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A TEORIA DO AUTOCUIDADO E SUA APLICABILIDADE PARA A
ENFERMAGEM NO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA (PSF)
THE THEORY OF SELF-CARE AND ITS APPLICABILITY TO THE NURSINGN IN
THE FAMILY HEALTH STRATEGY (FHS)
Maria Izabel dos Santos Nogueira1
Magna Maria Pereira da Silva2
Ádala Nayana de Sousa Mata3
1Aluna especial do mestrado do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Especialista em Enfermagem em
Dermatologia pela Faculdade Integrada de Patos. Enfermeira do Programa Saúde da Família
do Município de Santana do Matos/ Rio Grande do Norte. Natal, Rio Grande do Norte, Brasil.
Email: [email protected]
2Mestre do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Natal, Rio Grande do Norte, Brasil.
3Mestre do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte. Natal, Rio Grande do Norte, Brasil.
RESUMO Trata-se de um estudo de intenção epistemológica acerca da teoria do autocuidado de
Dorothéa Orem e suas contribuições para o conhecimento e prática de enfermeiros que atuam
no “Programa Saúde da Família” (PSF) no Brasil. Aplicaram-se leituras e reflexões quanto às
diretrizes e propostas do PSF para perceber a interface entre os dois paradigmas em estudo.
Identificou-se haver coerência entre as duas propostas de abordagem, possibilitando a adoção
dos ensinamentos de Orem na prática do PSF, no sentido da enfermagem obter maiores e
melhores resultados de suas ações, principalmente na qualidade de sua assistência junto aos
pacientes.
PALAVRAS CHAVES: Enfermagem; Autocuidado; Saúde da família.
ABSTRACT
This is a study of epistemological intention about the theory of Dorothea Orem's self-care and
their contributions to the understanding and practice of nurses working in the "Family Health
Strategy" (FHS) in Brazil. Applied to reading and reflection on guidelines and proposals of
the FHS to understand the interface between the two paradigms in the study. Identified to
ensure consistency between the two proposed approach, allowing the adoption of the
teachings of Orem in the practice of PSF in the direction of nursing to get bigger and better
results of their actions, particularly in the quality of its assistance to patients.
KEY WORDS: Nursing; Self-care; Family health
1
INTRODUÇÃO
A profissão de enfermagem enfrentou e ainda enfrenta, assim como outras
profissões, as conseqüências oriundas do rápido avanço tecnológico e científico das
últimas décadas. Como resultados desse avanço surgiram nas décadas de 1950 e 1960,
as primeiras teóricas de enfermagem, concebidas por profissionais que se preocupavam
em compreender e descrever suas funções, seus papéis, tornando, assim, entendida a
atuação da enfermagem. Essas teoristas buscavam identificar um campo conceitual
próprio para a profissão, desatrelado, principalmente, do modelo médico1.
Iniciando o terceiro milênio, percebe-se que a aplicação de uma teoria na
prática da enfermagem parece representar um interesse crescente por parte dos
enfermeiros. O uso da teoria apoia os enfermeiros na definição de seus papéis, no
melhor conhecimento da realidade e conseqüente adequação e qualidade do
desempenho profissional, proporcionando aos clientes/pacientes submeter-se a
procedimentos e cuidados com menos danos possíveis. As teorias desafiam as práticas
existentes, criando novas abordagens e remodelando a estrutura de normas e princípios
vigentes1.
Nesse sentido, um estudo sobre a prática assistencial junto a idosos por
enfermeiras, no contexto da Atenção Básica, identificou que a visão de Dorothéa Orem
sobre a enfermagem é um sistema de ajuda para o autocuidado, quando o individuo não
tem condições de suprir seus próprios requerimentos e sua proposta de se estabelecer
uma interação entre enfermeiro e cliente através de sua teoria do autocuidado, parece ser
coerente com as diretrizes e metas do Programa Saúde da Família (PSF)2.
O PSF é uma proposta de reorientação do modelo assistencial brasileiro, criado
em 1994, pelo Ministério da Saúde3. Tem seu enfoque voltado para a relação com a
comunidade, assumindo o compromisso de prestar assistência universal, integral,
equânime, contínua e resolutiva à população, em conformidade com suas reais
necessidades. Busca, todavia, a satisfação do usuário através do estreito relacionamento
dos profissionais com o indivíduo, família e comunidade4. Segundo a portaria do
Ministério da Saúde, deve haver uma equipe multiprofissional responsável por, no
máximo, 4.000 habitantes, sendo a média recomendada de 3.000 habitantes, com
jornada de trabalho de 40 horas semanais para todos os seus integrantes e composta por,
no mínimo, médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem ou técnico de enfermagem e
Agentes Comunitários de Saúde5. Assim, o PSF representa um campo emergente à
atuação do enfermeiro no nível nacional. Na última década, o número de enfermeiros
atuantes nos diversos recônditos deste país intensificou-se consideravelmente, o que em
parte se deve a implantação destas equipes.
Observa-se que o enfermeiro tem papel fundamental neste processo, como
membro da equipe interdisciplinar, sempre considerando o paciente como um ser
individual com uma história de vida própria, com características próprias, que podem
determinar de forma decisiva as capacidades funcionais e psicossociais preservadas para
serem trabalhadas na sua reabilitação6.
Com este mesmo pensamento a teoria de Dorothéa Orem publicada em 1985,
descreve, que as pessoas desejam e podem se tornar aptas ao seu autocuidado, podendo
os profissionais de Enfermagem assumir esta tarefa quando não estão em condições de
fazê-lo. A atuação do enfermeiro mediante a compreensão de que o ser humano deve
ser visto em três requisitos de autocuidado (universais, desenvolvimentais e nos desvios
da saúde), cuja interação enfermeiro-pessoa é fundamental para o estabelecimento e
2
alcance de metas de saúde, propiciando o desenvolvimento de potencialidades no
cliente, pessoa e comunidade7.
Diante do exposto, decidiu-se pela realização do presente estudo, que tem por
objetivo fazer uma análise crítica da teoria do autocuidado de Orem e demonstrar se há
integração entre sua estrutura conceitual e os pressupostos básicos do PSF.
Essa busca permite, portanto, inferir que o presente trabalho é inovador e
bastante contributivo para a enfermagem, uma vez que poderá sugerir um referencial
teórico para ser aplicado em uma área de ampla atuação dos enfermeiros.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo de intenção epistemológica acerca da teoria do
autocuidado proposta por Dorothéa Orem e suas contribuições para o conhecimento e
prática de enfermeiros que atuam no PSF. Como método de trabalho foram realizadas
consultas bibliográficas, leituras e reflexões a respeito das diretrizes do PSF e da
estrutura conceitual de Orem.
Foram efetuadas buscas na Biblioteca Regional de Medicina (BIREME),
especificamente na Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (LILACS) e
Scielo no intervalo de 1999 a 2009, na intenção de encontrar trabalhos aplicando a
teoria de Orem no contexto do PSF – Brasil ou outros programas semelhantes. No
Scielo foram encontradas doze publicações aplicando teorias de enfermagem,
entretanto, apenas uma mencionava a teoria de Orem, cujo foco foi sua aplicabilidade
no processo de enfermagem através de um estudo de caso em uma adolescente grávida
acompanhada por uma unidade da saúde8. Já na LILACS, foram encontradas dez
publicações aplicando teoria do autocuidado de Orem, onde duas se aplicavam ao
estudo: uma aplicou a atuação da enfermagem na prevenção de complicações em
pacientes hipertensos propondo intervenções de enfermage9; a segunda aplicou a teoria
na prestação da assistência de enfermagem à clientela idosa seus familiares e/ou
cuidadores com enfoque na promoção do autocuidado2.
O relato do estudo foi descrito em duas fases: a primeira, que trata da análise
da teoria de Orem, baseada em Leopardi e George; e a segunda que confronta a teoria
de Orem com as propostas do PSF7,10
.
RESULTADOS
Teoria do autocuidado de Dorothea Orem
A teoria do autocuidado de Orem engloba o autocuidado, a atividade de
autocuidado e a exigência terapêutica de autocuidado. O autocuidado é a prática de
atividades iniciadas e executadas pelos indivíduos em seu próprio benefício para a
manutenção da vida e do bem-estar. A atividade de autocuidado constitui uma
habilidade para engajar-se em autocuidado. A exigência terapêutica de autocuidado
constitui a totalidade de ações de autocuidado, através do uso de métodos válidos e
conjuntos relacionados de operações e ações10
.
Para Orem, segundo Leopardi, o autocuidado é a prática de atividades que o
indivíduo inicia e executa em seu próprio benefício, na manutenção da vida, da saúde e
do bem-estar. Tem como propósito, as ações, que, seguindo um modelo, contribui de
maneira específica, na integridade, nas funções e no desenvolvimento humano. Esses
propósitos são expressos através de ações denominadas requisitos de autocuidado7.
3
São três os requisitos de autocuidado ou exigências, apresentados por Orem:
universais, de desenvolvimento e de desvio de saúde. Os universais estão associados a
processos de vida e à manutenção da integridade da estrutura e funcionamento
humanos. Eles são comuns a todos os seres humanos durante todos os estágios do ciclo
vital, como por exemplo, as atividades do cotidiano. Os requisitos de desenvolvimento
são as expressões especializadas de requisitos universais que foram particularizados por
processos de desenvolvimento, associados a algum evento; por exemplo, a adaptação a
um novo trabalho ou adaptação a mudanças físicas. O de desvio de saúde é exigido em
condições de doença, ferimento ou moléstia, ou pode ser conseqüência de medidas
médicas exigidas para diagnosticar e corrigir uma condição7,10
.
Dessa forma, Polit e Hungler (1995), afirmam que a capacidade que o
indivíduo tem para cuidar de si mesmo, é chamada de intervenção de autocuidado, e a
capacidade de cuidar dos outros é chamada de intervenção de cuidados dependentes.
Sendo assim, no modelo de Orem, a meta é ajudar as pessoas a satisfazerem suas
próprias exigências terapêuticas de autocuidado11
.
Portanto, a teoria do autocuidado de Orem segundo autores, tem como
premissa básica, a crença de que o ser humano tem habilidades próprias para promover
o cuidado de si mesmo, e que pode se beneficiar com o cuidado da equipe de
enfermagem quando apresentar incapacidade de autocuidado ocasionado pela falta de
saúde7,10
.
A teoria de déficit de autocuidado
A teoria de déficit de autocuidado constitui a essência da teoria de Orem,
quando a enfermagem passa a ser uma exigência a partir das necessidades de um adulto,
e quando o mesmo acha-se incapacitado ou limitado para prover autocuidado contínuo e
eficaz12
.
Assim, Orem identificou cinco métodos de ajuda: 1) agir ou fazer para o outro;
2) guiar o outro; 3) apoiar o outro (física ou psicologicamente); 4) proporcionar um
ambiente que promova o desenvolvimento pessoal, quanto a tornar-se capaz de
satisfazer demandas futuras ou atuais de ação; e 5) ensinar o outro7,10
.
A teoria de sistemas de enfermagem
O sistema de enfermagem planejado pelo profissional está baseado nas
necessidades de autocuidado e na capacidade do paciente para a execução de atividades
de autocuidado. Para satisfazer os requisitos de autocuidado do indivíduo, Orem
identificou três classificações de sistemas de enfermagem que são os seguintes: o
sistema totalmente compensatório, o sistema parcialmente compensatório e o sistema de
apoio-educação12
.
O sistema de enfermagem totalmente compensatório é representado pelo
indivíduo incapaz de empenhar-se nas ações de autocuidado. O enfermeiro, através de
suas ações, vai atuar na ação limitada do paciente conseguindo o autocuidado do
mesmo, compensando sua incapacidade para a atividade de autocuidado através do
apoio e da proteção ao paciente7,10
.
O sistema de enfermagem parcialmente compensatório está representado por
uma situação em que, tanto o enfermeiro, quanto o paciente, executam medidas ou
outras ações de cuidado que envolve tarefas de manipulação ou de locomoção. Através
de sua ação, o enfermeiro efetiva algumas medidas de autocuidado pelo paciente,
compensa suas limitações de autocuidado atendendo o paciente conforme o exigido. O
4
paciente age realizando algumas medidas de autocuidado que regulam suas atividades e
aceita atendimento e auxílio do enfermeiro7,10
.
O sistema de enfermagem de apoio-educação ocorre quando o indivíduo
consegue executar, ou pode e deve aprender a executar medidas de autocuidado
terapêutico, regula o exercício e desenvolvimento de suas atividades de autocuidado, e o
enfermeiro vai promover esse indivíduo a um agente capaz de se autocuidar7,10
.
O processo de enfermagem de OREM
O processo de enfermagem proposto por Orem, em George (2000) e Leopardi
(1999), compreende os seguintes passos:
Passo 1 - fase de diagnóstico e prescrição, que determina as necessidades ou
não de cuidados de enfermagem. O enfermeiro realiza a coleta de dados do indivíduo.
Os dados específicos são reunidos nas áreas das necessidades de autocuidado, de
desenvolvimento e de desvio de saúde do indivíduo, bem como, o seu inter-
relacionamento. São também coletados dados acerca dos conhecimentos, habilidades,
motivação e orientação da pessoa7,10
.
Passo 2 - é a fase do planejamento dos sistemas de enfermagem, bem como do
planejamento da execução dos atos de enfermagem. O enfermeiro cria um sistema que
seja totalmente compensatório, parcialmente compensatório ou de apoio-educação. As
duas ações envolvidas no planejamento dos sistemas de enfermagem seriam: a) a
realização de uma boa organização dos componentes das exigências terapêuticas de
autocuidado dos pacientes; b) a seleção da combinação de maneiras de auxílio que
sejam, ao mesmo tempo, efetivas e eficientes na tarefa de compensar ou sobrepujar os
déficits de autocuidado dos pacientes. Com a utilização do modelo de Orem, as metas
são compatíveis com o diagnóstico de enfermagem, capacitando o paciente a tornar-se
um verdadeiro agente de autocuidado7,10
.
Passo 3 - inclui a produção e execução do sistema de enfermagem, onde o
enfermeiro pode prestar auxílio ao indivíduo (ou família) no que se refere ao
autocuidado, de modo a alcançar resultados identificados e descritos de saúde. O passo
3 inclui a evolução, onde, juntos, paciente e enfermeiro, realizam a avaliação. A
evolução é um processo contínuo, e é fundamental que o enfermeiro e o paciente
avaliem quaisquer modificações nos dados que afetariam o déficit de autocuidado, o
agente de autocuidado e o sistema de enfermagem7,10
.
Interface da Teoria de Orem com as diretrizes do PSF
Ao longo de seu trabalho, Orem interpreta o metaparadigma de enfermagem
dos seres humanos, saúde, enfermagem e sociedade. Dessa forma, iniciamos por
analisar o metaparadigma desta teorista realizando uma interface com o Programa
Saúde da Família.
Seres humanos são diferenciados das outras coisas vivas por sua capacidade de
refletir sobre si mesmo e seu ambiente, simbolizar o que eles experimentam e usar as
criações simbólicas (idéias, palavras) para pensar, comunicar-se e orientar os esforços
para fazer coisas que são benéficas para si e para os outros. O funcionamento humano
integrado inclui os aspectos físicos, psicológicos, interpessoais e sociais. Orem acredita
que os indivíduos têm o potencial para aprender e desenvolver-se. A forma como o
individuo preenche as necessidades de autocuidado não são instintivas, mas um
comportamento aprendido. Os fatores que afetam o aprendizado incluem a idade, a
capacidade mental, a cultura, a sociedade e o estado emocional do individuo. Se o
5
individuo não pode aprender as medidas de autocuidado, outros devem aprender e
proporcioná-los10
. Da mesma forma se apresenta a proposta do PSF, voltada a que os
enfermeiros possam criar condições para o desenvolvimento de potencialidades das
pessoas, de suas famílias e da comunidade, acreditando que estas podem e devem
exercer o controle social sobre os serviços de saúde e se autocuidarem.3,6
Em George (2000), Orem apoia a definição de saúde da Organização Mundial
de saúde como estado de bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência da
doença ou da enfermidade. Ela constata que os aspectos físico, psicológico, interpessoal
e social são inseparáveis no individuo. Orem também apresenta a saúde com base no
conceito de cuidado preventivo de saúde. Esse cuidado inclui a promoção e a
manutenção da saúde, o tratamento da doença ou da lesão e a prevenção de
complicações10
. Este conceito evidencia a importância atribuída à participação do
cliente no processo saúde-doença, e que em concordância com a orientação do PSF,
ressalta o caráter da auto-gestão da saúde e a visão do indivíduo como um ser que está
constantemente recebendo influências internas e externas, uma vez que está imersa em
sistemas interatuantes6.
A sociedade não foi definida especificamente para a teoria do autocuidado,
apesar de ser indicado como um dos conceitos principais da estrutura conceitual de
sistemas e compreendido como um sistema organizado e delimitado de regras sociais,
comportamentos e práticas desenvolvidas para manter valores e mecanismos que
regulam as práticas e as regras. Foi afirmado que o modelo de sistemas proposto por
Orem parece ideal para estudar seres humanos e saúde em interação com a sociedade e
o ambiente, justo por considerar a complexidade das organizações dos serviços de saúde
e seu contexto sócio-cultural7,10
. Esse é o cenário no qual o PSF deve ser implementado,
uma vez que o programa tem a família, no espaço social, como núcleo central de
abordagem, bem como o estímulo à organização da comunidade6.
Orem fala de vários fatores relacionados com o conceito de enfermagem onde é
considerado como um processo de ação, reação e interação, pelo qual enfermeira e
cliente compartilham informações sobre suas percepções, em uma determinada situação
de enfermagem. Aqui a teórica destaca os clientes como agentes potencialmente capazes
de promoverem ações de saúde, a partir de oportunidades e estímulos desencadeados
por intervenções adequadas de enfermagem7,10
. No PSF, os enfermeiros são orientados
para ampliar e fortalecer o vínculo com os clientes, pois sendo co-responsáveis pela
saúde da população adstrita, cabe-lhes interagir de maneira a reconhecerem as reais
necessidades e potencialidades da comunidade, através de um processo de interação e
troca permanente de saberes13
.
Passando a analisar a teoria de Orem e realizando um paralelo com o Programa
Saúde da Família pode-se considerar que a promoção da saúde é a grande meta do PSF,
tendo, portanto, como pilar de sustentação a informação em saúde, tornando-se evidente
a importância da interação enfermeiro-cliente neste processo, assim como sua
capacidade de autocuidar-se6,13
. Além deste aspecto, é sabido que a interação é um
fenômeno presente em todas as ações de enfermagem, ganhando especial atenção no
contexto do PSF, porque nele é esperado do enfermeiro ter um conhecimento
aprofundado dos traços de sua população adstrita13
.
A teoria de enfermagem de Orem proporciona uma base compreensiva para a
prática de enfermagem. Tem utilidade para a enfermagem profissional nas áreas de
educação, prática clínica, administração, pesquisa e sistemas de informação de
enfermagem10
. O fundamento básico do PSF é a participação comunitária, uma
6
atividade, portanto, da enfermeira, como membro da equipe. Entende-se por
participação, a democratização do conhecimento do processo saúde/doença e dos
serviços, estimulando a organização da comunidade, para o efetivo exercício do
controle social, na gestão do sistema. Neste sentido, afirma-se ser fundamental a
participação do cliente, como elemento ativo nas ações de saúde, para que as metas
estabelecidas sejam alcançadas, para tanto ser necessária a adequada atuação de
enfermagem6.
O enfermeiro pode se utilizar desse conceito para valorizar a percepção dos
clientes, com relação à sua experiência de vida e de saúde-doença, quer seja no contexto
pessoal ou no contexto mais amplo da família e da comunidade, conduzindo-os ao
exercício do autocuidar-se, papel prioritário dos que integram as equipes do PSF. Sobre
essa questão acrescenta-se que os enfermeiros estão em uma posição para investigarem
o que as pessoas sabem sobre sua saúde, o que elas pensam sobre a sua saúde e como
elas agem para mantê-la; é neste sentido que o PSF determina o território para a atuação
das equipes, de forma a proporcionar um conhecimento pleno das percepções das
pessoas sobre sua saúde e qualidade de vida6.
É importante salientar que a teoria de Orem define que a enfermagem é
necessária quando o individuo não consegue manter, continuamente, a quantidade e a
qualidade de autocuidado necessários para sustentar a vida, recuperar-se da doença ou
da lesão ou enfrentar os seus efeitos7,10
. No exercício da enfermagem, no contexto do
PSF, é importante que enfermeiros e clientes se percebam como seres que têm uma
individualidade e características próprias, sendo conduzidos a um crescimento mútuo, a
partir de uma interação proposital.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teoria de autocuidado de Orem tem aplicação à prática de enfermagem. Tem
sido aplicada por clínicas de enfermagem em uma série de circunstâncias. Ela tem sido
usada como base dos currículos de escolas de enfermagem e do sistema de informação
de enfermagem.
A teoria de enfermagem de déficit de autocuidado de Orem continua a evoluir.
Seu uso disseminado reflete sua utilidade para enfermagem profissional. Esta teoria
fornece uma maneira exclusiva de ver o fenômeno da enfermagem. O trabalho de Orem
contribui, significativamente, para o desenvolvimento das teorias de enfermagem.
Uma análise objetiva e consistente da teoria de Orem deixa clara sua
significativa contribuição para o desenvolvimento da enfermagem, principalmente no
contexto em que ela surgiu, procurando dar resposta às necessidades básicas dos
clientes e responder a uma lacuna existente: a de se ter um modelo conceitual próprio
para a profissão.
Seus resultados evidenciaram a importância da aplicação da teoria de Orem no
contexto do cliente/comunidade, levando à compreensão de alguns fenômenos de saúde-
doença e comportamento social, além da possibilidade de que o processo de
enfermagem baseado nesta teorista permite subsídios para a aplicação sistemática da
assistência, fazendo-se mudanças necessárias ao plano de cuidados.
Portanto, queremos destacar as contribuições que Orem traz aos profissionais
que atuam no PSF, particularmente ao enfermeiro, assertiva confirmada na análise
epistemológica demonstrada neste estudo. Nessa oportunidade, todavia, a teoria do
autocuidado fica como uma recomendação que poderá embasar a prática dos
7
enfermeiros do PSF, na medida em que representa um suporte conceitual e teórico para
a implementação da assistência de enfermagem, coerente com os pressupostos do PSF.
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