monografia necessidades educacionais

84
ASSOCIAÇÃO JUINENSE DE ENSINO SUPERIOR DO VALE DO JURUENA – AJES INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO DO VALE DO JURUENA-ISE CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM METODOLOGIAS DIVERSIFICADAS NA EDUCAÇÃO – 04 A 10 ANOS. INCLUSÃO ESCOLAR DO ALUNO COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS ELIANA ALVES BORBA

Upload: gersonmartinsdasilva

Post on 23-Jun-2015

879 views

Category:

Documents


7 download

TRANSCRIPT

Page 1: Monografia Necessidades Educacionais

ASSOCIAÇÃO JUINENSE DE ENSINO SUPERIOR DO VALE DO

JURUENA – AJES

INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO DO VALE DO JURUENA-ISE

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM METODOLOGIAS

DIVERSIFICADAS NA EDUCAÇÃO – 04 A 10 ANOS.

INCLUSÃO ESCOLAR DO ALUNO COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS

ELIANA ALVES BORBA

CUIABÁ – MTJULHO/2007

Page 2: Monografia Necessidades Educacionais

Associação Juinense de Ensino Superior do Vale do Juruena – Ajes

Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena - ISE

Curso de Pós-Graduação em Metodologias Diversificadas na Educação – 04 a 10 anos.

Inclusão escolar do aluno com necessidades educacionais especiais

Eliana Alves Borba

Orientador (a): Rosemary de Oliveira Kauffman.

Monografia apresentada a Associação Juinense de Ensino

Superior do Vale do Juruena AJES. - Instituto Superior de

Educação do Vale do Juruena – ISE como requisito

parcial para obtenção do título de Especialista em

Metodologias Diversificadas na Educação – 04 a 10 anos.

CUIABÁ – MTJULHO/2007

Page 3: Monografia Necessidades Educacionais

Associação Juinense de Ensino Superior do Vale do Juruena – Ajes

Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena - ISE

Curso de Pós-Graduação em Metodologias Diversificadas na Educação – 04 a 10 anos.

TERMO DE APROVAÇÃO

ELIANA ALVES BORBA

ORIENTADORA PROF. MS. ROSEMARY DE OLIVEIRA KAUFFMANN

...........................................

NOTA/CONCEITO

Page 4: Monografia Necessidades Educacionais

AGRADECIMENTO

Agradeço a Deus por ter-me permitido realizar esta

pesquisa. Aos professores, funcionários e colegas, pela

colaboração e apoio dispensados ao longo de todo o

curso. A todas as pessoas que, de uma maneira ou de

outra, colaboraram comigo nesta realização. Enfim, a

todos os que me ofereceram auxílio, incluindo as

pessoas que não citei nominalmente aqui, agradeço por

me permitirem concluir mais uma etapa da minha vida

acadêmica e profissional.

Obrigada.

Page 5: Monografia Necessidades Educacionais

"A educação moderna está em crise,

porque não é humanizada, separa

pensador do conhecimento, o professor da

matéria, o aluno da escola, enfim, separa

o sujeito do objeto" (Augusto Cury).

RESUMO

Page 6: Monografia Necessidades Educacionais

Este estudo parte dos mais recentes desenvolvimentos conceituais em deficiência

mental para discutir os rumos e as necessidades atuais da pedagogia sobre a inclusão

educacional do aluno portador de Necessidades Educacionais Especiais (NEEs). Em relação

às pessoas que apresentam NEEs, à aceitação das diferenças à estas é complexa, por esta

razão o presente estudo optou por um segmento, dentro das deficiências, muito estigmatizado

na sociedade, que são as pessoas que apresentam paralisia cerebral. Que, de acordo com

Brandão (1992), é impróprio este termo. Portanto, ele emprega Dismotria Cerebral

Ontogenética (D.C.O.). De acordo com o referido autor dismotria significa alterações de

motricidade e do tônus; cerebral para indicar que estas alterações são conseqüentes das lesões

do cérebro; e ontogenética porque as alterações são decorrentes da anormalização do

desenvolvimento funcional da motricidade. Abordaremos também o papel da escola nesse

processo de inclusão responsável pela produção das inadaptações intelectuais; enfocaremos,

igualmente, a capacitação dos professores para enfrentar essa situação no ensino regular

fundamental. O pano de fundo de nossas considerações será o paradigma da inclusão,

aplicado à realidade escolar.

Palavras - chave: Educação Especial, Inclusão Escolar, Deficiência Mental,

Page 7: Monografia Necessidades Educacionais

ABSTRACT

In this study we leave of the most recent conceptual developments in mental deficiency to

argue the routes and the current necessities of the pedagogia on the educational inclusion of

the carrying pupil of Educational Necessities Special (NEEs). In relation to the people who

present NEEs, to the acceptance of the differences to the these she is complex, to this reason

the present study opted to a segment, inside of the deficiencies, very estigmatizado in the

society, that are the people who present cerebral paralysis. That, in accordance with Brandão

(1992), is improper this term. Therefore, it uses Cerebral Dismotria Ontogenética (D.C.O.). In

accordance with the related dismotria author means alterations of motricidade and tônus;

cerebral to indicate that these alterations are consequent of the injuries of the brain;

ontogenética e because the alterations are decurrent of the anormalização of the functional

development of the motricidade. We will also approach the paper of the school in this process

of responsible inclusion for the production of the intellectual inadaptations; we will focus,

equally, the qualification of the professors to face this situation in basic regular education.

The cloth of deep of our considerações will be the paradigm of the inclusion, applied to the

pertaining to school reality.

Words - key: Special education, Pertaining to school Inclusion, Mental Deficiency,

Page 8: Monografia Necessidades Educacionais

8

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO......................................................................................................10

2. A INCLUSÃO ESCOLAR DO PORTADOR DE NECESSIDADES

EDUCACIONAIS ESPECIAIS (NEEs).....................................................................12

2.1 Dismotria Cerebral Ontogenética (D.C.O.)..........................................................12

2.2 Educação Inclusiva: novo paradigma da Educação Especial...............................12

2.3. A construção do paradigma da educação Inclusiva.............................................13

2.4 Conceitos inclusivistas..........................................................................................15

2.5 Novas possibilidades de inclusão ou exclusão velada?........................................19

2.6 Os desafios da escola inclusiva.............................................................................23

2.7 O direito à educação do portador de deficiência e a cidadania.............................28

3. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO

BRASIL......................................................................................................................31

3.1 prática pedagógica dos professores de alunos com D.C.O...................................34

3.2 A necessidade da formação continuada de professores para a integração de alunos

com NEE.....................................................................................................................36

4. O DIREITO À EDUCAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA: ASPECTOS

JURÍDICOS................................................................................................................41

Page 9: Monografia Necessidades Educacionais

9

4.1 O que diz a Constituição Federal?........................................................................41

4.2 A LDBEN, a Educação Especial e o Atendimento Educacional Especializado...42

4.3 A LDBEN e as inovações trazidas pelo Decreto 3.956/2001 (Convenção da

Guatemala)..................................................................................................................43

4.4 Como cumprir a Constituição Federal e a Convenção da Guatemala?.................45

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................48

6. REFEREÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................50

Page 10: Monografia Necessidades Educacionais

10

1. INTRODUÇÃO

A integração ou inclusão de alunos com necessidades especiais no sistema regular de

ensino tem sido sem dúvida, a questão referente à Educação Especial mais discutida no nosso

país nas últimas décadas. Este tema, que por tanto tempo, salvo algumas experiências

isoladas, ficou restrito ao debate em congressos e textos da literatura especializada, hoje se

torna proposta de intervenção amparada e fomentada pela legislação em vigor, e determinante

das políticas públicas educacionais tanto em nível federal, quanto estadual e municipal,

direcionando programas e políticas educacionais e de reabilitação em vários países, incluindo-

se o Brasil (Cardoso, 1992; Carvalho, 1994; Glat, 1998; Mantoan, 1997).

Historicamente, a proposta de integração escolar foi elaborada em 1972, na Educação

Especial, por um grupo de profissionais da Escandinávia, liderados por Wolfensberger, na

forma do chamado princípio de normalização. Este princípio apregoa que todas as pessoas

portadoras de deficiências têm o direito de usufruir de condições de vida o mais comum ou

“normal” possível, na sociedade em que vivem. Dito de outra forma, normalizar não quer

dizer tornar normal significa dar à pessoa oportunidades, garantindo seu direito de ser

diferente e de ter suas necessidades reconhecidas e atendidas pela sociedade (Glat, 1998;

Saint-Laurent, 1997).

Assim, o conceito de integração é uma das conseqüências fundamentais do princípio

de normalização: “Normalização é objetivo. Integração é processo. Integração é fenômeno

complexo que vai muito além de colocar ou manter excepcionais em classes regulares”

(Pereira, 1990). É, portanto, parte fundamental de todo o processo educacional.

Assim, o inciso III do Art. 208 da Constituição Brasileira se refere ao atendimento

educacional especializado aos portadores de deficiências, “preferencialmente na rede regular

de ensino". E na sua “Política Nacional de Educação Especial” (MEC/SEEP, 1994), o MEC

estabelece como diretrizes da Educação Especial apoiar o sistema regular de ensino para a

inserção dos portadores de deficiências, e dar prioridade quando do financiamento a projetos

institucionais que envolvam ações de integração. Esta mesma definição foi posteriormente

reforçada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n°. 9.394/96), e

Page 11: Monografia Necessidades Educacionais

11

recentemente nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (CNE /

CEB, 2001).

A identificação dos perfis de apoio começa a levar em conta não apenas os tipos e a

intensidade de tais apoios, mas os meios pelos qual a pessoa pode aumentar sua

independência, produtividade e integração no contexto comunitário e entre seus pares da

mesma idade.

A educação inclusiva propõe que todas as pessoas com necessidades educacionais

especiais (NEEs) sejam matriculadas na escola regular, baseando-se no princípio da educação

para todos. Neste cenário a escola deve ser um espaço propício às transformações, aberta a

lidar com as diferenças sejam elas de ordens raciais, de classe econômica, entre outras, uma

vez que fazem parte da sociedade, e estão presentes em diferentes ambientes, sendo um destes

o escolar (LEÃO, 2004).

Page 12: Monografia Necessidades Educacionais

12

2. A INCLUSÃO ESCOLAR DO PORTADOR DE NECESSIDADES EDUCACIONAIS

ESPECIAIS (NEEs)

2.1 Dismotria Cerebral Ontogenética (D.C.O.)

De acordo com Garcia (2002) as pessoas que apresentam D.C.O. são pessoas que de

alguma forma sofrem preconceitos, pois na maioria das vezes, tem comprometimentos

motores e alteração da aparência física, o que dificultam a locomoção e a vida cotidiana. (p.

50).

A sociedade que valoriza a beleza física choca-se com esses comprometimentos, e

geralmente associa a deficiência a um déficit cognitivo que muitas vezes inexiste. Nota-se,

modernamente, que a deficiência é a tradução de um modelo social no qual o indivíduo acaba

sofrendo muito mais com as manifestações secundárias de sua deficiência do que

propriamente com as suas manifestações primárias.

A inclusão é um processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir as pessoas

com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na

sociedade (SASSAKI, 1997). Um dos maiores desafios da inclusão não é de fato a adaptação ou

não destas pessoas, mas sim a adaptação da sociedade a novos valores, mais sim humanos e

democráticos.

2.2 Educação Inclusiva: novo paradigma da Educação Especial

Para Mrech (1999), a Educação Especial pode ser concebida como um campo de

conhecimento, norteada por paradigmas que direcionam os seus processos, procedimentos e

conceitos. Paradigma pode ser conceituado como um conjunto de problematizações,

conceitos, valores, percepções e práticas, compartilhadas por estudiosos de uma área, sempre

considerando-se as relações entre o objeto de estudo e o contexto da .realidade social. Enfim,

o paradigma é a expressão da visão de mundo que guia a construção de um campo de

conhecimento.

Analisando o desenvolvimento da história da Educação Especial, pode-se notar que as

mudanças sociais desencadearam, ou mesmo exigiram, mudanças de paradigmas que

Page 13: Monografia Necessidades Educacionais

13

permitiram a evolução dos serviços educacionais direcionados aos indivíduos com

necessidades educativas especiais, reconsiderando seu papel social e a responsabilidade da

sociedade em relação aos mesmos.

Em vista disso, o paradigma da Educação Inclusiva surge dentro da Educação Especial

como produto histórico de uma época e da realidade educacional contemporânea, que tem

exigido dos educadores e, sobretudo da sociedade mudança de estereótipos e preconceitos e a

superação do senso comum.

O paradigma da Educação Inclusiva se fundamenta no conceito de ambiente menos

restritivo. O ambiente social e suas relações são os principais determinantes na questão do

desenvolvimento da pessoa portadora de deficiência, superando a visão médica que atribuía

única e exclusivamente o problema ao sujeito. Com isso, procura-se manter o aluno deficiente

no ensino regular com a ajuda e o suporte necessário dos professores do ensino regular e do

ensino especial.

2.3. A construção do paradigma da educação Inclusiva

Foram quatro os eixos básicos que delinearam o problema da inclusão como uma

questão pública e social e que, portanto, exigem novas práticas educacionais e sociais: a

psicanálise, a luta pelos direitos humanos, a pedagogia institucional e o movimento de

desinstítucionalização manicomial. Mrech (1999) traz as seguintes colocações sobre cada uma

delas:

2.3.1 Psicanálise

Trouxe uma nova forma de se conceber os seres humanos, revelando a importância da

linguagem, do inconsciente e da sexualidade nos processos de constituição dos sujeitos. Tem

como principais colaboradores Sigmund Freud e Jacques Lacan.

Sua importante contribuição foi enfatizar a importância das relações sociais como

determinantes para o desenvolvimento da sexualidade, da inteligência e da afetividade, não se

restringindo apenas aos processos biológicos.

Em se tratando de portadores de deficiência, Mauad Mannoni foi a autora que trouxe

maiores reformulações à maneira tradicional de se conceber a criança portadora de deficiência

Page 14: Monografia Necessidades Educacionais

14

mental. Ela questionou a aplicação do modelo médico à criança portadora de deficiência e

revelou a importância da linguagem nas relações humanas. Mrech (1999) conclui que

"a psicanálise, a partir dos trabalhos de Mauad Mannoni, veio introduzir um questionamento da aplicação direta do conceito de deficiência à criança; assim como veio também estabelecer a luta pelo direito da criança deficiente ter respeito à sua própria palavra em relação às demais pessoas. Em sfntese, que ela não ficasse mais reduzida à palavra do adulto, fosse ela do pai, professor, especialista, etc. Ela revelou que a criança portadora de deficiência é muito maior que o quadro clínico onde nós tentamos encaixá-Ia."

2.3.2 Lutas pelos Direitos Humanos

Movimento que eclode no período entre 1964 e 1968, tendo como objetivo garantir

direitos políticos e acesso igual a todas as pessoas aos processos sociais e educativos.

Acabam por trazer à tona o papel estratégico da educação na manutenção de processos

estigmatizadores no decorrer dos anos.

2.3.3 Pedagogia Institucional ou Pedagogia Revolucionária

Surgida na França na década de 60, tem suas raízes no movimento freinetiano e no

grupo dos Situacionistas Internacionais (principal grupo que compôs a Revolução de Maio de

1968, que desencadeou no mundo todo uma nova forma de ver a Educação e a cultura).

Trazem para a Educação o conceito de situação a partir de autores como Henri Wallon

e Jacques Lacan. Baseiam-se na idéia de que o individuo não deve ser focado isoladamente,

mas sim inserido no contexto social, o qual oferece ou não condições de desenvolvimento e

que são os elementos estratégicos e transformadores da cultura, sociedade e dos sujeitos.

Seu reflexo no contexto educacional foi perceber a importância do contexto escolar no

desenvolvimento do aluno e o quanto o mesmo depende do como é visto e trabalhado.

Page 15: Monografia Necessidades Educacionais

15

2.3.4 Movimento de Desinstítucionalização Manicomial e Antipsiquiatria

Considerado um dos movimentos mais transformadores da cultura na década de 60 e

70, lançou nova visão no processo de tratamento dos doentes mentais, defendendo a idéia de

que os mesmos têm o direito de participar de forma mais ampla e digna dos contextos sociais

comuns. Questionam a exclusão a que estão submetidos e a eficácia da instituição manicomial

como lugar adequado de tratamento.

2.4 Conceitos inclusivistas

2.4.1 Autonomia

É a condição de domínio do ambiente físico e social, preservando ao máximo a

privacidade e a dignidade de quem a exerce. Daqui sai os conceitos de autonomia física e

autonomia social. Exemplos: rampas nas calçadas, cadeira de rodas. O grau de autonomia

resulta da relação entre o nível de prontidão físico-social do portador de deficiência e a

realidade de um ambiente físico-social. (Sassaki, 1997)

2.4.2 Independência

Capacidade “de decidir sem depender de outras pessoas, tais como: membros da família ou

profissionais especializados”. A pessoa deficiente pode ser mais independente ou menos

independente, e isso vai depender da sua auto determinação e/ou prontidão para tomar

decisões numa situação. Ambas podem ser aprendidas e/ou desenvolvidas.

2.4.3 Empowerment

“Processo pelo qual uma pessoa, ou um grupo de pessoas, usa o seu poder pessoal

inerente a sua condição” – por exemplo: deficiência, gênero, idade, cor – para fazer escolhas e

tomar decisões. O poder pessoal está em cada ser humano. A sociedade não tem consciência

de que o portador de deficiência também possui esse poder pessoal, e aí a sociedade faz

escolhas e toma as decisões por ele.

2.4.4 Equiparação de oportunidades

A Disabled Peoples lnternational, uma organização criada por pessoas portadoras de

deficiência, não-governamental e sem fins lucrativos aprovou a sua Declaração de Princípios,

em 1951. “Processo através do qual os sistemas gerais da sociedade – tais como o ambiente

Page 16: Monografia Necessidades Educacionais

16

físico e cultural, a habitação e os transportes, os serviços sociais e de saúde, as oportunidades

educacionais e de trabalho, a vida cultural e social, incluindo as instalações esportivas e

recreativas – são feitos acessíveis para todos.” (United Nations, 1983, 12)

2.4.5 Inclusão Social

Processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais

gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para

assumir seus papéis na sociedade. Trata-se de um processo bilateral no qual as pessoas, ainda

excluídas, e a sociedade buscam equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a

equiparação de oportunidades para todos.

Para incluir todas as pessoas, a sociedade deve ser modificada a partir da compreensão

de que é ela que precisa ser capaz de atender às necessidades de seus membros.

A prática da inclusão social repousa nos seguintes princípios:

aceitação das diferenças individuais; valorização de cada pessoa; a convivência dentro da diversidade humana; a aprendizagem através da cooperação.

2.4.6 Da integração à inclusão

Neste final de século, estamos vivendo um estágio de transição entre a integração e a

inclusão. Os dois termos são falados e escritos com diversos sentidos. Os conceitos de

integração e inclusão na moderna terminologia de inclusão social.

Integração – inserção da pessoa deficiente preparada para conviver na sociedade. Inclusão – modificação da sociedade como pré-requisito para a pessoa com

necessidades especiais desenvolver-se e exercer a cidadania.

2.4.7 Modelo social da deficiência

Aqui a sociedade é que cria os problemas para as pessoas portadoras de necessidades

especiais. Desse modo, à sociedade cabe eliminar todas as barreiras físicas, programáticas e

de atitudes para que as pessoas deficientes possam ter acesso aos lugares, serviços e a bens

necessários ao seu desenvolvimento pessoal, social, educacional e profissional. Este modelo

social da deficiência focaliza os ambientes e barreiras incapacitantes da sociedade e não as

pessoas deficientes.

Page 17: Monografia Necessidades Educacionais

17

Segundo Stainback e Stainback (1999, p. 31), a inclusão é: [...] mais que um modelo

para a prestação de serviços de educação especial. É um novo paradigma de pensamento e de

ação, no sentido de incluir todos os indivíduos em uma sociedade na qual a diversidade está se

tornando mais normal do que exceção.

Para Leão (2004) a inclusão educacional indica compromisso social de se educar todos

os alunos com NEEs nas classes regulares de ensino comum, de modo que possam desfrutar

de suas experiências de vida junto com os demais alunos ditos "normais". Portanto, na visão

da autora, a inclusão seria eficaz se os estudantes envolvidos fossem realmente acolhidos.

Todavia, como a escola está fundamentada na hegemonia, a questão da aceitação e prática da

diversidade fica comprometida, gerando o preconceito devido à dificuldade que as pessoas

têm em aceitar as diferenças dos outros, redundando num sentimento de intolerância.

Deste modo, a inclusão é um assunto que deve ser tratado com muita cautela, pois, a

sociedade pode estar incorrendo em erros do passado, criando uma nova modalidade: a dos

excluídos dentro da inclusão (CARMO, 2000).

O Brasil é um país marcado pela exclusão social de um contingente crescente da

população, portanto, realizar a inclusão nesse contexto é tarefa árdua, que possibilita a pesquisa e

o questionamento dos desafios que o processo de inclusão apresenta nas escolas onde estão

ocorrendo (MENDES, 2001).

Para discutir um tema atualmente presente na Educação que envolve

conceitos/categorias como diversidade, deficiência, integração e inclusão. Segundo Sassaki

(1997), “os conceitos são fundamentais para o entendimento das práticas sociais”, a

inclusão, enquanto novo paradigma, alavanca a escola, que com novas implicações educati-

vas, deverá acolher todas as crianças independentemente de suas condições físicas, inte-

lectuais, sociais, emocionais, lingüísticas e culturais. Segundo Blanco (1998), o

desenvolvimento das escolas inclusivas implica modificações substanciais na prática

educativa, desenvolvendo uma pedagogia centrada na criança e capaz de dar respostas às

necessidades de todas as crianças, incluindo aquelas que apresentam uma incapacidade grave.

Este é o princípio vetor da Declaração e Linha de Ação da Conferência Mundial Sobre

Necessidades Educativas Especiais. (Salamanca, 1994)

Page 18: Monografia Necessidades Educacionais

18

A Integração Escolar é um processo gradual e dinâmico que pode tomar distintas

formas de acordo com as necessidades e habilidades dos alunos. A integração educativo-

escolar refere-se ao processo de educar – ensinar, no mesmo grupo, a crianças com e sem

necessidades educativas especiais, durante uma parte ou na totalidade do tempo de

permanência na escola. (MEC, 1994)

O próprio conceito de integração escolar já está sendo por muitos considerados

ultrapassado, e, a proposta mais “moderna” nos países ditos de Primeiro Mundo é a da escola

inclusiva, dentro do movimento pela inclusão total.

A Normalização, segundo o MEC (1994), é um princípio que representa a base

filosófico-ideológica da integração. Não se trata de normalizar as pessoas, mas sim o contexto

em que se desenvolvem, ou seja, oferecer, aos portadores de necessidades especiais, modos e

condições de vida diária o mais semelhante possível às formas e condições de vida do resto da

sociedade. Segundo Mantoan (1997b, p.120) a normalização visa tornar acessíveis às pessoas

socialmente desvalorizadas condições e modelos de vida análogos aos que são disponíveis de

um modo geral ao conjunto de pessoas de um dado meio ou sociedade. Essa proposta de

integração foi introduzida na Educação Especial por um grupo de profissionais da

Escandinávia, na forma do chamado Principio da Normalização.

Atualmente a prática da integração social dá-se de três formas, segundo Sassaki

(1997):

1) Pela inserção das pessoas com deficiência que conseguem utilizar os espaços físicos e

sociais, os programas e serviços, sem nenhuma modificação da sociedade (escola comum,

empresa, clube etc.);

2) Pela inserção das pessoas portadoras de deficiência que necessitam de alguma adaptação

específica no espaço físico comum, no procedimento da atividade comum, a fim de só então,

estudar, trabalhar, ter lazer, conviver com pessoas não-deficientes; e,

3) Pela inserção de pessoas com deficiência em ambientes separados dentro dos sistemas

gerais. Exemplo: escola especial junto à comunidade.

Em suma: no modelo integrativo, a sociedade aceita receber os portadores de

deficiência desde que sejam capazes de:

Page 19: Monografia Necessidades Educacionais

19

Moldar-se aos requisitos dos serviços especiais separados (classe especial, escola especial).

Acompanhar os procedimentos tradicionais (trabalho, escolarização, convivência

social etc.).

Contornar obstáculos existentes no meio físico (espaço urbano, edifício).

Lidar com atitudes discriminatórias da sociedade resultantes de estereótipos,

preconceitos e estigmas: rotulagem verbal, discriminação, incapacidade e segregação

(Amarilian, 1986).

Desempenhar papéis sociais individuais com autonomia, mas não necessariamente

com independência.

Na verdade a sociedade criou um modelo social da deficiência. A sociedade é que cria

os problemas para as pessoas portadoras de necessidades especiais. Desse modo, à sociedade

cabe eliminar todas as barreiras físicas, programáticas e de atitudes para que as pessoas

deficientes possam ter acesso aos lugares, serviços e a bens necessários ao seu

desenvolvimento pessoal, social, educacional e profissional. Este modelo social da deficiência

focaliza os ambientes e barreiras incapacitantes da sociedade e não as pessoas deficientes.

2.5 Novas possibilidades de inclusão ou exclusão velada?

Uma das questões mais relevantes hoje no que se refere à educação de alunos com

deficiência mental, especialmente aqueles com maiores comprometimentos, são os aspectos

referentes à sua terminalidade acadêmica e conseqüente certificação denominada

terminalidade específica vislumbrada como possíveis de serem efetivadas oficialmente, a

partir da LDB nº 9394/96 (Art.59, II).

O surgimento do discurso da inclusão na sociedade capitalista, em que o homem,

historicamente, de diferentes formas, é explorado, expropriado e excluído. Mostra que o

discurso da inclusão vem, de forma ideológica, contrapor-se às situações de exclusão,

sustentando-se em palavras tais como direito, igualdade, diferença, diversidade e eqüidade.

Page 20: Monografia Necessidades Educacionais

20

Neste contexto, vai sendo construído então, um novo mito, chamado educação inclusiva

idealista como todos os mitos necessário para legitimar o intenso processo de exclusão.

Para viabilizar realmente o processo de inclusão cuja discussão, normalmente eivada

de idealismo e voluntarismo, tem mascarado os reais determinantes históricos que limitam e

condicionam sua efetivação são necessárias mudanças estruturais na sociedade e na escola.

Nesta última exige-se, entre outras medidas, uma nova política de formação de

professores, quebra de barreiras arquitetônicas e atitudinais, equipamentos, materiais e

currículos adaptados e equipe técnica de apoio, formada por profissionais das áreas da saúde e

educação.

A polêmica sobre a inclusão de alunos com deficiências/necessidades especiais nas

escolas regulares acontece no sentido de que a depauperada escola brasileira e seus

professores assentes numa sociedade em que o modo de produção capitalista produz mais e

mais concentração de renda e enormes contingentes de excluídos e, por conseqüência, mais e

mais desigualdade social receberam a incumbência de fazer a inclusão, mas, não receberam as

condições materiais para tal. Neste cenário, a legislação nacional garante a esses alunos

possibilidades de prosseguimento de sua vida acadêmica e profissional.

Tal possibilidade quando se refere à certificação do ensino fundamental a alunos com

deficiência mental, que não puderem atingir o nível acadêmico exigido para tal, em virtude de

suas deficiências nos leva a resgatar o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932,

que preconizava ser a educação trazida pela Escola Nova uma

reação categórica, intencional e sistemática contra a escola tradicional artificial e verbalista vinculada a interesses das classes a quem servia. Dizia que a Educação Nova perde o sentido aristológico (...) deixa de constituir um privilégio determinado pela condição econômica e social do indivíduo, para assumir um caráter biológico (...) reconhecendo a todo o individuo o direito a ser educado até onde o permitam as suas aptidões naturais, independente de razões de ordem econômica e social. A educação nova, alargando as suas finalidades para além dos limites das classes, assume, com sua feição mais humana, a sua verdadeira função social, preparandose para formar a hierarquia democrática pela hierarquia das capacidades, recrutadas em todos os grupos sociais, a que se abrem as mesmas oportunidades de educação (Ghiraldelli, 1994, p.59).

Estas afirmações do “Manifesto de 32” levam a duas reflexões no que tange à

educação das pessoas com deficiências/necessidades especiais.

Page 21: Monografia Necessidades Educacionais

21

Teria a educação perdido realmente seu caráter aristológico, deixando de ser privilégio

dos que têm melhores condições econômicas e sociais? Considerando-se que hoje cerca de

97% da população brasileira da faixa etária de 7 anos matricula-se na escola, dir-se-ia que sim

e que os ideais das duas primeiras décadas dos anos de 1900 propalados pelo movimento

intitulado “Entusiasmo pela Educação” estariam, 80 anos depois, sendo atingidos, ou seja, a

escola se democratizou em relação a se permitir o acesso de grande parte das crianças; no

entanto, há que se fazer o enfrentamento de questões como permanência na escola e conclusão

de estudos com qualidade, por parte desta população.

A segunda reflexão remete ao caráter biológico assumido pelos signatários do

Manifesto dos Pioneiros, pelo qual o indivíduo deve ser educado até onde lhe permitirem suas

aptidões naturais, compondo assim a “hierarquia democrática” da sociedade pela “hierarquia

das capacidades”, afirmando ainda que,

tanto mais perfeitas serão as sociedades, quanto mais pesquisada e selecionada for a sua elite, cuja seleção se deve processar não por diferenciação econômica, mas pela diferenciação de todas as capacidades, desenvolvendo ao máximo os indivíduos dentro de suas aptidões naturais e selecionando os mais capazes, de forma a que pudessem exercer influência efetiva na sociedade e afetar dessa forma a consciência nacional (Xavier, 1990, p.80).

Essa visão impõe uma nova limitação em relação à educação a condição “natural” do

sujeito o que implica dizer que aqueles que não possuíam condições biológicas favoráveis,

tinham limitada sua entrada e permanência na escola.

Desta forma, embora garantidas pelas leis e declarações, o que se constata é que há

uma luta desigual das pessoas com deficiências/necessidades especiais por educação, pois

além de elas estarem historicamente atrasadas em exigir sua inclusão social e escolar são

limitadas pelas exigências requeridas hoje pela educação formal, impostas pelo mundo do

trabalho, ou por currículos e práticas pedagógicas que se mantém inalteradas, ou ainda

pressupostos teóricos que não acompanham a visão de educação para todos, encontrando-se

então, em desvantagem em relação às outras pessoas.

Page 22: Monografia Necessidades Educacionais

22

Neste rol de dificuldades, cumpre colocar que as pessoas com deficiência mental com

mais comprometimentos são aquelas que têm encontrado os maiores obstáculos à sua

educação.

O que a história recente da educação escolar dos alunos com deficiência mental tem

demonstrado, é que eles passam anos de suas vidas estudando e acabam saindo da escola, na

maioria das vezes, sem certificação de conclusão de escolaridade, principalmente os que têm

comprometimentos mais acentuados.

2.6 Os desafios da escola inclusiva

Pan (2001) refere que as escolas não apresentam projetos específicos para promover o

processo inclusivo, o que dificulta a execução deste processo, resultando, entre outros

aspectos, ausência de esclarecimentos sobre as diferentes NEEs.

Nem sempre a equipe escolar envolvida no processo de inclusão vê seus resultados da

mesma forma, como se pode observar em Silva. Por um lado se apresenta a visão da equipe

responsável pela efetivação do processo de colocação dos portadores de deficiência na rede

municipal de ensino, que afirma que o mesmo está ocorrendo de forma progressiva e a

qualidade de atendimento garantida. Por outro lado está o resultado da nossa pesquisa, onde

60% dos professores informaram que não receberam apoio e 68% não conseguem trabalhar

com seus alunos portadores de deficiência (PAN, 2001: p. 422).

Verifica-se na literatura científica que muito tem sido pesquisado a respeito da

inclusão. Há grande foco nos estudos desta temática quanto ao papel que o professor exerce

neste contexto (LEÃO, 2004). Contudo, há poucas investigações quanto às práticas educativas

escolas, ou seja, os procedimentos que são utilizados pelo educador para promover a

aprendizagem de seus alunos.

Constata-se também, que os obstáculos à aprendizagem não são exclusividade dos

alunos cegos, surdos, com deficiência mental, paralisia cerebral, dificultando-lhes a

apropriação dos conteúdos.

Page 23: Monografia Necessidades Educacionais

23

Tais obstáculos podem ser temporários ou permanentes e fazem parte também do

cotidiano escolar de inúmeros alunos que, pelo fato de apresentarem dificuldades para

aprender, são rotulados como alunos-problema ou têm estabelecidos limites para sua

capacidade de aprendizagem.

O grande desafio do educador hoje, é implementar uma prática pedagógica que

elimine qualquer barreira à aprendizagem, deslocando o foco da problemática, das

características do aluno, de suas condições orgânicas, psicossociais o que o tem

responsabilizado pelo seu fracasso na escola para outros fatores como o educador, a escola, o

sistema educacional, as influências das representações sociais e os aspectos ideológicos e

políticos que determinam tal prática. Segundo Aquino (1997, p.93), é necessário retirar o

foco-diagnóstico da figura do “aluno-problema”, deslocando o olhar para as relações

conflitivas que o circunscrevem, das quais ele é tão somente porta-voz.

Atualmente a Escola tem a prerrogativa legal, por que prevista na LDB (art. 12 Inciso I), para

elaborar o seu projeto pedagógico, de forma a atender a diversidade social e cultural e avaliar

as práticas implementadas. Ao construir o projeto pedagógico, deve-se conceber o ato

pedagógico como fruto da relação entre os diferentes níveis e segmentos da comunidade

escolar, que se configura no processo ensino-aprendizagem. Do projeto pedagógico faz parte

o Currículo que, na definição de Coll,

é o projeto que preside as atividades educativas escolares, define suas intenções e proporciona guias de ação adequadas e úteis para os professores que são diretamente responsáveis por sua execução. Para isso, o currículo proporciona informações concretas sobre o quê ensinar, quando ensinar, como ensinar e como e quando avaliar. (1996, p.45).

Um dos componentes curriculares que preocupam a escola hoje, é o quê ensinar diante

da imensa gama de conhecimentos historicamente produzidos. Segundo Stainback &

Stainback (1999,), torna-se relevante,

o desenvolvimento de cidadãos que buscam informações e solução de problemas, e que sejam capazes de ter sucesso no complexo e diverso século XXI, rico em informações e voltado para a tecnologia. Os futuristas da educação observam as tendências sociais interdependentes e internacionais que tornam cada vez mais difícil para os currículos escolares acompanhar o aumento

Page 24: Monografia Necessidades Educacionais

24

exponencial das informações e das descobertas tecnológicas e científicas (p.201).

Segundo Wiggins, apud Stainback, 1999, p.201, “há simplesmente informações

demais para qualquer um de nós conhecermos, que dirá para ensinar para uma enorme

quantidade de alunos em um dia letivo curto. Esse fato trágico leva-nos a uma conclusão

libertadora: a sabedoria vale mais do que o conhecimento”.

Ainda com referência a se definir sobre o quê ensinar e a fragmentação dos conteúdos

e sua descontextualização, Kuenzer (1999), afirma:

na escola, a seleção dos conteúdos sempre foi regida por uma concepção positivista da ciência, fundamentada na lógica formal, em que cada objeto do conhecimento origina uma especialidade que desenvolve sua própria epistemologia e se autonomiza, quer das demais especialidades, quer das relações sociais e produtivas concretas (p.127).

Neste sentido é importante aprofundar os estudos relativos aos saberes necessários à obtenção

da terminalidade acadêmica dos alunos com deficiência mental, qual o momento adequado de

seu processo de escolarização em que a terminalidade deve ocorrer e quais as adaptações

curriculares necessárias ao currículo regular, que possam proporcionar maiores chances de

continuidade do processo de escolarização para estes alunos.

No entanto, os saberes possíveis de serem adquiridos pelas pessoas com deficiência

mental, especialmente aquelas com maiores comprometimentos, de forma a garantir-lhes

terminalidade acadêmica, contraditoriamente, poderiam não estar garantindo-lhes a verdadeira

inclusão escolar e social, tendo em vista que a sociedade tem exigido cada vez mais,

escolarização consistente que possibilite à pessoa utilizar nas práticas sociais, os

conhecimentos adquiridos, e estes dadas às dificuldades em assimilá-los não poderiam ser

apropriados em sua totalidade. E também porque, como afirma Duarte (2000,):

(...) a educação passa cada vez mais a ser valorizada não por seus conteúdos concretos, mas por produzir as capacidades abstratas que permitiriam o “aprender a aprender”. O objetivo a ser alcançado com a educação escolar não é o de formar um indivíduo que possua determinados conhecimentos, mas um indivíduo disposto a aprender aquilo que for útil à sua incessante adaptação às mutações do mercado globalizado (p.116).

Page 25: Monografia Necessidades Educacionais

26

Ou seja, se apropriar do conjunto dos conteúdos ensinados pela escola já é difícil para

esses alunos com deficiência mental, a situação torna-se mais complicada quando se trata de

escolas que trabalham na lógica neoliberal do “aprender a aprender”.

Então, para a área da Educação Especial em que nem sempre se consegue ensinar

tudo, muito menos a todos, a legislação oficial recomenda que se deve organizar no projeto

curricular das escolas, ajustes ou adaptações num contínuo, que vai desde pequenas

modificações na programação das aulas, até mudanças significativas que podem se distanciar

consideravelmente do projeto curricular estabelecido. São as chamadas adaptações

curriculares, que têm por finalidade conseguir a maior participação possível dos alunos. No

caso daqueles que apresentam deficiência mental, deve-se adaptar as atividades desenvolvidas

no projeto curricular da escola e na programação da sala de aula.

De acordo com Garcia (2002) as práticas educativas escolares inclusivas em geral são

sistemas de ações que deveriam evoluir conjuntamente, dado o seu caráter de

complementaridade. Muitas são as razões que explicam esta impermeabilidade. Uma delas,

sem dúvida, é a rigidez dos sistemas de ensino escolar, que se mantêm fechados além do

necessário. O ensino inclusivo sugere mudanças nos métodos e nas técnicas do ensino

tradicional, que se baseiam na transmissão de conhecimentos e na individualização das tarefas

de aprendizagem.

Nessa concepção pedagógica é impossível criar situações a partir das quais cada aluno

possa trabalhar, aprender e se perceber como sujeito ativo na conquista do conhecimento.

Diante desse posicionamento educacional os alunos mais competem do que cooperam.

Porém, eles não se perdem na cooperação e não deixam de aprender quando dividem entre si

as tarefas de aprendizagem.

Para Goffredo (1992, p. 32) Frente a esse novo paradigma educativo, a escola deve ser

definida como uma instituição social que tem por obrigação atender todas as crianças, sem

exceção. A escola deve ser aberta, pluralista, democrática e de qualidade.

Page 26: Monografia Necessidades Educacionais

27

Portanto, deve manter as suas portas abertas às pessoas com necessidades educativas

especiais. A escola que desejamos para nossa sociedade deve conter, em seu projeto

educativo, a idéia de unidade na diversidade. Não é possível a coexistência de democracia e

segregação.

Para Stainback e Stainback (1999, p. 52) a mudança da escola tem papel fundamental

na vida dos alunos com NEEs. A promessa da inclusão total está no tipo de comunidade

escolar que se pode desenvolver quando alunos com deficiências importantes revelam ter

consciência das dimensões da vida escolar e proporcionam oportunidades, para todos que dela

compartilham, de aprender maneiras mais gratificantes de estar juntos.

A sustentação de um projeto inclusivo está na sua estrutura curricular, e servirá de

suporte a todas as inovações que esse ensino pretende das escolas e de seus membros. Não são

propostas fáceis de serem concretizadas, pois operam segundo novos paradigmas e traduzem

suas inovações. Trata-se de um desafio que pode ser contornado com generalidade e

flexibilidade, de modo a permitir que a escola elabore seu próprio projeto curricular.

A escola não está isolada no processo de inclusão. Entretanto, neste momento é mais

que oportuno o surgimento de um novo conceito de comunidade Sergiovanni (1999) definiu

comunidade como sendo o vínculo que une alunos, e professores de forma especial, a algo

mais importante que eles próprios, no caso, com valores e ideais que devem ser

compartilhados. Nesse novo conceito, consegue-se remeter tanto aluno como professor a

níveis mais elevados de autoconhecimento, compromisso e desempenho, facilitando, desta

forma, o enfrentamento do fracasso e das dificuldades cotidianas em suas vidas. A

comunidade pode ajudar alunos e professores a serem transformadores de uma realidade

excludente e segregacionista.

É evidente que muitas mudanças são necessárias para esta nova concepção de escola,

pois falar em comunidade educativa é pensar em um grupo coeso, com alunos, professores,

equipe administrativa, pais e a sociedade em geral trabalhando com um mesmo objetivo: a

educação de qualidade para todos.

Neste contexto, a fim de atender a estas aspirações da escola ela terá de buscar

abordagens mais revolucionárias para garantir, a cada indivíduo, uma experiência educacional

que efetivamente corresponda aos ideais de um "cidadão do mundo".

Page 27: Monografia Necessidades Educacionais

28

Assim, para que a escola seja inclusiva, ela deve compreender o aluno que apresenta

NEEs, e respeitá-lo na sua diferença, reconhecendo-o como pessoa a qual apresenta

limitações, porém, possui outras habilidades que devem ser observadas e reforçadas

(GARCIA, 2002).

A mencionada autora refere ainda que a fim de que a escola mude de postura, são

importantes que se abandonem os rótulos e as classificações estereotipadas.

2.7 O direito à educação do portador de deficiência e a cidadania

Hoje discute-se a escola inclusiva como forma de garantir o princípio da igualdade,

verifica-se num passado não muito remoto, que também na educação, o portador de

deficiência não era contemplado. Como bem lembram Jussara Oliveto e Eduardo José

Manzini.

Segundo Mazini (1999), no período anterior ao século XX às pessoas portadoras de

deficiência eram consideradas indignas de educação escolar. Nas décadas de 50 e 60 (já no

século XX) começaram a surgir escolas especiais e mais tarde, as classes especiais dentro da

escola comum. Somente a partir da década de 70, é que se inicia uma crescente preocupação

com a integração de deficientes, sendo caracterizada pela matrícula de alunos portadores de

deficiência em classes de ensino regular ou em outros ambientes menos restritivos (MAZINI,

1999).

O momento mais significativo desse novo modo de pensar em relação ao aluno

portador de deficiência, ocorreu com a Declaração de Salamanca1. Hoje, como bem adverte o

Professor Luiz Alberto David Araújo (1994.p.52.) “a educação deve ser ministrada sempre

tendo em vista a necessidade da pessoa portadora de deficiência”. Assim, pode parecer

óbvio, mas dependendo do tipo e do grau de deficiência é que se poderá estabelecer linhas de

atuação na educação. Um aluno com D.C.O leve poderá estudar em classes comum, da

mesma forma que um deficiente físico (locomoção), ou portador de deficiências múltiplas ou

mentais graves. Na verdade, a educação inclusiva contempla a adaptação da escola às

necessidades do aluno, daí porque é possível tal solução.

1 Conferência Mundial sobre necessidades educativas especiais: acesso e qualidade, de junho de 1994.

Page 28: Monografia Necessidades Educacionais

29

Na verdade, a educação assume um papel relevantíssimo quanto ao destino do portador de

deficiência, com efeito,.não obstante as inúmeras definições legais do que vem a ser uma

pessoa portadora de deficiência, verifica-se que doutrinariamente o que define tais pessoas,

segundo Araújo (1994):

Não é a falta de um membro, nem visão ou audição reduzida. O que caracteriza a pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. A deficiência há de ser entendida levando-se em conta o grau de dificuldade para integração social e não apenas a constatação de uma falha sensorial ou motora, por exemplo.

E a escola pode ajudar uma pessoa a se tornar menos deficiente. Daí porque o

relevante papel que desempenha a escola inclusiva quanto à cidadania do portador de

deficiência. Ela pode tornar uma pessoa menos deficiente, integrando-a na comunidade.

Contudo, verifica-se2 que ainda hoje esta escola inclusiva não cumpre adequadamente

o seu papel, sendo vários os fatores que contribuem para tal ocorrência, tais como:

os professores não se sentem preparados para atender adequadamente às necessidades

do educando;

as crianças ou adolescentes que não portam deficiência não foram preparadas sobre

como aceitar ou como brincar com o colega com deficiência e, por isso, chegam as

vezes a rejeitá-los;

porque muitos profissionais das escolas se opõem à integração dos alunos com

deficiência;

os edifícios foram construídos para pessoas sem deficiência, marginalizando, de

imediato, alunos e portadores de deficiência física e visual;

algumas famílias de crianças/jovens não portadores de deficiência temem que esse

contato seja prejudicial a seus filhos ou não dignifique a escola;

os pais e familiares de crianças/jovens com deficiência têm receio de que seu filho

tenha dificuldade no relacionamento interpessoal na escola, preferindo mantê-los em

casa ou em instituições especializadas;

2 EDUARDO JOSÉ MAZINI. op.cit p. 58

Page 29: Monografia Necessidades Educacionais

30

porque o próprio portador de deficiência não foi ensinado e encorajado a enfrentar o

mundo e a sociedade com confiança em si próprio.

No entanto, não obstante tais dificuldades, o certo é que a inclusão da pessoa

portadora de deficiência é a forma mais eficaz de fazer valer a cidadania desta parcela da

comunidade.

Mas esta inclusão deve ser completa e não apenas parcial, ou seja, o processo de

inclusão que deve ocorrer com:

1) Inclusão econômica – proporcionando trabalho ao deficiente.

2) Inclusão social – diminuindo o preconceito em relação ao portador de deficiência.

3) Inclusão educacional – que vem a ser o processo de inclusão dos portadores de

deficiência na rede comum de ensino em todos os seus graus.

4) Inclusão ambiental no sentido mais amplo do termo – que representa a queda das

barreiras arquitetônicas. No caso específico da educação inclusiva, mais que adaptar o

aluno à escola, torna-se vital adaptar a escola ao aluno.

Quando todo este processo de inclusão se verificar, pode-se afirmar que a pessoa

portadora de deficiência é um cidadão em sua plenitude.

Page 30: Monografia Necessidades Educacionais

31

3. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO

BRASIL

A integração ou inclusão de alunos com necessidades especiais no sistema regular de

ensino tem sido sem dúvida, a questão referente à Educação Especial mais discutida no nosso

país nas últimas décadas. Este tema, que por tanto tempo, salvo algumas experiências

isoladas, ficou restrito ao debate em congressos e textos da literatura especializada, hoje

torna-se proposta de intervenção amparada e fomentada pela legislação em vigor, e

determinante das políticas públicas educacionais tanto em nível federal, quanto estadual e

municipal.

Deste ponto de vista, o professor, na sua prática educacional tem relevância singular,

uma vez que pela sua atividade docente, busca desenvolver no aluno o espírito crítico,

reflexivo, maximizar habilidades/competências (novos paradigmas) e, “dominar a pesquisa,

elaborar projetos, questionar”, (DEMO, 2000).

Avançando na discussão do papel da escola, da educação, e, sobretudo, da presença do

professor, enquanto elo no processo ensino – aprendizagem, na direção de uma consciência de

cidadania, a inclusão só terá êxito com seu total engajamento; pois “se o professor não é um

incluído, como pode ajudar a promover a inclusão”? (DEMO, 2000)

Assim, o inciso III do Art. 208 da Constituição Brasileira se refere ao atendimento

educacional especializado aos portadores de deficiências, “preferencialmente na rede regular

de ensino". E na sua Política Nacional de Educação Especial (MEC/SEEP, 1994), o MEC

estabelece como diretrizes da Educação Especial apoiar o sistema regular de ensino para a

inserção dos portadores de deficiências, e dar prioridade quando do financiamento a projetos

institucionais que envolvam ações de integração. Esta mesma definição foi posteriormente

reforçada. na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n°. 9.394/96), e

recentemente nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (CNE /

CEB, 2001).

No entanto, não basta que uma proposta se torne lei para que a mesma seja

imediatamente aplicada. Inúmeras são as barreiras que impedem que a política de inclusão se

torne realidade na prática cotidiana de nossas escolas. Entre estas, a principal, sem dúvida, é o

Page 31: Monografia Necessidades Educacionais

32

despreparo dos professores do ensino regular para receber em suas salas de aula, geralmente

repletas de alunos com problemas de disciplina e aprendizagem, essa clientela (BUENO,

1999; GLAT, 1995; 2000; GOFFREDO, 1992; entre outros).

A formação clássica do professor, ao privilegiar uma concepção estática do processo

de ensino-aprendizagem, trouxe como corolário a existência de uma metodologia de ensino

“universal”, que seria comum a todas as épocas e a todas as sociedades. Assim, por muito

tempo acreditou-se que havia um processo de ensino-aprendizagem “normal” e “saudável”

para todos os sujeitos, e aqueles que apresentassem algum tipo de dificuldade, distúrbio ou

deficiência eram considerados anormais (isto é, fora da norma), eufemisticamente

denominados de “alunos especiais”, e alijados do sistema regular de ensino (BUENO, 1999).

Esta concepção de normalidade acabou por gerar dois tipos de processos de ensino-

aprendizagem: o “normal” e o “especial”. No primeiro caso, o professor estaria frente aos

alunos considerados “normais”, que seguem o padrão de aprendizagem para o qual ele foi

preparado durante sua formação; no segundo caso estariam os alunos que apresentam os

denominados “distúrbios ou dificuldades de aprendizagem” e/ou aqueles que precisam de

processos de ensino-aprendizagem diferenciados por apresentarem deficiências ou demais

necessidades educacionais especiais3(GLAT, 1995).

Neste contexto, a prática pedagógica do professor, está impregnada pelo mito, pela

concepção, hoje considerada errônea, mas por muito tempo tomado como verdade científica

de que existem duas categorias qualitativamente distintas de alunos: os “normais” que

freqüentam a escola regular e os “excepcionais”, que são clientela da Educação Especial. Em

outras palavras, ou ele ensina o aluno em um processo de aprendizagem contínuo, e aí ele está

lidando com o aluno “normal”; ou, então, se surgir algum problema de aprendizagem que

perturbe este processo, ele se encontra frente a um sintoma de doença ou desequilíbrio, isto é,

um distúrbio de aprendizagem, algum tipo de deficiência ou doença mental e, portanto, este

aluno não pertence ao seu universo de ensino.

3 Embora esses dois casos sejam distintos sob o aspecto psicopedagógico, na prática os alunos com os chamados distúrbios comuns de

aprendizagem, que poderiam ser inseridos na classe regular, acabam sendo considerados “portadores de necessidades especiais” (termo que atualmente perdeu muito de seu original significado, sendo entendido como sinônimo de deficiência) e encaminhados para o ensino especial.

Page 32: Monografia Necessidades Educacionais

33

Esta visão dicotômica das possibilidades de aprendizagem de diferentes alunos é,

segundo Bueno (1999), a primeira dificuldade a ser enfrentada na efetivação da proposta da

escola inclusiva.

[... na medida em que, por um lado, os professores do ensino regular não possuem

preparo mínimo para trabalharem com crianças que apresentem deficiências evidentes

e, por outro, grande parte dos professores do ensino especial tem muito pouco a

contribuir com o trabalho pedagógico desenvolvido no ensino regular, na medida em

que têm calcado e construído sua competência nas dificuldades específicas do

alunado que atende, porque o que tem caracterizado a atuação de professores de

surdos, de cegos, de deficientes mentais, com raras e honrosas exceções, é a

centralização quase que absoluta de suas atividades na minimização dos efeitos

específicos das mais variadas deficiências (pg.15).]

O mesmo argumento é enfatizado por Freire e Valente (2001) :

[O professor (da classe especial) certamente conhece o diagnóstico do aluno – as

principais características e decorrências de seu quadro patológico – mas quase

nunca usa este dado como ponto de partida para conhecer as potencialidades do

sujeito. O diagnóstico é mais freqüentemente visto como um fator limitante na vida

escolar do aluno: define o que o sujeito não pode fazer. Paradoxalmente, a situação

da escola regular não é muito diferente. Falta, na maioria dos casos, uma

reinterpretação das dificuldades e necessidades do aluno no contexto escolar (pg.

76).]

O professor, agindo de acordo com a formação recebida, costuma privilegiar certos

conteúdos em detrimento de outros. Dessa forma, o saber pode se apresentar num circuito

repetitivo e desvinculado da realidade do aluno o que faz com que o sujeito, continuamente,

mantenha a mesma prática alienada. É o que tem acontecido com a maior parte dos nossos

professores, sejam eles “regulares” ou “especiais”. No entanto, é importante ressaltar que eles

agem desta forma por não terem recebido, em seus cursos de formação e capacitação,

suficiente instrumentalização que lhes possibilite estruturar a sua própria prática pedagógica

para atender às distintas formas de aprendizagem de seu alunado.

Page 33: Monografia Necessidades Educacionais

34

Conseqüentemente, não é de se espantar que ainda não tenha havido uma efetiva

integração ou inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais no sistema regular

de ensino. O professor, no contexto de uma educação inclusiva precisa, muito mais do que no

passado, ser preparado para lidar com as diferenças, com a singularidade e a diversidade de

todas as crianças e não com um modelo de pensamento comum a todas elas.

Cabe a ele, a partir de observações criteriosas, ajustar suas intervenções

pedagógicas ao processo de aprendizagem dos diferentes alunos, de modo que lhes

possibilite um ganho significativo do ponto de vista educacional, afetivo e

sociocultural (PRADO & FREIRE, 2001, p.5).

A aceitação generalizada da proposta de integração/inclusão, e a reconhecida

necessidade de ampliação do acesso à Educação àqueles que, tradicionalmente, têm sido

excluídos do sistema de ensino, refletem uma tendência atual em se acreditar no potencial dos

alunos com necessidades especiais. Porém, não podemos perder de vista que, como lembra

Glat (1995), a segregação social e a marginalização dos indivíduos com supostas deficiências

têm raízes históricas profundas, e a sua integração escolar não pode ser vista apenas como um

problema de políticas públicas, pois envolve, sobretudo,“ o significado ou a representação

que as pessoas (no caso, os professores) têm sobre o deficiente, e como esse significado

determina o tipo de relação que se estabelece com ele” (p. 17).

A validade da educação inclusiva, no entanto, é indiscutível se levarmos em

consideração que a criança interage com o meio, considerando-se sua maneira própria,

diferente, de entrar em contato com o mundo, respeitando-se suas possibilidades e limites. Ao

adotarmos a educação inclusiva estaremos desenvolvendo um trabalho preventivo e

contribuindo em direção à meta, talvez utópica, da equiparação de oportunidades, o que

significa preparar a sociedade para receber a pessoa portadora de necessidades especiais. Caso

contrário, este indivíduo tenderá a uma fragmentação ou desintegração de sua personalidade,

ocasionando inevitáveis prejuízos pessoais e sociais.

3.1 prática pedagógica dos professores de alunos com D.C.O

Temos convicção de que o professor é uma peça muito importante no conjunto que

movimenta todo o sistema educacional. Nesse sentido, é fundamental que o professor da

escola regular seja devidamente capacitado para receber esse novo alunado que está chegando

Page 34: Monografia Necessidades Educacionais

35

à escola, pois “juntar crianças em uma sala de aula não lhes garante ensino, não lhes garante

escola cumprindo seu papel, não lhes garante aprendizagem e, portanto, não lhes garante

desenvolvimento” (PADILHA, 2004, p. 96).

Consideramos importante analisar as concepções dos professores, pois sabemos que

eles constroem sentidos que retratam o seu modo de ser e agir, a partir das relações

estabelecidas ao longo de sua vida, tanto no nível pessoal quanto profissional. Daí, a

importância de conhecer de maneira mais aprofundada o que pensam e como agem os

professores de alunos com D.C.O., pois sua maneira de ser traz pistas importantes para

compreendermos sua prática pedagógica.

Tendo em vista que a prática da inclusão tem sido bastante incentivada, sem que suas

implicações sejam suficientemente conhecidas, parece-nos relevante abordarmos as

concepções dos professores de alunos que apresentam deficiência mental incluídos na classe

comum do ensino regular. Esse novo paradigma surgiu como uma reação contrária ao

processo de integração, e sua efetivação prática tem gerado muitas controvérsias e polêmicas.

Segundo uma pesquisa realizada pela professora Drª. Arlete Miranda (2003), mostram

o quanto os professores estão preocupados com a falta de infra-estrutura das escolas e com a

não preparação dos profissionais para participar da inclusão escolar.

As maiores dificuldades estão centradas nos aspectos pedagógicos. Segundo Miranda

(2003), para o aprendizado da criança deficiente ser mais produtivo precisaria haver mais

apoio, como a assistência de um psicopedagogo, de um psicólogo, de um fonoaudiólogo, de

um neurologista, isto é, uma orientação diária com esses especialistas. Não podemos negar a

importância desses serviços, entretanto, dentro de uma instituição escolar, o atendimento na

área da saúde não deveria se sobrepor ao atendimento pedagógico.

Para que o professor realize um bom trabalho é necessário uma boa estrutura, onde

não falte material pedagógico e de consumo, a estrutura física da escola tem que se adequar

para receber os alunos deficientes mentais. Temos que ponderar que as condições físicas

inadequadas são inerentes às dificuldades de todo o ensino e não só para o deficiente mental.

Assim, não podemos generalizar esse problema para toda a situação de inserção escolar de

Page 35: Monografia Necessidades Educacionais

36

deficientes mentais, e devemos considerar, também, que é uma situação possível de ser

mudada, ainda que difícil e a longo prazo. (MIRANDA, 2003)

Mello (1998) acredita que é conveniente para o professor estar em constante processo

de formação, exigindo-se iniciativas de formação continuada. O educador deve criar

condições para que o próprio exercício da profissão seja local de aperfeiçoamento das práticas

pedagógicas, vendo a competência como algo em contínuo desenvolvimento, como

desenvolvimento profissional.

3.2 A necessidade da formação continuada de professores para a integração de alunos com NEE

A formação contínua dos professores do ensino regular, de acordo com a generalidade

dos autores que se têm debruçado sobre esta temática e, como acabamos de ver, constitui um

fator de extrema importância para a integração e inclusão dos alunos com necessidades

educativas especiais.

A formação contínua dos professores do ensino regular se organiza em função das

suas dificuldades, das suas preocupações, equacionadas e refletidas, isto é, se partir da análise

de necessidades de formação, que decorrem da integração escolar de alunos com necessidades

educativas especiais, facilita a sua integração e a sua inclusão.

Na verdade, ouvir os professores, sentir a sua experiência, perceber como

perspectivam e se prospectlvam relativamente à Integração, procurar conhecer as áreas em

que encontram dificuldades, bem como as motivações que têm em relação â formação

contínua, parece ser um bom ponto de partida para equacionar a integração. Nomeadamente,

porque este processo de identificação e de análise de necessidades é, também, um processo

formativo que o formador ajuda a equacionar, a refletir, a problematizar, em conjunto com os

professores que, desta maneira, estão co-envolvidos ao longo do processo.

O processo de integração, entretanto, não é facilmente alcançado apenas através da

instauração de uma lei. Tampouco pode ser concluído rapidamente. Exige uma série de

medidas gradativas de reformulação do ensino que começa pelos já citados currículos e

métodos, e vai além. O atendimento de pessoas com NEE na rede regular de ensino exige dos

seus profissionais conhecimentos produzidos em diferentes áreas (psicologia, medicina,

Page 36: Monografia Necessidades Educacionais

37

pedagogia, arquitetura etc.) para gerar um saber interdisciplinar, indispensável ao sucesso da

integração. Uma das perguntas a se responder é se os profissionais da educação foram

instrumentalizados suficientemente para promover a integração de pessoas com NEE às

classes regulares.

Na atual conjuntura, as dificuldades no atendimento de pessoas com necessidades

especiais são reflexo de uma prática social que não fica circunscrita aos limites da escola. De

modo geral, a sociedade estabelece e marca as diferenças, o que resulta na utilização de

mecanismos discriminatórios nos quais estão presentes processos de “coerção normalizadora

e fabricação ininterrupta de desviantes” (Wanderley, 1999, p. 8). Deste modo, uma população

“desviante” é estabelecida, por características biológicas, psicológicas e sociais. A Educação,

por sua vez, acaba reproduzindo este processo social, dificultando cada vez mais a inserção de

alunos com necessidades educativas especiais num meio onde os níveis de escolarização são

sempre crescentes.

Mudanças, todavia, têm sido verificadas, determinadas por novas perspectivas.

Concepções pedagógicas que encaravam o desenvolvimento como determinante da

aprendizagem deu lugar a uma abordagem mais interativa “em que a aprendizagem abre

caminhos que favorecem o desenvolvimento” (Marchesi e Martín, 1995, p. 9). Dessa forma,

passou-se a não mais encarar os limites de pessoas com necessidades especiais como

fronteiras demarcadas de antemão, e o papel da educação foi redimensionado para admitir sua

importância fundamental no desenvolvimento dessas pessoas.

A inclusão, portanto, requer uma revolução de paradigmas. Não significa apenas

colocar pessoas “diferentes” num lugar em que não costumavam estar, a classe regular.

Significa não mais conceber as necessidades especiais como imutáveis ou incapacitantes.

Significa, ademais, rever o papel da escola e conscientizá-la de que sua responsabilidade é

educar a todos, sem discriminação. Logicamente, isso exige uma reviravolta estrutural na

sociedade, como um todo.

Diante desta imensa tarefa, encontram-se os profissionais da educação. A eles cabe dar

conta das reformas educacionais propostas pelas autoridades. É preciso, então, saber se estes

profissionais estão preparados para tal processo.

Page 37: Monografia Necessidades Educacionais

38

A questão, segundo a literatura, relaciona-se diretamente com a capacitação de

professores e equipes pedagógicas, pois a elaboração do projeto de inclusão requer preparo

por parte dos encarregados em elaborá-lo, a saber: a equipe de professores e técnicos da

escola. O que se evidencia nas escolas é que as equipes não sabem nem mesmo por onde

começar a implementação da proposta de inclusão na rede regular de ensino.

O despreparo profissional em relação à inclusão muitas vezes evidencia-se nas

representações dos professores sobre as diversas facetas da prática educativa, representações

essas que determinam atitudes. Estudos já demonstraram que “...as expectativas do professor

sobre o desempenho dos alunos podem funcionar como profecia educacional que se auto-

realiza” (Rosenthal e Jacobson, 1981, p. 258). Coll e Miras (1995, p. 273) ainda colocam: “as

expectativas dos professores sobre o rendimento dos seus alunos podem chegar a afetar

significativamente o rendimento efetivo destes últimos”. Portanto, os comportamentos dos

professores e dos alunos não podem ser estudados isoladamente. Sendo assim, é preciso

analisar as metodologias, atitudes e procedimentos dos professores, o que conduz novamente

ao problema da capacitação.

Referente às concepções dos professores é preciso questionar como o professor encara

sua prática, como concebe seus alunos, que função julga desempenhar. Quanto a isso, a

pesquisa revelou que, em muitas escolas, prevalece a representação de um aluno ideal. De

acordo com esta perspectiva idealizada, Coll e Miras colocam: “ao estabelecer contato com

um novo aluno, o professor selecionaria aquelas características que apresentam um maior

peso em sua imagem do aluno ideal, caracterizando-o em conseqüência e interpretando sua

conduta de acordo com estes parâmetros” (1995, p. 267).

Desta representação decorre, conseqüentemente, a representação do aluno-problema.

Sobre isso, Souza (1997) comenta: “qualquer aluno que desvie desse padrão pré-estabelecido

pela escola passa a ser visto com um ‘problema em potencial’ necessitando de um

atendimento ‘preventivo’. ...A presença de atitude diagnóstica escolar ou preditiva da

performance da atuação da criança é muito preocupante em função das conseqüências que

trarão a esse aluno” (p. 22).

Estas atitudes revelam uma tendência à homogeneização, extremamente danosa aos

alunos com NEE e, de modo geral a todos os alunos, pois todo o aluno tem uma história

Page 38: Monografia Necessidades Educacionais

39

peculiar que caracteriza seu ritmo de aprendizado, tornando-o único. Esta tendência

niveladora revela-se, então, na inflexibilidade dos métodos, currículos e processos de

avaliação. “De um modo geral, o currículo tem constituído grande obstáculo para os alunos

com necessidades especiais na escola regular, porque impõe como uma referência homogênea

a ser alcançada por todos os alunos, independente da ocorrência de condições específicas”

(Carvalho, 1998, p. 31).

Outro fator a se considerar é a concepção que o professor tem sobre o ensino e a

aprendizagem. Privilegiar apenas o conteúdo ou apenas um mecanismo de aprendizagem é

também um obstáculo ao aprendizado de todos os alunos; e em especial os com necessidades

especiais. Marchesi e Martín ressaltam que “os professores que valorizam o desenvolvimento

dos conhecimentos e os processos acadêmicos têm mais dificuldade em aceitar os alunos que

não vão progredir com um ritmo normal nesta dimensão” (1995, p. 20). É, portanto,

imperativo considerar quais são os objetivos educacionais que os professores sustentam em

relação aos seus alunos e o conceito que construíram acerca da educação.

É preciso então que o corpo docente reveja suas concepções e reconstrua seus

objetivos para que esses incluam a aceitação das diferenças. Desta maneira, poder-se-á

“buscar, em cada aluno, as suas qualidades desejáveis, em vez de acentuar ainda mais suas

inadequações para determinadas tarefas” (Leite, 1981, p. 245).

Então, que o processo de inclusão requer inicialmente um projeto. Assim poderão ser

feitas mudanças efetivas tais como alterações curriculares, avaliativas e metodológicas. É

necessário também que sejam integrados vários conhecimentos para que se produza a

interdisciplinaridade, indispensável ao processo de inclusão. A capacitação de educadores

requer atenção, pois são necessárias a instrumentalização prática e a reconstrução de

concepções de ensino e aprendizagem para que os objetivos educacionais levem em conta as

particularidades dos alunos, conduzindo à individualização do processo educativo e

desfazendo idealizações niveladoras.

A capacitação dos profissionais da educação, entretanto, não é a única variável

envolvida no processo de inclusão. Creditar a responsabilidade pelo sucesso do processo de

inclusão somente aos profissionais da educação seria desconsiderar uma série de questões

importantes. Além disso, seria incorrer, de certa forma, no mesmo erro para o qual se procura

alertar. Assim como não se pode atribuir ao aluno exclusivamente a responsabilidade por suas

Page 39: Monografia Necessidades Educacionais

40

dificuldades, não se pode designar exclusivamente à escola a responsabilidade pelos

obstáculos que vem encontrando. É preciso admitir que a escola e seus membros, frente à

nova situação apresentada pela LDB, também têm suas “necessidades educativas especiais”,

pois as escolas precisam “aprender” a lidar com uma nova demanda. Além disso, é necessária

uma integração não só de alunos, mas também de profissionais detentores de conhecimentos

em diversas áreas relacionadas à educação especial. Pode-se, portanto, concluir que, nas

escolas observadas nesta pesquisa, a inclusão é ainda um ideal que, no entanto, não pode ser

perdido de vista.

Page 40: Monografia Necessidades Educacionais

41

4. O DIREITO À EDUCAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA: ASPECTOS

JURÍDICOS

O objetivo deste capítulo é abordar os conceitos mais atuais e adequados às diretrizes

mundiais de inclusão da pessoa com deficiência na área educacional no aspecto jurídico.

Apesar do enfoque está voltado para crianças e adolescentes com deficiência, porque são as

mais vulneráveis em razão da não-adaptação arquitetônica e pedagógica das escolas em

geral ., o que se defende é uma educação ministrada com a preocupação de acolher a todas as

pessoas. Ou seja, sem preconceitos de qualquer natureza e sem perpetuar as práticas

tradicionais de exclusão, que vão desde as discriminações negativas, até uma bem

intencionada reprovação de uma série para outra.

Sempre que o direito de acesso à escola comum da rede regular é questionado e

descumprido, a principal alegação é a dificuldade das escolas para receber esses alunos,

especialmente os casos em que a deficiência é mais severa. Porém, o que a Legislação

assegura aos portadores de NEEs?

4.1 O que diz a Constituição Federal4?

A nossa Constituição Federal elegeu como fundamentos da República a cidadania e a

dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. II e III), e como um dos seus objetivos fundamentais

a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer

outras formas de discriminação (art. 3º, inc. IV).

Garante ainda expressamente o direito à igualdade (art. 5º), e trata, nos artigos 205 e

seguintes, do direito de todos à educação. Esse direito deve visar o pleno desenvolvimento da

pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (art.

205).

4 Trecho reproduzido da Cartilha: “O Acesso de alunos com deficiência às escolas e classes comuns da rede regular / Ministério Público Federal: Fundação Procurador Pedro Jorge de Melo e Silva (organizadores) / 2 ed. ver. atualiz. – Brasília: Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, 2004.

Page 41: Monografia Necessidades Educacionais

42

Além disso, elege como um dos princípios para o ensino, a .igualdade de condições de

acesso e permanência na escola. (art. 206, inc. I), acrescentando que o .dever do Estado com a

educação será efetivado mediante a garantia de acesso aos níveis mais elevados do ensino, da

pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um. (art. 208, V).

Portanto, a Constituição garante a todos o direito à educação e ao acesso à escola.

Toda escola, assim reconhecida pelos órgãos oficiais como tal, deve atender aos princípios

constitucionais, não podendo excluir nenhuma pessoa em razão de sua origem, raça, sexo, cor,

idade, deficiência ou ausência dela.

4.2 A LDBEN, a Educação Especial e o Atendimento Educacional Especializado

Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDBEN (art. 58 e

seguintes), .o atendimento educacional especializado será feito em classes, escolas, ou

serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for

possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular. (art. 59, § 2º).

O entendimento equivocado desse dispositivo tem levado à conclusão de que é

possível a substituição do ensino regular pelo especial. A interpretação a ser adotada deve

considerar que esta substituição não pode ser admitida em qualquer hipótese,

independentemente da idade da pessoa. Isso decorre do fato de que toda a legislação ordinária

tem que estar em conformidade com a Constituição Federal. Além disso, um artigo de lei não

deve ser lido isoladamente. A interpretação de um dispositivo legal precisa ser feita de forma

que não haja contradições dentro da própria lei.

A interpretação errônea que admite a possibilidade de substituição do ensino regular

pelo especial está em confronto com o que dispõe a própria LDBEN em seu artigo 4º, inciso I5

5 Art. 4º. O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria (...).

Page 42: Monografia Necessidades Educacionais

43

e em seu artigo 6º6 e com a Constituição Federal, que também determina que o acesso ao

Ensino Fundamental é obrigatório (art. 208, inc. I).

A Constituição define o que é educação, não admitindo o oferecimento de Ensino

Fundamental em local que não seja escola (art. 206, inc. I) e também prevê requisitos básicos

que essa escola deve observar (art. 205 e seguintes)

Outra situação da LDBEN que merece atenção é o fato de não se referir, nos artigos 58

e seguintes, a atendimento educacional especializado, mas à Educação Especial. Esses termos,

atendimento educacional especializado e Educação Especial, para a Constituição Federal não

são sinônimos. Se nosso legislador constituinte quisesse referir-se à Educação Especial, ou

seja, ao mesmo tipo de atendimento que vinha sendo prestado às pessoas com deficiência

antes de 1988, teria repetido essa expressão que constava na Emenda Constitucional nº 01, de

1969, no Capítulo do Direito à Ordem Econômica e Social.

Assim, para não ser inconstitucional, a LDBEN ao usar o termo Educação Especial

deve fazê-lo permitindo uma nova interpretação, um novo conceito, baseados no que a

Constituição inovou, ao prever o atendimento educacional especializado e não Educação

Especial em capítulo destacado da Educação.

Portanto, o direito ao atendimento educacional especializado previsto nos artigos 58,

59 e 60 da LDBEN (Lei 9394/96) e também na Constituição Federal, não substitui o direito à

educação (escolarização) oferecida em classe comum da rede regular de ensino.

4.3 A LDBEN e as inovações trazidas pelo Decreto 3.956/2001 (Convenção da

Guatemala)

Posterior à LDBEN, surgiu uma nova legislação, que como toda lei nova, revoga as

disposições anteriores que lhe são contrárias ou complementa eventuais omissões. Trata-se da

6 Art. 6º. É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos sete anos de idade, no ensino fundamental.

Page 43: Monografia Necessidades Educacionais

44

Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a

Pessoa Portadora de Deficiência, celebrada na Guatemala.

O Brasil é signatário desse documento, que foi aprovado pelo Congresso Nacional por

meio do Decreto Legislativo nº 198, de 13 de junho de 2001, e promulgado pelo Decreto nº

3.956, de 08 de outubro de 2001, da Presidência da República.

Portanto, no Brasil, ele tem tanto valor quanto uma lei ordinária, ou até mesmo (de

acordo com o entendimento de alguns juristas) como norma constitucional, já que se refere a

direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, estando acima de leis, resoluções e

decretos.

Trata-se de documento que exige agora mais do que nunca, uma reinterpretação da

LDBEN. Isto porque a LDBEN, quando aplicada em desconformidade com a Constituição

(como visto no item anterior), pode admitir diferenciações com base em deficiência, que

implicam em restrições ao direito de acesso de um aluno com deficiência ao mesmo ambiente

que os demais colegas sem deficiência.

A Convenção da Guatemala deixa clara a impossibilidade de tratamento desigual com

base na deficiência, definindo a discriminação como toda diferenciação, exclusão ou restrição

baseada em deficiência, antecedente de deficiência, conseqüência de deficiência anterior ou

percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou

anular o reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de

seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais (art. 1º, nº 2, a.).

O direito de acesso ao Ensino Fundamental é um direito humano indisponível, por isso

as pessoas com deficiência, em idade de freqüentá-lo, não podem ser privadas dele. Assim,

toda vez que se admite a substituição do ensino de alunos com deficiência em classes comuns

do ensino regular, unicamente pelo ensino especial na idade de acesso obrigatório ao Ensino

Fundamental, esta conduta fere o disposto na Convenção da Guatemala.

Page 44: Monografia Necessidades Educacionais

45

4.4 Como cumprir a Constituição Federal e a Convenção da Guatemala?

Para esse cumprimento, não há necessidade de alteração da LDBEN, mas de sua

aplicação conforme a Constituição Federal e a Convenção da Guatemala. O que muda,

basicamente, é a execução prática de seu capítulo referente à Educação Especial,

principalmente após a internalização da Convenção da Guatemala (FÁVERO et. al, 2004).

Assim, os órgãos responsáveis pela emissão de atos normativos infralegais e

administrativos relacionados à Educação (Ministério da Educação, Conselhos de Educação e

Secretarias de todas as esferas administrativas), devem emitir diretrizes para a Educação

Básica, em seus respectivos âmbitos, considerando os termos da promulgada Convenção da

Guatemala no Brasil, com orientações adequadas e suficientes para que as escolas em geral

recebam com qualidade a todas as crianças e adolescentes. (PANTOJA et. al, 2004)

Segundo Maria Teresa Mantoan (2004), estas diretrizes e atos devem observar, no

mínimo, os seguintes aspectos fundamentais:

é indispensável que os estabelecimentos de ensino eliminem suas barreiras

arquitetônicas, pedagógicas e de comunicação, adotando métodos e práticas de ensino

escolar adequadas às diferenças dos alunos em geral, oferecendo alternativas que

contemplem a diversidade dos alunos, além de recursos de ensino e equipamentos

especializados, que atendam a todas as necessidades educacionais dos educandos, com

e sem deficiências, mas sem discriminações;

os critérios de avaliação e de promoção, com base no aproveitamento escolar,

previstos na LDBEN (art. 24), não podem ser organizados de forma a descumprir os

princípios constitucionais da igualdade de direito ao acesso e permanência na escola,

bem como do acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação

artística, segundo a capacidade de cada um. Para tanto, o acesso a todas as séries do

Ensino Fundamental (obrigatório) deve ser incondicionalmente assegurado a todos, e

por isso, como garantia de qualidade, as práticas escolares, em cada uma das séries,

devem contemplar as diferenças existentes entre todos os seus alunos;

o Ensino Médio, os cursos profissionalizantes, o Ensino de Jovens e Adultos ou os

tradicionalmente voltados para a preparação para vestibulares devem ser organizados

Page 45: Monografia Necessidades Educacionais

46

com o objetivo de atender a todos os alunos que concluíram o Ensino Fundamental, de

acordo com o perfil e aptidão de cada um;

os serviços de apoio especializado como os de professores de Educação Especial,

intérpretes de língua de sinais, intrutores de Libras, professores de Português (segunda

língua para os surdos), professores que se encarreguem do ensino e utilização do

sistema Braile e de outros recursos especiais de ensino e de aprendizagem, não

caracterizam e não podem substituir as funções do professor responsável pela sala de

aula da escola comum de ensino regular;

o encaminhamento de alunos com deficiência e outras necessidades especiais (por

exemplo intolerância ao glúten ou diabetes) a serviços educacionais especializados ou

atendimento clínico especializado deve contar com a concordância expressa dos pais

dos alunos;

as escolas de Educação Infantil, creches e similares, dentro de sua atual e reconhecida

função de cuidar e educar, devem estar preparadas para crianças com deficiência e

outras necessidades especiais, a partir de zero ano (art. 58, § 3º, LDBEN c.c. o art. 2º,

inc. I, alínea .a., da Lei 7.853/89), oferecendolhes cuidados diários que favoreçam sua

inclusão e acesso ao atendimento educacional especializado, sem prejuízo aos

atendimentos clínicos individualizados que, se não forem oferecidos no mesmo

ambiente, devem ser realizados convênios para facilitação do atendimento da criança;

não deve ser permitida a realização de exames (.vestibulinhos.) com a finalidade de

aprovação ou reprovação para ingresso no Ensino Infantil ou Fundamental, devendo,

em caso de desequilíbrio entre a oferta de vagas e a procura, fazer uso de métodos

objetivos e transparentes para o preenchimento das vagas existentes (sorteio, ordem

cronológica de inscrição etc), conforme os termos do Parecer CNE/CEB 26/2003, do

Conselho Nacional de Educação;

todos os cursos de formação de professores, do Magistério às Licenciaturas, devem

dar-lhes a consciência e a preparação necessárias para que recebam, em suas salas de

aula, alunos com e sem necessidades educacionais especiais, dentre os quais, alunos

com deficiência; os cursos de formação de professores especializados em Educação

Especial devem preparar esses profissionais, de modo que possam prestar atendimento

Page 46: Monografia Necessidades Educacionais

47

educacional especializado, em escolas comuns e em instituições especializadas,

envolvendo conhecimentos como: código Braile, Libras, técnicas que facilitem o

acesso da pessoa com deficiência ao ensino em geral, e outros com a mesma

finalidade.

Os órgãos oficiais responsáveis pelo reconhecimento, credenciamento, autorização ou

renovação de quaisquer desses atos não podem deferir os respectivos pedidos das instituições

de ensino que não preencherem os aspectos fundamentais aqui apontados. Também deverão

deferir prazos para que as escolas interessadas procedam às adaptações necessárias para a

formação de profissionais dedicados a esse atendimento específico.

Page 47: Monografia Necessidades Educacionais

48

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Dismotria Cerebral Ontogenética (D.C.O.), como foi tratada durante este estudo,

parece ser o maior problema da inclusão de pessoas com deficiência nas escolas comuns.

Acreditamos, contudo, que é também mais uma provocação para a transformação e melhoria

do ensino escolar como um todo.

A Constituição Federal determina que deva ser garantido a todos os educandos o

direito de acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, de

acordo com a capacidade de cada um (art. 208, V) e que o Ensino Fundamental completo é

obrigatório. Por isso, é inegável que as práticas de ensino devem acolher as peculiaridades de

cada aluno, independentemente de terem ou não deficiência. Mas não é isso o que as escolas

têm feito e esta é a grande chave para que a educação escolar das pessoas com deficiência

mental possa acontecer e, com sucesso, nas classes comuns de ensino regular.

As tradicionais rotulações e divisões de alunos em turmas aparentemente homogêneas

não são garantias de aprendizado. Ainda que nessas turmas os conteúdos escolares pareçam

ser aprendidos mais facilmente, o entendimento efetivo desses conteúdos não é o mesmo para

todos os alunos.

Grande parte dos professores continua na ilusão de seus alunos apresentarão um

desempenho escolar semelhante, em um mesmo tempo estipulado pela escola para se aprender

um dado conteúdo escolar. Esquecem-se de suas diferenças e especificidades. Apesar de

saberem que os alunos são pessoas distintas umas das outras, lutam para que o processo

escolar os torne iguais. Esperam e almejam em cada série, ciclo, nível de ensino, que os

alunos alcancem um padrão predefinido de desempenho escolar. Essa ânsia de nivelar o

alunado, segundo um modelo, leva, invariavelmente, à exclusão escolar, não apenas dos

alunos com deficiência intelectual acentuada, mas também dos que possam apresentar

dificuldades ou mesmo uma deficiência que os impeça de aprender, como se espera de todos.

Os alunos com D.C.O., especialmente os casos mais severos, são os que forçam a

escola a reconhecer a inadequação de suas práticas para atender às diferenças dos educandos.

De fato, as práticas escolares convencionais não dão conta de atender à deficiência mental, em

Page 48: Monografia Necessidades Educacionais

49

todas as suas manifestações, assim como não são adequadas às diferentes maneiras de os

alunos, sem qualquer deficiência, abordarem e entenderem um conhecimento de acordo com

suas capacidades. Essas práticas precisam ser urgentemente revistas, porque, no geral, elas

são marcadas pelo conservadorismo, são excludentes e, conforme visto, inviáveis para o

alunado que temos hoje nas escolas, em todos os seus níveis.

A inclusão é um desafio, que ao ser devidamente enfrentado pela escola comum,

provoca a melhoria da qualidade da Educação Básica e Superior, pois para que os alunos com

e sem deficiência possam exercer o direito à educação em sua plenitude, é indispensável que

essa escola aprimore suas práticas, a fim de atender às diferenças. Esse aprimoramento é

necessário, sob pena de os alunos passarem pela experiência educacional sem tirar dela o

proveito desejável, tendo comprometido um tempo que é valioso e irreversível em suas vidas:

o momento do desenvolvimento.

Finalmente, é importante ressaltar que não existem receitas prontas para atender a cada

necessidade educacional de alunos com deficiência que a natureza é capaz de produzir.

Existem milhares de crianças e adolescentes cujas necessidades são quase únicas no mundo

todo. Assim, espera-se que a escola, ao abrir as portas para tais alunos, informe-se e oriente-se

com profissionais da Educação e da Saúde sobre as especificidades e instrumentos adequados

para que aquele aluno encontre ali um ambiente adequado, sem discriminações e que lhe

proporcione o maior e melhor aprendizado possível.

Page 49: Monografia Necessidades Educacionais

50

6. REFEREÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARILIAN, Maria L. Toledo Morais. Psicologia do excepcional. São Paulo: EPU, 1996.

ARAÚJO Luiz Alberto David de. A Proteção Constitucional das Pessoas Portadoras de

Deficiência. Brasília: Corde, 1994. pág. 52.

MELLO, R. R. Os saberes docentes e a formação cotidiana nas séries iniciais do ensino

fundamental – um estudo de casos múltiplos do tipo etnográfico. Tese de Doutorado.

Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 1998.

MIRANDA, Arlete A. B. A Prática Pedagógica do Professor de Alunos com Deficiência

Mental. Tese de Doutorado. Universidade Metodista de Piracicaba. Piracicaba/SP, 2003.

BLANCO, R. Aprendiendo en la Diversidad: implicaciones educativas, In: Anais do III

Congresso Ibero-Americano de Educação Especial. Vol.1 Foz do Iguaçu:  Paraná,1998.

BRASIL. Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica. Diretrizes

Nacionais pa a Educação Especial na Educação Básica. Brasília. MEC/SEESP, 2001.

BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em: <http://www.in.gov.br/imprensa/

constituição/Con1988br.pdf> Acesso em: 08 jan. 2004

BRASIL. Política Nacional de Educação Especial. Brasília : MEC/SEESP, 1994

BUENO, J. G. Crianças com necessidades educativas especiais, política educacional e a

formação de professores: generalistas ou especialistas. Revista Brasileira de Educação

Especial, vol. 3. nº5, 7-25,1999.

CARDOSO, M. C. de F. Integração educacional e comunitária. Revista Brasileira de

Educação Especial, 1(1), 89-99. 1992.

Page 50: Monografia Necessidades Educacionais

51

CARMO, A. A. Inclusão escolar: roupa nova em corpo velho. Integração, Brasília, ano 13,

n. 23, p. 43-48, 2000.

CARVALHO, R. E. Panorama internacional da integração: enfoque nacional. Revista

Integração, 5(11), 9-13. 1994. 

Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas especiais.

Brasília: CORDE, 1994.

FÁVERO, Eugênia. A. G.; PANTOJA, Luisa de M. P. e MANTOAN, Maria T. Eglér. O

Acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede Regular

Ministério Público Federal: Fundação Procurador Pedro Jorge de Melo e Silva

(organizadores) / 2ª ed. rev. e atualiz. . Brasília: 2004.

FREIRE, F. M P. e VALENTE, A. Aprendendo para a Vida: os Computadores na Sala de

Aula. São Paulo: Cortez, 2001.

GARCIA, C. A. A. Um estudo das práticas educativas no processo de inclusão da criança

portadora de dismotria cerebral ontogenética 2002. 134f. Dissertação. In: Revista

brasileira de educação especial. vol.12 no.2  Marília May/Aug. 2006

GLAT, R. A Integração Social dos Portadores de Deficiência: uma Reflexão. Rio de

Janeiro: Editora Sette Letras, 1995.

GLAT, R. Inclusão Total: mais uma utopia? Revista Integração. Brasília, ano 08, nº 20,

1998. p. 26-28.

GOFFREDO, U. L. F. S. Integração ou segregação: o discurso e a prática das escolas

públicas da rede oficial do município do Rio de Janeiro. Revista Integração, Brasília,

n.4, p. 127-128, 1992.

Page 51: Monografia Necessidades Educacionais

52

MANTOAN, M. T. E. (Org.). (1997). A integração de pessoas com deficiência:

contribuições para uma reflexão sobre o tema. São Paulo: Memnom, SENAC.

MANTOAN, Maria Teresa Eglér. O Direito Á Diferença Na Igualdade Dos Direitos –

Questões sobre a inclusão escolar de pessoas com e sem deficiências. In: BATISTA,

Cristina Abranches Mota. (Org). Ética da Inclusão. Belo Horizonte: Armazém de

Idéias, 2004.

MAZINI. Eduardo José. Dificuldades de Professores de Pré-Escolas no trabalho de integração

com alunos com deficiência. In: Integração do Aluno com deficiência. Marília: Unesp

– Marília. Publicações, 1999, págs. 28/29.

MENDES, E. E. Inclusão, por que não? In: XX Congresso Nacional das Apaes. Fortaleza.

Anais. p. 167 - 170. 2001. In: Revista brasileira de educação

especial. vol.12 no.2  Marília May/Aug. 2006.

PAN, M. A. G. S. Inclusão: uma fronteira entre o acolhimento e o abandono. In: XX

Congresso Nacional das Apaes. Fortaleza. Anais. p. 175-180. 2001.

PADILHA, A. M. O que fazer para não excluir Davi, Hilda, Diogo... In: GÓES, M. C. R.;

LAPLANE, A.L. F. (orgs.). Políticas e práticas de educação inclusiva. Campinas:

Autores Associados, 2004.

PRADO, M. E. B. B.; FREIRE, F. M. P. A formação em serviço visando a reconstrução da

prática educacional. In: FREIRE, F. M. P.; VALENTE, A. (Orgs) Aprendendo para a

Vida: os Computadores na Sala de Aula. São Paulo: Cortez, 2001.

SAINT-LAURENT, L. A educação de alunos com necessidades especiais. In M. T. E

Mantoan (Org.), A integração de pessoas com deficiência: uma contribuição para uma

reflexão sobre o tema (pp. 67-76). São Paulo: Memnon, SENAC. 1997. 

Page 52: Monografia Necessidades Educacionais

53

SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA,

1997.

STAINBACK, S; STAINBACK, W. Inclusão: um guia para educadores. Porto Alegre:

Artes Médicas Sul, 1999.

SERGIOVANNI, T. Building community in schools. In: STAINBACK, S.; STAINBACK,

W. Inclusão: um guia para educadores. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999

Page 53: Monografia Necessidades Educacionais

54