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FichaCatalográficaelaboradaporSuelyO.Moraes-CRB11/365B277fBarros,RooneyAugustoVasconcelosO Futebol e as expressões da vida na Amazônia profunda. / Rooney

AugustoVasconcelosBarros.–Manaus:EDUA,2017.116p.:il.ISBN978-85-7401-XXX-X1.Esporte-Sociabilidade.2.Futebol-Lazer.3.Futebol-Cultura.I.Título.

CDU796.332(811.3)

FichaCatalográfica

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ParaMinhamãe,ConceiçãoVasconcelos,meupaiAntônioBarros

Quemederamavidaeimprimiramemmimosprincípiosquenorteiammeucaminhar.

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Quemnãosonhaoazuldovoo,perdeopoderdepássaro.É sonhar, mas cavalgando o sonho e inventando o chão para o sonho

florescer.ThiagodeMelo

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PREFÁCIO

O tema do futebol em suas manifestações socioculturais discutido por

Rooney Augusto Vasconcelos Barros, neste livro, traz significativascontribuiçõesparaacompreensãodosestilosdevidaemduascomunidadesdoAmazonas,noBrasil.Trata-sedeumavigorosapesquisarealizadanoâmbitode seus estudos pós-graduados desenvolvidos junto ao Programa de Pós-graduação Sociedade e Cultura na Amazônia da Universidade Federal doAmazonas,voltadaparaacompreensãodofutebolcomoumapráticasocialdelazerquearticulaacultura,asociabilidadeeoespíritodefraternidade,numadisputa saudável que dá conta do varar da vida entre os moradores dascomunidades tradicionaisHarmonia eNossaSenhora deNazaré, localizadasnoEstadodoAmazonas.

O autor está preocupado em demonstrar que, embora o futebol tenhaassumido historicamente um cariz de masculinidade, não deixa de ser,atualmente, uma prática social protagonizada também por mulheres, que seveem,mobilizadasemsuacorporeidade,comosujeitoquesecriaerecriaemsuasubjetividadeesatisfaçãohumana.

NessefeixedediscussãoRooneyBarrosevidenciaofutebolcomoolugarde manifestações socioculturais, na perspectiva de pertença dos sujeitoshomem e mulher, no sentido de solidariedade, cooperação e união,mobilizandoasubjetividadedoscorposnoprotagonismodosjogos.

A Amazônia e sua gente é o solo cultural sobre o qual Rooney Barroslança seu olhar e deita raízes o seu pensamento.O futebol é uma expressãodiacríticadopovobrasileiro,sendo,pois,umapráticasocialquerearticulaasociabilidadedospovostradicionaisdaAmazônia,numarelaçãoternáriacomoselementos terra/água/floresta.NaperspectivadeMorin(2000), trata-sedeumarelaçãoindividuo/sociedade/espécie,queentrelaçaomundodavidanumcaleidoscópiodepertençacomoplaneta.

RooneyBarros,nesteseuconcretopensado,assumeumaposturaengajadacomaAmazônia.Aocunharaexpressãofutebolvarzeano,oautornotabilizae

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visibiliza os moradores de Harmonia e Nossa Senhora de Nazaré,apresentando-os cientificamente na ode do conhecimento. Isto, porém, nãoencapsula o autor no regionalismo, mas lança-o ao mundo com um temaglobalizado, capaz de canalizar energias de alegria e entretenimento, o quepodeevitarproblemasdedegenerescênciadohumano.

Neste livro, Rooney Barros alça o voo de gênero, entrando nestacomunidade cientifica com grande desenvoltura. Capta bem o conceito degêneroenquantorelaçõescapilarizadasnasociedade,comovernizheurísticoexplicativodavidaemtodasassuasdimensões.Opropósitodoautorsevoltapara a percepção do entrelaçamento entre a subjetividade dos jogadores e asociabilidadecomunitária,numprocessoidentitáriocomofutebol.

Sugiro a leitura detida deste opúsculo que se apresenta como leiturafundamentalsobreaAmazôniaprofundaesuagente.

Águasdemarço,2017.

IraildesCaldasTorres

AntropólogaProfessoraAssociadadaUniversidadeFederaldoAmazonas

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INTRODUÇÃO

Urge fazermos e valorizarmos a história local para não continuarmos

estrangeirosaonossopassado,esquecidosdenossasorigenseobstinadospelavontadedesermosinovadorespelacópiaoutraduçãodemétodosestrangeiros.

MaryDelPrioreEste estudo se ocupa de uma discussão sobre o futebol e suas práticas

sociaisenquantoespaçodemanifestaçãosocioculturalentreosmoradoresdeduas comunidades tradicionais da Amazônia. Trata-se de uma viageminvestigativacircunscritaaosnossosestudosdemestrado juntoaoProgramade Pós-graduação Sociedade e Cultura da Amazônia. A nossa inquietaçãorepousousobreatemáticadegêneroaqualnasceudaexperiênciavivenciadano contexto daAmazônia profunda, ambiente onde residimos desde a nossainfância.

Navegarnestatemáticasignificou,paramim,oconhecimentodaestruturadesta realidade social, permitindo-me mergulhar na minha própria história.Busca-se analisar esse espaço varzeano entrelaçado ao cotidiano da minhainfância,vivenciadanaAmazôniaprofunda(TORRES,2012),naconfluênciaentreosmunicípiosdeParintins1eBarreirinha2,noAmazonas.Fazerpartedahistóriadestecontextoamazônicosignificou,emúltimaanálise,umavoltaaomeu passado.Ou seja, trata-se de ummomento de fazer fluir a imaginação,reabilitando lembranças vividas na minha infância, num mundoconfortavelmente romântico do ponto de vista de uma criança, mas que jánaquele momento interrogava-me sobre a estrutura da sociedade em quevivíamos.

Pesquisar uma temática circunscrita ao lugar onde vivi meus primeirospassos e o contato com a bola de futebol significou, outrossim, embarcarnuma viagem às memórias do meu passado, fazendo-me recordar algumas

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brincadeirasdeinfânciacommeusamigos,meusprimeirosdiasnaescolaeasperipéciasdeumgarotomoradordeumacomunidadedevárzea.

Lembrei-me do pular n’água, mergulhando por baixo das canoas e dosbarcos,brincandocomamigosnoscamposde futeboldacomunidadeNossaSenhoradeNazaré,ondenasci.Remavaatéaescola,pescava,enfim,realizavaumasériedeatividadessocioculturaisquepoderiamsignificaruma"bibliotecadeexperiências"navidainfantil.ParaSarmento(2006,p.57)

[...]asculturasdainfânciaexprimemaculturasocietalemqueseinserem,

mas fazem-no de modo distinto das culturas adultas, ao mesmo tempo queveiculam formas especificamente infantis de inteligibilidade, representação esimbolizaçãodomundo.

Estamos falando de experiências adquiridas desde a infância, frutos deconhecimentosquemepossibilitaramumarelativaindependêncianocontextosocioculturalamazônico,emseusaspectosmaisprofundosquemepermitiramo desenvolvimento de algumas habilidades que me levaram a lidar com anaturezadeformamaissegura.

Estaexperiênciamefezperceberqueos jogosdefutebolatraiamparaascomunidades um maior número de pessoas. Trata-se de elementosfundamentaiseestratégicosparainteraçãoentreosmembrosdacomunidade.Essecontatopermitiu-meumretornoaoslugaresvividosnaminhainfânciadeondeviriamasmotivaçõesnecessáriasaomeuobjetodeestudo.

As observações que realizamos nas duas comunidades pesquisadasganharam dinamicidades no contexto dos torneios de futebol, ondeconstatamos as relações de sociabilidade presente na vida dos moradoresdessascomunidades.Ésobestaóticadasrelaçõessociaisedegêneroqueestelivroseassenta,numadiscussãodofutebolcomoespaçodesociabilidadedepráticassociaisdehomensemulheres.

Apesquisaassumiuoaporteteórico-metodológicodasciênciassociaissobo fluxodas abordagens qualitativas semexclusãodos aspectos quantitativos,envolvendoprincipalmenteumdiálogocomEliaseDunning(1992),Foucault(2001),Bourdieu(1989).DaMatta(1982)acreditaqueépossívelrealizarumaleitura do sistema social brasileiro através do futebol, pois nesse esporte,atravésdedramatizaçõesdomundosocial,asociedadeseexpressa,apresentae revela características de sua cultura. Neste estudo fizemos uso de fontesvivas, no âmbitodahistória oral,momento emque catalogamos relatosdossujeitosdapesquisa.Aoralidadeéumapráticadeapreensãodenarrativasfeita

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pormeiodousodosmeioseletrônicosdestinadaarecolhertestemunhoscomo intuito de facilitar o entendimento como alternativa para o estudo dassociedades.

O lócus da pesquisa se estabeleceu nas comunidades Harmonia e NossaSenhora de Nazaré, localizadas no Baixo Amazonas no lugar denominadoRepartimento do Limão, que recebe esta denominação em virtude deconstituir-se no marco divisório entre os Municípios de Parintins eBarreirinha. O trabalho de campo foi realizado junto a uma amostra de 25pessoas, sendo 10 homens e 15 mulheres sob a técnica de entrevistasemiestruturada. Ouvimos também 04 líderes de time de futebol, sendo 02homens e 02 mulheres que residem nas comunidades pesquisadas.Entrevistamos, por fim, o Coordenador de Esporte da Secretariaria deEducação (SEDUC-AM) de Parintins e o Secretário de Educação deBarreirinha.

O Brasil é um país geograficamente extenso e de grande diversidadeculturaloquenospermitefazermúltiplasleiturassobreosespaçosdapráticado futebol seja nos grandes clubes ou nos jogos de futebol de várzea onderealizamosnossainvestigação.Denominamos,paraefeitodesteestudo,futeboldevárzeaàspráticas futebolísticasnãooficiais, taiscomo: jogosentre timesamadoresrealizadosnoterritóriodevárzea.

No âmbito da sociologia do esporte o processo social é marcado peloindividualismo, sendo, pois, o futebol transvestido de relações que sedesdobram em papeis cuja função social promove a cooperação, união esociabilidade. As atividades esportivas nessas comunidades se dão comomomentosespeciais,porquearticulamefortaleceasrelaçõessociaiscomosmoradores das comunidades vizinhas. Nos encontros futebolísticos sãodiscutidosproblemasdocotidiano,sejameleseconômicos,políticos,sociaisereligiosos,enfim,éummomentodecelebraçãoedefesta,tendonoesporteofatordeexpressãoemanifestaçõessocioculturais.

A prática de futebol em cada comunidade se desenvolve e se estabelece,tendo por base o diálogo interdisciplinar que rege os estudos realizados noProgramadePós-graduaçãoSociedade eCulturanaAmazônia.ParaGeertz,(1989), o futebol é parte da teia de significados que os humanos, em suadinâmicasocial,vãoconstruindoconstantementeatualizandoerevivendo,teiaessaqueconstituiaprópriaculturadeumpovo.

O livro está seccionadoem três seções.Naprimeira seçãodiscutimosasquestõesrelativasaofutebolcomoespaçodemanifestaçõessocioculturais.Na

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segunda seção analisamos a função social do futebol e suas manifestaçõesintersubjetivas. E a última seção traz a análise das relações de gênero comdestaqueespecialparaasmulheresnapráticadefutebolnasduascomunidadespesquisadas.

Nãopoderíamosdeixardeagradeceràspessoasquecontribuíramparaoêxitodestetrabalho.Emprimeirolugarvoltoomeuolhardeagradecimentoàminha orientadora, professora doutora Artemis de Araújo Soares, queconduziucomdesveloestetrabalho.Meusagradecimentossevoltamtambémpara a Capes que me concedeu bolsa sem a qual não teria concluído estapesquisa.Nestamesmalinha,devoagradeceraPropesp/UfameaCapes,quegarantiramapublicaçãodestelivro.Porfim,devoespecialagradecimentoaossujeitosdestapesquisaquemereceberamemsuascasasparaacoletadedadoscom disposição e solicitude. À todos os moradores das comunidadesHarmonia e Nossa Senhora de Nazaré, objeto deste estudo, recebam omeusinceroagradecimento.

Deve-sereconhecerarelevânciasocialdesteestudoparaosmoradoresdascomunidades tradicionais da Amazônia profunda, no que tange às práticassociais do futebol, envolvendo as relações de gênero no processo decorporeidadee ludicidadequeentrelaçamosimbólicoea intersubjetividade.Espera-sequeestedocumento-diagnósticopossacontribuirparafundamentara elaboração de políticas públicas de lazer para os moradores dascomunidadesestudadas.

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CAPÍTULOI:OFUTEBOLCOMOESPAÇODEMANIFESTAÇÕESSOCIOCULTURAIS

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1.1Ofutebolnocontextobrasileiro

Pode-se definir a cultura como a totalidade das reações e atividades

mentaisefísicasquecaracterizamacondutadosindivíduosquecompõemumgruposocial,coletivaeindividualmente,emrelaçãoaoseuambientenatural,aoutrosgrupos,amembrosdomesmogrupoedecada indivíduoparaconsigomesmo.

FransBoasA prática do futebol é uma atividade milenar e na atualidade é um dos

principais fenômenos sociais da atualidadedomundomoderno, tendo comoexemplo, a Copa doMundo que vem se constituindo como um dos eventosmais esperados, que ocorre de quatro em quatro anos. A sua trajetória jáassumiu as mais variadas formas simbólicas de representatividadesociocultural, tais como: treinamento militar, ritual de oferenda aos deuses,fertilidadeeumadiversidadedesignificados.

Aconfiguração3dofutebolmodernosecompreendecomoumreflexodosistemaeconômicovigentedomundocapitalistaonde,estehomemmodernoécompelido pela concorrência e competição, como retrataDaMatta (1994, p.11),"[...] dando-lhe a higidez necessária à sua sobrevivência num admirávelmundonovo,nesseuniversogovernadopelomercado,peloindividualismoepelaindustrialização".

NoBrasil,nobojoda"modernização",atrajetóriadofutebolfoimarcadaporumcomponentesocialmuitoforte.Ahistóriadofutebolteceumdiálogocomosregimestotalitáriosemesmoasdemocraciaseháumgrandevolumedeobrasnamaioriadelasconstruídasporjornalistasdedicadosaofutebol,sãoobrascruciasparaacompreensãodofutebolquehojeconhecemos.

Tomamoscomopropostaconhecermaisnossasociedadeapartirdeumaperspectivasocioculturalenessalinhaderaciocínioveremoscomoofutebolfoi se transformando em "paixão nacional" e aomesmo tempo ummeio decompreensãodoprocessosóciohistóricobrasileiro.

AproduçãodestapesquisasurgenocontextodaCopadoMundonoBrasilde2014.Éumeventodaplenitudedapráticadofuteboleumdosmeiosmais

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significativosparaacompreensãodosaspectossocioculturais,poiscomportauma imensa gama de aspectos da diversidade cultural compartilhadas, alémdasinfluênciasdasinstituiçõespolíticasemídiasnosmaisdiversosdiscursos,bemcomo,asexpressõesverbaisenãoverbais,osaspectossimbólicosenfim,asrelaçõesentretorcedoresdediferentespaíses.

OfutebolmodernoéumdosfenômenossociaisqueconseguecompactarumadramaticidadesocialdatotalidadedasexpressõessocioculturaisemtornodaCopadoMundo,sedáaconcretizaçãodasrelaçõessociaisdesociabilidadeinseridasnumprocessode"civilização4",ondeépossívelvisualizardiferentespessoasediversosaspectoslinguísticosmasquesecompreendememtornodofutebol.

Compreenderacontextualizaçãosóciohistóricadatrajetóriadofutebol,émuitomaisquecompreendê-locomoumapráticadelazer,éumaatividadequesecaracterizacomumalinguagemexpressivapróprianadramaticidadedeseudesenvolvimento onde se visualiza lances, jogadas, gols e intrinsecamentemanifestações socioculturais. Vejamos a crônica jornalística de NelsonRodrigues(1993,p.103):

Certoebrilhanteconfradedizia-meontemquefutebolébola.Nãohájuízo

maisinexato,maisutópico,maisirrealístico.Ocolegaesvaziaofutebolcomoumpneu,erepito:-retiratudoqueeletemdemisteriosoedepatético.Amaissórdidapelada é deuma complexidade skakesperiana.Àsvezes, numcornermaloubembatido,háumtoquedeevidantísmosobrenatural.Eudiriaaindaaoilustreconfradeoseguinte:-emfutebol,opiorcegoéoquesóvêabola.

OjornalistaNelsonRodriguesfoiumgrandesimpatizantedoesporteede

forma poética revela informações sobre a tessitura do futebol que estava seconstruindonoBrasil,masacimadetudoumafontedeinterpretaçõesparaacompreensãodasociedadebrasileira,umavezqueasformasdemanifestaçõesficavam restritas às classes dominantes em detrimento da cultura popular.Assim, ele encontrou nas crônicas um excelentemeio demanifestação parapodertransmitirseussaberes.

Nesteuniversosóciohistóricodofutebolbrasileiropermitenosdizerqueentre outros aspectos o futebol desperta os mais profundos sentimentos dasociedade como, alegrias, tristezas, agressividade enfim, um universo de

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impulsos emocionais benéficos para si e para os outros, manifestandocaracterísticaspsicológicasmaisintensasdeumasociedade.

Buscar compreender o processo sócio histórico do futebol brasileiro éuma possibilidade de mergulhar na profundidade da formação e integraçãosocial, uma vez que o futebol se transformou desde a segunda metade doséculo19eagorainíciodoséculo21emumaatividadequecongregatodosasclasses sociais do país. Talvez essa diversidade cultural seja uma dascaracterísticas que diferencia o Brasil dos demais países, neste de ponto deanálisesobreofutebolnoBrasilToledo(2000,p.27)afirma:

Ofutebolpodeserpensadocomoumsímboloflutuantejustamenteporque

não produz este consenso, ao menos não na sua totalidade, mas pode servislumbradocomoumfenômenoculturalnoqual todosarticulam,comumaboa dose de especulação, cientificismo, ‘magia’ e emoção, suas teorias edoutrinas,eque,literalmente,investemnassuasfalasesaberesdeterminadosvaloresque,aísim,talvezproduzamidentidadesemalgunsníveis.

O autor não compactua com a ideia de que o futebol seja um símbolo

nacional, este denomina de símbolo flutuante, mas considera o futebol degrandeimportânciaenoaspectoculturalépossívelatravésdestecompreenderadescriçãodeserbrasileironassuas relaçõessociaiseespaciaisecapazdeaglutinar um grande número de pessoas em torno de seu desenvolvimentocomoatividadedesportiva,assimservindocomoumaespéciede laboratórionaturalnoentendimentodasrelaçõessocioculturais.

Fazendo uma análise sócio histórico do universo do futebol noBrasil epartedonoséculo19,haviaumaespéciedeseparaçãooufronteirasentreeliteesetorespopulares,enquantoaselitespraticavamofutebolcomoumeventosocial para seus pares ou sujeitos de sua classe social, por outro lado ascamadas populares improvisavam e praticavamo futebol na clandestinidade.Dessaforma,nasconcepçõesdeFrancoJunior(2007,p.64):

Havia, então, dupla concepção do futebol. De uma parte, estava a

perspectiva pedagógica europeia, presente no Brasil pelo menos desde oparecer de Rui Barbosa sobre a Reforma do Ensino Primário em 1882.Harmoniadosmúsculos,higienizaçãodoscorpos,etiqueta,coordenaçãodosmovimentos e controle da violência seriam elementos a contribuir para ofortalecimentomoral e solidáriodos futurosdirigentesdopaís.Em1905,o

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escritorAfrânioPeixotocelebravao futebolporquenele ‘vencer significavadisciplina, cooperação, solidariedade eficaz’. Na mesma linha, alguns anosdepois o jornal carioca Correio da Manhã creditava importante lição aofutebol,poreleser‘namaiorpartedasvezesaantítesedalógica’(1/12/1919).Deoutraparte, estava a realidadenacionalde corpos adestradosno trabalhobraçal e habituados aos folguedos das danças populares e a toda sorte deimprovisações da arte damalandragem, vinculadas a precárias condições devida.Íntimosdosgestosacrobáticosdatemidacapoeiraoudasaçõescoletivasdo ruidoso movimento operário, os corpos de negros, de imigrantes e daarraia-miúda branca possuíam outros saberes, expressões habilidades queviriamaserdeterminantesnasuamaneiradejogarfutebol.

Aprática do futebol em finais do século 19 ganhamnovos espaços e os

estádios começam a ser construídos num processo de modernização versusurbanização, assim o que eram os simples espaços de lazer agora iriam setransformar em grandes monumentos das cidades brasileiras. Afinal,lembrandoaspalavrasdeJacquesLeGoff(1990,p.545),"[...]odocumentonãoéqualquercoisaqueficaporcontadopassado,éumprodutodasociedadequeofabricousegundoasrelaçõesdeforçasqueaídetinhamopoder".

Ofutebolcomopráticadesportivafoiganhandoforçasepaulatinamenteseampliando, quando chegou aos mais diversos segmentos sociais setransformou numa linguagem comum entre as classes socioeconômicas edevido a esta popularidade a administração pública tomou para si oordenamento como atividade desportiva. Nesse sentido concordamos comFoucault(2001,p.183-184):“[...]oindivíduonãoéooutrodopoder:éumdeseusprimeirosefeitos.O indivíduoéumefeitodopoderesimultaneamente,oupelopróprio fatode serumefeito, é seucentrode transmissão.Opoderpassaatravésdoindivíduoqueeleconstituiu”.

Nesta assertiva, Foucault evidencia o processo disciplinador do corpo apartirdastécnicasmanipuladaspelossujeitosqueaconduzemparaomelhordesempenho da atividade e se constituindo como elemento crucial naconstituiçãodohomemmoderno.Nesseprocessohistóricoocorpodonegroé um elemento a mais, uma vez que são suas destrezas ou peculiaridadescorporais que favorecem o desempenho na prática do futebol e lheoportunizaramaintegraçãosocial.

AsaçõescorporaisdossujeitosmarginalizadosnoséculoXIXsãoumdosmeiosdecompreensãosocioculturaldasociedade, seusaspectos,oumelhor,

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suas habilidades lhes permitiram a integração na vida cotidiana, mas agoracomopartesdocorposocialdesuaépoca,essaparticipaçãovaiseconstruindopaulatinamente,ouseja,alongoprazonaconstituiçãoeformaçãosocial.

Osespaçosdefutebolforamganhandoinstitucionalizaçãoenormatizaçõesque norteiam as práticas sociais de lazer dos indivíduos, é uma espécie demoldura ou vigilância que se constituem nos espaços de relações esignificaçõesnosmaisdiversoslugaresdopaís.Nosespaçosdestapesquisaaprática do jogo de bola se desenvolve no tempo livre dos moradores dacomunidade, não há uma norma obrigatória pra que seus torcedores eespectadores participem, mas existe um sentimento não obrigatório emcompartilharproblemaseemoçõescotidianasdacomunidade.

SegundoBourdieu(1989),osentidodefuncionamentodeespaçosocialécompreensíveldesdequesepercebaas relaçõesentreossujeitossociaisqueocupam esses espaços, nesse entendimento o papel das ciências sociais é oponto chavepara se perceber osmúltiplos aspectos, sejam socioculturais ousimbólicos.Bourdieu(1989,p.82),conceituacomo:“[...]aciênciasocialdeveenglobar na teoria do mundo social uma teoria do efeito da teoria, que aocontribuirparaimporumamaneiramaisoumenosautorizadadeveromundosocialcontribuiparafazerarealidadedessemundo[...]”.

Ressalta-sequequandoumaatividadechegaemalgumlugar,estajáéfrutode toda uma construção histórica e devido a dinâmica sociocultural, aspopulações que a recebem acabam incorporando novas facetas, pois todaatividadetemseusproblemaseemcadalugarsearticulamformasderesolvê-los.UmexemplodessaconcepçãoéreiteradoporBourdieu(1989,p.37):

Parasenãoserobjetodosproblemasquesetomamparaobjecto,épreciso

fazer a história social da emergênciadesses problemas, da sua constituiçãoprogressiva, quer dizer, do trabalho coletivo – frequentemente realizado naconcorrência e na luta – o qual foi necessário para dar a conhecer e fazerreconhecer estes problemas como problemas legítimos, confessáveis,publicáveis,públicos,oficiais[...].

Transitar dialogando nos espaços do futebol é um exercício prazeroso,

masmuitasvezesangustiantes,quandosecompreendeaslutastravadassobreosproblemasnocotidianodessaspopulações.

Osespaçosdefutebolemáreasdevárzeas,apresentamumavitrineemcéuaberto, muito mais que o futebol, se vê pessoas com conhecimentos sendo

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socializados e um laboratório aos olhos do pesquisador. Se buscarmos umacompreensão historiográfica dos espaços e a trajetória da modalidadeesportivanacomunidade,aspossibilidadesde reflexãoapresentamum lequedepossibilidadesinterpretativasemtornodesi.

OcontextonoqualofutebolsurgenoBrasil,sedáapartirdoprocessodemodernizaçãoeurbanizaçãodoeixoRiodeJaneiroeSãoPaulo,osprojetosdesseprocessopromovemoencontrodediversasculturaseconsequentementeoaumentodaimigraçãoemfunçãodasmudançasdemãodeobraquedeixavadeserescrava.

AhistóriadaorigemdofutebolnoBrasilsegundoFrancoJúnior(2007,p.61), "[...] coincide com uma tradição autoritária brasileira de privilegiar oprotagonismodaselitesemdetrimentodosdemaisgrupossociais".

Ofutebolficavarestritoaoscolégioseaosgruposouassociaçõesdaeliteinglesa. A sua origem se atribuía aos selecionados por critérios de cor eclasse, eram formas excludentes da sociedade de meados do século XIX,possivelmenteporessescritériosascamadaspopularespraticavamo futebolnaclandestinidade.NaobradocronistaMarioFilho5(2003,p.126),elerelata:

Desaparecera a vantagem de ser de boa família, de ser estudante, de ser

branco.Orapazdeboafamília,oestudante,obranco, tinhadecompetir,emigualdadedecondições,comopé-rapado,quaseanalfabeto,omulatoeopretoparaverquemjogavamelhor.Eraumaverdadeirarevoluçãoqueseoperavanofutebolbrasileiro.

As estruturas sociais e econômicas se configuram nestes relatos como

objetodeseleçãocriteriosaondeopreconceitoracialesocialeramnotórios,masofutebolvemserumdoselementosquevaiabrircaminhosediscussõessociais que se formavam nos espaços brasileiros. Constituindo em torno dofutebolnovosconsumidoreseestilosdevidadestapráticaeclassificaçãodeagrupamentossociais.ComobemcaracterizaBourdieu(1983,p.127):

[...] é preciso que haja bens classificados, de ‘bom’ ou ‘mau’ gosto,

‘distintos’ ou ‘vulgares’, classificados e ao mesmo tempo classificantes,hierarquizadosehierarquizantes,equehajapessoasdotadasdeprincípiosdeclassificações,degostos,quelhespermitamperceberentreestesbensaquelesquelhesconvém,aquelesquesão‘doseugosto’.

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Nestepontodecompreensãodahistóriadofutebol,éumfatoadmitidoporváriospensadores, quanto àdisseminaçãoporpartedas elitesque chegavamaoBrasilequeorganizavamaspartidasdefutebol.

Aseliteseuropeiasfundamentaramasregrasdofuteboleinstituíramcomoaspectos estruturais e ideológicos que ainda figuram em nosso futebol.Aospoucos o futebol elitista e as classes populares começaram em torno de sidiálogos, considerando que as classes populares estavam dando um novoformatoàpráticadofutebol,emborahouvessegranderesistênciaporpartedaselites, mas seriam as classes populares que dariam um novo horizonte aofutebolbrasileiro.

Asclassespopularescompostaspelosoperáriosquesereuniamemtornodasfábricas,emterrenosbaldiosenasvárzeasdosrios,aprenderamadriblarváriosproblemasvivenciadosnocotidiano,desdeacriatividadedefazerumaboladepanooupapelháterrenoscheiosdeburacosqueimprovisavamojogode bola como prática do lazer.Mesmo sobre esse estado de precariedade, ofutebolsetornouumaexpressãodasmanifestaçõesdapopulaçãobrasileiraenaatualidademuitomaisqueumespaçocênicoéumespaçodecompreensãosociocultural.

AhistóriadofutebolnoBrasilé tambémahistóriada lutadeclasses,dopreconceitoeintegraçãodonegronasociedadedeclasses,enfimdaformaçãodopovobrasileiro,estesfatoresforamcruciaisparaaconstruçãodeobjetosdepesquisascomoproblemáticasquelevariaosintelectuaisdaépocarefletirsobreasociedadequeseconstruíanoBrasil.

O sociólogo Freyre (1945), foi um dos mais eminentes pensadores nocontexto dos acontecimentos, este se propôs a analisar, como se dava aformaçãoculturaldopaísondeapresençanegraéseuobjetodepesquisa,naclássicaobra,"Casagrandesenzala",estefazumestudosociológicoapartirdaculturadosnegrosafricanosnoBrasil,emsuasanálisesestaaartedejogarboladobrasileirocomparadoaosingleses.

ConformeoscomentáriosdeFreyre(1945,p.421-422):Onossoestilodejogarfutebolmeparececontrastarcomodoseuropeus

porumconjuntodequalidadesdesurpresa,demanhã,deastúciaeligeirezaeaomesmotempodebrilhoedeespontaneidadeindividualemqueseexprimeomesmomulatismodequeNiloPeçanhafoiatéhojeamelhorafirmaçãonaartepolítica.Osnossospasses,osnossospitus,osnossosdespistamentos,os

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nossos floreios com a bola, [...] alguma coisa de dança e capoeiragem quemarcamoestilobrasileirodejogarfutebol[...].

Entende-se que há um período relativamente longo na história doBrasil

que já secomentavao futebolassociadoàscaracterísticasartísticasdepovo.Assim, o jeito de jogar bola foi se constituindo como uma das maioresmanifestaçõesdasaptidõesdojeitoeexpressãodeserbrasileiro.Éumaformade ver os brasileiros na sua individualidade e como sujeito coletivo, bemcomoospreconceitossociais.

Neste ponto de raciocínio, essas aptidões permitiram concomitantementeaobrasileiroobterno futebolummeiodeascensãosocial, tendoemvistaodesempenho dessas peculiaridades corporais de alguns indivíduos, queconseguiraminserirsuashabilidadescorporaisnapráticadofutebolmoderno.

As classes populares se apresentavam em um lugar que podemosdenominá-lo de "palco de futebol de várzea", uma vez que não havia umapreocupaçãoprofissionalmas,frenteàprecariedadedocontextosocialvivido,precisavammostrar suas habilidades para ganhar alguma visibilidade, daí aimportânciaqueestesdavamàquelemomentoondesuaapresentaçãopoderiacustarpossibilidadesdeinserçãosocial.

SãodessesencontrosquecomeçamasedesenvolverofutebolnoBrasileentre as classes sociais, fossem eles não afortunadosmas com aptidão parajogarbolaaospoucosvãofazendopartenacomposiçãodostimesdaselites.Hobsbawn(1997,p.297)afirma:"[...]uma‘culturafutebolística’original-umconjuntoespecíficodeprocedimentossobreumanovabasesocial".

Odesenvolvimentodapráticade futeboldecampo foi seconstruindonoBrasil, a partir da constituição do processo urbano das cidades versusformaçãoeintegraçãodasclassessociaisnumintercâmbiocomassociedadeseuropeias. Foi no decorrer desse processo que houve a constituição sócio-histórica das bases de formação do estado brasileiro. Partindo destespressupostosepistemológicossobreahistoriografiadofutebol,Toledo(2000,p.9)discorreque:

[...]disseminadonoBrasilemfinsdoséculoXIXpelosfilhosdaselites–

quetomaramcontatocomasmanifestaçõesesportivasnasescolaseuropeias,onde geralmente eram educados – o futebol espraiou-se também entre ascamadas populares. Estas rapidamente adestraram-se nos seus fundamentos

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técnicos, na interpretação das suas regras e na percepção dos seus sentidosmais lúdicos, conferindo-lhes significados e dinâmicas sociais originais –muitas vezes divergentes dos desígnios supostamente civilizatórios que seemprestavamaéticaesportivapropaladapelosindivíduosdascamadassociaismaisabastadas.

Nessesentidodecompreensãopodemosinferirqueosfilhosdaeliteque

aqui se encontravam, eram financiadores da prática do futebol, essamesmaelitequeseimplantaranoBrasilnoprocessodeindustrializaçãodopaís.Daíalógica ou estreita relação entre as atividades econômicas e sociais para acompreensão desse complexo processo de formação de uma "cultura dofutebol".

Vai desencadear um longo processo de luta de classes e preconceito nopaís, até o momento em que a arte de jogar bola do brasileiro lhesproporcionará visibilidade, integração sociocultural, direito à cidadania eacessoaosmeioseducacionais,dessa forma,Toledo (2000,p.10),afirma,"[...]emprestava-seaojogoumsignificadopretensamenteeducativo".

Há uma espécie de "simulação de vencidos" quando os operários emespecial,osnegrosemestiçosemretaliaçãoàsdiversasformasdeviolênciassofridas, embora libertos juridicamente, sofriam fortes preconceitos, entãoincorporam ao futebol elementos de sua cultura e entre eles as práticascorporaiscomo,ospassescheiosde floreios,gingasdançantesecomobemescreve Certeau (2001, p. 41), “[...] as maneiras de fazer constituem as milpráticas pelas quais usuários se reapropriam do espaço organizado pelastécnicasdaproduçãosociocultural”.

As classes abastadas tentaram proibir as práticas de futebol às classespopulares mas o que houve foi a popularização dessa prática, seguindo asestruturas do futebol europeu, essa manifestação se transformou numaexpressão sociocultural do estado nacional brasileiro. Assim o pensamentoelitistatransformouCharlesMiller6nofundadordofutebolnoBrasil.

A prática do futebol surge nesse contexto onde são privilegiados ospensamentosdaculturamaterialelitista,eraumaatividade tidacomo"culta",mas concomitantemente ganha espaços e "[...] para externar-se, falar,apresentar-seerevelar-se,umdeterminadoângulodeondeapopulaçãocontaumahistóriadesimesmaparasiprópria."(DAMATTA,1982,p.21).

O futebol brasileiro é um fenômeno aglutinador no entendimento doprocesso sociocultural do país, é tido como um objeto fundamental no

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contextoeducacional,quevisaprimarpelaconstruçãodeumasociedadequevislumbreumcenáriosocialmaisjustoecidadã.

SegundoSoares(2011,p.14),"Associartaisvivênciasàcidadaniapassaaserumdiscursopoderosoemuitasvezes,nãosócarregadodeideologiacomotambémdesprovidoderespaldoacadêmico-científico.",umavezqueconhecere compreender todo o processo sócio-histórico do futebol pode corroborarparaminimizarconflitosfuturosenapromoçãodelazer.Soares(2011,p.14)acrescentaaindaque:

Nãopareceequivocadosuporqueaolongodasduasúltimasdécadasvem-

seobservandonoBrasiladefesadequeasvivênciasemesportee lazer sãonecessidades humanas tanto quanto direitos do cidadão, o que vemproporcionandoimportantesavançosàsmesmas.

Aquestãodoesportelazercomoaspectoimportantenocotidianoecomo

necessidadena formaçãoeducacionaldos indivíduos.É, sobretudo,ummeiodeoportunizara inserçãosocialcomofenômenoquepodequebrarbarreirasnapráticadeensinoaprendizagem.

Aspossibilidadesmetodológicasinstrumentalizadasnapráticadaeducaçãofísica em torno do futebol emergem constantemente e ganha status denecessidadepedagógica,ouseja,o futebolalémdeserumaatividade lúdica,promoveasocialização,odesenvolvimentodehabilidadeseaflexibilidadedoconhecimento.

A própria carreira do atleta precisa de novas perspectivas educacionais,umavezqueofuteboldecampoéumesportecoletivofenômenodasmassas,mas podemos dizer que na maioria dos casos os jogadores iniciavam suascarreiras como "aventureiros" que em alguns casos acabamdando certo, ouseja,nãosãofrutosdeumaconstruçãopolíticaepedagógicasistematizadadapráticadesportivaedelazer.

NoestadodoAmazonas,ofutebolsurgenacidadedeManausapartirdasmanifestaçõesdosaspectossimbólicosesocioculturaisdascidadeseuropeiaseparaosmembrosdaelite,ouseja,osimigrantesqueaquidesenvolviamsuasatividades econômicas também se mantinham conectados à moda de seuspaíseseofutebolrepresentavaesseveículodecomunicação.

AseliteseuropeiasnoseuprocessodeocupaçãodaAméricalatina,vãoteruma forte influência sociocultural na população brasileira, tendo em vista o

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processo de modernização à moda europeia que aqui se operava. SegundoDaou(2000,p.86)em"ABelleÉpoqueAmazônica",reiteraque:

Estão associadas à ideia de uma minoria que se destaca em relação ao

conjunto da sociedade não apenas nas situações pautadas na hierarquia e naordem, como naquelas pautadas no individualismo e na igualdade. Emdiferentes contextos, têm sua ação remetida à interesses econômicos, aomonopóliodopodereàsorientaçõesculturaisdavidadeumgrupo. Isso setraduzemseupapeldeorientadorasdamaioria,depromotoradeidentidade,de portadoras de interesses dos grupos que nelas se fazem representar ou,ainda,deprotetorasdacoletividadefaceaoinimigoexterno.

Este processo de hierarquização social e urbanização nos espaços

amazônicos do final do século XIX e início do século XXI, provocammudanças significativas no imaginário social a partir das concepções dacivilização cristã e ocidental. Era uma espécie de vigilância social, ditadaspelasestruturasadministrativasdocontinenteeuropeuquevisavameconômicae ideologicamente construir uma sociedade dita moderna, onde os valoreseuropeus definiam o perfil da estrutura sociocultural a serem vividas nestepaís.Eraaideiadeprogressoqueoperavacomonecessidadedeexpansãodaselitesburguesaseuropeias.

EraumaconfiguraçãosocialqueseapresentavaaqualDaMatta(1981,p.142)denomina: "[...] esqueletohierarquizantedenossa sociedade".Assim, asbasesdeorganizaçãosocialsãosistematizadasnosolobrasileiro,mascomoacultura é dinâmica, ou seja, nunca é neutra, como bem conceitua DaMatta(1981,p.169):

Écomose tivéssemosduasbasesatravésdasquaispensássemosonosso

sistema.No caso das leis gerais e da repressão, seguimos sempre o códigoburocráticoouavertente impessoaleuniversalizante, igualitária,dosistema.Mas no caso das situações concretas, daquelas que a ‘vida’ nos apresenta,seguimossempreocódigodas relaçõesedamoralidadepessoal, tomandoavertente do ‘jeitinho’, da ‘malandragem’ e da solidariedade como eixo deação.Naprimeiraescolha,nossaunidadeéoindivíduo;nasegunda,apessoa.A pessoamerece solidariedade e um tratamento diferencial.O indivíduo, aocontrário,éosujeitoda lei, focoabstratoparaquemasregrasearepressãoforamfeitos.

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Novasconfiguraçõesdesociabilidadesforamseconstruindonasociedade

brasileira partir do ideário de "civilização dita moderna", seja na expansãourbanística numa estrutura aos moldes da belle époque e nas atividades deculturaelazer.

ParaDaMatta(1982,p.69),“[...]écomoseodomíniodoritualfosseumaregiãoprivilegiadaparasepenetrarnocoraçãoculturaldeumasociedade,nasua ideologia dominante e no seu sistemade valores [...]”, assim a atividadeesportivavaiganhandonovosarranjosereferênciasnospermitindoformularpropostasrenovadorasdeintervençãonavidasocial.

Hoje,éumfatoconstatadoqueamaioriadosbrasileirosgostadefutebol,masahistóriadofutebolétambémumaformadecompreensãodaformaçãosocioculturaldopovobrasileiro.Nessaótica,segundoDaMatta(2006,p.47):

[...] é a prova de que [podemos] canibalizar tudo […] se o Oswald de

Andrade,autorda ideiamodernistadacanibalizaçãocultural, tivesseentradoumdianoestádio[defutebol],teriaimediatamenteverificadoqueestavadianteda concretização, de uma expressão perfeita, de tudo aquilo que ele estavafalando […] Um liquidificador verde e amarelo poderosíssimo pegou todoessenegóciodeforaebotoutudoaquinoBrasil.

Hámuitosdiscursosdeconcepçõesromânticasenaltecidospelasmetáforas

que tentamminimizar os problemas sociais vividos no interior das relaçõessocioculturais, como a ideia de que podemos tratá-la como algo quecolocamosnumaparelhoesubtrairasimpurezassociais,hánovasformasdepoder em torno do futebol, na disciplinarização do corpo e obediência àsregras e esquemas táticos, ou seja, são novas formas de existir no mundomoderno.

Nas concepções de Bosi (2001, p. 16), “[...] a cultura é o conjunto daspráticas,das técnicas,dossímbolosedosvaloresquesedevemtransmitiràsnovas gerações para garantir a reprodução de um estado de coexistênciasocial”.Nestecontextoaculturaéalgodinâmicoenosprojetosoueventosdefutebol pressupõe a interação e articulação de certas variáveis culturais econsensuais.

Atravésdofutebolpodemosterumacompreensãodospoderessimbólicosdaestruturavigentedosmeiosdeprodução.Aforçadaideologiaseapropriademeiosdesociabilidadeseentreelesofutebolqueserveaosseusinteresses

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de reprodução social, assim o melhor exemplo desse fenômeno pode sermelhor compreendido na Copa do Mundo onde os sujeitos das estruturassociais colocam em xeque o seu poder ao buscar a afirmação oureconhecimentodasociedademundial.

Na concepçãodepoder, aCopadoMundopode ser entendido comoumdosespaçosdeconsumodosbensculturaiscompartilhadosentreasnações.Ossujeitos sociais protagonizam seus aspectos socioculturais simbolicamenterepresentados nos estádios que serve de palco das dramatizações regionais,nacionaiseinternacionais.

Na hierarquia de poder e manutenção administrativa do futebol está aFederação Internacional de Futebol (FIFA), o órgão institucional einternacional que possibilita o entendimento entre as nações do mundo dofutebol. No Brasil a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) é o órgãoresponsávelpelastramitaçõescomàFIFA.Sobreoaspectodogerenciamentodoesporte,Bourdieu(1983,p.137)afirmaque:

[...] a constituição do sistema de instituições e de agentes diretamente ou

indiretamenteligadosàexistênciadepráticasedeconsumosesportivos,desdeos agrupamentos ‘esportivos’ públicos ou privados, que têm como funçãoassegurar a representação e a defesa dos interesses dos praticantes de umesporte determinado e, ao mesmo tempo, elaborar e aplicar as normas queregemestaspráticas[...].

No aspecto multicultural a Copa doMundo representa este "mosaico de

culturas", e as instituições hierárquicas como a FIFA e a CBF garantem aordemdepossíveisconflitosentreasnações,ondeatolerância,solidariedadeecidadania,parecem fazer efeitocomodiscursos ideológicosdomodelodesociedade contemporânea. Os valores socioculturais parecem ser universaisfrenteàsregrasdofutebol.

Cada país tem suas leis próprias, suas concepções políticas e religiosas,masquandose tratadeCopadoMundo,háumaespéciedegeneralidadedasleiseosestádiosservemcomoespaçodeaplicabilidadedasleisemformasdemanifestações. Por exemplo, o respeito a si e ao outro parece servir comoregra universal que permitem um diálogo social ao "caldeirão cultural"existente, representados nos símbolos, cores, expressões corporais ecomportamentosdiversosdasnaçõesdosdiversoscontinentes.

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Noanode2014ocorreuavigésimaCopadomundoeoBrasilfoiopaíssede,assimosolhosdomundoatravésdaslentesdascâmerassevoltaramparaos espaços brasileiros onde ocorreram as partidas dos clubes. A copa doMundo é um evento que ocorre a cada quatro anos e consegue mobilizarmuitospaísesemtornodessaprática.NoBrasilmobilizou12cidadessedesdomundialeconsequentementeossetores:políticos,econômicosesocioculturaisdosespaçosbrasileiros.

O Brasil é o país que mais alcançou títulos mundiais, foi campeão dascopasde1958,1962,1970,1994e2002,jásediouem1950umacopaemqueo país campeão foi oUruguai, é o único país que já participou de todas ascopas,assimoBrasilcarregaemseucurrículomaistítulosqueoutrospaíses,liderandoorankingdospaísescampeõesdacopa,masquecoubeaAlemanhalevarotítulodepaíscampeãodaCopadoMundoem2014.

Acopadomundofoiumeventoqueproporcionououtrospaísesconhecermanifestações socioculturais e poucas gerações tem essa oportunidade departicipardeumacopaemseupaís.Ressalta-sequenestacopanoBrasilváriosfenômenos a serem pensados, tais como: a mídia e suas formas deentretenimento e transmissão de notícias, a construção dos estádios que temuma história própria, de ações e reações populares que ganham as ruas dascidadesdevidoaosgastoscomasobrasparaacopa.

A copa do mundo no Brasil nos trouxe expectativas simbólicas dereafirmaçãododenominado"futebolarte",característicodojeitobrasileirodejogar. A copa deixou o legado dos estádios de futebol e uma melhoria nainfraestrutura das cidades que receberam as seleções. A cidade de Manausganhouumdospalcosdacopaadenominada"ArenadaAmazônia".

O futebol no Amazonas7 ainda não se enquadra no ranking entre osgrandes centros do futebol brasileiro. As perspectivas de melhoria bonsespecialistas no assunto são muitas, talvez este seja um legado da Copa domundonosespaçosamazônicos.

Emtermosdetorcida,osclubesmanauarastêmmenostorcedoresqueosclubesdo sudeste dopaís, oFlamengo8 (IBOPE, s.d.), figura comoumadasmaiorestorcidasdopaísemesmoemManausémaiorqueatorcidadosclubeslocais, mas estes fatores são resultantes de um processo sócio histórico dofutebolversusasdesigualdadesregionaisexistentesnoestadobrasileiro.

Compreender, portanto o futebol no contexto brasileiro é precisocaracterizar três dimensões, tais como: lazer, como aspecto intrínseco daculturanacionaleofutebolartecomosinônimodebrasilidade.Estes fatores

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sereforçameservemcomojustificativadatramitaçãodacopadomundonoBrasil,umavezqueestavemlegitimarosdiscursosjámencionados,aprópriamídia mundial reforça estas características ao compartilharem essainformaçãoparaidentificaçãodaspeculiaridadesbrasileiras.

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1.2Ofutebolnocontextodascomunidadesestudadas

TendoemvistaageografiadoBaixoAmazonascaracterizadapelasáreas

de várzeas e terra firme, aqui nos direcionamos a várzea nas questões dasmanifestações socioculturais como são percebidas e compreendidas nessesespaçosdesociabilidades.É,nesteuniversoquenospropomoscompreenderas formas de pensar, interpretar, representar e ressignificar os aspectossocioculturais no contexto das comunidades estudadas. O aspectogeomorfológicocomoaspectodoecossistemabiológicotemamplaevidênciana construção dos saberes e imerso nas linguagens e suas formas deinterpretarsuarealidade.

Figura1-Comunidade"NossaSenhoradeNazaré"noRepartimentodoLimão

Fonte:PesquisadeCampo,oautor(2013).Na Figura 1, visualiza-se Comunidade "Nossa Senhora de Nazaré"

(católica), no Repartimento do Limão, este lugar está situado na divisão

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geográfica dosMunicípios deParintins eBarreirinha.É constituída: ao ladoesquerdo da igreja a EscolaMunicipal "Nossa Senhora deNazaré", ao ladodireito o barracão de festas e de reuniões, em frente ao bar utilizado emépocasdefestasdapadroeiraenapartedetrazdaigrejaumapequenacasaqueserveparacolocarogeradordeluzmovidoadieselougasolina.

AsáreasdevárzeasdoBaixoAmazonasapresentamumaricadiversidadebiológica,éumecossistemacompostopelaformaçãodevegetaisqueresistemàs inundações periódicas e possibilitam a renovação das pastagens naturais,mas dependendo da proporção das enchentes e vazantes, muitas vezes aspastagenssãosolapadaspelascorrentezasousecasecertamenteprejudicandooecossistemanaturaleomododevidadoshabitantesdessaslocalidades.

Figura 2 - Comunidade "Harmonia" (Adventista do 7º dia

Fonte:PesquisadeCampo,oautor(2013).Emnossosregistrosidentificamosdoiscamposdefutebol,umaoladona

comunidade católica e outro nas proximidades da igreja evangélica"Harmonia" (Adventista do 7º dia), esta última vista na Figura 2, onde ossujeitosdestareligiãosereúnemaossábadosemoração.

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Na hora dos jogos participam jogadores e espectadores das duascomunidades,umavezqueospresidentesdosdoistimesfizeramumacordo,ondeumdomingojogamnocampopertencenteàreligiãocatólicaenooutrodomingo no campo da religiãoAdventista do 7º dia, considerando que comesseacordoasduascomunidadespuderamternaspartidasdefutebolomaiornúmerodeparticipantes,sejacomojogadoreseespectadoreseassimganharmaisdinamicidade.

Asduascomunidadessesituamemáreasdevárzea, sãoespaçosondeossujeitos sociais participamda tramado futebol na constituição sociocultural.Essesespaçostemumtempoqueoscamposdefutebolcedemàvidaaquáticaeetnografandoosespaçosdojogodebola,Matos(2008,p.234)afirma:

[...] O rio vai secando, os campos submersos, que num certo momento

eram apenas transitáveis por embarcações (canoas, cascos, rabetas) oufrequentados por pescadores e serviamde abrigo aos seres de vida aquática(peixes, répteis, aves, insetos etc.) começam a aparecer e com eles asgramíneasapetitosasdãoalimentosaosanimaisdomésticosentreelesbovinos,ovinos, caprinos. A vazante do rio continua e os humanos, que numdeterminadoperíodoutilizarama áreapara obtençãode comida, fazemdelaumareferênciaparasedivertirem[...].

É o ciclo das várzeas pertinentes no cotidiano das populações dessesespaços, onde o ritmo das enchentes e das vazantes se configuram comofenômenonaturaleosmoradoresaprendemaconvivercomessesciclos.

Os planos dos jogos de bola, das plantações ou criações de gado, sãotraçadostendoemvistaosperíodosdeenchentesevazantes,somadosaestesfatoresaexperiênciaéomelhordosaliados.

Quando as terras voltam a surgir os campos de futebol precisam dereparos porque devido a enchente, toras de madeira, árvores completaslevadaspelacorrentezaficamnomeiodocampo,acorrentezatambémproduzmuitosburacos,quenodizerdosmoradores sãoas "baixadas",duranteumapartidade futebolchegaserhilárioverumatletaaodescerabaixadacomabola e quase desaparecer, bem como driblar o adversário e as fezes, pois aboiadaquemuitasvezesprocuraumespaçomaislimpopradormirláficamasfezes, são ingredientes amais para a diversão dos espectadores. ParaMatos(2008,p.235):

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Osespaçosfísicosondese realizamos jogossãodelimitadoscomoumaexigência da regra do esporte praticado, esse é um fato, mas,independentementedaregra,anaturezavaidemarcaraáreade jogoquenãopodesernacapoeira(vegetaçãosecundária),emuitomenosnorio,massim,nocampodefutebol,espaçoconstruídopelauniãodeforçamotriz–puxirum–provindadosbraçosdoshumanos.Tantopara limparouparaconstruirouprepararumnovocampo,éaajudamútuaquecontribuinarealizaçãodetaismetas.

Éummododevidadesafiador,tendoemvistaqueessesmoradoresestão

sempre na dependência do ciclo anual da natureza das várzeas. PedroVasconcelos (moradorda comunidade amaisde80anos), compreendebemesteprocesso,éumdosmoradoresquepassaaépocadasenchentesnaprópriaáreadevárzea,ouseja,nãovaiparaaterrafirmecomoéocasodamaioriados moradores dessas áreas, este vive os desafios impostos durantes asenchentesemesmoasgrandesvazantes.SegundoPedroVasconcelos(2013):

Na várzea temos fartura e na terra firme muitas vezes fica difícil,

antigamentenãomas,agoraaalimentaçãonaterrafirmeestámaisdifícil[...]aqueles que sãomais experientes na pesca não passam fome na terra firmemas,paraosmaisnovosacoisaficacomplicada[...]aquinavárzeaqualquercurumimpescaporqueéfácil, temfarturade tudoquantoépeixe,ésó iraliparaabeiradadoriojogaroanzolcomumaiscaecommeiahorajápegouoalmoçoe,atécomoterçadoépossívelpescarnãoéprecisonemmalhadeira,basta pegar a lanternaou a poronga e sair ai pelas beradas à noite e prontomas,naterrafirmenãoépranemmuitovelhoenemmuitonovo,aquelequenãoforpreguiçosopassaébem[...](informaçãoverbal).9

NaspalavrasdePedroVasconcelos(2013),ficaevidenciadoqueopeixeé

alimento principal no cotidiano do meio rural, há uma diversidade dessespeixes nas áreas de várzeas. Em função das enchentes, os peixes se tornammaisdifíceisdeseremcapturados,enquantonasáreasdeterrafirmeaescassezde peixes já se constitui um dos problemas vivenciados por essascomunidades.

Noquetangeàagricultura,apósasenchentesnasvárzeas,asterrassurgemeapresentamosolofértilemrazãodasedimentaçãocausadapelaenchenteevazante periódica, assim as possibilidades de plantio nesse solo revigorado

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são maiores e permitem a agricultura pelos moradores dessas localidades.SegundoConceiçãoVasconcelos:

Asplantaçõesocorremassimqueas terrascomeçama surgirdepoisdas

enchentes, preparam-se as áreas com cercas, porque agora a maioria dosmoradores são criadores de: gado, porcos, carneiros e cavalos mas, asplantaçõessãopoucas[...]algunssomenteplantammelancia,milhoejerimuns[...]depoisquesurgiramas facilidadesde transportedevidoa trocadacanoacomoremopelomotorrabeta,aspessoasperceberamqueerasócolocarumisoporcomgelonacanoa,pescarelevaropeixeparacidadeevenderentão,deixaram de plantar a juta, a malva, os grandes milharais e melanciaisdesapareceram[...]asfacilidadesdotransportetrouxeramessasmudançasemnossomeio(informaçãoverbal).10

A entrevistada desta pesquisa Conceição Vasconcelos (2013), fala dos

temposdefarturadospeixesedaagricultura,masdevidoasaçõesantrópicasaolongodotemponessasáreastaiscomo:asderrubadasdeárvores,extraçãodemadeiras, pesca predatória e a pecuária extensiva, foram fatores cruciaispara a ocorrência de grandes alterações no ecossistema natural e assim,prejudicandoaqualidadedevidadaspopulaçõesnomeiorural.

As famílias faziam os puxiruns e faziam suas roças para as plantaçõesperiódicas, produziam e consumiam seus alimentos adquiridos nos seusprópriosterrenosdevárzeaeassim,oslaçosdesociabilidadespermaneciammais fortes, todos osmembros da família e da comunidade trabalhavamemtorno de uma mesma atividade, como lembra a entrevistada ConceiçãoVasconcelos(2013):

Omeupai,AméricoTavaresdeVasconcelosjuntocommeuirmãoAlício

Vasconceloseramgrandespescadoresdopeixepirarucuquetinhaemfarturanaquelaépoca[...]omeuirmãomaisnovoalémdopirarucutambémeraumgrandecaçadordecapivaras,esteconseguiuvivercomsuafamíliadapescaecaçanopassado[...]minhamãeAugustaVasconcelos,juntasàsminhasirmãseirmãos plantávamos juta, milho e melancias, mas hoje isso tudo acabou,algunsmoradoresplantampequenosmelanciasealgunsbalcõesdehortaliças[...](informaçãoverbal).11

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Nestes relatos ao falar da pesca e fartura do peixe pirarucu, ao mesmotempoqueessepeixeexistiaemgrandesquantidadesaartedesuacapturaéumfenômenodeaprendizagemdessessujeitos,damesmaformaaartedacaçaqueemconversasinformaiseobservaçõesconstata-sequeestesmoradoresfaziamutensílios para a captura das capivaras, como, por exemplo uma espécie deapito, feito com tampinhas de garrafas, essas tampinhas eram dobradas aomeio e faziam um pequeno furo, assim as capivaras se confundiam com ochamadopensando serumde seusbandos e assimeramcapturadas comumtirodeespingarda.

Asfamíliasplantamecriamanimaisdomésticosnessecurtoqueocorremnessesambientesdasvárzeas,mesmoempequenosperíodosmasconseguemconviverdeacordocomosritmosdascheiasedasvazantesnocotidianodesuasexperiências.Loureiro(2000,p.61),"[...]aculturapodeserconsideradacomoum feixe de representações, de símbolos, de imaginário, de atitudes ereferênciassuscetíveldeirrigar,demodobastantedesigual,masglobalmente,ocorposocial".

Compreendemosquenocontextodaáreadepesquisa,osgruposhumanosque vivem nesse ambiente das águas barrentas, compreendem ageomorfologia de várzea e assim se adaptam às condições da dinâmicageográfica, seguindo os ritmos sazonais de várzea e terra firme de acordocom as suas estratégias de sobrevivência se estabelecem e constroem seumododevida,comoafirmaJaciraVasconcelos(2013):

Todososanoséumrecomeço,temosquearrumarnossascasasdevidoàs

grandesenchenteseasfortescorrentezasquemuitasvezesacabamafetandoosesteios e as casas são tombadas [...] temos problemas com a moradia, mastambémcomaágua,quandoavazanteégrandeosriosficamcompoucaáguae o barro toma conta, tomamos dessa água barrenta é o jeito, às vezesadoecemos mas vamos levando, fazemos nossos remédios caseiros, sóprocuramos irprocurar tratamentonacidadequando ficamuito sério ai éojeito ir [...] mas a vida segue e por aqui também passeamos acompanhandonossosfilhosemaridonosjogosdefutebol(informaçãoverbal).12

Diante destes relatos, compreendemos as dificuldades enfrentadas,

primeiramente pelo lado psicológico onde os moradores veem suas casasseremafetadaspelasenchentes,suasplantaçõesde:balcõesdetomates,cheiroverde,alfaces,pimenta,sendolevadaspelascorrentezas.

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Evidencia-seoaprendizadodesobrevivência, inclusivecomaquestãodesaúde,acuradosremédioscaseiros,estessupremasnecessidadesbásicasdesaúde,frutosdeconhecimentosadquiridosatravésdasváriasgerações.

Os moradores sabendo desses fenômenos como algo natural, projetamsuas atividades de acordo com as possibilidades sazonais, mas nos últimosanos as enchentes e vazantes, apresentam um desequilíbrio e os seusplanejamentosficamcomprometidos.JaciraVasconcelos(2013),relataainda,"[...]avidasegueeporaquipasseamosacompanhandonossosfilhosemaridonos jogosde futebol." (informaçãoverbal)13. É um exercício de cidadania equalidadedevidacaracterísticosnocontextodascomunidades,quedesfrutammomentodelazercomafamília.

Figura3-Criançasjogandofutebolaoladodacomunidade

Fonte:PesquisadeCampo,oautor(2013).Na imagem da Figura 3, se observa as crianças jogando bola nas

proximidadesdocampodefutebolondeseuspaissereúnemparaosjogosdefutebol.NestaimagemhámeninasemeninosquepertencemàigrejacatólicaeàigrejaAdventistado7ºdia,masqueseunememtornodapráticadofutebol.Os times das comunidades, algumas vezes viajam para jogar em outraslocalidades, neste compromisso social a organização fica por conta dopresidentedo time,este juntoaos jogadoreseespectadores fretamumbarcopara ir ao evento, são percursos de até três horas de viagens pelo rio, é

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sobretudoumpasseioondeatorcidacompostapelosamigosefamiliaresdosjogadores vão juntos aos jogadores que apreciam a vista da natureza nasmargens dos rios, observando da embarcação, as aves, os peixes, enfim anaturezaservedeentretenimento.

Nachegadaàcomunidadevisitadaocomandanteencostaobarcoecolocaapontedemadeiraamarradanaproadobarcoeassimtodosdescem,sobemaribanceiraecumprimentamostimesadversários.

Os jogos na categoria infantil são organizados uma vez ou outra egeralmenteorganizadosemmetadedocampooficialondejogamosadultos,éumaatraçãoqueospaissedivertemjuntoaotorcerempelosseusfilhos.

O futebol feminino émais queumapartida de futebol, pois a beleza dasatletasparecesermaisimportantequeoresultadoparaosjovens,éodespertardafaseconduzindoaonamorocaracterísticonesseseventos.

Os atletas nestes eventos podem jogar com ou sem chuteiras, meias,camisasmasindividualmenteelesdãoomáximoduranteomêsqueseantecipaaoeventoparaestarembemapresentáveis,entãoparaganharalgumdinheiroeles,pescam,trabalhamemcamposcomgado.

A partida de jogo acontece e a empolgação parece não dar espaço aocansaço, mas alguns conscientemente de sua condição física, pedem paraseremsubstituídoseaotérminodosjogos,osatletasaindatemenergiaparaascomemorações, é um momento que percebemos que as relações entre seus"parceiros" de comunidade ficam evidentes, como por exemplo, quandoaquelequeconseguiumaisdinheiroduranteomês,compartilhacomosoutrosascervejas,refrigerantes,guloseimas,etc.

A premiação geralmente é um valor em dinheiro, um boi, bolo, frango,carneiro enfim, diversos prêmios dependendo do evento. Depois daspremiações se não tiver uma festa dançante os times retornam às suasembarcações e voltam comemorando ou tristes se perderam o jogo, mas odeverdecumprircomaagendasocialémuitorelevanteparaosjogadoresquerepresentamasuacomunidade.

A comunicação via televisão geralmente só ocorre no período noturnoparaasfamíliasassistiremnovelasouaosdomingosnumapartidadefutebol.ParaAlminoReis(2013):

Aquinaminhacasaaspessoaschegamànoiteparaassistirnovelasouuma

partidadefuteboldosgrandestimes,comooFlamengoouVasco,Fluminense,Botafogo,SãoPaulo, sãoespectadoresqueaprendemcomseuspaisa torcer

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pelos grandes clubes que influenciam o imaginário das comunidades rurais(informaçãoverbal).14

A energia fornecida nessas casas é à base de motor gerador de luz,

mantidosàgasolinaoudiesel,daíporqueporumaquestãodecustoelesoptampor ligar o gerador somente à noite. A maioria dos moradores não temtelevisão, então estes se dirigem a casa mais próxima para assistir àsprogramações.

Omeiodecomunicaçãomaisutilizadonestesespaçosaindaéorádio,nascasasdosmoradoressemprese temumrádioàpilha,ondeestesescutamosavisos,osjornais,osprogramasinfantis,ouvemmúsicaseastransmissõesdaspartidasdefutebol.

Edessastransmissõestelevisivasouderádioquechegamasinformaçõesdas disputas dos grandes clubes brasileiros. Muitos dos times queinfluenciaramnestaslocalidades;podemoscitarosseguintestimes:Flamengo,Vasco,Fluminense,Botafogo,Corinthians,SãoPauloePalmeiraseSantos.

O futebol expressa no imaginário amazônico um evento carregado desimbolismo, mesmo sendo acompanhado pelo rádio leva o torcedor a umaespéciede"loucura".Éumapersonificaçãodopoderconstruindosignificadossobre suapreferênciapelo time.Osmoradores sãoouvintesqueadquiremacapacidadedeouvirpelorádioeconstruirnoseuimaginárioascaracterísticasde um time ou jogador, haja vista, estes manifestam sua preferência erepresentam em seus diálogos descritivos uma riqueza de detalhes dashabilidadesdosjogadores,datécnicadotimeedamotivação.

Nos encontros entremoradores émuito comumouvir, "deu no aviso dorádio" ou "fiquei sabendo pelo programa de rádio", nas transmissões oslocutores utilizam a seguinte chamada quando é de uma informação sobredoençaou falecimento:“atençãomuitoatençãopara esteaviso", seguidodeum fundo musical que já é conhecido dos moradores, o qual faz com quetodosfiquematentosànotíciaeaofinaldotextoolocutorlê:"quemouviresteavisofavorretransmitiraodestinatáriopeloquemuitoagradeço".

O rádio éumdosmeiosde comunicaçãomais comunsnas comunidadesrurais,atravésdoqualestespassamosavisosparaosseusfamiliaresouparaoanúnciodeumapartidade futebol, logoseevidenciaa importânciado rádiocomoveículodacomunicação.

A primeira emissora de rádio no Amazonas a transmitir informaçõesesportivas teve início em 1927 com a “Voz de Manaós”, foi criada por

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EphigênioSalles,masaenergiaeraracionadapelosingleseseatransmissãoapresentavamuitasdificuldades.

Em 1938 surgiu a segunda emissora de rádio amazonense: a Voz daBaricéiaeparalelamentesurgemtambémosgrandesnarradoresesportivoseentre eles o carioca Wuppschlander Lima, cujas narrações eram muitoempolgantes, a partir das narrações muitos nomes foram revelados, foramnomesquemarcariama"eradeouro"dorádionoAmazonas,ouseja,rádioefutebol caracterizam uma época de esplendor e cumplicidade.O locutor daspráticasesportivas,ValdirCorreiaMelo(2013),fala:

[...]NóstínhamosaquiumVivaldoLimalotado,quandonãoeraoVivaldo

Limaeraoparque.OnacionaleraabasedoatléticoMineiroeoRioNegroabase do Cruzeiro e o Fast clube não ficava pra trás, então nós tínhamosgrandes jogadores e grandes craques do futebol no Amazonas. Manausexpandiu, então a nossa opção aqui de lazer era o futebol, você almoçava ejantavafutebol(informaçãoverbal).

AexpansãodofutebolnoAmazonasfoiumfenômenoquesemanifestou

atravésdasemissorasderádio,essemeiodecomunicaçãotraziainformaçõesdo futebol de diversas regiões do país. Os locutores expressavam o vigor,levavam o torcedor ao tom das partidas, despertando paixões, seguidores esimpatizantes.

Historicamente, se compreende que as impressões sobre a Amazônia natessitura e transmissão do imaginário está diretamente relacionado com oprocessodecomunicaçãoatravésdasemissorasderádio.

Compreendemos que as populações de determinado lugar, tecem um"imaginário" domundo à sua volta e revelam suas formas de compreender,pensar,representareressignificarsuaspráticassocioculturais.Apopulaçãonocontato vivenciado com a natureza constroem aspectos simbólicossignificativos na convivência com seus pares. SegundoCastoriádis (1982, p.25):

Toda relação social e, mais ainda, toda instituição social exige que o

homemprolonguesuaexistênciaemimagensquefazdesimesmoedooutro,de seu passado e de seu futuro. Ora, isto supõe um trabalho permanente daimaginação[...].

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Nos espaços de futebol da comunidade pesquisada, fluem essa relaçãosocial, tendo emvista que seus pares se identificamcomesse pertencimentoque lhes são peculiares. Assim, muito além dos aspectos religiosos a qualpertencem os grupos, há um diálogo frequentemente ressignificado de seuselementossimbólicosdapaisagemnaturaldomundoAmazônico.

No futebol esses saberes entram em jogo, na medida em que essasrepresentaçõessãobemmaisvisíveis,quandoossentimentoseemoçõesdosjogadores e espectadores são extravasados, suas falas são contextualizadas apartirdosaspectoscompreendidosdabiodiversidadelocal,aquallheatribuemsignificadossimbólicos.

Neste contexto conhecemos moradores como, por exemplo, SérgioVasconcelos (49 anos, entrevista 2013), do qual foi possível anotar edescreversuashabilidadesnotratamentodooutronoquetangeainterpretaçãoou denominação a que se faz aos sujeitos nos em diversos momentos docotidiano.

Muitos aspectos culturais construídos, questões referentes àbiodiversidade, a relação entre a destreza ou lentidão de umanimal, as suascaracterísticas físicas e biológicas e ainda aspectos do sol, água ou lua, sãoatribuídos aos outros na forma de tratamento carinhoso ou de aversão,podemos dizer que são personificações construídas por sujeitos atentos aoecossistema natural, assim os frutos dessas observações lhe permitem umaleiturademundonafiguraçãodooutro.

O modo de vida dessas populações está atrelado às suas práticas desobrevivência e convíviocomseuspares atravésdousodo tempoe espaço,quesãorelaçõesconstruídasapartirdadinâmicasociocultural.Noprocessode ressignificação, são capazes de dar vozes ao ambiente natural, são comopoetasque temsuas formaspeculiaresdeobservar e retrataromundoa suavolta.

Adiversidadebiológicaéumpotencialaserexploradonaregiãodeformasustentável, apesar dos atos predatórios com o meio ambiente, mas oaproveitamentodosconhecimentosdaspráticassocioculturaisdosmoradores,seria uma forma de melhoraria da qualidade de vida dessas populações epotencializaraeconomia.

A economia das áreas de várzea do Baixo Amazonas se caracteriza porcicloseconômicosemfunçãodesuageomorfologia.Ressalta-se,noentanto,que estes ciclos têm um começo e fim, haja vista que não sãoempreendimentos projetados de forma sustentável, pois não há

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acompanhamento sistematizado por parte poder público, assim os recursostendemaseesgotar.

As várzeas se caracterizam pelo setor primário da economia, que temgrandeimportâncianossetoresprodutivosdapecuária,dapescaeatividadesagrícolasdomilho,melancia, jerimuns.Estessetoresproduzemrendaparaapopulação,masdevidoasenchentesperiódicas,estesbuscamasterrasfirmesemuitasvezesvãoparaascidadesenãoretornam,porquebuscamumaformademudar a qualidade de vida e assim, uma troca de cultura temporária porumapermanente.

Apescaconstituiumadasprincipaisfontesnaprovisãodealimentoerendapara a população local. Os peixes típicos mais comuns são: pirarucu,tambaqui,curimatã,aruanã,pacu,acaribodó,piramutaba, surubim, tucunaré,piranha,acará-áçú,apapá,pirapitinga,pirararaeatraira.

A pecuária é um setor importante na economia local, a maioria dasfamílias possuem rebanho de animais e dentre os principais destacam-se acriação de: bovino, suíno, bubalino, galinhas e ovinos. A produção destesconstitui um setor de fomento à economia dos Municípios de Parintins eBarreirinha.

Naeducaçãonascomunidadesfuncionamsomenteoensinofundamentaleaeducaçãodejovenseadultos,oquefazcomqueosestudantesmigremparaassedesdosmunicípiosnabuscadoensinomédio.

Nasaúdeascomunidadessãoatendidaspordoisagentescomunitários,umatendeaosmoradorescadastradospeloMunicípiodeParintinseoutropelodeBarreirinha. Esses agentes de saúde são moradores da localidade com aformaçãodoensinomédio,recebemcursostemporáriosnaáreadasaúdeparaficarem aptos a atender aos moradores, mas os casos mais graves sãoencaminhadosaoshospitaisdascidades.

Asatividadesagrícolasedapecuárianasvárzeasestãodiretamenteligadasao cumprimento de um calendário em função dos ciclos de enchentes evazantes.Sobreas festaspopulares,DaMatta (1881),édentreoutrosautores,queseinteressapeloenfoquedasreligiõesafro-brasileiras,nadistinçãoentreo sagrado e profano que se configura como um dos fatores observados nocontextodas comunidades estudadas.Adesignaçãoda "culturapopular" aquiutilizada, refere-se às manifestações socioculturais que fazem parte docotidianopopulaçõesdevárzeadoBaixoAmazonas.

Neste universo, o sagrado está presente no aspecto mental dos grupossociais.Dentreaspráticasreligiosasmaiscomuns,estáadevoçãoaossantos

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católicos que são celebrados nas comunidades e presentes nas orações dejogadores, pescadores, pecuaristas, benzedeiras, bem como as parteirastradicionais,queseapegamaossantosdesuadevoçãonahoradarealizaçãodeumparto.

O evento mais importante no calendário da comunidade católica é o dafestareligiosa,acontecedeacordocomodiadopadroeirodacomunidade,daío porquê das variações dos calendários das diferentes comunidades. É umevento único dos encontros entre moradores e das diversas comunidades,acentuando-secomoumcostumedocalendárioanual.

Adatadafestareligiosadapadroeiradacomunidadede"NossaSenhoradeNazaré",torna-seummomentodeexpectativa,ondecertamenteostimesirãoparticipardostorneiosedafestareligiosa,ondeseevidenciaaprocissão,osespaçosdefuteboleduranteànoitemissaefinalizandocomafestadançante.

Éummomentodesociabilidadedoscomunitários,ondeháaparticipaçãodascrianças,dosadultoseidosos,essesencontrospermitemquenosfinaisdetarde os times treinem para os torneios que acontecerão no dia da festareligiosa.

Observa-sequenosdiasqueantecipamafesta,sejanosdiasdefutebolouemoutras atividades, a fé é revelada pelos fiéis commais consistência, elestem orgulho de mostrar símbolos de sua fé, são utensílios cristãos como:camisas,pulseirasebonés.ConformeEliade(1992,p.88):

[...] o calendário sagrado regenera periodicamente o tempo, porque faz

coincidir com o tempo de origem o tempo ‘forte’ e ‘puro’. A experiênciareligiosa da festa, a participação no sagrado, permite aos homens viverperiodicamente na presença dos deuses. Ao imitar seus deuses o homemreligiosopassaavivero tempodeorigem,o tempomítico ‘sai’daduraçãoprofanaparareunir-seaumtempo‘imóvel’,à‘eternidade’.

Nasemanadafestachegamcolaboradoresdascomunidadesvizinhasouda

cidade e participam das atividades, inclusive dos treinos e dos torneios defutebol, sendo um momento de abertura e sociabilidade quanto às relaçõesentreosnovossujeitosquechegamparaafesta.

O momento da organização das festas é muito trabalhoso para oscomunitários, mas é uma atividade prazerosa, pois pra eles é uma "obrasantificada",assimelestentamconciliarasuavidacotidianacomasatividades

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das datas festivas na comunidade. Assim nos revela uma de nossasentrevistadas,ConceiçãoVasconcelos(2013):

[...]umtrabalhoprazerosoporseralgofeitoparaosagrado,ouseja,para

opadroeiroda comunidade.Os comunitários fazemmelhoriasno campodefutebol, na capela, no barracão de festa, ornamentam com bandeirolas,melhoramailuminação,preparamasguloseimas,fazemdoaçõesvoluntáriasevãoembuscadedoaçõesquesãooschamadosdonativosfeitospordiversascomunidades(informaçãoverbal).15

Nessesmomentosna comunidade, surgemaspessoas comcapacidadede

organização e lideranças, são consideradas pessoas de prestígio para seusparescomunitários.Aidentificaçãodesseslíderesguardaumarelaçãocomosagrado, os seus membros consideram essas pessoas como os verdadeirosdevotosdosantopadroeiro.

Vistosobreoprismadadevoçãoreligiosa,aparticipaçãonostorneiosdefutebolsetornaalgoalémdojogo,comoa"purificação"doespíritodoatleta,porenvolvertrabalho,religiosidadeeliderança.Oeventoocorreumavezporano, daí ser considerado o principal momento da expressão individual ecoletivadacomunidade.TertulinaSouza(2013)relata:

Aquinacomunidadenosdiasdafestadapadroeirade‘NossaSenhorade

Nazaré’, nós reunimos várias comunidades que vem rezar e os homens dacomunidadeaproveitamafestaerealizamosjogosdebola,ébemproveitosoporquerezamosenosdivertimoscomofutebol(informaçãoverbal).16

Há preparativos durante o ano todo para a realização dessemomento de

festa, é ummomento de revelação dos aspectos religiosos, os comunitáriosprocuram de alguma forma se planejar para esse dia, geralmente criampequenosanimaisdomésticosparadoaremparaosfestejos.Éumeventoondeo aspecto sagrado enaltece os moradores que se tornam promesseiros epromovemalmoçoscomunitários,novenasebailesdançantes.

Ofutebolacontecefrequentementeaosdomingosnascomunidadesrurais,secaracterizacomoummecanismodeencontroentreosparenteseamigosdacomunidade, lhes possibilitando a socialização dos saberes do cotidianoproduzidosnapráticadasvivênciasdassucessivasgerações.

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Noaspectosocioculturalnoquetangeaopecúlioedinâmicadoselementossimbolicamente construídos. As várias gerações se situam num esquema deaprendizado onde os filhos acompanham os pais nas diversas atividades eflorescem, os conhecimentos aprendidos com a prática da: pesca, pecuária,caçada,roçaedovaivémdascanoase"rabetas".

Figura4-Momentodechegadadosmoradoresnascanoasnacomunidade

Fonte:PesquisadeCampo,oautor(2013).

Na Figura 4, se observa as canoas com motor rabeta na parte de trás(polpa),éomeiodetransportemaiscomumnascomunidadesrurais,tambémutilizam para ir às cidades. As expressões intrínsecas na comunicação docotidiano,serefletemnessesencontroseovaivémdosrabetas,achegadanacomunidade,ascorrentezas,osanimais,ospeixespulando,enfimtodosessesfenômenosfazempartedocontextolocal.

A troca de informações das manifestações socioculturais emergem e osfenômeno simbólicos do grupo evidenciam-se numa harmonia natural, masessacomunicaçãoficageralmenterestritaaosseusparesdacomunidadeaqualpertencem,comofrutodoconhecimentodessaspopulações.

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Diantedesteexpostosefaznecessárioumareflexãodosconhecimentos,deacordocomaspalavrasdeSantos(2007,p.20):"Issoéaindamaisurgenteepor isso precisamos fazer uma reflexão epistemológica, já que em nossospaísessevêcadavezmaisclaroqueacompreensãodomundoémuitomaisamplaqueacompreensãoocidentaldomundo".

ParaSantos(2000),operamoscomumaepistemologiadosul.Precisamosfazer uma leitura a partir das vozesdaAmazôniamuitas vezes silenciadas esempre retratadase instrumentalizadoscomasconcepçõesocidentais.Nestestermos,segundocorroboraTorres(2005,s.p.):

Há dificuldade em construir um pensamento amazônico porque aAmazôniasemprefoivistadefora.Asmatrizesteóricassobrearegiãotrazemoestereótipoeuropeu.Interpretaçõesespecíficaseparticularizadas,diversaseplurais,fictíciasemetaforizadas,compõemoquadrodeumaregiãoinventadaourecriada.

Asinterpretaçõesteóricasdeformadiretamaterializaramomododevida

dosmoradoresdaszonasruraisdaAmazônia,oscondicionamentosnaformadepensarlhesmantêmsubmissosaosolharesdopoderpúblico,umavezqueas atividades desportivas são declaradas constitucionalmente comonecessidades básicas para a qualidade de vida, no entanto, restam iniciativasindividuais dessesmoradores que buscar no jogode bola ummodode vidasaudável. Um exemplo é reiterado por Pedro Vasconcelos (entrevista/2013)queemseusrelatosfaladeseusconhecimentos.

Aqui todos me conhecem sou um dos moradores mais antigos da

comunidade,tenhominhavendaháanos,tambémquandoaspessoasadoecemporaquielesvemlogocomigo[...]temosalimentosquecomproevendoeatéremédios caseiros, a copaíba que é bom para sarar os golpes de faca deterçadoeservetambémparanãopegarfrionocorte[...]aandirobaquevocêmistura com mel de abelha e cura de infecção da garganta [...] quando osjogadorestorcemopéoualgumapartedocorpoelesvemaquieeucoloconolugar, eu puxo com andiroba e também, a banha de boto commel que curatosse ,abanhadosucurijuquesararápidoosgolpes[...]e temoutrascoisasquesãoobenzimentodascriançasquandoaparecemcomquebranto[...]eujáchegueiairpracidademetratarmasbommesmoeufiqueicomosremédiosda região e estou vivo bem de saúde graças a Deus já tenho 90 anos e aspessoasvemaquitomarcaféeconversar,elessereúnemaquitododia,quando

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saemdabolaépracáqueelesveme ficamatédarosono,depoispegamorabetaevãoemborapracasadeles[...](informaçãoverbal).17

PedroVasconcelos (entrevista /2013) é umhomemde costumes simples,

mas com conhecimento muito amplo do contexto amazônico, é muitoreservado ao falar desses conhecimentos,mas apósmuitas conversas e caféqueeste fazquestãodeservira todosquevisitamasua residência,conseguiqueestecompartilhasseumpoucodeseusconhecimentosadquiridos.Emseusrelatos,os remédiosquecuramasenfermidadesatreladoaobenzimentoqueeste faz com uma folha de arruda, é comum entre os moradores dacomunidade comentarem que Pedro Vasconcelos (entrevista/2013), éconhecedor de qualquer planta ou animal da região e sabe os benefícios emalefíciosqueestespodemproporcionar.

PedroVasconcelos (2013) relataqueaprendeucomosseuspaisecomotempofoiaprimorandoseusconhecimentoseestemesmonosdiz:"[...]avidaensinaeanaturezaestáaiparaserobservadaécoisaqueDeusnosdádegraça[...] por aqui já tratei e tratodamaioriaquando ficamdoentes." (informaçãoverbal).18Ouviesteúltimorelatoquandoestavafazendootratamentonopédeummoradorlesionado,ouseja,asabedoriafluinaturalmentesemosartifíciosepistemológicosqueaciênciaproduz.

Pedro Vasconcelos (entrevista/2013) não é um frequentador assíduo daspartidas de futebol, embora sua residência fique a poucos metros dacomunidade, mas é um ponto de encontro da maioria dos jogadores eespectadores.Seusconselhos são frutosde sua sabedoriaque já fazpartedocotidianovividonocontexto local e comobem relata, "[...] euconheçocadaumporaquidesdecriança,elesvãopracidadevoltammassemprevemaquiconversarcomigo."(informaçãoverbal).19

Estesconhecimentossãomuitasvezessilenciadosenãovalorizadospeloconhecimento científico. É uma lacuna existente entre os conhecimentostradicionais que não são valorizados em função do pensamento científico,assim as atividades cotidianas parecem invisíveis no contexto escolar, quepoderiam utilizar os vínculos socioculturais e melhorar a compreensão doaprendizado dos estudantes. Existe um determinismo do conhecimentocientíficoemdetrimentodossaberestradicionais.

Os contornos científicos europeus atrelados ao seu modo de pensar odesenvolvimento mundial, proclamaram uma prosperidade socioeconômicanoseu formatodesociedade,emprejuízodosdiversoscontextosculturaise

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entre eles aAmazônia que sofreuumhiatono seuprocessohistórico.Nestaperspectiva,Pinto(2010,p.25)reiteraque:

A transdisciplinaridade da natureza, antes uma meta, passou a ser um

pressupostodaslinguagenscientíficas.Entretanto,amundializaçãodaculturaocidental imprimiu novos contornos e delimitações aos processoscivilizatórios.Intensificouasdesigualdadessociaisemostrouanecessidadedeseconstruirnovasconcepçõeshumanísticas.

Novosolharesprecisamserpostosàdiscussãosobreomododeviverdos

moradores da Amazônia, principalmente nas áreas afastadas dos centrosurbanoscomoéocasodascomunidadesdestapesquisa.

A complexidade do cotidiano dos moradores necessita de uma novaconstrução epistemológica, com o olhar próprio dos conhecimentostradicionais que visem seus aspectos religiosos, seus valores educacionais,sociaiseeconômicos.

O universo das comunidades rurais se configura com característicaspróprias, éumapopulaçãoqueconstruiu saberesapartirdosconhecimentostradicionais e mantém suas peculiaridades mesmo com as dinâmicassocioculturais,estesconhecimentostendemaoaprimoramento,maspodemterumefeitoinverso,ouseja,esquecidosevistocomindiferençaporaquelesqueaprenderamentreasparedesdaescolaformal.

Os conhecimentos tradicionais estão imersos nos espaços de futebol nosdiversosplanosdeexperiência individualecoletivo,as formasdepensar,asideias daprática cotidianado conhecimento acumulado ao longodahistóriadascomunidades.ComoseevidenciamnaspalavrasdeRaimundoVasconcelos(2013):

Quandovoujogarbola,eumepreparocomostrabalhosnaslidasdodiaa

dia, seja pescando ou trabalhando com a boiada, a gente fazmuito esforçocom essas atividades que a gente fica às vezes exausto e chega em casa e ocorpopede a redermas, opreparo físico é sóumaparte do cuidado comocorpo porque, a questão da alimentação também émuito importante, eu porexemplo, no meu almoço eu tomo somente um caldo de peixe com poucafarinha, porque senão eu fico pesado em campo e corro menos e também,quandosejogadebarrigacheiaéarriscadoterumacongestão[...]masquandovoujogaremoutrascomunidadesmaisdistantesaquestãodaalimentaçãose

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tornaumproblemaporqueagenteseacostumacomanossarealidadeeláforaésemprediferente[...](informaçãoverbal).20.

Compreende-se nos relatos de Raimundo Vasconcelos (entrevista/2013),

quando este fala de sua alimentação e preparo físico, indiretamente dosespaçosdefutebolevistosobreessaótica,nosrevelamsaberesquepodemserútilaoutrasrealidades,massuapráticadevesercompreendidadentrodesuacomplexidade sociocultural, uma vez que cada contexto deve apresentarsoluçõesàssuasemergênciasdarealidadevividaecompartilhada.

Asmanifestaçõesdofutebolnosespaçosamazônicosemergemdentrodeumaproblemáticadadinâmicahistórica,econômica,políticae sociocultural,pois os jogosde futebol nas comunidadespesquisadas, passarampormuitasalteraçõesapartirdetodoessesprocessos,tendoemvistaqueessasmudançaspossivelmente coadunam com a funcionalidade dessa prática desportivamasqueasestruturassemantém.Éumpatrimônionaturaldosaspectosdofutebol,lazeresociabilidadesdohomemamazônico.

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1.3Aspeculiaridadesevidenciadasnostorneiosdefutebol

EntreosrioseflorestasdaAmazônia,vivemsujeitossociaisnumaestreita

relação com a fauna e flora, neste ecossistema natural, se evidenciam osconhecimentosadquiridosatravésdasgerações.Háumacomplexidadedavidacarente de compreensão epistemológica e neste universo de saberes, nospropomos compreender estas peculiaridades evidenciadas nos torneios defutebol.

Tanto nos espaços de várzea comonosmais diversos lugares do país, ofuteboldecamposegueumadinâmicacomoumamodalidadedesportivaquese configura com suas regras estabelecidas, estratégicas, técnicas, formação,motivação, enfim uma série de características que sistematizam a suapraticidade,porémnestesespaçosserevelamaspectossimbólicospróprios.

Nosdiálogosentreosparescomunitáriossecompreendeasrelaçõesentreo homem versus natureza, estes agrupamentos sociais adquirem umaexperiênciaempíricaeestabelecemessacomunicaçãonumatrocadecostumesevalores numcomplexo sociocultural,mas quedetermina umaorganizaçãodomododevida.

É um mergulho na cultura amazônica na profundidade dos aspectossimbólicos que caracterizam os comportamentos, ou seja, a forma decompreensãodomundonaconcepçãodosmoradores.

Almino Reis (2013) comenta: “[...] a gente se encontra nos torneios defutebolecolocamosasconversasemdia."(informaçãoverbal).21Osassuntossãoosmaisdiversospossíveis,falamdefutebol,pescaria,enchentes,vazantes,criaçãodegado,família,plantações,economiadoméstica,enfimosdiálogoscorriqueirospresentesnocontextodocotidianodasvárzeas.

Emtodososespaçosécomumocorrermudançasemfunçãodasdinâmicassocioculturais, onde os sujeitos se integram e produzem inventividades ouadequaçõesdesituaçõesquemaislhesconvémcomo,naspalavrasdeAlminoReis(entrevista/2013):

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Antesostorneioseramsomentedejogocorrido,eramonzejogadoresdecadatimecoméumjogooficialmas,hojeos timesse inscrevemefazemosumtorneiodepenalidadese,somentealgumasvezesocorremjogoscorridosdentrodanormalidadee,istoocorredevidoaograndenúmerodetimesqueseinscrevemenósprecisamosdessarendaparaaorganizaçãodotorneioporquesomosnósquepagamososcustosdoeventomas,mesmoassim,nósfazemosjogoscorridosentredoistimesedepoistorneiodepenalidades,tudodependedonúmerodetimesetempo,porqueostorneiosocorremsomentenumatarde(informaçãoverbal).22

Figura5-Jogadoresdefuteboldecampoemtorneiodepênaltis

Fonte:PesquisadeCampo,oautor(2013).Ojogodefutebol,nasuaestruturadeformaçãoetemposdejogo,aoqual

denominados de "jogo corrido", é um assunto corriqueiro na comunidade,haja vista, que nos últimos anos durante um evento maior na comunidade,como num espaços de futebol, as disputas tem se dado por penalidades. Osmoradores mais antigos na comunidade são os que mais questionam essasalterações.Nas palavras deAntônioBarros (2013), "[...] jogo corrido que é

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jogoéondeotimemostraqualéobom."(informaçãoverbal).23Existeumarivalidade do futebol de longa duração entre as comunidades, essessentimentoseemoçõesdevitóriasederrotasvêmàtonanomomentodojogo.

Figura6-Jogodefutebolentreasduascomunidadespesquisadas

Fonte:PesquisadeCampo,oautor(2013).NaFigura5,seobservaojogodefuteboldisputadoempenalidadesena

Figura 6, o jogo entre duas comunidades emdisputa de "jogo corrido", sãoduas situações explicáveis, no primeiro caso devido ao grande número detimes e o tempo, haja vista que se trata deumeventodisputado somente emumatardeeotimeprecisaderecursosfinanceiros,entãoamelhorformaqueencontraram para resolver o problema foi fazer jogos de penalidades, massempredeiníciofazemumapartidadejogocorrido.

No segundo caso o jogo corrido, é algo adquirido a longo prazo já fazpartedocontextoememóriacoletivadascomunidades,aexperiênciadevidasociocultural centralizada no futebol como meio de lazer, é um meio deexpressão das peculiaridades da comunidade, onde os sujeitos sociaiscompartilhamacontecimentos,hábitosepráticassociais.

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Astransformaçõesnassuas"redessociais"eeconômicasocorrem,massemantém as estruturas culturais,mesmo assim provocam sériasmudanças nomodo de vida dessas populações. Os elementos culturais estão imersos nouniversosimbólicodocotidianorural.OssujeitosdaAmazôniaseconstroemnessaslógicas.Nessesentido,Bourdieu(1989,p.14)explica:

Opoder simbólicocomopoderde constituirodadopela enunciação,de

fazer ver e fazer crer, de confirmaroude transformar a visãodomundo e,destemodo, a ação sobre omundo, portanto omundo; poder quasemágicoque permite obter o equivalente daquilo que obtido pela força (física oueconômica), graças ao efeito específico demobilização, só se exerce se forreconhecido,querdizer,ignoradocomoarbitrário.

AsanálisesdeBourdieusãopeculiaresparaestadiscussão,poisasforçaseconômicas são poderes que se constituem e exercem essas transformaçõesdosvaloreseideologiasnocontextodocotidianodessascomunidades.

Asmemóriasseconstituemcomotipodepoderesdacontinuidadecultural,acentuadas na trajetória de vida dos sujeitos. Assim, essas reivindicações,implicam a permanência de valores de longa duração na perspectiva decidadaniaepreservaçãodeaspectosdatrajetóriasocioculturaldacomunidade.

Asmudançasocorridasfazempartedeumadinâmica,masamemóriadosaspectos significativos da comunidade são elementos que fazem parte dacultura, assim as reivindicações são frutos de elementos importantes nocotidiano vivido, tais como, história, lazer, comunicação, noção de tempo eespaço,enfimumasériedeaspectossimbólicosdestaspopulações.

As práticas socioculturais se configuram como aspectos simbólicos depertencimento de determinado grupo, são elementos que circulam nocotidiano, um desses fenômenos é a questão da alteridade, ou seja, notratamento ao outro com características simbólicas personificadas que sãoreconhecidas pelos seus pares sociais, esse reconhecimento na forma deconceberooutrosecaracterizacomoumelodeexistênciacompartilhada.

Pensarooutrocomosujeitomembrodacomunidadeétambémdemonstraralémda identificaçãoumaspectodesociabilidadeeumaestreita relaçãodosaspectossimbólicos,comosugereSantos(1997,p.135),oaspectoculturalemprocessodetransformaçãoonde"[...] identidadessão,pois,identificaçõesemcurso".

Oscognomesdadosháalgunsdosmoradores,sãoexemplosdosaspectossimbólicos,presentesnasrelaçõeseganhamdestaquenaspartidasdefutebol

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quandoostorcedoresoujogadoressedirigemaooutrosejadotimeaoqualtorcem ou do time adversário, o fato é que alguns acabam sendo alvos depiadaseapelidosdecunhopejorativo.

No cotidiano destes durante a vida social esses apelidos surgem nosmomentosdedescontração,masacabamsetornandocomumentreasfamíliase no círculo de amigos que fazem parte de seu meio. No momento dasinscrições dos times e jogadores, onde se coloca numa lista o primeiro e oúltimonomedojogadoracompanhadodeseuapelido,porexemplo:filhodeporaquê,garfo,patinha,carará,estessãoalgunsdos jogadoresdoFlamengode Nossa Senhora de Nazaré, são denominações que receberam a partir deobservaçõesdeseusparesdacomunidade.

Os padrões de vida ou os costumes de cada um pode ser um dosmecanismosquelevamaqueleindivíduoareceberumcognome,ouseja,umacomparaçãocomo seumodovida relacionadoà suaautoapresentaçãoouasuaidentificação.

Os apelidos fluem dependendo da ocasião, seja para elogiar ouridicularizarooutro,sãonarrativassimbólicasconstruídasnoprópriomeio,que nos levam a refletir sobre o fenômeno que cria fronteiras e aomesmotempoaproximamaspessoas,apartirdopoderdasnarrativasassociadasaomeioqueestessujeitoscompartilhamnocotidiano.

O futebol trás as caracteriza socioculturais, revelando o modo de serindividualecoletivodascomunidades,assimécrucialpartirmosdoprincípiodequeofutebolchegaaoslugares,concebidodentrodeumaperspectivadasparticularidades.

Ofutebolsegueumadinâmicalineardomundoocidental,comsuasregraspré-estabelecidas. Cabe a nossa análise contida dentro de uma representaçãosociocultural da Amazônia, discutir o mundo do futebol que incorpora ecompartilhaexperiênciasnossujeitossociais.

Cabe a crítica ao pensamento inserido dentro de um entendimento dacultura ocidental capitalista, como afirma DaMatta (2003, p. 20): “[...] Ofantasma de um velho e pouco falado ‘etnocentrismo’ (‘sociocentrismo’)ressurgeclaramentequandoofenômenoaserestudadonãoémaisalgoquesóoestudiosoconhece[...]masfazpartedenossaexperiênciadiária[...]”.

NaAmazônia a prática do futebol deve ser compreendida dentro de suacomplexidade sociocultural, onde todos independente de classe social ouidade, se envolvem de alguma forma, o futebol não pode ser analisadosomente como uma atividade desportiva composta cada equipe por onze

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jogadores de cada lado com regras pré-estabelecidas, mas qual arepresentatividadedessapráticadentrodocontextoAmazônico.

No estudo da Sociologia do Esporte, DaMatta (1982) acredita que épossível realizar uma leitura do sistema social brasileiro através do futebol,poisnesseesporte,atravésdedramatizaçõesdomundosocial,asociedadeseexpressa,apresentaerevelacaracterísticasdesuacultura.

Onossosistemasocialeeconômicoénamaioriadasvezesexcludenteemarcado pelo individualismo radical, mas no futebol essas relaçõessocioculturaisdesempenhamumpapelcrucialnoquedizrespeitoàpromoçãodeaçõescooperativasecompetitivas.

As atividades esportivas nessas comunidades se dão como momentosespeciais além do esporte, que são as manifestações sociais compartilhadasentre as comunidades vizinhas. Nesses encontros discutem problemas docotidiano sejameleseconômicos,políticos, sociais e religiosos, enfiméummomentode celebração e festa, tendoo esporte como fatorde expressãodeseussentimentosmaisprofundos.

Ofutebolfazpartedaculturabrasileiradeformabemconsistenteeváriosautorestemsedebruçadoemdiscutirestatemática,entreelesDaMatta(1982),afirma que o futebol se constitui em um veículo para uma série dedramatizações e representações da sociedade brasileira, permitindo aexpressãoevivênciadeproblemasnacionais.

É um estado de catarse na dramaturgia caracterizada por expressõescênicas das experiências construídas e compartilhadas, seja de jogadores ouespectadores,assimasrelaçõesnuncasãopassivas,masdeparticipaçãoondetodos são envolvidos na trama, com uma carga emocional encenada porprotagonistas de um espetáculo numa atividade sociocultural e suasimplicações.

Seviveaçõesimprevisíveisnestesespaçosondeseconstituemexpressõescaracterísticas da vida real do cotidiano das várzeas Amazônicas. Geertz(1989) afirma que "[...] o futebol é parte da teia de significados que oshumanos,emsuadinâmicasocial,vãoconstruindoconstantementeatualizandoerevivendo,teiaessaqueconstituiaprópriaculturadeumpovo".Portantooaspecto cultural flui de uma forma espontânea nos atores sociais dessestorneiosdefutebol.AntônioBarros(2013)afirma:

Anossaescolaéaescoladavida,aquiaprendemosfazendo,desdemuito

cedoaprendicommeupaieassimsãomeusfilhosaprenderam,essemundode

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meuDeushojejánãoéomesmodetemposatrás[...]antespegávamosanossacanoaremávamoscontraouafavordacorrentezamas,hojeosjovensjánãosabemmasnemremar,tudomudoueessescostumesestãodesaparecendo[...]assimcomoumacorrenteza,vocêeseuremo,senãotiverescuidadocomteusfilhos eles serão levados pelo mundo, tem muita coisa ruim por ai, aquidividimosoquetemoscomovizinhoeosnossosfilhosaprendemassim,éoquepodemosetemospraensinar[...](informaçãoverbal).24

Estefaladossaberesculturaisedificadosnocotidianovivido,éumsaber

despretensioso e profundamente interpessoal e são compartilhados pelasocializaçãodevaloresmateriaiseimateriais,masasmudançasnoscostumeschegam comouma forte correnteza, comouma força das águas a força dasideias povoam o imaginário e se reconstroem a partir novos contornos domundoglobalizado.

Podemos inferirquenoque tangeàsmudançasquevemocorrendocadavez com mais velocidade são frutos do processo das informaçõestecnológicas,sejadatecnologiadacomunicaçãooudosmeiosdetransportes,são alterações na dinâmica cultural provocadas por fatores externos, quechegam sem pedir licença, vão simplesmente chegando, transitandorapidamente como um veículo incontrolável e assim, se consolidando efazendoparteconstitutivodoselementosculturais.

A força das novas informações e elementos da cultura material quecompõeavidadessaspopulaçõesincluemdealgumaformatodosossujeitosque fazem parte da comunidade, mas esses elementos chegam de formadesigual e "perversa" sem os sujeitos envolvidos se darem conta dessesfenômenos,gerandoconflitosnoquetangeaosvaloresculturais.

Noaspectodasrelaçõesdesociabilidadeasnovasformasdealteridadesetornam mais plurais, ou seja, novos hábitos que concomitantementeproduziram novas ideias, mas provocam certo sentimento de perda de seusvalores,ossujeitosficaminsegurosàsalteraçõesdehábitosnoseuambientevivido, o novo pode ser o certo, mas este novo é desconhecido e recente,enquanto o antigo hábito é fruto de uma trajetória sociocultural de longoprazoqueproporcionamumarelativasegurança.

Na formação de novas ideias na comunidade, devido às grandestransformações muitos se sentem marginalizados no processo. Quando osentrevistadosdesta pesquisa relatamque "os jovensnão sabemmais remar",esta afirmação se configura como um sentimento de perda, como se não

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houvesse a possibilidade de coexistência dos aspectos culturais do tempopassado com o presente expressos na ressignificação de valoressocioculturais.

Faz-se necessário buscar compreender a Amazônia a partir do ponto devista endógeno enão simploriamente sobre aóticados fatores externos, daítalvezestejanossasdificuldadesemresolverproblemaslocaiseregionais.Háuma diversidade de saberes neste contexto sociocultural, na interpretação deSantos(2010,p.54)esteafirma:

Em todo omundo, não só existem diversas formas de conhecimento da

matéria,sociedade,vidaeespírito,comotambémmuitosediversosconceitossobre o que conta como conhecimento e os critérios que podem ser usadosparavalidá-lo.

Hoje há novas abordagens epistemológicas em construção na forma de

abordar as ciências humanas e assim envolvem os saberes culturais, suasideologias interpretativas acerca do mundo. Nesse sentido, o universoamazônico não pode ser simplesmente um lugar de contemplação dabiodiversidadeapresentada,precisadepolíticaséticasdedesenvolvimentodossaberesculturais.

Há uma carga de preconceitos com essas populações em função dasconcepções epistemológicas ocidentais que influenciaram e influenciam aforma de tratar os nossos colaboradores desta pesquisa. São termos quegeneralizam e que não caracterizam determinada sociedade. Pinto (2006, p.109)destaca:

[...] Criamos aqui expressões como, por exemplo, "ribeirinho". Essa

expressãocomosentidoquecarregahojetemumusobastanterecenteequerse referir aos pobres do interior, aos trabalhadores do campo que possuemcondições de existência situadas entre as mais baixas do Brasil. Em quemedida, entretanto, o termo ribeirinho é capaz de nos apontar a origem e anatureza dos processos sociais que são afinal os responsáveis pela suacondiçãodesfavorável?Anossover,essaéaquestão-chave.

As categorias de linguagem criadas para disfarçar profundos problemas

construídos no decorrer dos anos bem como, para um meio histórico eideológicoque tememvistaa justificativaparaestaspopulaçõesaceitarema

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suacondiçãode subsistência comoalgonatural.Anossa análise está imersodentro de uma representação sociocultural da Amazônia a partir de umaconcepção dos colaboradores, ou seja, dos sujeitos envolvidos diretamentenestapesquisa.

Talvez pretensiosos, mas buscamos investigar as manifestações no quetange ao fenômeno desportivo que ao nosso primeiro contato foi possívelobservar, que nesses torneios fluem sociabilidades que incorporam ecompartilham experiências dos sujeitos que transitam dia a dia nessescontextos. Os atores sociais amazônicos revelam conhecimentos eexperiências, seja pelos jogadores, torcedores ou mesmo aqueles que nãoparticipamdiretamente.

A estrutura do futebol nas áreas de várzea são organizadas a partir dofutebol profissional onde as equipes se compõem de um presidente e de 11(onze) jogadores de cada time com seus respectivos reservas, uniformes,traves,redeseárbitros,massãosistematizaçõesdearranjosdeacordocomaspossibilidadesdealgunsmoradoresque tomamparasiaorganizaçãodesseseventos, ou seja, não há uma institucionalização dos eventos daí, segundoBourdieu(2004,p.26):

[...]aanálisedasestruturasobjetivas–asestruturasdosdiferentescampos-

é inseparávelda análisedagênese, nos indivíduosbiológicos, das estruturasmentaisquesãoemparteprodutodaincorporaçãodasestruturassociaisedaanálisedagênesedasprópriasestruturassociais:oespaçosocial,bemcomoosgruposquenelesedistribuem,sãoprodutosdelutashistóricasnasquaisosagentes se comprometem em função de sua posição no espaço social e dasestruturasmentaisatravésdasquaiselesapreendemesseespaço.

Compreende-se que o futebol sem suas regras estruturais, não seria

futebol,poissãofrutosdelutasaolongodahistóriadofutebol,nocontextoaoqualeleocorreoscondicionantessocioculturaisparecemserenderàsregrasuniversais,masésabidoqueasregrassãosuscetíveisdealgumasmudanças,como, por exemplo, no processo de integração do negro na sociedade declasses,estesnoiníciodahistóriadofutebolnoBrasilnãopodiamjogar,masmesmo na clandestinidade as expressões suas gingas como forma deexpressãocorporal,seadequaramperfeitamenteaofuteboleassimasregrastiveramqueseralteradas.

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Em torno da história da sociologia do futebol, se compreende que épossívelorganizaçãosocialapartirdesuaprática,assimadinâmicaculturaléfrutodasrelaçõessociais.Nodiálogocomosagentessociaisdascomunidadespesquisadas, as partidas entre os times das comunidades rurais de várzea setransformamemrivalidades,sãoosdenominadosclássicos.

NavisãodePedroVasconcelos(entrevista/2013),ostimeseacomunidadeprecisam estar em sintonia e organizados para disputarem os jogos. ParaPedroVasconcelos (2013)"[...]quandoo timeganhaéporqueacomunidadeestá organizada não se pode ganhar um jogo ou torneio formado porjogadores arrumados na hora." (informação verbal).25 Nesse contexto ofutebolrepresentamuitomaisquejogosentrecomunidadesrurais, tambéméumaformadeorganizaçãosociocultural.

As rivalidades exercem um papel fundamental na organização dascomunidades,asrelaçõesdeproximidadeentreosjogadoreseespectadoresseafunilam,éummomentoquefortalecemseuslaçosemfunçãodotimedesuacomunidade,éummomentodeencontros.

Umadaspeculiaridadesmaisconsistentessãooslaçosdeafinidadesentreseus companheiros de equipe do cotidiano, são vínculos tidos como deparentesco,parecemumagrandefamília,ondetodosossujeitosmoradoresdalocalidadecompõemumgrandealdeamento.Éumespaçocompartilhadodassociabilidadeseesteéumfatorquelhescolocanumazonadeconfortoentreseuspares.

O encontro com times de áreasmais distantes promove certamotivaçãonosjogadoreseespectadoresdacomunidade,éumeventoaguardadocheiodeexpectativasquemovimentaocotidianodacomunidade, temacapacidadedealterar a rotina, são encontros numa rede de sociabilidades que agregamatividadessocioculturaiscompartilhadasentrejovenseadultosantesduranteedepoisdosjogos.

Osespaçosaosarredoresdoscamposdefutebolsãocompartilhados,porcrianças, esposas, filhos, namorados. Na torcida os espectadores expressamseussentimentosridicularizandoouenaltecendoosjogadoresapartirdesuasvozesegestosdramatizandoatramaqueocorre.

Figura7-Famíliasaoredordocampotorcendo

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Fonte:Oautor(2013).Não se trata de uma conspiração, mas uma espécie de dramatização da

plateiaondeafloramemsuasvozesemocionadasosconhecimentosadquiridosnestesespaços,éumacomunicaçãoquecaracterizaomododevidaque lhesconfereumasingularimportânciasociocultural.

Podemos dizer que estes espaços funcionam como um expositor doimaginário, onde os sujeitos exercitam ativamente a rotina e mantém seusaspectosculturaiscompartilhadosnessesmomentosdeexcitação.

O aprendizado destes com seus ambientes naturais, acabam refletindo naforma respeitosa no trato de seus pares, é uma riqueza de conhecimento,adquirido nas observações das particularidades de seu modo de vida eaprofundados ou materializados simbolicamente em seus comportamentossociais.

Ateatralizaçãodosaspectossocioculturaissedá,porexemplo,emsimplesgestos corporais eles manifestam uma informação compreensível ao outro,

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quereagemcomoutrasaçõeseassimseconstroemformasdecomunicaçãodarealidadefísicaecultural.

É fato dizer que estes são protagonistas e portadores de um saberconstruídonoseumododevidaque lhessãopróprios,masdevidoafatoresexternos da dinâmica cultural cada vez mais expressiva devido àmundialização, há certo comprometimento quando as mudanças provocadasporessasaçõessãoatreladasanovosconhecimentos.

Anecessidadedefazermosumaleituradassingularidadesdestesespaçosédegrandeimportância,umavezqueécomumsefazerinterpretaçõeserrôneasdas populações que residem nos espaços rurais e assim comprometer asformas de pensar as peculiaridades culturais destas localidades. NestaconjunturaRaimundoVasconcelos(2013)relata:

Nossavidaaquinãoédefartura,masgraçasaDeustemostodososdiaso

nosso peixe namesa, temos água boa, dormimos sossegados,mas às vezestemosquetercuidadocomnossascoisascomaquelesquevêmdefora,entreos quemoram aqui não temos problemas, somos uma grande família, todomundorespeitaosaberdooutro(informaçãoverbal).26

RaimundoVasconcelos (entrevista/2013), fazuma leituradaqualidadede

vida no contexto vivido dos espaços rurais amazônicos, mas muitasepistemologias tendem a interpretar estas peculiaridades como sinônimo deatraso, ou seja, não compreendem o tempo e o espaço do cotidiano destesmoradores, geralmente fazem uma leitura da cultura capitalista linearocidental.

Vistosobreestaótica,podemosinferirqueaculturaamazônicaédinâmicae composta por uma complexidade simbólica. É, um ambiente caracterizadocomummododevidapróprio,assimcorroboraLoureiro(1995,p.59):"[...]égraçasaestaformapeculiardoolhardohomemdaregião,tornou-setambémumaextensãoilimitadaàsinstigaçõesdoimaginário".

Nestes imensos espaços amazônicos, fluem mistérios, segredos efenômenos dominados pelo conhecimento dosmoradores dessas redondezasque lhes são frutos do conhecimento de várias gerações, são anos denavegabilidadeporesseshorizontesquelhessãopeculiares,assimresta-nosaaproximaçãoéticadaacademiaversusetnoconhecimentocomopontochavedenovosdiálogosesaberesconstruídosecompartilhados.

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O modo de compreensão destes espaços determina a cultura destesmoradores,constituindo-senoscódigosdesignificaçõescompartilhadosentreseusmembros.Navidasocialestaspeculiaridadesestãopresentes,paraoutroscontextossocioculturaisévistocomoaspectosestranhosaseusentendimentos,assimnapossibilidadedeconstruirmosumarededeinformaçõesdestetecidosocial,émisterdesenvolvermosumaprendizado,filtrandoalgunsderegistrosetnográficosdomododevidadestesagrupamentossociais.

Osespaçosdefutebolcomolugardesociabilidadesnosapresentamcomoum dos lugares estratégicos na busca de informações das peculiaridades douniverso domeio rural amazônico. Nesta busca investigativa devemos estarabertosàspossibilidadesde interpretações,ondeos relatosdosentrevistadossãopassos fundamentaisno trabalhodeumpesquisadorquedesejaconheceresseshorizontes.

As práticas socioculturais destes espaços são produtos de um longoprocesso das ações individuais que se somam aos agrupamentos, portantoaspectoscoletivosdeestilosdevida,quepodemsermapeados,assimservindoao conhecimento científico como indicador à diversidade de elementossociológicos,quesepermitedesvelarnosespaçosamazônicos.

Analisaraspeculiaridadesevidenciadasnosespaçosdefutebolnospermitecompreenderqueo futeboldevárzeanos trásumasériedecontribuiçõesnaformadepensaracomplexidadedavidasociocultural,ouseja,nospossibilitaumaleiturademocráticadosespaçosdaculturapopular.

Os conhecimentos revelados nos espaços de futebol estão diretamentevinculados aos aspectos religiosos, onde o profano e o sagrado sãodramatizados, assim se desenvolve no cotidiano a sincronia dos aspectossimbólicos,ofutebolagregacertosdiscursosreligiososedevoçõesaosseussantos,ondejogadoreseespectadoresutilizarcertosadereçosrevelandosuasopçõesreligiosas.

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CAPÍTULO–II:OFUTEBOL:OUTROSOLHARES

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2.1Ojogodofutebol-Atrajetóriadeumamodalidade

Quem pode duvidar de que o esporte é uma janela importante para a

propagaçãodojogolimpoedajustiça?Afinaldecontas,ofairplayéumvalorqueéessencialparaoesporte.

NelsonMandelaO jogo de bola por ser uma prática que envolve manifestações

socioculturais desperta a atenção das mais diversas concepçõesepistemológicas. É uma atividade desportiva de âmbito coletivo de imensapopularidade e difícil de ser contestada como fenômeno que envolve adiversidadecultural.

Nabuscadecompreensãodasrelaçõesdesociabilidades,ojogodefutebolé uma das atividades que nos permite adentrar nas formas de pensar,interpretarerepresentarossujeitossociaisdofuteboldevárzeaeseusmeiosdefiguração.

Está imerso na trajetória o entendimento da formação das sociedades, aeducação,otrabalho,acomunicaçãoenfimosprocessoshistóricosculturais.Ao centrar o foco no caso brasileiro na sociologia do futebol, é possívelnavegarnumperíodoconturbadoecompostoporumcenáriodepreconceitosquesefaziampresentesemtodasasinstanciasdavidasocial.

Torna-seimportanteassinalarquefuteboldecampoéumamodalidadedeformação coletiva e em função dessa composição, na maioria dos casos osucesso da equipe depende da boa relação dessa equipe. O líder africanoNelsonMandelajádiziaque"[...]oesportetemopoderdeinspirareuniraspessoas [...]", o futebol por envolver o coletivo oferece condições depromover a união diferentes grupamentos sociais que se comunicamsocioculturalmente.

As possibilidades de interpretações em torno do futebol são as maisdiversaspossíveis,circulaem tornodediversosestratosdenossasociedade,asriquezasdeinterpretaçõessemprerevelamnovosolharessuscitandomuitasquestões.Naatualidadedevidoàsmuitasfacetasdaglobalizaçãoeentreelasas

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perspectivas dos intercâmbios culturais em função da mídia, são maissuscetíveisaoolhardooutro.

AtrajetóriadessapráticasocioculturalnomeioruralAmazônicorevelaomodo de vida quemuitas vezes são silenciadas ou empobrecidas pelomeioacadêmico, por nãoperceber as variantes observáveis e as possibilidadesdeinterpretações.Estapesquisapoderácontribuirparapensarapráticadofutebolalémdasquatrolinhas,ouseja,osdiálogosquesedãoantes,duranteedepoisdosjogos.

Nacontemporaneidadeaanáliseacadêmicadofutebolsecaracterizacomouma prática além da mera diversão, mas como aspecto de manifestação esocializaçãodosfenômenossocioculturais.

Naatualidade,ocontextonoqualofutebolseapresenta,ofereceinúmeraspossibilidadesdeinserçãosocialeavanços,nosentidodepolíticasesportivasquevemcrescendonos espaçosbrasileiros.Soares (2011,p. 127) aprofundaesseraciocíniopostulandoque:

ÉinegávelqueoBrasilfezalgunsavançosnaáreadoesporte.Hojetemosumapolítica nacional de esportes consolidada, onde o esporte e o lazer sãodireitos dos cidadãos. É uma política que está voltada para a sociedadebrasileira independentemente de cor, etnia, gênero ou condiçãosocioeconômica.

As iniciativas de políticas desportivas, tem se demonstrado maisabrangentesnoaspectosocial,masaindalongedeumestadodemocráticodedireito,muitosprojetosparecemalienígenasporseapresentaremmuito foradarealidadeondesãoimplantados.Aspopulaçõesdevárzeaficamàmargemdesseprocesso.AlminoReis(2013)acrescenta:

Aquitemidosos,deficientes,crianças,jovenseadultosmas,parecequesó

somosvistospróximosàseleiçõesquandoaparecempolíticosdetudoquantoéladoefalammuitomas,ficasónodiscurso[...]achoqueospolíticostinhamque ver que o nosso voto é igual ao da cidade e que temos o direito de termelhorcondiçãoprarealizarnossoseventos,nossotrabalhomas,esperamospela providência de Deus um dia melhorar [...] nos jogos de bola nosdescarregamos os problemas do dia é por isso que nos finais de semana écerto o nosso encontro geralmente nos domingos á tarde e quando chega asegundafeiraestamosprontosparanossaslidas[...](informaçãoverbal).27

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Observam-senestesrelatosasconcepçõespolíticasdeatoresquevivemnomeiorural,sepercebeoentendimentodasquestõesrelativoàcidadania,comopor exemplo, a falta do poder público nas atividades desenvolvidas nascomunidadesrurais.Estessãosujeitosdedireitoseprotagonistasdemododevidaesustentabilidade.

Nos relatos de nosso colaborador ele compreende a frieza dos dadosestatísticos, quando este retrata que as prefeituras conhecem o número depessoasquevotameonúmerodeestudantes,masdefatoparecemignorarosdiagnósticos dos problemas locais, como elementos que possam visar oupossibilitarsubsídiosdepolíticaspúblicasparaessaslocalidades.

Torna-seimprescindívelparaestessujeitosdaAmazôniatraçarpropostasde ação que visem à valorização de sua cultura respeitando as diferençaslocais,tendoemvistaqueestespossuemsuaspeculiaridadesemseus:ciclosdanatureza, festas populares, espaço, tempo enfim seus aspectos simbólicospróprios.

AsDiretrizesOperacionaisparaaEducaçãoBásicadoCampo(2002,p.5)assinalamque "[...] o campo émais do que umperímetro não urbano, é umcampodepossibilidadesquedinamizama ligaçãodos sereshumanoscomaprópriaproduçãodascondiçõesdaexistênciasocialecomas realizaçõesdasociedade humana". Fazer uma leitura destes espaços é navegar noetnoconhecimentodomeioruralcomoumlugardememóriaelaboratóriodeaprendizados.

Os espaços rurais precisam de políticas sustentáveis, as políticasassistencialistas e compensatórias tornam-se danosas uma vez que asexpectativas a longo prazo de desenvolvimento ficam comprometidas porprojetosacurtoprazoparaemergênciasespecíficas,comoocasodasgrandesvazantes ou enchentes nas várzeas que em alguns lugares os moradoresrecebemumacestabásicasomenteparaummês.

Sobre a implantação das políticas públicas de esporte e lazer na regiãoNorte,Soares (2011,p. 128): afirma: "Verificamos tambéma inexistênciadeprogramasdeesporteelazerparaosetno-descendenteseaquaseinexistênciadaparticipaçãodasociedadenoplanejamentodasatividades".

No município de Parintins existem duas universidades a UniversidadeFederal doAmazonas-UFAM e aUniversidade Estadual doAmazonas-UEA,que atendem a estudantes destas localidades e existe uma série de pesquisasnessas áreas, no entanto a relação entre o poder público e as universidadesaindasãocaminhosdistintos.

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O esporte e lazer mais peculiar é o futebol característico dos finais desemana das comunidades de várzea, mas vinculadas às determinações dasregrasvigentesháanos,é,portanto,umamodalidadeque temuma trajetóriaatrelada a um processo histórico-social. Para Elias (1992) o esporte surgeprimeiramente na Inglaterra, pois esse processo estava interligado com asmodificações da sociedade inglesa, principalmente o processo de"parlamentarização" que a Inglaterra sofria, substituindo antigas formasviolentas de resolverem problemas por formas mais pacíficas eautocontroladas.

Durante o processo histórico de autoafirmação da ordem política quepredispõe uma espécie de controle da população no que tange às suasatividades socioculturais. É o que corrobora Elias (1992, p. 46), para esseautor,oesportedesdeoséculo18sempre"[...] incluiuconfrontosrealizadosparaasatisfaçãodeespectadoreseoesforço físicoprincipal tantopodiaserdosanimaiscomodossereshumanos".

Sobreestaafirmativa,quantoàsuaorigem,Toledo(1996,p.102):afirma:"[...] o futebol consiste em uma das modalidades mais difundidas demanifestaçãoesportivadassociedadesmodernas.Ofutebolcomoseconheceatualmente, é frutodas sociedades competitivas instauradas coma revoluçãoindustrial".

No Brasil a prática de futebol surge num contexto caracterizado com aformação do espaço urbano e na diversidade cultural que começava a seformar no Brasil. Era a formação de um estado moderno que tinha comomodeloaEuropaquedisseminavapadrõescomportamentais"civilizados",daísesegueaspráticassocioculturaiseuropeiaseentreelasofutebolaosmoldesIngleses.

Nessa configuração os padrões comportamentais das entidades inglesassão o arcabouço na construção da sociedade moderna, essa estrutura chegacomtodaasuaimperativaforçacomasatividadesdesenvolvidasnaquelepaíse entre as práticas de lazer o futebol começa a ser veiculado nos espaçosbrasileiros.

Segundo Bourdieu (1989, p. 10), "[...] os sistemas simbólicos, comoinstrumentosdeconhecimentoedecomunicação,sópodemexercerumpoderestruturanteporquesãoestruturados".Aconsolidaçãodeumasociedadecomcaracterísticas modernas nos espaços brasileiros se ativeram ao futebol apartir de seus modelos ou perfis sociais. Como as análises realizadas pelopensador Bourdieu, esta parte da concepção de que nossas preferências e

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nossos gostos são resultantes de nossa relação com a sociedade na qualvivemosevisualizamasestruturasnelapresentes.

As estruturas ideológicas das classes dominantes chegam imperando umcondicionantedevidasocial,masaospoucosessamesmaconfiguraçãopassasofrer mudanças, basta compreendermos o processo histórico do futebolenquantoinstrumentodelazerdaclassedominante,masoseuêxitonoBrasilse deve à abrangência da popularidade do futebol ás classes menosfavorecidas,estascomeçamaparticiparevãodarlegitimidadenoBrasilcomoo"futebolarte".

O poder das estruturas vigentes na história doBrasil tem no futebol ummecanismo de compreensão da materialização das ideias europeias. Afuncionalidade desses poderes materializados nas redes de preconceito nosespaçosbrasileiros.

O futebol como aspecto que se inseriu na cultura popular foi ummecanismo que possibilitou driblar as estruturas políticas e sociais do país.Foiumprocessolentoegradual,mashojepodemosdizerqueentrevencidosevencedoresestáàvozdadiversidadeculturalpresentesnahistóriaeformaçãodosclubes,ondemuitosatletasoriundosdascamadasmenosfavorecidassãoosgrandesdestaques.

Através do futebol as expressões socioculturais do povo brasileiroganharam concomitantemente visibilidade. A cultura do futebol no Brasilrecebehojedenominações,comoadecunhojornalista,"ofutebolarte",pelassuas peculiaridades do individualismo dos atores do futebol. SegundoBourdieu(1989,p.11):

[...]aculturaqueune(intermediáriodecomunicação)é tambémaculturaquesepara(instrumentodedistinção)equelegitimaasdistinçõescompelindotodas as culturas (designadas como subculturas) e definirem-se pela suadistânciaemrelaçãoàculturadominante.

O futebol que se inicia com as elites, mas concomitantemente chega as

classesmenosfavorecidas,ouseja,ganhacontornospopularesebuscampormeiodessapráticaummeiodeascensãosocial.

Nadinâmicaculturalalgunsaspectossãoincorporadosnomododejogar,como,porexemplo,ajogadadoinventorda"bicicleta"ea"plásticajogada"28dobrasileiroLeônidasdaSilva29,eraumanovaformadejogarqueemumade suas partidas o juiz anulou o gol de bicicleta por achar a jogadaextravagante.Caracteriza-seassim,umaformadejogaretambémdeviverque

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segundoFrancoJúnior(2007,p.166):"[...]futebolémetáforadecadaumdosplanosessenciaisdoviverhumanonascondiçõeshistóricaseexistenciaisdasúltimasdécadas".

Este fato social caracteriza a aversão e o preconceito, onde revela umaforma hierárquica de classificação cultural, sobretudo legitima o podervigentedasclassesdominantesemdetrimentodosaspectosdaculturapopularesuaspotencialidades.

Ofutebolcomofenômenodaculturapopular,temopoderderevelarseuscraques e torná-los espécies de heróis nacionais, como é o caso de EdsonArantes do Nascimento30 (Pelé), considerado melhor jogador de todos ostempose"reidofutebol",nessaperspectivadeanáliseFrancoJúnior(2007,p.259) corrobora: "Pelé, segundo relatam amigos dele, ‘acredita ser um deustanto dentro como fora dos gramados". Esta personificação ganha maissentido sócio histórico quando ao analisarmos que se trata de uma pessoanegra.

Numacompreensãosociocultural,emcadalugarháasdistinções,comonaAmazônianocontatocomooutro se revelammuitosaspectosculturais, taiscomo:nomes,apelidos,discursos,enfimomododevidadocotidianodessesmoradoresqueestáalémdopassatempoedivertimento.

O futebol de várzea difere do futebol no espaço urbano seja pelaprofissionalização, ou seja, a formalidade ou informalidade, mas sobretudopermite-nosnestesespaçoscompreenderdeumaformamaisaprofundadaseusaspectossimbólicos,taiscomo,omododevida,comosãoretratadosnasfalasdos personagens, que inconscientemente e sem uma cobrança acadêmicarevelamseuspoderessimbólicos.

NaAmazôniaofutebolseguecomoumcampeonatodealtosebaixos,masqueconseguedesdeosprimeirostemposreunirmultidõesequenodecorrerdos tempos ganha novas modalidades, o que leva os indivíduos locais a seidentificarcomesseesporte,comoumadasprincipaisatividadesde lazerdapopulaçãodascomunidadesrurais.

A prática do futebol é uma atividade que possibilita compreenderelementos da história social e adentrar na complexidade do cotidiano nocontextodascomunidadesdevárzeanaAmazônia,ondeaspopulaçõesfazemumverdadeiromalabarismoparaparticiparemdeumaatividadecoletiva.

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2.2Ofutebolcomoformapopulardelazer

Ofuteboléumaformademanifestaçãosocioculturalquerepresentaacima

detudoumentretenimentodaíporquealguns jornalistasodenominamcomo"ópio do povo". Mas o aspecto do lazer em uma partida de futebol criapossibilidades da dinâmica cultural, constituída pela vivência lúdica ereveladordeemoçõesparaojogadoreespectadores.

Acompreensãodolazernocontextodasmanifestaçõessocioculturais,nosremeteapensarqueemtodososespaçosfluempráticasdesportivasquelevamseus atores a concretizar relações de sociabilidades, ou seja, é quaseimpossível um espaço onde o futebol não esteja inserido, como bem expõeToledo(2000,p.67)aorefletirqueseria"[...]difícilimaginar,hoje,oBrasilsemofutebol".

Nos espaços amazônicos em suas áreas de várzea, existe um grandedistanciamento entre uma residência e outra, mas apesar dessas diferençasdemográficas está longe da ausência de atividades de lazer, mesmo com asdificuldadescotidianasaspopulaçõesbuscamalgumentretenimentoeo jogode bola é a principal atividade. Corroborando com essa afirmação Matos(2008,p.233-234)reitera:

Nojogodefuteboléondesepodeobservarareuniãodemaiornúmerode

pessoas residentesnaáreadepesquisa.Nesseespaçode sociabilidadevamosver as diferenciações, as redes de interdependências e relações de poder aoobservar as pessoas em suas individualidades se postando como o maiorcriador de gado, o representante da lei, o representante da comunidade, opescador profissional, o adventista que comanda a igreja, o aposentado, oagente de saúde, enfim vamos ‘enxergando’ como se configura a estruturasocial [...] ondeo jogodebola é o grande atrativo, para qual convergemaspessoasembuscadeexcitaçõesagradáveis.

Osespaçosdatramadaatividadedojogodebola,tambéméoespaçoondeespectadores compartilhamosproblemasdocotidiano, eonde sepercebe asrelações de compadrios e afetividade entre os moradores. Como afirma

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RicardoVasconcelos (2013): "[...] aqui é um lugar de encontro dos amigos,parentes e a gente fica informado como está todo mundo na comunidade."(informação verbal)31. A preocupação com o outro é um aspecto peculiardesteslugares.

A partir dos fatores mencionados, a expressão futebol como prática delazerexpõeosatoressociaisarevelarseussentimentoseaimagemdooutrodotadadeumdiscursoqueosmanifestamculturalmente.Nestesmomentosdelazer se percebeuma carga de emoçãoque se completa coma inserçãodoselementos culturais do contexto local. Nesse sentido, Elias (1994, p. 270)afirma:

Nenhumasociedadepodesobreviversemcanalizaraspulsõeseemoções

do indivíduo, sem um controle muito específico de seu comportamento.Nenhum controle desse tipo é possível sem que as pessoas anteponhamlimitaçõesumasàsoutras,e todasas limitaçõessãoconvertidas,napessoaaquemsãoimpostas,emmedodeumououtrotipo.

Duranteosjogosdefuteboloscomportamentosfluem,assimjogadorese

espectadoresdascomunidadescompartilhamseussentimentos,ouseja,olazerrevela elementos simbólicos pertinentes às comunidades. Segundo Elias(1985),sobreodesporto:"[...]aprofundaconsciênciadequeacompreensãododesportocontribuíaparaoconhecimentodasociedade".

Elias(1985)demonstraemsuaspesquisasacapacidadequeesportetemdequeaomesmotempoquegeraconflitoetensões,tambémporumaespéciedecódigo de conduta é necessário o estabelecimento de regras da sociedadeinglesanosseusprocessoscivilizatórios.CorroborandocomessaafirmaçãoEliaseDunning(1985,p.69)reiteram:

Nassociedadesondegrandepartedoselevadospadrõesdecivilizaçãosão

salvaguardados e assegurados por meio de um estado interno de acentuadocontrolo efetivo da violência física, as tensões pessoais resultantes dessegênero de conflito, numa palavra, as tensões determinadas por essadificuldade,estãomuitoespalhadas.

Os autores exemplificam a questão das emoções e o papel crucial dasregulações, tão importantes para as sociedades modernas que estavam seformando. Elias (1985), na sua teoria sobre o processo civilizador, busca

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comoobjetodeestudooesportequetempapelfundamentalnoentendimentodasociedade.

As concepções metodológicas de Elias fornece informações sobre afuncionalidadedasociedade,utilizandooesportecomoobjetodeinvestigaçãoaté então considerado uma fonte pouco utilizada. Utilizamos aqui o esportenestecontextoelisianocomoformadecompreensãodassociedadesruraisdomeioAmazônico.

No contexto global existem vários órgãos responsáveis pelaimplementação da prática do futebol como necessidade desportiva para associedades,entreessesoFundodasNaçõesUnidasparaaInfância(UNICEF),incentivaodireitoaoacessodesportivoemváriospaíses,principalmenteemáreasque apresentamdifícil acesso.Sãoprojetos executados compareceriasdas esferas de gestão públicas federais, estaduais e municipais. O direito àpráticadesportivaestá expressonaConvenção sobreosDireitosdaCriança,adotadapelaAssembleiaGeraldaOrganizaçãodasNaçõesUnidas(ONU)em20denovembrode1989,art.31:

1. Os Estados Partes reconhecem o direito da criança ao descanso e aolazer,aodivertimentoeàsatividadesrecreativasprópriasdaidade,bemcomoàlivreparticipaçãonavidaculturaleartística.

2. Os Estados Partes promoverão oportunidades adequadas para que acriança, em condições de igualdade, participe plenamente da vida cultural,artística,recreativaedelazer.

NoBrasiloesporteelazerfoilegitimadocomoumapráticaquefazparte

do cotidiano, é uma necessidade essencial na vida do povo brasileiro, aprópriaconstituiçãofederalotornouumapráticalegalizadacomodireitodoscidadãos.AConstituiçãoFederalBrasileirade1988,sobreaordemsocialnocapítuloIII“DaEducação,daCulturaedoDesporto”afirma:

Artigo217:ÉdeverdoEstadofomentarpráticasdesportivasformaisenãoformais,comodedireitodecadaum,observados:

I-Autonomiadasentidadesdesportivasdirigenteseassociações,quantoàsuaorganizaçãoefuncionamento;

II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária dodesporto educacional e, em casos específicos, para o desporto de altorendimento;

III - o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o nãoprofissional;

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IV - A proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criaçãonacional.(BRASIL,1988).

É crucial refletirmos sobre o direito das manifestações desportivas no

imagináriodas sociedades amazônicas, doprocessodedesenvolvimentodashabilidades físicas e psicológicas, além do discernimento do trabalhoindividual e em equipe, também o convívio com as diferenças étnicas ereligiosas dos indivíduos, é um direito garantido e, portanto, deve serimplementadonosmaisdiversoslugaresdopaís.

Nos espaços rurais o futebol está no centro das atividades de lazer, écertamente um lugar da sociabilidade e aperfeiçoamento das manifestaçõesculturais, onde os envolvidos direta ou indiretamente podem aprender aconvivercomsituaçõesconflituosasnomomentodesportivoéumaquestãodealteridade.

O processo de redemocratização do país incorporou como direitoconstitucionaloesporteelazercomoformadepromoverapromoçãosocialecidadã. Como se lê no artigo constitucional citado, o texto trata de práticasdesportivas formaisenão formais,ouseja, tratadeumaformageneralizadaoseventosdesportivos.

Existemno paísmuitas associações desportivas que tem essa perspectivanomododetrabalharapráticadesportivarelacionadaaolazer.Osresultadostêm mostrado efeitos positivos no sentido físico, psicológico, social eeducacional. Esses projetos ajudam a promover a saúde, o senso de equipe,autoconfiançaecomunicaçãosocial.

Em termos legais a adequação da legislação desportiva a partir dosparâmetros e princípios daConstituição Federal de 1988 só ocorreu com aaprovação da Lei n. 9.615, de 24 de março de 1998, a “Lei Pelé32”. Foisomente a partir desta lei que o jogador de futebol foi incorporado àslegislaçõestrabalhistascomoatletaprofissional.

Vale ressaltar que no projeto ao qual tive a oportunidade entrevistar oCoordenador do esporte da Secretariaria de Educação (SEDUC-AM) deParintins, Carlos Meireles, este em seus relatos expõe os objetivos dosprojetos:

EmParintinsháprojetosdefutebolcomo:‘OBomdebola’,‘Bolaverde’,

‘TorneiodosMarianos’,‘OParintinzão’,mas,quetendemaabarcarsomente

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espaçosurbanosembora,esteúltimosejaumprojetoquetemcomoobjetivo‘aosmoradoresdomunicípiodeParintins,tantodazonarural,comodazonaurbana, um evento desportivo-social e cultural a partir da modalidadeesportivadefuteboldecampo,nosNaipesmasculinoefeminino’.

O professor CarlosMeireles, enfatiza ainda a questão do pertencimento

destespotenciaisatletas,masprincipalmenteapráticadaeducaçãofísicacomouma necessidade corporal, desenvolvimento sociocultural das práticasdesportivasdoMunicípio.

[...]Temosanecessidadedecriarumaculturaesportivanomunicípiotendoem vista o desenvolvimento de equipes amadoras/profissionais capazes decompetir a nível municipal, regional e nacional, valorizando os atletas domunicípio[...]Entrarparaocalendáriodeeventosesportivosdomunicípioedo estado, servindo de referência para eventos regionais [...] Sensibilizar osatletas amadores e a população em geral ao grande problema que osedentarismocausaaspessoasquenãopraticamatividadefísica,incentivandoassim a prática desportiva, como instrumento valioso para o bomfuncionamentodoorganismo(informaçãoverbal).33

Nas secretarias municipais de Parintins e Barreirinha há projetos dessa

magnitudeondemuitosalunosdasescolaspúblicasparticipam.Sãoiniciativascoordenadaspelassecretariasdomunicípio,massãoprojetosconstruídoscomo propósito visando abarcar a totalidade do município, mas de fato aconsolidaçãodestaideiaestálongedeserumarealidade.

Em Barreirinha existem muitas iniciativas por parte do poder públicocomo,porexemplo:oprojeto"CopaVerdeBarreirinha","CopadoConselhoTutelar" ("CidadãodoFuturo"), esteúltimosegundoos relatosdosecretáriode Educação FrancinaldoMatos, "[...] um dos objetivos émotivar os alunosnão só os que têm bom rendimento,mas principalmente aqueles com baixorendimento escolar com o intuito de diminuir os efeitos da evasão escolar[...]", além de possibilitar aos jovens a compreensão problemas sociaiscausadospeloálcool,tabacoeoutrasdrogas.

Nas comunidades de "Nossa Senhora de Nazaré e Harmonia" onde selocalizaolugardestapesquisa,asiniciativasdesportivassedãoporiniciativa

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dosmoradoreslocais.Osmoradoresdestascomunidadesutilizamosfinaisdesemanaparaolazer,quandoelestêmotempolivre.

Ofutebolocorresemprenosfinaisdesemana,somenteemdiasdefestasocalendário se altera,mas cadamomento de reunião entre as comunidades ésempre um grande evento na compreensão do contexto local, é um diaaguardadocomansiedadepelacomunidadeporserummomentodeencontronoseutempolivre,comoafirmaMatos(2008,p.61):

De fato, o futebol ficaria numa posição deslocada se fosse considerado

como uma atividade intermitente, não contínua. Pode-se considerarintermitente se observarmos a prática em finais de semana. Assim comopoderíamosconsideraroutrasatividadesquesãodesenvolvidasdetemposemtemposcombasenotempocíclico,sematentarmosaumaestruturasocialcoma atenção voltada para o devir. O futebol é uma prática desenvolvidageralmente aos finais de semana mas que homens e mulheres – crianças,jovens e adultos – de Bicó, Cuiamucu e Canela-Fina, estão esperando omomentoparaestarpresentequandodesuarealização.Hánocotidianodessascomunidadesumapreparaçãoantecipadaqueseevidenciacadavezmaisaoseaproximardofinaldesemana.

ApesquisadatesedoprofessorGláucioMatosfoifeitaemumcontextodo

baixo Amazonas, se configura como um exemplo característicos a outrasrealidadescomoéocasodo lugardestapesquisa.Apreparaçãodestessedádiferente do contexto urbano se levarmos em consideração que estes só sereúnemnosfinaisdesemana,comoesclareceAlcivaldoPinto(2013):

‘Ofuteboléamelhordiversãoquetemosporaquientãofazemosdetudoparaofinaldesemanaestarmospresente’,equantoàpreparação,‘jáquenãotemos tempo para se reunir e se preparar juntos, então cada um se preparacomopode, é correndo no campo reunindo os bois, tirando leite, pescando,trabalhandonoscamposéissoquefazemos’(informaçãoverbal).34

Comoseobservanos relatos acima,o futebolnesses espaços segueumadinâmicadiferentedofutebolprofissionalnosentidodepráticacorporal,umavez que preparar o corpo para um evento é está ligado diretamente àsatividadesdocotidiano.

Em função dos custos para a comunidade, os organizadores promovempartidas de futebol entre as comunidadesmais próximas ou quandopossível

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formamdoistimesnaprópriacomunidade.AlminoReis(2013)relata:[...] nós não temos ajuda nem do Município de Parintins e nem de

Barreirinha,nosorganizamose fazemosdo jeitoque épossível, realizamostorneioscomascomunidadesmaispróximase,quandoaodinheiroépoucofazemos por aqui mesmo [...] já temos dois times um organizado pelocompadreAlminoReiseooutropormime,oeventoébomjátematorcidadeleeanossa(informaçãoverbal).35

Aorganizaçãodasatividadesdeesporteelazersedáporresponsabilidade

únicadosprópriosmoradorescomorelatouRicardoVasconcelos.Aausênciado poder público nas práticas de lazer se dá também em função da falta deconhecimento e planejamento a gestão pública, uma vez que as atividadesdesportivasservemparamelhoraraqualidadedevidarelativaàsaúde,poisésabido que o esporte é uma necessidade do corpo humano. Diante destaperspectivaalgunsproblemassãorelatasporSoares(2011,p.62):

Entretantoessa tentativaesbarraemalgunsproblemasondedestacamosa

ausência de informações seguras ou registros para subsidiar as políticas deesporteedelazernassuasdiferentesvertentesespecialmenteconsiderandoosEstadosdaregiãoNortedoPaís.Essamagníficaregiãopossuicaracterísticasque impõem um ritmo próprio de vida a começar pelas distâncias,considerando-se também o sistema de transporte que se baseia nos rios dabaciaamazônica,alémdasdificuldadesnaturaisdesobrevivência.

Osespaçosdevárzeaprecisamderegistrose,sobretudo,oconhecimentodo lugar e dos aspectos culturais dessas populações. Diante da diversidadebiológicavisivelmenteperceptiva,épossíveldiagnosticarquese tratadeumlugar que apresenta um imenso potencial de recursos naturais a seremexplorados,visandoaquestãodasustentabilidade.

Porém, o nosso objeto de estudo são, asmanifestações do futebol comoexpressão do lazer. A nosso ver representa um lugar crucial para acompreensão dos aspectos socioculturais do homem amazônico, onde asevidências de alteridade, emoções e corporeidade se expressam com muitomaisclareza.

Nestesmomentosdelazereentretenimento,ossujeitossociaisextravasamsuasemoçõesdepoisdeumasemanade trabalho.ParaDumazedier (2001,p.

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92),olazeréumtempoemqueapessoa"[...]seliberaaoseugostodafadiga,descansando; do tédio, divertindo-se; da especialização funcional,desenvolvendo demaneira interessada as capacidades de seu corpo e de seuespírito".

No contexto das comunidades estudadas, o lazer e o tempo livre érelativamenteumaquestãodeescolhapessoalemfunçãodeumacombinaçãode fatores religiosos e econômicos. Estes podem aproveitar para conseguirfazeralgumaatividadequelheproporcionerendaparaosustentofamiliarouàdevoçãodeseussantospadroeiros

NasconcepçõesdeEliaseDunning(1992,p.107),"[...]deacordocomosatuais usos linguísticos, é todo o tempo liberto das ocupações de trabalho".Muitosdessestrabalhadoresaproveitamotempolivreparadormir,brincarouficarnacompanhiados filhos, esposae seuspais,vistoqueomododevidanascomunidadesruraispesquisadas,osmoradoresaproveitamotempolivreparaumadiversidadedeatividades.

O futebol embora seja uma dessas atividadesmais preponderantes comomeio de lazer, há outras, tais como: dormir, visitar vizinhos, ficar com afamília. Segundo Elias e Dunning (1992, p. 110), "A tipologia mostra, deformamuitonítida,queumaparteconsideráveldonosso tempo livrenãosepodeidentificarcomolazer".

Olazerfazpartedotempolivrecomoumaatividadehumanacomomeiode entretenimento e descanso, ou seja, com o intuito de melhorar odesenvolvimento pessoal e social. No futebol nem sempre é o simplesentretenimento às vezes o que é lazer para uns para outros é uma atividadetrabalhista.

EliaseDunning(1992,p.112),partemdapremissadequeolazeré[...] um tipo de atividade que se insere no tempo livre, colocando o

indivíduocomotransformadordasuarealidade,este,enquantosujeitosocialpodedotardesentidoaatividadedelazereaproximá-ladabuscadaexcitaçãooudoprazer.

Carlos Roberto Pinto (2013) afirma: "[...] quando jogamos é paraextravasarosproblemasdodiaaadiaemantera formafísica." (informaçãoverbal)36,ouseja,olazernaatividadedesportivaproporcionaaosjogadoresliteralmente o exercício físico e mental, bem como aos torcedores queextravasam seus sentimentos de aversão ou acolhimento com os atletas dooutrotime.

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Aonavegarmosporesteshorizontesdemanifestaçõesculturais,noslevaarefletir sobre os olhares do mundo acadêmico no meio rural amazônico.ComobematestamosestudosdeEliaseDunning(1992,p.151):

[...] representa uma esfera de vida que oferece mais oportunidades às

pessoas de experimentarem uma agradável estimulação das emoções, umadivertida excitação que pode ser experimentada em público, partilhada comoutrosedesfrutadacomaprovação[...].

As manifestações que afloram nas partidas de futebol nos campos devárzea expressam o cotidiano de forma espontânea, sem uma preocupaçãorelativamentediretacomasformalidadesdodiaadia.

Nos relatos dos jogadores eles afirmam que o futebol como expressãolazeréumimportanteporqueéummomentodeextravasarseussentimentos,serve para tirar o stress do dia a dia, de poder passear com a família nascomunidades.Evidencia-sequeofutebolproporcionasaúdeevidasocialaosseusatores, sejameleshomens,mulheresecrianças.MarioCarvalho (2013)afirma:

Quandojogamosbola,tambémjogamosforaostressdodiaadiaénesse

momento de laser que podemos brincar, apelidar os colegas, brincar comnossosfilhos[...]ébomveraesposadagentegritandonabeiradocampoonossonomee torcendopornósela tambémsediverteé,umdiadadiversãodosamigosedafamília(informaçãoverbal).37

Entende-senocontextoruraldofuteboldevárzea,olazercomoatividade

nãoobrigatória,ouseja,édelivrevontadedosindivíduos.Masemfunçãodasengrenagens do capitalismo, muitas vezes o que antes era lazer pode sertransformado em algo obrigatório principalmente no futebol, quando oschamados olheiros que são as pessoas que identificam possíveis craques,percebemumfuturonaquelejogadorhabilidoso.

É a lógica do mercado capitalista imperando na prática do lazer nascomunidades,principalmentecomachegadadasnovastecnologias,taiscomo,osaparelhoscelulares,ostelevisores,enfimasformasdepensardosespaçosurbanos que se fazem presente na mentalidade desses atores, o que lhespermite buscar na atividade desportiva o lazer atrelado à possibilidade deascensãoprofissional.

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Há vários estudos e pesquisas referentes ao lazer e ao futebol queconvergem-se em alguns pontos e divergem-se em outros. Porém, asperspectivas são positivas quando relacionadas às manifestaçõessocioculturais, uma vez que pensar o direito ao lazer é acima de tudo, umpasso à alteridade e consequentemente a melhoria da qualidade de vida daspopulaçõesdomeiorural.

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2.3Ofutebolcomomeiodeexpressãodocotidiano

Discorrer sobre as expressões manifestadas nos espaços de futebol nocotidiano das várzeas é, sobretudo, penetrar no tecido sociocultural docotidiano das populações rurais.O futebol é um aglutinador das emoções eespaço de representações de cenas do cotidiano, assim expõe osconhecimentosproduzidosfrutosdadinâmicacultural.

Partimosdoprincípiodoobjetodenossasanálisessobreasmanifestaçõespresentes no cotidiano nas expressões socioculturais. A complexidade docotidianovivenciadonosespaçosrurais.

Nestecontexto,areflexãodeCerteau(1996,p.31)evidencia:Ocotidianoéaquiloquenosédadocadadia(ouquenoscabeempartilha),

nospressionadiaapósdia,nosoprime,poisexisteumaopressãodopresente.Tododia,pelamanhã,aquiloqueassumimos,aodespertar,éopesodavida,adificuldadedeviver, oudeviver nesta ounoutra condição, comesta fadiga,comestedesejo.Ocotidianoéaquiloquenosprendeintimamente,apartirdointerior [...] è um mundo que amamos profundamente, memória olfativa,memóriadoslugaresdainfância,memóriadocorpo,dosgestosdainfância,dosprazeres[...]aohistoriadordocotidianoéoinvisível[...].

O pensador nos adverte sobre a complexidade do cotidiano o qual nos

mantémcomouma"camisade força",ondeas ações repetidas tendemanosoprimir, dado os problemas que surgem cotidianamente no interior dasrelações,masultrapassaomundodascoisasmateriaisquandoocotidianoestáimersoemnossoimaginário.

Nouniversodaspopulaçõesquevivemnoambienteamazônico,omundodasrepresentaçõesemergenosespaçosdelazer,ondeofutebolnosdirecionaabuscarcompreenderassuasatividades.JoséEnéiasGloria(2013)falacomentusiasmodeseucotidiano:

Amanheço felizporquemoroaqui e adormeçoagradecendoaDeuspelo

lugarquemoramos,aquigraçasaDeusvivemosempaz,apesardo trabalho

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dodiasempretemostempodebrincarumpoucojogandobolae,nossosfilhosestão nomesmo caminho, naminha forma de ver acho que eles são felizescomoquetemosaoferecer[...]àsporaquiascoisasficammeioparadasentãovamosàigrejaedepoisjogarbolaequandodávamosàcidade(informaçãoverbal).38

José Enéias Gloria, expressa a sua experiência em lidar com as ações

repetidas no contexto das comunidades, se compreende essa estratégia dequalidadedevidaaoouvirseusrelatos,asrelaçõesentreocotidianoeopapeldoaprendizadodosfilhos,paramanteremvivasasexpressõessocioculturaisnoambiente, segundoele foidestinadoporDeus.Percebe-seaquestãoda fémuitopresenteemsuasidasevindas,oqualéumfenômenoquefazpartedomododecompreensãodosacontecimentosnestesespaços.

É, certamente uma ideia que circula no imaginário destas populações,como homens e seres livres por natureza divina, como a correnteza dasvárzeas cheio de caminhos e mistérios do bioma característicos dessesambientes, são sempreumavariedadesde fenômenosnaturaisqueemergem,todas essas dádivas naturais lhes enchem de perspectivas na condução daeducação dos filhos, ou seja, percepções sensoriais do ambiente naturalcorporificadonomododevidacotidiano.

Visto sobre esta ótica, se percebe que a sociedade cria e desenvolvepráticas socioculturais próprias nos espaços que vivem de acordo com suasnecessidades.Osqueconvivemnestesambientessãoosgrandesprotagonistasepossuemsaberesmisteriososdacomplexidadedavidanomeiorural,frutode suas constantesobservaçõesno cotidianocomo relata JoséEnéiasGloria(2013):

Nós jáaprendemosaviveraquinavárzea,permanecemosaquiduranteo

período de enchentes e, vivemos da pescamas, pescar dá um certo trabalhotemos que procurar os lugares onde a vegetação é boa ou onde tem frutos,sementes, lá estão os peixesmas, com o passar dos anos está ficandomaisdifícil de peixes [...] há alguns perigos como a cobra sucuriju que sempreapareceoumesmocobrasvenenosasqueprocuramascasaspraseabrigaremmas, essa foi avidaqueDeusnosdeu e a fé éoquenosmovee assiméonossodiaadia[...](informaçãoverbal).39

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Figura8-ResidênciadeJ.G.(entrevistado)

Fonte:Oautor(2014).NaFigura8aresidênciadeJoséEnéiasGloria,tomadapelaenchente,mas

comobemenfatizaemseusrelatos,"aprendemosaviveraquinavárzea".Estefaladosproblemasdocotidianonaépocadaenchente,masaquestãodafééomeioquesuafamíliautilizacomoummecanismodedriblarosproblemasdocotidiano.

AnelilzaGlória(2013)relataquenasatividadesdiárias,nãohádiferençaentre os gêneros, ambos trabalham e em seus relatos descreve o cotidianovividonasterrasdevárzea.

Eusempretrabalhojuntoàfamílianododia,nossosfilhossempreestão

junto, pescamos juntos e plantamos e, quando a vazante chega, a terra estápronta e tudo vinga, a terra vem adubada mas, quando a enchente é muitogrande como aquela do ano de 2009, o solo fica lavado e, nasce nas terrastudoquantoébesteira,masquemfazplantaçõesempequenosbalcõeséótimoporque, procuramos nos campos as arvores das mungubeiras caídas que jáestãopodreselasservemcomoadubo...(informaçãoverbal).40

Verifica-sequenosrelatosdeAnelilzaGlória,asrelaçõesdesociabilidade

muitopresentenoambientefamiliareoconhecimentoadquiridonocotidianodessesespaços.Asestratégiasdesobrevivênciafrenteàsintempériesnaturaisé

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como relata Anelilza Glória (2013), "[...] o negócio é aprender fazendo."(informaçãoverbal)41.

Ocotidianodestesmoradoreséa"escoladavida",ouseja,asobrevivênciaeaqualidadedevidadependemdiretamentedeconhecimentosadquiridoscomoprópriomeio,masdevidoocomplexodoestuárioamazônicoondeosciclosdaságuas são fenômenoscadavezmais incertos,háenchentesevazantesdemaioroumenorproporção.

A operacionalidade do modo de vida praticado nestes lugares édiagnosticada pelosmoradores que compartilham dasmesmas experiências,corroborando com essa afirmação Certeau (1995, p. 201) reitera que: "Umlugar é a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuemelementos nasrelações de coexistência [...]", constituem-se conhecimentos adquiridos nocomplexodasrelaçõessocioculturais.

Nocontextodestapesquisaanavegabilidadeestápresentenodiaadia,noriodenome"ParanádoLimão",afluentedorioAmazonasondeosmoradorestransitamnoseucotidiano,naspalavrasdeTocantins(1988,p.233):

[...]ohomemeoriosãoosdoismaisativosagentesdageografiahumananaAmazônia.Orioenchendoavidadohomemdemotivaçõespsicológicas,orio imprimindoàsociedaderumose tendências,criandotiposcaracterísticosnavidaregional.

Navegando e observando o cotidiano das comunidades, as casas de

madeira entre vizinhos, dispersas uma das outras, construídas de madeirapalhas denominadas palafitas adaptadas às cheias, que são resultados daengenhariadestesmesmosmoradores.

Figura9-ResidênciadeRaimundoVasconcelos(casatípicadaregião)

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Fonte:Oautor(2013).Nocotidianodestesmoradores,as formasde lidarcomomeioambiente

são aprendidas e compartilhadas muito cedo, se aprende fazendo e com origordedetalheselesconseguemfazerumaleiturabempeculiardoambientenatural. Estes expressam uma gama de conhecimentos ouvindo, sentindo einteragindocomomeioambiente.

Oaprendizadoé,sobretudo,umaformadedardinâmicaàvidadosgrupos.ParaCerteau(1995,p.142)"[...]paraquehajacultura,nãobastaserautordaspráticas sociais; éprecisoque essaspráticas sociais tenhamsignificadoparaaquelequeasrealiza".

Hámuitasformasdetransmissãodesaberesnestesespaços,aoralidadeéumdessesmecanismosquepermitemadisseminaçãodosconhecimentosquefluem com naturalidade no cotidiano, seja dos ciclos da natureza ou dapersonificaçãodascaracterísticastípicasdosmoradoresdevárzea.Atradiçãooralnosespaçosruraispossibilitaaincorporaçãodefatoresculturaisdeumaordem social empírica sensorial e perceptiva, Certeau (2001, p. 263-264)acrescentaque:

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[...]Noutraspalavras,somenteumamemóriaculturaladquiridadeouvido,

por tradição oral, permite e enriquece aos poucos as estratégias deinterrogação semântica cujas expectativas a decifração de um texto afina,precisa,corrige.Desdealeituradacriançaatéadocientista,elaéprecedidaepossibilitadapelacomunicaçãooral,inumerável‘autoridade’queostextosnãocitamquasenunca.

As análises de Certeau sobre o cotidiano, implicam numa concepção deideias, crenças e valores estão imersos na passividade dos poderes sociais.Mas os sujeitos nunca são neutros em suas conotações culturais, sempre háidealizaçõeseressignificaçõesdenovosinteresses.

Nomeioamazônicoasabedoria,aartedatradiçãooral,asestratégiasdesobrevivência são concepções poderosas de lutas e resistências na vidacotidiana.Sobreesteambientenatural,nasconcepçõesdeFraxe(2004,p.296):

[...] a cultura mantém sua expressão mais tradicional, mais ligada à

conservação dos valores decorrentes de sua história. A cultura estámergulhadanumambienteondepredominaatransmissãooralizada.Elarefletede forma predominante a relação do homem com a natureza e se apresentaimersa numa atmosfera em que o imaginário privilegia o sentido estéticodessarealidadecultural.Nessesentido,arelaçãodocabocloribeirinhocomaágua que atravessa seu cotidiano se torna de importância vital para acompreensãodessehomemedouniversoqueohabita.

A trajetória da história das comunidades é transmitida pela oralidade eganhamnovosaspectoscomointercâmbioentreoruralecidade,masdevidoas formas de adaptação e aprendizado com o meio, alguns elementos doconhecimentoruraldevárzeasósãopossíveisdeconhecerconvivendonestaorganizaçãoespacial.

Emboraascasasfiquemdispersasumadasoutras,masdiferentementedosespaços urbanos, as relações humanas de proximidade e afeto dosconhecimentos mútuos nas comunidades, essas afinidades das famílias sãocertamentemaisfortes,háumarelaçãodecumplicidadenocotidianodesuasrelações. Nos leva a pensar e problematizar sobre o sentido das relaçõessociaisnasmaisdiversassociedades.

As relações humanas mostram o diferencial nos espaços de lazer nostorneios de futebol de campo, é um fator que agregaumcomportamentodepertencimento de suas peculiaridades, enquanto universo intrínseco destes

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grupos.Compartilham elementos de sua cultura construídos àsmargens dosrios,furos,lagoseigarapés.

Viajar no barco ou canoa de uma família destes lugares até chegar nacomunidadeémuitomaisqueumsimplestransportecaracterísticodaregião,ésinônimo de conhecimento adquirido dos elementos corriqueiros docotidiano,contadosevivenciadospelosmaisvelhoseassimiladospelosmaisjovens, estes ouvem as histórias se divertem e aprendem com o ímpeto derespeitodashistóriaquemarcamodiaadiadacomunidade.

AntônioBarros(2013)contaahistóriadeseucompadreApolônioReis:Era uma tarde de domingo num torneio na comunidade e o compadre

Apolônio Reis que já é falecido foi bater um pênalti e, naquela época todomundojogavadescalçoentão,elesepreparoubemtomouumgrandeespaçoe,nahorapá,deuumchutenoprópriocalcanharquerasgouodedodelefoiumfatoqueassustoutodos,masdepoisquepassouojogosetransformouemumfatoengraçado(informaçãoverbal).42

Estaemuitasoutrashistóriassecaracterizamcomohistóriasdocotidiano,

são diversas facetas, com múltiplos detalhes e carregadas de significados.Assim, conviver durante dias com os moradores é mergulhar num rio deconhecimentos e compreender alguns fenômenos e a riqueza desses grupos,comoporexemplo,oprocessoeducativoconstruídosnodiaadianointeriordasrelaçõesdeparentesco.

Caracterizando o aprendizado, na hora do almoço todos devem estarvestidos, um homem não pode sentar à mesa sem camisa, é sinal dedesrespeito, bemcomoo lugar dopai e damãedas criançasnamesa, até opeixealgumaspartescomoacabeçaéumapartequesópodeserconsumidapelosmaisvelhos,éumfenômenosimbólicoderespeito,enfiméaconstruçãodevaloreseducacionaispresentesnocotidianodasfamíliasealgumasfamíliaspeloprocessodetradição,transmitemesseshábitosatravésdasgerações.

NachegadadeumvisitantenacasadePedroVasconcelos,percebiqueascrianças embora curiosas com a chegada dos visitantes, se mantinhamafastadas, mas não significa vergonha ou medo, é sinal de respeito, poissegundo Pedro Vasconcelos (2013), "[...] as criança não devem se meter naconversadosmaisvelhosesódevemveravisitaquechegououfalarcomelesseforemchamadas."(informaçãoverbal)43,écertamenteumaescoladavida

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ondeosvaloressemantémnopúlpito,cabeàs famíliasa transmissãodessesmodelosdesabereseducacionais.

Ocomportamentonosespaçosdofutebol,emboraseverifiqueaexcitação,masénotávelorespeitopelosmaisvelhosnasrelaçõessociais,ouseja,éumatodeeducação,cidadaniaealteridadequeseproduznointeriordasrelaçõesfamiliaresesecompletaexteriorizandonosencontrosdascomunidades,éumaconstruçãoinconscienteporsetratardosaspectosculturais,ouseja,atradiçãodascomunidades.Diantedestasconcepçõessobre"Acentralidadedacultura",Hall(1997,p.1)discorre:

[...]Porqueaculturaseencontranocentrode tantasdiscussõesedebates,

nopresentemomento?Emcertosentido,aculturasemprefoi importante.Asciências humanas e sociais há muito reconhecem isso. Nas humanidades, oestudodaslinguagens,aliteratura,asartes,asideiasfilosóficas,ossistemasdecrençamorais e religiosos, constituíram o conteúdo fundamental, embora aideiadeque tudo issocompusesseumconjuntodiferenciadode significadosuma cultura não foi uma ideia tão comum como poderíamos supor. Nasciênciassociais,emparticularnasociologia,oqueseconsideradiferenciadorda‘açãosocial’comoumcomportamentoqueédistintodaquelequeépartedaprogramaçãogenética, biológicaou instintiva éque ela requer e é relevanteparaosignificado.Ossereshumanossãoseresinterpretativos,instituidoresdesentido [...] toda ação social é ‘cultural’, que todas as práticas sociaisexpressam ou comunicam um significado e, neste sentido, são práticas designificação.

Apráticados elementosculturais se aplicanocotidianocontinuadamentenasaçõesdoinconscientecoletivo,ascondutasdoshabitantessãopermeadasde peculiaridades que às vezes se deparam com atos de preconceitos sobreestasdiferençasculturais.

Omododeviverdosmoradoresdevárzeas,emboradiferentedosespaçosurbanosmasnuncasãoestáticos,estestemumcontatocomculturasdiferentes,seja através da televisão e rádio ou de eventos esporádicos, das viagens àscidadespróximas,algunsmoradorespassamoperíododeenchenteemcidadesemuitosfilhosvãoparaascidadesestudaroensinomédio.

Compartilharomododevidaentrecidadeeosespaçosrurais,possibilitaagregarnovosvaloresdasmúltiplasexperiênciasefetichesnomododevidaurbano, mas no que tange às relações e processos sociais construídas no

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cotidianodasvárzeas,osembatesdoaspectoculturalganhaemdinamicidade.NaconcepçãodeCanclini(2007,p.41):

Aoconceituaraculturadestemodo,estamosdizendoqueaculturanãoé

apenasumconjuntodeobrasdearteoudelivrosemuitomenosumasomadeobjetos materiais carregados de signos e símbolos. A cultura apresenta-secomoprocessossociais,epartedadificuldadedefalardeladerivadofatodequeseproduz,circulaeseconsomenahistóriasocial[...].

A gama de aspectos simbólicos nesta rede de relações é sobretudo de

estranhezaaosespectadoresdeoutroscontextos,maséamanifestaçãodeumahistóriasocialvivenciadaedevaloressimbólicosconstruídosàanos.

Adentrarnosespaçosde lazer,épossívelcompreenderessas relações, sedeixando ir e vir no cotidiano dos banzeiros, nas cabeceiras dos rios, rindodascoisasengraçadaseaprendercomoosvaloressãotransmitidosatravésdasgerações. São práticas socioculturais que começammuito cedo na vida dascrianças,poisumdosprimeirospresentesadquiridosporesteségeralmenteuma bola, daí a força simbólica que o futebol representa na vida destescomunitários.

Écomumouvirnashistóriasdosjogadoresqueseuprimeiropresentefoiumabola,ouentreosmaishumildesquequandogarotosfaziamboladepapel,sacolaoupanocosturadoscomagulhademão,ouseja,aspossibilidadesdesetornarumíconenofutebol,relativamentedependedodesempenhoemcampoenãoénecessáriotermuitodinheirooubomdesempenhoacadêmico,esteéum dos fatores que levammuitos jovens às ditas "peladas" do dia a dia e agrandepopularidadedofutebolnosespaçosbrasileiros.

Ahistória de vida pessoal damaioria dos jogadores é exposta namídia,geralmente sãopessoasdeclassemenos favorecidas economicamente, e istofica no imaginário coletivo, atingindo diretamente os jovens que queremrapidamentebuscarmelhorarasuaqualidadedevida.

Ofutebolvemservircomomeiodeseexpressãoparaaquelesquequeremconhecer melhor estes espaços, a partir dele muitos podem expressar suaopinião.Podemos considerar que esta é umadas funções sociais do futebol,configurando-se mais que um jogo de futebol, há o complexo de relaçõessocioculturaisqueenvolvemascomunidadesondeesteédramatizado.

Vale ressaltar que embora no futebol possa representar um meio deexpressãosociocultural,convémdizer,comojámencionamosesteépermeado

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de regras já definidas, mas que não impedem que asmanifestações estejamacontecendo.

NaAmazônia como em outros lugares, em uma partida de futebol, seusatletassabemquedevemcontrolarseusmomentosdeódioouantipatiacontraseus competidores, uma vez que o autocontrole é uma das regras da práticadesportiva.

ParaDaMatta(1982,p.40),"[...]ofococentralatesedofutebolcomoumdramadavidasocial,comoummodoprivilegiadodesituarumconjuntodeproblemas socialmente significativos da sociedade brasileira [...]", é umaforma de representação social dos principais elementos para se analisar asquestõessocioculturais.

O universo de relações que se formam no cotidiano das populações devárzea sãoexpressõesdadinâmicacultural,que seconstituinocontextodosespaços amazônicos, onde é clássico saber que seu espaço territorial é degrandemagnitudeeconformeSilva(2010,p.106):

No sentido amplo, constituem-se como agrupamentos tipificados deacordo com as condições de organização espacial tradicional, e da feiçãogeopolíticanacionalcomcaracterísticasdiferentesedesiguaisdeintegraçãoena região, local configuradas como populações tradicionais, interioranas eurbanas.

Nolugardestapesquisa,aconfiguraçãonaocupaçãodoespaçoeomodo

devidadecadafamíliatemsempreumarelaçãocomosespaçosurbanos,sejano sentido econômico, quando algumas famílias comercializam algumproduto com a área urbana, como o queijo ou peixes e ainda, aqueles quevivem de aposentadorias ou pequenas diárias se serviços esporádicos noscamposdosseusvizinhos.

Osmoradoresdestemeiocompartilhamatividadesemcomum,taiscomo:pesca, pecuária, agricultura e os meios de transporte, enfim uma série deatividadesculturais.Aconvivêncianemsempreéharmônica,asdivergênciasem função dos interesses religiosos, políticos e econômicos são semprelatentes.NacompreensãodeSilva(2010,p.109),estareitera:

Embora sejam relevantes para comparar com a situação geral do país,

essesindicadoresdeixamdequantificaropesoqueelestêmnacomposiçãodarendafamiliarenaalimentação,aofertaderecursosnaturaisdesubsistência(pesca, fruto e caça) que influenciam os hábitos de vida da maior parte da

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população rural e ribeirinha, tornando menos graves as condições desobrevivênciadoqueasdaspopulaçõespobresdoscentrosurbanosdopaís.

A Amazônia se comparada às outras regiões do espaço brasileiro,

apresentagrandesperspectivasdeexploraçãodoseugrandepotencial,dadaadiversidadebiológicaqueseapresenta,masmuitaslutasprecisamsertravadasparaamelhoriadaqualidadedevidadessaspopulações.

Deve-selevaremconsideraçãoosseusfatoresgeomorfológicoscomo,asvárzeasquesãoinundadaseapopulaçãodiretamenteafetada.Énotávelqueasvárzeas não apareçam na agenda das políticas públicas, uma vez que ficamnumritmosazonalesobrevivendodasartimanhaseconhecimentosadquiridosaolongodosanos.

Nasenchentesasmarombassãoconstruídasepessoaseanimaisconvivemnosmesmosespaçosàesperadavazante,ocotidianoésobrecarregadodeféemseussantospadroeiroseoraçõesàDeusàesperademilagrespormelhorescondições de vida. Porém, não existe um planejamento em longo prazovisandominimizarosproblemasoriundosdasgrandesenchentesdosúltimosanos que assolamas várzeas daAmazônia e agravando a qualidade de vida,comoafirmaSilva(2010,p.110):

Uma progressiva pauperização atinge as populações humanas da

Amazônia,osindicadoressociaiseosíndicesdedesenvolvimentohumanosãobaixos, entre os mais baixos do Brasil [...] além disso, as fronteiraseconômicas abertas na Amazônia, ao desagregarem formas tradicionais desobrevivênciana floresta, inauguramas carências alimentares e as fomesnaregião. Há condição social dramática da miséria e abandono na realidadeamazonense.

As estratégias de sobrevivência das populações de várzea frente aosproblemas que surgem, dependem unicamente de iniciativas individuais dosmoradores, talvezsejapretensioso falar,masse tratamdeheróisque travamverdadeiras batalhas para sobrevivem às enchentes e vazantes dos riosamazônicos.

Umfatorpositivoéademonstraçãodestesmoradoresdeseustradicionaisconhecimentos, adquiridos nestesmesmos espaços no convívio efetivo comesta biodiversidade, sabendo driblar os empecilhos naturais e muitas vezesdependendode conhecimentos adquiridos as forçasnaturais lhesbeneficiam,

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porémemfunçãodosgrandesdesequilíbrioscausadospelasaçõesantrópicasasdificuldadessóaumentam.

OsociólogoFreitasPintoreconheceanecessidadedeencontrarmeiosdeimplementar eficazes intervenções numa ação compartilhada de sujeitosinternos e externos do meio amazônico. Certamente, há a necessidade deimplementaçãopolíticadedesenvolvimento,umapolíticacidadãqueaproveiteos saberes tradicionais numa articulação de homem versus natureza, bemcomomedidassocioambientaisnosespaçosamazônicos.Muitomaisqueumaarticulaçãonointuitodecumprircomasmetasedeveresconstitucionais,éoaproveitamento do potencial da sociobiodiversidade da Amazônia. ComoafirmaPinto(2006,p.242):

Desse vasto conhecimento que se produziu ao longo dos séculos e que

inclui desde a dimensãomágica e cosmológica até o uso diversificado paraalimentação, ornamentos corporais, ferramentas materiais de construção,medicamentosetc.apartirdeespéciesvegetaisedosanimais ligadosaessessistemasecológicos;épossívelconcluirqueessasflorestassetransformaramnabasedesustentaçãoecontinuidadedessassociedadesegruposhumanose,portanto,emvastoslaboratóriosemexperimentação.

É uma diversidade de saberes da complexidade material e imaterial no

cotidianodaspopulaçõeslocais,queoferecemumlegadodeconhecimentosepossibilidades na canalização desse modo de vida, mas precisam demanifestaçõesdavontadepolíticaeacadêmicaparaoexercíciodeprovimentosistemático destes espaços, visando trilhar para desenvolvimento daspotencialidadesdoBaixoAmazonas.

Nestesespaços,sevêumcapitalnaturalasertratadocomresponsabilidadedos estudiosos que tratam das políticas socioambientais, pois seria umaincoerênciaonãoaproveitamentodosconhecimentosadquiridosaolongodosanos,bemcomoumpercursocontrárionoquetangeaoquesedenominahojededesenvolvimentosustentável.

Afloramacadaritmodevazanteeenchentenovasformasdeselidarcomo ecossistema, em função das ações humanas, assim o aspecto social e oambiental são bens de um dado contexto local, assim ao se definir metas eaçõespráxissedevelevaremconsideraçãoosvaloresétnicoseculturais.NareflexãodePinto(2006,p.243):

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Atendênciaéqueasetnociênciasadquiramumaforçamaioràproporçãoqueosestudosantropológicos seampliemnasuniversidadesda região,poisafinalesseseriaunsdeseuscamposdeatuaçãoprioritários[...]revelando,deum lado, sua grande riqueza, e do outro, nossa grande ignorância eindiferençadiantedopatrimônioculturaldaAmazônia.

Opensadorvisualizaasperspectivasdoespaçoamazônicocomoumpalcode possibilidades, mas com as articulações do conhecimento científico e oconhecimento tradicional, é necessário estabelecer uma comunicaçãoadequadacomasociedadenointuitodeconstruçãodeumapolíticajustafrenteaoimpactosocioambiental,essescuidadossãonecessáriosparaminimizarospossíveis conflitos e variações ambientais. É neste contexto que buscamosregistrar os conhecimentos dos moradores, pesquisando nestes espaços asatividades socioculturais em torno do futebol, assim na missão decompreender a dimensão neste núcleo da pesquisa, fizemos alguns registrosetnográficosdascomunidadesde"NossaSenhoradeNazaréeHarmonia".

Foi possível observar e descrever rituais das expressões socioculturais,desdeomomentoemqueospaissepreparamparairàcomunidade,ondeascriançassevestemàmaneiradospais,ouseja,prontosparaoritualdofuteboleaesposaacompanhaomaridojuntoaosfilhos.

Seguem o trajeto à comunidade nas canoas com "motor rabeta", ondequalquer membro da família tem a habilidade de dirigir aquele meio detransporte, perfilados nos bancos, com seus animais de estimação e até achegada na comunidade é um momento de encontro das famílias, doscompadrios,asbênçãoscomosinalderespeitopelostios,padrinhoseavós.

Duranteosjogoscadaobservadortemsuaopinião,poderíamosdizerquesão técnicos à sua maneira, as discussões são inacabadas, surgem as maisdiversas polêmicas permeadas de emoções, assim seja o resultado do jogopositivo ou negativo, há sempre uma diversidade de justificativas atribuídasaosresultadosdaspartidas.

Nocontextodascomunidades,essesencontroseconvíviomuitofrequentenos finais de semana, se constituem o momento de expressar osacontecimentos, de compartilhar das novidades semanais, são eventuaisencontrosemtornodofutebolcomoveículodemanifestaçõesdasvivências.

Afloram aspetos além do fenômeno esportivo que ocorrem nascomunidades, DaMatta (1982, p. 21) sobre "O Universo do Futebol" opensador: "[...] chama a atenção para relações, valores, ideologias que, de

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outro modo, não poderiam estar devidamente isolados dos motivos queformamoconjuntodavidadiária[...]".

Emtornodofutebolsereúneumasériedeatividadessocioculturais,ondeos temas das discussões são bem diversificados, é o queDaMatta chama de"dramatizaçãoqueofutebolpermiterealizar".Transcendealémdesteaspectoapossibilidade de análise, leitura e uma reflexão das manifestaçõessocioculturaisnaAmazônia.

Alguns aspectos da vida diária que podemos anotar dentre eles: alinguagem, a expressão corporal, o parentesco, as relações de afetividade,enfim uma riqueza inesgotável de possibilidades de interpretações eproblemáticasquepermitemumasériedeanálises.

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CAPÍTULOIII:CAMINHOSTRILHADOSPELOFUTEBOL

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3.1Ofutebolnogênerofeminino

Essapráxiscriadoraedesingularidadedoethoshumanotornaasmulheres

construtorasdahistória.Momento síntesede suaobjetivação ehominização.Elastransformamanaturezanumprocessoimaginativodecriaçãoerecriaçãodesimesmas,exteriorizando-separaomundo.

IraíldesC.TorresAtravés do fenômeno esportivo este estudo visa a compreensão das

relações de gêneros nos espaços do futebol como lugar propício noentendimento das manifestações socioculturais, nos levando a uma análisealém dos fatores biológicos, mas sobretudo fatores sócio históricos quecaracterizamessapráticanocontextodocotidianodascomunidadesdevárzea.

Ogênerofemininoexerceumpapelcrucialnoentendimentodasrelaçõesintrínsecasnaestruturaçãodaspráticasdelazerdascomunidadesrurais,umavez que o futebol está diretamente relacionado como a principal atividadesócioeducacionalnosintervalosdasaulasnascomunidades,sendoasmãesaspessoas que mais acompanham a educação dos filhos. Sendo assim,indiretamentepercebemanecessidadedapráticadofutebolcomoummeionaformaçãoeducacionaldeseusfilhos.

Visto sobre a ótica das relações dos gêneros, os espaços do futebolpossibilitam fazer uma leitura da complexidade das manifestaçõessocioculturais nos contextos rurais que explicitam a comunicação e condutadosvaloresquenorteiamoimaginárionomeioamazônico.

Nestesespaçosaaproximaçãodapráticadojogodebolapelasmulheressedáinicialmentenadimensãoeducacional,masemfunçãodojogodevaloresde todo o processo histórico social, o preconceito figura no centro dasrelações, a disputa entre os sexos e o discurso ainda se evidenciam na"habilidadedohomemforteemdetrimentodamulhertidaestereotipadacomofracaesutil"(grifonosso).

Osvaloressocioculturaispresentesnestescontextosruraissãoconstruídosdelongaduraçãoporumaideologiamachista,essasconstruçõessimbólicasse

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evidenciamnos espaços do futebolmasculinizado,mas o não sexismo é umdiscursoatualdapráticapedagógica.

Os docentes desenvolvem transposições didático pedagógicas,equacionando a valorização e igualdade dos gêneros, é certamente umexercício de consciência crítica e cidadã que se desenvolve nos contextosescolares.

Aparticipaçãodasmulheresnosespaçosdefutebolemrelaçãoaoshomenssempre foi um aspecto de segregação, uma vez que historicamente osargumentos construídos sempre foram de valorização dos homens emdetrimento das mulheres, a sociedade supostamente afirmava ser umadiferençanaturaleolugarreservadoàsmulhereseraade"protetoradolar",mas hoje esses discursos que foram construídos contexto das relações degênerotemapresentadomudançassignificativas.

No período histórico do patriarcal ou paternalismo44 a centralização dopoder figurava nos homens onde as mulheres eram submissas e merascoadjuvantes. Como forma de manutenção do poder os papéis no contextosocialerambemdefinidos.Porémasrelaçõessociaisforamsetransformandoeganhandonovossignificados.

Para Torres (2009, p. 73) "[...] existem claves que tomam rumosdiferenciados, assim como existem espíritos capazes de atos de grandeza,fervoreserupturasnocursodesuasvidas".Novaspráticasdemanutençãodepoderforamseconstruindocomaparticipaçãodosmovimentosfeministas.

RinaraNívea(2013)afirma:Se nós mulheres não buscarmos melhorar a nossa qualidade de vida

sempreestaremosàmercêdomaridoe,acreditoquehojecomosprogramaseducacionais que chegam nestas áreas é possível termos um espaço ou umnovo rumoemnossasvidas.O fato é quenãopodemosnos acostumar comessa submissão, temos é que pensar que com essamelhoria será importantepara nós enquanto mulheres e, ao mesmo tempo teremos meios de comomanterepensarofuturodenossosfilhos(informaçãoverbal).45

Este relato da entrevistada nos enalteceu enquanto pesquisador, uma vez

quefoiumdiálogocarregadodeemoçõeseemcunhodedesabafo,enfimumdosexemplosquedefinebemocotidianodasmulheres,ondeestamostrasuasangústiasedesejosdeconstruirumfuturomelhorapartirdesuasconquistaspessoais,vislumbrandoseremreconhecidassocialmente.

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Um fator preponderante nas comunidades pesquisadas é o grau deescolaridadedamaioriadasmulheres,quetemsomenteoensinofundamentalequandodecidemirparaascidadesàprocurademelhorescondiçõesdevida,percebemquedevidoàescolaridadeécrucialnosempregos.

Otrabalhodomésticoéumadasalternativasemquesãoapresentadasnascidadesàquelescombaixaescolaridade.Neste sentidoTorres (2005,p.158)afirma: "[...] aquelas que se ocupam desse tipo de trabalho geralmente sãomulheres que possuem menor escolaridade e praticamente sem qualquerexperiênciaprofissionalnomercadodetrabalho".

Asexpectativasemtornodemobilidadeeperspectivasdemudançadevidaacabam provocando outros agravantes sociais, tais como, o desemprego eviolênciacontramulher,masparamuitascomoRinaraNívea(2013):"[...]sairdainvisibilidadejáéumagrandevitória."(informaçãoverbal)46.Ainteraçãoentre as mulheres oriundas das várzeas para as cidades oportunizam novasformasdeorganizaçãosocial.

É, certamente um ganho de cunho social e político, a questão daconsciênciadopapeldamulherintrínseconestesrelatos,emboraamaioriadasmulheres não percebam a sua condição de submissão,mas esta com tomdeliberdade,deixa transpareceremseusreladosasconquistaseducacionaisquepossibilitamquebrarparadigmassocioculturais.

RinaraNívea(2013)afirma:Umexemplodonãoreconhecimentodenossotrabalhoéquandopegamos

o motor rabeta para ir à comunidade e os que passam ficam comentandoquandoéumamulherdirigindomas,seéohomeméalgonormal[...]opiordetudoéqueasprópriasmulheressãoasquemaisfalam(informaçãoverbal).47

Asituaçãoquecompreendemospelosrelatos,sãoasrelaçõesdepoderque

estãosobrecarregadasdeumasituaçãosimbólicahistoricamenteconstruídos.Os homens se aproveitamdesta situação,mas se faz necessário um trabalhosócio histórico no qual os gêneros reconheçamo papel do outro frente aosabusosexistente.ParaTorres(2002,p.131-132):

O Estado brasileiro sempre enfrentou a questão a pobreza de forma

casuística,descontínua,semefetividadeesemplanejamento[...]umaformadedependência, apadrinhamento e clientelismo. Muitas vezes, os usuários das

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instituiçõesdebem-estarnãosereconhecemcomosujeitosdessarelação,mascomoserespassivoseincapazesdiantedasociedade.

Nos espaços urbanos esse casuísmo e clientelismo e visto em algumas

iniciativaspontuaisporpartedemulheresdeprefeitosqueexecutamtrabalhosdecunhosocial,masvisamfavorecimentosdopoderpúblico.

ParaTorres(2002,p.22)"[...]oEstadoseeximedesuaresponsabilidadeeda sua função da intervenção na chamada 'questão social', transferindo essaresponsabilidadeparaaprópriasociedadesobadireçãodasprimeiras-damas".

Ésabidoqueessaéumaquestãocultural,construídahistoricamenteondecabeàsmulherestrataremdasquestõessociaiseopoderpúblicoseapropriadas mazelas sociais sobre o pretexto de bem-estar se eximindo de suasresponsabilidadespúblicas.

Tertulina Souza (2013) relata: "[...] no passado os pais já definiam ostrabalhosqueeramdemulhereseosdehomensenacomunidadehojejásevêmulheresjogandobola,mulheresdirigindocomunidades,ascoisasmudarammuito." (informação verbal)48. Diante deste relato se percebe que essespoderesjáseconstruíamnosseiosfamiliaresesefazempresentes.ParaPerrot(2008,p.150)"[...]asmulheres,precisamdeumespaçodesolidariedade,desociabilidade,deaberturaparaomundoedetomadaderesponsabilidades".

É preciso iniciativas de cunho institucional e ordenamento constitucionalsistematizado para os casos de Assistência Social, onde o Estado se utilizadestes trabalhos como um fim político de favorecimento à máquinaadministrativa em detrimento da população, é um serviço de direitoconstitucionalmenteadquirido.Torres (2005,p.105)afirma:"[...]é fictíciaeencontra significação no mundo imaginário e não nas estruturas dassociedades".

Neste aspecto de análise, os espaços de sociabilidade como é o caso dofutebol,servecomoumlugarpropíciodeintercâmbiodasrelaçõessimbólicasnaconstruçãoderedesdecidadania.

NaperspectivadeTorres(2011,p.1):Verificamosqueasrelaçõessociaissãotranspassadaspelotrabalhoepor

umaredesimbólicadesinaisesignificados.Mulheresehomenspautamsuasrelações com os elementais terra, floresta e rios com respeito e reverência,estabelecendo um pacto de preservação do ambiente natural em face danaturezadadivosa.

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Asrelaçõescotidianasresultantesdasatividadeslaboriosasconstituem-sea

organizaçãodavidafamiliar,dentreoutrasquestões,ondeosgênerosexercempapéisquesecompletamnamanutençãodafamília.NasconcepçõesdeTorres(2005,p.154),"[...]osignificadosocialdasatividadesdamulherébemmaisdiversificadoeparticipantedoquegeralmentepossamossupor".

Na comunidade pesquisada as mulheres desenvolvem atividades nasplantações,nacriaçãodegado,nocuidadodolar,sãopessoasquefazemparteintegralmentedoprocessoprodutivo.SegundoTorres(2005,p.148),"[...]sãoelas que se ocupam da limpeza do campo sob a técnica da capinação e dacoivara,queconsistenaqueimadadomatagalretiradoparaadubarehidrataraterraparaoplantio".

É uma atividade pesada que compõe o cotidiano das mulheres, mesmoassim, ao chegar em casa cuidam de seus filhos e de todos afazeresdomésticos,esteéumpapelvistonestesespaçosdeformaestereotipada,queseguenopúlpitodosvaloressimbólicosnocotidianodasrelaçõesdegêneros,emboraemalgunsambientes já seconfiguramumanova formadepensaropapeldamulher.JaciraVasconcelos(2013)afirma:

[...] Já éumcostumenosso aqui, acordar cedo, fazero café e cuidardas

crianças,dosbalcões,dasroupas,dosanimaisdomésticos,dalimpezadacasaedoalmoço[...]ásvezesoshomensajudamajuntaroestrumeparafazerashortas[...]masinfelizmenteamaioriadoshomensnãoachamqueétrabalho,graçasaDeusomeumaridoreconheceoqueeufaço,mastemunsqueaindachegambrigando(informaçãoverbal).49

Nestes relatos se percebe o número de atividades desenvolvidas pelasmulheres,bemcomo,arevelaçãodequepoucotemporestaàsmulheresparaodescanso,umavezqueajornadaéintensa,amesmaafirmaaindaafaltadoreconhecimentodeseutrabalho.SegundoTorres(2011,p.10):

Asmulheresfalamaomundo,comunicamsuasexistênciasatravésdoseu

trabalho.Nãoéoaspectodareproduçãohumanaquefundaacondiçãodeserhistóricoesocialdasmulheres,sãoassuaspráticassociaisdecorrentesdoseutrabalho.Cabeàsciências,reconheceremoaspectoprodutivodotrabalhodasmulheres.

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Acomunicaçãodaexistênciadeseustrabalhosepapéisqueassumemnascomunidadesruraiséperceptívelquandosevêquecabeaestasaorganizaçãode eventos sociais, onde os homens confirmam a necessidade dasmulheresorganizarem as ações da comunidade, assim se fortalecem a condiçãopaternalista,ondeumfalaeooutroobedece.

As discussões em torno do trabalho nas sociedades atuais colocam amulher no centro destes debates, a cada dia a mídia vem dando maisvisibilidade a estas questões, nos espaços das comunidades rurais é possívelidentificar discursos resultantes destes debates,mas são expressõespequenasdiantedoimensomapeamentopopulacional.

Foucaultdiscuteasrelaçõesdepodertravadasnocotidianoentremulheresehomens,osquaisestedenominade"feixederelações",estevaiexplorarasmúltiplasdireçõesdepoderesuasresistências.

Nos espaços de futebol essas relações de poder configuradashistoricamente por "estruturas de dominação" começam a mostrar suasfragilidades,umavezqueaculturaédinâmicaeasinformaçõescirculamcommaior velocidade. Algumas das mulheres das comunidades pesquisadasafirmamemseusdiscursosqueseusmaridosestãomais flexíveis,masessasflexibilidades são ínfimas diante da realidade apresentada nesses espaços,JaciraVasconcelos(2013)afirma:

Agoraporaquinóstemosmaismeiosdecomunicação,antigamenteerasó

orádioagora temosa televisão,essesprogramasnosensinammuitascoisasboaseruinseachoqueéporissoqueascoisasemnossoambientefamiliarestãomudando(informaçãoverbal).50

Emnossa compreensão o poder produzmudanças à adequação de novas

situaçõesdarealidadesóciohistóricanasatividadeshumanaseseapresentamemnovoscontextos apartir de conhecimentos adquiridos.NodizerdeElias(1993,p.193-194):

[...] o controle efetuado através de terceiras pessoas é convertido, sob

váriosaspectos,emautocontrole,queasatividadeshumanasmaisanimalescassão progressivamente excluídas do palco da vida comunal e investidas desentimentosdevergonha,quearegulaçãodetodavidainstintivaeafetivaporum firme autocontrole se torna cada vez mais estável, uniforme egeneralizada.

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Asmudançasocorridasdopontodevistadogênerofemininoapartirdenovas configurações sociais têm provocado condutas comportamentais decunho individual e coletivo, seja nos espaçosdasmodalidades esportivas ounasmaisdiversasáreasdoconhecimento.

Entre essas novas formas ou modalidades está o futebol que Eliasdenominoudeefeitocatártico51,devidoàssuaspropriedadesdepossibilitaraliberaçãodeemoçõesetensõesprovenientesdostressdasatividadesdiárias,éumaatividadequenãoameaçaaordemsocialdosgrupos,porserumapráticadelazercontroladaemfunçãodesuasregrasestabelecidas.

Na sociedade contemporânea, devido às mudanças aceleradas ocorridascom o impacto das tecnologias da informação determinam novasconfiguraçõessocioculturais.ParaElias(1994,p.159),porexemplo,"[...]asnormasmudamcomasrelaçõesdepoder[...]",nessesentidoodireitoaolazerfemininoeaspossibilidadesdecidadaniasocialficammaisevidentes.

O futebol do gênero feminino nas comunidades pesquisadas são eventosqueocorremcomaparticipaçãodasmulherescomotorcedorasdostimesdosfilhos,dosespososedosamigos.AquitranscorreoqueFoucaultdenominoude"teiadepoderes",cabendoàsmulheresopapeldecoadjuvantesnaspartidasdefutebolondeahierarquiaseconstruiuapartirdocorposexuado.

Duranteopercursodestapesquisa,observeiqueamaioriadostorneiosdefutebol,aindasãoreservadosaoshomensnopalcodosacontecimentoseemnossas ponderações, podemos inferir que a participação das mulheres estánumprocessodeconstruçãodeseusespaços,emboranãosejamasatrizesnopalcodofutebol,asexpectativasporpartedoshomenssãonegativas,comoseobservanosrelatosdeVivaldoReis(2013):

Os torneios de futebol entre as comunidades sempre existiram,mas nós

temos dificuldades de organizar um evento e principalmente quando amulheradaquer jogar, ficamaisdifícilporque temmaisgastosemuitosnãocolaboramparacustearasdespesas(informaçãoverbal).52

Estáéumaafirmaçãodemuitoscomunitáriosevemconfirmarefortalecer

a questão dos poderes das estruturas paternalistas presentes no interior dasrelações destes contextos. Indicam acima de tudo a concepção moral doshomensmarcadosporumprocessohistóricoqueaindafiguranossosespaçosnaconstruçãosociocultural.

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DeacordocomDunning(1992,p.390),o"[...]desporto,tradicionalmenteéumadasmaisimportantesáreasreservadasmasculinaseporessemotivodepotencial importância para o funcionamento de estruturas patriarcais". Estessãoosmecanismosdepoderquefiguramnocotidianoepermitemopapeldecoadjuvantes àsmulheres.Neste início de século asmulheres tem adquiridosucesso não só no futebol encantando omundo,mas em diversas atividadesdesportivasemuitoschegamadizerqueasmulheres"temmaisgarra",masnossacompreensãoéaequidadeentreospapéisenãoasupremacia.

As próprias mulheres das comunidades fortalecem os discursosestereotipados,amaioriadessasmulheresprefereficaremcasacuidandodascriançasouevitamiraostorneiosnasoutrascomunidadesparaevitargastos.Hánessepensamentoaafirmaçãodequeasprópriasmulheresfortalecemosdiscursospaternalistas.

Osdiscursosfuncionamcomoumaespéciedeafirmaçãodavirilidadeedopapel natural predestinado às mulheres à inferioridade. Segundo Bourdieu(2010, p. 67), "[...] a virilidade é uma noção eminentemente relacional,construídadiantedosoutroshomensecontraafeminilidade,porumaespéciedemedodofeminino,econstruída,primeiramente,dentrodesimesmo".

É possível observar no contexto dos jogos de futebol a satisfação dasmulheres cuidando das crianças para que o marido se divirta, sentem-sesatisfeitas ao ver na expressão dos maridos, ou seja, eles representam odomíniodamasculinidadesobreocorpofeminino.

A expressão representada pelamulher configura-se como a continuidadedasupremaciadeumgênerosobreooutro,contrariandoosdiscursosdeumasociedade livre e igual. As mulheres são "acorrentadas" por sistema depensamentoconstruídose representadosnosmaisdiversosespaços.SegundoBeauvoir(1980,p.489):

Quanto tempo e forças desperdiça para liquidar, sublimar, transferircomplexos, falando dasmulheres, seduzindo-as, temendo-as! Libertá-lo-iam,libertando-as.Mas é precisamente o que receia.Obstina-se nasmistificaçõesdestinadasamanteramulheracorrentada.

Noconjuntodasrelaçõesedesigualdadessociaisentrehomensemulheres,

os discursos da desigualdade continuam se perpetuando e legitimado pelospoderes contemporâneos que lhes atribuem denominações damulher frágil,assimcolocaasmulheresnumestadodeinsegurançaoudependênciacorporal,

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estes discursos da dominação masculina se reproduzem principalmente nocontextodasfamílias.

Na contemporaneidade, as atividades socioculturais como o futebol, sãoespaços onde se revelam a força dos gêneros no que tange às conquistas,sejam estas de cunho erudito ou das habilidades físicas, ou seja, não são osaspectos biológicos que determinam as atividades sociais como no passado,masdependeunicamentedesuasatividadesdesenvolvidasnocontextosocial.

SegundoasconcepçõesdeBourdieu(2010,p.45):[...] a representação androcêntrica da reprodução biológica e da

reproduçãosocialsevêinvestidadaobjetividadedosensocomum,vistocomosenso prático, dóxico, sobre o sentido das práticas. E as próprias mulheresaplicamatodaarealidadee,particularmente,àsrelaçõesdepoderemqueseveemenvolvidas, esquemasdepensamentoquesãoprodutoda incorporaçãodessas relações de poder e que se expressam nas oposições fundantes daordemsimbólica.

NestaanáliseasconcepçõesdehabitusàluzdacompreensãodeBourdieuvem à tona, considerando que as mulheres colaboradoras desta pesquisa,evidenciam em seus discursos palavras do tipo, "estamos acostumadas","sempre foiassim","amulherdeve respeitaromarido".NestaconcepçãodepensamentoBourdieu(2010,p.82)confirma"[...]adominaçãomasculina,queconstitui asmulherescomoobjetos simbólicos [...] temporefeitocolocá-lasem permanente estado de insegurança corporal, ou melhor, de dependênciasimbólica".

A instituição família perpetuou a "fragilidade" feminina, orquestradasnumasintoniasocioculturaldestarelaçãodesubmissãoserumacoisanatural,masnasúltimasdécadasosmovimentosfeministastemtravadolutasnointuitodealcançarumarelaçãosaudávelnesseequilíbriodasforçasnasfamílias.

Asmulheres hoje se inserem nasmais diversas situações socioculturais,buscando alternativas aos problemas do cotidiano onde tem se mostradoinovadoras nas atividades desenvolvidas, o jogo de bola se configura comoumadessasatividades.

É crucial levantarmos a questão das inovações e capacidade criativa dasmulheres, se mostram cada vez mais eficazes no desenvolvimento de suasatividades, uma vez que muitos teóricos mencionam o reconhecimento dasmulheres em igualdade entre os homens, mas este fato destaca certa"superioridade dos gêneros". Enfim, é necessário sugerir aspectos

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socioculturais da afirmação feminina e não a utilização do referencialmasculino.

O gênero feminino nos mais diversos espaços socioculturais ocupamnotoriedade, mas devido as contradições e conflitos de um sistema dedominação masculina, estas ficam relegadas nos parâmetros masculinos desociedade.

É necessário rever as conquistas do gênero feminino, os seus papéis nasociedade, e assim traçar novasdiretrizesparaummovimento feminista e oidealdesociedadedeumEstadodemocráticodedireito.

As relações sociais dos gêneros têm se apresentado em estado dedesigualdade através das diversas gerações, apesar das transformaçõesocorridasnestesúltimosanos,osmodelospatriarcais tendema semanter sereestruturando nos diversos espaços sociais, logo, é necessário repensarnossosvaloreseaconstruçãodossaberesnosdiversosespaços.

O desenvolvimento sociocultural é algo que deve ser pensado à luz dosgêneros uma vez que a dominação do gênero masculino é visível e nosespaçosdestapesquisaestefatoréevidenteeseperpetuaumcomportamentode relação de poder corporal.Em“Vigiar ePunir”, Foucault (1993, p. 125)destacaque:

[...]duranteaépocaclássica,umadescobertadocorpocomoobjetoealvo

de poder. Encontraríamos facilmente sinais dessa grande atenção dedicadaentãoaocorpoquesemanipula,semodelasetornahábiloucujasformassemultiplicam.

As construções desses comportamentos nas práticas socioculturais dos

gêneros estão atreladas a todo um processo sócio-histórico no que tange àformação das instituições, tais como: igreja, família e a escola. Nestasinstituiçõesseconcretizaaestruturadaspráticasdesportivas,umavezquesãolugares de sociabilidades e, assim constituem-se em modelos de práticassocioculturais.

Asinstituiçõesdãolegitimidadeàfuncionalidadedestespoderesapartirdoexercíciode suas ideologias, numprocessode sociabilidadedas relaçõesdegênero,ondeasmulheresseencontramsubmissasnessespapéis,massesabequehojeessasfronteirasdedesigualdadescomeçamaseromper,eassimestasbuscamabrirnovoscaminhosemsuasmanifestações.

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No palco do futebol neste início de século, o gênero feminino vemaderindo ao futebol, inclusive o bom desempenho da seleção feminina defutebol, possibilitando fomentar discussões sobre o papel das mulheres naspolíticas esportistas, assim paulatinamente as características paternalistasobservadasnasrelaçõesdegênerovãoaospoucossendodesconstruídas.

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3.2Ofutebolinfantil,sub17esub20

Em nossa análise nos propomos compreender os significados dascategorias infantis, sub 17 e sub 20 que vem se caracterizando comoconquistasacercadapráticadofutebol,nessesespaçosdesociabilidades.Nesteinício de século, as categorias têm propiciado cada vezmais pesquisas porpartedeestudiososdoassuntoealcançamcadavezmaisnotoriedadeeposiçãodedestaque,nocenáriosocioculturaldosespaçosbrasileiros.

Aparticipaçãodestascategoriasemnossasanálisespermite-nosumolharnas relações no cotidiano das áreas pesquisadas, no intuito de compreendercomoestascategoriassãoinseridasnoscontextosesportivosdascomunidades.AldenirReisVilaça(2013)relata:

Aqui em nossa comunidade as crianças nos acompanham e na hora dos

jogosdosadultoselasimprovisamtravesnafrentedacomunidadeebrincamde jogarbolaaté ahorade irpracasacomagente [...] aquiquemnão jogacom os adultos no campo grande é, porque ainda não aguentam então nãoexistecategoria[...]aquiépelotamanhoedisposição[...]asmulherestambémjogammastambémseparadasumavezououtra[...](informaçãoverbal).53

Aldenir Vilaça (2013) faz uma tessitura de como são caracterizadas ascategoriasinfantis,sub17esub20nosespaçosdascomunidadesrurais,ondeo acesso ao futebol por estes se dá pela vontade individual daqueles quedesejampraticarojogodebola.

É um universo espacial, diferente dos contextos urbanos, não existemescolinhasde futebolnestesespaços,mas simplesmenteoaprendizadocomoaspecto da tradição cultural, onde os filhos adotam as práticas de lazer dosagrupamentossociaisaqualestãoinseridos.

A fluência do futebol se dá por iniciativa de alguns particulares,mas háperspectivas de intervenções por parte dopoder público a partir de projetosdas secretarias municipais de educação, onde são inseridos nas propostaspedagógicasdeensino.

A disciplina escolar Educação Física, tem propiciado resultados nosespaços escolares, seja na prática de exercícios corporais ou no sentido de

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buscarummeiodemotivarosestudantesaestaremnaescola,enfimapráticanas atividades esportivas vem se tornando um mecanismo que possibilitadiminuiraevasãoescolar.

Nos espaços das cidades há grande interesse por "escolinhas" de futebolinfantil e adolescentes, que identificam possíveis craques ou novos talentos,visam formar indivíduos na utilização de todas as suas potencialidadesenquantorendimentoevalordemarcadoevemevolvendopessoasquetemsereveladoporessapráticanosentidoprofissionalizante.

Essas modalidades são comumente denominadas categorias de base, asquais são cruciais aos grandes clubes, que buscam nos atletas meios deutilizaçãodetodooseupotencialfísicoeintelecto,ouseja,todoorendimentopossível atrelado às tecnologias existentes na melhoria do desempenho doatleta.

Abusca incessante pelo alto rendimento, como efeito damercantilizaçãodos atletas do futebol, impede que a prática desportiva se caracterize comouma atividade demanifestação sociocultural se levarmos em consideração anossasociedadecapitalistacaracterizadapeloindividualismo.

Na área pesquisada essa preocupação com o alto rendimento individualnãoexiste,oespíritocoletivoépresente,umavezqueoslaçosdeparentescossão evidentes. Trata-se de uma área de várzea onde a composição de umaequipejáéumadasdificuldadesevidenciadas,segundoJoaquimAlexandrino(2013):

‘Muitas vezes nós contamos com aqueles que vêm de outros lugares e

mesmodascidadesquecompõeaequipe’,massegundoestecolaborador, ‘énecessáriocolocaressajuventudedesdeinícioparaaprenderemcomoédentrodecampo’(informaçãoverbal).54

Ascriançase jovens iniciamdesdecedoapráticado jogodebolanuma

relação de parentesco, mas é nos espaços do futebol de campo dascomunidades e acompanhadas pelas famílias que aprendem a relação dofutebolcomopráticadesportiva,regidaporregraspróprias.

Talvez seja pela relação de parentesco, a explicação das relações sociaisnestes lugares serem bem mais próximas, nesse entendimento é possívelcompreenderqueofutebolcumprecomumafunçãosociocultural,hajavistaque cria possibilidades de inserção das crianças e adolescentes no cotidianodosmoradores.

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Épossívelidentificararepresentatividadedojogobolanoimagináriodascrianças, que buscam se divertir, mas permeia nesse fenômeno associabilidades.Torna-seumapráticauniversalentreeles,funcionacomomeiodemanifestação,daíummeioexequívelcomoelementoparaacompreensãodacomplexidadedavidadestecontexto.

Talvezestasponderaçõesobservações,expliquemasfalasondeopovodizque"todobrasileirojánascesabendojogarbola",assimseexplicaqueatravésdofutebolasmanifestaçõessocioculturaisganhamsignificadosdesdeatenrainfâncianavidadobrasileiro.

Setornarumgrandecraque,ganharfamaedinheirotemmotivadomuitosjovens a buscar os campos de futebol desde cedo, assim se torna um fatorintrínseco na mentalidade dos jovens brasileiros, estes veem no futebol apossibilidadedeumavidadesucessoeglória.ParaDaMatta(1982,p.27):

Creio que é por possibilitar essa dialética de individualização ecoletivização,queofutebolpermitenocasobrasileiro,oimportanteconflitoentre ‘destino’ impessoal e vontade individual. Sendo assim, são muitos osjogosdefutebolque,noBrasilpermitemsua‘leitura’enquantoparadigmasdeumcombateentreasforçascoletivaseimpessoais(dodestino)easvontadesindividuaisquebuscamescapardociclodaderrotaedapobreza.

Ashistóriasdecraquesqueconseguirama façanhadechegarno topoda

fama oriundos de realidades socioculturais carentes como Ronaldinho,Neymar, Ronaldo (fenômeno), Robinho, são alguns exemplos, motivammilhões de crianças e jovens a traçar a mesma trajetória, ou seja, háantecipadamente aos treinosum imaginárionamentalidade coletivaquevisafavoreceressabuscaincessanteempraticarofuteboleseconfigurandocomoreflexodomercadocapitalista.ConformeDaMatta(1994,p.11):

[...] atividade destinada a redimir e modernizar o corpo pelo exercício

físicoepelacompetição,dando-lheahigideznecessáriaà sua sobrevivêncianum admirávelmundo novo, nesse universo governado pelomercado, peloindividualismoepelaindustrialização.

Emfunçãodamundialização,osclubesbrasileirosbuscamavalorizaçãodeseuscraquescomoformademostraro"futebolarte",assimevidenciamaespetacularização e marketing através da mídia, para as negociações doscraqueseprincipalmenteaquelesrecém-saídosdascategoriasdebase.

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Ofutebolpor serum fenômenodemassa, chega influenciandonosmaisdiversos lugares do espaço brasileiro, independente do espaço escolar oucategorias de base, a ideia de se tornar um craque de bola permeia oimagináriodecrianças, jovenseadolescentes,masháproblemassociaisdasmaisdiversasordens,comobemreiteraDaMatta(1982,p.107):

[...] Há outro jogo que se passa na vida real, jogado pela populaçãobrasileira,nasuaconstantebuscademudançaparaseudestino.Eumterceirojogojogadono‘outromundo’,ondeentidadessãochamadasparainfluenciarnoeventoeassimfazendo,promovertransformaçõesnasdiferentesposiçõessociais envolvidas no evento esportivo. Tudo isso revela como uma dadainstituição,nocasooFootballAssociation,inventadopelosingleses,podeserdiferencialmenteapropriada.

PodemosinferircombasenestespressupostosdeDaMattaqueofutebolé

um dos meios de compreensão dos problemas socioculturais de nossosespaços,acadadiapovoaosentimentoeoimagináriodosgênerosmasculinoefeminino,bemcomodopúblicoinfantil.

ApopularizaçãodofutebolnoBrasil,noslevaainferirnacrençadequenoBrasilosgarotos jánascemcomhabilidadespara jogar futebol.Partindodessapremissamíticadotalentoinatoaojogador,asopiniõessedivergememtorno dessa questão. Em entrevista ao JornalNacional, dia 21 de janeiro de1999,EdsonArantesdoNascimento (Pelé), consideradopormuitoscomoomaior jogadorde futebol domundo, declarouque "futebol não se aprende",reforçando a crença que já se nasce no Brasil sabendo jogar futebol(SCAGLIA,1999,p.35).

ParaReinaldoVasconcelos(2013)"[...]osjovensaprendemdesdecedoasregrasdojogoeasuafunçãotáticadentrodocampo."(informaçãoverbal)55,neste relato, podemos compreender nestas redes de sociabilidades a ideia depoder intrínseco sobre os corpos numa questão de "disciplinarização" dasregras do futebol, bem como da manipulação do corpo para a prática dofutebol.

ParaFoucault(1993,p.127):"[...]opoderdocorpo;fazdeleporumladoumaaptidão,umacapacidadequeelaprocuraaumentar;e inverterporoutroladoaenergia,apotênciaquepoderiaresultardissoefazdelaumarelaçãodesujeiçãoestrita".

A preparação do corpo se dá nas comunidades atreladas à rede desociabilidade no sentido sociocultural, haja vista que os pais desde cedo se

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preocupam empreparar o filho para viver em comunidade. São espécies depoderes,emqueospaiscumpremcomumadassuasfunçõessociaisdogrupo,masésempreumaformademanipulaçãooucontrolesocial.

ComoesclareceMatos(2008,p.50):Tal aprendizagem inicia aindaquando criança, sob a orientaçãodospais

por meio da oralidade e da observação de derrubar árvore a machadoindividualmente ou em dupla, cavar a terra, remar, carpir entre outrasatividades.Aessaspráticasestá imbricadoumritmonasuaexecuçãoqueaoserassimiladotorna-sefatorimportanteparasuacontinuidade.

Aestruturafamiliardasregrassociais,sãoespéciesdecamisadeforçana

execução de atividades, as crianças aprendem a participar do grupodesenvolvendoatividadesadquiridaspeloprópriogrupo.ComonosdizMatos(2008, p. 53) em páginas seguintes: "Em outras palavras, a apropriação deforçasnaturaisouartificiaisparavencerapróprianaturezaocorreunosentidounilateralemproldacomodidadeoudamelhorqualidadedevida".

Nofutebolumaequipequedesejavencer,essecontrolesobreocorposedámaisexacerbadoumavezquevisamomáximoderendimentonosatletas,daíestesseremalvosdeumpodercontroladordeseuscorpos.Aeducaçãodoscorpos infantis nas atividades do local de pesquisa se dá nas escolas, é ummeio educativo atrelado aos currículos das secretarias municipais deeducação, é uma atividade física uniforme em todas as escolas de ensinofundamental.Porém,emtodasociedadeháseuscódigoseducacionaisnoquetange aos seus movimentos corporais identificados pelo próprio grupo quesegundooantropólogoLévi-Strauss(2003,p.12-13):

As crianças são treinadas a controlar reflexos [...] inibir seusmedos [...]

selecionarparadasemovimentos[...]Aeducaçãodacriançaérepletadaquiloque chamamos detalhes, mas que são essenciais [...] inobservados e cujaobservaçãodeveserfeita,compõemaeducaçãofísicadetodasasidadesedeambosossexos.

NacompreensãodeStraussficaevidenciadoqueaeducaçãodascriançaséfundamentalnoprocessoculturalaqualestapertence,bemcomo,ossaberesadquiridos são códigos estruturais do grupo ao qual pertencem e, portanto,espéciesdelaboratóriosparaoconhecimentocientífico.

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Os movimentos corporais das crianças de determinada localidade jáexpressamcaracterísticasdeseuambientesocial.RefletindoDaMatta (1995),podemos inferir que os espaços do esporte e do jogo são expressões quedramatizamosmaisprofundosritosdedeterminadasociedade.

Osjogosdefutebolsãonorteadospelolazeresociabilidadesnosespaçosdas comunidades rurais, daí podemos compreender que acontecem nessesespaçosmanifestaçõesdediversosaspectosdaculturapopular.

Nainteraçãodosjogadoreseespectadoresnovossaberessãoincorporadoseestefatoréumadaspremissasdádinâmicacultural,assimascriançassãoagarantia destas representações socioculturais. Neste contexto Pinto (2006, p.223)afirma:

Umoutrodadoquenãopodemosdeixardeconsideraréodarelaçãoentre

esses processos culturais e histórico que produzem ou condicionam adiferenciação e o que passou a ser aceito como base para a construção dasidentidades. É assim que as diferenças e aproximações que passam a serreconhecidasereforçadasnasrelaçõesentreosprópriosgrupos,populaçõesesociedades assumem estatutos concretos e simbólicos, como necessidadesafirmativasdeexistência,desobrevivênciaedecontinuidadecultural.

Diantedoexpostoacima,podemosponderarqueadinâmicaculturalestá

intrínsecoaosjogosdebolanascomunidades,cabeàscategoriasinfantis,sub17 e sub 20 dar novos redirecionamentos na combinação dos elementos dacultura local aos fatores externos, evidenciando novas propostas naconcretizaçãodevaloressimbólicos.

Aaprendizagemnocontextodaáreapesquisadanãosecaracterizaporumapedagogia formal, mas por um costume da prática de futebol de pais parafilhos, ou seja, não há uma preocupação ou responsabilidadeprofissionalizante,mas simplesmente uma prática comumno contexto local,hajavistaquenumalistagemdebrinquedosentreelesoprimeiroéumaboladefutebol.

As crianças desde cedo têm contato com a bola e o futebol acaba sendoincorporadoàssuasprincipaisbrincadeiras,se transformaconsequentementeem um hábito. Segundo Bourdieu, "habitus" é um conjunto de elementosinteriorizados e socializados que se estruturam a uma realidade objetiva.Enquanto Elias se refere ao "habitus" como "saber social incorporado", ou

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seja,asexperiênciassãoacumuladasesofremmodificaçõescontínuasapartirdasdinâmicassocioculturais.

Nocampodasestruturasdestesespaçosruraisestáainstituiçãodafamíliae da escola onde o jogo de bola passar ser crucial na diversão dascomunidades,éumaatividadedelazersocializadanapremissadeseushabitusculturais.

Primamos por este exercício epistemológico para poder compreender ouniversodasditascategoriasdofutebolatreladosaumprocessodeensinoeaprendizagem.Nasáreasdevárzeaondeháoelementodatradiçãodafamíliaqueconceituamosporhábitos,sãonoçõesapartirdasperspectivasdeEliaseBourdieu, mas devido ao encontro de fatores externos, tais como novastécnicas que vem compondo os clubes e são divulgados viamídia de formageral, promovem mudanças comportamentais nas práticas socioculturaispresentesnoscontextosdascomunidades.

Neste início de século no cotidiano das várzeas há certa tendência àsmudançasmais estruturais, considerando a relação do podermidiático e oshábitos das comunidades, mas não significam rupturas absolutas,simplesmenteoqueBourdieudenominade"sistemasdedisposiçõesduráveisetransponíveis",ouseja,comnovossignificadosincorporados.

Embora as categorias infantis sub 17 e 20 não exerçam um domínioenquanto atividade prática nos contextos da pesquisa, mas é relevanteconsiderar que osmoradores não têm preocupação direta com a idade parajogarbola,comoafirmaRicardoVasconcelos(2103):

Não importa a idade desde que ele dê conta e consiga jogar entre os

adultos [...] a gente tem cuidado pra não machucar os menores na hora dojogo, porque aqui é como uma grande família, todos querem ganhar masexisteo respeito, são todosparentes, amigos, então agente aproveita e todomundo joga e assim, as crianças vão aprendendo desde cedo (informaçãoverbal).56

NosrelatosdeRicardoVasconcelos,seobservaqueháumapreocupação

com a integridade física e moral nos jogos de bola, mesmo que não osclassifiquepor idade, nessa configuraçãopercebe-sequenessas categorias épossível ver que no futebol há em torno de si, uma diversidade deinterpretações,comoafirmaDaMatta(1982,p.21):

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AsapreciaçõessobrefutebolnoBrasilsãoclassificadascomodiscussões.Não se fala simplesmente de futebol. Discute-se, toma-se partido, fala-se demodosério.Nãosepodeassumirumaatitudeneutraquandosefaladefutebol,mesmoparanegar-lheaimportância.

Analisarosdiversosaspectospresentesnoscontextossocioculturaiséuma

tarefa difícil dada a diversidade de fatores para dar conta, mas é possívelobservarfatosbemreaiscomoarelaçãodeaprendizagensentrepaisefilhosno cotidiano das comunidades, onde se percebe sentimentos e emoções bemdiferentesdarelaçãodasescolinhasdefutebolprofissionalizantes.

Nas comunidades entre aqueles que ensinam e quem pratica o futebol asrelaçõessãomaispróximas,sepercebeoespíritocoletivonosseussujeitos,enquanto que nos espaços das cidades a carga do individualismo dessasrelaçõesémaior.

Podemos inferir dizer que nas comunidades há fatores positivos no quetangeàsrelaçõesdesociabilidade.DaMatta(1982,p.21)partedopressupostoque,"[...]oesportefazalgumacoisapara,comoucontraasociedade,podendoserinstrumentoneutro,negativooupositivo[...]".

Noprocessodeensinoeaprendizagem,atransmissãodosconhecimentosnas comunidades rurais e o preparo das crianças e adolescentes se dãonorteados pelo conhecimento empírico, é o que nos relata Antônio Barros(entrevista2013);

AnossafilosofiadevidaemrelaçãoaofutebolsemprefoiaDeusdará[...]

anossaescolaéaescoladavida,osjovensaprendememqualquerlugarporaquinoterreiroeaténoscurraisdaboiada[...]euaprendiassim,antigamentetínhamos somente que aprender a ler escrever e fazer contas das quatrooperaçõesdamatemática[...]masoestudoerabempuxado,senãoaprendesseaprofessorausavaapalmatóriaenahoradabolaagentejogavacomvontademesmo, era um orgulho pro meu pai ver a gente ganhando uma partida efazendoomelhoremcampo[...]acordávamosbemcedo,fazíamosdetudopropaificarcontenteeganharodireitodeirpracomunidadejogarbola[...]eporlánãopodíamosbrigarsenãoquandochegasseemcasateriaumacertocomomeupai,ascoisaseramsériaseexistiaumgranderespeitopelosmaisvelhos(informaçãoverbal).57

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AntônioBarros (2013) relata ainda que "[...] o vigor físico e vontade devenceréoquecontavanaspartidasdefutebol[...]"(informaçãoverbal)58,ouseja,cadaumpareciaseroprotagonistadesuaprópriahistória,daípodemosconsiderar que os conhecimentos adquiridos destes indivíduos estãodiretamenterelacionadosaoseucontextosociocultural.

Ofutebolagreganavidadessesatoressociaisatrajetóriadomododevidaconscientementede liberdadee lazer, são frutosdeconhecimentodohomemamazônico,estescomportamentosfluemnosespaçosdefutebol.

Osjovensestãoinseridosnesseprocessoesãoresponsáveiseenvolvidosconscientemente na trama das atividades socioculturais dado o aspecto datradiçãotransmitidosentreasgerações"[...]todoumoutroconjuntodevaloreserelações[...]"(DAMATTA,1982,p.26).

Emcertamedida,ofutebolcomoespaçoquedramatizaasrelaçõessociais,é um dos mecanismos que promove o conhecimento e desenvolvimentosocioculturalnosespaçosamazônicos.Oaprendizadoestádiretamenteligadoàtradiçãodosvaloresculturaisefuncionacomooestabelecimentodecódigosde lei intrínseco no subconsciente coletivo, onde o jovem compreende asverdadesdavidasociocultural.NesteaspectodeentendimentoLoureiro(1995,p.85)fazaseguintereflexão:

Na Amazônia seus mitos, suas invenções no âmbito da visualidade, sua

produção artística, são verdades de crenças coletivas, são objetos estéticoslegitimadossocialmente,cujossignificadosreforçamapoetizaçãodaculturadaqualsãooriginados.Aprópriaculturaamazônicaos legitimaeos instituienquantofantasiasaceitascomoverdades.

Loureiro nos traz à tona a reflexão poética do aprendizado da cultura

amazônica, mas sobretudo os fenômenos estéticos, estes se revelam nocotidiano e são estabelecidos como verdades nosmesmos contextos em quesão compartilhados. São incorporados às experiências vivenciadas por elesdesdeafaseinfantil,constituindo-senaformaçãodehábitosenaaceitaçãodogrupoaqualpertencem.

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3.3Asmanifestaçõessocioculturaisevidenciadasnosespaçosdefutebol

Teremos de equacionar ao lado dessa política rodoviária uma política

hidroviária,atentosparaaverdadedequeorioévida,alémdesercaminho.Estradas e rio configuram um binômio, que, conjugados e racionalmenteusados, serão inquestionavelmente instrumentos eficazes e 'eloquentes, nassuasexpressõesgeoeconômicas,paraaocupaçãohumanadaHileia.

JoséLindosoNatopologiadosespaçosdevárzeaapaisageméapenasoespaçofísico,

mas se reserva aos sujeitos sociais a constituição de manifestaçõessocioculturais e na integraçãodehomemversus natureza.Nesses espaços sedesenvolvem trocas simbólicas imerso no imaginário que caracterizam ohomemamazônico.

Fluemnessesespaçosentrerioseasmatasdoimensouniversoamazônicoumadiversidadedeconhecimentos,frutosdacomplexidadedavidaruraleosjogos de bola servem de palco apropriado dessas relações. Acordo com aafirmaçãoLoureiro(2000,p.80)reiteraque:

Fala-sedeumconjuntoderelaçõesculturaiscomomundo,reguladaspelo

poéticoqueemanadodevaneiodoimaginárioemliberdadeecujamediaçãoéfeitapormeiodassimbolizaçõesestéticasconfiguradasnamitologia,naarte,navisualidadeamazônicas.Sendoassim, e sobo ânguloque reconheceumaatmosfera estetizante predominando em algumas sociedades cujas relaçõescom a natureza propiciam isso, é possível se conceber uma poética doimaginário amazônico.Umapoética que se revela não somentenas criaçõesdosdiversoscamposdaarte,masquetambémestabeleceaformadeumaéticadasrelaçõesdoshomensentresiecomanatureza.

Nessesentido,apartirdefontespoéticasLoureiromostraagrandiosidadedos fenômenos éticos e estéticos que norteiam o cotidiano amazônico,

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sobretudo a transfiguração do imaginário para a vida real que se consolidacom a sociabilidade. É, uma forma reflexiva de enxergar a amplitude deinformaçõesdaspeculiaridadesdaregiãoqueseconfiguramnasexperiênciascotidianas.

Etnografando o cotidiano dos moradores do lugar da pesquisa, oamanhecer parece chegar mais cedo, o sol da manhã chega penetrando nasfrestasdascasasafetadaspelasenchentes,orelógiodespertadordestesespaçossãoossonsdosanimais:ocacarejardasgalinhas,ogrugulejardosperus,ogrunirdosporcos,orelinchardoscavalos,omugirdosbois,duranteodiaécomumouviressessonsequandochegaanoite,ocoaxardossaposdãootomnacompanhiadosberrosdosbodesecabraseocrochitardascorujas.

Osmoradoresjáaprenderamalidarcomotempo,elesantecipamalgumasdasatividadesdodiaantesdachegadadosol,acordamgeralmente4horasdamanhã,pegamsuacanoaeremoevãoverseusespinheisemalhadeiras,antesque o peixe capturadomorra porque sabem que a piranha pode devorá-lo eassimtambémcortarasmalhasdesuasmalhadeiras,chegamemcasaaesposaoufilhajáfizeramocafé,oqueeleschamamdeumcafésimples,rapidamentevãoaocurral tiraro leiteporquesabemqueumavacaquedácincolitrosdeleite,massechegarosolesta ficastressadanocurralecomoelesdizemelasuspendeoleite[grifonosso].

Pelamanhã, opreparodo café com tapioca reúne a família em tornodamesa,ondeoraréfundamentalparainiciarumaboajornadapedindobênçãosaDeusparaosucessodosafazeresdodia,asmulheresouhomenscortamalenha e deixam ao lado do fogão de barro, colocam o alimento de seusanimais domésticos, alguns vão pescar para o consumo da família ou paravenda,outrosparaocampocuidardegadoouparticipardealgummutirãoesósereúnemnovamenteàsonzehorasparaoalmoçoeànoitenojantaremfamíliaàluzdaslamparinasqueficanocentrodamesa.

Nocardápioestãoospeixescozidos,assadosoufritosacompanhadospelafarinha de mandioca. Após o jantar estes conversam um pouco, contamhistórias,piadasecoisasengraçadasqueocorremnocotidiano,masdormemcedoeatamsuasredesealamparinaficaacesaatétodosestaremdeitadosparadormir.

Estes fatores do cotidiano são emblemáticos no modo de vida erepresentam a "teia de saberes" construídos no contexto de suas relaçõessocioculturais, vividas nestes espaços constituídos de uma lógica interna docomportamento social, adquiridos e constituindo-se em novas experiências

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empíricas,comobemcaracterizaMerleau-Ponty(1996,p.1):"[...]omundoénãoaquelequepenso,masaquiloqueeuvivo".

Arealidadevividaeconstruídaporesteshabitantesconstituem-sehistóriassociais de aspectos simbólicos que lhes são peculiares. São os atores destaanálise os quais descrevem com riqueza de detalhes o cotidiano vivenciado,comorelataAntônioBarros(2013):

Aquiémeuespaçoéondemesintoseguroequandovoupracidadepassoumdoisdiasesintofaltademeusbairros,aquiseisevaichoverounão,tenhotempodefazerascoisassempreocupação,atéquandoamanheceédiferentedacidadeaquiobarulhoédospássarosedasnossascriaçõesemesmoquandovoupracomunidadeverofuteboljáseiqueobatepapoébomporqueestareientreamigoseelesfalamaminhalinguagem,atéotransitoaquiébomquandopego meu motor rabeta já sei por onde passar tem os atalhos e as partesperigosasondetemtroncoscompontasquemaldápravermas,queédaquijásabeforaissoétudotranquilo(informaçãoverbal).59

AdescriçãoeoapegoaohabitatnaturaldeAntônioBarros,secaracteriza

como uma zona de conforto ao ambiente sociocultural vivido. Onde esteconstruiu seus saberes e tem certos domínios da relação, espaço versushomemeambientedosmistériosdoecossistemanatural.

Olugardevárzeaparaestesmoradoresconstitui-sealgomaisquemoradiaou espaço geográfico, sobretudo está imerso as questões de história ememória de lugar. Constroem-se poderes no imaginário coletivocompartilhado pelos sujeitos sociais, suas relações vão além de suasconquistas econômicas e são sentidos socioafetivos de inspirações eperspectivas do grupo. Nas concepções sobre a questão espacial, Foucault(2002,p.212)descreve:

Seriaprecisofazerumahistóriadosespaços–queseriaaomesmotempo

umahistóriadospoderes–queestudassedesdeas estratégiasdageopolíticaatéasnossaspequenastáticasdohabitat,daarquiteturainstitucional,dasaladeaulaoudaorganizaçãohospitalar,passandopelas implantaçõeseconômicos-politicas.[...]Afixaçãoespacialéumaformaeconômico-políticaquedeveserdetalhadamenteestudada.

A prática do futebol é umamanifestação que faz parte do cotidiano das

comunidadespesquisadas, ondeo conhecimentode seus sistemas simbólicos

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sãoevidenciados,ossaberesconstruídosnocontextosocialsãorepresentadosporseusatores,sãoatividadesdavidacotidianaquetemoespaçofutebolísticocomo palco destas representações, mas é necessário considerar que sãoaspectos culturais que influenciam e ganham novas configurações sociais epossibilidadesinterpretativas.ComosugereGeertz(1989,p.19):

[...] a diferença, relativa em qualquer caso, que surge nas ciências

experimentaisouobservacionaisentre‘descrição’e‘explicação’aquiaparececomo sendo, de forma ainda mais relativa, entre ‘inscrição’ (‘descriçãodensa’)e‘especificação’(‘diagnose’)-entreanotarosignificadoqueasaçõessociais particulares têm para os atores cujas ações elas são e afirmar, tãoexplicitamentequantonosforpossível,oqueoconhecimentoassimatingidodemonstrasobreasociedadenaqualéencontradoe,alémdisso,sobreavidasocialcomotal.

Diante das possibilidades de diálogos com as ciências que transitam nosuniversos amazônicos, se faz necessário tangenciarmos aos conhecimentosempíricos dos moradores, estes revelam uma inesgotável fonte deconhecimentos,sejadasobservaçõesdosfenômenosnaturais:lua,sol,ventoerios, por onde estes transitam no seu dia a dia e assim conseguem tirar osustentodafamíliadopróprioambientevivido.

Os conhecimentos adquiridos e transmitidos através de gerações, porcidadãosdouniverso amazônico, são canalizadospara sua subsistência,mastambém por particulares que de forma predatória, desenvolvem atividadeseconômicas. Torna-se um conhecimento utilizado de forma danosa ao seexpandir à manutenção da economia das cidades. Sobre este aspecto Silva(2010,p.20-21)afirma:

Os paradigmas da ciência como agente de promoção social entre osdiferentespovos,daeconomiacomomecanismodedesenvolvimentofísicoehumano integrado e aliado às aspirações mundiais de prosperidade ealteridadeedapolítica enquantoprocessoda construçãodeummundomaislivre,solidário,fraternoehumano,estãodefinitivamentepostosemxeque.Omundo nunca esteve tão entrelaçado na sua dinâmica socioeconômica ecompartimentadoemseuhumanismocivilizatório[...].

Torna-se evidente a necessidade de se discutir as políticas dedesenvolvimento no contexto amazônico e primar por novas concepçõeshumanísticas, pois o cenário agravante que se apresenta neste contexto é dedesigualdadesocial.

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Constituem-senestesespaços,umcenário instiganteparaaçãoacadêmicaatrelado ao conhecimento das populações locais, tendo em vista abiotecnologia existente em outras realidades, mas inexistente neste imensouniverso biológico, onde se pode introduzir novos elementos na construçãodoconhecimentocientifico.

Atrocadesaberesdosgrupossociaisnosespaçosdefutebolvãoalémdapráticadojogodebola,aaprendizagemnosentidoinvestigativoéumfatordereflexão, haja vista que em torno desta prática, as pessoas se mobilizam eassimasconversas,opiniões,atitudes,contradiçõesemuitosoutrosaspectossocioculturaissãomanifestados.

Descrever a trama de acontecimentos dos atores sociais, é sobretudovivenciar o cotidiano dos moradores das comunidades, uma vez que a boarecepçãodosmoradoreseasutilezadeseusconvites,setornaimpossívelnãocompartilhar de seus afazeres, assim as possibilidades de análise tem maispropriedade.

Os mais idosos exercem o papel de sociabilidade dos que chegam àcomunidade,conservamvaloresdopassadoedãonovossentidos,namedidaem que se sentem valorizados quando o recém-chegado à comunidadecompartilha de seus valores e entre eles, o jogo de bola.Assim, o lugar devárzeaseconstituicomoespaçodeconstruçãonosentidodememóriasocialindividualecoletiva.

No vaivém das comunidades, se constroem histórias nos espaços defutebol, são resultantes de encontros culturais, ou seja, asmanifestações sãosempre plurais, havendo sempre possibilidades de adentrar no mundo dooutro, onde se imprimem novas formas de produção de saberes, estes sãoreveladospormeiodoimagináriosocioculturaleconsequentementepermiteamanutençãodogrupo.

No interior destas relações há também os conflitos internos como emqualquer grupo, por exemplo, quando decidem organizar um torneiomasculino ou feminino, de penalidades ou jogo corrido, mas há situaçõesestruturais que se mantém na trama de atividades culturais. Como afirmaBourdieu (1983, p. 82), ao acentuar que "[...] às diferentes posições que osgrupos ocupam no espaço social correspondem estilos de vida, sistemas dediferenciação que são a retradução simbólica de diferenças objetivamenteinscritasnascondiçõesdeexistência".

É uma manifestação no universo esportivo onde se revelam: emoções,expressões corporais, comunicação verbal e não verbal, alteridade,

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competição,ouseja,umsistemadesaberessocioculturaisqueoscaracterizam.Bourdieu(1983,p.138)esclarecesobreestessaberes:[...] comose constituiueste espaçode jogo, comsua lógicaprópria, este

lugar compráticas sociais inteiramente particulares, que foramdefinidas nocursodeumahistóriaprópriaequesópodemsercompreendidasapartirdestahistória.

Nestes espaços se processam e transmitem valores, daí porque não pode

ser reduzido aumúnico elemento,masháumcomplexode relaçõesque seestabelecemnasrelaçõeshumanas.

Embora o esporte esteja presente em diversos lugares do país, em cadacontexto ele ganha novas formas de representações simbólicas que sãopróprias de cada grupo, neste contexto de mundialização do esporte estecarrega uma ideologia que domina e massifica determinados aspectosculturais.

Natotalidadedoambienteamazônico,ograudecomplexidadedomododevida das populações de várzea são bem diversificados, dado por fatoreshistóricos e geográficos de formaçãodestes espaços,mas emcadauniversosociocultural é possível identificar características próprias nos espaços defutebol, sejam nas "peladas" de várzea dos finais de semana ou nas partidasentrecasadosesolteiros.

Constituímosadenominaçãojogode"peladas"porseremtimesformadospor amigos emoradores locais, que embora sigam certas regras do futebolprofissional,outrassãoadequadasasuarealidadelocal,taiscomo,númerodejogadores, espaço do campo, tamanho das traves, a utilização o não de umárbitro,comousemuniformes.

Ocontextodostimesdevárzeasedánumambienteondearelaçãohomemversus natureza ganham significados simbólicos, uma vez que a paisagemrepresenta no imaginário concretude da cultura material e imaterial. Sãoeventos que ocorrem geralmente nos finais de semana e os atores sãopersonagensqueseveemdiantedeumaplateia,sãosituaçõespassageirasaoterem à atenção da comunidade, mas que lhe conferem grande importânciasingularaosseuspares.

A valorização dos espaços visuais, como aspectos simbólicos naconstruçãodoimagináriodosatoresdofuteboldevárzea,sãofenômenosque

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fazem parte de seu discurso no cotidiano vivido, como discorre RicardoVasconcelos(2013)emseusrelatos:

[...]aquiquandovocêestámuitosuadovocêcorreedáummergulhoaíno

rioevoltaprontoprojogoe,quandoestamossóapreciandoojogoficamossentados no pé de uma árvore lá tem taperebazeiro, marizeiro lá ficam astorcidas(informaçãoverbal).60

Os espaços de futebol representam um púlpito das manifestações

socioculturais dos moradores onde ocorre a trama dos discursos entrejogadores e espectadores. É, sobretudo, um espaço onde compartilhamproblemasdocotidiano.

Alcileu Vilaça (2013) relata: "[...] aqui na comunidade é como umjornalismolocaltudosesabe,daenchentecomovaiser,davazante,asfofocasenfimsevocêquerficarinformadotemqueviràcomunidadeéondemaistemnovidades."(informaçãoverbal).61

A comunidade é um lugar de encontro e informação das coisas daí anecessidade de toda família participar e compartilhar esse momento,JandersonSouzaVasconcelos(26anos,entrevista2013):

A família é maior riqueza que temos, por isso sempre que possível

levamos as nossas crianças para a comunidade, lá elas se reúnem com oscolegasetodomundobrinca[...]todomundotemodireitodesedivertir,veras coisas acontecerem é importante porque assim, desde muito cedo elasaprendemlogocomoéavida,osimplesfatodesaíremumpoucodecasajáéum grande feito, é bom ver as crianças se sentindo livres brincando(informaçãoverbal).62

Nos relatos do colaborador este coloca empauta um fator importante, a

questãododireitoconstitucionaldacriançaeadolescenteàpraticadolazer.Aconstituiçãoemseuartigo227:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e aoadolescente,comabsolutaprioridade,odireitoàvida,`asaúde,àalimentação,àeducação,aolazer,àprofissionalização,àcultura,àdignidade,aorespeito,àliberdadeeàconvivênciafamiliarecomunitária.(BRASIL,1988,s.p.,grifonosso).

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Ofuteboléummeioquepossibilitaaosmoradoresdevárzeaolazer,masem função deste, o aprendizado relacionado à prática do cotidiano seevidencia, e coloca em jogo a filosofia de vida do trabalhador rural e lhepermitindoagregaraosvaloresfamiliaresàutilidadedofutebol.

Cadamorador observa e interpreta as vivências culturais à suamaneira,masosaspectosnaturaissãocomunsatodos,daíasafinidadeseconstruçõessociais coletivas. Alcileu Vilaça (2013) relata: "[...] aqui apesar de cada umpossuir seu trabalho sua religião, mas sempre nos reunimos discutimos ascoisase fazemosalguns trabalhosemconjunto,umajudaooutroegraçasaDeustemdadocerto."(informaçãoverbal).63

Afamíliaéumainstituiçãoqueagregavalores,ondeseinseremosdireitose deveres e neste meio de entendimento se completam com os aspectosreligiosos, estes são fortes elementos pertinentes nos seios familiares dascomunidades.

Os aspectos religiosos são fenômenos que fazem parte da cultura dascomunidadesedecertaformaparecemsuavizarosproblemassociais,comoafirmaConceiçãoVasconcelos(2013):"[...]nossosproblemassãomuitos,aquiparece que não é Brasil o poder público finge que não existe nomapa estelugar,entãonosapegamosàsnossascrenças,Deusnosfortalecenosdáforçaeassimnosmantemosvivos."(informaçãoverbal).64

As lideranças religiosassãoatribuiçõesdos líderesdascomunidadesquesão denominados de presidentes, entre os comunitários há acordosestabelecidosondecabeaolíderlocalopapeldepresidente.Estessujeitosnãosãoremuneradosporessaatividade,maséummecanismoutilizadonasmaisdiversas comunidades. Diante destas concepções, assim afirma Bourdieu(1996,p.194):

As instituições religiosas trabalhampermanentemente, tantopráticacomo

simbolicamente,paraeufemizarasrelaçõessociais,aíincluídasasrelaçõesdeexploração, (como na família), transfigurando-as em relações de parentescoespiritual ou de troca religiosa, através da lógica da benemerência: da partedos assalariados, dos agentes religiosos subalternos encarregados, porexemplo,dalimpezadasigrejasoudamanutençãoedecoraçãodosaltares,háumadádivadetrabalho,‘oferendalivrementedadadedinheiroedetempo’.

Os líderes ou presidentes locais das comunidades de várzea gerenciam

aspectos teológicosnocontextodascomunidades,comumaretóricabaseada

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nas manifestações socioculturais simbólicas peculiar aos seus pares. NesseprocessoGeertz(1989,p.104)partedaseguinteconcepção:

Na crença e na prática religiosa, o ethos de um grupo torna-se

intelectualmente razoável porque demonstra representar um tipo de vidaidealmenteadaptadoaoestadodecoisasatualqueavisãodemundodescreve,enquanto essavisãodemundo torna-se emocionalmente convincentepor serapresentada como uma imagem de um estado de coisas verdadeiro,especialmentebemarrumadoparaacomodartaltipodevida.

Areligiãocomoaspectodocotidianoseprojetanossignificadoseatitudes

dos moradores de várzea, situações advindas de fenômenos naturais deenchentesevazantes,paraestesseexplicamelhoratravésdoaspectoreligioso.

NaspalavrasdeAlcivaldo(2013)esteexplica:Ascoisasestãoficandomaisdifíceiscadaanoquepassaasenchentessão

maiores,aspastagensjánãosãoasmesmas,quasenãotemos,masobarranconaturais que ajudavam alimentar o gado, mas para Deus nada é impossível(informaçãoverbal).65

A fé é um fenômeno presente namentalidade dosmoradores, nos quais

podemos verificar em seus relatos, eles começam ou terminam uma falautilizandoasconcepçõesdosaspectosreligiosos,ficaevidenteparaestesquefalardeDeuséumanecessidadeindividualedogrupo,assimumexercíciodecidadaniaereligiosidadecomoaspectosimbóliconacomunidade.

Éumaconstruçãodacosmovisãoculturalnoentendimentoda relaçãodenatureza subjetiva na explicação de situações naturais, mas ressaltam-setambémosdadosempíricosmuitopresentesnasfalas,éoqueexpõeJoaquimAlexandrino(2013):

Antigamentetínhamosenchentesevazantesgrandes,masnãohaviagrande

quantidade de gado e, principalmente dos búfalos então a pastagem era boatinha onde os peixes se protegerem,mas com as derrubadas de árvores dasmargensdosriosascoisasestãoseacabando(informaçãoverbal).66

As experiências de Joaquim Alexandrino demonstram as mudanças no

decorrer dos anos e relata a questãode criações de animais comoobúfalo,

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que se proliferou, é um dos responsáveis pelo esgotamento dos barrancostípicosdaregião,umavezqueestesealimentanas terrasfirmesenos leitosdosrios.Mastambémaaçãodoshomenssobreoscamposdevárzeanointuitodecriaçãoextensivaderebanhosdegadobovino,considerandoque90%dosentrevistadostemcriaçãodegado.

Naconfiguraçãodas redessociaisdevárzea,háfatorescomportamentaisde valores constituídos que se limitam ou são pertinentes a esquemas maisfechados como, por exemplo, certas formas de tratar o outro, mas nãoqueremos dizer que estão sempre num estado de consenso. Diante dacomplexidade do cotidiano, nas áreas de várzea como em outros meios sevivem em constantes conflitos na busca de respostas aos seus anseioscoletivos.

Paraumamelhorcompreensãoénecessárioesclarecerumadasdiferençasentre a prática esportiva profissional e as práticas das áreas de várzea. Aprimeiracategoriaenvolveabusca incessantedoalto rendimentodoatletaenegociaçõesdecunhofinanceirosobreáóticadomercadomundial,poroutrolado as "peladas de várzea", como atividade de lazer, embora possa surgiralgum atleta, mas não é uma característica do alto rendimento. SegundoHuizinga(1971,p.33):

[...] O jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro decertosedeterminadoslimitesdetempoedeespaço,segundoregraslivrementeconsentidas,masabsolutamenteobrigatórias,dotadodeumfimemsimesmo,acompanhadodeumsentimentodetensãoedealegriaedeumaconsciênciadeserdiferentedavidacotidiana.

Sobre a ótica sociocultural, as denominadas "peladas", servem

substancialmenteaosnossospropósitosdepesquisadoreportanto,noslevaarefletirsobreasexpressõessociaispresentesnoscontextosamazônicos.

Nesses espaços de dimensões reduzidas e adequadas à prática do futebolpelos próprios moradores que se reúnem para "capinar o campo", fazer astraves e adequar às medidas do espaço local, para os moradores dascomunidades, é um momento que vai muito mais da simples tarefa, é umencontro das famílias, de amigos em função de uma atividade que lhesproporcionalazer.

NaspalavrasdeJandersonSouza(2013),"[...]aturmaseencontraefazoserviçoeduranteesteconversamosbastante[...]quenempercebemosotempopassar[...]",esterelataainda"[...]nãotemosessediacomoumtrabalho,mas

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comoummomentodeencontro[...]"(informaçãoverbal)67,éumapráticaqueestá além do trabalho e delega mais comprometimento social por ser umaspectosimbólicodacomunidade.

Nasobservaçõesdestesencontrosnascomunidades,foipossívelobservaralguns fatores pertinentes nas interações, como por exemplo, as expressõescorporais, o aspecto linguístico. São repletos de sentido no contexto queocorremenosfascinamenquantopesquisadordadoariquezadedetalhesquelhessãopeculiares.NaspalavrasdeReinaldoBarros(2013):

Nossasaçõesnacomunidadesãomotivadaspelaféepelaamizadedeum

grupo que fala a mesma linguagem [...] aqui nada é obrigatório, mas aspessoasfazemquestãodeparticiparedarsuascontribuiçõesnacomunidadeeassimfortalecemosnossoslaços(informaçãoverbal).68

Nestaperspectiva,nossoobjetodeestudosefortaleceapartirdomomento

em que nos certificamos de nossas hipóteses sobre as "manifestaçõessocioculturais que se revelam nesses espaços". Este fator é crucial parapercebermos que há fenômenos observáveis na sociologia do esporte, nospermiteumaimersãoacadêmicanessesespaçosparanosrevelarrealidadesdocotidianorural.

Nestas relações de sociabilidades fluem aspectos que nos permitemcompreender como os moradores resolvem os problemas da comunidade.Sobreesteaspecto,Bourdieu(1989,p.37)enfatiza:

Parasenãoserobjetodosproblemasquesetomamparaobjeto,épreciso

fazer a história social da emergência desses problemas, da sua constituiçãoprogressiva, quer dizer, do trabalho coletivo – frequentemente realizado naconcorrência e na luta – o qual foi necessário para dar a conhecer e fazerreconhecer estes problemas como problemas legítimos, confessáveis,publicáveis,públicos,oficiais[...].

O trabalho coletivopermite a socializaçãodos indivíduosnestes espaços

sociais, seja para um trabalho na igreja, no campo de futebol, as famíliasparticipam ativamente. Alcivaldo Pinto (2013) afirma: "[...] nos trabalhos dacomunidadeascriançassedivertemeosadultos trabalham[...]”(informaçãoverbal).69 São espaços que permitem comunicar ao outro os acontecimentosdodiaosquaissãocompartilhadasdeformadescontraída.

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Nesta perspectiva de comunicação, os fenômenos do cotidiano ganhaminterpretações de cunho individual e coletivo, na medida em que osacontecimentos são contados à luz das interpretações sem um compromissoformal. A sociabilidade é um aspecto presente como enfatiza o sociólogoalemão "é um fenômeno social" que permite a compreensão social dasinterações,afirmaaindaSimmel(1983,p.168-169):

[...]‘sociedade’propriamenteditaéoestarcomumoutro,paraumoutro,

contra um outro que, através do veículo dos impulsos ou dos propósitos,formaedesenvolveosconteúdoseosinteressesmateriaisouindividuais.Asformasnasquaisresultaesseprocessoganhamvidaprópria.Sãoliberadosdetodosos laçoscomosconteúdos;existempor simesmoepelo fascínioquedifundem pela própria liberação destes laços [...] também se caracterizam,precisamente,porumsentimento,entreseusmembros,deestaremsociados,epela satisfação derivada disso. Os sociados sentem que a formação de umasociedadeimpelidosparaessaformadeexistência.[...]Poisaformaéamútuadeterminaçãoe interaçãodoselementosdasociação.Éatravésda formaqueconstituemumaunidade.

O veículo de comunicação entre seus membros estão atrelados a uma

diversidadedeassuntosdocontextolocal,masquelhesconvémcomunicação,como uma espécie de conduta ética entre seus membros, que possibilita adinâmica social e assim novas informações que surgem nos grupos durantetodoumprocessohistórico.ParaSimmel(1983,p.173):

[...]Asociabilidadeéojogonoqualse‘fazdeconta’quesãotodosiguais

e,aomesmotempo,sefazdecontaquecadauméreverenciadoemparticular;e ‘fazer de conta’ não émentiramais do que o jogo ou a arte sãomentirasdevidoaoseudesviodarealidade.

Nostrabalhoscomunitáriosounaspartidasdefutebolsurgemosdiálogos

da vida social cotidiana, onde o lúdico é um aspecto presente. O própriofilósofo Johan Huizinga (1971, p. 33) em seu livro "Homo Ludens",argumentou:"[...]oelementolúdicoestánabasedosurgimentodacivilização[...]", ou seja, é um fenômeno que sempre está presente nas sociedades eproporcionaumdesenvolvimentooudinamismodaspráticassocioculturais.

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No palco das atividades do esporte na comunidade a sociabilidade se dácom osmembros do próprio grupo ou com os do time adversário,mas osvaloresmorais,oespíritodeequipe,orespeitoaooutroébastantefrequente,porexemplo,observamosqueduranteváriaspartidasoarbitroescolhidopelasequipes poderia ser ummembro da comunidade de qualquer um dos times.JoaquimAlexandrino70(2013)comentou:

Apitamos pelo certo porque quando vamos na comunidade deles,

possivelmentefarãoamesmacoisa,éumaquestãoderespeitoaooutro"eeuparticularmentemesintobemquandofaçoacoisacerta,poraquisemprefoinossos costume e assim graças a Deus sempre deu certo (informaçãoverbal).71

Compreende-sequenessasredesdesociabilidadesháobomsensoatrelado

aosvaloresmoraisdessamesmasociedade,diantedestasconcepçõesHuizinga(1971,p.33)afirma:

[...] o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de

certosedeterminadoslimitesdetempoedeespaço,segundoregraslivrementeconsentidas,masabsolutamenteobrigatórias,dotadodeumfimemsimesmo,acompanhadodeumsentimentodetensãoedealegriaedeumaconsciênciadeserdiferentedavidacotidiana[...].

A análise deste universo sociocultural, permiti-nos destacar o fatorsociabilidade e o lúdico como aspectos que agregam valores a partir dasexperiências adquiridas pelos indivíduos, mas como nas comunidades nemsempreasrelaçõessãoharmônicas,háocasionalmenteconflitossociaisentreseuspares,fazpartenaconstruçãodesaberesdoethoscotidianoparaummeiodedesenvolvimentodacomunidade.

ParaGeertz(1989):"[...]ethosdeumpovoéotom,ocarátereaqualidadedevida, seuestilomoral e estético e suadisposição, é atitude subjacente emrelaçãoaelemesmoeaoseumundoqueavidareflete".

As ações sociais sejam individuais ou coletivas sempre resultam em umefeitoquebeneficiaàtodosepromoveumaconvivênciasatisfatória,ouseja,agregamvaloresàrealidadesocial,somam-seàsexperiênciascotidianaseaodesenvolvimento sociocultural. Como denomina Geertz (1989): "[...] nóssomos animais incompletos e inacabados que nos completamos e acabamos

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através da cultura – não através da cultura emgeral,mas através de formasaltamenteparticularesdacultura".

Um exemplo característico destas populações de várzea são osaprendizados,comosciclossazonais,ondedesenvolvemcertashabilidadesnacapacidadedeobservaçãodeseusespaçoseconseguemexplorarospotenciaisrecursosdaregião.Nessesentido,Matos(2008,p.49)acrescenta:

Quem se desloca para qualquer ambiente, leva consigo hábitos e

conhecimentospeculiaresdesuaculturalocal,queempregadoscomartefatos,instrumentos,tecnologiaseaintroduçãodenovasespéciesvegetaiseanimais,emambienteestranhoaodeorigempodeproporcionaro impactoambientalemproldobem-estarsocialindividualoudegrupo.

Diante desta conjuntura sociocultural, as habilidades em captar recursospara o sustento familiar é fruto do conhecimento adquirido ao longo dasexperiênciasdogrupo,masessesconhecimentosmuitasvezessãoofuscadospelopoderpúblico,sópercebemosdanosnaturaisetomammedidaspaliativasparasanartaisproblemáticasemdetrimentodetodoconhecimentoadquiridopelapopulaçãolocal.

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CONSIDERAÇÕESFINAIS

O cenário das comunidades amazônicas comporta significativos

fenômenossimbólicosconstruídosnointeriordasrelaçõessociais.Sãovozesde sujeitos sociais silenciadas, obliteradas e estereotipadas, cujasinterpretações preconceituosas aparecem erroneamente no âmbito doconhecimentocientífico.

A Amazônia precisa ser pensada em seus aspectos universais deconstituiçãoepistemológicanoâmbitodaformaçãosocialdesta região,paraalémdosensocomumeruditoquevêaflorestaeosrecursosnaturaiscomoosúnicoselementosdesignificaçãomundial.Ohomem(eamulher)amazônicoédetentordeumconhecimentotradicionalqueaindanãopossuiestatutoparaaciência. Suas relações com o espaço e tempo, são provenientes dasexperiências milenares que matizam a vida dos povos tradicionais naAmazôniaprofunda.

Ofutebolaparecenesteprocessocomoumaexpressãodohumanoque,nosjogosdelazer,mobilizaaspessoasdeformauniversalsemacepçãodecredoreligioso.Estapesquisaconstataqueofutebolpraticadopelosmoradoresdascomunidades Harmonia e Nossa Senhora de Nazaré, envolve católicos eevangélicos,queseunemnasatividadesdesportivasemtornodasociabilidadecomunitária.Trata-se de umaprática social que s revela formas de pensar einterpretarouniversoamazônicoemseusaspectosfísicos,artísticos,laborais,sociais,culturais,intelectuaisereligiosos.

As mulheres participam como espectadoras torcendo por seus filhos emaridos, deixando extravasar suas emoções no momento desta torcida nodesenvolvimentodopapeldecoadjuvantes.

Esta pesquisa constata que o futebol de várzea comporta elementossimbólicos, com apropriação de pensamento próprio dentro de um genuínoespírito varzeano. Trata-se de um aprendizado tradicional que independe doensino formal. Seus conhecimentos se desenvolvem na relação afetiva entrehomem/sociedade/naturezanumarelaçãodepertencimento

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A ineficiência de políticas públicas dificulta o usufruto de qualidade devida aos povos tradicionais da Amazônia. Esta pesquisa revela que inexisteassistência técnica às atividades produtivas das comunidades pesquisadas.Háuma insustentabilidade no que diz respeito ao desenvolvimentosocioeconômico.Ospoderespúblicosjustificamonãocomprometimentocomas comunidades tradicionais baseados no preconceito da indolência e dapreguiça do povo Amazônico, que vê esta região como um "vaziodemográfico".

As políticas públicas poderiam alavancar o desenvolvimento local dascomunidades amazônicas, os povos tradicionais que, historicamente foramtratados pelo governo central do Brasil como não afeitos ao progresso,reclamamasuacidadaniajuntoaospoderespúblicos.

Apesquisarevela,porfim,queofuteboléumapráticasocialtransvestidaporrelaçõesdegêneronamedidaemquerearticulaasrelaçõessociaisdentrodacomunidade,numprocessodesociabilidadeeuniãoenvolvendohomensemulheres.

Geralmente, o futebol separa as pessoas de diferentes matizes e faixasetárias,escolhendoatletasquepossuemmaishabilidadescomabola,osquaisse tornam ídolos de torcida. Esses atletas dispõem de ajuda damídia comoinstrumento de comunicação de massa, a qual vende suas imagens comoprodutoscomerciais.

Por fim, deve-se reconhecer queo futebol possui o prisma socioculturalemcujosespaçosseexpressamhomensemulheresnumarelaçãodepertença.O futebol de várzea comporta elementos interpretativos de uma culturapopular,envolvendosujeitosdiferentesecomdiferentesformasdepensar.

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REFERÊNCIAS

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1)�ParintinséummunicípiobrasileirolocalizadonointeriordoEstadodoAmazonas,próximoàdivisacomoEstadodoPará,RegiãoNortedopaís.ComumapopulaçãoestimadapeloIBGEem2016de112.716habitantes,configura-secomoosegundomunicípiomaispopulosodoEstado.Emnívelnacional,entreosmunicípioscompopulaçãosuperioraos100000habitantes.Suaárea é de 5. 952,369 km², representando 0,3789% do EstadodoAmazonas,0,1545%daregiãoNortebrasileirae0,0701%do território brasileiro. Desse total 12 4235 km² estão emperímetrourbano.↵

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2)�Barreirinhaéummunicípiobrasileirono interiordoEstadodo Amazonas, pertencente à Mesorregião do CentroAmazonenseeMicrorregiãodeParintins,localiza-sealestedeManaus, capital do Estado, distando destes cerca de 331quilômetros e ocupa uma área de 5 750,534 km² sendo suapopulação, estimada pelo IBGE em 2016, em torno 31.105habitantes.↵

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3)�Configuraçãooufiguração-Eliasentendefiguraçãocomoum conceito de relação, ou seja, uma cadeia deinterdependências e que podem ser compreendidas medianteumaanálisedoselosde interdependência,opensadorutilizaofutebolcomoexemploparaexplicaresteconceito:Elias(1980,p. 142-143), "Só podemos compreender o fluxo constante doagrupamentodos jogadoresdeumdos lados, sevirmosqueogrupo de jogadores do outro lado também está num fluxoconstante. Se pretende que os espectadores compreendam egostemdo jogo, terãoque estar aptos a compreenderomodocomoestãorelacionadasasdisposiçõesmutáveisdecadalado–paraseguiraconfiguração fluídasdecadaumadasequipes.[...] No seio das configurações mutáveis – que constituem oprópriocentrodoprocessodeconfiguração–háumequilíbrioflutuanteeelásticoeumequilíbriodepoder,quesemoveparadianteeparatrás,inclinando-seprimeiroparaumladoedepoisparaoutro.Estetipodeequilíbrioflutuanteéumacaracterísticaestruturaldofluxodecadaconfiguração".

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4)� Civilização - Segundo as concepções de Elias (1994, p.24), “[...] o conceito de civilização refere-se a uma grandevariedadedefatos[...]esteconceitoexpressaaconsciênciaqueo Ocidente tem de si mesmo [...] ele resume tudo em que asociedade ocidental nos últimos dois ou três séculos se julgasuperior a sociedades mais antigas ou a sociedadescontemporâneas”. Mas o termo civilização não tem o mesmosignificado em todo ocidente. Enquanto que, para alemães einglesesestapalavraresumeoorgulhoqueosmesmossentemdeseuspaísesnodesenvolvimento.

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5)� Mario Filho (1908-1966) foi um dos mais importantescronistas esportivos brasileiros do Século XX. Além dejornalista foi também proprietário do Jornal dos Sports,publicação que, enquanto comandada por ele, fomentoudiversascompetiçõesesportivasereuniuintelectuaisimportantesque escreviam no periódico. Ele foi um dos principaisincentivadores da construção do Estádio do Maracanã queacabouporreceberoseunome.Naliteraturatevecontribuiçõesimportantes, sendo a mais destacada, "O negro no futebolbrasileiro". Mario Filho era irmão do dramaturgo NelsonRodrigues.↵

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6)� Charles Miller: filho de pai escocês e mãe brasileira deascendência inglesa, nascido no Brás- SP, é considerado pormuitosmemorialistas,jornalistasehistoriadores,ointrodutordofutebolnacidadeemseuretornoaoBrasilapósotérminodosestudos realizados na Inglaterra, este volta de umperíododeestudos na Inglaterra trouxe em sua bagagem o materialnecessário para a prática do futebol: bola, uniforme e ummanualderegrasnaestruturadofutebolnosmoldesIngleses.PassouafrequentaroSãoPauloAthleticClub,umclubeinglêsdedicadoaocricketfrequentadobasicamentepelosfuncionáriosdaCompanhia deGás, doBanco de Londres e da São PauloRailway,em1895.↵

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7)�SitedaConfederaçãoBrasileiradeFutebol.↵

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8)�SitedoIBOPE.↵

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9)� Entrevista concedida porConceiçãoVasconcelos, 69 anos,em2013.↵

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10)� Entrevista concedida porConceiçãoVasconcelos, 69 anos,em2013.↵

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11)� Entrevista concedida porConceiçãoVasconcelos, 69 anos,em2013.↵

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12)� Entrevista concedida por Jacira Vasconcelos, 67 anos, em2013.↵

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13)� Entrevista concedida por Jacira Vasconcelos, 67 anos, em2013.↵

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14)�EntrevistaconcedidaporAlminoReis,50anos,em2013.↵

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15)� Entrevista concedida porConceiçãoVasconcelos, 69 anos,2013.↵

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16)� Entrevista concedida por Tertulina Souza, 84 anos, em2013.↵

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17)� Entrevista concedida por PedroVasconcelos, 85 anos, em2013.↵

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18)� Entrevista concedida por PedroVasconcelos, 85 anos, em2013.↵

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19)� Entrevista concedida por PedroVasconcelos, 85 anos, em2013.↵

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20)� Entrevista concedida por RaimundoVasconcelos, 71 anos,em2013.↵

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21)�EntrevistaconcedidaporAlminoReis,50anos,em2013.↵

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22)�EntrevistaconcedidaporAlminoReis,50anos,em2013.↵

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23)�EntrevistaconcedidaporAntônioBarros,80anos,em2013.↵

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24)�EntrevistaconcedidaporAntônioBarros,em2013.↵

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25)�EntrevistaconcedidaporPedroVasconcelos,em2013.↵

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26)� Entrevista concedida por RaimundoVasconcelos, 71 anos,em2013.↵

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27)�EntrevistaconcedidaporAlminoReis,em2013.↵

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28)� A jogada denominada "bicicleta" e a "plástica jogada" sedeve ao jogador brasileiro Leônidas da Silva, ex-jogador doFlamengo,SãoPauloeSeleçãoBrasileiranadécadade1940quandoofutebolganhapopularidadeeesteemuitosoutrossetransformamemgarotospropaganda.↵

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29)� Leônidas da Silva ficou imortalizado nos gramados do"Pacaembu",comacriaçãodeumaplástica jogada,eternizadacomo "bicicleta", sendo um dos primeiros jogadores a ganhardinheirocomaprópriaimagem,seuapelido"DiamanteNegro",virounomedechocolate(REVISTAVEJA,8mar.2006).↵

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30)� EdsonArantes doNascimento,mais conhecido comoPelé(TRÊS CORAÇÕES, 23 out. 1940), é um ex-futebolistabrasileiro,éconsideradoumdosmaioresfutebolistasnahistóriadofutebolmundial.Verwww.e-biografias.net/pele/↵

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31)�EntrevistaconcedidaporRicardoVasconcelos,48anos,em2013.↵

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32)� A lei ficou conhecida como uma homenagem a “Pelé”,Edson Arantes do Nascimento, Ministro de EstadoExtraordináriodeEsportesdogovernodopresidenteFernandoHenrique Cardoso, entre 1/1/1995 e 30/4/1998, responsávelpelaelaboraçãodoprojetodelei.↵

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33)�EntrevistaconcedidaporCarlosMeireles,em2013.↵

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34)� Entrevista concedida por Alcivaldo Pinto, 34 anos, em2013.↵

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35)�EntrevistaconcedidaporAlminoReis,em2013.↵

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36)�EntrevistaconcedidaporCarlosRobertoPinto,57anos,em2013.↵

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37)� Entrevista concedida por Mario Carvalho, 37 anos, em2013.↵

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38)� Entrevista concedida por José Enéias Gloria, 60 anos, em2013.↵

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39)� Entrevista concedida por José Enéias Gloria, 60 anos, em2013.↵

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40)� Entrevista concedida por Anelilza Glória, 55 anos, em2013.↵

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41)�Ibid.↵

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42)�EntrevistaconcedidaporAntônioBarros,80anos,em2013.↵

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43)�EntrevistaconcedidaporPedroVasconcelos,em2013.↵

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44)� Paternalismo: Genovese (1976, s.p.) argumenta que o "[...]paternalismo,emqualquercenáriohistórico,definerelaçõesdesuperordenação e subordinação. Sua força como umprevalecimento do ethos aumenta quando os membros dacomunidade aceitam – ou se sentem compelidos a aceitar –essas relações como legítimas". Com Gilberto Freyre, em"Casa-Grande & Senzala", iniciam-se os estudos sobre opaternalismo brasileiro. Freyre (1945, p. 79) observou que associedades agrícolas de Pernambuco e doRecôncavo baianoeram, antes de tudo, paternalistas: "A sociedade colonial noBrasil,principalmenteemPernambucoenoRecôncavobaiano,desenvolveu-se patriarcal e aristocraticamente à sombra dasgrandes plantações de açúcar, não em grupos a esmo einstáveis".↵

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45)�EntrevistaconcedidaporRinaraNívea,40anos,em2013.↵

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46)�EntrevistaconcedidaporRinaraNívea,em2013.↵

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47)�EntrevistaconcedidaporRinaraNívea,em2013.↵

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48)� Entrevista concedida por Tertulina Souza, 84 anos, em2013.↵

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49)� Entrevista concedida por Jacira Vasconcelos, 67 anos, em2013.↵

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50)� Entrevista concedida por Jacira Vasconcelos, 67 anos, em2013.↵

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51)�Efeitomoralepurificadorda tragédiaclássica,conceituadopor Aristóteles, cujas situações dramáticas, de extremaintensidadeeviolência,trazemàtonaossentimentosdeterrorepiedade dos espectadores, proporcionando-lhes o alívio, oupurgação,dessessentimentos.↵

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52)�EntrevistaconcedidaporVivaldoReis,64anos, em2013.↵

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53)� Entrevista concedida porAldenirReisVilaça, 35 anos, em2013.↵

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54)�EntrevistaconcedidaporJoaquimAlexandrino,85anos,em2013.↵

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55)� Entrevista concedida por Reinaldo Vasconcelos, 42 anos,em2013.↵

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56)�EntrevistaconcedidaporRicardoVasconcelos,48anos,em2103.↵

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57)�EntrevistaconcedidaporAntônioBarros,em2013.↵

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58)�Ibid.↵

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59)�EntrevistaconcedidaporAntônioBarros,80anos,em2013.↵

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60)�EntrevistaconcedidaporRicardoVasconcelos,em2013.↵

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61)�EntrevistaconcedidaporAlcileuVilaça,48anos,em2013.↵

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62)�Entrevistaconcedidapor JandersonSouzaVasconcelos,26anos,em2013.↵

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63)�EntrevistaconcedidaporAlcileuVilaça,48anos,em2013.↵

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64)� Entrevista concedida porConceiçãoVasconcelos, 69 anos,em2013.↵

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65)�EntrevistaconcedidaporAlcivaldo,em2013.↵

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66)�EntrevistaconcedidaporJoaquimAlexandrino,85anos,em2013.↵

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67)�EntrevistaconcedidaporJandersonSouza,em2013.↵

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68)�EntrevistaconcedidaporReinaldoBarros,em2013.↵

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69)� Entrevista concedida por Alcivaldo Pinto, 34 anos, em2013.↵

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70)�JoaquimAlexandrinodeSouzaéconsideradohojeumadaspessoasmaisparticipativaseinfluentesnocontextohistóricodacomunidade "Nossa Senhora deNazaré", noRepartimento doLimão. Joaquim esteve presente ano de 1968 na fundação dacomunidade, na reunião foi eleito o primeiro presidente dacomunidade e, este na ocasião doou um terreno de 50metrosdefrentepor80defundo.Foisempreatuante tantonadireçãodacomunidadecomopresidentedotimedaregião,oFlamengo.Este é umadas grandes referências da comunidade juntamentecomasuaesposaMariadaconceiçãodosSantosSouza.↵

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71)�EntrevistaconcedidaporJoaquimAlexandrino,em2013.↵

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Sumario

PREFÁCIO

INTRODUÇÃO

CAPÍTULO I: O FUTEBOL COMO ESPAÇO DE MANIFESTAÇÕESSOCIOCULTURAIS

1.1Ofutebolnocontextobrasileiro

1.2Ofutebolnocontextodascomunidadesestudadas

1.3Aspeculiaridadesevidenciadasnostorneiosdefutebol

CAPÍTULO–II:OFUTEBOL:OUTROSOLHARES

2.1Ojogodofutebol-Atrajetóriadeumamodalidade

2.2Ofutebolcomoformapopulardelazer

2.3Ofutebolcomomeiodeexpressãodocotidiano

CAPÍTULOIII:CAMINHOSTRILHADOSPELOFUTEBOL

3.1Ofutebolnogênerofeminino

3.2Ofutebolinfantil,sub17esub20

3.3Asmanifestaçõessocioculturaisevidenciadasnosespaçosdefutebol

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CONSIDERAÇÕESFINAIS

REFERÊNCIAS