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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
YURI ROESLER DA CUNHA RODRIGUES
O SISTEMA CARCERÁRIO E O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
CURITIBA
2013
YURI ROESLER DA CUNHA RODRIGUES
O SISTEMA CARCERÁRIO E O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Armando Antonio Sobreiro Neto
CURITIBA
2013
TERMO DE APROVAÇÃO
YURI ROESLER DA CUNHA RODRIGUES
O SISTEMA CARCERÁRIO E O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, de setembro de 2013
_____________________________________________
Bacharelado em Direito
Universidade Tuiuti do Paraná
Orientador: Prof. Armando Antonio Sobreiro Neto
Prof.
Prof.
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer, em primeiro lugar, a Deus, pela força e coragem durante toda esta longa caminhada. Agradeço também a todos os professores que me acompanharam durante a graduação, em especial ao Prof. Dr. Armando Antonio Sobreiro Neto, responsável pela realização deste trabalho.
Dedico esta, bem como todas as minhas demais conquistas, aos meus amados pais (Ariovaldo Rodrigues e Inêz Duleba Rodrigues), meus irmãos (Fábio e Larissa) e minhas duas preciosas filhas (Ana Beatriz e Mariana - Meus melhores e maiores presentes...)
E o que dizer a você Camila?
Obrigado pela paciência, pelo incentivo, pela força e principalmente pelo carinho. Valeu a pena toda distância, todo sofrimento, todas as renúncias... Valeu a pena esperar... Hoje estamos colhendo, juntos, os frutos do nosso empenho! Esta vitória é muito mais sua do que minha!!!
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho primeiramente a Deus, por ser essencial em minha vida, autor de meu destino, meu guia, socorro presente na hora da angústia, aos meus pais Ariovaldo Rodrigues e Inêz Duleba Rodrigues, aos meus irmãos Fábio e Larissa, minhas amadas filhas Ana Beatriz e Mariana e à minha eterna esposa Camila.
Aos amigos acadêmicos.
Aos professores e colaboradores da Universidade.
Ao meu Professor Orientador, que tanto se dedicou em seu auxílio a essa pesquisa.
Nessa prisão ao ar livre em que o mundo está se transformando, já nem importa mais o que depende do que, pois tudo se tornou uno. Todos os fenômenos enrijecem-se em insígnias da dominação absoluta do que existe. Não há mais ideologia no sentido próprio de falsa consciência, mas somente propaganda a favor do mundo, mediante a sua duplicação e a mentira provocadora, que não pretende ser acreditada, mas que pede o silêncio.
Adorno. Theodor (1995 p. 14)
RESUMO
Trata-se de um estudo sobre o Sistema Carcerário e o princípio constitucional da presunção da inocência. A pesquisa surgiu da necessidade de discutir sobre o sistema carcerário e os direitos humanos tendo em vista a super população, as condições precárias e o desrespeito às garantias básicas, bem como o acolhimento do preso provisório em cadeias públicas ferindo os princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Presunção da Inocência. A partir desse pressuposto surge uma indagação: É possível reverter este panorama desumano através do cumprimento dos direitos e garantias dos presos provisórios, bem como com a implantação de novas idéias e soluções e, sobretudo, respeito ao princípio da presunção da inocência? Para responder essa questão utilizou-se uma metodologia de cunho exploratório, qualitativo, baseando-se na situação fática das cadeias públicas, legislação e literatura.
Palavras-chave: Sistema Carcerário, Direitos Humanos, Presunção da Inocência.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 7
2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 9
2.1 BREVE HISTÓRICO DO SISTEMA CARCERÁRIO .............................................. 9
2.1.1 Os Estabelecimentos Prisionais ............................................................................... 12
2.2 PRESO PROVISÓRIO E PRESO CONDENADO ............................................... 15
2.3 O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO ATUALMENTE ...................................... 20
2.3.1 Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN ................................................... 24
2.4 DIREITOS HUMANOS ....................................................................................... 25
2.5 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS QUE GARANTEM A DURAÇÃO RAZOÁVEL
DO PROCESSO ........................................................................................................ 32
2.5.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ........................................................... 32
2.5.2 Princípio do Devido Processo Legal ........................................................................ 33
2.5.3 Princípio da Proporcionalidade................................................................................. 33
2.5.4 O Princípio da Duração Razoável do Processo (art. 5° LXXXVIII da CF 88) ... 34
2.6 PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA ................................................ 37
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 40
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 42
7
1 INTRODUÇÃO
O Brasil conta com uma enorme população carcerária, que vive em
condições subumanas, sem qualquer respeito aos direitos e garantias básicos,
sofrendo todo tipo de humilhação e privação inadmissíveis para um estado
democrático de direito.
Gravosa é a situação daqueles que se encontram provisoriamente detidos,
pois além de sofrerem penalidades que transcendem a privação de liberdade ou
restrição de direitos em lei admitidos, sequer foram condenados ou, se já houve
condenação, da decisão que os apenou ainda cabe recurso.
De tão habituada a acompanhar através da mídia, a sociedade acaba por
tomar como normal tal panorama lastimável vivenciado pelos reclusos.
Chegamos ao absurdo de, em 2007 no Estado do Pará, ter uma adolescente
de 15 anos de idade detida em uma cela ocupada por cerca de vinte homens, por
quase um mês, sofrendo abusos sexuais e tortura.
Ou seja, se nem a separação dos presos por sexo, previsto na LEP, é
respeitada, quem dirá a separação básica, mas não menos importante, entre
apenados e reclusos provisórios.
Assim sendo, é necessário repensar toda a situação a fim de se buscar uma
efetiva solução para o cumprimento dos ditames legais que asseguram ao preso
provisório a proteção de seus direitos humanos, prazo máximo de permanência em
cadeias públicas aguardando a instrução e a separação entre presos condenados e
presos provisórios.
Por fim, merece dedicado estudo o princípio constitucional da presunção de
inocência face ao grande número de pessoas presas provisoriamente ou ainda
detidas quando já deveriam estar em liberdade por já terem cumprido sua pena.
A situação dos presos provisórios recolhidos em cadeias públicas é
extremamente crítica, visto as problemáticas ligadas à superlotação, desrespeito a
separação entre provisórios e condenados e excesso de prazo, dentre várias outras
violações.
Tal grave é a situação que várias cadeias públicas já foram interditadas
pelos motivos acima elencados, mormente em razão da superlotação, sendo este o
problema mais emblemático do nosso sistema carcerário nacional, que fere de morte
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os princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Presunção de Inocência, pois
muitos detidos ficam encarcerados em delegacias por prazo superior ao permitido
legalmente.
Ante todas as condições desumanas e latentes violações aos direitos dos
reclusos, indaga-se: É possível reverter este panorama desumano através do
cumprimento dos direitos e garantias dos presos provisórios, bem como com a
implantação de novas ideias e soluções e, sobretudo, respeito ao princípio
constitucional da presunção de inocência?
Para responder a essa questão, há que se analisar a situação do subsistema
carcerário provisório no país e constatar as violações advindas do total desrespeito
ao princípio da presunção de inocência, previsto na Lei Maior.
Demonstrando a necessidade de buscar alternativas que, no mínimo
abrandem a situação dos detidos provisoriamente, por meio do cumprimento de
seus direitos e garantias mínimas, bem como solucionar a superlotação através da
obediência ao princípio constitucional retro citado e da implantação de novas
soluções à detenção provisória.
Este trabalho será desenvolvido baseando-se na análise da situação fática
das cadeias públicas, além da legislação pertinente ao tema, tratados e
jurisprudência dos tribunais estaduais e superiores, além da consulta a obras
concernentes ao tema aqui proposto.
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2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 BREVE HISTÓRICO DO SISTEMA CARCERÁRIO
De início, o que se tem em registros bíblicos, é que a justiça era atribuída
aos Deuses e controlada pela igreja, o cumprimento de penas e o estabelecimento
destas, eram atribuídas aos sacerdotes, que por sua vez, seriam os representantes
de Deus na terra.
Nas palavras de Beccaria, a justiça humana tende a sofrer modificações,
dependendo da força política preponderante a época e espaço, quando assim
asseverava:
A justiça divina e a justiça natural são, por sua essência, constantes e invariáveis, porque as relações existentes entre dois objetos da mesma natureza não podem mudar nunca. Mas, a justiça humana, ou, se quiser, a justiça política, não sendo mais do que uma relação estabelecida entre uma ação e o estado variável da sociedade, também pode variar, à medida que essa ação se torne vantajosa ou necessária ao estado social. Só se pode determinar bem a natureza dessa justiça examinando com atenção as relações complicadas das inconstantes combinações que governam os homens. (1999, p. 3)
Das palavras do autor, observa-se, portanto, que a justiça depende do
homem e das diretrizes firmadas por ele, quando toma as decisões políticas, sendo
nestas, é que se decide, punir ou não punir, determinadas condutas
A ordenação de 1670 regeu até a Revolução, as formas gerais da prática
penal. A hierarquia dos castigos onde a morte era a questão. As penas físicas,
tinham portanto, uma parte consideraval, os costumes, as naturezas dos crimes, o
status dos condenados as faziam variar ainda mais.
Na França, como na maior parte dos países europeus, todo o processo
criminal, até a sua sentença, permanecia secreto, ou seja, o processo se
desenrolava sem o acusado, o saber, era privilégio absoluto da acusação.
O segredo não impedia que, para estabelecer a verdade, se devesse
obedecer a certas regras, ele implicava na definição rigorosa de um modelo de
demonstração penal.
Durante todo o século XVIII, dentro e fora do sistema judiciário, forma-se
uma nova estratégia para o exercício do poder de castigar e finalmente no século
10
XIX, uma nova legislação criminal se caracteriza por uma suavização das penas,
uma codificação mais nítida, uma considerável diminuição do arbitrário, um
consenso mais bem estabelecido a respeito do poder de punir.
Desde que funciona o novo sistema penal, o definido pelos grandes códigos
dos séculos XVII e XIX, um processo global levou os juízes a julgar coisas bem
diversas do que crimes, foram levados em suas sentenças a fazer coisa diferente de
julgar, e o poder de julgar foi, em parte transferido a instâncias que não são as dos
juízes da infração.
Em 1703, foi construído em Roma pelo Papa Clemente XI o Hospício de São
Miguel para menores incorrigiveis, obra de grande importância na história da
arquitetura das prisões pela forma como as celas foram dispostas. O corpo deixa
nessa época de ser alvo de repressão penal e cede lugar ao controle e domínio da
alma através da disciplina e correção. No fianal do século XVII já haviam vinte e
seis casas de correção. Nessas casas, os prisioneiros estavam divididos em 4
classes: os explicitamente condenados ao confinamento solitário, os que cometeram
faltas graves na prisão e a última aos bem conhecidos e velhos delinqüentes. O
estudo dos sistemas penitenciários torna referencia a Beccaria (1997), que com sua
obra, causou grande impacto na Europa no ano de 1764, fazendo com que surgisse
a reforma penal.Na Inglaterra, John Howard, apostolo da humanização da prisão
nomeado Sheriff do condado de Belfast, em 1772 muito impressionado com a
situação das varias prisões que visitou, dedicou-se à luta pela melhoria dos cárceres
No 1° Código Penal de 1810, entre a morte e as multas, a detenção ocupa,
sob um certo número de formas, quase todo o campo das punições possíveis.
Diante desse pressuposto Foucalt afirma que
O encarceramenteo, pedido pela lei, o império resolvera transcrevê-lo logo para a realidade, segundo uma hierarquia penal, administrativa, geográfica, no grau mais baixo, associada a cada justiça de paz, delegacia municipal, em cada distrito, prisões, em todos os departamentos, uma casa de correção no cume, várias casas centrais para os condenados criminosos ou os correcionais que são condenados a mais de um ano, enfim, em alguns portos, prisão com trabalhos forçado. É programado um grande edifício carceral, cujos níveis diversos devem-se ajustar exatamente aos andares da centralização administrativa. (1997 p. 950)
A operação penal inteira carregou-se de elementos e personagens
extrajurídicos.
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Pereira Cuano, aduz que:
O código Penal dos Estados Unidos do Brasil foi promulgado pelo Decreto de Governo Provisório, sob o n.° 847, de 11 de outubro de 1890, só tendo entrado em vigor no ano de 1891, face o Decreto 1.127, de 6 de dezembro de 1890, que assinava o prazo de seis meses para a sua execução no território nacional (art.411, CP). O Código,era dividido em 4 livros, sendo que o primeiro tratava dos crimes e penas, o segundo militava sobre os crimes em espécie, o terceiro, das contravenções em espécie, e o quarto, das disposições gerais, sendo composto de quatrocentos e doze artigos. O primeiro Código penal republicano foi menos feliz que o seu antecessor. A pressa com que foi concluído, prejudicou-o em mais de um ponto, e nele a crítica pôde assinalar, fundadamente, graves defeitos, embora, muitas vezes com excesso de severidade. Não tardou a impor-se a idéia de sua reforma, e em menos de três anos depois da sua entrada em vigor, já aparecia o primeiro projeto de Código, para substituí-lo. O movimento de reforma, entretanto tornara-se imperioso. Em 1916, o Instituto da Ordem dos Advogados, no Rio de Janeiro, fazia sentir no Congresso a necessidade urgente da reforma penal e dois anos depois, uma Comissão da Câmara e do Senado, entrava a discutir as bases de um projeto, que ficou também sem andamento. (2010, p. 5)
Todavia, se a justiça criminal moderna carrega tantos elementos
extrajurídicos, não é para poder qualificá-los juridicamente e integrá-los pouco a
pouco no estrito poder de punir, é, ao contrário, para poder fazê-los funcionar no
interior da operação penal como elementos não jurídicos.
Como salienta Foucalt
A justiça criminal hoje em dia só funciona e só se justifica pela perpétua referência a outra coisa que não é ela mesma, por essa incessante reinscrição nos sistemas não jurídicos. Ela esta votada a essa requalificação pelo saber. (1997, p.23)
No ano de 1984, foi estabelecida a Lei que cuida da Execução das penas,
Lei 7210, visando regulamentar a classificação e individualização das penas,
rezando ideias mínimas para tratamento do apenado, procurando resguardar seus
direitos e estabelecendo seus deveres.
Das inovações trazidas, pauta-se a redação do artigo 39 do CPB, e a do
artigo 29 da LEP, que possibilitam ao preso, trabalhar e a receber salário pelo seu
esforço.
As regras mínimas para o tratamento do preso no Brasil, que surgiram em
1994, é um documento de aspirações. Constitui-se de 65 artigos, abrangendo
tópicos como classificação, alimentação, assistência médica, disciplina, contato dos
presos com o mundo exterior, educação, trabalho e direito ao voto. As regras
baseiam-se nos modelos das Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros
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das Nações Unidas e foram oficialmente descritas como um guia essencial para
aqueles que militam na administração de prisões. A Constituição Federal em seu
artigo 5º XLIX, do Capitulo das Garantias e Direitos Fundamentais, contém explicitas
garantias para proteção da população encarcerada que diz: “é assegurado aos
presos o respeito à integridade física e moral”. Algumas constituições de alguns
estados do Brasil possuem previsões semelhantes, como no estado de São Paulo,
que diz que a legislação estadual assegurará o respeito às regras mínimas da
Organização das Nações Unidas para o tratamento de reclusos, a defesa técnica
nas infrações disciplinares.
As pessoas privadas de liberdade não podem ser sujeitas à tortura ou outro
meio cruel, desumano ou degradante de tratamento ou punição. O tratamento e o
respeito devem ser iguais aos das pessoas que se encontram livres. Já no que se
diz respeito à organização penitenciaria, deve-se compreender em três setores:
Sujeitos: que são os órgãos (Órgão Nacional de Planificação da Política Criminal,
Órgão Nacional de Administração Penitenciaria, Órgão Estadual de Administração
Penitenciaria, Juiz e Ministério Publico da Execução, Conselhos Penitenciários,
Conselho de Patrono ou Ajuda Social, Serviço Social Penitenciário, Centro
Comunitário); Condenado, internado ou imputado: estes possuem direitos e
deveres; Estabelecimento prisional ou penitenciário: no sentido amplo (da execução
da pena, de medidas de segurança, centro de observação) Pessoal penitenciário:
que são os de direção e administração, especializado, equipe interdisciplinar,de
instrução técnica e de vigilância ou custodia.
Ainda, cabe ressaltar nas palavras de Magnabosco que:
com o reconhecimento da autonomia do Direito Penitenciário pela Constituição Brasileira (art. 24, I), todas as Universidades terão de adotar o ensino do direito penitenciário. A reforma penal não se fará sem a renovação do ensino universitário das disciplinas relacionadas com o sistema penal. (1998, p. 56)
A partir do exposto, percebe-se a necessidade de discutir uma nova
conceituação estabelecendo as características das prisões e sua realidade.
2.1.1 Os Estabelecimentos Prisionais
Em 1769, a Carta Régia do Brasil determinou no Rio de Janeiro a
construção da Casa de Detenção, a primeira prisão brasileira. Naquela prisão, já
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naquela época, não havia separação de presos por tipo de crime. Ficavam juntos
primários e reincidentes, os que praticaram crimes “leves” e os criminosos mais
perigosos. Somente em 1824, a Constituição determinou que as cadeias tivessem
os apenados separados por tipo de crime ou pena e que fossem adaptadas para que
os detentos pudessem trabalhar.A determinação foi cumprida, mas por pouco
tempo: no início do século 19, surgiu um dos mais graves problemas do sistema
carcerário atual: a superlotação, quando as cadeia do Rio de Janeiro já tinham
presos acima do número de vagas.
Em 1890, o Código Penal previa que presos com bom comportamento, após
cumprirem parte da pena, poderiam ser transferidos para presídios agrícolas.
Transcorridos 118 anos, o país possui apenas 37 dessas unidades destinadas aos
presos do regime semi-aberto, apesar do crescimento assustador no número de
apenados.
Em 1935 o “Código Penitenciário da República” estabeleceu, além do direito
do estado punir, o dever de recuperar o detento.
Em 11 de Julho de 1984, foi sancionada lei de execuções penais, ampla, de
excelentes qualidades, considerada um dos melhores instrumentos jurídicos do
mundo. Apesar de normas constitucionais transparentes, da excelência da lei de
execução penal e após 24 anos de sua vigência e da existência de novos atos
normativos, o sistema carcerário nacional se constitui num verdadeiro inferno, por
responsabilidade pura e nua da federação brasileira através da ação e omissão dos
seus mais diversos agentes.
Como consta em Brasil
O Brasil conta com excelente aparato jurídico relativo ao Direito Penitenciário. A Constituição Federal contém importantes princípios gerais referentes às mulheres, aos direitos dos presos e à pena. A Lei de Execução Penal (LEP) é uma das mais avançadas do mundo e está em vigor há 24 anos. Há várias outras leis bastante precisas. Por outro lado, existe um conjunto infraconstitucional de instrumentos jurídicos que detalha, de forma pormenorizada, aspectos variados da vida carcerária. (2009 p.191)
Apesar da excelente legislação e da monumental estrutura do Estado
Nacional, os presos no Brasil, em sua esmagadora maioria, recebem tratamento pior
do que o concedido aos animais: como lixo humano.
No intuito de buscar uma conceituação, encontrou-se no Portal do Ministério
da Justiça, o seguinte:
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a) Estabelecimentos Penais: são todos utilizados pela justiça para alojar quem é preso, independente de ser provisório, condenado ou submetidos a medida de segurança; b) Estabelecimentos para Idosos: são estabelecimentos penais próprios, autônomos,, que se incorporam aos dos adultos, que servem para abrigamento de preso que tenham no mínimo sessenta anos de idade ao ingressarem ou os que atinjam essa idade quando de sua privação de liberdade; c) Cadeias Publicas: são estabelecimentos penais de presos em caráter provisório, sendo de segurança máxima; d) Penitenciarias: são estabelecimentos destinados a recolher presos em condenação a pena privativa de liberdade ao regime fechado; d.1) Penitenciaria de Segurança Máxima Especial: são estabelecimentos penais que abrigam presos de condenação em regime fechado, que possuem celas individuais; d.2) Penitenciarias de Segurança Médias ou Máxima: são estabelecimentos penais que abrigam preso de condenação de regime fechado e que possuem celas individuais ou coletivas; e) Colônias Agrícolas Industriais ou Similares: estas são estabelecimentos penais, que abrigam preso do regime semi- aberto; f) Casas do Albergado: casas do albergado são estabelecimentos penais, que abrigam presos que cumprem pena privativa de liberdade em regime aberto, ou, ainda, pena de limitação de fim de semana; g) Centros de Observação Criminológica: são estabelecimentos penais próprios do regime fechado e de segurança máxima, onde são realizados exames criminológicos estes indicadores da destinação que será dada ao preso, quanto ao estabelecimento adequado e ao tipo de tratamento que será submetido; h) Hospitais de Custodia e Tratamento Psiquiátrico: os hospitais de custodia e tratamento psiquiátrico, são estabelecimentos penais que abrigam pessoas submetidas a medida de segurança.
Destarte, o Estado estabelece em cada caso concreto, em qual
estabelecimento penal, o apenado, deva cumprir sua pena, sempre enfocando o
desejo reformador da casa.
Os sistemas são baseados na premissa do isolamento, na substituição dos
maus hábitos da preguiça e do crime, subordinando o preso ao silêncio e a
penitência para que se encontre apto ao retorno junto à sociedade, curado dos
vícios e pronto a tornar-se responsável pelos seus atos, respeitando a ordem e a
autoridade.
Todos têm o direito de voltar ao seio da sociedade, após terem pagado sua
divida para com a sociedade, mas para tanto é necessária a sua passagem em
estabelecimento penal, conduzida pelo Estado, no intuito de regeneração, com
segurança a sua vida, pois precisa sair vivo e com saúde, desta casa.
Nesta ótica, a exigência de segurança e disciplina, no interior da instituição
custodial, onde deverá haver uma correta coerção e supervisão Estatal, nestes
estabelecimentos, controlando o nível de liberdade dos apenados.
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Thompson ressalta que:
I. Dada a exigência de segurança media e máxima, não se pode esperar que o regime funcione como agente reformador II. Dada a exigência de segurança, não se pode encontrar um nível de liberdade interna capaz de, automaticamente, assegurar a disciplina. Necessariamente, terá de haver supervisão e coerção. III. Dadas as exigências de segurança e disciplina, não se poderá definir o papel do funcionário comum como sendo também o de amigo e conselheiro do preso. (1998, p. 96)
Entretanto, o comentário trazido pelo autor, adentra aos moldes e padrões
internos do equilíbrio e a estabilidade do sistema, colocando sob égide, o poder do
preso e o poder estatal, quanto a estabelecimento real e efetivo de custodia ao
apenado, propondo que o funcionário, ou seja o agente carcerário, não se envolva
emocionalmente com o preso, tendo em vista, o exercício da coerção, quando esta
necessária for.
2.2 PRESO PROVISÓRIO E PRESO CONDENADO
Denise Hammerschmidt assim conceitua preso provisório:
O preso provisório é aquele que se encontra segregado cautelarmente, por força de prisão em flagrante, prisão temporária, prisão preventiva, prisão decorrente de pronúncia ou sentença condenatória recorrível. (2011, p. 33)
Há dois tipos de prisão provisória.
Prisão preventiva
Uma ordem de prisão preventiva pode ser expedida por um juiz a pedido
oficial de uma autoridade policial ou de um promotor público quando satisfeitas as
duas seguintes condições: (a) materialidade de um crime (indicação de que o crime
de fato ocorreu) e (b) provas suficientes da autoria, bem como as seguintes
condições alternativas: (a) proteção da ordem pública, (b) proteção da ordem
econômica, (c) necessidade de obtenção de prova(s) ou (d) risco de evasão do
suspeito .
O Artigo 10 do Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial
deve, então, ser concluído dentro de 10 dias a contar da prisão quando o suspeito
estiver sob prisão preventiva ou detido após uma prisão em flagrante .
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Prisão temporária (também denominada prisão para investigação)
A Lei da Prisão Temporária surgiu com a Medida Provisória n.º 111/98,
depois substituída pela Lei n.º 7.960/89, passou então a figurar na Legislação
processual brasileira mais uma espécie de prisão provisória ou cautelar, chamada
de Prisão Temporária.
Não é exclusivo da Legislação pátria, pois a adotam entre outros países,
Portugal, França, Espanha, Itália, Estados Unidos, etc.
Como afirma Mirabet (2001 p. 392) "Trata-se de medida acauteladora, de
restringir a liberdade de locomoção, por tempo determinado, destinada a possibilitar
as investigações a respeito de crimes graves, durante o inquérito policial".
Esta espécie de prisão provisória contrasta-se com a tendência doutrinária
moderna, surgida com a Constituição Federal de 1988, que reza que não se deve
possibiltar o recolhimento á prisão do autor a infração penal, antes do trânsito em
julgado da sentença condenatória, máxime se primários e de bons antecedentes.
A prisão temporária precisa ser decretada por um juiz a pedido oficial de
uma autoridade policial ou de um promotor público dentro de um período de 24
horas a contar do recebimento do requerimento oficial . O juiz poderá, a seu próprio
critério ou por solicitação do promotor público ou do advogado, determinar que um
detento lhe seja apresentado, solicitar informações e esclarecimentos por parte da
polícia e submetê-lo a um exame de corpo de delito. Após ter sido decretada uma
prisão temporária, um mandado de prisão deve ser expedido e uma cópia entregue
ao preso a título de notificação das acusações feitas contra ele (nota de culpa) . O
Relator Especial entende o termo "nota de culpa", conforme empregado tanto pelos
detentos quanto pela sociedade civil, se referia, na maioria dos casos, a uma
confissão, e não à notificação de acusações, como prevê a lei.
A prisão temporária aplicar-se-á quando: (a) for indispensável às
investigações policiais; (b) o réu não tiver uma residência fixa ou não oferecer os
elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade e (c) houver razões
fundadas, em conformidade com qualquer prova admitida na legislação penal, de
que o réu cometeu ou participou dos seguintes crimes: homicídios dolosos (Artigo
121 do Código Penal), seqüestro ou encarceramento privado (Art. 148), roubo (Art.
157), extorsão (Art. 158), extorsão mediante seqüestro (Art. 159), estupro (Art. 213),
atentado ao pudor (Art. 214), seqüestro violento (Art. 219), epidemia resultante em
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morte (Art. 267), envenenamento de água potável ou produtos alimentícios ou
substâncias médicas que resulte em morte (Art. 270), participação de quadrilhas ou
de grupos criminosos (Art. 288), genocídio (Arts. 1 a 3 da Lei No. 2.899, de 21 de
outubro de 1967), tráfico de entorpecentes (art. 12 da Lei No. 6.368, de 21 de
outubro de 1976) e crimes contra o sistema financeiro (Lei N.º. 7.492, de 26 de junho
de 1986)". Há informação de que a jurisprudência e opinio juris estabeleceram que a
prisão temporária pode ser decretada no caso dos crimes relacionados acima
quando for cumprida uma das duas outras condições (a e b). O período máximo de
prisão de um suspeito detido sob prisão temporária é de cinco dias, "prorrogável por
igual período quando extrema e absolutamente necessário".
Além disso, são estipulados diferentes prazos para prisão temporária com
relação aos chamados crimes hediondos. O Artigo 5 (XLIII) da Constituição
estabelece que os seguintes crimes são crimes hediondos: tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes, terrorismo e outros a serem definidos em lei. A Lei de Crimes
Hediondos amplia a relação constitucional de modo a incluir os seguintes crimes:
latrocínio, extorsão qualificada por subseqüente morte da vítima, estupro e atentado
violento ao pudor, propagação de doença epidêmica qualificada por morte
subseqüente e genocídio. A mesma disposição constitucional estabelece,
adicionalmente, que a tais crimes não se aplicará anistia, indulto ou soltura
provisória sob fiança. No caso de uma pessoa presa sob suspeita de haver
perpetrado um crime hediondo, será decretada a prisão temporária por 30 dias,
renovável por igual período se absolutamente necessário.
O Artigo 84 da LEP estabelece que os presos condenados sempre devem
ser mantidos separados dos presos em caráter provisório. O Artigo 102 da LEP
estabelece que os detentos sob prisão provisória devem ser mantidos em unidades
prisionais pré-julgamento ou cadeias públicas. Cada comarca ou vara deve dispor de
pelo menos uma instalação de prisão provisória a fim de preservar o interesse da
administração da justiça penal e assegurar que os detentos sejam mantidos
próximos de sua família ou comunidade.
Entretanto, não fica claro se existe um limite de tempo para o período em
que uma pessoa que tenha sido formalmente acusada pode ser mantida em uma
delegacia de polícia antes de ser transferida para um estabelecimento de prisão
provisória. Embora a lei pareça clara e estabeleça que uma pessoa pode ser
mantida em uma carceragem policial por até 24 horas (isto é, o período dentro do
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qual um juiz deve emitir uma ordem de prisão provisória), a jurisprudência é
relativamente contraditória. O Supremo Tribunal Federal, assim, teria decidido que
"a prisão de uma pessoa acusada em uma delegacia de polícia não pode ultrapassar
o período de tempo dos processos regulares" , sem, no entanto, fazer referência ao
período de 24 horas sobre que dispõe a lei. De acordo com alguns dos interlocutores
oficiais do Relator Especial, para os fins da lei, as delegacias de polícia são, com
efeito, consideradas "cadeias públicas" e, portanto, os presos provisórios, ou seja,
pessoas detidas seja com base em um mandado de prisão temporária ou preventiva,
podem permanecer em celas policiais por mais de 24 horas. Eles destacaram,
todavia, que era ilegal manter presos condenados em delegacias de polícia ou
unidades prisionais pré-julgamento e manter presos provisórios em penitenciárias
destinadas a presos condenados. De acordo com ONGs e promotores públicos, a
prisão provisória em carceragens policiais deve ser considerada ilegal, uma vez que
o Artigo 102 estabelece que os presos em caráter provisório devem ser detidos em
instalações de prisão provisória específicas. Devido à falta de espaço em centros de
prisão provisória, acredita-se que as autoridades policiais e judiciais foram
"obrigadas" a ignorar a lei. Assim, vários tribunais estaduais decidiram que, nos
casos em que não havia lugar adequado em uma instituição penitenciária, mesmo
presos condenados - o que supostamente significa presos provisórios a fortiori -
podem permanecer em celas policiais. Porém, o Superior Tribunal de Justiça teria
decidido que um preso condenado não pode ser mantido em uma delegacia de
polícia. Como a polícia civil é responsável pela investigação preliminar e as
carceragens policiais estão sob a guarda de agentes da polícia civil, acredita-se que
essa situação, por si só, facilita os abusos cometidos pelos investigadores policiais
contra suspeitos, na tentativa de extraírem confissões ou informações relacionadas
ao inquérito penal. Além disso, devido à situação de superlotação nas penitenciárias
na maioria dos estados, os presos condenados muitas vezes são mantidos em
delegacias e, portanto, são freqüentemente misturados com os que aguardam
julgamento, em violação do disposto na LEP.
No dia 4 de julho de 2011, entrou em vigor a Lei 12.403 contendo alterações
ao Código de Processo Penal com relação ao trato das prisões e da liberdade
provisória.
19
Sobre os presos provisórios e presos definitivos, a lei eliminou o artigo 300
do CPP a expressão: “sempre que possível”, utilizando o verbo “ficarão”, dessa
forma, fica obrigatória a separação entre presos provisórios e presos definitivos.
Se não houver possibilidade de separação pela falta de local, o juiz deve
considerar a aplicação de prisão domiciliar, ou de uma das 11 alternativas cautelares
possíveis à aplicação da prisão.
Ainda nos termos da nova lei, só se pode decretar a prisão preventiva aos
crimes cuja pena máxima não ultraçasse 4 anos.
Em relação aos direitos dos presos condenados e presos provisórios, Gaya
(2007) salienta que:
Apesar da gama de direitos assegurados aos presos, tais como contato com advogado, visita íntima, lazer, proteção à integridade física, psíquica e moral, visita dos familiares, higiene mínima, assistência religiosa, direito a amamentação, tomar banho de sol e etc. o certo é que tais direitos nem de longe tem efetividade prática quando o preso está acautelado provisoriamente em cadeia pública – Delegacia - quer seja por força de prisão em flagrante, preventiva ou temporária, sendo latente nesta fase o princípio constitucional máximo da presunção da inocência e, não obstante, essas pessoas sofrem injustificadamente, cerceamento em seus direitos mais básicos.
Nenhuma escusa é suficientemente válida para deixar um preso em
condições degradantes, principalmente o provisório – que como o próprio nome diz,
não é condenado, não foi julgado – e pode ainda ser inocentado. Em função do
sofrimento muitos deles chegam a aspirar a condenação, a fim de serem
transferidos para Presídios onde esperam tratamento menos ofensivo.
Outro aspecto a ser observado é que embora a Constituição Federal
assegure que a pena não passará da pessoa do condenado, o que se vê são
famílias penando quando sequer seus entes queridos possuem a condição de
condenados. Os detentos não recebem material de higiene, alimentos e nem roupas
limpas quer do Estado quer dos familiares. As condições em que vivem não estão
reguladas em lei e cada Autoridade Policial procura administrar a situação dos
presos de sua Delegacia da maneira mais apropriada possível, porém, por mais boa
vontade que se tenha é humanamente impossível dar efetividade aos direitos
desses acautelados, os quais acabam sofrendo mais do que os condenados, em
franca ofensa ao principio da isonomia entre os que estão privados da liberdade.
20
Gaya, (2007) ainda salienta que
O conjunto de princípios para a proteção de todas as pessoas sujeitas a qualquer forma de detenção ou prisão afirma que a pessoa detida ou presa tem o direito de solicitar que seja melhorado o tratamento que lhe é dispensado ou de se queixar do tratamento recebido. As autoridades devem responder prontamente e, caso o pedido ou queixa seja recusado, o requerente tem o direito de apresentar o pedido ou queixa perante Autoridade Judicial, Ministério Público ou outra autoridade competente.
A maioria dessas violações ocorrem antes da sentença final, portanto,
quando os presos são ainda considerados provisórios, motivo pelo qual, as
autoridades devem estar atentas a qualquer sinal de agressão física ou psíquica,
pois muitas vezes o preso não as revela por medo, já que, retornarão para o
cárcere, daí porque a importância da atuação e vigilância efetiva do Ministério
Público e dos Magistrados.
Se todos os seguimentos da Sociedade passassem a exigir o cumprimento
das leis, essas tenderiam a ter vida, trazendo paz e harmonia a toda coletividade,
pois a ninguém interessa o seu descumprimento, principalmente com desrespeito
aos direitos humanos, pois nada é mais prejudicial ao Estado de Direito do que a
ilegalidade oficial.
Mirabete define bem a importância da separação entre provisórios e
condenados:
A separação instituída com a destinação à Cadeia Pública é necessária, pois a finalidade da prisão provisória é apenas a custódia daquele a quem se imputa a prática do crime a fim de que fique à disposição da autoridade judicial durante o inquérito ou a ação penal e não para o cumprimento da pena, que não foi imposta ou que é não é definitiva. Como a execução penal somente pode ser iniciada após o trânsito em julgado da sentença, a prisão provisória não deve ter outras limitações se não as determinadas pela necessidade da custódia e pela segurança e ordem dos estabelecimentos. Evita-se, com a separação do preso irrecorrivelmente condenado, a influência negativa que este possa ter em relação ao preso provisório. (2004, p. 285/286)
2.3 O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO ATUALMENTE
Atualmente o sistema prisional Brasileiro não passa de grandes amontoados
de pessoas vivendo em condições sub-humanas, sujeitando-se a toda sorte de
doenças e, vivendo e sendo tratados como animais, não poderiam tornarse fruto
diferente deste, pois através da antropologia e sociologia já se sabe que o homem
21
só é homem porque é ensinado a sê-lo. Da mesma forma, dentro desta sociedade
presidiária, prevalece a lei do mais forte.
Por outro lado a sociedade tem uma impressão de protecionismo
exacerbado aos direitos naturais dos presos que tem raízes nas amargas
experiências adquiridas ao longo do período da Ditadura Militar, levantando-se após
isso a bandeira de que “É Proibido Proibir”, porém nada disso impede que uma
infinidade de criminosos tenham seus direitos básicos jogados por terra, como no
massacre do Carandiru quando a Polícia Militar em busca de retomar o Complexo
durante uma rebelião, invadiu-a e executou sumariamente 103 detentos que
somados a outros que aparentemente foram mortos em conflitos entre os próprios
detentos somaram 111 mortos.
Também conquistou repercussão nacional o caso do Distrito Policial que
confinou 51 detentos que planejavam uma tentativa de fuga em apenas uma cela de
1,5 x 4m sem ventilação que levou a morte de 18 destes por asfixia.
Apesar dos problemas no sistema prisional o art. 37, 6 º, da CF, atribui
responsabilidade de forma objetiva pelos danos ocorridos aos detentos enquanto
estes estão em custódia no sistema prisional, devendo o Estado indenizar os danos
materiais e morais do detento se este comprovar o nexo de causalidade entre a
lesão e o dano. Esta responsabilidade leva em consideração tanto a ação quanto a
omissão da instituição prisional. Desta forma, a morte de um detento gera o direito a
indenização para a família do detento morto, mesmo que este tenha sido morto por
companheiro de cela.
A Resolução n° 14, de 11 de novembro de 1994, editada pelo Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária, órgão do Ministério da Justiça, criou
em nível federal, as Regras Mínimas para Tratamento do Preso no Brasil. Desta
Resolução interessa destacar os seguintes dispositivos:
Art. 25. Não serão utilizados como instrumentos de punição: correntes, algemas e camisa-de-força. Art. 29. Os meios de coerção, tais como algemas e camisas-de-força, só poderão ser utilizados nos seguintes casos: I – como medida de precaução contra fuga, durante o deslocamento do preso, devendo ser retirados quando do comparecimento em audiência perante autoridade judiciária ou administrativa; II – por motivo de saúde, segundo recomendação médica; III – em circunstâncias excepcionais, quando for indispensável utilizá-los; IV – em razão de perigo iminente para a vida do preso, de servidor, ou de terceiros.
22
Com toda razão, essa norma não admite que as algemas sejam utilizadas
como forma de punição ou de humilhação de pessoas, servindo apenas para a
contenção momentânea daquele que está sendo detido. As Regras Mínimas para
Tratamento do Preso no Brasil trazem ainda as hipóteses que ensejam a aposição
de algemas em âmbito federal.
A maioria dos estabelecimentos penais diligenciados necessita de ampla
reforma, a fim de permitir o adequado alojamento dos presos. Ainda não se verifica o
efetivo cumprimento da norma que determina a separação entre os presos
condenados e provisórios.
Muitos estabelecimentos não contêm instalações apropriadas à alocação
individual de presos e, quando estes são alojados coletivamente, não lhes são
propiciadas condições mínimas de acomodação.
Longe estão todos os presídios brasileiros de cumprir o que determina a Lei
nº 7.210, de 11 de JULHO DE 1984, a LEI DE EXECUÇÃO PENAL, que prevê, no
Capítulo II (Da Penitenciária), Artigo 88: “O condenado será alojado em cela
individual, que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório”. Ainda, de acordo
com o mesmo artigo, em Parágrafo único: “são requisitos básicos da unidade
celular: área mínima de 6,00 m2
Nos termos do art. 15 das Regras Mínimas da ONU, o Estado deve garantir
condições para que seus presos se mantenham limpos, devendo o estabelecimento
penal lhes fornecer água potável e os artigos de higiene necessários à sua saúde e
limpeza.
O Estado há de prover os presos com os meios necessários ao cuidado de
cabelo e barba, a fim de que possam se apresentar corretamente e conservar o
respeito por si próprios, nos termos do art. 16 do mesmo diploma legal.
No direito interno, constata-se que a Lei de Execução Penal não contém
disposições específicas acerca da higiene dos presos. Os dispositivos pertinentes
são de natureza infralegal e constam da Resolução n.°14, de 11 de novembro de
1994, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
O Estado não lhes disponibiliza água corrente e de boa qualidade.
Igualmente, não são tomadas medidas suficientes para assegurar que a água
fornecida seja limpa. Em muitos estabelecimentos, os presos bebem em canos
improvisados, sujos, por onde a água escorre. Em outros, os presos armazenam
água em garrafas de refrigerantes, em face da falta constante do líquido precioso.
23
Em vários presídios, presos em celas superlotadas passam dias sem tomar
banho por falta de água. Em outros, a água é controlada e disponibilizada 2 ou 3
vezes ao dia.
Muitos estabelecimentos penais são desprovidos de banheiros e pias dentro
das celas e dormitórios ou próximos a esses. Quando tais instalações existem,
comprometem a privacidade do preso. Não raras vezes os banheiros estão
localizados em outras áreas, e nem sempre os presos têm acesso ou permissão
para utilizá-los. O mesmo ocorre para as instalações destinadas a banho.
O Estado também não oferece aos presos artigos necessários à sua higiene
pessoal, como sabonete, dentifrício, escova de dente e toalhas. Nesse caso, os
detentos são obrigados a adquiri-los no próprio estabelecimento penal, nos locais
destinados à sua venda, ou no mercado paralelo explorado clandestinamente na
unidade prisional.
O art. 17 das Regras Mínimas da ONU determina que, quando ao preso não
é permitida a utilização de suas próprias roupas, deve o Estado lhe prover
vestimentas apropriadas ao clima e em quantidade suficiente à manutenção de sua
boa saúde.
Em nenhuma hipótese as roupas fornecidas pelos estabelecimentos penais
podem ser humilhantes ou degradantes. Devem ser limpas e mantidas em bom
estado e as peças íntimas devem ser trocadas com a freqüência necessária à
manutenção da higiene.
As mesmas medidas hão de ser adotadas quando, em situações
excepcionais, o preso é autorizado a utilizar suas próprias roupas. O Estado deve
fornecer cama individual ao preso, além de roupa de cama suficiente e própria,
mantida em bom estado de conservação e trocada com freqüência capaz de
assegurar a sua limpeza.
A Lei de Execução Penal, em seu art. 11, limita-se a incluir o vestuário como
modalidade de assistência material a ser prestada aos presos. No plano infralegal, o
conteúdo do art. 17 das Regras Mínimas da ONU está reproduzido no art. 12 da
Resolução n.° 14 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
Na maioria dos estabelecimentos penais os presos utilizam suas próprias
roupas, sem qualquer critério, levadas por parentes, doadas por entidades de
caridade, tomadas de outros presos, ou simplesmente vestem molambos ou trapos
velhos e fedorentos.
24
Em vários Estados, os presos dormem em pedras nuas e frias. Os colchões
são sempre em menor quantidade do que o número de presos. Os presos têm que
colar vários colchões e grudar o corpo com o de outro para se agasalharem. Por
outro lado, quando são fornecidos, os colchões são muito finos, com espessura
incompatível com a necessidade dos presos, os quais em muitos lugares são
obrigados a adquirir este “privilégio” no mercado paralelo.
Consoante determina o art. 20 das Regras Mínimas da ONU, o Estado deve
fornecer ao preso, em horas determinadas, alimentação de boa qualidade, bem
preparada e servida, cujo valor nutritivo seja suficiente à manutenção de sua saúde
e de seu vigor físico.
O fornecimento de alimentação faz parte da assistência material a ser
provida ao preso e ao internado, conforme o teor do art. 11 da Lei de Execução
Penal. Por sua vez, o art. 13 da Resolução n.° 14, do CNPCP, além de conter as
mesmas determinações do dispositivo acima citado, determina a preparação da
alimentação do preso segundo normas de higiene e de dieta controladas por
nutricionista.
Em quase todas as unidades prisionais, os presos reclamaram da qualidade
da comida. Denúncias de cabelos, baratas e objetos estranhos misturados na
comida foram constantes. Comida azeda, estragada ou podre também foi
denunciada. Em vários presídios, a CPI encontrou quentinhas amontoadas do lado
de fora das celas, prontas para irem para o lixo, recusadas pelos presos, em face da
péssima qualidade da alimentação servida.
O art. 85 da Lei de Execução Penal salienta que o estabelecimento penal
terá lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determina o limite
máximo de capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e
peculiaridades.
A realidade é bem diferente, superlotação é um grave problema e aflige a
grande maioria dos estabelecimentos prisionais. São extremamente raras as
unidades que respeitam a capacidade inaugural ou projetada.
2.3.1 Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN
O Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) encontra fundamento no
art. 71, da Lei n° 7.210 – Lei de Execução Penal (LEP), de 11 de julho de 1984, que
25
o define como órgão executivo da Política Penitenciária Nacional e de apoio
administrativo e financeiro ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
(CNPCP).
O DEPEN é o órgão superior de controle destinado a acompanhar a
aplicação da Lei de Execução Penal e das diretrizes da política penitenciária
emanadas do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, cuja finalidade
é viabilizar condições para a implantação de ordenamento administrativo e técnico,
voltado ao desenvolvimento da política penitenciária. Destaca-se, ainda, como órgão
de apoio à gestão do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), criado pela Lei
Complementar nº. 79, de 7 de janeiro de 1994, regulamentada pelo Decreto nº.
1.093, de 23 de março de 1994.
Entre as principais atribuições estabelecidas no art. 72 da LEP, sobressaem:
acompanhar e zelar pela aplicação das normas da execução penal em todo o
território nacional; inspecionar e fiscalizar periodicamente os estabelecimentos e
serviços penais; assistir tecnicamente as unidades federativas na implantação dos
princípios e regras estabelecidos em lei; colaborar com as unidades federativas,
mediante convênios, na implantação de estabelecimentos e serviços penais;
colaborar com as unidades federativas para a realização de cursos de formação de
pessoal penitenciário e de ensino profissionalizante do condenado e do internado;
coordenar e supervisionar os estabelecimentos penais e de internamento federais; e
gerir os recursos do Fundo Penitenciário Nacional.
O Departamento é o órgão responsável pela implementação do Programa de
Reestruturação do Sistema Penitenciário por meio do estabelecimento de parcerias
com as unidades federativas, mediante a articulação com outros Ministérios.
2.4 DIREITOS HUMANOS
É notável que as bases do Código Criminal do Império resgatam preceitos e
ditames da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, pois em toda a
sistemática, de plano legislativo, que trata especialmente da “teoria da pena” resta
encadeado o espírito revolucionário (iluminista, em verdade) que atribui ao homem –
à vida e à liberdade – o maior valor que a política e o direito podem proteger.
O texto de 1789, defensor das liberdades do homem, proclama direitos
fundamentais, e apesar de haverem sido inscritos no Brasil na Carta de 1824 (artigo
26
179), receberam sistematização contundente no projeto de Bernardo Pereira de
Vasconcelos.
Veja-se, no texto penal brasileiro, a inscrição dos artigos 4º e 5º da
Declaração, que força o princípio da legalidade:
Art. 1º. Não haverá crime, ou delicto (palavras synonimas neste Codigo) sem uma Lei anterior, que o qualifique. (...) Art. 33. Nenhum crime será punido com penas, que não estejam estabelecidas nas leis, nem com mais, ou menos daquellas, que estiverem decretadas para punir o crime no gráo maximo, médio, ou minimo, salvo o caso, em que aos Juizos se permittir arbitrio.
Ouviu-se aqui o eco da Carta Outorgada:
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte: I. Nenhum Cidadão póde ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude da Lei. (...) XI. Ninguem será sentenciado, senão pela Autoridade competente, por virtude de Lei anterior, e na fórma por ella prescripta. (...) XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um. (...)
A pretensa cidadania apontada por Vasconcelos, em seu ato legislativo,
pressupõe a observância do princípio da legalidade, da dignidade humana (apesar
de vigorar, até o fim do Império, a pena de morte na forca), da presunção da
inocência, do devido processo legal.
É igualmente visível a noção de soberania (política), ao estabelecer para o
“poder soberano” (Poder Moderador) a possibilidade de perdão ou minoração das
penas, especialmente a de morte, o que, aliás, fora praticado a partir de 1861,
quando, salvo uma única exceção (em 1876), o Imperador comutou as penas de
morte para prisão ou banimento.
Veja-se a ordem: Art. 66. “O perdão, ou minoração das penas impostas aos
réos, com que os agraciar o Poder Moderador, não os eximirá da obrigação de
satisfazer o mal causado em toda a sua plenitude”.
Obviamente a letra da lei estava imbuída de certa literalidade que recebeu a
respectiva carga interpretativa nas análises de casos concretos, o que não
desmereceu o Código Criminal, em vigor durante todo o Império brasileiro (e até
27
1891, quando fora substituído pelo novo Código Penal republicano “dos Estados
Unidos do Brasil”).
No mesmo ditame de direito público, tendo na Constituição a representação
das garantias ou “promessas” fundamentais, verifica José Antônio Pimenta Bueno,
em sua opus magnum, a necessidade inexorável de se conceber, em qualquer
civilização, fundamentos e princípios essenciais de regulação e organização política,
para o fim de assegurar aos partícipes desta relação sócio-política as garantias e
“promessas” inerentes: o bem de todos e o de cada um. Esse o verdadeiro
significado de uma Lei Maior, para além de mero “symbolo de esperanças
lisongeiras”.
Como aponta Bueno
É o frontispicio grandioso do edificio representativo, que para não ficar só em simples decoração isolada demanda suas columnas de segurança, seus espaços interiores, que resguardem os direitos publicos e individuaes, que sirvão de officinas da prosperidade social. (1857, p. 45)
Toda a argumentação de Pimenta Bueno nesse particular, referenciando
especialmente a Constituição de 1824, é além de técnica e jurídica, filosófica,
patriótica, moral e religiosa.
A análise da Carta Outorgada realizada por Pimenta Bueno merece especial
atenção à questão do legalismo, desde Vasconcelos apontado como elementar no
contexto histórico analisado.
Os incisos que expressam o princípio da legalidade, elencados no artigo 179
da Constituição Imperial, foram devidamente destacados pelo “Marquês de São
Vicente”, pois praticamente impõe sinonímia entre liberdade e lei. Veja-se, a
respeito, a interpretação acerca da primazia da legalidade, disposta no art. 179, § 1º
da Carta Imperial:
A liberdade no estado ou consideração puramente natural do homem é o
direito, a faculdade que elle tem de fazer ou não fazer tudo quanto queira sem outro
limite que não seja a prohibição da lei natural, ou por outra, tudo quanto não viole
seus deveres para com Deos, para com os outros homens, e para comsigo mesmo.
No estado social a liberdade é esse mesmo direito, salvas não só essas
restricções da lei natural, mas tambem as restricções da lei social.
A liberdade é o próprio homem, porque é a sua vida moral, é a sua
propriedade pessoal a mais preciosa, o dominio de si proprio, a base de todo o seu
28
desenvolvimento e perfeição, a condição essencial do gozo de sua intelligencia e
vontade, o meio de prefazer seus destinos.
É o primeiro dos direitos, e salva-guarda de todos os outros direitos, que
constituem o ser, a igualdade, a propriedade, a segurança, e a dignidade humana.
Em suma, todas as garantias fundamentais estão amparadas na liberdade,
que somente pode ser garantida, por sua vez, a partir da estrita legalidade. A lei é o
critério de liberdade do homem. Nada mais “moderno”, pois em perfeita consonância
com o instrumento inaugural da modernidade, a Declaração de 1789.
Sendo a liberdade regra geral, “principio absoluto”, fazer ou deixar de fazer
tudo o que a lei não proíbe é fazer prevalecer a mais alta garantia que pode uma
Carta Magna consolidar. E na esteira dessa garantia está a lei positiva como
elemento norteador.
A evolução histórica dos direitos humanos e a respectiva classificação
doutrinária em direitos humanos não traz em si nenhuma hierarquia entre os direitos
humanos. Em tese, não existe escalonamento dos direitos humanos, nenhum direito
apresenta primazia entre os demais, no sentido de que uns devem ser garantidos
em primeiro plano. O Estado Democrático tem o dever deimplementar todos os
direitos previstos na Constituição. Mas, evidentemente, no plano fático, esses
direitos podem até se apresentar como contraditórios.
Os horrores perpetrados pela 2ª guerra mundial serviram de impulso para a
reafirmação dos direitos humanos.
Busca-se, então, o ideal entre o Estado Liberal e o Totalitário. A história
demonstrou que a não-intervenção e a intervenção excessiva são igualmente
danosas.
Como salienta Comparato
Os primeiros fundamentos intelectuais para a compreensão da pessoa humana e para a afirmação da existência de direitos universais a ela inerentes delineiam-se entre os séculos VIII e II a.C., em meio ao surgimento das escolas de filosofia, na Grécia, e de uma nova valoração ética assimilada pelas religiões, as quais propiciaram laços de aproximação e compreensão mútua, entre diversos povos. (2007, p. 45)
Como se nota a evolução histórica dos direitos humanos está adstrita à luta
da humanidade pela afirmação da dignidade da pessoa humana. Essa luta
encontrou fundamento respectivamente no campo religioso, filosófico e científico.
29
O Estado Brasileiro conheceu sete Constituições. A Constituição de 1824,
como ja visto, tem clara influência do modelo constitucional francês do século XIX,
instituindo um Estado Liberal.
A Constituição de 1891 é inspirada nos ideais republicanos, com inspiração
da Constituição Norte-Americana, instituiu a República, de forma presidencialista de
Governo, Forma Federativa de Estado, e a criação de uma Suprema Corte. Surge o
Estado Democrático de Direito. O texto constitucional de 1934 surge na esteira da
Constituição da República Alemã de Weimar.
A Constituição de 1937 tem um cunho autoritário, com retrocesso a um
Estado de exceção. A Constituição de 1946 restaura o Estado Democrático de
Direito, que encontra sua derrocada com o golpe de 1964, que gerou a Constituição
de 1967, seguida pela Emenda de 1969.
A Constituição Federal de 1988 inaugurou um novo sistema jurídico, agora
embasado nos pressupostos do Estado Democrático e Social de Direito. O texto
constitucional configura-se como marco jurídico, social e político da transição
democrática e institucional, concedendo ênfase aos direitos e garantias individuais e
sociais. Essa Constituição inseriu no sistema jurídico pátrio a proteção dos direitos
humanos, constituindo-se a Carta Política mais avançada em matéria de direitos
individuais e sociais na história constitucional do país.
Da leitura dos primeiros artigos da Constituição verifica-se o destaque aos
direitos humanos (arts. 1º, II, 4º, II, da CF). A ênfase ao indivíduo, consagrada no
atual sistema jurídico, não caracteriza a República Federativa do Brasil como um
Estado Liberal; pelo contrário, a inserção dos direitos sociais na Carta Magna o
caracteriza como um Estado Democrático e Social de Direito. Essa assertiva é
verificada no referido Título I – DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS, da Constituição
Federal de 1988, em especial o art. 3º, e seus incisos, que traçam fundamentos
caracterizadores do Estado Democrático e Social de Direito, sendo que foi adotada a
denominação Estado Democrático de Direito, sem o qualificativo Social, por
questões meramente políticas embasado nos pressupostos do Estado Democrático
e Social de Direito.
Estado Democrático e Social de Direito, sendo que foi adotada a
denominação Estado Democrático de Direito, sem o qualificativo Social, por
questões meramente políticas.
30
“A Constituição de 1988 consagrou e constitui o Estado Democrático de
Direito no caput do seu art. 1º. Sintetizou nesse conceito os princípios do Estado
Social e Estado Liberal”.
Dessa forma, os direitos individuais encontram limites no Estado Social. O
Estado Democrático e Social de Direito, tem a função de conciliar a defesa social
com os interesses individuais dos cidadãos do Estado.
Como adverte Salo de Carvalho (2004, p. 195), “o texto constitucional
alavancou um sistema criminalizador, conformando um modelo penal programático”,
por ele denominado Constituição Penal dirigente:
Ainda no mesmo pensamento, o autor aduz que
Tem-se, desta forma, na história recente do constitucionalismo nacional, a formação de um núcleo constitucional-penal programático cujo efeito é aliar os mais diferenciados projetos políticos que, sob o manto retórico da construção/solidificação do Estado Democrático de Direito, optam, em realidade, pela edificação de um Estado Penal como “alternativa” ao inexistente Estado Social. [...] Exigiu-se da estrutura liberal (genealógica) do direito penal algo que dificilmente terá capacidade resolutiva, projetando severos índices de ineficácia. Desde esta perspectiva, pode-se afirmar a existência de uma ”Constituição Penal”, idealizadora/instrumentalizadora de um Estado Penal, plenamente realizada. (2004 p. 196)
À medida que o tempo passa, os direitos humanos vão perdendo seu valor
dentro do sistema carcerário, ocorrendo alguns problemas listados à seguir: espaço
físico inadequado; atendimento médico, odontológico e psicológico insatisfatório;
direitos do preso tratados como liberalidades; uma quantidade considerável de
presos poderia estar nas ruas por causa da Progressão Penal ou pelo cumprimento
da pena; falta de acesso efetivo à Justiça ou Defensorias Públicas; Segurança
Pública não consegue inibir as atividades do crime organizado que consegue
orquestrar diversas atividades retaliativas junto à sociedade, como o ataque
ordenado contra policiais, fechamento de comércio e escolas, execuções sumárias,
paralisação dos transportes coletivos e atentados a prédios públicos; tortura e maus-
tratos, corrupção, negligência e outras ilegalidades praticadas pelos agentes
públicos, além da conivência destes às movimentações que redundavam em fugas e
rebeliões, inclusive com saldo em mortes de presos; incapacidade da Segurança
Pública em manter a ordem e aplicar a lei com rigor sem desrespeitar os Direitos
Humanos dos apenados bem como incapacidade em cumprir as normas firmadas
nos acordos internacionais, os quais o Brasil é signatário; rebeliões e atentados
31
frequentes nas prisões; entrada de materiais proibidos que dão apoio ao crime
dentro e fora da prisão, tais como aparelhos celulares e armas brancas. estado não
consegue aplicar a tecnologia existente de forma a prevenir ou combater o crime,
tais como Bloqueador de Radiofrequencia, Raio X, e Detector de Metais.
A personalidade humana é o único requisito para a titularidade de direitos.
Isto porque todo ser humano tem uma dignidade que lhe é inerente, sendo
incondicionada, não dependendo de nenhum outro critério, senão ser humano. É o
princípio da dignidade que concede unidade aos direitos fundamentais expressos
na Constituição de 1988, ou seja, “sem que se reconheçam à pessoa humana os
direitos fundamentais que lhe são inerentes, em verdade estar-se-á lhe negando a
própria dignidade.
A positivação no texto constitucional da dignidade da pessoa humana
representa a consagração de uma ordem social justa, consubstanciando o respeito à
integridade moral de todo ser humano, independentemente de credo, raça, cor,
origem ou status social. O acatamento a esse princípio significa o triunfo da
igualdade sobre a intolerância, o preconceito, a exclusão social, a ignorância e a
opressão.
O art. 10 da LEP determina que “a assistência ao preso e ao internado é
dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em
sociedade”. O seu parágrafo único estende a assistência aos egressos. No art. 11,
consta que a assistência será material, jurídica, educacional, social, religiosa e à
saúde. As condições de vida numa prisão são determinantes do senso de auto-
estima e da dignidade do preso. O fornecimento de instalações de qualidade, com
estruturas adequadas para descanso, higiene, alimentação, lazer, trabalho e estudo
tem profunda influência no seu sentimento de bem-estar.
As condições de vida abrangem, também, o “clima na prisão”, condicionado,
entre outros fatores, pelo estilo de gerenciamento da unidade prisional e pela
natureza das relações entre os servidores penitenciários e os presos.
A existência de milhares de presos provisórios, por até cinco anos, sem
sentença definitiva, é uma das mais graves violações aos direitos humanos e uma
declaração de falência do Poder Judiciário nacional.
Providências urgentes devem ser tomadas para corrigir esta anomalia e
ilegalidade e, ao mesmo tempo, desafogar o sistema
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2.5 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS QUE GARANTEM A DURAÇÃO RAZOÁVEL
DO PROCESSO
2.5.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
A dignidade da pessoa humana está positivada no nosso ordenamento
jurídico no artigo 1º, III da CF/88 ao rezar que a República Federativa do Brasil,
formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático e de Direito e tem como fundamento a
dignidade da pessoa humana.
É assim um princípio que fundamenta nosso Estado de Direito, ou indo além
conforme Nunes (2002 p. 50) seria verdadeiro “supraprincípio constitucional que
ilumina todos dos demais princípios e normas constitucionais.”
Há, portanto, dois elementos ínsitos ao princípio da dignidade humana, um
material e outro instrumental. O material se realiza na existência do mínimo vital ao
ser humano, onde aquém desse limite não haverá dignidade.
Também se incorpora ao elemento material do princípio da dignidade
humana a vedação da utilização do ser humano como um meio ou instrumento de
outro ser humano ou do Estado, posto que é um fim em si mesmo, estando, portanto
dotado de autonomia para seguir seu próprio destino, conforme suas próprias
decisões, buscando seu pleno desenvolvimento.
Por sua vez, pode-se dizer que o acesso à justiça é o elemento instrumental
do princípio da dignidade da pessoa humana, pois é através dele que o ser humano
pode exigir e efetivar seus direitos. E considerando que o acesso à justiça não
constitui apenas a possibilidade de ingresso no Judiciário, mas também a garantia
de um processo célere e com respeito aos princípios processuais, afirmamos que a
duração razoável do processo garante a dignidade da pessoa humana.
Partindo desse pressuposto, afirma Oliveira
A razoável duração do processo insere-se como um acréscimo ao princípio do acesso à justiça, ampliando-o. Denota, a partir da recém aprovada emenda, a preocupação do legislador constitucional com a temática do tempo na prestação da tutela jurisdicional, nos Estados que se constituem em Estado Democrático de Direito. Tem como fundamento o pleno exercício da cidadania e o respeito à dignidade da pessoa humana, atributos que consolidam a compreensão dos princípios inerentes aos Direitos Humanos. (2006 p. 103)
33
A duração irrazoável do processo viola o princípio da dignidade humana, e
por isso, deve-se sempre lembrar de que quando mais demorado for o final do
processo menor será a justiça.
2.5.2 Princípio do Devido Processo Legal
A Constituição de 1988 foi a primeira a prever expressamente o princípio do
devido processo legal. As anteriores previam princípios que garantiam aos cidadãos
alguns direitos relacionados ao aspecto processual do princípio.
O princípio do devido processo legal possui uma natureza dual, tem uma
feição processual, destinado a garantir a realização de julgamentos por meio de um
procedimento adequado e justo, bem como uma substantiva, que é utilizada como
meio de controle da razoabilidade dos atos estatais.
O devido processo legal em sentido processual determina que as partes
tenham tratamento jurisdicional igualitário e que sejam seguidas determinadas
garantias inerentes ao processo, tais como o contraditório, a ampla defesa, a
possibilidade de recurso e etc.
2.5.3 Princípio da Proporcionalidade
O princípio da proporcionalidade constitui instrumento indispensável ao
aplicador das normas - especialmente àquelas que dispõem sobre direitos e
garantias constitucionais - para estabelecer limites e dirimir conflitos diante de casos
concretos. Através dele, se fazem ponderações e harmonizações de bens jurídicos
constitucionalmente tutelados, em vista das peculiaridades fáticas e jurídicas de
cada caso situação problema que se apresente.
Nas palavras de Bonavides o princípio da proporcionalidade apresenta três
aspectos:
a) adequação, que exige que o meio ou instrumento utilizado para alcançar a finalidade desejada seja apropriado; Com o desígnio de adequar o meio ao fim que se intenta alcançar, faz-se mister, portanto, que ‘a medida seja suscetível de atingir o objetivo escolhido. b) necessidade, que consubstancia a exigência da adoção do meio mais suave dentre aqueles igualmente aptos ao alcance do resultado buscado. Pelo sub-princípio da necessidade a medida não há de exceder os limites indispensáveis à
34
conservação do fim legítimo que se almeja, ou uma medida para ser admissível deve ser necessária; c) proporcionalidade em sentido estrito que representa a concreta apreciação dos interesses em conflito, necessitando da formulação de um juízo de sopesamento entre o meio adotado e a limitação sofrida pelo indivíduo, ou seja, exige que a relação meio e fim seja conforme e proporcional. (2005 p.234)
Em casos difíceis, em que o aplicador da lei não encontre na norma
processual a solução adequada ao caso concreto, haja vista os interesses em jogo,
deve-se utilizar o princípio da proporcionalidade, como meio apto à concretização
dos direitos constitucionalmente tutelados.
Conforme enfatiza Góez
A atividade jurisdicional estará em desarmonia com o acesso à justiça se não se valer da influência da proporcionalidade nas suas decisões. Os interesses em jogo devem constantemente ser contrabalanceados e o equilíbrio somente é alcançado por meio do princípio da proporcionalidade. Deve-se buscar hoje, o que Amini Haddad Campos denomina nova vertente do Direito Processual: o devido processo proporcional. Este devido processo proporcional traduz a idéia de que o juiz cria direito e não lei, pois esta é fruto do exercício da função legislativa. O papel da criatividade judicial está inserido na solução jurídica construída no caso concreto, a partir dos hard cases, a qual é erigida em princípios, notadamente o princípio da proporcionalidade. (2004 p. 75)
Fica claro que há casos concretos para a aplicação direta da lei, onde a
subsunção do fato à norma pela interpretação do juiz é imediata; mas em casos
difíceis é possível falar-se em alternativas juridicamente possíveis, sempre com o
auxílio do princípio da proporcionalidade, e com vistas ao fundamento maior de
nosso Estado de Direito, que é a dignidade da pessoa humana, que também garante
a duração razoável do processo.
2.5.4 O Princípio da Duração Razoável do Processo (art. 5° LXXXVIII da CF 88)
Em 31 de dezembro de 2004 foi inserido no art. 5° da Constituição Federal
por meio da Emenda Constitucional n° 45 o inciso LXXVIII em que consta a seguinte
redação: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável
duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
O inciso foi incluído na Emenda substitutiva n°11 da Comissão Especial
encarregada de oferecer parecer à proposta de Emenda Constitucional n°1 de 1992:
A proposta centra-se em reforma estrutural do Poder Judiciário, do primeiro grau aos Tribunais Superiores sublinhada, muito especialmente, por
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princípios de modernidade vigentes em países progressistas, tais como os da transparência, acesso, eficiência e efetividade da prestação jurisdicional ao cidadão. 2. Enfrentando preliminar necessária, a Emenda Substitutiva proposta adita aos incisos LV, LX, LXXI e LXXIV e cria os incisos LXXVIII, LXXIX e LXXX ao art. 5° da Constituição Federal, que trata dos “Direitos Individuais”, com princípios de reforço à assistência judiciária, do acesso à Justiça, da limitação de custas e taxas judiciais, do direito à comunicação da decisão final ao interessado e de razoável duração do processo, com os meios para tal necessários.” (Diário da Câmara dos Deputados – Suplemento, Terça-feira, 14 de dezembro de 1999, p. 00389).
Tal artigo é de relevância inestimável tendo em vista que resguarda
princípios de direito destinados à liberdade, igualdade e inúmeros outros direitos
adquiridos pelos cidadãos.
É excessiva a demora até que se alcance a solução de um conflito
apresentado ao Poder Judiciário por haver esgotado todas as possibilidades de
acordo entre as partes.
O processo se torna desgastante, causando contrangimentos e prejuízos a
cidadãos, tendo em vista que a duração razoável não está bem explícita, ou seja, tal
duração poderia atender o interesse das partes ou seria o tempo necessário para o
julgamento justo.
Assegura-se ainda, meios que garantam a celeridade numa tramitação
processual, porém, não se menciona tais meios que podem ser interpretados como
procedimentos simples e com prazos reduzidos, no entando, faz-se necessário uma
reforma, já que tudo deveria ser revisto.
Quanto à aplicabilidade do inciso, pode-se afirmar que, segundo o parágrafo
§1° do artigo 5° da CF/88, “as normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata” e o novo inciso LXXVIII do mesmo artigo 5º,
define que a todos, no âmbito judicial ou administrativo, são assegurados o direito à
razoável duração do processo, e a garantia da celeridade da tramitação dos
processos.
O inciso LXXVIII do artigo 5º, do Título II (Dos Direitos e Garantias
Fundamentais) capítulo I (Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos) pelo artigo
5, § 1° da CF/88, tem aplicação imediata, ou seja, independe de complementação
legislativa, seja de lei processual ou de norma administrativa, devendo o Poder
Judiciário aplicá-lo imediatamente em todos os processos em curso à vista de cada
caso concreto. E mais, as leis ou normas administrativas existentes que o contrariem
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são consideradas não recepcionadas se anteriores ou inconstitucionais se
posteriores à 31.12.04
Nas palavras de Diniz
As normas constitucionais com eficácia absoluta são as intangíveis; contra elas nem mesmo há o poder de emendar. Daí conterem uma força paralisante total de qualquer legislação que, explícita ou implicitamente, vier a contrariá-las. (2006 p. 46)
O que se nota, é que o inciso LXXVIII pode trazer melhorias e até mesmo
celeridade no âmbito judicial, porém, se for devidamente regulamentado, caso
contrário, não passará de mais uma Emenda Constitucional lamentavelmente
abstrata e ineficaz.
Em caso de violação do direito fundamental à razoável duração do processo
têm se entendido cabível pedido de indenização em face da responsabilidade
objetivo do Estado (art. 37, § 6° da CF/88).
Nesse sentido Hoffman aduz que:
Diante do novo inciso LXXVIII do art. 5° da CF/88, com a previsão da duração razoável do processo como garantia constitucional do cidadão, nosso posicionamento é cristalino no sentido de que o Estado é responsável objetivamente pela exagerada duração do processo, motivada por culpa ou dolo do juiz, bem como por ineficiência da estrutura do Poder Judiciário, devendo indenizar o jurisdicionado prejudicado – autor, réu, interveniente ou terceiro interessado -, independentemente de sair-se vencedor ou não na demanda, pelos prejuízos materiais e morais. (2006, p. 99)
Cabe aqui enfatizar que a duração razoável do processo é um direito
fundamental e ocorrendo sua violação em determinado caso concreto para a sua
proteção é cabível o mandado de segurança.
A razão da demora do processo talvez seja o excessivo formalismo, com
minúcias exageradas em formalidades procedimentais, que muitas vezes geram
nulidades (que são sanáveis) e até a extinção injusta do processo sem julgamento
de mérito.
Parece que há atualmente a pretenção por parte do Judiciário de se impedir
o acesso à jurisdição com a verificação do formalismo exagerado, muitas vezes
irrazoável da lei processual, somente para não se examinar a pretensão material
discutida no caso concreto, por mais paradoxal que isso possa parecer.
Pode-se citar inúmeros exemplos de que se tem conhecimento, dessa triste
realidade, onde a burocracia formal e arraigada torna-se autônoma e independente
37
do processo do qual deveria ser apenas acessória e simplificada: a exigência de
cópia autenticada para instrução do recurso de agravo, sob pena de não
conhecimento, e o pagamento de custas no banco que se encontra dentro do fórum
ou Tribunal, sob pena também de não conhecimento da ação ou recurso,
exigências, data vênia irrazoáveis, que existem na justiça federal .
O aumento excessivo do valor do preparo, a contínua “extinção” de recursos
feitas pelo legislador, também leva a crer que o fenômeno do impedimento do
acesso à decisão que examine a pretensão material não tem sido praticado somente
pelo Judiciário. A tão discutida morosidade do judiciário não pode servir de
argumento para criação de leis que impeçam o acesso à justiça.
Somente caberá a irresponsabilidade do Estado se o atraso se verificou em
razão dos atos ou omissões das partes, pois como contido no art. 17 do Código de
Processo Civil “a menos que as falhas das partes recair na capitulação geral do
litigante de má-fé, não se verificará a responsabilidade do Estado ante erros e falhas
provenientes de atos da parte”.
No caso de processos cíveis onde não exista o perigo de ocorrência de dano
irreparável ou o perecimento de direito, mas esteja presente a demora na prestação
jurisdicional, como por exemplo, o decurso de vários anos para o proferimento de
sentença ou o julgamento de apelação e não sendo este atraso causado pelo
comportamento das partes, mas simplesmente em razão da própria ineficiência do
Estado, cabe a impetração de mandado de segurança para que seja ordenada a
prestação jurisdicional devida pela autoridade coatora, ou se for o caso
restabelecimento da atividade jurisdicional injustificadamente paralisada, por
violação ao princípio da duração razoável do processo.
2.6 PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA
O princípio da presunção surge como meio de limitar o poder de punir do
Estado, que, ao longo da história, tratou o acusado como culpado desde o início do
processo penal, sem atribuir a este qualquer direito.
Segundo Ferreira
Seu marco principal ocorreu no final do século XVIII, em pleno iluminismo, quando na Europa Continental, surgiu a necessidade de se insurgir contra o sistema processual penal inquisitório de base romano-canônica, que vigia desde o século XII. Nesse período e sistema o acusado era desprovido de toda e qualquer garantia. Surgiu, daí, a necessidade de se proteger o
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cidadão do arbítrio do Estado que, a qualquer preço, queria sua condenação, presumindo-o, como regra, culpado [...].(2001, p. 150)
O referido princípio foi proclamado, pela primeira vez, na Declaração de
Direitos do Homem e do Cidadão, no ano de 1789. Posteriormente, foi recepcionado
pela Declaração Universal de Direitos do Homem, da ONU, em 1948.
Na Constituição Federal de 1988, o princípio da presunção de inocência está
no art. 5°, LVII e assegura ao réu de um processo criminal que não seja
considerado culpado até que tenha transitado em julgado a sentença penal que o
condenou.
No conceito de Moraes
O princípio da presunção de inocência consubstancia-se, portanto, no direito de não ser declarado culpado senão mediante sentença judicial com trânsito em julgado, ao término do devido processo legal (due processo of law), em que o acusado pôde utilizar-se de todos os meios de prova pertinentes para sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas pelo acusado (contraditório). (2003, p. 386)
Contudo, o princípio da presunção de inocência não obsta a adoção de
determinadas medidas de caráter cautelar, seja em relação à própria liberdade do
eventual investigado ou denunciado, seja em relação aos seus bens. O que não se
admite é a que a providência a ser tomada importe em antecipação da condenação
ou de sua execução.
Como aduz Freitas (2009 )
Nos tratados e nas Cortes Internacionais é dito que toda pessoa se presume inocente até prova de sua culpa em um tribunal. Nesta mesma interpretação segue a Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, a Convenção Européia dos Direitos Humanos, 1950, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos da ONU, de 1966, o Pacto de San José da Costa Rica e o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 2002. Mas em nenhum deles se afirma que esta presunção exige o esgotamento de todas as instâncias. Interpretando tais dispositivos na realidade forense internacional, a regra não é aguardar o esgotamento de todas as instâncias.
A integridade física consiste, como o próprio nome indica, o direito de o
cidadão não ter o seu corpo violado fisicamente, danificado, agredido ou ferido. Vale
frisarque esse direito é inclusive tutelado pelo Direito Penal, que tipificou
criminalmente como lesão corporal leve (artigo 88 da Lei 9099/95)71, grave ou
gravíssima (artigo 129 do Código Penal).
Já a integridade moral é o direito de o preso ter resguardada a sua
incolumidade psíquica, sem ser humilhado, insultado ou menosprezado. Caso esse
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direito seja desrespeitado a Constituição garante à vítima o direito de resposta
proporcional ao agravo, cumulado ou não com uma indenização por dano moral, nos
termos do artigo 5°, inciso V.
Desse modo, impõe-se ao Estado o dever constitucional e legal de vigilância
para evitar que qualquer preso que esteja sob sua custódia venha a sofrer danos
pessoais. É incumbência dos agentes públicos resguardar as pessoas recolhidas a
prisões, buscando evitar que auto-lesões ou agressões praticadas por terceiros
venham a ocorrer.
Como menciona Gomes primeira formulação acerca da aplicabilidade do
princípio da presunção de inocência, incide o posicionamento de que:
a aplicação mais comumente defendida pela doutrina da norma sob exame dá-se no campo probatório. Nessa primeira formulação, o réu ser presumido inocente significa, por um lado, que o ônus de provar a veracidade dos fatos que lhe são imputados é da parte autora na ação penal (em regra, o Ministério Público) e, por outro lado, que se permanecer no espírito do juiz alguma dúvida após a apreciação das provas produzidas, deve a querela ser decidida a favor do réu. (1999, p. 111/11)
A Constituição garante a todos o direito à ampla defesa, mas não se pode
caminhar para um sistema insensato e tolo em que dificilmente se chega a uma
condenação definitiva. A tese de que não é possível manter na prisão aqueles que
foram condenados e os que ainda têm recursos para serem julgados não pode
ganhar a extensão que foi dada pelo STF.
O Código de Processo Penal, nos artigos. 311 a 316, disciplina a prisão
preventiva, que é uma modalidade de prisão provisória, de natureza cautelar e que
poderá ser decretada judicialmente em qualquer fase, até mesmo antes do
oferecimento da denúncia, nos termos do art. 312 do CPP, provada a existência do
crime e indício suficiente de sua autoria. (BRASIL, 1941, p. 644).
Se um processo for conduzido no sentido de esgotar todos os recursos, sua
duração é longa. O juiz de primeiro grau condena, o de segundo grau confirma e o
Tribunal Superior mantém. Mas, enquanto não haja a decisão final da Corte
Suprema, a inocência é presumida. Notável o grande equívoco desta interpretação,
pois é razoável o entendimento de que a presunção deveria ser exatamente o
contrário: se já houve três condenações, o lógico seria presumir a culpa, nunca a
inocência. As decisões dos juízes de primeiro e segundo graus devem ser levadas a
sério.
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CONCLUSÃO
O tratamento desumano dado aos presos e seus familiares é uma realidade
histórica, que não teve nenhuma alteração com a aprovação da Lei de Execução
Penal, em julho de 1984, que, caso fosse efetivamente aplicada, garantiria aos
presos e seus familiares uma outra perspectiva de futuro. Todavia, nas últimas três
décadas, o problema se agravou. Além da ampliação das dificuldades já existentes
(como superlotação, tortura e assassinatos), houve a expansão do narcotráfico e o
aumento significativo da população carcerária e os estabelecimentos prisionais
brasileiros passaram a ser dominados por facções criminosas.
Apesar dos esforços envidados pelas autoridades no sentido de reprimir tais
práticas delituosas, as organizações criminosas continuam a atuar nos presídios,
posto que as condições que deram origem a elas e ajudaram a disseminá-las ainda
persistem.
O Estado não deveria permitir ou sustentar a rotina de convivência e
clausura de presos que praticaram pequenos delitos com outros altamente perigosos
e com uma margem infinitamente menor de serem ressocializados. Pode-se ainda
afirmar que os criminosos de alta periculosidade não poderão ser ressocializados no
atual contexto do Sistema Penitenciário.
A segurança dos presídios não garantem real proteção à sociedade, aos
agentes e nem tampouco aos próprios presos. O aumento da criminalidade na
sociedade reflete o aumento da superlotação no Sistema Penitenciário na mesma
proporção.
A existência do sistema prisional só se justifica pela situação fática de que
uma quantidade considerável de criminosos não podem ser reintegrados à
sociedade, apresentando assim uma relação social negativa com o esta enquanto
livre, pelo tempo que sua existência perdure.
A condição financeira para se criar novos presídios nunca será suficiente
para suprir as necessidades de construção de novos espaços e sua manutenção
levando-se em conta a plena deterioração social pela qual estamos à mercê, e por
conta desta, a cada dia a criminalidade aumenta.
A maioria dos estabelecimentos penais não oferece aos presos condições
mínimas para que vivam adequadamente. Ou seja, condições indispensáveis ao
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processo de preparação do retorno do interno ao convívio social. O próprio estado
mostra-se incapaz ou até mesmo negligente em diagnosticar se algumas medidas
de prevenção e segurança implantadas não funcionaram pela sua inviabilidade
técnica de alcançar o objetivo esperado ou se não o alcançou por falta de
manutenção.
Independentemente dos delitos que cometeram, os presos perderam apenas
a liberdade e não a alma, a dignidade e a vida.
Diante do escrito, acredita-se que com políticas econômicas viáveis,
programas sociais efetivos; ações de prevenção e combate à criminalidade, governo
e sociedade estarão caminhando a passo largos para fechar as portas de entrada no
sistema carcerário.
Da mesma forma, governo e sociedade devem juntar as mãos no esforço
concentrado e solidário para abrir as portas do sistema carcerário ao cumprimento
das leis, ao respeito dos encarcerados e sobretudo para garantir o direito de todos
os brasileiros a uma vida tranqüila e segura.
Em contra ponto também para fazer uma reforma profunda no Judiciário foi
necessário modificar a Constituição, até porque antes da promulgação do inciso
LXXVIII da CF/88, ainda que com algumas tentativas de reformas implementadas
pelo Legislador no CPC, a situação calamitosa do Judiciário continuava, com
milhares de processos aguardando julgamentos, tanto em primeira, quanto em
segunda e nas instâncias superiores.
Com o estabelecimento expresso do princípio da duração razoável do
processo houve a certeza que poderia ser modificada a situação do Judiciário, mas
para isto, não basta que os Poderes Públicos o implemente concretamente, mas
que, a doutrina o interprete de acordo com a sua finalidade verificando a ilegítimos
das normas ou atos processuais que importem em obstáculo injustificável ao bom
andamento do processo ou propondo a criação de outras ou outros que garantam a
celeridade processual sem descurar das demais garantias constitucionais, e
finalmente que os profissionais do direito colaborem aplicando-o através de
requerimentos sempre que se virem diante de um processo onde se apresente
condutas irrazoáveis e desproporcionais que violem o citado princípio.
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REFERÊNCIAS
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43
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