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psicologia

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  • UnP - UNIVERSIDADE DE POTIGUAR

    ALQUIMY ART

  • Curso de Especializao em Arteterapia

    DESCOBRINDO O EU INTERIOR EM ARTETERAPIA - O ADOLESCENTE:

    Evoluo e Vivncias Arteteraputicas

    Maria Lcia Teixeira Mainardi

    BELM 2005

  • MARIA LCIA TEIXEIRA MAINARDI

    DESCOBRINDO O EU INTERIOR EM ARTETERAPIA - O ADOLESCENTE:

    Evoluo e Vivncias Arteteraputicas

    Monografia apresentada Universidade Potiguar, RN e

    ao Alquimy Art, de So Paulo como parte dos requisitos

    para obteno do ttulo de Especialista em Arteterapia.

    Orientadora: Professora MsC. Deolinda Florim Fabietti.

    BELM 2005

    UnP Universidade Potiguar Alquimy Art

    Pr Reitoria de Educao Profissional

  • DESCOBRINDO O EU INTERIOR EM ARTETERAPIA - O ADOLESCENTE:

    Evoluo e Vivncias Arteteraputicas

    Monografia apresentada pela aluna Maria Lcia Teixeira Mainardi ao Curso de

    Especializao em Arte Terapia em ___/___/____ e recebendo a avaliao da banca

    examinadora constituda pelos professores:

    ____________________________________ Profa. MsC.Deolinda Florim Fabietti - Orientadora _____________________________________ Profa. Dra. Cristina Dias Allessandrini Coordenadora da Especializao

    _____________________________________ Profa. Bia Ribolla Leitora Crtica.

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus, que me deu o dom da inteligncia, permitindo-me chegar Ps-Graduao, me fazendo acreditar em meu potencial e por ter me dado habilidade suficiente para o exerccio simultneo dos papis de me, av e estudante;

    A Profa. MsC Deolinda Florim Fabietti, por fazer o possvel para orientar- me, mesmo distncia;

    A Profa. Dra. Cristina Allessandrini, que no mediu esforos para orientar neste processo de construo e reconstruo do meu desenvolvimento intelectual em Arteterapia;

    A Psicloga e co-orientadora Eliane Almeida, amiga e mediadora de nossas dvidas;

    A Psicloga e Terapeuta, amiga Karina Coelho, ouvinte dos problemas existenciais; amiga e Profa. Meire Torres.

    Ao Vilson, meu marido, que me deu apoio no decorrer dos dois anos;

    Aos meus filhos, Mrcia, Marcondes; Liliam e Dedei (In memoriam);

    Aos meus netos Monzs e Camila, presentes que Deus me deu;

    Aos meus colegas, que sempre foram acolhedores e ternos comigo;

    A todos os professores da especializao em Arteterapia;

    A todos que contriburam direta e indiretamente para que eu cumprisse mais esta etapa de minha vida.

  • A minha me Martinha, por ter se abdicado de vrios sonhos em favor dos meus;

    Ao meu esposo Vilson, pelo companheirismo, pacincia e tolerncia;

    Aos meus filhos Mrcia, Liliam e Marcondes por terem grande pacincia e pelo amor incondicional;

    Ao meu filho Monzs (in memorian) que mesmo na ausncia fsica se presentifica espiritualmente no meu cotidiano, pois o amor jamais morre.

  • A arteterapia caminho novo ao encontro do invisvel ao visvel, das cores que falam da harmonia ou desarmonia, da veracidade de fatos internos e externos. (MAINARDI, Lcia, 2005)

    RESUMO

    Esta monografia tem como objetivo compreender o adolescente, a sua evoluo e vivncias, por meio da Arteterapia. Um dos instrumentos utilizados foi o estgio, no qual pude me inserir neste contexto, utilizando a Arte como mediadora no processo de construo e compreenso do universo desses sujeitos. Portanto, este estudo uma descrio do alcance e do limite da Arte, como procedimento facilitador durante as Oficinas Criativas, aplicadas aos jovens e adolescentes no desenvolvimento do seu potencial criativo, afetivo e cognitivo, re-significando a sua

  • viso de mundo, revelada formalmente nas expresses com desenhos, pinturas e modelagens, tendo como suporte terico os autores: Allessandrini (1999), Ferguson (1980), Jung (1977), Pain (1977), Tiba (2002), Winnicott (1989), dentre outros. O resultado obtido foi a produo das informaes descritas e anlise do processo evolutivo e criativo, por meio das observaes durante as aes desenvolvidas.

    PALAVRAS-CHAVES: Adolescentes Arteterapia Evoluo Vivncias Oficinas Criativas - Arte

    ABSTRACT

    This monograph has objective to understand the youth, its evolution and experiences, by means of the Art therapy. One of the used instruments was the period of training, in which I could insert me in this context, using the art as mediating in the construction process and understanding of the universe of these citizens. Therefore, this subject is a description of the reach and the limit of the art, as facilitator procedure during the creative workshops, applied to the young and youth in the development of its creative potential, affective and cognitive, changing its vision of world, disclosed formal in the expressions as drawings, paintings and modeling, having a support theoretician the authors: Allessandrini (1999), Ferguson (1980), Jung (1977), Pain (1977), Tiba (2002), Winnicott (1989), amongst others. The gotten result was the production of the described information and analysis of the evolutive and creative process, by means of the comments during the developed actions.

  • KEY WORDS: Youth Art Therapy Evolution Experiences Creative Workshops - Art

    SUMRIO

    I - A TRAJETRIA: MEU ENCONTRO COM A ARTETERAPIA (CONSIDERAES PRELIMINARES).................................................................11

    II - A TRANSIO DO

    ADOLESCENTE...............................................................18

    III - O QUE ARTETERAPIA?..............................................................................23

    IV - ENTENDENDO O CONTINNUM DAS TERAPIAS EXPRESSIVAS

    (Expressive Terapies Continnum- ETC) ............................................................... .28

    V - TRAANDO O ATELIER TERAPUTICO ....................................................29

  • VI - LAOS DE AMIZADE..................................................................................33

    VII - DESCOBRINDO A SI MESMO NO PR-VIDA..............................................37

    VIII - PROCESSO CRIATIVO E TERAPUTICO NO VITRAL DE PAPEL.......39

    IX - VIVNCIA CORPORAL - CAMINHAR PELA SALA SE PERCEBENDO NESTE

    AMBIENTE.......................................................................................43

    9.1 Vivncia: Painel de

    Apresentao..................................................................43

    X- SOMOS PARTE DO TEMPO E HORIZONTE EM EVOLUO CONSTANTE...

    (CONSIDERAES FINAIS).................................................................................47

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS......................................................................52

    ANEXO.................................................................................................................. 53

  • 11

    I - A TRAJETRIA: MEU ENCONTRO COM A ARTETERAPIA

    A arte o nico domnio em que a onipotncia das idias se manteve at nossos dias. S na arte ainda acontece que um homem, atormentado por desejos, realize algo que se assemelhe a uma satisfao; e, graas iluso artstica, este jogo produz os mesmos efeitos afetivos, como se fosse real. com razo que se fala da magia da arte e que o artista comparado a um mgico. (FREUD apud FIOREZZI, 2004, p. 15)

    Relutncia. Esta palavra que poderia sintetizar o meu primeiro contato com o

    caminho Arteteraputico. O convite partiu de uma colega de turma, durante uma aula

    de graduao em Artes Visuais e Tecnologia da Imagem da Universidade da

    Amaznia - UNAMA. O fato de se tratar de uma Especializao que tinha referncia

    em Arteterapia deixou-me em dvida por ainda estar cursando o terceiro ano do

    curso j citado. Na semana seguinte resolvi enfrentar a dvida e comear o curso.

    Na data prevista me dirigi ao local onde estava sendo realizado o curso, cheia

    de curiosidade e medo sobre o que encontraria. Apresentei-me professora e

    expliquei que havia perdido o primeiro mdulo, mas que na primeira oportunidade o

    faria. Neste segundo mdulo fui muito bem recebida pelos colegas e, graas a Deus,

    no tive dificuldades na adaptao essa nova realidade.

    A partir do momento em que entrei para o grupo, tudo passou a ter uma

    conotao diferente, seguindo as vivncias e as experincias de cada mdulo, como

    uma descoberta do meu eu interior, transformando-me na personagem principal da

    Arteterapia, mergulhando em minhas origens simblicas e na codificao dos outros

    como se fosse meu prprio cdigo.

    Neste segundo mdulo O Desenvolvimento do Grafismo: Arte & Linguagem

    Visual, consegui desenvolver um maior entendimento e acompanhar as atividades

    que estavam sendo ministradas naquele dia. A leitura da ementa propiciou-me a

    noo de como se encaminharia o curso: o processo de construo da

    representao grfica, as caractersticas de cada etapa, a relao do grafismo com

    outras atividades, o desenho no diagnstico e na interveno teraputica, as

    diferentes qualidades de traos, dentre outros.

  • 12

    Partindo do fragmento de um desenho, fiz uma releitura que denominei de

    Corao. Ainda neste segundo mdulo, senti uma leve dificuldade de organizao

    mental, mas depois dei vazo minha intuio, para que formasse um carter,

    informal e descontrada. Ao desenhar o corao utilizei a cor verde, vermelha e azul

    como pontos fortes. A figurativizao deu personalidade energia criadora, me

    revelando os conflitos existenciais que, de certa forma, intimidam a busca criativa ou

    do primeiro trao. Mas vencendo a timidez, expandi a sensibilidade dentro do

    processo da histria a ser descoberta.

    A sensibilizao estimula as cores internas que esto armazenadas no

    consciente. O corao um elemento de transformao do ser humano e por ele

    que emerge o calor do amor na vida das pessoas. Durante essa trajetria fiz muitas

    descobertas, principalmente quando em relao aos medos que sentia do novo.

    Extrair o mago da observao das vivncias um desafio metamorfsico,

    mergulhando nas profundezas do mar interior, nas busca pelo fascnio que a forma

    abstrata oferece intimidade no processo de transformao.

    Neste contexto, pude compreender a construo das idias da viso interior e

    da exteriorizao, trazendo conscincia o ato dos procedimentos e, ao mesmo

    tempo, a sensao da concluso de algo que sempre quis vir tona e faltava

    oportunidade para exteriorizar. Foi como um despertar interior que envolveu toda

    uma espera de vinte anos e que se processou nos dois momentos da graduao e

    da Especializao em Arteterapia, como se um estivesse esperando pelo outro para

    o cumprimento de um dever esquecido que foi sendo retomado.

    Vivenciar as experincias com o grupo foi como estar me ajustando ao cu, ao

    sol, a lua e as constelaes, comeando de novo todos os recortes que

    aconteceram nos estudos e na vida, tornando o objetivo real e maior. Hoje, tenho

    certeza de que, pouco a pouco, os recortes se uniram num s feixe de luz que se

    propagou no autoconhecimento.

    Os feixes de luz visualizados em tons fortes e linhas paralelas representam o

    equilbrio e, simbolicamente, essas linhas significam a identidade profissional, as

  • 13

    impresses digitais da base da formao vocacional, a responsabilidade em lidar

    com o ser humano e seus medos.

    Ao longo do percurso desses dois anos de Especializao em Arteterapia me

    descobri e perdi muitos medos que se acumularam em todas a fases de minha vida:

    desde a infncia at minha vida adulta. Foi perpassando por vivncias que fui

    eliminando etapas que no mais me pertenciam, aparando arestas e reconstruindo

    momentos expressivos que me marcaram e me curaram.

    Dentre os medos, existia um que me perturbava h muitos anos: falar em

    pblico. E foi compartilhando momentos de vivncia na Especializao em

    Arteterapia e na graduao que estudava em paralelo, que tive a oportunidade de

    rever valores que eu mesma desconhecia como potencialidade criativa, tica e

    disciplina.

    Para Diskin (apud MIGLIORI: 1998 p. 86) valores e tica so:

    Os valores humanos so os fundamentos ticos e espirituais que constituem a conscincia humana. Os valores tornam a vida algo digno de ser vivido e permitem constatar que no somos superanimais, mas seres supraconscientes.No se faz necessrio tentar descobrir novos valores, mas perceber que eles so inerentes a ns e pratic-los. A sobrevivncia do mundo e da espcie humana depende do despertar para os valores humanos e do nosso compromisso com a tica.

    Passei por todos os nveis de descobertas, ou seja, pelas funes do

    imaginrio desses diferentes nveis at os valores que se acumularam ao longo da

    especializao: os bons valores e os que classificamos como no bons. Dentre

    estes, o de que ns, em alguns momentos, no sabemos ouvir o outro, o que fez

    com que vivesse as interaes no grupo com muita intensidade e interesse e

    aprendesse a ouvir as transformaes na trajetria percorrida.

    A intensidade e a integrao vividas na trajetria deram embasamento e

    segurana para o futuro estgio, descortinando um processo em que o ver, o sentir e

    o ouvir seriam os pontos focais de um trabalho denso e importante no aprendizado

    de uma futura arteterapeuta.

  • 14

    Partindo das vivncias nas Oficinas Criativas, em que a sensibilizao

    discorreu para um encontro formal e agradvel comigo mesmo, aprendi um pouco

    sobre a sensibilidade da pessoa interna. A expresso livre foi um momento de

    pensamento ou de idia de criao, elaborando expressamente, transpondo, por

    meio da escrita, a sntese do processo criativo, verbalizando e enfocando as

    qualidades. Aprendi que um arteterapeuta no ensina ou conduz a uma resposta,

    mas d condio para que a pessoa atendida elabore sua prpria resposta.

    A Arteterapia, no sentido geral, no objetiva o trabalho da beleza esttica.

    Porm, tem sentido experimental e extravasador, passando por momentos em que j

    se conversou bastante sobre si para, a seguir, oferecer o material para que a pessoa

    experimente: desde o mais denso at o mais sutil. Esses materiais se constituem

    numa fonte de valores expressivos que compem os fios que tecem as tramas das

    experimentaes necessrias s investigaes e conhecimento de si mesmo.

    Considerando Salles (1998 p.156):

    Quando se convive com documentos de processo, conseguimos nos aproximar da intrincada trama de motivos que envolvem a experimentao. Muitas dessas possibilidades, aqui apontadas, se entrelaam em uma rede de relaes. Mais de um motivo pode estar e quase sempre est interferindo no ato de decidir. O mtodo de investigao na arte tem certamente mais que uma caixa com muito mais de doze chaves. O processo de criao, como processo de experimentao no tempo, mostra-se, assim, uma permanente e vasta apreenso de conhecimento.

    Desse modo, as trajetrias foram situando paradas e reflexes que perpassam

    pela percepo que representa o momento de nossas vivncias, das horas que

    correspondem ao presente. E neste presente o processo de criao envolvido pela

    intensidade da sensibilizao interna e externa.

    O estgio foi um dos percursos de extraordinria funo, pois permitiu a

    observao do comportamento e o abrao responsabilidade com o outro,

    conduzindo-me a uma pesquisa profunda, sobretudo, das expresses lgicas dos

    adolescentes.

  • 15

    O silncio uma das formas que transitam por este estudo, no qual capto as

    possveis transformaes das pessoas atendidas. Vivenciei este momento,

    apreciando o desvelamento, o trabalho exercido, a minha funo como

    arteterapeuta. Neste trajeto do silncio, fazendo parte de uma dupla, parti com toda

    a energia possvel, a fim de realizar o trabalho e dele extrair lies de vida e

    experincia em relao projeo vocacional de arteterapeuta.

    Transitar por este processo de aprendizado foi gratificante, pois no apreendi a

    conhecer somente os outros por meio das atividades, mas a me conhecer enquanto

    pessoa, destravando-me, experienciando alguns momentos de recolhimento e

    anlise de mim mesma. O estgio foi uma fonte de pesquisa e de descobertas, no

    da quantidade, mas da qualidade nas relaes humanas.

    Concluo a esta etapa de minha trajetria, tendo certeza dos indicadores de

    mudana que a acompanharam, sempre pontuando as fases vivenciadas em todos

    os mdulos, contribuindo para o desenvolvimento cognitivo em Arteterapia. Na

    trajetria e no estgio o estudo foi de cunho qualitativo. O objetivo geral do estudo

    foi o de compreender o processo de evoluo do adolescente em todas as

    fases das vivncias e suas articulaes com projees de imagens que trazem

    elementos de seu universo pessoal.

    Zamboni (1988) explica que uma das principais caractersticas de uma

    pesquisa o grau de conscincia intelectual do autor sobre seu objeto de estudo e

    processo de trabalho; a forma que o pesquisador ir encontrar para formatar suas

    pesquisas, as mincias prprias de orientaes e conceitos.

    Afirma que em qualquer atividade humana a pesquisa, enquanto processo, no

    somente fruto racional; o que racional a conscincia do desejo, vontade e a

    predisposio para isso. No o processo em si que intercala o racional e o intuitivo,

    mas a busca comum em solucionar algo.

    Neste sentido, este estgio se direcionou ao desenvolvimento de adolescentes

    por meio da arteterapia, solicitando o detalhamento de vivncias e das elaboraes

  • 16

    expressadas nos desenhos, pinturas, recortes, colagens e trabalhos com argila,

    fundamentalmente, no que concerne a certos tipos de materiais e suas articulaes.

    Esta monografia se enquadra como investigao qualitativa, conforme Bogdan;

    Bicklem (1994), por se tratar da compreenso e evoluo do adolescente atravs da

    Arteterapia e dos processos criativos revelados com o uso de materiais adequados

    necessidade do momento.

    Alm das sensibilizaes, foram trabalhados a respirao e movimentos com o

    corpo, situando-se no espao, meio e no mundo interno, representando seu mundo

    ldico na constituio perceptiva, memria e imaginao, como estruturas que se

    aliceram no sentido da criao.

    A pesquisa qualitativa exige um comportamento questionador, com objetivo de

    perceber [...] aquilo que eles experimentam, o modo como eles interpretam as suas

    experincias e o modo como eles prprios estruturam e interpretam o mundo social

    em que vivem. (Op.cit.p.51).

    Essa investigao qualitativa possui suas especificidades e exigncias, pois

    necessria a verificao, de certa forma, do mundo, pois as idias no so casuais e

    nem triviais: tudo est relacionado potencialidade em achar e construir pistas para

    que se tenha uma compreenso mais clara do sujeito ou do objeto que se est

    estudando.

    Para Bogdan; Bicklen (1994, p.48):

    Os investigadores qualitativos freqentam os locais de estudos porque se preocupam com o contexto. Entendem que as aes podem ser melhor compreendidas quando observadas no seu ambiente habitual de ocorrncia. Os locais tm de ser entendidos no contexto da histria das constituies a

    que pertencem.

    Para os autores, como investigao qualitativa, possvel classificar algumas

    caractersticas dos inmeros caminhos a serem seguidos e que fundamentam a

    pesquisa qualitativa, conforme descrito abaixo:

  • 17

    - O que significa que, a partir do momento em que a direo da pesquisa vai

    tomando forma, o investigador vai at a fonte. O agrupamento de dados

    denominado Teoria Fundamentada (in locum), que se constitui num dos meios

    principais do investigador esclarecer as questes propostas de investigao.

    - A descrio efetuada por meio de anotaes feitas no campo de

    pesquisa, com registro fotogrfico, vdeo, documentos pessoais. Nesta monografia

    utilizo a produo dos jovens e adolescentes, ou seja, todo o material dos trs locais

    de estgio, bem como, a apresentao do processo final das vivncias que realizei

    durante o estgio.

    - A investigao se d de forma estruturada e pensada, de acordo com

    as necessidades das pessoas atendidas. Neste estudo recolhi dados e provas, com

    o objetivo de confirmar as minhas hipteses investigadas.

    - O significado o sentido dado pelo sujeito pesquisador importncia

    da abordagem qualitativa. Esta caracterstica emerge das questes presentes na

    pesquisa. Todo investigador tem um objetivo proposto, determinado fim e escolha na

    determinao de seu objeto ou sujeito de estudo. Uma variedade de pessoas

    envolve entendimento e compreenso sobre a experimentao dos objetos, por

    apresentar caminhos diversos, realidades diferentes e mltiplas, por no ser a

    realidade nica que interessa aos investigadores qualitativos.

    Aps situar estas etapas, foi possvel distinguir o processo de evoluo dos

    trs grupos atendidos nos estgios de Arteterapia: Meninos e Meninas Livres -

    GRUPO MEL; Promotora da Vida e Cidadania - PR-VIDA; Escola Superior Madre

    Celeste ESMAC, ratificando as suas relaes perceptivas, de memria,

    imaginao e vivncias, dando respostas s problemticas e fundamentando os

    argumentos, bem como, respaldando as aes arteteraputicas desenvolvidas ao

    longo desta pesquisa considerando a transio do adolescente para a fase adulta.

  • 18

    lI - A TRANSIO DO ADOLESCENTE

    A adolescncia o perodo de transio da infncia fase adulta.Em geral, considera-se um indivduo que seu inicio se d com a puberdade, mas um indivduo pode ser adolescente sem ser pubescente e vice-versa.

    (SPERLING, 2003.p.134).

    Na Grcia, por volta do sculo V a.C. h registros sobre a arte sendo usada

    como tratamento e cura. A Arteterapia no mundo contemporneo tem auxiliado a se

    tornar concreto o desenvolvimento intelectual do adolescente, fato que se consolida

    por meio de pesquisas e estudos sobre o comportamento e atitudes, alm da sade

    emocional e cultural.

    Muitos estudos tm alardeado o mundo do adolescente e suas incessantes

    alteraes nos estados emocionais, os quais, a princpio se perguntam sou

    normal? J na fase que se chama meio da adolescncia, se questionam: quem sou

    eu? E atingindo o final da adolescncia, indagam: qual o meu lugar no mundo?.

    bem sabido que, para os jovens, essas fases podem chegar a serem

    assustadoras, at que se encontrem verdadeiramente e se reconhecerem em si

    mesmos.

    Segundo Amiralian (2004)12, a adolescncia compreende uma faixa etria em

    que os jovens tm que lidar com mudanas fsicas e hormonais decorrentes da

    prpria puberdade, alm de ser uma fase de descoberta pessoal em relao

    sexualidade, sendo imprescindvel que esse processo no seja visto como um

    problema, mas como uma fase de transio, que no deve ser adiada ou atrasada,

    mas deve ser aceita, respeitando o tempo de cada indivduo.

    Gessel (1963) afirma que, apesar das diferenas individuais da idade, de

    maturidade, possvel assimilar grandes etapas que servem de orientao geral,

    embora no correspondam nunca a um adolescente particular. Tais etapas se

    resumem em: Pr-adolescncia perodo/anterior aos 10-12 anos; Adolescncia

    (perodo/central) dos 13 aos 16 anos; Adolescncia (perodo/final), dos 17 aos 21

    anos.

    12

    Em aula ministrada durante o processo de formao no Curso de Especializao em Arteterapia Belm Par, 2004.

  • 19

    Como os rapazes amadurecem um pouco mais tarde que as moas, podemos

    considerar que, para elas, as etapas so aproximadamente as seguintes: Pr-

    adolescncia, dos 10 aos 11 anos; Adolescncia (perodo central), dos 12 aos 16

    anos e Adolescncia (perodo final), dos 17 aos 20 anos.

    As mudanas psicolgicas que tm lugar na pr-adolescncia e no perodo

    inicial da adolescncia so maiores do que aquelas que ocorrem mais tarde e

    acompanham as rpidas modificaes fsicas que acontecem no referido perodo.

    As mudanas implicam a necessidade de se adaptar a elas e quanto mais

    rapidamente se produzem, tanto mais difcil ser a adaptao. Durante os ltimos

    anos da infncia, a vida desenrola-se a um ritmo relativamente calmo. As primeiras

    adaptaes ao ambiente fsico e social encontram uma soluo bastante satisfatria

    na poca em que a criana chega idade escolar. A partir de ento e at a

    adolescncia, as novas adaptaes vo-se realizando de forma gradual, com tempo

    suficiente e com a ajuda de pais e mestres, o que torna a adaptao relativamente

    fcil.

    O incio da puberdade provoca modificaes rpidas no tamanho e estruturas

    corporais. Estas mudanas fsicas so acompanhadas de modificaes interiores. O

    indivduo torna-se desajeitado, torpe e com falta de segurana nos seus

    movimentos. J no lhe interessam os seus colegas de jogo nem os seus

    entretenimentos infantis. Possui um novo interesse pelo sexo oposto, pelo cinema,

    por atividades sociais e at por leituras que anteriormente desdenhava.

    Alm disso, surgem muito mais problemas dos que jamais tinha tido que

    resolver num perodo to breve. O adolescente se d conta, gradualmente, de que

    por fora do seu aspecto fsico, se espera dele um comportamento como o de um

    indivduo adulto e no como o de uma criana indefesa. No entanto, quando, em sua

    meninice h uma preparao gradual para esta mudana, tem menos dificuldades

    em adaptar-se a ela do que o adolescente que na vida anterior vivenciou a

    dependncia plena do adulto.

  • 20

    Como todas as transies, a adolescncia caracteriza-se por um ir e vir do

    comportamento anterior ao atual e pela tomada de atitudes velhas e novas. A

    instabilidade e a contradio so ndices de imaturidade, demonstrando que o

    indivduo no tem confiana em si e que procura adaptar-se nova situao que

    deve assumir no grupo social.

    No aspecto psicolgico, reafirma suas idias, ao compar-las com o mundo

    dos outros. Nesta fase, vive no seu mundo interior e para conhecer a prpria

    personalidade, as suas idias e ideais, compara-se aos outros, tendo a impresso

    de apatia por causa da preocupao repousada e reflexiva pelos prprios estados

    anmicos. Esta interiorizao abarca tambm as esferas intelectuais, filosficas e

    estticas, enchendo a sua vida com estas teorias.

    As caractersticas mais prprias deste perodo so: crescente conscincia e

    conhecimento do "eu"; nascimento da independncia; adaptao progressiva aos

    ncleos sociais da famlia, escola e comunidade em geral.

    O autor sugere algumas atitudes para lidar com um adolescente que so:

    demonstrar sincera amizade, estabelecer comunicao baseada no respeito, na

    confiana e na oportunidade, compreenso, aprender a escut-los, no cansar de

    os animar, exigir suavemente, mas com firmeza, compartilhar dos seus projetos.

    Gessel (1963) tambm enfatiza a importncia de recordarmos as nossas

    tenses e inquietaes em nossa fase da adolescncia, pois assim estaremos em

    condies de ajudar os jovens e de sermos mais compreensivos com eles.

    A adolescncia um perodo no qual uma criana se transforma em adulto.

    No se trata apenas de uma mudana na altura e no peso, nas capacidades

    mentais e na fora fsica, mas, tambm, de uma grande mudana na forma de ser,

    da evoluo da personalidade.

    Segundo Tiba (2002, p.84 -85):

    [...] a puberdade uma busca de identidade sexual, a inundao dos hormnios sexuais na criana e o terremoto corporal causam uma mudana radical no fsico e nas emoes de um adolescente tumultuando a famlia.O feminino e o masculino diferenciam-se nesta etapa, cada qual

  • 21

    com um comportamento caracterstico, fortemente pela dobradinha hormnio/cultura.

    A garota passa a dar extrema importncia s colegas e amigas, formando

    grupos e subgrupos que ora se unem como amigas eternas, ora se afastam como

    inimigas mortais. A famlia vai para o segundo plano. Como passarinhos

    alvoroados e cantantes no fim de uma tarde de vero, elas voam de repente para

    outra rvore e tudo continua. Porm, um passarinho no cho est doente ou

    ciscando, do mesmo modo que uma garota solitria no est bem. As competies

    comeam quando surge interesse pelo mesmo garoto.

    O rapaz embarca no sentido oposto: esse o perodo mais anti-social de sua

    vida. Isola-se e se torna irritadio, respondo, mal-humorado. No divide suas

    preocupaes, no pede nem oferece ajuda. Grandes transformaes corporais e

    psicolgicas ocupam tanto o pbere masculino que ele fica sem energia para

    investir nos relacionamentos sociais.

    A adolescncia pode ser comparada etapa em que as rvores frutferas

    do flores. Estas geralmente ficam na parte mais alta, bem expostas ao sol. Super

    coloridas e perfumadas, elas chamam ateno de todos polenizadores. Os

    adolescentes so, ao mesmo tempo, flores e polenizadores.

    A satisfao emocional pode vir acompanhada de um desejo de construo

    interior, o que facilita a transmisso de seus sentimentos e da forma como entende o

    mundo, mesmo carregado de conflitos internos e externos. E a arteterapia um dos

    caminhos vitais para que o adolescente, em uma das aberturas e possibilidades,

    possa aumentar sua autoestima para um inovador processo de descoberta de si

    mesmo e tambm de seu processo criativo.

  • 22

    III - O QUE ARTETERAPIA?

    Segundo Pan (1996.p.9):

    [...] ainda que saibamos as noes de arteterapia por incluir em seu contexto tratamento psicoteraputico, que utiliza como mediao a expresso artstica (dana, teatro, msica e outros), nosso conhecimento ainda est limitado, no que diz respeito representao plstica: pintura desenho, gravura, modelagem, mscara, marionete.

    Estas atividades tm em comum o objetivo da representao visual do domnio

    figurativo, a partir da transformao da matria. Por ser essa uma rea recente, que

    data do perodo ps-guerra, preciso tomar a palavra arte no sentido que adquiriu

    na segunda metade do sculo, no qual no mais ofcio da recriao da beleza

    ideal, nem tampouco est a servio da religio ou da exaltao natureza.

    Essa observao constitui um reconhecimento da ruptura da arte

    contempornea com aquelas que a precederam, indagando nessa nossa poca,

    qual a funo da arte e quais mudanas so possveis ocorrer a partir da escolha

    das tcnicas a serem utilizadas e tambm da ideologia do sujeito que a vive.

    A linguagem da Arteterapia se torna hbrida, a partir da compreenso de que

    outros povos utilizam diversos meios arteteraputicos. No entanto, o desenho e a

    pintura so os que mais expressam a contextualizao do ser si mesmo, levando o

    indivduo atendido aquisio de uma melhor qualidade de vida, relacionando-se e

    se integrando com seu meio e com o mundo que o cerca.

    Das tendncias atuais, segundo Pan (1996), o trabalho em arteterapia o mais

    prximo da clnica psicoterpica, que considera a atividade plstica como meio

    secundrio, porque atribui o efeito teraputico vindo das trocas verbais em torno do

    contedo da obra.

    Por outro lado, a arteterapia d suporte ao indivduo, para que possa, por meio

    das imagens adquiridas em seu universo interior, dar significados, explorando e

    expurgando os conflitos subjetivos.

  • 23

    A arteterapia, para a autora, tem um papel importante que o de acompanhar o

    processo do paciente, ser testemunha de sua aventura, ajudando-o a superar os

    obstculos encontrados, considerando-os, ao mesmo tempo, de um ponto de vista

    subjetivo e objetivo. Para isso, preciso que haja normas na observao dos

    sujeitos que esto realizando uma atividade criativa e, por outro lado, decidir a

    oportunidade e o contedo das intervenes.

    Neste contexto, do terapeuta exigida uma grande capacidade de

    concentrao cada vez que o processo de construo simblica considerado como

    uma aventura contnua, em que as transformaes sucessivas so mais importantes

    do que o resultado final. De acordo com a mais recente definio de arteterapia:

    A arteterapia baseia-se na crena de que o processo criativo envolvido na atividade artstica teraputico e enriquecedor da qualidade de vida das pessoas. Arteterapia o uso teraputico da atividade artstica no contexto de uma relao profissional por pessoas que experienciam doenas, traumas ou dificuldades na vida, assim como por pessoas que buscam o desenvolvimento pessoal. Por meio do criar em arte e de refletir sobre os processos e trabalhos artsticos resultantes, pessoas podem ampliar o conhecimento de si mesmo e dos outros, aumentar a auto estima, lidar melhor com sintomas, estresse e experincias traumticas, desenvolver recursos fsicos, cognitivos e emocionais e desfrutar e desfrutar do fazer vitalizador do fazer artstico. Arteterapeutas so profissionais com treinamento tanto em arte como em terapia.Tem conhecimento sobre o desenvolvimento humano, teoria psicolgica, prtica clnica, tradies espirituais, multiculturais e artsticas e sobre o potencial curativo da arte. Utilizam a arte em tratamentos, avaliaes e pesquisas, oferecendo consultoria a profissionais de reas afins. Arterapeutas trabalham com pessoas de todas as idades, indivduos, casais, famlias, grupos e comunidades.(AATA, 2003).

    Allessandrini (1969), responsvel pela implementao das oficinas criativas e

    da elaborao de uma metodologia para trabalhar em atelier teraputico,

    contextualiza que um espao em que o participante, por meio de uma atividade

    artstica, expressa criativamente uma imagem, que se processa na descoberta,

    sensibilizao.

    Pensa de acordo Com Pain; Jarreau (apud ALLESSANDRINI 1969.p.29) que

    consideram o atelier teraputico como um lugar de aventura, no qual o participante

    escolhe os riscos que quer correr medida que entra em contato com o material que

    teve afinidade. um fazer interessante no lugar de um fazer bonito. Criar

  • 24

    explorar mundos interiores, despertar atravs da sensibilizao, dialogar e sentir o

    material, aflora as emoes, compartilha e avalia seu resultado final.

    Para explorarmos mundos interiores necessrio entender o outro dentro do

    desenvolvimento humano o seu tempo consciente e inconsciente.

    A Psicologia, segundo Winnicott (apud ALLESSANDRINI, 2004, p.62) tem

    estudado o mecanismo consciente e inconsciente da psique. Nesse sentido, o

    desvendar dos processos psquicos a partir de Freud, Jung, Winnicott e outros nos

    ajudam, de forma contundente, a entender a importncia de tais mecanismos no

    desenvolvimento humano.

    Segundo Jung (apud FRANZ 1977.p.161) o processo de individuao uma

    engenharia de inmeros componentes. Entre eles est o self - centro organizador de

    onde emana a ao reguladora que o autor chamou de ncleo atmico do nosso

    sistema psquico. Este foi descrito como a totalidade absoluta da psique, para que

    houvesse diferena entre o ego e o self. O ego que constitui uma pequena parcela

    da psique.

    Jung (1977, p. 161) comparou a psique a:

    [...] uma esfera com uma zona brilhante (A) em sua superfcie que representa a conscincia. O ego o centro desta zona (um objeto s consciente quando eu o conheo). O self , a um tempo, o ncleo e a esfera inteira (B); seus processos reguladores internos produzem sonhos. (Op.cit.p.161).

    A

    EGO

    Self

    B

    Figura 03: Reproduo do desenho da psique comparada a uma esfera

    Fonte: Acervo da pesquisadora

  • 25

    Em sua acepo, Jung (1977) afirma que o homem desenvolveu vagarosa e

    laboriosamente a sua conscincia, num processo que levou um tempo infindvel, at

    alcanar o estado civilizado, arbitrariamente datado de quando se inventou a escrita,

    mais ou menos no ano 4000 a.C.

    Nesse sentido j evolumos, mas precisamos alar vos teraputicos cada vez

    mais altos, no que diz respeito ao estudo da subjetividade do ser humano complexo

    e de sua transformao. Ferguson (1980, p.65-67) afirma que o termo

    transformao tem significados paralelos na Matemtica, nas Cincias Fsicas e na

    mudana humana.

    Uma transformao , literalmente, uma nova forma, uma reestruturao de

    alguma coisa. Uma transformao matemtica, por exemplo, converte um problema

    em termos novos, a fim de que possa ser resolvido. E a transformao, segundo o

    autor, no especificamente de pessoas, mas a transformao da conscincia.

    Neste contexto, conscincia significa apenas a percepo desperta, o estar

    consciente da prpria conscincia, tendo experimentado uma modificao positiva

    em suas prprias vidas - mais liberdade, sentimento de afinidade e de unidade, mais

    criatividade, maior capacidade de lidar com o estresse, uma noo de sentidos da

    vida.

    A comprovada flexibilidade do crebro e percepo humanos sugere a

    possibilidade de que a evoluo individual pode conduzir evoluo coletiva.

    Ferguson (1980, p.66) escreveu sobre a evoluo da conscincia:

    A idia de que temos amplas opes de conscincia no nova. Com liberdade de opo e com dignidade, como criador e modelador de si mesmo o homem pode assumir a forma que preferir.Ter a fora para gerar nas formas inferiores de vida, que so irracionais. Ter fora, partindo do julgamento da alma, para renascer em formas superiores...

    Segundo o autor, os discursos dos filsofos acerca da natureza humana

    buscavam saber como era essa natureza humana: boa ou m. Porm, em todas as

    disciplinas, nos oferecem uma opo: tanto o crebro como o comportamento

  • 26

    humano so quase, inacreditavelmente, flexveis. Somos condicionados a ter medo,

    ficarmos na defensiva, sermos hostis, embora ainda tenhamos, tambm, capacidade

    para uma extraordinria transcendncia.

    A transcendncia se d a partir de quando o ser humano encontra-se num mais

    elevado e sublime amor em si mesmo, promovendo um encontro consigo mesmo, ou

    seja, quando sente que algo transcende de dentro para fora. Quando transcende os

    limites das experincias metafsicas possveis.

    Penso que todo o nosso ser capaz de grandes transformaes interiores,

    mesmo que tenhamos que passar por momentos dolorosos, que so de suma

    importncia para o amadurecimento tanto do adulto quanto do adolescente na sua

    estrutura fsica e emocional.

  • 27

    IV - ENTENDENDO O CONTINUUM DAS TERAPIAS EXPRESSIVAS

    (Expressive Therapies Continuum ETC)

    Kagin; Lusebrink (1978) desenvolveram o modelo de um conceito de expresso

    e interao com o meio em diferentes nveis, no qual foi constitudo o Continuum das

    Terapias Expressivas - ETC.

    Este modelo foi dividido em quatro nveis, organizados numa seqncia

    desenvolvimentista da formao de imagem e processamento das informaes. Os

    primeiros trs nveis refletem a seqncia desenvolvimentista e a crescente

    abstrao no processamento da informao, na seguinte ordem: nvel

    cinestsico/sensorial (KS); perceptual/afetivo (PA) e cognitivo/simblico C/(Sb), alm

    do quarto nvel: o criativo (CR). Este ltimo nvel criativo considerado como

    sntese dos outros trs e tambm responsvel pela integrao, transformao e

    expresso da experincia em novas formas (KAGIN; LUSEBRINK,1978).

    O nvel cinestsico/sensrio est focalizado, primariamente, no soltar da

    energia e por meio da ao do movimento corporal. O nvel sensrio refere-se s

    sensaes experenciadas e, com ele, o individuo percebe o seu potencial

    energtico. A estimulao sensrio-motora apresenta um componente curativo e

    teraputico que surge atravs do ritmo que espontaneamente se estabelece no

    desenvolvimento da forma e da percepo e de seus significados.

    O perceptual/afetivo (PA) seria uma representao da interao entre os

    aspectos perceptual e afetivo e a influncia de diferentes meios sobre aquela

    interao. O nvel perceptual afetivo caracterizado por uma distncia reflexiva

    mnima entre o estmulo e o envolvimento na ao e sensao.

    O nvel cognitivo-simblico se caracteriza, essencialmente, pelo uso da

    linguagem associada ao smbolo. O cognitivo lida com o pensamento lgico e o

    simblico focaliza a formao intuitiva de conceitos.

  • 28

    O plo perceptual deste nvel est focalizado na forma ou nas qualidades

    estruturais da expresso, tais como: definir limites, diferenciar formas e o esforo de

    alcanar a representao, que se originam de uma experincia interna ou externa. O

    nvel criativo enfatiza a sintetizao e as foras da auto-atualizao do Ego e do EU.

  • 29

    V - TRAANDO O ATELIER TERAPUTICO

    A motivao para o desenvolvimento deste estudo comeou quando conheci

    um grupo de adolescentes que foi indicado pelas colegas da especializao: o

    Grupo MEL. Percebi que o mesmo era um grupo preparado para outras atividades,

    o que reforou a necessidade do atendimento em Arteterapia.

    A instituio responsvel pelo grupo a Secretaria de Segurana Pblica do

    Par SEGUP, que recebe apoio da Prefeitura Municipal de Belm. A sigla do

    Projeto MEL significa: Meninos e Meninas Livres e beneficia adolescentes com a

    faixa etria entre 14 a 17 anos. Esse projeto rotativo, pois em cada local cedido a

    permanncia por dois anos. O local onde foi desenvolvida esta pesquisa foi um

    clube com quadra de esporte, piscina e rea coberta. Os instrutores so todos

    militares, com exceo da psicloga da instituio, que acompanhou todo o

    processo dos encontros teraputicos. Comeamos no primeiro encontro com 22

    adolescentes e a mdia do atendimento ficou intermediada entre dezenove e dez,

    ficando fixada em dez adolescentes, sendo que o nmero de atendimentos fechou-

    se em nove.

    Para dar incio aos atendimentos no estgio, trabalhamos as suas fases da

    infncia at os dias atuais, iniciando pelo conhecimento de suas crenas, os

    traumas, as mgoas, ressentimentos, culpas e carncias afetivas. Nas vivncias

    sensibilizadoras pedimos que abrissem seus coraes para as coisas mais

    importantes, como: suas necessidades, desejos, frustraes e perdas. O trabalho foi

    direcionado reconstruo e valorizao da auto-estima.

    Como a pesquisa tinha o cunho e o compromisso com a evoluo do

    adolescente por meio da pintura com aquarela, guache, pastel a leo e a seco,

    colagem, recorte, argila, foi solicitado que pensassem quais as suas metas para o

    futuro.

    Esse contato com os adolescentes foi um marco profundo para meu estudo e

    foi a partir dele que formulei a seguinte problemtica:

  • 30

    Como construir tramas possibilitadoras para que o adolescente evolua

    atravs das prticas e vivncias arteteraputicas transformadoras, mantendo

    um dilogo aberto, integrado a um sentimento, um fazer e um pensar?

    Tal problemtica conduziu o objetivo da pesquisa ao resgate da dignidade,

    autoconfiana, resoluo dos conflitos internos e sociais do adolescente, pois so

    indivduos povoados de fantasias e egocntricos.

    Uma das formas para o trabalho com o adolescente so as Oficinas Criativas,

    nas quais:

    [...] se utiliza recursos expressivos e artsticos na perspectiva de re-signficar a aprendizagem do indivduo, prope uma interveno psicopedaggica que trabalha os coordenadores cognitivos [...]. Os coordenadores cognitivos representam os aspectos funcionais gerais da formao e do exerccio dos esquemas de ao, e tambm so fontes comuns das correspondncias e transformaes no desenvolvimento humano. (ALLESSANDRINI, 1996, p. 103)

    Partindo das oficinas criativas e do processo de atendimento, observei em

    todas as oficinas o desenvolvimento intelectual do grupo e dos indivduos na

    desenvoltura para verbalizar, ou seja, para compartilhar o que viveu, sentiu e o que

    imaginou internamente.

    Inicialmente, o jovem ou o adolescente inibido no admitia compartilhar e

    mostrar o que havia produzido. Num outro momento, era notvel a satisfao em

    querer compartilhar e expor suas produes. A estes momentos atribui nomes:

    momento fechado e momento aberto.

    O momento fechado ocorre no instante de elaborar os desenhos e da escolha

    da cor para a pintura: ficavam alguns minutos olhando para o branco do papel. Estes

    Figura 01: Representao do momento fechado Fonte: Acervo da pesquisadora.

    Figura 02: Representao do momento aberto Fonte: Acervo da pesquisadora.

  • 31

    cdigos foram detectados nos trs grupos MEL, PR-VIDA e Escola Superior Madre

    Celeste - ESMAC.

    Entretanto, depois dos momentos de reflexo interna, os adolescentes no

    resistiam, elaborando e extravasando o pensamento em desenhos e pinturas

    significativas, que enfatizavam o nvel afetivo de expresso livre. As pinturas foram

    executadas com tintas fluidas, como aquarela e guache e tambm com material mais

    encorpado, como: pastis a leo e a seco, em cores variadas, o que propiciava alvio

    aos sentimentos. Os exerccios de aquecimento foram sempre acompanhados por

    msicas suaves com sons de rios, mares, chuvas e pssaros.

    Neste percurso, as tcnicas e visualizaes luminosas com as cores eram

    estimuladas para que, desse encontro consigo mesmo, trouxesse uma resposta

    positiva para si mesmo.

    Pan (1996, p.20) diz que:

    A arte atravs de sua histria e suas variaes, apresenta os diferentes cdigos de significao onde as produes individuais podem encontrar seu sentido.Quanto mais o terapeuta domina o cdigo, mais facilmente ele descobre os valores (luminosidade, obscuridade, contrastes passagens, etc) com os quais o sujeito trabalha e pode melhor auxiliar a enriquecer sua linguagem e sua capacidade de simbolizao.

    As teorias e conceitos fundamentaram e enriqueceram a pesquisa para que

    compreendssemos aspectos positivos no comportamento dos adolescentes e

    jovens. A necessidade de conhecer outros caminhos, at ento despercebidos,

    afloraram a simbolizao individual e coletiva que, no conceito de Jung (1977)

    evidencia que pelas suas estruturas a linguagem simblica se exprime e se no for

    bem compreendida sua importncia vital poder ser benfica ou destrutiva.

    A Arteterapia, na viso junguiana, traz amadurecimento, conhecimento no s

    individual como coletivas muitas mudanas, transformaes e os sonhos sonhados

    de olhos abertos e os outros de quando dormimos se relacionam com o dia a dia.

    Essa relao onrica faz com que tendncias se desenvolvam interna e

    externamente, regulando o crescimento e o processo de individuao.

  • 32

    Partindo desse princpio, a Arteterapia se apropria da energia psquica do

    indivduo, formando smbolos que transitam entre o inconsciente e o consciente. A

    percepo parte da compreenso de mudanas no estado emocional e afetivo que

    se armazenam descondensadas, o que possibilita a construo e o desenvolvimento

    individual por meio das produes plsticas.

    Somente o profundo mergulho em si mesmo A percepo de uma origem comum A certeza do longo caminho a percorrer Nos conduzem ao mistrio do outro. Sua beleza Sua dor Sua expresso de busca s vezes disfarada pelo pudor.

    Compaixo Ruy Csar do Esprito Santo (Migliori. 1998, p.59)

  • 33

    VI - LAOS DE AMIZADE

    Por meio das visitas fui criando um vnculo harmonioso, ou seja, laos de

    amizade, estimulados pela curiosidade dos adolescentes. E as motivaes

    cresceram, porque decidi estudar para compreend-los e ajud-los nas suas

    descobertas. A recepo por parte deles foi carinhosa e predominantemente repleta

    de curiosidade.

    Comecei pelo nvel cinestsico por sentir que o grupo estava tenso e

    necessitava de um estmulo para se desinibir e perder o medo natural diante do

    novo, alm do fato de que este nvel viabiliza a sensibilizao com movimentos

    motores, ou seja, trabalha o corpo para poder soltar suas energias. Aps os

    exerccios, prossegui as atividades, explorando os materiais a serem usados, como:

    o papel A4, lpis pretos, coloridos, tintas aquarela, guache, dentre outros.

    Aos poucos, detectei alguns problemas de ordem afetiva que se estendiam s

    carncias familiares, como tambm o desejo de se firmarem profissionalmente e

    adquirirem estabilidade financeira, pois todos so de famlias de baixa renda. Outros

    vm do interior para estudar na cidade e ficam residindo com parentes ou amigos da

    famlia.

    Alm desses problemas que detectei no Grupo MEL, ainda senti o descrdito

    do valor da Arteterapia por parte da Instituio, mesmo explicando que estvamos ali

    desempenhando o nosso papel com muito boa-vontade, embora no fssemos

    psiclogas. Porm, no fechamento do primeiro semestre, o Coordenador Delegado

    da SEGUP relatou o valor do nosso trabalho e sua percepo sobre o quanto era

    necessrio para aquele grupo o tipo de trabalho que desenvolvemos.

    Os nossos encontros ficavam submetidos ao calendrio da Instituio, o que

    interferiu, sobremaneira no incio das atividades, pois tnhamos que aguardar a

    autorizao para comear o trabalho com os adolescentes. O trabalho fluiu porque

    os adolescentes se sentiam ansiosos pelos encontros e pediam para que iniciasse o

    atendimento.

  • 34

    Ao iniciar o processo teraputico, houve algumas Interferncias externas, mas

    que logo foram solucionadas: queriam ver se iria clinicar, ou seja, se o nosso

    trabalho estaria direcionado rea da Psicologia e, com muito custo, tive uma

    conversa sria e entenderam que o objetivo no era este, mas sim agilizar o estgio,

    deixando a contribuio aos adolescentes daquela comunidade.

    A seguir, os responsveis pelo Projeto se colocaram apenas como ouvintes,

    participando das atividades. As interferncias internas minimizaram e os

    adolescentes se envolveram com as atividades.

    A cada encontro o grupo se mantinha ansioso porque era uma novidade.

    Queriam saber o que era a Arteterapia. Expliquei de uma forma simples para que

    entendessem. Ento disse: Vocs iro expressar-se atravs do desenho e pintura,

    ou seja, atravs da expresso livre. E com a arteterapia o ser humano alcana um

    equilbrio emocional para uma melhor qualidade de vida.

    A sensibilizao aquecia e ocasionava o relaxamento e desejo de fazer as

    atividades. Seus desenhos mostravam o sentimento mais afetivo, pois desenhavam

    a famlia, por meio da disponibilidade das cores, verbalizavam e escreviam frases ou

    pequenos textos, nos quais demonstravam amor ou desamor por algumas

    passagens de suas vidas. Sentiram-se seguros com minha presena. No desenrolar

    dos encontros a harmonia sempre predominava.

    Dentre os adolescentes, o que mais me chamou a ateno foi JH, um dos seis

    fixos que iniciaram e terminaram o processo teraputico. A preocupao dele era

    familiar, querendo resgatar o entendimento com um irmo que no se comunicava

    h cerca de dois anos, por causa de um conflito de ordem social, pois se preocupava

    constantemente com habitao, sade, e emprego, que so princpios bsicos para

    a qualidade de vida de todo cidado brasileiro e do mundo.

    JH uma pessoa alegre e demonstrou total interesse pelas atividades

    propostas, comeando e terminando todos os desenhos, mesmo que, por alguns

    minutos, refletisse muito olhando o branco do papel.

  • 35

    Antes do final do estgio, fiquei sabendo que o seu irmo voltou a falar com ele

    sem criar resistncia. Um indicativo de mudana muito importante, pois outras

    pessoas no conseguiram essa transformao.

    Fizemos a terapia com o barro, com o objetivo de transformao de si mesmo

    usando os quatro elementos da natureza. Ao iniciarmos a sensibilizao,

    exercitvamos o corpo, balanando-o de um lado para o outro, nos deixando

    conduzir como as ondas do mar, trabalhando sempre a respirao para que se

    sentissem relaxados.

    A seguir, comeamos pela esfera, reino vegetal mineral, animal, at chegar na

    evoluo do homem. Todos receberam uma quantidade de barro que coubesse em

    suas mos, limparam o barro, retirando as impurezas e moldaram uma esfera,

    representando o seu mundo, na qual a cada evoluo interna seria transformado em

    outro mineral, sucessivamente.

    Nesse momento, havia apego com o objeto e os adolescentes no queriam

    despedir-se do animal que fizeram, pois se empenhavam intensamente em faz-lo e

    no queriam perd-lo. Finalizamos com a verbalizao e a sntese dessa vivncia

    coletiva e individual e a palavra final foi solidariedade.

    Finalizei os nove encontros, mostrando dois dos momentos mais marcantes,

    que foram a construo dos bonecos feitos com garrafas plsticas descartveis e os

    quatro elementos da natureza. Durante a atividade com o barro os adolescentes

    foram filmados trabalhando, o que os deixou orgulhosos, dizendo-se capazes de

    produzir.

    Em seus depoimentos disseram que nunca mais iriam me esquecer, pois

    proporcionei a eles bem-estar e a descoberta do potencial de criao e que, em

    alguns momentos, se achavam incapazes de desenhar e pintar. Um momento

    marcante, alm de tantos vividos, foi o da finalizao com a palavra do dia e as

    palavras mais repetidas foram F e Esperana.

  • 36

    Nessa despedida ganhei uma pintura em papel reciclado como agradecimento

    dos dias que passamos juntos. O coordenador ficou encantado com o trabalho e

    pediu a fita para ser gravada em CD para possvel apresentao dos trabalhos

    executados junto ao Grupo MEL. O descrdito inicial dos dirigentes transformou-se

    em elogios e aplausos.

    Percebi os indicadores de mudanas e crescimentos pessoais em cada um, ao

    seu tempo, e dizendo que aprenderam a ver o mundo com mais pacincia e

    tolerncia, qualidades que no sabiam lidar antes da arteterapia. Aprenderam a se

    conhecer melhor e a valorizar o trabalho do outro.

    Ao encerrar o trabalho com esse grupo, recebi um convite para novamente

    trabalhar com adolescentes que vivem internos por praticarem delitos ou porque

    perderam o contato com familiares, moradores de rua e outros casos em que os pais

    so alcolatras ou drogados.

    O contato com o coordenador do grupo foi imediato para ver as principais

    necessidades deste novo grupo. O novo grupo era a PR-VIDA, ou seja, o Lar Jian

    Lucca Pr-Vida (Promotora da Vida e Cidadania) mantido por famlias Italianas,

    Organizao No-Governamental, intermediada pelo padre Savino Mondelle da

    Igreja Catlica, com sede situada a Rua Ricardo Borges, 150 Bairro da

    Guanabara, Municpio de Ananindeua - Par. Os jovens residentes neste lar so de

    faixa etria entre dezesseis a vinte anos e so em nmero de dez residentes.

  • 37

    VII - DESCOBRINDO A SI MESMO NO PR-VIDA

    Descobrindo o eu interior em Arteterapia, se desenvolveu a partir da minha

    escolha em trabalhar a carncia de afetividade que o adolescente sofre por no

    conviver com seus familiares, entrando em seu mundo interno, buscando

    alternativas para um viver melhor a partir de suas necessidades. Entretanto, percebi

    nos adolescentes focos predominantes do desejo de mudana e de crescimento

    intelectual, espiritual e profissional, alm de um mundo mais afetuoso e humano, por

    terem pais que vivem num mundo tenebroso e triste.

    Na pesquisa foi detectada a no convivncia com os pais e irmos. Mesmo

    assim, notei um forte lao de amizade entre eles, bem como, o compromisso de

    todos na vivncia em comunidade, dividindo os trabalhos da casa, como: lavar

    cozinha, limpar, ou seja, manter o ambiente limpo e organizado.

    Os adolescentes sofrem por falta do amor materno. Este um problema que

    talvez tenha cura ou no, porque mesmo que tenha acontecido um corte umbilical

    brusco, por motivos to incoerentes e to longe de seus entendimentos, esse corte

    aconteceu quando eram praticamente bebs ou a partir dos trs anos. Os motivos

    principais foram: alcoolismo, drogas, fatores econmicos. Estes fatores descritos so

    desencadeantes de suas doenas emocionais.

    Winnicott (1993, p.115-16) diz, bem claramente, sobre a cura do adolescente:

    Cada indivduo v-se engajado numa experincia viva, num problema do existir....

    ... A cura da adolescncia vem do passar do tempo e do gradual desenrolar dos

    processos de amadurecimentos.

    Conversando com os adolescentes e ouvindo suas verbalizaes aps as

    atividades, o sentimento de re-construo, aliado ao desejo de amor, carinho e

    afetividade. Notei entre um e outro que, para eles, essa casa acolhedora e no se

    constitui numa priso. Contudo, para estes jovens no h alternativa, seno esperar

    uma boa oportunidade que os leve ao trabalho e a uma profisso.

  • 38

    possvel que no seu querer algo, mesmo com alguns traos de rebeldia e

    desinteresse, o que realmente precisam de uma oportunidade para dar a sua

    contribuio, para criarem seu mundo ldico e expressarem suas formas

    imaginativas, obtendo, com isso, um trabalho de transformao interior.

    Alguns jovens, quando passam por essa fase de reconstruo interior um

    verdadeiro dilema, pois na altura em que atingiram o grau de maturidade ficam num

    limiar em que se perguntam sobre o que ser o futuro.

    Um dos jovens atendidos foi P. de 20 anos de idade - criado neste lar desde os

    cinco anos. Tem me, mas foi acolhido pelo Lar Jian Lucca, Pr-Vida. Em seu

    depoimento, P afirmou: Estou aqui h muitos anos. Estou terminando o ensino

    mdio, mas a minha maior preocupao de no saber o que irei fazer no futuro?.

    A sua necessidade a de estar bem consigo mesmo e expressou isso quando

    fez um desenho representando o mundo e nele uma interrogao equivalente

    pergunta acima que se fez.

    No desenho coletivo foi proposto que cada um procurasse um espao para si

    no papel 60k exposto um painel para que desenhassem uma base no papel, depois

    sassem do seu desenho e encontrassem os das outras pessoas, tentando ser

    sensveis, compreendendo o que havia no primeiro desenho.

    Com estes desenhos, detectei que P um lder de seu grupo, pois pareceu ter

    bastante sensibilidade para expor sua ansiedade e, ao mesmo tempo, o seu desejo

    em querer ser e transformar-se. Desenhou um leo bebendo gua num rio azul e

    com flores azuis. O leo tinha grandes ps fortes, expressando uma pessoa forte e

    determinada. A sua ansiedade em querer ser e transformar-se o leva a ajudar seus

    colegas, aconselhando-os a se tornarem pessoas melhores.

  • 39

    VIII - PROCESSO CRIATIVO E TERAPUTICO NO VITRAL DE PAPEL

    A reconstruo foi visvel em cada indivduo do grupo Pr-Vida. As buscas pela

    Arteterapia integram o ser humano a uma profunda internalizao, soltando

    emaranhados que h tanto tempos est adormecida, tornando-o capaz de se

    reorganizar, construindo novos valores significativos.

    Nessa vivncia participaram oito jovens. Iniciamos alongando o corpo,

    trabalhando a respirao. Depois, sentados em crculos, continuamos a trabalhar a

    respirao, ouvindo msica com sons de rios e mares, pedindo que visualizassem a

    transparncia das guas e da luz do sol incidindo sobre ela: a luminosidade. Aps a

    sensibilizao foi oferecido o material, com livre escolha de cores.

    A tcnica e materiais utilizados foram: papel celofane, papel carmim branco,

    estilete, tesoura, cola basto e outros. O objetivo foi: compreender a adequao aos

    desejos, aos limites e s possibilidades dos materiais disponveis e a habilidade para

    recortar. O significado da transparncia e da luminosidade fundamental para julgar

    o prazer provado pelo jovem na atividade do vitral.

    Dentre os jovens, Ed. contribuiu para um estudo mais aprofundado, pois

    trabalhou as suas dificuldades. Escolheu seu material usando uma cor s de papel

    celofane. Para todos, o tamanho do papel era o mesmo 40cm X 40cm, mas ele

    comeou desenhando um crculo e dois quadrados com o lpis. Porm, parecia que

    no achava o jeito: recortou o papel verde (cor que escolheu para que tornasse seu

    trabalho menos frio) at ficar com 15cm e colou nos vazios.

    Trabalhou silenciosamente. Ao terminar, perguntei se queria comentar sobre o

    que tinha feito. Ed. comentou que, ao iniciar, tinha dificuldade em verbalizar, que

    havia confeccionado os quadrados que, para ele, representavam a maneira como se

    sentia: preso dentro dele como num labirinto, que j havia ultrapassado algumas

    dificuldades de relacionamentos e a transparncia do papel fez com que parecesse

    que ningum o estava enxergando.

  • 40

    Disse, ainda, que seu maior problema era a comunicao, que sentia como se

    seus anseios estivessem todos ali dentro do labirinto e que o seu desejo era sair do

    quadrado e passar para o crculo. Comentou que, a princpio, no sabia o que fazer,

    mas que, de repente, surgiram estes desenhos e que se sentia mais corajoso em

    relao comunicao aps compartilhar com os colegas e se abrir com os

    mesmos. Trabalhou as dificuldades relacionais consigo mesmo e com os outros.

    Ao final de todos os encontros, soltou a voz e comentou o que sentia em

    relao a si e aos outros, expondo seus sentimentos de ressentimento e tambm de

    amor. Finalizamos o encontro sabendo que grandes transformaes haviam ocorrido

    neste grupo.

    No ETC, que um exerccio de tcnica, detectei que a porta de entrada do

    atendimento aos jovens e adolescentes seria o afetivo-cognitivo, simblico,

    relacionando como agiam, o que pensavam sobre si mesmos e sua prpria

    concentrao.

    A seguir, observei como lidavam com os colegas, o grau de interesse ou at

    que pontos respeitavam o limite um do outro. Alm dessa observao no

    comportamento desses jovens, atentei para como se relacionavam com o material, o

    objeto e o que escreviam ou como se sentiam ao escrever.

    Na escrita, percebi uns trs jovens que no conseguiam achar a palavra inicial

    para a escrita, diferente do que acontecia com os desenhos, momento em que eram

    mais soltos e bem mais pessoais. Na pintura exerciam os movimentos com uma

    fluidez impressionante. Alguns sentiam dificuldade quanto ao primeiro risco,

    demonstrando-se livres depois do primeiro momento. Nos primeiros desenhos se

    expressaram como se estivessem pedindo socorro para sair de seus problemas

    existenciais.

    Os oito jovens e adolescentes mesmo parecendo responsveis por si mesmos

    e pelos colegas do lar em que vivem, senti ainda imaturidade quanto s prprias

    descobertas interiores. Quanto essa imaturidade Sheehy (2004, p.31) afirma que a

    maturidade provisria vai dos 18 anos aos 30 anos; a primeira maturidade dos 30

  • 41

    aos 45 anos, a segunda maturidade dos 45 aos 85 anos+. Adolescentes e jovens

    tm muito que aprender, pois a estrada ainda longa e cada um apresenta conflitos

    diferenciados, exigindo sonhos diversificados.

    A idade, em cada indivduo, apresenta caractersticas variadas. O autor diz que

    importante a possibilidade que se apresenta nos trs momentos que antecedem o

    ciclo da vida adulta. Talvez o medo do mundo l fora os deixava parecendo

    imaturos.

    Neste final de ano recebi um telefonema do coordenador do Pr-Vida, relatando

    a notcia maravilhosa de que os jovens atendidos passaram por uma transformao

    marcante: alguns voltariam para suas famlias de origem, alguns com emprego e

    perguntei se estavam bem e o coordenador falou que depois que foi feito todo

    aquele atendimento, os jovens tiveram um novo olhar sobre o mundo e o que

    pretendiam sobre este novo mundo que os cercava.

    Quando iniciaram os atendimentos, a viso de mundo no parecia promissora,

    mas hoje as suas perspectivas so melhores. Um dos jovens - o A. descobriu, ao

    ganhar uma mquina fotogrfica de presente, que vai se dedicar a fotografar

    pessoas.

    Para mim, como futura arteterapeuta, este primeiro momento foi um lance a

    mais na escada da vida e uma resposta concreta minha pergunta: H

    possibilidade do adolescente evoluir em arteterapia por meio do desenho, recortes,

    pintura e colagem? Confirmei neste estudo a possibilidade de ocorrer a evoluo do

    adolescente nas prticas arteraputicas.

    Ento, por meio destes indicadores, dediquei-me a estudar cada vez mais a

    teoria junguiana sobre a individuao e o desenvolvimento humano, pois somos

    capazes de ultrapassar barreiras da existncia, sabendo que podemos crescer e

    vivenciar momentos de delicadeza e percepo de ns mesmos.

    Trabalhei, ainda, num terceiro grupo de jovens e adultos, realizando quatro

    encontros no formato de um workshop com doze pessoas na Escola Superior Madre

  • 42

    Celeste ESMAC. Porm, apenas oitos comearam e terminaram todas as

    vivncias. Todos os participantes vivenciaram intensamente as atividades propostas.

    Iniciando com as sensibilizaes, o objetivo era a valorizar a respirao,

    movimentos com o corpo, percebendo e sentindo seu prprio corpo e o ambiente.

    Aps este movimento, passamos para outra fase: deitados no cho enumeram as

    partes do corpo, comeando pelos ps at chegar cabea. Finalmente, solicitei

    que colocassem as mos sobre o peito, sentindo as batidas do corao,

    mentalizando as cores e trazendo-as para o desenho.

    Na primeira noite que se sucedeu oficina, fiz a apresentao como

    ministrante arteterapeuta e sabendo que faria um trabalho ousado, pois seriam

    quatro dias consecutivos com vivncias que teriam comeo, meio e fim a cada dia

    das oficinas. Ento, neste primeiro dia, promovemos uma conversa para que

    percebssemos suas expectativas enquanto profissionais pedagogos e alunos que

    buscavam extinguir o estresse por meio da auto-expresso e a terapia, tendo como

    relevncia a experincia de um novo olhar como arte-educador, em sentir a arte de

    dentro do eu interior para fora e no como antes, ou seja, de fora para dentro.

    A problemtica elaborada neste grupo foi: Como organizar e reconstruir este

    grupo de alunos e pedagogos beira de um estresse e com baixa afetividade? O

    objetivo deste projeto foi criar momentos reflexivos e trocas de experincias,

    reconhecendo o prprio potencial criativo, estimulando a autoconfiana e a auto-

    estima.

    Todos os materiais utilizados foram acessveis e de fcil aquisio, para que

    pudessem tambm utilizar futuramente com seus alunos, pois este grupo formado

    de pedagogos e arte-educadores, alm de jovens da comunidade. Com este grupo

    houve uma ampliao maior quanto comunicao e expresso livre, aos smbolos

    criativos e conscincia de si mesmo.

  • 43

    IX - VIVNCIA CORPORAL - CAMINHAR PELA SALA

    SE PERCEBENDO NESTE AMBIENTE

    No momento em que est caminhando, observar e se integrar, concentrando-se

    em todo o ambiente, percebendo todo o material que ocupa o espao, a si prprio,

    sua pulsao, respirao. Aps este aquecimento, solicitei que deitassem sobre o

    cho para um relaxamento do corpo, enumerando as partes do corpo dos ps para a

    cabea, relaxando e sentindo a respirao profunda, colocando as mos um pouco

    abaixo do umbigo e sentindo a energia dessa respirao, primeiramente lenta e em

    seguida, profundamente. Aps este momento de reflexo interna, foi apresentado o

    material para que escolhessem conforme suas necessidades.

    9.1 Vivncia: Painel de Apresentao

    Neste grande painel, o grupo props a apresentao e nele escreveram seus

    nomes, profisso, idades, se tinham filhos, o estado civil, tipo de hobby. No centro do

    crculo foram colocados diversos materiais, como: canetas coloridas, giz de cera,

    pastel a leo e seco, revistas, colas coloridas, colas com gliter e outros.

    O foco do primeiro trabalho foi individual, utilizando papel sulfite, colagem de

    figuras, escrita de frases, escolha da melhor forma de se apresentar ao grupo. Ao

    final, todos compartilharam e se dirigiram ao grande painel, colando individualmente

    suas apresentaes.

    Na verbalizao, notei que havia afinidades entre as histrias de cada um: um

    jovem e uma jovem expuseram a sua vontade de ter um filho e, ao final, detectei que

    eram casados. Sobre o relaxamento, disseram ter mergulhado profundamente em si

    mesmos e descobriram afinidades que, at ento, com dez anos de casados

    passavam despercebidos e relataram como a magia do relaxamento trouxe maior

    proximidade entre eles. Ao finalizar a vivncia, o grupo disse uma palavra que

    deixou marcado aquele momento de encontro consigo mesmo.

  • 44

    Ao manusear este material compilado, com sensibilizao, deixei este grupo de

    pessoas bem vontade, liberando seus sentimentos. Observei que o material

    oferecido abriu-se num leque de opes, em que tiveram a oportunidade de

    expressar-se livremente, com a segurana de algum que deseja uma

    transformao no alcance de seus objetivos. Ao terminar a vivncia a palavra que

    marcou esse dia foi sublimao.

    De modo geral, a questo detectada foi o desejo de reconstruo, tendo como

    porta de entrada do Continuum das Terapias Expressivas - ETC que d

    embasamento para que haja um desenvolvimento no trabalho teraputico.

    Nessa oficina percebi o quanto s pessoas estavam carentes e em busca de

    preencher o corao, revalorizando contedos at ento congelados pelo tempo.

    Nesse processo criativo e meditativo foram trabalhados os aspectos

    afetivos/cognitivos.

    Em meio ao caos emocional percebido, disseram que apreenderam a

    compartilhar seus sonhos e tristezas com os colegas do grupo. Vivenciaram

    momentos antes no vividos no cotidiano e, naquele instante despertaram para o

    sentir os outros como parte integrante deste universo to grande, com

    peculiaridades diferentes.

    Houve casos significativos na oficina criativa, como o da jovem AL. que passou

    a vida toda se escondendo, dizendo que jamais pensava que poderia se

    desvencilhar de um problema nos quatro dias em que participou da oficina de ateli

    teraputico: chamou-o de encasulamento. Contou que sempre viveu momento de

    angstia, por se sentir muito sozinha, mesmo quando estava rodeada de pessoas,

    no tendo coragem de falar de si mesma. E disse que os desenhos e pinturas

    fizeram vir tona este sentimento e a tornara livre, leve e mais solta.

    A oficina revelou ao grupo suas imagens internas, demonstrando a importncia

    da solidariedade, de nos colocarmos disponveis a sermos ouvintes da necessidade

    do outro. O nvel criativo enfatiza a sintetizao e as foras de auto-realizao do

    ego e do EU. (ALLESSANDRINI 2003, p.18).

  • 45

    Dentre outros momentos de vivncia, AL. se deixou envolver pela

    sensibilizao, se aprofundando no exerccio respiratrio, relaxando profundamente

    por meio da msica com sons de rios, buscando em si mesma a necessidade de se

    libertar de sentimentos antigos.

    Trabalhou as linhas da vida, nas quais cada parte lembrava um fato ocorrido

    entre trs e seis anos de idade. Para as linhas sinuosas, utilizou areia colorida no

    tom azul ultramar e para fazer as linhas o tubo de cola cascorez, desenhando com o

    bico da cola. Depois, derramou a areia sobre a cola, em cada parte objeto ou outra

    cor de areia. Marcando um ponto de recordao, desenhou no canto do papel uma

    borboleta amarela.

    Terminado esse momento de conversa interior entre o pensar e o fazer A.

    resolveu compartilhar com o grupo seus anseios. Contou que um dos fatos que ficou

    marcante em sua vida se deu aos seis anos de idade. Ela era filha nica quando sua

    me resolveu ter outro beb e um dia A. pegou o beb com sete meses e foi passear

    com ele, retirando-o do carrinho. Sua me viu, ela se assustou, ficou com medo e

    correu para se esconder debaixo da cama. Foi ento que A. descobriu a origem de

    sua timidez e de nunca se abrir para contar seus problemas. E disse que a borboleta

    representava o desvencilhar de sua timidez para a liberdade.

    Dois estudos viabilizaram-me a compreender a timidez dos dois jovens: AL e

    ED, cada um no seu mundo. AL. com sua famlia bem estruturada e ED., sem famlia

    e criado por pessoas do lar acolhedor, desde os dez anos de idade e com

    dificuldade em falar e expressar seus sentimentos.

    AL. pelo susto que tomou quando criana, sendo tolhida de sua liberdade e,

    naquele exato dia, com uma simples vivncia, conseguiu rever o que a fazia sofrer,

    desprendendo-se de seu ser, pois deu a si mesma sua resposta.

    ED, com a vivncia do vitral percebeu o grau de dificuldade que encontrava em

    verbalizar o que sentia, conseguiu organizar as idias e expor s pessoas de seu

    convvio, dizendo que se sentia livre e no se sentia mais preso em si mesmo.

  • 46

    Nestes dois estudos percebi como fatores internos interferem e perturbam o

    desenvolvimento do ser humano.

    Com base nestes estudos, vejo quanto os jovens se sentem perturbados com

    coisas que aconteceram em suas infncias e a busca por respostas que propiciem

    um novo sentido s suas existncias, atitudes e valores.

    De acordo com Jung (1977 p.166):

    Se o desenvolvimento da conscincia for perturbado no seu desabrochar natural, a criana, para escapar s suas dificuldades externa e interna, isola-se em uma fortaleza ntima. Quando isso acontece, seus sonhos e seus desenhos, que do ao material inconsciente uma expresso simblica, revelam de maneira invulgar a recorrncia de um tipo de motivo circular, quadrangular ou nuclear. Centro vital da personalidade do qual emana todo o desenvolvimento estrutural da conscincia.

    Todos os jovens e adolescentes foram perturbados por no terem sido criados

    e educados por seus pais desde bebs at sua vida atual, mesmo tendo encontrado

    pessoas que lhes deram suporte e proteo. As marcas so perceptveis na carncia

    pelo desejo do conjunto familiar, tanto neles quanto em muitos outros que

    desconhecemos, pois esto imersos num universo que s pertence a eles. No

    difcil, mas custoso para um jovem encontrar o equilbrio total, mediante todas as

    crises que sucederam os caminhos percorridos.

    Jung (1977) discorre que o jovem se desperta gradativamente, caracterizado

    pela conscincia de si mesmo e de seu mundo. durante a infncia que se torna

    intensa a fase emocional, nascendo os primeiros sonhos e nas vivncias que os

    adolescentes sempre descrevem sua infncia e seus desejos infantis. Como toda

    criana, possuem sonhos de brincar com brinquedos diferentes: carrinho controle

    remoto, viajar de avio, lpis de cores e um caderno de desenho - todos os sonhos

    que crianas com melhor poder aquisitivo tm. E nesse momento que se encontra

    a [...] estrutura bsica simblica, indicando como mais tarde ela ir modelar o

    destino do indivduo (Op.cit., p.165).

  • 47

    X - SOMOS PARTE DO TEMPO E HORIZONTE EM EVOLUO CONSTANTE...

    (CONSIDERAES FINAIS)

    Na Arteterapia foi bem fcil detectar por quais caminhos percorri e quem pingou

    a tinta para influenciar este estudo. Porm, ficou claro que uma parcela do saber

    adquirido se deu na observao e nas vivncias das oficinas criativas, desenvolvidas

    no decorrer do estgio.

    A energia gerada por todos os docentes que, pouco a pouco, semearam e

    apresentaram teorias e ensinamentos a respeito da Arteterapia enriqueceram meu

    aprendizado teraputico.

    As vivncias em sala de aula somadas ao estgio se constituram em smbolos

    que se projetaram quando buscava a evoluo dos adolescentes por meio da

    Arteterapia. E essa projeo se argumentou incessantemente nas possibilidades e

    formas propostas a cada encontro, amadurecendo a minha percepo quanto ao

    fato de observar e acompanhar o desenvolvimento global de cada adolescente

    atendido. Tenho conscincia de que cedo para ter esta certeza, porm, ainda

    tenho uma longa jornada de aprendizado que vir com novos momentos

    arteteraputicos.

    Se atentarmos para o fato de que a percepo um meio pelo qual articulamos

    e transformamos os saberes e que a arteterapia no se restringe somente ao carter

    formal, mas tambm ao prprio comportamento que o individuo precisa adquirir,

    sinto que todos os caminhos percorridos me fizeram amadurecer tanto para

    problematizar quanto para criar solues que, ao longo do estgio, se configuraram.

    Salles (1998.p.90), diz que:

    A percepo artstica, como atividade criadora da mente humana, um dos momentos em que se percebem aes transformadoras. O filtro perceptivo vai processando o mundo em nome da criao da nova realidade que a obra de arte oferece. A lgica criativa consiste em formao de um sistema que gera significado. A partir de caracterstica que o artista lhe concede,

  • 48

    a construo de mundos mgicos decorrentes da estimulao internas e

    externas recebidas por meios de lentes originais.

    Quanto magia que tomou conta de meu despertar enquanto arteterapeuta foi

    proporcionada pelas expresses contidas nas vivncias e tiveram elaboraes

    tericas na percepo, observao, unificao do real ao meu imaginrio, ao meu

    fazer criativo integrado com os diversos nveis de expresso contidos nos dois anos

    da especializao, na convivncia com os mestres que me conduziram busca de

    conhecimentos, apontando caminhos que me levassem, no a um fim comum na

    concluso do curso, mas abertura de novos horizontes que pudessem fazer a

    minha vida mais desejante, com muito mais perspectivas.

    As expresses que os adolescentes elaboraram foram se conduzindo conforme

    suas necessidades e pelos meus estudos, no desejo em ajud-los a se encontrarem.

    As linhas e cores eram aplicadas em diferentes tonalidades que se ligavam aos

    componentes somticos e motores da vivncia e da expresso, ao nvel

    cinestsico/sensorial e se transformaram em imagens por meio da forma.

    Percebi que os adolescentes e jovens exploraram cada etapa, considerando a

    sensibilidade no contexto dos desenhos e da massa argila, mantendo o foco para

    suas reaes, sensaes, interesse, seus ritmos lentos ou mais acelerados.

    Mantive-me como um a guardi consciente sobre o que viria a acontecer: suas

    dificuldades e discernimentos quanto compreenso de seus movimentos internos.

    A ansiedade tomou conta de mim dia aps dia durante todo o percurso do estgio.

    Lembro-me bem de um dos momentos mais bonitos: foi quando levei sucatas

    para criao dos bonecos em garrafas descartveis, em que passaram por etapas:

    criar bonecos, reunir em equipe, criar uma histria, o cenrio e o momento da

    apresentao. Fiquei encantada com a criatividade dos adolescentes. Esse toque de

    vivncia me conduziu sensoriabilidade e percepo dos acontecimentos que

    perpasavam por mim, sentindo a emoo dos meninos e meninas em seus

    momentos de liberdade e ao.

  • 49

    Essa experincia e a vivncia so frutos que se propagaram em meu

    desenvolvimento e em minha compreenso de que a percepo um complicado

    fenmeno que sofre diferente evoluo interior de minha realidade, enquanto

    pesquisadora, em contraponto s oscilaes de um determinado momento, pois as

    dvidas que surgiam pareciam infinitas e sem respostas.

    Muitos questionamentos me foram suscitados interiormente e propus a mim

    mesma: disciplina entre a transio, a leitura das teorias e o fazer, elaborando as

    vivncias e a transcrio do processo de trabalho. Portanto, emergiu em mim um

    potencial que foi se tornando um componente ativo de meu fazer cotidiano, pois me

    sinto mais preparada para idealizar e concretizar os meus estudos, percebendo as

    transformaes que os desenhos e modelagens proporcionam em cada gesto e

    movimento das pessoas atendidas.

    Mas o que mais me chamou ateno foi o fato de trabalhar, primeiramente, o

    no verbal, observando nos desenhos dos adolescentes a desenvoltura para uma

    nova elaborao e, ao mesmo tempo, comecei a perceber que, a cada encontro

    repensava a necessidade do desdobramento para complementar o encontro

    passado, analisando cada etapa concluda.

    Passei a olhar a Arteterapia por um novo ngulo. As vivncias construdas e

    desconstrudas me impulsionaram a novas realizaes. Sei que ainda preciso

    estudar muito, mas creio que esta especializao ampliou os meus conhecimentos,

    conceitos, significaes, formas de ver e materializar os meus sonhos, o meu

    imaginrio e os de outras pessoas que me foram e so queridas.

    Para Ostrower (1977 p.70).

    No trabalho o homem intui. Age, transforma, configura, intuindo. O caminho em toda tarefa ser novo e necessariamente diferente. Ao criar, receber sugesto da matria que est sendo ordenada e se altera sob suas mos, nesse processo configurador o indivduo se v diante de encruzilhadas. A todo instante, ele ter que se perguntar: sim ou no, falta algo, sigo ou paro... A partir de noes intelectuais, conhecimentos familiares sua mente... Decidir baseando-se numa empatia com a matria via articulao.

  • 50

    As possibilidades foram muitas e aprendi a ir sempre em busca de mais,

    sempre mais... Construindo, reconstruindo, desconstruindo saberes, pois a vida

    um tempo que se move.

    bem verdade que o avano da cincia faz com que o homem tenha uma nova

    viso, como uma pessoa de mente flexvel, aberta e disponvel para novas

    articulaes, procurando resolues para vrias questes e dvidas. E foi nesta

    perspectiva que parti em busca de levantamento das possibilidades, envolvendo os

    adolescentes e sua evoluo por meio dos desenhos, pinturas, recortes, colagens e

    modelagens, levando os adolescentes, por meio de materiais simples, a alarem

    vos teraputicos como resultados deste estudo.

    A relevncia desta pesquisa se direciona especificamente ao adolescente,

    podendo atingir os jovens e adultos de toda Regio Amaznica, ainda carente neste

    contexto, pois descrevo o processo e as descobertas que aconteceram neste

    percurso.

    Ademais, foi uma pesquisa que respeitou todos os passos necessrios

    comprovao cientfica, pois segui os caminhos que foram direcionados pela

    coordenadora e a co-orientadora, in locum, colhendo dados, vivenciando, por vezes

    desconstruindo, reconstruindo, elementos que considero indispensveis a um bom

    arteterapeuta: a capacidade de transformar, no s as matrias ou os indivduos

    envolvidos no processo, mas primordialmente, a si mesmo. E na pesquisa em

    Arteterapia nada disso diferente: vale, sim, o respeito s regras cientificas.

    A importncia desse desenvolvimento se confirmou na possibilidade e

    construo do conhecimento tcito, se revelando verdadeira e necessria

    componente da ao imaginativa e criativa.

    Neste nterim, socializei-me com a coordenadora e a co-orientadora, recebendo

    informaes sobre a necessidade e importncia do equilbrio no processo

    teraputico, para que pudesse realizar, de maneira tranqila, este meu caminhar,

    mesmo com todos os desafios, que s serviram de estmulo, na medida em que j

  • 51

    havia decidido partir em busca de meu desenvolvimento, tanto cognitivo quanto

    afetivo/emocional, relacionando cada vivncia, cada adolescente presente em

    minhas experincias como futura arteterapeuta.

    Somos tempo e horizonte em constante evoluo, envoltos no processo dos

    mistrios da essncia, que nos permite pensar sempre: somos gua, terra, fogo e ar

    em eterna ebulio. O horizonte inalcanvel de nossas memrias hbridas tem

    cheiro de tempo... de sonhos, de eterno prosseguir. E assim, no finalizo este texto,

    pois para mim tudo fica at um novo reencontro, at o novo percurso que somente o

    tempo permitir ver chegar.

  • 52

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    ALLESSANDRINI, Cristina Dias.Tramas Criadoras na construo do ser si mesmo. So Paulo: Casa do Psiclogo, 1999. _________________________. Anlise Microgentica da Oficina Criativa: Projeto de Modelagem em Argila. So Paulo: Casa do Psiclogo, 2004.

    ARTIGO.http://paginaseducao.no.sapo.pt/Caractersticas dos 13 a 16anos.

    02/05/2005.GESSEL,Psicologia Evolutiva de 1 16 aflos,ed.Paids Aires,1963.

    FERGUSON, M., A conspirao Aquariana. Rio de Janeiro. Editora Record, 1980. JUNG, C.G. O homem e seus Smbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977.

    MIGLIORI, Regina de Ftima et al. tica, valores humanos e transformao. So Paulo: Fundao Petrpolis, 1998.

    OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processo de Criao. 6 ed. So Paulo: Vozes, 1977.

    PAN, Sara.Teoria e tcnica de arte-terapia: a compreenso do sujeito. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1996.

    SALLES, Ceclia Almeida. Gesto Inacabado Processo de criao Artstica. So Paulo: Fapesp: Annablume, 1998.

    TIBA, Iami. Quem Ama Educa! So Paulo: Editora Gente, 2002.

    WINNICOTT.D.W. Tudo comea em casa. In: O conceito de Indivduo Saudvel; Vivendo de Modo Criativo; A imaturidade do adolescente. So Paulo: Martins Fontes, 1989.

    .

  • 53

    ANEXO

  • 54

    ANEXO A - Grupo MEL: Encontro 01 - 27 / 04 / 2004

    Neste primeiro encontro nos reunimos em crculo e fizemos levantamento das

    necessidades do grupo: apresentao atravs da confeco de um crach, na qual

    deveria se colocar um a