energia da antropologia seis cartas de jorge dias para ernesto veiga de oliveira

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Etnográfica vol. 12 (2) (2008) Miscelânea e dossiê "European Christianities at the turn of the millenium: ethnographic approaches" ................................................................................................................................................................................................................................................................................................ João Leal A energia da antropologia: seis cartas de Jorge Dias para Ernesto Veiga de Oliveira ................................................................................................................................................................................................................................................................................................ Aviso O conteúdo deste website está sujeito à legislação francesa sobre a propriedade intelectual e é propriedade exclusiva do editor. Os trabalhos disponibilizados neste website podem ser consultados e reproduzidos em papel ou suporte digital desde que a sua utilização seja estritamente pessoal ou para fins científicos ou pedagógicos, excluindo-se qualquer exploração comercial. A reprodução deverá mencionar obrigatoriamente o editor, o nome da revista, o autor e a referência do documento. Qualquer outra forma de reprodução é interdita salvo se autorizada previamente pelo editor, excepto nos casos previstos pela legislação em vigor em França. Revues.org é um portal de revistas das ciências sociais e humanas desenvolvido pelo CLÉO, Centro para a edição eletrónica aberta (CNRS, EHESS, UP, UAPV - França) ................................................................................................................................................................................................................................................................................................ Referência eletrônica João Leal, « A energia da antropologia: seis cartas de Jorge Dias para Ernesto Veiga de Oliveira », Etnográfica [Online], vol. 12 (2) | 2008, posto online no dia 04 Julho 2012, consultado no dia 16 Maio 2013. URL : http:// etnografica.revues.org/1814 Editor: CRIA http://etnografica.revues.org http://www.revues.org Documento acessível online em: http://etnografica.revues.org/1814 Este documento é o fac-símile da edição em papel. © CRIA

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Etnografica 1814 Vol 12 2 a Energia Da Antropologia Seis Cartas de Jorge Dias Para Ernesto Veiga de Oliveira

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  • Etnogrficavol. 12 (2) (2008)Miscelnea e dossi "European Christianities at the turn of the millenium: ethnographicapproaches"

    ................................................................................................................................................................................................................................................................................................

    Joo Leal

    A energia da antropologia: seis cartasde Jorge Dias para Ernesto Veiga deOliveira................................................................................................................................................................................................................................................................................................

    AvisoO contedo deste website est sujeito legislao francesa sobre a propriedade intelectual e propriedade exclusivado editor.Os trabalhos disponibilizados neste website podem ser consultados e reproduzidos em papel ou suporte digitaldesde que a sua utilizao seja estritamente pessoal ou para fins cientficos ou pedaggicos, excluindo-se qualquerexplorao comercial. A reproduo dever mencionar obrigatoriamente o editor, o nome da revista, o autor e areferncia do documento.Qualquer outra forma de reproduo interdita salvo se autorizada previamente pelo editor, excepto nos casosprevistos pela legislao em vigor em Frana.

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    Referncia eletrnicaJoo Leal, A energia da antropologia: seis cartas de Jorge Dias para Ernesto Veiga de Oliveira, Etnogrfica[Online], vol. 12 (2)|2008, posto online no dia 04 Julho 2012, consultado no dia 16 Maio 2013. URL: http://etnografica.revues.org/1814

    Editor: CRIAhttp://etnografica.revues.orghttp://www.revues.org

    Documento acessvel online em: http://etnografica.revues.org/1814Este documento o fac-smile da edio em papel. CRIA

  • etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    Aenergiadaantropologia.SeiscartasdeJorgeDiasparaErnestoVeigadeOliveira

    Joo LealUniversidadeNovadeLisboa;CentroemRededeInvestigaoemAntropologia

    JORgEDIAS(1907-1973)mANtEVEAOLONgODAVIDAUmAINtENSAcorrespondnciaatagorainditacomvriosdosseusamigos,colaboradoresecolegas.AsseiscartasqueaseguirsopublicadassodirigidasaoseugrandeamigoecompanheirodeequipaErnestoVeigadeOliveira.ForamescolhidasporBenjamimPereiradeentreumconjuntomaisvastodecartaseforamtrans-critas, com respeito pela grafia original, porCatarinamira.O perodo quecobremumperodoextenso:aprimeiracartafoiescritaem1939,quandoJorgeDiasiniciavaosseusestudosetnolgicosemmunique,ealtimadatade1959,quandoJorgeDias,jdepoisdareorientaoafricanistadasuapesquisa,desempenhoufunesdeprofessorvisitantenaUniversidadedeWitwaters-randemJoanesburgo.Umadessascartasescritaempapeltimbradodamis-sodeEstudosdasminoriastnicasdoUltramarPortugusnoestdatada,mastudoindicaquetenhasidoescritanofinaldosanos1950,antesdaestadadeJorgeDiasemJoanesburgo.

    Cada leitor ler as cartas de diferentes maneiras: como uma janela deentradanossentimentosesonhosdeJorgeDias,comodocumentosinformaissobreoseupercursocientficoeodosseuscompanheirosdetrabalho,comotestemunhossobreomodocomoassuasaspiraessecruzaramcomosdile-masdoseutempo.

    Pelaminhapartehouvedoisoutrspontosaquefuimaissensvel.UmdelestemavercomomodocomoascartasdocumentamofascniodeJorgeDiaspormodosdevidaalternativos,identificadoscomocampoeassociados

  • 504 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    errncia,liberdadeeplenitude.Em1939,emmunique,escreviaaErnestoVeigadeOliveira: Estouvidopormedeitarpelosmontes fora, abeber aluz,porco, rto,selvagem.Vai-mesaberespantosamentebemterunsmsesconsigo.Havemosdenosasselvajar atmedula. []Havemosdepercor-reressasregiesespantosasdoPas, lentamente,desacoscostas,afazeracomidaentreduaspedras,dormindonospalheiros.Ouviremosaquelasvozesquequsiemudeceramparans,porquebrutalizamosanossamaispuraemo-tividade,comaslutasestpidasaquenostemossujeitado.

    destaenergiaquase libertriaquenasceaantropologiaemJorgeDias.Em1942,aindanaAlemanhaesse mundonrdicodenvoasespessasefrios glaciais JorgeDias fala j da antropologia como a possibilidade derealizaoprofissionaldeumidealdevagabundagemexpressorecorren-tementeusadana sua correspondncia associado liberdadedos grandesespaoscampestreseserranos.Aetnologia,escreveJorgeDiasaErnestoVeigadeOliveiraemJulhode1942,paransumapossibilidadenicaporquenosdliberdadeparaandarmosmesespelasserrasecampos,comacertezadeteropogarantidonasociedadedoshomens.EmNovembrode1942voltaa insistir:AEtnografiapermite-nosviverpelosmontesepelasaldeias, semtermosumpatro,livrescomodesejamosecomavantagemdetermosumarecomendaodoministrioeumordenadotodososmses.

    Presente nos anos de formao de JorgeDias, esta energia libertria, defundoantimodernista,nuncamaisoabandonou,comomostraumacartadofinaldosanos1950emqueJorgeDiasescreve:Eutenhopassadoestesdiasnaquintae,coisacuriosa,comeoasentir-mecadavezmelhornaquelevalesolitriorodeadopelaameaainvisiveldacivilizao.Vivoalicomoumvaga-bundo,inebriadocomoaromadasplantassilvestresecomoscantosdapas-saradaedeoutrosbichos.Sinto-mebem,ecadavezmesintomenosligadosambiesquefervilhamnacidadefedorenta,empomadadaeengomada.

    testemunhandodessaenergiaquehabitaavocaoantropolgicadeJorgeDias,assuascartasparaErnestoVeigadeOliveirafalamtambmdealgunsdospassosdatransformaodessaenergiaemantropologia.

    AscartasdaAlemanhasoessenciaisparaperceberasfasesiniciaisdessatransformao:asprimeirasleituras,aoscilaoterminolgicaentreetnogra-fia,geografiahumanaeVolkskunde,osprimeirosesboosdeprojectos, comoquandoJorgeDiasescreveaErnestoVeigadeOliveira,enfaticamente:noqueroqueVocabandoneoseucurso,poisconvemterumalicenciaturaemLetras [].Ostrabalhosa fazersodevriaordememuitovastoseentreoutrascoisasconvemumacertaculturafilolgica,poistalvezvalesseapnafazer omapa lingustico dePortugal.Damesma forma, emNovembrode1942,antecipandooseuregressoaPortugal,JorgeDiasdesafiaErnestoVeigadeOliveiraparaumprimeiroexercciodeetnografiavagabunda:Estasfriasjdevamosvaguearmuitoporserrasdonorte,parapossivelmentepublicarmos

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 505

    qualquercoisajuntosantesdasualicenciaturaedepoismeucaroErnesto,anossavidaserladoalado,porserrasevales,pelaspraiascheiasdesol,pelasromariascoloridasebarulhentasepelosgrandesplanaltossilenciososedeser-tosemquevelhospastoresperpetuamcostumesmilenrios.

    Quanto s cartas de final dos anos 1950, surpreendem vrios momen-tos dessa energia j transformada em antropologia concreta. Alguns dessesmomentos so institucionais.o casoda criaodoCentrodeEstudosdeEtnologia,aoqualrepetidamenteJorgeDiasregressanassuascartas.Nacartanodatadadefinaldosanos1950refere-se-lheainda,deformaalgocontida,comoumCentroquedeverestudardiferentesaspectosdaculturadassocie-dadeshumanaseemespecialdopvoportugusnasvriasregiesdaterraemqueseencontrafixado.maistarde,emcartadeDezembrode1959,trans-parece jo entusiasmopelaobra realizadanoquadrodoCentro: Afinal, agentepodeteracertezadequeonossoCentrovemarealizarumaobranicanopas,ecomrecursosextremamentemodestos.Oueumeenganomuito,oudaquiaunsdezanosonossoCentroumainstituionotvelnopaspelaobrarealizada.tudoumaquestodeorientarbemotrabalhoedetrabalharcomperseverana.

    Simultaneamente, as cartas de final dos anos 1950 documentam vriosmomentosdodesenvolvimentodaspesquisasconcretassquaisseabalana-vamentoJorgeDiaseosseuscompanheiros.Apesquisarelativaaosespiguei-ros,queestarianaorigemdoclssicoEspigueiros Portugueses (1963),vriasvezes referida, comona cartadeDezembrode1959: gostei de saber queVocssempreestodecididosaatirarem-seaosespigueiros.Eutenhohojemui-toselementos sbreoassuntodemuitaspartesdomundo:Africa,AmericadoSul,CentroeNorte,eOriente.Creioquepossatrazeralgunselementosnovossbreocaso.Noseiseofaaj,juntamenteconvosco,ousepubliquemaistarde.Dequalquermaneiraovossotemdeaparecerantesouaomesmotempo,poisaparteespeculativadeveseguir-seapartedescritivaeanaltica.AspesquisasdeErnestoVeigadeOliveirasobreaarquitecturapopularemPor-tugalsotambmreferenciadas.DepoisdereferirumadeslocaodeOrlandoRibeiro atavira para estudar os telhados a 4 guas, tipo pombalino, comcaractersticasorientais,JorgeDiasescreveaErnestoVeigadeOliveira:IstomostraaimportnciadosestudosdahabitaoqueVocstmvindoafazercomextraordinrio rigor,masquepor enquanto est limitado ao litoral doNorte.precisoestenderavossaactividadeaoutrasreasdopas.

    Porvezessoanunciadosprojectosquenuncachegaramaserconcretiza-dos,comoaideiadeescreverumapequenamonografiasobreasconstantesdaactividadeindustrialdopovoportugues.Noutroscasosassinalam-senovaspossibilidades tcnicas o carro, uma Leika que permitiriam projectar apesquisaparanovospatamaresdeexigncia.HumamenoreorientaoafricanistadapesquisadeJorgeDias,queselamentaaessepropsitoporter

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    abandonadoos seuscompanheirosde trabalhopara seguir todesvairadoscaminhos.AintegraodeBenjamimPereiraseguro,serenoedeolhinhovivoesemprealertanaequipadetrabalhodoCentrotambmobjectodevriasreferncias:Eleumexcelentemooetenhoacertezaquehavemosdefazerdeleumbometngrafo.Eusimpatizeilogoqueovipelaprimeiravez,masagoranotenhoamnimaduvidadequeestaliumaprola.Setuoforesajudandoepulindo,orientandoconvenientementeasuaactividadeesujerindoalgumaleiturahavemosdefazerdeleummagnficocolaborador.

    tomadasnoseuconjunto,estasrefernciaseoutrasqueoleitorteroca-siodedescobrirporsiprpriomostram-nosumJorgeDiasirrequietonasuansiadefazerdaantropologiaumespaodemovimentoedeperseveranaabertoanovosdesafios.AindahojesomosdevedoresemPortugaldessaenergiaquetransformouavagabundagemnumadisciplinaquefazdavisi-taodeuniversosculturaisdiferentesoseumotivoinspirador.

    Figura 1JorgeDiascomFernandogalhano,empausanumaserraportuguesa(semdata).

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 507

    munique,20-VI-39

    CaroErnesto!

    Comosempre,asuacartatrouxe-meumsprodevidaestranha.Vocmesmoquandoestmaisdesanimado,temocondodemedarforaeanimar.Edigodarfora,porque,paramimascoisasnemsemprevalemoquevalemparaosoutros.Comrespeitosuaconvicodequeaminhasituaoaquidefinitiva,digo--lhequeseengana.Eunoaturoistomuitotempo.Aculturamuitobonita,aspessoassomuitoilustradas,hmuitaarte,etc.masfalta-meoessencial:avidalivreeplenadasmontanhasdaminhaterra.Nssomosfeitosdeldo,e-nosindispensvelviveremcontactocomorestodaterradequesaimos.Euestouagoraconvencido,dequeanicacoisaparamimverdadeiraavagabundagem.Sinto-meaabafarnomeiodestagenteeentaladonosmoldesestreitosdares-ponsabilidadedumlugardeprofessor.Istodeterdefalarsempreasrio,compessoassempresrias,umaestopada.Depoistudoistomuitobonito,massoparquesejardins.OqueeuqueroumaNaturezanaturalenoNaturezaartifcio.Estouvidopormedeitarpelosmontesfora,abeberaluz,porco,rto,selvagem.Vai-mesaberespantosamentebemterunsmsesconsigo.Havemosdenosasselvajaratmedula.Depoisvimosatmuniquedarosltimosretoqueschamadaculturaeporfimcairemosparasemprenaverdadeiravida.

    Eurecebihojeumconviteparafazerummtododeportugusparaalemes.Voumanhprocurarodirectordaempresaquemeconvidaparasaberascon-dies.Comoesperodeve-medarunscontosdereis.Oraporquenoh-deVocvircomigoemfinsdeOutubroajudar-menotrabalhoeganharosuficienteparaviver?Passaaquiunsmses,e talvezarrangea ficar tantotempocomoeu,edepoishavemosdearranjaremPortugalqualquercoisaquenospermitavivereescrever.Nsdevemosterpossibilidadedeofazer.Porsinoduvido.QuerendotrabalharVocdumescritorextraordinrio.masmesmoemarteprecisodis-penderenergia,eoqueomatoufoiafaltadeentusiasmoemtodo.VocnoumpoetalricocomooEduardo,emqueainspiraoindispensvelmasnoexigeregularidadedetrabalho.Vocdevecriarumaobraemqueaemoosecasecomarazo.Deixe-meestarconsigoevaiver.Estoucheiodeesperana.

    AchobemVocganharforas,masissonoseconseguefazendoasbruta-lidadesquefezcomoEduardoeogalhano.Duranteumagrandetemporadanodevefazergrandesesforos.Coma,durma,passeie,sonheeesperepormim.HavemosdepercorreressasregiesespantosasdoPas,lentamente,desacos

  • 508 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    costas,afazeracomidaentreduaspedras,dormindonospalheiros.Ouviremosaquelas vozes que qusi emudeceramparans, porque brutalizamos a nossamaispuraemotividade,comaslutasestpidasaquenostemossujeitado.Vamosprimeiroaominho,sparapastar.tomamoslumbanhodeverdura.Depoisdebemfrescosvamosattrs-os-montespurificaraalma,eleva-laaosgrandesideaisecompreenodeDeus.Aseguirunsdiasdegralheira,paramatarasedenasbicaspurasdaserra.DavamosparaaBeiraBaixa,regiodoSabugal,seguindo a fronteira espanhola vindo a acabar no cimo da Serra da Estrela.Paraistonoprecisomuitodinheiro,massemprenecessrioalgum.V-seportantoprevenindo,poisasuamenolherecusaalgumevaiserumtempodeenlouquecer.EnquantodescansavlendolivrosdoKnutHamsun,paraenri-quecer a alma com o snho desse aventureiro.Depois basta o nosso snho.Entreguesansprpriosdesfraldaremosasvelasdafantasiaaosventosdaserraepairaremospor todas aspaisagens comoNillOlgersonquando cavalgavaogansobravo.OEduardodisse-mequeestavaresolvidoadar-mealgumtemposeu.Portantoiremoscomleeogalhanoaalgumasregies,selesnoquise-remvaguearsempre,vamosns,szinhoscomodoispegureirosansiososdeluzegraadeDeus.

    Istoaquicomrespeitoaclimamiservel.AindanoseiseestounaPrima-veraounoInverno.Dedez,emdezdiasdechuvavemumdesol.Amonotoniadostonspardoschegaafazerenlouquecer.tenhoumansiadecoresvivasquedeslumbremcomoumtesoiromaravilhosoabrilharaosol.

    Sensarranjarmosqualquercoisaquenosdedecomernumaaldeolanossa.tendo liberdade epodendo escrever, talvez sejapossvel atingirmosum idealambicionadoequehojeparecedeimpossvelrealizao.

    DesaudadesaoEduardo

    Abraa-ocomtodaaamizadeoeternocompanheirododestino

    Ant

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 509

    Bernau,den25.Juli1942

    meuqueridoErnesto,

    Atqueenfimreceboumsinaldevidaseu!Contudo,eunoachoestranhooseusilncio,atmeparecenatural.Parasiestaminhavidadeveterqualquercoisade irreale fantstico,umaespciede realizaodumsonho impossvel.Paramimnoexistemistrio,porqueaminhavidaaquitemocaracterbanaldocotidiano,easua-meconhecidaporquesedesenrolanoteatroemqueeutantosanosrepresenteiumaapagadafiguradetragi-comdia.Porisso,enquantoqueeuligoperfeitamenteonossopassadoaopresente,Vocestnamargemdelatatearnoescuroeaidealizaraminhafantsticaexistncia.

    Euestouemvsperasdepartida,poisdentrodunsdezdiasdevoestaremPortugal.NomefaltamprojectoseescusadoserdizerqueVocsestosempreassociadosales,smefaltasaberseascircunstnciasnonosimpediroderealizarodesejado.

    Nomeparecequeosnossosdestinostendamaseparar-seeeucadavezoassociomaisaosmeusplanosfuturos,alegrando-mebastanteosseustriunfosacadmicospresentes.EuseiquelesnadavalemparasiequeVocnotraba-lhouparaasclassificaesquetirou,masdequalquermaneiraumasatisfaoser-sebemsucedidoesobretudointeressa-memuitoofactodeVoctirarboasclassificaes,porque issovemajudarosmeusplanos.Como lhedisseoanopassado,continuoapensaremdedicar-megeografiaHumana;istoaumacoisaqueaquiseestudasobonomedeVolkskunde,equetemporbaseageo-grafiaHumanasebemqueumaextensomaioremuitomaiorprofundidade.Oestudoemsi interessante, temnonossopas fontes imensasporestudare talvez aprofissomais compatvel comanossamaneirade ser e comasdurasrealidadesdavidaaquenopodemosfugir.Nstemosdeverascoisasdefrenteecompreenderqueonossodesejoromnticodevagabundagemnonossosculoumautopia,sequenoserutopiaemtdasaspocas.Portanto,indispensvelharmonizarmosonossotemperamentoeaprofisso,escolhendoumaquenosejaincompatvelcomleesejaaomesmotempoumapossvelnanossasociedade.AVolkskundeparansumapossibilidadenica,porquenosdliberdade,paraandarmosmsespelasserrasecampos,comacertezadeteropogarantidoeumlugarnasociedadedoshomens.Almdisso,passariamosunsquatromsestodososanosemLisboaoquenodeixadesernecessrio,paranoperderocontactocomooutroladodascoisas.

  • 510 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    Eupensofazeromeudoutoramentoemmarodoprximoanoeaindafica-reimaisunsmsesatrabalharaquicomquempercebedoassunto,paradepoispodertrabalharacomumacertasegurana.Naturalmentequemeseriautils-simaasuacolaboraoeslamentoqueVocnopossatrabalharaquiumanocomigo,massebemqueeulhearranjasseissocomfacilidade,noqueroqueVocabandoneoseucurso,poisconvemterumalicenciaturaemLetrasparapodermelhorpropor-secandidaturadolugar.Ostrabalhosafazersodevriaordememuitovastoseentreoutrascoisasconvemumacertaculturafilolgica,poistalvezvalesseapnafazeromapalingusticodePortugal.massbreestascoisasfalaremosquandoeufr.

    ComoVocdevecalcular,devemosencontrarmuitasdificuldadespelafrenteeindispensvelumagrandecoragemefradevontadeparavenceraresis-tnciadessagentedosministrios,maseucreionaminhaestrlaenaminhaaudcia.Asuaatitudeconfianteeoptimistanestaltimacartafoiumagrandesatisfaoparamim,queconfiobastanteemsi,comoocompanheiroidealparaumatalrealizao.Vocparaoanojdeveconcluirascadeirasdalicenciaturaeslhefaltaatese.QuemsabeseummotivodaVolkskundevistaporumaspectofilosficoseriaumamaneiradematardoiscoelhosdeumascajadada!Bem,esperamosmaisunsdiasparaconversar.

    SadadesaoEduardoeaoCarlosseovir

    Abraa-odocoraooseumtamigoAnt

    P.S.Cumprimentosdamargot

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 511

    Bernau,20-XI-42

    meuqueridoErnesto,

    Oregressoastemundonrdicodenvoasespessasefriosglaciaisfez-meimediatamente cair naquele segundo eu, que c se foi a pouco e pouco for-mando, em contacto comoutra cultura e comoutra paisagem.Amutao rpida:umraiodesolquente,umcopodevinhoeavozeariameridionalcha-mam-me imediatamente queles estados de conscincia habituais na minhainfnciaemocidade.Damesmamaneiraqueestapaisagemgrandeefria,estagenteponderadaeromntica,idealistaecultameobrigamatomarperanteavidaumanovaatitude;maisreflectida;maislucidaeordenada,maispositivaeactivaedecididamentemaistil.Nofaloaquidumautilidadesocial,refiro-mesimplesmenteaomeueu,aocomplexopsicolgicoquesouequenaturalmenteencontraumamaiorpossibilidadedeexpansoeequilbrionesteambientetoricodepersonalidadesedepossibilidades.

    Poucotempodepoisdecchegarjestavasvoltascomoslivroseparanomemeterbruscamenteaotrabalho,resolvi,comointroduo,leralgumacoisa,que pudesse servir para a sua futura tese. Eno lhe digonada, passei umashorasdeliciosas,quetivedeinterromperporqueurgeaproveitarotempoquetenhoatcomearemasaulas,parareveromeutrabalho.LisdoislivrosumdeKurtSchneider:DiePsycchopatischenPersnlichkeiteneooutrodeKretschmergenialemenschen.Ostitulosnoparecemirdireitosaonossoassuntoecon-tudoVocnofazideiadariquezadesugestesqueaseencontram,sobretudonoltimo.Eledesenvolveumateoriapsicolgicacercadasraas, interessan-tssimaequeVocpodiaaplicaraPortugal, estabelecendopossvelmenteumparaleloentreonossopaseanaovisinha.Enfim,slheseidizerquepeloscomeosquetiveestouconvencidodumamagnficazonadeexploraesquepodemdarlugaraumatesemagnfica.Vocleiaumpoucoalemoeprocureirdominandoalngua.indispensvelquensnonosdeixemosdominarpelapartefracadonossoeuelevemosaofimosnossosprojectoseparaissoindis-pensveltrabalharcomregularidadeeterbastanteconfianaemnsenofuturo.Ns somosno fundodoisgrandesvagabundosdeolhosextasiadosperanteomistriodavida.masseosomosesempreseremos,noquereistodizerquedesistamosdavida,pelofactodeelaoferecerpoucaspossibilidadesparagentecomons.Sensquisermos,Ernesto,havemosdeconseguirumasituaoidealparaanossamaneiradeser,simplesmentecomaobrigaodedarmosumcerto

  • 512 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    esforo para alcanarmos o nosso fim. A Etnografia permite-nos viver pelosmontesepelasaldeias,semtermosumpatro,livrescomodesejamosecomavantagemdetermosumarecomendaodoministrioeumordenadotodososmses.Isto,naturalmente,umagrandelimitaoenocorrespondequiloqueumdiasonhamos,masissoumabsurdo.Osnossossonhosromnticosnosorealizveiseseficssemosagarradosalessconseguamossossobrarnsteato-leiroqueavidamoderna.Hojepoetasesonhadores,filsofosepensadoressvivemquandoconseguemumaformadeactividadeacessriaquelhesassegureaexistncia.Ouseprofessoroujornalista,outradutor,enfimqualquerrodadagrandeengrenagemsocial,cujafunoreconhecida.Oranstemosdeaceitaristocomoumagranderealidadeeparecequejambosnotemosdvidassbreoassunto.Resta-nosportantoprocurarasoluo.Quantoamimencontreiesta,quesenoidealdasmelhoresqueathojesemeapresentaram.Vimpormconcluso,quessinhonuncasereicapaz,assimcomoVocssinhonosercapazdemuitacoisa.Estportantoindicadoquetemosdenosassociarnestavida,parajuntosalevarmaisfacilmente.Oidealatseriatrs,ouquatro,poisvenciamosmelhortodososobstculosquesurgemconstantemente,mascreioqueseformosmaisdedoisnoconseguiremosquemnospague.Onossopasmuitopobre,parapagartaisluxos.Porisso,temosdetercoragememetermo--nosaobarulho.Voc,porenquanto,vaiconcluindoocursoefazumatesequetenharelaocomostrabalhosaquesequereproporedepoisarranjaremosaquenosdeemumasituaooficial.Apocaamelhorparastesestudos,poisoque seno fizernestesdecniosnuncamais se far, porquedesaparecerotodososrestosdasvelhastradies.Estasfriasjdevamosvaguearmuitoporserrasdonorte,parapossivelmentepublicarmosqualquercoisajuntosantesdasualicenciaturaedepoismeucaroErnesto,anossavidaserladoalado,porserrasevales,pelaspraiascheiasdesol,pelasromariascoloridasebarulhentasepelosgrandesplanaltossilenciososedesertosemquevelhospastoresperpetuamcostumesmilenrios.Envelheceremososdoisporentrefragas,perdidosaouviravozdoventoeesquecidosdefazertrabalhoselivrosparaopdasbibliotecas.AdeusmeuqueridoErnesto,ataoano.

    SadadesatodosespecialmenteaoEduardomeusedamargot.

    Abraa-oternamenteoseu

    Antonio

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 513

    [Escritoempapeltimbrado:UniversityoftheWitwatersrand,Joannesburg]

    15deNovembrode1959

    meuvelho!

    RecebiontematuacartacheiademoinhoseestivequasiainvestirdelanaempunhocomoovelhoQuixote,nocontraasvelas,mascontraodestino,quemeimpediudeterlevadoatarefaacabohmaistempo!maseunofundonoestoudescontentecomle.Nofundoadoroavida,etenhobebidoataaa trasbordar de tudo quanto ela oferece. Contudo, tenhomuitas vezes penadevosterabandonado,paraseguirtodesvairadoscaminhos.Poroutrolado,seonotivessefeito,eseoslugaresqueocupotivessemsidopreenchidosporoutros,gneroFernandodeCastroP.L.,talvezjnemonossoCentroexistisse,porqueafinalquempauta,nanossaterra,quemocupacertoslugaresestrat-gicos.FelizmentequeVocsseguiramosvelhostrilhosetnogrficosqueeutinhacomeadoarasgar,comtantaseguranaexito,queeujnadatenhoarecearpelofuturodanossaobra.

    SeoFernandometivesseditoqueotrabalhodosfrancesesdeviaapareceraindasteano,eutinhaescritoumaslinhas,poisnoeracoisaquemematasse.maseupenseiquetivessemaistempoecomosmateriaisquetenhoemcasa,ecomoquejltenhoredigido,penseipoderescreverumaespciedeintroduoevoluodamoagemduranteasfriasdoNatal.

    masafinalascoisassooutraseachoquefizestemuitobememterescritooprefcioeemandarparaafrente.Vocsjsabemqueeutenhomuitosdefei-tos,masacimadetudosouVossoamigoecompanheiroenuncaqueroserumempata.Oprefcioestmuitobom,eeunooescreveriatobem,dissopodestuestarcerto.Foitambmumgestodeamizadet-loassinadopormim,maspodiasperfeitamentet-loassinadotu.BemsabesqueeuaindanoestoucomoomendesCorreia.Quantoaoteunomefigurarnolivroachoumaexcelenteideia,e jtencionavaprop-loaoFernando,quandofssenoNatalaoPorto.Nestestrabalhosacolaboraodadadamaneiramaisvariada,eassujesteseconversassotoimportantes,comoterdirectamenteescritoumaspginasdolivro.Nocalculascomomesintofelizporverosnomesdenstrsassociadosnamesmaobra.SenosmantivermossempreunidoshavemosdeconseguirqueonossoCentrovenhaaserumarealidadeaceiteerespeitadaportodos.AentradadoBenjamimmaisumagarantiadesucesso,eeraumelementoquenosfaziamuitafaltafoiumalanaemAfricaqueh-dedarabundantesfrutos.

  • 514 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    EuachoqueoFernandodeviafazerunsmapascomadistribuiodosmoi-nhosemPortugal,comofezcomosaparelhosdeelevaraguaderega.tambmnoseriamau,noprimeirovolume,levarumasboasfotografiasdeumaazenhaedemoinhos.PodiamosmesmocomprarnoBelezaounoAlvo.AgoracomaLaicajpodemostirarboasfotografias,masasantigasnemsempresomuitoaproveitveis.Noseriabomfazerumndiceanalticodetodaaobraepublica--lonoltimovolume.talvezconviessediz-lonoprefcio.

    Parabenspelatuaactividadeeportudo.Recebeumgrandeabraodocora-odoAntonio.DsaudadesaoBenjamim.

    P.S.DevoregressaraLisboano1.deDezembro.DumabraoaoFernandoediz-lhequeseagarreaosmoinhoscomoumvalente,eque faaunsmapasbonitos.No1.volumedevevirumcomadistribuiodostiposdescritos.

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 515

    [Escritoempapeltimbrado:UniversityoftheWitwatersrand,Joannesburg]

    5deDezembrode1959

    meucaroErnesto,

    Nocalculasoprazerquetivecomavossavisita!Sinto-metofelizcomotucomaaquisiodoBenjamim.Eleumexcelentemooetenhoacertezaquehavemosdefazerdeleumbometngrafo.Eusimpatizeilogoqueovipelaprimeiravez,masagoranotenhoamnimaduvidadequeestaliumaprola.Setuoforesajudandoepulindo,orientandoconvenientementeasuaactividadeesujerindoalgumaleiturahavemosdefazerdeleummagnficocolaborador.

    Noseisecompreendesoquerepresentaparamimverqueaquelesaquemdei aminha confiana correspondemdemaneira to cabal. Afinal, a gentepodeteracertezadequeonossoCentrovemarealizarumaobranicanopas, e com recursos extremamentemodestos.Ou eume enganomuito, oudaquiaunsdezanosonossoCentroumainstituionotvelnopaspelaobrarealizada.tudoumaquestodeorientarbemotrabalhoedetrabalharcomperseverana.

    Euestouagoranumafasemelhordoquehumano.AestadiaemJoanes-burgodeu-menovas foras e energia.Aspermannciasdemasiado longas emPortugalesgotam-me,masunsmeses foradaterrarestituem-mea juventude.Hojedeiumaaulabestial!ParecequeoEspritoSantotinhadescidosbremimefaleicomoumeluminada.Eestouresolvidoanomedeixarirabaixo.

    Quero trabalhar convosco e realizar umaobra bonita e aomesmo tempovivercomumacertabeleza.

    tenho pena de no poder ter estadomais tempo convosco, e de no tervisitadoosmuseusnavossacompanhia.masesperovirarecuperaroperdido,quandoafornoNatal.

    Estiveapensarnoesquemadeumapequenamonografiasbreasconstantesdaactividadeindustrialdopovoportuguesechegueiaoseguinteresultado.

    I FaseinicialcomunitriaII transio;propriedadecolectivaeindividualIII PropriedadeindividualetrabalhoscolectivosnoremuneradosIV Industriascaseiras;artesanatoV Espritoqualitativo,incapacidaderacionalizadoraVI transioindustriascaseirasparaaverdadeiraindustrializaoVII moagem

  • 516 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    VIII tecelagem.tearesmanuaiseindustriasdefiaoetecidosS.totirsoe guimaresIX Industriasdeguimares{Ciclofechado:milho-bois-coiro-chifre- -estrumes,resduosdecortumes,pentes,cabosdefacas,etc.X tecidosdel,tearesmanuais,pises,(rebanhostransumantes Lamesta,etc.)XI Problemasrelativostecelagem,defeitosdaindustriadetecidos. tratadodemethwen.Sistemadecontrole!XII OlarariaecermicaXIII FiligranaseourivesdeprataXIV DesenvolvimentodoespritoquantitativoeracionalistaBibliografia:gamaBarros,

    Listoeintroduzsujestes.Umavezestabelecidooesquemaecomalgumabibliografiapodemosfazerrpidamenteumapequenamonografiaorientadora.

    IIgostei de saber queVocs sempre esto decididos a atirarem-se aos espi-

    gueiros.Eutenhohojemuitoselementossbreoassuntodemuitaspartesdomundo:Africa,America do Sul,Centro eNorte, eOriente.Creio que possatrazeralgunselementosnovossbreocaso.Nosei seo faa j, juntamenteconvosco,ousepubliquemaistarde.Dequalquermaneiraovossotemdeapa-recerantesouaomesmotempo,poisaparteespeculativadeveseguir-seapartedescritivaeanaltica.

    precisoqueVocsnosejammesquinhosemmatriadeilustrao,comooforamcomosmoinhos.Umaobradestasvaleimensopelailustrao.OlhaaobradoPiresdeLima?Elenofeznadapessoalmente,masteveomritodevalorizarespantosamenteovossotrabalhocomailustrao.Vocstmdecom-preenderistoenotransigir.OFernandonestascoisastemsempreamaniadepuxarparatrs,masatuaobrigaopuxarparaafrente.Seassimnofizerem,paraqueservetodoessedocumentriofotogrficodoCentro?Podedizer-sequeumaautnticainutilidadeefoidinheiroroubadoaoEstado,vistoquenosechegaautilizar.Nadademesquinhs!!

    AchooptimaaideiadoBenjamimestudarasrocas.Podecomearpelasdeumadeterminadaregioe,aospoucos,podefazertodasasrocasdePortugal.ParaumtrabalhodessestambemimportanteailustraoeoFernandopodiafazerdesenhosbonitosdevriasrocasexistentesemmuseusportugueses.

    SoubehojequeoOrlandofoiataviraparaestudarostelhadosdascasasdetavira.Noseisetelembras,deunstelhadosa4guas,tipopombalino,comcaractersticas orientais? Istomostra a importnciados estudosdahabitao

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 517

    queVocstmvindoafazercomextraordinriorigor,masqueporenquantoestlimitadoaolitoraldoNorte.precisoestenderavossaactividadeaoutrasreasdopas.AgoraqueVocs tmoBenjamimconvempr tudoemmovi-mento.Comumcarrofcilestendersseestudoatodoopasefazerumaobranica.

    meuvelho,desculpatodoestearrazoado,masestoucheiodeesperanadequeoCentrovaientrarnumanovafase.gosteideteveralegreecheiodebrilhoedeveroBenjamim,seguro,serenoedeolhinhovivoesemprealerta.Estnatuamofazerdeleumexcelenteetngrafo.

    Daquiauns15diasestounoPorto!tencionodemorar-meporlumasduasoutrssemanasesinto-mefelizporestarssetempojuntodevs.

    DtrsscosaoDonFernando,saudadesaoBenjamimeparatiumabraomuitoapertadodoamigovelhodocorao

    Antonio

    P.S.SeescreveresaoEduardo,manda-lheumabraomeuteuAnt

  • 518 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    Figura 2Oprof.WagleyeJorgeDias,numcabanaldeumavelhacasadeFelgar,ouvindootioDomingos,latoeiro,cujamulhereramordomadaigrejadeFelgar(Junhode1949)(legendanoversodafotografiaoriginal).

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 519

    [Escritoempapeltimbrado:

    ministriodoUltramar

    CentrodeEstudosPolticoseSociais

    daJuntadasmissesgeogrficasedeInvestigaesdoUltramar

    missodeEstudosdasminoriastnicasdoUltramarPortugus

    PraadoPrncipeReal,20Lisboa]

    meuvelho!

    Setutenssaudades,eunemsefala!!AviagemaInglaterra,mesmoapesardahostilidadedetodoscontraPortugaledosnegros,mesmocontramim,sempremefezbem.Eutenhojestadeformaodapersonalidade;semumafugaparaalmfronteirasesmoreoepercoosonho.

    Euprecisomuitodefalarcontigo.Criou-seagoraumCentrodeEstudosdeAntropologiaCultural,dequecertamentevouserdirector.SeVocsvivessemmaispertoeumetia-voslemmelhorescondiesfinanceiras.Seeutivessecon-fiananofuturo,obrigava-vosmesmoavirparac,masquemquehojepodegarantirqualquer coisa?!Contudo, trabalhar convosco eraumgrandeprazer.EsteCentroparaestudardiferentesaspectosdaculturadassociedadeshuma-naseemespecialdopvoportugusnasvriasregiesdaterraemqueseencon-trafixado.Portantocobretambemovossocampo.masnoseicomoh-deser!temosdeconversarmuito.Quantoaeuestarlivrenomomento,nofcil,anoseruns3ou4diastodasassemanas.Seviessesnodia2demaio,naturalquenodia3notenhaaulasdemanhporquehumaconferncia.Depois,detardetenhoduasaulaseficolivreataodia10,porquena3.feira8douumpontoescritoenoprecisodelestar.Nodia10tenhoaulasevoltoaficarlivre(livreclaro,compontosparaver)ataodia14,emquetenhoreuniodecursoemCoimbra.PodiamostalvezvirdecarroparaCoimbradevagarporumcaminhomaislongo.FicoemCoimbraosdias14e15.Comcerteza,nodia15sficodemanhpoisdetardevotodosnoCortejodaqueimadasfitaseeujnotenhoconvicoparatantoepossoestarconvoscoouregressaraLisboa,poisnodia17tenhoaltimaaula.Creioquetemdeserassim,decontrrio,necessrioesperaratJunho.NoS.JoovouapassarunsdiasporcausadoCongressoLuso-Espanhol.Sosempreumachatice,mastemosdefazerosacri-fcioparareceberarecompensanosqueserealizamemEspanha,muitomaisdomeuagrado,sejamcomcreadillasousemelas.

  • 520 JOOLEAL etnogrfica novembrode2008 12(2):503-521

    Eutenhopassadoestesdiasnaquintae,coisacuriosa,comeoasentir-mecadavezmelhornaquelevalesolitriorodeadopelaameaainvisiveldaciviliza-o.Vivoalicomoumvagabundo,inebriadocomoaromadasplantassilvestresecomoscantosdapassaradaedeoutrosbichos.Sinto-mebem,ecadavezmesintomenos ligadosambiesquefervilhamnacidadefedorenta,empoma-dadaeengomada.SeeuVostivesseaquieraumreisemreinomascomumacrtedebelosefieiscortezos.

    Vemdepressaetrazatraduodohungaroparaeuveroquedizsbreosespigueiros.

    SaudadesaoBenjamimeaoEduardo

    Abraa-teoteuAntonio.

  • AENERgIADAANtROPOLOgIA.SEISCARtASDEJORgEDIAS 521

    Figura 3 JorgeDiasemacondes(1957).