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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

VOLU

ME I

I

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO

SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO

DIRETORIA DE POLÍTICA E PROGRAMAS EDUCACIONAIS

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL

ILIANE INÊS FRANCESCHINI CARDOSO

O ENSINO DA HISTÓRIA AFROBRASILEIRA ATRAVÉS DE FONT ES LITERÁRIAS

MARECHAL CÂNDIDO RONDON / PR 2010

ILIANE INÊS FRANCESCHINI CARDOSO

O ENSINO DA HISTÓRIA AFROBRASILEIRA ATRAVÉS DE FONTES LITERÁRIAS

Unidade Didática elaborada pela professora Iliane Inês Franceschini Cardoso da disciplina de História, apresentado para conclusão do Segundo Período do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), Turma 2009, à Secretaria de Estado da Educação do Paraná.

Orientador (a): Professora Drª. Meri Frotscher Kramer - Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Marechal Cândido Rondon

MARECHAL CÂNDIDO RONDON/PR

2010

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DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

Professora PDE: Iliane Inês Franceschini Cardoso

Área PDE: História

NRE: Dois Vizinhos

Professora Orientadora IES: Drª. Meri Frotscher Kramer

IES vinculada: UNIOESTE (Universidade Estadual do Oeste do Paraná)

Escola de Implementação: Colégio Estadual Dr. Paranhos - Ensino Fundamental e Médio

Público objeto da intervenção: Alunos (as) da 8ª série

Tema de Estudo do Professor PDE: História, Etnicidade e Literatura.

Título: O Ensino da História Afrobrasileira através de Fontes Literárias.

4

APRESENTAÇÃO

Esta Unidade Didática tem como objetivo trabalhar com fontes literárias no ensino

de História e Cultura Afrobrasileira, contribuindo para que o aluno do Ensino Fundamental

compreenda que a História faz uso dos mais diversos documentos para rememorar o

passado com vistas à compreendê-lo, assim como, perceber como se dá à produção do

conhecimento histórico. O referido material didático objetiva ainda, contribuir para a

compreensão da pluralidade étnico-racial e discutir a questão multicultural no Brasil e no

mundo. Colocamos-nos o desafio de trabalhar a questão a partir de fontes literárias,

considerando a necessidade de diálogo interdisciplinar e de utilização de fontes em sala de

aula, pois cresce a importância da ampliação da abordagem através de materiais

alternativos, que mostrem aspectos múltiplos do social. Objetiva-se promover e aprofundar

reflexões que permitam ao aluno reconhecer e valorizar a presença afrodescendente no

Brasil e, principalmente, desnaturalizar concepções preconceituosas e historicizar

processos históricos que contribuíram para a construção da ideia de diferenças pautada em

teorias raciais. Desta forma, pretende-se dar visibilidade a estas populações, conhecer sua

história e desmistificar preconceitos nos espaços escolares. A perspectiva é que a literatura

poderá possibilitar novas abordagens e propiciar metodologias diferenciadas para o ensino

de história, não sendo somente como forma de motivação, mas como fontes de pesquisa e

investigação. Este material didático irá trabalhar textos literários, visando a

interdisciplinaridade como possibilidade de diálogo entre o profissional do ensino de

História, Língua Portuguesa e Artes.

Conforme a autora Sandra Pesavento (1999) o estágio atual da discussão relativa à

aproximação da História e Literatura permite que se estabeleçam posições consensuais pela

corrente da História Cultural. Na contemporaneidade a interdisciplinaridade possibilita a

aproximação entre a História e a Literatura. Ambas as narrativas, segundo a autora, “se

empenham neste esforço de capturar a vida, re-apresentar o real” (2000, p. 8). Verifica-se,

portanto, que o presente material vem de encontro como a Diretriz Curricular para o ensino

de História do Estado do Paraná.

O contexto nacional em fins do século XIX e início do século, período que

pautamos nossa pesquisa, é marcado por inúmeras transformações. A questão política é

marcada pelo fim do regime monárquico e o início do período republicano. Neste momento

abrem-se possibilidades para uma maior participação política da sociedade. Na economia,

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a grande produção de café e a entrada de capital estrangeiro contribuem para avolumar

significativamente os negócios. Também a industrialização, que vinha tomando fôlego

dentro de uma economia essencialmente rural, até então. É neste contexto que se faz sentir

um desejo de modernidade nas principais cidades brasileiras, onde casarões eram

demolidos para dar lugar a novas construções e ruas largas, deixando para trás a aparência

colonial. Porém, isso não se observa no interior do Brasil. Este, por sua vez, apresentava

com mais intensidade a miséria, o desemprego, as doenças, o abandono do governo, o

“atraso” econômico. Observa-se através da análise realizada de textos literários que os

intelectuais brasileiros adotam posturas diversas. Entre os intelectuais da época, situam-se

escritores como Monteiro Lobato e Aluísio Azevedo, cujas obras foram escolhidas para o

trabalho com os alunos. Algumas de suas obras tiveram grande repercussão no mercado

editorial, mas se faz necessário analisá-los conforme as condições da produção da época e

as discussões travadas pelos intelectuais do período. As obras selecionadas para o estudo

permitem refletir sobre diversos aspectos da sociedade da época entre eles pode-se citar:

situação dos negros na sociedade brasileira nas últimas décadas do século XIX e início do

século XX, o lugar que pessoas consideradas “negras” ocuparam na sociedade e também

na imaginação nacional, sugerem as deficiências provenientes do atraso das regiões e a

brutalidade das relações humanas que ali se davam. Analisaremos com os alunos a obra de

Aluísio de Azevedo “O Mulato” (1881), e nas obras de Monteiro Lobato “Negrinha”

(1920) e “Urupês (1918) os contos “Negrinha”, “Bugio moqueado”, “O Jardineiro

Timóteo” e “Bocatorta”, pois entendemos que tais escritos nos permitem perceber imagens

da diferença étnico-racial na sociedade brasileira deste período. Além do acima citado,

pretende-se analisar o cotidiano das cidades brasileiras no período, as representações que

os autores fazem das populações negras, as relações sociais como a violência contra

mulheres e crianças, a sociedade paternalista, a modernização da sociedade e da economia

e de que forma estas obras estão conectadas às discussões travadas entre os intelectuais da

época.

A leitura e análise das obras de Aluísio de Azevedo e Monteiro Lobato nos permite

maior conhecimento destes escritores brasileiros, bem como a oportunidade de renovar os

olhares e aprofundar as reflexões sobre os laços entre literatura e história, literatura e

sociedade, literatura e relações étnicas. A História e a Literatura são áreas do conhecimento

que facilmente se intercambiam e se reconhecem. Ambas narram, muito embora tenham

estatutos diferentes.

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A necessidade de incluir no currículo a questão do outro de forma que este não seja

visto como “exótico” e pejorativamente nos remeteu a pensar sobre uma proposta que

possibilite a reflexão sobre a história e cultura afrobrasileira. Percebeu-se que pode ser

desenvolvido um trabalho em sala de aula que utilize escritos de autores da literatura

brasileira, os quais tematizam as questões aqui trabalhadas, como Monteiro Lobato. O

diálogo e a aproximação com os professores de Português nos permitem observar que tem

muito de História na Literatura, e tem muito de Literatura na História.

Entende-se que a ficção faz parte de um mundo imaginário, mas que se remete ao

real, tornando evidente a alusão recíproca entre a ficção e a História. Concebe-se que a

Literatura é a representação do imaginável e a História é a representação do vivido. O

literato em seu trabalho de invenção não tem compromisso obrigatório com a realidade

concreta, os fatos criados, os personagens o espaço temporal podem ser frutos da

imaginação criadora, porém não existe postura neutra. O escritor tem sua visão de mundo

na sociedade que está inserido, e o produto de sua arte sempre mantêm alguma relação com

a realidade concreta. Por isso, a Literatura mostra-se como fonte privilegiada também nos

estudos históricos.

O trabalho do historiador e do literato possui muito em comum, pois ambos

precisam através da narrativa construir uma cena que envolva ambiente, personagens e

enredo. O que os distingue, é que o historiador tem uma preocupação em se aproximar da

realidade com base em fontes. Acredita-se, entretanto, que apesar do comprometimento

que o historiador tem com a ciência histórica, os documentos não devem ser lidos como

fragmentos da realidade passada. O literato tem sua preocupação centrada no enredo, e este

é produto de sua capacidade criadora. Porém, a sua narrativa imaginária se dá a partir de

condições históricas específicas. Por muito tempo a busca da verdade histórica deu-se

através dos documentos oficiais e escritos. Atualmente, segundo Sandra Pesavento,

adormeceu a preocupação com as “grandes verdades científicas e as explicações

totalizantes, que não dão conta da complexidade do real, parece ter se deixado de lado

debates estéreis, com a radical separação real/imaginário” (1999, p.70 )

Diante do proposto, nossa intenção é possibilitar algumas alternativas que poderão

subsidiar os professores das áreas de História, Português e Artes no ensino de história e

cultura afrobrasileira, voltando-se para a exploração e uso de um material de fácil

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disponibilidade e que certamente contribuirá para despertar o interesse do aluno nas aulas

de história tendo em vista um ensino mais interrogativo e menos prescritivo.

3. CONTEÚDOS

Conteúdo Estruturante: Relações de Trabalho e Cultura

Conteúdo Básico: Sujeitos, Guerras e Revoluções

Conteúdo Específico: A presença do negro na sociedade brasileira;

Sociedade patriarcal no Império e na República Velha;

O cotidiano no interior do Brasil no Império e na República Velha;

As relações sociais ontem e hoje.

4. OBJETIVOS

• Pensar a relação passado / presente;

• Perceber que os artistas e intelectuais intervêm na realidade através de

suas obras, produções e composições e ao mesmo tempo, representam

questões de seu tempo;

• Perceber o papel social de literatos que, através de suas obras, pensam e

criticam a sociedade e suas ideias repercutem nesta;

• Perceber a música como forma de interagir na sociedade e expressar

ideias;

• Despertar nos alunos sensibilidades mais aguçadas em relação a

problemas enfrentados por populações que historicamente foram

marginalizadas pelo conjunto da sociedade;

• Conhecer através da literatura outras visões sobre a sociedade brasileira

no período imperial e na República Velha;

• Despertar o prazer pela leitura de contos como fonte de conhecimento e

informações;

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• Desenvolver o interesse pela investigação história e perceber esta como

forma de produção do conhecimento histórico.

5. PRIMEIRA UNIDADE

A vinda dos africanos para o Brasil

1. Antecipar informações e ativar conhecimentos prévios sobre a letra da música

Todo camburão tem um pouco de navio Negreiro

Atividades para o aluno

Vamos refletir sobre a letra da música cujo título é: Todo Camburão Tem Um

Pouco De Navio Negreiro

a) O que você entende desse título?

b) A palavra camburão e navio negreiro te lembram o quê?

c) Você já viu um camburão? Em que situação?

d) Você já estudou ou ouviu algo relacionado com o nome da música?

e) Que mensagem você imagina que o autor desta letra quis passar?

f) Qual é o estilo musical do qual este autor faz parte? E como a forma de cantar,

melodia, estilo musical se conectam com a letra da música? Que impressão

causam?

2.Ouvir a música e ler a letra em forma de poesia

Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro, composição de Marcelo Yuka

cantada por O Rappa

“Todo camburão tem um pouco de navio negreiro

Todo camburão tem um pouco de navio negreiro

É mole de ver

Que para o negro

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Mesmo a AIDS possui hierarquia

Na África a doença corre solta

E a imprensa mundial

Dispensa poucas linhas”.

Atividades para o aluno:

a) Dividir os alunos em grupo para responder os questionamentos iniciais. Comparar

as respostas iniciais com as realizadas em grupo e em seguida fazer a apresentação

das respostas em grupo para a turma.

3. Professor: Depois da apresentação, considerando as provocações propostas, se

houver necessidade, o professor poderá fazer algumas intervenções

Atividade para o aluno – debate oral

a) O que você sobre a vinda dos africanos para o Brasil? Vamos fazer a leitura dos

textos a seguir com a finalidade de você rememorar e aprimorar seus conhecimentos

sobre este tema.

5.Textos sobre Navios Negreiros

Texto 1

Compreende-se por Navios Negreiros as embarcações que realizavam o transporte

de homens, mulheres e crianças oriundos do continente africano. Primeiramente o destino

destes era a Europa, mas tarde a América. Estas embarcações utilizadas para o transporte

de pessoas eram também conhecidas por “Navios Tumbeiros”. Tumbeiro vem da palavra

tumba que significa sepultura.

A história dos navios negreiros está relacionada à história do tráfico de seres

humanos, que tem sua primazia nas antigas sociedades humanas, onde a escravização de

pessoas se dava pelos mais diversos motivos, seja ele político, religioso ou mercantil.

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A história do tráfico de pessoas africanas para o Brasil teve a duração de mais de

três séculos. Durante todo este tempo, milhões de seres humanos foram retirados de forma

forçada de suas famílias, comunidades, enfim do seu espaço de vivência para engrossar a

massa de escravizados, e realizar o trabalho necessário nas mais diversas atividades que se

desenvolviam na maior colônia de Portugal, o Brasil. O trabalho destas milhões de pessoas,

ou simplesmente a sua pessoa enriquecia alguns poucos grandes proprietários de terras,

comerciantes, ocupantes de cargos políticos que viam na escravidão uma forma de

enriquecimento.

É uma história que até hoje comove, pois foi marcada pela dor, sofrimento, luta e

desespero daqueles que vinham amontoados nos porões destas embarcações, em ambiente

escuro, sujo, mal cheiroso devido a falta de higiene e péssimas condições do transporte.

Nestas condições desumanas, milhões de pessoas atravessaram o Oceano Atlântico, onde

conviveram lado a lado com a fome, sede, doenças, saudade, incerteza, pois o presente era

aterrorizante. Acorrentados nos porões vinham homens, mulheres e crianças em um menor

número, de etnias diferentes. A viagem longa em navios frágeis e superlotados durava

muitos e longos dias. O mal estar acometia muitos devido à água e a comida serem

precárias. Nestas condições muitos não chegam ao destino e acabavam morrendo, sendo

então o seu destino, o mar. Devido à demora com que a tripulação descia aos

compartimentos inferiores dos navios muitos morriam e acabavam ficando por dias, até

serem retirados e em seguida jogados ao mar.

Texto 2

“Claro que a lei portuguesa tratava de defender a “mercadoria”. Exigia que ao

escravo fossem fornecidas três refeições diárias, dois litros e meio de água e que sofresse

revisão médica. Mas é fora de dúvida que só eram cumpridas as disposições de interesse

dos traficantes e, longe de se assemelharem a cruzeiros luxuosos como insistem

absurdamente alguns autores, a fome, a sujeira, o desconforto e a morte eram

companheiros de viagem dos negros.

O número de escravos por navio era...o máximo possível.Uns quinhentos numa

caravela, setecentos num navio maior- cerca de mil toneladas- iniciavam a viagem que

demorava de trinta e cinco a cinquenta dias a partir de Angola até Recife, Bahia ou Rio de

Janeiro, numa viagem normal. Calmarias ou correntes adversas podiam prolongar a

travessia até cinco ou seis meses, tornando mais dantescas as cenas de homens, mulheres e

crianças espremidos uns contra os outros, vomitando e defecando frequentemente em seus

11

lugares, numa atmosfera de horror que o calor e o mau cheiro se encarregavam de

extremar.

É claro que, num ambiente desses, grassavam as doenças, fazendo com que o

fundo do mar se transformasse no ponto final da viagem de muitos. Alguns autores

procuravam minimizar a importância de escravos mortos na travessia, afirmando, não sem

certa dose de razão, que nenhum traficante teria interesse em perder sua mercadoria...”

(PINSKY, Jaime. A Escravidão no Brasil. 11ª edição. São

Paulo:Contexto,1992.p.27)

Texto 3

“Apresado aos quinze anos em sua terra, como se fosse uma caça apanhada em uma

armadilha, ele era arrastado pelo pombeiro - mercador africano de escravos- para a praia

onde seria resgatado em troca de tabaco, aguardente e bugigangas. Dali partiam em

comboios, pescoço atado a pescoço de outros negros, numa corda puxada até o porto e o

tumbeiro. Metido no navio, era deitado no meio de cem outros para ocupar, por meios e

meio, o exíguo espaço do seu tamanho, mal comendo, mal cagando ali mesmo, no meio da

fedentina mais hedionda. Escapando vivo à travessia, caía no outro mercado do lado de cá,

onde era examinado como um cavalo magro. Avaliado pelos dentes, pela grossura dos

tornozelos e dos punhos, era arrematado. Outro comboio agora de correntes, o levava à

terra adentro ao senhor das minas ou dos açúcares, para viver o destino que lhe havia

prescrito a civilização: trabalhar dezoito horas por dia, todos os dias do ano. No domingo

podia cultivar uma rocinha, devorar faminto a parca e porca ração de bicho com que

restaurava sua capacidade de trabalhar no dia seguinte até a exaustão.”

(Ribeiro, Darcy. O povo brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. São Paulo:

Companhia das Letras, 1995. p. 119.)

Texto 4

“A partir da segunda metade do século XVI, começaram a ser trazidos para a

América os africanos como escravos em número expressivo para a exploração sistemática

de sua mão-de-obra.

A opção pelo africano se deu por algumas supostas vantagens: maior resistência

física às epidemias e maiores conhecimentos em trabalhos artesanais e agrícolas. A opção

pelo escravo africano se deu também porque o tráfico dava lucros, era uma das atividades

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mais lucrativas do sistema colonial. Para facilitar, nem o Estado nem a igreja católica

condenavam a imposição da escravidão aos africanos.

Os portugueses transportavam os escravos em suas caravelas vindas da África. Os

holandeses também realizavam o tráfico de escravos para o Brasil. O número de escravos

embarcados dependia da capacidade da embarcação. Nas caravelas, os portugueses

transportavam até 500 cativos. Um pequeno navio podia transportar até 200 escravos, um

navio grande até 700.

A bordo, todos os escravos eram marcados a ferro no ombro ou na coxa.

Embarcados, os cativos são acorrentados até que se perca de vista a costa da África. Os

navios negreiros embarcavam mais homens do que mulheres. O número de crianças era

inferior, de 3% a 6% dos embarcados.

Angola (África Centro-Ocidental) e a Costa da Mina (todo o litoral do Golfo da

Guiné) eram até o século XVIII os principais fornecedores de escravos ao Brasil. Os

principais grupos étnicos africanos trazidos ao Brasil foram os bantos, oriundos de Angola,

Golfo da Guiné e Congo; os sudaneses, originários do Golfo da Guiné e do Sudão; e os

maleses, sudaneses islamizados.

Durante o século XVI e o XVII, os escravos eram trazidos principalmente ao

Nordeste para a atividade açucareira, sobretudo, para fazendas na Bahia e em Pernambuco.

Em menor número eram enviados ao Pará, Maranhão e Rio de Janeiro. No final do

século XVII, a descoberta do ouro na província de Minas Gerais eleva o volume do tráfico,

que passa a levar os cativos para a região das minas. No século XVIII, o ouro sucede o

açúcar na demanda de escravos, o café substitui o ouro e o açúcar no século XIX.

Entre a segunda metade do século XVI e 1850, data do fim do tráfico negreiro (Lei

Eusébio de Queiroz), o número de escravos vindos para o Brasil é estimado entre 3 500

000 e 3 900 000. O Brasil teria importado 38% dos escravos trazidos da África para o

Novo Mundo.

Os escravos a bordo estavam sujeitos a todos os riscos. Sua alimentação era

escassa. Não fazia exercícios físicos durante a viagem. A higiene a bordo era muito

medíocre. Havia ainda os maus-tratos a bordo e a superlotação dos porões insalubres e

infectos.

Trinta dias durava a viagem de Angola a Pernambuco, quarenta até a Bahia,

cinquenta até o Rio de Janeiro. A mortalidade era alta a bordo. 20% dos escravos morriam

durante essa longa viagem.

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A partir da década de 1840, a Inglaterra começa a sua guerra contra o tráfico de

escravos para o Novo Mundo, alegando razões humanitárias, mas na verdade com a

finalidade de ampliar o mercado consumidor de seus produtos industrializados. É aprovada

na Inglaterra a lei conhecida como Bill Aberdeen, que dava direito a Marinha de Guerra

britânica de prender navios negreiros no Atlântico e julgar seus tripulantes.

Sob pressão inglesa, o governo imperial brasileiro promulga a 4 de setembro de

1850, a lei Eusébio de Queiroz, que extinguia o tráfico de africanos para o Brasil. Com a

ilegalidade do tráfico, a alternativa foi a intensificação do tráfico inter-regional e

interprovincial de escravos. Assim, no século XIX, os cativos vinham principalmente das

províncias do Norte e Nordeste para suprir as necessidades de mão-de-obra do Sudeste

cafeeiro.”

(texto retirado do Site www.portalventrelivre.com/?tag=navionegreiro)

Atividades para o aluno

a) O que mais lhe chamou a atenção nos textos lidos sobre o tráfico de pessoas do

continente africano para o Brasil?

b) O que você aprendeu de novo a respeito do tráfico de africanos para o Brasil?

c) Escreva as características deste comércio de pessoas.

d) Algum dos textos acima justifica o tráfico de escravos? Como?

e) De que forma os textos mostram os negros no período colonial?

f) No texto 3 percebemos que a Inglaterra pressionou os países americanos a por fim ao

tráfico e a escravidão. Destaque os motivos que levaram o país europeu a tomar tal

atitude.

g) Pesquise notícias para elaborar um painel demonstrativo sobre situações de violência /

discriminação / preconceito / racismo contra os diferentes grupos sociais, com a ajuda

do(a) professor(a).

h) Produza um texto para posterior apresentação considerando a letra da música e os

textos apresentados para o estudo.

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6. SEGUNDA UNIDADE

O cotidiano das populações afro-brasileiras presente nas obras de Monteiro Lobato

1. Apresentação do projeto. O professor fará um breve comentário sobre a utilização

de obras literárias como fontes históricas no ensino de História. Apresentar de forma

suscinta os autores que se fará uso para o estudo do recorte do espaço temporal.

2 Atividades

Os trechos abaixo fazem parte respectivamente dos contos do autor Monteiro Lobato

“Negrinha” da obra Negrinha e “Bocatorta” da obra Urupês.

Negrinha

“Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fusca, mulatinha escura, de

cabelos ruços e olhos assustados.

Ótima, a dona Inácia.

Mas não admitia choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva. Viúva

sem filhos, não a calejara o choro da carne de sua carne, e por isso não suportava o choro

da carne alheia. Assim mal vigia, longe na cozinha, a triste criança, gritava logo nervosa:

- Que é a peste que está chorando aí?

Quem havia de ser? A pia de lavar pratos? O pilão? O forno? A mãe da criminosa

abafava a boquinha da filha e afastava-se com ela para os fundos do quintal, torcendo-lhe

em caminho beliscões de desespero.

- Cale a boca, diabo!”

Bocatorta

“-Bocatorta é a maior curiosidade da fazenda, respondeu o major. Filho duma escrava de

meu pai, nasceu, o mísero, disforme e horripilante como não há memória de outro. Um

monstro, de tão feio... O povo diz de horrores - que come crianças, que é bruxo, que tem

parte com o demo.”

“- Você exagera, Vargas.Nem o diabo é tão feio assim, criatura de Deus!

- Homem, seu doutor, quer saber? Contando não se acredita. Aquilo é feiúra que só

vendo!”

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“- Bocatorta? – exclamou Cristina com um reverbero de asco no rosto.-Não me fale. Só o

nome dessa criatura já me põe arrepios no corpo.”

“ Lábios de pitanga, a magnólia da pele acesa em rosas nas faces, olhos sombrios como a

noite, dentes de pérola..., ...linda que nem uma santa.”

3. Após a leitura destes trechos da obra de Monteiro Lobato os alunos deverão

responder o seguinte questionamento.

Atividade para o aluno

a) Você conhece o autor dos textos acima citados?

b) Que obra você leu ou conhece deste autor ?

c) Você conhece as obras acima citadas? Se conhecer, qual é o tema da obra? Se não

conhece, sobre o que você imagina que o autor trata nestas obras? Produza um

parágrafo sobre a sua dedução ou conhecimento sobre as obras.

4. Vamos conhecer um pouco mais sobre Monteiro Lobato. Para isso vamos ler os

contos “Negrinha” e “Bocatorta”.

Atividade para o aluno

Depois da leitura na íntegra destes contos, em duplas vamos responder ao seguinte

questionamento.

a) Em que local e época se dá o ocorrido?

b) Como o autor faz a configuração dos personagens? Quem são? O que fazem? O que

falam? O que pensam? Como se sentem?

c) Que ações pensamentos e opiniões motivam tais personagens?

d) Dentre os personagens existem alguns que não são justificados?

5. Dividir a sala em grupos de três componentes, para em seguida ler um dos contos

novamente e responder ao seguinte questionamento.

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Atividade para o aluno

a) Usa-se a primeira ou a terceira pessoa, ou seja, o narrador é parte das ações narradas?

Retirar do texto alguns trechos que comprovem a resposta

b) O narrador conhece o interior das personagens que retrata, ou o seu horizonte é

idêntico ao destes personagens?Justifique sua resposta.

c) Que posição o narrador toma frente os fatos narrados? Tem uma postura neutra?

Garante uma distância? Toma partido?

6. Texto 1

“ Ocorreria, mesmo, que um negro desgastado do eito tivesse oportunidade de

envelhecer num canto da propriedade, vivendo do produto de sua própria roça, devotado a

tarefas mais leves requeridas na fazenda. Liberto, porém, já não sendo de ninguém, se

encontrava só e hostilizado, contando apenas com sua força de trabalho, num mundo em

que a terra e tudo o mais continuava apropriada. Tinha de sujeitar-se, assim, a uma

exploração que não era maior que dantes, porque isso seria impraticável, mas era agora era

desinteressada do seu destino. Nessas condições o negro forro, que alcançara de algum

modo certo vigor físico, poderia, só por isso, sendo mais apreciado como trabalhador,

fixar-se nalguma fazenda, ali podendo viver e reproduzir. O débil, o enfermo, o

precocemente envelhecido no trabalho, era simplesmente enxotado como coisa

imprestável.

Depois da primeira lei abolicionista - a Lei do Ventre Livre, que liberta o filho da

negra escrava -, nas áreas de maior concentração da escravaria, os fazendeiros mandavam

abandonar, nas estradas e nas vilas próximas as crias de suas negras que, já não sendo

coisas suas, não se sentiam mais na obrigação de alimentar. Nos anos seguintes à Lei do

Ventre Livre (1871), fundaram-se nas vilas e cidades do estado de São Paulo dezenas de

asilos para acolher estas crianças, atiradas fora pelos fazendeiros. Após a abolição, à saída

dos negros do trabalho que não mais queriam servir aos antigos senhores, segui-se a

expulsão de negros velhos e enfermos das fazendas. Numerosos grupos de negros

concentravam-se, então, à entrada das vilas e cidades, nas condições mais precárias. Para

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escapar a essa liberdade famélica é que começaram a se deixar aliciar para o trabalho sob

as condições ditada pelo latifúndio.”

(Ribeiro, Darcy. O povo brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. São Paulo:

Companhia das Letras, 1995. P. 232)

7. Relação passado/presente. Responder individualmente e depois expor oralmente as

respostas, promovendo um debate.

Atividade para o aluno

a) Após ler o texto acima do antropólogo Darcy Ribeiro, assim como os contos

“Negrinha” e “Bocatorta” de Monteiro Lobato e identifique quem são as crianças e

idosos que vivem em condições semelhantes ou parecidas com as personagens na

atualidade.

b) Quais são as mudanças e ou permanências que podem ser percebidas através da

leitura dos textos ?

c) É possível perceber semelhanças entre o texto do antropólogo Darcy Ribeiro e os

contos do autor Monteiro Lobato?

d) Compare o texto do antropólogo Darcy Ribeiro com o conto do Monteiro Lobato e

verifique em que medida os textos permitem o conhecimento do passado.

7. TERCEIRA UNIDADE

A vida de Monteiro Lobato e a modernização do Brasil.

1. Dividir a sala em grupos de quatro componentes para realizar a pesquisa sobre a

vida e a obra de Monteiro Lobato.

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Atividade para o aluno

Agora sua tarefa é pesquisar sobre a vida e a obra deste importante autor brasileiro.

Através da pesquisa procure responder de forma clara a origem social, a educação e a

posição política do autor assim como qual concepção literária serve para a base de sua

obra.

2 Conhecendo mais sobre Monteiro Lobato.

A obra de Monteiro Lobato, conforme você já constatou através da pesquisa, é

vastíssima. Este autor brasileiro escreveu sobre os mais diversos temas e sua obra ainda

está muito presente na mídia. Através de filmes, vídeos, reprodução de suas obras em

livros e revistas tem-se contato com a sua produção escrita. Além dos contos que já

estudamos anteriormente sobre a impressão que o autor tinha sobre o negro na sociedade

brasileira, podemos citar ainda “Bugio moqueado”, “O jardineiro Timóteo”, “Presidente

Negro” entre outros. Através do conto “O jardineiro Timóteo”, Monteiro Lobato configura

como personagem principal um negro velho que por quarenta anos prestou seu trabalho

como jardineiro para um fazendeiro. Com a venda da fazenda, os novos proprietários a que

representam a evolução, o moderno, decidem arrasar o jardim, visto como antiquado, para

plantar novas flores que simbolizariam a mudança para os novos tempos a serem

instaurados naquele lugar. Através deste conto é possível perceber como o autor retrata

algumas características da sociedade brasileira, como sociedade patriarcal, submissão da

mulher, economia agrária, e na verdade os velhos valores coloniais do Período Imperial.

“ Vendeu-se a fazenda. E certa manhã viu Timóteo arrumarem-se no trole os antigos

patrões, as mucamas, tudo o que constituía a alma do velho patrimônio...

Pela primeira vez na vida Timóteo esqueceu de regar o jardim. Quedou-se plantado

a um canto, a esmoer o dia inteiro o mesmo pensamento doloroso:

- Branco não tem coração...

Os novos proprietários eram gente da moda, amigos do luxo e das novidades.

Entraram na casa com franzimento de nariz para tudo.

- Velharias, velharias...”

19

3 Ler o conto de Monteiro Lobato “O Jardineiro Timóteo” com o objetivo de

identificar as intenções do autor na representação desta personagem .

Atividade para o aluno

a) O estudo do conto “O jardineiro Timóteo” como testemunho histórico de um

determinado período e lugar, nos possibilita identificar continuidades

(permanências) e transformações (mudanças) em nossa sociedade atual?

b) No conto lido, negros e brancos parecem conviver harmoniosamente, não

apresentando qualquer conflito social, procure encontrar no conto passagens que

confirmem tal afirmativa. Você concorda com isso? Escreva justificando sua

reposta.

c) O jardim que o jardineiro Timóteo cuidava conta uma história. “O jardim tornara-se

memória viva da casa. Livro aberto, símbolo vivo, crônica vegetal. Timóteo

compunha os anais vivos da família, anotando nos canteiros, um por um, todos os

fatos dalgumas significações, fez do jardim, o verdadeiro diário da fazenda - tudo

memorava ele, com hieróglifos vegetais, em seu jardim maravilhoso”. O jardineiro

conta a história de quem através das plantas? Ele se faz presente na história escrita

através das plantas?

d) Qual seria a intenção do autor escrever que Timóteo era um preto branco por dentro?

Que interpretação você faz desta fala do autor?

e) Quais são os sentimentos que acometem o personagem principal neste conto de

Monteiro Lobato?

f) Quem é o Jardineiro Timóteo no contexto social, político e econômico da época que

foi escrito o conto?

g) De que maneira, neste conto, o autor discute a problemática da abolição da

escravatura?

20

4- Trocando ideias.

Atividade para o aluno

a) Converse com um colega para verificar qual foi à impressão que ele teve sobre o conto.

b) Agora imaginem que vocês pudessem realizar uma entrevista com o autor do conto

lido. Escreva as curiosidades em forma de perguntas que vocês fariam ao autor. Não

esqueçam de perguntar sua posição frente a abolição da escravidão no Brasil. Em

seguida as duplas deverão trocar suas perguntas com outras duplas para eu estas sejam

respondidas.

Através do texto a seguir de David Broobshaw podemos conhecer um pouco mais

sobre Monteiro Lobato. Leia-o.

Monteiro Lobato: a visão de São Paulo

O ataque duplamente cortante dirigido ao negro considerando-o de um lado animal

selvagem e, de outro, possuidor de certas qualidades infinita e convenientemente

resignadas, não subversivas, é muito perceptível nos escritos do paulista sincero Monteiro

Lobato. Em seu conto Bocatorta tem-se a descrição de um negro “fantasma” e ladrão de

sepulturas em termos satânicos, ao passo que em o Jardineiro Timóteo, o velho jardineiro

simboliza a sensibilidade e, na verdade, os velhos valores coloniais do tempo do Império.

A imagem do monstro em Bocatorta difere da do negro selvagem nos romances de Coelho

Neto e Afrânio Peixoto. No conto de Monteiro Lobato, Bocatorta é apresentado como

sendo fisicamente repulsivo, especialmente para a filha do fazendeiro, que morre por ter

posto os olhos nele. É obvio que a reação contrária ao negro depois da Abolição

demandava seu afastamento das mulheres brancas como um dos meios para sua

marginalização social. Criar um monstro a partir dele era, na verdade, dizer que ele não era

um homem, nem tampouco merecia qualquer contato humano, fosse qual fosse. Assim

como a mulher branca era assexualizada para tornar-se modelo de inocência e pureza, o

homem negro também era assexualizado para ser transformado e monstro. Monteiro

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Lobato, portanto, nada poupa em sua descrição de Bocatorta: “Bocatorta excedeu a toda

pintura. A hediondez personificara-se nele. Avultando, sobretudo, na monstruosa

deformação da boca. Não tinha beiços e as gengivas largas, violáceas, com raros cotos de

dentes bestiais fincados às tortas, mostravam-se cruas, como enorme chaga viva. E torta,

posta de viés na cara, num esgar diabólico, resumindo o que o feio pode compor

horripilante.” Na verdade, a opinião de Monteiro Lobato sobre serem feios os traços físicos

do negro, fica bem evidente em uma carta a Godofredo Rangel, onde descreve uma cena de

rua no Rio: “ Num desfile, à tarde, pela horrível rua Marechal Floriano, da gente que volta

para os subúrbios, perpassam todas as degenerescências, todas as formas de má-formas

humanas - todas menos a normal.”

A própria negrofobia de Monteiro Lobato deve ser atribuída, pelo menos em parte,

ao fato de que ele era de São Paulo, uma cidade onde negros e mulatos eram a minoria, e

onde o racismo nos anos posteriores à Abolição era mais manifesto do que em qualquer

outro lugar. Foi certamente como um paulista que ele viu o perigo de uma invasão de

negros das áreas pobres do país e imaginou a mistura de raças que resultaria, Como muitos

de seus contemporâneos, Lobato não defendia a miscigenação, na verdade ele atacava

abertamente, imputando o subdesenvolvimento industrial brasileiro à inferioridade racial e

ao mulatismo.

Texto retirado do livro de David Brookshaw, sob o título Raça & cor na literatura

brasileira. Tradução de Marta Kirst, Porto Alegre: Mercado Aberto, 1983.

Atividades para ao aluno.

a) O que você entende por negrofobia?

b) Você concorda com o autor sobre a negrofobia de Monteiro Lobato?

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8. QUARTA UNIDADE

O romance de Aluísio De Azevedo no contexto do fim do Período Imperial

1- Leitura

O autor David Brookshaw, em seu livro Raça e cor na literatura brasileira, coloca

que a figura do negro na literatura brasileira é posterior a 1850. Antes disso, praticamente

não existem obras que evidenciam a presença do escravo, do negro. É após a Lei Eusébio

de Queirós, a qual instituiu abolição do tráfico de escravos, que literatos brasileiros passam

a se ocupar deste tema. Isto causa muita estranheza se pensarmos no papel diário que o

negro escravo exercia nas mais diversas atividades. Segundo Davi J. Haberly, em

Abolitionism in Brazil, citado por Brookshaw “isto é um indício de que o escritor brasileiro

não considerava o escravo de modo nenhum um ser humano, e não há dúvida que há algo

de verdade nisto

Conforme Brookshaw (1983), a abolição do tráfico de escravos forçou os escritores

brasileiros a voltar sua atenção aos escravos e, em particular, ao tratamento que recebiam,

dado que o prolongamento da escravidão dependia consideravelmente da maneira como os

negros eram tratados. Após esta data a literatura passa a demonstrar preocupações com o

escravo, aparecendo a partir de então inúmeros romances que evidenciam a figura do

escravo negro no Brasil. Para o autor, os literatos desta época não questionam a existência

da escravatura em si, representando o negro de forma estereotipada, sendo, muitas vezes

eles próprios vítimas de todos os preconceitos e intolerâncias que rodeavam a questão da

raça e da cor.

Para compreender um pouco melhor esta época tão confusa que envolve o fim da

escravidão, quando interesses particulares se sobrepunham aos interesses de uma grande

maioria vamos buscar analisar a obra de Aluíso de Azevedo “O mulato” (1881). O

romance retrata um personagem comum na vida real do final do século XIX no Brasil.

Raimundo, o personagem principal do enredo escrito por Aluíso de Azevedo é filho do

português José da Silva com uma escrava negra de nome Domingas. José da Silva depois

de tornar-se um homem de grandes posses, um grande proprietário de terras, casa-se com

Dona Quitéria Inocência de Freitas Santiago, rica proprietária, viúva e naturalmente que

nutre um grande ódio por negros escravos. Esta por sua vez não admite que Raimundo seja

criado pelo pai, e para atender os desejos da esposa José despacha seu filho para seu irmão

23

Manuel um comerciante que é casado, mas ainda não tem filhos. É a esposa de Manuel

uma senhora meiga, branca e cheia das qualidades que vai fazer com que Raimundo um

menino sujo, feio, doente torne-se a partir dos cuidados em pouco tempo um menino

robusto e cheio de vida.

Esta estória passa-se no Maranhão antes da abolição da escravatura, na superfície,

um trágico caso de amor entre um mulato educado, Raimundo, recentemente vindo da

Europa, e sua prima, Ana Rosa. O enredo se desenvolve em um ambiente de intolerância

racial. Enquanto o romance está mais para a escola romântica no tocante a descrição de

Raimundo que desconhece suas origens misteriosas e servis e de Ana Rosa como pálida

heroína, o despertar de sua luxúria e o conseqüente romance com Raimundo são

interpretados do ponto de vista de um naturalista. A trágica conseqüência do

relacionamento das personagens origina-se do efeito desastroso da paixão mulata sobre a

fraca sensibilidade feminina: “ Entontecia de pensar nele. O hibridismo daquela figura, em

que a distinção e a fidalguia do porte harmonizavam caprichosamente com a rude e

orgulhosa franqueza de um selvagem, produzia-lhe na razão o efeito de um vinho forte,mas

de uma doçura irresistível e traidora”...

Os escritores de influência naturalistas eram pró-abolicionistas e é nestas

características que o escritor Aluísio de Azevedo se assemelha, seus escritos não se dão por

amor ao negro, mas por que era republicano, e estes não se ligavam aos interesses de

senhores-de-escravos. Ele era produto de uma burguesia urbana em expansão,

comprometida com os ideais de tecnologia e trabalho não escravo como instrumentos de

progresso e de desenvolvimento econômico. Os naturalistas ratificaram os estereótipos

negativos do negro, ampliando a área de concentração para incluir o mulato, o qual era

visto como ameaça potencial à ordem étnica e sociedade uma sociedade livre da

escravidão.

2. Atividade para o aluno

a) Pesquisar quem eram os literatos naturalistas e porque eram ou foram assim

denominados.

b) Qual o significado da expressão “pró-abolicionista”? Pesquise sobre as razões

deste posicionamento.

c) Aluíso de Azevedo era um republicano. Explique os motivo para ser assim

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denominado.

d) Para saber mais sobre Aluísio de Azevedo, vamos pesquisar sobre sua obra e sua

vida.

3.Atividade de leitura

Para fazer a leitura desta obra é necessário estar atento nas questões da ficha de leitura

abaixo. A leitura da obra “O mulato” de Aluísio de Azevedo nos proporcionará maior

conhecimento da sociedade brasileira do final do século XIX.

Ficha de leitura

a) Nome da obra e do Autor - Outras obras do autor

b) Referências históricas: espaço, tempo e eventos históricos

c) Protagonistas identificados no texto.

d) Como o autor caracteriza estes protagonistas?

e) Quem é o personagem principal, como o autor o descreve, atente para as

características físicas, intelectuais, econômicas, culturais entre outros.

f) Gostou ou detestou algum personagem? Qual? Justifique as razões.

g) É possível conhecer aspectos da economia, política e religiosidade da sociedade

brasileira através desta obra. Transcreva frases ou excerto mais importantes sobre o

solicitado.

h) Transcreva frase ou excerto que particularmente gostou e que poderia ser debatido

em sala de aula.

i) Indique razões para ler esta obra.

4. Atividade de síntese e apresentação

Após a leitura e a realização desta ficha os alunos deverão formar grupos de quatro pessoas

para sintetizar as respostas individuais em respostas coletivas. Em seguida apresentar de

forma oral a ficha de leitura produzida coletivamente.

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9. QUINTA UNIDADE

Trabalhando Contos de Monteiro Lobato através da teatralização

Através da pesquisa realizada sobre a obra e vida do autor brasileiro Monteiro

Lobato tivemos a oportunidade de conhecê-lo melhor. Constatamos que o autor, que

adorava livros, dizia o que pensava, agradando ou não, defendia suas verdades e escrevia a

partir de suas vivências. Diversos personagens tornaram-se conhecidos nacionalmente

através de seus livros, que foram republicados e readaptados. Por isso, ainda é atual.

Através dos contos, que já tivemos a oportunidade de ler, percebemos que o autor

Monteiro Lobato descreve os personagens negros enfatizando defeitos físicos do corpo,

assim como aspectos de temperamento e caráter. O negro é retratado como um ser

possuidor do saber prático, executor de trabalhos manuais, bondoso, humilde, servil, dócil,

detentor do bom senso, ligado à feitiçaria, estereotipado e deformado físico e moralmente.

Observe na citação abaixo como o autor representa o negro em seu conto “Bugio

moqueado”:

Um dia, em Três Corações, tomei a serviço um preto de nome Zé Esteves. Traquejado da vida e sério, meses depois virava Esteves a minha mão direita. Para um rodeio, para curar uma bicheira, para uma comissão de confiança não havia outro. Negro quando acerta de ser bom vale por dois brancos. Esteves valia por quatro (LOBATO, 1994, p.48- 49).

Através do vídeo contos da meia noite – “Bugio moqueado” vamos aprimorar

nosso conhecimento sobre o cotidiano rural brasileiro no início do século XX. Preste bem

atenção no vídeo para em seguida refletir sobre e responder aos questionamentos.

Para acessar o vídeo segue o endereço:

http://www.youtube.com/watch?v=ph0CY4ihD6w

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Atividades para o aluno

1 - Que impressões o conto lhe causou?

3 – O vídeo que acabamos de assistir foi produzido a partir de um conto de autor

Monteiro Lobato. Quem são os personagens presentes neste conto e como os mesmos são

representados?

4 – É possível através de este conto perceber aspectos econômicos, sociais e

políticos do Brasil neste período? Escreva fazendo os apontamentos sobre os itens sugeridos.

5- Como é retratado o cotidiano brasileiro deste período?

6- Como estão evidenciados no conto os problemas sociais do período no Brasil?

Relacione tais problemas com os existentes na atualidade.

Atividade Final

Trabalhando com representações e readaptações.

Em grupo a ser definido o número de participantes, escolher um dos contos

estudados para representar através de teatralização.

Discutir com a professora um enredo que atualize o conto, ou seja, que recoloque

questões no contexto atual. Se necessário, problematizar posicionamentos e representações

do autor, consideradas inapropriadas e preconceituosas. Através deste exercício de crítica

do autor e de crítica social, elabore um enredo para encenação.

Definir cenário, figurino e personagens da peça a ser encenada.

Ensaiar e apresentar para a sala e para os demais alunos do colégio.

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10. BIBLIOGRAFIA

AZEVEDO, Aluísio. O mulato. 20.ed. São Paulo: Martins, 1975.

AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda negro medo branco: o negro no imaginário

das elites século XIX. 2ª edição. São Paulo: Annablume, 2004.

BROOKSHAW, David. Raça & Cor na literatura Brasileira. Tradução Marta Kisrt.

Porto Alegre: Mercado Aberto, 1983.

MONTEIRO, Lobato. Negrinha. São Paulo:Brasiliense,1994.

__________, Urupês. São Paulo: Brasiliense, 2004.

PARANÁ, Governo do Estado do Paraná, Secretaria de Estado da Cultura,

Superintendência da Educação. Diretrizes Curriculares de Historia para a Educação

Básica. Curitiba/Pr 2006. Disponível em www.diaadiaeducação.pr.gov.br,acesso abril

2010

PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação.

Departamento de Ensino Fundamental. História e Cultura afrobrasileira e Africana :

educação para as relações étnico-raciais. Cadernos Temáticos. Curitiba: Seed/Pr. 2006.

PESAVENTO, Sandra J. Fronteiras da ficção: diálogos da história com a literatura.

Estudos de História, Franca, v.6, n. 1, 1999, p.67- 85.

PESAVENTO, Sandra J. (Org.) Leituras cruzadas: diálogos da história com a literatura.

Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2000.

PINSKY, Jaime. A Escravidão No Brasil. 11ª edição. São Paulo: Contexto, 1992.

RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. São Paulo:

Companhia das Letras, 1995.

www.portalventrelivre.com/?tag=navionegreiro)