a quarta teoria politica

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  • A QUARTA TEORIA POLTICA

    Alexander Dugin

  • 2

    Alexander Dugin

    A QUARTA

    TEORIA

    POLTICA

    2012

  • 3

    Captulo 1: Introduo ............................................................................ 11

    Ser ou No Ser? ................................................................................................. 11

    Captulo 2: Incio Conceitual. O Fim do Sculo XX O Fim da Modernidade .............................................................................................. 17

    As Trs Principais Ideologias e seu Destino no Sculo XX .............. 18

    O Fim do Liberalismo e a Chegada do Ps-Liberalismo .................. 21

    A Quarta Teoria Poltica como Resistncia ao Status Quo .............. 25

    A Batalha pela Ps-Modernidade .............................................................. 29

    Repensando o passado e aqueles que perderam................................ 32

    O Retorno da Tradio e da Teologia ...................................................... 35

    Mitos e Arcasmo na Quarta Teoria Poltica ......................................... 38

    Heidegger e o Evento (Ereignis) ............................................................ 40

    A Quarta Teoria Poltica e a Rssia .......................................................... 43

    Captulo 3: Dasein Como Ator Fases e Problemas no Desenvolvimento da Quarta Teoria Poltica ................................... 47

    Captulo 4: A Crtica dos Processos Monotnicos ......................... 94

    Captulo 5: A Reversibilidade do Tempo ....................................... 118

    Captulo 6: A Ontologia do Futuro ................................................... 125

    Captulo 7 - Transio Global e Seus Inimigos ............................ 151

  • 4

    A Ordem Mundial Questionada ................................................................ 151

    Ordem Mundial do ponto de vista dos Estados Unidos ................. 154

    A Ordem Mundial do ponto de vista no americano....................... 165

    Captulo 8 - A Nova Antropologia Poltica: O Homem Poltico e Suas Mutaes. ........................................................................................ 174

    Os Limites da Ps-Antropologia e a Origem da Ps-Poltica ....... 177

    Os Principais Sujeitos da Ps-Poltica ................................................... 180

    O Fatalismo da Ps-Antropologia e da Angelopolis ......................... 185

    Captulo 9 - Quarta Prtica Poltica ................................................. 189

    Captulo 10 - O Gnero na Quarta Teoria Poltica ...................... 204

    Captulo 11 - Conservadorismo e Ps-Modernidade ................ 220

    Estamos na ps-modernidade .................................................................. 220

    O Polo da Liberdade e a Liberdade de Escolher o Canal ............... 221

    Paradoxos da Liberdade ............................................................................. 223

    Conservadorismo como Rejeio da Lgica da Histria ............... 226

    Conservadorismo Fundamental: Tradicionalismo .......................... 227

    Conservadores Fundamentais Hoje ....................................................... 232

    Conservadorismo Status Quo Conservadorismo Liberal ........... 237

    Bin Laden como Smbolo ............................................................................ 239

  • 5

    Simulacro de Che Guevara ......................................................................... 240

    Revoluo Conservadora ............................................................................ 242

    Os Conservadores devem liderar uma Revoluo ........................... 243

    Dasein e Ge-Stell ............................................................................................. 246

    Triste Fim do Espetculo ............................................................................ 248

    Conservadorismo de Esquerda (social-conservadorismo) .......... 250

    Eurasianismo como Episteme ................................................................... 251

    Neoeurasianismo ........................................................................................... 254

    Captulo 12: Civilizao como Conceito A Necessidade de uma definio especfica ........................................................................ 256

    Civilizao como estgio de desenvolvimento de uma sociedade 257

    Civilizao e Imprio .................................................................................... 258

    Civilizao e o Tipo Universal ................................................................... 259

    Civilizao e cultura ...................................................................................... 261

    Entendimento ps-moderno e sincrnico da civilizao ............... 262

    Desconstruo da "civilizao" ................................................................. 265

    Atualmente o entendimento sincrnico e plural da "civilizao" prevalece ............................................................................................................ 269

    A crise dos modelos clssicos da anlise histrica (classe, econmica, liberal, racial) ........................................................................... 273

  • 6

    Utpicos liberais voltam atrs: construo do Estado ...................... 277

    O mundo como rede (por Thomas Barnett) ........................................ 278

    A viso americana da ordem mundial (trs verses)....................... 279

    Limitao do arsenal ideolgico dos oponentes da globalizao e o mundo unipolar ............................................................................................... 282

    O significado do conceito "civilizao" como oposio ao globalismo ......................................................................................................... 284

    Para o "Grande Espao" ................................................................................ 285

    Lista de civilizaes ....................................................................................... 287

    O Ideal Multipolar ........................................................................................... 291

    Captulo 13 - A Transformao da Esquerda no Sculo XXI ... 294

    Filosofia da Esquerda em crise ................................................................ 294

    Trs Variedades da Ideologia da Esquerda ........................................ 295

    Marxistas Ortodoxos Europeus ............................................................... 297

    Social-democratas Europeus .................................................................... 300

    Socialistas de Terceira Via ..................................................................... 303

    Nacional-Comunismo (paradoxo conceitual, discrepncias ideolgicas, energias subterrneas) ...................................................... 306

    Novos Esquerdistas (antiglobalismo, rotas ps-modernas, labirinto de liberdades, ao advento da ps-humanidade) ............ 314

    Esquerdistas na Rssia moderna ............................................................ 324

  • 7

    Captulo 14 - O Liberalismo e suas Metamorfoses ..................... 328

    O Liberalismo como um Sumrio para a Civilizao Ocidental, e sua Definio ................................................................................................... 331

    Liberdade de ............................................................................................. 333

    O Liberalismo e a Nao ............................................................................. 336

    O Desafio do Marxismo ............................................................................... 338

    A Vitria Definitiva dos Liberais na Dcada de 90 ........................... 343

    No Limiar do Sculo Americano .............................................................. 345

    Liberalismo e Ps-Modernidade ............................................................. 351

    O Liberalismo na Rssia Contempornea ........................................... 355

    Captulo 15 - A Possibilidade de Revoluo na Ps-Modernidade ........................................................................................... 360

    A Morfologia e Semntica da Revoluo .............................................. 360

    Tecnologia da Revoluo ............................................................................ 365

    Revoluo e Modernidade. O Desafio da Revoluo Conservadora ............................................................................................................................... 368

    A Possibilidade de Revoluo na Ps-Modernidade ....................... 369

    A Revoluo na Rssia moderna ............................................................. 371

    Captulo 16 - Contra o Mundo Ps-Moderno ................................ 375

    O Mal da Unipolaridade .............................................................................. 375

  • 8

    Em Direo Quarta Teoria Poltica ..................................................... 379

    Apndices ................................................................................................. 386

    Ps-Antropologia Poltica ............................................................................ 386

    Apndice II. Gnero nas Trs Teorias Polticas da Modernidade ............................................................................................................................... 397

    Apndice III. Quarta Teoria Poltica e Praxis ..................................... 410

    Apndice IV. Metafsica do Caos ................................................................ 422

    Apndice V. O Projeto da Grande Europa .............................................. 437

    (Um projeto geopoltico para um futuro mundo multipolar) ....... 437

  • 9

    Sobre o autor

    Alexandr Gelyevich Dugin nasceu em 1962, em Moscou,

    capital russa, filho de um oficial da inteligncia militar

    sovitica e de uma mdica. Filsofo, socilogo, cientista

    poltico e ativista, destaca-se como o principal pensador do

    neoeurasianismo, com seu projeto geopoltico de congregar as

    naes europeias e asiticas em uma Unio Eurasiana para

  • 10

    fazer oposio hegemonia internacional americana e

    estabelecer uma realidade global multipolar.

    Diretor do Centro de Estudos Conservadores da Universidade

    de Moscou, Doutor em Cincias Polticas e Cincias Sociais,

    uma nota fundamental em sua trajetria, que o distancia dos

    meros acadmicos, tem sido sua participao ativa desde o

    final da dcada de 80 em diversos movimentos nacionalistas e

    revolucionrios visando salvaguardar a soberania e restaurar

    a glria de sua nao. Durante alguns anos em meados da

    dcada de 90, foi um dos principais idelogos do Partido

    Nacional-Bolchevique, at que, em 1998 saiu do mesmo por

    discordncias ideolgicas e estratgicas. Em 2001, funda o

    Partido Eurasiano, posteriormente Movimento Eurasiano, o

    qual ele lidera at hoje.

    Entre suas principais obras esto Conspirologia (1992), A

    Revoluo Conservadora (1994), Os Mistrios da Eursia

    (1996), Os Cavaleiros Templrios do Proletariado (1996),

    Fundamentos da Geopoltica (1997), A Filosofia da Guerra

    (2004), Geopoltica Ps-Moderna (2007), A Quarta Teoria

    Poltica (2009), entre outros.

  • 11

    CAPTULO 1: INTRODUO

    SER OU NO SER?

    No mundo atual, a poltica parece ter acabado, pelo

    menos como ns a conhecemos. O liberalismo

    persistentemente lutou contra seus inimigos polticos que

    haviam oferecido sistemas alternativos; isto , o

    conservadorismo, o monarquismo, o tradicionalismo, o

    fascismo, o socialismo e o comunismo, e finalmente ao fim do

    sculo XX, havia derrotado todos eles. Seria lgico assumir que

    a poltica se tornaria liberal, enquanto todos os seus

    oponentes marginalizados reconsiderariam suas estratgias e

    formulariam uma nova frente unida segundo a periferia contra

    o centro, de Alain de Benoist. Mas, ao invs, no incio do sculo

    XXI tudo seguiu um roteiro diferente.

    O liberalismo, que sempre havia insistido na

    minimalizao da poltica, tomou a deciso de abolir a poltica

    completamente aps seu triunfo. Talvez isso tenha sido para

    prevenir a formao de alternativas polticas e para tornar seu

    domnio eterno, ou porque a agenda poltica havia

    simplesmente expirado com a ausncia de rivais ideolgicos,

  • 12

    cuja presena Carl Schmitt havia considerado indispensvel

    para a construo adequada de uma posio poltica.

    Independentemente da razo, o liberalismo fez tudo o possvel

    para garantir o colapso da poltica. Ao mesmo o tempo, o

    prprio liberalismo mudou, passando do plano das ideias,

    programas polticos e declaraes para o plano das coisas,

    penetrando na prpria carne da realidade social, a qual se

    tornou liberal. Isso foi apresentado no como um processo

    poltico, mas como um processo natural e orgnico.

    Como consequncia de tal virada histrica, todas as

    outras ideologias polticas, lutando apaixonadamente uma

    contra a outra durante o ltimo sculo, perderam sua vigncia.

    O conservadorismo, o fascismo e o comunismo, junto com suas

    variaes secundrias perderam a batalha e o liberalismo

    triunfante transmutou-se em um estilo de vida: consumismo,

    individualismo e uma iterao ps-moderna do ser

    fragmentado e subpoltico. A poltica se tornou biopoltica,

    passando ao nvel individual e sub-individual. Acontece que

    no foram apenas as ideologias polticas derrotadas que

    deixaram o palco, mas a poltica, enquanto tal, incluindo o

    liberalismo, que tambm se retirou. por essa razo que a

    formao de uma alternativa se tornou to difcil. Aqueles que

  • 13

    no concordam com o liberalismo se encontram em uma

    situao difcil o inimigo triunfante se dissolveu e

    desapareceu; eles esto lutando contra o ar. Como se pode

    engajar na poltica, se no h poltica?

    H apenas uma sada rejeitar as teorias polticas

    clssicas, tanto vitoriosas como derrotadas, empenhar a

    imaginao, tomar a realidade do novo mundo global, decifrar

    corretamente os desafios da Ps-Modernidade, e criar algo

    novo algo para alm das batalhas polticas dos sculos XIX e

    XX. Tal abordagem um convite ao desenvolvimento da

    Quarta Teoria Poltica para alm do comunismo, do fascismo

    e do liberalismo.

    Para avanar em direo ao desenvolvimento dessa

    Quarta Teoria Poltica, necessrio:

    Reconsiderar a histria poltica dos ltimos sculos desde

    novas posies para alm das estruturas e clichs das

    velhas ideologias;

    Perceber e se tornar consciente da estrutura profunda da

    sociedade global emergindo diante de nossos olhos;

    Decifrar corretamente o paradigma da Ps-Modernidade;

  • 14

    Aprender a se opor no ideia, programa ou estratgia

    poltica, mas ao status quo objetivo, o aspecto mais

    social da (ps-) sociedade fraturada e apoltica;

    Finalmente, construir um modelo poltico autnomo que

    oferea um caminho e um projeto no mundo de

    encruzilhadas, becos sem sada e reciclagem infindvel

    das mesmas coisas velhas (ps-histria, segundo

    Baudrillard).

    Esse livro dedicado a esse problema mesmo como o

    incio do desenvolvimento de uma Quarta Teoria Poltica,

    atravs de um panorama e um reexame das trs primeiras

    teorias polticas e de suas ideologias prximas, como nacional-

    bolchevismo e o eurasianismo que se aproximaram bastante,

    de fato, da Quarta Teoria Poltica. Este um convite

    criatividade poltica, uma declarao de intuies e

    conjecturas, uma anlise de novas condies e uma tentativa

    de reconsiderao do passado.

    A Quarta Teoria Poltica no nos parece como a obra de

    um nico autor, mas como uma tendncia de um amplo

    espectro de ideias, pesquisas, anlises, prognsticos e

  • 15

    projetos. Qualquer um que pense nessa veia pode contribuir

    com algumas de suas prprias ideias. No obstante, mais e

    mais intelectuais, filsofos, historiadores, cientistas,

    estudiosos e pensadores respondero a esse chamado.

    significativo que o livro Contra o Liberalismo, pelo

    bem sucedido intelectual francs Alain de Benoist, que

    tambm publicado em russo pela editora Amphora, possui

    como subttulo Em direo Quarta Teoria Poltica.

    Indubitavelmente, muitas coisas podem ser ditas sobre este

    tema por representantes tanto da velha Esquerda como da

    velha Direita e, provavelmente, at mesmo pelos prprios

    liberais, que esto conceitualizando mudanas qualitativas de

    sua prpria plataforma poltica, da qual a poltica est

    desaparecendo.

    Para meu prprio pas, a Rssia, a Quarta Teoria

    Poltica, entre outras coisas, possui uma significncia prtica

    imensa. A maior parte do povo russo sofre sua integrao na

    sociedade global como uma perda de sua prpria identidade.

    A populao russa havia rejeitado quase inteiramente a

    ideologia liberal na dcada de 90. Mas tambm aparente que

    um retorno s ideologias polticas no liberais do sculo XX,

    tais como comunismo ou fascismo, improvvel, j que essas

  • 16

    ideologias j falharam e se provaram historicamente

    incapazes de se opor ao liberalismo, para no dizer nada dos

    custos morais do totalitarismo.

    Portanto, de modo a preencher esse vcuo poltico e

    ideolgico, a Rssia necessita de uma nova ideia poltica. Para

    a Rssia, o liberalismo no se encaixa, mas o comunismo e o

    fascismo so igualmente inaceitveis. Consequentemente, ns

    precisamos de uma Quarta Teoria Poltica. E se para algum

    essa uma questo de liberdade de escolha, a realizao da

    vontade poltica, que sempre pode ser dirigida tanto a uma

    assero e sua negao, ento para a Rssia essa uma

    questo de vida e morte, a eterna questo de Hamlet.

    Se a Rssia decidir ser, ento isso significa

    automaticamente a criao de uma Quarta Teoria Poltica. Do

    contrrio, para a Rssia resta apenas a opo de no ser e

    ento deixar o palco histrico e mundial, e se dissolver no

    mundo global, nem criado ou governado por ns.

  • 17

    CAPTULO 2: INCIO CONCEITUAL. O FIM DO SCULO XX O FIM DA MODERNIDADE

    O sculo XX acabou, mas apenas agora que ns

    estamos comeando a verdadeiramente perceber e entender

    esse fato. O sculo XX foi o sculo da ideologia. Se nos sculos

    anteriores, religio, dinastias, Estados, classes e Estados-nao

    desempenharam um enorme papel nas vidas de pessoas e

    sociedades, ento, no sculo XX, a poltica passou a um reino

    puramente ideolgico, tendo redesenhado o mapa do mundo,

    de etnias, e civilizaes de uma nova maneira. Por um lado, as

    ideologias polticas representavam tendncias civilizacionais

    primitivas e profundamente enraizadas. Por outro lado, elas

    eram completamente inovadoras.

    Todas as ideologias polticas, tendo alcanado o pico de

    sua distribuio e influncia no sculo XX foram o produto da

    nova Era Moderna, incorporando o esprito da modernidade,

    ainda que de diferentes modos e mesmo atravs de diferentes

    smbolos. Hoje, ns estamos deixando rapidamente essa Era.

    Assim, todos falam mais e mais frequentemente da crise da

  • 18

    ideologia ou mesmo do fim da ideologia desse jeito e a

    existncia de uma ideologia estatal explicitamente negada na

    Constituio da Federao Russa. J passou a hora de abordar

    essa questo mais proximamente.

    AS TRS PRINCIPAIS IDEOLOGIAS E SEU DESTINO NO SCULO XX

    As trs principais ideologias do sculo XX foram:

    Liberalismo

    Comunismo

    Fascismo

    Elas lutaram entre si at a morte, formando, em

    essncia, toda a dramtica e sangrenta histria poltica do

    sculo XX. lgico numerar essas ideologias (teorias polticas)

    tanto com base em sua significncia e em ordem de sua

    ocorrncia, como feito acima.

  • 19

    A primeira teoria poltica o liberalismo. Ele emergiu

    primeiro, to cedo quanto o sculo XVIII e acabou sendo a

    ideologia mais estvel e bem sucedida, tendo finalmente

    prevalecido sobre seus rivais nessa batalha histrica. Como

    resultado dessa vitria, ele provou, entre outros fatores, a

    justificativa de sua reivindicao sobre todo o legado do

    Iluminismo. Hoje, bvio que era o liberalismo que estava

    melhor adaptado modernidade. Porm, esse legado era

    disputado inicialmente, dramaticamente, ativamente e, em

    momentos, convincentemente, por outra teoria poltica o

    comunismo.

    razovel chamar o comunismo, tanto quanto o

    socialismo em todas as suas variedades, de segunda teoria

    poltica. Ele apareceu depois do liberalismo como uma

    resposta crtica emergncia do sistema burgus-capitalista,

    que era a expresso ideolgica do liberalismo.

    E, finalmente, o fascismo a terceira teoria poltica.

    Como uma concorrente por seu prprio entendimento do

    esprito da modernidade, muitos pesquisadores, Hannah

    Arendt em particular, razoavelmente consideram o

    totalitarismo como uma das formas polticas da modernidade.

    O fascismo, porm, se voltou para as ideias e smbolos da

  • 20

    sociedade tradicional. Em alguns casos, isso gerou um

    ecletismo, em outros o desejo dos conservadores de liderar

    uma revoluo ao invs de resistir a ela, levando sua

    sociedade na direo oposta, i.e. Arthur Moeller van den

    Bruck, Dmitry Merezhkovsky, etc.

    O fascismo emergiu depois das outras grandes teorias

    polticas e desapareceu antes delas. A aliana da primeira

    teoria poltica com a segunda teoria poltica, bem como os

    equvocos geopolticos suicidas de Hitler, o derrubaram no

    meio do caminho. A terceira teoria poltica foi uma vtima de

    homicdio ou talvez de suicdio, no vivendo o bastante

    para conhecer a velhice e a decomposio natural, em

    contraste com a URSS. Portanto, esse fantasma vampiresco

    sangrento, tinindo com uma aura de maldade global,

    atraente aos gostos decadentes da ps-modernidade, ainda

    amedrontando a humanidade em grande medida.

    Com seu desaparecimento, o fascismo abriu espao

    para a batalha entre a primeira e a segunda teoria poltica.

    Essa batalha assumiu a forma da Guerra Fria e deu origem

    geometria estratgica do mundo bipolar que durou quase

    meio sculo. Em 1991, a primeira teoria poltica, o liberalismo,

  • 21

    havia derrotado a segunda teoria poltica, o socialismo. Isso

    marcou o declnio global do comunismo.

    Como resultado, ao fim do sculo XX, a teoria liberal a

    nica remanescente das trs teorias polticas da Modernidade

    que capaz de mobilizar as vastas massas por todo o mundo.

    Porm, agora que ela ficou por conta prpria, todos falam em

    unssono sobre o fim da ideologia. Por qu?

    O FIM DO LIBERALISMO E A CHEGADA DO PS-LIBERALISMO

    Acontece que o triunfo do liberalismo, a primeira teoria

    poltica, coincidiu com seu fim. Isso apenas parece ser um

    paradoxo.

    O liberalismo tem sido uma ideologia desde o incio. Ele

    no era to dogmtico quanto o marxismo, mas no era menos

    filosfico, gracioso e refinado. Ideologicamente ele se opunha

    ao marxismo e ao fascismo, no apenas empreendendo uma

    guerra tecnolgica pela sobrevivncia, mas tambm

    defendendo seu direito de monopolizar sua prpria imagem

    do futuro. Enquanto as outras ideologias competidoras

    estavam vivas, o liberalismo perdurou e tornou-se mais forte

  • 22

    precisamente como ideologia, i.e. um conjunto de ideias,

    vises e projetos que so tpicos para um sujeito histrico.

    Cada uma das trs teorias polticas tinha seu prprio sujeito.

    O sujeito do comunismo era a classe. O sujeito do

    fascismo era o estado no fascismo italiano sob Mussolini, ou

    raa no nacional-socialismo de Hitler. No liberalismo, o sujeito

    era representado pelo indivduo, livre de todas as formas de

    identidade coletiva e de qualquer pertencimento

    (lappartenance).

    Enquanto o conflito ideolgico possua oponentes

    formais, naes e sociedades inteiras, ao menos teoricamente,

    foram capazes de selecionar seu sujeito de preferncia o da

    classe, racismo/estatismo, ou individualismo. A vitria do

    liberalismo resolveu essa questo: o indivduo se tornou o

    sujeito normativo dentro da estrutura de toda a humanidade.

    nesse ponto que o fenmeno da globalizao emerge,

    o modelo de uma sociedade ps-industrial se faz conhecido e a

    era ps-moderna tem incio. De agora em diante, o sujeito

    individual no mais resultado de escolha, mas um tipo de

    dado mandatrio.

  • 23

    O homem est liberto de seu pertencimento e de

    identidades coletivas, e a ideologia dos direitos humanos se

    torna amplamente aceita, ao menos em teoria e praticamente

    compulsria.

    Uma humanidade sob o liberalismo, composta por

    indivduos, naturalmente impelida em direo

    universalidade e busca se tornar global e unificada. Assim, os

    projetos do estado global, governana global e do governo

    mundial ou globalismo nascem.

    Um novo nvel de desenvolvimento tecnolgico torna

    possvel alcanar a independncia em relao

    estruturalizao classista das sociedades industriais i.e. ps-

    industrialismo.

    Os valores do racionalismo, cientificismo e positivismo

    so reconhecidos como formas veladas de polticas

    repressivas e totalitrias, ou como a grande narrativa e so

    criticados. Ao mesmo tempo, isso acompanhado pela

    glorificao paralela da liberdade completa e da

    independncia do indivduo em relao a quaisquer fatores

    limitantes, incluindo a razo, a moralidade, a identidade

    (social, tnica e at mesmo de gnero), disciplinas, etc. Essa a

  • 24

    condio da Ps-Modernidade. Nessa fase, o liberalismo deixa

    de ser a primeira teoria poltica e se torna a nica prtica ps-

    poltica. O fim da histria de Fukuyama chega, a economia na

    forma do mercado capitalista global, substitui a poltica, e

    estados e naes so dissolvidas no caldeiro da globalizao

    mundial.

    Tendo triunfado, o liberalismo desaparece e se

    transforma em uma entidade diferente - o ps-liberalismo. Ele

    no mais possui dimenses polticas; ele no representa a

    liberdade de escolha, mas ao invs se torna um tipo de

    destino historicamente determinista. Essa a fonte da tese

    sobre a sociedade ps-industrial: economia como destino.

    Assim, o incio do sculo XXI coincide com o fim da

    ideologia ou seja, de todas as trs. Cada uma encontrou um

    fim diferente: a terceira teoria poltica foi destruda em sua

    juventude, a segunda morreu de velhice decrpita e a

    primeira renasceu como outra coisa como ps-liberalismo e

    como a sociedade do mercado global. Em qualquer caso, a

    forma que todas as trs teorias polticas assumiram no sculo

    XX no mais til, efetiva, ou relevante. Elas carecem de poder

    explanatrio, da habilidade de nos ajudar a entender eventos

  • 25

    atuais e da capacidade de responder a desafios globais. A

    necessidade da Quarta Teoria Poltica deriva dessa avaliao.

    A QUARTA TEORIA POLTICA COMO RESISTNCIA AO STATUS QUO

    A Quarta Teoria Poltica no nos ser simplesmente

    dada sem qualquer esforo. Ela pode emergir ou no. O pr-

    requisito para seu aparecimento o dissenso. Isto , o dissenso

    em relao ao ps-liberalismo como prtica universal, contra a

    globalizao, contra a ps-modernidade, contra o fim da

    histria, contra o status quo, contra o desenvolvimento

    inercial dos principais processos civilizacionais na aurora do

    sculo XXI.

    O status quo e essa inrcia no pressupem quaisquer

    teorias polticas. Um mundo global s pode ser governado

    pelas leis da economia e pela moralidade universal dos

    direitos humanos. Todas as decises polticas so

    substitudas por decises tcnicas. A maquinaria e a tecnologia

    substituem todo o resto. O filsofo francs, Alain de Benoist,

    chama isso de la gouvernance, ou microgerenciamento.

    Gerentes e tecnocratas assumem o lugar do poltico que toma

  • 26

    decises histricas, otimizando a logstica do gerenciamento.

    Massas de pessoas so equiparadas massa singular de

    objetos individuais. Por essa razo, a realidade ps-liberal, ou,

    melhor dizendo, a virtualidade cada vez mais deslocando a

    realidade para longe de si mesma, leva diretamente abolio

    completa da poltica.

    Alguns poderiam arguir que os liberais mentem

    quando eles falam sobre o fim da ideologia (este foi o tema

    meu debate com o filsofo Aleksandr Zinoviev); em

    realidade, eles permaneceriam crentes em sua ideologia e

    simplesmente negariam a todas as outras o direito de existir.

    Isso no exatamente verdade. Quando o liberalismo se

    transforma de ser um arranjo ideolgico para ser o nico

    contedo da existncia tecnolgica e social subsistente, ento

    ele no mais uma ideologia, mas um fato existencial, uma

    ordem objetiva de coisas, cujo desafio no apenas difcil, mas

    tolo. Na era ps-moderna, o liberalismo se move da esfera do

    sujeito para a esfera do objeto. Isso potencialmente levar

    substituio completa da realidade pela virtualidade.

    A Quarta Teoria Poltica concebida como uma

    alternativa ao ps-liberalismo, mas no como um arranjo

    ideolgico em relao a outro. Ao invs, como uma ideia

  • 27

    incorprea oposta matria corprea; como uma possibilidade

    entrando em conflito com a atualidade, como aquilo que ainda

    est para vir a ser atacando aquilo que j est em existncia.

    Ao mesmo tempo, a Quarta Teoria Poltica no pode ser

    a continuao seja da segunda teoria poltica ou da terceira. O

    fim do fascismo, muito como o fim do comunismo, no foi

    apenas um mal-entendido acidental, mas a expresso de uma

    lgica histrica bastante lcida. Elas desafiaram o esprito da

    modernidade (o fascismo o fez quase abertamente, o

    comunismo de modo mais encoberto: ver a resenha do

    perodo sovitico como uma verso escatolgica especial da

    sociedade tradicional por Mikhail S. Agurskii ou Sergei Kara-

    Murza) e perderam.

    Isso quer dizer que o conflito com a metamorfose ps-

    moderna do liberalismo sob a forma da ps-modernidade e da

    globalizao deve ser qualitativamente diferente; deve ser

    baseada em novos princpios e propor novas estratgias.

    No obstante, o ponto de partida dessa ideologia

    precisamente a rejeio da prpria essncia da ps-

    modernidade. Esse ponto de partida possvel mais nem

    garantido, fatal ou pr-determinado porque ele emerge do

  • 28

    livre arbtrio do homem, de seu esprito, ao invs de um

    processo histrico impessoal.

    Porm, essa essncia (muito como a deteco da razo

    por trs da prpria modernidade imperceptvel previamente

    que realizou sua essncia to completamente que exauriu

    seus recursos internos e mudou para o modo de reciclagem

    irnica de suas fases anteriores) algo completamente novo,

    previamente desconhecido e apenas deduzido intuitivamente

    e fragmentariamente durante as fases primitivas da histria

    ideolgica e do conflito ideolgico.

    A Quarta Teoria Poltica uma Cruzada contra:

    Se a terceira teoria poltica criticou o capitalismo a

    partir da Direita e a segunda a partir da Esquerda, ento a

    nova fase no mais destaca essa topografia poltica:

    impossvel determinar onde a Direita e a Esquerda esto

    localizadas em relao ao ps-liberalismo. H apenas duas

    posies: conformidade (o centro) e dissenso (a periferia).

    Ambas as posies so globais.

    A Quarta Teoria Poltica o amlgama de um projeto

    comum e um impulso comum em relao a tudo que foi

    descartado, derrubado e humilhado durante o curso da

  • 29

    construo da sociedade do espetculo (construindo a ps-

    modernidade). A pedra que os construtores rejeitaram veio a

    tornar-se pedra angular (Marcos 12:10). O filsofo Aleksandr

    Sekatsky corretamente apontou a significncia da

    marginalia na formao de um novo eon filosfico, sugerindo

    o termo metafsica dos escombros como metfora.

    A BATALHA PELA PS-MODERNIDADE

    A Quarta Teoria Poltica lida com a nova reencarnao

    de um velho inimigo. Ela desafia o liberalismo, muito como a

    segunda e terceira teorias polticas do passado, mas ela o faz

    sob novas condies. A principal novidade dessas condies

    est no fato de que de todas as trs grandes ideologias

    polticas apenas o liberalismo garantiu o direito a possuir o

    legado por trs do esprito da modernidade e obteve o direito

    de criar o fim da histria baseado em suas prprias premissas.

    Teoricamente, o fim da histria poderia ter sido

    diferente: um Reich planetrio, se os nazistas tivessem

    vencido, ou o comunismo global, se os comunistas

    estivessem certos. Porm, o fim da histria acabou sendo

  • 30

    precisamente liberal. O filsofo Alexandre Kojve foi um dos

    primeiros a prever isso; suas ideias foram depois

    reproduzidas por Francis Fukuyama. Mas j que este o caso,

    ento quaisquer apelos modernidade e suas hipteses, s

    quais os representantes da segunda e (e em medida maior) da

    terceira teorias polticas apelavam em vrios graus, perdem

    sua relevncia. Eles perderam a batalha pela modernidade

    conforme os liberais triunfaram. Por essa razo, a questo da

    modernidade, e, incidentalmente da modernizao, pode ser

    removida da agenda. Agora a batalha pela ps-modernidade

    comea.

    E aqui que os novos prospectos se abrem para a

    Quarta Teoria Poltica. Aquele tipo de ps-modernidade que

    est atualmente sendo realizada na prtica, a ps-

    modernidade ps-liberal, cancela a lgica estrita da prpria

    modernidade aps o objetivo ter sido alcanado, os passos

    para alcana-la perdem o sentido. A presso da concha

    ideolgica se torna menos rgida. A ditadura das ideias

    substituda pela ditadura das coisas, senhas de login e cdigos

    de barra. Novos buracos esto aparecendo no tecido da

    realidade ps-moderna.

  • 31

    Como a terceira e segunda teorias polticas, concebidas

    como uma verso escatolgica do tradicionalismo, uma vez

    tentaram colocar uma sela na modernidade em sua luta com

    o liberalismo, a primeira teoria poltica, hoje h uma chance de

    conquistar algo anlogo com a ps-modernidade, usando esses

    novos buracos, em particular.

    O liberalismo se desenvolveu infalivelmente operando

    armas dirigidas contra suas alternativas diretas, o que foi a

    base de sua vitria. Mas essa prpria vitria que reserva o

    maior risco para o liberalismo. Ns devemos apenas averiguar

    a localizao desses novos pontos vulnerveis no sistema

    global e decifrar suas senhas de login de modo hackear seu

    sistema. Pelo menos, ns devemos tentar faz-lo.

    Os eventos de 11 de setembro em Nova Iorque

    demonstraram que isso possvel at mesmo

    tecnologicamente. A sociedade da Internet pode ser til

    mesmo para os seus firmes inimigos. Em qualquer caso,

    primeiro e mais importante, ns devemos entender a ps-

    modernidade e a nova situao no menos profundamente do

    que Marx entendeu a estrutura do capitalismo industrial.

  • 32

    A Quarta Teoria Poltica deve buscar sua inspirao

    sombria na ps-modernidade, na liquidao do programa do

    Iluminismo e na chegada da sociedade do simulacro,

    interpretando isso como um incentivo para a batalha, ao invs

    de como um dado fatal.

    REPENSANDO O PASSADO E AQUELES QUE PERDERAM

    A segunda e terceira teorias polticas so inaceitveis

    como pontos de partida para resistir ao liberalismo,

    particularmente pelo modo como elas se compreendiam, a que

    elas apelavam e como elas operavam. Elas se posicionavam

    como competidoras pela expresso da alma da modernidade e

    falharam nessa iniciativa. Porm, nada nos impede de

    repensar o prprio fato de sua derrota como algo positivo, seus

    vcios remodelados como virtudes. J que a lgica da histria

    da Nova Era nos trouxe ps-modernidade, ento ela tambm

    contm a essncia secreta da Nova Era que s nos foi revelada

    no final.

    A segunda e terceira teorias polticas se reconheciam

    como competidoras pela expresso do esprito da

    modernidade. E essas reivindicaes caram por gua abaixo.

  • 33

    Tudo relativo a essas intenes no realizadas nas ideologias

    prvias de mnimo interesse para os criadores da Quarta

    Teoria Poltica. Porm, ns devemos atribuir o prprio fato de

    que elas perderam a uma de suas vantagens ao invs de a suas

    desvantagens. Perdendo, elas provaram que no pertenciam ao

    esprito da modernidade, o qual, por sua vez, levou matrix

    ps-liberal. A residem suas vantagens. Mais ainda, isso

    significa que os representantes da segunda e terceira teorias

    polticas conscientemente ou inconscientemente estavam

    do lado da Tradio, porm, sem tirar as concluses

    necessrias disso ou sem mesmo o reconhecer.

    A segunda e terceira teorias polticas devem ser

    reconsideradas, selecionando nelas aquilo que deve ser

    descartado e aquilo que possui valor em si mesmo. Como

    ideologias completas, tentando fazer as coisas prpria

    maneira literalmente, elas so totalmente inteis seja

    teoricamente ou praticamente. Porm, certos elementos

    marginais que no foram geralmente implementados e

    permaneceram na periferia ou nas sobras (lembremos-nos da

    metafsica dos escombros novamente) podem

    inesperadamente acabar sendo extremamente valiosos e

    saturados de significado e intuio.

  • 34

    Porm, em qualquer caso, necessrio repensar a

    segunda e terceira teorias polticas de uma nova maneira, a

    partir de uma nova perspectiva e apenas aps ns rejeitarmos

    nossa confiana naquelas estruturas ideolgicas nas quais sua

    ortodoxia se sustentava. A sua ortodoxia seu aspecto mais

    desinteressante e intil. Fazer uma leitura cruzada delas seria

    muito mais produtivo: Marx atravs de uma perspectiva

    positiva da Direita ou Evola atravs de uma perspectiva

    positiva da Esquerda. Essa fascinante iniciativa nacional-

    bolchevique, no esprito de Nikolai V. Ustrialov ou Ernst

    Niekisch, no suficiente por si mesma. Afinal, uma adio

    mecnica da segunda teoria poltica terceira, por si mesma,

    no nos levar a lugar algum. Apenas em retrospecto ns

    podemos delinear suas regies comuns, as quais eram

    firmemente opostas ao liberalismo. Esse exerccio

    metodolgico til como um aquecimento antes de comear

    uma elaborao completa da Quarta Teoria Poltica.

    Uma leitura verdadeiramente significativa e decisiva da

    segunda e terceira teorias polticas s possvel com base em

    uma j estabelecida Quarta Teoria Poltica. A ps-

    modernidade e suas condies (o mundo globalista, a

    gouvernance ou microgerenciamento, a sociedade de

  • 35

    mercado, o universalismo dos direitos humanos, a dominao

    real do capital, etc.) representam o principal objeto na Quarta

    Teoria Poltica. Porm, elas so radicalmente negadas

    enquanto valor.

    O RETORNO DA TRADIO E DA TEOLOGIA

    A Tradio (religio, hierarquia, famlia) e seus valores

    foram sobrepujados na aurora da modernidade. Em verdade,

    todas as trs teorias polticas foram concebidas como

    construes ideolgicas artificiais por pessoas que

    compreenderam, de vrios modos, a morte de Deus

    (Friedrich Nietzsche), o desencanto do mundo (Max Weber)

    e o fim do sagrado. Este foi o ncleo da Nova era da

    Modernidade: o homem passou a substituir Deus, a filosofia e a

    cincia substituram a religio, e os construtos racionais,

    enrgicos e tecnolgicos tomaram o lugar da Revelao.

    Porm, se o modernismo se exauriu na ps-

    modernidade, ento ao mesmo tempo, o perodo de

    teomaquia direta chega a um fim junto com ela. As pessoas

    ps-modernas no so contrrias religio, mas ao invs,

  • 36

    indiferentes. Ademais, certos aspectos da religio, via de regra,

    relativas s regies do inferno, a textura demnica dos

    filsofos ps-modernistas so bastante atrativas. Em qualquer

    caso, a era da perseguio Tradio acabou, ainda que,

    seguindo a lgica do ps-liberalismo, isso provavelmente

    levar criao de uma nova pseudo-religio global, baseada

    nos restos de cultos sincrticos disparatados, no ecumenismo

    catico desenfreado e na tolerncia. Enquanto esse curso

    dos eventos , de algumas maneiras, ainda mais aterrorizante

    do que o materialismo e o atesmo dogmtico diretos e

    descomplicados, o enfraquecimento da perseguio da F

    pode ser aquela chance, se os representantes da Quarta Teoria

    Poltica agirem consistentemente e descompromissadamente

    na defesa dos ideais e valores da Tradio.

    Agora seguro instituir como programa poltico aquilo

    que foi banido pela modernidade. E isso no mais parece to

    tolo e destinado derrota quanto antes pelo menos porque

    tudo na ps-modernidade parece tolo e destinado derrota,

    inclusive seus aspectos mais glamourosos. No por acaso

    que os heris da ps-modernidade so aberraes e

    monstros, travestis e degenerados essa a lei do estilo.

    Contra o pano de fundo dos palhaos do mundo nada e

  • 37

    ningum pode parecer arcaico demais, mesmo as pessoas da

    Tradio que ignoram os imperativos da vida moderna. A

    validade dessa assero no provada apenas pelas

    conquistas significativas do fundamentalismo islmico, mas

    tambm pelo ressurgimento da influncia exercida pelas

    vastamente arcaicas seitas protestantes (dispensacionalistas,

    mrmons, etc.) na poltica externa americana. George W. Bush

    foi guerra no Iraque porque, em suas prprias palavras,

    Deus me disse para invadir o Iraque!. Isso bastante

    compatvel com seus professores protestantes metodistas.

    Assim, a Quarta Teoria Poltica pode facilmente se

    voltar para tudo que precedeu a modernidade de modo a

    buscar sua inspirao l. O reconhecimento da morte de

    Deus deixa de ser um imperativo mandatrio para aqueles

    que querem permanecer relevantes. As pessoas da ps-

    modernidade j esto to resignadas diante desse evento que

    elas nem podem mais compreend-lo Quem morreu

    exatamente? Mas, do mesmo jeito, os desenvolvedores da

    Quarta Teoria Poltica podem esquecer esse evento. Ns

    acreditamos em Deus, mas ignoramos aqueles que ensinam

    sobre Sua morte, tanto como ignoramos as palavras dos

    loucos.

  • 38

    Isso marca o retorno da teologia e se torna um elemento

    essencial da Quarta Teoria Poltica. Quando ela retorna, a ps-

    modernidade (globalizao, ps-liberalismo e a sociedade ps-

    industrial) facilmente reconhecida como o reino do

    Anticristo (ou suas contrapartes em outras religies Dajjal

    para os muulmanos, Erev Rav para os judeus, e Kali Yuga

    para os hindus, etc.). Agora esta no simplesmente uma

    metfora capaz de mobilizar as massas, mas um fato religioso

    o fato do Apocalipse.

    MITOS E ARCASMO NA QUARTA TEORIA POLTICA

    Se o atesmo da Nova Era deixa de ser algo mandatrio

    para a Quarta Teoria Poltica, ento a teologia das religies

    monotestas, que uma vez substituiu outras culturas sagradas,

    no ser tambm a verdade ltima (ou melhor, poder ser ou

    no). Teoricamente, nada limita a profundidade da abordagem

    dos antigos valores arcaicos, a qual pode assumir um lugar

    especfico na nova construo ideolgica, aps ser

    adequadamente reconhecida e compreendida. Eliminando a

    necessidade de ajustar a teologia ao racionalismo da

  • 39

    modernidade, os portadores da Quarta Teoria Poltica esto

    livres para ignorar aqueles elementos teolgicos e dogmticos,

    que foram afetados pelo racionalismo nas sociedades

    monotestas, principalmente nas ltimas fases. Estas levaram

    ao aparecimento do desmo sobre as runas da cultura

    europeia crist, seguido do atesmo e do materialismo,

    durante um desenvolvimento escalonado dos programas da

    era moderna.

    No apenas os mais altos smbolos supramentais da f

    podem ser colocados a bordo novamente como um novo

    escudo, mas tambm podem aqueles aspectos irracionais dos

    cultos, ritos e lendas que tem deixados perplexos os telogos

    das fases prvias. Se ns rejeitamos a ideia de progresso

    inerente modernidade (que como ns vimos, acabou), ento

    tudo que antigo ganha valor e credibilidade simplesmente

    por ser antigo. Antigo significa bom e quanto mais antigo

    melhor.

    De todas as criaes, o paraso a mais antiga. Os

    portadores da Quarta Teoria Poltica devem lutar para

    descobri-lo novamente no futuro prximo.

  • 40

    HEIDEGGER E O EVENTO (EREIGNIS)

    E finalmente, ns podemos identificar a mais profunda

    ontolgica! fundao para a Quarta Teoria Poltica. Aqui,

    ns devemos prestar ateno no apenas em telogos e

    mitologias, mas tambm na experincia filosfica reflexiva de

    um pensador particular que fez uma tentativa nica de

    construir uma ontologia fundamental o estudo mais

    resumido, paradoxal, profundo e penetrante do Ser. Eu estou

    me referindo Martin Heidegger.

    Uma breve descrio do conceito de Heidegger como

    segue. Na aurora do pensamento filosfico, as pessoas (mais

    especificamente, os europeus e, ainda mais especificamente,

    os gregos), levantaram a questo do Ser como ponto focal de

    seu pensamento. Mas, pela sua tematizao, elas se arriscaram

    a se confundir pelas nuances do relacionamento complicado

    entre Ser e pensamento, entre puro Ser (Seyn) e sua expresso

    na existncia um ser (Seiende), entre Ser no mundo (Dasein

    ser-a) e Ser-em-si (Sein). Essa falha j ocorreu no

    ensinamento de Herclito sobre a physis e o logos. Logo, ela

    bvia na obra de Parmnides e, finalmente, em Plato, que

    colocou as ideias entre o homem e a existncia e que definiu a

  • 41

    verdade como sua correspondncia, a teoria referencial do

    conhecimento, essa falha alcanou sua culminao. Isso deu

    origem a uma alienao que eventualmente levou ao

    pensamento calculista (das rechnende Denken) e ento ao

    desenvolvimento da tecnologia. Pouco a pouco, o homem

    perdeu de vistas o puro Ser e entrou no caminho do niilismo. A

    essncia da tecnologia (baseada no relacionamento tcnico

    com o mundo) expressa esse niilismo continuamente

    acumulativo. Na Nova Era, essa tendncia alcana seu pinculo

    o desenvolvimento tcnico (Gestell) finalmente substitui o Ser

    e coroa o Nada. Heidegger odiava amargamente o

    liberalismo, o considerando uma expresso da fonte

    calculista que reside no corao do niilismo ocidental.

    A ps-modernidade, que Heidegger no viveu para ver,

    , em todos os sentidos, o esquecimento ltimo do Ser, aquela

    meia-noite, quando o Nada (niilismo) comea a escorrer de

    todas as rachaduras. Porm essa filosofia no era

    desesperanosamente pessimista. Ele acreditava que o prprio

    Nada o outro lado do puro Ser, o qual de modo to

    paradoxal! lembra a humanidade de sua existncia. Se ns

    decifrarmos corretamente a lgica por trs do desdobramento

    do Ser, ento a humanidade pensante poder salvar a si

  • 42

    mesma com mxima rapidez no momento de maior risco.

    Onde est o perigo, l tambm cresce a oportunidade de

    salvao, Heidegger cita a poesia de Friedrich Hlderlin.

    Heidegger usa um termo especial, Ereignis o

    Evento, para descrever esse retorno sbito do Ser. Ele ocorre

    exatamente meia-noite da noite do mundo no momento

    mais escuro da histria. O prprio Heidegger constantemente

    vacilava quanto a esse ponto j ter sido alcanado ou - "ainda

    no. O eterno ainda no...

    A filosofia de Heidegger pode provar ser aquele eixo

    central conectando tudo ao seu redor das segunda e terceira

    teorias polticas reinterpretadas ao retorno da teologia e da

    mitologia.

    Assim, no corao da Quarta Teoria Poltica, em seu

    centro magntico, est a trajetria da Ereignis (o Evento)

    iminente, que incorporar o retorno triunfante do Ser no exato

    momento em que a humanidade o esquece de uma vez por

    todas ao ponto de que seus ltimos traos desaparecem.

  • 43

    A QUARTA TEORIA POLTICA E A RSSIA

    Hoje muitas pessoas intuitivamente entendem que a

    Rssia no tem lugar no admirvel mundo novo da

    globalizao, da ps-modernidade e do ps-liberalismo.

    Primeiro, o Estado global e o governo mundial esto

    gradualmente abolindo todos os Estados-nao em geral. Mais

    importante o fato de que a totalidade da histria russa um

    argumento dialtico com o Ocidente e contra a cultura

    ocidental, a luta pela defesa de nossa prpria (muitas vezes

    apenas intuitivamente compreendida) verdade russa, nossa

    prpria ideia messinica e nossa prpria verso do fim da

    histria, no importa como ela se expresse atravs da

    Ortodoxia moscovita, do imprio secular de Pedro, ou da

    revoluo comunista mundial. As mentes russas mais

    brilhantes viram claramente que o Ocidente estava se

    dirigindo para o abismo. Agora, olhando para onde a economia

    neoliberal e a cultura ps-moderna levaram o mundo, ns

    podemos ter certeza de que essa intuio, impulsionando

    geraes do povo russo a buscar por alternativas, era

    completamente justificada.

  • 44

    A atual crise econmica global apenas o comeo. O

    pior ainda est por vir. A inrcia dos processos ps-liberais

    tamanha que uma mudana de curso impossvel: para salvar

    o Ocidente, a tecnologia emancipada irrestrita (Oswald

    Spengler) buscar por meios tecnolgicos mais eficientes,

    porm meramente tcnicos. Essa a nova fase na chegada da

    Gestell espalhando a mancha niilista do mercado global por

    todo o planeta. Movendo de crise em crise e de uma bolha

    para a prxima (milhares de americanos realizaram um

    protesto em um tempo de crise com o seguinte slogan, Nos

    deem uma nova bolha! D para ser mais cego?), a economia

    globalista e as estruturas da sociedade ps-industrial tornam

    a noite da humanidade mais e mais negra. Ela to negra, na

    verdade, que ns gradualmente esquecemos que est de noite.

    O que luz? se perguntam as pessoas jamais a tendo visto.

    claro que a Rssia precisa seguir um caminho

    diferente. O seu prprio. Aqui est a questo e o paradoxo.

    Escapar da lgica da ps-modernidade em um nico pas no

    ser to simples. O modelo sovitico tentou e caiu. Depois

    desse ponto, a situao ideolgica mudou irreversivelmente

    bem como a balana estratgica de poder. Para que a Rssia

    possa salvar a si mesma e a outros, criar algum tipo de milagre

  • 45

    tecnolgico ou uma jogada enganosa seria insuficiente. A

    histria mundial tem a sua prpria lgica. E o fim da

    ideologia no uma falha aleatria, mas o incio de uma nova

    fase, aparentemente, a ltima.

    Nessa situao, o futuro da Rssia depende diretamente

    de nossos esforos para desenvolver a Quarta Teoria Poltica.

    Ns no iremos longe e apenas estenderemos nosso tempo se

    localmente selecionarmos as opes que a globalizao nos

    oferece e corrigindo o status quo de um jeito superficial. O

    desafio da ps-modernidade tremendamente significativo:

    ele est enraizado na lgica do esquecimento do Ser e no

    distanciamento da humanidade em relao a suas razes

    existenciais (ontolgicas) e espirituais (teolgicas). Responder

    a isso com inovaes tiradas do chapu ou substitutos de

    relaes pblicas impossvel. Portanto, ns devemos nos

    referir s fundaes filosficas da histria e fazer um esforo

    metafsico de modo a resolver os problemas atuais a crise

    econmica global, contrapor o mundo unipolar, bem como a

    preservao e fortalecimento da soberania, etc.

    difcil dizer como o processo de desenvolver essa

    teoria acabar. Uma coisa clara: no pode ser um esforo

    individual ou um que seja restrito a um pequeno grupo de

  • 46

    pessoas. O esforo deve ser compartilhado e coletivo. Dessa

    maneira, os representantes de outras culturas e povos (tanto

    na Europa como na sia) podero verdadeiramente nos

    ajudar, j que eles sentem a tenso escatolgica do momento

    presente de um jeito igualmente agudo e esto to

    desesperadamente procurando por um caminho para fora do

    beco sem sada global.

    Porm, possvel afirmar desde j que a verso russa

    da Quarta Teoria Poltica, baseada na rejeio do status quo

    em suas dimenses prticas e tericas, focar na Ereignis

    russa. Esse ser aquele Evento, nico e extraordinrio, para

    o qual muitas geraes de russos viveram e esperaram, do

    nascimento de nossa nao chegada futura do Fim dos Dias.

  • 47

    CAPTULO 3: DASEIN COMO ATOR FASES E PROBLEMAS NO DESENVOLVIMENTO DA QUARTA TEORIA POLTICA

    Sendo um defensor do desenvolvimento cclico e um

    oponente de Francis Bacon e sua ideia de coleta de dados, eu

    ainda gostaria de sugerir que ns desenvolvssemos e

    modificssemos abordagens a tpicos e reas especficos do

    pensamento de modo contnuo. Ns repetidamente

    esclarecemos a noo de conservadorismo. Ns conduzimos

    uma srie de conferncias e simpsios cientficos sobre a

    Quarta Teoria Poltica. Acreditamos que estes esforos, cujos

    resultados esto publicados em revistas1, colees cientficas,

    monografias individuais e stios virtuais2 no foram realizados

    1 Edio #1 da revista Russkoe Vremia (Tempo Russo), 2009, completamente dedicado ao tema do conservadorismo. Ver tambm A.G. Dugin, A Quarta Teoria Poltica, Perfil, #48, 22.12.2008. 2 Aqui esto alguns links: http://evrazia.org/print.php?id=779;

    http://www.evrazia.org/article/755;http://konservatizm.org/news/activity/020409175427.xhtml; http://rossia3.ru/ideolog/friends/hezbali1; http://rossia3.ru/ideolog/friends/hezbali2;http://www.evrazia.org/article/751;http://konservatizm.org/konservatizm/theory/160309164752.xhtml; http://konservatizm.org/konservatizm/theory/140309014819.xhtml; http://www.geopolitica.ru/Articles/434/;

  • 48

    em vo, e que os leitores esto mais ou menos familiarizados

    com eles. Portanto, eu proponho que avancemos.

    Eu demonstrarei com exemplos concretos o que foi

    feito para promover a discusso da Quarta Teoria Poltica e,

    consequentemente, os resultados observveis das atividades

    conduzidas pelo Centro de Pesquisa Conservadora na

    Faculdade de Sociologia da Universidade Pblica de Moscou3 e

    pelo Clube Conservador de So Petersburgo na Faculdade de

    Filosofia da Universidade Pblica de So Petersburgo4. Esses

    resultados incluem dois livros que foram recentemente

    publicados em So Petersburgo, na maravilhosa casa editorial

    de So Petersburgo Amphora: Contra o Liberalismo: Em

    Direo Quarta Teoria Poltica5 de Alain de Benoist e A

    Quarta Teoria Poltica6 de Alexander Dugin. O livro do filsofo

    Alain de Benoist, que discursou na Universidade Pblica de

    So Petersburgo durante os Dias de Filosofia em So

    http://www.sorokinfond.ru/index.php?id=552; http://neokons.ru/index. php?option=com_content&task=view&id=88&Itemid=78 3 http://konservatizm.org

    4 http://konservatizm.org/regions/leningrad/region.xhtml

    5 Benoist, Alain de. Protiv liberalizma. K chetvertoi politicheskoi teorii, St.

    Petersburg, Amfora, 2009. [Contra o Liberalismo. Em Direo Quarta Teoria Poltica] 6 Dugin, A.G. Chetvertaia politicheskaia teoriia, St. Petersburg, Am-

    phora, 2009 (on the web: http://konservatizm.org/konservatizm/amfo- ra/031209153016.xhtml) [A Quarta Teoria Poltica]

  • 49

    Petersburgo, um compndio de suas opinies na filosofia e

    na cincia poltica sobre grandes questes de nosso tempo:

    globalizao, a crise econmica e social, o processo de

    integrao europeia, as novas tendncias polticas e sociais, o

    relacionamento entre Europa e Rssia, o humanismo, etc.

    Todos esses problemas so abordados do ponto de partida da

    crtica ideologia liberal que domina o mundo (a primeira e

    mais estvel teoria poltica). Tendo permanecido sem

    competio aps o colapso do comunismo, ela se tornou o alvo

    prioritrio para crticas por aqueles que esto agudamente

    conscientes dos aspectos negativos do status quo na poltica,

    na esfera social, na economia, na cultura, na ideologia, etc. e

    por aqueles que esto buscando uma alternativa. As velhas

    alternativas ao liberalismo comunismo e fascismo foram

    historicamente superadas e descartadas: cada uma a sua

    prpria maneira, porm elas demonstraram sua ineficcia e

    incompetncia.

    Portanto, a busca por uma alternativa ao liberalismo

    deve ocorrer em outro lugar. A rea de busca designada

    como o domnio da Quarta Teoria Poltica. Tal abordagem

    corresponde exatamente ao tema afirmado:

    Conservadorismo: o Futuro ou uma Alternativa? Se ns

  • 50

    pensarmos em uma alternativa e a correlacionarmos com a

    planta para o futuro, ento ns deveramos claramente

    perceber o que essa alternativa vai substituir. A resposta

    simples: o liberalismo como o discurso global dominante.

    Portanto, a nica alternativa significativa deve logicamente

    ser dirigida contra o liberalismo, da o ttulo do livro de Alain

    de Benoist. No obstante, a questo permanece: o

    conservadorismo se adqua a esse papel? Em parte, ns

    ouvimos a resposta na fala de Alain de Benoist, na qual ele

    criticou a teoria liberal do progresso. Essa abordagem

    filosfica prope que o conservadorismo seja o candidato mais

    lgico para uma alternativa ao liberalismo ou como uma

    viso de mundo relativizadora ou como uma viso de mundo

    que rejeita o progresso completamente. O que permanece,

    ento, especificar o tipo de conservadorismo em questo:

    bvio que o conservadorismo liberal no pode ser

    considerado como uma alternativa ao liberalismo, sendo sua

    variante. Assim, atravs do processo de eliminao, ns

    podemos especificar uma proposio: ns devemos buscar

    uma alternativa ao liberalismo nas verses no-liberais de

    conservadorismo. Tudo isso lgico, j que o prprio De

    Benoist conhecido como um filsofo de opinies

  • 51

    conservadoras (s vezes, ele referido como um dos pioneiros

    da Nova Direita europeia), mas o tipo particular de opinies

    conservadoras que ele tem em mente bvio a partir de seu

    livro recm-publicado.

    H outro aspecto digno de mencionar em relao ao

    ttulo do livro de Alain de Benoist. Muitos leitores se

    lembraro de outro manifesto ideolgico dirigido contra o

    liberalismo chamado Aps o Liberalismo7 por Immanuel

    Wallerstein. Apesar da semelhana de ttulos e do objeto de

    crtica, h uma diferena significativa. Wallerstein criticou o

    liberalismo desde o ponto de vista da Esquerda a partir da

    posio neomarxista. E, como qualquer marxista, ele viu o

    liberalismo (democracia burguesa, capitalismo) como uma

    fase do desenvolvimento histrico, o qual progressivo em

    comparao com as fases precedentes de desenvolvimento

    (como o feudalismo ou a escravido), mas inferior ao que

    deve vir aps ela socialismo, comunismo, etc. Ns estamos

    falando sobre a crtica a partir da Esquerda e, de algumas

    maneiras, do ponto de partida do futuro (que expresso no

    ttulo do livro de Wallerstein Aps o Liberalismo). Essa uma

    7 Wallerstein, Immanuel. Posle liberalizma. Moscow, 2003. [Aps o

    Liberalismo]

  • 52

    caracterstica tpica do marxismo. Para De Benoist, nem a

    superioridade do liberalismo sobre os tipos histricos prvios

    de sociedade, nem as vantagens de um futuro comunista so

    bvias.

    Portanto, apesar da similaridade de ttulos, h uma

    diferena fundamental entre as posies iniciais dos autores:

    com Wallerstein, ns temos que lidar com uma crtica a partir

    da Esquerda; com de Benoist, com uma crtica a partir da

    Direita. Outra diferena envolve o relacionamento em relao

    ao liberalismo. Segundo Wallerstein, o fim do liberalismo era

    uma concluso prevista pela prpria lgica da histria

    sociopoltica e socioeconmica, e assim ele falou facilmente de

    um depois. Para de Benoist a questo permanece: deve-se

    lutar contra o liberalismo, porm nessa luta moralmente e

    historicamente justificada, no h resultados garantidos.

    importante lutar contra o liberalismo aqui e agora;

    importante identificar suas vulnerabilidades; importante

    forjar uma viso de mundo alternativa mas o futuro est em

    nossas mos e aberto ao invs de pr-determinado.

    Wallerstein, em vrios graus, um mecanicista, como

    qualquer marxista, enquanto de Benoist um organicista e

    holista, como qualquer (verdadeiro) conservador.

  • 53

    O ltimo item ao qual eu gostaria de chamar ateno

    em relao s ideias de Alain de Benoist e sua relevncia a

    compreenso do conceito do Quarto Nomos da Terra" 8 de

    Carl Schmitt isto , o relacionamento entre cincia poltica e

    teologia poltica com geopoltica e o novo modelo da

    organizao poltica do espao.

    De minha parte, no livro A Quarta Teoria Poltica9, eu

    havia feito uma resenha das trs principais teorias polticas do

    passado liberalismo, marxismo (socialismo) e fascismo

    (nacional-socialismo), avaliado seu equilbrio geral e tentado

    identificar os horizontes para o desenvolvimento da Quarta

    Teoria Poltica para alm de todas as trs ideologias. Isso,

    claro, est extremamente distante de qualquer dogmatismo ou

    de uma proposta para uma resposta completa para o

    problema apontado. Mas, no obstante, esses so passos

    razoavelmente especficos em direo preparao de uma

    abordagem prxima da questo. Sem repetir o que foi dito em

    meu livro e no livro de Alain de Benoist, eu tentarei fazer um

    certo nmero de observaes sobre o desenvolvimento deste

    tema.

    8 Schmitt, Carl, Nomos zemli, St. Petersburg, 2008. [O Nomos da Terra]

    9 Dugin, A. G. Chetvertaia politicheskaia teoriia, ibid. [A Quarta Teoria

    Poltica]

  • 54

    O que a Quarta Teoria Poltica em termos de

    negao agora est claro. Ela no nem fascismo, nem

    comunismo, nem liberalismo. Em princpio, esse tipo de

    negao razoavelmente significativo. Ele incorpora nossa

    determinao de ir alm dos paradigmas ideolgicos e

    polticos usuais e fazer um esforo de modo a superar a

    inrcia dos clichs internos ao pensamento poltico. Isso por si

    s um convite extremamente estimulante para um esprito

    livre e uma mente crtica. Eu realmente no compreendo por

    que certas pessoas, quando confrontadas com o conceito de

    Quarta Teoria Poltica, no correm imediatamente para abrir

    uma garrafa de champagne e no comeam a danar e se

    regozijar, celebrando a revelao de um novo horizonte.

    Afinal, este um tipo de um Ano Novo filosfico um

    excitante salto no desconhecido. O Ano Velho testemunhou a

    luta das trs ideologias polticas uma que foi sangrenta e que

    clamou milhes de vidas. Toda a crtica ao liberalismo era ou

    fascista ou comunista. Essa crtica foi deixada no passado, mas

    a mais antiga dessas ideologias liberalismo ainda est aqui.

    O liberalismo o remanescente do Ano Velho; um resduo,

    um passado incerto que no foi adequadamente enviado para

    o esquecimento. Ele j passou, mas no quer ir embora

  • 55

    permanentemente de qualquer jeito. Em resumo, uma

    quimera, o drago que engoliu o sol ou os espritos

    diablicos que raptaram a Donzela de Neve antes do Ano

    Novo. Em certo sentido, o liberalismo incorpora tudo que

    estava no passado. A Quarta Teoria Poltica o nome para

    uma descoberta, para um novo comeo.

    Ressaltando a relevncia da crtica e especialmente

    destacando o fato de que essa uma rejeio radical de todas

    as trs teorias polticas (liberalismo, comunismo, e fascismo) e

    suas variantes, eu sugiro que ns contemplemos o contedo

    positivo da Quarta Teoria Poltica. O fato de que ns

    identificamos o contedo negativo em si mesmo notvel e

    requer um entendimento meticuloso. A prpria ideia de pr

    um fim ao fascismo, ao comunismo e ao liberalismo uma

    coisa extremamente estimulante. O programa negativo da

    Quarta Teoria Poltica soa assim, Diga no ao fascismo,

    no ao comunismo, e no ao liberalismo! O liberalismo no

    vai funcionar! Ele no passar! (No pasar!), assim como o

    fascismo outrora falhou (no ha pasado). O Muro de Berlim,

    tambm, caiu; apenas poeira permanece da nica

    manifestao visvel do comunismo, separando os comunistas

    dos capitalistas (liberais). Os comunistas no passaram

  • 56

    tambm. Agora, o que resta que os liberais no passem e

    eles no passaro! (No pasarn!). Mas para que eles no

    passem, os fragmentos do Muro de Berlim so insuficientes

    para ns, como o prprio Muro foi insuficiente. O Muro existia,

    mas eles ainda passavam. Ainda de menos teis so as

    sombras escuras do Terceiro Reich, seus cadveres

    independentes10, inspirando apenas a brutal juventude punk

    e os sonhos perturbadores e pervertidos de adeptos do

    sadomasoquismo.

    Consequentemente, ns sugerimos avanarmos de

    modo a sairmos da fase niilista da Quarta Teoria Poltica em

    direo positividade. Descartando as trs teorias polticas

    como um todo sistematizado, ns podemos tentar olhar para

    elas a partir de uma perspectiva diferente. Elas esto sendo

    rejeitadas precisamente como sistemas ideolgicos completos

    cada um com base em argumentos separados. Mas eles

    como qualquer sistema consistem de elementos que no

    pertencem a eles. As trs ideologias polticas possuem seus

    sistemas filosficos, grupos, metodologias explanatrias, sua

    totalidade nicas uma estrutura de seu crculo

    10

    Nota da Traduo: cadveres independentes. O autor usa a palavra nezalezhnye em referncia revoluo laranja na Ucrnia e s simpatias nazistas entre certos ucranianos do oeste.

  • 57

    hermenutico, suas epistemes fundamentais. Elas so o que

    elas so como um todo. Desmembradas em componentes, elas

    perdem sua significncia e se tornam dessemantizadas. Um

    componente particular de uma ideologia liberal, marxista

    (socialista, comunista), ou fascista (nacional-socialista) no

    liberalismo, marxismo, ou fascismo. No que eles sejam

    completamente neutros, mas fora do contexto ideolgico

    estrito, eles podem encontrar ou descobrir um diferente

    novo sentido. Os aspectos positivos no desenvolvimento da

    Quarta Teoria Poltica so baseados nesse princpio. Uma

    reviso das trs ideologias polticas e sua anlise no

    convencional pode dar certas pistas para o contedo

    substantivo dessa teoria.

    Em cada uma das trs ideologias h um sujeito

    histrico claramente definido.

    Na ideologia liberal, o sujeito histrico o indivduo. O

    indivduo concebido como uma unidade que racional e

    imbuda com uma vontade (moralidade). O indivduo tanto

    um dado como o objetivo do liberalismo. um dado, mas um

    que muitas vezes no tem conscincia de sua identidade como

    indivduo. Todas as formas de identidade coletiva tnica,

    nacional, estatal, religiosa, de casta, etc., impedem a

  • 58

    conscincia individual da prpria individualidade. O

    liberalismo encoraja o indivduo a se tornar ele prprio, isto ,

    a se libertar de todas aquelas identidades e dependncias

    sociais que constrangem e definem o indivduo externamente.

    Esse o sentido do liberalismo (ing.: liberty, lat.: libertas): o

    chamado para ser liberado (Lat.: liber) de todas as coisas

    externas. Ademais, os tericos liberais (em particular, John

    Stuart Mill) enfatizaram o fato de que estamos falando de uma

    liberdade de11, sobre a liberao de laos, identificaes e

    restries que sejam negativas em seu contedo.

    Quanto a qual seria o propsito dessa liberdade os

    liberais permanecem em silncio afirmar algum tipo de

    objetivo normativo , em seus olhos, restringir o indivduo e

    sua liberdade. Portanto, eles separam estritamente uma

    liberdade de, que eles consideram como um imperativo

    moral para o desenvolvimento social, de uma liberdade para

    (ing.: freedom) a normativizao de como, por que e para

    que propsito essa liberdade deve ser usada. Esta ltima

    permanece discrio do sujeito histrico (o indivduo).

    11

    Mill, John Stuart, O svobode, Nauka i zhizn, 1993, #11, pp. 1015, # 12. pp. 2126. [Sobre a Liberdade]

  • 59

    O sujeito histrico da segunda teoria poltica a classe.

    A estrutura de classes da sociedade e a contradio entre a

    classe exploradora e a classe explorada so o ncleo da viso

    da histria dramtica dos comunistas. Histria luta de

    classes. A poltica sua expresso. O proletariado um sujeito

    histrico dialtico, que chamado a se libertar da dominao

    da burguesia e a construir uma sociedade sobre novas

    fundaes. Um indivduo singular concebido aqui como

    parte de uma totalidade de classe e adquire existncia social

    apenas no processo de aquisio de conscincia de classe.

    E, finalmente, o sujeito da terceira teoria poltica ou o

    Estado (como no fascismo italiano) ou a raa (como no

    nacional-socialismo alemo). No fascismo, tudo baseado na

    verso direitista do hegelianismo, j que o prprio Hegel

    considerava o Estado Prussiano como o pice do

    desenvolvimento histrico no qual o esprito subjetivo era

    aperfeioado. Giovanni Gentile, um proponente do

    hegelianismo, aplicou esse conceito Itlia fascista12. No

    nacional-socialismo alemo, o sujeito histrico era a raa

    12

    Gregor A. James, Giovanni Gentile: Philosopher of Fascism, Transaction Publishers, 2001

  • 60

    ariana13, que, segundo os racistas, participa no conflito

    eterno contra as raas sub-humanas. As consequncias

    estarrecedoras dessa ideologia so bem conhecidas demais

    para insistirmos nelas. Porm, foi essa definio original de

    um sujeito histrico que estava no mago das prticas

    criminosas dos nazistas.

    A definio de um sujeito histrico a base

    fundamental para a ideologia poltica em geral e define sua

    estrutura. Portanto, nessa questo, a Quarta Teoria Poltica

    deve agir do modo mais radical rejeitando todas essas

    construes como candidatos para um sujeito histrico. O

    sujeito histrico no nem um indivduo, nem classe, nem o

    Estado, nem uma raa. Este o axioma antropolgico e

    histrico da Quarta Teoria Poltica.

    Ns assumimos que esteja claro para ns quem (ou o

    que) no pode ser o sujeito histrico. Mas ento quem (ou o

    que) pode?

    Ns limpamos um espao e apresentamos

    corretamente a questo. Ns continuamos com nosso tema:

    ns especificamos o problema do esclarecimento do sujeito

    13

    Rosenberg, Alfred, Mif XX veka. Tallinn, 1998. [O Mito do Sculo XX]

  • 61

    histrico na Quarta Teoria Poltica. Agora h um buraco

    escancarado. Esse buraco extremamente interessante e

    significativo.

    Penetrando nas profundezas desse vcuo, ns

    propomos quatro hipteses, as quais no so mutuamente

    exclusivas e que podem ser examinadas tanto coletivamente

    como individualmente.

    A primeira hiptese sugere abandonar todas as verses

    de competidores pelo papel de sujeito histrico da teoria

    poltica clssica, assumindo que o sujeito da Quarta Teoria

    Poltica algum tipo de composto no o indivduo, classe,

    Estado (raa, nao) por conta prpria, mas ao invs, uma

    certa combinao destes. Essa uma hiptese de um sujeito

    composto.

    A segunda hiptese abordar o problema do ponto de

    partida da fenomenologia. Coloquemos tudo aquilo que

    sabemos sobre o sujeito histrico fora da estrutura das

    ideologias clssicas, realizando o mtodo husserliano de

    epoch e tentemos definir empiricamente aquele mundo

    vital, que abrir diante de ns o mundo vital do poltico,

  • 62

    um livro da metafsica ou da teologia14. possvel

    considerar a histria poltica sem um sujeito? A histria

    enquanto tal? Afinal, teoricamente, houve perodos histricos

    em que a poltica existia, mas nos quais no havia sujeito no

    sentido filosfico cartesiano. claro, em retrospecto, mesmo

    esse pr-sujeito na histria poltica foi reinterpretado

    segundo vrias ideologias. Mas se ns no mais confiamos em

    ideologias (as trs teorias polticas), ento sua reconstruo

    histria no um axioma para ns. Se ns considerarmos a

    histria poltica no estilo da Escola dos Annales (mtodo de

    Fernand de Braudel), ento ns temos a chance de descobrir

    uma imagem um tanto polifnica, expandindo nosso

    entendimento do assunto. No esprito de Peter Berger15, ns

    podemos abrir o prospecto da dessecularizao (ao longo da

    histria, organizaes religiosas frequentemente atuaram

    como sujeitos polticos) ou junto com Carl Schmitt16, ns

    podemos repensar a influncia da Tradio na tomada de uma

    deciso poltica (no esprito da doutrina schmittiana sobre o

    decisionismo). Descartar o dogma do progresso revelar

    14

    Schmitt, Carl, Politicheskaia teologia, Moscow, 2000. [Teologia Poltica] 15

    Berger Peter L. (ed.), The Desecularization of the World: A Global Overview, Grand Rapids, Michigan, 1999. 16

    Schmitt, Carl, Diktatura, St. Petersburg, 2005. [Ditadura]

  • 63

    uma ampla gama de atores polticos, operando at e para alm

    da Nova Era, o que se encaixa na abordagem conservadora.

    Mas ns estamos livres para continuar nossa busca livre por

    aquilo que pode ficar no lugar do sujeito histrico no futuro

    na rea das hipteses exticas de Deleuze e Guattari sobre o

    rizoma, um corpo sem rgos, micropoltica, etc. ou sobre

    o horizonte da proto-histria com Baudrillard e Derrida

    (texto, desconstruo, diffrance, etc.). Eles nos oferecem

    novas (dessa vez, totalmente no conservadoras) capacidades.

    Portanto, no vale a pena rejeit-los por antecipao,

    simplesmente com base na simpatia de seus autores em

    relao ao marxismo e em sua afiliao esquerdista.

    A terceira hiptese a de forar o mtodo

    fenomenolgico e acelerar vrios passos: ns podemos propor

    considerar o Dasein17 de Heidegger como o sujeito da Quarta

    Teoria Poltica. Dasein descrito na filosofia de Heidegger

    amplamente atravs de sua estrutura existencial, o que torna

    possvel construir um modelo holstico complexo sobre sua

    base, cujo desenvolvimento levar, por exemplo, a um novo

    entendimento da poltica. Muitos pesquisadores perderam de

    17

    Heidegger, Martin, Sein und Zeit (1927), Max Niemeyer Verlag, Tubingen, 2006.

  • 64

    vistas o fato de que Heidegger (especialmente, no perodo

    intermedirio 1936-1945) desenvolveu uma histria

    completa da filosofia centrada no Dasein, o que pode formar a

    base de uma filosofia poltica completa e bem desenvolvida

    em retrospecto.

    Assim, aceitar a hiptese do Dasein imediatamente ns

    d um amplo sistema de coordenadas de modo a navegar a

    construo histrica necessria para uma teoria poltica. Se o

    sujeito Dasein, ento a Quarta Teoria Poltica constituiria

    uma estrutura ontolgica fundamental que desenvolvida

    sobre a base da antropologia existencial. Ns podemos

    mapear a direo para especificar esse tipo de abordagem:

    Dasein e o Estado;

    Dasein e estratificao social;

    Dasein e poder (a vontade de poder);

    Dasein e poder;

    Ser e poltica;

    Os horizontes da temporalidade poltica;

  • 65

    Espacialidade existencial e a fenomenologia das

    fronteiras;

    O Prncipe e nada;

    Parlamento, a escolha e Ser-para-a-morte;

    Cidadania e o papel dos guardies do Ser;

    Referendo e intencionalidade;

    O autntico e o inautntico na jurisprudncia;

    Filosofia existencial da jurisprudncia;

    Revoluo e a fuga dos deuses;

    Urbanizao e a casa do Ser.

    Naturalmente, este apenas um esboo apressado das

    reas de interesse na nova cincia poltica.

    A quarta hiptese apela ao conceito da imaginao

    (limaginaire). Esse tpico coberto em detalhes nas obras de

    Gilbert Durand18, cujas ideias bsicas eu discuto em minha

    18

    Durand, Gilbert, Les Structures anthropologiques de l'imaginaire, Paris, 1960.

  • 66

    nova obra Sociologia da Imaginao19. A imaginao como

    uma estrutura precede o indivduo, o coletivo, classe, cultura e

    raa (se a raa existe como fenmeno sociolgico, o que

    incerto), bem como o Estado. Segundo Durand, que

    desenvolveu as ideias de Carl Gustav Jung e Gaston Bachelard,

    a imaginao (limaginaire) forma o contedo da existncia

    humana baseada nas estruturas internas, originais e

    independentes que esto integradas nela. A interpretao dos

    processos polticos na histria a posteriori no difcil para a

    sociologia da imaginao e produz resultados

    impressionantes. Se ns interpretarmos a imaginao

    (limaginaire) como um ator autnomo na esfera poltica,

    incluindo o componente projetivo e um tipo de status legal,

    ento ns acabamos com uma trajetria extraordinariamente

    fascinante e totalmente no desenvolvida. Apesar de os

    estudantes de 1968 terem demandado liberdade de

    imaginao, naquele momento era improvvel que eles

    reconhecessem a imaginao como uma competidora para

    uma subjetividade poltica especial. Eles permaneceram

    presos no indivduo (como parte do liberalismo, mesmo que

    19

    Dugin, A. G., Sotsiologiia voobrazheniia. Vvedenie v strukturnuiu sotsiologiiu, Moscow, 2010. [Sociologia da Imaginao. Introduo Sociologia Estrutural]

  • 67

    um de Esquerda) e na classe (i.e., marxismo, ainda que

    estritamente considerado com base na psicanlise).

    Em busca do sujeito da Quarta Teoria Poltica, ns

    devemos ousadamente adentrar um novo crculo

    hermenutico. A Quarta Teoria Poltica o todo que,

    naturalmente, ainda insuficientemente descrito e definido.

    Suas partes so o sujeito que tambm estabelecido como

    uma sugesto preliminar. Mas, nos movendo constantemente

    entre a incerteza do todo e a incerteza de suas partes e de

    volta, ns gradualmente comeamos a esclarecer os contornos

    mais precisos do que est em jogo. Esse processo, comeando

    a partir da base da credibilidade negativa (a rejeio dos

    velhos crculos hermenuticos: liberalismo com o indivduo,

    marxismo com a classe, fascismo/nazismo com o

    Estado/raa), levar clarificao de uma estrutura um tanto

    positiva mais cedo ou mais tarde. Essa estrutura ser ainda

    mais esclarecida quando a hermenutica atingir as fronteiras

    de contradies explicitamente absurdas (que no podem ser

    resolvidas) ou deixe de combinar dados empricos. Isto ,

    comeando a partir de certo ponto, o desenvolvimento da

    Quarta Teoria Poltica ganhar caractersticas

    razoavelmente cientficas e racionais, as quais, por agora, mal

  • 68

    so discernveis por trs da energia de intuies inovadoras e

    da super tarefa revolucionria de destruir as velhas

    ideologias.

    Todo o crculo hermenutico da Quarta Teoria

    Poltica deve ser includo no Quarto Nomos da Terra. Essa

    incluso especificar seu contedo em bem mais detalhe e, em

    particular, revelar um colossal potencial epistemolgico da

    geopoltica. Esta, em adio a seus objetivos puramente

    prticos e aplicados, pode ser vista como um convite amplo a

    pensar espacialmente em um cenrio ps-moderno, quando o

    pensamento histrico, que dominava a era moderna, est se

    tornando irrelevante. Em numerosas ocasies, eu escrevi

    sobre o potencial filosfico e sociolgico da geopoltica em

    minhas obras20. A espacialidade um dos componentes

    existenciais mais importantes do Dasein, assim o apelo ao

    Quarto Nomos da Terra pode ser ligado hiptese do

    terceiro sujeito da Quarta Teoria Poltica.

    20

    Dugin, A. G., Myslit prostranstvom. Osnovy geopolitiki. Moscow, 2000 [Pensando a Espacialidade. As Origens da Geopoltica] New edition: Sotsiologiia prostranstva. Sotsiologiia voobrazheniia. Vvedenie v strukturnuiu sotsiologiiu, Moscow, 2010. [Sociologia do Espao. Sociologia da Imaginao. Introduo Sociologia Estrutural]

  • 69

    Agora ns podemos abordar o problema da formao

    de contedo da Quarta Teoria Poltica a partir de outra

    direo e examinar os competidores para incluso nessa

    teoria dos trs modelos clssicos.

    Porm, antes de determinar os aspectos das trs velhas

    ideologias que podem ser emprestados delas tendo

    neutralizado-as e retirado-as de contexto, arrancando-as de

    seu prprio crculo hermenutico, importante mencionar

    brevemente que aspectos devem ser firmemente descartados.

    Se comearmos com o fascismo e o nacional-socialismo,

    ento aqui ns devemos definitivamente rejeitar todas as

    formas de racismo. O racismo o que causou o colapso do

    nacional-socialismo no sentido histrico, geopoltico e terico.

    Este no foi somente um colapso histrico, como tambm

    filosfico. O racismo baseado na crena na superioridade

    objetiva inata de uma raa humana sobre outra. Foi o racismo

    e no alguns outros aspectos do nacional-socialismo que

    gerou as consequncias, que levaram a sofrimento

    imensurvel, bem como ao colapso da Alemanha e das

    Potncias do Eixo e destruio de toda a construo

    ideolgica da terceira via. A prtica criminosa de varrer

    grupos tnicos inteiros (judeus, ciganos e eslavos) com base

  • 70

    na raa estava precisamente enraizada na teoria racial isso

    que nos enfurece e choca em relao ao nazismo at hoje.

    Ademais, o antissemitismo de Hitler e a doutrina de que os

    eslavos so sub-humanos e devem ser colonizados, o que

    levou a Alemanha a entrar em guerra contra a URSS (pelo que

    ns pagamos com milhes de vidas), bem como ao prprio

    fato de que os prprios alemes perderam sua liberdade

    poltica e o direito de participar na histria poltica por um

    longo tempo (seno para sempre) (agora resta para elas

    apenas a economia e, na melhor das hipteses, a ecologia). Os

    apoiadores da terceira via foram deixados na posio de

    prias e marginais ideolgicos. Foi o racismo na teoria e na

    prtica que criminalizou todos os outros aspectos do

    nacional-socialismo e do fascismo, fazendo dessas vises de

    mundo polticas o objeto de insultos e vilificao.

    O racismo hitlerista, porm, apenas um tipo de

    racismo esse tipo de racismo o mais bvio, direto, biolgico

    e, portanto, o mais repulsivo. H outras formas de racismo

    racismo cultural (afirmar que h culturas superiores e

    inferiores), civilizacional (dividir os povos entre aqueles

    civilizados e os insuficientemente civilizados), tecnolgico

    (ver o desenvolvimento tecnolgico como o principal critrio

  • 71

    de valor societrio), social (afirmar, no esprito da doutrina

    protestante de predestinao, que os ricos so melhores e

    superiores quando comparados com os pobres), racismo

    econmico (em cuja base toda a humanidade hierarquizada

    segundo regies de bem-estar material) e racismo

    evolucionrio (para o qual axiomtico que a sociedade

    humana o resultado de um desenvolvimento biolgico, na

    qual os processos bsicos de evoluo das espcies

    sobrevivncia dos mais aptos, seleo natural, etc.

    continuam hoje). As sociedades europeia e americana esto

    fundamentalmente afligidas por este tipo de racismo,

    incapazes de erradica-lo de si mesmas apesar de todos os

    esforos. Plenamente conscientes do quo revoltante este

    fenmeno , as pessoas no Ocidente tendem a fazer do

    racismo um tabu. Porm, tudo isso se transforma em uma caa

    s bruxas novos prias acusados de fascismo so suas

    vtimas, muitas vezes sem motivos aparentes. Assim, o prprio

    politicamente correto e suas normas so transformados em

    uma disciplina totalitria de excluses polticas, puramente

    racistas. D