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    GADIEGO CARRARO

    Passo Fundo, 2011

    MSICA E EDUCAOO CONTRABAIXO E A BOSSAuma perspectiva histrica

    e prtica

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    DEDICATRIADedico este livro a todos aquelesque acreditam no meu trabalho ecolaboraram de alguma forma,

    porque sem eles nada disso

    seria possvel.Obrigado, muito obrigado!

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    LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1 - Contrabaixo Acstico atual de 4 cordas.......................37

    Figura 2 - Contrabaixo Acstico atual de 5 cordas.......................37

    Figura 3 - Contrabaixo Eltrico 4 cordas (Precision Bass) ...........38

    Figura 4 - Contrabaixo Eltrico de 6 cordas .................................38

    Figura 5 - Contrabaixo Fretless (sem trastes) ................................38

    Figura 6 - Contrabaixo Semi-acstico (baixolo) ..........................38

    Figura 7 - Conduo caracterstica do contrabaixo no Choro .....41

    Figura 8 - Conduo caracterstica do contrabaixo no Samba ....42

    Figura 9 - Conduo caracterstica do contrabaixo na BossaNova .............................................................................................42

    Figura 10 - Luizo Maia (foto) ........................................................45

    Figura 11 - Zeca Assumpo (foto) .................................................45

    Figura 12 - Tonho Alves (foto) .......................................................45

    Figura 13 - Alex Malheiros e Tio Neto (foto) ...............................45

    Figura 14 - Dcio Rocha (foto) ........................................................46

    Figura 15 - Adriano Giffoni (foto) ..................................................46Figura 16 - Trecho de partitura orquestral, (Sinfonia n5,

    L. V. Beethoven), contrabaixo acstico dobrando a linhado violoncelo ................................................................................50

    Figura 17- Trecho de acompanhamento do contrabaixo noSamba-Funk, (msica Odil-Odil, Joo Bosco) ......................50

    Figura 18 - Exemplo de conduo harmnica no contrabaixo,(coluna: acordes no baixo) ..........................................................50

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    Figura 19 - Trecho demonstrando o contrabaixo na ticaimprovisativa, (msica Cor de Rosa, Nico Assumpo) ...........51

    Figura 20 - Trecho do Preldio em Sol Maior (J. S. Bach),

    Contrabaixo como instrumento solista ......................................51Figura 21 - Figurao rtmica que marcaria o acompanhamento

    caracterstico da Bossa Nova ......................................................56

    Figura 22- Chega de Saudade, ritmo independente doacompanhamento ........................................................................56

    Figura 23 - Figurao rtmica tradicional de acompanhamentodos instrumentos percussivos .....................................................56

    Figura 24 - Figurao rtmica de acompanhamento na Bossa Novafeita pela Bateria. A linha superior indica o ritmo feito pelavassoura na pele da caixa, a linha inferior indica a baquetatocada na borda da caixa............................................................57

    Figura 25 - Relao groove de contrabaixo com o bumbo dabateria ..........................................................................................57

    Figura 26 - lbum 78 RPM, disco de estria de Joo Gilberto,lanado em 1958 ..........................................................................60

    Figura 27 - Letra de Chega de Saudade. Foto de Vincius, Tome Gilberto ......................................................................................61

    Figura 28 - Esboos originais de Tom Jobim, includo Chega deSaudade em que o compositor escreve algumas linhas meldicas,inclusive para Elizete Cardozo ...................................................62

    Figura 29 - Programa do show no Carnegie Hall, em que a BossaNova mostrou ao mundo seu estilo ............................................64

    Figura 30 - Partitura de Chega de Saudade (trecho 1).................79

    Figura 31- Partitura de Garota de Ipanema (trecho 1) ................81

    Figura 32 -Partitura de Chega de Saudade (trecho 2)..................82

    Figura 33 - Partitura de Garota de Ipanema (trecho 2) ...............83

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    UDIOS CD

    udio 1 - Figura 7 Conduo caracterstica do contrabaixo no Choro

    udio 2 - Figura 8 Conduo caracterstica do contrabaixo no Samba

    udio 3 - Figura 9 Conduo caracterstica do contrabaixo na BossaNova

    udio 4 - Figura 16 Trecho de partitura orquestral, (Sinfonia n5, L. V.Beethoven), contrabaixo acstico dobrando a linha do violoncelo

    udio 5 - Figura 17 Trecho de acompanhamento do contrabaixo no

    Samba-Funk, (msica Odil-Odil, Joo Bosco)

    udio 6 - Figura 18 Exemplo de conduo harmnica no contrabaixo,(coluna: acordes no baixo)

    udio 7 - Figura 19 Trecho demonstrando o contrabaixo na ticaimprovisativa, (msica Cor de Rosa, Nico Assumpo)

    udio 8 - Figura 20 Trecho do Preldio em Sol Maior (J. S. Bach),Contrabaixo como instrumento solista

    udio 9 - Figura 21 Figurao rtmica que marcaria o acompanhamentocaracterstico da Bossa Nova

    udio 10 - Figura 22 Chega de Saudade, ritmo independente do

    acompanhamento

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    udio 11 - Figura 23 Figurao rtmica tradicional de acompanhamentodos instrumentos percussivos

    udio 12 - Figura 24 Figurao rtmica de acompanhamento na BossaNova feita pela Bateria. A linha superior indica o ritmo feito pela vassoura napele da caixa, a linha inferior indica a baqueta tocada na borda da caixa

    udio 13 - Figura 25 Relao groove de contrabaixo com o bumbo dabateria

    udio 14 - Figura 30 Partitura de Chega de Saudade (trecho 1)

    udio 15 - Figura 31 Partitura de Garota de Ipanema (trecho 1)

    udio 16 - Figura 32 Partitura de Chega de Saudade (trecho 2)

    udio 17 - Figura 33 Partitura de Garota de Ipanema (trecho 2)

    Bnus Track

    udio 18 - Chega de saudade Arranjo contrabaixos

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    SUMRIO

    AGRADECIMENTOS ....................................................................... 11

    PREFCIO ........................................................................................13

    APRESENTAO .............................................................................15

    1 UM CONTEXTO HISTRICO E PRTICO .................................171.1 Breve histrico do papel da msica na educao ............................191.2 O contrabaixo na Histria ..............................................................271.3 O contrabaixo no Brasil .................................................................371.4 O contrabaixo: caractersticas marcantes e principais atribuies .....461.5 Bossa Nova: aspectos histricos e culturais ....................................50

    2 EDUCAO E INTERAO.......................................................652.1 Um enfoque a partir da prtica mecnica x prtica refletida ............. 662.2 Da criatividade musicalidade, o que remete a reflexo .................. 69

    3 O CONTRABAIXO E A BOSSA: CONTRIBUIESDA PRTICA REFLETIDA ............................................................73

    3.1 Chega de Saudade e Garota de Ipanema: uma anlise

    contrabaixstica ....................................................................................74

    CONSIDERAES FINAIS.............................................................85

    GLOSSRIO .....................................................................................87

    SOBRE O AUTOR .............................................................................91

    REFERNCIAS .................................................................................93

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    PREFCIO

    A msica uma manifestao multifacetada, e no toa que JosMiguel Wisnick escolheu para o seu livro O Som e o Sentido (1989) osubttulo Uma Outra Histria das Msicas, em oposio aos livros quereduzem a histria da msica quela produzida no Ocidente nos ltimos 1500

    anos. O que unifica as msicas a sua origem no som e no silncio e o fato deque todos os povos possuem algum tipo de expresso musical. O que asdiferencia a natureza distinta das diferentes regies do mundo e a naturezadistinta de cada ser humano.

    A multiplicidade da msica, no entanto, fez com que frequentementefossem criadas dicotomias e rivalidades. No passado distante da Idade M-dia (mas no muito distante, se pensarmos que a msica existe certamente h

    mais de 35 mil anos), a Igreja Catlica criou a diviso entre a msica eclesi-stica e a msica profana, e ai de quem ousasse sujar a msica da igreja comelementos profanos. No entanto, estes elementos foram entrando pelas bei-radas, e o surgimento do moteto no final da Idade Mdia evidencia a ideia deque as msicas se misturam.

    No sculo XX, a principal dicotomia criada foi entre a msica eruditae a msica popular. Entre frequentes embates de defensores de uma e outra,

    elas no puderam ter outro destino que no mesclar seus elementos, e amsica de concerto passa a utilizar elementos da msica popular, e a msicapopular a assimilar elementos da msica erudita. E cria-se o Jazz e a BossaNova, com dissonncias da msica moderna de concerto. Por sua vez, oscompositores da msica de concerto se utilizam dos ritmos e harmonias des-sas novas msicas populares. E a academia, que inicialmente exclua as ma-nifestaes musicais populares, ou as via com desconfiana, finalmente co-

    meou a abrir suas portas, tendo como pontap inicial a fundao daBerklee

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    School of Music, nos Estados Unidos, prxima metade do sculo XX. NoBrasil ainda recente a ideia de estudar msica popular na academia, mas ademanda e o interesse por parte dos estudantes, pesquisadores e docentes

    das Instituies de Ensino Superior so crescentes, refletindo-se na criaode alguns cursos superiores de msica popular.

    O livro de Gadiego Carraro est em um espao entre a dicotomia doerudito e do popular, contribuindo significativamente para a rea, sem criarbarreiras, o que, sem dvida, parte de sua prpria vivncia musical - fazparte da sua msica. Tambm pela vivncia do autor, o foco o contrabaixoe a bossa nova. E o livro chega Bossa Nova passando pela msica erudita.

    E chega ao baixo eltrico remontando s origens do contrabaixo acstico.Ao mesmo tempo, um trabalho voltado educao e prope uma prticareflexiva no estudo do instrumento, pois entender o contexto de cada msica um pr-requisito de uma boa interpretao. Como a msica vive dos sonse dos silncios, no poderia deixar de haver uma parte sonora, em CD como autor em sua interface de intrprete, que exemplifica o que se l no livro eleva compreenso daquilo que no pode ser dito em palavras.

    Dr. Felipe Kirst Adami

    Porto Alegre, novembro de 2011

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    APRESENTAO

    O presente trabalho prope explanar a relevncia da prtica instru-mental com cunhos reflexivos, histricos e estilsticos, apontandocentralizadamente para a utilizao do contrabaixo na Bossa Nova,contextualizando ideias que possam contribuir no exerccio da prtica instru-

    mental.

    Com a inteno de localizar o leitor, apresentaremos um breve histri-co da msica na educao, algumas diferenas entre a prtica mecnica e arefletida, que sero entrelaadas tambm com um histrico do contrabaixo eda Bossa Nova, atentando para a contribuio destes aspectos tanto no es-tudo do instrumento como da performance. Esta pesquisa no visa especifi-camente formao tcnica de instrumentistas, mas quer constituir-se como

    mais uma ferramenta a auxiliar nesse assunto. Para isso, prope-se umembasamento histrico e terico, fundamentais para a performance musical eo estudo do contrabaixo.

    Sero tratadas questes referentes presena da msica em vrioscontextos, entre eles: histrico, cultural, social e educativo. Posteriormente,tentar-se- traar um histrico do contrabaixo destacando sua evoluo eutilizao na msica, em especial na Msica Popular Brasileira, com foco na

    Bossa Nova, estilo que tambm ser estudado quanto s questes histricase idealizadores. As contribuies da prtica refletida e da prtica mecnicasero analisadas no contexto da criatividade e da musicalidade, o que remetea reflexo e que devem estar presentes no estudo e na prtica instrumental.

    Por fim, sero analisadas duas obras em especial: Chega de Sauda-de, por dar origem ao estilo e Garota de Ipanema, por afirmar o estilomundialmente. Ser feito um paralelo dessas duas composies, tentando

    trazer a tona algumas de suas principais diferenas e semelhanas, contem-

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    plando alguns aspectos de anlise musical, entre eles: aspectos histricosreferentes s obras e ao compositor, forma, estruturao (harmnica, me-ldica e rtmica), instrumentao, entre outros pontos. Ser tratado de for-

    ma mais aprofundada a tica do contrabaixo, quanto a sua funo e contri-buio nesse contexto musical, oferecendo ao estudante a oportunidade deconhecer internamente a Bossa Nova e as principais funes do contrabaixonesse estilo, de forma que se possa ouvir e analisar os exemplos e tambmtoc-los.

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    UM CONTEXTO HISTRICO E PRTICO

    A busca por uma integrao que contemple a msica em diferentesaspectos, sem desmerecer um em detrimento do outro, imperativo nos diasatuais. A msica no contexto contemporneo privilegia o dilogo constantedesta com outras reas de conhecimento, valorizando o estudo integrado da

    teoria e da prtica. Neste capitulo abordaremos historicamente alguns mo-mentos do papel da msica na educao e na cultura do ser humano, tambmdo contrabaixo e da Bossa Nova, apontando para fatos relevantes em cadaum dos contextos, que posteriormente sero entrelaados e discutidos nodecorrer do trabalho. O intuito de pesquisar historicamente assuntoseducativos, instrumentais e estilsticos em msica, se justifica pela necessida-de de no impor barreiras quanto ao estudo da msica e suas inter-relaes,

    propondo uma base terica fundamentada e contextualizada sobre a sua amplautilizao, seja na educao musical, no estudo do instrumento ou naperformance.

    Os primeiros experimentos do homem com a msica, conforme pon-tua Sekeff (2003), diz respeito msica como parte do processo natural davida do ser humano, quando se propunha atravs dela, ideias, valores e pr-ticas que fizeram parte da cultura1de vrios povos. Um veculo para expres-sar emoes e sentimentos, o que fez da msica parte vital e fundamental naformao e expresso do homem no passar dos tempos.

    No decorrer do processo de construo de cada culturaespecfica, o ser humano transformou em linguagem expressiva arelao (inicialmente utilitria e funcional) com o fenmeno

    1

    1 Neste sentido o termo cultura est sendo empregado em torno da tica musical, e desua contribuio individual para a formao global da prtica comum de um povo,que remete sempre a um tipo de cultura especfica.

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    sonoro, chegando denominao atual de msica como jogo deorganizao e relacionamento entre som e silncio que aconteceno tempo e espao [...]. O homem primitivo comunicava-se pormeio de sons e silncios que traduziam informaes objetivas,

    mas que provocavam tambm sentimentos e emoes (BRITO1998, apud, JOLY, 2003, p. 114).

    Tais acontecimentos ocorreram e ocorrem justamente por que a msi-ca possui inmeras utilidades e funes, impactando profundamente aracionalidade e a emoo do ser humano. A manipulao dos sons, sempreocorreu de maneira natural e vital para o homem, sendo oportuno citar queas culturas que delegaram e valorizaram a msica em patamares mais am-

    plos, obtiveram significativo sucesso. Seja ela utilizada em rituais religiosos,em momentos festivos, ou ainda fazendo parte de prticas educativas e for-madoras, o fato que nas civilizaes nas quais a msica foi valorizada,houve significativas mudanas e evolues em suas sociedades, contribuindopara a formao tica, social e como parte integrante da formao educaci-onal do indivduo (BEYER, 1993). Em contrapartida, houve situaes emque ocorreram distanciamentos da msica com relao a sua aplicabilidade

    s realidades especficas de cada povo, suas necessidades e prticas, sendoela muitas vezes aplicada sob um enfoque opressor e arbitrrio, como pode-mos ver em alguns momentos da histria (incio do cristianismo romano, quan-do a msica esteve quase que exclusivamente a servio da igreja, sem outrosfins especficos), um descaso quanto diversidade de usos e recursos comrelao msica e um desligamento de sua importncia cultural.

    Um desvio tico que aos poucos a Etnomusicologia est possibilitan-do mudar. Mudana que ocorre principalmente pelo estudo da msica, em

    seu contexto etnolgico, isto , considerando no somente componentes es-truturais e estilsticos, mas o papel que a msica tem na cultura e suas fun-es na ampla organizao social e cultural do homem (MERRIAM, 1964,apud, THIESEN, 2007, p. 140). Um aprofundamento de uma das linhas depesquisa da Musicologia que contribui para entendimento sobre as culturasde maneira menos prejudicial e taxativa, observando a mesma, sem analis-la de maneira padronizada e pr-estabelecida, trazendo dados cada vez mais

    fiis e precisos sobre o estudo da msica em cada cultura.

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    1.1 Breve histrico do papel da msica na educao

    Ao longo dos tempos, muitos educadores investigaram as fases de

    desenvolvimento humano no processo de ensino-aprendizagem, entre elespodemos destacar Jean Piaget2(1896-1980). Props ele uma nova tica arespeito de como ensinar e de que forma o indivduo responderia a diferentestipos de estmulos. Diante desse novo contexto e aps muitos anos de pes-quisa, a msica comea a ser entendida como uma ferramenta muito maisatuante no desenvolvimento mental e psicolgico do sujeito. Esta abordagemrevela novas interfaces e objetivos a serem alcanados no ensino da msica,seja no mbito da educao musical ou do ensino instrumental.

    Ester Beyer revela que:

    Os registros mais antigos da existncia de aulas de msica soencontrados entre os egpcios, provavelmente datados por voltade 2500 a. C., poca da V e da XII Dinastia [...]. Sendo que naChina, a formao musical desempenhava importante papel napoca deDschou (1050 a 256 a. C.), onde meninos aprendiamcanto e dana. [...], tanto na cultura egpcia como chinesa, percebe-

    se que a formao musical, bem como o ensino da msica, estavacondicionada a funes atribudas a sociedade [...], (1993, p. 5).

    medida que mais pesquisas relacionadas com o desenvolvimentohumano avanam, de maneira mais clara e indiscutvel, pode- se afirmar so-bre a importncia do ensino musical independentemente do contexto, se ins-trutivo ou curricular. O artigo A importncia da msica para as crianas(abe-msica) revela que, Pesquisadores da Universidade deKonstanz, na

    Alemanha, concluram que a exposio msica reconecta os circuitos neurais[...], como outros circuitos formados cedo na vida, os da msica permane-cem gravados na memria (ABEM, 2002, p. 9). Da a importncia da m-sica na vivncia do ser humano. Como o texto acima nos indica, a ligaoentre o homem e a msica muito longeva, os registros remetem a mais dequatro mil anos de existncia de ensino musical. Porm, se pensarmos navivncia prtica do homem com a msica, ou seja, no fazer musical,ento

    2 Bilogo e epistemlogo suo.

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    teremos que retroceder a perodos muito mais longnquos, retornando radi-calmente as razes da humanidade. A relao do homem com o fazer musicalest diretamente ligada com o tocar, produzir e experinciar msica, pro-

    movendo uma forma de discurso que to antiga quanto prpria raahumana (SWANWICK, 2003, p. 18). Pontuaes como essas, transpor-tam e projetam a msica a outro patamar valorativo, o que sugere a ela umaimportncia vital e circunstancial na vida humana.

    Inmeras culturas delegaram a msica um importante papel, sendo aela atribudas muitas funes como podemos ver a seguir:

    Para os egpcios a aprendizagem musical estava voltada para o

    ensino do instrumento e do canto, vinculada iniciao do ritualou culto a divindade [...]. Na concepo dos chineses a msicatinha uma importncia tica muito grande no indivduo, sobretudona formao do ser [...]. Na Grcia a educao musical ocupavalugar importante na formao das crianas e jovens [...], sendo amsica parte integrante de todo o processo de educao doindivduo [...], (BEYER, 1993, p. 5 e 6).

    O texto acima revela e confirma questes significativas, demonstrando

    a relevncia da msica no desenvolvimento do ser humano e da sociedade.Atravs dela percebe-se uma contribuio expressiva para a evoluo devalores e conceitos, seja como canal de elevao espiritual, promovendotoda a atmosfera necessria para o desenvolvimento dos ritos religiosos comoocorria na sociedade egpcia, processo que tambm foi utilizado no cristia-nismo, ou ainda participando na formao tica e educativa do indivduo.

    Os chineses tambm acreditavam muito no poder da msica, atribuam

    a ela uma importncia fundamental para a formao do sujeito, indo alm dosritos religiosos apenas, utilizando a contribuio da msica tambm no pro-cesso de construo do carter do seu povo.

    O mesmo ocorreu na Grcia, porm em propores ainda maiores.L a educao musical fazia parte da formao integral do sujeito (BEYER,1993), sendo em nveis bastante aprofundados, como por exemplo, o estudodas relaes entre msica e matemtica, formaes intervalares, alm dasrelaes com outros assuntos, como descreve Beyer:

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    A criana recebia educao em msica3. Plato defendia oequilbrio entre as disciplinas, alertando sobre o perigo davalorizao de uma em detrimento das outras. Era opinio quetoda a criana seria capaz de ter uma educao em msica. Essa

    educao tinha continuidade para o jovem que estudava entreoutras disciplinas, msica num nvel mais avanado (1993, p. 6).

    Tais pensamentos, advindos da cultura grega, contriburam para a rea-lidade em que vivemos hoje, seja na forma de pensar, de educar, ou no pro-cesso de construo do conhecimento. Em todos os contextos nos quais amsica esteve envolvida, desde o surgimento do homem, que segundo(SEKEFF, 2003) tem origem na mente humana, apontam para a valorizao

    da msica com destaque em algumas civilizaes.O perodo que vai do Imprio Romano (27 a. C. 476 d. C.) at a

    Idade Mdia (476 d. C. 1453 d. C.), compreende uma poca em que amsica no possua importncia to relevante para a educao. Como disse-mos anteriormente, existia a idia da utilizao do ensino em msica voltadoa formar alunos que pudessem exercer atividades musicais na igreja. Porm na transio para com o incio da Idade Mdia que ocorre uma diviso im-

    portante, compreendendo duas variedades de indivduos envolvidos com aarte musical: oMusicusque possua formao musical ampla, conhecendoas relaes entre a msica e as disciplinas matemticas (direcionamento aopadro grego de educao musical) e oKantor, esse com vivncia prticacom relao msica, suas atividades musicais estendiam-se ao servio reli-gioso. Essa diviso props enxergar a msica por outros mbitos, o queconseqentemente instigou aspiraes maiores sobre os propsitos da for-mao musical intelectualizada, ou seja, uma visualizao mais abrangente da

    msica e de sua utilizao.O Humanismo4renascentista assume um papel importantssimo diante

    dessa situao, no s para o entendimento da msica, mas de toda manifes-tao artstica. Posto que a partir desse movimento que a composio ou

    3 Referente educao nas musas, que inclua alm de msica, poesia e movimentos.4 Movimento intelectual caracterstico da Renascena. Valorizava um programa educa-

    cional e cultural baseado na antiga literatura grega. O foco estava no indivduo e nassuas relaes terrenas. Mais informaes vide(PERRY, 1999).

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    criao, em sentido geral, comeam realmente a possuir valor artstico. Oque tambm interferiu no processo educativo, proporcionando uma maiorincidncia de alunos a estudarem em escolas e instituies, e que mais tarde

    se transformariam em Universidades. O pensamento humanista seria o prin-cipal pndulo desses significativos progressos na educao renascentista, fa-vorecendo no desmembramento da formao musical com direcionamentosno apenas religiosos, de modo que as escolas j no necessariamente esta-riam vinculadas a religio. Uma viso multifacetada aberta a novas possibili-dades, que valorizava o talento humano e suas realizaes (PERRY, 1999).

    Surgem ento, conceitos que para o mundo das artes, tornar-se-iamvalorosos, entre eles o indivduo capaz de expressar-se e propor uma viso

    de mundo a partir de sua prpria tica. Com a Reforma, importantes impli-caes ocorreram no mbito da educao musical, entre elas a iniciativa deviabilizar escolas para mais alunos e de incluir a msica como elemento ne-cessrio formao desses alunos, (BEYER, 1993).

    Comenius5(1592-1670) refora a idia da formao educacional ini-ciada pelos sentidos e pela ao do sujeito. Para este pensador, toda a auladeveria ser clara e com proximidade do real, incentivando a prtica musical e

    o canto no ensino das crianas. Com J. J.Rousseau6

    (1712-1788), o pro-cesso educacional ganha outro impulso. Rousseau prev uma pedagogia di-ferente para o ensino infantil, que no deveria ser avaliado por moldes adul-tos, pois esses no correspondiam mente da criana, que deveria ser res-peitada no seu desenvolvimento, influenciando muitos pedagogos musicaisno sculo XIX.

    J Guido Adler7(1885-1944), prope a valorizao e a organizaodos campos de estudos da msica, relacionando-os com a musicologia siste-mtica e a histria. Menciona, ainda, a pedagogia musical como campo deconhecimento cientfico, capaz de relacionar-se e promover importante

    feedback com outras disciplinas. Nesse momento a msica comea a serintegrada como rea de conhecimento, capaz de contribuir no processo edu-cacional e, assim, promover o dilogo e o debate com outras reas. O con-

    5 Professor, cientista e escritor tcheco, considerado o fundador da Didtica Moderna.6 Filsofo suo, escritor, terico poltico e compositor musical autodidata.7 Professor e musiclogo.

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    ceito de Adler prope o posicionamento da msica em relao a outras re-as, dando indcios da sua possvel contribuio no processo de construodo conhecimento, porm faltaria ainda uma concepo terica a respeito

    desse assunto. Isso se tornaria possvel atravs da teoria desenvolvimentistade Jean Piaget, Atravs desta teoria, reconstri-se a possibilidade de umainterao equilibrada entre ao e reflexo musicais e de construo do co-nhecimento segundo etapas adequadas de desenvolvimento do educando(BEYER, 1993, p. 12). Sekeff tambm nos esclarece que:

    A linguagem musical no somente um recurso de combinao eexplorao de rudos, sons e silncios, tambm um recurso de

    expresso (sentimentos, idias, valores, cultura e ideologias), decomunicao (do indivduo com ele mesmo e com meio que ocircunda), de gratificao (psquica, emocional, artstica), demobilizao (fsica, motora, afetiva, intelectual), e tambm de auto-realizao (o indivduo com aptides artstico-musicais, que maiscedo ou mais tarde as direciona a um fazer pelo qual se realiza),ou simplesmente de apreciao, vivendo o prazer da escuta (2003,p.13).

    A autora se refere justamente ao potencial educativo da msica, per-cebendo a linguagem musical de maneira muito mais abrangente e facetada, oque prope significado a msica em um contexto mais amplo.

    Ao longo da histria, a educao em msica esteve voltada a vriassituaes distintas. Poderia ela ter fins religiosos, de formao do ser e atmesmo de entendimento da msica como um fim em si mesmo. Em muitasvezes, porm, ocorreu a valorizao de um contexto e a desvalorizao deoutro, o que privilegiou acentuadamente em muitos momentos o canto e oaprendizado formal de um instrumento. Essas prticas no davam a idia deeducar musicalmente de maneira ampla, ou seja, contribuindo para o desen-volvimento musical em diferentes aspectos, antes contemplavam a msica deuma maneira geral ou especfica e no conjunta (BEYER, 1993), que come-aria a mudar com o estudo desenvolvimentista de Jean Piaget, contribuindopara que se entendesse melhor a estruturao do conhecimento musical.

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    A educao musical deveria buscar o equilbrio entre umatendncia de formao mais geral e uma formao mais especfica.Em outras palavras deve ser disciplina de acesso a todos, para asnoes bsicas, sem descuidar a formao do profissional em

    msica. Ambos as tendncias funcionariam de modo paralelo,num sistema de retroalimentao mtua, onde a formao bsicalevaria alunos melhor preparados s escolas superiores (ouuniversidades) e os profissionais em msica contribuiriam para amelhoria do ensino bsico (BEYER, 1993, p. 13).

    Beyer refere-se ao conceito de utilizao simultnea da msica comoferramenta diversificada na educao, capaz de contemplar a formao doeducando em vrios nveis, desde os primeiros passos no aprendizado musi-cal, at questes mais avanadas, de modo que tambm no poderamosdeixar de citar, a relao que contempla o equilbrio do processo educativo-musical no quesito terico-prtico, em que podemos propor umacomplementao do pensamento de Beyer, atravs do texto de Oliveira:

    Como meta o educador musical em todos os nveis de atuao,do elementar ao superior, a formao em msica para ser bemsucedida tem de abordar concomitantemente a prtica e a teoria.Desta forma equilibra-se a relao entre a expresso e a formao,entre a criao e a imitao, entre o fazer e o entender, entre aemoo e a razo (1993, p.45).

    Alguns pontos pertinentes no dilogo da msica x educao estiveramrelacionados necessidade de construir uma base terica, que pudesse serfundamentada e apoiada em pesquisas cientficas, de modo a fornecer o su-porte terico necessrio para sustent-la e subsidi-la como rea de conhe-cimento significativa e atuante. Portanto, torna-se necessrio esclarecer algu-mas pontuaes, que so muito bem apresentadas no texto a seguir:

    [...] Se tem validado da fora das caractersticas psicolgicas damsica, para vincular essa linguagem as cincias de conduta -,antropologia, sociologia, psicologia e para estimular formassaudveis de comportamento e recuperao. Cabe tambmlembrar, em relao aos educadores, que novas teorias

    psicolgicas dos anos 80 e 90 estabelecem uma reviso da

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    abordagem e da conceituao das faculdades cognitivas inteligncia, aprendizagem, conhecimento e emoo -, que sebeneficiam da prtica da vivencia musical [...]. Hoje modernaspesquisas psicolgicas confirmam que processos de ideao

    esto fundamentalmente ligados aos sentimentos, e quesentimentos so estimulados pela prtica musical (SEKEFF, 2003,p. 49 e 50).

    A autora apresenta direcionamentos de alguns princpios que se tor-nam relevantes na relao msica-educao, em que questes relacionadasaos processos de construo do conhecimento, a aprendizagem, a intelign-cia, a cognio, demonstrando a relevncia da vivncia e da prtica musical.

    Oliveira (1993) esclarece algumas questes sobre pesquisas no campo dapsicologia, comentando sobre as teorias de aprendizagem e a sua diviso emdois grandes grupos: a associacionista8e a cognitiva9. A autora pontua tam-bm sobre a poca em que movimentos relacionados valorizao dacriatividade na educao comearam a surgir, apoiados em pesquisas depsiclogos como Carl R. Rogers10e Joy P. Guilford11, nas quais a educaomusical tambm se inseriu atravs de atividades improvisativas, de explora-o de timbres e de liberdade por parte do aluno em explorar ambientes commateriais sonoros diversos, o que, no entanto, em um primeiro momento,no se revelou producente. Segundo Oliveira (1993), muitos trabalhos signi-ficativos tm surgido nos Estados Unidos e Europa, onde o currculo de m-sica tem se especializado na rea, proporcionando cursos mais criativos, comapoio de multi-meios e recursos interdisciplinares.

    As ltimas dcadas trouxeram muitas novidades para a tica da edu-cao de um modo geral, promoveu-se significativo avano nesta rea. Mui-

    8 Prev a aprendizagem quando o aluno atravs da tentativa e do erro adquire umconjunto de habilidades especficas.

    9 O conhecimento adquirido atravs do relacionamento dos meios com o fim, demodo que, o aluno constri seu conhecimento. Mais informaes sobre tais concei-tos, vide(OLIVEIRA, 1993).

    10 Psiclogo norte-americano, considerado o precursor da psicologia humanista.11 Psiclogo americano que desenvolveu no final dos anos de 1940 um modelo de

    entendimento humano que serviu de fundamento pesquisa moderna sobre acriatividade.

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    tos desses avanos estiveram relacionados a pesquisas no campo da psico-logia. Com Jean Piaget descobriu-se inmeras novidades sobre as formas deestruturao do conhecimento, o que instigou muitos trabalhos na rea da

    educao musical, ajudando a segmentar ainda mais a eficcia e a importn-cia da msica no processo educativo, trazendo reflexos tambm para o ensi-no do instrumento e da performance musical.

    A msica passou por vrios nveis de importncia ao longo dos tem-pos, fazendo parte inicialmente do cotidiano expressivo, comunicativo e reli-gioso do homem, contribuindo fortemente tambm para a formao tica esocial de alguns povos, finalmente assumindo finalidade importante no pro-cesso educativo e na construo do conhecimento do indivduo. Atravs de

    pesquisas nos campos da psicologia, elucidou-se a importncia e utilizaoda msica na cultura e na educao do ser humano. A partir desse momento,direcionaremos e discutiremos esses assuntos ainda na tica histrica, po-rm, em relao ao contrabaixo e a Bossa Nova, destacando os fatos quecontribuiro para o surgimento de ambos.

    1.2 O Contrabaixo na Histria

    Falar a respeito da histria do contrabaixo nos remete a enten-der um pouco mais sobre a utilizao desse instrumento ao longo dos tem-pos, desde sua tmida participao no incio do seu surgimento, at sua ex-plorao extrema nas mais variadas formas nos dias atuais. Propor uma ex-perincia histrica reflexiva a partir deste instrumento contribuir e explorarainda mais o universo da msica, tanto no mbito instrumental como noeducativo.

    Segundo Pescara12,

    O fato de o contrabaixo ser usado amplamente tanto na msicapopular e como na msica erudita, aliado sua fundamentalimportncia em qualquer tipo de msica, faz do contrabaixo um

    12 Jorge Pescara msico, contrabaixista, compositor e pesquisador. Venceu em 1991 o1 concurso nacional de composio para contrabaixo promovido pela UNESP.

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    dos instrumentos que mais evolui, tcnica e expressivamentenos ltimos anos. Nunca na histria da msica um instrumentoteve to grande aplicao em gneros e estilos to diversos ecom enorme desenvolvimento em perodo to curto da histria,

    (2005, p. 19).

    O contrabaixo est protagonizando hoje no meio musical, um momen-to de muitas inovaes, (PESCARA, 2005). Tais inovaes ligam-se direta-mente diversidade mltipla de utilizao que o contrabaixo prope na m-sica, seja apenas reforando e dando sustentao a uma harmonia grave,desempenhando papel de pndulo rtmico-harmnico, ou, ainda, atuando comoinstrumento solista.

    O fato que, quanto mais se desenvolve a msica, a qualidade dosinstrumentos e a capacidade tcnica dos instrumentistas, maiores as possibi-lidades de insero desse instrumento na prtica musical. Hoje existem or-questras de contrabaixo, concertistas solo, tanto no mbito da msica or-questral como da msica popular. Entre eles esto, os contrabaixistas brasi-leiros Marcos Machado13e Snia Ray14, que, alm de exercerem atividadesdocentes e de pesquisa, tem levado o nome deste instrumento a vrios luga-

    res do mundo, demonstrando que no h limites para a utilizao docontrabaixo, seja na msica Erudita, no Jazz, na Bossa Nova e em tantosoutros estilos nos quais o contrabaixo est presente, ajudando a promover acultura musical e a pesquisa em msica.

    Algumas mudanas que precederiam o surgimento do contrabaixocompreendem um perodo no qual a msica comea a ter significativas ino-

    13 Doutor em msica pela University of Illinois. Professor de contrabaixo erudito e jazzna University of Southern Mississippiem Hattiesburg. Spalla daMeridian SymphonyOrchestra. Tambm desenvolve carreira internacional como solista. Seu virtuosismotem despertado ateno por onde tem passado em especial do compositor america-no Frank Proto.

    14 Professora da EMAC-UFG. Doutora em Performance e Pedagogia do Contrabaixopela Universidade de Iowa, EUA, solista e camerista tendo feito a estria de diversasobras brasileiras para contrabaixo. Scia-fundadora da ABC (Associao Brasileirade Contrabaixistas). Atualmente, desenvolve projetos de pesquisa nas reas depsicologia da performance musical e de catalogao (edio e editorao) de msicabrasileira para contrabaixo.

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    vaes. Sabe-se que at ento os relatos de msica mais antiga que conhe-cemos, tanto sacra como profana, referem-se msica com apenas umamelodia, ou seja, monofnica. Nos sculos XII e XIII, iniciam-se alguns acon-

    tecimentos importantes em termos musicais, em que compositores deorganum15pertencentes Escola deNotre Dame16promovem significativaevoluo da msica, acrescentando outras linhas meldicas s composies,fazendo surgir obras para serem cantadas fora do mbito da igreja, dandoorigem a outros estilos musicais como oMoteto17, conseqentemente, inici-ando uma era de novos conceitos em termos composicionais e musicais, queeclodiria e ficaria mais acentuada na Msica Renascentista18(1450-1600).

    Tais acontecimentos contriburam para a ampliao da tica musical,

    abrindo campo para novas experimentaes, novos estilos, proporcionandoum ambiente favorvel ao surgimento de mais compositores, construtores deinstrumentos, favorecendo o desenvolvimento musical da poca, inclusiveviabilizando a existncia do contrabaixo.

    Por volta do ano de 1200, o nome Gigeera usado para denominartanto a rabeca (instrumento de origem rabe), como o Guitar-

    Fiddle(espcie de violo com formato parecido com o violino),

    na Alemanha naquela poca todos os instrumentos tocados comarcos eram chamados pelo nome Gige [...]. Aproximadamente em1450, comeou-se a usar o registro de baixo, que at ento noera considerado. Com essa nova tendncia para os graves, osmsicos precisavam de instrumentos especiais, capazes dereproduzir ou fazer soar as partes graves. A soluo encontradapelos construtores da poca, foi simplesmente reconstruir osinstrumentos existentes, s que em escala maior, aumentando-lhe o tamanho, mas sem trocar a forma ou modo de construo

    desses novos instrumentos (PESCARA, 2005, p. 17).

    15 Msica com mais de uma linha meldica (polifnica).16 Grupo de msicos ligados catedral deNotre Dame(1163) em Paris, que alcanaram

    admirvel estgio na composio do organum.17 Do francs mots, que significa palavra, compreendia a adequao de mais de um

    texto a ser usado na mesma composio.18 Termo aplicado a histria da msica ocidental que se estende aproximadamente de

    1450 at final do sculo XVI. Buscava restaurar os ideais artsticos da AntiguidadeClssica, repudiando o ideal da Idade Mdia.

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    moderno que estaria presente na msica orquestral, de cmara, inicialmentecom trs cordas e, posteriormente, com quatro em seguida chegando a cincocordas (DE DONNO, 2006).

    Em geral, uma orquestra sinfnica moderna, tem pelo menos oitocontrabaixos. A msica de cmara com contrabaixo inclui o Septetode Beethoven (1770-1827), o quinteto A truta e o Octeto deSchubert (1797-1828), e um Quinteto de cordas de Dvork (1841-1904). Os compositores do sculo XX exploraram o contrabaixoem sua busca de timbres menos familiares, por exemplo, oQuinteto de Prokofiev (1891-1953) e obras de Henze (b. 1926),muitas das quais usam harmnicos21artificiais (GROVE, 1994, p.

    217).

    Aps comear a ser utilizado como parte integrante e efetiva da or-questra, o contrabaixo se expandiu muito em utilizao e representatividadenas formaes musicais. Muitos instrumentistas ao longo da histria ajuda-ram a difundir esse instrumento, mas um em especial, contribuiu muito parainovaes no incio desse processo. Seja pela forma de tocar os dedilhadosde mo esquerda, como tambm de conseguir melhor desempenho no arco,

    Domnico Dragonetti (1763-1846), que apesar de tocar em um instrumentoque ainda possua trs cordas apenas, foi fundamental na divulgao e tam-bm insero do contrabaixo como instrumento solista apresentando-se re-gularmente em concertos e festivais de provncia durante meio sculo que seseguiu, ganhou fama por suas interpretaes expressivas e virtuossticas [ ](GROVE, 1994, p. 278). Dragonetti comps muitas obras para esse instru-mento, que so referncia at hoje para quem pretende seguir os estudos do

    contrabaixo orquestral. Alm de Dragonetti, outro grande instrumentista quecontribui para o desenvolvimento do contrabaixo acstico foi GiovanniBottesini (1821-1889), que devido a seu extremo virtuosismo, ficou conhe-

    21 Sons parciais que normalmente compe a sonoridade de uma nota musical. Nosinstrumentos de cordas podem ser naturais e artificiais. O primeiro gerado fazendoque uma corda vibre em determinadas sees, tocando-a levemente no ponto ade-quado. J o segundo pode ser produzido, prendendo-se a corda e, ao mesmo tempo,roando-a levemente uma quarta acima, o que resulta em uma nota duas oitavasacima, mais informaes videGrove (1994).

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    cido como o Paganini22do contrabaixo. Estes instrumentistas promoveramgrande avano para o contrabaixo na tica solista, abrindo caminho para quemuitos outros grandes msicos surgissem.

    Um desses nomes Franois Rabbath (n. 1931), um contemporneodo contrabaixo que mistura com muita genialidade elementos da msica deconcerto com a msica tnica, aliado a tcnica extremamente avanada nocontrabaixo. Trouxe grandes desenvolvimentos para a pedagogia deste ins-trumento e para explorao de novas tcnicas, considerado um dos gran-des nomes do contrabaixo contemporneo. No Jazz msicos como CharlesMingus (1922-1979), atravs do seu grande potencial criativo, ajudaram emuito na expanso das tcnicas do contrabaixo para outros estilos alm da

    msica orquestral. Mingus foi um grande compositor no estilo jazzstico, mis-turando magistralmente a composio com a improvisao (GROVE, 1994).

    As principais diferenas do contrabaixo acstico de hoje para seuantecessor Violone, estavam nos trastes regulveis do antigo, que no exis-tem no atual, alm de evolues ocorrentes na matria prima de algumaspeas. Entre elas: tarraxas antes construdas em madeira e atualmente emmetal, cordas que antigamente eram feitas de tripas de animais, agora cons-

    titudas de ao revestido, o espelho mais encurvado nos dias de hoje, almdo arco que se distingue entre alemo e francs e que diz respeito tcnicaempregada ao tocar, j que a origem do mesmo italiana.

    Desde que o contrabaixo acstico teve sua estrutura praticamente de-finida no sculo XVIII, vinha ele sendo utilizado na msica orquestral e, nosculo XX, tambm em diferentes formaes musicais, como big bands epequenos grupos de jazz (Ragtime, Dixieland, Swing, Blues, entre outros).Essa utilizao se expandiu ainda mais, devido tcnica depizzicato, que sediferenciava da tcnica de arco principalmente por ser tocada com os dedosdiretamente nas cordas e no atravs do arco. O que implicou em uma mu-dana radical em sua sonoridade e concepo, que foi muito bem absorvidapor gneros como Jazz, Blues (Estados Unidos), tambm pelo Samba e aBossa Nova (Brasil) alm de vrias outras culturas.

    22 Nicolo Paganini (1782-1840), um dos maiores virtuoses do violino de todos os tem-pos, chamava muita a ateno para o significado do virtuosismo como elementoartstico.

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    Por volta da dcada de 1950, surgiria um instrumento que revolucio-naria o mundo dos graves. Atravs da popularizao do contrabaixo, surgecom Lo Fender23(1909-1991), um novo olhar para este instrumento, Fen-

    der observou que o contrabaixo acstico apresentava alguns inconvenientespara pequenas formaes musicais, como seu tamanho e sua baixa sonorida-de (PESCARA, 2005, p. 18). Se atentarmos para documentrios e showsde muitas bandas da poca, observaremos que a utilizao do contrabaixoacstico ainda era uma constante em muitos estilos. O prprioRockabillyeoRock and Roll,contemplavam o contrabaixo acstico em sua formao,sendo que a guitarra com seu som amplificado possua significativa vantagemem termos de volume, com relao ao contrabaixo mesmo sendo ele

    microfonado.

    No final dos anos 40, a amplificao j desempenhava um papeldominante na msica popular americana. Amplificadores, P. As.,captadores e a guitarra Fender Telecaster eram os elementosprincipais de uma tendncia rumo ao volume mais alto. Algunscontrabaixistas limitados a enormes contrabaixos acsticos instalaram captadores, usando amplificadores adaptados paraesse fim [...]. Consciente do problema que os contrabaixistasenfrentavam Fender comeou, em 1950, a trabalhar num prottipode um contrabaixo eltrico (PESCARA, 2005, p. 19).

    Leo Fender instituiria um instrumento que possuindo a mesma afinaodo contrabaixo acstico e mesma tessitura, desempenharia objetivamente amesma funo desse instrumento na msica popular. No seria mais tocadoverticalmente como o caso do contrabaixo acstico, agora seria utilizado

    na horizontal, seguindo o mesmo panorama da guitarra eltrica (at porqueeste novo instrumento parecia-se e muito com uma guitarra). Este instrumen-to possua trastes na escala ao contrrio do contrabaixo acstico, uma capta-o capaz de equilibrar o volume sonoro com os outros equipamentos einstrumentos eltricos, alm de oferecer uma comodidade muito grande, tan-to no mbito de tocar como de transportar o instrumento. Surgiria em 1951

    23 Perito em eletrnica de rdios. Fundador da: Fender Musical InstrumentsCorporation. Inventor da guitarra eltrica e posteriormente do contrabaixo eltrico.

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    oPrecision Bass, que na concepo de Leo Fender garantiria uma maiorpreciso na sua execuo e a resoluo de muitos inconvenientes enfrenta-dos pelos instrumentistas populares.

    Em pouco tempo o contrabaixo eltrico j era uma realidade no mun-do da msica. Suas principais semelhanas com relao ao contrabaixo acsticoestariam na extenso e na afinao das cordas, constituindo instrumentosdistintos nas demais caractersticas, como no nmero de cordas e nas tcni-cas empregadas. De l para c, o contrabaixo eltrico vem adquirindo per-sonalidade e caractersticas cada vez mais prprias e marcantes (PESCA-RA, 2005). Para o mundo dos graves24, um nome em especfico a represen-tar este instrumento : John Francis Pastorius III(1951-1987) popularmente

    conhecido como Jaco Pastorius. Props ele uma nova tica a respeito decomo tocar este instrumento, que at ento tinha muita influncia da tcnicado contrabaixo acstico. Com Jaco, surgiria uma linguagem prpria nesteinstrumento, que seria seguida posteriormente por baixistas de vrias partesdo mundo, mesmo aps sua morte, a poderosa sonoridade de Jaco Pastoriusse faz presente na mente e nos coraes de muitos baixistas ao redor domundo (WOOD, 2002, p. 24).

    Com o passar dos anos surgiram muitas marcas e modelos decontrabaixos. O instrumento que derivou do Violone, atualmente, chama-do e conhecido no meio musical por contrabaixo-acstico, contrabaixo deorquestra ou at mesmo rabeco, j o instrumento criado por Leo Fender conhecido nos dias atuais como contrabaixo eltrico, baixo eltrico ou ape-nas baixo. Porm, existem, ainda hoje, no meio musical, muitas discrepnciasquanto diferenciao entre os modelos (tradicionais25) de contrabaixos. comum algum chegar a uma loja musical pedindo um oramento de umcontrabaixo acstico e receber o oramento de um baixolo26ou vice versa.

    24 O termo refere-se linguagem popular de como o contrabaixo conhecido e chama-do entre o meio musical.

    25 Diz respeito s verses convencionais e mais usuais conhecidas deste instrumento.26 Instrumento que tem origem a partir da construo do contrabaixo eltrico. Possui

    uma caixa acstica e um sistema de captao de som semelhante ao violo, que lhepermite ser tocado eletrificado ou no. Desempenha a mesma funo do contrabaixoeltrico, sendo normalmente utilizado em shows acsticos.

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    Ou ainda ouvir at mesmo de msicos e profissionais da rea, comentriosnos quais pensam estar se referindo a um tipo de instrumento e na realidadeesto fazendo meno a outro.

    De fato a cultura que at meados dos anos 1950 tinha apenas ocontrabaixo acstico como referncia, com o surgimento do contrabaixo el-trico, reduziu inicialmente o interesse no contrabaixo acstico. Este instru-mento ficou restrito, em alguns momentos, a instrumentistas do meio orques-tral e alguns poucos msicos de grandes cidades e centros musicais. Estamudana de interesse por parte de alguns msicos pode ter ocorrido tantopela praticidade que o contrabaixo eltrico oferecia, seja em termos de volu-me e facilidade de transporte, viabilidade econmica e pelo surgimento de

    gneros musicais como oRock.Atualmente, existem muitos modelos de contrabaixo no mercado, jun-

    tamente com muitas experimentaes, fuses de um instrumento com outro.Um resultado da rpida evoluo do mundo moderno e da facilidade noacesso a informao e especializao profissional especfica. O aumento noquesito ofertaprocura resulta em grande diferena na relao tempo-evolu-o da primeira com a segunda fase de aprimoramento e desenvolvimento

    dos instrumentos de maneira geral. Convm lembrar, ainda que sejam muitasas formas, estilos e inseres do contrabaixo, alguns modelos e marcas sounanimidades. A seguir veremos alguns destes modelos que fazem parte dalista dos mais utilizados e conhecidos mundialmente:

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    Figura 1: Contrabaixo Acstico Figura 2: Contrabaixo Acsticode 4 cordas. de 5 cordas.

    www.amadeus.online.pt www.amadeus.online.pt

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    Figura 3: Contrabaixo Eltrico Figura 4: Contrabaixo Eltrico4 cordas (Precision Bass). de 6 cordas.

    www.fender-brasil.com.br www.superbass2.hpg.ig.com.br

    Figura 5: Contrabaixo Fretless Figura 6: Contrabaixo Semi-(sem trastes). acstico (baixolo).

    www.superbass2.hpg.ig.com.br www.pridemusic.com.br

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    1.3 O contrabaixo no Brasil

    At meados dos anos de 1920, o contrabaixo no era empregado na

    MPB, os baixos (linhas meldicas de tessitura mais grave) eram executadospor formaes instrumentais que no contemplavam esse instrumento. Nor-malmente, essas linhas meldicas eram feitas pelo violo ou por algum instru-mento de sopro. No Choro, os movimentos contrapontsticos sempre carac-terizaram muito esse estilo musical, sendo que as linhas meldicas graveseram, e ainda so, normalmente, executadas pelo violo de sete cordas. Anovidade do baixo surgido nas Amricas est nos novos padres rtmicos eno uso de tambores reforando a marcao (CARVALHO, 2006, p. 14).

    Quando o contrabaixo comeou a ser utilizado nestas formaes, executavalinhas meldicas que, preferencialmente, deveriam ser nas fundamentais dosacordes, trabalhando as figuras rtmicas com os instrumentos de percusso,delineando a harmonia e a ritmo da msica, sem conflitar com a linha caracte-rstica do violo e dos tambores, mantendo, assim, a originalidade do estilo.

    Nos anos de 1920, os equipamentos de som eram ainda precrios,nessa poca, chegava ao Brasil especialmente a So Paulo e Rio de Janei-

    ro a tecnologia de comunicao. Momento em que a era do rdio davaseus primeiros passos para logo se tornar o principal veculo de comunicaoda poca, carregando junto vrios programas de rdio, muitasperformancesao vivo, com orquestras, trios, nos quais a msica se tornara essencial. Umaparticipao mais efetiva do contrabaixo na MPB iniciaria por volta da dca-da de 1930, quando o contrabaixo acstico comeou a ser valorizado emgravaes, formaes instrumentais e grupos regionais. Entre os contrabaixistasmais conhecidos na poca, que estiveram presentes nesses trabalhos e gra-vaes, podemos citar Pedro Vidal, Oswaldo Alves, entre outros. Esses se-riam os primeiros a se destacar nesse instrumento. Outro fator a contribuirpara os contrabaixistas foi a inveno da captao para instrumentos acsti-cos, ajudando a mostrar os verdadeiros instrumentistas, que fariam histriano contrabaixo. Orquestras como a de Pixinguinha (1898-1973) e RadamsGnattalli(1906-1988) iniciaram o processo de substituio da tuba pelocontrabaixo acstico e comearam a utiliz-lo mais assiduamente na sua for-

    mao musical.

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    Nos anos 1940 o contrabaixo acstico introduzido no Samba, po-rm sem caractersticas contrapontsticas, a partir da dcada seguinte, suapresena se solidificaria na msica popular brasileira com a Bossa Nova.

    Esse estilo de Samba no contemplava de maneira maante, uma cozinhartmica percussiva, o contrabaixo assumiria um papel mais importante namsica, desempenhando fortemente o elo entre a harmonia e o ritmo, trazen-do a beleza dos acordes atravs de uma conduo menosstacatto27e maisligada, com muitos baixos invertidos28.

    Na Bossa Nova no existe a marcao rtmica de instrumentos depercusso que prevalece em outros estilos de Samba. O

    contrabaixo tem um trabalho rtmico desenvolvido com maiorliberdade, mas sempre em conjunto com o baterista. As notasdevem soar mais ligadas, dando uma slida base harmnica parao violo e o piano, com ateno aos acordes invertidos(MONTANHAUR, 2003, p. 41).

    Uma nova forma de pensar e tocar os arranjos ocorreria com osurgimento da Bossa Nova, trazendo enorme evoluo musical a MPB, poisat ento as linhas mais graves tinham apenas a funo de sustentao har-mnica e no de embelezamento. Com a Bossa Nova, o contrabaixo desen-volveria uma participao realmente ativa nas prprias funes e encadea-mentos harmnicos, bem como no apio mais forte na sustentao rtmica

    junto com a bateria. Um bom conhecimento estilstico dos instrumentos depercusso e de suas principais clulas rtmicas sempre foi muito importantepara o contrabaixista de msica popular, isso se fez decisivo, desde o incioquando os primeiros msicos se aventurarem nesse instrumento,(DE SILLOS

    2003). O processo evolutivo referente s construes de grooves nocontrabaixo demonstra como tambm evoluram os processos composicionaise estilsticos da MPB, referente a estilos como o Choro, o Samba e a BossaNova. Vejamos a seguir alguns exemplos da concepo degrooveno mbi-to do contrabaixo:

    27 Refere-se ao toque seco sem deixar com que as notas soem em demasiado.28 Diz respeito inverso da nota fundamental ou nota mais grave do acorde, por outra

    nota que faa parte do mesmo.

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    Figura 7: Conduo caracterstica do contrabaixo no Choro. udio 1.

    Fonte: MONTANHAUR, 2003, p. 14.

    Vejamos a atuao do contrabaixo em uma cadncia caracterstica do

    Choro, no qual os acordes permanecem normalmente dentro da mesma to-nalidade. Nesse exemplo, em d maior, passando pelos graus relativos destamesma tonalidade, o foco da conduo neste estilo est nas fundamentais equintas dos acordes, bem como em algumas passagens cromticas, princi-palmente enfatizadas nas mudanas de acordes, aliadas ao ritmo de colchei-as pontuadas e semicolcheias. Nesse exemplo, a linha superior deve ser exe-cutada uma oitava acima para no conflitar com a linha inferior, oua a faixa,aproveitando as informaes para depois tocar.

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    Na Bossa Nova os acordes e progresses propem uma con-cepo que no eram usuais para a poca. O uso de dissonncias e acordesgeradores de tenso j no eram utilizados apenas como retorno a tnica,

    mas sim como elementos que despertam novos eventos e caminhos a seremexplorados, normalmente a Bossa Nova possui andamento mais cadenciadocom relao ao Samba e ao Choro. O contrabaixo traz consigo alguns ele-mentos que podem ser encontrados no Samba e no Choro, porm maislegato30,no sendo enfatizadas apenas as fundamentais e quintas dos acor-des. Ocorre com mais freqncia o uso de dissonncias, inverses de acor-des, antecipaes e uma variedade de contrapontos que podem ser com amelodia ou com outros instrumentos, preste a ateno na gravao.

    Com o advento da Bossa Nova e a popularizao das orquestras,novamente o contrabaixo acstico ganhou mais espao e repercusso, tar-dando um pouco a entrada do contrabaixo eltrico no Pas. J no final de1950 e incio de 1960, oRock and Rolltornara-se forte em vrios lugaresdo mundo, influenciando muito jovens, o que favoreceu muito para que ocontrabaixo eltrico ganhasse tambm seu espao em inmeros pases, inclu-sive no Brasil. At ento, bandas de Rock and Roll dos anos de 1950,

    como Bill Haley e Jerry Lee Lewis usavam os contrabaixos acsticos [...].Os contrabaixos acsticos apresentavam alguns inconvenientes para peque-nas formaes musicais, como seu tamanho e a sua baixa sonoridade (PES-CARA, 2005, p. 18). Diante das caractersticas que oRock and Rollpos-sua, o contrabaixo eltrico obteve nesse gnero um campo frtil para seestabelecer e se desenvolver, como podemos observar no texto a seguir:

    Ao longo dos seus cinqenta anos de histria, a sonoridade do

    Rock na Roll esteve relacionada s guitarras distorcidas e aosvocais gritados ou sussurrados que simbolizavam a rebeldia, ono-conformismo e o descontentamento, caractersticos doambiente dos jovens [...]. Porm para que as guitarras e os vocaispudessem se exprimir com fora e energia, em uma msica vibrantee muitas vezes danante, uma base ritmo-harmnica consistente

    30 Diz respeito forma de execuo e de como o som gerado, que nesse caso deve sercom bastante sustentao e suavidade nos sons emitidos.

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    era necessria, e o contrabaixo eltrico e a bateria se mostraramos instrumentos perfeitos para essa funo (CARVALHO, 2006,p. 16 e 17).

    Com a influncia desse gnero tambm no Pas, uma verso docontrabaixo, agora eletrificado e parecendo-se muito com a guitarra eltricacomeou a ganhar credibilidade tambm no Brasil. O contrabaixo eltricochegou ao Brasil impulsionado pelo movimento da Jovem Guarda31, na d-cada de 1960 (DE SILLOS, 2003, p. 14). Surgiriam ento as primeirasverses do Rock nacional em que o contrabaixo eltrico se inseriu muitobem, posteriormente conquistando espao tambm em outros estilos da nos-sa msica.

    Com a popularizao desse instrumento, surgiram muitos outros gran-des contrabaixistas, de incio devido ao acesso mais facilitado na aquisiodo instrumento que era bem mais barato que o acstico. Isso, em um segun-do momento, ajudou a manter a cultura do contrabaixo acstico, pois muitos

    jovens que iniciaram seus estudos no contrabaixo eltrico, posteriormente,tiveram a oportunidade de estudar tambm o contrabaixo acstico. Muitosinstrumentistas que tocavam o acstico tambm aderiram ao eltrico por as-

    sim ampliarem seu leque de trabalho, mantendo igualmente uma boa expres-so em ambos os instrumentos. A partir da dcada de 1970, surgem talentososmsicos que comeam a criar uma linguagem nacional para o contrabaixo(DE SILLOS, 2003). Esse processo se deu principalmente pelo desenvolvi-mento da MPB e do Rock Nacional e da miscigenao cultural. Grandesgnios surgiram no Brasil, tanto no contrabaixo eltrico quanto no contrabaixoacstico, contribuindo para o crescimento da msica brasileira, ajudando-a a

    conquistar credibilidade e respeitabilidade perante outros gneros musicais.Alguns destes instrumentistas citaremos a seguir:

    31 Movimento surgido na segunda metade da dcada de 60, que mesclava msica,comportamento e moda. Os integrantes do movimento foram muito influencia dospelo Rock and Roll da dcada de 50 e 60 e pela precursora do rock no pas, CellyCampello. A maioria de seus participantes teve como inspirao o rock da dcada de60, comandado por bandas como Beatles e Rolling Stones.

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    Figura 10: Luizo Maia Figura 11: Zeca Assumpo

    Fonte: GIFFONI, 1997, p. 12. Fonte: GIFFONI 1997, p. 39.

    Figura 12: Tonho Alves Figura 13: Alex Malheiros e Tio Neto

    Fonte: GIFFONI, 1997, p. 35. Fonte: GIFFONI, 1997, p. 26.

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    Figura 14: Dcio Rocha Figura 15: Adriano Giffoni

    Fonte: GIFFONI, 1997, p. 48. Fonte: GIFFONI, 1997, p. 9.

    Luizo Maia, baixista e compositor, participou de muitas gravaesrealizadas entre 1970 e 1990. Fez shows com diversos artistas da MPB,entre eles: Elis Regina, Chico Buarque, Sivuca, Martinho da Vila, Nara Leo,Gal Costa, Dominguinhos. Destacou-se pela maneira percussiva de tocarsamba, com muitoswinge musicalidade, abrindo caminho para muitos ou-tros contrabaixistas.

    Zeca Assumpo foi um dos primeiros msicos a estudar no exterior(Berklee College of Music32, Boston, EUA), alm de contrabaixista, Zeca

    trabalhou muito como compositor e arranjador, tambm acompanhou artis-tas como Caetano Veloso, Hermeto Pascoal, Quinteto de Radams Gnattalli,desenvolvendo um trabalho intenso tambm com Egberto Gismonti.

    Tonho Alves desenvolveu inmeros projetos como contrabaixista,compositor e arranjador, seu foco esteve muito voltado sempre para a divul-

    32 Escola de Msica, com sede em Boston (Estados Unidos Da Amrica). uma dasprincipais escolas de msica popular do mundo, responsvel pela formao de gran-des artistas no mundo inteiro.

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    gao e valorizao da musica nordestina. Foi um dos pioneiros na utilizaodo contrabaixo acstico na msica regional.

    Alex Malheiros participou da gravao de muitos discos de sucesso

    da MPB. Fez parte de um dos primeiros conjuntos instrumentais a fazeremsucesso no exterior (grupoAzimuth).Tio Neto Tocou por muitos anos na banda de Tom Jobim e Srgio

    Mendes, gravando muitos de seus discos e de outros grandes nomes da MPB.Dcio Rocha iniciou sua carreira tocando em bailes no recife e em

    Pernambuco nos anos setenta, dedicou sua carreira principalmente pesqui-sa de ritmos e instrumentos brasileiros.

    Adriano Giffoni, contrabaixista, compositor, arranjador, professor e

    pesquisador. Acompanhou em gravaes e shows, artistas como: ElbaRamalho, Roberto Menescal, Leila Pinheiro, Djavan, Ivan Lins, Leni Andrade,Maria Bethnia, Emlio Santiago, Tim Maia, participando como contrabaixistados Song Booksde Tom Jobim, Dorival Caimmi, Vincius de Moraes, EduLobo, Carlos Lira, Ary Barroso, Djavan e Joo Donato. Integrou a Orques-tra de Msica Brasileira sob a regncia de Maestro Roberto Gnattalli e aOrquestra Tabajara de Severino Arajo. Professor da escola Pr-Art (RJ),

    escreveu os livros Msica Brasileira para Contrabaixo, vol. I e II.A MPB conquistou um espao muito grande em vrias partes do mun-do. Isso se deve, em grande parte, ao potencial criativo de seus artistas. Omsico brasileiro tem no suingue seu grande diferencial, a levada diferenteque faz com que a execuo da msica tenha a assinatura prpria [...], qual-quer ritmo adotado pelo msico brasileiro tende a ganhar uma ginga envolvente,quase sempre animada (DOMNICO 2008, p. 11). Nos dias de hoje nos a msica brasileira, mas tambm nossos instrumentistas adquiriram granderespeitabilidade no exterior. Alm desses, contrabaixistas, acima citados,muitos outros grandes instrumentistas desempenharam papel importantssi-mo para a valorizao da nossa msica, seja gravando, produzindo, arran-

    jando, pesquisando e conseqentemente fazendo da msica do Brasil, docontrabaixo brasileiro, uma referncia, um cone no mundo inteiro. A partirda dcada de 1980, muitos msicos entre eles contrabaixistas, estiveram noexterior para aprimorar seus conhecimentos, contribuindo tambm para a

    divulgao da linguagem do contrabaixo brasileiro e da MPB fora do Brasil.

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    1.4 O contrabaixo: caractersticas marcantes e principaisatribuies

    O estudo do contrabaixo atualmente torna-se interessante devido diversidade de funes que o mesmo pode assumir na msica, ao passo queo seu potencial educativo tambm cresce quando aplicado ao contextodo aprendizado estilstico. Neste momento interligam-se questes educativas,histricas e de performance, refletindo a proposta deste livro. Ao observar-mos a participao do contrabaixo em vrios perodos da histria da msica,percebemos como principal mudana o seu ingresso como solista em estilos

    que sempre atuou como acompanhante, e que no caso da MPB contemplauma oportunidade nica para os estudantes eperformersdo contrabaixoconhecerem e se aproximarem ainda mais da msica brasileira, seja ele maisenvolvido com o ambiente da msica popular ou de concerto. Uma formaencontrada pra demonstrar essa relao, foi abordando principalmente ocontrabaixo na Bossa Nova, porm inter-relacionando-o com outros mo-mentos musicais, acompanhante na orquestra, posteriormente exercendo essa

    funo com maior liberdade musical (sua utilizao na msica popular), atdesempenhar o papel tambm de solista, harmonizador e improvisador. Exem-plos que teremos a oportunidade de observar atravs de partituras e audi-es presentes nesse livro.

    Dentre as principais atribuies e caractersticas desse instrumentopertencente famlia das cordas, est a sustentao rtmico-harmnica damsica, o que faz parte tanto da ideia inicial da utilizao do contrabaixoacstico como do contrabaixo eltrico. Ou seja, o contrabaixo no surgepara desempenhar papis de solista, de acompanhamento harmnico, ou deimprovisao, mas sim, para proporcionar o equilbrio sonoro e a sustenta-o dos graves na orquestra. Posteriormente, o contrabaixo assume maiorimportncia tanto no mbito da msica de concerto (com o surgimento deinstrumentistas com elevado nvel tcnico), como na msica popular, em que

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    muitas outras funes lhe foram atribudas de maneira mais explcitas33, masainda assim, com a funo vital de manter o balano (ritmo), e a clareza(harmonia) na msica. [...] A linha de baixo da msica popular surgida nas

    Amricas, incorporou a rtmica africana, multiplicando-se numa infinidade denovos padres [...], sem perder, no entanto sua importncia harmnica eformal (CARVALHO, 2006, p. 12 e 13). Obviamente com o passar dostempos, com a evoluo tecnolgica na construo dos instrumentos e amaior capacidade tcnica dos instrumentistas, o contrabaixo assumiu muitomais funes. Assim melhores instrumentos e instrumentistas permitiram li-nhas mais complexas, da mesma forma que linhas mais elaboradas demanda-

    vam melhores instrumentos e exigiam maior domnio tcnico dos msicos(CARVALHO, 2006, p.11). Esses progressos fizeram com que o contrabaixoatuasse como solista (concertos especficos para este instrumento, temas emelodias executadas pelo contrabaixo), acompanhante harmnico (ocontrabaixo como nico harmonizador, ex. baixo e voz), improvisador(Standards, onde o contrabaixo possui bastante espao improvisativo). Em-bora todas essas atribuies comeassem a fazer parte da realidade do

    contrabaixo, ainda assim suas funes bsicas se estabeleciam e se mantive-ram a partir da manuteno, da sustentao, do balano (swing), do ritmocom a harmonia da msica. Vejamos alguns exemplos musicais da inserodo contrabaixo em vrias funes diferentes, observando suas atribuies ecaractersticas marcantes em cada contexto musical. Oua os exemplos au-ditivos, aproveitando para toc-los tambm.

    33 Neste contexto refere-se incluso do contrabaixo com maiores possibilidadesinterativas, j que nos gneros populares como na Bossa Nova por exemplo, aquantidadede instrumentos menor, o que distribu uma maior responsabilidade defunes para cada instrumento e instrumentista.

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    Figura 16: Trecho de partitura orquestral, (Sinfonia n5, L. V.Beethoven), contrabaixo acstico dobrando a linha do violoncelo.udio 4.

    www.starnews2001.com.br

    Figura 17: Trecho de acompanhamento do contrabaixo no Samba-Funk, (msica Odil-Odil, Joo Bosco). udio 5.

    Fonte: WOOD, 2003, p. 29.

    Figura 18: Exemplo de conduo harmnica no contrabaixo, (colu-na acordes no baixo). udio 6.

    Fonte: PEREIRA, 2006, p. 42.

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    Figura 19: Trecho demonstrando o contrabaixo na ticaimprovisativa, (msica Cor de Rosa, Nico Assumpo). udio 7.

    Fonte: WOOD, 2003, p. 31.

    Figura 20: Trecho do Preldio em Sol Maior (J. S. Bach),Contrabaixo como instrumento solista. udio 8.

    Fonte: JAMBERG, 2007, p. 97.

    A grande diversidade de funes que atualmente fazem parte da reali-dade do contrabaixo, seja no mbito da msica orquestral, popular ou instru-mental, ocorreu principalmente devido ao desenvolvimento dos instrumen-tos, evoluo da orquestra, ao crescimento das manifestaes musicaispopulares, mas principalmente devido inquietao dos instrumentistas. Odesejo de dominar cada vez mais o instrumento, de elevar a tcnica e a com-posio a outros patamares, contribuiu para que se fosse desvendado sem-pre novas facetas de utilizao. medida que o tempo avanou, o contrabaixodemonstrou ser um dos instrumentos que mais evoluiu em termos de atuaodiversa e explorao timbrstica.

    O sculo XX props um novo olhar para as artes de uma maneirageral, que na msica se apresentou bastante atrativo e receptivo ao contrabaixo,sendo ele muito utilizado por vrios compositores na busca por novos tim-bres e nuances musicais. Na MPB, inicialmente substituindo as linhas execu-tadas pela tuba, no Choro executando ogroove(preenchendo os espaos)

    em combinao com o violo de sete cordas e no Samba atuando aliado ao

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    trabalho rtmico com os instrumentos percussivos. Na Bossa Nova, vriosdesses elementos foram agregados, acrescentando novos, entre eles a maiorliberdade rtmica, harmnica e para improvisao, seja em termos de cons-

    truo dogroove, como solstico. Devido proximidade intelectual, interativae improvisativa que a Bossa Nova tinha com o Jazz (muitos dos idealizadoresda Bossa Nova possuam experincia e vivncia tambm nesse gnero) mui-tos outros elementos foram acrescentados a esse estilo, propiciando umamaior interatividade entre os msicos. Fatores como esses fizeram ocontrabaixo ganhar mais espao na MPB, garantindo o surgimento de timosinstrumentistas, contribuindo tambm para uma abertura maior em termos deatuao e utilizao desse instrumento em outros estilos musicais.

    Observamos nos exemplos vistos at aqui a insero do contrabaixo esua ampla utilizao, seja na funo de acompanhante ou solista, transitandoinicialmente pela funo de sustentao rtmico-harmnica, passando pelafuno mantenedora do groove e por fim exercendo mltiplas funes. Essestrechos musicais foram demonstrados entrelaando questes histricas, deatuao do contrabaixo na MPB, com as partituras musicais e seus respecti-vos exemplos auditivos. Sugere-se ao estudante a experincia de tambm

    toc-los.

    1.5 Bossa Nova: aspectos histricos e culturais

    A Msica Popular Brasileira possui inmeras justificativas para seradmirada e respeitada atualmente. Entre tantas esto capacidade adaptativa,inventiva de seus artistas, que sugerem a nossa msica um grande carisma.Porm, inicialmente, a Bossa Nova sofreu alguns preconceitos e crticas, sejapela tica ritmo-harmnica inovadora, seja pela capacidade de agregar, adap-tar e processar informaes.

    Desde as primeiras danas trazidas para c como o Lundu34, observa-mos a miscigenao msico-cultural que deu origem a MPB, ela passou por

    34 Dana originria da frica, que combina a umbigada dos terreiros africanos com acoreografia dos fandangos espanhis e portugueses, com estribilho marcado porpalmas dos participantes.

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    vrios processos evolutivos, assimilando vrias informaes. Observa-se quea Bossa Nova ao se misturar com outros elementos, no escapou da misci-genao cultural que marca a cultura brasileira (DOMENICO, 2008, p. 11

    e 12), fazendo parte da caracterstica da nossa cultura, essa capacidade deinteragir, de associar, de absorver.

    A Msica Popular Brasileira se distingue das outras, entre tantascoisas, pela capacidade de assimilar informaes rtmicas,meldicas e harmnicas de tantas outras culturas e reprocess-las [...]. Quando a Bossa Nova comeou a se formatarinformalmente, alguns crticos disseram que era imitao do Jazznorte americano [...], se o prprio Jazz era sntese de vrias

    linguagens musicais, por que a bossa Nova deveria nascer seminfluncias? (DOMENICO, 2008, p. 12).

    De fato, devido a sua formao instrumental, aos tipos deharmonizaes (mais requintadas e polidas musicalmente), como tambm aogrande potencial improvisativo (qualidade muito presente em nossa cultura etambm no Jazz), a Bossa Nova recebeu associaes de que era muito pare-cida com o Jazz, o que gerou at msica, como podemos observar na obra

    Influncias do Jazz de Carlos Lyra, cuja letra diz pobre do meu samba/foise misturando, se modernizando e se perdeu. Ironia ou no, a riqueza damsica e do arranjo, fundamentalmente jazzsticos, mostram o contrrio(DOMENICO, 2008, p. 12).

    Fora algumas caractersticas que fazem parte de toda obra, estilo ougnero musical erudito35, a Bossa Nova se tornaria o estilo musical brasileiromais conhecido, tocado e respeitado fora do Brasil. Isso se deu em parte,

    pelo seu requinte esttico e musical (que chamaria a ateno do mundo, umamsica que apesar das crticas possua muitas caractersticas nacionais.

    35 Refere-se s caractersticas intelectuais e formais que permeiam o estudo musical, eque fazem parte de um mesmo processo de pesquisa, por mais que em culturasdiferentes, como por ex.: Harmonia, contraponto, arranjo, composio, improvisa-o.

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    A Bossa Nova, forma de expresso musical que se popularizouem meio a grandes polmicas, adquiriu muito rapidamente suaestabilidade e maturidade de propsitos [...], quando setransformou num produto brasileiro de exportao dos mais

    refinados e requisitados no exterior (MEDAGLIA, 1978, p.70).

    A origem que remete ao termo Bossa Nova bastante complexa econseqentemente circunda inmeros acontecimentos. Muito antes do ad-vento desse novo estilo surgir e se popularizar, msicos como Johnny Alf, jimprimiam em suas obras um requinte harmnico e meldico bastante desen-volvido, ao passo que cantores como Dick Farney j demonstravam um jeitode cantar com influncias sinatrianas bastante ntidas, o que se dava justa-

    mente por ambos serem bons praticantes do Jazz americano no Brasil,(MEDAGLIA, 1978). Tudo isso, aliado a cantores que j imprimiam emsuas formas interpretativas um jeito de cantar mais falado, sem tantos mala-barismos e virtuosismos, ajudou a formar o estilo de cantar bossa-novista.

    Medaglia ainda aponta que se quisssemos realmente encontrar as razeshistricas da Bossa Nova, a encontraramos em outro estilo que cem porcento brasileiro:

    [...] Os seus pontos de contato mais evidentes. a msica deNoel. o samba flauta-cavaquinho-violo. a msica da Lapa,capital do samba (de cmara) tradicional, como Copacabana -Ipanema - Leblon so os redutos da Bossa Nova. a linguagemsem metfora, espontnea, direta e popular [...], que poderiam serditas e cantadas por Noel Rosa ou Joo Gilberto em 1940 ou em1960 (1978, p. 80).

    A forma realmente direta, espontnea e popular com que Noel Rosacompunha e interpretava suas obras, mantendo o encanto e a doura de suamsica, demonstra alguns traos poticos que tambm foram desenvolvidose agregados a concepo da Bossa Nova. Trechos como: garom faa-meo favor de me trazer depressa foi maneira tambm encontrada, ou melhor,dizendo retomada por compositores como Newton Mendona, Vincius deMoraes, Ronaldo Bscoli e Carlos Lyra, entre outros para representarem

    posteriormente expresses como Eis aqui este sambinha, feito de uma nota

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    s, h se ela soubesse que quando ela passa... (MEDAGLIA, 1978), pr-tica esta que tambm estava presente em msicas de Joo Gilberto e TomJobim.

    Segundo Diniz:A Bossa Nova um movimento que surge no Rio De Janeiro em1958. De certa forma, um produto das ricas experincias musicaisda dcada, apesar de querer guardar distncia do clima dor-de-cotovelo da poca, existencialista, dos primeiros anos. Pela lente

    Rolleyflexbossa-novista via-se o amor positivo, a beleza do mar,do cu, da montanha, da mulher amada [...], substituindo a dor-de-cotovelo de Ningum mais me ama, por aes afirmativas como,

    Eu sei que vou te amar (2006, p. 154 e 155).

    Contemplando uma voz mais intimista, um ritmo com mais variaes esncopes, e uma harmonia sofisticada, que misturava uma viso mais otimistae menos chorosa de encarar a vida, de ser brasileiro, assim despontava aBossa Nova, dando incio a uma nova era musical. Em termos harmnicos,esse novo estilo inclua passagens para outras tonalidades, constantes modu-laes e acordes com maior uso de tenses, gerando uma melodia com no-

    vos caminhos meldicos e, consequentemente, muito mais cromtica e dife-rente do que se estava acostumado a vivenciar. Em termos rtmicos, surgiauma estruturao no mais de clulas repetidas que mantinham o tempo umdo compasso sempre ntido (caracterstica do samba tradicional). Surgia agorauma rtmica que se tornara independente da linha meldica da voz, dando ainteno de um compasso quaternrio, porm com vrias inflexes que fugi-am do tempo forte. O contrabaixo nesse contexto atuaria com a bateria,

    fazendo o contraste meldico (conduo da linha do baixo em contraste coma melodia principal) junto com a sustentao rtmica, dando intenes maio-res valorizao do tempo dois do compasso, vejamos os exemplos:

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    Figura 21: Figurao rtmica que marcaria o acompanhamento ca-racterstico da Bossa Nova. udio 9.

    Fonte: MEDAGLIA, 1978, p. 77.

    Figura 22: Chega de Saudade, ritmo independente do acompanha-mento. udio 10.

    Fonte: Song Book, Tom Jobim, 1994, vol. 2, p. 54.

    Figura 23: Figurao rtmica tradicional de acompanhamento dosinstrumentos percussivos. udio 11.

    Fonte: MEDAGLIA, 1978, p. 77.

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    Figura 24: Rtmica de acompanhamento na Bossa Nova feita pelaBateria. A linha superior indica o ritmo feito pela vassoura na peleda caixa, a linha inferior indica a baqueta tocada na borda da caixa.

    udio 12.

    Fonte: MEDAGLIA, 1978, p. 77.

    Figura 25: Relao groove de contrabaixo com o bumbo da bateria.udio 13.

    Fonte: RODRIGUES, 2000, p.12.

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    O balano do violo de Joo Gilberto deu um novo requinte a msicabrasileira, em especial ao samba, que aliado a criativas harmonias Jobinianase a doces versos do grande Vincius, acabaria por trazer um novo ar musical

    para a cidade do Rio de Janeiro. Em 1958, na voz de Elizete Cardozo (1920-1990), nascia primeira gravao de Chega de Saudade, que antecederia aabertura das portas da Bossa Nova para o mundo. Ainda no era o gneropropriamente dito que hoje conhecido mundialmente, mas dava indcios doque viria a seguir. Alguns meses depois, com o lbum Chega de Saudade,seria contemplada uma msica com esse mesmo ttulo. Joo Gilberto trariaao mundo o jeito bossa-novista de ser, que alm da batida caracterstica daBossa Nova, trazia tambm o canto mais sereno, menos explosivo, ao con-

    trrio da prtica que ainda marcava muitos cantores da poca.O fato que tal movimento despertou controvrsias, comentrios e

    muitas opinies diferentes no ambiente musical da poca, at porque o Brasilpassara por vrias complicaes e mudanas poltico-econmicas aps amorte de Getlio Vargas (1883-1954). Havia muita desigualdade nas rela-es de negcios com outros pases, em especial com os Estados Unidos,que exercia forte presso diplomtica e financeira com relao ao desenvol-

    vimento brasileiro (TINHORO, 1998).Como comentamos anteriormente, a Bossa Nova sofria alguns ata-ques por agregar influncias que para muitos tinham mais a ver com o Jazz,do que com a msica brasileira. Na poca existia uma influncia muito forteda msica internacional, que se refletia tambm em outros segmentos, frutoda abertura de portas para as importaes, que em termos musicais fez surgirmuitas verses de msicas arranjadas para a nossa lngua, desvalorizando umpouco a produo musical brasileira da poca. Houve certo bloqueio doscompositores brasileiros das camadas mais baixas, considerada msica demorro, salvo os sambas enredos das escolas de samba, que recebia maisateno da classe mdia devido aos desfiles carnavalescos (TINHORO,1998) e que com o advento da Bossa Nova, ganharia mais respeitabilidadeinternacionalmente.

    O movimento bossa-novista quebrou com muitos padres existentesna poca. Os jovens que encabearam esse ideal no pareciam estar preo-

    cupados, seno na busca por atualizaes da msica popular, contemplando

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    Figura 26: lbum 78 RPM, disco de estria de Joo Gilberto, lanadoem 1958.

    Fonte: DINIZ, 2006, p. 157.

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    Figura 27: Letra de Chega de Saudade. Foto de Vincius, Tom eGilberto.

    Fonte: ALMEIDA, 1996, p.52

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    Figura 28: Esboos originais de Tom Jobim, includo Chega deSaudade em que o compositor escreve algumas linhas meldicas,inclusive para Elizete Cardozo.

    www.jobim.org/dspace-xmlui/handle/2010/3963

    A importncia hoje atribuda a esses artistas brasileiros grandiosa,principalmente no que se refere influncia que tiveram no despontar destenovo estilo. Um estilo moderno, mas com caractersticas de uma msica maisuniversalizada e erudita da nossa Msica Popular Brasileira em especfico dosamba, do choro e das manifestaes folclricas. Embora, para muitos, osurgimento do movimento bossa-novista parecia um des-patriotismo, feliz-

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    mente ela contribuiu muito para a valorizao da msica com caractersticasnacionalistas, pois de maneira alguma deixava de possuir elementos claros dacultura brasileira.

    Agregando valores musicais mais aprimorados, a Bossa Nova ajudouartistas, compositores, msicos, cantores, instrumentistas brasileiros, a per-ceber e valorizar as manifestaes musicais brasileiras, trazendo outro olharpara a nossa msica. Com certeza, no Brasil, existiam pessoas capazes dedar continuidade ao desenvolvimento da MPB e foi o que de fato ocorreu,no ficando mais a merc apenas do jazz como forma de expresso popularsofisticada, surgia a Bossa Nova com caractersticas da msica nacional dealto nvel de elaborao.

    Ainda que muitos afirmem o contrrio, a Bossa Nova foi ummovimento que provocou a nacionalizao dos interessesmusicais no Brasil. Como se sabe, a Bossa Nova reavivou ereformulou um sem-nmero de antigas formas musicais brasileiras,trouxe para prtica musical urbana uma srie de motivos donosso folclore; refreou, aps o seu sucesso popular, a importaode artistas do exterior, e assim por diante. Mas a nosso ver, a suaprincipal contribuio foi o fato de ter substitudo no de todo,

    claro a prtica das Jam sessions, e das preocupaes dosjovens instrumentistas pelo jazz moderno, pelas reuniesinformais privadas e em pequenos teatros, cuja preocupao etema so: msica brasileira moderna (MEDAGLIA, 1978, p. 107).

    Entre muitos os responsveis pela a expressividade da Bossa Nova,Antnio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim36desempenhou papel impor-tante e fundamental no s para o reconhecimento Bossa Nova, mas para avalorizao dos artistas brasileiros. Tom Jobim tido hoje como referenciana MPB, mas antes disso trabalhou como arranjador, transcritor, acompa-nhou muitos msicos e cantores na noite, ou seja, fez a trajetria natural demuitos artistas que tentam viver de msica no Brasil, at tornar-se famoso ereconhecido no mundo todo. Entre alguns acontecimentos que fizeram suavida mudar como ele prprio comenta em entrevista, esteve gravao doLP Chega deSaudade de Joo Gilberto, seu contato com Vincius de Moraese a parceria em Orfeu:36 Nasceu em 1927 e faleceu em 1994.

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    Eu andava pela cidade com uma pastinha cheia de arranjos. Euqueria escrever msica [...]. A apareceu o Joo Gilberto...Ningum queria gravar Joo Gilberto, achavam que o modo deJoo Gilberto cantar era muito bonito, mas no era comercial [...].

    Gravamos com Elizete aquele LP, em que pela primeira vez seescuta a batida da Bossa Nova [...] Finalmente, obtive permissopara fazer um disco de 78 rotaes com o Joo Gilberto. De umlado aquela msica dele Bim Bom... E, do outro lado, Chega deSaudade, letra do Vincius de Moraes com msica minha. A odisco estourou [...]. Vincius estava precisando de um msicopara anotar canes para ele [...], Orfeu abriu muitos horizontespara a gente [...]. O Orfeu negro se tornou um clssico! Corria oano de 1956. Eu e Vincius comeamos a fazer muita msica juntos.

    Inauguramos uma parceria de mais de cinqenta canes [...].Depois veio a Bossa Nova no Carnegie Hall, foi em 1962 [...].Toda aquela msica que ns escrevemos... A gente nunca pensouque aquela msica fosse acontecer l fora. Esse negcio de omundo tocar Bossa Nova... Nunca ningum pensou (JOBIM apudVENTURA, 1993, p. 170-172).

    Figura 29: Programa do show no Carnegie Hall, em que a Bossa

    Nova mostrou ao mundo seu estilo.

    Fonte: DINIZ, 2006, p. 158.

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    Marcos Vincius da Cruz de Melo Moraes37, poeta e diplomata, foi umdos maiores letrista da Bossa Nova, suas parcerias incluem Pixinguinha, TomJobim, Adoniram Barbosa, Baden Powell, Carlos Lyra, Chico Buarque e

    Toquinho, est presente em grande parte das canes de maior sucesso daBossa Nova.Joo Gilberto Prado Pereira de Oliveira (c. 1931) foi criador da bati-

    da de violo que ficaria famosa em todo o mundo. Aliando seu estilo despi-do de toda a nfase, tanto no canto como no violo (GROVE, 1994, p.124) e de suas parcerias com instrumentistas como Stan Getz, deu grandecontribuio para divulgao da Bossa Nova fora do pas, principalmentenos Estados Unidos.

    A Bossa Nova caracterizou um momento importantssimo para o futu-ro da Msica Popular Brasileira, pois ajudou a difundir a qualidade da nossamsica, apresentando ao mundo o talento de nossos compositores,instrumentistas e letristas. Seus textos coloquiais, harmonia e melodia refina-das, trouxeram um olhar mais respeitoso do mundo com relao a nossamsica, caractersticas do alto nvel musi