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Janeiro de 2013 UMinho|2013 Maria da Conceição Barbosa Rodrigues Mendes Avaliação da Qualidade e Educação Superior em Angola: o caso da Universidade Agostinho Neto Maria da Conceição Barbosa Rodrigues Mendes Avaliação da Qualidade e Educação Superior em Angola: o caso da Universidade Agostinho Neto Universidade do Minho Instituto de Educação

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  • Janeiro de 2013UM

    inho

    |201

    3

    Maria da Conceio Barbosa Rodrigues Mendes

    Avaliao da Qualidade e Educao Superior em Angola: o caso da Universidade Agostinho Neto

    Mar

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    inh

    o N

    eto

    Universidade do MinhoInstituto de Educao

  • Trabalho realizado sob a orientao doDoutor Eugnio Adolfo Alves da Silva

    Tese de Doutoramento em Cincias da Educao Especialidade de Organizao e Administrao Escolar

    Janeiro de 2013

    Maria da Conceio Barbosa Rodrigues Mendes

    Avaliao da Qualidade e Educao Superior em Angola: o caso da Universidade Agostinho Neto

    Universidade do MinhoInstituto de Educao

  • Assinatura: ________________________________________________

  • iii

    Resumo

    Esta tese aborda a avaliao institucional na Universidade Agostinho

    Neto (UAN), de Angola, enquanto prtica emergente, convocando teorias de

    anlise organizacional cujos pressupostos permitiram descortinar os seus

    contornos, perceber as suas lgicas e significados. O trabalho foi construdo

    com base numa hermenutica sustentada nas percees que os atores

    conferem s suas prticas, sob lentes direcionadas para a captao das

    facetas burocrtica, poltica e institucional da avaliao. Este quadro terico de

    anlise induziu reflexes sobre a natureza do processo avaliativo, suas

    finalidades e mbito, bem como as interaes dos seus atores e os seus

    efeitos na ao organizacional.

    Os argumentos procuram problematizar as lgicas subjacentes s

    prticas avaliativas e s tendncias da avaliao que encarada como um

    processo que se deixa penetrar por lgicas de conformidade, de dissenso e

    negociao e, tambm, de legitimao e simbolismo. As razes da pouca

    contemporaneidade da avaliao no contexto do ensino superior em Angola,

    particularmente da UAN, constituram elementos da referida problematizao.

    Ao captar-se o sentido da avaliao atravs desta trade analtica, foi possvel

    caraterizar a avaliao institucional na UAN atravs das percees de atores

    organizacionais internos e externos, sem perder de vista a contextualidade.

    A avaliao concebida como um processo necessrio face

    exigncia de assegurar a qualidade educativa com a qual o rgo de tutela e a

    prpria UAN pretendem resgatar a credibilidade social da universidade e do

    ensino superior em Angola. Daqui decorre o reconhecimento da importncia da

    avaliao institucional como mecanismo de pilotagem do desenvolvimento da

    UAN, como forma de melhoria dessa qualidade educativa e, tambm, como

    instrumento de regulao por parte do rgo de tutela.

    Porm, ao nvel da UAN, nem sempre existe uma compreenso correta

    sobre a essncia da avaliao, seus procedimentos e efeitos, especialmente

    quando os atores envolvidos nem sempre participaram nos processos

    decisrios a ela inerentes. Por esta razo, considera-se precoce a

    implementao imediata da avaliao institucional, sob pena de a mesma no

    produzir os efeitos esperados, embora se reconhea a sua imprescindibilidade.

  • iv

  • v

    Abstract

    This thesis addresses the institutional assessment at Agostinho Neto

    University (UAN) of Angola, while emerging practice, calling theories of

    organizational analysis whose assumptions shed light on its contours and

    understand their logic and meaning. The work was constructed based on a

    hermeneutic sustained in perceptions that actors give to their practices under

    lenses directed to capture the bureaucratic, political and institutional facets of

    the assessment process. This theoretical analysis set did generate reflections

    on the nature of the assessment process, its purpose and scope, as well as the

    interactions of its actors and its effects on organizational action.

    The arguments seek to problematize the underlying logics of the

    assessment practices and the evaluating trends that is seen as a process that

    leaves penetrate logical compliance, dissent and negotiation and also of

    legitimation and symbolism. The reasons for the low contemporary of the

    evaluation in the context of higher education in Angola, particularly the UAN,

    were elements of that questioning. When taking up the meaning of the

    evaluation through that analytical triad, it was possible to characterize the

    institutional assessment in UAN through the perceptions of organizational

    internal and external actors, without losing the contextuality of the subject.

    The institutional assessment is conceived as a necessary process to

    the requirement to ensure educational quality with which the state

    administration and the own UAN want rescue social credibility of the university

    and of higher education in Angola. It follows the recognition of the importance of

    institutional assessment as a mechanism for driving the development of UAN,

    as a way of improvement of educational quality and this, too, as instrument of

    regulation by the state administration.

    However, in the level of UAN, there is not always a correct

    understanding of the essence of the assessment, its procedures and effects,

    especially when the involved actors do not always participate in decision

    making processes inherent to it. For this reason, it is considered premature the

    immediate implementation of institutional assessment, otherwise it will not

    produce the desired effects, while recognizing its indispensability.

  • vi

  • vii

    Siglas utilizadas CEDUMED - Centro de Estudos Avanados de Educao Mdica

    CI-INAAES - Comisso Instaladora do Instituto Nacional de Avaliao e

    Acreditao do Ensino Superior

    EDUAN - Editora da Universidade Agostinho Neto

    ES - Ensino Superior

    FC-UAN - Faculdade de Cincias da Universidade Agostinho Neto

    FM-UAN - Faculdade de Medicina da Universidade Agostinho Neto

    GAA - Gabinete de Avaliao e Acreditao

    IES - Instituies de Ensino Superior

    INAAES - Instituto Nacional de Avaliao e Acreditao do Ensino Superior

    IPAD - Instituto Portugus de Apoio ao Desenvolvimento

    ISCED - Instituto Superior de Cincias da Educao

    ISCISA - Instituto Superior de Cincias de Sade

    LBSE - Lei de Bases do Sistema Educativo

    MEC - Ministrio da Educao e Cultura

    MED - Ministrio da Educao

    MES - Ministrio do Ensino Superior

    MESCT - Ministrio do Ensino Superior e da Cincia e Tecnologia

    MPLA - Movimento popular de Libertao de Angola

    NGRSES - Normas Gerais Reguladoras do Subsistema de Ensino Superior

    SARUA - Southern African Regional Universities Associations

    SEES - Secretaria de Estado para o Ensino Superior

    UAN - Universidade Agostinho Neto

    UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

    UNITA - Unio Nacional para a Independncia Total de Angola

    UO - Unidade Orgnica

  • viii

  • ix

    Dedicatria

    Ao meu querido pai Jesuno Barbosa, a

    ttulo pstumo, pai dedicado, sempre

    presente e intransigente quanto educao

    do seu pombal, a quem no conseguirei

    retribuir o afeto e o carinho

    minha querida me Leontina,

    costureira incansvel, figura sempre

    presente que nutre a face materna da minha

    vida e me inspira nas longas caminhadas

    Ao Anldio e Jssica, a quem foi

    roubado tempo de convvio e carinho

    materno, filhos que a cada dia me

    engrandecem e mostram o verdadeiro

    significado da vida

    Ao Tuca, esposo amigo e companheiro

    sempre presente

    Helena, irm sempre disponvel para

    contrabalanar os impedimentos desta

    trajetria.

    Aos meus familiares por perdoarem a

    minha ausncia

    Universidade Agostinho Neto, que um

    dia me acolheu como estudante e outro

    como profissional, parte da minha histria de

    vida e que hoje me permitiu partilhar uma

    pequena parcela do seu percurso existencial.

    A todos dedico este trabalho!

  • x

  • xi

    Agradecimentos

    A realizao desta obra foi fruto da colaborao, entrega e incentivo de

    diversas entidades e pessoas, a quem expresso o meu reconhecimento.

    Ao Professor Doutor Eugnio Alves da Silva, pela oportunidade

    concedida, confiana e disponibilidade que sempre manifestou na orientao

    deste trabalho. Acima de tudo, agradeo especialmente a amizade e a

    convivncia acadmica que constituram fonte constante de incentivo e

    propiciou espao para o meu crescimento acadmico e profissional.

    Ao Professor Doutor Ado do Nascimento, o meu profundo

    agradecimento pelas oportunidades de reflexo que contriburam para firmar

    esta obra.

    Aos participantes nesta investigao, pela disponibilidade e

    colaborao, especialmente a Direo da Faculdade de Medicina, da

    Faculdade de Cincias e do Instituto de Cincias da Sade.

    Ao Professor Pedro Bondo, o meu apreo pelo apoio prestado ainda

    quando este trabalho apenas se resumia em curtas linhas de um projeto.

    Um agradecimento particular ao Professor Doutor Albano Ferreira, pela

    colaborao na produo dos resultados que nutriram este estudo.

    Ao Doutor Nicolau Silvestre, o meu reconhecimento pelas mais

    diversas contribuies e apoio para a efetivao do trabalho.

    A todos os colegas da Universidade Agostinho Neto e da Universidade

    Katyavala Bwila, pelo incentivo permanente para a concluso desta obra.

    minha famlia sempre presente, pelo conforto e encorajamento

    constante. Especialmente Helena Joana pela colaborao e pela partilha de

    expetativas nos momentos mais marcantes deste percurso.

    Aos meus filhos Anldio e Jssica, o meu particular apreo pelas

    palavras de alento nos momentos cruciais desta trajetria.

    O meu agradecimento Ana Paula Elias e Alice Pina, pelo apoio

    prestado na realizao desta obra.

    Um agradecimento muito especial ao Tuca, esposo e amigo, pela

    ateno e partilha de reflexes, nos momentos mais difceis que marcaram a

    realizao deste trabalho e impeliram a sua concluso.

  • xii

  • xiii

    ndice Geral

    Resumo .............................................................................................................. iii

    Abstract .............................................................................................................. v

    Siglas utilizadas ................................................................................................. vii

    Dedicatria ......................................................................................................... ix

    Agradecimentos ................................................................................................. xi

    INTRODUO ................................................................................................... 1

    1. Percurso da investigao e escolha do tema ............................................. 3

    2. Formulao do problema ........................................................................... 6

    3. Objetivos da investigao .......................................................................... 9

    4. Abordagem ao objeto ............................................................................... 10

    5. Estrutura do trabalho ................................................................................ 13

    CAPTULO I: O ENSINO SUPERIOR EM ANGOLA: DESENVOLVIMENTO E

    AFIRMAO DA UNIVERSIDADE AGOSTINHO NETO........................... 17

    1.1. Surgimento e desenvolvimento do ensino superior em Angola ................. 19

    1.1.1. Prenncio do ensino superior em Angola: os Estudos Gerais

    Universitrios ..................................................................................... 19

    1.1.2. A Universidade de Luanda: uma realidade hierarquizante e imobilista

    do ensino ........................................................................................... 21

    1.1.3. A Universidade de Angola: entre autonomia e dependncia ............. 25

    1.1.4. A Universidade Agostinho Neto: a sobrevivncia, a concorrncia e o

    redimensionamento ........................................................................... 30

    1.2. Ruturas e descontinuidades nas dinmicas organizacionais da UAN ....... 40

    1.3. Gesto do ensino superior em Angola: (des)articulaes entre o Estado e

    as IES ........................................................................................................ 45

    1.3.1. Regionalizao organizativa da rede de IES ..................................... 46

    1.3.2. A autonomia da UAN face ao papel reitor da tutela ........................... 51

    1.4. A UAN como uma estrutura: os servios centrais e as UO ........................ 61

  • xiv

    CAPTULO II: EMERGNCIA DA AVALIAO INSTITUCIONAL NO ENSINO

    SUPERIOR EM ANGOLA: PROCESSOS E PRTICAS NA

    UNIVERSIDADE AGOSTINHO NETO ....................................................... 77

    2.1. Estruturas e mecanismos de implantao ................................................. 79

    2.2. Configurao do Estado-Avaliador ............................................................ 92

    2.3. Avaliao institucional: titularidade e tendencionalidade ......................... 100

    2.4. Algumas prticas avaliativas na UAN e seus efeitos na dinmica

    organizacional .......................................................................................... 106

    2.4.1. Olhares externos sobre a UAN ........................................................ 107

    2.4.2. Olhares internos sobre as prprias prticas .................................... 114

    2.4.3. Efeitos das prticas avaliativas ........................................................ 119

    CAPTULO III: TEORIAS DE ANLISE ORGANIZACIONAL E REALIDADES

    ORGANIZACIONAIS: CONFIGURAES DA ESCOLA E DA

    UNIVERSIDADE COMO ORGANIZAO ............................................... 133

    3.1. Teorias de anlise organizacional em contextos educacionais ............... 135

    3.1.1. Intermediao de teorias para a compreenso das dinmicas

    organizacionais ................................................................................ 135

    3.1.2. Imagem organizacional da escola .................................................... 142

    3.1.3. A universidade: uma organizao fluda e permevel ...................... 147

    3.1.4. Universidade, avaliao e pluralidade de abordagens ..................... 155

    3.2. Abordagem burocrtica da ao organizacional ..................................... 157

    3.2.1. Racionalidade e uniformidade na ao ............................................ 159

    3.2.2. A escola e a universidade como estruturas burocrticas ................. 163

    3.2.3. A abordagem burocrtica e o funcionamento dptico das organizaes

    educativas ....................................................................................... 168

    3.3. Abordagem poltica da ao organizacional ............................................ 171

    3.3.1. Coalizes no seio das organizaes: explorao das zonas de

    incerteza .......................................................................................... 171

    3.3.2. Instituies educativas como arenas polticas ................................. 174

    3.3.3. Os interesses individuais face aos interesses organizacionais ........ 180

  • xv

    3.3.4. Os conflitos no campo organizacional: do latente ao expresso ........ 189

    3.3.5. O poder e as margens de manobra face s zonas de incerteza ...... 194

    3.3.6. A negociao como fator de intermediao ..................................... 197

    3.4. Abordagem (neo)institucional .................................................................. 200

    3.4.1. Aproximaes e divergncias entre o novo e o antigo

    institucionalismo .............................................................................. 201

    3.4.2. Isomorfismo e institucionalizao ..................................................... 208

    3.4.3. Legitimidade e sobrevivncia organizacional ................................... 212

    3.4.4. Representaes, mitos e cerimoniais............................................... 214

    3.4.5. Organizaes educativas: a legitimao e a institucionalidade ........ 217

    CAPTULO IV: A AVALIAO INSTITUCIONAL NO CONTEXTO

    EDUCACIONAL: OLHARES LUZ DE ALGUMAS PERSPETIVAS DE

    ANLISE ORGANIZACIONAL ................................................................. 225

    4.1. Avaliao e teorias de anlise organizacional: breve justificao

    terica ...................................................................................................... 227

    4.2. Avaliao no contexto educacional e conceitos agregados .................... 228

    4.2.1. Avaliao institucional, credenciamento e certificao .................... 228

    4.2.2. Dimenses e indicadores de avaliao ............................................ 231

    4.2.3. Avaliao e qualidade versus qualidade da avaliao ..................... 240

    4.3. Modelo, enfoque e formato avaliativo: hermenutica concetual .............. 243

    4.3.1. Bipolaridade da avaliao: face interna e externa ............................ 248

    4.3.2. Funes ou finalidades da avaliao ............................................... 251

    4.4. Avaliao institucional: sua natureza burocrtica, poltica e

    institucional .............................................................................................. 255

    4.4.1. A avaliao como mecanismo de controlo e regulao burocrtica . 259

    4.4.1.1. Regulamentao e intencionalidade da avaliao ................ 259

    4.4.1.2. Participao dos intervenientes e imposio de margens de

    manobra .................................................................................. 269

    4.4.1.3 Normativizao da avaliao e hiperburocracia .................... 271

    4.4.2. A avaliao como campo impregnado de conflitos: a arena poltica 273

    4.4.2.1. A participao e a negociao .............................................. 274

  • xvi

    4.4.2.2. Contextualizao da avaliao e responsabilizao dos atores

    de terreno ................................................................................ 281

    4.5. Avaliao institucional como um mundo de representaes, simbolismos e

    ritualidade ................................................................................................ 286

    4.5.1. A avaliao e a credibilizao social da universidade ...................... 287

    4.5.2. Avaliao como processo de construo de significados ................ 290

    CAPTULO V: ABORDAGEM METODOLGICA: DELIMITAO DO OBJETO

    E CONSTRUO DO CORPUS DE DADOS .......................................... 297

    5.1. Natureza da investigao e amostra ....................................................... 299

    5.1.1. O estudo de caso ............................................................................. 299

    5.1.2. A natureza qualitativa do estudo de caso ........................................ 302

    5.1.3. A amostra: caratersticas e critrios de seleo ............................... 305

    5.2. Mtodos e procedimentos de recolha de dados ...................................... 311

    5.2.1. A interao com os atores no ambiente natural: abordagens iniciais,

    expetativas e desafios ..................................................................... 311

    5.2.2. As entrevistas: objetivos e realizao .............................................. 315

    5.2.3. O inqurito por questionrio: objetivos e premissas orientadoras .... 324

    5.2.4. A anlise documental ....................................................................... 328

    5.2.5. As conversas informais .................................................................... 330

    5.3. Mtodos de anlise e tratamento dos dados ........................................... 332

    5.3.1. A anlise de contedo: objetivo e procedimentos ............................ 333

    5.3.2. A anlise estatstica: objetivo e procedimentos ................................ 337

    5.4. Limitaes do estudo .............................................................................. 339

    CAPTULO VI: AVALIAO INSTITUCIONAL: SUA COMPREENSO A

    PARTIR DAS PERCEES DOS ATORES ORGANIZACIONAIS ......... 343

    6.1. Estado atual da avaliao na UAN .......................................................... 345

    6.2. Percees e imagens sobre a avaliao e a qualidade educativa .......... 349

    6.2.1. A qualidade na agenda do Estado e das IES ................................... 349

    6.2.2. A avaliao institucional como um processo multidimensional e

    sistemtico ....................................................................................... 357

    6.2.3. Avaliao como um processo normativo e de autoconhecimento .... 363

  • xvii

    6.2.4. Abrangncia e critrios da avaliao ............................................... 366

    6.2.5. Condies inerentes realizao da avaliao ............................... 369

    6.2.6. Lgicas subjacentes s finalidades da avaliao ............................. 383

    6.2.7. Imagem organizacional e avaliao institucional ............................. 388

    6.2.8. Emergncia da avaliao versus cultura avaliativa .......................... 394

    6.2.9. Agentes da avaliao ....................................................................... 401

    6.2.10. Constrangimentos no campo da avaliao .................................... 405

    6.2.10.1. Constrangimentos internos ................................................. 405

    6.2.10.2. Constrangimentos externos ................................................ 418

    6.3. As prticas avaliativas e suas tendncias ............................................... 423

    CONSIDERAES FINAIS ........................................................................... 431

    BIBLIOGRAFIA .............................................................................................. 445

    APNDICES E ANEXOS ................................................................................. xix

    Apndice A: Roteiro das entrevistas .......................................................... xxiii

    Apndice B: Boletim do inqurito por questionrio .................................... xxvii

    Apndice C: Escala para a apreciao das opinies e atitudes dos docentes

    e gestores universitrios ................................................................. xxxiii

    Apndice D: Escala que foi integrada no questionrio ................................. xlv

    Apndice E (1) : Grelha de anlise categorial das transcries das

    entrevistas (natureza do processo, finalidades, mbito, agentes e

    efeitos da avaliao) ......................................................................... xlix

    Apndice E (2) : Grelha de anlise categorial das transcries das

    entrevistas (condies, obstculos avaliao, qualidade e gesto do

    ensino superior) ................................................................................. lvii

    Apndice F: Tabela de frequncias e valores mdios dos itens do

    questionrio (apreciao por UO) ...................................................... lxv

    Anexo A: Regies Acadmicas e IES Pblicas ........................................... lxxi

    Anexo B: Organigrama MESCT (extrato do Decreto Presidencial n. 70/10,

    de 19 de maio) ................................................................................. lxxv

    Anexo C: Estatuto do Instituto Nacional de Avaliao e Acreditao do

    Ensino Superior (extrato do Decreto Presidencial n. 252/11, de 26 de

    setembro) ....................................................................................... lxxvii

  • xviii

  • xix

    Lista de quadros e figuras

    Quadro I: Indicadores de desenvolvimento do ensino superior em

    Angola (2010-2011) .

    33

    Quadro II: Sntese da evoluo do ensino superior em Angola 39

    Quadro III: Unidades Orgnicas da UAN em 1998 .. 65

    Quadro IV: Caraterizao da abordagem institucional ... 202

    Quadro V: Principais diferenas entre o antigo e o novo

    institucionalismos ..

    207

    Quadro VI: Principais caratersticas burocrtica, poltica e institucional

    da avaliao ...

    296

    Quadro VII: Caraterizao da amostra entrevistada 308

    Quadro VIII: Composio da populao e da amostra 309

    Quadro IX: Composio da populao inquirida em funo do cargo .. 310

    Quadro X: Distribuio dos inquiridos em funo do grupo etrio 310

    Quadro XI: Composio da populao inquirida em funo do tempo de

    servio .

    311

    Quadro XII: Mapa resumo das entrevistas realizadas . 323

    Quadro XIII: Constituio e perfil do painel de especialistas .. 327

    Quadro XIV: Matriz de anlise de contedo .. 336

    Quadro XV: Apreciaes dos inquiridos sobre a varivel mbito da

    avaliao

    362

    Quadro XVI: Apreciaes dos inquiridos sobre a varivel processo de

    avaliao

    365

    Quadro XVII: Apreciaes dos inquiridos sobre a varivel agentes da

    avaliao

    370

    Quadro XVIII: Apreciaes dos inquiridos sobre a varivel finalidades

    da avaliao 385

    Quadro XIX: Apreciaes dos inquiridos sobre a varivel efeitos da

    avaliao

    390

    Figura I: Mapa de distribuio das Regies Acadmicas

    48

  • xx

  • INTRODUO

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    3

    1. Percurso da investigao e escolha do tema

    As instituies educativas tm sido objeto de estudos de diversa

    natureza, entre os quais se destacam os de pendor sociolgico, pedaggico,

    psicolgico, econmico, entre outros, os quais focam os mais diversos aspetos

    que compem as dinmicas dessas organizaes. A Universidade, enquanto

    organizao, tambm se enquadra nos estudos antes referidos, dos quais se

    destacam os de natureza essencialmente sociolgica. Estes tomam como

    referncia determinadas perspetivas de anlise organizacional, tidas como uma

    intermediao para a interpretao e compreenso da complexidade de

    aspetos organizacionais, quer em termos de prticas, como em termos das

    interaes que se produzem entre os atores em ao.

    O estudo da avaliao institucional tem-se constitudo como um tpico

    interessante de investigao em diversos contextos sob distintas perspetivas e

    abordagens de anlise, o que lhe confere contemporaneidade. No contexto

    particular do ensino superior (ES) em Angola essa contemporaneidade torna-se

    menos visvel o que, partida, levantou interrogantes que constituram um

    convite inegvel imerso nessa realidade, na tentativa de construir um

    quadro analtico que contribusse para a sua melhor compreenso, num

    momento em que a avaliao institucional invocada como instrumento

    indispensvel para a melhoria da gesto e da qualidade do ES.

    A reviso de literatura diversa sobre esta temtica permitiu localizar

    estudos de natureza sociolgica que abordam a Universidade, nos quais

    conferida centralidade complexidade desta organizao inerente sua

    dinmica interna e ao tipo de aes que a caraterizam, voltadas para a

    realizao das funes substantivas da universidade, entre as quais sobressai

    a construo e disseminao do conhecimento. No cumprimento da sua

    misso a universidade estabelece uma vasta rede de relaes com o ambiente,

    do mesmo modo que se expe s influncias deste, de cujo grau de adaptao

    depende, em considervel medida, a sua sobrevivncia e afirmao.

    O percurso existencial da Universidade Agostinho Neto (UAN) revela

    que uma instituio com histria que tem resistido no tempo e aos mais

    diversos e adversos contextos. Entre as adversidades figura a sua constituio

    como uma instituio herdeira de um patrimnio influenciado por polticas e

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    4

    vises coloniais, a resistncia a presses decorrentes de um ambiente

    caraterizado por instabilidade de vria ordem, as constantes mudanas no

    plano administrativo e governamental. Esta universidade tambm vivenciou

    processos de descentralizao e recentralizao, os quais no interromperam

    o seu percurso histrico. A UAN chegou a operar, por muito tempo, num

    quadro hegemnico e autonmico considervel. Numa fase mais recente, a

    UAN passou por um processo de redimensionamento que, por um lado, veio

    restringir o seu campo geogrfico de atuao, limitar a sua interveno a duas

    provncias e reduzir notoriamente a sua dimenso organizacional. Por outro

    lado, estas restries conduziram concentrao de esforos e de recursos o

    que coloca esta universidade em posio favorvel relativamente a outras

    universidades pblicas recentemente criadas no mbito desse

    redimensionamento.

    A reviso deste percurso histrico da UAN e, de algum modo, o

    convvio pessoal com determinadas fases desse percurso constituram as

    primeiras razes para a delimitao do estudo UAN. Para completar a

    escolha tiveram influncia o percurso acadmico, as sugestes de pessoas de

    referncia na gesto da UAN e do ES em Angola, quando solicitadas a

    apresentar reflexes e sugestes sobre a inteno de restringir o estudo

    temtica da avaliao institucional. A temtica foi considerada, partida, como

    uma questo pouco conhecida entre os acadmicos e pouco explorada no

    mbito do ES em Angola, o que reafirmou a sua atualidade em termos de

    campo de investigao e, com isto, as primeiras impresses sobre a

    pertinncia do assunto.

    Delimitado o tpico investigativo, as reflexes centraram-se em aspetos

    de ordem mais metodolgica, as quais colocaram em realce os possveis

    desafios e obstculos que as primeiras intenes poderiam encontrar. Alguns

    desafios decorriam do prprio contexto em que se localiza a unidade de

    anlise, ou seja, a avaliao institucional, focada como uma prtica emergente

    no ES em Angola, particularmente, na UAN. Ora, ao ser um elemento

    emergente, os esforos encetados para localizar trabalhos ou estudos com

    alguma sistematizao da realidade avaliativa no ES em Angola mostraram,

    por um lado, que o estudo seria desenvolvido num campo pouco conhecido e

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    5

    compreendido, sobre o qual no se conhecem os contornos. Por outro,

    descobriu-se que o campo era despido de referenciais contextualizados, em

    termos de estudos realizados, dado que no foram encontradas evidncias

    (estudos empricos e/ou referenciais sobre estes), o que tornou mais difcil a

    construo de referenciais e antecedentes de pesquisa. Contudo, o facto no

    deixou de reforar o interesse e a predisposio para dar seguimento ao

    estudo pois, em contrapartida, os primeiros obstculos colocaram evidente a

    fertilidade do campo investigativo, o que, bem explorado, poderia ser uma

    mais-valia para o estudo, tornando-o mais interessante pela possibilidade de

    trazer elementos e discusses relativamente novos no seio da academia.

    neste panorama que as conjeturas iniciais indiciaram que a

    realizao de um estudo em tais condies constitua um desafio ao implicar a

    abordagem do fenmeno sem perder de vista as exigncias metodolgicas e

    cientficas que as investigaes impem.

    Esta realidade suscitou preocupaes que foram expressas em duas

    interrogantes centrais, a saber:

    a) A primeira residiu nas possveis dificuldades de ordem metodolgica

    e procedimental, uma vez que, sendo a avaliao uma prtica emergente e

    pouco conhecida no contexto do ES em Angola questionvamos em que

    medida os agentes informadores-privilegiados estariam disponveis para falar

    sobre ela. Ou seja, questionmos sobre a possibilidade de captar as percees

    dos agentes organizacionais sobre um assunto relativamente novo e ausente

    do quotidiano organizacional da universidade.

    b) A segunda interrogante esteve relacionada com a escolha do quadro

    referencial para a definio da avaliao no contexto do ES porquanto o

    investigador se confronta com uma multiplicidade de teorias e outros

    pressupostos cientficos que focam, por um lado, a universidade enquanto

    organizao e, por outro, a avaliao educativa, enquanto processo integrado

    nas dinmicas organizacionais, neste caso, das Instituies de Ensino Superior

    (IES). Perante uma diversidade de possibilidades de focar o objeto, de

    natureza multidimensional e complexa, quais seriam as perspetivas mais

    adequadas? Assim, no deixou de ser desafiante a opo por teorias ou

    perspetivas de anlise que pudessem dar conta das complexidades

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    6

    organizacionais da universidade e permitir uma melhor compreenso das

    mesmas e, concomitantemente, fazer uma articulao desse quadro terico

    com o objeto de estudo sem o isolar do seu contexto, pois a compreenso dos

    significados a ele atribudos somente possvel nessas condies.

    Em sntese, os desafios circunscreveram-se na procura de caminhos

    que permitissem uma articulao consistente entre os pressupostos

    metodolgicos assumidos e os referenciais tericos construdos para a

    abordagem do objeto, sem perder de vista as particularidades do contexto em

    que o objeto se situa.

    A reviso de literatura diversa sobre a universidade, enquanto

    organizao e sobre a avaliao educativa e institucional, particularmente no

    ES, ofereceu um conjunto de fundamentos que permitiram responder s

    interrogantes, definir e clarificar o problema, o que constituiu um fator

    orientador da investigao.

    2. Formulao do problema

    A formulao do problema, concordando com Tuckman (2012), uma

    das tarefas mais difceis na elaborao do projeto de investigao, o qual deve

    ser suficientemente objetivo e isento de ambiguidades. Para atender a estas

    caratersticas de ordem metodolgica, foi indispensvel a procura de elementos

    tericos que pudessem sustentar as constataes iniciais para dar consistncia

    problematizao do estudo.

    As primeiras reflexes cingiram-se s observaes e constataes

    obtidas na fase exploratria, incluindo a reviso de literatura relacionada com o

    objeto de estudo, particularmente documentos institucionais que pudessem

    reportar, de forma particular, a realidade avaliativa na UAN o que exigiu uma

    abordagem mais alargada que conduziu incluso de aspetos referentes ao

    ES em geral. Como resultado deste procedimento foram elencadas as

    constataes julgadas mais relevantes, entre as quais: a inexistncia de

    normativos legais que instituam a avaliao institucional, em termos de

    orientaes gerais, procedimentos metodolgicos que pudessem regulamentar

    a avaliao no ES, como previsto na Lei de Bases do Sistema Educativo de

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    7

    Angola (LBSE); a inexistncia de um sistema nacional e de sistemas internos

    de avaliao das IES; a existncia de prticas episdicas de avaliao em

    algumas Unidades Orgnicas (UO) da UAN.

    Das reflexes antes apontadas foi possvel derivar o problema deste

    trabalho centrando a ateno na avaliao da qualidade da educao superior

    em Angola, focando de modo particular a avaliao institucional na UAN e os

    seus reflexos nas dinmicas organizacionais. Neste quadro, considera-se a

    avaliao como um instrumento relevante de gesto institucional, de melhoria e

    garantia da qualidade e de credibilizao social, a qual no constitui uma

    tradio nessa universidade e conduz a descontinuidades de processos de

    reflexo sobre as prticas e suas implicaes na realizao da misso

    institucional. O estudo procurou compreender as razes que obstam, por um

    lado, a adoo da avaliao como uma prtica corrente de gesto institucional,

    de controlo e de melhoria da qualidade e, por outro, compreender os efeitos

    desta ausncia na construo de uma imagem institucional e sua credibilizao

    social num momento em que vrios questionamentos so colocados

    relativamente qualidade do ES.

    Depreende-se que, mesmo num quadro em que estudos especficos

    tenham apontado a premncia da implantao de um sistema interno de

    reflexo sobre as prticas institucionais na UAN e num contexto em que a

    avaliao reconhecida como necessria melhoria da gesto das IES em

    Angola, a mesma continua ausente das dinmicas da UAN.

    Considera-se assim que, embora a UAN, enquanto servidora pblica,

    esteja sujeita superintendncia do Estado e a parmetros de administrao e

    gesto burocrtica, possvel uma atuao que no se enquadre nos

    parmetros estabelecidos, como o caso da avaliao institucional prevista na

    LBSE. As reflexes comeam a ser atravessadas por aspetos que no so

    exclusivamente da responsabilidade da UAN, seno que, tambm do mbito de

    atribuies do rgo de tutela, enquanto responsvel pela formulao de

    polticas de gesto do ES, o que lhe confere prerrogativas para regular e

    controlar a funcionalidade do sistema.

    A problematizao da avaliao institucional na UAN deixa de ser uma

    questo meramente de ordem interna e passa a assumir uma configurao que

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    8

    integra aspetos mais externos universidade, enquanto estrutura dependente

    de um rgo central. neste panorama que a abordagem da avaliao

    institucional no contexto da UAN se alarga ao ambiente envolvente no qual se

    localizam diversos atores a quem reservado um espao no processo de

    avaliao institucional.

    Este modo de abordar o objeto de estudo levou a considerar tanto os

    aspetos de ordem organizativo-institucional, ao nvel da UAN, como aspetos

    relacionados com a organizao do subsistema de ES, no sentido de encontrar

    traos que permitissem uma caraterizao localizada da avaliao, sem perder

    de vista aqueles que so mais exteriores mas que, nem por isso deixam de

    influenciar a ao organizacional.

    Para construir um quadro o mais compreensvel possvel, adequado s

    complexidades acima descritas, multiplicidade de fatores e de interaes

    possveis de se estabelecer num processo avaliativo, foi necessrio partir da

    mobilizao e escolha de perspetivas de anlise que pudessem conduzir

    compreenso da natureza, complexidade e particularidades da ao

    organizacional, desde o ponto de vista das racionalidades burocrtica, poltica

    e institucional; bem como compreender o processo avaliativo e construir um

    quadro hermenutico sobre o mesmo. Para uma melhor explicitao do

    problema foram levantadas as seguintes questes:

    a) Em que medida que a avaliao institucional no ensino superior

    em Angola, nas condies atuais, poder contribuir para a afirmao da

    imagem e para a credibilizao institucional da Universidade Agostinho Neto?

    b) Que sentido faz a implantao de um sistema nacional de avaliao

    da qualidade da educao superior em Angola?

    c) Que fatores tm obstado adoo e implementao de processos e

    prticas consistentes e sistemticas de avaliao na Universidade Agostinho

    Neto?

    d) Como interpretam os atores universitrios angolanos a problemtica

    da avaliao institucional no ensino superior em Angola?

    e) Quais so os efeitos das prticas avaliativas nas aes da UAN, nas

    Instituies de Ensino Superior e na qualidade do subsistema do ensino

    superior em Angola?

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    9

    f) Como se articulam os diversos atores e instncias na configurao

    do sistema de avaliao no ensino superior em Angola?

    Estes referenciais contriburam para uma melhor delimitao da

    problemtica, o que, por sua vez, conduziu formulao de objetivos que

    pudessem balizar o estudo e manter a abordagem dentro de um limite terico-

    metodolgico compreensvel e plausvel de relativa profundidade.

    3. Objetivos da investigao

    A natureza implcita ao problema formulado constituiu o fundamento

    principal pela realizao de um estudo centralizado numa realidade concreta,

    isto , a UAN, no sentido de abordar essa realidade detalhadamente e com

    profundidade aceitvel, a partir de uma anlise hermenutica baseada nas

    percees dos atores organizacionais. Tratou-se, assim, de um estudo de

    pendor essencialmente qualitativo de natureza terico-exploratria com carter

    descritivo-interpretativo, baseado na articulao de pressupostos da

    racionalidade burocrtica, poltica e institucional para a compreenso da

    avaliao.

    Com base nestes referenciais foram propostos os seguintes objetivos:

    a) Caraterizar a evoluo do ensino superior em Angola,

    particularmente da Universidade Agostinho Neto, em termos organizativos e

    estruturais;

    b) Analisar a avaliao institucional na Universidade Agostinho Neto a

    partir de um quadro terico elaborado na base dos pressupostos dos modelos

    de anlise burocrtico, poltico e institucional;

    c) Apurar em que perspetivas tericas se inscrevem as prticas e

    processos de avaliao que ocorrem na Universidade Agostinho Neto tendo em

    conta as lgicas burocrtica, poltica e institucional que as influenciam;

    d) Descobrir, a partir das percees dos atores (decisores polticos,

    gestores acadmicos e docentes da Universidade Agostinho Neto), bem como

    das tendncias expressas nos normativos existentes, os significados e os

    sentidos conferidos avaliao no contexto do ensino superior em Angola,

    particularmente da Universidade Agostinho Neto.

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    10

    4. Abordagem ao objeto

    A natureza do objeto de estudo e do tema formulado justificaram uma

    abordagem que assume caratersticas que permitem analisar a priori, uma

    realidade pouco estudada o que implicou um trabalho exploratrio a fim de

    identificar e explicitar o campo de estudo e seus antecedentes, do mesmo

    modo que, foi feita a descrio do objeto com base em dados essencialmente

    qualitativos, assumindo-se assim, uma postura predominantemente

    interpretativa.

    A abordagem resumiu-se a dois planos principais: plano terico e plano

    metodolgico. No plano terico tratou-se, num primeiro momento, de mobilizar

    pressupostos de anlise organizacional que permitiram focar a universidade

    como organizao cujas dinmicas complexas podem ser melhor discutidas e

    compreendidas a partir de modelos compsitos de anlise. Entre os estudos

    encontrados so de referir os de Friedberg (1995) que qualifica a universidade

    como anarquia organizada, marcada pela ambiguidade e pela participao

    fluda nos processos de deciso, apresentando-se como organizao fluda e

    permevel; Lcinio Lima aborda o modo de funcionamento dptico da

    organizao (1992); Mintzberg (1995) analisa a universidade como uma

    organizao de profissionais; Good e Weinstein (1995) debruam sobre as

    variveis consideradas mais importantes para a avaliao das escolas e para a

    compreenso das suas caratersticas organizacionais; Estevo (2004) analisa a

    escola como uma instituio enraizada no modo de vida social e, por isso,

    como arena de interaes; Torres (2004) aborda a cultura organizacional no

    contexto educativo. No caso particular de Angola, o estudo desenvolvido por

    Eugnio Silva (2004) em torno da anlise da UAN o mais referenciado e

    considerado o mais completo. Este ltimo aborda a universidade com base nas

    interconexes entre a dimenso racional-burocrtica e a dimenso poltica.

    Este dptico terico foi tomado como referncia central para este trabalho, ao

    qual foi acrescentada a perspetiva institucional no sentido de incluir nas

    anlises o mundo simblico e as percees que os atores conferem s suas

    prticas.

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    11

    No segundo momento, a anlise decorreu em torno da avaliao

    procurando descortinar os vrios indcios da mesma, sob o ponto de vista

    burocrtico, poltico ou institucional. Esta opo levou escolha de teorias,

    perspetivas ou modelos tericos de avaliao que permitissem caraterizar de

    modo consistente as prticas e percees captadas na realidade e articular os

    elementos encontrados e analis-los congruentemente com as abordagens de

    anlise organizacional definidas para o efeito.

    A anlise da avaliao luz da trade de abordagens (burocrtica,

    poltica e institucional) foi feita num quadro de permeabilidade, j que entre tais

    teorias nem sempre possvel estabelecer limites estritos. A inteno

    fundamental residiu em focalizar as vrias facetas da avaliao e enfatizar as

    caratersticas predominantes sob um determinado foco de abordagem. Tal

    articulao permitiu penetrar no objeto estudado com alguma profundidade,

    desconstruir as realidades institucionais, compreender as prticas, as

    percees e os sentidos nelas impregnados e conferidos pelos atores

    participantes. Para esta construo contriburam, de modo particular,

    posicionamentos e argumentos tericos de autores como Dias Sobrinho,

    Denise Leite, Almerindo Afonso, Dilvo Ristoff, Alexandre Ventura e Virgnio S.

    Para direcionar esta abordagem tem-se em linha de conta

    interrogantes que sinalizam premissas orientadoras, sendo a primeira a

    tentativa de perceber em que medida a avaliao pode ser interpretada luz

    das abordagens burocrtica, poltica e institucional, sem descurar o hibridismo

    que a pode caraterizar conforme as facetas focadas em cada anlise. Quer-se

    com isso dizer que, apesar da natureza ecltica dos modelos avaliativos,

    decorrentes das suas fronteiras bastante permeveis, o foco central do trabalho

    residiu numa tentativa de descortinar as orientaes predominantes, tanto no

    plano das representaes e simbolismos como no plano das prticas

    avaliativas, bem como as articulaes possveis entre as mesmas.

    Portanto, para a anlise da avaliao institucional foram tomadas,

    como referencial bsico, as perspetivas de anlise organizacional burocrtica,

    poltica e institucional, como uma tentativa de construo de um quadro terico

    que, a priori, permitisse olhares multifocados, no sentido de perceber de forma

    mais completa as variaes e caratersticas do objeto em anlise.

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    12

    No plano metodolgico as reflexes tiveram um primeiro confronto com

    a multiplicidade de possibilidades e de abordagens metodolgicas sobre as

    quais nem sempre h consensos, o que foi um dos desafios marcantes que,

    em muitos casos, criou situaes de dvidas e de incertezas, relativamente s

    opes metodolgicas mais adequadas para manter o estudo dentro dos

    limites cientficos e metodolgicos exigidos. O passo inicial consistiu em

    sustentar o estudo em fundamentos metodolgicos que permitissem captar a

    realidade no seu contexto natural a partir das perspetivas dos atores, de tal

    modo que fosse possvel uma certa proximidade entre a investigadora e os

    investigados, buscando a compreenso destes sobre a temtica em estudo, a

    partir da qual se pudesse traar um quadro compreensivo dessa realidade.

    Esta opo revelou-se congruente com a delimitao do campo de

    investigao, expresso no problema formulado (uma instituio concreta), j

    que no houve inteno de produzir generalizaes. Do mesmo modo,

    considerou-se que a restrio do estudo a um caso concreto plausvel, na

    medida em que, a pertinncia do estudo de microcosmos assenta no

    pressuposto de que estes contm elementos de ordem macro (Silva, 2003:

    51), guardando a possibilidade de um estudo mais intensivo e em

    profundidade.

    Ficou salvaguardada a possibilidade de captar a realidade a partir das

    percees dos decisores polticos, dos gestores acadmicos e dos docentes

    universitrios no seu ambiente natural, o que conferiu ao estudo o sentido

    emprico que deve caraterizar uma investigao deste tipo. Para o efeito foi

    recolhido um conjunto de dados, junto dos atores organizacionais que,

    reduzidos e agrupados em categorias especficas, formaram um corpus de

    dados adequados para sustentar a investigao.

    Em sntese, tratou-se de uma abordagem que admitiu a captao dos

    sentidos e significados conferidos pelos atores s suas prprias prticas,

    atravs de procedimentos de natureza qualitativa, esboados de forma a

    integrar um estudo de caso. Foram utilizados mtodos e procedimentos que

    propiciaram a interao da investigadora com os sujeitos produtores de dados

    e com a realidade estudada, entre os quais as entrevistas semiestruturadas, a

    anlise documental e de contedo, sem excluir a utilizao de mtodos

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    13

    quantitativos de recolha e anlise dos dados. A combinao de mtodos e

    procedimentos propiciou a busca de fontes de evidncias distintas

    (fundamentalmente entrevistas, documentos, registos em arquivos) que

    convergiram em termos da unidade de anlise assumida no estudo. A

    abordagem do objeto ocorreu no prprio contexto em que se desenvolve, o que

    considerado como condio pertinente para uma melhor compreenso da

    realidade (Yin, 2005: 32).

    O estudo de caso incidiu sobre a anlise e descrio do percurso de

    uma organizao, centrado num processo organizacional concreto, a avaliao

    institucional, o que se enquadra na perspetiva de Martins (2002), ao explicar

    que esta estratgia de pesquisa dedica-se a estudos intensivos do passado,

    presente e de interaes ambientais de uma unidade social. A delimitao do

    estudo a uma unidade social concreta, neste caso a UAN, visou reunir os

    dados relevantes sobre o objecto de estudo e, desse modo, alcanar um

    conhecimento mais amplo sobre esse objecto (Chizzotti, 2008: 135).

    5. Estrutura do trabalho

    Depois desta introduo, na qual so delineados aspetos

    essencialmente de ordem metodolgica entre os quais a trajetria investigativa,

    a problematizao do estudo, os objetivos e a abordagem assumida, cumpre-

    nos apresentar a estrutura do presente trabalho que se encontra organizado

    em seis captulos, ao que se seguem as consideraes finais.

    No primeiro captulo faz-se uma abordagem UAN, com incidncia no

    seu percurso histrico, com recurso anlise documental, mormente

    documentos legislativos e institucionais, os quais permitiram identificar

    momentos reveladores de caratersticas para serem considerados marcos

    histricos no processo de constituio e desenvolvimento do ES em Angola.

    Decorrente de processos de reorganizao da rede de IES em Angola,

    a UAN sofre um processo de redimensionamento, passando de nica

    universidade pblica para uma das setes universidades pblicas distribudas

    por Regies Acadmicas. Nesta fase, a UAN deixou transparecer uma imagem

    que a singulariza perante as demais universidades pblicas, a qual

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    14

    encontrada no capital de experincias acumulado ao longo da sua histria, bem

    como a sua condio diferenciada em termos de corpo docente e, mais

    recentemente, em termos infraestruturais.

    A abordagem ao ES permitiu sintetizar o percurso particular da UAN

    enquanto universidade que se foi adaptando ao seu tempo, o que lhe permitiu

    sobreviver. Foi tambm possvel levantar reflexes sobre a necessidade de a

    UAN assumir protagonismo no campo da avaliao o que no deixar de ser

    influenciada por processos isomrficos.

    No segundo captulo faz-se uma abordagem do estado atual da

    avaliao institucional, enquanto processo emergente na UAN, centrando a

    ateno nos elementos relativos s estruturas e mecanismos que so

    acionados para a sua configurao, as articulaes entre o Estado e as IES,

    bem como as tendncias que este processo assume. Tambm feita uma

    incurso s prticas avaliativas, o que permitiu identificar alguns estudos e

    processos equiparveis avaliao institucional, na sua dimenso interna e

    externa. Entre os estudos localizados so assinalveis o desenvolvido pelas

    Fundaes Calouste Gulbenkian e Gomes Teixeira, bem como o diagnstico

    conduzido pela Secretaria de Estado do Ensino Superior (SEES), ento rgo

    de tutela do ES, como olhares externos. Na dimenso interna reportada a

    experincia vivenciada pela Faculdade de Medicina da UAN (FM-UAN), como o

    estudo mais estruturado at ao momento. O captulo encerra com uma

    abordagem sobre os efeitos das aes avaliativas no contexto da ao

    organizacional das UO da UAN.

    No terceiro captulo faz-se uma incurso ao campo da sociologia

    organizacional, particularmente no que diz respeito s perspetivas de anlise

    organizacional, com a inteno de construir um quadro terico que ajudasse a

    compreender as lgicas subjacentes aos processos que ocorrem no seio da

    universidade. Para o efeito, foram convocados pressupostos das perspetivas

    burocrtica, poltica e institucional e mobilizados conceitos-chave associados a

    estas perspetivas. Isto tornou possvel a estruturao de um referencial que

    revela a complexidade e multidimensionalidade da ao e dos processos que

    ocorrem no seio da universidade que, em dado momento, se revelam como um

    quadro caraterizado pela normatividade e conformidade; noutro, como um

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    15

    quadro em que a lgica se concentra mais no dissenso e na negociao e

    outro, ainda, em que os processos assumem um carter essencialmente

    institucional no qual entram em jogo os simbolismos e as representaes.

    No quarto captulo procede-se construo de um quadro de

    referenciais sobre a avaliao institucional, com particular revelo para a

    avaliao no contexto do ES, onde se abordam pressupostos tericos e

    metodolgicos que permitem fazer uma leitura de algumas nuances que a

    avaliao assume. As lgicas nas quais assentam as suas finalidades, o

    envolvimento dos atores, as fontes da iniciativa a partir das quais se identifica o

    grau de interioridade e de exterioridade da avaliao, o que engloba tambm

    os pressupostos relativos participao dos agentes/atores. Estes aspetos so

    apresentados e analisados luz das lgicas induzidas pelas perspetivas de

    anlise organizacional assumidas como referenciais para a abordagem da

    realidade estudada, como se fez meno. A avaliao focalizada como um

    processo complexo que ganha sentido de processo coletivo construdo

    socialmente, imbuda de simbolismos e concees, sem excluir as lgicas que

    a tornam um processo normativizado que se desenrola num quadro de

    conformidade, nem sempre consensual e, por isso, induzido por lgicas

    baseadas no dissenso e na negociao enquanto estratgia para a busca da

    aproximao das partes e dos interesses em confronto.

    No quinto captulo so apresentados os fundamentos e as justificaes

    das opes metodolgicas assumidas para a realizao do estudo. So

    descritas as caratersticas que conferem investigao a natureza de estudo

    de caso com uma abordagem essencialmente qualitativa. Na formulao do

    problema e dos objetos ganharam centralidade a captao da realidade com

    base nas percees de atores situados no terreno, neste caso, decisores

    polticos, gestores acadmicos e docentes universitrios enquadrados na

    universidade estudada. Tambm so apresentados os mtodos e

    procedimentos utilizados, considerados compatveis com o tipo de abordagem,

    os quais colocaram a investigadora numa posio mais interventiva, em termos

    da recolha direta dos dados, bem como no tratamento e anlise dos mesmos.

    Faz-se ainda a apresentao dos sujeitos produtores de dados, em termos das

    suas caratersticas socioprofissionais o que foi resumido no perfil dos mesmos.

  • Introduo ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    16

    O captulo encerra com a descrio dos procedimentos utilizados para a

    realizao do trabalho emprico e para a anlise e o tratamento dos dados da

    resultantes. Da aplicao destes mtodos e procedimentos resultou um corpus

    de dados que serviu de base para a apresentao e fundamentao das

    argumentaes construdas no sentido de interpretar os dados com base no

    quadro referencial.

    No ltimo captulo procede-se anlise e discusso dos dados

    empricos e resultados da pesquisa os quais permitiram dar conta das

    significaes e percees dos atores participantes do estudo sobre (i) aspetos

    de natureza terica de mbito avaliativo, entre os quais as dimenses, as

    finalidades, a natureza do processo, os agentes e os efeitos da avaliao na

    ao organizacional e sobre (ii) aspetos do mbito mais prtico, isto , relativos

    s prticas avaliativas vivenciadas no mbito da avaliao institucional na UAN.

    O trabalho encerra com as consideraes finais onde so

    apresentadas as linhas de argumentao destacadas como as mais relevantes,

    desenvolvidas e discutidas ao longo de cada um dos captulos, com maior

    nfase naquelas que exprimem as facetas burocrtica, poltica e institucional

    da universidade e, particularmente, da avaliao institucional no mbito da

    UAN.

  • CAPTULO I: O ENSINO SUPERIOR EM ANGOLA:

    DESENVOLVIMENTO E AFIRMAO DA UNIVERSIDADE AGOSTINHO NETO

  • 18

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    19

    1.1. Surgimento e desenvolvimento do ensino superior em Angola

    1.1.1. Prenncio do ensino superior em Angola: os Estudos Gerais Universitrios

    At 1961 o ES no existiu em Angola, tal como nas demais colnias

    portuguesas. Esta situao motivou uma minoria de angolanos, sustentados

    por apoios estatais, paraestatais, das Igrejas e, excecionalmente, apoios

    familiares, a optarem pela deslocao para Portugal para cursarem uma

    licenciatura. Contudo, a maior parte dos estudantes angolanos que concluam

    os seus estudos no regressavam a Angola, o que consequentemente

    retardava o desenvolvimento socioeconmico da colnia que, na altura j era

    bastante baixo.

    Esta situao, no fim da dcada cinquenta, deixou de constituir uma

    preocupao individual dos cidados angolanos, tendo sido assumida pelos

    responsveis da administrao pblica e privada de Angola que reconheceram

    a necessidade da institucionalizao do ensino universitrio. Foi apontado

    como fundamento a preparao do pessoal que pudesse estar altura das

    inmeras tarefas que exigiam vastos e profundos conhecimentos cientficos e

    tcnicos da poca. Nesta conformidade, o ento Governador-Geral, Venncio

    Augusto Deslandes, corporizou uma proposta de criao de uma universidade

    voltada para a soluo das carncias vividas em Angola, tendo encontrado

    uma sria oposio em Angola e em Portugal. A oposio por parte de Luanda

    fundamentava-se no facto de que a institucionalizao da universidade viria

    beneficiar apenas uma minoria, uma vez que, poucos cidados estariam em

    condies de frequentar o ES; por parte de Lisboa a objeo baseava-se no

    facto de a ideia representar certa inconstitucionalidade pois, na tica desses

    opositores, o Governo de Luanda usurparia atribuies que se dizia

    pertencerem ao Governo Central.

    Assim, a proposta foi considerada formalmente incorreta e

    politicamente impertinente, uma vez que a medida poderia romper a unidade

    nacional. Subjacente a estas ideias existia uma tentativa de travar a

    institucionalizao da universidade, contrariamente ao que acontecia em vrios

    pases africanos, dado que isto poderia constituir uma ameaa colonizao. A

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    20

    intelectualizao dos angolanos poderia criar, ou mesmo forjar atores que

    poderiam opor-se colonizao e, provavelmente, incitar movimentos contra

    esta.

    Apesar da oposio inicial institucionalizao da universidade em

    Angola, a ideia veio a surtir efeitos nos anos 60. Segundo Santos (1970), no

    ano de 1962, considerado dos mais relevantes e produtivo para o ES, foi

    fundado junto do Instituto Superior de Estados Ultramarinos, a 21 de Abril de

    1962, o Centro de Estudos de Antropologia Cultural, que promoveu a formao

    de investigadores no campo da antropologia cultural; a 30 de maio do mesmo

    ano foi criado o Centro de Estudos de Antropobiologia que deveria substituir o

    Centro de Estudos de Etnologia do Ultramar. Anos mais tarde (1965/66) foram

    criados outros Centros de Estudo, como o Centro de Estudos Vasco da Gama,

    o Centro de Biologia Aqutica Tropical e o Centro de Bioceanologia e Pescas

    do Ultramar, em substituio do Centro de Biologia Piscatria e a Misso de

    Biologia Martima.

    Ainda a 21 de Abril de 1962, o Governador-Geral Venncio Augusto

    Deslandes publicou o diploma legislativo que organizava junto dos Institutos de

    Investigao e do Laboratrio de Engenharia de Angola os Centros de Estudos

    Universitrios. Esta iniciativa no foi concretizada, devido a entraves impostos

    por Lisboa, alegadamente por insuficincias estruturais e de carter terico e

    prtico. No entanto, a 21 de Agosto do mesmo ano, o Governo Portugus

    publicou o Decreto-Lei que criou em Angola os Estudos Gerais Universitrios

    (Decreto-Lei n. 44530, de 21 de agosto de 1962), integrados na Universidade

    Portuguesa.

    de referir que os Estudos Gerais Universitrios em Angola tiveram

    como fundadores diretos o Governador-Geral Venncio Augusto Deslandes e o

    Ministro do Ultramar, Adriano Jos Alves Moreira. O primeiro Reitor dos

    Estudos Gerais Universitrios em Angola foi o engenheiro Andr Francisco

    Navarro, nomeado em comisso de servio. Este foi exonerado anos mais

    tarde, a seu pedido (Boletim Oficial, II srie, n. 38, de 19 de Setembro de

    1964), cujo sucessor foi o professor catedrtico Antnio de Mendona

    Monteiro. No dia 31 de dezembro de 1962 o primeiro Reitor dos Estudos Gerais

    Universitrios de Angola toma posse que semanas mais tarde, declara que a

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    21

    instituio comearia a funcionar em Outubro de 1963 com os cursos de

    Medicina, Engenharia, Veterinria, Agronomia, Silvicultura e Cincias

    Pedaggicas.

    Em 5 de agosto de 1963 foi promulgado o estatuto fundamental

    (Decreto-Lei n. 45180) que, entre vrios aspetos, estabelece os dez cursos

    professados no ES em Angola (Cincias Pedaggicas, Mdico-cirrgico,

    Engenharia Civil, Engenharia de Minas, Engenharia Mecnica, Engenharia

    Eletrotcnica, Engenharia Qumica-Industrial, Superior de Agronomia, Superior

    de Silvicultura e Medicina Veterinria.

    1.1.2. A Universidade de Luanda: uma realidade hierarquizante e imobilista do ensino

    Em 1968, por fora do Decreto-Lei n. 48790, de 23 de dezembro, os

    Estudos Gerais Universitrios passam denominao de Universidade de

    Luanda. Esta distribuiu-se geograficamente, com cursos diferenciados, em trs

    das principais cidades, constitudos como Ncleos Universitrios - Luanda,

    Nova Lisboa e S da Bandeira - designadas na altura por distritos, ministrando

    dezanove cursos, conforme a seguinte distribuio:

    Luanda Nova Lisboa S da Bandeira

    Engenharia Mecnica Engenharia Civil

    Engenharia Eletrnica Engenharia de Minas

    Medicina Matemtica

    Qumica Biologia Geologia

    Engenharia Geogrfica

    Agronomia Silvicultura

    Medicina Veterinria

    Letras Cincias Pedaggicas

    Matemtica Geografia Histria

    Filosofia Romnica

    A formao de especialistas diplomados nos vrios ramos do direito

    para fazer face ao vazio ento existente, no corpo de magistrados e juristas do

    ultramar, constituiu justificativa para a autorizao dos cursos de bacharelato e

    licenciatura em Direito nas Universidades de Luanda e de Loureno Marques

    (em Moambique).

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    22

    O apoio a um acelerado desenvolvimento cultural e cientfico das

    populaes e territrios do ultramar com vista participao ativa de todas as

    raas e etnias na gesto pblica, considerado como um dos princpios

    fundamentais da poltica ultramarina, incentivou a adoo de medidas que

    levassem descentralizao.

    Do mesmo modo, foi flexibilizada a abertura para a autonomizao das

    Universidades Ultramarinas, especificamente as Universidades de Luanda e de

    Loureno Marques, o que sinalizou uma autonomia conferida (Decreto-Lei n.

    300/74, de 4 de julho). Em essncia, a deciso residiu na repartio e/ou

    transferncia de competncias, antes partilhadas pelos Ministros da Educao

    e Cultura e da Coordenao Interterritorial, para este ltimo, salvaguardando as

    atribuies consultivas da Direo-Geral do Ensino Superior, relativamente ao

    Ministro da Coordenao Interterritorial, em ordem de eliminar a excessiva

    burocracia e morosidade na tramitao dos processos institucionais, bem

    como, conferir s universidades maior capacidade de iniciativa.

    Em outubro do mesmo ano, em termos normativos, foi reforada e

    ampliada a autonomia da universidade, passando a ser da competncia do

    Ministro da Coordenao Interterritorial a aprovao de planos de estudo e de

    experincias pedaggicas, validao dos graus e ttulos conferidos pelas

    Universidades Ultramarinas e os processos de transferncias entre

    Universidades Metropolitanas e Ultramarinas (Decreto-Lei n. 500/74, de 1 de

    outubro).

    Estas decises, de certo modo, sinalizaram o prenncio de um

    processo de descentralizao no domnio do ES, visando, essencialmente,

    conferir maior autonomia s Universidades Ultramarinas, por via de uma cadeia

    de delegao de poderes aos rgos de governo de Angola e de Moambique,

    reservando-se tambm a estes a mesma faculdade relativamente s

    autoridades acadmicas das universidades.

    A fase de transio governativa vivida em Angola foi marcada pela

    tomada de medidas de natureza essencialmente poltico-administrativas

    justificadas pela necessidade de uma participao real e considervel dos

    angolanos na gesto dos destinos do pas, precisamente entre 1974-1975, no

    sendo o setor da Educao e Cultura alheio a esses acontecimentos. Evidncia

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    23

    disso a criao de novos lugares e o ajustamento de situaes de carter

    tcnico-administrativo expressas no Decreto n. 31/75, de 14 de abril. Por fora

    desse Decreto, foi criado o lugar de Diretor Central do Ensino Superior, mais

    tarde transformado em Diretor-Geral do Ensino Superior (Decreto 69/75, de 14

    de junho), posio justificada pela convenincia de dotar maior competncia s

    estruturas criadas e promover uma descentralizao dos servios ao nvel do

    Ministrio da Educao e Cultura (MEC). Contudo, em todos os casos,

    verificou-se a tutela do MEC relativamente ao ES. Nesse mesmo perodo h

    uma tendncia expressa de democratizao do ES, sendo, tambm

    denunciado o carter hierarquizante, antidemocrtico e imobilista do ensino,

    realidade apontada essencialmente para as escolas mdias-superiores, como

    revela o seguinte excerto:

    Exemplo flagrante desta realidade so as escolas mdias-superiores, em que uma populao escolar, dum modo geral, oriunda de classes menos favorecidas do que as que entram na Universidade, era ministrado um ensino intencionalmente destinado a manter os seus diplomados durante a vida profissional numa situao de desvantagem ou subalterna relativamente aos diplomados pelas escolas universitrias ( 1, Decreto n. 62/75, de 30 de maio).

    Uma das formas encontradas para reverter a situao foi a

    reconverso dos Institutos Industriais em Escolas Superiores de Tecnologia

    que passaram a ser designados Institutos Superiores (Decreto n. 62/75, de 30

    de maio), no caso concreto do Instituto Industrial de Luanda e de Nova Lisboa.

    Aos Institutos Superiores foi outorgada assim, por via do mesmo Decreto, a

    categoria de escolas de nvel universitrio, dotados de personalidade jurdica e

    de autonomia administrativa, conferindo os graus de bacharelato e de

    licenciatura.

    Os condicionalismos impostos pelo contexto social, poltico e

    econmico do pas, nesse perodo, exerceram influncia considervel no modo

    de atuao da Universidade de Luanda. Esta viu-se obrigada a recrutar pessoal

    cujo perfil profissional e acadmico no se alinhava s exigncias decorrentes

    das funes e atividades especficas de uma instituio cuja misso essencial

    reside em aes voltadas formao de alto nvel, extenso e pesquisa

    cientfica, para fazer face aos vrios problemas sociais.

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    24

    O reconhecimento da incapacidade institucional em criar condies

    atrativas aos poucos quadros qualificados existentes na altura levou ao

    recrutamento de colaboradores que garantissem o normal funcionamento dos

    servios, sem exigncia especial de habilitaes literrias. Esta deciso foi

    considerada um ato de justia, j que muitos dos que passaram a integrar o

    quadro de pessoal da Universidade de Luanda, sob esta proteo decretada,

    excecionalmente, em determinado momento foram vistos como valiosos

    colaboradores (Decreto n. 70/75, de 16 de junho) ao servio institucional.

    Em termos administrativos, a gesto do ensino universitrio ocorria ao

    nvel dos rgos centrais da Universidade de Luanda, nomeadamente,

    Assembleia Magna, Conselho Universitrio, Comisso Executiva e Conselho

    Administrativo, contando com uma participao direta de representantes dos

    Ncleos Universitrios (Decreto Provincial n. 112/74, de 5 de novembro), o

    que denuncia, em termos administrativos, uma gesto centralizada, o que, mais

    tarde, viria a ser colocado em causa.

    Assim, no mbito das mudanas de natureza tcnico-administrativas

    levadas a prtica no ES em Angola, nesse perodo, assinalvel a tentativa de

    descentralizao dos Ncleos Universitrios ento existentes (Ncleo de Nova

    Lisboa e Ncleo de S da Bandeira). Constituram fundamentos para decretar a

    descentralizao os resultados do estudo realizado sobre a autonomizao dos

    Ncleos Universitrios, entre os quais os efeitos negativos da administrao

    centralizada imposta pelo Decreto Provincial n. 112/74, de 5 de novembro,

    entre os quais a morosidade no tratamento dos assuntos inerentes aos

    Ncleos, dificuldades de contacto entre estes e o rgo central encarregue da

    gesto do ES.

    Com base nestes fundamentos, foi concedida descentralizao

    administrativa e pedaggica aos referidos Ncleos Universitrios,

    reconhecendo-se a partir 5 de julho de 1975 a existncia de trs Universidades

    em Angola, nomeadamente, a Universidade de Luanda, a Universidade do

    Huambo e a Universidade do Lubango (Decreto-Lei n. 86/75, de 5 de julho).

    Em prtica esta experincia de descentralizao foi efmera, ao no ter

    permitido a transformao da universidade numa verdadeira instituio ao

    servio do pas, pelo facto de ter sido inoportuna face ao momento

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    25

    inapropriado. Julga-se num contexto conturbado. Considerando que foi provado

    na prtica a impossibilidade de funcionamento autnomo dos Ncleos,

    decorrente da falta de estruturas administrativas e pedaggicas, o que poderia

    concorrer para a banalizao de Angola, a autonomia ora conferida viria a ser

    recolhida a coberto do Decreto-Lei n. 147/75, de 28 de outubro.

    O fracasso da descentralizao dos Ncleos Universitrios foi assim

    atribudo essencialmente a no criao de estruturas administrativas e

    pedaggicas que pudessem permitir aos dois Ncleos autogerirem os

    processos institucionais o que levantou receios quanto a continuidade dos

    cursos ministrados nos Ncleos (agronomia, silvicultura, veterinria, geografia,

    histria, romnicas, pedaggicas e filosficas), considerados vitais para a

    reconstruo nacional.

    Recorrendo a pressupostos de anlise inscritos na perspetiva

    institucional, esta experincia pode ser conferida a natureza de um ambiente

    organizacional construdo politicamente. As justificativas apresentadas sobre o

    fracasso demostram que, com base nos argumentos de DiMaggio e Powell

    (1999b), os decisores polticos no experimentam as consequncias das suas

    decises, do mesmo modo que, as decises polticas se aplicam de maneira

    geral a todas as organizaes, o que reduz a adaptabilidade e flexibilidade das

    mesmas.

    Portanto, infere que, embora tenha existido um estudo antecipatrio da

    tomada de deciso poltica, a ausncia da experimentao conduziu a um

    conhecimento posterior da inviabilidade da deciso poltica.

    1.1.3. A Universidade de Angola: entre autonomia e dependncia

    Aps a independncia de Angola, em 1975, o Governo estabeleceu a

    educao como um dos setores prioritrios, enquanto instrumento fundamental

    para a formao harmoniosa dos cidados e potenciador do desenvolvimento

    humano e econmico do pas. A massificao da educao implcita

    nacionalizao e democratizao levou a uma primeira exploso escolar, no

    ensino geral, verificada nos anos 1978 e 1979. Segundo os dados

    apresentados pelo Ministrio da Educao (MED) estes foram anos com os

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    26

    maiores registos de matrculas, sendo 2.305.614 e 2.596.276, respetivamente

    (MED, s/d.a). Em termos de corpo docente os maiores registos recaem para o

    ano 1979 e 1981 com um total de 44.612 e 43.899, respetivamente.

    A 14 de junho de 1976 foi promulgado o Decreto n. 60/76, de 19 de

    junho1, o qual reestrutura a orgnica do MEC, estabelece a Universidade de

    Angola como uma estrutura orgnica desse Ministrio, do mesmo modo que se

    procede a integrao do Instituto de Investigao Cientfica de Angola na

    universidade (Decreto n. 60/76, de 13 de agosto). Essa integrao teve como

    lgica a conformao do ES e a investigao como um corpo comum, deixando

    de fora apenas os estabelecimentos de investigao cuja funo especfica

    justificava atividade independente relativamente ao ES. Com o mesmo Decreto

    deixou de existir, na orgnica desse Ministrio, o lugar de Diretor-Geral do

    Ensino Superior.

    Atingida a independncia poltica, foi assumida pelo governo a

    responsabilidade de dotar o pas de estruturas precisas ao exerccio da

    soberania conseguida o que, no domnio da educao, esteve na base da

    reestruturao da orgnica do MEC, perspetivando a orientao do sistema

    educativo de modo a corresponder aos reais interesses e aspiraes do povo,

    naquele momento.

    Assim, a 28 de setembro de 1976, um ano depois da independncia

    nacional, o ento Ministro da Educao, Antnio Jacinto do Amaral Martins,

    assinava a Portaria n. 77-A/76, que coloca em vigor o diploma orgnico da

    Universidade de Angola, integrada por trs Centros Universitrios (Luanda,

    Huambo e Lubango) e pelo Instituto de investigao Cientfica de Angola. A

    universidade passa a ser integrada por trs Centros e sete Faculdades, com a

    seguinte distribuio:

    a) Centro Universitrio de Luanda: Faculdades de Cincias, de

    Medicina, de Engenharia, de Economia e de Cincias Jurdicas

    b) Centro Universitrio do Huambo: Faculdade de Cincias Agrrias;

    c) Centro Universitrio do Lubango: Faculdade de Letras.

    1

    Por ter sado de forma incorreta o Decreto n. 60/76, de 19 de junho, foi novamente publicado no Dirio da Repblica, I srie, n. 191, de 13 de agosto de 1976.

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    27

    Para a gesto da Universidade de Angola foram designados, pelo

    mesmo Decreto, os seguintes rgos mximos: Conselho Universitrio,

    Conselho Cientfico e Pedaggico e o Conselho Administrativo, aos quais

    foram conferidas as seguintes competncias:

    a) Compete ao Conselho Universitrio definir as linhas gerais da poltica do Ensino Superior, da investigao, da ligao produo e da administrao; b) Compete ao Conselho Cientfico e Pedaggico elaborar programas e reformas de ensino e investigao e dar parecer sobre matrias de ndole pedaggica; Compete ao Conselho Administrativo a gesto e execuo dos oramentos do Estado, cumprindo-lhe a prestao de contas aos rgos competentes. (Portaria n. 77-A/76).

    A universidade assume-se assim como um rgo do Estado,

    enquadrado no MEC, com prerrogativas para operar para alm das suas

    funes substantivas (formao, investigao e extenso), j que

    responsabilizada pela definio das linhas gerais da poltica do Estado no

    domnio do ES, conforme o expresso na competncia do Conselho

    Universitrio.

    Num contexto sociopoltico marcado por uma orientao socialista e

    pelo regime monopartidrio, a reformulao do subsistema de ES em Angola

    constituiu uma das questes e preocupaes centrais do MPLA-Partido do

    Trabalho, figurando entre as resolues do seu 1 Congresso (Despacho n.

    3/79 - MED, Dirio da Repblica, I Srie, n. 229, de 29 de setembro). A

    universidade foi vista como uma instituio com uma pesada responsabilidade

    num Pas de opo socialista (Decreto n. 31/80, de 10 de abril), cujos

    docentes eram chamados a dar resposta ao desafio de se construir uma

    Angola completamente independente.

    A formao de quadros nacionais figurou entre os desafios mais

    elevados do setor da educao e, particularmente do ES, baseado no ideal de

    que a independncia completa dum pas mede-se tambm pelo peso que os

    nacionais ocupam no quadro docente universitrio (Decreto n. 31/80, de 10

    de abril, 2). Com isto, conferir carreira universitria a dignidade, a

    segurana e a seriedade necessrias era premente, sendo pretenso a

    captao das maiores capacidades intelectuais e investigativas.

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    28

    Contudo, as exigncias expressas no Estatuto da Carreira Docente

    Universitria (Decreto n. 31/80, de 10 de abril), em termos de grau acadmico,

    indiciavam um certo desalinhamento face ao desafio, j que a escassez de

    quadros nacionais (qualitativa e quantitativamente) e a abertura para a

    admisso no quadro docente de candidatos com nvel acadmico de

    graduao (licenciatura) e equiparados constitua uma realidade. Assim, para a

    contratao e enquadramento de candidatos carreira docente universitria,

    exceto para as categorias de professor e de professor agregado, era vlido o

    grau de licenciatura, sendo dispensvel para as categorias de leitores,

    monitores e monitores estagirios. Para os primeiros, a reconhecida

    capacidade pedaggica e cientfica constitua o critrio subsequente, ao passo

    que, para as duas ltimas categorias, a frequncia do 4 e 3 anos do curso,

    bem como a obteno de treze valores de mdia geral e quinze valores de

    mdia em cadeiras de especialidade constituam critrios alternativos.

    Ainda em relao ao corpo docente universitrio, neste perodo, foi

    apontada a situao pouco aliciante da carreira docente, bem como a

    necessidade premente da superao acadmica e profissional dos mesmos

    para, deste modo, atrair e reter quadros qualificados que pudessem estar

    altura das exigncias da universidade. Este quadro, em 1983, foi reconhecido

    como um dos maiores problemas vivenciado pela universidade angolana, como

    d conta o seguinte fragmento:

    ao nvel do Ensino Superior extremamente acutilante o problema de actualizao de conhecimentos e da ps-graduao, uma vez que, nos termos actuais, o professor universitrio sente a cristalizao dos seus conhecimentos, a sua desactualizao em relao s grandes conquistas da Cincia e da Tcnica e a impossibilidade de prosseguir a sua formao (MED, 1984: 13).

    A insuficincia de quadros, em termos quantitativos e qualitativos,

    levou o Governo Angolano a fazer recurso cooperao internacional a qual foi

    utilizada de forma significativa pelo MED desde 1978 (MED, 1984), o que viria

    a colocar, de modo particular, a universidade numa situao de excessiva

    dependncia. A maioria das disciplinas curriculares era assegurada por

    docentes estrangeiros (sendo as mais representativas as nacionalidades

    cubana, portuguesa, blgara e da R.D.A.), com o estatuto de cooperantes e de

    residentes. Em 1984/85 o contingente de docentes cooperantes atingiu, num

  • Captulo I: O ensino superior em Angola: desenvolvimento e afirmao da UAN ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    29

    universo de 207 docentes em regime integral, cerca de 64% (MED, 1984: 13;

    Fundao Calouste Gulbenkian, 1987: 35).

    A situao de dependncia no deixou de representar um risco ao

    normal funcionamento das instituies de ensino, o que foi mais marcante em

    1982/83, consequente das dificuldades de alojamento o que gerou

    incapacidade para aumentar o contingente de docentes estrangeiros nos

    diversos nveis de ensino. No plano financeiro, os atrasos no processamento

    de salrios e transferncias de vencimentos e o cumprimento de outras

    clusulas contratuais afetaram consideravelmente a efetivao e a qualidade

    da contribuio esperada com a cooperao estrangeira (MED, 1984: 35). No

    plano logstico tambm foram identificados entraves em relao ao

    asseguramento em alimentao e em transporte. No plano funcional e

    organizativo so referenciadas as ausncias prolongadas dos docentes

    estrangeiros, sem a devida autorizao do MED, como testemunha o seguinte

    trecho:

    particularmente em relao cooperao portuguesa, j prtica corrente a ausncia do pas por perodos superiores aos 30 dias regulamentares (de frias), posteriormente justificada com atestados mdicos de veracidade contestvel. Ainda no que se refere partida para o pas de origem, quer em situao de frias, quer por termo de contrato, frequente suceder com a cooperao cubana e da RDA a sada do pas sem qualquer autorizao por parte do Ministrio da Educao (MED, 1984: 25).

    A colaborao com outros setores do pas foi referenciada como uma

    das condies indispensveis para o bom funcionamento das instituies

    educativas, a qual foi assinalada em 1984, como um dos pontos de

    estrangulamento do sistema educativo angolano. Nesta linha, a falta de

    a