ajuste oclusal por desgaste seletivo

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Ajuste oclusal

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  • CASO CLNICO

    J Bras Ortodon Ortop Facial 2003; 8(47):362-73

    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento OrtodnticoOcclusal Adjustment by Selective Grinding After the Orthodontic Treatment

    Joo Joaquim Ferreira Neto*Antonio Borges Miguel Neto**Oswaldo de Vasconcellos Vilella***

    Ferreira Neto JJ, Miguel Neto AB, Vilella O de V. Ajuste oclusal por desgaste seletivo aps o tratamento ortodntico. J Bras Ortodon Ortop Facial 2003; 8(47):362-73.

    Ao nal do tratamento ortodntico, o Ortodontista pode deparar-se com uma situao na qual os dentes, apesar de nivelados e compondo arcos bem alinha-dos e coordenados, no apresentam uma intercuspidao excelente. Do mesmo modo, uma ocluso funcional pode no ter sido atingida. Nesse momento, ajustes oclusais por desgaste seletivo devem ser utilizados para re nar os resultados do tratamento ortodntico, melhorando a nalizao dos casos. Com este artigo, os autores apresentam uma reviso sobre ocluso e desgastes seletivos. Um caso tratado relatado e discutido.

    PALAVRAS-CHAVE: Ortodontia; Ocluso dentria balanceada; Ajuste oclusal; Ocluso dentria.

    *Especialista em Ortodontia e Ortopedia Facial UFF; e-mail: [email protected]**Especialista em Ortodontia e Ortopedia Facial UFF; e-mail: [email protected]**Mestre em Odontologia (Ortodontia) UFRJ, Professor do Curso de Especializao em Ortodontia e Ortopedia Facial UFF; Av. Canal de Marapendi, 1315/3/2202, B. Tijuca CEP 22631-050, Rio de Janeiro, RJ; e-mail: [email protected]

    INTRODUOA busca pela excelncia no trata-

    mento ortodntico, especialmente no tocante estabilidade dos resultados ps-tratamento, um dos maiores de-sa os para os Ortodontistas no presente momento, principalmente, pelo fato de os mesmos no dependerem apenas de um bom domnio da tcnica ortodntica e por possurem natureza multifatorial. A estabilidade aps o tratamento pode ser devida, principalmente, correta ocluso dentria, com ausncia de

    interferncias oclusais capazes de produzir deslocamentos dentrios e, conseqentemente, apinhamentos na regio ntero-inferior (Monnerat, Mucha, 2000).

    Uma ocluso equilibrada consiste na coincidncia da relao cntrica com a mxima intercuspidao habitual e na presena de movimentos excursivos funcionais livres de interferncias tanto nos movimentos de lateralidade quanto no de protruso da mandbula (Heide, Thorpe, 1965; Sadowski, Polson, 1984; Joondeph, Riedel, 1995; Janson, Mar-

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    tins, 1990; Okeson, 1992).Portanto, torna-se necessrio, por parte

    dos Ortodontistas, o conhecimento de recur-sos capazes de eliminar tais interferncias aps o tratamento estar nalizado, o que pode, inclusive, diminuir a necessidade de conteno (Ramfjord, Ash, 1968; Dawson, 1992). Um desses recursos , sem dvida, o ajuste oclusal por desgaste seletivo (Aubrey, 1978; Monnerat, Mucha, 2000).

    Em vista disso, os autores tm como na-lidade apresentar uma reviso da literatura, bem como ilustrar um caso sobre o desgaste seletivo aps a nalizao ortodntica.

    REVISO DA LITERATURAO princpio bsico da ocluso normal

    o fundamento que rege a Ortodontia, assim como citado por Angle (1899). poca de seu estabelecimento, esse conceito somente considerava a relao normal dos planos inclinados oclusais dos dentes com os ar-cos em ocluso como pr-requisito para a obteno da chamada ocluso normal. Angle foi o pioneiro neste campo, pois, atravs de observaes da coleo de crnios de Atkin-son, reuniu as informaes que considerou necessrias para formular seu conceito de ocluso normal (Strang, 1957).

    Enquanto sua forte in uncia prevale-ceu, outras idias eram rejeitadas. Somente aps sua morte novos estudos tiveram seu valor reconhecido (Graber, 1965). Strang, em 1957, formulou o primeiro conceito amplo de ocluso normal, reconhecendo a existncia de um complexo de estruturas, do qual os dentes fazem parte, mas em que no pode ser desprezado o papel de outros componentes, como o ligamento periodon-tal, o sistema neuromuscular, os ossos e os ligamentos, bem como a articulao tempo-romandibular.

    A ocluso funcional dos dentes foi de-fendida por DAmico, em 1961. Para ele, os caninos so os dentes mais importantes na proteo das estruturas de suporte, pois so

    as unidades mais designadas para resistir a foras horizontais, que podem causar danos aos tecidos periodontais dos dentes pos-teriores. A ao involuntria da guia pelos caninos, durante as excurses excntricas da mandbula, provoca impulsos nervosos, os quais diminuem a tenso muscular, redu-zindo as foras aplicadas sobre a dentio e protegendo os dentes posteriores de foras com componentes horizontais (DAmico, 1961).

    Em 1972, Andrews concluiu que, para uma ocluso normal, devem ser notadas as seguintes caractersticas, observadas em uma amostra de 120 casos no tra-tados e 1150 casos bem nalizados orto-donticamente, denominadas seis chaves da ocluso normal: 1) relao dos molares; 2) angulao da coroa; 3) inclinao da co-roa ou torque; 4) ausncia de rotaes; 5) contatos justos; 6) plano oclusal reto ou leve curva de Spee.

    Um objetivo do tratamento ortodntico, seno o objetivo do tratamento ortodntico, seria o de produzir um resultado no qual a relao cntrica e a mxima inter cus-pidao habitual coincidissem e em que, em relao cntrica, todos os dentes opostos con tatassem seus antagonistas simultanea-mente, com a ausncia de qualquer deslize mandibular, e, nas excurses excntricas, os dentes anteriores, especialmente os ca-ninos, desarticulassem os posteriores aps um leve movimento. Alm disto, acredita-se que o quanto mais prximo desta relao, mais estvel ser o resultado do tratamento orto dntico e menor o risco de trauma oclusal futuro e desordens temporomandibulares (Tuverson, 1980; Roth, 1981b).

    H, tambm, uma posio ideal para os cndilos em relao fossa articular e a mandbula deve estar apta a mover-se para qualquer direo possvel, sem interfern-cias dentrias no padro de movimentos ditados pela articulao, bem como ser capaz de fechar para a posio de mxima intercuspidao, sem de etir os cndilos de

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    sua posio mais ideal em relao s fossas. Nesta posio, os cndilos parecem estar centralizados dentro das superfcies internas das fossas articulares (Roth, 1981a).

    As idias sobre ocluso e equilbrio das foras oclusais comearam a surgir como conseqncia da grande perda dos dentes naturais e da necessidade de substitui-los proteticamente. Em 1920, Stillman, McCall chamaram a ateno para a capacidade destrutiva de foras excessivas sobre a den-tio. O pensamento da poca era de que as foras excessivas, geradas durante o ato da mastigao, quando os dentes entravam em contato, poderiam causar alteraes gen givais, chamadas festes de McCall. Apesar de ser este o conceito que prevalecia na poca, no existiam, no entanto, medidas teraputicas para resolver tais problemas.

    Em 1930, comeou-se a questionar os conceitos iniciais sobre trauma de ocluso; entretanto, Gottlieb et al. demonstraram a ausncia de correlao entre distrbios gen-givais e alteraes no ligamento periodontal. Foram, como conseqncia, descritas duas entidades na etiologia da doena periodon-tal: uma in amatria e outra degenerativa ou distr ca (atribuda s foras excessivas exercidas sobre os dentes).

    Contudo, deve-se a Schuyler uma contri-buio cient ca para o ajuste oclusal da den-tio natural, atravs do desgaste seletivo. Em 1923, j havia sido notado que ocluses equilibradas por procedimentos empricos quase sempre terminavam em vrias com-plicaes. Devido a essas observaes, o autor idealizou uma maneira sistemtica para o ajuste oclusal, provendo meios para a Odontologia remover estruturas dentais por desgaste, a m de minimizar as foras oclusais exercidas durante a mastigao.

    A in uncia do trauma oclusal na pro-duo da leso periodontal foi discutida por Orban, em 1939, que estabeleceu: um tecido traumatizado pode mais facilmente tornar-se in amado e um tecido in amado pode ser mais suscetvel ao trauma; por-

    tanto, a ocluso traumtica produz injrias na membrana periodontal, com subseqente rea bsoro do osso alveolar e alargamento da membrana periodontal.

    Em 1947, Schuyler apresentou uma revi-so de suas regras para o desgaste seletivo, enfatizando as in uncias destrutivas que os contatos no lado no-funcional exerciam sobre o aparelho mastigatrio.

    At 1950, os Oclusionistas baseavam seus tratamentos na premissa de que os dentes contatavam durante a mastigao e de que as estruturas de suporte poderiam ser injuriadas na presena de contatos anormais. Manly, Braley, entretanto, veri caram que somente pequena quantidade de foras era gerada pelo ato da mastigao e que o tempo despendido na mastigao do alimento era muito pequeno em comparao com as ou-tras atividades bucais. Como conseqncia, os Clnicos e investigadores comearam a questionar se de fato os dentes entravam em contato durante a mas tigao e se tais contatos seriam de magnitude su ciente para provocar danos ao periodonto de suporte.

    Em 1953, Jankelson et al., seguindo as investigaes iniciadas por Manly e Bra-ley, utilizaram a tcnica de cine uorogra a para estudar os contatos oclusais durante a mastigao e a deglutio. Observaram que: durante a mastigao, raramente ocor-rem contatos dentrios; no foi encontrada evidncia de balanceio dentrio excntrico; a ocluso dentria ocorre durante a de-glutio; durante a mastigao, os dentes antagonistas ocluem funcionalmente com o alimento entre eles interposto e, na fase nal da mastigao, a ocluso dos dentes de microdurao, terminando em uma reao nociceptiva; a mandbula, durante a deglu tio, invariavelmente levada para a posio de retruso mxima, quando livre de interferncias oclusais. Dessa forma, desenvolveram um novo conceito de oclu-so, sugerindo a seguinte sistemtica para o ajuste oclusal: a relao cntrica e a mxima intercuspidao habitual esto relacionadas

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    ao ato de deglutio e, caso sejam coinci-dentes, sero obtidas timas condies de estabilizao; no deve ser realizado ajuste para as posies excntricas, pois no h evidncia de que os dentes sejam balan-ceados nestas posies; o tratamento das reas oclusais abrasionadas no consiste em desgastar os sulcos oponentes, mas sim, em estreitar as cspides, a m de minimizar seus contatos.

    As indicaes para ajuste oclusal po-dem ser agrupadas nas seguintes catego-rias: 1) melhoria das relaes funcionais e induo de estmulo siolgico a todo o aparelho mastigador; 2) eliminao de ocluso traumtica; 3) eliminao de ten-so muscular anormal, bruxismo e mols-tias ou dores associadas; 4) eliminao de desordens da ATM; 5) estabelecimento de um padro oclusal timo, antes de pro-cedimentos restauradores extensos; 6) adaptao da forma e contorno dentrios, melhorar a e cincia mastigatria e pro-porcionar proteo ao periodonto; 7) ajudar na estabilizao dos resultados do trata-mento ortodntico; 8) recondicionamento de alguns hbitos de deglutio anormal (Ra mfjord, Ash, 1968).

    Um dos objetivos principais do ajuste oclusal por desgaste seletivo adaptar a for-ma e o contorno dentrios para melhorar as relaes funcionais da dentio de modo que os dentes e o periodonto recebam estmulo funcional uniforme e as superfcies oclusais dos dentes estejam expostas a um desgaste siolgico semelhante (Ramfjord, Ash, 1968), com as foras oclusais orientadas em uma di-reo vertical, passando pelo longo eixo dos dentes (Ross, 1974). Para Okeson, em 1992, o uso destes procedimentos limitado pelo fato de serem permanentes e irre versveis. Desgastes seletivos esto indicados para eliminar uma desordem tem poromandibular e como tratamento complementar, associa-do com mudanas oclu sais ao tratamento ortodntico, por exemplo.

    Com relao s vrias tcnicas preco-

    nizadas na literatura, estas deveriam ser aceitas ou descartadas com base em sua adequao aos princpios siolgicos do aparelho mastigatrio; eliminao de con-tatos prematuros e interferncias oclusais; estabelecimento de efetividade mastigatria tima, relaes oclusais estveis, padres mul tidirecionais e cazes e direcionamento das foras oclusais (Ramfjord, Ash, 1968).

    Um procedimento de ajuste oclusal pode ser dividido em cinco partes: 1) condiciona-mento dos maxilares ou desprogramao muscular; 2) remoo dos contatos oclusais de ectivos em relao cntrica; 3) remoo dos contatos oclusais de ectivos em movi-mentos excntricos; 4) alvio da sensibilidade muscular; 5) equilbrio dos contatos oclusais de todos os dentes, primeiro com o paciente em posio horizontal e, ento, em posio vertical (Long, 1973).

    Antes de se proceder aos ajustes da ocluso, um diagnstico deve ser realizado. A manipulao do paciente, para relao cntrica, o ponto de partida desde o in-cio do tratamento ortodntico, ao invs da visualizao da posio de mxima inter-cuspidao. A posio dos cndilos deve estar correta, antes que os dentes sejam considerados. A partir da determinao da posio de relao cntrica, reproduzvel, os dentes sero adaptados para estar em harmonia com a ATM (Aubrey, 1978; Roth, 1981a).

    O diagnstico de deslizes e interfern-cias oclusais, a partir da posio de relao cntrica e durante as excurses excntricas da mandbula, pode ser realizado visual-mente ou registrado com papel articular ou cera. aconselhvel que o Ortodontista guie estes registros, pois o paciente pode, inconscientemente, seguir uma trajetria de menor desconforto para si, evitando as interferncias (Ramfjord, Ash, 1968).

    O primeiro passo de uma seqncia de ajustes oclusais por desgastes a eliminao do deslize das posies de relao cntrica para mxima intercuspidao. O deslize da

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    mandbula causado pela instabilidade dos contatos entre vertentes de dentes opostos. Quando a ponta de cspide contata uma superfcie plana em relao cntrica e uma fora aplicada pelos msculos elevadores da mandbula, no ocorre deslize. Assim, para se conseguirem contatos aceitveis em relao cntrica, deve-se alterar ou recontor-nar todas as vertentes em ponta de cspide ou superfcie plana (Okeson, 1992).

    No desgaste seletivo para eliminao do deslizamento em cntrica, deve-se tratar de estabilizar a ocluso e manter a funo cspi-de-fossa, ajustando as cspides vestibulares dos dentes inferiores s fossas centrais dos dentes superiores e as cspides palatinas dos dentes superiores s fossas centrais dos dentes inferiores (Ramfjord, Ash, 1968).

    O desgaste de interferncias, durante os movimentos excntricos, tem como objetivo complementar o aspecto funcional dos con-tatos dentrios, que iro servir para guiar a mandbula atravs destes movimentos. Em funo, os dentes posteriores no so apropriados para receber foras geradas nos movimentos excntricos e desgastes so realizados para que somente os dentes anteriores faam a desocluso bilateral dos dentes posteriores (Okeson, 1992).

    RELATO DO CASOA paciente P.S.P. (Figura 1), 11 anos

    e 10 meses, apresentou-se para consulta na clnica do Curso de Especializao em Ortodontia e Ortopedia Facial da UFF com a queixa principal: no tenho a arcada cor-reta. Ao exame clnico, foi detectado um per l convexo, com o lbio inferior evertido e sob presso do incisivo superior, linha de sorriso agradvel (Guerra, 1998), dias temas em ambas as arcadas, overjet de 7mm, so-bremordida de 5mm e uma ma locluso de Classe II, 1a diviso (Figura 2) (Angle, 1899). A paciente foi selecionada para iniciar trata-mento ortodntico e, atravs do exame ce-falomtrico, foi encontrada uma combinao

    de protruso maxilar e retruso mandibular, conforme demonstrou a anlise de Steiner, de 1962 (SNA: 85; SNB: 75; ANB:10). Pela avaliao dos valores das medidas do plano mandibular (GoGn.SN: 34; FMA: 28) (Stei-ner, 1962; Tweed, 1966) e do ngulo do eixo Y (62) (Downs, 1948), constatou-se uma leve predominncia do crescimento vertical sobre o horizontal. O incisivo superior esta-va bem posicionado em relao base do crnio (1.NA: 19; 1-NA: 4mm), entretanto, o incisivo inferior estava projetado e com incli-nao acentuada para vestibular (1.NB: 35; 1-NB: 9mm). Em relao linha S (Steiner, 1962), os lbios estavam posicionados 4mm para a frente.

    Os objetivos do plano de tratamento fo-ram de nidos para melhorar a relao maxi-lomandibular, com a instalao de aparelho

    FIGURA 1: Fotogra as iniciais da face da paciente P.S.P.A, vista frontal. B, sorriso. C, per l total. D, destaque para o tero inferior.

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    extra-oral com fora inicial de 450g de cada lado, diminuir a convexidade do per l, fechar os espaos nos arcos, diminuir o overjet, com a retrao dos incisivos superiores, nivelar a curva de Spee e conseguir uma sobremordida adequada, para estabelecer, assim, uma ocluso funcional para a pacien-te. O aparelho foi montado com o sistema edgewise standard 0,022 (Morelli, Soro-

    caba, SP), em maro de 1997, e removido aproximadamente dois anos e seis meses depois. O tratamento foi iniciado pela Dra. Cristiane Monnerat Aylmer e nalizado por um dos autores (A.B.M.N.). Como conteno para o arco superior, uma placa removvel de acrlico com grampo circunferencial foi confeccionada e instalada e, no arco infe-rior, uma barra com o twist- ex 0,0195 foi

    FIGURA 2: Fotogra as iniciais dos arcos dentrios. A, lateral direita. B, vista frontal. C, lateral esquerda. D, oclusal superior. E, oclusal inferior.

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    colada de canino a canino.Aps a nalizao do tratamento orto-

    dntico xo total, considerado o maior ajus-te oclusal para o caso desta paciente, em dezembro de 1999, foram adotados os pro-cedimentos de ajuste oclusal por desgaste seletivo, para aprimorar a intercuspidao dentria, bem como favorecer uma maior estabilidade do caso (Ramfjord, Ash, 1968; Aubrey, 1978; Janson, Martins, 1990). Assim, como preconizado por Schuyler, em 1973, um ms aps a remoo da aparatologia xa, com as devidas acomodaes dentrias e restabelecimento biolgico das estruturas de suporte, a paciente retornou para consulta de reviso, durante a qual foram realizados os procedimentos para o ajuste oclusal por desgaste seletivo que seguem:

    1) Realizou-se a desprogramao mus-cular da paciente. Manipulou-se a mandbula da paciente para a posio de relao cntri-ca, a qual, neste caso, coincidiu com a posi-o de mxima intercuspidao habitual.

    2) Os contatos foram marcados com papel carbono no (Accu lm II, Parkell, Far-mingdale, EUA) preso em uma pina Miller e foram checados, observando-se a presena dos contatos de parada e de equilbrio.

    3) Seleo das pontas diamantadas para baixa rotao para a realizao dos desgas-tes. Trs tipos de pontas diamantadas foram selecionadas, nos formatos esfrico, chama e cone invertido (Intensiv SA, Sua), devido versatilidade que as mesmas apresentam para a realizao de quaisquer desgastes nas vrias formas dos elementos dentrios. Um disco de polimento Sof-Lex (3M do Bra-sil, Sumar, SP) foi tambm selecionado, de granulao na, para o acabamento das superfcies desgastadas.

    4) Aps a marcao dos contatos e sele-o das pontas diamantadas, foram realiza-dos os desgastes, especialmente daqueles correspondentes s cristas marginais, que podem atuar como fatores desencadeantes de de exo da mandbula e, conseqente-mente, de traumas. Foi dada preferncia aos

    desgastes no arco superior, pois, segundo Santos Jr., em 1998, o arco superior uma estrutura xa e menos sujeita ao erro durante o procedimento. Durante esta etapa, cuida-dos em relao tcnica, foram tomados, como preservao das cspides de suporte e estreitamento da mesa oclusal.

    5) Aps cada seqncia de desgastes, novos contatos foram marcados at que somente os contatos desejados, ditos ante-riormente, estivessem presentes.

    6) Ao nal da sesso de ajuste oclusal por desgaste seletivo, um polimento foi exe-cutado nas superfcies desgastadas, com disco Sof-Lex de granulao na, sendo realizada aplicao tpica de or ao trmino dos procedimentos.

    Vale ressaltar que apenas uma consulta no su ciente para o ajuste oclusal total, pois necessrio que se permita um tempo de aproximadamente um ms para acomo-daes eventuais dos dentes (Schuyler, 1973). Sendo assim, este procedimento foi repetido em mais duas sesses, at que se estabelecesse o equilbrio oclusal.

    DISCUSSOPoucas denties naturais, se que algu-

    ma o faa, desenvolvem-se para uma relao de ocluso funcional; medida que h o des-gaste dentrio, alguma desordem funcional iniciada. Restauraes inadequadas podem ainda contribuir para o aparecimento de de-sarmonias oclusais. Estas, que costumam ser toleradas nos primeiros anos, tm potencial para tornarem-se traumticas e patognicas, com uma diminuio da resistncia fsica. Desarmonias oclusais so, tambm, a causa primria de bruxismo, com sua contribuio para a doena periodontal (Schuyler, 1973).

    O objetivo do tratamento ortodntico no deve ser apenas o de produzir uma melhor esttica facial e uma ocluso ideal esttica, assim como descrita por Angle (1899) e, pos-teriormente, Andrews (1972), mas, tambm, de proporcionar uma ocluso harmoniosa

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    com a articulao temporomandibular, com contatos mltiplos e de mesma intensidade em todos os dentes no fechamento em cn-trica (Timm et al., 1976; Aubrey, 1978; Tu-verson, 1980; Roth, 1981a, 1981b; Janson, Martins, 1990). Este objetivo usualmente tambm requer algum grau de ajuste oclusal por desgaste (Timm et al., 1976; Janson, Martins, 1990).

    Entretanto, os desgastes devem ser seletivos e conservadores e as mesmas dimenses de contatos verticais devem ser al canadas para todos os dentes em cntrica (Timm, Herremans; Ash, 1976). Contatos iguais em fechamento resultaro em uma presso igual nas pores centrais dos dis-cos articulares, avasculares e desprovidos de nervos sensitivos; portanto, capazes de suportar estresses sem injria ou dor (Timm et al., 1976; Watson, 1979).

    Fatores de desarmonia oclusal podem contribuir para posies anormais do cn-dilo na fossa articular e para movimentos con dilares funcionais anormais. Aps todos os ajustes, desejvel reexaminar a oclu-so do paciente dois ou trs meses depois, dando ateno especial aos contatos do lado no-funcional, pois estes podem tambm favorecer movimentos condilares anormais em funo. A sua reduo, resultando em movimentos normais do cndilo, pode trazer os planos inclinados no-funcionais para contato. Estes contatos devem, novamente, ser eliminados (Schuyler, 1973) sem, entre-tanto, alterar os contatos cntricos (Okeson, 1992).

    A ocluso aps o equilbrio por desgaste seletivo usualmente bem estvel, mas uma avaliao peridica desejvel, para se veri- car se o uso introduziu algum desequilbrio funcional (Schuyler, 1973).

    No demais ressaltar que casos po-bremente tratados e nalizados de forma inadequada, ou que esto grosseiramente fora da posio de relao cntrica, no podem, na maioria das vezes, ser apenas equilibrados para uma cntrica estvel,

    com uma correta guia anterior e, em alguns casos, no podem sequer ser restaurados, pois devem ser retratados ortodonticamente (Roth, 1981a).

    Aps a nalizao do tratamento da pa-ciente P.S.P. (Figuras 3 e 4), observou-se a presena de espaos negros triangulares en-tre os dentes superiores e inferiores, quando os arcos estavam em ocluso. Foi realizado o exame com papel articular e veri cou-se a presena de contatos mais pesados em determinados dentes. Procedeu-se a uma seqncia de ajustes oclusais por desgastes seletivos (Figura 5) e os seguintes resultados foram atingidos: 1) homogeneizao dos contatos dentrios em relao cntrica (Figu-ra 6); 2) movimentos de lateralidade guiados pelos caninos, com desocluso dos demais dentes (Figura 7); 3) guia anterior com de-socluso pelos quatro incisivos inferiores e incisivos centrais superiores e 4) diminuio e at eliminao dos espaos negros com os

    FIGURA 3: Fotogra as nais da face da paciente P.S.P. A, vista frontal. B, sorriso. C, per l total. D, destaque para o tero inferior.

    a b

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  • J Bras Ortodon Ortop Facial 2003; 8(47):362-73370

    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    FIGURA 4: Fotogra as nais dos arcos dentrios. A, lateral direita. B, vista frontal. C, lateral esquerda. D, oclusal superior. E, oclusal inferior.

    FIGURAS 5A e 5B: Marcao e desgaste seletivo das superfcies dentrias que apresentavam contatos indesejveis. A, marcao com papel articular. B, desgaste com ponta diamantada em baixa rotao.

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    FIGURAS 5C e 5D: Marcao e desgaste seletivo das superfcies dentrias que apresentavam contatos indesejveis. C, contatos resultantes. D, contatos no arco oposto.

    FIGURA 6: Contatos obtidos ao nal das sesses de desgastes seletivos. A, arco superior. B, arco inferior.

    FIGURA 7: Movimentos de lateralidade guiados pelos caninos. A, lado direito. B, lado esquerdo.

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    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    FIGURA 8: Comparao da presena de espaos triangulares negros antes (A e C) e aps (B e D) as sesses de desgastes seletivos. A, Fotogra a lateral direita, com visualizao de espaos triangulares negros. B, Fotogra a lateral direita ao nal dos desgastes, com diminuio considervel dos espaos triangulares negros. C, Fotogra a lateral esquerda, com visualizao de espaos triangulares negros. D, Fotogra a lateral esquerda ao nal dos desgastes, com diminuio considervel dos espaos triangulares negros.

    arcos dentrios em ocluso (Figura 8).

    CONCLUSESPara a obteno de resultados excelentes

    no tratamento ortodntico, devem ser conside-rados outros objetivos, alm de uma ocluso ideal esttica. Uma avaliao funcional e di-nmica deve estar presente, comeando pela posio de relao cntrica, a qual dever, ao nal do tratamento, coincidir com a posio de mxima intercuspidao. Desta forma, con-tatos mltiplos e uniformes no maior nmero possvel de dentes, durante o fechamento em relao cntrica, devem estar presentes, com

    ausncia de sintomatologia da ATM, ausncia de deslizes decorrentes de prematuridade e, nos movimentos excntricos, desocluso posterior imediata aps leves movimentos protrusivos e laterais, guiados por incisivos e caninos, respectivamente.

    O ajuste oclusal por desgaste seletivo, aps o tratamento ortodntico, um recurso importante para a obteno dos objetivos acima citados, quando somente o tratamento ortodntico no possibilitou a sua obteno. A estabilidade dos resultados alcanados parece, tambm, ser favorecida por este pro-

    a

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    d

    cedimento.

    Ferreira Neto JJ, Miguel Neto AB, Vilella O de V. Occlusal adjustment by selective grinding after the orthodontic treatment. J Bras Ortodon Ortop Facial 2003; 8(47):362-73.

    At the end of an orthodontic treatment, the Orthodontist may be faced with a situation in which

  • J Bras Ortodon Ortop Facial 2003; 8(47):362-73 373

    Ajuste Oclusal por Desgaste Seletivo aps o Tratamento Ortodntico

    the teeth, though well leveled, and the arches, although well aligned and well coordinated, do not present an excellent intercuspation. Following this, a functional occlusion might not have been achieved. Selective grinding of teeth should be used to re ne the results of the orthodontic treatment, at this time, improving the nishing of the cases. In this article, the authors present a review on the subjects of occlusion and selective equilibration, and a case treated with this combined approach is reported and discussed.

    KEYWORDS: Orthodontics; Dental occlusion, balanced; Occlusal adjustment; Dental occlu-sion.

    REFERNCIAS

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    Receb ido para pub l i cao em: 22/05/02

    Enviado para anlise em: 04/06/02Aceito para publicao em: 14/10/02