revista brasileira: das ciências para as letras

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WEDIS MARTINS FERREIRA REVISTA BRASILEIRA: DAS CIÊNCIAS PARA AS LETRAS

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A Revista Brasileira é uma publicação que teve início no ano de 1857. Durante toda a sua existência, ela esteve voltada a ser um meio de expressão para as reflexões sobre os problemas mundiais e, principalmente, brasileiros, em momentos de muitas transformações: culturais, econômicas, políticas. A Revista existe até hoje. No momento, ela está sob a tutela da Academia Brasileira de Letras.

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WEDIS MARTINS FERREIRA

REVISTA BRASILEIRA: DAS CIÊNCIAS PARA AS LETRAS

UERJ2011

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REVISTA BRASILEIRA: DAS CIÊNCIAS PARA AS LETRAS

Wedis Martins Ferreira

Monografia de conclusão do curso de Comunicação Social apresentada ao departamento de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social da UERJ. Orientadora: Drª. Luiza Helena Sampaio Corrêa Mariani.Profª. Adjunta – UERJ

Rio de Janeiro, 2. sem. de 2011

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

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FOLHA DE EXAME

REVISTA BRASILEIRA: DAS CIÊNCIAS PARA AS LETRAS

Wedis Martins Ferreira

Monografia submetida ao corpo docente da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de

Bacharel.

Banca Examinadora:

Luiza Helena Sampaio Corrêa Mariani - OrientadoraProfª. Adjunta FCS / UERJ 

Fábio Mário IorioProf. Adjunto FCS / UERJ 

Ilana PolistchukProfª. Substituta FCS / UERJ 

Resultado:____________________Conceito:_____________________Grau obtido:__________________RIO DE JANEIRO,___/ ___ / ______

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Agradeço às equipes da sala de consulta da Fundação Casa Rui Barbosa e da seção de periódicos da Biblioteca Nacional pela ajuda e gentileza em todas as vezes que precisei.

Agradeço à minha orientadora, professora Luiza Mariani, pelo incentivo na realização desse trabalho.

Agradeço à minha família, à professora Ilana Polistchuk e as amigas Carolina Pessôa e Tamyres Matos pelo apoio.

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“Hay que investigar algo que nos de esperanza”.

Jesús Martín-Barbero

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RESUMO

FERREIRA, Wedis Martins. Revista Brasileira: das ciências para as letras. Orientador: Profª Drª Luiza Helena Sampaio Corrêa Mariani. Rio de Janeiro: UERJ/FCS, 2011. 54p. Monografia. (Graduação em Comunicação Social)

Este estudo pretende documentar a trajetória da Revista Brasileira, a fim de fazer uma análise acerca das características e dos objetivos desta publicação. Por ser uma revista que atravessa dois séculos, sendo dividida em diferentes fases, seria difícil analisar sua história toda. Assim, escolhemos focar em uma em particular, a quarta fase, que vai de 1934 a 1935; para comparar seu conteúdo com as demais fases; tentando resgatar um viés do perfil que a Revista oferecia aos leitores. Em todas as fases, a publicação esteve voltada a ser um meio de expressão para as reflexões sobre os problemas mundiais e, principalmente, brasileiros, em um momento de muitas transformações: culturais, econômicas, políticas.

O estudo está organizado em três capítulos. No primeiro é apresentado o contexto histórico do seu surgimento, no ano de 1857. Como a Revista surge com a pretensão de ser um veículo de divulgação científica, esse contexto histórico mostra exatamente a prática da divulgação científica na imprensa nacional. No segundo capítulo, apresentamos um panorama geral das três primeiras fases da Revista; e no terceiro capítulo procuramos fazer com mais detalhes uma análise da quarta fase da publicação.

A fonte de dados para a pesquisa constitui-se de livros, artigos e teses sobre a época e sobre a Revista. Constitui-se, principalmente, dos próprios artigos da Revista Brasileira. Todas as edições da quarta fase foram consultadas na Fundação Casa Rui Barbosa, localizada no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, em sua versão original, impressa. Já as edições das fases anteriores foram consultadas na Biblioteca Nacional, no centro do Rio de Janeiro, onde se encontram microfilmadas. Como referencial teórico, usamos autores como Luisa Massarani, Ildeu de Castro Moreira, Moema Vergara e Ilka Stern Cohen.

 Palavras chave: Revista Brasileira, Jornalismo Científico, ciência, literatura, Brasil

Page 7: Revista Brasileira: das ciências para as letras

ABSTRACT

FERREIRA, Wedis Martins. Revista Brasileira: from sciences to the letters. Leader: Profª Drª Luiza Helena Sampaio Corrêa Mariani. Rio de Janeiro: UERJ/FCS, 2011. 54p. Monograph. (Degree in Social Communication)

This study aims to document the Revista Brasileira’s history, to do an analysis about the characteristics and purposes of this publication. How it is a magazine that goes through two centuries, being divided into different phases, it would be difficult to analyze your whole history. We therefore chose to focus on one in particular, the fourth phase, which runs from 1934 to 1935, to compare its contents with the other phases, trying to rescue a profile’s bias that the Journal offers to the readers. At all periods, the publication was aimed to be a medium of expression for the debates on global issues, and especially, brazilians, in a time of many changes: cultural, economic, political.

The study is organized into three chapters. The first is presented the historical context of its emergence in 1857. How the magazine comes up with the pretense of being a vehicle for scientific, that historical context shows exactly the practice of science communication in the national press. The second chapter presents an overview of the first three phases of the Journal, and the third chapter we tried to make a more detail analysis of the fourth phase of publication.

The data source for the research consists of books, articles and theses about the period and about the journal. It consists mainly of the Journal's own articles. All fourth phase’s editions were found in Fundação Casa Rui Barbosa, located in the district of Botafogo, Rio de Janeiro, in its original version in print. And the editions of the previous phases were found in Biblioteca Nacional, in downtown Rio de Janeiro, where they are microfilmed. As theoretical framework, we used authors as Luisa Massarani, Ildeu Moreira de Castro, Moema Vergara and Ilka Stern Cohen.

Keywords: Revista Brasileira, Science journalism, science, literature, Brazil

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 1

1 – CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA REVISTA BRASILEIRA .4

2 – UM ÚNICO TÍTULO E VÁRIAS FASES ......................................................... 10

___ 2.1 – Surgimento da Revista e sua primeira fase .................................................. 10

___2.2 – Segunda fase Revista Brasileira .................................................................. 12

___2.3 – Terceira fase da Revista Brasileira .............................................................. 15

___2.4 – Uma Revista dedicada às causas nacionais .................................................. 17

___2.5 – Linguagem empregada na Revista................................................................ 22

3 - QUARTA FASE DA REVISTA BRASILEIRA (1934-1935) .............................. 26

___3.1 – Público da Revista ........................................................................................ 28

___3.2 – Expediente ..................................................................................................... 29

___3.3 – Colaboradores ............................................................................................................................ 35

___3.4 – Seções ............................................................................................................. 38

___3.5 – Ilustração........................................................................................................ 39

CONCLUSÃO ........................................................................................................................................... 44

ANEXO 1 - LINHA DO TEMPO – REVISTA BRASILEIRA .................................. 47

ANEXO 2 - PROSPECTO DA REVISTA BRASILEIRA, NÚMERO 1, 1857 ......... 49

ANEXO 3 - EDITORIAL DA REVISTA BRASILEIRA, NÚMERO 1, 1934 .......... 51

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................................... 53

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INTRODUÇÃO

A Revista Brasileira surge na segunda metade do século XIX com a proposta

de divulgar ciência. No entanto, esta característica vai se modificando ao longo das suas

diferentes fases. O tempo mostrou que mais espaço foi sendo dedicado às letras com o

passar dos anos, tanto que hoje a Revista é publicada pela Academia Brasileira de

Letras (ABL). Inclusive, a criação da ABL foi influenciada pelos intelectuais que

compunham o corpo de colaboradores da Revista na sua terceira fase, conhecida como

“fase José Veríssimo”.

Este estudo pretende documentar a trajetória da Revista Brasileira, a fim de

fazer uma análise acerca das características e dos objetivos desta publicação. Para

embasá-lo teoricamente foram utilizadas referências de diferentes autores, em especial

Luisa Massarani, Ildeu de Castro Moreira, Moema Vergara e Ilka Stern Cohen. O

trabalho pretende assim promover um diálogo entre esses diferentes autores acerca dos

objetivos e das características da Revista Brasileira e do seu momento histórico em

cada fase.

Ao manter o nome de Revista Brasileira, os editores de cada nova fase visavam

dar continuidade a essência desta publicação. Essa essência nada mais era do que a

preocupação em ser um veículo portador da identidade brasileira. Um veículo dedicado

à reflexão dos problemas nacionais. Dedicado a mostrar o que o país tinha de melhor,

seja nas ciências, como na primeira fase, seja na literatura, como na segunda e terceira

fases, seja em diversos campos do conhecimento, como pretendia na quarta fase.

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Como a Revista foi criada em 1857, seria difícil analisar tantos anos de sua

história. Assim, escolhemos focar em uma em particular, a quarta fase, que vai de 1934

a 1935. No entanto, antes de chegarmos na análise da quarta fase, iremos mostrar o

contexto histórico do seu surgimento (segunda metade do século XIX), no capítulo 1,

intitulado “Contexto do surgimento da revista brasileira”. Como a Revista surge como

uma publicação voltada à divulgação da ciência, esse contexto envolve justamente a

prática de divulgação científica que se fazia na época. Esse surgimento se dá na

seqüência da segunda revolução industrial na Europa. Em uma época em que as

atividades de divulgação se intensificaram em todo o mundo. Existia uma onda de

otimismo em relação aos benefícios do progresso científico e técnico. Nesse sentido, a

publicação pretendia mostrar a ciência nacional para o Brasil, torná-la conhecida e, com

isso, ajudar no seu aprimoramento e desenvolvimento do país.

Já no capítulo 2, “Um único título e várias fases”, iremos fazer uma exposição

geral das três primeiras fases. Poderemos ver assim como os seus vários números

formam um panorama da produção científica, literária e cultural do país e ver a sua

dedicação na procura de uma identidade nacional.

Por fim, chegaremos à análise da quarta fase da Revista Brasileira, no capítulo

3, “Quarta fase da Revista Brasileira (1934-1935)”. Nesse momento, a publicação

estava sob a direção de Antonio Baptista Pereira e a divulgação de assuntos científicos

não é o seu principal compromisso. A Revista continua ainda preocupada com as causas

brasileiras, mas pretende ir além e ser “a síntese do comportamento contemporâneo”,

conforme ilustra sua folha de rosto. Essa síntese abrange todas as áreas de interesse

público, como economia, ciência, política, sociologia e artes.

Page 11: Revista Brasileira: das ciências para as letras

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A escolha por essa fase em particular foi feita porque os estudos que já existem

sobre a Revista Brasileira analisam muito mais as fases anteriores. Nesse sentido, a

pesquisa procura trazer luz sobre a quarta fase da publicação que, como as outras, teve

grande importância na sua época. Uma grande relevância que essa pesquisa pode trazer

para a sociedade é ajudar a tornar mais conhecida uma publicação que em tantos anos

de história se preocupou em mostrar o Brasil para os brasileiros.

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1- CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA REVISTA BRASILEIRA

A Revista Brasileira surgiu com a pretensão de ser um veículo de divulgação científica. Nesse

sentido, achamos que é importante mostrar como era feita a divulgação científica na imprensa naquela

época – segunda metade do século XIX. Para isso, mostraremos algumas iniciativas importantes na

história da divulgação científica no Brasil até o período de interesse. Este é um panorama geral e

incompleto, apenas para situar o leitor. Para saber mais sobre a riqueza desse período, sugerimos a leitura

de dois estudos: um realizado por Luisa Massarani (1998) sobre os estudos históricos sobre a divulgação

científica no Brasil até a década de 1920 e o apresentado por Ildeu Moreira e Luisa Massarani (2002)

sobre um panorama geral da história da divulgação científica no Brasil.

Luisa Massarani e Ildeu Moreira contam que a divulgação científica, a partir do

estabelecimento da ciência moderna nos séculos XVI-XVII, apresentou fases distintas,

com finalidades e características que refletiam o contexto, as motivações e os interesses

da época. Para os autores, a análise dos aspectos históricos desse processo pode nos

ajudar a elucidar como suas formas variaram no tempo em função dos pressupostos

filosóficos sobre a ciência, dos conteúdos científicos envolvidos, da cultura subjacente,

dos interesses políticos e econômicos e dos meios e instrumentos disponíveis. (2003,

p.39)

No Brasil, a divulgação científica sofreu com a censura que todas as outras áreas

da imprensa sofreram. Censura motivada por uma metrópole controladora. Simon

Schwartzman conta que, da mesma forma que a coroa portuguesa, preocupada com a

ideia de que algum instituto brasileiro pudesse rivalizar com os portugueses, proibiu que

os jesuítas instalassem na colônia a universidade que desejavam, também proibiu a

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criação de qualquer tipo de imprensa que pudesse contribuir para a disseminação de

novas ideias. (2003, Capítulo 3, p. 4)

Diversos estudos tentam compor o quadro de iniciativas realizadas no país para

levar o tema das ciências aos brasileiros. Embora muitas lacunas ainda existam,

Bernardo Esteves mostra que algumas ações dispersas e localizadas se realizaram nesse

sentido no século XVIII. Contudo, o autor releva que foi somente no século XIX que as

iniciativas se intensificaram, sobretudo depois que a corte portuguesa se instalou no Rio

de Janeiro (1808), suspendendo a proibição de impressão na colônia e estimulando a

circulação de livros e idéias. Com isso, textos e manuais ligados à educação científica,

embora em número reduzido, começaram a ser publicados e difundidos. (2005, p.27)

Segundo Luisa Massarani e Ildeu Moreira, os primeiros jornais, como A Gazeta

do Rio de Janeiro (1808), O Patriota (1813-1814) e o Correio Brasiliense (1808),

editado na Inglaterra, publicaram artigos e notícias relacionados à ciência, embora não

ocupassem tanto espaço assim nas publicações e nem tivesse uma periodicidade regular.

Em sua tese de doutorado, Luisa Massarani conta ainda que, em meados do século,

textos sobre ciências foram identificados também em revistas como Nichteroy, O

Guanabara e a Revista Brasileira – Jornal de Ciências, Letras e Artes (objeto dessa

monografia). Outras, inclusive, foram criadas exclusivamente para essa temática, como

a Revista do Rio de Janeiro, Sciencia para o Povo e a Revista do Observatório.

Os autores contam que a existência desse surto mais intenso de atividades de

difusão da ciência estava correlacionada com o fato político singular da mudança no

status colonial do país e também com a ação de muitos brasileiros, formados no

exterior, que retornaram ao Brasil.

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Nos anos que antecederam à independência política havia emergido uma perspectiva nacionalista que via na ciência e nas técnicas, em especial nos domínios agrícola e mineralógico, uma possibilidade de avanço econômico para a nação que se pretendia construir. José Bonifácio é um representante típico dessa mentalidade. (2003, p. 40)

Eles também ressaltam o papel do naturalismo para a divulgação científica:

O Rio de Janeiro sempre se mostrou um paraíso para os estudiosos e curiosos da história natural que aqui conseguiam aportar. Incrustrada em região de mata atlântica, a cidade e suas vizinhanças foram uma fonte importante para equipar gabinetes e museus europeus. As descrições de naturalistas e viajantes boquiabertos com a diversidade natural encontrada não deixam dúvidas quanto a isto. Mas pouco disto se traduziu em avanço institucionalizado e em uma difusão local mais ampla das ciências da natureza, em que pese as duas grandes e duradouras exceções, o Museu Nacional e o Jardim Botânico. (2003, p. 41)

A segunda revolução industrial, na segunda metade do século XIX, trouxe uma

onda de otimismo em relação aos benefícios do progresso técnico no mundo,

repercutindo inclusive no Brasil, mesmo que em escala menor. Luisa Massarani e Ildeu

Moreira explicam que, nesse período, as atividades de divulgação científica se

intensificaram em todos os lugares e também aqui. Segundo os autores, o interesse do

imperador D. Pedro II pela ciência e pelas novidades técnicas também favoreceu

algumas atividades ligadas à difusão dos conhecimentos. No entanto, o quadro geral da

instrução pública e da educação científica era extremamente restrito e limitado a uma

pequena elite, e o analfabetismo atingia mais de 80% da população.

Pelo número de periódicos criados nesse período, e que tratam de temas de ciência, e pelas conferências públicas de divulgação que são organizadas, percebe-se o surgimento de um interesse crescente, embora difuso, por temas ligados às ciências e suas aplicações. Análise dos dados, que constam do catálogo de periódicos da Biblioteca Nacional, mostra que, no século XIX, foram criados alguns milhares de periódicos no país, dos quais cerca de 10% relacionados de alguma forma à ciência. Parte significativa deles (cerca de 20%) foi editada no Rio de Janeiro. Quando são analisadas as datas de criação desses periódicos nota-se um grande crescimento do número de periódicos de caráter geral no período que vai de 1850 a 1880. Há também um crescimento acentuado no número de novos periódicos relacionados à

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ciência a partir de 1860, com ápice em 1875, o que ilustra o aumento relativo de interesse pelos temas de ciência. (2003, p.42)

A Revista Brasileira - Jornal de Ciências, Letras e Artes, criada em 1857,

estava entre essas iniciativas. Dirigida por Cândido Batista de Oliveira, tinha entre seus

colaboradores, cientistas como Guilherme Schüch de Capanema, Freire Alemão e

Emmanuel Liais. Outra publicação dessa época, a Revista do Rio de Janeiro, lançada em

1876, trazia em seu editorial do primeiro número, "um dos meios mais eficazes de

favorecer a instrução e o progresso, e ao mesmo tempo prestar valioso serviço ao país,

que tem tudo a ganhar com a difusão das luzes, é vulgarizar as ciências, letras, artes,

agricultura, comércio e indústria". Luisa Massarani e Ildeu Moreira ainda mostram o

exemplo da Revista Ilustrada, publicada por Angelo Agostini e que ficou famosa pelas

belas ilustrações e pelo humor e ironia com que tratava os problemas políticos. A revista

humorística produziu também muitas ilustrações que ironizavam o interesse do

imperador pela astronomia. (2003, p. 43)

Os autores lembram também da publicação de livros nessa época como uma

forma de divulgar informações científicas. Contam ainda que a ligação telegráfica do

Brasil com a Europa, a partir de 1874, por meio do cabo submarino, também foi

incentivo para aumento de publicações sobre ciência. Assim, os jornais começaram

também a divulgar notícias mais atualizadas sobre novas teorias ou descobertas

científicas.

Bernardo Esteves na sua tese de mestrado acrescenta duas importantes

iniciativas de divulgação científica no Rio de Janeiro durante esse período: as

Conferências Populares da Glória, que começaram em 1873 e que ao longo de quase

vinte anos trataram de temas variados, com maior ou menor interface com a ciência,

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como clima, origem da Terra, doenças, bebidas alcoólicas, o papel da mulher na

sociedade e educação e, três anos depois, em 1876, os Cursos Públicos do Museu, nos

quais especialistas do Museu Nacional apresentavam ao grande público aspectos de suas

disciplinas – o evento se realizou ao longo de dez anos.

Segundo o autor, no livro Domingo é dia de Ciência: história de um suplemento

dos anos pós-guerra, esse não foi o único período histórico em que se verificou tal

fenômeno: “a ciência parece atravessar fases de maior e menor participação na esfera

pública ao longo dos anos, como sugeriu o cientista social britânico Martin Bauer em

um estudo de 1989”. (ESTEVES, 2006, p. 44)

O estudo de Bauer identificou quatro grandes ondas de divulgação científica ao

longo de 170 anos nos Estados Unidos e na Inglaterra. A primeira foi de 1850 ao início

da década de 1870, a segunda de 1910 a meados dos anos 1920, a terceira vai de 1940

ao início da década de 1960, a quarta de meados de 1970 até o presente.

Ao comparar dados de diferentes estudos sobre como aparecia a ciência na imprensa desses países, ele apontou períodos em que o tema esteve mais presente nos jornais; cada pico era seguido por um período em que declinava o interesse da imprensa pela ciência. O autor relacionou a ocorrência desses ciclos com ciclos de expansão e retração da atividade econômica e das inovações tecnológicas, mas ressaltou também que cada onda de aumento das atividades de divulgação científica obedeceu a motivações diferentes e se manifestou de forma singular. (ESTEVES, 2005, p. 28)

Luisa Massarani e Ildeu Moreira apontaram uma correspondência entre as ondas

de intensificação da divulgação científica postuladas por Bauer e os períodos mais

fecundos dessa atividade no Brasil, com uma pequena defasagem de tempo. Surtos

similares de atividades de divulgação científica se verificaram por aqui cerca de dez

anos após sua eclosão na Europa e nos Estados Unidos. Um período rico em iniciativas

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de divulgação científica no Brasil ocorreu entre 1865 e 1880; a onda seguinte se deu ao

longo dos anos 1920.

Duas características gerais emanam das observações feitas sobre a divulgação da ciência na segunda metade do século XIX, período em que ocorreu uma intensificação nessas atividades. Em primeiro lugar, os principais divulgadores são homens ligados à ciência por sua prática profissional como professores, engenheiros ou médicos ou por suas atividades científicas, como naturalistas, por exemplo. Não parece ter sido relevante a atuação de jornalistas ou escritores interessados em ciência. O segundo aspecto se refere ao caráter predominante das atividades de divulgação científica: elas tiveram como característica marcante a ênfase nas aplicações da ciência. (2002, p. 52).

Na última década do século XIX e primeiros anos do século atual observa-se que

as principais atividades de divulgação científica sofreram um certo refluxo. As

conferências e os cursos populares declinaram, o envolvimento de cientistas e

professores com essas atividades decresceu, assim como o número de revistas e artigos

referentes à divulgação científica. Para Luisa Massarani e Ildeu Moreira, essa redução

relativa não parece ser um fato isolado. Está correlacionada com a diminuição similar

que ocorreu nas atividades de divulgação no contexto internacional. (Ibid., p. 52)

Essa é uma amostra do contexto em que a Revista Brasileira se inseriu na

época de seu surgimento. A seguir, iremos ver o que traziam suas páginas, quem eram

seus colaboradores, o que o público pensava sobre a publicação.

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2 – UM ÚNICO TÍTULO E VÁRIAS FASES

Neste capítulo será dado um panorama geral de todas as fases da Revista Brasileira, antes da

fase dirigida por Antonio Baptista Pereira, cujas características serão mostradas no capítulo 3.

2.1 – Surgimento da Revista e sua primeira fase

A Revista Brasileira é uma continuação da revista Guanabara, uma publicação

mensal – editada por Manuel de Araújo Porto-Alegre, Joaquim Manuel de Macedo e

Gonçalves Dias. Segundo Moema Vergara, a revista Guanabara foi um dos principais

veículos que abrigaram os grupos iniciais do Romantismo no Brasil. Ela surgiu em

1849, teve vida mais ou menos regular até 1852, terminando em 1855. (2004, p. 75)

Em 1857, na cidade do Rio de janeiro, surge o primeiro número da Revista

Brasileira, dando início à sua primeira fase, que vai até 1861¹. Quando surgiu, ela tinha

o título de Revista Brasileira - Jornal de Ciências, Letras e Artes, passando depois a

ficar conhecida simplesmente como Revista Brasileira. No prospecto do primeiro

número, Cândido Batista de Oliveira, diretor da publicação, explica o seu surgimento:

A publicação literária que se dá hoje à luz, sob a denominação de Revista Brasileira, nada mais é que a transformação de outro jornal do mesmo gênero, o Guanabara, tomando maiores proporções, e passando a ser trimestral. Os acanhados limites do jornal, cuja publicação cessara, não permitiam o preciso desenvolvimento de muitos assuntos interessantes; nem o período mensal da sua aparição dava tempo suficiente para se prepararem as matérias que faziam seu objeto.A redação da nova Revista está confiada às mesmas pessoas que colaboraram na publicação do Guanabara; com uma única diferença de ficar agora cometida designadamente a um só desses colaboradores a direção dos trabalhos concernentes a publicação regular do novo jornal, com a responsabilidade inerente à qualidade de editor.

¹ A Revista Brasileira teve um primeiro momento antes da fase dirigida por Candido Baptista. Foi em 1855, mesmo ano em que desaparece a revista Guanabara. Durou apenas um ano, lançando poucos números, e tinha o título de Revista Brasileira: Jornal de Literatura, Teatros e Indústria. Nessa fase ela foi redigida quase que exclusivamente por seu diretor, Francisco de Paula Menezes.

Page 19: Revista Brasileira: das ciências para as letras

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A Revista Brasileira compreendera em matéria de ciências, letras e artes, tanto os trabalhos de lavra própria, como a transcrição de artigos tirados das publicações nacionais e estrangeiras da mesma índole, cuja leitura possa interessar ao público. (OLIVEIRA, Prospecto. Revista Brasileira, 1857)

A Revista Brasileira foi uma dos primeiros veículos nacionais especialmente

dedicados à divulgação de assuntos científicos e culturais. E um espaço em particular

foi dedicado ao Naturalismo. Moema conta que, nesse sentido, a nova publicação não

apresenta uma ruptura tão grande sua antecessora, a revista Guanabara, já que o

Naturalismo pode ser considerado um fruto direto do Romantismo presente nas páginas

daquela publicação, “preocupado em estabelecer os ‘critérios da nacionalidade’,

associando-se às filosofias naturalistas da segunda metade do século XIX, para

determinar a nossa autodefinição e diferenciação”. (VERGARA, 2004, p.75).

Uma análise do catálogo da Biblioteca Nacional realizada por Luiza Massarani

e Ildeu Moreira mostrou que, ao longo de todo o século XIX, foram criados cerca de

7.000 periódicos no Brasil, dos quais aproximadamente 300 relacionados de alguma

forma à ciência. Com “periódicos relacionados à ciência”, os autores se referem a

aqueles produzidos por instituições ou associações científicas ou ainda que tinham em

seu título a palavra “científico” ou “ciência”.

Na realidade, boa parte deles, mesmo com o título de “científicos”, trazia muito pouco material com conteúdo de ciência, limitando-se a notícias curtas ou curiosidades científicas. Ainda assim é significativo, e um reflexo do contexto cultural da época, o fato de trazerem explicitamente em seus títulos a referência à componente científica (real ou não). (2002, p. 46).

O que diferenciava a Revista Brasileira desses outros veículos era que nela

notava-se uma predominância dos assuntos científicos. A maioria das colaborações

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versava sobre assuntos diversos, apresentados em relatórios, comunicações, memórias,

ensaios, assinados por nomes de projeção do meio científico brasileiro. (VERGARA,

2004, p. 76). Entre os seus colaboradores, estavam nomes como Frederico Leopoldo

César Burlamaqui, Francisco Freire Alemão, Guilherme Schüch de Capanema,

Giacomo Raja Gabaglia, F. A. Varnhagen, Emmanuel Liais, entre outros.

Segundo Moema, o traço característico da prática científica que vai se

constituindo na segunda metade do século XIX é estar profundamente comprometida

com uma ampla difusão de suas descobertas; tanto para garantir o apoio do Estado,

quanto para legitimar a prática científica na sociedade.

Assim sendo, a vulgarização científica se constituiu em uma via de propaganda para garantir a autonomia atividade científica, que, para se manter e se desenvolver, requer auto-regulamentação e auto-referência. Para tal, é preciso que a sociedade associe a ciência com progresso ou, de alguma maneira, reconheça o valor do trabalho científico. Este reconhecimento permite que o cientista obtenha prestígio social e consiga financiamentos para seus projetos. (VERGARA, 2003, p. 13)

O estudo da trajetória da Revista Brasileira nos faz perceber que não só nessa

primeira fase, como nas seguintes também, embora de maneira menos intensa, a Revista

Brasileira esteve comprometida com essa visão.

2.2 – Segunda fase da Revista Brasileira

Em 1ª de junho de 1879, um grupo de intelectuais, liderado pelo carioca Nicolau

Midosi, do qual participavam o escritor cearense Franklin Távora e o médico baiano

Moreira Sampaio entre outros, ressuscitou a Revista Brasileira dando início a sua

segunda fase, que durará até 1881.

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Moema explica que todos esses homens trabalharam na Secretaria do Império,

sendo provavelmente deste espaço que partiram para a empreitada de reorganizar a

Revista que teria por fim, segundo o editorial do primeiro número, “proporcionar aos

escritores brasileiros e a quantos se ocupam com o estudo das coisas do nosso país a

publicação das produções literárias e científicas de reconhecido mérito e utilidade”.

(Editorial da Revista Brasileira, 1879. Apud, VERGARA, 2004, p. 75).

Abaixo, transcrevo outro trecho do editorial do primeiro número da fase Midosi:

Procurando continuar essa gloriosa tradição, duas vezes infelizmente interrompida, a Revista Brasileira pretende servir com dedicação e sinceridade a causa da cultura nacional. Abre-se a todas as opiniões sinceras e honestas. Não exige de seus colaboradores senão probidade literária, que envolva a competência e respeito das alheias opiniões. Busca ser um laço de união e um estímulo de trabalho para todos os estudiosos brasileiros e a todos convida a colaborar com ela nesta boa tarefa de alto patriotismo. Enciclopédica, a nova Revista Brasileira, se ocupará, entretanto, de preferência de quanto direta e indiretamente ao Brasil e a sua cultura interessam: ciência, letras, artes, história, filosofia, economia, política, ciências sociais, viagens, etc.A bibliografia nacional e tudo que respeita ao nosso movimento espiritual, merecer-lhe-á toda a atenção e será objeto de seções especiais, permanentes ou periódicas. Os livros brasileiros, conforme a sua importância e valor, serão sempre apreciados na Revista Brasileira em artigos ou simples notícias críticas. (Editorial Revista Brasileira, 1879. Apud, VERGARA, 2004, p. 76

Embora mostrasse um programa variado, essa fase teve um tom nitidamente

mais literário do que a anterior. A historiadora Ana Luiza Martins diz que o elenco de

colaboradores conferiu-lhe uma alta qualidade literária, lembrando que, em suas

páginas, Machado de Assis lançou Memórias Póstumas de Brás Cubas, a comédia Tu

Só, Tu, Puro Amor, A Mosca Azul, entre outras obras; o jornalista Carlos Laerte, na

seção Crônica Literária, defendeu Fagundes Varela, criticado por Castelo Branco; Sílvio

Romero divulgou ali o primeiro capítulo de sua História da Literatura Brasileira;

Sacramento Blake anunciou na Revista o lançamento de seu Dicionário Bibliográfico

Brasileiro. (2008, p.63)

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Nesse momento, a Revista funcionava na Rua Gonçalves Dias, 47 , centro do

Rio de Janeiro, e tentou obter bases comerciais mais sólidas, angariando, já no primeiro

número, diversas assinaturas, além de recursos vindos dos anúncios. Em 1880, recebeu,

inclusive, apoio financeiro de D. Pedro II (o que, no entanto, não evitou seu final no ano

seguinte).

Para a Moema, o público-alvo dos editores da fase Midosi era, com certeza, o

homem culto. Isto pode ser notado pela escolha dos temas, pela forma de apresentação

dos artigos sem recursos de ilustração e pela linguagem empregada. O próprio

Imperador, expressão máxima desta elite letrada, era leitor da Revista.

Podemos afirmar que o público da Revista, grosso modo, pertencia à classe dominante. Mas, com as transformações ocorridas no final do século XIX – como o desenvolvimento das instituições de ensino superior –, observamos um alargamento desta elite ilustrada que não necessariamente se confundia com a elite econômica. Assim, neste processo de formação de uma elite ‘cultivada’, podemos encontrar figuras não tão privilegiadas, que tinham no cultivo das letras uma forma de ascensão social, como o mestiço Machado de Assis, representante dos setores médios da cidade do Rio de Janeiro, e Tobias Barreto, sergipano autodidata que influenciou muitos autores da Revista. (VERGARA, 2004, p.76)

Segundo a autora, logo após o fim da fase Midosi, Veríssimo e Machado de

Assis trocam correspondência sobre o problema das revistas literárias e o público leitor

no Brasil, como podemos ver num trecho de uma carta de Machado de Assis, datada de

19 de abril de 1883, para Veríssimo:

Há alguns dias, (...) referindo-me à Revista Brasileira, tão malograda, disse esta verdade de La Palisse: ‘que não há revistas sem um público de revistas’. Tal é o caso do Brasil. Não temos ainda a massa de leitores para essa espécie de publicações. (ASSIS, 1883. Apud, VERGARA, 2004, p. 77)

Page 23: Revista Brasileira: das ciências para as letras

14

Realmente, o público da Revista, em linhas gerais, era constituído por uma

minoria da sociedade brasileira, uma vez que a taxa de analfabetismo variou de 84,2%

em 1872 a 74,5% em 1900. (IBGE. Apud, VERGARA, 2003, p. 24). “Logo, estamos

nos referindo a um grupo minoritário da sociedade, no qual o conceito de elite

econômica pode, grosso modo, se confundir, mas não se esgotar no sentido de elite

intelectual”. (Ibid., p. 24).

2.3 – Terceira fase da Revista Brasileira

Se na fase Midosi, a literatura recebe grande destaque, na fase seguinte, sob a

direção de José Veríssimo, a predominância de assuntos literários aumenta ainda mais.

A terceira fase começa em 1895, quatorze anos depois do final da fase Midosi e com o

país já completando sete anos de vida republicana, indo até 1900². A sede, naquele

momento, foi situada à rua do Ouvidor, 66 – endereço que se tornou um importante

centro de referência para os intelectuais no Rio de Janeiro.

Na fase Veríssimo, segundo mostra Moema, a seção “Notas e Observações”

tinha por objetivo receber “comunicações originais, breves e exatas sobre toda a ordem

de fatos que possam esclarecer ou interessar como questões de história natural ou

política, pontos duvidosos de história literária nacional, biografia, etc.” (Nota dos

editores. Revista Brasileira, tomo I, 1895. Apud, VERGARA, 2003, p. 78)

² Durante esta fase da Revista Brasileira, os intelectuais que lá colaboravam fundarão a Academia Brasileira de Letras (1897). Por causa disso, Moema fala que não surpreende que a Revista Brasileira, nos anos de 1940, tenha sido encampada pela ABL.

Page 24: Revista Brasileira: das ciências para as letras

15

A Revista contava também com a seção “Notícias de ciências, letras e artes”, de

redator anônimo e a “Bibliografia”, destinada a resenhas, geralmente de

responsabilidade do editor, que de vez em quando cedia o espaço a um colega. Também

havia a seção “Revista Científica”, em que diretor do Observatório Nacional, Luis

Cruls, assinava a maioria dos artigos.

A Revista Brasileira se tornou uma referência para os homens letrados, que não

só liam seus artigos, mas se dirigiam a sua sede a fim de comprar outras publicações.

Na fase Midosi, podemos verificar a venda de títulos como: Noções de química inorgânica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro; A Piedade Suprema, de Victor Hugo; Telas Sonantes, de Afonso Celso, cujos preços variavam de 1$000 a 3$000. Talvez por isso, houvesse um espaço grande da revista destinado a resenhas e notícias de lançamento de livros e periódicos. Este serviço de agilização da informação bibliográfica se ampliava ainda mais na fase Veríssimo. (VERGARA, 2003, p.78)

Segundo Moema, a idéia de oferecer tal serviço seja decorrência de um aspecto

incentivado por Veríssimo que era a convivência dos autores no escritório da Revista.

Nesse sentido, Graça Aranha informa que todo final de tarde, com ou sem texto a

entregar, os colaboradores passavam pela redação da Revista Brasileira. “Além de ser

um prestigiado veículo de publicação de autores nacionais, a Revista Brasileira acabou

por adquirir status de agremiação literária, instituindo-se o chá das cinco”. (EL FAR, A

encenação da imortalidade, 2000, p. 45. Apud, VERGARA, 2003, p. 79).

Todas as tardes no Rio de Janeiro, antes que o sol transmonte, um grupo de homens se reúne em uma pequena e modesta sala. É o five o’clock da Revista Brasileira, refúgio suave, tranqüilo da tormentosa vida fluminense. Há desordem no parlamento? Há estado de sítio? Que importa! Recolhemonos àquele retiro e reciprocamente nos infiltramos de fluidos intelectuais. (ARANHA, “A literatura atual no Brasil”. Revista Brasileira, tomo XIII, 1898, p. 184. Apud, VERGARA, 2003, p.79).

Page 25: Revista Brasileira: das ciências para as letras

16

Frente aos acontecimentos tumultuados da recém-proclamada República, como

cita Graça Aranha, Moema mostra que a Revista Brasileira teve o dom da tolerância e

da concórdia. As suas páginas e as suas salas foram compartilhadas por monarquistas

como Taunay, Joaquim Nabuco, Eduardo Prado, republicanos como Lúcio de

Mendonça ou socialistas como o próprio José Veríssimo. Este espírito já estava

anunciado no primeiro editorial da fase Veríssimo:

Este período é em nossa vida nacional de reorganização política e social. A Revista Brasileira não lhe pode ficar alheia e estranha. As questões constitucionais, jurídicas, econômicas, políticas e sociais em suma, terão um lugar nas suas páginas. Republicana, mas profundamente liberal, aceita e admite todas as controvérsias que não se achem em completo antagonismo com a inspiração da sua direção. Em Política, em Filosofia, em Arte não pertence a nenhum partido, a nenhum sistema, a nenhuma escola. Pretende simplesmente ser uma tribuna onde todos os que tenham alguma coisa que dizer e saibam dizê-la, possam livremente manifestar-se. (Editorial Revista Brasileira, 1895. Apud, VERGARA, 2003, p. 79).

2.4 – Uma Revista dedicada às causas nacionais

Uma característica comum a todas as fases da Revista Brasileira era o esforço

de produzir uma identidade nacional. Isso gerou, inclusive, como conta Moema, um

sentimento de aversão aos tempos coloniais, identificando tudo que lembrasse Portugal

ao passado e ao atraso.

Na Revista Brasileira, era recorrente os autores verem, na condição de colônia portuguesa, apenas um empecilho que, ao mesmo tempo, explicava nosso atraso e deveria ser vencido. Portugal era, aos olhos desses autores, desprovido de produção científica digna de nota, e sua cultura se distanciava das coisas da ciência. (VERGARA, 2003, p. 38)

Page 26: Revista Brasileira: das ciências para as letras

17

Segundo a autora, na segunda metade do século XIX, a influência das idéias

evolucionistas trazia, para a elite brasileira, a esperança de formar uma nação moderna.

Podemos interpretar estes dois momentos – a Ilustração luso-brasileira e os anos de 1870– guardadas suas especificidades, como a nossa procura de uma ocidentalidade. Contudo, esta busca só fazia sentido se pudéssemos compreender nossa natureza e não pela simples imitação e adaptação de idéias ou instituições estrangeiras. (Ibid., p. 43-44).

A autora ainda lembra do desejo dos homens letrados brasileiros, em meados do

século XIX, de produzir um conhecimento sobre o Brasil feito por brasileiros em

oposição aos relatos de viajantes que por aqui passavam buscando, muitas vezes, a mera

promoção pessoal.

Nas segunda e terceira fase da Revista Brasileira fica claro que essa identidade

nacional procurava ser mostrada principalmente através da literatura. Mas uma

característica interessante foi o fato dos críticos literários também desempenharem o

papel de divulgadores da ciência, ao lado de cientistas.

Principalmente na fase Midosi, observamos os críticos literários, como Sílvio Romero, Souza Bandeira, José Veríssimo e Rangel S. Paio popularizando o conhecimento científico junto ao público da Revista Brasileira. Isto nos faz pensar que este esforço de vulgarização estava a serviço do projeto mais amplo da Revista, que era uma iniciativa dos literatos. (...) Também notamos estes homens de letras recorrendo à ciência como argumento de autoridade para a defesa de determinado ponto de vista ou simplesmente para se mostrar sintonizados com as conquistas de seu tempo, imbuídos da missão de levar o conhecimento científico para o povo para renovar a nação, removendo as amarras do obscurantismo. (VERGARA, 2003, p.101)

Moema insere a crítica literária no quadro de inovações oriundas do processo de

modernização pelo qual estava passando a sociedade brasileira no final do século XIX,

que tinha como uma de suas decorrências, a sistematização dos conhecimentos sobre os

Page 27: Revista Brasileira: das ciências para as letras

18

problemas brasileiros feitos por instituições nacionais. Este processo trouxe consigo

uma crescente especialização e profissionalização de diversos ofícios no Brasil, como a

critica literária, que, segundo ela, carregava consigo os debates de outras áreas do

conhecimento, como a necessidade de uma ciência nacional através da aplicação do

método experimental.

Para a autora, a criação da Academia Brasileira de Letras é um dos indícios do

processo de profissionalização dos escritores. E completa:

Quando o desenvolvimento tecnológico da imprensa fez surgir os grandes jornais diários no Rio de Janeiro e em São Paulo, os literatos viram no jornalismo um espaço primordial de venda e de divulgação de seus textos, para assim poderem viver de sua produção intelectual. No entanto, a opção de “viver de letras” ainda era bastante árdua. El Far nos mostra que, além de enfrentar a baixa remuneração, os escritores deparavam-se com as escassas oportunidades no mercado editorial, que continuava privilegiando os poucos autores brasileiros consagrados. “Por perfilarem nas colunas dos maiores jornais da cidade do Rio de Janeiro, esses poetas e romancistas conquistavam um renome desconhecido às demais atividades, mas poucas vezes desfrutavam de estabilidade financeira e de um status social consolidado. (2003, p.96)

No entanto, ressalta Moema, neste contexto de progressiva profissionalização

dos literatos, a crítica literária não havia atingido o nível de especialização que

conhecemos atualmente. Segundo ela, na Europa, durante a segunda metade do século

XIX, já se poderia ver a atividade do crítico como um especialista dentro do campo da

literatura, mas no Brasil daquele momento ainda não seria possível ver este tipo de

especialização em nosso meio literário.

O crítico era visto não apenas como um intérprete de obras alheias, mas ainda como um orientador, exercendo uma tarefa praticamente didática com relação ao seu espaço sócio-cultural. Assim, ganhava vulto a figura do crítico literário, cuja tarefa era a de educar o público e formar uma opinião. Por ser a categoria que toma para si, mais do que as outras, a função de intermediar a produção intelectual dos demais letrados com o público, acreditamos serem os textos dos críticos literários um espaço privilegiado para a análise da vulgarização científica. (Ibid., p. 97).

Page 28: Revista Brasileira: das ciências para as letras

19

Para Sílvio Romero, citado pela autora, a crítica deveria ser abrangente e estudar

as origens e as leis que regem o desenvolvimento de todas as criações do espírito

humano, científicas, artísticas, religiosas, políticas, jurídicas e morais. Moema lembra

que nesse período surgiu o Naturalismo, profundamente influenciado pelo positivismo e

pelo evolucionismo e tudo que representava o racionalismo moderno, nas idéias

literárias, filosóficas ou sociais. Desta forma, segundo ela, podemos ver que o ofício de

homem de letras daquele momento requeria estar em sintonia com os avanços

científicos de sua época.

Tanto os literatos quanto os cientistas acreditavam, naquele momento, que era imprescindível, para o fortalecimento do sentimento nacional, a criação de um “nacionalismo científico”, ou seja, que o Brasil também ingressasse no cenário das nações que contribuiriam para o crescimento do conhecimento científico universal. Este nacionalismo científico terá na natureza brasileira o seu elemento principal. Mas esta era tida pelos colaboradores da Revista Brasileira como uma natureza ‘desconhecida’ e que precisava do recurso à ciência para torná-la efetivamente constituinte do ‘patriotismo nacional’. O aproveitamento da natureza pátria, através do método experimental, traria a riqueza e o conhecimento necessário para a conquista de um lugar para o Brasil nos ‘foros da História e da Civilização’. A função específica da vulgarização científica neste quadro seria conferir os instrumentos necessários para que o leitor participasse do processo deconhecimento sobre a natureza pátria, capacitando-o na observação desta natureza mas também garantindo respaldo social ao trabalho do cientista profissional. (VERGARA, 2003. P.210).

Segundo Maria Helena Rouanet, a crítica literária tinha naquele momento seus

limites confundidos com a principal função que escolhera para si: a de preparar um

futuro melhor para a nação recém-constituída. (ROUANET, Um mister de boticários,

1993, p. 11. Apud, VERGARA, 2003, p.98).

Outros periódicos do período apresentavam características semelhantes às da

Revista Brasileira, como tornar a linguagem acessível aos leigos ou por ter literatos na

função de vulgarizadores. O Vulgarizador é um exemplo. No entanto, o que faz,

Page 29: Revista Brasileira: das ciências para as letras

20

segundo Moema, a Revista Brasileira peculiar, é que nela observamos que eram os

críticos literários que mais se dedicavam a esta atividade, uma vez que viam na ciência

o caminho que poderia guiá-los para a “verdadeira” essência da identidade brasileira. E

a Revista Brasileira ofereceu um largo espaço em suas páginas para este tipo de

reflexão.

Era através da comunicação de suas reflexões que esta elite pensante abriria um espaço de crítica e progresso contínuo mediatizado pela publicidade. É importante frisar que em um país novo, com instituições políticas e jurídicas ainda frágeis, a literatura foi o espaço de formação da consciência nacional, onde o Brasil se revelou aos brasileiros. (VERGARA, 2003, p.103)

O começo da República foi marcado pela criação de várias instituições de

pesquisa, principalmente em São Paulo; o Instituto Vacinogênico, para o

desenvolvimento de vacinas (1892); o Instituto Bacteriológico (1893); e o Instituto

Butantã, um centro para pesquisa de venenos e produção de antídotos (1899). Em 1900,

foi criado, no Rio de Janeiro, o Instituto de Manguinhos, para a pesquisa biomédica.

Moema explica que essas organizações foram responsáveis por muito do que se

produziu na ciência brasileira até a década de 1930. E que muitos pesquisadores que

estavam ligados a estas instituições, criadas não só na república, mas no império

também, utilizaram a Revista Brasileira para divulgar seus trabalhos, como Louis

Couty, Batista Lacerda, Orville Derby, von Ihering, Goeldi e Ladislau Netto. (2003, p.

54).

Daniel Essenine Takamatsu Arantes lembra também do interesse da fase

Veríssimo pelos assuntos jurídicos e constitucionais, além dos artigos de cunho

filosófico. Segundo o autor, o próprio José Veríssimo, em algumas oportunidades,

Page 30: Revista Brasileira: das ciências para as letras

21

divulgou alguns de seus estudos no campo, como o intitulado “O Positivismo no

Brazil”, nas páginas da Revista. (ARANTES, 2010, p.86)

2.5 – Linguagem empregada na Revista

Na primeira fase, sobre a direção de Candido Baptista, observamos textos muitos

longos, alguns chegando a ter mais de 50 páginas. Eles apresentavam uma linguagem

muito técnica, uso de fórmulas matemáticas e gráficos complexos. Enfim, são textos

com um nível de dificuldade bem alto, que só pessoas entendidas do assunto poderiam

acompanhar. Já nas duas fases seguintes, vemos a preocupação em torná-los mais

simples. No editorial do primeiro número da fase Midosi, por exemplo, lemos que “na

Revista dão-se a ler, sem risco de cansaço, artigos sobre todos os conhecidos assuntos

por onde anda o pensamento, a imaginação, a análise, o ensino do homem”. (Editorial

Revista Brasileira, 1879. Apud, MARTINS, 2008, p.63)

Já Veríssimo, em seu primeiro editorial, afirmava que iria fazer uma revista

dedicada a diversos temas, que com isso pretendia ser diferente da fase dirigida por

Cândido Batista de Oliveira, considerada enfadonha por ele por ter “uma feição talvez

demasiado científica e técnica, que lhe devia certamente estorvar o acesso ao público”.

(Editorial Revista Brasileira, 1895. Apud, VERGARA, 2003, 79).

Segundo Moema, as promessas de Veríssimo foram cumpridas por todos que

escreveram na Revista Brasileira sobre assuntos de ciência, quando ele foi editor da

Revista. Isto pode ser comprovado no compromisso assumido pelo astrônomo Luis

Cruls em seu artigo inaugural, para a seção Revista Científica que ficou sob sua

responsabilidade durante vários números:

Page 31: Revista Brasileira: das ciências para as letras

22

Sem usarmos de fórmulas matemáticas, que seriam bastante deslocadas nesta Revista, nem tão pouco recorrermos a considerações que poderiam escapar a alguns dos seus leitores, procuramos nos restringir ao emprego da linguagem mais singela que for possível. (CRULS, Luis. Revista científica. Revista Brasileira, 1896, p. 392. Apud, VERGARA, 2003, p. 83)

Já Louis Couty, outro freqüente escritor da Revista, acreditava que era preciso

produzir artigos que não se restringissem a veicular a aplicação pragmática do

conhecimento científico, mas matérias capazes de inflamar o leitor com assuntos do

mundo do laboratório, que estavam distantes dos olhos do público:

É preciso que no Brasil, como na Europa, todas as classes instruídas e amantes do progresso cheguem a compreender a utilidade, a importância intelectual e científica das investigações pacientes do laboratório; é preciso que aqui, como ali, o homem chegue a apaixonar-se pelas questões científicas da menor, como da maior importância, e que qualquer descoberta interessante possa tornar-se assunto das conversações e discussões assim como de todas as pessoas instruídas. É preciso que o conhecimento dos métodos experimentais e dos problemas que por eles se resolva faça parte da educação média com o mesmo título que os demais conhecimentos literários e científicos. (COUTY, Louis. “Os estudos experimentais no Brasil”. Revista Brasileira, 1879, p. 215. Apud, VERGARA, 2003, p. 83)

Para Moema, este não é apenas um projeto iluminista de levar as luzes da razão

para toda a sociedade, mas aproximar o modus fasciendi da ciência para aqueles já

iniciados em algum nível de cultura científica, que poderiam dar apoio financeiro e

institucional à comunidade científica, levando a adiante o projeto de uma ciência

nacional. Sobre isso, Couty fala:

Os nossos artigos serão curtos, porque desejamos que sejam lidos; entretanto, não nos esquecendo que se escrevermos para homens instruídos, não procuraremos simplificar as questões e pô-las, conforme se diz, ao alcance de todos. Terão eles um fim único: discutir e estudar desde já o que denominei – a ciência do Brasil. (COUTY, Louis., op. cit., Revista Brasileira, p. 238. Apud, VERGARA, 2003, p. 86)

Page 32: Revista Brasileira: das ciências para as letras

23

Segundo a autora, estes “homens instruídos” que se constituem no público-alvo

da Revista eram substancialmente diferentes do público formado por proprietários de

terras dos periódicos O Auxiliador e O Patriota, do início do século XIX, que visavam a

subsidiar o desenvolvimento de uma racionalização da produção agrícola em bases

científicas. Em outras palavras, o público da Revista Brasileira era composto pela elite

letrada da época, formadora da opinião pública.

Na fase Midosi, vemos a intenção de mostrar a vantagem da Revista sobre as

demais publicações. Segundo os organizadores, a Revista Brasileira seria uma

transição racional do jornal para o livro.

A revista, transição racional do jornal para o livro, ou antes laço que prende esses dois gêneros de publicação, afigura-se nos por isso a forma de dar ao nosso povo conhecimentos que lhe são necessários para ascender à superior esfera no vasto sistema das luzes humanas (...) não se trata ali de uma só matéria, como de ordinário no livro singular, ou de muitas matérias em rápido percurso, como no jornal, mas de todas com a conveniente demora, em forma e extensão proporcionadas aos espíritos, qualquer que seja o grau de instrução de cada um, a intensidade da sua convicção, a tendência do seu gosto, a ordem do seu interesse. (Editorial Revista Brasileira, 1879. Apud, MARTINS, 2008, p.63)

No mesmo sentido, Veríssimo afirmava em seu primeiro editorial:

Mais facilmente que o jornal ou o livro, pode a revista recolher de todo o país e por todo ele disseminar as manifestações da sua vida espiritual, sendo ao mesmo tempo um centro de convergência e de irradiação de todas elas. (Editorial Revista Brasileira, 1895. Apud, VERGARA, 2003, p.77)

Essa foi uma visão geral das três primeiras fases da Revista Brasileira.

Podemos perceber que em cada novo ciclo, sob direção diferente, a publicação revelava

características novas. No entanto, podemos ver também que semelhanças atravessaram

Page 33: Revista Brasileira: das ciências para as letras

24

todas as fases. E, sobretudo, que a essência da Revista – ser uma publicação voltada e

preocupada com os interesses nacionais – permaneceu. No próximo capítulo iremos ver

que na sua quarta fase, a Revista também trouxe características novas e preservou sua

essência.

Page 34: Revista Brasileira: das ciências para as letras

25

3 - QUARTA FASE DA REVISTA BRASILEIRA (1934-1935)

Nesse capítulo iremos analisar as propostas e o conteúdo da Revista Brasileira em sua quarta

fase, que vai de 1934 a 1935, sob a direção de Baptista Pereira.

Como vimos, a Revista Brasileira surgiu com a missão de divulgar a produção

científica nacional. Vimos também que essa característica principal foi se alterando ao

longo das fases seguintes. Em sua quarta fase, dirigida por Antonio Baptista Pereira, e

tendo Samuel Wainer como secretário, e Ruy Baptista Pereira, filho de Antonio, como

redator, divulgar ciência também não foi seu maior interesse. Nessa fase, a Revista

pretendia ir além e ser “a síntese do comportamento contemporâneo”, conforme ilustra a

folha de rosto do primeiro número. Essa síntese passava por todas as áreas de interesse

público, como economia, ciência, política, sociologia, artes.

Nessa época, a sede da Revista estava situada na Rua Álvaro Alvim, número 28,

edifício Góes, 8ª andar, Rio de Janeiro. A publicação se dizia mensal. O número de

páginas variava próximo a 250 páginas.

Mesmo mudando sua linha editorial, ao manter o nome de Revista Brasileira,

os editores de cada nova fase visavam dar continuidade a uma tradição inaugurada na

segunda metade do século XIX. Visava, sobretudo, manter os mesmos objetivos e

princípios de brasilidade da publicação, como vemos no primeiro editorial da quarta

fase:

Nenhum dá melhor idéia dos seus propósitos de brasilidade, mas de uma brasilidade bem entendida, sem xenofobias esdrúxulas e atrasadas, e sem o ridículo do nacionalismo que olha com arrogância e desprezo o estrangeiro, sem o qual não seriamos hoje o que somos. (Editorial. Revista Brasileira, nº. 1, 1934)

Page 35: Revista Brasileira: das ciências para as letras

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Além da defesa de um nacionalismo sadio, visto nesse primeiro editorial da

quarta fase, a historiadora Ilka Stern Cohen nota também a intenção de objetividade e

profundidade de seus autores. “O projeto editorial era claro: oferecer ao leitor um

panorama dos temas contemporâneos em suporte capaz de servir de ‘arquivo’”.

(COHEN, 2006. In Anais do XVIII Encontro Regional de História – O historiador e seu

tempo. ANPUH/SP – UNESP/Assis, 24 a 28 de julho de 2006)

Segundo os diretores, a inspiração da Revista era estrangeira:

Dois admiráveis modelos apontaram-lhe as linhas mestras do seu programa. A 'Review of Review' de William Stead e o recente magazine francês 'Le Mois', as duas mais completas fontes de informação que a publicidade moderna tem oferecido, fora do quadro dos diários, à massa que dia a dia se avoluma das elites culturais. (Editorial. Revista Brasileira, nº. 1, 1934).

Tabela: Edições da quarta fase da Revista Brasileira

Número Data

1 Junho de 1934

2 Agosto de 1934

3 Setembro de 1934

4 Outubro - Novembro de 1934

5 Dezembro de 1934

6 Janeiro – Fevereiro de 1935

7 Março – Abril de 1935

8 Maio – Junho de 1935

9 Julho – Agosto de 1935

10 Outubro – Novembro de 1935

Como notamos, embora se anunciando uma publicação mensal, a Revista teve uma periodicidade irregular.

Page 36: Revista Brasileira: das ciências para as letras

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3.1 – Público da Revista

Como suas antecessoras, a nova Revista Brasileira continuava a ser voltada

para a elite. Elite que compunha a opinião publica da época, composta por homens de

ciência e letras, que tinham, segundo Moema, uma dupla missão: instruir e determinar

os caminhos para o governo “esclarecido” sobre as bases da razão e se dirigir

igualmente ao público em geral a fim ajudá-los a fazerem uso de sua própria razão num

sentido mais elevado do que a empregada no âmbito privado. (VERGARA, 2004, p.87)

O editorial do número três da quarta fase mostra a continuidade dessa

característica:

Muita gente supõe que o Brasil ainda não tem público para uma publicação como a nossa, que exige leitores cujo senso crítico se tenha aprimorado no cultivo do que as artes e as letras tenham de mais apurado. É um engano. Não só no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Porto Alegre, em Belo Horizonte, em Pernambuco e na Bahia, existem núcleos intelectuais de primeira ordem. Em todo o remoto e esquecido Norte os há tão brilhantes e tão fecundados, e, talvez, com um senso mais nítido dos nossos verdadeiros valores, que julgam imparcialmente, à distancia , sem preocupações subalternas, constituindo assim, para os que mourejam no pensamento uma antecipação da posteridade. (Editorial. Revista Brasileira, nº. 3, 1934).

Já no “Balanço intelectual” que os editores fizeram em homenagem ao início do

segundo ano da publicação, lemos:

Não foi possível disfarçar a surpresa que trouxe o nosso número 1. Atônitos perguntavam-nos os incrédulos: aonde fostes buscar tanta coragem? As expressões já gastas de um “Brasil tão grande quanto inculto” feriram-nos sucessivamente os ouvidos. Mas o sucesso estrondoso junto a crítica e ao público, encarregou-se de desmentir o derrotismo dos que vêem no Brasil um ótimo produtor de café e nada mais. (“Balanço intelectual”. Revista Brasileira, nº.6, 1935)

Page 37: Revista Brasileira: das ciências para as letras

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Realmente o sucesso do primeiro número parece ter sido estrondoso, conforme

já apontava o editorial do número 2; neste os editores agradeceram a acolhida e

noticiaram o rápido esgotamento da edição. No número 3, eles também falam sobre o

sucesso do empreendimento:

O êxito da Revista é uma realidade. Verifica-se por fatos e não por palavras. O 1ª número está completamente esgotado. O 2ª número vai pelo mesmo caminho. Ambos estão sendo zelosamente guardados pelos que vêem no seu texto as verdadeiras preciosidades e uma série de documentos inéditos que é preciso conservar porque são únicos.A Revista Brasileira não é mesmo uma dessas publicações que uma vez lidas se possa pôr fora. O escrúpulo que com é escolhida a sua matéria, a mina de documentos a que recorre, e de que apenas entremostrou o filão, o nível dos seus colaboradores, em nada inferior ao das mais legitimas notabilidades estrangeiras, tudo isso nos tem assegurado uma simpatia, que é o melhor premio dos nossos esforços. (Editorial. Revista Brasileira, nº. 3, 1934).

Capas da quarta fase da Revista Brasileira. (Acervo Fundação Casa Rui Barbosa)

3.2 – Expediente

O expediente da Revista apresenta algumas alterações ao longo das edições. Nos

dois primeiros números, Baptista Pereira aparecia como o diretor, Samuel Wainer como

Page 38: Revista Brasileira: das ciências para as letras

29

secretário e Ruy Baptista Pereira, como redator. No 3º, 4º e 5º números, Bandeira Stelle

surge como redator também.

No 6º e 7º números, Baptista Pereira aparece como diretor-responsável, Samuel

Wainer como diretor-secretário, Ruy Baptista Pereira, como diretor-gerente e Bandeira

Stelle e Alvaro Albuquerque como redatores.

No 8º número, saem Samuel Wainer, Bandeira Stelle e Alvaro Albuquerque,

mantendo-se apenas o proprietário-diretor e seu filho, agora na qualidade de diretor-

gerente. Dois novos nomes surgem: Maria da Graça Dutra, como secretária e Benjamin

E. Do Lago como redator-chefe.

No 9º e 10º números, Chermont de Brito e Raymundo Pinheiro aparecem como

redatores.

Samuel Wainer, no livro Minha razão de viver. Memórias de um repórter, de

1989, explica que o motivo de sua saída foi um artigo de Miguel Reale, trazido por Ruy

Baptista Pereira, na seção "Brasil". Ilka conta que Wainer percebeu na publicação desse

artigo um passo definitivo em direção à propaganda integralista, e abandonou o projeto.

Realmente, a pretensão de isenção que a publicação trazia, caiu por terra a partir desse

artigo que, além do evidente conteúdo de propaganda, veio acompanhado de uma nota

de esclarecimento ao leitor:

Com este número a Revista Brasileira inicia uma série de artigos sobre o integralismo, que é o mais belo, patriótico e irresistível movimento de opinião já processado em nossa pátria. Miguel Reale é o homem indicado para dar a conhecer aos brasileiros as bases da doutrina integralista, pois ocupa no Partido a destacada posição de Secretário Nacional da Doutrina. Nos próximos números publicaremos, do mesmo autor, novos trabalahos sobre a grande cruzada de salvação nacional, empreendida pelos legionários do sigma. (Revista Brasileira, nº. 7, 1935, p. 37. Apud, COHEN, 2006, p.3)

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30

A admiração de Ruy Baptista pelo integralismo e pelo fascismo tornou-se clara.

Artigos sobre aspectos da Itália atual, por exemplo, eram freqüentes:

Com o advento do regime fascista renasceram a Itália e as asas italianas. Se só um cego não vê as grandiosas realizações de gênio de Mussolini, em todas as esferas da atividade italiana, que dizer do capítulo da aviação, em que se pode afirmar sem exagero que criou o tipo da eficiência, da disciplina e da devoção? (As asas italianas". Revista Brasileira n°. 8, 1935, p. 194. Apud COHEN, 2006, p.4-5)

Mas como a Revista declarava também ser uma publicação “acima de paixões e

partidarismos”, como dizia o editorial do nº 2, na mesma edição em que se fazia a

apologia do integralismo, artigos defendendo a intervenção do Estado na economia ou a

entrada da Rússia na Sociedade das Nações faziam o contraponto. No número 8, junto

ao expediente, uma nota em negrito alertava:

A Revista Brasileira é completamente alheia à política partidária. Só vê e nunca deixa de ver os interesses do Brasil. Mas do alto. Fora e além das personalidades. Só com essa orientação é que ela poderia sustentar o crédito que lhe tem confiado a opinião pública: o de ser a mais alta tribuna do pensamento brasileiro. (Revista Brasileira n°. 8, 1935. Apud COHEN, 2006, p.5)

Realmente é difícil um veículo da imprensa se manter totalmente afastado da

política em um momento de grandes transformações no mundo e no Brasil. De acordo

com Marialva Barbosa, no seu História Cultural da imprensa: Brasil –1900-2000, o

país nesse momento via a emergência de novas forças políticas, como os getulistas,

tenentistas, integralistas, comunistas e aliancistas, no contexto de modernização da

sociedade e de organização do aparelho estatal. Forças que, mesmo ocupando posições

diferentes, pertencem a um mesmo universo ideológico caracterizado pelo

autoritarismo, pelo intervencionismo e pelo nacionalismo.

Page 40: Revista Brasileira: das ciências para as letras

31

De forma quase unânime, a historiografia aponta os primeiros anos da década de 1930 como de acentuada instabilidade política, diante de incapacidade de qualquer dos grupos dominantes em assumir o controle das funções políticas. Esta situação teria sido responsável por algumas das características mais marcantes da política brasileira de então, entre elas a personalização do poder, construindo a imagem – meio real meio mítica – da soberania da sociedade política sobre o conjunto da sociedade. (2007, p.104).

Para a autora, os anos 1930 são um período de evidencia da política e estes

temas encontram o seu lugar natural na imprensa. “A polêmica e o apoio institucional

ao governo ou a oposição ganham espaço nobre nas páginas das publicações”. (2007,

p.108).

Como pretendia ser a “síntese do momento contemporâneo”, os artigos da

publicação não retratavam só o Brasil. O mundo teve grande destaque na quarta fase da

Revista Brasileira. Um mundo, aliás, tão conturbado e instável quanto o Brasil. Na

década de 1930, a Europa assistia à ascensão de líderes totalitários e estruturação do

Nazismo, que culminaria na deflagração da Segunda Guerra Mundial. A Índia, uma das

várias Colônias Britânicas, liderada por Mahatma Gandhi, estruturava um movimento

para sua independência, que aconteceria apenas em 1947. A China, invadida pelo Japão,

enfrentava uma guerra civil. Os Estados Unidos amargavam a “Grande Depressão de

29″, que determinou mudanças na economia mundial, ao mesmo tempo em que

Hollywood começava a conquistar o ocidente. (Cenas do Mundo na década de 30 -

Especial Revolução de 30. In: Portal Último Segundo, 2010. Disponível em:

<http://especiais.ig.com.br/zoom/cenas-do-mundo-na-decada-de-30/>. Acesso em: 11

dez. 2011)

Page 41: Revista Brasileira: das ciências para as letras

32

Ilka lembra que a seção de "política estrangeira", por exemplo, vinha sempre

recheada de análises da situação européia do pós-guerra.

O Tratado de Versalhes e a Sociedade das Nações eram objeto permanente de exames cuidadosos. Em geral pessimistas, os artigos denunciavam o fracasso das negociações de Versalhes, cujas conseqüências se tornavam perceptíveis no clima de animosidade e no armamento alemão, (COHEN, 2006, p.6).

O trecho a seguir exemplifica esse pessimismo:

Nunca se falou tanto em paz, mas jamais a guerra pareceu tão iminente. A última não fora suficiente para destruir o germe latente do belicoso espírito humano. Apesar dos pactos e tratados oficiais e oficiosos, o vulcão fazia ouvir ao longe o prenúncio da erupção. Laços políticos frágeis, interesses imediatos, receios recíprocos não permitiram a franca declaração da guerra. Mas os tremores de terra continuam. Insignificâncias passageiras ou, quem sabe, incapacidade dos obserevatorios meteorológicos que não podem ou não possuem os meios de prever a extensão do desastre que se aproxima. (A marcha da guerra. Revista Brasileira nº. 4, p. 27. Apud, COHEN, 2006, p.6)

De acordo com Ilka, essa instabilidade política vivida nos anos 1930 estava

diretamente relacionada com e a insistência da Revista em debater modelos

estrangeiros, dos quais a Itália e a Alemanha eram exemplos constantes. Em entrevista

ao portal Último Segundo, o historiador Pedro Paulo Funari, professor do Instituto de

Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, explica que a década de 30 e as

mudanças ocorridas após a tomada de poder por Getúlio foram fundamentais para o

Brasil começar a ter um novo papel no cenário mundial.

A partir de 30, o Brasil passou a ter relações com o mundo externo que não tinha antes. Primeiro com outras democracias, já que a Constituição de 34, embora seja brasileira, refletia um movimento que estava ocorrendo na Espanha e na França no sentido de eleição popular, partidos políticos, voto feminino. Isso tudo era muito progressista na época. O Brasil, pela primeira vez, estava se integrando a um movimento internacional. (Brasil vive sonho de 1930 - Especial Revolução de 30. In: Portal Último Segundo, 2010. Disponível em : <http://ultimosegundo.ig.com.br/revolucao1930/brasil+vive+sonho+de+1930/n1237772790085.html>. Acesso em: 11 dez. 2011).

Page 42: Revista Brasileira: das ciências para as letras

33

Para o professor, esse foi o primeiro passo para o País conquistar a relevância

externa que possui atualmente.

Hoje o mundo está muito diferente e o Brasil também. A relação do Brasil com os países vizinhos é muito maior, nas questões comerciais, econômicas e culturais. O Brasil tem uma política internacional bem mais ampla e forte influência em nações como o Timor Leste e em países de língua portuguesa da África. Tem ainda relevância econômica, com investimentos na área do petróleo, mantém relações e alianças políticas que o fazem se projetar para o mundo, como no caso das relações com a África do Sul, a Rússia e o Irã. (Brasil vive sonho de 1930 - Especial Revolução de 30. In: Portal Último Segundo, 2010. Disponível em : <http://ultimosegundo.ig.com.br/revolucao1930/brasil+vive+sonho+de+1930/n1237772790085.html>. Acesso em: 11 dez. 2011)

Folha de rosto Revista Brasileira, nº 1, 1934. (Acervo Fundação Casa Rui Barbosa)

Page 43: Revista Brasileira: das ciências para as letras

34

3.3 – Colaboradores

Nas fases Midosi e Veríssimo, Moema classifica os autores dos artigos da

Revista Brasileira da seguinte forma:

a) vulgarizadores: homens de letras, muitas vezes sem formação superior, que

utilizam as páginas da Revista para vulgarizar um determinado conhecimento

produzido por outrem, a título de ilustrar o público;

b) Cientistas: vinculados às instituições científicas nacionais, aproveitam “as

colunas abertas na Revista” para vulgarizar suas pesquisas.

Quanto ao perfil dos cientistas que participaram da Revista, grosso modo podemos afirmar que todos estavam ligados a alguma instituição científica brasileira e possuíam vínculos com academias tanto nacionais, como o IHGB, como internacionais, fazendo com que esta comunidade científica estivesse bastante atualizada com os avanços de seu tempo. Também escreviam para diversos outros órgãos de imprensa, entre jornais e revistas especializadas. (VERGARA, 2003, p.103)

Como exemplo de cientista, podemos citar Orville Derby (1851-1915), natural

de Nova York, formado pela Universidade de Cornell. Foi integrante da Comissão

Geológica do Império (1875), diretor da seção geológica do Museu Nacional (1879) e

diretor da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo. Aliás, os relatórios desta

comissão eram constantemente noticiados na Revista Brasileira;

c) Críticos literários: vulgarizam o conhecimento científico – produzido nacional

ou internacionalmente – mas, de um modo geral, preocupados em articular o conteúdo

Page 44: Revista Brasileira: das ciências para as letras

35

deste conhecimento em um projeto mais abrangente: a de produção de condições que

favoreçam a formação e a consolidação de um pensamento nacional. Segundo a autora,

em um primeiro momento, funcionam como público, ou melhor, receptores do

conhecimento produzido pelos cientistas e que, depois, passam a difundir este saber

com o intuito de que este lhes dêem acesso à “verdadeira essência” nacional e os auxilie

na superação da herança romântica entre nós.

Ela ainda lembra de profissionais liberais como professores, médicos e

jornalistas, sem vínculos com a pesquisa científica e que complementam suas atividades

profissionais com a tarefa de vulgarização científica na imprensa para o público em

geral.

Um outro subconjunto seria formado pelos profissionais liberais, que mesmo distantes da pesquisa e da inovação científica, têm o domínio do conhecimento científico presente em sua prática, o que lhes confere autoridade e prestígio junto à sociedade. Estes profissionais liberais utilizam a vulgarização científica como um meio de defender o “monopólio” desta prática embasada pelos cânones científicos, que os diferenciam dos demais setores da sociedade. (Ibid., 2003, p 114)

Segundo Moema, a Revista não era só destinada à elite, como era feita também

por uma elite que desejava “oferecer uma amostra da competência dos brasileiros

distintos por suas grandes faculdades e luzes, alguns ainda pouco conhecidos neste

vasto império” (Editorial Revista Brasileira, 1879, p.6. Apud, VERGARA, 2004, p. 76).

Na fase Veríssimo, observamos que a figura do “literato-vulgarizador”

praticamente desaparece e notamos que os cientistas profissionais tomam mais para si a

tarefa de vulgarizar o conhecimento científico para o público leigo.

A coluna “Revista Científica”, de Luís Cruls, é bastante representativa deste esforço dos cientistas em popularizarem seu ofício junto ao público leitor da Revista Brasileira. Podemos interpretar tal procedimento como uma das conseqüências da maior profissionalização e institucionalização da comunidade científica do período. (VERGARA, 2003, p.209)

Page 45: Revista Brasileira: das ciências para as letras

36

Já na fase Baptista Pereira a figura do “literato-vulgarizador” não aparece mais.

A partir do número dois, a Revista passa a publicar nas primeiras folhas, os autores que

colaboraram na edição. Pela lista, vemos que os colaboradores se tratavam de

professores, ministros, jornalistas, advogados, políticos, sociólogos, economistas,

médicos, engenheiros, artistas, etc.

Alguns nomes frequentes eram Azevedo Amaral, sociólogo e jornalista; Bezerra

de Freitas, historiador e jornalista; Afrânio de Melo Franco, ex ministro das relações

internacionais; Adolpho Bergamini, deputado federal; Lindolpho Collor, Trystão de

Athayde, Eloi Pontes, entre outros. “Ressalte-se que as opiniões expressas pelos

colaboradores eram de sua exclusiva responsabilidade. Com isso a revista se isentava de

polêmicas, na medida em que se colocava apenas como "veículo" de idéias diversas”.

(COHEN, 2006, p.5)

Nota-se também a forte presença de matérias internacionais – compradas em

copyright. A partir número cinco, a Revista inicia essa colaboração internacional,

acompanhada da seguinte nota:

Já a brilhante plêiade de seus escritores brasileiros havia lhe assegurado um dos mais altos lugares na imprensa periódica do Brasil. Doravante, porém, passarão por suas seções os maiores estadistas, economistas e escritores do mundo, dilatando-se assim o seu caráter de grande magazine. O crescimento de mais um melhoramento em nossa Revista visa senão corresponder ao grande aceitamento que ela teve por parte do público brasileiro. (Revista Brasileira, nº. 5, 1934)

Nomes de ministros, cientistas, professores, escritores, entre outros, assinaram as

páginas estrangeiras. Alguns exemplos são o general Herman Göring, Claude Farrère

Page 46: Revista Brasileira: das ciências para as letras

37

(escritor), James Farrel (presidente da United Steel Corporation) e Guglielmo Marconi,

(inventor do telegrafo sem fio, que escreveu na seção de ciências o artigo “O novo rádio

cirúrgico sem laminas”.

3.4 – Seções

Pela análise das seções da fase Baptista Pereira vemos que a publicação era bem

equilibrada. Não seria correto dizer que ela priorizou um assunto mais que outros. Ao

longo das edições, vemos seções fixas como: Brasil, que trouxe artigos sobre eleições,

idade média dos brasileiros e urbanismo, por exemplo; Economia, com textos sobre a

unidade nacional e, principalmente, a situação econômica em outros países; Letras,

como resenhas, comentários, críticas, textos literários, notícias sobre o mundo das letras,

dicas de livros novos, etc.; Sociologia, que aparecia junto com a seção Letras;

Variedades, que trazia artigos mais curtos sobre temas como aviação, automobilismo, o

rei da Arábia, artigos sobre radiofusão e esporte; e a seção Política estrangeira, que

abriu todas as edições da Revista.

A seção Ciência apareceu a partir do número três. Inaugurou-a o professor

Alberto Betim Paes leme com o seu “processo de analise aspectral quantitativa”, estudo

que fora objeto de um dos cursos do Instituto Franco-Brasileiro de Alta Cultura em

Paris. Fizeram parte da seção artigos de temas variados, como o que falava sobre o

inconsciente e o sonho, a ação do freio dos veículos, miscigenação, o saber terapêutico

do café e velhice fecunda. Interessante lembrar que os textos científicos não eram tão

complicados como os da fase Candido Baptista. No entanto, também não eram tão

simples, exigindo ainda um leitor com um nível educacional mais elevado.

Page 47: Revista Brasileira: das ciências para as letras

38

As seções Arte, Cinema e Teatro, às vezes vinham juntos, às vezes vinham

separadas.

Outras seções tiveram vida curta como Esportes, presente nos dois primeiros

números (após isso, os textos sobre esportes podiam ser encontrados na seção

Variedades); Sociedade, presente só nas cinco primeiras edições; e História, que

apareceu apenas nos quatro primeiros números.

Montagem com títulos de seções da 4ª fase da Revista Brasileira. (Acervo Fundação Casa Rui Barbosa)

3.5 – Ilustração

A fotografia foi o único tipo de ilustração presente na quarta fase. Na fase

Candido Baptista, por exemplo, eram os desenhos feitos a mão que ilustravam as

páginas. Esses desenhos eram, muitas vezes, feitos pelo próprio autor do artigo que

procurava demonstrar uma espécie vegetal ou animal, algum esquema físico, ou

fenômeno astronômico, como o eclipse do sol.

Page 48: Revista Brasileira: das ciências para as letras

39

Embora fosse o único tipo de imagem presente na quarta fase, o recurso da

fotografia não foi tão explorado nas páginas da Revista. A publicação trazia apenas uma

única folha de ilustração por seção. E o padrão da ilustração era o mesmo: uma montava

naquela folha com as imagens em preto e branco que representassem cada texto da

seção. Essas imagens eram, predominantemente, fotos de pessoas. Mas poderiam ser

também lugares e cenas, por exemplo. A legenda servia para dizer os nomes das pessoas

ou do objeto que estivesse representado.

A apresentação gráfica da Revista é bastante simples, mantendo- se

praticamente inalterada em todas as suas fases. O formato de livro e os extensos artigos

apresentados em sequência são uma das características que se mantiveram nas quatro

primeiras fases. O tamanho dos artigos e a falta de preocupação de integrar imagens e

recursos gráficos aos textos são um aspecto negativo da Revista, pois poderia tornar sua

leitura cansativa.

Exemplo de ilustração na seção Política Estrangeira. Verifica-se que na mesma página são colocadas todas as imagens dos artigos da seção. (Acervo Fundação Casa Rui Barbosa)

Page 49: Revista Brasileira: das ciências para as letras

40

Na fase Midosi e Veríssimo, os anúncios e propagandas nas páginas finais de

cada volume, apresentados em papel colorido, são um ponto em comum. Segundo

Moema, nessas fases encontramos anúncios de laboratórios farmacêuticos e

homeopáticos; pílulas reguladoras autorizadas pela Junta Central de Higiene Pública,

companhias de seguros, espetáculos teatrais, lojas especializadas em luto e semiluto,

papelarias e fabricantes de instrumentos cirúrgicos, de dentistas e ortopédicos. “É

interessante notar que, embora os textos dos artigos não utilizassem o recurso à imagem,

estas se encontram nos reclames”. (VERGARA, 2004, p.77)

O estilo dos anúncios não difere significantemente entre essas fases e a fase

Baptista Pereira, onde apareciam também anúncios de novos aparatos tecnológicos,

roupas e locais de lazer como cassinos e o Pão de Açúcar. Muitos anúncios traziam,

além do endereço, telefone para contato. A análise dos anúncios também nos dá um

indício de quem seria o público potencial da Revista, pessoas com elevado poder

aquisitivo. Na fase Midosi e Veríssimo, Moema mostra:

Observamos anúncios de instrumentos e utensílios para a prática de profissões liberais como Medicina e Direito; não há propagandas específicas para o público feminino. Assim sendo, podemos imaginar que esta publicação se destinava aos homens, instruídos e de certo poder aquisitivo, longe do setor popular da sociedade. (Ibid., 2004, p.78)

Outro indício de que a Revista Brasileira não era propriamente uma publicação

“popular” era o preço da assinatura. Segundo Moema, durante a fase Midosi, a

assinatura custava, na Corte, 10$000 (dez mil réis), e nas províncias, 12$000. Ela

lembra que um ingresso de teatro, em 1874, variava de 2$000 a 3$000. Já na fase

Veríssimo, não há mais diferença entre a capital e o restante do país, “talvez um indício

da melhoria dos transportes, e a assinatura anual custava 24$000, 14$000, a semestral e

Page 50: Revista Brasileira: das ciências para as letras

41

2$000, o volume avulso, em 1895. No mesmo ano, os livros importados de 300 a 400

páginas poderiam ser comprados por 3$500 a 4$000, cada”. (Ibid., 2004, p.78)

Na fase Baptista Pereira, o número três inicia o serviço de assinaturas, trazendo

um modelo de contrato com a ressalva de que “como de habito a assinatura deveria ser

paga adiantadamente”. O preço anual da assinatura naquela época era de 55$000, e a

semestral, 28$000.

A partir do número quatro, a Revista passa a publicar o preço avulso: 5$000.

Uma nota explicava a medida: a revista tinha recebido grande número de telegramas

reclamando que, em função da grande procura, os distribuidores do interior estavam

aplicando um aumento de 30 a 50% no preço da venda.

No número dez, o último, verificasse uma mudança no preço. A assinatura anual

passa a ser 60$000 e a semestral 35%000. A edição avulsa permanece o mesmo valor.

Exemplos de anúncios da quarta fase da Revista Brasileira. (Acervo Fundação Casa Rui Barbosa)

Page 51: Revista Brasileira: das ciências para as letras

42

Em dezembro de 1935, sem anunciar seu fim, a Revista Brasileira sob a direção

de Antonio Baptista Pereira, simplesmente não aparece mais. A causa? Não se sabe. O

que podemos notar é que quando o número 10 saiu não continha nada que mostrasse a

intenção de seus dirigentes que aquele fosse o último número. Pelo contrário, a Revista,

que já havia contado com o serviço de distribuição da editora José Olympio e Silva

Pareto Ltda, trazia uma nota que dizia: “a partir do presente número, fará, por si mesma,

a sua distribuição”. Ou seja, apresentava a pretensão de ter um próximo número.

Em seu livro, História da imprensa no Brasil, Nelson Werneck Sodré nos dá

uma pista desse desaparecimento. Segundo o autor, com o pós-guerra de 1919 apareceu

uma série de revistas de vida efêmera no país, literárias ou humorísticas, além de jornais

de circunstâncias.

Na maioria dos casos, trata-se de empresas mal estruturadas, que se esgotam depressa, que consomem rapidamente o capital, mas sempre empresas e não empreendimentos individuais. (SODRÉ, 1998, p.355-356)

Embora o autor lembre que o terceiro decênio do século tenha sido de grande

desenvolvimento da imprensa, particularmente no sentido de consolidar a estrutura

empresarial, jornais e revistas de vida efêmera, embora em número bem menos

reduzido, continuaram existindo. (SODRÉ, 1998, p.371). A quarta fase da Revista

Brasileira pode ter sido um desses casos de empresas mal estruturadas. Essa é uma

hipótese que, ao lado de outras como problemas com a censura ou desentendimentos

entre seus componentes, merece ser melhor estudada.

Page 52: Revista Brasileira: das ciências para as letras

43

CONCLUSÃO

Este estudo documentou a trajetória da Revista Brasileira, fazendo uma análise

acerca das suas características e dos seus objetivos, procurando contextualizar cada fase

à sua época. Procurou mostrar em seu primeiro capítulo, o espaço que a divulgação

científica ocupava na segunda metade do século XIX (passagem da monarquia para a

república), momento que a publicação surge pela primeira vez, caracterizado por muitas

transformações sociais no Brasil e no mundo. Procurou mostrar de forma geral como era

a Revista em suas três primeiras fases para, por fim, analisar mais detalhadamente a

quarta fase, que vai de 1934 a 1935.

Na sua quarta fase, a publicação se dizia, conforme aparecia na folha de rosto de

cada edição, um “resumo claro, imparcial e detalhado dos principais acontecimentos da

vida contemporânea nacional e estrangeira”. Não foi demasiadamente cientifica, como a

fase de Candido Baptista, não foi demasiadamente literária, como as fases Midosi e

Veríssimo. Foi uma fase com um conteúdo diversificado, mais quente, ou seja, de temas

mais atuais.

Como suas antecessoras, foi muito bem aceita pelo público. Como suas

antecessoras, tinha um público elitizado, que compunha a opinião pública brasileira.

Como suas antecessoras, desapareceu. Desapareceu para seis anos depois, sob a tutela

da Academia Brasileira de Letras, reaparecer e, até hoje, se dedicar a mostrar aos

brasileiros o que a nossa literatura produz. Na fase atual, a Revista é dirigida pelo

acadêmico e jornalista João de Scantimburgo e continua sendo trimestral.

Como conclusão, podemos dizer que durante toda sua história, a Revista se

manteve ligada aos acontecimentos da sua época. Refletiu em suas páginas, por

exemplo, o período tumultuado da recém-proclamada República, os desdobramentos do

Page 53: Revista Brasileira: das ciências para as letras

44

pós guerra, o início da chamara “era Vargas”, nos anos 1930. Enfim, se tornou uma

vitrine das principais questões científicas, econômicas, políticas, sociais e culturais do

momento. No entanto, todos esses temas foram igualmente abordados somente na

quarta fase. Na sua primeira fase, a Revista estava muito mais preocupada com a

divulgação científica. Já nas segunda e terceira fases, a publicação se dedicou a ser uma

vitrine mais voltada para a literatura nacional.

O fato de a publicação modificar os seus objetivos de uma fase para outra, pode

fazer alguns a considerarem uma publicação nova em cada fase. Mas prefiro considerá-

la uma revista única. Uma revista brasileira, dedicada às causas do Brasil. Quando

priorizou as letras, ela estava preocupada em revelar o que de melhor nós tínhamos

nesse campo dentro do país. Quando priorizou as ciências, a Revista Brasileira

acreditava que só o conhecimento científico seria capaz de fazer o país se desenvolver.

Já na fase Baptista Pereira, ao pretender ser a “síntese do momento contemporâneo”, a

Revista queria ir além e mostrar aos brasileiros os assuntos mais importantes ao redor

do mundo para ajudá-los a formar aqui uma nação melhor.

A epígrafe dessa monografia fala de esperança. O estudo da trajetória da Revista

Brasileira mostra que a esperança foi o que guiou os homens que empreenderam cada

nova fase da publicação. Cada um, ao dar vida nova à Revista, acreditava que estava

contribuindo para a construção de um país melhor. Estava contribuindo para tornar o

país mais conhecido por seus habitantes. Estava contribuindo para a formação de uma

verdadeira identidade nacional.

O sucesso em cada fase mostrou que eles tiveram êxito e foram bem recebidos

tanto pelo público quanto pela crítica. Infelizmente, por causas desconhecidas, cada

empreitada dessas não deu certo, levando a Revista ser interrompida várias vezes. Se

Page 54: Revista Brasileira: das ciências para as letras

45

cada fase tivesse dado certo, a Revista Brasileira não teria essa história que tentei

contar aqui. Uma história que eu considero bonita. Uma história que eu acho

interessante. Um caso curioso da nossa imprensa do qual não temos muito

conhecimento.

Page 55: Revista Brasileira: das ciências para as letras

46

ANEXO 1 - LINHA DO TEMPO – REVISTA BRASILEIRA

1855 – Surgimento da Revista. Com o título de Revista Brasileira, Jornal de Literatura,

Teatros e Indústria. Foi fundada e dirigida pelo Dr. Francisco de Paula Meneses.

Anunciava-se como quinzenal, mas só apareceu o nº 1.

1857 – A publicação reaparece, com a denominação de Revista Brasileira, Jornal de

Ciências, Letras e Artes. Durou até 1861, publicando quatro volumes. A literatura

considera essa como sendo a primeira fase da Revista. Foi dirigida pelo engenheiro e

matemático, Cândido Batista de Oliveira.

1879 – Inicia-se a fase II da Revista Brasileira, a chamada “fase Midosi”, editada por

Nicolau Midosi. Publicou regular e mensalmente, de junho de 1879 a dezembro de

1881, trinta números, reunidos em dez volumes.

1895 – Início da fase III da Revista Brasileira, conhecida como “fase José Veríssimo”,

pois era editada por ele. Circulou de janeiro de 1895 a setembro de 1899. Foram

publicados 19 tomos, com 93 fascículos.

1934 – Fase IV da Revista Brasileira, dirigida por Batista Pereira. Durou apenas de

junho de 1934 a novembro de 1935. Na folha de rosto anunciava “Publica-se

mensalmente”, mas não foi regular, publicando durante 18 meses apenas 10 números.

1941 – Começa a fase V da Revista Brasileira, a partir da qual passou a ser publicada

pela Academia Brasileira de Letras. Nasceu de uma proposta de Levi Carneiro, então

presidente da Casa. Em 1948, sai o vigésimo número e sua publicação é interrompida.

Page 56: Revista Brasileira: das ciências para as letras

47

Em 1958, dez anos depois, volta a sair, ainda sob a direção de Levi Carneiro, e chegou

ao nº 29, publicado em novembro de 1966.

1975 – Começa a sexta fase, sob a direção de Josué Montello, compreendendo apenas

seis volumes, entre 1975 e 1980. Voltou a ser publicada no último trimestre de 1994,

sob a direção de João de Scantimburgo. Mantendo-se a trimestralidade.

A Fase VII atualmente conta com 67 números. Ainda é dirigida pelo acadêmico e

jornalista João de Scantimburgo e continua sendo trimestral. A Academia Brasileira de

Letras disponibiliza no seu site a versão digital on line da Revista Brasileira - versão

integral.

Fonte: Revista Brasileira. In: Academia Brasileira de Letras. Disponível em: < http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=31>. Acesso em: 29 nov.2011

Page 57: Revista Brasileira: das ciências para as letras

48

ANEXO 2 - PROSPECTO DA REVISTA BRASILEIRA, NÚMERO 1, 1857

A publicação literária que se dá hoje à luz, sob a denominação de Revista

Brasileira, nada mais é que a transformação de outro jornal do mesmo gênero, o

Guanabara, tomando maiores proporções, e passando a ser trimestral. Os acanhados

limites do jornal, cuja publicação cessara, não permitiam o preciso desenvolvimento de

muitos assuntos interessantes; nem o período mensal da sua aparição dava tempo

suficiente para se prepararem as matérias que faziam seu objeto. A redação da nova

Revista está confiada às mesmas pessoas que colaboraram na publicação do Guanabara;

com uma única diferença de ficar agora cometida designadamente a um só desses

colaboradores a direção dos trabalhos concernentes a publicação regular do novo jornal,

com a responsabilidade inerente à qualidade de editor.

A revista brasileira compreendera em matéria de ciências, letras e artes, tanto

os trabalhos de lavra própria, como a transcrição de artigos tirados das publicações

nacionais e estrangeiras da mesma índole, cuja leitura possa interessar ao público.

Além das ciências puramente especulativas, ou de produções literárias de mero

gosto, farão regularmente objeto da Revista quaisquer conhecimento de utilidade

prática: compreendendo-se especialmente nesta categoria o estudo comparativo de

importantes fatos históricos de qualquer ordem nacionais e estrangeiras; e das matérias

econômicas, industriais e financeiras, com particular aplicação ao Brasil.

A redação da Revista aceitara de bom grado, para serem nelas estampados, os

trabalhos literários que lhe forem transmitidos, uma vez que satisfaçam estes a condição

indispensável da utilidade , e se recomendem por outra parte pelo merecimento da

composição.

Page 58: Revista Brasileira: das ciências para as letras

49

A redação da Revista Brasileira empenhará finalmente os seus esforços para

preencher a horrorosa tarefa de que se encarregará, tanto pela importância do seu fim,

como sobretudo para corresponder dignamente aos desejos benévolos daquele, que no

fastígio do poder somente anhela a propriedade do Brasil, amparando com generosa

proteção e promovendo desveladamente a ilustração nacional, o mais seguro abono da

ordem e da liberdade regrada que faz hoje a nossa felicidade, e fará também no futuro a

do nossos filhos.

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50

ANEXO 3 - EDITORIAL DA REVISTA BRASILEIRA, NÚMERO 1, 1934

Nome que é um programa, a Revista Brasileira vem a lume reatando a tradição

de um grande esforço na publicidade nacional. Fundada em 1857 por Candido Baptista

de Oliveira e aparecendo trimestralmente, sua orientação era principalmente científica e

técnica. Contava entre os seus colaboradores os grandes nomes de Capanema, Freire

Allemão, Varnhagem, Soares Azevedo, F. Burlamarque, Porto Alegre, R. Gabagha, etc.

Em 1879 reaparece a Revista com outra orientação, tendo como fundadores

principais: Nicolau Midosi, Franklin Tavora, Balduino Coelho, Moreira Sampaio,

Borges Carneiro e Candido Rosa. Durou de 79 a 81. Nesse período prestou grandes

serviços as nossas letras. Braz Cubas, a obra prima de Machado de Assis foi ali

publicada em primeira mão. Nela colaboraram Sylvio Romero, Ramiz Galvão, Baptista

Caetano, Alfredo Taunay, Carlos de Laet, Araripe Junior, entre outros. É dessa fase o

volume especial em homenagem a Camões, hoje preciosidade bibliográfica.

Em 1895 aparece pela terceira vez a Revista Brasileira, ilustrando-a os nomes de

Sylvio Romero, Calógeras, Homem de Mello, Araripe Junior. Ai estréia Affonso

Arines. Teve vida efêmera.

Procurando um nome para um magazine destinado a reunir mensalmente num

volume portátil uma síntese da vida contemporânea, especialmente da do Brasil, os

fundadores desta publicação não acharam outro que quadrasse tão bem aos seus intuitos

como o da Revista Brasileira.

Nenhuma dá melhor ideia dos seus propósitos de brasilidade, mas de uma

brasilidade bem entendida, sem xenofobias esdrúxulas e atrasada, e sem o ridículo

nacionalismo que olha com arrogância e desprezo o estrangeiro, sem o qual não

seriamos o que hoje somos. Todavia, embora sem pagar o tributo obsoleto do

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jacobinismo, o objetivo desta Revista terá de ser principal e categoricamente o Brasil e

sempre o Brasil.

A Revista Brasileira não sente a ânsia insofrida da inovação e da excentricidade.

Pensa que a melhor divisa do progresso é: conservar melhorando. Dois admiráveis

modelos apontaram-lhe as linhas mestras do seu programa. A “Review of Review’s” de

Willian Stead e o recente magazine Frances “Le Mois”, as duas mais completas fontes

de informação que a publicidade moderna tem oferecido fora do quadro do quadro

rápido dos diários, a massa que dia a dia se avoluma das elites culturais. Resumir num

volume pequeno o que se passa no mundo seria impossível. Coordenar porém os

assuntos mais importantes, os acontecimentos mais memoráveis, os fatos mais

significativos da vida universal, compilando e transcrevendo num trabalho rigoroso de

crítica e seleção os melhores órgãos de publicidade é uma tarefa que demanda

imparcialidade e cultura. O público que a Revista se propõe a servir, dentro dessas

linhas e afastando-se rigorosamente das incandescências das lutas partidárias é que vai

julgar se os fundadores da Revista Brasileira estão ou não a altura dos seus propósitos.

Page 61: Revista Brasileira: das ciências para as letras

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BIBLIOGRAFIA

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Editorial. Revista Brasileira, nº. 2, 1934

Editorial. Revista Brasileira, nº. 3, 1934

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