tomadas de deciso, sem dependncia direta da instncia central

    (CASASSUS, 1989; RIVAS, 1991). Nessa concepo de graus, que poder variar at

    chegar a um nvel mais elevado, a desconcentrao seria, ento, uma condio necessria,

    embora no suficiente, para atingir os nveis desejados de descentralizao nas tomadas de

    deciso (TOBAR, 1991, p. 5).

    A adoo de um processo descentralizante pode gerar dvidas quanto sua efetiva

    implantao em razo de suas vrias modalidades. As diversas formas de descentralizar

    fazem com que a descentralizao ganhe o jargo de camaleo poltico. Em cada caso,

    poder ser aplicada uma funcionalidade diferente, de acordo com os interesses particulares

    das autoridades, o momento e a situao em que aplicada (TOBAR, 1991). Segundo

    Casassus (1989), a diferena entre os dois fenmenos situa-se na finalidade do processo de

    delegao:

    [...] parece-me que pode mudar algo mais na preciso dos conceitos de

    descentralizao e desconcentrao, e em particular na orientao de alguns

    autores (Caetano e outros, 1982) que recordam que a diferena essencial entre

    ambos reside em que um deles - a desconcentrao - reflete processos cujo

    objetivo assegurar a eficcia do poder central, enquanto que o outro -

    descentralizao - um processo que visa a assegurar a eficcia do poder local

    (CASASSUS, 1989, p. 15).

    12

    LUBAMBO, C. Descentralizao: a experincia das ONGs na formulao de polticas pblicas na cidade

    do Recife. Caderno de Estudos Sociais, Recife: Massangana, v. 16, n. 1, jan./jun. 2000. FJN.

  • 39

    Casassus (1989) e Rivas (1991) se juntam ao pensamento de Tobar (1991), pois

    compreendem a descentralizao em duas dimenses: desconcentrao e a prpria

    descentralizao, apontando que, nos termos da poltica pblica, o processo de

    descentralizao transfere as atividades da unidade central s locais. Primeiro, pela

    desconcentrao, passando-se, em seguida, ao estado de descentralizao. Para esses

    autores, a formulao de estratgias de desconcentrao e descentralizao acontece de

    forma sequencial e gradual em um processo de escolha de tomadas de deciso.

    Para Abrucio (1997), a simples descentralizao administrativa um processo de

    desconcentrao, pois no prevalecendo descentralizao poltica, existe apenas uma

    significativa delegao de autoridade que se refere ao exerccio de pequenas aes, como o

    atendimento ao pblico e outros servios mais formais. Nessa concepo, Alves (2007)

    alega que o discurso descentralizador no aponta para uma verdadeira descentralizao, e

    sim para uma desconcentrao, confundindo-se a denominao dos dois processos.

    Desconcentrar representa, apenas, a melhoria da eficcia, com delegao de poderes e

    competncias sem a devida autonomia para tomadas de deciso. Esses processos

    autodenominados de descentralizao representam, na verdade, o exerccio de

    desconcentrao administrativa e repasse de funes a governos locais sem garantia da

    autonomia (FLEURY, 2006; ALVES, 2007).

    Lima (2004) tambm cita a dualidade do processo descentralizante, quando aborda

    a reforma do sistema educativo portugus. As propostas apresentadas por uma comisso ao

    governo pressupunham a descentralizao da administrao, a autonomia da escola e a

    criao de um rgo de direo democrtica no seu interior. A ideia consistia em

    implantar polticas de efetiva descentralizao na administrao educativa. O governo

    portugus se ops e optou em adotar uma administrao centralizada no Ministrio da

    Educao, um sistema centralizado-desconcentrado. Essa opo levou as escolas

    (representando o poder local) a exercerem apenas autonomia administrativa e

    simplesmente operacionalizarem as aes e atividades de rotina (LIMA, 2004, p. 11).

    Abrucio (1997) faz meno experincia inglesa para ilustrar outro caso de

    desconcentrao denominado de descentralizao. Para definir as responsabilidades das

    agncias governamentais e dos seus funcionrios pblicos, o governo ingls adotou o

    modelo da administrao por objetivos e a descentralizao administrativa. O objetivo do

    processo de descentralizao foi dar mais autonomia s agncias locais e aos

    departamentos. Nesse processo, havia uma definio clara dos objetivos de cada unidade

    local. Porm, esses objetivos deveriam ser cumpridos sob a vigilncia e controle da

  • 40

    unidade central. Sendo assim, apesar da propaganda governamental anunciar a

    descentralizao, o que ocorria de fato era a desconcentrao de poderes (ABRUCIO,

    1997).

    No mbito do sistema de ensino brasileiro, a desconcentrao parte da poltica

    educacional descentralizadora, pois a delegao de atribuies concedida pelo governo

    central (Estado) s unidades administrativas regionais ou locais (municpios), s escolas,

    instituies privadas ou comunitrias limitada (ALMEIDA, 2005), conforme

    anteriormente citado. Os maiores empecilhos descentralizao efetiva do ensino so de

    natureza administrativa e financeira, principalmente, por causa da distribuio desigual dos

    recursos entre os muitos municpios brasileiros e da ausncia de capacidade tcnica para

    enfrentar os problemas de gesto e operacionalizao da rede escolar (BUENO,

    PINHEIRO, PEREIRA, 2007).

    Vieira (1971), na mesma linha de pensamento de Casassus (1989), Rivas (1991),

    Melo (1996) e Nardi (2008), diz que a descentralizao abrange o processo de

    desconcentrao. Para esse autor, nenhuma unidade descentralizada (local)

    completamente autnoma, pois mesmo sendo, est sob o controle do poder central, que

    determina suas competncias, podendo, inclusive, decidir pela sua extino. A outorga de

    poderes da unidade central para as locais tem como base dois princpios gerais:

    desconcentrao e descentralizao, que na prtica, formam um sistema misto, cuja

    proporo varia de caso para caso (VIEIRA, 1971), a saber:

    Na desconcentrao, o poder central cria unidades administrativas ou rgos

    locais, isoladamente ou formando uma hierarquia, e determina o que podem

    fazer e como devem fazer. A autoridade central reserva-se o poder de deciso

    sobre todos os assuntos que envolvem diretrizes fundamentais de governo. A

    desconcentrao tem por objetivo descentralizar a execuo dos servios. A

    unidade desconcentrada ser mais ou menos autnoma conforme a soma de

    poderes que lhe tenham sido outorgados pelo governo central. Na

    descentralizao, as unidades locais so criadas com certos poderes prprios

    para administrar certos campos de atividade em que podem usar iniciativa e

    discernimento prprios (VIEIRA, 1971, p. 80).

    Para outros autores, o processo descentralizante possui autonomia e valor

    democrtico, pois h o deslocamento de poder da unidade central para as locais, visando

    fortalec-las, permitindo gerir o mximo de tarefas pelos prprios interessados ou por seus

    representantes. A desconcentrao uma tcnica de comando, no tem em si valor

    democrtico e se concretiza atravs da transferncia da execuo de tarefas da unidade

    central s locais, sem a devida autonomia para a iniciativa da execuo dessas tarefas:

  • 41

    tudo o que a periferia realizar por ordem do centro, pois nesse processo no h

    deslocamento de poder decisrio (CRETELLO JNIOR, 1998, p. 150; CARVALHO,

    2004; SOARES, 2005).

    Duarte (2005) complementa que a implantao de processos descentralizantes e de

    desconcentrao no simples ou consensual. Esses processos exigem reviso de

    atribuies, distribuio de aes, redefinio de funes, negociao, vontade poltica de

    todos os envolvidos e outros componentes. A adoo desses processos exige habilidade e a

    implantao complexa.

    Descentralizao implica em uma transformao nas instncias de poder, de um

    ente federado, por exemplo. No caso da desconcentrao, a estrutura se mantm

    e h ainda relao de subordinao entre centro e periferia, dentro do mesmo

    sistema (DUARTE, 2005, p. 83).

    O fato de haver vrias filiais e diretorias em locais distantes no significa um

    processo descentralizante. A implantao de normas rgidas, limitadoras da autoridade

    condiciona a deciso apenas unidade central (MATOS, 1996).

    O que se entendesse por descentralizao no seria mais do que o espraiar de

    problemas trabalhados por grupos diversos, sob a presso do aumento de

    volume de casos, mas sem a necessria autonomia da deciso, nico fator capaz

    de tornar a administrao, como um todo, livre para exercer suas funes

    fundamentais de planejar, organizar, dirigir, motivar e controlar (MATOS, 1996,

    p. 60).

    Num modelo de administrao em que no h responsabilizao dos dirigentes

    locais pelas aes demandadas, embora se busque a descentralizao da execuo de

    atividades, a centralizao das decises e o controle dos resultados a serem alcanados

    permanecem. Dessa forma, essa descentralizao representa a redistribuio de atividades

    administrativas, excluindo-se o poder de deciso. Em seu significado real, a

    descentralizao um processo de distribuio do poder e dos meios para exercit-lo, e a

    desconcentrao a delegao de competncia, porm, sem a transferncia do poder

    decisrio (TOBAR, 1991; CABRAL NETO; ALMEIDA, 2000).

    A evidenciao das diferenas entre os dois fenmenos gerenciais no ofusca

    alguns de seus pontos convergentes. Para Cretello Jnior (1998), h algo em comum entre

    desconcentrao e descentralizao, que o fato de algum poder de deciso importante

    escapar da unidade central e ser exercido pelas unidades locais. O que est em jogo, no

    entanto, de que forma garantir a eficcia e a eficincia dos recursos pblicos na utilizao

    desses modelos de gesto.

  • 42

    No curso desta pesquisa, a inteno verificar como ocorre esses trs movimentos

    no processo de integrao no setor pblico. Para entender a mudana na estrutura da

    instituio pblica decorrente da introduo de processos gerenciais com aes

    centralizadas, descentralizadas e desconcentradas com decises centralizadas, adaptar-se-

    o modelo de Pettigrew (1973), que ser tratado na sequncia.

    2.2.4 O modelo de Pettigrew

    O modelo idealizado por Pettigrew (1973) tem contribudo com vrias pesquisas,

    principalmente na Europa e nos Estados Unidos (PEREIRA, 1998), sendo normalmente

    utilizado como parmetro para organizaes da inicia