arquitetura em bambu, centro de cultura max feffer | |

147
Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

Upload: phambao

Post on 08-Jan-2017

225 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

Arquitetura em bambu,Centro de Cultura Max Feffer

| |

Page 2: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

REVISTA LABVERDEV. II - Nº 2

LABVERDE - Laboratório VERDEFAUUSP - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Universidade de

São Paulo

JUNHO 2011ISSN 2179-2275

Page 3: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

Ficha Catalográfica

Serviço de Biblioteca e Informação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP

Revista LABVERDE, v.II, N° 2

LABVERDE- Laboratório Verde

Rua do Lago, 876 - Cidade Universitária, Bairro do Butantã

CEP: 05508-900 São Paulo-SP

Tel: (11) 3091-4535

Capa: Mariana Oshima Menegon

Assunto: Centro Cultural Max Feffer, arquitetura em bambu, autoria de Leiko Hama Motomura, da

Amima Arquitetura de Mínimo Impacto sobre o Meio Ambiente

e-mail: [email protected]

Home page: www.usp.br/fau/depprojeto/revistalabverde

REVISTA LABVERDE/ Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e Urba-

nismo. Departamento de Projeto. LABVERDE- Laboratório Verde – v.2, n.2 (2010)- .

– São Paulo: FAUUSP, 2010 –

Semestral

v.: cm.

v.2, n.2, jun. 2011

ISSN: 2179-2275

1. Arquitetura – Periódicos 2. Planejamento Ambiental 3. Desenho Ambiental 4. Sus-

tentabilidade I. Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.

Departamento de Projeto. LABVERDE. II. Título

CDD 712

Page 4: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

3

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Revista LABVERDEJunho - 2011ISSN: 2179-2275

Universidade de São PauloJoão Grandino Rodas (Reitor)Hélio Nogueira da Cruz (Vice-Reitor)

Faculdade de Arquitetura e UrbanismoMarcelo de Andrade Romero (Diretor)Maria Cristina da Silva Leme (Vice-Diretora)

Editor ResponsávelMaria de Assunção Ribeiro Franco

Comissão EditorialDenise DuarteMárcia Peinado AlucciMaria de Assunção Ribeiro FrancoPaulo Renato Mesquita PellegrinoSaide Kahtouni

Conselho EditorialCatharina Pinheiro Cordeiro dos Santos Lima (FAUUSP)Cecília Polacow Herzog (FAUUFRJ)Denise Duarte (FAUUSP)Demóstenes Ferreira da Silva Filho (ESALQ)Eduardo de Jesus Rodrigues (FAUUUSP)Eugenio Fernandes Queiroga (FAUUSP)Euler Sandeville Júnior (FAUUSP)Fábio Mariz Gonçalves (FAUUSP)Giovanna Teixeira Damis Vital (UFU)

Helena Aparecida Ayoub Silva (FAUUSP)José Carlos Ferreira (UNL-Portugal)João Reis Machado (UNL-Portugal)João Sette Whitaker (FAUUSP)Larissa Leite Tosetti (ESALQ)Lourdes Zunino Rosa (FAUUFRJ)Marcelo de Andrade Romero (FAUUSP)Márcia Peinado Alucci (FAUUSP)Maria Ângela Faggin Pereira Leite (FAUUSP)Maria Cecília França Lourenço (FAUUSP)Maria de Assunção Ribeiro Franco (FAUUSP)Maria de Lourdes Pereira Fonseca (UFABC)Miranda M. E. Martinelli Magnoli (FAUUSP)Paulo Renato Mesquita Pellegrino (FAUUSP)Saide Kahtouni (FAUUFRJ)Silvio Soares Macedo (FAUUSP)Vladimir Bartalini (FAUUSP)

ColaboradoresAntonio FrancoOscar Utescher

Desenvolvimento de webEdson MouraMariana Oshima Menegon

CDD 712

Page 5: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

4

Revista LABVERDE

SUMÁRIO

1. EDITORIAL

Maria de Assunção Ribeiro Franco

2. ARTIGOS

OS ATERROS SANITÁRIOS DESATIVADOS E O SISTEMA DE ÁREAS VERDES DA CIDADE DE SÃO PAULO: POSSIBILIDADE DE INTEGRAÇÃOThe Disabled Landfills And Green Areas System Of São Paulo City: The Integration Possibility Monica Machado Stuermer, Pérola Felipette Brocaneli e Maria Elena Merege Vieira.

REDUTOS RURAIS: ESTRATÉGIA DE RESILIÊNCIA E INFRAESTRUTURA VERDE URBANA. ESTUDO DE CASO EM VALINHOS, SP - BRASILRural Remains: Strategy of Resilience and Urban Green Infrastructure. Case Study in Valinhos, SP – BrazilLéa Yamaguchi Dobbert, Larissa Leite Tosetti , Sabrina Mieko Viana

SISTEMA DE INFORMAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DA QUALIDADE AMBIENTALInformation System As An Instrument Of Environmental Quality Mana-gementPatricia Helen Lima

A EVOLUÇÃO DA SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL URBANA E AS IN-TERFERÊNCIAS DA ÉTICAThe Evolution of the Urban Environmental Sustainability and the Ethics InterferencesDeize Sbarai Sanches Ximenes

007

010

030

045

061

Page 6: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

5

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

ARQUITETURA DA COMPLEXIDADE: DESIGN A SERVIÇO DA VIDA EM UM ESTUDO DE CASO NO SUL DE MINAS GERAISArchitecture of Complexity: Design Aimed at Serving Life in a Case Stu-dy in the South of Minas Gerais Evandro de Castro Sanguinetto

OIKOS: REINTEGRANDO NATUREZA E CIVILIZAÇÃOOikos: Reintegrating Nature and CivilizationJosé Otávio Lotufo

3. ENTREVISTA

BETTY FEFFERCentro Max Feffer: um centro de referência em cultura e sustentabilidade no Polo Cuesta, Pardinho, SP.

4. DEPOIMENTOS

BIA GUERRAInstituto Jatobás: atuação na cultura e valores de sustentabilidade junto à comunidade de Pardinho.

CATHARINA PINHEIROEm Pauta o Código Florestal

5. COMUNICADOS

Normas para Apresentação de Trabalhos

081

107

129

134

138

145

Page 7: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

1. EDITORIAL

Page 8: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

7

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

EDITORIAL

Na Revista LABVERDE Nº 2 foram reunidos seis artigos, uma entrevista e dois de-poimentos sob o tema “Projetos Sustentáveis”. O leitor observará, no entanto, que todos os textos aqui apresentados discutem, de uma maneira ou de outra, a susten-tabilidade ligada a uma nova ética, denominada ética ambiental ou ecológica que, na verdade, poderia ser tratada, também, como temática deste número.

O primeiro artigo apresenta uma interessante proposta de recuperação de aterros sanitários desativados do município de São Paulo, transformando-os em parques pú-blicos, que, segundo as autoras Stuermer, Brocaneli e Vieira, uma vez interligados aos demais parques, por meio de corredores verdes, poderão aumentar consideravelmen-te o índice de áreas verdes por habitante em nossa Cidade.

Dobbert, Tosetti e Viana, no segundo artigo, despertam a atenção para a questão da conservação e recuperação de “redutos rurais” como estratégia de resiliência e infra-estrutura verde diante do processo de urbanização e apresentam o caso de redutos rurais de interesse ambiental, histórico e cultural na cidade de Valinhos, SP.

O terceiro artigo, apresentado por Lima, ressalta a importância da adoção, por parte do setor público, de novas tecnologias ligadas aos Sistemas Geográficos de Informa-ção para a formulação e gestão de políticas públicas, especialmente no nível local, para a promoção da qualidade ambiental e a sustentabilidade urbana.

O artigo de Ximenes, o quarto, discute a questão da evolução da ética nas visões antropocêntrica e biocêntrica e suas implicações nos problemas sociais e ambientais da atualidade, tratando o problema da sustentabilidade, antes de tudo, como um pro-blema ético.

No quinto artigo, Sanguinetto apresenta um interessante experimento de uma casa ecológica integrada ao lote, ao ecossistema e à paisagem local no município de Piran-guinho, no sul de Minas Gerais.

Lotufo, no sexto artigo, preocupa-se em incorporar os princípios ecológicos ao ato de projetar o edifício e a cidade, discutindo o problema como reflexo de uma lógica mercadológica mecanicista, distanciada das leis naturais que regem o funcionamento

Page 9: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

8

Revista LABVERDE

dos ecossistemas. O texto aponta a possibilidade de uma nova maneira de projetar tanto edifícios quanto o espaço urbano, que incorpore os processos ecossistêmicos, no caminho da sustentabilidade.

A entrevista com Betty Feffer revela uma experiência inédita, na cidade e município de Pardinho, feita por uma organização não governamental, atrelada ao “Projeto Pólo Cuesta”1, com a criação do Instituto Jatobás e posteriormente o Centro Max Feffer -Cultura e Sustentabilidade, que reúne diversas atividades de cunho social visando a implantação do modelo Ecopolo de Desenvolvimento Sustentável. A sede do Centro Max Feffer, de autoria da arquiteta Leiko Hama Motomura e da empresa Amima Ar-quitetura de Mínimo Impacto sobre o Meio Ambiente, cuja foto é capa desta edição, tornou-se uma referência regional e nacional em arquitetura sustentável.

Dois depoimentos completam esta edição: o da Professora da FAUUSP Catharina P. Cordeiro Lima, sobre os recentes embates sobre as implicações do Novo Código Flo-restal Brasileiro e o de Bia Guerra, coordenadora das atividades do Centro Max Feffer, cujas atividades estão centradas na educação para a sustentabilidade.

Tenham uma boa leitura!

Maria de Assunção Ribeiro FrancoEditora da Revista LABVERDE

1 O “Pólo Cuesta” é um projeto de iniciativa da Secretaria de Turismo do Estado de São Paulo,

com foco em turismo sustentável, iniciado em 2001. O projeto está em desenvolvimento, envolvendo

dez cidades do interior de São Paulo, na região de Botucatu. São elas: Anhembi, Areiópolis, Bofete,

Botucatu, Conchas, Itatinga, Paranapanema, Pardinho, Pratânia e São Manuel.

Page 10: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

2. ARTIGOS

Page 11: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

ARTIGO Nº1OS ATERROS SANITÁRIOS DESATIVADOS E O SISTEMA DE ÁREAS VERDES

DA CIDADE DE SÃO PAULO: POSSIBILIDADE DE INTEGRAÇÃOThe Disabled Landfills And Green Areas System Of São Paulo City: The

Integration Possibility Monica Machado Stuermer, Pérola Felipette Brocaneli e Maria Elena Merege Vieira.

Page 12: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

11

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

OS ATERROS SANITÁRIOS DESATIVADOS E O SISTEMA DE ÁREAS VERDES DA CIDADE DE SÃO PAULO: POSSIBILIDADE DE INTEGRAÇÃO

Monica Machado Stuermer¹Pérola Felipette Brocaneli²Maria Elena Merege Vieira³

¹ Engenheira civil, Doutora em Geotecnia Ambiental pela Escola Politécnica da USP. Leciona na

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

E-mail: [email protected]

² Arquiteta e Urbanista pela FAU Mackenzie. Doutora em Paisagem e Ambiente pela FAU-USP.

Leciona na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

E-mail: [email protected]

³ Arquiteta e Urbanista pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Doutora em Paisagem e

Ambiente pela FAU – USP Leciona na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade

Presbiteriana Mackenzie. E-mail: [email protected]

Resumo

O trabalho aqui apresentado tem por objetivo estudar os aterros sanitários desativa-dos do município de São Paulo e sua relação com as áreas verdes, da cidade, apre-sentando algumas idéias para intervenção e inserção dos mesmos na malha verde urbana, de forma a contribuir para a melhora a qualidade ambiental do município de São Paulo e de seus habitantes, através do aumento das áreas verdes municipais e suas conexões.

Palavras Chaves: Aterro sanitário, áreas verdes de uso restrito, revitalização am-biental urbana, ecologia da paisagem, corredores verdes.

Page 13: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

12

Revista LABVERDE

THE DISABLED LANDFILLS AND GREEN AREAS SYSTEM OF SÃO PAULO CITY: THE INTEGRATION POSSIBILITY

Abstract

This work aims to study the disabled sanitary landfills of the city of São Paulo and their relation with the green areas, presenting some ideas for intervention and insertion of them in the urban green mesh, of form to improve the ambient quality of the city of São Paulo and its inhabitants, through the increase of the municipal green areas and its connections.

Key-words: Sanitary Landfill, Green Areas of Restricted Use, Urban Environmental Revitalization, Landscape Ecology, green corridors.

1.INTRODUÇÃO

Grande parte dos problemas urbanos atuais do Município de São Paulo decorrem do vertiginoso crescimento ocorrido a partir da sua industrialização, que ocasionou tanto a sua riqueza como sua pobreza e seus maiores problemas ambientais.

Já na década de 1960, a cidade já apresentava problemas em con-seqüência da não aplicação de uma política urbana ambiental a mé-dio e longo prazo. A partir da década de 70 começaram as discus-sões sobre questões ambientais urbanas, onde os principais pontos eram a carência de áreas verdes, a poluição atmosférica e dos re-cursos hídricos e a destinação dos resíduos sólidos, entre outros. Nos anos 80 difundiu-se o paradigma ambiental pela sociedade, de forma generalizada e nos anos 90, este passa a dominar a noção de interdependência planetária, questões que transparecem direta-mente na cidade de São Paulo, permeando a elaboração do Plano Diretor Estratégico, em 2002.

A diferença de temperatura entre as regiões centrais e os bairros arborizados e Par-ques, dentro da Mancha Urbana, chega a 5°C, e entre as regiões periféricas ainda recobertas por vegetação, esta diferença atinge até 10° C em um mesmo momento, fenômeno conhecido como “Ilha de Calor”, (Atlas Ambiental de São Paulo, 2002) .

Page 14: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

13

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

O mesmo documento demonstra que as áreas mais quentes da cidade são aquelas onde há a menor concentração de verde, maior impermeabilização do solo e os maio-res índices de poluição atmosférica.

Os espaços verdes suprem os quarteirões adjacentes a áreas verdes com ar mais fresco. Deneke e Grey (1992) colocam que o efeito da vegetação na temperatura do ar será mais significativo quando ela for plantada em áreas totalmente desprovidas de vegetação. As “Ilhas de Calor”, também podem ser amenizadas pelo adensamento do verde, acrescentando-se ainda que as pesquisas indicam que a vegetação quando plantada de forma dispersa, isto é, não concentrada em grandes manchas verde, fun-ciona de forma mais eficiente para absorção dos poluentes.

O sistema de áreas verdes de uma cidade deve incluir remanescentes expressivos de vegetação nativa, protegidos em Unidades de Conservação, trechos marginais arbori-zados (como as áreas de domínio de rodovias, encostas de barreiras etc.), áreas parti-culares e públicas de uso restrito (sítios, quintais, jardins etc.), além dos parques, pra-ças, e jardins municipais, de uso público. Cada modalidade de área verde exerce um papel importante na qualidade ambiental das cidades. O projeto de paisagismo deve valorizar a natureza, recompondo a vegetação nativa, propondo espaços contempla-tivos que sirvam de atrativo à fauna silvestre, notadamente à avifauna, objetivando a biodiversidade; deve ter como ponto de partida o aproveitamento das qualidades que a natureza proporciona, trazendo à tona a demonstração do conceito de preservação ambiental. A paisagem, tendo fundamentalmente uma conotação espacial e traduz na sua fisionomia as interações dos fatores naturais e antrópicos que estruturam e modi-ficam o funcionamento dos sistemas ambientais por ela configurados. Outro fator con-siderado na elaboração do projeto está associado às funções microclimáticas da área em questão, cuja melhoria advém das sombras e retenção de umidade proporcionada pelas árvores, permitindo o contato do usuário com elementos naturais. A implantação de coberturas vegetais distintas cria uma série de ambientes diferenciados em uma área que, de outra maneira, poderia ser um grande e inóspito descampado, funcio-nando como estruturadoras de espaço; estas causam impacto positivo, respeitando as características naturais da área, inserindo o empreendimento dentro do contexto regional. Além disso, a cobertura vegetal p0ode recuperar áreas degradadas, como aterros sanitários.

Os aterros sanitários provocam diversos impactos ambientais, não só em sua fase de implantação e funcionamento, mas também quando de seu fechamento e desativa-

Page 15: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

14

Revista LABVERDE

ção, provocando, muitas vezes, a degradação da área local e do entorno. Estes locais necessitam de tratamento diferenciado ao de outras áreas degradadas, devido a fato-res como a liberação de gás metano que representa um dos maiores limitantes para a implantação de vegetação, dos riscos de explosão, do recalque diferencial do terreno, problemas de drenagem e compactação da camada superficial do solo utilizado no preenchimento do terreno (MATA E ANDRADE: 2000; SILVA: 2001).

As áreas de solo remanescentes dos aterros sanitários urbanos podem ser considera-das como áreas degradadas. Segundo a NBR 10703 (ABNT: 1989) a degradação do solo é definida como:

“alteração adversa das características do solo, em relação aos seus diversos usos possíveis, tanto os estabelecidos em planejamento quanto os potenciais.” A mesma norma define recuperação do solo como: “processo de manejo do solo no qual são criadas condições para que uma área perturbada ou mesmo natural seja adequada a novos usos”.

Na cidade de São Paulo são gerados aproximadamente 15 milhões de toneladas de lixo por ano. Os resíduos sólidos se apresentam, então, como um grande desafio para a sociedade, exigindo recursos técnicos, financeiros e administrativos munici-pais para o seu manejo adequado. Uma das formas de disposição destes resíduos é o aterro sanitário, um sistema controlado que minimiza os impactos da disposição dos mesmos e é considerado o sistema mais eficiente para a disposição dos resíduos sólidos domésticos. No entanto ao término da vida útil dos aterros, um programa de recuperação destas áreas pode auxiliar a suprir a falta de áreas verdes do município, reintegrando-as na forma de parques, criando não uma massa verde pontual, mas um sistema integrado.

A proposta do presente trabalho é a criação de uma rede verde na cidade (corredores verdes) interligando áreas verdes (parques e áreas verdes significativas) e as franjas das áreas dos aterros sanitários desativados, com o intuito de ampliar as possibilida-des de trânsito da biodiversidade da fauna e flora na escala da cidade.

2. AS ÁREAS VERDES NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

O município de São Paulo apresenta um índice médio de áreas verdes/habitante de

Page 16: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

15

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

cerca de 4,9 m2/hab (SVMA, 2008), valor muito abaixo do mínimo recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) de 12 m²/habitante.Observa-se que este é um problema histórico no município, que nunca apresentou taxas de áreas verde elevadas, conforme demonstra a tabela 1 a seguir:

Ano Áreas Verdes População ÍndiceAnterior a 1860

1860-18901890-19201920-19501950-19801980-1996

143.428143.428326.527

13.933.62726.680.13537.084.581

31.38564.934579.033

2.189.0968.493.22610.220.783

4,572,210,566,373,143,63

Tabela 1: Evolução das áreas verdes no Município de São Paulo (KOHLER et al, 2000).

Para efeito de comparação com grandes cidades, Buenos Aires apresenta índice de 9 m2/hab, Curitiba, 16 m2/hab, Londres, 71 m2/hab e Los Angeles, 111 m2/hab (EM-PLASA, 2000).

Os parques municipais apresentam realidades bastante diversas, variando em ex-tensão, vegetação, equipamentos e contexto social. Além das atividades de lazer de-senvolvidas diariamente pelo público usuário, outras atividades complementares são promovidas pelas diferentes divisões do DEPAVE, Secretarias Municipais, outras ins-tâncias governamentais e entidades civis, tais como: investigação científica, educa-ção ambiental, cursos, produção de mudas, atendimento médico-veterinário, eventos artísticos e culturais (KOHLER et al, 2000).

Entre os parques municipais, o maior deles é o Parque Anhanguera, na região norte do município, ocupando 9.500.000m2. A maior parte de sua área é reflorestada com eucaliptos. A seguir aparece o parque do Carmo, na zona leste, com 1.500.000 m2, localizado dentro de Área de Proteção Ambiental. O parque possui remanescente de mata ciliar e mata atlântica nativa. O Parque do Ibirapuera localizado na região sul do Município é o parque mais popular da cidade, com 1.584.000 m2 (SVMA, 2008).

Entre os parques estaduais, a maior área pertence ao Parque Estadual da Serra do Mar com 44.322.946m2. Este parque abrange diversos municípios de São Paulo, com área total de 309.938 hectares. A vegetação é de Mata Atlântica típica de encosta e

Page 17: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

16

Revista LABVERDE

compreende o cinturão verde sobre a Serra do Mar. O Parque Estadual da Cantareira, com área de 40.519.593 m2, faz parte da Reserva Estadual da Cantareira e tem co-bertura florestal em praticamente toda sua extensão, que é considerada de preserva-ção permanente, formada principalmente pela Mata Atlântica. Estas duas áreas ainda não estão englobadas pela malha urbana. As demais áreas verdes estaduais situam-se dentro da área urbana. (KOHLER et al, 2000).

Em relação às áreas privadas, KOHLER et al,(2000) observam que os maiores índices de áreas verdes e de arborização em propriedades particulares se dão nos bairros onde predominam a população de média e alta renda. Os autores colocam que, se as áreas verdes particulares fossem somadas ás áreas públicas, ter-se-ia um valor de índice de áreas verdes de 12,42 m2/hab, atendendo ao valor mínimo recomendado pela OMS.

Observa-se, no entanto, a má distribuição destas áreas verdes no espaço urbano. Algumas regiões são muito bem servidas e outras completamente nuas de vegetação. Segundo dados da SVMA (2000), a região do Itaim Paulista, Santa Cecília e Brás apresentam taxas de vegetação/habitante próximas de zero, enquanto a região da Capela do Socorro apresenta taxa de 162 m2/habitante.

Em 2012, a prefeitura pretende atingir a marca dos 100 parques municipais, um au-mento considerável de áreas verdes, passando de 9.000.000m² para aproximada-mente 50.000.000 m² na cidade de São Paulo, número que não inclui os parques estaduais e nem mesmo as APAs (Áreas de Proteção Ambiental). Atingindo esta meta, a cidade passará a contar com um total de 86.130542 m² de áreas verdes públicas. Adotando-se uma população de 11,0 milhões no município para 2012 (projeção SE-ADE, 2003), a taxa de área verde passará dos atuais 4,9 m2/hab para 7,8 m2/hab, o que será um feito extraordinário. (Neste total não estão contabilizadas as praças e demais áreas verdes).

Os novos parques, locados de forma mais equilibrada pelo território urbano, segundo mostra o mapa 2, buscam reduzir o desequilíbrio na distribuição de áreas verdes do município (PMSP, 2008) .

No entanto, atingir o valor mínimo recomendado pela Organização Mundial da Saúde de 12 m2/habitante parece distante, em uma cidade já densamente ocupada, onde são poucas e pequenas as áreas livres que podem ser destinadas a parques e praças

Page 18: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

17

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

sem a necessidade de desapropriações.

Mapa 1: Localização dos Parques Municipais na Região Metropolitana de São Paulo. http://ww2.prefeitura.sp.gov.br/mapa_verde/asp/home.asverde/

Áreas degradadas podem vir a suprir a falta de áreas verdes se reintegradas ao mu-nicípio na forma de parques. A recuperação de uma área degradada não representa a volta às condições iniciais existentes, mas sim uma nova destinação de uso da área, de forma sustentável, através de uma estratégia de utilização em conformidade com valores ambientais, estéticos e sociais. Majer (1989, apud Oliveira, 2005) utili-za o termo “reabilitação” para a recuperação da área, podendo esta reabilitação ser condicional, onde as ações antrópicas direcionam os fenômenos naturais, como no caso de plantações e pastagens; ou então, uma reabilitação auto-sustentável, onde as ações humanas agem até um determinado ponto, a partir do qual a própria natureza caminha para um equilíbrio sustentável, como no caso de um reflorestamento. Desta forma apesar de não ser possível a recuperação original da área, pode-se obter um ecossistema alternativo, auto-sustentável.

Page 19: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

18

Revista LABVERDE

Mapa 2: Projeto dos “100 Parques” propostos no Município de São Paulo Fonte: DE-PAVE, PMSP

3. OS ATERROS SANITÁRIOS NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

Segundo a norma NBR 8149 da Associação Brasileira de Normas Técnicas ABNT (1987):

“Aterro sanitário de resíduos sólidos urbanos consiste na técnica de disposição de resíduos sólidos no solo, sem causar danos ou riscos à saúde pública e a segurança, minimizando os impactos ambien-tais, método este que utiliza princípios de engenharia para confinar os resíduos sólidos à menor área possível e reduzi-los ao menor volume permissível, combinando-os com uma camada de terra na

Page 20: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

19

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

conclusão de cada jornada de trabalho e em intervalos menores se necessários”.

O “inventário de resíduos sólidos do Estado de São Paulo de 2000” CETESB (2002) mostra que os aterros sanitários vêm melhorando suas características de disposição dos resíduos, tomando lugar dos lixões. Ainda assim, os possíveis impactos ambien-tais são bastantes críticos, tais como: liberação de gases e material particulado, ge-ração de ruído, produção de vetores de doenças, degradação do solo e da paisagem do local, degradação da fauna e flora e ainda a possível contaminação do solo e das águas superficiais e subterrâneas pelo chorume percolado. O primeiro aterro sanitário regular da cidade, o de Lauzane Paulista - situado na vila Santa, surgiu somente em 1974, (KAHTOUNI,2004). Os primeiros aterros não apresentavam a estrutura sani-tária dos aterros atuais. A partir da década de setenta, com a explosão populacional na Região Metropolitana de São Paulo foi necessária a estruturação da disposição e destino final dos resíduos urbanos.

A tabela 3 relaciona os principais aterros sanitários existentes na cidade, todos desati-vados (aqui estão relacionados aqueles que foram localizados junto à Limpurb, órgão responsável pelos aterros do município).

ATERROLauzane

Paulista

Jardim

Damasceno

Eng. Goulart

Raposo Tavares

Santo Amaro

Vila São

Francisco

Vila.Albertina

Carandirú

Pedreira Itapuí

Sapopemba

Vila Jacuí

São Mateus

LOCALIZAÇÃOAv. Dr. Francisco Raniere x Av. Adolfo Coelho – zona

norte

R. Feliciano Malabia alt. N. 500 – zona norte

Pq. Ecológico do Estado – zona norte

Rod. Raposo Tavares, km 14,5

Av. Nações Unidas x Av. Interlagos – zona sul

Av. Imperador x Av. Água Haia – zona leste

R. José Aguirre de Camargo – zona norte

Av. Zachi Narchi – zona norte

Av. Líder x R. Agostinho de Faria – zona leste

Av. Sapopemba – zona leste

Av. Mimo do Vênus – zona leste

Marg. Esquerda do córrego Fazenda Velho – zona

leste

FUNCIONAMENTO02/1974 – 11/1974

02/1975 – 12/1975

04/1975 – 01/1976

07/1975 – 08/1979

04/1976 – 02/1995

06/1976 – 07/1976

03/1977 - 1993

01/1977 – 03/1977

12/1978 – 11/1979

11/1979 – 02/1984

03/1981 – 08/1988

02/1984 – 01/1986

Page 21: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

20

Revista LABVERDE

Tabela 3: aterros sanitários na cidade de São Paulo. Fonte : Limpurb/PMSP – 2006.

O mapa 3 apresenta a localização esquemática dos mesmos:

ATERROBandeirantes

Sítio São João

LOCALIZAÇÃORod. Bandeirantes, km 26,5 – zona noroeste

Estr. Sapopemba, km 33 – zona leste

FUNCIONAMENTO09/1979 – 11/2007

12/1992 – 11/2007

Mapa 3: Localização esquemática dos aterros desativados no Município de São Pau-lo. Fonte: Departamento de Planejamento – Secretaria Municipal de Áreas Verdes e Meio Ambiente.

Os aterros se localizam, em sua maioria na zona leste e nas bordas da cidade, uma vez que, quando da implantação dos mesmos, estas eram as áreas menos ocupadas do município. No entanto, quase todas as áreas ocupadas por aterros sanitários, se

Page 22: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

21

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

encontram hoje em regiões com densa urbanização e escassez de vegetação, vias pouco arborizadas e carência de praças e jardins públicos.

Além disso, alguns destes aterros vêm sendo ocupados de forma ilegal, sendo que alguns deles já apresentaram problemas pela urbanização irregular. A ocupação da área do aterro de Lauzane Paulista é uma das citadas pela secretaria do Meio Am-biente da cidade de São Paulo como das mais inadequadas.

Na zona norte, o aterro do Jardim Damasceno, após desativação foi transformado em área de esportes, mas foi invadido e hoje virou uma favela. Os moradores contam que:“Quando os ônibus ou caminhões descem a rua, minha casa balança. Deve ser por causa do lixo embaixo da terra” e também observam que não podem cavar dois me-tros de fossa por causa do “perigo com o gás do lixo”. Outros relatam que: “o piso da casa vive rachado, não tem jeito de consertar, mas isso é comum por aqui”. (Folha de São Paulo, 09/12/2001)

O aterro Carandirú também encontra-se tomado por ocupações irregulares e a favela instalada neste local já sofreu quatro incêndios, sem causa definida (Folha de São Paulo, 09/12/2001). Especula-se que os gases liberados pelo aterro possam ser res-ponsáveis pelos incêndios.

No entanto, essas áreas que não fazem parte da lista das áreas de “atenção perma-nente” da prefeitura, e não sofrem avaliação do potencial de risco, tais como: incên-dios, explosões, rachaduras e desabamentos por instabilidade do solo e reacomoda-ção da massa de lixo. Como a maior parte dessa ocupação é resultado de invasões, ou ocorreu há muito tempo, não passaram por nenhum tipo de análise ambiental.

De Leo (2006) afirma que mesmo tendo sido desativados há quase vinte anos, os aterros sanitários da cidade de São Paulo ainda continuam contaminando as áreas vizinhas e expondo a população a riscos, em função do chorume e do gás metano pro-duzido pela decomposição do lixo. Segundo o autor, os cinco aterros potencialmente poluidores dentro de São Paulo são o da Vila Albertina, na Zona Norte, o de Santo Amaro, Zona Sul, e os de Sapopemba, Vila Jacuí e São Mateus, na Zona Leste.

Cada aterro tem suas particularidades e riscos. No aterro da Vila Albertina, Santo Amaro e no de Sapopemba o pesquisador constatou maior incidência de leptospirose do que em outras regiões da cidade. Segundo o geógrafo, o aterro de Sapopemba é

Page 23: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

22

Revista LABVERDE

o que mais oferece riscos ambientais e sociais. Já o aterro em melhores condições seria o da Vila Jacuí.

Esta é mais uma razão para se dar destino adequado às áreas de disposição de resíduos quando de sua inativação. Bitar (1997) afirma que o planejamento do uso pós-fechamento do aterro em áreas urbanas já deve ser contemplado quando do pla-nejamento do aterro em si, exigindo soluções compatíveis com a destinação futura do local, com as características de uso e ocupação de solo e com a demanda social da cidade.

O mapa 4 apresenta uma sobreposição das áreas verdes e dos aterros anitário desa-tivados, ou seja, a sobreposição dos mapas 2 e 3.

Mapa 4: Localização dos aterros no município de São Paulo, com superposição dos Parques Municipais.

Page 24: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

23

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

4. A REINTEGRAÇÃO DO ATERRO SANITÁRIO NA PAISAGEM

O uso pós fechamento de um aterro é bastante restrito, e a edificação sobre estas áreas não é recomendada, em função da instabilidade do maciço e da formação de gases que produz riscos de explosão. Por outro lado, a demanda por áreas verdes dentro de centros urbanos direciona a recuperação das áreas através do processo de revegetação, destinando-as aos mais diversos usos, tais como preservação ambiental ou lazer. Estas áreas verdes podem servir para campos de jogos, jardins públicos, entre outros, além da possibilidade de implantação de uma usina de biogás.

Como exemplo de ocupação adequada, tem-se o Parque Raposo Tavares. Criado em 1981, com área de 195.000 m2 o Parque Raposo Tavares destaca-se como o primei-ro parque da América do Sul a ser construído sobre um aterro sanitário. Apresenta, por isso, características peculiares: seu solo é formado por camadas de lixo e terra compactados, sendo revestido por uma camada de argila para diminuir a emanação de gases, e por outra de terra que serve de substrato à vegetação. Localizado junto à rodovia Raposo Tavares, o Parque homenageia o bandeirante de mesmo nome.

A vegetação existente no local é totalmente introduzida e tem a vida dificultada pelo fato de crescer em cima de um aterro sanitário. No parque são encontradas áreas ajardinadas com arbustos, herbáceas ornamentais, gramíneas, bosques baixos e le-guminosas. A existência de aves é favorecida pela vegetação: joão-de-barro, chopim, rolinha, sabiá-do-campo, bico-de-lacre, bem-te-vi, pica-pau-do-campo, quero-quero, sanhaço e outras. Há ainda alguns répteis inofensivos, como cobras não venenosas e mamíferos, como gambás e preás. O parque funciona das 7 às 18 horas e possui es-tacionamento, acesso para cadeirantes, sanitários, pista de cooper, trilhas para cami-nhadas, aparelhos de ginástica, quadra de campo, quadra poliesportiva,play-ground e área de estar.

Outro caso de ocupação de um antigo lixão encontra-se em Salvador, Bahia; entre 1974 e 1997 o local recebeu todo o lixo produzido pela capital baiana e era um dos símbolos de degradação da cidade; foi transformado num parque socioambiental pio-neiro no País, inaugurado pela Prefeitura de Salvador em parceria com o governo do Canadá.

“Um antigo lixão de Salvador, que entre 1974 e 1997 recebeu todo o lixo produzido pela capital baiana e era um dos símbolos de de-

Page 25: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

24

Revista LABVERDE

gradação da cidade, foi transformado num parque socioambiental pioneiro no País, inaugurado pela Prefeitura de Salvador em parce-ria com o governo do Canadá .” (www.estadao.com.br e http://www.crea-rs.org.br/crea/jornal/04/novidades.asp)

A área foi urbanizada, com a construção de parques, áreas para a prática de esportes e outros equipamentos que esconderam, sob a terra, as toneladas de lixo acumuladas ao longo de duas décadas. O complexo é capaz de produzir energia elétrica a partir de biogás e manterá uma usina de triagem de detritos, uma unidade de compostagem para produção de adubos, outra de reciclagem de entulho para fabricação de tijolos e uma escola-oficina.

Outra proposta ambiental de ocupação nasceu conjuntamente com o Plano Integrado de Melhoria Ambiental na Área de Mananciais da Billings, com seis intervenções prio-ritárias, duas de responsabilidade da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e outras quatro da prefeitura de São Bernardo. O aterro sani-tário do Alvarenga funcionou no período de 1974 a 1986 e era utilizado pelos municí-pios de São Bernardo e Diadema. Para remediar o problema, serão adotadas ações como drenagem de gases e água de chuva, aterro de uma área de aproximadamente 25 hectares, tanque de contenção e tubulações para captação do “chorume” Também serão construídos Poços Subterrâneos para Monitoramento Ambiental, um Centro de Estudo e Experimentação Ambiental e um Centro de Gerenciamento de Qualidade de Água. O Centro de Estudo e Experimentação Ambiental terá como mais importantes funções: promover a educação ambiental, difundir a consciência ambiental, consoli-dar o intercâmbio de informações e dar apoio e cooperação as atividades feitas pela população do entorno. O Centro de Gerenciamento de Qualidade de Água terá como diretrizes principais a divulgação dos dados de monitoramento da água da represa e administração conjunta com os municípios que fazem parte da bacia. (http://www.estado.com.br/editorias/2007/03/28).

Observa-se que o plano de encerramento e respectivos projetos de recuperação am-biental e eventual uso seqüencial da área utilizada, deve ser específico para cada aterro, e considerar as particularidades do compartimento ambiental e as condições de sua implantação e operação.

A proposta de uso futuro da área deve considerar que os resíduos aterrados ainda permanecem em processo de decomposição após o encerramento das atividades por

Page 26: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

25

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

períodos relativamente longos, que podem ser superiores há 10 anos (FEAM, 1995). Assim, independente do encerramento das atividades de recuperação do aterro, os sistemas de drenagem superficial de águas pluviais e de tratamento dos gases e líquidos percolados devam ser mantidos por um período de cerca de 30 anos. Este período padrão (default) é adotado por ser considerado suficiente para o maciço de lixo alcançar as condições de relativa estabilidade (ALBERTE et al., 2005).

Para uso futuro dos aterros é indicada a implantação de áreas verdes, com equipa-mentos comunitários como praças esportivas, campos de futebol e áreas de convívio, nos casos de aterros próximos a áreas urbanizadas. Em todos os casos, a requalifica-ção do aterro deve integrar a área ao seu entorno, considerando-se, principalmente, as necessidades da comunidade local, suprindo os anseios e expectativas da popula-ção diretamente afetada.

5. A INTEGRAÇÃO DOS ATERROS DESATIVADOS ÀS ÁREAS VERDES DA CIDADE

A recuperação dos aterros já é uma realidade em nosso Município, mesmo que ainda de forma incipiente. No entanto, um tratamento de forma integrada, organizando-se um sistema de áreas verdes que concentre as funções de melhoria da qualidade do meio e a recuperação de áreas degradadas, é uma visão que se pretende alcançar com uma interligação entre as áreas de aterros sanitário desativados nas cidades.

Estudos realizados por Volpe-Filik et al (2007) demonstram que o aterro de Sapopem-ba, por exemplo, na zona leste, por se tratar de uma extensa área (38 ha) encravada em área totalmente ocupada por população, após sua recuperação, pode formar um corredor verde, interligando o Morro do Cruzeiro, Sapopemba, Mauá e Baixada San-tista.

As áreas dos aterros desativados no Município de São Paulo possuem caracterís-ticas próprias; conforme a Teoria dos Ecossistemas (DRAMNSTD, OLSOM e FOR-MAN,1996) trata-se de um meio ambiente bastante diferenciado e significativo, carac-terizando uma ocupação antrópica especifica, bastante comprometida, aqui definida como lixão desativado.

Page 27: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

26

Revista LABVERDE

Para a revitalização destas áreas fragmentadas, propõem-se, neste trabalho, duas ocupações diferenciadas:1. Recuperação da área interna, aqui denominada Área Núcleo (AN), de acordo com a Lei 13.564 de 20034, referente ao Passivo Ambiental. Esta área terá ocupação respeitando propostas especificas já utilizadas em outros aterros, conforme exemplos expostos, onde, em grande parte propõe-se equipamentos edificados;

2. Recuperação da franja deste território, aqui denominada área de Recomposição Ambiental (ARA), de forma a integrá-la às áreas verdes conectivas da cidade, na forma de corredores verdes, objetivando uma forma de recolonizarão ecológica. Na maior parte das vezes, parte desta franja é ocupada por favelas e outras habitações de baixa renda que necessitam ser desocupadas para garantir sua recomposição ambiental.

Para melhor classificação foram estabelecidas as seguintes siglas:

ARA 1 – Área de Recomposição Ambiental – (Classe 1): apresentando solo conta-minado, com obrigação de remediação.

ARA 2 – Áreas de Recomposição Ambiental – (Classe 2): apresentando poluição das águas superficiais, com obrigação de tratamento de efluentes; perda de espécies de fauna e flora, perda de patrimônio cultural, com obrigação de recomposição ou compensação.

4 Lei 13.564 de 24/4/2003 - Dispõe sobre a aprovação de parcelamento de solo, edificação ou instala-

ção de equipamentos em terrenos contaminados ou suspeitos de contaminação por materiais nocivos

ao meio ambiente e à saúde pública, e dá outras providências.

Page 28: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

27

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Figura 5: Proposta de ocupação diferenciada para a área de aterros sanitários desa-tivados

6. CONCLUSÕES

A carência de áreas verdes na cidade de São Paulo é evidenciada por diversas pes-quisas. Também é de conhecimento geral que áreas verdes, de lazer, com equipa-mentos esportivos e recreativos, em especial em regiões carentes, trazem uma me-lhora na qualidade de vida da população local.

O aproveitamento das áreas de aterros sanitários desativadas, conforme a proposta acima exposta pode aprimorar o “net” de transposição, melhorando significativamente a biodiversidade na cidade de São Paulo.

Embora a área efetiva para plantio restrinja-se à franja do território, esta tem como proposta dinâmica expandir-se através da mancha urbana apresentando um caráter Interativo, fazendo parte de um processo a ser aplicado em etapas consecutivas, en-fatizando os aspectos visuais, estéticos e ambientais e objetivando acomodar tanto

Page 29: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

28

Revista LABVERDE

os interesses humanos como os processos naturais; considera-se ainda que esse corredor será espaço permeável para a percolação da água e servirá também, como armazenador de certa quantidade de água.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBERTE, Elaine Pinto Varela; CARNEIRO, Alex Pires, KAN Lin. Recuperação de áreas degradadas por disposição de resíduos sólidos urbanos, Diálogos & Ciência, Revista Eletrônica da Faculdade de Tecnologia e Ciências de Feira de Santana. Ano III, n. 5, jun. 2005.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, ABNT, NBR 10703, Degrada-ção do solo. 1989.

BITAR, O.Y. Avaliação da recuperação de áreas degradadas por mineração na Região Metropolitana de São Paulo. Tese de Doutorado, USP, São Paulo, 1997.

DEPARTAMENTO de Limpeza Urbana – LIMPURB. São Paulo, 2004. Disponível em www.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/servicoseobras/limpurb acesso em 15/10/04.

FOLHA DE SÃO PAULO: Ex-aterros e lixões de São Paulo têm ocupação de risco, Caderno cotidiano - 09/12/2001

FUNDAÇÃO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE (FEAM). Como destinar os resíduos sólidos urbanos. Belo Horizonte: FEAM, 1995. 47 p.

FUNDAÇÃO SISTEMA ESTADUAL DE ANÁLISE DE DADOS – SEADE- http://www.seade.gov.br/est_vitais/jan03/principal.htmlI 2003.

IAURIP.Cahiers de l’Institut d’Aménagement et d’Urbanisme de la Région d’Ile-de-France, volume 53, dezembro de 1978, La Végétation, un remède aux pollutions et nuisances úrbaines,Paris, 1978.

KAHTOUNI, Saide. Cidade das águas, São Carlos: Rima, 2004.

Page 30: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

29

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

KLIASS Rosa Grena. Parques Urbanos de São Paulo e sua Evolução na Cidade. São Paulo : Pini, 1993.

KOHLER Maria Claudia Mibielli, ROMERO Marcelo de Andrade, PENHALBER Eliza-beth de Faria, CORTES Maria Teresa Miraglia, CABRAL Viviane Benini. Áreas verdes no município de São Paulo: análises, tendências e perspectivas in:XXVIIi Congresso Iinteramericano de Engenharia Sanitária e Ambiental, Porto Alegre, RS, 2000.MATA E ANDRADE, J. C. Vegetação em aterros sanitários de resíduos sólidosMEUNIER, Isabelle - Jornal do Commercio - Caderno Cidades - Página Ciência e Meio Ambiente - Coluna “De Olho na Ciência 11 de junho de 2000.

OLIVEIRA, C.N.: Recuperação ambiental de aterros sanitários na Região Metropoli-tana de Campinas: Revegetação e uso futuro. Dissertação de Mestrado, UNICAMP , São Paulo, 88p, 2005.

SILVA, F.A.N. Avaliação ambiental preliminar de antigas áreas de disposição de resí-duos sólidos urbanos do município de São Paulo. Dissertação de Mestrado do Institu-to de Geociências - USP, 2001. 104p.

VOLPE-Filik, Andréa; AGUIRRE JUNIOR, José Hamilton; LIMA, Ana Maria Liner Pe-reira; FERREIRA, Flávia Bighetti Jorge; SALIM, Mônica; FARIA,Otávio Augusto , AL-VAREZ, Ian André , Criação de parques urbanos em aterros sanitários desativados. Estudo do aterro Sapopemba, São Paulo, sp. Revista da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, Volume 2, Número 3, 2007.

Page 31: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

ARTIGO Nº2REDUTOS RURAIS: ESTRATÉGIA DE RESILIÊNCIA E INFRAESTRUTURA VERDE

URBANA. ESTUDO DE CASO EM VALINHOS, SP - BRASILRural Remains: Strategy of Resilience and Urban Green Infrastructure. Case

Study in Valinhos, SP – BrazilLéa Yamaguchi Dobbert, Larissa Leite Tosetti , Sabrina Mieko Viana

Page 32: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

31

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

REDUTOS RURAIS: ESTRATÉGIA DE RESILIÊNCIA E INFRAESTRUTURA VER-DE URBANA. ESTUDO DE CASO EM VALINHOS, SP – BRASIL

Léa Yamaguchi Dobbert

1

Larissa Leite Tosetti 2

Sabrina Mieko Viana3

1Arquiteta, mestre em Recursos Florestais pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da

Universidade de São Paulo, Piracicaba – SP. E-mail: [email protected]

2Engenheira Agrônoma, mestranda em Recursos Florestais pela Escola Superior de Agricultura “Luiz

de Queiroz” da Universidade de São Paulo, Piracicaba – SP. E-mail: [email protected] 3Bióloga, doutoranda em Recursos Florestais pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da

Universidade de São Paulo, Piracicaba – SP. E-mail: [email protected]

Resumo

O presente estudo ressalta a importância da preservação e/ou requalificação dos re-dutos rurais na cidade de Valinhos (SP), como referências culturais que devem ser mantidas no processo de urbanização do município. Da coleta de dados à apresen-tação das informações, um quadro da atual situação dos redutos rurais é traçado no mapa da cidade a fim de contribuir para a educação e a informação da população como também do poder público sobre os valores histórico, cultural e social de tais redutos rurais inseridos na malha urbana de Valinhos. Ao enfatizarem-se os valores culturais desses redutos rurais, visa-se integrar a arquitetura residencial e o desenvolvimento econômico à preservação do patrimônio cultural singular da região. Apresentam-se, como propostas, possíveis intervenções de infraestrutra verde, orientando a dinâmica de crescimento do local seguindo um desenho ambiental sustentável, com base numa análise dos redutos rurais, avaliados como ordenadores do espaço e do território lo-cal, encontrados na malha urbana da cidade de Valinhos no Estado de São Paulo.

Palavras-chaves: patrimônio cultural, redutos rurais, desenvolvimento urbano, desenho ambiental, resiliência, infraestrutura verde.

Page 33: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

32

Revista LABVERDE

RURAL REMAINS: STRATEGY OF RESILIENCE AND URBAN GREEN INFRAS-TRUCTURE. CASE STUDY IN VALINHOS, SP - BRAZIL

Abstract

The present study highlights the value of preserving and / or upgrading rural remains in Valinhos–SP-Brazil, cultural landmarks that should be preserved in the process of urbanization of the city. From the data collection to the presentation of information, a picture of the current situation of rural remains is designed on the city map to help to educate and inform the public about the historical values. Cultural and social effects of these remains inserted in the urban and rural areas of Valinhos emphasize the values of cultural and rural remains that aims at integrating the residential architecture and economic development to preserve the natural heritage of the region. Proposals are presented like possible interventions on the green infra structure, guiding the dynamic local growth. Following a sustainable environmental design, based on an analysis of rural remains and evaluated as space and the local area orientation, found in the urban landscape of Valinhos city of São Paulo State. Key words: cultural heritage, rural remains, urban development, environmental de-sign, resilience, green infrastructure.

INTRODUÇÃO O processo da urbanização pode ser abordado sob vários ângulos: do urbanismo, no que diz respeito ao planejamento e paisagismo desse espaço; da percepção, no que concerne aos sentimentos, valores e atitudes dos habitantes em relação ao espaço vivenciado, ou, ainda, do estudo das conexões entre as formas espaciais e a estrutura social. No caso brasileiro, a urbanização aconteceu atrelada à herança rural, como esclarece Ribeiro (1995), processo que se manifesta nas simples habitações constru-ídas em meados do século XX, que vão configurando a forma urbana.

A crença de que o espaço “mais urbanizado é melhor” é frequentemente utilizada como uma evocação ao nível de desenvolvimento econômico de uma região, entre-tanto, esse pensamento é quase sempre dissociado do nível cultural e social de seu povo e até mesmo em termos de sustentabilidade. Considerando que o desenvolvi-

Page 34: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

33

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

mento das cidades brasileiras adotou modelos orientados para maior produtividade econômica e lucratividade, constituídas sobre interesses privados em detrimento dos coletivos, o planejamento do meio físico foi praticamente inviabilizado acarretando em cidades, incapazes de oferecer uma boa qualidade de vida aos seus habitantes (LOMBARDO, 2003).

A preservação do espaço rural, tanto física como culturalmente, tem se mostrado salu-tar em razão dos inúmeros benefícios que tal preservação proporciona, como: presen-ça de áreas verdes, áreas permeáveis que evitam fenômenos semelhantes às “ilhas de calor”, manutenção da biodiversidade, melhora na qualidade do ar, conforto térmi-co, entre outros. Do mesmo modo, a implantação ou enriquecimento da infraestrutura verde, que deve estar associada a esses espaços existentes, podem aperfeiçoar o desenvolvimento da cidade, visando o crescimento dos espaços naturais em redes capazes de desempenhar serviços ambientais e maximizar a qualidade ambiental. A infraestutura verde é definida por Franco:

“Podemos considerar infraestrutura verde como sendo áreas urba-nas permeáveis ou semi-permeáveis, plantadas ou não que “pres-tam serviços” à cidade e apresentam algum grau de manejo e geren-ciamento púbico ou privado. Das áreas pertencentes à infraestrutura verde de uma cidade destacamos os seguintes serviços prestados: 1- Melhora da qualidade do ar promovendo a saúde humana; 2- Se-qüestro de carbono da atmosfera; 3- Amortização do balanço climá-tico entre temperaturas baixas e altas no microclima urbano entre dia-noite e as estações do ano; 4- Proteção, conservação e recupe-ração da biodiversidade da flora e fauna na área urbana; 5- Conten-ção da erosão; 6- Promoção de atividades contemplativas, esporti-vas e de lazer; 7- Promoção da importância da paisagem como fator determinante da estética urbana; 8- Incremento do fator permeabili-dade do solo urbano permitindo a percolação da água e portanto a redução de enchentes; 9- Articulação e conectividade entre espaços verdes; 10- Promoção da seguridade urbana; 11- Proteção de áreas de fragilidade ecológica; 12- Promoção de áreas de alto valor ima-gético, icônico e de identidade de lugares e sítios urbanos.” (FRANCO, 2010, p. 143)

A cidade de Valinhos, assim como boa parte das cidades brasileiras, sofre pressões

Page 35: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

34

Revista LABVERDE

diversas do mercado imobiliário que vem se estendendo em direção às áreas rurais. A urbanização corporativa guiada pelo interesse de grandes empresas e pela espe-culação imobiliária deixa de lado, na maioria das vezes, os compromissos e gastos sociais, culturais, ambientais, voltando-se somente para o maior ganho possível de lucros. (SANTOS, 2008) Dentro desse contexto, Argollo (2004) alerta que a urba-nização do campo não deveria significar transformá-lo em cidade, e sim resgatar e valorizar a memória e a cultura de um povo, baseado nas condições rurais, sem dar a esse processo de transformação uma conotação folclórica ou jocosa, reconhecendo o potencial dos novos empreendimentos que, segundo o estudioso, além de prover sustentabilidade sócio-econômica, contribuem não só para a preservação ambiental, mas também para os valores culturais de um país ou região.

Observa-se muitas vezes, porém, que esse objetivo ao se urbanizar o campo não é atingido, pois o que ocorre, na realidade, é o fato de empresários do ramo imobiliá-rio apresentarem maiores vantagens aos proprietários para que estes se desfaçam de suas propriedades, onde serão construídos grandes edifícios, condomínios hori-zontais, dentre outros tipos de empreendimentos. A urbanização causa, então, for-tes impactos, muitas vezes irreversíveis, à região além de impossibilitar a prática de atividades consideradas tipicamente rurais. Infelizmente, atraídos por tais propostas, o homem com raízes no campo acaba por ceder à pressão do mercado, perdendo a identidade, a liberdade e a referência de sua origem.

“Para Kayser (1990:13), o rural é um modo particular de utilização do espaço e de vida social. Seu estudo supõe, portanto, a compre-ensão dos contornos, das especificidades e das representações do espaço rural, entendido, ao mesmo tempo, como espaço físico (re-ferência à ocupação do território e aos seus símbolos), lugar onde se vive (particularidades do modo de vida e referência de identida-de) e lugar de onde se vê e se vive o mundo (a cidadania do homem rural e sua inserção nas esferas mais amplas da sociedade” (WANDERLEY, 2000, p.88)

Atividades consideradas tipicamente rurais, praticadas e desenvolvidas nas cidades, encontram-se, muitas vezes, encobertas por incrementos urbanos, sendo, ainda as-sim, consideradas redutos rurais. Os costumes das pessoas, geralmente de origem rural, manifestam-se na cidade em pequenos espaços por meio de diversas ativida-des exercidas, como pequenas criações, plantio de hortas, ou mesmo a prática de

Page 36: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

35

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

costumes tipicamente rurais, que integram o que se pode denominar de um modo de vida, expresso, portanto, em sua habitação como herança rural.

“O caipira foi vítima de um traumatismo cultural marginalizado pelo despojo de suas terras, resistente ao engajamento no “colonato” e ao abandono compulsório de seu modo tradicional de vida.”. (RIBEIRO, 1995, p.387)

Manterem-se vivos os costumes e as crenças do homem do campo, o “caipira”, é o mesmo que não se deixar apagar a memória de um povo, cuja identidade não pode ser desprezada, assumindo-se, pois, a importância de sua herança cultural, bem como de suas referências.

Nesse sentido, Argollo (2004) reconhece que o patrimônio arquitetônico, juntamente com o patrimônio industrial existente no meio rural, compõe um conjunto ainda mais rico: o patrimônio cultural rural. Patrimônio que, inserido na malha urbana, vem definir a cultura e a paisagem da cidade:

“O papel da arquitetura rural no processo de resgate e valorização da memória e cultura local é fundamental para o desenvolvimento rural sustentável, uma vez que eles (memória e cultura locais) são a base para o reconhecimento e análise das paisagens culturais de uma determinada região” (ARGOLLO, 2004, p.8).

A palavra reduto, segundo Houaiss (2004), são espaços fechados ou recintos demar-cados; sendo assim, redutos rurais urbanos podem ser definidos como espaços rurais fechados remanescentes inseridos na malha urbana.

Trabalhos de pesquisa que reconheçam a relevância de tais redutos são decisivos para propor a devida valoração e estímulo de preservação do rural. Por meio de in-centivos fiscais, resgate da cultura local e apoio cultural, o Estado pode viabilizar o convívio harmônico entre urbanização e espaço rural. Muitas vezes a contenção do crescimento de uma cidade pode trazer vários benefícios à população que habita a região.

Page 37: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

36

Revista LABVERDE

Numa outra perspectiva, Herzog e Rosa (2010), retomando outros autores, defendem o desenvolvimento da ecologia da paisagem na ecologia urbana, como decisiva para a compreensão da interação homem-natureza, ao proporcionar uma mudança positi-va no planejamento e adaptação das cidades. O mapeamento dos redutos rurais, ou remanescentes naturais, na área urbana podem ser de grande valia como auxiliares no diagnóstico e no planejamento urbano, visando a um desenho ambiental, definido por Franco (2008 p.212), “como a arte e a ciência dedicada à valorização da qualidade de vida das cidades...”.

Esse mapeamento pode ser realizado com o uso de várias ferramentas, como os sistemas de informação geográfica (SIG), de imagens ou fotografias aéreas obtidas através de sensores remotos, dentre outros. Entretanto quando se trata de áreas ou municípios de pequeno porte (segundo IBGE, com 500 a 100.0000 habitantes), o levantamento dos dados pode ser feito em campo, com a vantagem de se possibili-tarem levantamentos específicos quanto às estruturas arquitetônicas e às condições naturais (áreas verdes, parques, árvores, APPs urbanas).

Assim, conhecer os redutos rurais presentes em Valinhos (SP), estimular sua preser-vação e valorização, e utilizar esses espaços como resgate cultural e social, como oportunidade de presença do natural no urbano, como espaços educadores que apro-ximam os cidadãos de um conhecimento histórico e patrimonial, é uma alternativa de inclusão das pessoas em um pensamento holístico no desenvolvimento das cidades, visando sempre o crescimento que integra as diversas áreas do saber.

OBJETIVO O presente estudo teve como objetivo apresentar um quadro dos redutos rurais, in-seridos na malha urbana da cidade de Valinhos no Estado de São Paulo. O enfoque principal foi dado aos espaços públicos, às antigas sedes de fazendas e capelas, com o intuito de captar o modus vivendis rural, valorizando-se, assim, costumes e crenças a serem preservados, e realçando características da cultura rural local, sua história e seus valores. Compreende-se que a valorização desses redutos pode ser de grande valia no desenho ambiental urbano, auxiliando no desenvolvimento sustentável da ci-dade e, até mesmo, como forma de se levarem seus habitantes e gestores a refletirem sobre formas alternativas de crescimento do espaço rural no cotidiano das cidades.

Page 38: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

37

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

MATERIAIS E MÉTODOS Valinhos localiza-se a 22º 58’14’’ de latitude sul e 46º59’45’’ de longitude oeste, com altitude de 660 metros. Município criado em 1953, pertence à região Metropolitana de Campinas (RMC) e possui uma área de 148,96 km² (figura 1). Conhecida com popu-lação tipicamente de origem rural, hoje é ainda conhecida como capital do figo roxo.

Figura 1. Localização de Valinhos a partir dos mapas do Brasil, do Estado de São Paulo e da região metropolitana de Campinas (ilustração: Sabrina Mieko Viana).

Page 39: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

38

Revista LABVERDE

Durante o mês de janeiro de 2007, realizou-se um mapeamento dos redutos rurais na malha urbana de Valinhos, por meio de levantamento de dados em campo, consulta a livros de registro, coleta (informal) de relatos de moradores locais, além de registro fotográfico.

Para se encontrarem as raízes de tal herança é importante que se conheça a história da cidade e de seus habitantes com o intuito de se compreender a origem desses cos-tumes e da tradição rural. Para tanto, fez-se um levantamento bibliográfico referente à história da cidade de Valinhos, além da conversa informal com moradores locais.

Um estudo bibliográfico realizado anterior aos levantamentos de campo pôde auxiliar na compreensão do termo redutos rurais, definindo quais elementos da infraestrutura urbana entrariam nesse mapeamento. RESULTADOS E DISCUSSÃO A análise dos dados obtidos em pesquisa de campo indicia que os redutos encon-trados dentro da malha urbana de Valinhos não estão adequados à cultura rural da região, levando-se em conta uma visão ecossistêmica, em que a diversidade tanto do ponto de vista biológico, ecológico, social e cultural é essencial na construção de cidades mais saudáveis e equilibradas (FRANCO, 2008).

Há necessidade, portanto, de se proporem novos modelos de gestão urbana, adequa-dos à cultura local, que ressaltem a importância da preservação e ou requalificação dos redutos rurais arquitetônicos e culturais com a finalidade de que as referências culturais prevaleçam, inclusive com a inserção destas nos planos de gestão do muni-cípio de Valinhos.

O levantamento dos redutos rurais pode ser observado na figura 2.

Page 40: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

39

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Figura 2: mapa de Valinhos e seus redutos rurais inseridos na malha urbana (ilustração: Sabrina Mieko Viana, baseado em mapeamento de Léa Y. Dobbert)

Na cidade de Valinhos, constatou-se que antigos espaços rurais foram transfor-

mados em escolas de equitação, pesqueiros, pousadas, clubes, residências de lazer e, especialmente, condomínios horizontais (figura 3).

Page 41: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

40

Revista LABVERDE

Figura 3: a) Antiga fazenda Dois córregos, atual Condomínio residencial Reserva Colonial (Foto: Léa Yamaguchi Dobbert, 2007) b) Antiga fazenda São Bento, atual clube de campo Vale Verde (Foto: Léa Yamaguchi Dobbert, 2007) c) Antiga fazenda Santana, atual condomínio residencial Visconde Village do Itamara-cá (Foto: Léa Yamaguchi Dobbert, 2007) d) Antiga fazenda Macuco, atual Pousada Fazenda Joapiranga (Foto: Léa Yamaguchi Dobbert, 2007)

Há também antigas construções rurais como, por exemplo, algumas casas de colonos que se encontram atualmente sem utilização, expostas ao vandalismo devido ao des-caso das autoridades locais (figura 4).

Figura 4: a) e b) Antigas casas existentes ao lado da Estação Ferroviária

a b

c d

a b

Page 42: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

41

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Outro aspecto importante a ser considerado ao se diagnosticarem e conhecerem os redutos rurais em Valinhos é o que se pode chamar de resiliência cultural e urbana, definida por Franco (2010) como “a capacidade que um determinado grupo social tem em resistir a mudanças provocadas pelo choque com culturas diferentes, preservando seu patrimônio cultural”.

A pressão do mercado imobiliário, conforme relato de alguns moradores de pequenas casas de colonos de antigas fazendas, fez com que muitos destes moradores se re-dessem as propostas sedutoras de tais empreendedores, abrindo mão não apenas de seus imóveis, mas de sua tradição, memória e história.

Neste sentido, Menezes e Tavares (2003), destacam a importância de se respeitar a história urbana e social com seus significados, sentidos e valores simbólicos, por meio da conservação da imagem urbana. Ao preservar os redutos rurais de Valinhos, não se impede o desenvolvimento da cidade com as mudanças esperadas, mas, an-tes, garante-se que certos códigos simbólicos sejam mantidos naquela comunidade, valorizando-se, assim, a cultura local em meio às influências culturais exóticas e às pressões imobiliárias.

A capacidade de resiliência em um município é bem empregada quando utilizada para amenizar impactos antropogênicos, como esclarece Franco (2010). Assim, a proposta de parques lineares com funções de corredores verdes, que conectam os redutos ru-rais ao espaço urbano, permite um desenvolvimento mais harmônico do município ao assegurar a seus moradores e visitantes possibilidades variadas de lazer, locomoção e contato com a história e a cultura da cidade. Respeita-se, assim, a sobrevivência da cultura rural de Valinhos.

Em conjunto com esta proposta, sugere-se também que a população seja educada para reconhecer o valor histórico, cultural, social e ecológico, de tais redutos rurais inseridos na malha urbana de Valinhos. Neste contexto pode-se pensar nestes lugares também sob o conceito dos “espaços e estruturas educadoras”, ou seja, como locais onde se possa trabalhar e discutir, com a população, alternativas para a sustentabili-dade, por meio do estímulo à realização de atividades conjuntas, além do reconheci-mento da necessidade de se educar (BRANDÃO, 2005).

Qualquer espaço no cotidiano das cidades pode ter características educadoras, entre-tanto para que isso se concretize, de fato, é necessário que haja uma intencionalidade

Page 43: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

42

Revista LABVERDE

educativa, levando as pessoas à reflexões sobre as causas e efeitos dos problemas urbanos, além de redescobrirem e resgatarem os simbolismos, a cultura, a história e as identidades associados à sua cidade (MATAREZI, 2005). Um espaço educador quando bem estruturado e pensado em suas intenções educadoras pode ter um po-tencial tão provocador e transformador quanto o de, por exemplo, uma obra de arte (MATAREZI, 2005). Considera-se também que a partir do momento que as pessoas reconhecem este patrimônio, o descobrem e se apropriam destes espaços, aumenta seu sentimento de pertencimento ao local, potencializando os esforços de conserva-ção e preservação destes espaços, estabelecendo assim um elo afetivo com o lugar (TUAN 1980).

Incluídas nas possibilidades que o espaço educador oferece, podemos vislumbrar a viabilidade de implementar estruturas que auxiliem no resgate do pertencimento dos moradores urbanos aos equipamentos públicos, como as propostas de ciclovias, par-ques lineares, espaços arborizados para esporte e lazer e outras diversas formas de aproveitamento, formalizando infra-estruturas verdes que também atuam na melhoria ambiental do município.

Fundindo as oportunidades de aproveitamento dos espaços urbanos e fundamentan-do otimização dos investimentos no orçamento público, pretende-se realizar uma pro-posta de catalogação e documentação dos redutos rurais em Valinhos, que servirá de instrumento de consulta para se criar um organismo em defesa do patrimônio histórico e cultural do município, que auxilie no planejamento e investimento dessa infraestru-tura verde necessária ao desenvolvimento da urbe.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Para que o planejamento e o projeto da infraestrutura verde em Valinhos sejam de fato eficientes e eficazes, é preciso ter uma abordagem sistêmica, abrangente e transdis-ciplinar. Sua eficácia depende de um levantamento detalhado dos aspectos abióticos, bióticos e culturais. Um mapeamento dos condicionantes geológicos, geomorfológi-cos, hídricos - de preferência com o uso da bacia hidrográfica como unidade de ma-croplanejamento -, climáticos, da cobertura vegetal, dos sistemas de drenagem e es-gotamento sanitário e uso e ocupação do solo nessa região seria o passo inicial a fim de que se conheça a biodiversidade local. Levantar dados e mapas históricos sobre o uso e a ocupação do solo, hábitos da cultura local, é um segundo passo a ser dado.

Page 44: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

43

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Conhecer, enfim, em profundidade o município. O processo do planejamento deve ser dinâmico e flexível, além de efetivamente participativo contando com representantes de todos os segmentos da sociedade que serão afetados pelo projeto. É necessário identificar os anseios e os problemas trazidos pela comunidade quando se buscam novas idéias que devem nascer como fruto da vivência e da experiência no lugar pesquisado. O engajamento dos usuários nas fases do planejamento e do desenvol-vimento do projeto é essencial para que a infraestrutura verde seja sustentável em longo prazo (RIBEIRO, 2001; BOUCINHAS, 2007; COSTA et al., 2007). O diagnóstico inicial irá indicar quais as oportunidades e as limitações da área.

Urge, portanto, a necessidade de um estudo quali-quantitativo mais aprofundado e com maiores especificidades, que possibilite confeccionar um banco de dados con-tendo todos os redutos rurais e suas características para que se possa propor um método de catalogação e controle de preservação do patrimônio cultural rural da ci-dade de Valinhos (SP). Ao se propor também a conectividade entre esses redutos e a urbanização por meio de parques lineares ou corredores verdes, uma rota turística se fortalece com função ambiental, proporcionando um desenvolvimento urbano do município associado à implantação de infraestruturas verdes e a uma logística que facilite essas estruturas como espaços educadores.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARGOLLO FERRÃO, A. M. Arquitetura rural dentro do contexto dos estudos sobre patrimônio e paisagens culturais. Campinas: Barcelona [ESP]:ETSAB-UPC, 2004, p.p. 8-29. BRANDÃO, C.R. Aqui é onde eu moro, aqui nós vivemos: escritos para conhecer, pen-sar e praticar o município educador sustentável. 2ªed. Brasília: MMA, Programa Nacional de Educação Ambiental 2005. 181p. CARNEIRO, M.J. Ruralidade: novas identidades em construção. Rio de Janeiro: CPDA /UFRRJ, 1998, p. 4. FRANCO, M.R.A. Desenho Ambiental: uma introdução à Arquitetura da Paisagem com o Paradigma Ecológico. 2ª edição. São Paulo: Editora Annablume, 2008. 224p.

Page 45: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

44

Revista LABVERDE

FRANCO, M.R.A. 2010. Infraestrutura Verde em São Paulo: o caso do Corredor Verde Ibirapuera-Villa Lobos. Revista LABVERDE. n. 1, out. 2010, 134-154 p. HERZOG, C.P., ROSA, L.Z. Infraestrutura verde: Sustentabilidade e resiliência para a paisagem urbana. Revista LABVERDE. n. 1, out. 2010, 91-115p. HOUAISS, A.; VILLAR, M.S.; FRANCO, F.M.M., Minidicionário Houaiss da língua por-tuguesa, 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Moderna, 2004. 907p. LOMBARDO, M.A. Qualidade ambiental e planejamento urbano In: RIBEIRO, W.C. (org.) Patrimônio ambiental brasileiro. São Paulo: EDUSP/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. 2003. 621p. MATAREZI, J. Estruturas e espaços educadores: quando espaços e estruturas se tor-nam educadores In: FERRARO JÚNIOR, L.A. Encontros e Caminhos: formação de educadoras(es) ambientais e coletivos educadores. Brasília: MMA/Diretoria de Educação Ambiental. 2008. 358p. MENEZES,M. e TAVARES, L.T., A imagem da cidade como patrimônio vivo, 3º ENCORE, LNEC, Lisboa, 2003, 10p. RIBEIRO, D. O povo brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Schwarcz, 1995, p.p. 198-397. SANTOS, M. A Urbanização Brasileira. São Paulo: EDUSP. 2008. 174 p. TUAN, Y. F. Topofilia, um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. São Paulo: DIFEL, 1980. 288p.

WANDERLEY, Maria de Nazareth. A emergência de uma nova ruralidade nas socie-dades modernas avançadas - o “rural” como espaço singular e ator coletivo. Estu-dos Sociedade e Agricultura. out. 2000. p.p.53-86.

Page 46: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

ARTIGO Nº3SISTEMA DE INFORMAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DA QUALIDA-

DE AMBIENTALInformation System As An Instrument Of Environmental Quality Management

Patricia Helen Lima

Page 47: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

46

Revista LABVERDE

SISTEMA DE INFORMAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DA QUALIDADE AMBIENTAL

Patricia Helen Lima

Mestre em Projeto Sustentável pela FAUUSP

Coordenadora da Seção de Informação e Qualidade Ambiental da Prefeitura de SBC

E-mail: [email protected]

Resumo

Este trabalho discute mecanismos de formulação e gestão de políticas públicas, so-bretudo no nível local, abrangendo seus conteúdos temáticos (política social, ambien-tal e econômica), procurando entender sua evolução e seus resultados em termos da participação popular, dos interesses ambientais, econômicos e globais, apresentando alternativas que possam atender as necessidades contemporâneas em crescente mu-dança, numa sociedade em transição cultural.

Para interferir diretamente nesse processo, procuramos apresentar as dificuldades e limites da atual prática, e apresentar caminhos para se construir propostas articuladas de políticas de desenvolvimento integrado, sistematizado e sustentável.

Palavras-chaves: Qualidade Ambiental, Sistema de Informação, Políticas Públicas, Meio Ambiente, Planejamento Ambiental.

Page 48: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

47

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

INFORMATION SYSTEM AS AN INSTRUMENT OF ENVIRONMENTAL QUALITY MANAGEMENT

Abstract

This work discusses the mechanisms of creation and management of public policies, above all on a local level, covering its thematic contents (social, environmental and economic policies), trying to understand its evolution and its results in terms of popular participation, of environmental, economic and global interests, presenting alternatives that may attend to the contemporary necessities in growing changes, in a society in cultural transiton.

To interfere directly in this process, we tried to present the dificulties and limits of the cur-rent practice and present paths to build articulated proposals of integrated, systemic and sustainable development policies,

Keywords: Environmental quality, information system, public policies, Environment, Environmental planning.

POLÍTICAS PÚBLICAS

Políticas públicas são diretrizes de ação do poder público, procedimentos que nor-teiam suas relações com a sociedade. São, nesse caso, políticas formuladas em leis, projetos e programas, que normalmente envolvem recursos públicos. A esfera das políticas públicas também possui uma dimensão política, que envolve a distribuição de poder, o papel do conflito social nos processos de decisão, a repartição dos custos e benefícios sociais, evidenciando que nem sempre há compatibilidade entre as inter-venções e as ações desenvolvidas.

A responsabilidade e encargos atribuídos ao Município são definidos na Constituição Federal e detalhados na Lei Orgânica. O município tem ampla autonomia para definir suas políticas e aplicar seus recursos. Nas áreas tradicionalmente objeto de políticas públicas, como assistência social, meio ambiente, habitação, saneamento, abaste-cimento, educação, saúde, o município tem competência comum com a União e o

Page 49: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

48

Revista LABVERDE

Estado, a ser exercida com a cooperação dessas esferas de poder, pela transferência de recursos, ou pela cooperação técnica.

Por ser Política pública, seu processo de elaboração é submetido ao debate público, o que a diferencia das Políticas governamentais, embora sejam estatais. Como o poder é uma relação social que envolve vários atores com interesses diferenciados e até contraditórios, há a necessidade de mediações sociais e institucionais, para que se possa obter um mínimo de consenso e, assim, as políticas públicas possam ser legiti-madas e obter eficácia (TEIXEIRA, 2002).

As políticas urbanas iniciadas no Estatuto das Cidades e nos Fóruns Ambientais Globais abriram caminhos para mudanças significativas na função social, seguido de parâmetros para nortear a atividade produtiva dentro de um ambiente sustentável, englobando diferentes lógicas, que buscam um entendimento e que estabelecem re-lações que remontam às questões da sustentabilidade. Analisar tais questões no es-paço urbano e seus impactos sobre os ecossistemas acarreta na revisão do processo das políticas públicas, que irá compor o projeto urbanístico no cumprimento de seu objetivo final (LIMA, 2009).

A condição na qual a ideologia sobre as questões ambientais e sociais se produz em nossa época -e que abrem possibilidades novas- encontra barreiras no mundo da economia global, onde as idéias se “desligam” da sua correspondência de origem, determinando a formação social e decorre daí um entendimento apenas parcial da realidade, nem sempre atrelado às culturas locais.

A globalização, um fenômeno que está predominado em todo mundo se manifesta de forma excludente e gera vários tipos de violência, causando danos econômicos-sociais e ambientais. Vale salientar que a pressão da globalização com força merca-dológica cria a necessidade do governo buscar alternativas novas do contato direto com o cidadão superando o ortodoxo de fazer política. De igual maneira, a cidadania conscientemente organizada necessita criar mecanismo de contato e controle de polí-ticas estatais, democratizando-as. Isso demanda novos experimentos de participação política direta de maior número possível de cidadãos. Assim, um dos maiores desafio da globalização é a discussão profunda e ampla a cerca de uma política da condição social humana global (CRUZ, 2009).

Page 50: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

49

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Partindo da observação deste contexto de relações globalizadas, da hegemonia do capital aliado às questões sociais urgentes, é possível um exercício de análise das transformações ocorridas, onde se percebe que os esforços para a verdadeira com-preensão dos novos conceitos têm sido depositados em ações para soluções con-juntas, para não corrermos o risco de sermos engolidos pela banalidade do contexto atual.

A criação de estruturas adequadas para a realização de um mecanismo comum, que tro-que as experiências de cada setor pela atuação que propicie poderes decisórios amplos, com múltiplas competências, com instrumentos que permitam ultrapassar obstáculos e que dêem segurança e compreensão necessárias é o caminho que entendemos possível para novas ações e que permitirão a transparência das informações para um meso nível de conhecimento.

MEIO AMBIENTE NO PROCESSO DE GLOBALIZAÇÃO

A expansão das forças globais sobre o espaço, a sociedade e as ações locais trouxe reflexões sobre a lógica que pauta este caminho. A intervenção do setor financeiro na lógica do espaço urbano e rural e na sua produção mostrou que as lógicas coexistem e se inter-relacionam, porém, quando incluída a lógica ambiental, nos deparamos com novos desafios.

Com o objetivo de explorar diferentes dimensões, escalas e relações, buscamos para exemplificar o conceito atual de área urbana e rural. O mundo rural secular opõe-se claramente ao mundo urbano, em suas funções, atividades, grupos sociais e paisa-gens. “Nos anos 80 assistiu-se uma nova realidade: o mundo rural não agrícola. Esta perspectiva introduziu elementos novos no modo de encarar os mundos rural e urba-no, em si e na forma como se relacionam” (RÊGO FILHO, 2007). As decisões sobre as questões agrícolas tomadas no urbano e a submissão da ideologia dos padrões rural ao urbano, marcou uma visão de dominação urbana.

A idéia do mundo rural não agrícola trouxe em si transformações sociais. A ausência de movimentos significativos que apóiem os desenvolvimentos locais, a valorização simbólica atribuída ao mundo rural e a força do mercado alteraram definitivamente as relações entre urbano e rural. Os aspectos hipervalorizados da conservação e proteção da natureza, a mercantiliza-

Page 51: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

50

Revista LABVERDE

ção das paisagens transformou o mundo rural, crescentemente reduzido, em espaços multifuncionais ou parques naturais sem expressão significativa. Com o crescente au-mento da população urbana e a diminuição na qualidade da vida destes, surge o papel cada vez mais contrastante entre a imagem do rural buscado pela população urbana como próximo da natureza e a fuga da vida urbana. O rural de hoje, entendido neste contexto, não traduz o rural do passado, ou seja, a relação da sociedade rural com o espaço e seu registro local, no conjunto social. O sistema de valores da população rural de antes é substituído pelo individualismo que transformou o homem e a terra em mercadoria.

Enfrentamos agora novas questões sobre limites do urbano e do rural, que se encon-traram fisicamente, com a extensão do tecido urbano. Nesta nova relação urbano-ru-ral, é importante frisar, que uma nova relação urbano-rural terá que ser desenvolvida com um novo olhar sobre os espaços, de forma sinérgica em suas relações.

Estas relações pressupõem garantir o funcionamento de processos ecológicos bási-cos, como medida de preservação de ecossistemas. Significa garantir oferta pública de mobilidade, cultura e aprendizado às populações. Significa garantir que políticas de ordenamento do território e preservação da natureza sejam complementares e re-sultem no desenvolvimento adequado às novas redes que se criam.

O custo ambiental se associará à sua diversidade natural e à complexidade da pro-blemática social, o que representará grande potencial para o seu desenvolvimento, envolvimento e troca. A proximidade de indústrias com fontes de energia e matéria prima não mudará a geografia econômica, mas alterará seu papel diante do mercado consumidor. A figura de rede substituirá a da Linha de produção (RÊGO FILHO, 2007).

Este é o estágio atual do processo de globalização, onde se tornam indispensáveis a interação e a consideração entre os níveis local, regional, nacional e global, o que sig-nifica sobrepor diferentes estruturas que comportam complexidades desiguais ante-riores, como uma ordem próxima (de vizinhança) e uma ordem distante (da sociedade como um todo), que regem a produção e o consumo, da escala global.

A revisão do tamanho populacional dos municípios, sua densidade demográfica e sua localização serão obrigatórias tanto em conceitos como em normas legais, para a verdadeira compreensão da nova situação. As microrregiões são essenciais para a caracterização dos ecossistemas, ainda que artificializada pela ação urbana e nesse

Page 52: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

51

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

sentido, o campo não poderá ser concebido apenas como complementar a cidade e paisagem a ser consumida, mas como estruturador de um novo espaço, que contribua na valorização e reconhecimento dos seus saberes e potenciais locais, sem a condi-ção de subordinação, envolvendo reais culturas.

Nasce a idéia de novas geografias que serão identificadas com sua espacialidade e suas marcas. Esta espacialidade terá que desenvolver e comportar a participação dos atores locais que desenvolverão e produzirão influências particulares. A escala de ação definirá as interações espaciais e a informação se construirá no conjunto dos atores e da gestão da proteção ambiental. Este processo será capaz de direcionar ações que busquem a qualidade da informação e das intervenções.

TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E CONHECIMENTO

É preciso recuperar temas que permitam a construção de um quadro de práticas ur-banas e rurais e que considerem os processos históricos e naturais, que não iludam, mas que influenciem ações mais abrangentes e cautelosas, uma produção do espaço que seja condição e meio para o processo da construção do território, considerando a espacialidade do processo social como intrínseca à análise territorial (LIMA, 2009).

A tecnologia avançada possibilita uma leitura conjunta de fatores que envolvem infor-mações de diferentes fontes e que analisadas no todo representam uma ferramenta de gestão em que diversos atores podem usufruir e produzir um novo espaço, sob novas condições de realização e que possuam a potência de transformar a prática sócio-espacial. O desafio é explorar o desenvolvimento tecnológico para um objetivo de tornar as cidades sustentáveis.

SANTOS, equipara o desenvolvimento da história com o desenvolvimento das técni-cas, dizendo que “A cada evolução técnica, uma nova etapa histórica se torna possí-vel”. (SANTOS, 2005). Em nossa época, o que é representativo do sistema de técni-cas é a tecnologia da informação, do conhecimento e dos modelos digitais, permitindo todos os lugares convergirem os momentos e as ações desejadas, usufruindo das questões locais e globais e dos atores locais e globais.

Dispomos de um sistema de técnicas, com informações que se agrupam ao mesmo tempo e em qualquer lugar. Podemos ter uma visão detalhada da terra, observada por

Page 53: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

52

Revista LABVERDE

satélites, redes de infra-estrutura e rede social que as suportam, enfim, passamos a conhecer todos os lugares, funções, relações e produções e observá-los em sua evo-lução. Como síntese constitui-se em uma visão integrada, altamente elucidativa do conjunto interligado dos fatores físicos, bióticos e socioeconômicos responsáveis pela realidade e suas relações (Fig.1).

Fig.1 - sistemas geográficos de informação.

Muitas representações digitais do ambiente são extremamente úteis para o conjunto destas informações. São exemplos os mapeamentos temáticos e os bancos de da-dos. Estas representações podem ser integradas em uma estrutura que permita a investigação de relações entre as entidades físicas representadas e os impactos que as ações representam. Este cruzamento das informações cria modelos conceituais que representam diferentes facetas da realidade.

O sentido que têm todas estas ferramentas são a correta interpretação de tudo o que existe e que temos acesso e as possíveis intervenções no processo, para que sejam revistas as ações. Estamos buscando construir uma filosofia das técnicas e das ações, que seja uma forma de conhecimento amplo e concreto do mundo tomado como um todo e das particularidades dos lugares, que incluem condições físicas, naturais ou artificiais e condições políticas. Conhecer todo o processo das intervenções no territó-rio, suas relações e abrangência é uma necessidade de princípio para qualquer ação. Por exemplo, diversas atividades só são possíveis pela existência de recursos que

Page 54: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

53

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

não são produzidos ou extraídos em seu local e podem ser sentido em sua vizinhança. Nas cidades, os recursos naturais que utilizamos no dia-a-dia, o lixo que geramos, o solo que impermeabilizamos, o ar que poluímos chegam ao meio rural e podem não ser percebido na cidade, mas causam impacto.

O estudo das bacias hidrográficas, por exemplo, como uma unidade ambiental de análise é um caminho para uma investigação do meio, pois é possível analisar altitu-des de terrenos ao longo da bacia, regular o fornecimento de água, preservar os solos férteis, ações humanas, a densidade demográfica e as razões econômicas, entender a drenagem, o fluxo dos cursos d’água, a distribuição das chuvas, o grau de imperme-abilização, interpolando com o clima, estudar a funcionalidade do fornecimento, enfim, todos os componentes das bacias hidrográficas encontram-se interligados e os rios são os veículos dessa integração.

Devido a essa interligação natural, as bacias hidrográficas são excelentes unidades de planejamento e gerenciamento e constitui um sistema natural bem delimitado do espaço, composto por um conjunto de terras integradas e portanto mais facilmente interpretáveis.

O gerenciamento por Bacia hidrográfica exigirá um conhecimento que ultrapasse li-mites administrativos, mas que entenda os fluxos, que permita um diagnóstico da realidade, e mais ainda, permita requalificar áreas entre tantas situações que impossi-bilitam as decisões autônomas. Todas estas questões remetem à tecnologia atual na busca da qualificação do meio.

É necessário envolver diferentes setores permitindo um nível de entendimento entre atores para tomada de decisão cada vez mais transparente. Um sistema como parâ-metro para induzir maiores mudanças, juntando-se a uma cidadania participativa para lidar com a especificidade dos problemas urbanos, criarão políticas públicas para re-solver questões de ambientes específicos.

À medida que aumenta a conscientização da interdependência e à medida que o conhecimento e a informação mostram os problemas de forma cada vez mais clara e rápida, pode haver cooperação e apoio em diferentes estágios na busca de um novo equilíbrio entre sociedade, cidade e natureza. Esta é a força motriz que constrói uma sociedade sustentável.

Page 55: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

54

Revista LABVERDE

QUALIDADE AMBIENTAL

Em relação às questões que permeiam as informações relativas à qualidade ambien-tal, vale apresentar sucintamente a importância das informações sistematizadas no desenvolvimento de um planejamento ambiental, que representa um salto de qualida-de na observação e interpretação do meio.

É comum surgirem questões sobre a lógica utilizada na seleção dos dados que são utilizados na análise do meio e que critérios definem este conjunto de dados para que sejam sistematizados e interpretados.

Todo planejamento que visa definir políticas requer conhecimento sobre os compo-nentes que formam o espaço. O dado é a base da informação, a medida, a quanti-dade ou o fato observado e pode ser apresentado na forma de números, descrições, caracteres ou mesmo símbolos. Este dado quando passa a ter uma interpretação se torna uma informação. Por sua vez, quando a informação é uma propriedade cuja variação deve alterar a interpretação do fenômeno que representa, sem lhe alterar a natureza, é chamada de parâmetro, que pode apresentar diversos valores, conforme a circunstância (Fig.2). Lembrando que para cada dado, informação, parâmetro ou variável obtido em um planejamento, deve-se reconhecer a temporalidade e o espaço de abrangência (SANTOS, 2004).

O importante é observar a ocorrência desses níveis, a relação que se pretende es-tabelecer entre eles, os dados que são representativos, comparáveis e de fácil in-terpretação, para construir uma base sólida de informações. Estas informações são apresentadas como indicadores, que têm a capacidade de descrever um estado ou uma resposta dos fenômenos que ocorrem no meio. A figura à seguir caracteriza o parâmetro como indicador.

Fig. 2 Caracterização de parâmetro como indicador. Baseado em SANTOS, 2004.

Não existe consenso sobre qual o conjunto ideal de indicadores a ser adotado. Num planejamento ambiental o número de indicadores normalmente está associado à es-

Page 56: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

55

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

cala e espaço físico que se está trabalhando e para cada dimensão há indicadores específicos. Normalmente é comum priorizar os indicadores do meio natural e poste-riormente os que expressam aspectos sociais, culturais e econômicos, ficando claro que a seleção dos dados populacionais e socioeconômicos está orientado segundo sua relação direta com os subsistemas ambientais naturais. Importante é perceber que o agrupamento dos indicadores auxilia no processo de planejamento de diferentes maneiras, podendo expressar as condições de qualidade ou estado do meio, refletir as políticas setoriais, outro grupo pode refletir pressões ou impactos das atividades humanas sobre o meio, outro pelas relações sociais, e assim por diante.

A forma mais usual de organizar os indicadores, principalmente quando o planeja-mento fundamenta-se em princípios de desenvolvimento sustentável, é por meio da estrutura da OECD (Organization for Economic Co-Operation and Development), que adota três grupos de indicadores: estado, pressão e resposta.

TEMÁTICAS E TEMAS

Outra questão a ser a ser considerada em relação ao planejamento ambiental são seus múltiplos aspectos como um todo contínuo no espaço, que englobam dados ligados a diversas disciplinas. Na sistematização das diferentes disciplinas é necessário considerar dois níveis de informação: o das temáticas e o dos temas.

Cada tema é um núcleo próprio de dados, por exemplo: o clima, a geologia, a vegeta-ção, o uso da terra, educação, entre outros, que podem ser subdivididos em subtemas e podem ser derivados, ou seja, abranger dois ou mais temas. Temática é um conjunto de temas, que quando associados permitem uma análise que é a síntese de uma fra-ção particular do meio (SANTOS, 2004).

“Os planejadores precisam refletir que a compreensão sobre a com-plexidade do meio e a forma como se dá a integração entre seus diversos temas deve, primeiramente, passar pelo relacionamento entre os próprios elementos do grupo das múltiplas interações que os unem.”(SANTOS, 2004)

Page 57: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

56

Revista LABVERDE

A partir das temáticas e temas é possível descrever e prever situações dentro da di-mensão de análise estabelecida, sabendo que esses componentes não são isolados e apresentam padrões de distribuição no território estando relacionados numa rede de interações. Um caminho para representar esta integração é por meio da segmentação do espaço em unidades territoriais homogêneas, onde são analisados todos os temas agrupando os pontos com características comuns e denominando cada um segundo suas características.

Um caminho integrador dos temas que vem sendo utilizada no planejamento ambien-tal é a Ecologia da paisagem, porque ela permite aplicar procedimentos analíticos que conduzem à observação, sistematização e análise. A paisagem é observada como um conjunto de unidades naturais, alteradas por ação humana, que compõe um intrinca-do, heterogêneo e interativo mosaico, em que planejadores interpretam este mosaico e revelam as relações entre as unidades.

De acordo com Santos (2004), para o enfoque da paisagem são trabalhados três aspectos (Fig. 3): • Estrutura – padrões e relações de distribuição entre elementos espaciais; • Função – área heterogênea discutida em relação ao fluxo de espécies, energia e matéria entre esses elementos; • Mudanças – alterações da estrutura e função do mosaico da paisagem através do tem-po.

Fig. 3 - Estrutura, função e mudança na paisagem. Baseado em SANTOS, 2004 O olhar sobre a paisagem deve ser feito em dois eixos: no horizontal (definição de padrões mutuamente relacionados entre unidades) e vertical (define os atributos de

Page 58: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

57

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

cada estrato). Nos métodos tradicionais cada tema estuda um estrato e considera os demais como fatores de forma para seu próprio atributo. Considera, ainda, a hete-rogeneidade de uma área formada por todos os atributos como um objeto único de estudo (Fig. 4).

Fig. 4 – Observação do espaço, de acordo com o estudo da paisagem. SANTOS, 2004

O eixo vertical permite identificar os diferentes estratos cuja quantidade e composição depende da unidade, como florestas ou campos. O eixo horizontal permite identificar as diferentes unidades de paisagem.

Ainda sobre a perspectiva de análise sobre a função da paisagem, os planejadores indicam que a estrutura da paisagem reflete uma imagem imediata da distribuição da matéria pelos processos ecológicos num determinado tempo e que a observação por longos tempos apresentam a dinâmica do espaço. A estrutura é observada a partir de três elementos básicos: matriz, mancha e corredor (Fig. 5).

Page 59: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

58

Revista LABVERDE

Fig. 5 – Representação dos elementos da paisagem.

A matriz controla a dinâmica da paisagem e é o elemento que tem o maior predomínio da área ocupada e com menor grau de fragmentação. As manchas são os elementos não lineares, de aparente homogeneidade e que interrompem a matriz. Os corredores são os elementos lineares, de aparente homogeneidade e distinguíveis da matriz. Podem ser classificados como corredores naturais, corredores de alteração ou distúr-bio (estradas, linhas de energia), corredores de reabilitação (reflorestamento ciliar) e outros.

“A observação das interações entre a estrutura da paisagem (tama-nho, forma, arranjo e conexão entre seus elementos) e seus proces-sos ecológicos permite que vários fenômenos sejam averiguados, como: a capacidade do meio em recuperar-se e continuar em equi-líbrio apesar de uma mudança; o tempo de sobrevivência de um sistema ou de algum de seus componentes; a resistência às mudan-ças, aos efeitos de barreira; as conseqüências das mudanças dos movimentos e transporte de agentes (organismos, água, ar) entre os elementos da paisagem; a medida da facilidade de ocorrência dos fluxos biológicos (conectividade); a permeabilidade da matriz; a evolução da fragmentação relacionada aos tipos de perturbação;

Page 60: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

59

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

os efeitos de borda dos fragmentos; os pontos de ligação (áreas de habitats dispersas), que facilitam os fluxos entre manchas, e a varia-ção da diversidade na paisagem.” SANTOS, 2004.

Fig. 6 – Suposição de composição na paisagem em uma área com vegetação natural preser-vada, uma região essencialmente agrícola e uma área urbana. SANTOS, 2004 A interpretação pelo enfoque da ecologia da paisagem reflete muito bem a dinâmica das áreas estudadas e possibilita empregar medidas mais concretas de aproveitamen-to e conservação dos recursos da terra, apesar de ainda existir desacordo relacionado à noção de homogeneidade e heterogeneidade em função de diferentes questões, como escala adotada, percepção dos múltiplos processos existentes, formação do planejador, com estratégias próprias, considerando os diferentes campos de conheci-mento, com princípios, conceitos e estratégias próprias, o que leva a procedimentos sob a ótica de diferentes profissionais.

CONCLUSÃO

As Considerações deste trabalho trazem reflexões de que o conhecimento deve ab-sorver experiências e informações, que não podem ser confundidos com quantidade de dados isolados, caso contrário, não esclarecerão a leitura necessária à construção do território. Propiciar que os cidadãos se apropriem de suas localidades e que as políticas públicas contribuam com ações para educação do cidadão critico que possa exigir os seus direitos, que é co-responsável pela sua comunidade e sabe das neces-sidades da mesma é o caminho para uma boa gestão.

Partimos da hipótese de que a partir da relação entre circuitos financeiro, social e ambiental, adaptados ao conhecimento do espaço e das ações surgirá como resul-

Page 61: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

60

Revista LABVERDE

tado a realização das políticas públicas aplicada às localidades de forma consciente, participativa e qualitativa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CRUZ, Vicente Vagner. Repensando O Conceito De Políticas Públicas. Disponível em <http://www.artigonal.com/politica-artigos/repensando-o-conceito-de-politicas-publi-cas-756674.html> Acesso em Fev.2011. RÊGO FILHO, Luiz de Morais e CARNEIRO, Auner Pereira. Relações entre o mundo rural e o mundo urbano: Evolução histórica, situação atual. Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro, Vinculada à Secretaria de Agricultura, Abaste-cimento e Pesca, 2007. Disponível em <http://200.255.4.232/Arquivos/Mestrado/Grupos-Pesquisa/DesenvMunicipal/RelatoUrbanoRural.pdf> Acesso em Fev. 2011. LIMA, Patricia Helen. Projeto Sustentável: Exigência para o Século XXI. Percepção do projeto sustentável na produção imobiliária atual. Dissertação de Mes-trado em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universi-dade de São Paulo, São Paulo, Nov. 2009. SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 12 ed. – Rio de Janeiro: Record, 2005. SANTOS, Rozely Ferreira dos. Planejamento ambiental: teoria e prática. São Paulo: Oficina de Textos, 2004. TEIXEIRA, Elenaldo Celso. O Papel das Políticas Públicas no Desenvolvimento Local e na Transformação da Realidade. 2002 - AATR-BA. Disponível em <http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/aatr2/a_pdf/03_aatr_pp_papel.pdf> Acesso em Fev. 2011.

Page 62: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

ARTIGO Nº4A EVOLUÇÃO DA SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL URBANA E AS

INTERFERÊNCIAS DA ÉTICAThe Evolution of the Urban Environmental Sustainability and the Ethics

InterferencesDeize Sbarai Sanches Ximenes

Page 63: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

62

Revista LABVERDE

A EVOLUÇÃO DA SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL URBANA E AS INTERFERÊNCIAS DA ÉTICA

Deize Sbarai Sanches Ximenes

Mestre em Arquitetura e Urbanismo - PósArq da UFSC - Brasil

E-mail :[email protected]

Resumo A intenção deste artigo é apresentar as influências da ética na evolução da sustenta-bilidade ambiental a partir do séc. XIX quando ocorre um rápido desenvolvimento das cidades e um crescimento desordenado da população gerando problemas sociais e ambientais. O ambiente natural sofreu, por muito tempo, com a atividade predatória do ser humano, que estimulado por sua ganância, retirou de forma irresponsável e sem planejamento, as riquezas naturais em busca de lucro comprometendo a sobrevivên-cia sustentável. A visão tradicional antropocêntrica enfatiza um desenvolvimento am-biental urbano focado nos interesses e bem estar do ser humano desde a existência do homem, enquanto a biocêntrica, desloca o eixo da ética para os seres vivos e os ecossistemas naturais, onde teremos a introdução à ética ambiental na década de 70 e o conceito de ecodesenvolvimento.

Palavras-chave: evolução, sustentabilidade ambiental urbana, ética antropocêntrica, ética biocêntrica, ecodesenvolvimento.

Page 64: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

63

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

THE EVOLUTION OF THE URBAN ENVIRONMENTAL SUSTAINABILITY AND THE ETHICS INTERFERENCES

Abstract

The intention of this article is to present the influence of ethics in the evolution of envi-ronmental sustainability from the century XIX when there is rapid development of cities and a disorderly growth of the population generating social and environmental proble-ms. The natural environment has suffered for a long time, with the predatory activity of human beings, that stimulated by their greed, pulled in an irresponsible manner and without planning, natural resources for profit committed to sustainable livelihoods. The traditional view emphasizes an anthropocentric environmental urban development fo-cused on the interests and welfare of human beings since man’s existence, while the biocentric, shifts the axis of ethics for living beings and natural ecosystems, where we have the introduction to environmental ethics in 70’s and the concept of eco-develop-ment.

Keywords: evolution, urban environmental sustainability, ethics anthropocentric, bio-centric ethics, eco-development. INTRODUÇÃO

Como se sabe, o século XIX marcou profundamente o avanço da urbanização e a carência de infra-estrutura, que resultou nas condições atuais das cidades que con-centram cada vez mais, grande parte da população do planeta.

A ação antrópica, fortemente concentrada nas cidades, gerou grande impacto no am-biente construído e no meio físico em que o ser humano se inseriu. O aumento da população associado à diminuição de recursos naturais conduz as cidades a uma situação de esgotamento iminente. Esgotamento de recursos não renováveis e degra-dação que ocorre no solo, água, vegetação e ar, pois o ser humano retira do ambiente natural, os recursos necessários para sua sobrevivência e age como se estes fossem infinitos.

Page 65: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

64

Revista LABVERDE

A qualidade da vida humana está diretamente relacionada com a interferência do ser humano no ambiente construído. A natureza humanizada, através das modificações no ambiente, alcança maior expressão nos espaços ocupados pelas cidades. A partir desse cenário, pode-se tentar compreender a importância da ética no processo de evolução da sustentabilidade ambiental, haja visto que a ética envolve todas as re-lações da vida humana. Os problemas éticos são apresentados aos seres humanos, relativamente às atividades econômicas, sociais e ambientais. “Nas últimas décadas, crises de âmbito mundial, como fome e miséria, migração da pobreza e superpopula-ção, destruição ininterrupta do ambiente natural e guerras, despertaram a exigência de uma responsabilidade mais ética” (ENDERLE, 1997).

Se a humanidade não pensar e agir a partir de uma ética ambiental, enfrentará os efei-tos negativos dos últimos duzentos anos de crescimento populacional e econômico que fatalmente levaram ao desequilíbrio ecológico e a degradação do meio ambiente físico e social. As ações sustentáveis precisam ser vistas como elemento essencial para o alcance da melhoria da qualidade de vida do ser humano e da preservação do ambiente natural. O debate ecológico levanta questões fundamentais na maneira como a ética se posiciona perante o processo de evolução das questões ambientais. O próprio ponto de partida e a abrangência da ética enfatizam diferentes enfoques; antropocêntricos ou biocêntricos. Uns partem de que o ser humano detém um prota-gonista no mundo. Buscam a solução para os problemas ambientais na perspectiva do papel central do ser humano em relação à natureza. Outros defendem que o ser humano é apenas um elemento a mais no ecossistema da natureza, um elo ao lado de outros na cadeia de reprodução da vida. Por isso, o protagonista pertence à vida. Para estes a crise ecológica precisa ser equacionada numa perspectiva biocêntrica.

Desta maneira foram-se perfilando duas grandes tendências de ética ecológica que se excluem entre si. Uma que tem como ponto de partida o ser humano em sua pos-tura ética. Defende que não existe ética sem antropocentrismo, pois somente o ser humano pode agir moralmente e tomar decisões. A outra, a postura biocêntrica, que parte do ponto de vista da ecologia como conhecimento e prática de preservação do meio ambiente. Essa tendência compreende a ética a partir do paradigma da ecolo-gia. Esse paradigma pretende revolucionar a ética, porque supera a concentração antropocêntrica de toda ética ocidental. Apresenta-se como a única postura coerente de defesa da natureza e preservação do meio ambiente.

Page 66: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

65

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

De acordo com os grandes acontecimentos urbanísticos e paisagísticos, será anali-sada a evolução da sustentabilidade ambiental urbana e suas interfases com a ética.

CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL

A sustentabilidade é vista como “um princípio em evolução”, “um conceito infinito”, “que poucos sabem o que é” e “que requer muita pesquisa adicional”, manifestações de um positivismo frustrado: o desenvolvimento sustentável seria um dado objetivo que, no entanto, não se conseguiu ainda apreender. Mas, como definir algo que não existe? E que, ao existir, será, sem dúvida, uma construção social? E que, como tal, poderá também compreender diferentes conteúdos e práticas a reivindicar seu nome. Isto nos esclarece por que distintas representações e valores vêm sendo associados à noção de sustentabilidade: são discursos em disputa pela expressão mais legítima. Pois a sustentabilidade é uma noção a que se pode recorrer para tornar objetivas di-ferentes representações e idéias.

CONCEITO DE ÉTICA

Etimologicamente a palavra ética deriva do grego éthos que significa costume desig-nando a doutrina do agir correto, ou seja, do agir bem e o vocábulo moral deriva do latim, mos, mores que significa costumes, hábito. A ética e a moral, originalmente têm o mesmo significado, entretanto, há uma distinção entre ambas. “Moral designa o que se faz, portanto as convenções, o habitual, a moral de todos os dias, a moral da me-diania, enquanto ética indica a reflexão, se o que é habitual realmente é bom e certo” (ENDERLE, 1997). Vázquez define a ética como a “teoria ou ciência do comportamen-to moral do ser humano em sociedade, ou seja, é ciência de uma forma específica de comportamento humano” (2002). Em suma, a ética é a ciência da moral. Ele esclarece ainda que a moral não é considerada ciência, mas objeto de estudo da ciência; sendo, neste sentido, por ela estudada e investigada.

Lima (1999), além de esclarecer que “A ética é a exteriorização dos juízos morais (ciência da conduta)”, descreve que a Ética é a filosofia que estuda a conduta do ser humano e os critérios pelos quais valoram os comportamentos e a escolha.

Page 67: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

66

Revista LABVERDE

“Parte da filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento hu-mano, refletindo especialmente a respeito da essência das normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social”. (HOUAISS 2001)

A ética varia de acordo com o estágio de desenvolvimento do ser humano e de suas relações em sociedade. Lima (1999) esclarece que ser ético “significa ter consciência dos procedimentos permitidos e proibidos dentro da sociedade, dando o exemplo de conduta positiva, zelando para que todos observem os princípios legais, desenvolven-do-se e educando-se continuamente”.

EVOLUÇÃO DA DA SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL

No final do século XVIII com a Revolução Industrial na Inglaterra, a insalubridade ob-servada na maior parte das cidades industriais européias, demandou ações corretivas voltadas ao resgate da qualidade ambiental. O apelo à qualificação estética de áreas da cidade, também ganhou importância tanto quanto a busca da higienização. Neste período, na Inglaterra o parque surge como fato urbano de relevância, atingindo seu pleno desenvolvimento apenas cem anos de-pois. O Parque Urbano passou a responder pela demanda de equipamentos para as atividades de recreação e lazer decorrentes da intensificação da expansão urbana da cidade industrial. Dois processos distintos marcaram a criação dos primeiros parques urbanos na Inglaterra: a absorção dos grandes espaços livres representados pelos jardins dos palácios da Corte, que foram abertos ao público e incorporados à estrutura urbana e os empreendimentos imobiliários promovidos pela iniciativa privada.

O movimento dos Parques Americanos liderado por Frederick Law Olmsted se coloca contra os males das cidades industrializadas e surgem os grandes jardins contem-plativos, os parques de paisagem, os parkways (parques lineares) e os parques de vizinhança americana, como o Central Park em Nova Iorque, 1863. Com base nestas preocupações, Olmsted realiza em Boston a primeira experiência de organização de um sistema de parques que considera o conjunto da cidade. Na concepção desse sis-tema de parques, conhecido como “Emerald Necklace”, pelo fato de se tratar de um

Page 68: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

67

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

conjunto de espaços interligados, Olmsted teve como preocupação, além da questão do lazer, a questão do saneamento do ambiente urbano e da sua recuperação.

A implantação de parques urbanos nas cidades tem seu caráter de punho ambiental, mas o principal argumento é o bem estar da população; ou seja, os interesses sociais e ambientais do ser humano; ele que irá usufluir do espaço “construído”. De acordo com Taylor, “nossos deveres com o mundo natural derivam, no fundo, de nossos de-veres para com os seres humanos. É porque temos de respeitar os direitos humanos de cada um, ou porque temos de proteger e fomentar o bem-estar de humanos que devemos estabelecer certos limites em nosso modo de tratar o ambiente natural ter-restre e seus habitantes não-humanos.” Em outras palavras, a ética ambiental antro-pocêntrica dominante desde o século XVI, surge em contraste com a ética teocêntrica e teológica da Idade Média, desconsidera o Deus supremo como centro do universo e leva o homem à condição de espécie superior pela razão, priorizando os interesses econômicos, científicos e estéticos acima de tudo. Por essa razão, sua lógica é instru-mental, e seu argumento dos deveres para com o ecossistema é indireto.

O filósofo alemão do século XIX, Emmanurl kant, defende que as perspectivas an-tropocêntricas estabelecem os deveres morais positivos e negativos tendo em vista o bem dos seres humanos, colocado no centro e acima do bem de qualquer outro ser vivo. Por isso a designação “ética antropocêntrica”. Essa ética, ao engrandecer a natureza humana, afirmando que os interesses e propósitos humanos estão acima de quaisquer interesses ou fins de quaisquer indivíduos de outras espécies nesse planeta, coloca em segundo plano, para não dizer, em último lugar, os interesses de todas as demais espécies de vida. Estamos vivendo nesse momento a ameaça de destruição da vida, que tal ética ensejou.

A tese do antropocentrismo excludente, típica da filosofia moderna inaugurada por Descartes, vigorou até metade do século XX, quando começaram a tomar força as éticas ecológicas ou ambientais. A ética ambiental antropocêntrica fomentou a maioria das ações ambientalistas levadas a efeito ao redor do planeta nos últimos 40 anos. Seu fracasso pode ser constatado pela devastação ambiental em curso acelerado. Para evitar cometer erros antigos, é preciso finalizar a crítica ao caráter antropocêntri-co da proposta ética tradicional, contrapondo seu fundamento ao princípio que estru-tura a ética ambiental biocêntrica. Ao forjar o modelo ético biocêntrico, agentes morais humanos são colocados num plano horizontal relativamente a todas as espécies de vida, nem acima, nem abaixo, ainda que no centro.

Page 69: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

68

Revista LABVERDE

As preocupações da humanidade com a qualidade ambiental no processo de de-senvolvimento se fortaleceram no período que sucedeu a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). A destruição das cidades influenciou um novo modo de pensar o dese-nho urbano; como a redução da destruição de solos, o aumento das áreas perme-áveis, a redução do custo de infra-estrutura urbanística, a redução da poluição e a descentralização.

Surge neste período pós-guerra, a Ética da Terra (1949), por Aldo Leopold, onde ser-viu de inspiração para os princípios ecocêntricos da Ética Ambiental Contemporânea: A ética da Terra é uma abordagem ética holística, derivada de mais de um paradig-ma biológico que de uma tradição filosófica. Leopold definiu uma ética a partir desse ponto de partida biológico como uma limitação da liberdade de ação na luta pela vida. Assim, a ética ecológica, amplia os limites da comunidade para incluir solos, águas, plantas e animais, ou a própria Terra. Para Leopold “Uma coisa é correta quando tende a preservar a integridade, a estabilidade e a beleza da comunidade biótica. E é errada quando tende a ter outro resultado”.

Na década de 60, a deterioração ambiental e sua relação com o estilo de crescimento econômico já eram objeto de estudo e preocupação internacional. Nesse sentido, po-demos citar como exemplos: o livro Primavera Silenciosa, de Rachel Carson, lançado em 1962, que trata do uso e dos efeitos dos produtos químicos sobre os recursos am-bientais, o livro Design With Nature, de Ian Mcharg, em 1969, sobre o planejamento urbano com bases ecológicas e Albert Shweitzer, que ganhou o Prêmio Nobel da Paz ao popularizar a ética ambiental.

A Ética Ambiental surge em meio a esta visão ecocêntrica de Leopold, como uma nova relação de consciência entre o ser humano e o ambiente natural: o ser humano faz parte do ambiente natural e não é o seu dono, não a tem para servi-lo, mas para que ele sobreviva em harmonia com os demais seres. Nesta nova concepção, o ser humano passa a se preocupar com suas ações e, como conseqüência, passa a pra-ticar ações coerentes com o ambiente natural. Deve agir contra os desastres cotidia-nos nas cidades, como o desmatamento, a ocupação de encostas e fundos de vale, o esgoto e lixões a céu aberto, a poluição das águas de nascentes, a poluição das praias, a venda de animais silvestres em feiras livres e o comércio de plantas nativas em extinção, entre outros.

Page 70: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

69

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

A partir da década de 70, formam-se grupos de discussão cujo enfoque principal era a preocupação ambiental e sua importante influência para o desenvolvimento mundial. O Clube de Roma, um dos primeiros grupos a se concretizar, nasceu em 1968, con-gregando cientistas, economistas e altos funcionários governamentais, com a finalida-de de analisar os problemas ambientais, sob uma perspectiva ecológica de Sistema Global.

O arcabouço teórico do pensamento do Clube de Roma reside na idéia de que o planeta é um sistema finito de recursos, submetido às pressões do crescimento ex-ponencial da população e da produção econômica. As suas conclusões apontavam o horizonte do colapso do sistema e as suas propostas se organizavam em torno da noção de um gerenciamento global da demografia e da economia, a fim de alcançar um estado de equilíbrio dinâmico. Severas medidas de controle da natalidade e mu-danças radicais nos modelos produtivos eram as recomendações centrais da nova escola de pensamento ecológico.

A publicação em 1972 do relatório Os limites do Crescimento (Meadows et al., 1972) pelo Clube de Roma denunciava o crescente consumo mundial que ocasionaria um colapso do ecossistema global. Realizado pela equipe do Professor Meadows, do MIT – Massachusetts Institute of Technology, o relatório atentava para a preocupação com as principais tendências do ecossistema mundial: industrialização acelerada, for-te crescimento populacional, insuficiência crescente da produção de alimentos, esgo-tamento dos recursos naturais não renováveis e degradação irreversível do ambiente natural.

As questões relativas à qualidade ambiental se fortaleceram com a Reunião de Es-tocolmo de 1972 na Suécia, onde foram discutidos os potenciais efeitos nocivos das mudanças climáticas e os estilos de desenvolvimento sócio-econômico dos países em relação ao ambiente natural. Tratou-se das questões ambientais e da qualidade de vida e buscaram alternativas para o uso dos recursos naturais com o objetivo de satisfazer as necessidades globais de subsistência da população, como moradia, educação, saúde e alimentação. Ao final, foi criado o Programa das nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

Surge em meio às discussões ambientais da década de 70, uma nova visão de ética ambiental por Paul Taylor; a Ética da Vida ou biocentrismo. Ela surge como uma das tendências mais recentes no movimento ecológico. O biocentrismo propõe que os di-

Page 71: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

70

Revista LABVERDE

reitos naturais deveriam ser estendidos a todos os elementos da natureza, e que uma postura ética radical deveria ser tomada antes que todos os seres humanos, e mesmo seres inanimados, modifiquem completamente a relação entre a humanidade e a na-tureza. Roderick Nash analisa o biocentrismo em seu livro “Os direitos da natureza”, e o interpreta como uma conseqüência do liberalismo.

Taylor, com sua ética biocêntrica, sugere que seja levado em consideração o valor inerente à vida de cada indivíduo, não significando isso que em hipótese alguma uma vida não possa ser eliminada. Mas a razão pela qual uma vida pode ser exterminada deve ser uma razão ética, descartando-se a hipótese de que interesses comerciais, estéticos, científicos ou de qualquer natureza antropocêntrica possam servir como pretexto para que tiremos a vida dos outros. Isso vale para humanos, animais não hu-manos e ecossistemas naturais. Por isso a designação biocêntrica para tal proposta ética.

Por outro lado, a natureza não dá lições de ética, pois nela não há deveres, apenas leis. Seus eventos, portanto, não podem nos guiar moralmente. Esse é o ponto da ética biocêntrica que a distingue da ética ecocêntrica oriunda da ecologia profunda de Leopold (The Sand County Almanac, 1949), Baird Callicott, Albert Schweizer. A ética biocêntrica de Paul W. Taylor, apresentada em seu livro, Respect for Nature, e o conceito de ecodesenvolvimento são concebidos, ambos na década de 70, como um questionamento à ação devastadora dos ecossistemas naturais. Após a grande polêmica gerada na primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, em Estocolmo (1972), entre aqueles que defendiam o desenvolvimento a qualquer preço, mesmo pondo em risco a própria natureza e os partidários das questões am-bientais foi proposto o termo ecodesenvolvimento por Maurice Strong e, em seguida, ampliado pelo economista Ignacy Sachs, que, além da preocupação com o meio am-biente, incorporou as devidas atenções às questões sociais, econômicas, culturais, de gestão participativa e ética.

Para Sachs, ecodesenvolvimento é um “desenvolvimento endógeno e, dependente de suas próprias forças, submetidas à lógica das necessidades do conjunto da po-pulação, consciente de sua dimensão ecológica e busca estabelecer uma relação de harmonia entre o ser humano e o ambiente natural”.

Os princípios básicos do ecodesenvolvimento foram formulados por Ignacy Sachs dentro de uma nova proposta de desenvolvimento sustentável, tendo como pressu-

Page 72: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

71

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

posto a existência de cinco dimensões, que propõe ações que explicitam a necessida-de de tornar compatíveis a melhoria nos níveis de qualidade de vida e a preservação ambiental. São elas as cinco dimensões:

a. Econômica: aumentar a lucratividade e crescimento por meio do uso mais eficiente de recursos, incluindo mão-de-obra, materiais, água e energia;

b. Ambiental: evitar efeitos perigosos e potencialmente irreversíveis no ambiente por meio de uso cuidadoso de recursos naturais, minimização de resíduos, e proteção e, quando possível, melhoria do ambiente;

c. Social: responder às necessidades de pessoas e grupos sociais envolvidos em qualquer estágio do processo de construção (do planejamento a demolição), proven-do alta satisfação do cliente e do usuário, e trabalhando estreitamente com clientes, fornecedores, funcionários e comunidades locais;

d. Geográfica: necessidade de se buscar uma configuração rural-urbana mais equili-brada e de se estabelecer uma rede de reservas da biosfera para proteger a diversi-dade biológica e, ao mesmo tempo, ajudar a população local a viver melhor;

e. Cultural: talvez, constitua o critério mais difícil de ser concretizado, na medida em que implica que o processo de modernização deva ter raízes endógenas, buscando a mudança em sintonia com a continuidade cultural vigente em contextos específicos.

Na proposta de ecodesenvolvimento, a educação ambiental contribui para a compre-ensão fundamental da relação e interação da humanidade com todo o ambiente na-tural e fomenta uma ética ambiental a respeito do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida, despertando nos indivíduos e nos grupos sociais organizados o desejo de participar da construção de sua cidadania.

METABOLISMO DAS CIDADES

O conceito de metabolismo das cidades, segundo o desenvolvimento sustentável, consiste no balanço da entrada de recursos naturais e saída de resíduos. O meta-bolismo urbano explica a dinâmica de uma cidade e a relação com seus integrantes: moradores, indústrias, veículos, lixo e outros que constituem o ambiente construído.

Page 73: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

72

Revista LABVERDE

Na visão de Tickell (2001) “as cidades são como organismos que absorvem recursos e emitem resíduos”. E é sob este prisma que se considera o metabolismo urbano das cidades, como forma de compreender o impacto de seus processos no ambiente na-tural.

A cidade precisa de insumos para manter sua população e seus processos produti-vos: a energia em suas diversas formas, tais como elétrica, solar, eólica, entre outras, os alimentos, a água e a matéria-prima. A produção ou extração de cada um desses insumos impacta de forma mais ou menos intensa a área onde ocorre. A poluição do ar, os efluentes líquidos, os resíduos sólidos e os produtos químicos são resíduos que precisam de uma área capaz de assimilá-los. Essas áreas sofrem sérios impactos ambientais.

Essas áreas impactadas são conceituadas como Pegada Ecológica por Wackernagel e Rees (1996) que se basearam no conceito de “capacidade de carga”, a qual permite calcular a área de terreno produtiva necessária para sustentar o estilo de vida do ser humano.

Na cidade, a Pegada Ecológica é vista como a área impactada no processo de pro-dução de seus insumos – necessária à vida do ser humano – somada ainda à área necessária para a disposição e a assimilação de seus resíduos, mas seu conceito pode ser utilizado em diversas escalas, da individual à planetária. Sobre esta questão, a explicação dada pela equipe da organização Urban Ecology Austrália é a seguinte:

A pegada ecológica é uma ferramenta muito simples para nos dizer quanta natureza temos, quanta usamos. Nós precisamos olhar para a pegada ecológica para olhar para a saúde dos serviços ecossistê-micos que suportam nossa economia. Nós podemos fazê-lo no nível global, no nível nacional, no nível municipal ou até no nível individu-al (GIRARDET, 1997).

O metabolismo urbano, com uma representação ecossistêmica das cidades, compos-ta por movimentos interativos de circulação, troca e transformação de recursos em trânsito defini-se, diante do discurso sobre a sustentabilidade das cidades, pelo recur-so à metáfora biológica da “resiliência”, que procura descrever a capacidade adapta-tiva dos “ecossistemas urbanos” para superarem a sua condição de vulnerabilidade ante a choques externos (Godard, 1996, p.33). Neste tipo de representação, a in-

Page 74: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

73

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

sustentabilidade expressaria a incapacidade de reprodução adaptativa das estruturas urbanas diante de rupturas nas condições materiais requeridas para tal reprodução. A idéia de metabolismo urbano aponta para um modelo de equilíbrio a ser obtido pelo ajustamento apropriado dos fluxos e estoques de matéria e energia.

METABOLISMO LINEAR

Com estas considerações pode-se analisar o metabolismo das cidades do século XX como um metabolismo linear, no qual são recebidos insumos e emitidos dejetos quase que indiscriminadamente. Pode-se então representar esse metabolismo graficamente tal como o fez Girardet (Figura 1):

Figura 1: Modelo de metabolismo linear das cidades. Fonte: Adaptação elaborada pela autora a partir de GIRARDET, 1997.

METABOLISMO CIRCULAR

Girardet (1997) propõe um metabolismo circular em que a entrada de insumos feita linearmente no modelo anterior possa ser diminuída por meio de controle de entrada de energia e maximização de reciclagem, conseqüentemente reduzindo a produção de resíduos (Figura 2).

Page 75: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

74

Revista LABVERDE

Figura 2: Modelo de metabolismo circular das cidades. Fonte: Adaptação elaborada pela autora a partir de GIRARDET, 1997.

Analisando o metabolismo circular temos no processo de entrada os alimentos, a energia e as mercadorias. A partir do consumo destes recursos pela cidade teremos as conseqüências negativas no processo de saída dos resíduos e a necessidade de propor diferentes soluções para o consumo sustentável dos recursos.

Em termos urbanísticos, o próprio desenho das cidades pode ser pensado para me-lhorar as condições de conforto e saúde e as qualidades ambientais, como por exem-plo, reduzindo gastos com climatização e gerando caminhos de ventos adequados para manter um equilíbrio climático.

A reciclagem de produtos e de embalagens pode tornar menor a quantidade de maté-ria-prima necessária para a indústria, diminuir a mineração e a extração de materiais da natureza, diminuir a quantidade de energia necessária e diminuir ainda a poluição gerada no momento da produção.

A poluição do ar nas cidades é produzida na maior parte pelos meios de transporte movidos a combustíveis fósseis que precisam ser substituídos. Os veículos que ve-nham adotar tecnologias renováveis e menos poluentes trarão melhores condições e eficiência para os transportes e irão colaborar para alterar a entrada no modelo de metabolismo circular contribuindo para um desenvolvimento mais sustentável.

A poluição da água, por vezes, é decorrente do descaso com relação aos efluentes. Estes precisam ser recolhidos e tratados de maneira apropriada, antes de serem de-volvidos aos corpos de água. Outra forma de contaminação é a transferência da po-luição do ar e do solo para a água.

Page 76: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

75

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Os solos urbanos também passam pelo problema da poluição ao se tornarem bro-wnfields (campos marrons). Termo que surgiu em 1992, nos EUA, durante uma inves-tigação de campo conduzida pela Northeast Midwest Congressional Coalition, grupo de representantes que estudam os problemas ambientais dos estados americanos.

Sánchez (2001) define brownfields como edifícios ou terrenos previamente usados para fins industriais ou para determinados fins comerciais, que estão desocupados e freqüentemente contaminados por baixas concentrações de lixo tóxico ou poluição, e que possui o potencial para ser reutilizado desde que seja limpo. Terrenos que apre-sentam altas concentrações de lixo tóxico não podem ser enquadrados na classifica-ção de brownfields.

Não se pode esquecer outra importante fonte de contaminação dos solos e dos lençóis freáticos, que são os dejetos, seja na forma dos esgotos – que muitas vezes correm ao ar livre ou são acumulados em fossas construídas de forma inadequada ou em ter-renos que não as comportam – ou dos lixões que ocorrem em terrenos sem preparo. Os lixões são áreas de disposição final de resíduos sólidos que não contam com preparação anterior do solo, e nem com sistema de tratamento do chorume, efluen-te líquido que escorre do lixo, penetra na terra e contamina solo e lençóis freáticos. Moscas, pássaros e ratos circulam a céu aberto, enquanto crianças, adolescentes e adultos catam comida e materiais recicláveis para vender. Já o aterro sanitário é constituído por um sistema de drenagem de efluentes líquidos percolados (chorume) acima de uma camada impermeável de polietileno de alta densidade - PEAD, sobre uma camada de solo compactado para evitar o vazamento de material líquido para o solo, evitando assim a contaminação de lençóis freáticos. O chorume deve ser tratado e/ou recirculado causando assim uma menor poluição ao meio ambiente.

A idéia do metabolismo circular prevê que parte do resíduo que deixa as cidades no metabolismo linear seja reaproveitada, servindo-lhe de insumo, ao mesmo tempo em que compõe uma componente cíclica do sistema. A redução dos resíduos e da po-luição da cidade é proporcional à redução de consumo de recursos naturais pelo ser humano.

A produção de energia, alimentos e mercadorias pela cidade causam um impacto negativo no ambiente natural. Os dejetos produzidos em grande escala nas áreas ur-banas são despejados na natureza, na maioria das vezes sem cuidados, aumentando

Page 77: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

76

Revista LABVERDE

as áreas necessárias para sua disposição final e, conseqüentemente, aumentando as Pegadas Ecológicas das cidades.

Para obter um metabolismo circular no funcionamento das cidades são essenciais atitudes por parte do governo, dos empreendedores e do cidadão na busca de tec-nologias que reduzam os impactos das atividades do ser humano, como a produção de insumos de forma mais limpa e a disposição de resíduos de forma correta: como a neutralização do lixo tóxico e o tratamento e reaproveitamento dos resíduos.

O relatório Brundtland de 1987 realizado pela Organização das nações Unidas e pre-sidido por Gro Harlem Brundtland, ex-primeira ministra da Noruega, líder em desen-volvimento sustentável e saúde pública, discute intensamente a proteção ambiental e o conceito de desenvolvimento sustentável (Figura 3), o qual tem como base concei-tual três pilares: a atividade econômica, o meio ambiente e o bem estar da sociedade.

Figura 3: Conceito de desenvolvimento sustentável. Fonte: Adaptação pela autora do CIB (1996). O desenvolvimento sustentável busca hoje uma interação entre o desenvolvimento econômico, a qualidade ambiental e a satisfação das necessidades do ser humano. É um processo de modificações no qual está previsto que a exploração de recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e as mudan-ças institucionais deverão ser feitas consistentemente para atender as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades (BRUNDTLAND, 1987). Para que isso se torne realidade

Page 78: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

77

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

é necessária uma série de ações conjuntas e cooperadas entre o poder público e a iniciativa privada, além de um consenso internacional. Há também os movimentos sociais formados principalmente por ONG´s, que defendem melhores condições de vida associadas à preservação do ambiente natural e a uma condução da economia adequada a tais exigências.

“O desenvolvimento sustentável pretende combater a miséria hu-mana sem repudiar a natureza ou desconsiderar as especificidades locais. Introduzir o objetivo global de um crescimento econômico e social duradouro, e que não dilapide o patrimônio natural”. (AGENDA 21, 1996)

A CNUMAD – Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvi-mento em 1992 no Brasil, contou com a participação dos principais líderes de mais de cem nações. As pesquisas científicas realizadas até aquele ano não deixavam mais nenhuma margem de dúvida quanto ao perigoso caminho traçado pelo ser humano, em sua insaciável busca por padrões de vida incompatíveis com a capacidade de suporte do planeta. Esta conferência foi baseada em três princípios: análise da tota-lidade do ciclo de vida dos materiais, desenvolvimento do uso de matérias-primas e energias renováveis e a reciclagem de resíduos.

A questão ambiental embasada nesses preceitos acima propiciou a celebração de diversos acordos internacionais, com destaque para a Agenda 21, a qual foi assina-da em 1992 por 178 países. É uma Agenda de Desenvolvimento Sustentável onde predomina uma proposta que rompe com o planejamento com enfoque econômico e destaca o ambiente natural. Ela discute a essência do que é desenvolvimento susten-tável, o processo através do qual ele pode ser alcançado e as ferramentas de geren-ciamento necessárias para alcançá-lo. A Agenda 21 não é restrita às questões ligadas à preservação e conservação da natureza, mas sim, às questões estratégicas ligadas: à geração de emprego e de renda, à diminuição das disparidades regionais e inter-pessoais de renda, às mudanças nos padrões de produção e consumo, à construção de cidades sustentáveis e à adoção de novos modelos e instrumentos de gestão (HA-DDAD, 2002).

É importante ressaltar que, apesar das críticas a que tem sido sujeito, o conceito de desenvolvimento sustentável representa um importante avanço, na medida em que a Agenda 21, como plano abrangente de ação para o desenvolvimento sustentável no

Page 79: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

78

Revista LABVERDE

século XXI, considera a complexa relação entre o desenvolvimento e o meio ambiente numa variedade de áreas, destacando a sua pluralidade, diversidade, multiplicidade e heterogeneidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A natureza, como já foi dito, submeteu-se à intervenção técnica dos homens, mes-mo sendo ela independente dos desejos e das opiniões humanas. O homem deveria deixá-la cumprir seu objetivo, sob pena de transformá-la em bem fictício, carente de seu verdadeiro valor. Por essa razão, é importante adotar modos de vida e caminhos de desenvolvimento que respeitem e funcionem dentro dos limites da natureza.

A ética ambiental, porém, não prevê a mudança de um paradigma. Ela simplesmente ensina que, para continuar vivendo com conforto e segurança ambiental, é preciso adotar uma postura sustentável, sem, no entanto, ser necessário romper com o para-digma antropocêntrico e adotar uma ética biocêntrica. A mesma vem sendo aplicada, desde o momento em que se falou pela primeira vez em desenvolvimento sustentável, já na década de 70, com o Relatório das Nações Unidas sobre Meio Ambiente.

O homem não deve ocupar o centro da política ambiental, ainda que comumente ele busque um lugar prioritário. Haverá casos em que para se conservar a vida humana ou para colocar em prática a harmonia com a natureza será preciso conservar a vida dos animais e das plantas em áreas declaradas inacessíveis ao próprio homem.

A ameaça ao ambiente é uma questão eminentemente ética, depende de uma alte-ração de conduta do ser humano; e para haver essa alteração, o agir com dever e em colaboração com os outros seres é a primeira exigência na tentativa de reaver o equilíbrio do planeta.

RESULTADOS

A natureza tem seu modo de ser, suas leis e seus comportamentos. Assim, não podemos pensar uma ética para o homem e outra para a natureza. A interdependência do homem e da natureza exige uma ética que não sobreponha o racional ao irracional (ou segundo Darwin – o mais inteligente sobre o menos inteligente), mas uma igualdade naquilo que é essencial para

Page 80: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

79

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

ambos – a sobrevivência. Devemos ter, então, uma Ética Ecológica ou Integradora (Albert Schweitzer), ou seja, uma ética em que todos os seres vivos são importantes e inteiramente necessários. Assim, o homem é conduzido a dar a todo desejo de vida a mesma reverência pela vida que dá ao seu próprio desejo de viver.

Trata-se de reconhecer que, embora em escalas diferentes, ambos, homem e natu-reza, possuem valores complementares porque as interações biológicas estão interli-gadas entre si, de tal forma, que desequilíbrios afetam ambas as partes. A destruição de florestas, por exemplo, não afeta só os vegetais e animais que ali interagem, mas o próprio homem e seu meio ambiente.

Faz-se importante estudar, mesmo que de forma sucinta, a ética, para se tentar en-contrar a melhor maneira de resolver os problemas sociais e ambientais. Sendo a ética uma espécie de instinto da comunidade em sua realização, talvez a busca de novos caminhos e novas formas de agir ético traga boas soluções para o caos atual.

BIBLIOGRAFIA

ACSERALD, H. Discursos da sustentabilidade urbana. Revista Brasileira de Estudos Urba-nos e Regionais, Campinas, nº1, maio. 1999.

ACSELRAD, H. Sustainability and Territory. In: Internacional Seminar on “Sustainability as a Concept for Social Sciences”. Frankfurt: ISOE/Unesco, 1996.

BRUNDTLAND, G. Nosso futuro comum.São Paulo: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1987. FRANCO, Maria de Assunção Ribeiro. Planejamento Ambiental para a Cidade sustentável. São Paulo, Annablume, 2000, 296p.

GIRARDET, Herbert. “Sustainble Cities. A Contradiction in Terms?” in AD Architectural Design The Architecture of Ecology, London, 1997.

JONAS, Hans. Das Prinzip Verantwortung. Versuch einer Ethik für die technologische Zivilisation. Frankfurt am Main: Insel Verlag, 1979.

LIMA, Alex Oliveira Rodrigues de. Ética global: legislação profissional no terceiro milênio. São Paulo: Iglu, 1999.

Page 81: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

80

Revista LABVERDE

MACCLOSKEY,apud CAPELLA, Vicente Bellver. Ecologia: de las razones a los derechos. Granada: Comares, 1994.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

MILARÉ, Édis. Processo Coletivo Ambiental. In: BENJAMIN, Antônio Herman (Coord.). Dano Ambiental: Reparação, prevenção e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

NALINI, José Renato. Ética ambiental. Campinas: Millennium, 2001. p. XXII.

NASH, Roderick. The Rights of Nature: A History of Environmental Ethics, 1989.

SÁNCHEZ VÁZQUEZ, A. Ética. 23. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

TAYLOR, Paul W. Respect for Nature: Studies in Moral, Political, and Legal Philosophy. Princeton NJ: Princeton University Press, 1986.

TAYLOR, Paul W. The Ethics of Respect for Nature. In: ZIMMERMANN, Michael; CALLI-COTT, J. Baird; SESSIONS, George; WARREN, Karen J; CLARK, John (Eds.) Environmental Philosophy: From Animal Rights to Radical Ecology. Upper Saddle River NJ: Prentice Hall, 1998. THOMAS, K. O Homem e o Mundo Natural. Companhia das Letras, SP, 1983.

TICKELL, Crispin. “Introdução”. In: ROGERS, Richard. Cidades para um pequeno planeta. Barcelona, Gustavo Gili, 2001.

VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Tradução: João Dell’Anna. 23. ed. Rio de Janeiro: Civili-zação Brasileira, 2002.

Page 82: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

ARTIGO Nº5ARQUITETURA DA COMPLEXIDADE: DESIGN A SERVIÇO DA VIDA EM UM

ESTUDO DE CASO NO SUL DE MINAS GERAISArchitecture of Complexity: Design Aimed at Serving Life in a Case Study in

the South of Minas Gerais Evandro de Castro Sanguinetto

Page 83: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

82

Revista LABVERDE

ARQUITETURA DA COMPLEXIDADE: DESIGN À SERVIÇO DA VIDA EM UM ES-TUDO DE CASO NO SUL DE MINAS GERAIS

Evandro de Castro Sanguinetto

Biólogo (Licenciatura), Especialista em Meio Ambiente e Recursos Hídricos, MSc em Ciências do

Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Vice-Presidente do Circuito Turístico Caminhos do Sul de Minas

e Conselheiro do CBH-Sapucaí

E-mails: [email protected] e [email protected]

Resumo

A complexidade crescente da sociedade humana pede por novas formas de ser, es-tar, viver e conviver no e com o planeta, superando velhos modelos e padrões de entendimento de mundo baseados no mecanicismo, reducionismo e fracionamento do saber e fazer. Essas novas formas apontam para os processos vivos, a biosfera, como fonte de inspiração e conhecimento para as produções humanas. Propõe-se nesse artigo uma arquitetura biofílica, integrativa, respondente aos padrões, ciclos, teias e redes estabelecidos pela evolução dos seres vivos em sintonia com o planeta que nos abriga. Uma Arquitetura da Complexidade, que incorpore a inter, multi e trans-disciplinaridade, as inteligências múltiplas, os diferentes saberes e fazeres resultantes da interação entre culturas e ecossistemas locais, são mediados ou conduzidos pelo design ecológico. Buscando respostas, refletimos, dentre outras questões, sobre a possibilidade de uma arquitetura que formulasse um espaço habitável como parte de um ecossistema, que se expandisse para além de si mesma e reverberasse com o terreno que, em sintonia retroalimentasse o ambiente construído. Como resultado, desenvolvemos e implantamos Gaia Terranova, experimento teórico-prático-vivencial localizado no Sul de Minas Gerais.

Palavras-chave: arquitetura, complexidade, transdisciplinaridade, Gaia Terranova, design ecológico, sustentabilidade.

Page 84: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

83

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

ARCHITECTURE OF COMPLEXITY: DESIGN AIMED AT SERVING LIFE IN A CASE STUDY IN THE SOUTH OF MINAS GERAIS

Abstract

The growing complexity of human society asks for new ways of being and living in and with the planet, overcoming old models and standards for a deeper understan-ding of the world based on mechanicism, reductionism and fractionism of knowledge and action. This new lifestyle points to living processes - the biosphere, as a source of inspiration and knowledge for human productions. In this study we propose a bio-philic and integrative architecture, respondent to standards, cycles, webs and nets established by the evolution of human beings in syntony with the planet sheltering us all. The Architecture of Complexity, which incorporates inter, multi and transdisciplina-rity, multiple intelligences, different learning and doings, resulting from the interaction among human cultures and local ecosystems, are mediated or guided by the ecolo-gical design. With a view to answer an intriguing question, among others, we reflect upon the feasibility of an architecture which formulates a habitable area as part of an ecosystem, which expands beyond itself and reverberates with the land which, in response, provides feedback to the constructed environment. Aimed at an answer we have developed Gaia Terranova, a theoretical-practical-experiential experiment in the South of Minas Gerais.

Keywords: Architecture, complexity, transdisciplinarity, Gaia Terranova. ecological de-sign, sustainability.

BIOFILIA, COMPLEXIDADE, INTER, MULTI E TRANSDISCIPLINARIDADE

Seria possível uma arquitetura para além de si mesma, para além da forma, da be-leza, da funcionalidade, das linhas retas, da circunscrição de espaços de utilidade humana apenas? Seria possível uma arquitetura que formulasse um espaço habi-tável como parte de um ecossistema, que se expandisse para além de si mesma e reverberasse com o terreno que, em sintonia retroalimentasse o ambiente construído? Seria possível uma casa concebida como uma célula, um ser vivo, parte de um tecido maior, como o terreno, a vizinhança e a microbacia hidrográfica na qual se insere? Seria possível uma arquitetura que explicitasse numa casa o nascer e por do sol, da

Page 85: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

84

Revista LABVERDE

lua, das estrelas e planetas, ensinando silenciosamente aos moradores seu lugar no espaço-tempo? Seria possível uma arquitetura que mostrasse o caminho da brisa soprando os distintos aromas da região e a direção dos ventos ora trazendo chuvas da Amazônia, ora do Atlântico, ou ainda o frio seco da Antártica? Seria possível uma arquitetura que ampliasse e fortalecesse a diversidade de vida ao invés de reduzi-la, ensinando ou resgatando em seus moradores que eles estão intimamente imersos numa imensa e magnífica sinfonia, que não estão sozinhos, que estão conectados não só entre si, mas com a casa, o terreno, a bacia hidrográfica, os animais e vege-tais, os ecossistemas, os vales e montanhas, a biorregião, a biosfera e a cosmosfera? E, se for possível uma arquitetura assim engendrada, como seria sua manifestação em uma casa de classe média, um prédio de escritórios, ou ainda uma vila, bairro, cidade? Como estabelecer uma arquitetura biofílica?

Por biofilia entendemos o amor e cuidado com tudo o que é vivo. Biofilia é amor à vida, e o novo –ismo que se propõe é o do Biocentrismo, colocando a Vida no mais elevado patamar, significando superior ao Humano (fruto e não senhor da evolução da vida) e suas criações.

O ser humano não é máquina, como quer a visão reducionista, mas um ser vivo, um organismo em relação e simbiose com seu planeta. Um ser vivo, de microrganismo a humano, nunca se apresenta fragmentado, é sempre um sistema complexo, composto por partes interconectadas e respondentes a ciclos, teias e redes, dotado da capaci-dade de replicação, ou autopoiese1 (MATURANA, 2001). Nossa sociedade apresenta características de crescente complexidade, não necessariamente mais viva, já que as partes que a compõe não se caracterizam pela incorporação ou reprodução de ciclos, teias e redes, ou de relações e comunicação entre as partes (que no entanto crescem vertiginosamente com as novas tecnologias de informação), mas ainda por processos dissociativos, excludentes, fragmentados e lineares, incapazes de dar respostas ade-quadas à crescente complexidade da sociedade planetária.

Esse tema, o da complexidade, tem despertado interesse em várias áreas do conhe-cimento. Nicolescu (1999), por exemplo, diz da complexidade que, sendo uma com-plexidade desordenada, seu conhecimento não faria sentido. Por outro lado, como apontam as teorias quânticas ou cosmológicas mais recentes, estamos diante de uma complexidade ordenada, de padrões até então não percebidos e mensurados, por-tadores de ordem e simplicidade de uma nova natureza, sendo este, justamente, o objeto de estudo e compreensão de um novo conhecimento, dito complexo.

Page 86: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

85

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

O termo complexidade, do latim complexus, significando o que é tecido em conjunto, tem em Edgar Morin talvez seu maior teórico, defensor e disseminador. A escola filo-sófica da complexidade, ao contrário da visão cartesiana de fracionar e reduzir para compreender, vê o mundo de forma indissociada, fruto de interações, alimentações, retroalimentações, processos e ligações que não podem ser compreendidos de ma-neira isolada. Para Morin (2002), o humano, como unidade complexa, é ao mesmo tempo biológico, social, afetivo e racional, assim como a sociedade é ao mesmo tem-po histórica, econômica, sociológica, religiosa, etc. Unidades complexas são multi-dimensionais, formadas por texturas e interligações, tecidas em conjunto, que não podem ser compreendidas isoladamente, o que nos leva ao conhecimento pertinente, que reconhece este caráter multidimensional e busca integrar não apenas as partes entre si, mas também as partes e o todo. A noite escura se torna clara com o despon-tar da lua, assim como o dia claro escurece com a passagem das nuvens. O Yin e o Yang chineses que se mesclam formando o Tao. Não há escolha a ser feita entre um e outro, apenas o entendimento de que ambos compõem uma unidade maior.

Uma Ciência feita de partes quebradas, desconectadas, isoladas, feita de padrões rompidos, de reduções e simplificações perigosas leva à cegueira paradigmática, ex-cluindo opostos complementares, complexos, como sujeito/objeto, alma/corpo, ma-téria/espírito, qualidade/quantidade, sentimento/razão, liberdade/determinismo, exis-tência/essência (MORIN, 2002). As Ciências Exatas, herdeiras de Newton, Descartes, Bacon e tantos outros, querendo compreender e explicar o mundo reduzindo a com-plexidade do cotidiano a meros componentes estáticos, controláveis, mensuráveis com régua e compasso, conectados por processos meramente mecânicos, se de um lado contribuiram para grande avanço em todas as áreas do conhecimento, por outro nos têm levado aos limites desta forma de pensar-ser-estar no mundo. Posto que, a pessoa/sociedade formada, informada, conformada e deformada pelo pensamento-visão das partes, da extremada especialização, deixa de perceber o todo, o complexo, as interligações e conexões, as contradições, delírios e superações da exuberante explosão de vida que nos inunda a todos, todos os dias, há quase 4 bilhões de anos. A matemática clássica e a geometria euclidiana, lidando com quantidades e fórmulas, não têm como representar sistemas dinâmicos, sistemas vivos, sistemas complexos que incorporam e descrevem qualidades e padrões, como o redemoinho num corpo aquoso ou cone de vento, interligando-os ao movimento e estrutura de galáxias es-piraladas como a Via Lactea; ou ainda descrever uma nuvem, relâmpago ou delta de um rio; ou ainda a folha de uma samambaia e sua relação com a floresta. Para a

Page 87: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

86

Revista LABVERDE

descrição de estruturas complexas presentes na natureza, uma nova matemática e geometria se fizeram necessárias. Assim, em 1975 Mandelbrot cunhou a expressão “fractal” (do latim fractus, quebrado) para identificar uma nova geometria, não-eucli-diana, capaz de representar fenômenos e estruturas complexas, a geometria fractal2. Uma propriedade fundamental do fractal é que seus padrões característicos são en-contrados em diversos níveis, de modo que qualquer parte, em qualquer escala, guar-da semelhança com o todo, ao que se chama autossimilaridade. Capra (2006) dá vários exemplos de autossimilaridade na natureza: rochas em montanhas se asse-melham a montanhas; ramificações de relâmpagos ou nuvens que se repetem várias vezes; linhas litorâneas que reproduzem em diferentes escalas as praias, baias e pro-montórios; ramos de árvores e vasos sanguíneos que guardam similaridade entre si, apontando para padrões primários, subjacentes às estruturas, seja nos níveis micro, meso ou macrocósmico, como mostra a Figura 1.

c d

a b

Figura 1: Exemplos de autossimilaridade na Natureza (a. Amonite (fóssil), b. Broto de samambaia, c. Galáxia M743) e sua representação por um fractal (d. Nautilus (repre-sentação fractal)).

Page 88: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

87

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

O modelo cartesiano de fracionar os fenômenos na tentativa de compreendê-los e explicá-los, originou uma miríade de disciplinas, desdobrando-se em outras tantas com a especialização crescente, fracionando cada vez mais o entendimento dos obje-tos de estudo ao tempo que gera imensas quantidades de informação. A necessidade de manter-se algum contato entre as disciplinas originou, em meados do século XX, a pluri e interdisciplinaridade. A pluridisciplinaridade, ou multidisciplinaridade, sendo o estudo de um objeto de uma dada disciplina por várias disciplinas ao mesmo tempo, mantém a estrutura da pesquisa disciplinar, embora agora enriquecida por diferentes visões, como um quadro, uma obra de arte, sendo estudada por disciplinas como ótica, história da arte, história das religiões, química, física, etc. Já a interdisciplina-ridade transfere métodos de uma disciplina para outra, originando novos campos de aplicação e/ou estudos, distinguindo-se três diferentes graus, explicados por exem-plos: (a) aplicação – transferência dos métodos da física nuclear para a medicina, originando novos tratamentos para o câncer; (b) epistemológico – métodos da lógica formal aplicados ao direito produzindo análises na epistemologia do direito; (c) criação de novas disciplinas – matemática aplicada a fenômenos meteorológicos ou bolsa de valores originando a teoria do caos. Em cada um dos diferentes graus, a interdisci-plinaridade permanece atrelada à pesquisa disciplinar, podendo gerar novas e mais especializadas disciplinas. A transdisciplinaridade, por sua vez, está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das disciplinas e além das disciplinas, tendo por objeti-vo a compreensão do mundo presente, buscando a unidade do conhecimento. Se a pesquisa disciplinar envolve, não raro, fragmentos de um único nível de Realidade4, a transdisciplinaridade se interessa pela ação simultânea de diversos níveis de Realida-de (NICOLESCU, 1999). Segue que a visão transdisciplinar propõe considerar a Re-alidade como multidimensional, estruturada em múltiplos níveis, substituindo a visão clássica de uma Realidade unidimensional, com um único nível de manifestação. Se a lógica clássica mantém separados e mutuamente excludentes os opostos aparentes, a lógica do Terceiro Incluído5 os unifica em novo nível de realidade, que por sua vez passa a fazer parte de nova dualidade que se unificará em novo nível de realidade e assim por diante. A Figura 2 exemplifica essa evolução. No Nível de Realidade 1, os contraditórios A e Não-A estão presentes e não podem se conciliar, o que ocorre no Nível de Realidade 2, por meio do terceiro termo T, que inclui os contraditórios do nível anterior em não contraditórios nesse nível. Por outro lado, no Nível 2, o termo T pode se transformar em um novo contraditório (A’) para esse nível de Realidade, oposto ao Não-A’. Essa nova contradição, se não pode ser resolvida nesse nível de Realidade, o é no Nível de Realidade 3, onde A’ e Não-A’ são incluídos por T’ e assim por diante, seguindo por infinitos níveis de Realidade.

Page 89: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

88

Revista LABVERDE

Figura 2: Níveis de Realidade e par de contraditórios.

A metodologia da pesquisa transdisciplinar se assenta sobre três pilares: (a) os níveis de Realidade; (b) a lógica do terceiro incluído; e (c) a complexidade, sendo a discipli-naridade, multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, as quatro flechas de um mesmo arco, o do conhecimento (NICOLESCU, 1999, p. 48). Morin (2003) acrescenta que essa nova abordagem do conhecimento exige uma reforma do pensamento que, por sua vez, exige uma reforma da Universidade: Falo de uma reforma que leve em conta nossa aptidão para organizar o conhecimento – ou seja, pensar (MORIN, 2003, p. 83). O pensamento complexo incorpora e extrapola o pen-samento linear, cartesiano, próprio para a descrição de sistemas simplificados, mas não suficiente para lidar com questões mais complexas. Segue Morin (2003) consi-derando que, sobre o papel da Universidade, esta tem a função de: (a) ritualizar uma herança cultural de valores, saberes e ideias que permitem conservar, memorizar, in-tegrar os conhecimentos; (b) regenerar esta herança ao fazer sua releitura constante, atualizando-a e transmitindo-a; e (c) gerar novos saberes, ideias e valores que farão parte da herança comum futura. Dessa forma, a Universidade é ao mesmo tempo conservadora, regeneradora e geradora de novos conhecimentos, devendo adaptar-se às necessidades da sociedade contemporânea ao mesmo tempo em que mantém viva sua missão transecular de conservar, transmitir e enriquecer o patrimônio cultural universal.

Essa reforma do pensamento e do processo educativo encontra ecos em diferentes trabalhos, além dos de Morin, com diferentes enfoques mostrando horizontes novos para a educação, ciência e tecnologia, como aqueles de Gardner (1995) e colegas da Universidade de Harvard que propõem as Múltiplas Inteligências e Goleman (1996),

Page 90: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

89

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

propondo a Inteligência Emocional e, mais recentemente, a Inteligência Ecológica.

Assim se desdobram essas inteligências:

Lógico-matemática - capacidade de confrontar e avaliar objetos e abstrações, dis-cernindo as suas relações e princípios subjacentes. Matemáticos, cientistas e filó-sofos como Henri Poincaré, Albert Einstein, Marie Curie, dentre outros, apresentam essas características.

Linguística - caracteriza-se por um domínio e gosto especial pelos idiomas, palavras e escrita. Predomina em poetas, escritores e linguistas, como T. S. Eliot, Jorge Amado e Guimarães Rosa.

Musical - habilidade para compor e executar padrões musicais, executando pedaços de ouvido, em termos de ritmo e timbre, mas também escutando-os e discernindo-os. Pode estar associada a outras inteligências, como a lingüística, espacial ou cinestési-co-corporal. É predominante em compositores, maestros, músicos, críticos de música como por exemplo, Ludwig van Beethoven, Caetano Veloso e Phillip Glass.

Espacial - capacidade de compreender o mundo visual com precisão, permitindo transformar, modificar percepções e recriar experiências visuais até mesmo sem es-tímulos físicos. Predomina em arquitetos, artistas, escultores, cartógrafos, navegado-res e jogadores de xadrez, como Michelangelo, Garry Kasparov e Milton Santos.

Cinestésico-corporal - capacidade de controlar e orquestrar movimentos do corpo. É predominante entre atores e aqueles que praticam a dança ou esportes: Pelé, Gar-rincha, Ana Botafogo.

Intrapessoal - capacidade de se conhecer, estando mais desenvolvida em escrito-res, psicoterapeutas, conselheiros, místicos e espiritualistas como Karl Gustav Jung, São Francisco, Dalai Lama.

Interpessoal - habilidade de entender as intenções, motivações e desejos dos outros. Encontra-se mais desenvolvida em políticos, religiosos, comunicadores e professo-res, como Mahatma Gandhi, Chacrinha e Lula.

Page 91: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

90

Revista LABVERDE

Posteriormente6, essas sete inteligências foram acrescidas de outras duas, embora a última ainda não estabelecida:

Naturalista - sensibilidade para compreender e organizar os objetos, fenômenos e padrões da natureza, como reconhecer e classificar plantas, animais, minerais, in-cluindo rochas e gramíneas e toda a variedade de fauna, flora, meio-ambiente e seus componentes. É característica de paisagistas, arquitetos, mateiros, botânicos. São exemplos deste tipo de inteligência Charles Darwin, Rachel Carson e Alexander von Humboldt.

Espiritual/Existencial - investigada no terreno ainda do “possível” e carecendo de maiores evidências. Abrange a capacidade de refletir e ponderar sobre questões fun-damentais da existência e da transcendência. Seria característica de líderes espiritu-ais e de pensadores filosóficos como Jean-Paul Sartre, Margaret Mead, Dalai Lama e Charles Darwin.

Desse amálgama de inteligências, saberes, formas, conteúdos, singularidades, plura-lidades, conceitos, conhecimentos, teorias e práticas, emergem também novas formas de ver, olhar, ser, estar, viver e conviver no mundo. E com eles, novas abordagens para a Ciência e Tecnologia, como as propostas pela Engenharia Ecológica, a Perma-cultura e o Design Ecológico (SANGUINETTO, 2010), que dão conteúdo ao design e estudos em Gaia Terranova, e ainda o Desenho Ambiental, proposto e fomentado por Franco (2008).

De todos os campos do saber e fazer chegam informações de mudanças de padrões, conceitos e atitudes. Aos poucos fica evidente a correção de Einstein quando afirmava que um problema não poderia ser resolvido com o mesmo estado mental que o criou. Os problemas criados ao adotarmos uma visão de mundo mecanicista, necessitam de novo estado mental que permita solucioná-los. Um terceiro termo T que apazigue os opostos aparentemente irreconciliáveis e que não será encontrado no mesmo nível de pensamento-ação que criou os problemas que se busca solucionar. Novas formas de ver, pensar, sentir, perceber, ser, estar e agir no mundo começam a emergir, trazendo consigo o novo e também o receio do erro, próprio de sistemas desconhecidos, não consolidados, insipientes.

Page 92: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

91

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

UM ESTUDO DE CASO: GAIA TERRANOVA

Gaia Terranova é nome fantasia para designar um conjunto de duas residências e seus terrenos, somando 2.400m2, localizados na zona rural do município de Piran-guinho, MG, biorregião7 da Serra da Mantiqueira. O espaço vem sendo utilizado pelo autor e sua família como moradia e Campo de Estudos, Pesquisas, Desenvolvimento e Práticas Sustentáveis. A Figura 3 mostra a localização de Gaia Terranova, em rela-ção a cidades do Sul Mineiro.

Figura 3: Localização de Gaia Terranova em relação a cidades do Sul de Minas Ge-rais (SANGUINETTO, 2010).

Gaia Terranova é um experimento teórico-prático-vivencial, tentando integrar de ma-neira orgânica arquitetura, design, engenharia, ecologia, agroecologia, biologia, filo-sofia e espiritualidade, conferindo um perfil inter, multi e transdisciplinar na concepção e construção de uma casa ecológica integrada a um habitat sustentável, mediados por tecnologias vivas de tratamento de resíduos domésticos e explicitados pela educação para a sustentabilidade. Esses campos de estudos e pesquisas foram conectados pelo design ecológico, que forneceu as bases para o planejamento, interligação e fechamento de ciclos e dos fluxos de matéria e energia, potencializando o estabele-cimento de redes e teias de vida cada vez mais complexas. Ao conjunto visualizamos um eventual embrião de Arquitetura da Complexidade.

Page 93: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

92

Revista LABVERDE

FRACTAL CONHECIMENTO-AÇÃO

Esse experimento propõe reproduzir a complexidade dos sistemas vivos, tendo como elemento de ligação e reverberação entre casa e terreno, o que chamamos Tecnolo-gias Vivas para o tratamento de efluentes e resíduos orgânicos domésticos, resgatan-do água e nutrientes na recuperação de solos degradados e produção de alimentos de base orgânica, potencializando a ampliação da biodiversidade local e incorporando a possibilidade de coevolução entre cultura e natureza. O método do experimento par-tiu de um padrão simples de construção de conhecimento-ação (Figura 4), que atua como um fractal que se vai amplificando e complexificando em diferentes níveis ou camadas, formando uma estrutura de conhecimento não-linear.

Figura 4. Fractal de conhecimento-ação.

Sempre permeado pela Reflexão, que relaciona constantemente os quatro compo-nentes do fractal conhecimento-ação, interligados em rede e retroalimentados entre si, estabelece-se um moto contínuo que engloba:

1. Motivação (problema) - Como tratar biologicamente e reaproveitar água e nutrien-tes de esgotos residenciais?; ou: Como reproduzir os ciclos, teias e redes do ambiente natural no cotidiano de uma família de classe média, aproximando o conjunto casa-terreno dos ecossistemas locais?;

2. Observação da Natureza - Observação do ambiente natural e dos processos vitais envolvidos na ciclagem de nutrientes, autodepuração dos corpos d’água e evolução de ecossistemas alterados – aprendizado direto, vivencial, mediado por processos intuitivos, sensitivos, artísticos, emocionais e espirituais – inteligências múltiplas;

Page 94: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

93

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

3. Estudo e pesquisa - Revisão de literatura, conhecimento acadêmico e técnico-científico - aprendizado mediado pela razão;

4. Ação (solução) - Estágios sucessivos de ação-reflexão, buscando integrar os questionamentos, gerando novos desafios, questionamentos, observação, estudo e pesquisa e práticas renovadas, aproximando as soluções no cotidiano daquelas de-senvolvidas e baseadas em padrões vivos, sustentáveis.

O fractal conhecimento-ação permeou e permeia toda experimentação em Gaia Terra-nova. Para entendermos sua operacionalização, a Tabela 1 apresenta sua utilização e desdobramentos, partindo do Design Ecológico até a implantação e validação das Tecnologias Vivas de tratamento de efluentes, apresentando reflexões sobre ques-tões que nortearam todo processo e o resultado destas reflexões. A cada passo as relações vão-se complexificando, sendo muitas das vezes quase impossível caminhar linearmente e os limites entre teoria e prática, reflexão e ação, observação e estudo tornam-se tênues ao ponto de se dissolverem, conferindo um carácter transdisciplinar ao trabalho. Raciocínio idêntico permeou o processo de concepção, design, planeja-mento e construção da casa ecológica e implantação do habitat sustentável.

Tabela 1: Fractal conhecimento-ação complexificado nas Tecnologias Vivas de trata-mento de águas cinzas e pretas.

Page 95: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

94

Revista LABVERDE

Page 96: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

95

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Page 97: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

96

Revista LABVERDE

Page 98: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

97

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Page 99: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

98

Revista LABVERDE

RESULTADOS

O que estamos caracterizando talvez como um embrião de Arquitetura da Comple-xidade em Gaia Terranova, tem início com o Design Ecológico, aqui utilizado como ferramenta de desenho, planejamento e projeto, permitindo entendimento, estabeleci-mento e tecitura de fluxos, ciclos, redes e processos que se auto-fortalecem, gerando diversidade e abundância e integrando o humano e o natural de maneira mais equili-brada, harmônica e sustentável.

Seguindo princípio do Design Ecológico que propõe que as soluções emergem do local em que se se planeja um dado empreendimento, espera-se que diferentes locais apresentem diferentes condições e especificidades. O estudo dessas condições e especificidades incorporaram no experimento conhecimentos como: a direção pre-dominte dos ventos e brisas; a direção predominante das chuvas e tempestades; a insolação no verão e inverno; a posição do terreno em relação ao norte geográfico e bacia hidrográfica; os cursos d’água e caminhos de drenagem; a posição da casa em relação ao terreno; a vegetação do terreno e bacia hidrográfica; os ecossistemas locais; estradas e acessos; fontes energéticas e de água; o uso e ocupação do solo na bacia; plantações locais; a disponibilidade e diversidade de materiais construtivos locais; qualificação de mão de obra; impactos ambientais do empreendimento; fontes de água e energia; infra-estrutura de transportes, comunicações, acessos; costumes e tecnicas construtivas locais (Figuras 5, 6 e 7).

Figura 5: Estudo de influências abióticas no planejamento das residências.

Page 100: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

99

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Figura 6: Estudo de relações entre casa e bacia hidrográfica.Figura 7: Estudo de elementos naturais e construídos na bacia hidrográfica.

Com base nessas informações foi proposto um design de integração entre residência, terreno e bacia hidrográfica, orientando de um lado os fluxos de matéria e energia e estabelecendo ou reforçando ciclos e redes de água e nutrientes que potencializam a ampliação da biodiversidade local (Figura 8); e, de outro lado, favorecendo que os residentes usufruam de uma qualidade de vida ampliada e em sintonia com a vida ao redor, impactando de maneira positiva tanto os ecossistemas locais como a bacia hidrográfica em que se inserem.

6 7

Figura 8: Estabelecimento de fluxos, ciclos e redes entre casa, terreno e tecnologias vivas (SANGUINETTO, 2010).

As Casas Ecológicas (Figura 9) foram construídas (uma ainda em construção) incorpo-rando elementos, conhecimentos e processos de gestão zero de resíduos; tratamento

Page 101: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

100

Revista LABVERDE

biológico de efluentes com reúso das águas; captação, reservação e utilização de água de chuva; eficiência energética; bioconstrução; iluminação passiva; recuperação e reutilização de materiais diversos (madeiramento, vitrôs, portas, janelas, cerâmicas, etc); agroecologia no manejo do solo e implantação de pequeno sistema agroflorestal; produção orgânica de alimentos; reaproveitamento de resíduos orgânicos por meio da compostagem e minhocultura; recuperação de solos degradados; avaliação de impactos ambientais no uso e ocupação do solo; planejamento estratégico utilizando sistemas de informação geográfica; resgate de técnicas construtivas tradicionais e estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental. O design ecológico forneceu elementos para o projeto da residência, como: quadrante de chuvas, direção predomi-nante das brisas, posição no terreno, insolação e caminhos aparentes do Sol ao longo das estações.

O terreno (Figura 10) foi organizado segundo o design ecológico e foi trabalhado se-gundo conceitos da permacultura e agroecologia, formando Habitats Sustentáveis, caracterizados por curvas de nivel, bacias de contenção, ilhas de vegetação (período inicial) e vários microecossistemas construídos, que vem ampliando e fortalecendo a biodiversidade local e auxiliando na recuperação de solos degradados, recarga de lençol freático, produção de alimentos, fortalecimento da agricultura familiar e mudan-ças de padrões e comportamentos locais em relação ao uso, ocupação e gestão do solo.

Figura 9: Casa Ecológica Figura 10: Habitat Sustentável.

Na interface entre as Casas Ecológicas e Habitats Sustentáveis, as Tecnologias Vivas de tratamento biológico de efluentes permitindo o reúso das águas, tendo por base o design ecológico, a permacultura e a engenharia ecológica, promovem a relação e interação entre terrenos e casas, fechando ciclos de reaproveitamento de resíduos

Page 102: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

101

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

orgânicos oriundos da cozinha (folhas, talos, cascas, etc) por meio da compostagem e tratamento e reúso de águas residuárias na produção de alimentos de base orgânica. As águas residuárias (esgotos) tratados são portadores de água e nutrientes, utiliza-dos por plantas e microrganismos em seu processo de crescimento, via fotossíntese, mecanismo desenvolvido pela evolução para transformar energia solar em energia química. O manejo periódico dessa biomassa, por meio de podas e compostagem, disponibiliza nutrientes e energia para o sistema, seguindo para as hortas e pomar, ampliando a produção de alimentos de base orgânica (sem utilização de venenos ou adubos químicos). Os alimentos assim produzidos são consumidos pelos moradores e o ciclo se fecha, com a produção de novos resíduos e efluentes (Figura 11). Ao mes-mo tempo, a energia cinética das águas de chuva é absorvida no sistema: (a) pela ve-getação; (b) pela cobertura morta mantida como proteção para o solo; (c) por curvas de nível e bacias de contenção, instaladas em todo terreno de modo e impedir a ero-são e carreamento de nutrientes ao mesmo tempo em que facilitam a infiltração, con-tribuindo para a recarga de lençois freáticos e minimização de eventuais enchentes e assoreamento de corpos d’água; (d) por lagoas multifuncionais, parte da Tecnologia Viva de tratamento de águas cinzas (oriundas de pias, tanques, máquinas de lavar, chuveiros), funcionando como lagoas de polimento dos efluentes tratados e reserva-ção de água. Águas pretas (oriundas dos vasos sanitários), por sua vez, formam outra tecnologia viva, composta por duas câmaras anaeróbias seguidas de um banhado construído, vala de infiltração e linha de bananeiras, que absorvem água e nutrien-tes após tratamento resultando em frutos que são consumidos pelos moradores. A biomassa das plantas do banhado construído, bem como das bananeiras pós-produ-ção, são compostadas ou semi-incorporadas ao solo, liberando nutrientes à medida que sofrem a ação de decompositores (microrganismos, larvas, insetos, pequenos animais), sendo reaproveitados por frutíferas (citricos, pessego, mamão, maracujá, amora, pitanga, graviola, ingá, etc), leguminosas (soja, feijões, guandu, leucena, etc), hortaliças diversas (cenoura, alface, rúcula, etc) e espécies nativas da mata atlântica e exóticas, incorporadas ao sistema para formação de pequena agrofloresta (ipês, açai, araucária, pau-brasil, jequitibá, nim, cedro, urucum, etc), além de flores diversas (capitão, cosmos, orquídeas, etc), milho, cabaça e abóbora, dentre outras. Buscou-se, dessa forma, construir moradias com maior eficiência, conforto, valor agregado e responsabilidade socioambiental, aproximando as casas e terrenos de espaços mais sustentáveis, complexos, transdisciplinares e biofílicos.

Page 103: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

102

Revista LABVERDE

Figura 11. Fluxos de matéria e energia nas Tecnologias Vivas (SANGUINETTO, 2010).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entendendo que a Vida é a mestra primeira quando se busca pela sustentabilidade, uma vez que permanece e evolui no planeta há quase 4 bilhões de anos, é nos pro-cessos vitais que se pode buscar os conhecimentos básicos para evoluir a sociedade humana a um patamar sustentável em relação ao planeta que habita. Dessa forma, partiu-se não de condições controladas de laboratório, mas de tentativas de reproduzir sistemas naturais em microescala que permitam solucionar problemas relacionados a assentamentos humanos que se deseja sustentáveis, num futuro próximo.

Em certo sentido, inverte-se a lógica da Ciência Clássica, que fraciona a realidade para compreendê-la, mecanizando processos, linearizando e reduzindo relações comple-xas e especializando o entendimento de mundo, para agora reproduzir a diversidade de vida e as relações e teias que tece em sua relação com o meio, para em seguida medir, analisar e refletir sobre os resultados que se obtém por meio desta abordagem. Explicando a evolução por meio do acoplamento estrutural entre unidades autopoi-éticas e ambiente, propondo ainda que é o Amor o elo que permite a evolução das sociedades humanas, a teoria de Maturana e Varela (2001) embasou a concepção de casas e terrenos como uma unidade autônoma organizacionalmente fechada e

Page 104: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

103

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

estruralmente aberta, na esperança de que um dia se comporte como uma unidade autopoiética em sinergia com o ambiente natural e construído. Caso se alcance este estágio, o sistema deverá se desdobrar ou se “reproduzir” em sistemas semelhantes tanto na microbacia como na biorregião, evoluindo ou contribuindo para ultimar em uma Comunidade Sustentável. O fractal conhecimento-ação apresentado na concepção, implantação e validação das Tecnologias Vivas encontra ecos e faz parte de uma ação mais ampla e comple-xa, originando outros níveis de realidade que buscam apaziguar os contraditórios em Gaia Terranova (Figura 12):

a. Nível de Realidade 1 – casa e terreno dissociados e a idéia de que o desenvol-vimento e permanência do humano no planeta se dá às custas do ambiente natural, que deve ser “dominado” e a “impossibilidade” de se viver de maneira harmônica com o meio estão presentes no modo como vivemos e moramos, criando o primeiro con-traditório.

b. Nível de Realidade 2 – a superação do primeiro contraditório se deu por meio do design de tecnologias vivas, biofílicas, amigáveis em relação ao ambiente e biosfe-ra, promotoras da vida, baseadas em modelos ecológicos que promovem a ponte e interações entre casa (casa ecológica) e terreno (habitat sustentável). Estas por sua vez podem ser vistas como um contraditório às tecnologias duras, expressas pelas tecnologias tradicionais baseadas em modelos mecânicos;

c. Nível de Realidade 3 – a Educação para a Sustentabilidade promove a compa-tibilização entre diferentes visões de mundo, que por sua vez concebem diferentes tecnologias. A educação para a sustentabilidade, ao propor uma visão mais ampla de mundo e educação, mostra-se aparentemente em contradição com a educação tradi-cional, fruto do pensamento cartesiano e da visão mecânica de universo que fraciona a realidade e especializa o conhecimento e desenvolveu a Ciência baseada na Razão.

d. Nível de Realidade 4 – as Comunidades Sustentáveis marcam a transição de saberes, fazeres, conceitos e práticas insustentáveis rumo à sustentabilidade, fomen-tando uma convivência harmoniosa dentro do tecido social e deste com a biosfera. Os processos de produção de bens, produtos e serviços estão agora em sintonia com os processos vivos e a humanidade passa a se ver como um todo indissociado da bios-fera, parte integrante do sistema que mantém a vida no planeta.

Page 105: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

104

Revista LABVERDE

Figura 12: Níveis de Realidade e par de contraditórios em Gaia Terranova.

Com esse trabalho esperamos, modestamente, contribuir para a discussão, evolu-ção e integração de diferentes disciplinas e práticas, inferindo que uma Arquitetura da Complexidade possa auxiliar nossa sociedade na árdua tarefa de superar o atual estágio de dissociação em relação à biosfera e ao planeta que a abriga, construindo pontes que nos permitam inaugurar uma era de cultura de paz em sintonia, harmonia e coevolução com a Vida Planetária.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAPRA, Fritjof. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 2006.

FRANCO, Maria de Assunção Ribeiro. Desenho ambiental: uma introdução à arqui-tetura da paisagem com o paradigma ecológico. 2ª edição. São Paulo: Anablume e Fapesp, 2008.

GARDNER, Howard. Inteligências Múltiplas, a teoria na prática. Porto Alegre: Art-med, 1995.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1996.

MATURANA, Humberto R. e VARELA, Francisco J.. A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. São Paulo: Palas Athena, 2001.

Page 106: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

105

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

MOLLISON, Bill. Introdução à Permacultura. Tyalgum, Austrália: Tagari Publications. 2a Edição, 1994. Edição brasileira: Rede Brasileira de Permacultura.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 6ª edição. São Paulo: Cortez. Brasília, DF: UNESCO, 2002.

MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 8ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

NICOLESCU, Basarab. O manifesto da transdisciplinaridade. São Paulo: TRIOM, 1999.

SANGUINETTO, Evandro. Design Ecológico: projetando e construindo tecnolo-gias vivas para o tratamento de efluentes domésticos com reúso das águas. Dis-sertação. Mestrado em Meio Ambiente e Recursos Hídricos - MEMARH. Universidade Federal de Itajubá – UNIFEI. Itajubá: 2010, 228p.

¹ Autopoiese ou autopoiesis (do grego auto «próprio», poiesis «criação») é um termo cunhado

na década de 1970 pelos biólogos e filósofos chilenos Francisco Varela e Humberto Maturana para

designar a capacidade dos seres vivos de produzirem a si próprios. Segundo esta teoria, um ser vivo

é um sistema autopoiético, caracterizado como uma rede fechada de produções moleculares (proces-

sos), onde as moléculas produzidas geram com suas interações a mesma rede de moléculas que as

produziu. A conservação da autopoiese e da adaptação de um ser vivo ao seu meio são condições

sistêmicas para a vida. Por tanto um sistema vivo, como sistema autônomo está constantemente se

autoproduzindo, autorregulando, e sempre mantendo interações com o meio, onde este apenas de-

sencadeia no ser vivo mudanças determinadas em sua própria estrutura, e não por um agente exter-

no. In http://pt.wikipedia.org/wiki/Autopoiese

² Ver o sítio http://mandelbrot.ovh.org/ onde se pode experimentar a criação on line de fractais.

³ Fonte: http://imgsrc.hubblesite.org/hu/db/images/hs-2007-41-a-large_web.jpg

Page 107: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

106

Revista LABVERDE

4 Deve-se entender por nível de Realidade um conjunto de sistemas invariantes sob a ação de um

número de leis gerais: por exemplo, as entidades quânticas submetidas às leis quânticas, as quais

estão radicalmente separadas das leis do mundo macrofísico. Isto quer dizer que dois níveis de Re-

alidade são diferentes se, passando de um ao outro, houver ruptura das leis e ruptura dos conceitos

fundamentais (como por exemplo, a causalidade). Nicolescu (1999), p. 25.

5 A lógica clássica está baseada em três axiomas: (a) Identidade: A é A; (b) Não-contradição: A não

é não-A; (c) Terceiro excluído: não existe um terceiro termo T (de terceiro incluído) que é ao mesmo

tempo A e não-A. No entanto, com o advento da física quântica, essa lógica tem sido questionada. Ni-

colescu (1999) aborda a questão dizendo que a lógica quântica introduz diferentes percepções, valo-

res e verdades ao axioma da não-contradição, superando a visão binária por outra onde a Realidade

se reveste de diferentes níveis e um terceiro termo T, que seja ao mesmo tempo A e não-A torna-se

possível. No nível da mecânica clássica, por exemplo, onda e partícula são mutuamente excludentes:

ou uma ou outra, e a luz não pode ser devidamente explicada, uma vez que se comporta como onda

e partícula ao mesmo tempo. No entanto, para a mecânica quântica essa contradição desaparece,

pois a dualidade é vista sob um nível de realidade diferente, onde um terceiro elemento “pacifica” a

dualidade, incorporando onda e partícula como quantum, quantidade elementar, indivisível de energia

eletromagnética.

6 Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Inteligências_múltiplas

7 Biorregião: Espaço geográfico que contém um ou vários ecossistemas e se caracteriza por sua topo-

grafia, vegetação, cultura e história humanas comuns (MOUSINHO apud TRIGUEIRO, p.339, 2003).

Page 108: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

ARTIGO Nº6OIKOS: REINTEGRANDO NATUREZA E CIVILIZAÇÃO

Oikos: Reintegrating Nature and CivilizationJosé Otávio Lotufo

Page 109: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

108

Revista LABVERDE

OIKOS: REINTEGRANDO NATUREZA E CIVILIZAÇÃO

José Otávio Lotufo

Arquiteto e urbanista pela Faculdade de Belas Artes da São Paulo (1996), mestre na área de

Projeto Arquitetônico pela FAU-USP (2011).

E-mail: [email protected]

Resumo

Incorporar os princípios ecológicos ao conjunto das atividades humanas requer mu-danças no modelo econômico, ainda baseado em paradigmas ultrapassados, requer mudanças no modo de produção que hoje consome recursos e polui demasiadamen-te, e também requer uma transformação profunda na cultura de valores que persiste em um modelo consumista inconsequente. O processo de formação e transformação da cidade está fortemente condicionado por estes fatores. A precariedade da cidade e seu impacto no meio ambiente revelam o distanciamento histórico entre a lógica mercadológica e mecanicista e as leis naturais que regem o funcionamento dos ecos-sistemas. É urgente uma reintegração harmônica entre as atividades humanas e os processos que regem o funcionamento dos ecossistemas. Esta reintegração deve buscar expressão no desenho de nossas cidades e edifícios.

Palavras chave: Planejamento ambiental, desenvolvimento sustentável, ecologia ur-bana, ecossistemas, arquitetura, urbanismo.

Page 110: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

109

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

OIKOS: REINTEGRATING NATURE AND CIVILIZATION

Abstract

Incorporate ecological principles to all human activity requires changes in the economic model, still based on outdated paradigms, requires changes in the mode of production that now consumes resources and pollutes too much, and also requires a profound transformation in the culture of values that persist in a consumerist inconsequential model. The process of formation and transformation of the city is strongly influenced by these factors. The precariousness of the city and its impact on the environment reveal the historical distance between the market and mechanistic logic and natural laws that govern the functioning of ecosystems. We need a harmonious reintegration between human activities and processes that govern the functioning of ecosystems. This reinte-gration must seek expression in the design of our cities and buildings.

Keywords: Environmental planning, sustainable development, urban ecology, ecosys-tems, architecture, urbanism.

INTRODUÇÃO

O prefixo “eco” presente tanto em ecologia como em economia deriva da palavra gre-ga oikos que quer dizer “morada”. A etimologia destas palavras sugere uma comple-mentaridade entre o conhecimento (logia) e a organização (nomia) do habitar. E o que viria a ser habitar? Podemos nos auxiliar da definição posta por Heidegger de que habitar significa o “nosso modo de estar no mundo”. Em seu ensaio ‘Construir, Habitar, Pensar’, já em 1951, nos alertava que a questão da habitação está muito além de um problema quantitativo. Não se trata tão somente de construir grandes conjuntos para alojar pessoas, para ele habitar é “de-morar-se”, ou seja, “habitar é o nosso modo de estar no mundo”. Habitamos, portanto, a residência, mas este “habi-tar” também se estende à rua, ao bairro, à cidade, ao planeta. “Nosso modo de estar no mundo” é antes de tudo um modo de relacionamento com o outro, com o lugar, com a cultura. Num âmbito maior poderíamos também dizer que habitar é o modo como nos relacionamos com uma grande teia de vetores que se afe-

Page 111: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

110

Revista LABVERDE

tam reciprocamente naquilo que chamamos de ecossistemas. Esta “liberdade de ser”, de “estar no mundo”, segundo Heidegger, deve ser assegurada pela compreensão e respeito a todas as coisas. O egoísmo e a ignorância são, portanto, o que deve ser superado para que o homem aprenda a habitar, ou seja, para que aprenda a “estar no mundo” em harmonia, assegurando assim seu futuro. Assegurar o futuro implica em adotar princípios baseados em novos paradigmas, o que nos conduz de saída a um desafio: deparamos-nos frente a um evidente conflito entre economia e ecologia. A ideia de proteção ambiental destrói os princípios da eco-nomia clássica, pois esta se apoia no equívoco de que a natureza é fonte inesgotável de recursos (FRANCO). A importância de documentos como a AGENDA 21 e relatórios como o do IPCC/ONU sobre novos cenários climáticos, consiste em apontar caminhos a serem seguidos em conjunto pelas diversas atividades humanas no sentido de viabilizar um futuro saudá-vel para as próximas gerações. É fato conhecido o impacto das cidades e da constru-ção civil sobre o meio ambiente. Pensar a cidade do futuro exige uma reflexão sobre qual caminho adotar no processo do desenho, quais os fatores que devem estimular a criatividade e qual o papel do arquiteto, do paisagista, do urbanista e do planejador em contribuir para um futuro melhor. A arquitetura e o urbanismo devem se adequar a um momento histórico que solicita a reintegração das atividades humanas com os processos ecossistêmicos. No modelo de produção industrial tradicional, o produto final é supervalorizado em de-trimento dos capitais natural e humano empregados no processo. O processo indus-trial tradicional se dá de uma forma linear, através do qual os recursos entram numa extremidade enquanto que o produto e seus resíduos emergem no extremo oposto. Os próprios produtos, por sua vez, (na ausência da noção de reuso e reciclagem) tam-bém se transformarão em resíduos no final de sua vida útil. Este modo de produção linear, no qual se apoia também a produção dos espaços urbanos, é a base de um sistema econômico obsoleto, um paradigma ultrapassado que urge ser substituído por um modo cíclico, que consuma menos recurso e produza menos resíduo.

Page 112: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

111

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

REVENDO O CONCEITO DE RIQUEZA

A mentalidade do modelo capitalista em vigor, que molda os atuais processos de pro-dução e consumo, não considera com a devida importância o capital natural, tampouco o humano. Fala-se muito no meio-ambiente e na sociedade como coisas importantes, mas desde que esta preocupação esteja equilibrada com as exigências de crescimen-to econômico. O equívoco reside no fato de que todo o conjunto da economia está apoiado sobre a disponibilidade e a funcionalidade de recursos naturais e humanos. Sua escassez e degradação comprometem o desenvolvimento econômico futuro. De-vemos, portanto, considerar a natureza e a sociedade pelos seus reais valores, como nossos tesouros mais preciosos. Encontramo-nos num momento histórico onde a definição de riqueza passa por uma grande transformação. Até então acreditávamos que as sociedades prosperavam pelo capital criado pelo homem, agora sabemos que o capital natural, recurso cada vez mais escasso, é fundamental. O sistema industrial transforma o capital natural naquilo que consiste a base material de nossa vida cotidiana. Então se torna necessário reco-nhecer a interdependência entre a produção por um lado e o fornecimento de capital natural, por outro. O uso do capital humano carece também de uma consideração mais séria. Sem a provisão de uma vida digna, de bem estar social, cultura, saúde e educação estaremos erodindo nossos recursos humanos e destruindo as bases de um desenvolvimento sustentável. Paul Hawkwn, Amory Lovins e Hunter Lovins, autores do livro Capitalismo Natural chegaram à seguinte conclusão: “O capitalismo, tal qual vem sendo praticado, é uma aberração lucrativa e insustentá-vel do desenvolvimento humano. O que se pode designar como “capitalismo industrial” não se ajusta cabalmente aos seus próprios princípios de contabilidade. Ele liquida seu capital e chama de renda. Descuida de atribuir qualquer valor ao mais importante capital que emprega: os recursos naturais e os sistemas vivos, assim como aos sis-temas sociais e culturais que são a base do capital humano” (HAWKEN e LOVINS). Para a economia clássica os recursos, sejam eles naturais ou humanos, estarão sem-pre disponíveis enquanto houver dinheiro que os compre e o destino dos resíduos não é levado em consideração. Quando se esgotam os recursos naturais não há dinheiro que os faça ressurgir do nada. Se antes a economia era limitada pela capacidade

Page 113: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

112

Revista LABVERDE

de produção ela passa agora a ser limitada pela capacidade de gerenciamento de recursos.

O consumo inconsciente vem erodindo nosso estoque de capital natural além de po-luir o planeta com materiais e substâncias que o ecossistema não tem capacidade e tempo para assimilar. Hawken e os Lovins salientam que apesar da dificuldade em contabilizar o capital natural, tentativas em avaliar seu custo estimaram que os ser-viços que fluem da natureza para a sociedade anualmente quase se igualam ao PIB mundial. É uma boa medida para se avaliar o valor do capital natural na economia. Os sistemas sociais, por sua vez, são erodidos através de uma exploração injusta e insustentável da força de trabalho, desprovendo de qualidade de vida porções con-sideráveis da população. O capital humano corresponde, segundo o Banco Mundial (dados de 1995), ao triplo de todo o capital financeiro e manufaturado registrado nos balanços econômicos globais, desconsiderando ainda desta conta todo o trabalho humano não compensado e os recursos culturais.

Como os capitais natural e humano não costumam ser contabilizados, os prejuízos socioambientais que se dão em longo prazo não são considerados nas equações dos planos, projetos e empreendimentos. Estes prejuízos são resultado de uma má gestão de recursos. Esta falácia se deve ao fato de não se distinguir claramente as diferenças entre preço e custo. O preço é o dinheiro investido e o custo do capital natural e hu-mano é desconsiderado, não entra na conta, sendo ele empurrado para uma situação distante ou futura, não se deixando claro quem vai pagar as contas nem quando. O prejuízo maior ficará para a classe de menor poder aquisitivo que já se encontra em condições precárias de vida, é excluída socialmente e não receberá os benéficos do crescimento econômico. A degradação ambiental e a social acabam por se alimentar reciprocamente em ciclos viciosos indissolúveis. A economia não pode mais se apoiar sobre sistemas lineares de extração, produção, consumo e descarte. Deve sim se apoiar sobre sistemas cí-clicos e renováveis de produção, com gerenciamento e distribuição democrática de recursos, bem estar social generalizado, consumo consciente e gerenciamento de resíduos.

Page 114: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

113

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

A INSUSTENTABILIDADE DO MODELO CONSUMISTA O nosso atual modelo de valor, muito baseado no consumo irresponsável, tem como medida de riqueza a aquisição de bens. Estes bens são frequentemente simbólicos, no sentido de que seu valor reside no significado que atribui ao seu possuidor. Na maior parte das vezes este significado é o que distingue o indivíduo pela classe de poder aquisitivo e reforça a estratificação da sociedade pela renda. Vivemos numa sociedade onde o “ser” foi substituído pelo “ter”. É um modelo que realimenta a segre-gação sócio-espacial que caracteriza patologias ecossistêmicas nos espaços urbanos contemporâneos, e é um modelo nutrido diariamente pelos meios de comunicação em massa, principalmente a televisão, lamentavelmente o principal meio atual de en-tretenimento. Enquanto diariamente a população passa horas em estado catatônico em frente às telas de TV, absorvendo passivamente as informações que moldam sua autoimagem e seu comportamento consumista, a cidade, suas ruas, seu verde, suas praças e espaços públicos e tudo o que poderiam oferecer com lazer, cultura e quali-dade de vida, são abandonados. Um universo simbólico, virtual e imagético se impõe, substituindo o mundo real que se deteriora longe dos olhos desatentos e hipnotizados. O modelo baseado no consumo de bens e produtos e que molda uma cultura de valor tipicamente norte-americana, se proliferou por todo o mundo ocidental principalmente a partir da década de 50, como parâmetro de progresso e qualidade de vida, porém tem se comprovado como um modelo insustentável. Não há no mundo recursos su-ficientes para que este seja um modelo viável de desenvolvimento para as classes sociais e países emergentes. Ao negar assinar um importante documento como o pro-tocolo de Kioto, os Estados Unidos deixaram clara a incompatibilidade de seu modelo econômico com as necessidades ambientais do planeta. A WWF (World Wildlife Fund) define o conceito de “pegada ecológica” de um país, de uma cidade ou de uma pessoa, como o tamanho das áreas produtivas de terra e de mar, necessárias para gerar produtos, bens e serviços que sustentam seus estilos de vida. Dados de 2006 fornecidos pela Global Footprint Network nos mostram estatís-ticas de um aumento de 2% na pegada ecológica da humanidade como um todo em relação ao ano anterior e 22% em relação à década anterior. Este aumento deve-se tanto ao crescimento populacional como ao do consumo per capta. Segundo os dados mais recentes (2006) o atual nível médio de consumo no mundo já supera a capacidade do globo, requerendo 1,4 planetas Terra para atender

Page 115: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

114

Revista LABVERDE

a demanda. Caso todos os habitantes da Terra adotassem hoje o consumo médio de um cidadão norte americano seriam necessários cinco planetas como o nosso. Este modo de vida predatório que já se encontra além dos limites aceitáveis para a garantia de um futuro viável é a expressão em larga escala do processo linear de produção e consumo que esgota os recursos naturais e polui extensivamente o planeta. Uma vez que a Terra não dispõe destes recursos, não será trilhando os caminhos tradicionais de desenvolvimento, e tampouco seguindo como modelo os padrões de valor consumistas, que sua população, em larga escala, alcançará um padrão de vida elevado.

CAMINHOS PARA UMA MUDANÇA Hawken e os Lovins, em Capitalismo Natural, propõe a substituição do modelo de va-lor baseado na aquisição e consumo de bens por outro modelo, baseado em serviços e fluxos. Segundo eles isso poderia contribuir na transformação de uma economia predatória para uma ecológica. Numa economia de serviço e fluxo os fabricantes (ou produtores, construtores, em-preendedores, etc.) deixam de conceberem-se como vendedores de produtos para tornarem-se prestadores de serviço por intermédio de bens duráveis e aperfeiçoáveis. Vendem-se resultados e não equipamentos, desempenho e não máquinas. O que se propõe é uma economia baseada na oferta contínua de qualidade, utilidade e desem-penho e no combate feroz ao desperdício. O objetivo é o aumento do bem estar social, uma melhoria na qualidade da vida humana e a preservação dos recursos naturais. Um modelo de valores baseado em serviços e fluxos é um conceito que pode estimu-lar o aumento na produtividade dos recursos existentes, o que implica no desenvolvi-mento de tecnologias que transforme o processo de produção de linear para cíclico. Ao serem incentivados a aumentar a produtividade dos recursos e a adotar tecnolo-gias produtivas sustentáveis, tanto os produtores quanto os consumidores protegem os ecossistemas e consequentemente, a si próprios e seus descendentes.

Um instrumento importante que pode contribuir para tal mudança e que pode ter uma aplicação imediata, é o implemento de políticas tributárias que adéquam os impostos ao custo real e total da produção, incluindo no custo todo o impacto humano e am-biental. Isto requer visão de futuro, planejamento ao longo prazo. Ao considerar o justo

Page 116: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

115

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

valor ao capital humano e natural, o uso de recursos escassos deve ser encarecido e a utilização de produtos sustentáveis, assim como a adoção de circuitos fechados de produção, deve ser estimulada. Os tributos sobre o trabalho devem também ser reduzidos como uma forma de estimular o capital humano, o que é hoje um recurso abundante. Esta reformulação tributária é importante uma vez que, em curto prazo, o custo das novas tecnologias, produtos e processos sustentáveis de produção é o maior obstáculo para suas adoções em larga escala. Em longo prazo, porém, o retor-no será abundante em capital humano e natural.

O AUMENTO DA PRODUTIVIDADE DOS RECURSOS Cada vez menos os limites para o nosso progresso contínuo são determinados pe-los meios de produção, e cada vez mais pela oferta de recursos naturais. Uma das mais importantes chaves para o emprego eficaz dos recursos financeiros, humanos e naturais é o aumento radical da produtividade dos recursos, isto é, produzir muito mais com a mesma quantidade de recursos. (HAWKEN E LOVINS). Esse deve ser o principal desafio tanto para as novas tecnologias como para o aperfeiçoamento das tecnologias existentes e implica numa revolução nos processos de produção. Ao mul-tiplicar a produtividade com a mesma quantidade de recursos, diminuímos de um lado o consumo dos recursos naturais e do outro a produção de resíduos e poluentes. O aumento da produtividade dos recursos requer a substituição do processo linear de produção pelo cíclico, ou circular. O processo cíclico mimetiza os processos naturais da biosfera eliminando a ideia de desperdício, possibilitando a reciclagem constante e contínua de material e diminuindo a poluição do ar, do solo e da água. Considerar adequadamente o papel da tecnologia no aumento da produtividade evita a postura romântica, presente em algumas correntes ecológicas que prega o retorno ao passado através da interrupção e negação do desenvolvimento tecnológico. Mas também é equivocada a postura que diz simplesmente que a tecnologia trará como o tempo todas as soluções para as questões ambientais e sociais. Não basta afirmar que a tecnologia trará benefícios e soluções, porque ela já se comprovou como um grande fator de impacto sobre o meio ambiente, quando aplicada de forma não sistê-mica ou mesmo predatória. Idem com a economia que explora de forma insustentável o homem e a natureza. Se oculta nesta postura um viés ideológico que busca justificar a continuidade de modelos econômicos insustentáveis. É necessário mudar o enfo-que tecnológico sobre a questão, de modo a substituir um modelo parasitário por um

Page 117: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

116

Revista LABVERDE

modelo sustentável.

Hawken e os Lovins nos lembram de que há pouco mais de dois séculos era impen-sável que um indivíduo pudesse fazer o serviço de outros duzentos homens, porém a industrialização permitiu isto. Porque não deveríamos pensar que uma revolução tecnológica, já em andamento, não possa multiplicar pelo mesmo fator a produtivi-dade utilizando a mesma quantidade de recursos (HAWKEN E LOVINS)? Trata-se, portanto, de usar de forma eficiente um tipo muito específico de recurso, a inteligência humana.

A ABOLIÇÃO DO DESPERDÍCIO, UMA ECONOMIA DE SERVIÇO E FLUXO Taiichi Ohno, o homem que revolucionou o sistema de produção da Toyota, define desperdício como “qualquer atividade humana que absorve recursos sem criar valor” (HAWKEN E LOVINS). Aperfeiçoar um elemento isoladamente do sistema em que está incluído pode prejudi-car a totalidade do sistema. É isso que temos que ter em mente quando consideramos, por exemplo, as propostas de empreendimentos imobiliários autointitulados “susten-táveis”. Algo sustentável em si mesmo (e só em si mesmo) pode funcionar dentro do sistema ao qual pertence como um parasita, que consome recursos de forma “egoís-ta”, isto é, em benefício próprio. Quando dentro de um sistema cada elemento e cada etapa do processo se realiza em harmonia com o conjunto e na proximidade de sua fase sequencial o fluxo é mantido contínuo, os intervalos e conflitos são eliminados, assim como o desperdício de tempo e energia em deslocamentos. Quando reunimos os princípios de maior produtividade de recursos e os ciclos fechados de produção possibilitamos uma nova lógica administrativa, a oferta de serviços de alta qualidade e eficiência e baixo impacto ambiental. No âmbito da cidade a ideia de fluxo sugere que o uso e ocupação do solo reúnam as atividades humanas de forma eficiente, com economia de tempo e energia, propician-do qualidade de vida e sentimento de comunidade. A cidade compacta, democrática, verde, baseada na vida dos bairros enquanto centralidades sustentáveis e conecta-das por um eficiente sistema coletivo de transporte se apresenta como a correção de rumo à prática urbanística da cidade esparramada, setorizada, baseada no uso do automóvel particular, e cuja lógica de distribuição populacional responde a interesses

Page 118: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

117

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

de minorias, descuidando da integração social necessária à cidade sustentável. TRANSPORTE, FLUXO E MORADIA

Um caso relevante nos mostra como a abordagem unilateral de problemas pode pre-judicar o sistema como um todo. A recente obra de ampliação da marginal Tietê em São Paulo trouxe à tona a discussão sobre a permanência de um modelo de desen-volvimento que é no mínimo obsoleto, mas que revela que por décadas nossa cidade se moldou sobre a égide do automóvel, importando um modelo norte-americano por questões fortemente ideológicas, beneficiando de forma injusta e desigual segmentos específicos da sociedade. Este modelo rodoviarista está claramente ultrapassado. Ele beneficia somente quem tem carro e enquanto infraestrutura limitada não suporta a democratização deste benefício. É maléfico ao sistema de drenagem e escoamento de águas, contribuindo enormemente para as inundações. Tem contribuído há déca-das com o espraiamento metropolitano, o que resulta numa tenebrosa desigualdade na organização socioespacial da cidade, reservando a “boa cidade” aos ricos e expul-sando os pobres para as franjas da cidade e áreas de risco, distantes do centro, des-conectadas da cidade e desprovidas de toda a qualidade humana e urbanística. Mas a cidade dos carros tem prejudicado a todos, inclusive os mais ricos, que hoje perderam toda a referência da rua como espaço para a vida e o convívio, uma vez que o tráfego desqualifica a rua como espaço para a vida, transformando-as em “não-lugares”, algo pelo qual se passa o mais rápido possível para ir de um lugar a outro, pois se trata agora de um lugar hostil, poluído, barulhento e arriscado. Como consequência, os mais ricos vivem amedrontados dentro de seus condomínios fechados, carros blinda-dos e shoping-centers. A questão do transporte é fundamental por condicionar todo o tecido urbano, estabe-lecendo assim uma íntima ligação com a questão da moradia. São as artérias para o fluxo de gente, mercadoria e serviços, portanto possuem uma função metabólica vital no ecossistema urbano. Ao colocar as decisões técnicas nas mãos da engenharia de tráfego e nos interesses de empreiteiras e empresas que administram autoestradas, sem considerar todos os outros fatores importantes ao planejamento urbano, descui-da-se de tratar de forma adequada a cidade como uma complexa rede de atividades humanas. A questão não se limita a propiciar maior fluxo de veículos, mesmo porque a curto ou médio prazo, o sistema novamente de satura com a introdução de mais ve-ículos nas ruas. Trata-se, portanto de um planejamento mais amplo que integre vários fatores envolvidos, como a introdução de modalidades de transporte mais eficientes

Page 119: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

118

Revista LABVERDE

e menos impactantes, e a provisão de habitação de qualidade em locais próximos de oportunidades de trabalho. Entre os perversos resultados destas práticas insus-tentáveis está, por exemplo, a remoção de famílias estabelecidas há anos na região com o pretexto de plantar árvores, assumindo de forma demagoga a questão am-biental, como se o bem estar dos grupos humanos não fosse um pressuposto de uma ecologia urbana saudável. Observamos ainda uma total ausência de visão sistêmica que inclua a necessária substituição do modelo de transporte individual pelo coletivo, questões referentes a hidrografia e contenção de enchentes, e questões referentes a oferta local de moradia adequada aos habitantes do local. Curitiba recebeu um grande destaque no livro Capitalismo Natural como exemplo de como as coisas podem ser diferente. O prefeito Jaime Lerner em seu primeiro man-dato passou a tratar com sabedoria os recursos hídricos com um desenho urbano integrado à natureza. As margens de rios e córregos da cidade se transformaram em parques lineares, construíram-se lagos artificiais propiciando alternativas de lazer e descanso e resolvendo o problema de enchentes de forma econômica.

Se para alguém o problema de São Paulo possa parecer muito maior e insolúvel, o exemplo do canal de Cheonggyecheon em Seul demonstra que o que carecemos é de vontade política. O leito do rio, que estava tão poluído quanto o nosso, havia sido co-berto por autopistas e um elevado, nos mesmos moldes daquilo que de forma absurda ainda aparece como propostas para nossas marginais. O projeto de recuperação do rio em Seul removeu as autopistas e o elevado existentes, diminuindo consideravel-mente o tráfego de veículos em toda a cidade, o que foi compensado com a adoção do transporte coletivo que se desenvolveu rapidamente. Nas margens do rio, limpo e recuperado, foram construídos parques lineares hoje fortemente frequentados pela população. Os bairros no entorno dos novos parques sofreram um impacto positivo com uma rápida revitalização (NOBRE).

Page 120: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

119

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Projetos ousados de notável esforço técnico-científico, como por exemplo o desen-volvido por Maria Assunção Ribeiro Franco para as marginais Tietê e Pinheiros, deixa de parecer utópico frente a casos como o de Seul. Se para muitos pode parecer que mudanças radicais na forma de abordar e tratar a cidade possa parecer inviável eco-nomicamente, este artigo busca cumprir a função de refrescar uma visão viciosa, que tende a confundir preço e custo. Estamos pagando muito mais caro pela ineficiên-cia dos modelos adotados no passado. Revertê-los é uma questão de planejamento econômico e urbanístico a longo prazo, com grande redução de custo e geração de riqueza. É possível numa cidade como São Paulo, onde não faltam recursos financei-

Page 121: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

120

Revista LABVERDE

ros, investir fortemente num sistema de transporte intermodal de alta capacidade pro-piciando a recuperação e criação de parques e um sistema de provisão de habitação social como nunca antes presenciamos na nossa história. Hawken e os Lovins respondem a questão da viabilidade invertendo a pergunta da seguinte forma: “Como foi possível criar um sistema econômico que nos diz que é mais barato destruir a Terra e exaurir as pessoas que nutrir ambas? É racional ter um sistema de preços que vende o passado e cobra do futuro? Como foi que criamos um sistema econômico que confunde liquidação do capital com renda?” A CIDADE, PROJETO ECONÔMICO E ECOLÓGICO

“Nossas cidades sempre em multiplicação carregam a ameaça de uma poluição avassaladora e uma sociedade global polarizada en-tre o ‘ter’ e o ‘não-ter’”. (Richard Rogers, Cidades para um Pequeno Planeta)

Os caminhos traçados no processo de construção das cidades guardam estreitas relações com modelos políticos e econômicos atuantes. São por eles condicionados e têm expressado no decorrer da história o distanciamento de uma abordagem so-cioambiental. Sem assumirmos, dentro de uma visão abrangente, que a abordagem sobre a qual tem se apoiado os modelos econômicos é insustentável, não será possí-vel empreender uma mudança capaz de se elevar acima da relação conflituosa entre economia e ecologia, que se expressa também no conflito entre meio construído e natureza. Temos que refletir sobre qual modelo se baseia a ação do homem sobre o meio ambiente em toda a cadeia produtiva, desde a concepção, passando pela extra-ção, produção, consumo e descarte. A cidade tem um funcionamento análogo ao sistema produtivo que a criou. Os mo-delos de desenvolvimento em vigor têm gerado nas cidades condições precárias de habitabilidade e de vida, desencadeando um ciclo vicioso de degradação entre meio-ambiente e sociedade. Estamos diante de uma economia de desperdício e má gestão de recursos, que gera carências e desigualdade. Sua ênfase no lucro em curto prazo compromete o futuro.

Page 122: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

121

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

A cidade contemporânea demonstra claramente isto quando os processos de reno-vação urbana aprofundam a segregação socioespacial promovendo a valorização do solo enquanto mercadoria, causando a substituição da população pela renda, “var-rendo” os mais pobres para regiões distantes e desqualificadas. Efetiva-se assim a pilhagem do nosso futuro e das nossas próximas gerações, assim como se reprodu-zem as injustiças sociais. Os ecossistemas e as sociedades humanas, quando forem considerados a partir de seu real valor enquanto ativos econômicos, deverão tornar os empreendimentos e as operações urbanas mais sistêmicos, ecológicos, sustentáveis e justos. O conceito modernista da máquina de morar, aplicado tanto no edifício como no espa-ço urbano, traduz no âmbito do projeto os preceitos tecnológicos em vigor. Uma mu-dança paradigmática na economia e nos processos de produção implica numa revisão dos aspectos técnicos do funcionamento dos edifícios e cidades. A mesma transição do processo linear para o cíclico que deve ocorrer nas linhas de produção industrial e nos processos econômicos deve encontrar ressonância no projeto arquitetônico e urbanístico. As cidades e os edifícios são organismos dentro de organismos e devem substituir uma relação parasitária por uma relação harmônica e simbiótica. O modelo de cidade que se impôs a partir de princípios de compartimentação e loca-lização das atividades segundo a função, separando os espaços e usos fisicamente e conectando-os por uma grande rede de ruas e transportes horizontais, anula a fle-xibilidade dos espaços e construções impedindo que a cidade funcione como uma unidade orgânica e dinâmica. Somado a isto, a setorização funcional da cidade gera um grande consumo de tempo e energia em locomoções, estas por meios agressivos e poluentes que têm tornado mais e mais hostis os espaços públicos. Richard Rogers, em Cidades para um Pequeno Planeta, comenta que o economista Kenneth Boulding já dizia em 1966 que deveríamos parar de viver em uma economia de ‘velho-oeste’, na qual não se considera limites de território a ser conquistado e de recursos a serem consumidos, e propunha que deveríamos pensar no nosso planeta como uma ‘nave espacial’, com sistema fechado e recursos finitos. Isto nos leva a pensar a cidade como um metabolismo circular, o que traz ao âmbito do planejamento urbano a ideia inerente aos princípios de uma economia ecológica, pela qual se subs-titui o processo de produção linear pelo circular.

Page 123: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

122

Revista LABVERDE

A cidade é como um organismo vivo, possuindo um tipo próprio de metabolismo atra-vés do qual se mantém em constante troca como o ambiente externo em escalas que vão desde a local até a global. Seu sistema inclui uma estrutura física construída e um sistema biológico, humano e natural. Seus processos se renovam num equilíbrio dinâmico e não estático. Os princípios ecológicos, portanto, se afastam da ideia de equilíbrio estático dos economistas clássicos, e referem-se a um processo evolutivo sustentável de mudança contínua. A cidade é um ecossistema que depende do forne-cimento externo de energia e materiais. O que a difere de um organismo natural é a intensidade do fluxo tanto de entrada (energia e materiais) quanto de saída (resíduos). Por não prever produção interna de alimentos, energia, purificação de ar e reciclagem de material acaba funcionando como parasita dos ecossistemas agrícolas e naturais (FRANCO). A reciclagem e reuso de recursos materiais e energéticos, a recuperação de áreas e edifícios degradados no interior do sistema, a restauração e inserção da natureza no meio urbano, são modos de mitigar seu impacto, transformando o meta-bolismo da cidade em circular. A substituição do processo de produção linear pelo cíclico implicará no âmbito da cidade no “aumento radical da produtividade de recursos”, exigindo menos recursos materiais e energéticos para o funcionamento da cidade e diminuindo a poluição. O que poderíamos chamar de “biomimetismo” (HAWKEN E LOVINS) implica na redu-

Page 124: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

123

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

ção do uso dissipador de material, eliminando o desperdício, adotando processos de construção e provisão que possibilitem o reuso e reciclagem de materiais e energia. A adoção em ampla escala de uma “economia de serviços e de fluxo” ajudará a tornar os processos cíclicos vantajosos tanto para os produtores como para os consumidores, e pode no âmbito dos mercados imobiliários, assim como do uso e ocupação do solo, apresentar alternativas mais sustentáveis que as práticas atuais do mercado especu-lativo, e muito mais alinhadas a preceitos de qualidade do que meramente financeiros. Estamos tratando, dentro do âmbito do projeto, de uma complexa rede de relações. E quando falamos de um ecossistema urbano temos que considerar todos os seus com-ponentes. Existe uma estrutura física construída, com ruas, vias, artérias, sistemas de transporte, indústrias, mercadorias, edifícios, equipamentos, e infraestrutura; existe uma estrutura natural, com os rios e cursos d’água, topografia, espécies vegetais e animais, condições climáticas (a natureza é também infraestrutura). Existe também uma estrutura humana, ou social, que inclui toda a sua população e toda a atividade humana, como trabalho, lazer, esporte e cultura. É dentro deste conceito que se vin-cula intimamente as questões ambientais e sociais. Tratá-las de forma isolada é um equívoco que retira da equação fatores relevantes. E só na total consciência e preo-cupação com as questões sociais que podemos tratar efetivamente de uma ecologia urbana. A pobreza e a precariedade social refletidas nas péssimas condições de habitabilidade são patologias e desequilíbrios nos ecossistemas urbanos, com consequências que se estendem aos ecossistemas naturais e à biosfera como um todo. O processo de cura ambiental, desde a escala das comunidades até a global, passa necessariamen-te pela melhora radical na qualidade de vida das populações carentes e pela garantia do bem estar social generalizado. A construção irregular, presente principalmente nas periferias de grandes cidades como São Paulo, apresenta características como ausência de áreas verdes, grande impermeabilidade do solo, geração de ilhas de calor e poluição dos recursos hídricos. Estas características são alimentadas pela ausência de planejamento e fiscalização que decorre na carência de infraestrutura e equipamentos, no distanciamento dos be-nefícios da cidade, gerando uma segregação sócio-espacial que reproduz entre tantos problemas uma violência urbana crescente. E assim se retroalimentam as patologias sociais e ambientais.

Page 125: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

124

Revista LABVERDE

A NATUREZA E A CONSTRUÇÃO DO ESPAÇO, UMA CIDADE PARA TODOS

Existe um debate sobre a questão da regionalização versus internacionalização da ar-quitetura. Trata-se de uma questão que hoje passa por uma resistência à imposição de políticas econômicas globalizantes e insustentáveis. Mas o desenvolvimento de uma arquitetura que se valorize pela presença de características regionais é justificado por questões que vão além da política, economia e cultura, ainda que não deva prescindir delas. Ken Yeang, no seu livro Projetar com a Natureza enfatiza o caráter local do pro-jeto arquitetônico através da integração entre a construção e o ecossistema local, que define para a arquitetura características próprias e regionais. A base para um projeto alinhado a preceitos ecológicos se dá mediante o conhecimento do ecossistema no qual se vai atuar. Uma vez que um ecossistema difere de outro, cada um determinará ao projeto uma série de características particulares (YEANG). Quando reconhecemos as sociedades humanas como parte integrante dos ecossistemas, reforça-se a ideia de que tanto a cultura local como a economia local são dados a serem levados em conta na elaboração de projetos urbanísticos e arquitetônicos. Quando os vínculos de pertencimento entre a comunidade e o lugar são rompidos ou obstruídos por soluções técnicas, porém insensíveis, todo o sistema adoece.

O enfoque sistêmico proposto por Yeang reconhece os vínculos entre os elementos de um conjunto propondo, ao invés de soluções isoladas, soluções integradas. Pode-se assim evitar efeitos não previstos por soluções que são a princípio equivocadas, e tendem ao “otimizar” um elemento de forma isolada, “pessimizar” o conjunto. Além de reconhecer os vínculos, um enfoque sistêmico deve encarar os desafios como oportunidades de transformar de modo profundo a eficiência do sistema. Ao incluir como componentes fundamentais dos sistemas tanto o capital natural como o huma-no, as comunidades e sociedades podem ser abordadas dentro de uma visão integral e sustentável. Uma postura que terá grande relevância no planejamento urbano e nos projetos urbanísticos, assim como nos projetos de habitação. Os sistemas sociais fornecem recursos humanos do mesmo modo que os ecossiste-mas fornecem recursos naturais. Estes recursos podem ser muitas vezes contabiliza-dos facilmente, como o trabalho braçal, técnico e intelectual, mas não se resumem a isto. É preciso considerar recursos não facilmente contabilizáveis como a cultura, a sabedoria, a honra, o amor, e as qualidades que nos definem enquanto seres huma-nos e enriquecem a nossa vida.

Page 126: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

125

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Da mesma forma que o capitalismo tem, no decorrer da história, se utilizado de mé-todos insustentáveis de exploração dos recursos naturais vem, ao mesmo tempo, adotando métodos insustentáveis de exploração dos recursos humanos. A insusten-tabilidade se evidencia no desequilíbrio social, na destruição gradual da perspectiva e do propósito humano de uma parcela considerável da população, principalmente nos países em desenvolvimento. Sempre na busca pelo lucro em curto prazo, o faz através da exploração excessiva e da valorização injusta do trabalho. Tolhe-se com isto a felicidade e toda a possibilidade de desenvolvimento do potencial humano, uma vez que grande parte da população vive num regime de sobrevivência. A ausência de tempo e espaço para o descanso, lazer, esporte e cultura, somada com o stress crescente das grandes cidades, a violência e medo do desemprego, são fatores que desperdiçam e esgotam o capital humano, desmantelando a coesão social e o sentido de comunidade. Um sistema econômico insustentável é aquele que desperdiça recur-sos naturais e também aquele que desperdiça pessoas. Uma cidade que reflita uma postura econômica sustentável deve tratar seus recursos humanos e naturais como os bens mais valiosos. Seus projetos devem ser participativos incluindo empresas e representantes comunitários que devem compartilhar uma visão que transcenda as ideologias partidárias e interesses unilaterais. Saber utilizar-se com sabedoria dos recursos humanos e naturais, desenvolver e ado-tar tecnologias avançadas e sustentáveis, substituir processos lineares por cíclicos, desenhar de acordo com a natureza e seus princípios são as bases para uma cidade humana, ecológica e sustentável onde o valor e os serviços fluem de forma a benefi-ciar a todos. E de forma alguma devemos nos esquecer de incluir à visão ambiental tradicional uma abordagem humanística, onde a cidadania entra como ingrediente imprescindível para uma sociedade sustentável. A lógica que tem moldado historicamente o desenvolvimento de nossas cidades tem prejudicado a formação da cidadania ao excluir grande parte da população daquilo que se oferece de melhor em educação, lazer e cultura. Além disso, violam-se os prin-cípios da gestão participativa previstos no Estatuto das Cidades, dificulta a integração das classes e gera uma tensão que se expressa na insegurança e violência urba-na crescente. São Paulo é neste sentido uma cidade emblemática. O espraiamento incontrolado gerou forte impacto ambiental ao condenar como única alternativa de moradia à grande parcela da população a construção irregular em áreas de proteção ambiental, como nas margens das represas Billings e Guarapiranga ao sul da cidade e na Serra da Cantareira ao norte.

Page 127: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

126

Revista LABVERDE

A cidade “boa” ficou reservada aos mais ricos, uma vez que a valorização do solo nas áreas bem servidas de equipamentos, infraestrutura e qualidade ambiental limitou o acesso a quem não tem recursos, e tem “varrido” a população menos privilegiada para áreas desprovidas de todo o benefício. A cidade irregular periférica, autoconstruída, tem se expandido como uma mancha de óleo. A imagens obtidas por satélite e as fo-tos aéreas da cidade, facilmente obtidas hoje com ferramentas como o Google Earth, revelam a dimensão de nossa pobreza socioambiental, com a ausência de vegetação, impermeabilidade, formação de ilhas de calor e grandes distâncias da cidade formal. O ponto fundamental sobre o qual deve se apoiar um critério eficiente para a habita-ção social está nas políticas urbanas, cujo papel tem no decorrer da história moldan-do essa nossa triste condição. Por isso devemos antes de aprofundar em questões mais particulares enfatizar que o importante momento histórico que passamos requer um novo paradigma para as questões urbanas, que substitua as práticas que têm demonstrado por si mesmas equivocadas. A lógica de ocupação do solo que segue a lógica da expansão ilimitada dos mercados e transformaram em ativos financeiros os espaços urbanos e construções, ao se basear unicamente na movimentação da economia, no lucro a curto prazo, e no interesse de setores específicos, descuida de uma série de consequências sociais e ambientais que tem se convertido em custos altíssimos em médio e longo prazo, configurando práticas distantes de todo preceito de desenvolvimento sustentável.

É unânime a posição de que um projeto deve ser abordado, não como algo isolado de seu contexto, mas como algo inserido e integrado de forma harmônica à cidade. O contexto deve ser considerado como algo que inclui espaço, mas que vai além de questões espaciais. O contexto político, social e econômico adequado é aquele que se oferece como um solo fértil para o florescimento de ideias inovadoras que possam de fato transformar positivamente o processo de desenvolvimento das cidades. Não é adequado que as decisões sobre as intervenções urbanas sejam tomadas de forma isolada atendendo a interesses políticos de minorias, na total ausência de uma abordagem sistêmica e socialmente justa. Não faz sentido que o Estado financie pes-quisas acadêmicas e não utilize o fruto deste investimento. Para não citar somente a USP, existe nas Universidades brasileiras uma vasta produção crítica, reflexiva e propositiva para os problemas urbanos e que oferecem alternativas para uma cidade mais humana e sustentável. Está mais do que na hora do Estado começar a se utilizar

Page 128: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

127

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

de seus recursos técnicos e científicos numa força-tarefa de transformação de nossas cidades.

REFERÊNCIAS

FRANCO, Maria Assunção Ribeiro. Planejamento Ambiental para a Cidade Sustentável. São Paulo:

Annablume, 2001.

HAWKEN, Paul; LOVINS, Amory; LOVINS, Hunter.Capitalismo Natural. São Paulo: Cultrix, 2000.

HEIDEGGER, Martin. Em: http://www.prourb.fau.ufrj.br/jkos/p2/heidegger_construir,%20habitar,%20

pensar.pdf

NOBRE, Eduardo Cusce. Revista AU n.o 191

ROGERS, Richard. Cidades Para um pequeno Planeta. Barcelona: GG,2001.

SZMRECSANYI, Maria Irene de Q.F.. A Americanização da Cidade Brasileira: A substituição de modelos

Urbanísticos em São Paulo no século XX. XIII Economic History Congress. Buenos Aires 2002. Em: http://

eh.net/XIIICongress/cd/papers/41deQ.F.Szmrecsanyi12.pdf

YEANG, Ken. Proyectar com La Naturaleza.Barcelona: GG, 2007.

Internet:

http://www.wwf.org/

http://www.footprinnetwork.org

http://www.ecolatina.com.br/pdf/IPCC-COMPLETO.pdf

http://www.ecolnews.com.br/agenda21/

Page 129: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

3. ENTREVISTAS

Page 130: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

129

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Entre 2008 e 2010 o LABVERDE elaborou uma série de pesquisas na Região do “Polo Cuesta” com a finalidade de experimentar uma certificação verde fundada em critérios de Sustentabilidade Regional e Urbana. As pesquisas resultaram na atribuição de selos LABVERDE de Localização Sustentável. Nesse processo a cidade de Pardinho foi uma das que, em 2010 recebeu o Selo LABVERDE “Eficiência” (Selo Dourado). Segundo as pesquisas essa condição foi alcançada, em parte, pelas atividades de caráter social que o Centro Max Feffer vem desenvolvendo junto à comunidade local. Portanto, a Revista LABVERDE procurou fazer contacto e entrevista com o Centro, na figura de sua criadora, Betty Feffer.

Betty Feffer formou-se eutonista pela Escola de Eutonia da América

Latina, na primeira turma realizada em São Paulo, de 1991 a 1995.

Completou o Curso de Letras pela Universidade de Londres (1965-

1970). Defendeu os Trabalhos de Conclusão de Curso: “Eutonia e De-

senvolvimento Espiritual”, em 1994, e “Eutonia, Profilaxia e Terapêutica

do Stress”, em 2001. É a fundadora e presidente do Instituto Jatobás e

Centro de Cultura Max Feffer, em Pardinho, voltados aos objetivos de

sustentabilidade e ampliação da consciência, junto à comunidade local.

www.centrodeculturamaxfeffer.com.br

ENTREVISTA

Betty FefferCentro Max Feffer: um centro de referência em cultura e sustentabilidade no Polo Cuesta, Pardinho, SP.

“Os dois primeiros anos foram tempos de sensibilização e de aproximação entre o CMF e a comunidade. A nova fase é de efetiva apropriação do espaço. Nesse processo, as partes inte-ressadas estão envolvidas - crianças frequentadoras da praça, vizinhos e moradores próximos, na intenção de criar um am-biente harmônico e integrado entre CMF, e o entorno.”

Page 131: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

130

Revista LABVERDE

LABVERDE - 1) Betty, como surgiu a idéia da criação do Centro Max Feffer (do-ravante designado CMF)? E a escolha do bambu como tema principal de sua arquitetura?BETTY - O Instituto Jatobás (IJ) já atuava no município de Pardinho implementando o modelo Ecopolo de Desenvolvimento Sustentável, dentre suas frentes de atuação, diagnósticos econômicos e socioambientais, cursos de capacitação de educadores da rede pública, seminários sobre o manejo do bambu e apoiando a iniciativas de agricultura familiar.Para fortalecer sua frente de atuação cultural e criar um maior vinculo com a cidade, já que a sede do IJ é na fazenda dos Bambus, uma área rural dentro do município, propôs-se construir um espaço de convivência para sustentabilidade enfocando a pro-moção de mudança de comportamentos visando a construção de um caminho susten-tável para Pardinho. Surge assim, o Centro de Cultura Max Feffer, que depois passa a ser o Centro Max Feffer – Cultura e Sustentabilidade.

LABVERDE - 2) Fale-nos da ligação entre o CMF e o Instituto Jatobás.BETTY - O Centro Max Feffer foi idealizado e construído pelo Instituto Jatobás, para servir a comunidade sendo um instrumento para a implantação do modelo Ecopolo de Desenvolvimento Sustentável. Além da história da família ser bastante vinculada a área da cultura e homenagear Max Feffer, que planejava um espaço de cultura para o município.

LABVERDE - 3) Como se deu a escolha do lugar, dentro da Cidade de Pardinho, onde seria construído o CMF?BETTY - A proposta foi construída em parceria com a prefeitura, pois a sugestão era de um espaço público gerido pelo poder público municipal, IJ e comunidade. A prefei-tura sugeriu então que a construção fosse feita na praça, onde já havia uma pequena estrutura de palco e banheiros. Isto acordado, a proposta inicial foi aproveitar a estru-tura e ampliá-la.

LABVERDE - 4) De onde provêm os recursos que mantêm o CMF e suas ativi-dades? O CMF conta com parceiros nacionais e/ou internacionais?BETTY - Os recursos que mantém o CMF provêm primordialmente do IJ e a prefei-tura apóia com pessoal, supre ainda alguns gastos administrativos, de manutenção e apoio logístico para alguns eventos. No caso de eventos, algumas vezes também há colaboração dos próprios artistas que se sensibilizam com a missão do IJ e empresas patrocinadoras.

Page 132: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

131

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

LABVERDE - 5) Como é a participação do CMF junto à Prefeitura de Pardinho e outras instâncias governamentais e vice-versa?BETTY - O CMF tem parceria com a prefeitura de Pardinho na parte de manutenção de infraestrutura e gerência do espaço, atualmente sob responsabilidade do IJ, mas que está construindo um caminho para o estabelecimento de uma gestão tripartite – prefeitura, IJ e comunidade. Há também parceria com a Prefeitura de Botucatu e com a Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo.

LABVERDE - 6) Fale-nos da relação do CMF com as escolas municipais?BETTY - O CMF funciona como apoio às iniciativas da comunidade e de entidades, como as escolas. Assim, professores podem utilizar o CMF para desenvolver aulas, promover exposições e eventos. Em 2010, por exemplo, foi realizada uma parceria com as escolas de ensino fundamental no projeto de Olimpíadas da Língua Portu-guesa (MEC). Desse trabalho, houve desdobramentos para inclusão de atividades pedagógicas transdiciplinares com o apoio do CMF no plano escolar de 2011.

LABVERDE - 7) Como se dá o contato do CMF com a Praça onde está localizado e seu entorno?BETTY - O CMF foi construído na praça com o apoio da prefeitura. Por meio de en-contros nas escolas, o projeto do CMF foi apresentado com amplitude à comunidade que foi convidada a participar do processo, dando sugestões, colocando suas neces-sidades e expectativas a cerca desse novo espaço.Os dois primeiros anos foram tempos de sensibilização e de aproximação entre o CMF e a comunidade. A nova fase é de efetiva apropriação do espaço. Nesse processo, as partes interessadas estão envolvidas - crianças frequentadoras da praça, vizinhos e moradores próximos, na intenção de criar um ambiente harmônico e integrado entre CMF, e o entorno.

LABVERDE - 8) Como o CMF interage com as festas e manifestações da cultura tradicional de Pardinho e Região?BETTY - A agenda de eventos do CMF é construída para valorizar as manifestações da cultura local. Assim, procura-se não coincidir datas de eventos e disponibilizar-se como parceiro nas festas e manifestações tradicionais, inclusive levando para eventos fora do CMF conceitos práticos de sustentabilidade como minimização do lixo e com-pensação de carbono.

Page 133: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

132

Revista LABVERDE

LABVERDE - 9) Quais as ligações do CMF com o Projeto de Desenvolvimento Eco-Turístico “Polo Cuesta”, da Secretaria de Esporte e Turismo do Estado de São Paulo?BETTY - O CMF não tem participação formal no Conselho do Polo Cuesta, mas de-senvolve atividades que servem como atrativo turístico e pedagógico para esse cir-cuito regional. Além disso, em parceria com a prefeitura de Pardinho, apoia a secre-taria de turismo para que essa frente possa ser desenvolvida no município a fim de torna-la um setor econômico viável, que fortalece a estrutura social e respeita o meio ambiente.

LABVERDE - 10) O que mudou nas atividades do CMF, desde o ano de sua funda-ção em 2008, que não foi previsto no projeto original?BETTY - Ampliação/Sensibilização para público externo e Aprofundamento/Conheci-mento para público interno (equipe e colaboradores), que passam a ser a referência da comunidade nas questões de sustentabilidade.

LABVERDE - 11) A senhora, como criadora do CMF, imaginou que a ação do mesmo poderia ter respostas tão rápidas de suas atividades, por parte da co-munidade local e na mídia em geral, dada a sua fundação ter sido tão recente (2008) ?BETTY - No início não se sabia quanto tempo seria necessário para avaliar os efeitos da intervenção do CMF, foi realmente uma agradável surpresa poder, hoje, em menos de dois anos,perceber esse retorno.. (sugestão... mas nosso projeto de desenvolvim-ento sustentável é muito mais ambicioso, trata-se de tornar Pardinho referencia mun-dial em sustentabilidade nos próximos 20 anos, e esse tempo já começou.

LABVERDE - Agradecemos muito a sua participação!

Page 134: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

4. DEPOIMENTOS

Page 135: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

134

Revista LABVERDE

Beatriz Burckas Ribeiro Guerra, 37 anos, é formada em Ciências Bio-

lógicas/Licenciatura - UNESP/ Botucatu. Coordenou o primeiro movi-

mento de artesãos de Pardinho e criou exposição itinerante de fotos de

Pardinho, valorizando a cultura local. Foi representante no Pólo Cues-

ta, no CEDEPAR (Consórsio de Estudos, Recuperação e desenvolvi-

mento Sustentável da Bacia do Rio Pardo), no Conselho de Turismo

de Pardinho e no Grupo de Trabalho para a Regulamentação da APA.

Atualmente é coordenadora das atividades do Centro de Cultura Max

Feffer/Instituto Jatobás desde 2008 como coordenadora de projetos na

área de Educação para a Sustentabilidade.

DEPOIMENTO

Bia GuerraInstituto Jatobás: atuação na cultura e valores de sustentabilidade junto à comunidade de Pardinho.

O Instituto Jatobás tem uma atuação transversal na qual a educação é uma das princi-pais áreas de ação no processo de trans – formação para uma cultura embasada nos valores da sustentabilidade.

Nesse sentido, incorpora a educação em todo seu trabalho, seja em seus projetos com a comunidade, relacionamento com parceiros ou capacitação de sua equipe e colaboradores. A própria forma de administrar o Centro Max Feffer é um diferencial na construção de possibilidades mais sustentáveis. Temos dois bons exemplos disso:

Os encontros em círculo, com momento de acolhimento, para compartilhar ideias, poesias, preces ou um lanche gostoso contextualizam um espaço rico em trocas por parte de todos os envolvidos – de gestores à equipe de manutenção, passando pelos prestadores de serviço.

Page 136: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

135

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Em 2010, um dos seguranças do CMF conversando com algumas das crianças, em sua maioria carentes, que frequentam a praça e o CMF contou que o pequeno rio que passa pela nossa cidade, o rio Pardo, fica grande e logo a alguns quilômetros tinha cachoeira. As crianças empolgadas disseram que gostariam de conhecer esse lugar e o rapaz combinou de levá-los um dia em seu carro. Já dá para imaginar que a história se espalhou como fogo na palha e dias depois já havia muitas mais crianças queren-do conhecer a cachoeira. O segurança compartilhou a história com o gestor do CMF, solicitando ajuda, talvez como motorista de mais um carro.

O que poderia ser um simples combinado entre colegas de trabalho foi conduzido para a equipe do CMF em uma reunião, pois talvez além de ir conhecer a cachoeira o passeio poderia ter um lanche ou uns livros da biblioteca... Todos os funcionários se dispuseram a colaborar voluntariamente no passeio que foi sendo alimentado de mais possibilidades com as diversas idéias que iam surgindo e foi necessário marcar uma série de outros encontros, pois o que seria a princípio, um passeio para mostra a cachoeira do nosso rio passou a ter uma proposta mais ousada de aproveitar a oportu-nidade e levar mais conhecimento sobre o lugar onde vivem. Os próprios funcionários julgaram importante mostrar onde nascia o rio, como ele era na cidade até chegar na cachoeira, mas ainda seria interessante mostrar para onde esse rio continua, pas-sando por Águas de Santa Barbara, estância que se beneficia da água que nasce em Pardinho e quem sabe chegar até Paranapanema, onde ele deságua... Junto com o roteiro cresceu as possibilidades de fazer um lanche comunitário, de parceria com os comerciantes, com a prefeitura para o transporte, pois o grupo poderia ser maior que apenas a vaga de dois carros, afinal era uma oportunidade para oferecer “algo mais” às crianças. Isso tudo foi iniciativa dos funcionários que tinham o apoio do CMF. Rotei-ro pronto, livros e histórias escolhidas para contar, lanche patrocinado, apoio da prefei-tura – o que faltava? Quem conduziria e explicaria tantas maravilhas do nosso rio para as crianças? Ninguém se sentia capaz e conhecia o trajeto da nascente, cidade, até a cachoeira com conhecimento para compartilhar para um grupo de crianças. Assim foi organizado um dia de passeio para a própria equipe. Conheceram a importância da região em que o município está localizado, como a Cuesta, o divisor de águas das bacias do Tiete e Paranapanema, o início da área de recarga do Aqüífero Guarani, a zona de transição entre Mata Atlântica e Cerrado; a nascente, os afluentes ignorados pela urbanização até chegar a cachoeira. Vivenciado a experiência poderiam compar-tilhar com as crianças. E assim foi feito.

Page 137: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

136

Revista LABVERDE

A história repercutiu no IJ que já utilizou parte do roteiro para uma das oficinas práticas de sustentabilidade para a própria equipe, mas também entre as outras crianças da cidade até chegar nas escolas. O que no desenrolar da criação da expedição passou a ser um dos ideais dos funcionários do CMF – que a expedição se replicasse!Meses depois surge a oportunidade de oferecer a várias turmas das EMEF um reco-nhecimento por terem participado da Olimpíada de Língua Portuguesa do MEC sob o tema O lugar onde vivo. O passeio organizado pela equipe poderia ser replicado, pelo menos em parte. Mais de 300 alunos e seus professores foram conhecer o lugar onde viviam, se alimentando de conhecimento, lindas paisagens e literatura. Alimentados, foram escrever novamente poesias – agora não mais para o concurso. O resultado empolgou IJ e escolas. Os poemas serão publicados com direito a tarde de autógrafos pelos alunos e os professores e alunos que não participaram pleitearam que a ativida-de fosse inserida no planejamento escolar.

Agora, professores são capacitados para assumirem a condução e criação de novos roteiros que agreguem o conhecimento de cada disciplina com o lugar em que vivem e disponibilizem, vivenciem com seus alunos.

Lembram, tudo isso surgiu do apoio a uma pequena ideia...

A segunda história é sobre estar atento as oportunidades.

Antes é preciso saber que o CMF foi construído em Praça Pública e por questão de segurança um parquinho infantil foi desativado. Depois do CMF inaugurando, o parque não foi mais montado. As crianças e famílias comentavam a necessidade do espaço, e buscou-se a prefeitura para reinstalação apenas com solicitações institucio-nais. Tempos depois uma menina de aproximadamente 12 anos foi escolhida pelas crianças freqüentadoras da praça para pleitear a volta do parque junto ao CMF. Soli-citou um tempo do gestor e contou que entendia que o espaço do CMF era para ser usado, mas nem sempre poderiam correr, brincar, gritar, pois atrapalhariam as ativi-dades desenvolvidas no CMF, mas que gostariam de ter um espaço para brincar. Que gostam de jogar bola, mas entendem que o CMF não é o lugar adequado e que jogar no jardim está destruindo as plantas. Ela, em nome das outras crianças queria o apr-que para brincar. O gestor poderia apenas ouvir ou dizer que iria acionar a prefeitura, já que a praça é um espaço de responsabilidade pública. Mas foi além e sugeriu que se o problema era de todas as crianças, que se reunissem todos para uma conversa. A menina fez os convites, distribuiu para todos os vizinhos mirins do entorno do CMF.

Page 138: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

137

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Uma semana depois 30 crianças entre 7 e 13 anos estavam reunidas em circulo, crian-do regras para convivência naquele momento, falando em seu momento e ouvindo to-dos os colegas, apresentando suas necessidades, criando soluções. O encontro pre-visto para no máximo uma hora, para não cansar ou dispersar as crianças se estendeu por duas horas e meia em total concentração e dedicação das crianças, interessadas em encontrar formas de construírem o campo de bola, pois foi essa a necessidade por eles percebida, e também construírem o parquinho, pois muitas crianças menores não estavam lá, mas que certamente era o que gostariam.

No final do encontro um sonho comum foi planejado e uma semente foi plantada por cada criança, representando o sonho a ser cuidado até o próximo encontro em quinze dias.

Até hoje não havia presenciado um espaço formado por tantos adultos ou crianças, consideradas desinteressadas, desobedientes, com comportamentos difíceis que fos-se tão harmonioso e eficiente, gerando frutos de parcerias, criação, responsabilidade compartilhada.

O trabalho ainda está em andamento. As sementes vingaram e cada criança retor-nou com seu copinho agora com um brotinho de salsinha, as que morreram tiveram nova oportunidade de plantar. Agora participam para elaborar o orçamento para cons-truir campo e parque. Para isso pais com competências em construção, conhecidos que podem doar material, amigos que podem ajudar serão convidados a participar da construção desse sonho. E para que ele seja sempre cuidado junto com a praça o grupo de crianças foi convidado a formar uma equipe de guardiões da praça. E para isso, novas oportunidades surgiram, pois para cuidar é preciso conhecer. E é isso que farão além de construir o espaço para eles: aprender a desenhar, pintar e conhecer todas as plantas da praça, fotografá-las e cuidá-las.

Page 139: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

138

Revista LABVERDE

O mês de maio de 2011 provavelmente entrará para a História do Brasil como um período no qual a questão ambiental virou assunto nacional e onde foi testada a mais dramática correlação de forças entre diversos setores organizados da sociedade civil e o pesado interesse de poucos sob o emblema da chamada bancada ruralista da Câmara de Deputados (Congresso Nacional).

No epicentro do embate (que deveria ter sido um debate), o Código Florestal Brasilei-ro. Lei federal elaborada originalmente em 1935 e objeto de aperfeiçoamento 30 anos depois, tem como finalidade precípua garantir a conservação do patrimônio florístico e a apropriação adequada dos recursos naturais no território nacional e é, no mo-mento, alvo de disputa com motivações econômicas, ideológicas, partidárias, éticas e científicas; enviada para votação na Câmara dos Deputados o projeto substitutivo do Deputado Aldo Rebello (PC do B) propôs alterações importantes no termo da lei que, em sua base conceitual e de aplicação, significam um retrocesso na perspectiva de se buscar um modelo que preserve a integridade ambiental dos remanescentes florestais, hidrológicos e edáficos do país e forneça alternativas sustentáveis para a ocupação dos solos urbano e rural.

Catharina Cordeiro LimaEm pauta, o Código Florestal

Catharina P. Cordeiro dos Santos Lima é Arquiteta pela Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, Professora Dra. Da Faculdade de Ar-

quitetura e Urbanismo da USP, Coordenadora do Grupo de Disciplinas

Paisagem e Ambiente e Coordenadora do Laboratório Paisagem Arte

e Cultura da FAUUSP.

DEPOIMENTO

Page 140: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

139

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

O pomo central da discórdia tem sido amplamente divulgado: setores organizados do agronegócio, grandes empresas nacionais e estrangeiras de celulose e papel e agentes dos interesses imobiliários pressionam por mudanças no Código a fim de que o mesmo se coadune aos interesses dessa parcela da sociedade, em detrimento de uma política socioambiental mais ampla para o campo (mas, também para a cidade) capaz de garantir a integridade e o sustentável uso do capital natural do país acomo-dando, também, a produção da agricultura familiar camponesa, a rigor responsável por 70% do que o brasileiro come, segundo o último censo do IBGE.

Em jogo, pesados interesses econômicos cujas motivações são claras e, em última análise, dizem respeito às escolhas que o Brasil têm feito quanto ao uso do seu ter-ritório, ao modelo econômico agrícola e agrário ainda calcado em uma matriz mo-nocultora, contaminadora e esgotadora do seu solo e das suas águas (o Brasil é o país que mais utiliza defensivos agrícolas no mundo, alguns, inclusive, ilegais); entre outros, o que está em cheque é a expansão do modelo agroexportador (e energético - os biocombustíveis) cujo foco são as commodities baseadas na produção de grãos. Ideologias à parte (se o Brasil deve, ou não, exportar commodities como a soja para “engordar animais no exterior”), não se trata tão somente de optar pelo uso do territó-rio como mercadoria internacional em detrimento da produção de alimentos, mas, de como essa apropriação territorial é feita.

O substitutivo do Dep. Aldo Rebello propõe, genericamente falando, a redução (e mais larga ocupação) de Áreas de Preservação Permanente –APPs fluviais, vertentes acentuadas, topos de morro, áreas florestadas e da chamada Reserva Legal. Tam-bém propõe anistia para os crimes ambientais ocorridos até o ano de 2008. Deve-se ressaltar ainda que a simples menção de uma anistia mais ampla tem aumentado dramaticamente o processo de devastação florestal em estados como o Mato Grosso ; nesse processo reabilitou-se, inclusive, a prática criminosa do chamado “correntão” que consiste na delimitação de um perímetro a ser desmatado (sem nenhum cuidado com os animais habitantes) com pesadas correntes, puxadas, a seguir, por tratores poderosos que arrastam, então, toda a vegetação (incluindo árvores adultas) que em seguida será queimada. A prática é ilegal e mesmo assim foi retomada.

O Governo Federal, por sua vez, buscou costurar um acordo capaz de mediar o con-flito entre o lobby ruralista e os deputados e setores ambientalistas; esse acordo foi alterado às pressas por parlamentares (incluindo o próprio Aldo Rebelo) e aprovado na Câmara no dia 24 de maio passado.

Page 141: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

140

Revista LABVERDE

O Governo da presidente Dilma Roussef tem compromissos ambientais internacionais e será cobrado por isso, pois vai ser progressivamente difícil, na Europa, encontrar compradores e/ou consumidores de produtos brasileiros às custas da devastação am-biental e manchado com o sangue do campo; e aqui temos outra questão gravíssima, denunciada pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil: a CNBB enviou ao Go-verno uma lista contendo o nome de mais de 1.800 trabalhadores rurais ameaçados de morte por latifundiários e madeireiros por lutarem contra os desmandos do campo, o que inclui o desmatamento ilegal, a grilagem de terras indígenas e de quilombolas, o trabalho escravo, a contaminação do solo e da água e o solapamento de nascentes e apropriação de APPs fluviais, entre outras práticas perniciosas - um corolário de cri-mes socioambientais, perfeitamente qualificáveis no termo da Lei.

A ministra-chefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos do Governo Federal, Maria do Rosário, assumiu publicamente a impossibilidade de o Estado garantir a vida dessas pessoas ameaçadas, pois,segundo suas palavras, seria necessário destacar um contingente razoável de policiais (na proporção de 8 para uma pessoa); pouco depois dessa sua declaração na mídia televisiva, mais um trabalhador foi morto – o Sr. Adelino Ramos, líder de movimento camponês e sobrevivente do chamado “mas-sacre de Corumbiara”, assassinado em Porto Velho (RO) por denunciar os crimes de corte e exportação ilegal de madeira na Amazônia; dias antes, os extrativistas José Claúdio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva foram também executados por motivos similares. Desde Chico Mendes (morto em 1988), passando pela irmã Dorothy Stang (2005) vários trabalhadores e defensores dos recursos e povos da flo-resta já foram assassinados pelos mesmos motivos. A questão envolvendo o campo é, portanto, agrícola e agrária ; não há como aprofundar o assunto sem fazer essas relações. A sensação de insegurança no campo é a mesma nas cidades – territórios onde o Estado não chega e para cujos dramas sociais (e fundiários) não dá respostas; é um sentimento de desamparo , de “terra sem lei” e de guerra (mais do que luta) de classes na origem do problema.

Adicione-se, assim, ao drama do campo, o das cidades. Com o avanço sobre a base biofísica dessa forma inconseqüente, repetem-se anualmente catástrofes como (só para falar de 2011) a das Serras Fluminenses (que ocuparam vertentes), da metrópole paulistana (que impermeabilizou o solo urbano) e da cidade do Recife (que aterrou seus mangues), como se estivéssemos diante de uma espécie de “crônica da morte anunciada” – perdas humanas e materiais se repetem anualmente em várias cidades do território nacional, como tem sido amplamente divulgado pela mídia aos brasileiros.

Page 142: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

141

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

Com as cidades assentadas de maneira insustentável sobre sua base natural é evi-dente que o Código precisa de um aprofundamento crítico capaz de fazer frente e dar respostas ao drama já consolidado – habitação precária sobre APPs - mas, também o avanço, ao largo da lei, do mercado imobiliário. A complexidade do assunto no meio urbano, que tem suas características próprias, demanda um aprofundamento crítico com vistas a “segurar” o que ainda resta e pensar em alternativas (de planejamento, projeto e gestão) para o que foi consolidado à revelia do Código ainda vigente, incluin-do a possibilidade de compensações ambientais e ajustes de conduta, aliando-se, por fim, uma revisão bastante crítica das políticas de habitação social no Brasil que, em última análise, ampara-se em leis federais socialmente avançadas (como o Estatuto da Cidade) e uma prática urbana anacrônica incapaz de atender a vicissitudes sociais e ambientais envolvidas.

É importante ressaltar, ainda, a atuação recente do Ministério Público com relação ao assunto. No Seminário referido, representantes do MP acenaram com a possibilidade de um último recurso para vetar (caso as instâncias próximas não o consigam) o texto da reforma do CF sob a constatação de que este último fere a Constituição Brasileira. O parecer do MP, em seu site, é claro e bastante representativo desse posicionamento merecendo ser consultado para que se entenda melhor essa perspectiva.

Em tempo, (uma pequena reflexão sobre o tempo das coisas)

O tempo da ciência. No processo de conflito na discussão do Código, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciência (ABC) elaboraram um documento bastante crítico e com base científica sobre o tema chamado “O Código Florestal e a Ciência – contribuições para o diálogo”, tornado público no site da SBPC; o documento, que tinha como objetivo subsidiar as discus-sões em torno das mudanças do CF foi fruto de um esforço acurado de Grupos de Trabalho que congregaram especialistas dos mais diversos campos do conhecimento, em um trabalho interdisciplinar e supra-ideológico/partidário; todos sabemos que o rigor requerido para a investigação científica demanda um tempo próprio a fim de se ter condições para o empreendimento da pesquisa, pautada por base confiável de dados, com a ampla consideração das variáveis envolvidas e dos prós e contras para fundamentar as escolhas; diante da complexidade socioambiental do tema, a SBPC “pediu a sociedade” um período de dois anos a fim de congregar técnicos, cientistas, acadêmicos e a sociedade capazes de fazer frente à envergadura desse trabalho.

Page 143: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

142

Revista LABVERDE

Nada mais sensato. A complexidade do assunto e o número de variáveis envolvidas clamam por isso.

Em 07 de maio passado, o Coletivo Curupira reuniu cerca de 350 pessoas e 50 entida-des em um Seminário Nacional sobre o Código Florestal, encontro de representação plural onde ao longo do dia técnicos, políticos e cidadãos debateram as motivações e prováveis conseqüências do substitutivo do deputado. Do seminário resultou um ma-nifesto em repúdio ao substitutivo do deputado Rebello e com ênfase na necessidade de se discutir com calma o assunto.

Alternativas técnicas viáveis foram apresentadas pelas pesquisas de especialistas como o Engenheiro Florestal Prof. Dr. Paulo Kageyama (ESALQ-USP-Piracicaba), demonstrando a alta produtividade de certas culturas agrícolas, plantadas com rigoro-sos critérios em Áreas de Preservação Permanente, em um esforço conciliatório entre natureza e apropriação humana e dentro da capacidade de suporte dos ecossistemas ribeiros; esse trabalho caminhou no esforço da superação de pressupostos radicais tanto quanto ao uso ou não de tais áreas e de se uma abordagem agro-florestal é ou não produtiva. A pesquisa e atuação profissional do professor e pesquisador dão pis-tas para um entendimento mais abrangente desses ecossistemas e sinaliza para uma postura conciliatória, entretanto, sustentável.

O tempo da sociedade. E o povo brasileiro? O que acha disso tudo? Bem, a nação tem assistido entre um misto de apatia (“o assunto não tem a ver comigo”) e perple-xidade (cidadãos comuns, movimentos sociais e organizações não-governamentais e outros setores progressistas da sociedade) o bate-boca no Congresso, suas cenas deploráveis e acordos manipulativos e antidemocráticos, feitos às pressas.

Por ocasião do Seminário promovido pelo Coletivo Curupira, aventou-se a perspec-tiva democrática de uma consulta à população. Nada mais justo e ético; a sociedade brasileira precisa se apropriar do espaço público da discussão ampla e irrestrita; o que o povo pensa sobre o assunto, porém, ainda é nebuloso. Entretanto, é preciso trabalhar no sentido do acesso ao conhecimento, debater o assunto não apenas em fóruns especializados, mas, nas escolas, nas universidades, no conjunto da socieda-de como um todo e isso, evidentemente, demanda tempo; sim, pois se um plebiscito fosse realizado hoje, provavelmente teríamos a trágica repetição do que ocorreu com o plebiscito das armas, onde o povo votou sob a égide do medo e da desinformação; com a campanha acirrada do lobby ruralista por meio da Grande Mídia, não acredito

Page 144: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

143

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

que tivéssemos um resultado fruto de uma consciência ambiental compreensiva, ou pelo menos, minimamente informada e amadurecida no tempo.

O Brasil que endossou e/ou votou favoravelmente ao substitutivo do referido depu-tado é o Brasil do atraso social, da impunidade ao crime, mesmo quando explícito, do anacronismo ambiental; em última análise está na contramão da História em um momento onde a humanidade já se deu conta de que de sua ética ambiental depende a sua sobrevivência; acordos e protocolos internacionais, progressivamente, buscam (muitas vezes sob forte pressão e notórias omissões) outros conceitos e políticas de desenvolvimento capazes de sustentar a vida no planeta.

Dessa forma, vale a pena lembrar que toda a discussão técnica e científica deve avançar no sentido da busca de uma ética maior que fundamente as escolhas e os encaminhamentos. A palavra Homem vem de Húmus (terra fértil), o que já sugere um campo reflexivo enorme capaz de promover essas conexões muitas vezes dor-mentes ou perdidas. Perguntas profundas e que dizem respeito aos nossos papéis e caminhos no planeta Terra, portanto, têm que ser feitas. Nesse debate centrado em projetos de lei, talvez valha a pena lembrar as palavras do filósofo mineiro Maurício Abdalla em seu brilhante livro “O princípio da Cooperação- em busca de uma nova racionalidade”; nesse trabalho em que discute “a crise da natureza...e das relações humanas de produção e sociabilidade” clama por uma nova forma de ver o mundo e seus habitantes, fundamentada na ontologia da solidariedade como paradigma capaz de balizar a direção do nosso caminho no planeta:

“ O ser humano só superou sua imanência por ser um ser de pro-jetos. Pro jacto significa lançar adiante. E o que nos faz um ser de projetos é a pulsão pela vida.”

Lutar por um código florestal que celebre a vida deveria ser um projeto de todos nós. Para saber mais, recomendo visitar:

http://4ccr.pgr.mpf.gov.br

http://www.sbpcnet.org.br

www.cnbb.org.br

Page 145: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

5. COMUNICADOS

Page 146: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

145

nº 02 | São Paulo, Junho de 2011

NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DE TRABALHOS

A Revista LABVERDE, criada em 2010, é um periódico científico eletrônico, semestral (abril e outubro), do Laboratório LABVERDE, multidisciplinar, com foco em Paisagem e Sustentabilidade, atualmente estruturado em 9 áreas: Planejamento Ambiental, De-senho Ambiental, Infraestrutura Verde, Arquitetura da Paisagem, Engenharia Ambien-tal, Certificação Verde, Ecologia Urbana, Floresta Urbana e Projeto Sustentável. Normas para Apresentação de Trabalhos

1. O Conselho Editorial da Revista LABVERDE decidirá quais artigos, ensaios, en-trevistas, conferências, debates, resenhas relatos de experiências e notas técnicas serão publicadas, levando em conta a consistência teórica e a pertinência do tema em conformidade com a linha editorial.

2. O Apresentação dos Trabalhos:

Em mídia eletrônica (CD, DVD), utilizando o processador de texto WORD 6.0 ou supe-rior, sem formatação, entrelinhas =1,5 – margens =2,5. Número de páginas entre 10 e 25, incluindo, imagens, tabelas, gráficos, referências, etc. Deverá conter entre 21.000 a 45.000 caracteres, incluindo o resumo, o abstract e a introdução. Deverão ser en-tregues com o CD/DVD, três cópias impressas do arquivo. O resumo e o abstract nãodeverão ultrapassar 2.000 caracteres.

3. Os títulos e os subtítulos deverão aparecer em maiúsculas, pois é importante que no original fique clara a sua natureza. Também deverão ser concisos e explícitos Quanto ao conteúdo tratado. Deverão ser apresentadas, no mínimo 5 palavras-chave.

4. As contribuições deverão ser acompanhadas da versão em língua inglesa do título, subtítulo, resumo e palavras-chave.

5. Logo após o título, devem constar o nome do autor, sua qualificação, procedência e endereço eletrônico.

6. As notas e referências bibliográficas deverão ser agrupadas no final do texto e devidamente referenciadas.

Page 147: Arquitetura em bambu, Centro de Cultura Max Feffer | |

146

Revista LABVERDE

7. Não serão aceitas reproduções de imagens publicadas em livros, revistas ou perió-dicos, sem a expressa autorização do(s) autor(es) das mesmas.

8. Os textos assinados serão de inteira responsabilidade dos autores e não haverá alteração de seu conteúdo sem prévia autorização.

9. Os trabalhos deverão ser entregues pelos autores com a autorização expressa, cedendo o direito de publicação à REVISTA LABVERDE.

10. Os editores se reservam o direito de não publicar artigos que, mesmo seleciona-dos, não estejam rigorosamente de acordo com estas instruções.

São Paulo, 21 de outubro de 2010

Profa. Dra. Maria de Assunção Ribeiro Franco Professora Titular Coordenadora do LABVERDE Editora da Revista LABVERDE