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Empresas investem em grupos de corrida para seus funcionários e conseguem melhoria de resultados • A Organização Mundial da Saúde adverte: investir US$ 1 na saúde dos funcionários faz bem à empresa, pois evita-se que outros US$ 3,20 sejam gastos no tratamento de doenças que levem à ausência deles no trabalho. Pensando nisso, muitas companhias estão criando grupos de corrida para incentivar os em- pregados a sair do sedentarismo, ganhar qualidade de vida e, por conseqüência, melhorar a produtivi- dade. Com uma das maiores equipes de corrida do Rio, com 502 funcionários inscritos e fila de espera, Furnas tem conseguido alcançar seus objetivos. — Além dos benefícios à saúde, como combate à hipertensão, hiperglicemia e obesidade, a corrida in- tegra as pessoas, democratizando as relações, e quebra hierarquias — diz o professor Wilson Neiva Milan Caldas, responsável pelo programa de qualidade de vida de Furnas há 18 anos. — Essas iniciativas são ferramentas de incentivo à saúde, com as quais conseguimos motivar o funcionário, dando-lhe satisfação e comprometimento. Para Maurício Goldenstein, psicólogo organizacional e diretor da Training X, a empresa que oferece pro- gramas de qualidade de vida, como grupos de corrida para funcionários, ganha muito: — Ao criar esses benefícios, a companhia mostra que seus funcionários não são descartáveis e que existe uma preocupação com a saúde deles. Quanto mais preparados física e psicologicamente, mais produti- vos eles serão. Isso gera comprometimento das duas partes. Um funcionário mais produtivo leva a empresa a ter melhores resultados. Ulysses Astolpho Júnior, médico especializado em medicina do trabalho e responsável pelo grupo de corrida da Rio de Janeiro Refrescos — fabricante da Coca-Cola no Rio e no Espírito Santo e que tem em sua unidade de Jacarepaguá uma pista para seus funcionários treinarem —, vê pontos positivos na inicia- tiva. — Pesquisas indicam que um funcionário sedentário chega a faltar ao trabalho cerca de 30% a mais que um ativo, por causa de doenças relacionadas ao sedentarismo. Para uma empresa, isso corresponde a uma despesa a mais. Se o funcionário é corredor ou caminhante, por exemplo, ele passa a ser mais saudável, com maior ânimo para trabalhar. Nos Estados Unidos, há empresas que preferem contratar pes- soas que pratiquem alguma atividade física por conta da produtividade — afirma Ulysses, que corre há cinco anos e tem nos 10km sua distância preferida. — Nosso grupo de corrida começou em 2006 com 30 pessoas. Hoje, já são 90, com alguns treinando na fábrica e outros, perto de casa. Segundo João Paulo Póvoa, diretor-técnico da Integra/Run & Fun, que cuida do treinamento dos fun- cionários da Rio de Janeiro Refrescos e de outras quatro companhias, normalmente as empresas deter- minam o número de vagas que serão oferecidas aos funcionários nos grupos de corrida e contratam assessorias esportivas especializadas. Em muitos casos, a participação dos empregados é custeada quase totalmente pela empresa, que, ao dar o incentivo, exige dedicação dos funcionários aos treinos e que eles tracem metas a serem alcançadas nas corridas. — As assessorias dão toda orientação ao grupo, fazendo planilhas individuais de treinos, que são pre- parativos para as provas — comenta João Paulo. Para Cássio Mazzorato de Sá, coordenador do programa Amil Qualidade de Vida, mais de mil pessoas dos escritórios do Rio, São Paulo, Campinas, Brasília e Curitiba estão participando do Mova-se, que tem ativi- dades de corrida e caminhada: — A ideia é conseguir reduzir efetivamente o percentual de sedentários na empresa, além de promover a integração entre os colaboradores. Qualidade de vida na sola do tênis Jornal O Globo 18 fevereiro 2011 Iúri Totti

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Page 1: Jornal O Globo 18 fevereiro 2011 Iúri Totti · Alcancei o meu primeiro objetivo, que foi correr os 5km na última São Sebastião — conta Luciano, coordenador do serviço ao cliente,

Empresas investem em grupos de corrida para seus funcionários e conseguem melhoria de resultados • A Organização Mundial da Saúde adverte: investir US$ 1 na saúde dos funcionários faz bem à empresa, pois evita-se que outros US$ 3,20 sejam gastos no tratamento de doenças que levem à ausência deles no trabalho. Pensando nisso, muitas companhias estão criando grupos de corrida para incentivar os em-pregados a sair do sedentarismo, ganhar qualidade de vida e, por conseqüência, melhorar a produtivi-dade.Com uma das maiores equipes de corrida do Rio, com 502 funcionários inscritos e fila de espera, Furnas tem conseguido alcançar seus objetivos.— Além dos benefícios à saúde, como combate à hipertensão, hiperglicemia e obesidade, a corrida in-tegra as pessoas, democratizando as relações, e quebra hierarquias — diz o professor Wilson Neiva Milan Caldas, responsável pelo programa de qualidade de vida de Furnas há 18 anos. — Essas iniciativas são ferramentas de incentivo à saúde, com as quais conseguimos motivar o funcionário, dando-lhe satisfação e comprometimento.Para Maurício Goldenstein, psicólogo organizacional e diretor da Training X, a empresa que oferece pro-gramas de qualidade de vida, como grupos de corrida para funcionários, ganha muito:— Ao criar esses benefícios, a companhia mostra que seus funcionários não são descartáveis e que existe uma preocupação com a saúde deles. Quanto mais preparados física e psicologicamente, mais produti-vos eles serão. Isso gera comprometimento das duas partes. Um funcionáriomais produtivo leva a empresa a ter melhores resultados.Ulysses Astolpho Júnior, médico especializado em medicina do trabalho e responsável pelo grupo de corrida da Rio de Janeiro Refrescos — fabricante da Coca-Cola no Rio e no Espírito Santo e que tem em sua unidade de Jacarepaguá uma pista para seus funcionários treinarem —, vê pontos positivos na inicia-tiva.— Pesquisas indicam que um funcionário sedentário chega a faltar ao trabalho cerca de 30% a mais que um ativo, por causa de doenças relacionadas ao sedentarismo. Para uma empresa, isso corresponde a uma despesa a mais. Se o funcionário é corredor ou caminhante, por exemplo, ele passa a ser mais saudável, com maior ânimo para trabalhar. Nos Estados Unidos, há empresas que preferem contratar pes-soas que pratiquem alguma atividade física por conta da produtividade — afirma Ulysses, que corre há cinco anos e tem nos 10km sua distância preferida. — Nosso grupo de corrida começou em 2006 com 30 pessoas. Hoje, já são 90, com alguns treinando na fábrica e outros, perto de casa.Segundo João Paulo Póvoa, diretor-técnico da Integra/Run & Fun, que cuida do treinamento dos fun-cionários da Rio de Janeiro Refrescos e de outras quatro companhias, normalmente as empresas deter-minam o número de vagas que serão oferecidas aos funcionários nos grupos de corrida e contratam assessorias esportivas especializadas. Em muitos casos, a participação dos empregados é custeada quase totalmente pela empresa, que, ao dar o incentivo, exige dedicação dos funcionários aos treinos e que eles tracem metas a serem alcançadas nas corridas.— As assessorias dão toda orientação ao grupo, fazendo planilhas individuais de treinos, que são pre-parativos para as provas — comenta João Paulo.Para Cássio Mazzorato de Sá, coordenador do programa Amil Qualidade de Vida, mais de mil pessoas dos escritórios do Rio, São Paulo, Campinas, Brasília e Curitiba estão participando do Mova-se, que tem ativi-dades de corrida e caminhada:— A ideia é conseguir reduzir efetivamente o percentual de sedentários na empresa, além de promover a integração entre os colaboradores.

Qualidade de vida na sola do tênis Jornal O Globo 18 fevereiro 2011 Iúri Totti

Page 2: Jornal O Globo 18 fevereiro 2011 Iúri Totti · Alcancei o meu primeiro objetivo, que foi correr os 5km na última São Sebastião — conta Luciano, coordenador do serviço ao cliente,

Para Alexandre Maximiliano, da Start Assessoria Esportiva, que atende a oito empresas, com esses grupos de corrida, as firmas reduzem os índices de absenteísmo, de acidentes de trabalho e de afastamentos por doença; aumentam a produtividade; e promovem a integração dos trabalhadores.— Uma das grandes vantagens desses programas é o aumento da autoestima dos funcionários. Há casos de em-pregados que saíram do sedentarismo e, com treinamento planejado, já conseguiram correr até uma maratona — diz Alexandre, acrescentando que todas as pessoas envolvidas passam por avaliações periódicas para saber como estão de saúde.Luciano Melhado é um exemplo de funcionário que se beneficiou do programa de qualidade de vida da Unilever.— Tinha aversão a academias e não me exercitava com regularidade. Depois que entrei para o programa da em-presa, estou mais disciplinado. Além dos objetivos profissionais, tenho metas pessoais. Alcancei o meu primeiro objetivo, que foi correr os 5km na última São Sebastião — conta Luciano, coordenador do serviço ao cliente, que já emagreceu 8kg desde agosto do ano passado, quando ingressou no programa, com orientação de João Paulo. — Vou perder ainda mais peso, pois já tracei minha meta para 2012, que é correr os 10km da São Sebastião.A indústria química e farmacêutica Merck criou seu grupo em outubro de 2010 e aproveitou uma área externa de sua unidade em Jacarepaguá para fazer uma pista para seus funcionários correrem, supervisionados por um profis-sional da Start.— Lançamos este grupo, e a resposta dos funcionários foi muito boa. Os resultados já podem ser percebidos na produtividade das pessoas — afirma Plínio Moreira de Castro Filho, responsável pela coordenação de medicina ocupacional da Merck, que tem 60 corredores no Rio.

Agrupar é precisoMarcos Dantas é triatleta e treinador da equipe Pro Ribeiro

• “Um por todos e todos por um!” O escritor Alexandre Dumas fez história com esta frase do famoso livro “Os três mosqueteiros”. A frase é batida, mas quando o assunto é trabalho em grupo, união, parceria, nada a supera. Se agrupar em prol de qualquer atividade geralmente traz bons resultados, quando o assunto é corrida então, melhor ainda.O prazer de correr acompanhado é um dos principais elementos de motivação para um treinamento. Tem dias que realmente é difícil sair da cama para treinar. Tem a questão do calor, do cansaço, da preguiça... mas, saber que você tem um compromisso marcado com alguém sempre ajuda. Quando este compromisso é com um grupo, aumenta ainda mais a responsabilidade. Quer ver uma prova prática e cabal disso? Observe as corridas de revezamento. Veja como os tempos e recordes pessoais são superados nestas competições. Por quê? Porque não queremos decepcio-nar ao próximo. Sabemos que tem alguém dependendo da gente naquele momento.O treinamento de corrida — dependendo da intensidade — pode ser feito tranquilamente conversando. Não há mal algum em relaxar e falar da vida durante aquele trote leve pela orla, tendo ao lado uma parceria com o mesmo objetivo: manter a saúde de forma lúdica. Sim, por que corrida também é diversão! Caretas de esforço e dores musculares fazem parte, mas o prazer em correr tem sempre de superar estes “obstáculos”.Restrições? Poucas, mas têm. A principal é saber que o encontro é coletivo, mas o treino é individual. Você pode treinar com alguém ao seu lado, desde que respeite o limite de intensidade que foi determinado a você. Para que isto dê certo, procure parceiros com o mesmo nível de condicionamento que o seu, evitando assim frustrações e exageros que em nada ajudam a melhora da saúde. É claro que é estimulante superar marcas que nunca alcan-çamos e, nessa hora, o grupo sempre auxilia. O que quero dizer é: escolha adequadamente o seu “coelho” neste grupo. Não adianta chegar no treino ou no dia da corrida e teimar em correr com o Marílson Gomes (hoje o melhor corredor do Brasil), por exemplo...Os três mosqueteiros, quando bradam o famoso bordão, querem dizer duas coisas óbvias e outra subliminar: um, se dedicando por todos; e esses, juntos, se dedicando por um. Implicitamente, vem o principal: todos juntos se dedicando por um objetivo comum. No nosso caso, pela saúde e qualidade de vida individual e coletiva. Correr em grupo é mais do que preciso, é essencial.