exame fisico neurologia
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Temas da Aula
Introdução 2
História Clínica 3
História Actual 3
Antecedentes Pessoais 5
Antecedentes Familiares 6
Exame Neurológico 7
Exames Complementares 10
Topografia da Lesão 11
Hemisférios Cerebrais 11
Gânglios da Base 14
Tronco Cerebral 15
Cerebelo 17
Medula Espinhal 19
Nervo periférico 20
Músculo 21
Bibliografia
� Anotada correspondente de 2006/2007, Mário Mendonça e António Pereira
� Ferro J., Pinto F. Semiologia Neurológica
� Snell R. Neuroanatomia Clínica
Anotadas do 4º Ano – 2007/08 Data: 15 de Outubro de 2007
Disciplina: Neurologia Prof.: José Pimentel
Tema do Seminário: Avaliação do Doente Neurológico
Autores: Vânia Gonçalves e Lúcia Nascimento
Equipa Revisora: Carlos Vila Nova e Pedro Freitas
Avaliação do Doente Neurológico
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Introdução
O objectivo em Neurologia prende-se com três parâmetros essenciais:
1. Diagnóstico
2. Tratamento
3. Prognóstico
Relativamente ao diagnóstico, este visa responder às perguntas:
� Onde está a lesão?
� Qual o tipo de lesão?
Deste modo, pode-se determinar:
• local da lesão – encéfalo, medula espinhal, nervo periférico, placa
neuro-muscular, músculos e meninges;
• tipo de lesão – vascular (início agudo), desmielinizante (evolução por
surtos), tumor/expansiva (evolução gradual), infecciosa/inflamatória
(início agudo ou subagudo), degenerativa (evolução crónica, com
envolvimento simétrico de múltiplos sistemas), traumática,
tóxico/metabólico e malformativa.
As lesões vasculares seguem, geralmente, uma apresentação clínica típica,
enquanto que as lesões desmielinizantes atingem predominantemente um grupo
etário ou sexo, manifestando-se de maneira específica. As lesões degenerativas
mais frequentes dizem respeito às doenças de Parkinson e Alzheimer, sendo de
natureza crónica e progressiva. A principal causa das lesões tóxico-metabólicas é
o alcoolismo, com consequente encefalopatia alcoólica.
O diagnóstico é obtido pela:
1. História clínica, de onde se extrai a história actual, antecedentes
pessoais e familiares;
2. Observação geral (onde se incluem gestos médicos como a inspecção,
palpação, percussão e auscultação);
3. Observação neurológica;
4. Exames complementares.
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História Clínica
HISTÓRIA ACTUAL
É necessário determinar quais os sintomas neurológicos presentes, isto é, os
sintomas que cubram todo o neuroeixo (SNC), SNP e placa neuro-muscular:
� Cefaleias
Determinando-se o tipo e se são acompanhadas por aumento da pressão
intracraniana1.
� Perturbações da Visão
Pesquisando-se se há uma diminuição da acuidade visual, defeito do campo
visual (hemianópsia, escotoma, estreitamento), diplopia, etc.
� Perturbações da Audição
� Vertigens/Tonturas
As vertigens definem-se como uma sensação desagradável e ilusória de
deslocação, movimento, do próprio em relação ao ambiente ou vice-versa
(devendo-se, neste caso, investigar uma disfunção vestibular e se é súbita,
intensa e acompanhada de vómitos).
A tontura é uma designação inespecífica, que pode significar desde vertigem
a sensação de perda de conhecimento eminente, dificuldade de concentração
ou de organização do pensamento, sensação de cabeça leve ou oca e
alteração transitória da consciência (doentes com crises epilépticas do tipo
ausências ou parciais com sintomatologia psíquica também usam o termo
tontura para descrever essas crises).
� Perturbações da Consciência
� Disfagia
A disfagia neurológica é mais propensa para líquidos.
� Disartria
Não permite localizar a lesão.
� Disfonia
� Dispneia
1 Ver aula sobre cefaleias.
os 4 D’s do bulbo
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� Disfasia
Indica lesão nos hemisférios cerebrais.
� Perturbações Esfincterianas
Incontinência ou retenção.
� Perturbações Sensitivas
Como dor (sintoma positivo) ou parestesias2 (sintoma negativo).
� Diminuição da Força Muscular
Proximal ou distal.
� Perturbações Autonómicas
Como sudação excessiva, palpitações, diarreias, podendo ser provocadas por
polineuropatias, como a Polineuropatia Amiloidótica Familiar3.
� Perturbações da Esfera Sexual
Em regra geral, cada um destes sintomas traduz a disfunção de uma
determinada estrutura, sistema ou via do neuroeixo:
• afasia e/ou epilepsia – lesão do hemisfério cerebral esquerdo (se a pessoa
for dextra);
• ataxia – lesão cerebelosa;
• diplopia – lesão no tronco cerebral ou na emergência de um dos nervos
oculares (III, IV e VI pares);
• paresia – lesão da primeira ou segunda via da motilidade voluntária;
• hemiplegia – lesão subcortical (via piramidal).
É ainda fundamental pesquisar sintomas e sinais resultantes de complicações
neurológicas de doenças sistémicas, como a hipertensão arterial (HTA), diabetes,
vasculites e doenças auto-imunes, que possam estar implicadas na história actual.
Pode-se tomar como exemplo uma metástase no SNC de uma neoplasia
extracerebral, ou ainda repercussões do alcoolismo no sistema nervoso.
2 Parestesia – sensação anormal de picada, formigueiro, impressão de pele enrolada. 3 Também conhecida como paramiloidose ou doença dos pezinhos.
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ANTECEDENTES PESSOAIS
Os antecedentes pessoais a recolher são idênticos aos de qualquer história
médica, sendo necessário, no entanto, dar especial ênfase às doenças que possam
ter repercussões no sistema nervoso.
Pode-se tomar como exemplos (alguns já referidos anteriormente):
� A HTA, tabagismo, doenças cardíacas, entre outras, que podem
culminar em AVC’s.
� A Diabetes é também um factor predisponente para AVC’s e pode ainda
conduzir a quadros clínicos de polineuropatias, com diminuição da força e
perda da sensibilidade dolorosa nos membros inferiores, com possíveis
ulcerações.
� Traumatismos crânio-encefálicos (TCE’s), AVC’s, tumores, período
perinatal e convulsões febris são possíveis causas de epilepsia. No
entanto, os TCE’s têm de ser bastante graves, nomeadamente com perda
de conhecimento e/ou amnésia, com fractura craniana.
� Neoplasia Sistémica, com complicações neurológicas inerentes à clínica
do tumor intracerebral.
� A SIDA pode estar associada a AVC’s, tumores (como o linfoma) e
principalmente infecções (como a toxoplasmose).
� Uma Infecção Viral pode ser responsável por quadros de meningite, de
polineuropatia (sindroma de Guillain-Barré4) ou ainda de miopatia.
4 O sindroma de Guillian-Barré é uma polineuropatia, de natureza auto-imune, precedida em 75%
dos casos por uma infecção viral.
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ANTECEDENTES FAMILIARES
Há que ter em conta que certas patologias neurológicas podem estar
associadas a factores hereditários.
Daí a importância da recolha dos antecedentes familiares.
São exemplos dessas patologias:
� Algumas doenças degenerativas presentes na família, como ataxias
espinho-cerebelosas podem indiciar presença de uma ataxia pura,
progressiva ou evolutiva.
� A Paramiloidose Familiar pode estar associada a polineuropatia sensitiva
e autonómica, com falta de força e de sensibilidade, vómitos, diarreias e
mialgias.
� Cefaleias – enxaquecas.
� Casos de convulsões na família podem indiciar alguns tipos de epilepsia.
� Se houver tremor familiar, podem-se encontrar tremores de acção no
indivíduo em causa.
� Oligofrénia – doenças metabólicas.
� Quadro extrapiramidal em adolescente – doenças metabólicas.
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Exame Neurológico
O exame neurológico deve ser o mais completo possível, percorrendo o doente
da cabeça aos pés. Não há uma maneira correcta para realizar o exame, tendo cada
observador a sua própria sistematização.
No entanto, é aconselhável iniciá-lo pelo estudo das estruturas
nervosas/sistemas/vias que a história clínica sugere, e só depois seguir para o
restante exame.
Um exame neurológico pode seguir a seguinte sistematização:
1) Testar as funções nervosas superiores/estado mental
Devem-se fazer perguntas fáceis, que indiquem o grau de orientação no
espaço e no tempo, inteligência, atenção, etc.
2) Testar os pares cranianos
I – Olfactivo
Acuidade olfactiva: deve-se testar com substâncias que tenham odor conhecido e
forte, como café. Pode estar afectado em casos de tumores acima da órbita ocular
que comprimam o bulbo olfactivo.
II – Óptico
Campimetria (campos visuais podem ser testados por confrontação); Fundoscopia
com fundoscópio ou biomicroscópio; Acuidade visual.
III, IV, VI – Óculo-motores
Movimentos oculares conjugados; III par: diâmetro pupilar, pálpebras, reflexo foto-
motor (contracção directa e consensual das pupilas, aquando da incidência directa
de um foco luminoso) e de acomodação (fenómenos de miose e midríase, bem
como a acomodação do cristalino, consoante o objecto focado se aproxima ou
afasta do observador).
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V – Trigémio
Sensibilidade da face; Músculos da mastigação; Reflexo córneo; Reflexo
masseteriano.
VII – Facial
Musculatura da mímica facial – pedir ao doente todos estes movimentos: enrugar a
testa, fechar e abrir os olhos, mostrar os dentes, assobiar e desviar os cantos da
boca para baixo.
VIII – Vestibular / Auditivo
Vias vestibulares – “prova dos braços estendidos” (doente desvia os braços no
sentido da lesão), marcha (dirige-se também no sentido da lesão), nistagmo (quando
se pede para o doente olhar o dedo a 45º da cabeça, este faz um movimento
ininterrupto dos olhos para esse lado), prova de Romberg vestibular (doente com os
olhos abertos, mãos ao longo do corpo, pés juntos nos calcanhares, sendo os casos
patológicos evidenciados por oscilações laterais ou ântero-posteriores).
Acuidade auditiva – prova do relógio, prova da voz ciciada, testar a transmissão das
vias aéreas e ósseas.
IX e X – Glossofaríngeo/ Vago
Reflexo faríngeo/tosse (tronco cerebral) e mobilidade da úvula, do véu do paladar e
das cordas vocais (voz bitonal no caso da lesão das cordas vocais).
XI – Espinhal
Força dos trapézios e esternocleidomastoideus.
XII – Hipoglosso
Observação de atrofias e fasciculações da língua; mobilidade da língua (protusão da
língua; movimentar a língua para a esquerda, direita, cima, baixo, e movimentos
circulares; empurrar a língua contra a bochecha).
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3) Verificar a presença de Atrofias; Movimentos involuntários; Tónus; Força
muscular dos membros; Fasciculações
No caso da força muscular, primeiro avalia-se globalmente a força dos
membros superiores (prova dos braços estendidos) e membros inferiores (prova de
Barré e Mingazinni5). Depois, segue-se a avaliação segmentar (em cada um dos
grupos musculares).
No caso do tónus, o doente pode apresentar hipertonia, que se divide em:
• rigidez, com o sinal da roda dentada, mais evidente na velocidade de pesquisa
lenta, surge nas lesões extrapiramidais, como na doença de Parkinson;
• espasticidade, com o reflexo da navalha de mola, mais evidente na velocidade
de pesquisa rápida e característico das lesões piramidais.
4) Reflexos
Reflexos cutâneos, osteotendinosos (ROT – lesão do primeiro ou segundo
neurónio) e patológicos (reflexo de Babinsky).
5) Sensibilidade
Sensibilidade dolorosa, térmica, táctil e profunda (proprioceptiva e vibratória).
6) Coordenação motora
Provas “dedo-nariz” e “calcanhar-joelho” (indiciam lesão nos hemisférios
cerebelosos); adiadococinese (incapacidade de realizar movimentos alternados
rápidos, como, por exemplo, barrar a manteiga no pão); marcha.
7) Marcha
Pode ser atáxica, neuropática, miopática, etc.
8) Sinais meníngeos
Rigidez da nuca, sinal de Kernig (positivo quando há dor ao flectir a coxa sobre
a bacia) e sinal de Brudzinski (flexão dos membros inferiores quando se pesquisa a
rigidez da nuca).
5 Na prova de Barré o doente deita-se em decúbito ventral, flecte as pernas de modo a formarem um
ângulo recto com o plano do leito. A prova de Mingazinni efectua-se com o doente em decúbito dorsal com os olhos cerrados, as coxas flectida, e as pernas no plano horizontal.
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Exames Complementares
Os exames comlementares são pedidos de acordo com a suspeita levantada
pela história e exame neurológico:
� Punção Lombar (PL)
Em casos de meningite ou hemorragia meníngea; é absolutamente
contra-indicada a sua realização quando há lesão a ocupar espaço
intracraniano (fazer TC antes da PL), e quando há sinais de hipertensão
intracraniana (náuseas, vómitos, cefaleias e sinais neurológicos focais).
� Ressonância Magnética Nuclear (RMN)
Para tumor, esclerose em placas, etc.
� Tomografia Computorizada (TC)
Para traumatismos crânio-encefálicos (TCE), acidentes vasculares
cerebrais (AVC), etc.
� Angiografia
Malformações vasculares e rupturas de aneurismas.
� Doppler carotídeo
Podem ainda pedir-se exames neurofisiológicos:
� Electroencefalografia (EEG)
No caso de epilepsia, entre outras patologias.
� Electromiografia (EMG)
Em miopatias e polineuropatias.
� Potenciais evocados
Para esclerose em placas.
Alguns diagnósticos dispensam exames deste tipo, como é o caso das
enxaquecas.
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Topografia da Lesão
As alterações neurológicas podem ser sistematizadas de uma perspectiva
topográfica, tendo em conta as várias estruturas do SNC.
HEMISFÉRIOS CEREBRAIS
A presença de lesão nos hemisférios cerebrais (fig.1) pode ser evidenciada
pelas seguintes alterações neurológicas:
� Envolvimento de funções corticais:
• Disfasia (lesão da área de Broca provoca a afasia de Broca: perda da
capacidade de produzir a fala, sem estar afectada a compreensão da
linguagem oral e escrita);
• Apraxia (perda da habilidade para executar movimentos e gestos
precisos, apesar do doente ter a vontade e a habilidade física para os
executar) – lesão no lobo parietal;
• Agnosia (perda da capacidade de reconhecer objectos, pessoas, sons,
formas) – uma lesão na área auditiva secundária, fará com que o doente
perca a capacidade de interpretar/reconhecer sons, apresentando, desta
forma, uma surdez para palavras/agnósia verbal acústica;
• Neglect (incapacidade em atender, explorar, responder ou orientar-se
para estímulos presentes no hemiespaço ou no hemicorpo contralateral)
– hemicorpo esquerdo, na sequência de uma lesão do hemisfério direito.
Fig.1 Cortéx funcional
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� Mono ou hemiparesias6.
� Mono ou hemiplegias7.
� Hemi ou monohipoestesias/anestesias dolorosas
Um doente que apresente alterações da sensibilidade, como anestesia nos
membros inferiores/superiores, deverá ter uma lesão entre o tálamo e a
cápsula interna.
� Defeitos nos campos visuais – hemianópsia homónima
Consiste em não ver metade do campo ocular em ambos os olhos,
resultante da lesão do córtex visual primário.
� Sindromas lobares
Conjunto de sintomas, resultante da lesão de determinadas áreas dos lobos
cerebrais. São exemplos de sindromas do lobo frontal, o sindroma fronto-
orbitário, cuja principal característica é a desinibição, e o sindroma da
convexidade, que provoca alterações da personalidade, entre outros8.
6 Paresia – diminuição da força muscular num ou mais membros, músculos ou grupos musculares. Hemiparesia – falta de força no membro superior ou inferior de um lado do corpo. Monoparesia – falta de força num só membro. 7 Plegia ou paralisia – abolição da força muscular. 8 Para saber mais sindromas, ver a partir da pág. 108 do capítulo “Sindromas dos Lobos dos
Hemisférios Cerebrais” do livro “Semiologia Neurológica”.
Homúnculo motor
Cápsula interna joelho e 2/3 anteriores da parte posterior
Pé do pedúnculo parte média
Protuberância
dispersão das fibras do feixe piramidal
Fig.2 Revisão do percurso do feixe piramidal. Abaixo das pirâmides, o feixe piramidal em parte cruza-se com o do lado oposto, formando o feixe piramidal cruzado. As fibras que não se cruzam formam o feixe piramidal directo.
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Observando a figura 2, compreende-se que:
� Uma lesão no córtex irá provocar uma monoplegia/paresia – só irá ser
afectado uma porção de um lado do corpo (braço face, mão, pé…),
correspondente à parte do homúnculo motor que ficou lesada.
� Uma lesão entre a área motora e a cápsula irá provocar uma monoparesia
ou hemiparesia desproporcionada – pode ser afectado, por exemplo, apenas
uma mão (monoparesia) se a lesão for mais próxima do cortéx, ou, caso a
lesão seja mais afastada deste, ser afectado todo o lado esquerdo do corpo,
com predomínio, por exemplo, do membro inferior (hemiparesia
desproporcionada). De notar que não ocorre plegia.
� Uma lesão na cápsula interna irá provocar uma hemiparesia/plegia – pelo
facto de todas as fibras da via piramidal passarem todas juntas na cápsula
interna, a lesão nesta zona irá provocar falta/ausência de força do hemicorpo
oposto (hemiparesia/plegia). Por exemplo, num doente que apresente uma
hemiplegia direita com paralisia facial central no mesmo lado, a paralisia não
corresponde a lesão na área motora do córtex. Nestes casos de paresias ou
plegias proporcionadas, a lesão está presente na cápsula interna.
� Uma lesão no tronco cerebral irá provocar um sindroma alterno – à medida
que a via piramidal desce pelo tronco cerebral, vai inervando vários pares
cranianos, cujas fibras exercem uma inervação homolateral. Deste modo, do
lado lesado há uma paralisia de um par craniano e do lado contrário uma
hemiparesia (sindroma alterno). Exemplo – lesão do feixe piramidal no
tronco cerebral ao nível do núcleo esquerdo do motor ocular comum (III) irá
provocar hemiplegia direita, com paralisia ocular esquerda.
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GÂNGLIOS DA BASE
Os núcleos basais (fig.3) desempenham um papel preponderante no controlo
da postura e movimentos voluntários.
O desenvolvimento de alterações no funcionamento dos gânglios da base
podem levar aos seguintes sintomas:
� Movimentos involuntários
• Tremor – oscilação rítmica e mecânica de pelo menos uma região
funcional do corpo; nos sindromas parkinsónicos, ocorre um tremor
essencialmente de repouso;
• Coreia – movimentos rápidos e involuntários “semelhantes a uma dança”,
que ocorrem em várias doenças, como na Coreia de Huntington;
• Atetose – movimentos de contorção lentos e contínuos;
• Balismo – movimentos involuntários, abruptos, intensos e violentos.
� Bradicinésia
Diminuição da velocidade e da amplitude do movimento, ocorrente nos
sindromas parkinsónicos.
� Hipertonia rígida9
9 Já referida no exame neurológico.
Estriado
Pálido
Substância negra Núcleo subtalâmico de Luys
Núcleo caudado (cabeça)
Putamen
Núcleos Basais
Fig.3 Gânglios da base
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TRONCO CEREBRAL
Fig.5 Núcleos do tronco cerebral
Mesencéfalo Núcleo vermelho (locus rubra) Substância nigra (locus niger) N. do motor ocular comum (III) N. do patético (IV) N. de Edinger-Westphal (III) N. mesencefálico do trigémio (V)
Protuberância N. do trigémio (sensorial principal e motor) (V) N. do motor ocular externo (VI) N. do facial (VII)
Bulbo N. do nervo auditivo (cocleares ant. e post. e vestibular) (VIII) N. salivatórios superiror (VII) e inferior (IX) N. do feixe solitário (VII, IX e X) N. ambíguo (IX, X e XI) N. dorsal do vago (X) N. do hipoglosso (XII) N. espinhal do trigémio (V) N. espinhal do acessório (XI) Decussação das fibras da via piramidal
N. ambíguo (IX, X, XI)
N. motor do trigémio (V)
N. do feixe solitário (VII, IX, X)
N. do hipoglosso (XII)
N. dorsal do vago (X)
N. coclear dorsal e vestibular (VIII)
N. do facial (VII)
N. do motor ocular comum (III)
N. do motor ocular externo (VI)
N. sensorial principal do trigémio (V)
N. mesencefálicodo trigémio (V)
N. espinhal do trigémio (V)
N. do patético (IV) Mesencéfalo
Protuberância
Bulbo
Fig.4 Núcleos dos pares cranianos no tronco cerebral
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Uma lesão no tronco cerebral (figs. 4 e 5) pode provocar:
� Sindroma alterno
Paresia de um nervo craniano ipsilateral10 e hemiparesia e/ou hemi-
hipostesia contralateral. São frequentemente causados por AVC’s
isquémicos nas artérias vertebrais, basilares e seus ramos.
� Sindromas de paralisias múltiplas de pares cranianos
As paralisias dos nervos cranianos podem combinar-se, quando as lesões
os atingem em regiões comuns de passagem, constituindo sindromas
característicos de algumas regiões da base do crânio. Eis alguns
exemplos:
• Sindroma do seio esfenoidal – atinge os óculo-motores (III, IV e VI
nervos) e o ramo oftálmico do V par, que passam no interior do seio
cavernoso;
• Sindroma da fenda esfenoidal – lesa os mesmos nervos que no
sindroma anterior, pois todos eles também passam pela fenda
esfenoidal;
• Sindroma do vértice da órbita – lesa os mesmos nervos e o II
nervo11.
� Sintomas e sinais específicos do tronco cerebral
• Disfagia;
• Disfonia;
• Dispneia;
• Diplopia.
10 Ipsilateral – mesmo lado da lesão. 11 Para saber em pormenor os sindromas, ver pág.115 e 116 do capítulo “Sindromas de Paralisias
Múltiplas de Pares Cranianos” do livro “Semiologia Neurológica”.
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CEREBELO
Classicamente, o cerebelo (fig.6) é composto por:
� Paleocerebelo
Constituído pelo lobo flóculo-nodular, com conexões essencialmente
vestibulares.
� Arqueocerebelo
Constituído essencialmente pelo lobo anterior e que recebe os feixes
espinho-cerebelosos.
� Neocerebelo
Composto pelos lobos posteriores, recebe aferências corticais através dos
núcleos da protuberância e envia eferências para o córtex, através do
núcleo rubro e do tálamo.
O paleocerebelo e o arqueocerebelo são responsáveis, sobretudo, pelo
equilíbrio axial (marcha, tronco, cabeça e movimentos oculares) e pelo tónus
muscular.
O neocerebelo controla o erro cortical (limita a extensão dos movimentos
voluntários), coordenando o equilíbrio cinético.
Fig.6 Anatomia do cerebelo
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As lesões no cerebelo podem resultar num sindroma cerebeloso,
caracterizado por:
� Ataxia
Manifestada por disartria, dismetria, tremor intencional, adiadococinésia,
assinergia e posta em evidência pelas provas dedo-nariz, calcanhar-
joelho, movimentos alternados rápidos, marcha, fala...
� Hipotonia
Num doente hipertónico, não há envolvimento do cerebelo.
� Reflexos osteotendinosos fracos
Existem vários tipos de sindromas cerebelosos:
� Sindroma cerebeloso axial
Ocorre alterações do equilíbrio axial: marcha de base alargada, vacilante, com
oscilações para o lado da lesão (marcha atáxica), pode ocorrer tendência para
cair para a frente ou para trás, dificuldade em manter a cabeça estável, em
manter o tronco erecto, nistagmo, etc. Pode estar afectado o paleocerebelo e/ou
o arqueocerebelo.
� Sindroma cerebeloso apendicular
Ocorre alterações de coordenação: consta de ataxia dos movimentos,
principalmente distais, dos membros homolaterais. Pode estar afectado o
neocerebelo.
� Sindroma pancerebeloso
Os sinais de disfunção cerebelosa são bilaterais, e afectam a marcha, o tronco
e os membros. Ocorrem alterações nos movimentos oculares e disartria.
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MEDULA ESPINHAL
As lesões medulares (fig.7) provocam o sindroma medular, caracterizado por:
� Alteração da força (para ou tetraparesias/plegias)
Devida a lesão dos feixes piramidais, acompanhada de espasticidade
(fenómeno da navalha de mola) e ROT vivos. Caso a lesão seja aguda, existe
hipotonia e ROT fracos, ou abolidos.
� Nível de sensibilidade
Presença de linha ou banda de hipersensibilidade, correspondente ao nível da
lesão, abaixo da qual há uma alteração sensitiva.
� Perturbações esfíncterianas e da esfera sexual
A incontinência ou retenção urinárias, menos habitualmente ou mais
tardiamente, rectal, bem como as alterações da potência sexual, devem-se ao
envolvimento das fibras medulares autonómicas.
� Sindromas medulares específicos
Consoante as características da lesão na medula, desenvolvem-se sindromas
medulares específicos12.
12 Descritos na pág. 104 do capítulo “Sindromas Medulares”, do livro “Semiologia Neurológica”.
Feixes de Goll e Burdach (sensibilidade profunda: postural e vibratória)
Feixe piramidal
+ Feixes espinho-cerebelosos (sensibilidade muscular e tónus)
Feixe espinho-talâmico (sensibilidade térmica-álgica)
Susbtância Branca Cordões posteriores
Cordões laterais Cordões anteriores
Substância Cinzenta
Corno posterior Onde entra o axónio do 1º
neurónio da via da sensibilidade
Corno anterior Onde se inicia o 2º neurónio
da via da motilidade
Fig.7 Corte transversal da medula espinhal. A organização é diferente nos cordões posteriores e nos laterais. Nos primeiros, as fibras, à medida que vão entrando, empurram as dos segmentos inferiores para dentro. Assim, as fibras sagradas (S na figura) são as mais medianas, as cervicais (C na figura) são as mais externas. Nos segundos, a organização é inversa (as fibras sagradas são as mais externas).
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NERVO PERIFÉRICO
Quando o nervo periférico (segundo neurónio da via da motilidade) é afectado,
pode-se obter uma mononeuropatia (um só nervo raquidiano afectado), uma
polineuropatia (vários nervos raquidianos afectados) ou uma neuropatia motora
ou sensitiva, consoante a célula afectada seja do corno anterior ou posterior da
medula13.
O sindroma polineuropático é caracterizado por:
� Diminuição da força
Paresias/plegias (mono, para ou tetra) simétricas e assimétricas,
frequentemente mais distais. O mais habitual é paresia dos pés e pernas,
seguido pelas mãos, pois as fibras mais grossas e compridas são as mais
susceptíveis.
� Alterações da sensibilidade
Também são distais, com hipostesia ou anestesia “em meia” (membro inferior)
ou “em luva” (membro superior).
� Alterações autonómicas
A lesão do SNA provoca alterações vasomotoras e da sudação, conduzindo a
alterações tróficas (úlceras e articulações de Charcot – articulações que se
tornam insensíveis à dor, o que leva à sua destruição com os traumatismos
repetidos). Estas alterações tróficas estão bem patentes nos doentes com
polineuropatia diabética.
� Restante sindroma do segundo neurónio
As lesões no segundo neurónio provocam:
• Abolição de todos os movimentos (voluntários, automáticos e reflexos),
• Hipotonia,
• Abolição dos ROT’s,
• Atrofias musculares,
• Fasciculações14.
13 Este tema irá ser mais pormenorizado na aula de Doenças Neuromusculares. 14 Fasciculações – contracção involuntária rítmica e indolor de um feixe muscular, que não provoca
movimento segmentar.
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MÚSCULO
Uma miopatia refere-se a qualquer doença dos músculos.
O sindroma miopático ou das doenças musculares consiste no seguinte
conjunto de sinais e sintomas:
� Paresia/plegia dos pares cranianos
� Fraqueza muscular/paresia/plegia dos membros
É o sintoma predominante e tem, em regra geral, um predomínio proximal (ao
passo que, nas neuropatias, tem um predomínio distal). Pode ser simétrica ou
assimétrica. Devido à fraqueza muscular ser essencialmente proximal, o
sindroma miopático causa a chamada marcha miopática (marcha de balanceio
de pélvis, semelhante a um pato a andar). A falta de força proximal dos
membros faz com que o doente, quando se tenta levantar, o faça por etapas:
primeiro põe as mãos no chão, depois nos joelhos, de seguida nas coxas –
manobra de Gowers.
� Diminuição do tónus muscular
� Diminuição dos reflexos osteotendinosos
Mas sem abolição destes.
� Dores e cãibras
� Dor à palpação das massas musculares
� Atrofia muscular
� Pseudo-hipertrofia muscular
Pode ocorrer em vez da atrofia muscular; o músculo aumenta de volume por
fibrose, o que lhe confere uma consistência aumentada à palpação.
� Miotonia
Incapacidade de relaxação muscular rápida e completa após uma contracção.
Por exemplo, dificuldade em abrir a mão, depois de a fechar.
� Mioquímia
Contracção involuntária repetida de um músculo ou parte de um músculo.