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O fantasma da “ideologia de gênero”: estratégias do capital para o cont role do
corpo e do trabalho das mulheres
MARIA JÚLIA ALVES GARCIA MONTERO1
O presente artigo tem o objetivo de analisar o impacto do neoliberalismo nas políticas
públicas em educação, especificamente no que se refere ao debate sobre as desigualdades de
gênero. A partir da análise de que desde 2008 vivemos sob uma crise econômica mundial, que
se dá de forma longa e arrastada, afirmamos que há uma ofensiva neoliberal em diversos
países, no sentido da precarização do trabalho e ataques aos direitos sociais. Essa forma de
capitalismo oferece às mulheres determinadas formas de inserção no mercado de trabalho – o
trabalho precarizado ou até mesmo informal. Para justificar tais medidas, o sistema lança mão
de uma ofensiva ideológica conservadora, reforçando a idéia de que mulheres são seres que
servem exclusivamente para o trabalho doméstico e de cuidados, afinal, uma vez que sua
tarefa principal não é permanecer no mercado de trabalho, mas em casa, justificam-se seus
baixos salários, “flexibilidade de horários” e mesmo demissões. Nesse sentido, a disputa em
torno das políticas educacionais torna-se central, uma vez que a escola é um espaço
“disseminador” de ideologia. Pode servir para reforçar ou contestar o status quo (Goodson,
2001) e, justamente por isso, é alvo de disputa (Duarte, 2012). Não à toa nos últimos anos
foram realizados diversos ataques à mera possibilidade da presença de debates relativos à
igualdade de gênero na educação – como foram os embates a respeito dos Planos Municipais
e Estaduais de Educação em todo o Brasil, com setores organizados tanto da Igreja Católica
como de Igrejas Evangélicas pressionando vereadores, deputados e o poder executivo para
que todas as menções ao tema fossem retiradas dos Planos, colocando em marcha uma espécie
de “cruzada” contra o que denominam “ideologia de gênero”. O debate caminha ombro a
ombro com o movimento “escola sem partido”, que busca retomar e fortalecer concepções
mecanicistas e tecnocratas de educação. Apesar do artigo ter a realidade brasileira como foco,
vale ressaltar que a campanha contra a “ideologia de gênero” é internacional, tendo sido
pautada em vários países, como na Colômbia, na ocasião do plebiscito pela paz entre as
FARC e o governo, em que os conservadores utilizaram o debate da “ideologia de gênero”
para defender o voto contra o acordo.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo tem o objetivo de debater o impacto do neoliberalismo nas políticas
públicas de educação, especificamente no que se refere ao debate sobre as relações de gênero
no contexto educacional. Buscamos analisar como a atual cruzada dos setores conservadores
da sociedade brasileira contra a presença de tal debate na escola é parte das recentes medidas
neoliberais na educação. O debate aqui realizado é fruto do acúmulo do movimento feminista 1 Mestra em Educação: História, Política, Sociedade pela PUC-SP
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brasileiro – em especial da Marcha Mundial das Mulheres – a respeito do que significa a
educação para a legitimação de determinadas ideologias, mas também de como se organiza o
trabalho feminino na sociedade capitalista e sobre os impactos do neoliberalismo sobre a vida
das mulheres. Buscamos entender o atual contexto em que vivemos – de crise econômica
internacional – e como isso impacta o trabalho das mulheres. Depois, discutimos os
mecanismos de controle do trabalho e do corpo das mulheres presentes nesses momentos de
instabilidade para, então, entrar na análise propriamente dita sobre o tema da “ideologia de
gênero” na educação e como isso é parte da investida neoliberal contra as mulheres.
Antes de mais nada, é preciso assinalar de onde partimos para realizar nossa análise.
O conceito de “gênero” vem sendo teorizado há muito tempo e por diversas feministas. É
quase um consenso entre as diversas autoras que tratam do tema (Scott, 1995; Saffioti, 2004;
Mathieu, 2009) que o conceito é utilizado para explicar os papéis designados socialmente para
os sexos masculino e feminino na nossa sociedade. Nesse sentido, rejeita determinismos
biológicos, que buscariam explicar através da biologia a submissão das mulheres aos homens.
Porém, consideramos-no insuficiente para retratar as atuais relações entre homens e mulheres
e, por isso, utilizaremos-no aliado a outros conceitos. De acordo com Saffioti (2004; 2009), as
relações de gênero podem referir-se a relações igualitárias ou patriarcais - podendo-se
também utilizar o termo patriarcado. Consideramos importante o uso do conceito pois é o
único que indica claramente uma situação de dominação-exploração entre homens e mulheres
(Pateman, 1993).
Não consideramos, no entanto, o patriarcado como algo separado do capitalismo. O
sistema de dominação-exploração de mulheres por homens é mais antigo que capitalismo,
porém, é englobado e ressignificado por este no momento de sua constituição, fazendo das
classes sociais um fenômeno “gendrado” (Saffioti, 2009). O Patriarcado, portanto, não é um
“resquício” feudal , muito menos um sistema separado. Vale ressaltar que as relações de raça
também também estruturam as relações capitalistas – ou seja, raça, gênero e classe se
alimentam mutuamente, em uma relação consubstancial (Kergoat, 2010), como vários fios
que formam a trama da sociedade.
A base material do patriarcado é a divisão sexual do trabalho. Tal divisão se baseia
em dois princípios: o da separação e o da hierarquização. Isto é, separam-se os trabalhos entre
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femininos (esfera reprodutiva, doméstica) e masculinos (esfera produtiva, pública),
destinando às mulheres aqueles mais inferiorizados, com baixo valor social agregado
(trabalho doméstico e trabalhos produtivos precarizados), enquanto os homens ocupam as
posições mais prestigiadas, como a política, igreja entre outros (Kergoat, 2009).
Para uma análise sobre o trabalho das mulheres, utilizaremos também aportes da
economia feminista, segundo os quais o trabalho reprodutivo é tão importante quanto o
produtivo na manutenção da esconomia capitalista – o trabalho invisível e gratuito realizado
pelas mulheres dentro das casas é, portanto, parte da economia, e não marginal a ela
(Carrasco, 2003; Orozco, 2012). Para o debate sobre o papel da escola e especificamente do
currículo na legitimação (ou contestação) de determinadas ideologias, utilizaremos as
contribuições de Goodson (1997) e Apple (2002).
2. A CRISE ECONÔMICA E O TRABALHO DAS MULHERES
Teóricas da economia feminista têm, cada vez mais, avançado na análise do que
significa o trabalho das mulheres para o sistema capitalista. Entre esses avanços, podemos
elencar 1) o reconhecimento do trabalho doméstico e de cuidados (reprodutivo) de fato como
um trabalho, e não como algo natural às mulheres e feito somente por amor; 2) a afirmação
de que o trabalho reprodutivo é essencial para a economia capitalista, pois garante a
reprodução da força de trabalho – sua alimentação, vestimenta, saúde, além da reprodução
propriamente dita.
Mas essas atividades não-valorizadas [...]Constituem um conjunto de tarefas que
tendem a dar apoio não só às pessoas dependentes por motivos de idade ou saúde,
mas também à grande maioria dos homens adultos. São [...] indispensáveis para a
estabilidade física e emocional dos membros do lar. Elas incluem a alimentação, o
afeto e, por vezes, aspectos pouco agradáveis, repetitivos e esgotadores, mas
absolutamente necessários para o bem-estar das pessoas. Implicam atividades
complexas de gestão e organização, necessárias para o funcionamento diário do lar e
de seus moradores, realizadas dia após dia [...] no lar e fora dele, no bairro e desde o
posto de trabalho assalariado, que cria redes familiares e sociais, oferece apoio e
segurança pessoal e permite a socialização e o desenvolvimento das pessoas. A
magnitude e a responsabilidade dessa atividade faz pensar – como já assinalei em
outra oc asião – na existência de uma “mão invisível” muito mais poderosa que a de
Adam Smith, que regula a vida cotidiana e permite a continuidade do funcionamento
do mundo (CARRASCO, 2003:17)
Esse trabalho acaba por fazer parte dos lucros das grandes empresas - uma vez que o
trabalho realizado para a manutenção dos trabalhadores empregados por elas fica por conta
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das mulheres, e ainda por cima é considerado como algo natural. Há não somente uma
invisibilização do trabalho doméstico e de cuidados, mas um apagamento de sua relação com
a produção capitalista. Trazer esse fator à luz significa mostrar que há um “repasse de custos
da produção capitalista para a esfera doméstica” (Carrasco, 2003, p.19), através do trabalho
das mulheres.
Vale ressaltar que uma parte desse trabalho pode ser substituída por determinados
serviços oferecidos pelo Estado, como as escolas (principalmente a educação infantil2), mas
também hospitais e restaurantes populares. Para isso, é necessário que haja um Estado
comprometido com a promoção de políticas públicas que visem a sustentabilidade da vida.
No entanto, hoje, vivemos no mundo um momento de crise econômica mundial
(Matijascic; Piñon; Acioly, 2009), e, para sobreviver e garantir suas taxas de lucros, as elites
capitalistas promovem o que eufemisticamente chamam de políticas de austeridade, isto é,
medidas neoliberais que visam a precarização do trabalho e ataques aos direitos sociais
(Pochmann, 2009). No Brasil, desde 2016, após o golpe contra a presidenta legítima Dilma
Roussef, o governo Temer vem implementando diversas medidas neoliberais mais radicais,
como a PEC 241 (conhecida como “PEC da Morte”), que congela os investimentos em saúde
e educação por 20 anos – resultado em uma população com escola e mais doenças. Além
disso, temos também a Lei da Terceirização e a Reforma Trabalhista, que também visam
expandir a precarização do trabalho.
Os impactos da crise são sentidos de forma diferente por homens e mulheres,
justamente por sua inserção diferenciada no sistema capitalista (Berger, [s.d]). O
neoliberalismo acaba por aprofundar a divisão sexual do trabalho – intensificando o trabalho
precarizado das mulheres, seja fora ou dentro de casa.
O corte de gastos com serviços públicos afeta de maneira especial as mulheres. Uma
vez cortados os serviços destinados ao cuidado de crianças e doentes, por exemplo, são as
mulheres que arcam com a responsabilidade de olhar por aqueles que passam a ser ignorados
pelo Estado – o que significa um aumento considerável de sua carga de trabalho.
O trabalho das mulheres é a variável de ajuste entre as lógicas e tempos
contraditórios do mercado movido pelos lucros e do cuidado davida humana. Em
2 Não queremos dizer, aqui, que a educação infantil seja algo restrito ao cuidado – ela serve também à educação
das crianças. Aliás, no que diz respeito a esse estágio da vida, é impossível pensar o cuidado sem a educação, e
vice-versa.
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que pese a sobrecarga de trabalho e a disponibilidade permanente de inúmeras
mulheres, há uma crise do cuidado e da forma como a sociedade responde às
necessidades básicas das pessoas, de se alimentar, compartilhar afetos, se sentirem
seguras. A deslocalização da produção de mercadorias se combina a uma
deslocalização do trabalho de cuidados com um enorme contingente de mulheres
dosul e de áreas mais pobres migrando para o norte ou áreas mais ricas para cuidar
das crianças, velhos e doentes, enquanto ninguém cuida delas. O mesmo acontece no
interior dos países (MARCHA MUNDIAL DAS MULHERES, 2015:29)
O aprofundamento da divisão sexual do trabalho significa uma reafirmação de que o
lugar das mulheres é dentro de casa, e que elas devem destinar-se prioritariamente ao trabalho
doméstico e de cuidados – e, estando fora disso, devem trabalhar de forma precária, afinal,
seu salário seria somente “complementar”. Para isso, é preciso lançar mão de uma ofensiva
(ideológica, mas também material) em que sejam retomados valores conservadores com
relação às mulheres e à família3. Esse é o debate que faremos no próximo ponto deste artigo.
3. AS FERRAMENTAS PARA A SUBORDINAÇÃO DAS MULHERES
Os momentos de crise nada mais são do que momentos de reorganização do
capitalismo. Nesse sentido, o sistema lança mão dos recursos necessários para sua
sobrevivência e posterior reconformação. Federici (2017) traça paralelos entre as atuais
políticas neoliberais de precarização da vida e do trabalho e as políticas levadas a cabo no
momento de conformação do capitalismo . Entre essas políticas estão o controle de territórios
e a expulsão de camponeses do campo (com extremo uso da violência) e, também, a caça às
bruxas (que em si significou um outro conjunto de políticas). Segundo a autora, no processo
de conformação do capitalismo, ocorrem alguns fenômenos, entre eles:
i) o desenvolvimento de uma nova divisão sexual do trabalho; ii) a construção de
uma nova ordem patriarcal, baseada na exclusão das mulheres do trabalho
assalariado e em sua subordinação aos homens; a mecanização do corpo proletário e
sua transformação, no caso das mulheres, em uma máquina de produção de novos
trabalhadores. E, o que é mais importante, coloquei no centro da análise da
acumulação primitiva a caça às bruxas dos séculos XVI e XVII: sustento aqui que a
perseguição às bruxas, tanto na Europa quanto no Novo Mundo, foi tão importante
para o desenvolvimento do capitalismo quanto a colonização e a expropriação do
campesinato europeu de suas terras (FEDERICI, 2017:26)
Gradualmente, construiu-se uma nova divisão sexual do trabalho, baseada em uma
separação estrita do espaço público e o espaço privado – este último o destinado às mulheres,
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que foram empurradas para fora de qualquer tipo de trabalho que lhes rendesse algum salário,
por menor que fosse. De acordo com a autora,
[...] ganhava espaço (no direito, nos registros de impostos, nas ordenações das
guildas) a suposição de que as mulheres não deviam trabalhar fora de casa e de que
tinha mapenas que participar na “produção” para ajudar seus maridos. Dizia-se até
mesmo que qualque trabalho feito por mulheres em sua casa era “Não trabalho” e
não possuía valor, mesmo quando voltado para o mercado [...] Assim, se uma
mulher costurava algumas roupas, tratava-se de “trabalho doméstico” ou e “tarefas
de dona de casa”, mesmo se as roupas não eram para a família, enquanto, quando
um homem fazia o mesmo trabalho, se considerava como “produtivo” (FEDERICI,
2017:182-183)
Obviamente, pela situação de extrema pobreza da classe trabalhadora no período, as
mulheres continuaram trabalhando – porém, ou eram completamente invisibilizadas (por
exemplo, trabalhavam junto com os maridos, mas ele é quem era reconhecido como
trabalhador e recebia o salário), ou simplesmente seu salário era pago ao marido. Essa política
“criou as condições materiais para sua sujeição aos homense para a apropriação de seu
trabalho por parte dos trabalhadores homens” (Federici, 2017, p.195). Ainda, segundo a
autora, a família foi um espaço que agiu principalmente para a apropriação e o apagamento do
trabalho das mulheres
Não podemos deixar de ressaltar também a criminalização de todos e quaisquer
métodos anticoncepcionais, assim como do aborto e mesmo das parteiras, como forma de
controlar a capacidade reprodutiva das mulheres – para repor perdas populacionais, por
exemplo e controlar a reprodução de força de trabalho. Dava-se início à constituição do que
seria uma “política reprodutiva capitalista” (Federici, 2010, p.173). A caça às bruxas se deu
principalmente nesse terreno, e
[...] literalmente demonizou qualquer forma de controle de natalidade e de
sexualidade não procriativa, ao mesmo tempo que acusava as mulheres de sacrificar
crianças para o demônio. Mas a guerra também recorreu a uma redefinição doque
costituía um crime reprodutivo. Desse modo, a partir de meados do século XVI, ao
mesmo tempo que os barcos portugueses retornavam da África com seus primeiros
carregamentos humanos, todos os governos europeus começaram a impor penas
maisseveras à contracepção, ao aborto e ao infanticídio (FEDERICI, 2017:174)
Susan Faludi (2001) afirma que, de meados dos anos 1980 até os anos 1990, período
em que os Estados Unidos passavam por grande recessão econômica, além do retrocesso com
relação aos direitos sociais, a “Nova Direita”, trouxe com mais força para a política grupos
religiosos que combatiam o feminismo e organizavam inclusive grupos anti-aborto - como
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por exemplo, a Operação Resgate, cujos membros chegaram a entrar em confronto direto com
as feministas na tentativa de fechar clínicas de planejamento familiar. Sobre os pregadores
desse tipo de discurso, a autora faz um comentário que não à toa guarda semelhanças com a
atual realidade brasileira: “ [eles] deixaram de parecer grandes idiotas no cenário político de
Washington” (Faludi, 2001, p.238).
Contemporaneamente, a capacidade reprodutiva das mulheres também é controlada
tendo em vista a reprodução da mão de obra – principalmente nos países europeus, em que há
um acentuado envelhecimento da população. Essa não é, obviamente, a situação brasileira, no
entanto, o impedimento do exercício da autonomia das mulheres mantém a naturalização da
maternidade e o espaço doméstico como consequente habitat natural feminino, contribuindo
para um ideário de mulher que não deve trabalhar fora e, se o fizer, deve fazê-lo
precariamente. Hoje, no Brasil, há diversas ofensivas mesmo contra as situações em que
legalmente é possível interromper a gravidez. Em 2013, na Jornada Mundial da Juventude, a
Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família distribuiu fetos em miniatura para os
participantes. Além disso, também foram distribuídos terços feitos com miniaturas de fetos.
Em 2015, começou a caminhar o PL 5069/13, de autoria de Eduardo Cunha, que alterava a
Lei de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual, dificultando o acesso à pílula do dia
seguinte. Em 2018, um grupo religioso criou um site armadilha para mulheres que desejavam
abortar. Chegando ao local combinado, eram recebidas com vídeos sensacionalistas sobre o
tema, obrigadas a segurar fetos de borracha, entre outras coisas4. Mais recentemente, a
antropóloga Débora Diniz deve que deixar o Distrito Federal por conta de ameaças recebidas
de grupos pró-vida por conta de sua militância em favor da legalização do aborto.
A misoginia e a objetificação das mulheres também fazem parte do controle sobre o
corpo e trabalho femininos. Segundo Federici, na transição entre feudalismo e capitalismo a
misoginia tornou-se lei, com a autorização inclusive do estupro de prostitutas. Nota-se que
que a ideologia não é suficiente para manter as mulheres submissas – e, para isso, vale
também o uso da violência sexista como um recurso de controle (Saffioti, 2001). A violência
é realizada pelos homens, porém, legitimada pelo Estado através da sua omissão. No Brasil,
essa área também sofreu retrocessos: em 2017, Temer cortou 61% (de R$ 42,9 milhões para
4 As informações são da reportagem de Andrea Dip, para a Pública: https://apublica.org/2018/01/armadilha-para-
mulheres/
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R$ 16,7 milhões) das verbas destinadas ao atendimento de mulheres vítimas de violência; e
reduziu em 54% (de R$ 11,5 milhões para R$ 5,3 milhões) o orçamento para políticas de
incentivo à autonomia das mulheres.
Além de todas essas medidas, tem-se buscado disseminar a imagem da mulher que
desde 2016 ficou conhecida como “bela, recatada e do lar” – palavras utilizadas pela Revista
Veja em reportagem de 2016 para caracterizar Marcela Temer, esposa do então vice-
presidente Temer. De acordo com a reportagem, “seus dias consistem em levar e trazer
Michelzinho da escola, cuidar da casa, em São Paulo, e um pouco dela mesma também (nas
últimas três semanas, foi duas vezes à dermatologista tratar da pele)”. A reportagem, ainda,
faz questão de salientar que tudo isso partiu da escolha da própria Marcela.
Esse modelo é velho conhecido das feministas: é a valorização do cuidado, do ser
mãe, e da mulher no espaço privado. Um ideário muito propagado pela ideologia patriarcal,
mas inalcançável para a maioria das mulheres – que precisam trabalhar todos os dias para
trazer a comida para a casa e fazer o trabalho doméstico sem a ajuda de ninguém. Apesar de
ser um modelo antigo, há uma tentativa de reciclá-lo, colocando-o como escolha e,
portanto, empoderador para as mulheres5. A partir do próprio tema do “empoderamento”, é
notável o uso que se tem feito do termo para justificar a flexibilização do trabalho, como na
reportagem “Porque o fim da jornada de 8 horas é o futuro do feminismo”, da revista Marie
Claire (2016), em que argumenta-se que a “mulher moderna” – que cuida da casa, dos filhos e
ainda tem uma carreira – precisa de horários flexíveis para fazer tudo o que lhe cabe. Trata-se
de uma ofensiva que visa não mostrar-se como anti-feminista, mas cooptar um determinado
discurso para proveito do sistema capitalista.
Porém, de alguns anos para cá, não só no Brasil, a disputa em torno dos modelos de
feminilidade têm se dado principalmente a partir do que setores da direita cunharam de
“ideologia de gênero”, sendo a escola o principal alvo de seus ataques.
4. A ESCOLA EM DISPUTA: O MOVIMENTO ESCOLA SEM PARTIDO E O
FANTASMA DA "IDEOLOGIA DE GÊNERO"
5 A título de curiosidade: a revista Notícias, da argentina, fez uma matéria semelhante sobre Juliana Awada, a
primeira-dama do país. Eis o título, e o texto que o acompanha: “A volta da mulher decorativa”. Continua:
“Deixou tudo para acompanhar Macri. Representa o estereótipo da esposa tradicional, discreta e a serviço do lar.
O contramodelo K [alusão a Kirchner]. Exclusivo: a primeira-dama explica como entende seu papel.”
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O papel da escola enquanto reprodutora (ou não) da ideologia dominante capitalista
têm sido tema de debate de diversos autores (Gramsci, 1978; Marx; Engels, 2011; Goodson,
2001; Apple, 2002). Apesar das discordâncias que possam ter entre si, é consenso sobre a
íntima relação estabelecida entre a escola e o sistema econômico vigente – uma vez que a
Escola Moderna surge para atender a determinadas demandas do sistema capitalista,
mostrando existente entre os âmbitos econômico, político e cultural. Em tese, para cada
sistema econômico, haverá uma escola para formar a mão-de-obra necessária para tal.
Gramsci, por exemplo, afirma que o “controle” dos “instintos sexuais humanos” é importante
para o desenvolvimento do “novo tipo de homem exigido pela racionalização da produção e
do trabalho” (1978, p.252) (motivo pelo qual esse controle seria maior nas cidades, e menor
no campo, que conta com uma presença maior de elementos considerados “pré-capitalistas”).
Nesse sentido, é preciso “um contínuo e relevante gasto com o aprendizado dos novos
urbanizados” (1978, p.251).
Quando fala em “racionalização da produção e do trabalho”, Gramsci refere-se à
industrialização. Esse processo – o avanço das forças produtivas – significa também a
complexificação do trabalho:
O desenvolvimento da máquina incorpora a esta a habilidade do ofício e os
conhecimentos que antes residiam no – e eram possessão do – trabalhador. Dessa
forma, a ciência e os conhecimentos passam a ser propriedade do capital [...]
(MARX; ENGELS, 2011:9)
O conhecimento acumulado pela humanidade contribui para o avanço das forças
produtivas, que pasam a tê-lo em si. Nesse sentido, trabalhar com elas – por exemplo, na
indústria siderúrgica, manuesando máquinas – exige um novo tipo de conhecimento, diferente
daquele que tinha o artesão. Nesse sentido, a manutenção do sistema exige uma determinada
formação de mão-de-obra, e també ma formação de uma pequena elite, que será responsável
por pensar e formular o avanço dos meios de produção (trata-se da divisão social do trabalho,
que o divide entre intelectual e manual):
O verdadeiro significado da educação, para os economistas filantropos, é a formação
decada operário no maior número possível de atividades industriais, de tal modo
que, se é despedido de um trabalho pelo emprego de uma máquina nova, ou por uma
mudança na divisão do trabalho, possa encontrar uma colocação o mais facilmente
possível (MARX; ENGELS, 2011:114)
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Nesse sentido, podemos afirmar que as mudanças nas forças produtivas criaram
novas necessidades tecnológicas – sendo elas, em grande parte, responsáveis pela
institucionalização da educação na Escola Moderna.
A escola, no entanto, também pode ser um espaço de socialização do conhecimento,
de acesso à cultura, contribuindo para a formação de uma consciência crítica – não à toa a
burguesia promove uma divisão das escolas: as de qualidade para seus próprios filhos, as mais
sucateadas para a classe trabalhadora.
De acordo com Apple, seria um equívoco considerar que a escola tenha tão somente
um papel reprodutor da ideologia dominante em nossa sociedade. Para ele, as relações
estabelecidas na escola são, como todas as relações capitalistas, contraditórias:
Pois as escolas não são “meramente” instituições de reprodução, [...] Esta
interpretação é falha sob dois aspectos centrais. Primeiramente, ela vê os estudantes
como internalizadores passivos de mensagens sociais pré-fabricadas. Qualquer coisa
que a instituição transmita, seja no currículo formal ou no currículo oculto, é
absorvida, não intervindo aí modificações introduzidas por culturas de classe ou pela
rejeição feita pela classe (ou raça ou gênero) dominada das mensagens sociais
dominantes. Qualquer um que tenha ensinado em escolas de classe trabalhadora [...]
sabe que não é assim [...].
A interpretação da reprodução [...] subteoriza e portanto negligencia o fato de que as
relações sociais capitalistas são inerentemente contraditórias sob algumas formas
muito importantes. Isto é, como afirmei antes, assim como na arena econ^mica, em
que o processo de acumulação de capital e a “necessidade” de expandir mercados e
lucros gera contradições na sociedade (em que, por exemplo, inflação e lucros
crescentes cram uma crise de legitimidade tanto no estado quanto na esconomia),
assim também contradições similares aparecerão em outras instituições dominantes.
(APPLE, 2002:31)
Os estudos sobre currículo buscaram entender “da onde vinham” os conhecimentos
ensinados na escola: quem, afinal, decide aquilo que se ensina? Ao contrário do que muitos
afirmam, o currículo não é um dado (quase) “natural”, um “dado atemporal” (Goodson, 2001,
p.213), ao contrário, trata-se de uma construção social (Goodson, 2001, p.213). Uma vez que
o currículo não é algo advindo da natureza, mas sim social, é também um terreno de disputa.
Para Apple (2002), a escola é um lugar onde se produz (e não só reproduz) ideologia e,
justamente por isso, é um espaço de luta e resistência – de professores, mas também de
alunos, que podem negar-se a aprender o que é ensinado. Da mesma forma que nos locais de
trabalho, o cotidiano da escola é um espaço de diálogos, contradições e resistências.
Tanto a escola é um espaço de disputa (Duarte, 2012), que reformas recentes buscam
alterar sua estrutura curricular – reformas estas que têm sido amplamente criticadas por
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associações educacionais e outros setores da esquerda, como a Reforma do Ensino Médio
(MP 746/2016), que flexibiliza a estrutura curricular desse nível de ensino, e a nova Base
Nacional Comum Curricular (BNCC). A própria necessidade de reformas para adequar a
escola às atuais necessidades do sistema capitalista mostra que a instituição pode ser alterada
de acordo com a correlação de forças na disputa. E é nesse ponto que entra o Movimento
Escola Sem Partido e o debate sobre a famigerada “ideologia de gênero”.
Apesar da maior visibilidade nos dias de hoje, o Movimento Escola de Partido surgiu
em 2004, criado por Miguel Nagib, advogado e procurador do Estado de São Paulo. As idéias
apregoadas por Nagib e pelo movimento estão alinhadas tanto com grupos economicamente
neoliberais quanto com grupos ultraconservadores de direita (ligados a políticos religiosos,
católicos ou evangélicos).
[...] Seu programa se posiciona contra a liberdade de expressão dos docentes em sala
de aula, o diálogo franco entre professores e alunos e o pensamento crítico. [...]Entre
as iniciativas inspiradas no Movimento Escola Sem partido, estão os anteprojetos de
lei que, além de pretender restringir o ensino crítico impondo censura aos docentes
nas escolas – razão pela qual fala-se em uma “nova lei da mordaça” - , querem banir
as discussões sobre gênero em sala de aula. Tais projetos são redigidos e
intermediados por figuras como o já citado Miguel Nagib e políticos como o Flávio
Bolsonaro, deputado estadual pelo Rio de Janeiro, do Partido Social Cristão,
polêmico por fazer declarações homofóbicas e defender a volta do regime militar; e
Magno Malta, senador do Partido da República pelo Espírito Santo, que é um pastor
evangélico ( FRANCO, 2017:234).
Assim como a Nova Direita citada por Susan Faludi, o Movimento Escola Sem
Partido afirma-se como “não-ideológico”, como se “ideologia” significasse automaticamente
algo “impuro” e uma manipulação (não à toa cunharam o termo “ideologia de gênero”).
Buscam afirmar-se como “heróis”, contra os “vilões”:
O dualismo implícito e explícito no discurso do Escola Sem partido é sustentado
pela eleição de personagens e instituições que, por um lado, o movimento pretende
valorizar e, por outro, qu quer condenar. Os primeiros são citados ou indicados sem
contestação, servindo como base de sustentação para o movimento. [...] Entre os
estrangeiros, há recomendação da leitura de Pascal Bernardin, autor de Maquiavel
Pedagogo ou o ministério da reforma psicológica [...], segundo o qual haveria uma
conspiração global, promovida por instituições como a Organização das Nações
Unidas (ONU) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco), para promover as políticas de gênero. Segundo o autor, tais
organizações afirmam-se preocupadas com o desenvolvimento da cidadania quando,
na prática estariam interessadas fundamentalmente na “manipulação mental” dos
alunos. (FRANCO, 2017:239)
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Um dos alvos do Movimento Escola Sem Partido e seus apoiadores foram os Planos
Municipais e Estaduais de Educação (PME e PEE). O movimento e seus vereadores e
deputados articularam-se para regirar a menção ao debate “de gênero” dos planos – e, em
alguns lugares, chegaram a lograr sua proibição – como foi o caso de Campinas (2015). A
votação na Câmara de Vereadores de São Paulo (2015) contou com a presença de grupos
feministas e do movimento LGBT mas também com os setores mais reacionários– incluindo a
Tradição, Família e Propriedade (TFP), identificados pela jaqueta com o símbolo da
organização estampado. Os vereadores votaram “em nome da família”, “em nome de deus”, e
afirmando que os países que implantaram a “ideologia de gênero” nas escolas haviam tido um
crescimento da violência contra a mulher (sem trazer nenhuma fonte que confirmasse essa
afirmação estapafúrdia).
Atuar para alterar leis em seu benefício é uma maneira de disputar os rumos da
escola – ainda que no espaço do cotidiano possam ser construídas resistências às leis. Por
exemplo, uma lei de cunho progressista, que não só permita mas que afirme a necessidade de
se debater sobre feminismo em sala de aula, é um apoio institucional legal para a professora
ou professor que pretende fazer esse debate e enfrentar as resistências presentes na escola (ou
pressões vindas de fora). É também, uma proteção contra eventuais ameaças de grupos
fundamentalistas – que, infelizmente, existem, como veremos mais adiante.
A não presença desse tema – mesmo que sem uma proibição explícita – nas diretrizes
para a educação (tanto nacionais, quanto estaduais ou municipais) pode abrir espaço para
tornar os professores “foras da lei”, afinal, se não está no PME, certamente é porque trata-se
de “ideologia pura” e “doutrinação” por parte dos professores. Esse nível de enfrentamento
não é possível sem, no entanto, uma intensa patrulha ideológica que vigie a atitude dos
professores. O Movimento Escola Sem Partido incentivou que as pessoas (pais, alunos e
mesmo professores) denunciassem caso em sua escola (ou dos filhos) estivesse sendo feito o
debate sobre o tema. Um claro exemplo foi o ocorrido em 2016 à Escola Municipal de Ensino
Fundamental (EMEF) Desembargador Amorim Lima, localizada na região Oeste da cidade de
São Paulo. O vereador Ricardo Nunes (PMDB) enviou uma notificação à escola, exigindo que
a escola paralisasse suas atividades relativas à “semana de gênero” (semana em que seriam
feitos diversos debates sobre o tema). Além de tal ação não ser de competência do vereador, o
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documento tinha um claro teor de ameaça. Posteriormente, foi organizado um ato-debate
sobre o ocorrido, que contou inclusive com a presença da Marcha Mundial das Mulheres. Lá,
a autora da “denúncia” (uma professora da própria instituição) assumiu o feito, afirmando
que não estava de acordo com o projeto político pedagógico adotado pela instituição.
Ainda que saibamos os limites da atuação da escola, ela não deixa de ser um espaço
“disseminador” de ideologia e, justamente por isso, importante para a formação dos jovens no
sentido de uma educação construída para a construção de relações não patriarcais de gênero.
Além do mais, o Movimento Escola Sem Partido e sua base fundamentalista de apoio não
buscam somente retirar o tema de sala de aula, mas inserir outros, como educação religiosa.
Nesse sentido, querem utilizar a escola para disseminar suas ideias de discriminação,
intolerância e preconceito. Por um lado, temos os ataques aos direitos sociais que irão
precarizar as relações de trabalho e as condições de vida e, por outro, teremos a legitimação
desse processo através de um projeto político-pedagógico direcionado a atender as demandas
do capital.
Ainda que o foco do presente trabalho seja o Brasil, vale ressaltar que a campanha
contra a “ideologia de gênero” é internacional, tendo sido pautada em vários países, como na
Colômbia, na ocasião do plebiscito pela paz entre as FARC e o governo, em que os
conservadores utilizaram o debate da “ideologia de gênero” para defender o voto contra o
acordo. Por conta de pressões de diversos setores da sociedade, o tema foi retirado da grade
currícular escolar do Perú e os livros didáticos que continham o tema foram recolhidos6.
A não presença desse tema nas escolas significa a perda da chance de atuar para
prevenir diversos problemas que atingem as meninas e jovens mulheres, tais como violência
(física, psicológica, sexual), doenças sexualmente transmissíveis, entre outros. Significa,
também, perder a chance de formar os meninos e jovens garotos em direção a uma nova
masculinidade. Ao combater a inserção do feminismo nas escolas, o Movimento Escola Sem
Partido atuam justamente para manter as mulheres em uma situação de submissão, e
retroceder com relação ao que conquistamos até hoje. Segundo Franco (2017), é preciso
desmascarar esse movimento, fazendo uma “leitura a contrapelo do que propõem”:
O que podemos pensar, por exemplo, quando nos deparamos, em seu site, com a
reprodução, sem contestação, de uma matéria de um veículo católico, que, entre
6 Sobre este tema, sugerimos o estudo realizado pelo Brasil de Fato que mapeia as regiões onde o debate ocorreu.
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outras coisas, se opõe à vacina contra HPV? [...]. Ora, se reproduzem matéria desse
teor, sem qualquer objeção a ela, por pretenderem evitar um diálogo em ambiente
escolar que fira a conduta moral de pais religiosos, é porque implicitamente
concordam que o Estado se omita em relação às possibilidades de contenção e
erradicação da doença. No limite, seriam cúmplices da disseminação da mesma.
Outra situação: se lançam críticas aos Parâmetros Curriculares Nacionais por
trazerem muitas vezes a palavra “preconceito”, é porque são adeptos das práticas
que a justiça e as associações educacionais consideram preconceituosas. Se não
querem discutir nem aceitar debater sobre sexo com segurança é porque acatam e
são conivente com os casos de gravidez indesejada na adolescência. Se não
concebem a abordagem de temas como o prazer sexual, é porque aceitam a noção da
prática sexual apenas para fins reprodutivos; e, se não há nenhum prazer implicado,
convenhamos, aceitam a ideia de que o mesmo é feito à base da força (FRANCO,
2017:243-244)
No item 3 deste artigo, trouxemos uma série de mecanismos utilizados para controle
sobre o trabalho e corpo das mulheres. O combate ao feminismo dentro das escolas é,
também, parte parte desses mecanismos: ao impedirem a discussão sobre a construção de
novas relações de gênero entre homens e mulheres, acabam por corroborar com a atual
conformação dessas relações – patriarcais, isto é, de submissão das mulheres aos homens e ao
capital.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A título de conclusão, consideramos importante ressaltar alguns fatores que
trouxemos ao longo do texto. Em primeiro lugar, o patriarcado (ou relações patriarcais) não é
um fenômeno somente cultural, mas tem uma base material, sendo ele próprio um dos pilares
que sustenta o capitalismo. Esse entendimento é importante para compreender como é
encarado este tema dentro das escolas, e mesmo para entender a atuação da própria escola –
que é prioritariamente cultural, mas tem relação com as esferas econômica e política do
sistema, uma vez que essas diferentes esferas se constróem em relações de mão dupla, isto é,
dialéticas.
Nesse mesmo sentido, é importante entender a atuação de grupos reacionários nas
escolas como algo relacionado à política geral. Isto é, o avanço de forças conservadoras sobre
a escola pública brasileira tem relação com o golpe que vivenciamos em 2016 e com as
medidas econômicas reacionárias e neoliberais que foram tomadas desde então, uma vez que
fazem parte de um mesmo projeto político que quer manter o Brasil como uma eterna
república das bananas.
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Por fim, é preciso afirmar novamente que as relações capitalistas são intrinsicamente
patriarcais e que, justamente por isso, medidas de fortalecimento do patriarcado serão
tomadas para o fortalecimento do capitalismo e uma saída reacionária para a crise – uma saída
que reafirmará a centralidade do mercado e que deixará mais uma vez a sustentabilidade da
vida na mão das mulheres. Para impedir isso e construir uma nova realidade – que tenha a
vida das pessoas e não o lucro como objetivo central – é preciso que façamos as análises
corretas, mas que também nos organizemos em conjunto com os diversos movimentos sociais
existentes para barrar os retrocessos que vivemos atualmente na política e na educação
brasileiras.
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