revista guitarra clássica n2

Upload: revista-guitarra-classica

Post on 11-Feb-2018

230 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    1/48

    GuitarraClssica 1

    Nmero2Julho2010

    ZoranDukicPauloVazdeCarvalhoOrlandoTrindadeRicardoBarcel

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    2/48

    GuitarraClssica 2

    Editorial:Algunsnmeros:Emseismeses,asduasediesdaRevistaforamacedidasmaisde5000vezes,estenmeroultrapassalargamenteonmeroqueaeventualpublicaoemformatofsicopoderiaatingirnumafase inicialcomoesta.Nestesentido,consideramosatagoracomomuitopositivaarecepoquetemtidodurantea suacurtaexistncia.Desdej,osnossosagradecimentosaos leitoresportuguesesebrasileirosqueajudaramaalargarestenmeroequecontriburamparaadivulgaodesteprojecto.NosprximosnmerosserapresentadooprimeiroConcursoNacionaldeComposioparaGuitarraeficadesdej lanadoodesafioparaquecompositores(enos)seaventuremaparticiparcomobrasparaguitarrasolocomduraode5a7minutos.MaisdetalhesembrevenaRevista.O Vero aproximase e consequentemente o grande nmero defestivais emasterclasses, votos deexcelentesfriascommuitamsica.

    PedroRodrigues

    NestenovonmerotivemosaoportunidadedeconversarcomoguitarristamaispremiadodaHistria,ocroata

    Zoran

    Dukic.

    Professor

    no

    Conservatrio

    de

    Haia

    ena

    Escola

    Superior

    de

    Msica

    da

    Catalunha,

    Dukic opina sobre o novo sistema de Bolonha j incorporado na maior parte das universidadeseuropeias, abordando tambm a sua mais recente gravao, os 24 Caprichos de Goya de MarioCastelnuovoTedescoparaaeditoraNaxos.Contamos tambm comuma entrevistaaPauloVaz deCarvalho,naqual sedebrua sobreoactualpanoramamusical/guitarrsticoportugus; crticanovagravaodeZoranDukic;umapea inditaparaguitarrademaisumjovemcompositorportugus,RicardoAbreu;talcomodoisartigossobreduasgrandesfigurasdopanoramahistricodaguitarranareadaperformanceecomposio, IdaPrestieFernandoSor.Mais uma vez incentivamos aos leitores a escreverempara o espao do leitor emitindo as vossasopinies e crticas, para tal basta enviarem um email com o assunto Espao do Leitor [email protected].

    Osnossos

    agradecimentos

    especiais

    aRicardo

    Abreu

    eRicardo

    Barcel

    pela

    importante

    colaborao

    nestaedio.

    AtOutubro!JooHenriques

    ndice:EspaodoLeitor 3

    EntrevistaaZoranDukic 4

    Guitarrano

    Feminino

    11

    EntrevistaaPauloVazdeCarvalho 16

    Luthier.pt 24

    NovasGravaes 28

    OMthodepourlaguitaredeFernandoSor(Paris,1830) 29PginascomMsica 46

    Equipa: Ricardo Abreu, Ricardo Barcel, Gil Ferreira, FranciscoMoraisFranco,JooHenriques,TiagoCassolaMarques,FilipaPintoRibeiro,Pedro

    Rodrigues,Alba

    Lpez

    Snchez

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    3/48

    GuitarraClssica 3

    [email protected]

    TOWRITEHERE!

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    4/48

    GuitarraClssica 4

    EntrevistaaZoranDukicporJooPauloHenriqueseAlbaLpezSnchez

    Umanoite,depoisde teros seusfilhosadormir, tivemosaoportunidadedeconversarpelo

    telefone

    com

    o

    grande

    guitarrista

    croata

    Zoran

    Dukic,

    que

    estava

    em

    Barcelona,

    uma

    semana

    antesdeviajarparaofestivaldeMikulov (naRepublicaCheca). Foiuma longaeagradvel

    conversaqueagorapartilhamoscomosnossosleitores.

    Revista Guitarra Clssica: Em primeiro lugar gostaramos de lhe agradecer o facto de teraceitadoonossopedidodeentrevista.umgrandeprazer.

    Nas edies anteriores, tivemos entrevistas com CarloMarchione e RicardoGalln.Ambos

    tiverameducaesmusicaismuitodiferentesenquanto cresciamemdoispasesdiferentes.

    ContenoscomofoicrescernaCrociaenoseumeiomusical.

    ZoranDukic:Eucomeceiatocarguitarracomseisanosnaescolaprimriaeaminhaprimeiracompetionacionalfoiaosseteanos,noqualganheiumprmio;massendoumacriana,no

    trabalhava conscientemente, somente tocava guitarra na escola. Somente aos 13 anos

    comecei a estudar com conscincia, formando a minha prpria personalidade e esttica.

    Duranteessesanos,entreosseiseoscatorze,fuiumxitonascompetiesnacionaisoque

    melevouaestudar,masfoiaminhamequemdirigiaomeuestudo,fazendoacontagemdo

    nmerodevezesquerepetiatalcomotinhaespecificadoomeuprofessor.Quandocomeceio

    graumdio,ensinosecundrio,eujestudavaconscientementeeasrio.Eutiveasortede

    ter na Crocia sempre excelentes professores. Omeu professor da primria pagavame o

    estudo com chocolate emais tarde no nvelmdio, tive umprofessormuito bom emuito

    srio,quetocavatambmnumabandaderock,masmuitoatradopelamsicaclssica,que

    meinspiroumuito.MaistardeestudeinaAcademiadeMsicadeZagrebcomDarkoPetrinjak.

    R.G.C:Quemfoiamaiorinflunciamusicalduranteasuajuventude?Z.D:ApessoaquemarcouminhacarreirafoiDarkoPetrinjak.EleestudouemInglaterraetoca

    oalade,o contrabaixoea guitarra,e foielequem iniciouodepartamentode guitarrana

    Crocia e seus alunos antes demim,Goran Liste e Istvn Rmer, que agora compem o

    Zagreb Guitar Trio junto com o Darko, ganhando prmios a nvel internacional.

    ElefoiecontinuasendoumainspiraoparamimeparaaCrocia,easuainflunciamotivou

    grandesxitosnos crculos guitarrsticosdaCrocia, continuandoaindahoje, com todosos

    guitarristasquepassampelasmosdeDarko.Ele foiaminhamaior inspiraoequemme

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    5/48

    GuitarraClssica 5

    mostrouocaminho,comoeoqueestudar,comodesenvolveramsicaecomoenfrentlaa

    srio, a partir daminha vocao. Ainda hoje inspirador e um grande amigo com quem

    mantenhoocontacto,esvezestocamosjuntos.

    R.G.C:Actualmente

    voc

    oprofessor

    principal

    no

    Conservatrio

    de

    Haia.

    Como

    se

    sucedeu

    essaoportunidade?

    Z.D:PrimeirofizumcursodepsgraduaocomHubbertKappel,naAlemanha,edepoiscasei

    comLauraYoungeemconjuntodecidimosviveremAmesterdo.Mudamonospara lsem

    nada,conhecendosomenteo luthierholands,OttoVowinkel,eaospoucos fuiconhecendo

    pessoas,edepoisdedoisoutrsanos,em1997,apresenteimeaumconcursoparaprofessor

    eobtiveavaga.

    R.G. C: difcil conciliar o ensino em Barcelona e em Haia com os concertos e asmasterclasses?

    Z.D:Bem,realmentecomoumtrabalho.EmHaia,todososmeusalunossoestudantesde

    mestradoeosdeBarcelonasodeLicenciatura(emBarcelonaaindanohmestradodevido

    acomplicaescomoprocessodeBolonha),porquenomomentonohnenhumprograma

    demestrado.VouHolanda,duasvezesporms,etentoconectarasviagenscomosmeus

    concertos,permanecendo

    dois

    dias

    antes

    edois

    dias

    depois

    de

    otour

    na

    cidade.

    Amesterdo

    umacidadequeestbemmuitobemconectadacomorestodomundoe,agora,Amesterdo

    Barcelonasosomenteduashoras.

    R.G.C:QualasuaopinionoquedizrespeitosalteraesqueestoincludasnoprocessodeBolonhaparaoensinosuperiorartstico?

    Z.D:EunoestoudeacordocomBolonha.Apartirdaminhaexperincia,jqueeutrabalhei

    durante trsanosem trsescolasdeensino superior (Haia,AacheneBarcelona)enoano

    passadonaSucia,soudaopinioqueBolonhaumproblema,poistemalgunspontosque

    estoabertosainterpretao.Porexemplo,naHolanda,oprojectofinaltratadocommuito

    menos gravidade do que na ESMUC (Barcelona), onde a maioria dos alunos fazem um

    semestreextraparaasuaconcluso;foialgoquenoentendinoincio,eporissoquealguns

    pontospossamserinterpretadospordiferentesescolasdemaneiradiferente.

    Poroutrolado,qualaideiadeBolonha?Estaexisteparaigualartodooensinosuperior,algo

    comoumaglobalizaodauniversidade,eaglobalizaotemafinalidadedeunificartudoe,

    portanto,mataradiversidade,queoquemaisenriqueceestemundo.Aglobalizao,tanto

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    6/48

    GuitarraClssica 6

    poltica,econmicaousocial,eliminaadiversidade.Hojeemdia,numaviagemChina,Japo,

    CanadouBuenosAirestodososcentrosdascidadessoiguaiseissoalgoimpressionante,e

    muito triste.Outro exemplo aAcademia de Zagreb. Eu estudei num sistema do este da

    Europa,noqualsetrabalhamuitomaiscomateoriadamsica,desdeosseisanos,enoqual

    os alunos/crianas tiveram duas horas semanais de aula individual de guitarra. Devido ao

    planodeBolonha tiveramde reduzirashorasde instrumentoparaaumentaremoscrditos

    em outro lado e, agora, de repente, todos os estudantes em Zagreb tmmenos aula de

    guitarraporsemana,oqueridculo.Tudoestaserigualado,eemalgunscasosparamelhor,

    emoutrosparapior.

    Houtrosaspectosmenosbvios,mastambmnegativos.Porexemplo,anecessidadedeter

    ummestradoparaconseguirumempregocomoprofessorexigequealgunsdosmeuscolegas

    procurem um lugar para fazlo, acabando em alguns casos em centros ou pases onde se

    obtmestettulocommuitomenosesforodoquenoscentrosepasescomprogramasmuito

    mais exigentes; isto no deveria acontecer, porque os diplomas conforme Bolonha, tm a

    mesmavalidade,masnoforamobtidoscomomesmoesforo.

    R.G.C:Ns gostaramos de felicitlo pelo seu ltimo CDnoqual gravou 24 Caprichos deGoyadeMarioCastelnuovoTedesco lanadoemMarode2009.Comofoiaexperinciade

    gravarumprogramatolongo?Z.D:Foiumaexperinciamaravilhosa.Averdadequenofoiminhaideia.Encontreimecom

    Norbert Kraft, produtor artstico da guitarra da editora Naxos, numa competio na qual

    ramosjris, e ele props que eu gravasse os 24 Caprichos de Goya e eu acheimuito

    interessanteaproposta.Submergimenessemundo,muitomaisemTedescodoqueemGoya,

    muito trabalho, muita msica de grande dificuldade, tentando ser o mais fiel possvel

    partitura publicada.A gravao no Canad foi uma experinciamuito boa, sentimemuito

    confortvel.

    Dividimos

    o

    trabalho

    em

    duas

    sesses

    de

    dois

    dias

    com

    uma

    semana

    pelo

    meio.

    Foimaisdeumanodetrabalho, imersonacaricaturasocialdaobradeGoyaenacaricatura

    musicaldeTedesco,sendoqueestetentoucapturaremmsicaogrotescodaobradeGoya,

    masdevodizerque,emboraGoyatenhasidoumartista frentedoseutempo,Tedesco foi

    ummsicomuitomaistradicional,nodevanguarda.Destepontodevista,osdoisartistasno

    correspondem um ao outro, mas a partir da perspectiva de admirao de Tedesco pelo

    trabalhodeGoya,sim.Tedescoconsideraestetrabalhocomoasuaobraprima.Acaricatura

    que tentou capturar no est muito longe do seu estilo habitual que ainda muito

    reconhecvel.Estoumuitofelizcomoresultado,comaexperincia,comamsica.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    7/48

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    8/48

    GuitarraClssica 8

    continuam a crescer muitos novos talentos. Enquanto soujri de um concurso, tenho a

    oportunidade de ouvir novos talentos e ver como o nvel tcnico aumentou. O nvel de

    autocrticados intrpretestambmsubiueosobjectivossomuitomaisambiciosos,eneste

    aspecto temonosaproximadomuitopertodas restantesvertentes.Pensoqueaindahum

    campo aberto em nossa frente, onde podemos melhorar ainda mais e procurar novos

    caminhos.

    R.G.C: Voc ganhoumais primeiros prmios em concursos internacionais do que qualqueroutrapessoa.dasuaopinioqueosconcursosajudamosjovensmsicosqueosvencem?Z.D:Obviamente,ajudamdevriasmaneiras.Partindodeumpontonegativo,pensoqueos

    concursos perderam um pouco o seu valor devido ao facto de havermuitos; fazendo um

    clculona

    Europa

    existem

    agora

    entre

    70

    e100

    concursos

    por

    ano,

    isso

    leva

    acerca

    de

    100

    primeirosprmios,300primeirosprmiosemtrsanos!

    Desdeopontodevistadautilidade,os concursosajudama fazercarreira,masagorano

    suficienteganharsomenteumconcurso,necessrioganhar15ou20,simplesmenteporque

    elesperderamovalor.Paraumjovemguitarristamuitointeressanteeeducativoestarnuma

    situaodifciletocarsobpresso,assimcomotocarnovorepertrioque,emmuitoscasos,

    noomaisconfortvel,enecessriohabituarseafazercoisasquenosoideais;uma

    grandeformao,

    um

    passo

    muito

    importante

    para

    avida

    de

    um

    concertista.

    Dada

    aminha

    experinciaemcompetiesde627anos,omeuconselhoparaumcompetidorquevoc

    deve irpara competir com a ideia de que no h nada a perder, somente pode ganhar.A

    segundacoisaimportantequeosconcursosnotmvalorreal,seumapessoatocaumdia

    paraumjridecincopessoasedepoistocaexactamenteomesmoparaoutrascincopessoas,

    paraumjriganhariaoprimeiroprmioeparaoutronopermitiriaquepassesefinal.

    O resultado finalmudamuito,dependendodojri,masno tanto sobrea interpretaodo

    participante.Notemnenhumvalorreal,podeaproximarseumpouco,masnoarealidade.

    Esta situao ocorre demodo exactamente igual em qualquer outro concurso de arte, por

    exemplopintura,porqueaartealgoquenopodesermedido.Eomaiorperigoquandoos

    concorrentesnotmxitoeolevamamal,tornandosedeprimidos,paramdetocar...eisso

    acontececommuitosconcorrentes.precisoolharparaoconcursoapartirdeumpontode

    vistapositivo.Outro conselhoqueoparticipantedeve tocaro repertrio comqueele se

    sintaconfortvel, sempensaroquepodeagradarmaisaojri.ToqueioCaprichorabena

    maioriados

    concursos

    em

    que

    participei,

    porque

    era

    uma

    pea

    com

    aqual

    me

    senti

    muito

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    9/48

    GuitarraClssica 9

    seguroemqualquersituaodestress(luzes,problemasdeafinao,cordas...)esabiaqueem

    qualquer uma das situaesme poderia defender. Eu acreditava no que estava fazendo.

    Temosdeacreditarnaquiloquesefaz.

    R.G.C:Apresenanafaseeliminatrianosconcursoscomobrasobrigatrias,emmuitoscasos,levaaquemuitosguitarristastoquemomesmorepertrioedifcilassistiraumconcertode

    guitarra,semapresenadeumdoshits.Achaqueprejudicialparaorepertriodaguitarra,

    ou no afecta significativamente o curso da evoluo natural do nosso repertrio?

    Z.D: Eu no acho que tenha muita conexo com o problema que, obviamente, existe.Precisamosterumrepertriobsico,peloqualtmquepassartodososguitarristas,comoo

    caso com outros instrumentos, que, no caso da guitarra adicionado s vezes a certos

    trabalhosque so feitosde sucessoporum tempoe soouvidosde formacontnua,maso

    problemaa faltade repertrio.Hobras como InvocacinyDanza,grandescomposies,

    muitoteis,comasquais sepodeaprendermuitoduranteoprocessodeestudo,equeeu

    recomendoaosmeusalunose,soexecutadascomfrequnciaemconcursos.

    Em geral, amaioria dos intrpretesmovese dentro do repertrio central, embora alguns

    tentamiralmdainclusodenovorepertrio,ampliandoasmargenseabrindonovasportas.

    Nomeu caso, a obrigatoriedadede obras nos concursosproporcionoumemuitas coisas, e

    trabalheirepertrioqueoutraformaprovavelmentenoteriatrabalhado.

    R.G.C:FazpartedasuaagendaumfuturoconcertoemPortugal?Z.D:No,alias,eununcatoqueiemPortugal.Anosatrs,estiveemvriasocasiesnofestival

    de Santo Tirso com o Trio de Colnia, e uma vez comojri,mas nunca toquei sozinho.

    Gostariade referirqueemPortugalhum grande guitarristaque vemdaescoladeDarko

    Petrinjak,DejanIvanovic.

    R.G.C: Para terminar, voc tem algum conselho para estudantes de guitarra sobre comocomearaestudarobranova?

    Z.D:Devesesemprecolocaramsicaemprimeirolugar,tendoaideiamusicaleafrasecomo

    guias.Eunoestouadizerserqueprecisoserescravodamsica,maspelomenos,seguila

    comosbdito.

    R.G.C:Onossomuitoobrigadopelasuadisponibilidade.Votosdemuitosucesso!

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    10/48

    GuitarraClssica 10

    OguitarristaZoranDukic,nascido

    em Zagreb em 1969, tem uma

    agenda ocupada com ensino,

    performance, gravaes e

    publicaes. Actualmente

    professornaESMUCemBarcelona

    enoConservatriodeHaia,tendo

    estudado com Darko Petrinjak e

    HubertKppel.Entreosanos1990

    e 1997, Dukic ganhou um

    impressionante nmero de

    concursosonde

    se

    incluem

    os

    Andrs

    SegoviadeGranadaePalmadeMaiorca,e

    concursosdedicadosaFernandoSor,ManuelPonce,ManueldeFalla,FranciscoTrrega,entre

    outros. Alm disto, a sua expressividade e poesia nicas lanaram a sua carreira a nvel

    mundial,arrecadandoincomparveldistinoentreosguitarristascontemporneos.

    CDOpera3 CDNaxos

    CDPrintempsdelaGuitare

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    11/48

    GuitarraClssica 11

    GuitarranoFemininoIdaPresti(19241967)porFilipaPintoRibeiro

    Je veux faire de ma vie, une chose simple et droite,

    comme un roseau vide afri que Dieu lemplisse de

    Musique.

    IdaPresti

    Unanimemente reconhecida pelo seu extraordinrio

    talento, Ida Presti foi um dos maiores prodgios da

    guitarra do sculo XX. Infelizmente, foi ficando na

    penumbradoesquecimentoaolongodosltimosanos,sem

    odestaquequea suadedicaoguitarra lhe fazmerecer.Filhadeumprofessordepiano

    francs(ClaudeMontagnon)edeme italiana(GraziaLoPresti), Idanasceua31deMaiode

    1924, em Suresnes, nos subrbios de Paris, e foi baptizada de Yvette Montagnon. A sua

    relaocomaguitarracomeouquando,a7deAbrilde1924,oseupai,impressionadocom

    umrecital

    de

    guitarra

    de

    Segovia,

    anunciou

    sua

    mulher

    grvida

    de

    oito

    meses:O

    nosso

    filho

    vai ser guitarrista. E foi esta ambio de Claude Montagnon, que comeou entretanto a

    aprenderguitarracomoautodidactaparaensinarafilha,quenosdeuoprivilgiodeconhecer

    umdosmaioresgniosdaguitarra,ummilagredefacilidadeegraa,naspalavrasdeEmilio

    Pujol.

    Aosquatroanosde idade, IdaPresti iniciouoestudodesolfejoeharmoniacomopai,eaos

    seisanos,osdeguitarra.Asuarotinadiriaerabastantergida.Depoisdasaulasdoliceufazia

    umasesta

    elogo

    de

    seguida

    iniciava

    as

    suas

    aulas

    de

    guitarra

    esolfejo,

    criando

    desta

    forma

    uma disciplina que muito a ajudaria a desenvolver o seu talento. A sua musicalidade e

    facilidadeexcepcionais foramdesde logoevidentese aosoito anosde idade apresentouse

    pelaprimeiravezempblico.Oseuprimeirorecitalfoidoisanosdepois,a28deAbrilde1935,

    naSalaChopinPleyel,emParis.

    IdaPresti foi aprimeira guitarrista commenosdedoze anos a ser convidadadurantedois

    anosconsecutivosparatocarnosconcertosdaSocitdesConcertsduConservatoiredeParis.

    As suas primeiras gravaes datam de 1938 e revelam uma maturidade tcnica e musical

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    12/48

    GuitarraClssica 12

    surpreendentesparaumacrianadeapenas14anos,deixandoanteverumacarreirabrilhante.

    Aclamadapelopblicoepelacrtica,onmerodeadmiradoresdeIdaPrestiaumentavacom

    cada apresentao sua. Ida chegou inclusivamente a participar no filme La Petite Chose,

    baseadonum romancedeAlphonseDaudete foiescolhidapara tocarcomaguitarradeN.

    Paganini(edeH.Berlioz)nascomemoraesdocentenriodamortedocompositor.

    A crtica fezlhe rasgados elogios:

    aps o seu primeiro recital,

    Bernard Gavoty escreveu a seu

    respeito: Aos dez anos, ela tem

    umagrandeseguranatcnicao

    seusomcheioeasuavariedadede

    timbres so dos mais sedutores

    que j ouvi. (Le Figaro, 10 de

    Maiode1935). LaPresseescrevia

    :Ida Presti a guitarrista mais

    nova, mais surpreendente, mais

    prodigiosaevirtuosadaactualidade.O

    prprioSegovia

    confessou,

    quando

    Ida

    tinha

    13

    anos,

    que

    no

    tem

    nada

    para

    lhe

    ensinar

    e

    que ela no deveaceitar ensinamentos de nenhumoutro guitarrista. Em 1938, na revista

    Rythm,A.P.ShapeescreveumartigointituladoAWonderGirlGuitarist,ondeapresentadae

    discutidaapossibilidadedehaverummelhorguitarristaqueSegoviaeondeoautordoartigo

    escreve:Essemelhorguitarristaestaquieumacrianadeapenas14anosdeidade.

    Raras vezes na histria da guitarra uma criana de 13 anos tocou com tamanha qualidade

    sonora, interpretativaevirtuosstica,orepertrioque Idaapresentavacomessaidade.Entre

    1935e1938,

    constavam

    nos

    seus

    programas

    obras

    de

    Bach,

    Broqua,

    Malats,

    Sor,

    Fortea,

    MorenoTorroba,PaganinieAlbniz.

    Apesardosucesso,avidadeIdanofoifcilprecisamenteapartirdestaidade.Em1938,oseu

    paimorreucomumataquecardaco,oqueadeixounopapeldechefedefamlia,umavezque

    tinhauma irmdeapenastrsanoseameno trabalhava.Desta forma,anica fontede

    rendimentoda famliapassou a ser a guitarraeo talentode Ida.A guerra,que teve incio

    pouco depois, agravou a situao da famlia, pois enfrentou srias dificuldades. Ida no

    gostavaderecordaresteperodo.

    Ida Presti aos 10 anos de idade

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    13/48

    GuitarraClssica 13

    Com19anos,casasecomHenryRigaut,doqualtemumafilha,ElisabethPresti,nascidaem

    1944.Apesarda suanovavida,demulhercasadaeme, Idanuncadeixade tocarguitarra.

    Gostavade tocar atdemadrugada,demonstrandoo seu carcterbomio,e ficavamuitas

    vezesatocarats2h00ou3h00paraosseusamigos.Idatambmadoravacantare,segundo

    relatosdapoca,osseusdotesvocaiseramsemelhantesaosguitarrsticos.Poroutrolado,Ida

    era uma grande improvisadora, passando diversos seres em sesses de improvisao,

    especialmente com Alexandre Lagoya, que viria a ser seu marido anos mais tarde, aps o

    divrcio de Rigaut. Foi graas a Lagoya que passmos a conhecer uma outra faceta de Ida

    Presti:adecompositora.Idatinhaporhbitoescreverassuascomposiesemfolhassoltas,

    que deixava espalhadas pela casa e foi Lagoya quem fez a recolha das mesmas. Das suas

    composies, para solo e duo, destacamse La Hongroise, Danse DAvila, Espagne, Danse

    Rythmique,Six

    tudes

    etude

    du

    Matin.

    Contudo,

    Ida

    nunca

    se

    assumiu

    como

    compositora,

    massimcomoumaguitarristaqueescreveparaoseuinstrumento.

    AcarreiradeIdaprosseguiurepletadesucessose,compoucomaisdevinteanos,jsetinha

    apresentado em Itlia, Holanda, Marrocos, Inglaterra, Indonsia, para alm dos vrios

    concertosquedavaemFrana,noapenasnasgrandescidadescomonaspequenasvilase

    aldeiasdopas.

    Foi quando conheceu Alexandre

    Lagoya,numadasfrequentestertlias

    em casa de Andr Verdier (cuja casa

    eraopontodeencontrodosAmisde

    la Guitare) que a sua vida e,

    consequentemente,a suacarreira, se

    transformou. Estvamos no ano de

    1952 e, um ano depois, Presti e

    Lagoya casaramse. Depois do

    nascimentodoprimeirofilhodocasal,

    Sylvain, Ida decide formar um duo

    com Lagoya, duo este que viria a

    tornarsenumdosmaisimportantese

    marcantes duos da histria da

    guitarra. Este foi o primeiro duo

    profissional,no

    sentido

    em

    que

    ambos

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    14/48

    GuitarraClssica 14

    osmembros abdicaramda sua carreiraenquanto solistas,procurandoum resultado sonoro

    unificado,despidodequalquer individualidade,criandoassimumverdadeiroidealdemsica

    decmara.CitandoFbioZanon:tantoIdaPresticomoAlexandreLagoyajtinhamassuas

    carreirasencaminhadascomosolistas,masoseuencontroeassuastrspaixes pelamsica,

    pelaguitarraeumpelooutro foramumacombinaoexplosiva,capazdecriarreverberaes

    incalculveis.

    Aprimeiraapresentaododuofoiem1955eobteveumaestrondosarecepoporpartedo

    pblicoedacrticafrancesadapoca.Desdeessaaltura,eduranteosquinzeanosseguintes,o

    duo PrestiLagoya deu mais de 2000 recitais e gravou diversas obras para a EditoraPhilips

    RecordCompany,edeixaassim,umgrandiosolegadoeaoportunidadedasgeraesseguintes

    poderemapreciarafacilidadequetinhamemseunificarnabuscadoseuidealmusical.Foia

    partirde1956,que Idadecidiudedicarseexclusivamenteaoduo,aoabdicardacarreirade

    sucessoquetinhaconstrudocomosolista.

    Em pouco mais de dez anos, vrios

    compositores escreveram para o duo

    PrestiLagoya: Rodrigo (Tonadilla),

    CastelnuovoTedesco (24 Preldios e

    Fugas As Guitarras Bem

    Temperadas), Andr Jolivet, Pierre

    Petit, Daniel Lesur, MorenoTorroba,

    Tomasi, Duarte, Jouvin, entre outros.

    O duo PrestiLagoya conquistou um

    estatutoqueotornounumareferncia

    nestetipodeformao.

    Em

    conjunto

    com

    Alexandre

    Lagoya,

    Ida

    Presti criou uma prestigiada classe de guitarra

    na ScolaCantorum em Paris. Quando era mais nova, Ida Presti no demonstrou particular

    interessenoensino,contudo,acaboupor se revelarumaexcelenteprofessora,dandoaulas

    nosnaScolaCantorumcomonaAcademieInternationaldtdeNice.Asuapersonalidade

    ternaedesimpatianatural,tornavaabastanteprximadosalunos,queporelatinhamuma

    grandeadmiraoeafeio.SegundoAaronSkitri,omtododeensinodePrestinoconsistia

    no tradicional mtodo de mestrediscpulo, em que o ltimo segue escrupulosamente as

    indicaesdoprimeiro.Idapreferiaadoptarumaposturadeorientadora,dandoliberdadeaos

    Ida Presti e Alexandre Lagoya

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    15/48

    GuitarraClssica 15

    alunosdeexploraremasuacriatividadeedesenvolveremasuapersonalidademusical,atravs

    deorientaeseindicaesqueosajudassemnessepercurso.

    CursodeVerodaAcademiaInternacionaldeNice,comIdaPrestieAlexandreLagoyaaocentro.Peranteesteinvulgarcasodetalentoegenialidade,omundorendeuseguitarradeIdaPresti

    eaoduoPrestiLagoya.Contudo,numatournepelosEstadosUnidos,comapenas43anosde

    idade, IdaPresti levadadeurgnciaparaoHospitalGrandMemorialRochester,emNova

    Iorque,ondeacabouporfalecer,vtimadehemorragiainterna.Acausadahemorragianunca

    foitotalmenteclara.Falasedeumerromdicoduranteumabroncoscopia,mas,tambmde

    complicaesdevidoacancronopulmo.Oquecertoqueasuamorteprematura,noauge

    dasua

    carreira,

    foi

    um

    choque

    para

    todos

    os

    seus

    admiradores.

    Lagoya,

    de

    tal

    modo

    afectado

    por este sbito e inesperado acontecimento, ausentouse durante cinco anos dos palcos,

    numaprofundadepresso.

    Eisanossahomenagemeficaodesejoqueesteartigosusciteavontadede(re)descobriresta

    grandeguitarrista,aquemtantodevemos.

    Por um curtoperodo de tempo, estivemos napresena de um gnio, e muitopouco

    provvel

    que

    venhamos

    a

    conhecer

    outro

    durante

    a

    nossa

    vida

    (John

    Duarte,

    1967).

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    16/48

    GuitarraClssica 16

    EntrevistaaPauloVazdeCarvalhoporGilFerreira

    G.F.Comeoporagradecer,emnomedaRevistadaGuitarraClssica,por teracedidoao

    nosso

    convite.

    DequeformavaemergnciadeumarevistaespecializadanombitodaGuitarraClssicaem

    Portugal?

    P.V.C. Primeiro, vem muito a

    propsitoelavemnasequncia

    de uma classe emergente de

    guitarristas.

    A

    revista

    oportuna

    porque vem com aexistncia de

    matriaparaimpulsionareparaa

    preencher.

    Hojeemdia,temosjumpblico

    muito grande de guitarristas e

    interessados na guitarra que justifica

    perfeitamente

    a

    existncia

    de

    uma

    revista

    que

    seja

    uma

    plataforma

    de

    troca

    de

    ideias/conhecimentotilepor issosadoa ideiadoPedroRodriguesedosseusamigospor

    lanaremarevista.

    AlmdomaisaguitarraestasermuitoestudadaemPortugal,tantoaonvelprticocomoao

    nvel terico. Julgo que a emergncia de gente capaz de produzir texto acerca da cultura

    guitarrsticatambmumelementodeimpulsodarevista.

    G.F.

    Perante

    um

    percurso

    de

    vida

    que

    cruza

    diversas

    experincias,

    quais

    as

    referncias

    musicaisdePauloVazdeCarvalho?

    P.V.C. Imagina uma floresta onde existissem todas as rvores e te perguntassem a que

    rvoretecheirava.

    Eu nunca consigo escapar luz, de Bach, de Beethoven e de Stravinsky. So trs pontos

    cardeais,umtringuloquemecerca.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    17/48

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    18/48

    GuitarraClssica 18

    Jtoqueiobrasparatocarcomamigosejtoqueiobrasporseremdeamigos.Estouagoraa

    verumaobraquepediaumamigo,ouviumaobradeleparapiano,pediparaescreveruma

    obraparaeu tocareeleescreveu.Deixo issoaoacaso,aomelhorde todososacasos.Claro

    que umacaso informado, um acaso determinadopelo gosto determinado at por algum

    sentidodepocaeoportunidade,masprincipalmentepelogosto.

    G.F.Naalturaemquecomeoua leccionarnoCursodeLicenciaturaemEnsinodaMsica

    existiam apenas trs estabelecimentos de ensino superior de Msica em Portugal.

    ActualmenteexistemonzeestabelecimentoscomcursossuperioresdeMsicaeonmerode

    Festivais de Guitarra bem como de alunos tambm tem vindo a crescer. De que forma

    descreveaevoluodaGuitarraemPortugal.

    P.V.C.Emformadefesta.De

    facto era muito pouca gente,

    um universo muito pequeno

    (estouafalardeh20anos)de

    gente e da resultava que se

    respirasse uma atmosfera

    acanhada.

    Eram poucas as pessoas em

    lugaresdepoderdarumasada

    profissionalaosalunosrefirome

    aoensinoramosmuitopoucose,

    emborahouvessejensinodealtaqualidade,agorahmuitagenteeveiogenteboaaumentar

    aofertadeestilodeensinonasUniversidades/Politcnicoseissodevedarumasensaode

    arlivreaosalunosquemuitosaudvelequeumacondioessencialparaqueelespossam

    exerceratasuaescolhaestticaehumanadentrodaMsica.

    G.F.EnquantoProfessordeGuitarra,quaissoassuasmaiorespreocupaesnoprocessode

    orientaodosalunosquerecebenaUniversidadedeAveiro?

    P.V.C.Essaperguntafaoeuati,eaguardoresposta!

    G.F.Nofundoumaorientaonosentidodoalunoencontrarasua identidadeenquanto

    intrpreteda

    Guitarra,

    uma

    identidade

    que

    no

    est

    indissocivel

    do

    aconselhamento

    tcnico,

    Paulo Vaz de Carvalho com Oscar Flecha, David Russell,Manuel Barrueco e Eduardo Isaac (Santo Tirso 1997)

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    19/48

    GuitarraClssica 19

    estilsticoemusical.EstaparecemeamaiorpreocupaodoPauloVazdeCarvalho,quecada

    alunoencontreasuaidentidade.

    P.V.C.Eestsdeacordocomisso?Masentonoachasquedeviahaver,emAveironomeu

    postode

    trabalho,

    uma

    maneira

    standard

    de

    ver

    as

    coisas

    que

    levasse

    aque

    os

    pblicos

    dissessem:aquiestumalunodoSr.Carvalho!

    G.F.ClaroqueexisteumamarcadoProf.Carvalho,nomeparecequeosalunossejam

    formatadoscomosmesmosprocessoscomoqueprovenientesdeumacunhagememsrie.

    P.V.C. Essa uma preocupao

    que eu tenho desde sempre e ser

    bom

    que

    seja

    de

    todos

    os

    Professores de Msica, de Artes ou

    de todos os Professores. Muitas

    vezes somos tentados a pedir

    nossa pereira que d melhores

    masdoqueamacieiradovizinho,

    mas a nossa uma pereira, ela vai

    dar

    peras

    degeneradas

    por

    nossa

    causa.Agentetemqueaprendera

    tratar de pras. De facto acho uma

    terrvel violncia estar a fazer dos

    alunos telas do nosso projector,

    recipientesdanossasensibilidade.Umavezlivresdens,nuncanosvoperdoar.

    Um Professor tem que principalmente comunicar a sua experincia investigatria (e a dos

    outros!),despertar

    acuriosidade

    eorganizar

    acuriosidade

    do

    aluno.

    Se

    oaluno

    no

    for

    curioso

    econtinuaranosercurioso,entodevesaberaconselhloatempoamudardeProfessorou

    deactividadequevparaumaactividadeemqueasrespostasjestejamdadas. Istosem

    excluir que, pelo processo de formatao em srie no se consigam boas turmas. Podem

    conseguirseboasturmas,talveznoseconsigamHomenslivres.

    G.F.Humladoliterrionoseudiscurso?Falenosumpoucodassuasrefernciasliterriasedequeformaestassecruzamcomamsicaquefazeensina.

    Paulo Vaz de Carvalho com Davide Amaral

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    20/48

    GuitarraClssica 20

    P.V.C.Nohnenhum lado literrionomeudiscurso.Todasasmatriasdanaturezaedo

    espritotmdireitoaserexpressasempalavras.Oquehouverdeliterrionoqueeudigo,est

    na potncia da msica. O que eu digo no literrio musical. H uma continuidade

    expressivacomumacontinuidadedelinguagemtalvezentreoobjectosom,oobjectomsica,

    o objecto obra de arte e o esprito, essa cadeia inquebrvel. De facto, entrar no mundo

    artsticoumaviagemaoinfinitodasubjectividadeapedagogianopodeisolarsedisso.A

    ressonncialiterriaumharmnicodanotacerta.

    G.F. Paulo Vaz de Carvalho, Licenciado em Direito, Guitarrista, Docente Universitrio,tambmescreveSabemosquecompemsicaparacenaerecitaisdepoesia, falenosum

    poucodasuaactividadecomocompositor.

    P.V.C. No sei se vale a pena gastar entrevista

    comaminhaactividadeenquantocompositor....eu

    no sei se sou compositor ou decompositor. O

    compositorjuntapartespara compor,para aspr

    emconjuntoeproduzirobrasde sntese.De facto

    eu sou um decompositor, principalmente porque

    intervenho em pequenos momentos sem

    importnciamusical:

    peas

    de

    Teatro,

    recitais

    de

    Poesia at de exposies de Pintura. Quando

    disseste que sou compositor, senti um abano

    porqueaminhaactividadenoenvolveessasntese

    daconstruodaobraquesesustentaporsi.Souum

    fabricantedeelementossonorosparaumaboaexposiodePintura,paraumbomrecitalde

    PoesiaouumapeadeTeatro.

    Tenhoagradadobastanteaosactoreseaosencenadoresporque,principalmente, tenhoum

    gostomuitograndeementrarnostextoseimagensplsticas.Tenhoumgostoenorme,muito

    sinceroecrescentenamultiplicidadedelinguagensqueseencontramemcimadeumpalco

    refiromeprincipalmenteaorecitaldePoesiaepeadeTeatro.Falomuitocomoencenador

    eouoomuito.Ouoexaustivamenteosactores,vejocomoelesmexeme falamedepois,

    quando a Msica j est apontada, doulhes muito a ouvir a minha Msica. H uma

    combinao, uma conformao mtua muito sincera e muito calorosa entre as notas que

    escrevoeocaminho

    que

    os

    actores,

    encenador

    ecengrafo

    vo

    tomando.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    21/48

    GuitarraClssica 21

    Souumaespciede cengrafopor somouajudantededramaturgopelaescritamusical.A

    Msicatematmuitopoucaimportncia,aqualidadedotecidomusicalenquantoMsicatem

    muito pouca importncia, no cmputo dessa construo muito laboriosa mas muito

    gratificanteeapaixonadaque faodentrodaequipe toda.Participosemprenadiscussoda

    obra...oquequesignificamosactores,asfalasouosplanos.

    Sempre que fao msica, que no seja uma coisa pressa, fao esse trajecto e os

    encenadores/actorescomquemtenho tidoogostodetrabalhar fazemno tambm.Oque

    maiscuriosoque,humaliberdadeinfinitanacriaomusical,nestascircunstnciashuma

    expressoindividualinfinita,harmonizadacomumdesejocolectivodefazerumaobradearte.

    Umavezcomeceiporfazerumapartituramaisoumenoscomplicada,combastantespginas,

    vriaspartesetalcomemosporfazerotrabalhodeactorcomassistnciadoencenadore

    medidaqueotrabalhocomosactoresecomoencenadoravanava,amsicaiasetornando

    sucessivamentemaisdesnecessriaeacaboupornohavermsicafoiemGilVicente,como

    AugustoBarroseaEscoladaNoiteporqueosactoressemtocar,semcantar,sembaterem

    batuques, assimilaram nas suas vozes, nas entradas, nos gestos e naspausas, tudo quanto

    aquelaMsicapoderiatervindotrazereportantoaMsicaficouemparteincerta.

    G.F.

    Se

    tivesse

    de

    eleger

    um

    nome

    da

    Guitarra

    no

    sculo

    XX,

    qual

    seria?

    P.V.C.Semeperguntasqualfoiomaisnecessriodelestodos,digoquefoioSegvia.

    G.F. Como perspectiva aGuitarra parao sculo XXI,o que considera que falta fazer em

    Portugal?

    P.V.C.Faltaqueosguitarristascadavezmaisencontremespaoparaaplicaroseutrabalhoe

    asuainvestigao.

    O

    que

    vai

    ser

    feito

    so

    os

    guitarristas,

    cada

    um

    deles,

    que

    vo

    decidir.

    Mas

    pelo

    menos

    j

    pudemos verqueemPortugal,a classede guitarristas suficientemente grandepara criar

    camposdefantasiajmuitodiferenciados.Issojumarealidadeenosumapromessa.

    HojevsaGuitarra,apartirdaClssica,aplicadaamuitoscamposdeexpressomusicalevsa

    Guitarracommuitacompetnciaecommuitosaberdeofcio.VsgentequesaiudaGuitarra

    Clssica para o Jazz, para os instrumentos antigos, para o Alade, para a Viuhela, para a

    GuitarraBarroca.VsgenteafazerexperinciasnocampodaGuitarrade8e10cordas,gente

    quefazexperinciasnaGuitarraDigital.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    22/48

    GuitarraClssica 22

    OreportriodaGuitarraClssicaemPortugalcomeaaserpontuadoquerpelaMsicaAntiga

    querpelaMsicaModernaedevanguardaevsaGuitarraassociadasnovasproduesde

    muitoscompositorescontemporneosportugueses.

    Dizeroquevai seraGuitarranocabeaumguitarristaeeu souapenasumGuitarrista.

    Estas duas dcadas so para mim uma afirmao enorme do talento portugus posto na

    guitarraoensinoprofissionalfoifundamental.Amultiplicaodeescolaseescolhastambm

    deixam,felizmente, estaperguntaimpossvelderesponder.

    Acompanho os cursos

    internacionais h mais de duas

    dcadas e cada vez vejo mais os

    professores

    que

    vo

    passando

    a

    encontrar uma classe de

    guitarristas altura daquele

    paraso a que chamamos

    estrangeiro. Tenho visto grandes

    Professores a referenciarem com

    entusiasmoaclassedosaprendizes

    deguitarraemPortugale issosinal

    quehumaclassedecolegasmeusqueestatrabalhar.

    Estassoapenasasminhaspalavras. Importantesvoseraspalavrasdaquelesquehojeso

    alunosouvoseralunosdestes,tenhoumagrandeesperana.

    No estou a adiar por uma gerao as minhas responsabilidades mas tenho uma grande

    esperananessagentequetemagoraentre10e20anosquejvaifruirdaaprendizagemda

    guitarracomoummeiodelibertaoexactamentepelavariedadedeescolha,pelavariedade

    depropostasepelapossibilidadedealteraroseucaminhovoter tantapossibilidadede

    escolherumProfessorcomotudeescolherolivroquevaisleramanh;issoliberdade.

    G.F. Estimado Paulo Vaz de Carvalho, agradeo mais uma vez a sua disponibilidade para

    partilharumpoucode si com aRevistaGuitarraClssica.Desejolhe asmaiores felicidades

    profissionaisepessoais.

    P.V.C.Felicidadesrevista!

    Masterclass de Paulo Vaz de Carvalho

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    23/48

    GuitarraClssica 23

    Paulo Vaz de Carvalho iniciou o estudo de

    guitarracomoautodidactaemVilaReal.Apar

    do curso de Direito, que concluiu em 1981,

    frequentou cursos livres com os professores

    Ribeiro da Silva, Lencart, Linhares, Nagy e

    Ponce.FoialunodeGuitarradeLuizeWalkerna

    Academia Superior de Msica de Viena;

    finalizou os estudos superiores com a

    classificao de Primeiro Prmio por

    UnanimidadenoConservatriodeAulnaysoba

    orientao de Raymond Grratien e orientao

    particular de Robert Aussel. Frequentou cursos

    livrescomRussel,Diaz,Cotsiolis,Ragossnig,ZsapkaeBrouwer.

    Concluiu em 1993 Mestrado em Cincias Musicais. Sob orientao deJoo Pedro

    OliveiraeFranoisDry,concluiuDoutoramentosobreDidcticadeGuitarra.Tocouem

    programasmusicais de Rdio e Televiso e em temporadas da Fundao Calouste

    Gulbenkian,MinistriodaCultura,FundaodeSerralves,CasadaMsica,Expo98,

    CoimbraCapitaldaCultura2003,FestivaldeGuitarradeAveiro,SemanadeGuitarra

    deLisboa,Festival InternacionaldeSantoTirsoeBolvarGuitarFestival,emLondres.

    Temdivulgadoobrasdeautoresportugueses.Compemsicaparacenaerecitaisde

    poesia.

    LeccionounoCIFOPdeVilareal.OrganizouencontrosmusicaisemVilareal.Fundoua

    AcademiaeMsicadeVilaReal.

    ProfessorAuxiliardoCursodeMsicanaUniversidadedeAveiro.

    http://www.meloteca.com/cordaguitarristas.htm#carvalho

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    24/48

    GuitarraClssica 24

    Luthier.ptRetratodeOrlandoTrindade(n.1973)PorFranciscoMoraisFranco

    Natural de Caldas da

    Rainha, acabou por se

    tornar luthier de forma

    quase imprevisvel.

    Enquanto criana, a sua

    mais remota influncia

    vemdo seuavmaterno

    (marceneiro que

    trabalhavacomcuidadoe

    pormenor),doqualguarda

    ofascniodeovertrabalhara

    madeiraassimcomoocontactocomasferramentasdetrabalho(assuntopeloqualaindahoje

    seinteressaparticularmente).

    Apesardestarefernciadeinfncia,smaistarde,em2000,seestreianaconstruodoseu

    primeiroinstrumento,umaviolademorenascentista.Pelopercursocontactoucomdiversas

    reas (desde um curso de cermica a reparaes de instrumentos elctricos e antigos) das

    quaisfoiadquirindooseusaberpolivalenteeascoisasforamacontecendoquaseporsorte.

    Apesar de no ter tido um mestre isolado que o tenha ensinado de raiz a construir

    instrumentos,sendoemgrandeparteautodidacta,OrlandoTrindadereferea importnciade

    algumas pessoas no seu percurso. Entre elas, Carlos Tavares (construtor de guitarras

    elctricas)

    com

    o

    qual

    trabalhou

    entre

    1998

    e

    2003

    e

    se

    iniciou

    na

    reparao

    e

    construo

    de

    instrumentoselctricos.

    Em2000contactacomomusiclogoeintrpretedemsicaantigaPedroCaldeiraCabralassim

    como com Joaquim Antnio Silva (membros dos grupos de msica antiga La Batalla e

    ConcertoAtlntico).Destecontactoviriaasurgirumaimportanteparceriaaonveldatroca

    deconhecimentossobreinstrumentosdemsicaantigaassimcomoaconstruoereparao

    deinstrumentosparaestesagrupamentos.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    25/48

    GuitarraClssica 25

    Apartirde2003passaadedicarseessencialmenteconstruodeinstrumentosacsticose

    em 2004 frequenta com regularidade o atelier de Fernando Meireles (construtor de

    cordofones tradicionais em Coimbra) com o qual aperfeioou tcnicas de construo e de

    restauro. Neste contexto, colaborou na reparao de diversos instrumentos musicais

    pertencentesColecoLouzHenriquesqueseencontraexpostaemCoimbranummuseu

    comomesmonome.

    Em2005frequentouocursode

    "Manutenode Instrumentos

    HistricosdeCordaDedilhada"

    ministrado pela luthier Italiana

    AnnaRadice.Noseguimentoda

    participaoneste curso foilhe

    encomendada uma guitarra

    barroca que actualmente faz

    parte do acervo de

    instrumentos musicais do

    ConservatrioNacionaldeLisboa.

    Temparticipadoemvariaspalestraseexposiesde instrumentostradicionais,ejrecebeu

    vriasencomendasde instrumentosdemsicaantigadeclientesportugueseseestrangeiros

    (Brasil,BlgicaeEspanha).

    Sobreaconstruodeguitarrasclssicas,OrlandoTrindade refereque foidos instrumentos

    quemaistardecomeouaconstruir.Apesardeteriniciadooestudodoinstrumentoem1990

    comoprofessorVascoAgostinhoedeposteriormenteterfrequentadooOrfeodeLeiriaeo

    ConservatriodeCaldasdaRainhanaDisciplinadeguitarraclssicasem2007queiniciaa

    construo

    da

    sua

    primeira

    guitarra.

    Confessa

    ainda

    bem

    que

    assim

    foi

    pois

    toda

    a

    bagagem

    de conhecimentos que adquiriu permitiulhe formar bases para que as suas primeiras

    experinciasfossembemsucedidas.

    Filosofiadeconstruo

    Orlando Trindade afirma que no apologista da aprendizagem meramente baseada por

    tentativaeerro.

    Apesar

    de

    ter

    conscincia

    de

    que

    sempre

    que

    se

    constri

    um

    modelo

    novo

    e

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    26/48

    GuitarraClssica 26

    sem precedentes, que se pode aprender com os erros que este apresenta, prefere fazer

    tentativassegurasemqueconsigapreveniraomximopossveisdefeitos.Paratal,defende

    acimadetudo,umaboainvestigao,amaiscompletapossvel(quasedecarctercientfico),

    baseadaentreoutrosaspectos,na leituradefontestcnicasentreasquaisdestacaoestudo

    deconstruode JosRomanillos (famoso luthierMadrileno)eRobertBouchet (importante

    luthierFrancs).Forammuitoteisvistoquejnomeencontravanumafasedeiniciantena

    construodeinstrumentos.

    Osmodelosque realizou at agora surgiramno seguimentodepedidospersonalizados,em

    particular, ao nvel das dimenses. Vejase o exemplo de ter construdo uma guitarra com

    comprimento de corda de 64,5cm (por divergncia aos normais 65cm) e neste momento

    encontraseadesenvolverummodelocom66,8cm,devidosexignciasdosclientes.

    Apesar de se encontrar

    neste momento a

    desenvolver um modelo

    standard, considera que

    difcil estabelecer medidas

    que sejam universais e

    ideais, defendendo que

    paracadacomprimentode

    cordapossveladaptaro

    volume e forma da caixa

    de ressonncia. O

    conhecimento histrico e

    retrospectivo dos

    instrumentos antigos e da

    sua evoluo, revelase

    proveitoso na construo

    das guitarras clssicas ao

    nvel da aplicao de

    tcnicasdeconstruoede

    processosdeinvestigao.

    Asmadeirasutilizadasnaconstruodeguitarrasclssicassooabetonrdico (PiceaAbies)

    paraostampos,ocedrodasHonduras(CedrellaOdorata)parabraoecabea,banoafricano

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    27/48

    GuitarraClssica 27

    (DiospyrosCrassiflora)paraaescalaepausantodoBrasil (DalbergiaLatifolia)paraocorpo.

    Para os barramentos interiores, que normalmente so feitos com cedro, Orlando Trindade

    utiliza o mesmo PiceaAbies do tampo, procedimento que recorrente na construo de

    instrumentosantigosmasqueaquiusadoejustificadopelassuascaractersticasdesermais

    leve,maisresistenteemaisressonante.

    OrlandoTrindadenotemporhbitoconstruiremsrie.Pornorma,osinstrumentosquefaz

    sodesde inciodestinadosaumcliente.Otempodeesperadesdeaencomendaentrega

    rondaos12mesesenofazqualquerexignciadepagamentopartida.

    PerspectivaseopiniosobreaguitarraemPortugal

    Sobreofuturo,OrlandoTrindademostraseoptimistaerefereaexplosodealunos inscritos

    emguitarraclssicaportodoopas(noseguimentodasnovasreformasdoensinodaMsica).

    Defendeque actualmenteexistemmais facilidadesaoestudodeum instrumentomusicale

    que isso acabar por trazer

    consequncias positivas para

    os que esto envolvidos no

    meio. Apesar de no existir

    muita gente ligada

    construo vo sempre

    aparecendo pessoas com

    valor()eaqualidadevaise

    aperfeioando.

    Contactos:

    [email protected]

    CaldasdaRainha

    http://www.orlandotrindade.com/

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    28/48

    GuitarraClssica 28

    NovasGravaesporTiagoCassolaMarques

    No finaldo sc.XVIII,opintorespanhol FranciscoGoya

    (17461828),

    recm

    nomeado

    primeiro

    pintor

    da

    corte

    espanholaemMadrid,dinciocriaodeumadassuas

    obrasprimas: uma srie de 80 gravuras com profundas

    conotaes sociais, polticas e psicolgicas, a que deu o

    nome de Caprichos. O impacto do carcter grotesco,

    irnico, ou introspectivo deste conjunto no compositor

    italiano Mario CastelnuovoTedesco (18951968) fezse

    sentir na dcada de 50 do sc. XX, seleccionando 24

    Caprichos para formar o corpus de uma no menos

    monumentalsequnciadepeasparaguitarrasolo,semdvidaoinstrumentoidealizadopelo

    compositorpara

    atransmisso

    desses

    ambientes

    to

    simblicos

    ecaricaturais,

    quanto

    cnicos

    e intimistas. O repertrio de qualidade inequvoca, tecnicamente muito exigente e

    completssimo.Tratasedepequenaspeascaractersticasaoinconfundvelestilopiansticode

    Tedesco;comideiassubstancialmentesimples,desenvolvidascombomgosto,compequenas

    subtilezas de articulao, baseadas em danas europeias, e numa linguagem formal

    neoclssica tonal, apresentando pequenos quadros musicais de carcter muito diverso.

    Sobressaema ironia,a levezaeogiocoso,bemcomoo ladograve, impetuosoeausterodas

    suas composies.Kazuhito Yamashita, Lily Afshar e Frank Bungarten so alguns dosguitarristas que, antes de Dukic, se debruaram sobre a leitura deste colosso quase

    intransponvel.

    Mas

    a

    abordagem

    proposta

    pelo

    guitarrista

    croata

    soberba.

    Aliada

    sua

    tcnicaportentosa,musicalidadeeexpressividadeatestadaspelosseusinmerosprmiosnos

    mais importantesconcursosdeguitarraeuropeus,ZoranDukicapresentasenestediscocom

    um som belo e potente (resultante tambm da sua guitarra Daniel Friederich), uma

    compreenso extraordinria do texto, com todas as texturas harmnicas evidenciadas, as

    dinmicas, aggicas e articulaes bem sopesadas, a conduo das vozes muito clara, bem

    comoodiferentecarcterquecadaestampapossui,tornandoaaudiododisconumafruio

    permanente. Embora com opes discutveis num ou noutro Capricho (porque diversas de

    outrasinterpretaesqueseguemumaleituramaisprximadapartitura),norestamdvidas

    dequeDukicfazsobressairoseusentidodasproporeseasuaintuio,interpretandooraa

    levezaeafria,

    ora

    aironia

    eagravidade

    presentes

    na

    riqueza

    composicional

    de

    cada

    Capricho.Para quem um amante de CastelnuovoTedesco, este certamente uma

    monografiamuitobemconseguida,comrepertriosingulareraro,executadocomumnvel

    extraordinrio,numdiscoduploaumpreoconvidativo.Aenriquecerodisco,estopresentes

    no libreto interno a reproduo dos 24 pratos de Goya que inspiraram os Caprichos de

    CastelnuovoTedesco,comnotasdocrticoGrahamWadeafazeraponteentreagravuraea

    pearesultante.Seguramente,oprodutofinalaconcretizaodeumdosmelhoresdiscosda

    colecodaNAXOSGuitarCollection.

    MarioCASTELNUOVOTEDESCO,24CaprichosdeGoya,Op.195

    ZoranDukic,

    guitarra

    Ref:Naxos8.57225253

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    29/48

    GuitarraClssica 29

    OMTHODEPOURLAGUITAREDEFERNANDOSOR(PARIS,1830)por

    Ricardo

    Barcel

    1. Aspectos Biogrficos de Fernando Sor (17781839).

    FernandoSorMontadas,tambmconhecidopeloseunomecataloFerranSorpeloseunome

    debaptizadoJosephFernandoMacarioSor,nasceu,provavelmente,nodia13deFevereirode

    1778emBarcelona.Aprendeuatocaraguitarra1eoviolinodesdeasuainfncia,evidenciando

    grandes capacidades naturais para a msica. Pouco tempo depois de morrer o seu pai,

    ingressouno

    Mosteiro

    de

    Montserrat

    onde,

    durante

    cerca

    de

    seis

    anos,

    esteve

    integrado

    no

    coroenaorquestra,tendoaoportunidadedeentraremcontactocomintrpretesdediversos

    instrumentos.Em1795abandonouoMosteiroparaseguiracarreiramilitar,jquenoestava

    destinado,por influnciasfamiliares,aseguirumaprofissomusical.Noentanto,foiumdos

    maiorescompositoresdemsicaparaoinstrumentohojeconhecidocomoguitarraromntica

    ouclssicoromntica.

    Porvoltadoanode1810,depoisdasinvasesfrancesasaEspanhaeduranteoreinadodeJos

    Bonaparte irmo de Napoleo , Sor apoiou os ocupantes,jurou fidelidade ao regime e

    chegou,at,a seroficialdasmilcias francesasemEspanha.primeira vista,a suaatitude

    pode parecer pouco patritica, mas Sor, tal como Beethoven2, no tinha a perspectiva

    histricaque temosactualmenteeviaNapoleo, igualmentequeoutros ilustrados, comoo

    1Secalculamosotempo transcorridoentreaapariodasprimeirasguitarrasdeseisordensdasque

    temosnotcias porvoltade1760 easprimeirasexperinciasdeSorcomoinstrumento,oqueteria

    acontecidocercadoano1783,quandotinhaaproximadamentecincoanos,nosdumresultadode23

    anos.Portanto,seriamprovavelmenteasguitarrasdoseuprogenitorguitarristaamadorasprimeiras

    que a criana conhecera, talvez alguma guitarra tardobarroca, ou uma das relativamente recentes

    guitarrasdeseisordens.Sabemosqueavoltadoano1780sevendiamemCatalunhaobras,taiscomo

    asdeAntnioAbreuoportugus,paraguitarradecincoeseisordens,segundoas investigaesde

    JosepMariaMangado,publicadasno livroLaguitarraenCatalua17691939.Tecla.Londres,1998.

    AnexoN_1.

    2 Beethoven dedicou a Napoleo Bonaparte a sua Sinfonia n3 emmi bemolmaior, apelidada de

    Eroica, embora a dedicatria foi retirada posteriormente. A sua durao eramuitomaior do que

    qualquersinfoniaescritaataquelemomento.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    30/48

    GuitarraClssica 30

    salvador da Europa e no como a um dspota conquistador. Por outro lado, tal como foi

    referido no captulo anterior, Paris no era s a capital da Frana, como tambm o plo

    culturalmais importantedapocaealguns intelectuaiseuropeusvislumbraramnas invases

    napolenicasapossibilidadedoprogressoculturalesocialdepasescomoEspanha.

    Quando os franceses foram derrotados, as foras militares napolenicas retiraramse para

    FranaeSor, identificadocomoafrancesado,noteveescolhaeviuseobrigadoaretirarse

    comelas,juntocommuitosoutrosintelectuais,noano1813,paraevitarrepreslias.Instalou

    seemPariseposteriormenteemLondres,comeandoumavidaitineranteportodaaEuropae

    Rssia.Nodifcil imaginarqualfoiodestinodasobrasdeSoremEspanha.OexliodeSor

    trouxecomo

    consequncia

    que

    muitos

    guitarristas

    espanhis

    s

    soubessem

    da

    produo

    musicaletericadeSoratravsderefernciasindirectas.

    Noano1815teveumafilha

    chamada Carolina e sobre a sua

    esposa no temos dados. S

    podemos referir que Sor enviuvou

    poucotempo

    aps

    onascimento

    da

    filha.Nessemesmoanoestabelece

    se em Londres, onde ganhou boa

    reputao como compositor e

    guitarrista, sendo verdade que

    tambm chegou a ter fama como

    professordepianoecanto.NestacidadeconheceuoluthierJosephPanormoeadquiriuuma

    dassuasguitarras,construdasaoestiloespanhol.3

    No ano 1819 comea uma intensa relao profissional e sentimental com Felicit Hullin,

    bailarinadoTeatrodaOperadeParis;trsanosdepoisestreadonoTeatroRealdeLondreso

    seu ballet Cenerentola, inspirado num conto de Perrault4. Em 1823 a mesma obra

    3 Os instrumentos fabricados por Panormo e pelo construtor francs Lacte foram alguns dos

    predilectosdeSor.

    4EmfrancsCendrillon.ConhecidonospaseslusfonoscomoCinderellaouAGataBorralheira e

    noshispano

    falantes

    como

    Cenicienta.

    O

    conto

    de

    Perrault

    (1628

    1703)

    possui

    elementos

    que

    podem

    considerarse reaccionrios, j que, como o destacam alguns autores, exalta valores da sociedade

    Hotel Favart. Paris, 2007.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    31/48

    GuitarraClssica 31

    representadanaperadeParis,sendoomaiorsucessoteatraldeSor5.Nomesmoano,viaja

    para aRssia com a sua filhae com FelicitHullin contratada comoprimeirabailarinado

    Ballet de Moscovo , instalandose neste pas, onde rapidamente obtm fama e

    reconhecimento.DepoisdamortedoczarNicolauem1825edaimperatrizElisabeteem1826,

    Sor ficou sem o apoio da famlia imperial; acabou tambm ento a relao com Felicit e

    voltou a Paris, onde a sua merecida fama tinha sido consolidada merc da publicao de

    diversas obras suas pelo editor Meissonnier. Na capital francesa publica o seu famoso

    Mthode pour la guitare no ano 1830 e em 1835 escreve a sua autobiografia para

    LEncyclopediepittoresque de Ledhuy. Vive em Paris os ltimos anos da sua vida, muito

    prolficos no que refere sua produo musical, quase exclusivamente guitarrstica.

    Permaneceualgum temponoHotelFavart6at oano1832,juntoa sua filhaCarolina,que

    tinha

    desenvolvido

    uma

    carreira

    como

    harpista e pintora. Depois mudouse para

    um apartamento em March SaintHonor,

    tambmemParis,ondemorouatamorte

    deCarolina,noano1837.

    Dois anos mais tarde, falece Fernando Sor

    nodia10deJulhode1839.Foienterradono

    Cemitrio

    de

    Montmartre,

    onde

    actualmente se pode visitar o seu tmulo

    comodefuntoclebre.

    patriarcal,onde

    opapel

    da

    mulher

    de

    total

    submisso

    etm

    singular

    importncia

    as

    figuras

    da

    realeza.

    Aapologiadesseselementos aparentementeanacrnicadepoisdaRevoluoFrancesa fazsentido

    comoregressoaFranadadinastiaBourbon,representadapeloReiLusXVIII,nopoderentre1815e

    1824, imediatamente depois da queda do Imprio Napolenico, que ainda defendia as ideias

    monrquicastradicionais.

    5AobratevetalrepercussoquefoiCenerentolaaprimeiraobracnicaqueseinterpretounoTeatro

    BolshoideMoscovoem1825.

    6Estehotelaindaexiste.EstsituadonaruaMarivauxN5, apoucosmetrosdaOperaCmicadeParis,

    erelativamentepertodoTeatrodaOpera.Outrosclebreshspedesdomesmohotelforamopintor

    espanholFranciscoGoyaeoguitarristaDionisioAguado.

    Tmulo de Fernando Sor.

    Cemitrio de Montmartre.

    Paris, 2007

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    32/48

    GuitarraClssica 32

    2.OMTODOPARAGUITARRADEF.SORCerca do ano 1826, Sor comeou a escrever o seu prprio mtodo, que foi publicado

    originalmenteem

    lngua

    francesa

    em

    Paris,

    em

    1830.

    Posteriormente

    foi

    traduzido

    para

    alemo e para ingls.7 Jeffery afirma que apesar de existirem pelo menos seis verses

    diferentesdeste livro averso francesa foianicaautorizadapeloprprioSor,aqualno

    seria reimpressa at a nossa poca8. Depois de comparar a verso francesa com a inglesa

    podemos comprovar que esta ltima que a mais difundida em todo o mundo e, em

    especial, nos pases anglosaxnicos possui algumas pequenas diferenas em relao

    original, no s no texto, ilustraes e exemplos musicais, como na sua estrutura, com as

    imagensintercaladasnoslugarescorrespondentesenonofinaldolivro,comoaparecemna

    versooriginal.

    Uma verso modificada do Mtodo de Sor9

    foieditadapelo guitarrista francsNapoleon

    Coste (18051883),discpulodirectoe amigo

    deSor.Narealidade,estapublicaoeraum

    novomtodoqueincorporavaalgumasideias

    seleccionadas

    de

    Sor

    e

    no

    s

    uma

    edio

    apenasrevistaporCostedomtodooriginal.

    Dequalquermaneiraestelivrointeressante

    porque,na sua introduo,Costeno s faz

    7UmaversofrancoalemfoipublicadaporSimrockemBonnnoano1831eatraduoao inglsde

    Arnold Merrick foi publicada em Londres por R. Cocks & Co em 1832. No ano 2008, o autor deste

    trabalho,juntoaoguitarristaEduardoBaranzano,editaramemPortugal,comaeditoraLabirinto,a

    primeirapublicaodoMtododeSoremidiomacastelhano.Em2010,MatanyaOpheepublicouuma

    novaversoinglesadesteMtodo.

    8 Jeffery, Brian. Ferrans Sors. Compositor i Guitarrist. Curial, Edicions Catalanes. Publicacions de

    LAbadiadeMontserrat,1982.

    9Coste,Napoleon.MthodecompltepourGuitareparFerdinandSor.ditionsHenryLemoine.Paris,

    1880 (reimpressodoMthodedeGuitareparFerdinandSor.Schonenberger.Paris,1851).Os 26

    tudespourlaguitare/parFerdinandSor,revues,classes,etdoigtesdaprslestraditionsdelauteur

    parN.Coste,integradosnofinaldolivro,tmumparticularinteresseporque podemrevelarintenes

    maismadurasdeSor,adquiridasporCostemedianteocontactodirectocomoautor.

    Mthode de Sor (ed. Coste)

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    33/48

    GuitarraClssica 33

    uma crtica da atitude dos adversrios de Sor,mas tambm da reaco deste ltimo, que

    lamentavelmente se reflecte no seu mtodo atravs de alguns pargrafos que deixam

    transparecerumacargaemocionalnegativa,inadequadaaquemexerceolabordeeducador.

    Essefacto,comoodeclaranaIntroduo,levaoaactualizaroMtododeSor,quemaistarde

    foi traduzido para castelhano e conhecido popularmente como o Mtodo de Sor ou Sor

    Coste. Isto ajudou a difundir o nome do seu autor e parte do seu trabalho didctico e

    composicional,masocultoudurantevriosanosocontedooriginal, frutodeumparticular

    contextohistrico,quedeulugaracertasmanifestaesdeSorquedesagradavamaCoste:

    OsucessodestegrandeArtistano lhedeixouasalvodacrtica invejosa.Osproblemas

    provocadosporcolegas ignorantesquenoocompreendiam,amargaramlheoespritoefoi

    soba influnciadestasdesgostosas impressesqueescreveuotextodoseuMtodo,noqual

    pareciaestar

    mais

    preocupado

    em

    responder

    aos

    supostos

    ataques

    que

    creia

    sofrer,

    ede

    devolverguerraporguerra,queemdesenvolveros seuspreceitosedeplosaoalcancede

    todos.10

    Vamosagoraanalisarottulodaobra,quepodesertraduzidoparaportuguscomoMtodo

    paraGuitarra.Numfragmentodoreferidolivro,Sorconsideraqueosautoresnodeveriam

    entender como sinnimos os termos mtodo, exerccios, lies e estudos, e define

    Mtodo11daseguintemaneira:

    Mtodo:

    Tratado

    de

    princpios

    raciocinados

    nos

    quais

    se

    apoiam

    as

    normas

    que

    devem

    orientarasoperaes.12

    MatanyaOphee,peranteestefacto,realizaasseguintesobservaes:

    Comoum volumedediscussespedaggicas,o livropode vira iluminarnos sobrea

    filosofia do compositor/educador. Usado juntamente com a matria musical contida nos

    estudos,ofimpedaggicodecadaumadaspeassurgiria,supostamente,clarocomoagua.

    Oupelomenosdeveria serassim.Adificuldade radicanofactodeomtododeguitarrade

    FernandoSornoserummtododeguitarranosentidotradicionaldapalavra,apesardoseu

    ttulo.

    ,

    antes,

    um

    manifesto,

    uma

    tentativa

    de

    codificar

    a

    teoria

    pedaggica

    em

    relao

    10Ibidem.Pg.1.(Todasastraduessodanossaautoria).

    11AprimeiraaceponoDicionriodaLnguaPortuguesa(PortoEditora.Porto,2000)definemtodo

    comos.m.programaqueantecipadamenteregularumasequnciadeoperaesaexecutar,comvista

    aatingircertoresultado;processotcnicodeclculooudeexperimentao;maneiraordenadadefazer

    as coisas;modo de proceder; processo; feio, esforo para atingir um fim; sistema educativo ou

    conjuntodeprocessosdidcticos;obraquecontmosprincpioselementaresdeumacinciaouarte;

    ordem;prudncia;circunspeco(Dogr.mthodos,id,pelolat.methodu.id).

    12Sor,Fernando.Mthodepourlaguitare.Pg.82.Paris,1830.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    34/48

    GuitarraClssica 34

    tcnica aplicada, revelando ideias numa mistura de extravagantes exageros e bvias

    contradies.Muitasvezesdifcil,atravsdeste livro,perceberexactamentequaisas ideias

    de Sor relativas guitarra ea sua tcnica []o seumtodo no contm necessariamente

    instrues ou regraspara realizar operaesprticas. Na verdade, expressa osprincpios

    filosficosdoautor.13

    Porconseguinte,desdeestepontodevista,estaobradidcticanopoderiaserconsiderada

    um mtodo convencional, como outras obras intituladas da mesma maneira, por outros

    msicosda suapoca.Noentanto, Sorachava que amaiorpartedestes trabalhoseraum

    compndiodematerialquenoserainsuficienteparaaformaodeumintrprete,como,

    aindapior,ocultavaoobjectivofinaldotrabalhodomesmo,vindoaserumobstculoparaa

    compreenso global do binmio tcnica/msica por parte do estudante, tal como a sua

    independnciademestrescomumaformaomaisprofunda:

    Tenhovistoqueamaiorpartedosmtodoscomeamondeeuinicioaterceiraparte,sem

    aprofundarminimamenteosassuntosqueintegramasduasprimeiraspartesdomeu[][]

    achoqueumalunoficariamenosdesanimadolendooquedevefazer,guiandoseasiprprio

    na ausncia doprofessor [] Se um aluno chegasse emmenos tempo aoponto em que

    pudesseprescindirdassuaslies,oseuexemploanimariaosquehesitamcomearpelomedo

    de se aborrecerem durante muito tempo comprincpios ridos e exerccios dos que no

    percebem o verdadeiro objectivo. As normas transmitidas sem se apoiar na autoridade,

    explicandoasrazespelasquaistmsidoestabelecidas,seriammelhorassimiladassefossem

    recebidasatravsdapersuasoenosimplesmentememorizadas14

    2.1.BASESFILOSFICASNa realidade, nomtodo de Sor se reflecte a filosofia do seu autor, que para sermelhor

    compreendido deveria ser contemplado, segundo a nossa opinio, luz da domovimento

    culturaleintelectualdaIlustraoouLuzes.

    Segundooshistoriadores,aRevoluoFrancesade1789defineconvencionalmenteo fimda

    IdadeModerna,

    para

    estabelecer

    oincio

    da

    Idade

    Contempornea.

    Esta

    tambm

    foi

    apoca

    do florescimento de novos pensamentos filosficos e de grandesmudanas em todos os

    13 Ophee, Matanya. Fernando Sor. The Complete Studies for Guitar. pg. 5. Chanterelle Verlag,

    Heidelberg1997.

    14Sor,Fernando.Op.cit.Pgs.35e36.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    35/48

    GuitarraClssica 35

    campos,surgindoomovimentoconhecidocomoLuzesouIlustrao15,peloqueosculoXVIII

    foichamadooSculodasLuzes.

    FernandBraudelafirmaque:

    Opresentedacivilizaodehojeessaenormemassadetempo,cujoamanhecerseria

    assinaladopelo sculoXVIII e cuja noite no estaria aindaprxima. Por volta de 1750, o

    mundo,comassuascivilizaesmltiplas,converteusenoobjectodeumasriedeagitaese

    decatstrofesemcadeia (quenosoapangioexclusivodacivilizaoocidental).Nelanos

    encontramoshoje16 []Heinrich Freyer afirmavaque aracionalidadeeraotrend17do

    pensamentodooccidente.18

    Para Braudel, a poca das Luzes no s um perodo histrico bastante delimitado, que

    comummentedesignadodestamaneira,narealidadeumadastendnciasdefundo,talvez

    amais

    caracterstica

    da

    histria

    europeia.

    Paulatinamente,enodecursodeumsculo,vaisedesenvolvendoumanovaformade

    conceberomundoquemarcaasuapresenaem todososcamposdosaber,dando

    lugaraotpicopensamento racionalistada Ilustraoquesereflectenafilosofia,nas

    cincias, na economia, nas letras e nas artes em geral. Em relao linguagem,

    adoptaseumdiscursomaissbrioefuncional,ondeapalavradeixamenosmargem

    paraos

    equvocos.

    2.2.SOREAILUSTRAO

    Kant,noseuartigoRespostapergunta:queoIluminismo?19,escritoseisanosdepoisdo

    nascimentodeSor,definiaaIlustraodaseguintemaneira:

    O Iluminismoa sadadohomemda suamenoridadedequeeleprprioculpado.A

    menoridadea incapacidadedeseservirdoentendimentosemaorientaodeoutrem.Tal

    15Porvezes,omovimentodasLuzes temsidomalchamado Iluminismo,especialmenteemtradues

    realizadas para portugus, e tambm para castelhano, de ingls ou de alemo: Enlightenment,

    Aufklrung,oquepodechegaraconfundirasLuzescomomovimentodos Iluminados(Perfekbilisten)

    doltimoquarteldosculoXVIII,comideaistotalmentediferentesdosIlustrados.

    16Braudel,Fernand.HistriaeCinciasSociais.Pg.129.Ed.Presena.Lisboa,1990.

    17Trend,umtermoinglsquesignificatendncia,inclinaooudireco.

    18Ibidem.Pg.113.

    19

    Kant,Emanuel.

    Beantwortung

    der

    Frage:

    Was

    ist

    Aufklrung?

    Prssia,

    1784.

    Verso

    portuguesa

    extradadolivro Apazperptuaeoutrosopsculos.Edies70.Lisboa,1989.Pg.11.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    36/48

    GuitarraClssica 36

    menoridadeporculpaprpriaseasuacausanoresidenafaltadeentendimento,masna

    faltadedecisoedecoragememseservirdesimesmosemaorientaodeoutrem.Sapere

    aude!Temacoragemdeteserviresdoteuprprioentendimento!Eisapalavradeordemdo

    Iluminismo20.

    Dasdeclaraes

    de

    Sor,

    no

    incio

    do

    seu

    Mtodo,

    pode

    inferir

    se

    que

    Sor

    pensa

    que

    amaior

    partedosguitarristasseencontramnumestadoquepoderiaserconsideradodemenoridade,

    ondepodemosverreflectidasalgumasdasideiasqueKantsustenta:

    Aoescreverummtodo,spretendofalardosistemaqueusoparatocar,oqualtenho

    estabelecido baseandome nas minhas reflexes e experincia. Aqueles que considerarem

    algunsdosmeuspreceitos contraditriossprticasadoptadasatagoraporguitarristas

    que,porcausadeumasubmissocegaeumrespeitoreligiosopelosseusmestres,tmseguido

    as suas mximas sem examinar ofundo equivocarseiam vendo neles uma atitude de

    oposio.21

    AsduraspalavrasdeSordirigidasaosguitarristasdasuapoca:submissocegaerespeito

    religioso,coincidemperfeitamentecomasreflexesdeKant22:

    Apreguiaeacobardiasoascausasporqueoshomensemtograndeparte,apsa

    naturezaosterhmuitolibertadodocontroloalheio(naturalitermaiorennes),continuem,no

    entanto,deboavontademenoresdurantetodaavida;etambmporqueaoutrossetornato

    fcil assumiremse como seus tutores. to cmodo sermenor. [] ,pois, difcil a cada

    homem desprendersedamenoridadequepara ele se tornou quaseumanatureza.At lhe

    ganhou

    amor

    e

    por

    agora

    realmente

    incapaz

    de

    se

    servir

    do

    seu

    prprio

    entendimento,

    porque nunca se lhepermitiufazer uma tal tentativa. Preceitos efrmulas, instrumentos

    mecnicosdousoracionalou,antes,domauusodosseusdonsnaturaissoosgrilhesdeuma

    menoridadeperptua.23

    Sor,naConcluso,insistesobreomesmotema:

    [] a submisso cega da razo degrada o esprito humano, e ainda muito mais

    quandoestatemlugaraexpensasdosdogmasreligiosos.24

    20Ibidem.Pg.13.

    21Sor,Fernando.Op.cit.Pg.1.

    22ConsiderandoqueomencionadoopsculodeKantsobreaIlustrao,doano1784,fuetraduzidodo

    alemopara inglsem1798,pelotradutoringlsJohnRichardson,equeSorviveuemLondresapartir

    doano1816,existeapossibilidadedequeoguitarristao tenha lidodurantea suapermannciaem

    Inglaterraequeasideiastransmitidaspeloprestigiadofilsofo tenhaminfluenciadoassuasopinies.

    23Kant,Emanuel.Op.cit.Pg11e12.

    24Sor,Fernando.Op.cit.Pg.82(Conclusion).

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    37/48

    GuitarraClssica 37

    Oestudiosodascinciasoudasletras aquemKantchamaerudito teriaporvocaoepor

    misso partilhar com os seus leitores, ouvintes ou estudantes, as suas indagaes e

    questionamentos,assuashipteseseteses(sempreprovisriasepassveisdesubmeterse

    crtica),assuasdvidaseincertezasperanteoterritriodosaberqueeleprprioinvestiga:

    []comoerudito,templenaliberdadeeatamissodeparticiparaopblicotodos

    os seus pensamentos cuidadosamente examinados e bemintencionados sobre o que de

    errneohnaquelesmbolo,easpropostasparaumamelhorregulamentaodasmatrias.25

    PodemosencontrarclaramenteestaatitudeemSor:

    Tenhosempreditoaosmeusalunosdecantoedeguitarra:Quandoeu lhesdisser

    para seguir algum preceito, nunca acreditem, simplesmente, pela minha autoridade.

    Perguntemme omotivo. Se eu no tiver capacidade suficientepara satisfazlos devero

    diminuirmuito

    aconfiana

    com

    que

    me

    honram,

    em

    benefcio

    da

    cincia26

    []

    Peoao leitorqueexaminebemasminhas ideiasequenoascondene sem tlas

    julgado.Possoenganarmeeerrarcomoqualquerpessoa,massigocomboafe,comotentei

    demonstraro exposto, nopoderiaadmitirumaopinio contrria quenofossedefendida

    atravsdeumademonstraoracional.27[]

    Respeite opblico e no lhe entregue o brinquedo da sua ignorncia. Se tem a

    obrigao de ensinar, siga um dos mtodos que provem que o autor tem raciocinado

    correctamente28

    Dopontodevistakantiano,eruditooindivduoquecolocaarealidade,metodologicamente,

    soboolharcrticodadvida,sujeitandosesempreanovasindagaessobreosseusescritos,

    sobreoscritriosquepautaramasua investigao,sobreas fonteseos recursosdequese

    valeuparasustentarpublicamenteasuacredibilidade.

    Sorapreciaaerudio,eeleprpriodeseja serumeruditono sentidoque falaKant,como

    podemos apreciar atravs da leitura do seuMtodo, imbudo do esprito da Ilustrao. O

    mestre

    consegue

    o

    merc

    das

    explicaes

    e

    demonstraes,

    embora

    a

    falta

    de

    clareza,

    alguns

    erroseamisturacomtemasheterogneos,alheiosaodomniotcnicoinstrumental,possam

    criar,porvezes,umacertaconfusonoleitor.

    25Kant,Emanuel.Op.cit.Pg.14

    26Sor,Fernando.Op.cit.Pg.36.

    27Ibidem.Op.cit.Pg.86.

    28Ibidem.Op.cit.Pg.78(notaderodap).

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    38/48

    GuitarraClssica 38

    Voltando ao ttulo do livro de Sor, DellAra29 afirma que, de facto, como foi exposto

    anteriormente,omsicocatalonoescreveuumMtodonosentidoestritodapalavra.No

    seria uma compilao de materiais tcnicomusicais ordenados de maneira que possam

    orientar o estudante para resolver gradualmente as dificuldades, tal como j tinham

    apresentado outros guitarristas,mas sim um autntico Tratado, o primeiro da histria da

    guitarra.30

    Ophee,numartigo,teceoseguintecomentrio:

    AverdadeiranaturezadomtododeSornofoicompreendidapormuitosestudiosos.

    A razoestnofactoque simplesmentenoummtodocomoqual sepossaaprendera

    tocaraguitarra.31

    Perguntamonos:

    qual

    omtodo

    com

    que

    se

    pode

    aprender

    atocar

    um

    instrumento

    musical

    semumaatitudeparticipativa?

    Oartigocontinuarealizandoumasriedeobservaessobreapsicologiadoautor,eatsobre

    uma suposta parania que o leva a confrontarse com outros guitarristas da sua poca,

    tornando complexa a leitura para o estudante que procura resultados imediatos. Riboni32

    defendeaposiodeOphee,acrescentandoqueasargumentaesdeSorestoimpregnadas

    deumaanimosidadeprpriadoespritderationalitdeumatpicaquerelleparisiense.Do

    nossopontodevista,estasobservaespoderiamsercorrectas,masnodevemossubestimar

    oescritornemesquecerque comoexpressoemvriaspartesdomtodo nodeixouestas

    impressesdemaneira involuntriaou sem repararnaspossveisconsequncias,antespelo

    contrrio.

    Para a burguesia francesa, a guitarra era o instrumento namoda e tudo o que estivesse

    relacionadocomelaeradeinteresse.Sorseguramenteimaginavaqueospotenciaisleitoresdo

    seumtodoconheciampreviamenteoutraspublicaesdogneroquecontinhamtudooque

    pudesse faltarnele,equemuitasdestasestavamdisponveis.Alis,nosltimosanosdasua

    29DellAra,Mario.Metodi e tratatti. La chitarra.A curadeRuggeroChiesa.Pg.253.EDT. Torino,

    1990.Pg.253.

    30AprimeiraaceponoDicionriodaLnguaPortuguesa(PortoEditora.Porto,2000)definetratado

    como:Estudoouobraescritasobretemacientfico,artstico,etc.

    31Ophee,Matanya.Iltocoappoggiato.Precisazioneeargomentistorici.IlFronimo.SuviniZerboni.

    Milo,1983.

    32Riboni,Marco.FernandoSoreilMthodepourlaGuitare.Pg.389,emGsser,Lus.Estudiossobre

    FernandoSor.EdicionesdelICCMU.Madrid,2003.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    39/48

    GuitarraClssica 39

    vida,compsosestudosintrodutriosaoestudodaguitarraOp.60,conscientedanecessidade

    deproveraosnovosestudantesdematerialadequado,aindadeixandoclaro naintroduoa

    estesestudosqueportrsdessapublicaonohaviaumamotivaocomercial.

    Sor,atravs

    do

    seu

    livro,

    quer

    defender

    os

    ideais

    dos

    quais

    est

    plenamente

    convicto,

    que

    pode apoiar com as suas virtudes composicionais e interpretativas e, ao mesmo tempo,

    preencher um espao sobre o qual os guitarristas ainda no se tinham debruado. Nesse

    sentido,cincoanosantesdapublicaodomtododeSor,elogiandoa suamsica,Aguado

    tinhadito:

    Mas,pela razodequeestamsica toboae tonovoomodode toclacomo

    corresponde,serianecessrioummtodoqueaexplicasse.NoseiseSoroterescrito(pelo

    menos no tenho notcias da sua publicao). Se isto se efectuasse, de mais nada

    necessitariamosamadores.33

    Existemartigos comoosquevimosanteriormente,deCoste,OpheeeRiboni nosquais

    destacadoofortedesprezoquedemonstraSor,noseuMtodo,pelamaneiradeprocederde

    alguns guitarristas profissionais, acusando acidamente alguns de ignorantes e outros de

    comerciantes.Contudo,consideramosnecessrioequilibrarestasobservaes,jquetambm

    nomesmolivro,SorfazumjulgamentopositivodaobradeguitarristascomoMoretti,Carulli,

    Carcassie,especialmente,deAguado,cujosmtodoseestudostambmestavamvendaem

    Parisnaqueles

    anos,

    eno

    deixavam

    de

    ser

    concorrncia

    verdade que, impulsionado por um sentimento que no romantismo ser generalizado e

    exacerbado, Sor ataca os guitarristas que no entregavam o melhor da sua capacidade,

    compondo ou arranjando materiais para as massas vidas de comprar msica fcil,

    considerandoosmercantilistas,talcomopodeversenaseguintecitao.

    Em vez de estudar oMtodo do Sr. Carulli, desfigurar o seu textofazendo um

    resumo,paraqueasuaobra,menosvolumosa,sejareputadacomomaissimples.Assimum

    editortermenosdificuldadesparaacomprar34

    Mas, em relao ao material didctico complementar do qual antes falamos, tambm

    poderamos interpretar estas palavrasde Sor comoumamensagem indirecta que avaliza a

    33Aguado,Dionisio.EscueladeGuitarra.Madrid,1825.Pg.1.

    34Ibidem.

    Pg.

    77.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    40/48

    GuitarraClssica 40

    utilizaodoMtododeCarulli,35especialmente tendoem contaque,no seuMtodo, Sor

    assinaladirectamenteosduetosdeesteautorcomoobrasdeboaqualidade36.

    2.3.PRECEITOSETEMASPRINCIPAIS.

    Comopassar

    do

    tempo,

    alguns

    dos

    preceitos

    de

    Sor

    chegaram

    aser

    de

    domnio

    popular,

    para

    algunsdeorigemannima,eassumidosporumainfinidadedeprofessoresquelhesucederam.

    Mas, em parte graas aos seus esforos, o estudo da guitarra actual abrange uma grande

    bagagem de conhecimentos tericoprticos, pelo que merece o mais alto respeito e

    reconhecimento.

    EntreoamplolequedetemastocadosporSornoseuMtodoencontramse:

    2.3.1.Construodeguitarras.Oferece

    solues

    alternativas

    enomeia

    alguns

    luthiers

    destacados

    da

    poca,

    dando

    informaodegrandeinteresseprticonasuapocaehistricohojeemdia.

    2.3.2.Colocaodoinstrumento.Realiza uma propostade comodeveria situarse a guitarra em relao ao executante para

    optimizar osmecanismos, criando uma comparao artificiosa com a postura habitual dos

    teclistas:umpianistasentasefrenteaodcentraldopianoparadarasmesmaspossibilidades

    deexecuoaambososbraos;apartirda,deduzqueametadedacordavibrantedaguitarra

    deveriaficar

    ao

    meio

    do

    corpo,

    sem

    ter

    em

    conta

    que

    aguitarra

    no

    um

    instrumento

    simtricocomoopiano37.

    2.3.3.UsodoTripodison.Na introduo da sua Fantasia ElegacaOp. 59 (1836), declara que o Trip de Aguado ou

    Tripodisneraamelhorsoluoparaacolocaodaguitarraquando,noseumtodo,jtinha

    35Carulli,Ferdinando.MthodeCompletteOp.27.Paris,ca.1811.

    36 Sor, Fernando.Op. Cit.Pg. 79, nota de rodap: Certains duos de Carulli sont dunombre. Sor

    recomendaosduosdeCarulliapesarde rivalizarcomele, tal comodestacaPaulSparks:Thewhole

    op.48 is seen tobean ironiccommenton theeasyguitarmusic thatwasbeingproducedby rival

    ParisianteachercomposerssuchasCarulli.Op.cit.Sparks,Paul,enGsser,Luis.Theguitarvariations

    ofFernandoSor.Pg441.

    37 Se tal teoria se aplicasse ao violino,o resultado seriaumaposio talvez similardo kemanch,o

    kemenchedasiaMenor,instrumentodecordafriccionadadotamanhodeumpequenoviolino,quese

    tocaapoiado sobreapernaesquerda,posturaque seadaptaaoestiloesnecessidades tcnicasda

    msicafolclrica

    dessa

    regio,

    muito

    afastadas

    das

    do

    violino

    eda

    msica

    erudita

    ocidental.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    41/48

    GuitarraClssica 41

    explicitadoasuaexperimentaocomumamesaparaconseguiroapoioparaaguitarraea

    posturacorporaladequados(noencontreinadamelhorqueprumamesaaminhafrente38).

    Em relao a este ponto, Ophee sustm que Sor nunca usou este sistema de apoio numa

    mesa,comosepodevernasilustraesdoseumtodo,porqueomusiclogobelgaFranois

    JosephFtis,ouvinteeobservadoratentodosconcertosdeSor,nuncafeznenhumcomentrio

    sobreesteaspecto.Se tivesseusadoumaposio foradonormal, tal factohaveriacausado

    algumasurpresae,seguramente,Ftistloiaregistado.Paracorroborarestaideia,podemos

    referirnosfrasedeAguado:

    OsquetenhamouvidooSr.FernandoSor,recordaroquehabitualmenteapoiavaa

    partecncavaE.F.daguitarra(lmina1)sobreapernaesquerda,e,sobreadireitaopontoH,

    uniodasilhargas.39

    Na nossa opinio, Sor queria dar outras sadas, estimular a imaginao dos guitarristas

    apresentando novas possibilidades. No

    consideramos que a sua ideia era enganar a

    algum,emboratalvezquisesse,issosim,provocar

    osinstrumentistas,incentivandoosabuscarnovas

    solues, a pensar, a raciocinar livremente,

    fomentando a sua maioridade no sentido

    kantiano.A

    tcnica

    clssico

    romntica

    ainda

    no

    estava suficientemente estandardizada e no

    havia uma vasta experincia nem estudos

    profundos sobre ela, pelo que no podemos ver

    comolhosdosculoXXIasvivnciasdeSor.Foiele

    um dos pioneiros, tal como Aguado, um dos

    precursoresdetodososnossosmestresactuais.

    2.3.4.Posturascorporais.Faz uma observao crtica sobre as posturas mais habituais dos guitarristas italianos e

    franceses,queconsiderapoucoergonmicasefuncionais,apoiandoseemexplicaesgrficas

    egeomtricas.Sobreesteponto,nosvemosaproblemticadestaforma:

    [Diferentesposturas] Sofuncionais sepermitem a realizao dasmanobras tcnicas

    necessriasligadasaumcertoestilo,peloquenodeixamdeservlidasnestecampo,desde

    38Sor,Fernando.Op.cit.Pgs.11e12.

    39Aguado,Dionisio.Escuela deGuitarra.Pg.4.Paris,1820.

    Aguado e o Tripodison

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    42/48

    GuitarraClssica 42

    que satisfaam os objectivos previstos. Um observador imparcial pode notar a falta de

    naturalidade[ouno]naposiogeraldoinstrumentista,quepodeserevidenciadaretirandoa

    guitarranoactodasuaexecuo.O instrumentopodeocultarou servirdejustificaopara

    umaatitudecorporalincorrecta,comooobservouDominiqueHoppenot.40

    2.3.5.Funcionamentodeambasasmos.Utilizaumaargumentaoquetemorigemnoseuconhecimentoemprico,emborabaseiaa

    suademonstraoemestudosgeomtricos.Quandotratadaproblemticadamoesquerda,

    introduz, entre explicaes puramente tcnicas, alguns relatos anedticos sobre as suas

    experincias,durantedilogoscomoutrosguitarristas,maisprpriosdeumensaiobiogrfico

    quedeummtodooutratado.

    2.3.6.Colocaodopolegaresquerdo.Uma das questes que produziamaior atrito nas discusses com outros guitarristas era a

    colocao deste dedo que, para Sor, nunca deveria actuar sobre as cordas, no diapaso,

    recurso que era bem visto pormuitos guitarristas da sua gerao (em especial nas cordas

    graves), entreeles os famososCarulli eGiuliani. Esta ideia no era original de Sor, porque

    FrancescoMolino,janteriormente,noaprovavaousodopolegarcalcandoascordassobrea

    escala, e famosa a guerra virtual deste ltimo com Carulli por este motivo. Sor,

    curiosamente, no fala em nenhummomento deMolino,mas recomenda a colocao do

    polegarnaparteposteriordomastro,formandoumanelcomodedo2.

    2.3.7.Formadeatacarascordasequalidadedosom.Continua com as demonstraesmatemticas,mas tornasemais simples perceber a sua

    intenoatravsdotextodoqueatravsdasilustraes,porvezesconfusas.

    2.3.8.Efeitostmbricosecomposio.Apresentaumrecurso,emvoganapoca,daimitaodediferentesinstrumentos,mudandoo

    timbremedianteotipodeataque ondeachatil,excepcionalmente,ousodepoucaunha ,

    concebendo a guitarra como um instrumento no qual se podia realizar uma espcie de

    orquestrao.Comoera tradicionaldesdeaantiguidade,entreosmsicosprofissionaisno

    estavam ainda muito diferenciadas as categorias de instrumentista e compositor; pelo

    contrrio, ambas estavam ligadas. Por este motivo, Sor d conselhos e exemplos para

    conseguirosmelhores resultados, indicandoqueno suficienteameramudana tmbrica

    paraconseguirumbomefeito.Paraestefim,aspassagensdevemestarescritasdeacordocom

    osrecursosidiomticosdecadaumdosinstrumentosimitados.Nasuamsicanoaparecem

    indicaes relativas s partes destinadas imitao instrumental, e ainda menos qual o

    40Barcel,Ricardo.AdestramentoTcnicoparaGuitarristas.RealMusical.Madrid,2001.

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    43/48

    GuitarraClssica 43

    instrumento imitado. Istopodeseentendercomoumaprticadeixada livrementevontade

    do intrprete,noobrigatria,oucomoconfiana,talvezporvezesexcessiva,nacapacidade

    dediscernimentodosseusintrpretes.

    2.3.9.Usodasunhas.TambmaquiseencontraumadasideiasdeSormaisdifundidasepiorcompreendidas,sobre

    aexecuocomunhasqueagoratranscrevemos,pelasuaimportncia:

    Nuncaouviumguitarristaquetocassedeumamaneirasuportvelseofaziacomunhas;

    []nosfortesouviasemaisorudodasunhascontraacordadoqueoprpriosomdacorda41

    Destasmanifestaes,podededuzirsequeoqueSornoaprova,na realidade,noouso

    dasunhas,masouso incorrectodelas,porquantomuitosguitarristas,aparentemente,ainda

    notinham

    encontrado

    amaneira

    adequada

    de

    produzir

    um

    som

    limpo

    ede

    boa

    qualidade

    usandoasunhas.Porestarazo,tinhaalgunspreconceitosrelativosaestaprtica.Contudo,

    quandoAguadotocouumacomposiodeSornasuapresena,disseaesserespeito:

    Comalgumesforoconseguiutocarmuitonitidamentetodasasnotas.Eseasunhasno

    lhepermitiamexpressardamesmamaneiradoqueeu,tocavacomumaexpressoquenoa

    desvirtuavaemabsoluto42

    Portanto,eapesardemanterassuasideias,nosecolocanumaposiofechada:noaprova

    normalmente

    o

    uso

    das

    unhas,

    mas

    louva

    Aguado

    pelo

    bom

    uso

    que

    faz

    delas,

    deixando

    implicitamenteocaminhoabertoparaosseguidoresdestemestre.

    2.3.10.Conhecimentododiapasoedigitaodeambasasmos.Considerafundamentaloconhecimentoperfeitodasescalasmaioresemenores,paraorientar

    a digitao, sendo as referenciasmusicaismais importantesque asmecnicas.A digitao

    deveria ser guiadaapartirdospadres intervalaresdasescalasnasdiferentes tonalidades,

    dandoespecial importncias terceiraseassextas.Para talefeito,destinauma importante

    partedolivro,sendoateoriailustradacomnumerososexemplosprticos.

    Chamaaatenoaausncia totalde referncias relativasao SistemaPosicionalaplicvel

    moesquerdadenominadoPosio, talcomoerahabitualnosmtodosdestapoca, tendo

    em conta a grande quantidade de elementos tcnicos referidos. Mas, por outro lado,desenvolveuma teoria de digitao, quer para asmelodias quer paraos acordes, baseada

    41Sor,Fernando.Op.cit.Pg.22

    42Ibidem

  • 7/23/2019 Revista Guitarra Clssica n2

    44/48

    GuitarraClssica 44

    fundamentalmentenadistribuiodas terceiraseas sextas,quedependentedaafinao

    convencionaldaguitarraequepoderiafuncionarcomoalternativaaousodaPosio.

    2.3.11.Movimentosdocotovelo.Destaca a importncia da colaborao dos movimentos do cotovelo para a adequada

    colocaodosdedosdamoesquerda.Nosc.XX,estaimportanteideiaretomadaporAbel

    Carlevaro, para desenvolver basicamente os conceitos de apresentao longitudinal e

    transversaldamoesquerdaemrelaoescaladaguitarra.

    2.3.12.Harmnicos.Neste

    captulo

    fica

    em

    evidncia

    que

    naquele

    momento

    aproduo

    de

    sons

    harmnicos

    ainda

    noestava suficientementedifundidanemexplorada.Descreveminuciosamentea formade

    produzirosharmnicosnaturaiseoitavados.Sor,noseumtodo,admitequepodefalharnas

    suas observaes como bom Ilustrado , e de facto, chega a concluses erradas sobre a

    origem dos harmnicos, ficando patente o seu desconhecimento dos pontos nodais e das

    teoriasacsticassobreosharmnicos,desenvolvidasprincipalmenteporJ.Wallis(16161703,

    J.Sauveur(16531706).)eD.Bernoulli(17001782).

    2.3.13.Acompanhamentosetranscries.Comovimosantes,Sorconsideravaqueosguitarristasdeviamdominarnosainterpretao,

    mastambmaspectosrelacionadoscomacomposio.Dsugesteseexemplosprticosde

    comorealizardemaneiraadequadatranscriesperfeitamentefunci