politica operaria 125

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Fundador: Francisco Martins Rodrigues MAIO / JUNHO 2010 Nº 125 3,00 Para quando a greve geral? Israel não consegue evitar a revolta palestiniana e perde terreno na cena internacional. A resistência em Gaza e na Cisjordânia, o boicote aos produtos israelitas no exterior, a exigência de sanções internacionais e a condenação da polí- tica sionista favorecem a causa palestiniana, mas não travam a passividade da ONU e dos Estados árabes e o apoio dos EUA a Israel nos seus crimes contra a humanidade.(Pág. 13) Contra o bloqueio a Gaza A caminho do trabalho forçado Perante a desorientação do governo PS, Pedro Passos Coelho toma cada vez mais a condução do bloco central. É de facto esta aliança não declara- da entre o PS e o PSD quem comanda os desti- nos do país, obedecendo aos que detêm o poder real – o grande patronato. (Pág. 3) “Ir buscar aonde o há” Belmiro de Azevedo saiu-se com esta: “Quando o Povo tem fome tem direito a roubar”. Esta surpreendente bravata deve ser entendida, antes de tudo, como diagnóstico e espelho da impunidade de classe de que a burgue- sia e o patro- nato des- frutam. (Pág. 9 ) No dia 8 os deserdados deste país vão poder manifestar mais uma vez a sua discordância relativamente às gravo- sas medidas de combate à crise a que são alheios, para a qual não foram vistos nem achados, mas que estão obrigados a pagar por determinação dos ricos e poderosos que coman- dam os destinos da União Europeia e dos seus serventuários de serviço no nosso país. E é apenas disso que se trata, de dizer que discordamos, e de forma ordeira. Nada de copiar os gregos, com ocupações de minis- térios, paralisar o país com greves gerais (o mau exemplo já chegou a Madrid), de sequestrar patrões até ver os direitos satisfeitos, com têm feito com êxito os trabalhadores fran- ceses e chineses. Depois da gigantesca manifestação de dia 29, quando era expectável que se endurecessem as formas de luta e as reivindicações, se começasse a mobilizar para uma greve geral nacio- nal e pelo derrube do governo e da coligação não declarada que o sus- tenta e mantém refém, os nossos bonzos sindicais resolveram-se por uma jornada de luta, que não se sabe bem para que servirá. Dirão que é a cobardia típica dos re- formistas e burocratas traidores. Nós dizemos que é uma lógica de classe e que quem anda enganado são os que ainda confiam na possibilidade de um dia os dirigentes do PCP, do BE e dos sindicatos caírem em si e dize- rem basta. Não é por acaso que o PCP não cessa de dizer que “o país precisa de uma política patriótica e de esquerda” e de se manifestar “em defesa da produção, da justiça so- cial e da soberania nacional”. É como se não existissem classes, mas só por- tugueses bons e honrados. Eleva-se a moral, rebaixa-se a política e eli- mina-se a consciência de classe. Não por acaso, agora a grande moda da classe política nacional é invocar o “patriotismo, depois de terem feito o seu percurso a “democracia e mercado”, o “imperativo nacional” e a “ética republicana”. Num mo- mento em que a conflitualidade so- cial se acentua, não deixa de ser es- tranho que a nossa esquerda ordeira actue à margem dos conflitos de classe, como se tudo pudesse ser resolvido através da harmoniosa ne- gociação entre os que beneficiam com a crise e as suas vítimas. O “interesse nacional” SUPLEMENT SUPLEMENT SUPLEMENT SUPLEMENT SUPLEMENTO PO O PO O PO O PO O PO 25 de Abril: o proletariado deixou escapar a crise de poder FRANCISCO MARTINS RODRIGUES Rumo à Quinta Internacional ÂNGELO NOVO Eleições no Brasil VALÉRIO ARCARY

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Publicação do Colectivo Comunista português Política Operária, correspondente a Maio-Junho de 2010.

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Page 1: Politica Operaria 125

Fundador: Francisco Martins Rodrigues MAIO / JUNHO 2010 Nº 125 3,00

Para quandoa greve geral?

Israel não consegue evitar a revolta palestiniana e perdeterreno na cena internacional. A resistência em Gaza e naCisjordânia, o boicote aos produtos israelitas no exterior, aexigência de sanções internacionais e a condenação da polí-tica sionista favorecem a causa palestiniana, mas não travama passividade da ONU e dos Estados árabes e o apoio dosEUA a Israel nos seus crimes contra a humanidade.(Pág. 13)

Contra o bloqueio a Gaza

A caminhodo trabalhoforçadoPerante a desorientaçãodo governo PS, PedroPassos Coelho toma cadavez mais a condução dobloco central. É de factoesta aliança não declara-da entre o PS e o PSDquem comanda os desti-nos do país, obedecendoaos que detêm o poderreal – o grande patronato.

(Pág. 3)

“Ir buscar aondeo há”Belmiro de Azevedo saiu-secom esta: “Quando o Povo temfome tem direito a roubar”. Estasurpreendente bravata deve serentendida, antes de tudo, comodiagnóstico e espelhoda impunidadede classe deque a burgue-sia e o patro-nato des-frutam.(Pág. 9 )

No dia 8 os deserdados deste país vãopoder manifestar mais uma vez a suadiscordância relativamente às gravo-sas medidas de combate à crise a quesão alheios, para a qual não foramvistos nem achados, mas que estãoobrigados a pagar por determinaçãodos ricos e poderosos que coman-dam os destinos da União Europeia edos seus serventuários de serviço nonosso país. E é apenas disso que setrata, de dizer que discordamos, ede forma ordeira. Nada de copiar osgregos, com ocupações de minis-térios, paralisar o país com grevesgerais (o mau exemplo já chegou aMadrid), de sequestrar patrões atéver os direitos satisfeitos, com têmfeito com êxito os trabalhadores fran-ceses e chineses.Depois da gigantesca manifestaçãode dia 29, quando era expectável quese endurecessem as formas de luta eas reivindicações, se começasse amobilizar para uma greve geral nacio-nal e pelo derrube do governo e dacoligação não declarada que o sus-tenta e mantém refém, os nossosbonzos sindicais resolveram-se poruma jornada de luta, que não se sabebem para que servirá.Dirão que é a cobardia típica dos re-formistas e burocratas traidores. Nósdizemos que é uma lógica de classee que quem anda enganado são osque ainda confiam na possibilidadede um dia os dirigentes do PCP, do BEe dos sindicatos caírem em si e dize-rem basta. Não é por acaso que oPCP não cessa de dizer que “o paísprecisa de uma política patriótica ede esquerda” e de se manifestar “emdefesa da produção, da justiça so-cial e da soberania nacional”. É comose não existissem classes, mas só por-tugueses bons e honrados. Eleva-sea moral, rebaixa-se a política e eli-mina-se a consciência de classe. Nãopor acaso, agora a grande moda daclasse política nacional é invocar o“patriotismo, depois de terem feitoo seu percurso a “democracia emercado”, o “imperativo nacional”e a “ética republicana”. Num mo-mento em que a conflitualidade so-cial se acentua, não deixa de ser es-tranho que a nossa esquerda ordeiraactue à margem dos conflitos declasse, como se tudo pudesse serresolvido através da harmoniosa ne-gociação entre os que beneficiamcom a crise e as suas vítimas.

O “interessenacional”

SUPLEMENTSUPLEMENTSUPLEMENTSUPLEMENTSUPLEMENTO POO POO POO POO PO

25 de Abril:o proletariadodeixou escapara crise de poder

FRANCISCO MARTINS

RODRIGUES

Rumo à QuintaInternacional

ÂNGELO NOVO

Eleições no BrasilVALÉRIO ARCARY

Page 2: Politica Operaria 125

[email protected]

Colaboraram neste número: Ana Barradas, António Barata, AntónioDoctor, Ângelo Novo, José Borralho, Maurício Castro, Paulo JorgeAmbrósio, Ricardo Noronha, Rui Mendes, Valério Arcary, Vítor ColaçoSantos

Propriedade: Cooperativa Política Operária

Correspondência: Apartado 1682 - 1016-001 LISBOA | TM: 960 135 270 |

Periodicidade: Bimestral | Tiragem: 1100 exemplares

Publicação inscrita na DGCS com o número 110858

ASSINATURAS

5 números 10 números 5 números(1 ano) (2 anos) (apoio)

Continente e Ilhas 12,50 • 25,00 • 25,00 •Europa 17,50 • 35,00 • 35,00 •Resto do Mundo 20,00 • 40,00 • 40,00 •

Pagamento por cheque ou vale de correio em nome de POLÍTICAOPERÁRIA e endereçado, Apartado 1682, 1016-001 LISBOA, ou por

transferência bancária para o NIB 0033 0000 4535 4654 3330 5

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2 | MAIO / JUNHO 2010

LER COM GOSTOÉ sempre com alegria e prazer que receboa “nossa Política Operária”. Leio-a com to-do o interesse e, uma vez lida, passo-a aum colega e amigo das lides do ensino, oqual também a lê com gosto.Li atentamente este número de Março/Abril, que refere o 2º aniversário da mortedaquele grande militante comunista quefoi o saudoso Francisco Martins Rodri-gues.Estou plenamente de acordo com o que arevista diz, nomeadamente no desmascara-mento de Sócrates e Manuel Alegre.Fiquei chocada com as torturas a que sãosujeitos, em Espanha, os activistas bascos.Enjoa-me que Portugal a apoie.Gostei de ver e ler o texto do nosso amigopadre Mário de Oliveira sobre a pedofiliana Igreja Católica. Repugna-me o que noseu seio se passa.

Fátima Pitta Dionísio – Funchal

OS “CAMARADAS” POLÍCIASA difusão electrónica do comentário aos inciden-tes registados na manifestação da CGTP dedia 29, que publicamos na página 5 com o títu-lo Os “camaradas” polícias, suscitou algumasreacções de que damos conta:Jamais esquecerei uma das maiores sovaspolíticas que levei até hoje, na já distantemanif da Inter de 27 de Junho de 1981.O bloco revolucionário, onde estavam ossindicatos da Corrente Sindical “O Tra-balho”, gritava então “contra o Amaral eo Carneiro, parar o país inteiro”, com mui-tos panos pela greve geral; o maior era odo sindicato dos marinheiros mercantes.Primeiro as provocações do useiro carrode som, depois a troca de palavras e final-mente a carga dos jagunços, armados depaus, canos de ferro dos panos deles, nava-lhas e até pistolas. O nosso bloco foi total-mente desfeito. O próprio Tomé levouporrada. Nos minutos que se seguiram eraum corrupio de ambulâncias a carregarmalta para dentro.Lembro-me que fui cercado e derrubadopor uma matilha duns quatro, a soco epontapés, um deles arrastou-me pelos péspara a estátua do Marquês, onde me foto-grafou, enquanto outro me apontava umapistola.Cenas do “movimento sindical unitário”,sempre cedendo aos direitistas e por issoselvático para com a sua ala esquerda, quejamais esquecerei.

Paulo Jorge – Mercês

Já partilhei com alguns de vocês a minhapreocupação sobre os incidentes na manifdo 1º de Maio e agora estes de dia 29 com

os “rapazes” da CGTP. Para quem andanisto desde as primeiras manifs de 1974-75, este é um filme que se repete e nãoaugura nada de bom.Também naquele tempo tivemos de dispu-tar ao soco e ao murro o nosso direito deestarmos dentro dos desfiles da centralsindical, sob acusações como sermos cúm-plices da extrema-direita, fazermos o jogoda reacção e sermos agentes da CIA.Ganhámos essa batalha, mostrámos a to-dos quem somos e durante todo este tem-po, embora contra vontade por parte dosmais sectários, não nos puderam expulsar.Agora que se agudizam as contradições napolítica e se avizinha um período de maiorconflitualidade e exasperação da luta declasses, aí estão os gorilas outra vez, man-dados de cima – não tenhamos dúvida –para nos intimidar e fazer ver que quemmanda no movimento são eles. Preparam--se para repetir a operação de tentar isolar--nos, evitar que nos acerquemos da basede apoio deles para não a disputarmos,fazer calar as nossas ideias e palavras deordem, nem que seja à cacetada, e impor asua “lei” antidemocrática.Será preciso voltar a recordar-lhes que omovimento sindical não é nenhum partidocomunista, não pertence a ninguém, é umconjunto muito diversificado de trabalha-dores com as mais variadas ideias e práticase ninguém lhe pode vir impor nada quenão tenha sido democraticamente votado.Todos os que se identificam com os objec-tivos gerais têm o direito de fazer ouvir asua voz singular, mesmo que não digamexactamente aquilo que queremos.Penso que aqueles indivíduos e/ou forma-ções políticas que foram agredidos e provo-cados se devem encontrar para dirigir umacarta à direcção da Intersindical a relataros factos e a exigir uma tomada de posiçãocontra esses abusos. Para que conste e paraque não se diga que não estavam ao cor-rente.

A. B. – Lisboa

Não tenho a certeza de que pertencessemao sindicato do PSP. Fiquei com a impres-são que era a equipa de seguranças profis-sionais que assegura as zonas mais impor-tantes da festa do Avante!  E também oouvi dizer por algumas pessoas do PCP.Também fiquei com a impressão de que adecisão de os meter ali foi tomada foradas estruturas sindicais, provavelmente naSoeiro Pereira Gomes.Quanto à carta à mesa nacional da CGTP,sou um pouco céptico. Mas que avancequem acha que isso pode ser importante.Um abraço

Ricardo – Lisboa

A TROPA VAI ACABAR? – Ficamos sem palavras quandoOtelo aparece a defender uma tropa ao serviço das popula-ções estilo MFA, ou o folclórico professor Agostinho daSilva aconselha aos militares a afectuosidade em vez daarrogância… Os seja, acham bom que se arranje umatropa que não seja tropa… A quem serve esta sublimaçãoutópica da função celerada do exército, quem ganha coma ilusão de que a tropa pode ser reconvertida, se ela nasceupara oprimir e matar?…A tropa não pode ser desarmada e extinta sem derrubar eexpropriar a burguesia. Este é o problema prático queestá posto e nele devemos concentrar atenções e esforços.É a isso que fogem os que tratam o problema da tropacomo uma questão moral e não de classe.

O 1º DE MAIO PODE VOLTAR A SER UMA JORNADADE LUTA CONTRA O CAPITAL – A burguesia tem o Diado Trabalhador domesticado. O poder das multinacionaiscobre o mundo como um cancro e, combinando a repressãocom a miragem do “bem-estar geral”, transforma a huma-nidade numa dócil massa assalariada. A derrocada dosregimes de Leste – cujos dirigentes, depois de terem anda-do a reprimir e explorar os operários em nome do socialis-mo, acabaram por chegar à conclusão que o que lhes con-vém é o capitalismo – põe a burguesia eufórica. Conven-cem-se de que ficaram livres para sempre da ameaça darevolta operária e só pensam em enriquecer depressa.

O CONGRESSO ESTÁ GANHO – O PIOR É EXPLICAR A“PERESTROIKA” – Se os membros do PCP ainda conse-guissem raciocinar perguntariam como pode em qualquerpaís “consolidar-se o Estado socialista” ao mesmo tempoque se instaura o poder arbitrário e repressivo sobre opovo. Então o socialismo não exige por definição precisa-mente o poder dos trabalhadores?! E, se se reconheceagora que os trabalhadores não detinham “o poder efec-tivo”, que estranho poder foi então esse que teria feitoavançar apesar de tudo o socialismo? E se agora já não hádúvidas para o PCP de que o poder dos sovietes não existena URSS (visto que vai ser “reconstituído”), como pensaque possa ser de novo instaurado sem uma nova revoluçãosemelhante à de 1917?

A CAPITULAÇÃO – Os fiéis pró-albaneses do PC(R) eda UDP reagiam com indignação às críticas que temosvindo a fazer ao PTA; encontravam razões para justificara política externa nacionalista, a estagnação ideológica,o tenebroso caso Mehmet Shehu, etc. E agora, como rea-gem à perestroika albanesa? No último número de BandeiraVermelha, o PC(R) congratula-se, numa extravagante sau-dação, cheia de adjectivos e floreados, com os novos “tre-mendos avanços” do socialismo albanês!

Na PO 25, Maio/Junho de 1990:- 25 Abril – 10 verdades incómodas;- Centrais sindicais - Somar ronha compaleio compensa?;- Debate comunista (A situação inter-nacional e o estado do comunismo;Tarefas do comunismo operário du-rante a derrocada do revisionismo;Uma proposta para o debate sobre osocialismo; Algumas lições do colapsodo capitalismo de Estado).

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MAIO / JUNHO 2010 | 3

Problemassobre problemas

A desvantagem actual do capitalismo é que nãosó não consegue debelar as crises que ele própriocria, como se limita a transferi-las de um lado parao outro: a crise dos bancos ou do défice orçamentalpassam a ser crises do país e mais especificamentedas suas camadas populares, que ficam na obrigaçãode as compensar à sua própria custa, através de re-dução de salários e prestações sociais.

O sistema financeiro, em roda livre há vários anos,levou muitos capitalistas a transferir património paraos paraísos fiscais, ao mesmo tempo que, no planodas relações laborais, tentavam disciplinar ossindicatos e retirar direitos aos trabalhadores parafazer baixar os custos com a mão-de-obra. Mas comisto criou novos problemas: se os salários estagnamou depreciam-se e o poder de compra dos consu-midores diminui. Onde é que o capital pode irrecolher os lucros que derivam do mercado?

Na mente dos magos das finanças, a resposta éfácil: cria-se um mercado fictício, o do crédito ajuros assassinos, a conceder a quem nada tem e ima-gina poder assim ganhar acesso a bens de consumoa que aspira, sem se dar conta do que significa ofacto de ter de levar toda a vida a pagá-los. A comprade casa própria, dantes considerada o eldorado dequalquer família desejosa de ascender, é agora apedra ao pescoço que a afunda na dívida permanenteou, na pior das hipóteses, em grupo de sem-abrigos.Outros produtos igualmente imaginários — futuros,derivados, tradings — completam o quadro da alu-cinação especulativa em que tudo é virtual, menosos lucros que apesar de tudo os bancos vão arreca-dando.

A grande ironia de tudo isto é que os adeptos doneoliberalismo e do menos-Estado são precisamenteos que revelam uma dependência completa em rela-ção ao Estado em momentos de crise. Cada governocorre em seu socorro, empresta aos bancos faltososem vez de os sancionar, empenha os recursos públi-cos para os salvar, para depois apresentar a facturaaos trabalhadores.

Nem por isso a crise é superada, bem pelo con-trário. A sobreprodução, o crescimento negativo ea estagnação económica sufocam o sistema e geramníveis de desemprego de longa duração como nuncase viu antes. Este dado novo parece ter vindo paraficar: mesmo com uma retoma, o emprego tal comoo conhecíamos antes é já uma relíquia do passado.

Enquanto o sistema gera a catástrofe, o únicocaminho que se abre aos trabalhadores é seguir oexemplo dos seus companheiros gregos — que bemse esforçam por os incentivar a levantarem-se emluta — e recusarem-se a pagar a crise, exigindo em-prego digno para todos como um direito políticogarantido por lei.

A não ser assim, os trabalhadores devem concluirque, se o capitalismo não pode atender a esta rei-vindicação elementar, então mais vale livrarmo-nosdele. Como disse Marx, as ideias transformam-se emforças da história quando são apropriadas por umaclasse social. Chegou a altura de o fazermos.

Perante a inépcia e a desorientaçãodo governo socialista, o PSD, pela mãodo seu novo líder Pedro Passos Coelho,toma cada vez mais a condução do blococentral. Ainda que não formal, é de factoesta aliança não declarada entre o PS e oPSD quem comanda os destinos do país,obedecendo aos verdadeiros donos da na-ção, aos que detêm o poder real – o grandepatronato.

Obrigados a entender-se, mesmo quecontra vontade e em prejuízo das respec-tivas clientelas, PS e PSD têm de “aguen-tar o barco”, pelo menos até às presiden-ciais, e pôr de lado rivalidades e ambiçõespessoais. A ordem do grande patronato épara não se derrubar o governo – nadapior para os negócios que “somar à criseeconómica uma crise política”, dizem.Com Sócrates e o seu cada vez mais desa-creditado governo na defensiva, é PedroPassos Coelho quem de facto dita as li-nhas orientadoras da governação e docombate à crise e empurra as coisas paraa frente. Com a vantagem de que quemestá a ser alvo do descontentamento popu-lar, a “desgastar-se” e a ser perseguidopor vaias onde quer que apareça é Sócra-tes e o seu governo, para desespero dosincompreendidos socialistas.

Enquanto o “pagode” se diverte como mundial de futebol e vê a sua atençãodesviada para coisas menores como sa-ber se Sócrates mentiu ao parlamento so-bre o imbróglio PT/TVI, o PSD trata deavançar com o que realmente importa aogrande patronato. Depois de agendar arevisão da Constituição, de ter inspiradoe dado o aval ao mais recente pacote anti-crise (o PEC2), agravando as anterioresmedidas de combate à crise mesmo antesde terem sido postas em prática, o PSDlevou agora à Assembleia da Repúblicaum novo “pacote de combate ao desem-prego” que, se for aprovado, reduz a nadaos cada vez mais escassos e formais direi-tos dos trabalhadores, deixando-os com-pletamente à mercê dos caprichos e davontade discricionária do patronato: oalargamento dos contratos a prazo dosactuais 18 meses para quatro anos, cujarenovação sem limite significa na práticao fim dos contratos de trabalho efectivos,passando a só haver trabalho precário.

Depois de aprovada a disposição queobriga os desempregados que estão a re-ceber subsídio de desemprego a aceitarum trabalho qualquer, chegou a vez daprecarização total. A serem aprovadas taisdisposições, iremos assistir a um abai-xamento contínuo dos salários, dado quecom elas se inicia um ciclo de despedi-mento-subsídio-novo trabalho-despedi-mento-subsídio…, em que o trabalhadorvê o salário reduzido em cerca de 40% acada novo emprego.

Por outro lado, não deixa de ser cu-

rioso que o grande patronato continue ainsistir na política de baixos salários, dadegradação das condições de vida e dosdireitos dos trabalhadores. Sempre quese realizam debates sobre a crise, sobre oatraso crónico e os constrangimentos daeconomia portuguesa, este modelo é alvoda crítica do patronato e das suas asso-ciações, de académicos, especialistas efazedores de opinião, políticos e gover-nantes como o principal factor da faltade competitividade, atraso e falência domodelo de desenvolvimento seguido nopaís após a adesão à União Europeia –sendo esta uma das matérias em que seregista o maior consenso nacional, co-brindo todo o leque partidário, da extre-ma-direita àquela coisa invertebrada queno nosso país se intitula esquerda, comdestaque para o PCP e o BE. A ladainhaé: não podemos competir com a China, aÍndia, o Norte de Ãfrica e outras regiõesonde não existe direito à greve, onde ostrabalhadores não têm quaisquer direitose protecção social, existe trabalho infantile escravo, etc., pelo que temos de nosvirar para a inovação e as novas tecnolo-gias, qualificar a mão-de-obra e criar mer-cadorias de valor acrescentado, etc.

A discrepância dá um bom retratode mentalidade retrógrada e mesquinhada classe dominante portuguesa, semprepronta a disfarçar com grandes e bonitaspalavras a sua tacanhez e imobilismo, semoutra ambição que não seja parasitar osfundos comunitários e viver à sombradas obras públicas e benesses do Estado,razão pela qual ela é um dos elos fracosdo bloco imperialista que dá pelo nomede União Europeia. O que nos coloca, anós revolucionários, perante o desafiode saber se estamos à altura dos aconte-cimentos e das responsabilidades his-tóricas que se nos apresentam.

ANTÓNIO BARATA

A caminho dotrabalho forçado

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O mês em relance

4 | MAIO / JUNHO 2010

A TETA DA GALP – Recentemente vieram a pú-blico as nomeações amigas, os prémios e venci-mento milionários auferidos pelos gestores deempresas do Estado. Aqui ficam alguns casos“esquecidos”, envolvendo a GALP e alguns figu-rões que – sinal dos tempos – agora acham obsce-nas as nomeações, os ordenados, os prémios e asreformas milionárias dos gestores públicos e cla-mam pela “moralização do Estado”.

Freitas do Amaral foi consultor entre 2003 e 2005.Recebeu 6.350 euros mensais e um seguro devida igual a 70 meses de ordenado.Manuel Queiró, do PP, recebia 8.000 euros men-sais como administrador da área imobiliária. Em2006 foi substituído por um administrador espa-nhol, tendo sido indemnizado com a oferta de15  anos de salários, pagamento da casa e do colé-gio dos filhos, entre outras regalias.Guido Albuquerque, cunhado de Morais Sarmen-to (PSD), saltou da Esso para a Galp, convencidopela oferta de 17 anos de salários a título de in-demnização quando sair da Galp, ordenado de17.400 euros e seguro de vida igual a 70 mesesde ordenado.Ferreira do Amaral, presidente do conselho deadministração. Como este é um cargo não execu-tivo, não tem direito a salário, sendo simbolica-mente remunerado com 3.000 euros por mês, pe-las presenças, e a oferta de PPRs  no valor de10.000 euros, o que dá um ordenado “simbólico”de 13.000 euros/mês.

QUEM TEM AMIGOS… – José Manuel Branquinhode Oliveira Lobo, juiz desembargador, reformou--se em Setembro de 2002, depois de se ter apre-sentado a uma junta médica em Abril desse ano,a qual detectou uma doença do foro psiquiátricoe o considerou incapaz para estar ao serviço doEstado, o que foi determinante para a sua passa-gem à reforma, no valor de 5.320 euros mensais.Em 30 de Julho de 2004, o Conselho de Ministrosdo Governo de Santana Lopes nomeia Branqui-nho Lobo como director nacional da Polícia deSegurança Pública. Desde então acumula a suapensão de aposentação por incapacidade com ovencimento de director nacional da PSP.

SÓCRATES - Rosto do PEC2. Apertou aindamais o pescoço aos mesmos. Ordenou: “Temosde pagar”. Temos, quer dizer: não todos. Osque podem – de facto! – pagar, não pagam eninguém lhes vai à bolsa… Tramaram-nos. Es-tamos cada vez mais pobres, desesperados, semesperança, e não há culpados, embora eles an-dem aí… Uma quadrilha de ex-ministros dasfinanças – grande parte do problema actual –foi apresentar “soluções” ao presidente da Re-pública… Transpirou para o povoléu “ignoran-te” que os embusteiros estavam amortalhados.Coitados! Falavam como se não tivessem sido(des)governantes; outros, decisores. Nenhumdisse que a crise é do sistema. Podia lá ser!Marx explicou. Continua a explicar.

O governo é o que há: uns dizem uma coisa,outros dizem outra, exactamente ao contrário.O descrédito é total e a indiferença acompanhaessa totalidade. Vão-nos derretendo em lumebrando, a nós, que somos as principais vítimasdesta ruína, que vivemos (os que vivem) compouco mais do que o ordenado minimíssimonacional.

O governo vive algemado a um conjuntode compromissos políticos, arranjinhos, pro-messas, vassalagens, dívidas que pagaem quilómetros de auto-estradas,túneis e, agora, em TGV com para-gem em todas as estações e apeadeirosdo poder local (desenhado em cimado mapa da volta a Portugal em bici-cleta). Já sabemos que Portugal temmais quilómetros de auto-estradasque muitos países mais desenvol-vidos.

Entretanto o discurso da oposi-ção, que defende a suspensão dasgrandes obras públicas, mais parecesalivar em vésperas de poder, um de-safio para que se guarde o melhorvinho para depois das eleições – enão uma verdadeira preocupaçãocom as finanças, ou seja, com o nos-so dinheiro.

Além das vassalagens, não podemos es-quecer os papa-reformas, profissionais da acu-mulação de reformas públicas, semipúblicas esemiprivadas. Basta ver o caso do Banco dePortugal. Há gente até com carreiras contribu-tivas virtuais, sem trabalho e com promoções– dizem que para isto são muito boas a Emis-sora Nacional/RTP e a Carris… Tudo, comosempre, feito ao abrigo da lei. É que isso doscrimes contra a lei é para os sucateiros. O pro-blema é que a lei que dá é refém dos beneficiá-rios que tiram e da sua ética. Melhor dizendo:os pol(h)íticos são os verdadeiros sucateiros.

PARTIDO SOCIAL-DEMOCRATA - Quertransformar o trabalho numa esmola dos pa-trões ao pretender acabar com o direito consti-tucional que proíbe o despedimento sem justacausa. É o sonho desta (extrema) direita quequer um país de salários baixos, um país desqua-lificado, em que não há regras para quem traba-lha. Caso esta regra seja aplicada, ficaremosnuma situação semelhante à da China, onde osoperários recebem 100 euros por mês. Amanhã,trabalharemos por uma malga de arroz, debaixode chicote! E por favor…

EDUCAÇÃO - “É criminoso não encerrar es-colas com menos de 21 estudantes. Vamos en-cerrá-las, com vista a combater o insucessoescolar” – Sócrates. A recente medida do go-verno de encerrar 900 escolas com até 21 alunos– o interior vai ficar mais pobre e mais deserto– muito preocupa qualquer observador nasquestões da qualidade e na relação e articulaçãocom o bem-estar dos principais interessados,os alunos. Diz a ministra da Educação: “Medi-das de racionalização dos custos e a melhoriado serviço prestado”.

Acenar com as estatísticas de maior insu-cesso em escolas pequenas é falácia. Basta umpar de classificações negativas numa escolacom 15 alunos para se terem valores indesejá-veis, esquecendo-se que esse insucesso resultaquase sempre da falta de meios e não da dimen-são da escola. Propõem que aos seis anos amiudagem seja mandada das suas aldeias paraser levada para a sede do concelho, a dezenasde quilómetros de distância, regressando aoséculo XIX. Há cem anos a escola estava emexpansão, agora em brutal regressão. Depoisde fazerem 30 ou 40 quilómetros aos tombos,não chegam à “nova” escola nas mesmas con-

dições daqueles que vivem a minutos da escola.Não percebe a srª ministra Alçada que os está acolocar em desigualdade de oportunidades des-de que saem de casa, com menos uma hora de sonoe ao chegarem a casa com outra hora a mais?Acha que é uma biblioteca maior que compensao desenraizamento? Este é o tipo de decisãopolítica economicista cega, falsamente funda-mentada, anti-social e totalitária, que revolta.Este é o maior atentado contra a educação deque há memória. A ministra anterior respondiaàs questões com autoritarismo boçal, aplicandomedidas tão ridículas quanto salazarentas. Isa-bel Alçada, com o seu sorriso de plástico, segue-lhe o rasto. E os meninos? Desinteressaram?

JORNALISMO - A ajudar à festa deste capita-lismo putrefacto, temos uma imprensa cadavez mais subjugada aos interesses financeiros –não há um único órgão de imprensa que nãoesteja ligado a um grande grupo económico –onde o jornalismo é maioritariamente idiota.Salvam-se poucos jornalistas, honradamente.Se não fossem alguns destes, Portugal era umsítio isento de banqueiros ladrões – perdão,engenheiros financeiros –, corrupções, abusossexuais e pedofilia, de crimes violentos, de jus-

tiça coxa... e de apitos de “latão”! Tantos jornalistas, quenão se submetem aos ditames, vão sendo colocados em“prateleiras” mal pagas. Outros abandonam a profissãocom frustrações e depressões. O jornalista estagiário nemsabe quanto vai ganhar… Paga para trabalhar. Não admiraa pobreza de análise que caracteriza o jornalismoportuguês. Este jornalismo não emerge por acaso, e nãoestá ausente da distinção entre segurança interior esegurança exterior. A inexistência de espírito crítico possuio sabor amargo da servidão.

“Haverá sempre um grupo de bandalhos que causa oopróbrio a uma nação; mas levantar-se-á contra ele umaminoria de homens de bem. Serão estes, talvez, injuriados;nunca serão escarnecidos pelo futuro”, disse AlexandreHerculano – também jornalista – em Opúsculos.

FISCO - O fisco aplicará 1% e 1,5% sobre a totalidade dosrendimentos de 2010. Ao impor apenas duas taxas, ogoverno impede que o agravamento seja proporcional,pois quanto maior o rendimento, menor o impacto doacréscimo. Em geral, o aumento médio é de 2,5%, em2010 mas, para um contribuinte com o rendimento anualde 100 mil euros, o agravamento efectivo é de 2,2%.Mais uma repartição “justa” dos sacrifícios. Quem ganhamais, paga menos!

VÍTOR COLAÇO SANTOS

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Os “camaradas”polícias

Já tinham feito a sua aparição na manifestação do 1º de Maio, aotentarem impedir que o bloco dos precários entrasse na Alameda. Agora,com mais desenvoltura, determinação e menos discretos, vestindo edespindo os coletes que os indicavam como da CGTP, os “camaradas”dos sindicatos da PSP que participaram na manifestação da CGTP dedia 29 puserem a sua experiência profissional ao serviço dos burocratasda central sindical inaugurando um peculiar serviço de ordem. Com umpostura entre o pidesco e o segurança de discoteca, mantiveram sobapertada vigilância os blocos e grupos de manifestantes que não estavamenquadrados pelas estruturas sindicais da CGTP. Ao BE e aos precáriossó lhes foi permitido entrar no fim da manifestação. Aos outros, os“esquerdistas e anarquistas”, nem isso. Só a muito custo e depois demuito insulto e empurrão, quase a rondar a violência física, ao longo dopercurso, é que conseguiram entrar e desfilar.

O tom já tinha sido dado nas reuniões sindicais, onde apareceramvozes dizendo que as manifestações da CGTP não “podiam ser umabandalheira, em que cada um faz o que quer”. Daí que também nãotenha sido de estranhar a hostilidade sectária de alguns manifestantes.

Para além das cenas lamentáveis protagonizadas pelos jagunçoscontratados pelos controleiros da CGTP, o que interessa reter do pontode vista político é o facto de, perante uma situação de crise em que osfactores de conflitualidade social se tendem a agudizar, a preocupaçãodo PCP e da sua corrente sindical se vire para o controlo político dodescontentamento dos trabalhadores e para o abafamento dastendências mais radicalizadas. Que temem eles?

Os relatos das agressões a que foram sujeitos doisjovens da Cova da Moura, numa madrugada de Junho,às mãos da PSP da Amadora, e algumas discussões quedeles resultaram parecem-me passar ao lado da ques-tão mais importante. Abusos, agressões, insultos, sãocoisas comuns nos subúrbios de Lisboa e poucos serãoos que nunca foram maltratados pela polícia por esta-rem sentados num banco de jardim à noite, fumandotranquilamente a sua ganza e/ou bebendo a sua litrosa.

Mas o caso aqui é distinto e bastante mais significa-tivo. Hezzbolah e LBC são dois militantes e activistasda luta contra a repressão polícial. Não se limitam alamentá-la ou a sofrê-la em silêncio: denunciam, lutam,organizam, produzem conflito social. Organizaram umamanifestação quando foi assassinado Edson Sanchesno ano passado. Dinamizam a Plataforma Gueto. Acom-panham a situação política e assumem uma posiçãoface a ela. Não por acaso, desceram a Av. da Liberdadea 29 de Maio, integrados na manifestação da CGTP, comoo fizeram outras pessoas que acorreram à concentra-ção anticapitalista. 

E é por isso mesmo que já há algum tempo relatama perseguição a que são submetidos pela polícia nosentido de os intimidar e dissuadir de lutar. O que acon-teceu domingo na Amadora não foi um “incidente”mais, que se possa colocar na longa lista de abusospoliciais. É um sinal político de que a mobilização depessoas das classes sociais mais pobres e subalternasassusta os responsáveis pela repressão e os leva aosmais desesperados actos de crueldade. Eles foram tor-turados numa esquadra para que se deixem de “políti-cas”. Para que fiquem no seu canto. Para que paremde lutar. Não houve nenhum equívoco na actuaçãodaqueles polícias. Tratou-se de uma operação táctica.Eles batem porque têm medo e  têm razão em ter medo.

RICARDO NORONHA

Polícia em todo o lado,justiça em lado nenhum

A ascensão ao poder do dr. Cavacodurante dez anos, como primeiro mi-nistro, determinou a substituição dosonho pelo “pragmatismo”. Este nãotransmite saber, dá cobertura a todasas vilezas políticas porque ausente dequalquer sobressalto moral. Normalizae formata. Tudo direito, como soldadi-nhos de chumbo. A partir daqui, foi oquadro de nefasta mediocridade em quevivemos até à actualidade: mentiras,ausências, ignorância, alienação, impu-nidade aos prevaricadores, enriqueci-mentos ilícitos…

Cavaco e o 10 de JunhoCavaco Silva, discursou no 10 de

Junho – dia de Portugal – apelando àcoesão: “… é necessário um contratosocial de unidade e solidariedade entreempresários e trabalhadores”. Concor-daram com a mensagem os patrões dospatrões da CIP e AIP – Pudera! Cavacoquer o regresso da União Nacional. Nãofalou na repartição dos sacrifícios deforma justa, entre os que se apodera-ram da riqueza e os explorados. Fezum discurso socialmente arrogante.

VÍTOR COLAÇO SANTOS

1º - O PS apoia o único candidatoque pode garantir-lhe uma vitóriasegura porque refaz a sua imagem deesquerda ao contar com o apoio doBE, dos renovadores e da considerávelfaixa do eleitorado que não se revênos outros concorrentes. É um bomfavor que lhe fazem. Mas a paga queterão vai sair-lhes amarga, comoacontece com quem fica refém do PS.

2º - A direita “socialista” está aprazo no poder, com ou sem Cavaco,com ou sem Alegre, tal é a erosão dapolítica socrática a que o seu candidatoagora se associa abertamente, comoaliás já tinha avisado quando disse quenão o veriam pôr-se contra o seu par-tido – trinta anos de cumplicidade ocomprovam. De qualquer forma, otrabalho que a direita precisaria defazer já está completado por estegoverno que temos. Os que se seguiremsó têm que consolidá-la.

3º - Por causa desta aliança Alegre--PS, o fogo que os seus adeptos terãode fazer contra o candidato soaristaterá de ser disparado pela direita, por-que Mário Soares parece estar agora àesquerda do socratismo. É triste, masé assim mesmo.

4º - Fiéis à teoria do mal menor,pensam os apoiantes do candidato Ale-gre que ele vai ajudar a suavizar a nossaausteridade lançando uma parte delasobre os que mais lucram com a crise.Santa ingenuidade! E chamam a seufavor a manifestação da CGTP a 29 deMaio, como força de pressão para re-forçar este efeito. Apontam o dedo àdireita, como se o PS fosse de esquerdae não tivesse toda a responsabilidadesobre tudo quanto tem acontecido des-de que é governo. O que é que não lhepode ser imputável? Estar agora a cul-par os especuladores e a UE, como fezAlegre, é uma bela maneira de sacudira água do capote do PS, que assim, deuma penada, é eximido de toda a carga

Sete tesesanti-alegristas

negativa da sua política anterior e vêrefeita uma falsa virgindade, passandoà posição de vítima das potênciaseuropeias. Ainda por cima, o candidatotem o descaramento de apelar àesquerda e aos sindicatos para se jun-tarem ao PS-PSD na aplicação dosPECs, como se de uma tarefa patrióticase tratasse. O frete não podia ser maior.Quem o apoiar terá de carregar tambémesse ónus.

5º - Pelo menos no BE o desconfor-to é grande, depois deste apoio manho-so do PS. É sinal de que os seus mem-bros ainda não foram conquistados devez. Pode ser que abram mais os olhose retirem o apoio a um candidato quese vende e os vende com a maior des-façatez.

6º - No PCP devem estar contentespor terem candidato próprio e não seenlearem com o PS. Isso vai dar-lhesvotos. Mas como será se tiverem deapoiar Alegre na segunda volta? Maisum sapo para engolir...

7º - O que uma esquerda decentedeveria ter feito era coligar-se para terum candidato independente seu, mes-mo que não fosse para ganhar, mas quepudesse ser a consciência ética e a reser-va moral dos trabalhadores que andamesmagados com a vida angustiosa quelhe oferecem e castigasse igualmentePP-PSD e PS, os partidos do capitalque nos obrigam a pagar a crise. Aindaestaremos a tempo?

ANA BARRADAS

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6 | MAIO / JUNHO 2010

A real imbecilidade“Tornar obrigatória a educação sexual resume-se a

dizer: forniquem à vontade.” (Duarte Pio, “rei” de Portu-

gal, Notícias Sábado, 13 Maio).

Deus o guarde“Não há muitos exemplos de divórcios de veludo.

Voltar para trás é voltar ao passado de conflito, de mávizinhança, de guerra… o projecto europeu pode salvar--nos.” (Rui Tavares, eurodeputado do BE, no colóquio Europa

dos Cidadãos, na Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira,

14 de Maio).

Recado chuchalista“O PS deve estar atento ao que diz Passos Coelho e

não entrar em guerra nessa matéria (medidas de austeri-dade). Porque já se viu que com o BE não se vai a partenenhuma, sem ser ao protesto de rua.” (Mário Soares,

Expresso, 12 de Junho)

Patronato deprimidoComo “já foi muita gente despedida”, a prioridade

deve ser “criar condições para os empresários voltarema ter coragem para empregar gente.” (Carlos Pinto Coe-

lho, presidente da Confederação do Turismo de Portugal,

em apoio às medidas de precarização dos trabalho, Metro,

17 de Junho).

Todos viram o poder dos sindica-tos quando se resolvem a tomar parti-do pela luta e deixam por momentoso incurável burocratismo, apesar dadessindicalização, da burocratização,do reformismo e da incipiência dasalternativas de um sindicalismo decombate.

A imensa manifestação do dia 29de Maio contou com milhares de tra-balhadores, grande maré humana pro-testando contra as medidas reaccio-nárias do governo. Centenas de auto-carros, enquadrados pelos sindicatos,transportaram os manifestantes, aque se juntaram os trabalhadores deLisboa e margem sul do Tejo.

O rol das malfeitorias do capitalque, em nome do combate à crise, opartido do Sócrates assume, tem pro-vocado o ódio dos trabalhadores por-que as medidas anticrise estão a serdescarregadas sobre eles e os reforma-dos e pensionistas de mais baixos ren-dimentos, enquanto os burgueses sãopoupados. Impostos, cortes nos direi-tos, despedimentos e congelamentosalarial para os de baixo. Não tribu-tam as empresas com lucros até doismilhões de euros, poupam os bancosapesar de continuarem a apresentarlucros, moralizam as mordomiasdos gestores, que continuam impu-nes, nadando em milhões de euros.Por isto mesmo, não surpreendeu a

grandeza da manifestação, nem oódio dos manifestantes ao gover-no. Começa a ficar claro para grandeparte da população  que vivemos diri-gidos por um sistema de ladrões que,para lá dos lucros do capital, delapida-ram e enriqueceram com os milhõesvindos de Bruxelas que se destinavamao desenvolvimento do país. Repeti-mos: ladrões os do PSD, com milhõesnas contas dos Loureiros, Oliveira eCosta, e outros milhares de ladrõesdo partido que quer ser hoje a alterna-tiva ao PS. Ladrões os do CDS, comas corrupções dos casos dos submari-nos, da Portucale, etc. Ladrões os doPS, com os Melancia, o Freeport, osVara e os Penedos, multiplicados pormilhares. A ladrar ficaram os da UGT,enquanto a caravana passava. O ódiodos pobres aos ricos tem mais querazão de ser. O ódio de classe aos cul-pados da crise e ao sistema de explora-ção faz com que tudo se possa alterarna luta social.

Muitos comentadores percebe-ram este ânimo das massas e apressa-ram-se a tranquilizar o poder segre-dando em voz alta que, enquanto Car-valho da Silva, secretário-geral daCGTP, se mantiver nas negocia-ções não há perigo de outras formasde luta surgirem descontroladas. Nãoabona em favor de Carvalho da Silva,mas eles lá sabem do que falam!

DESTAPOU-SE A PANELA,SAIU A PRESSÃO, E AGORA?

Pouco mais de uma semana apósa manifestação, reuniu a central sindi-cal e decidiu avançar com uma jorna-da de luta nacional composta por gre-ves sectoriais e manifestações emdiferentes cidades. P’rá frente é queé o caminho, ontem já era tarde! Esta-mos de acordo com o avanço da lu-ta, tudo faremos para que o proleta-riado se sinta confiante em que é pos-sível derrotar a ofensiva reaccionáriae não é uma fatalidade que sejam ostrabalhadores a pagar a crise.

É possível remeter o governo, ospartidos da direita e os patrões para adefensiva! Mas não será no parlamen-to burguês que a ofensiva da direitaserá travada, como se comprova pelaaprovação das medidas dos sucessivosPECs, como não será com ilusões naconcertação com o patronato que osdireitos dos trabalhadores serão ga-rantidos.

As forças capitalistas só recuarãomediante a força da luta de massas,numa corrente imparável a partir dasempresas na defesa dos mais elemen-tares direitos dos trabalhadores: direi-to ao emprego e ao salário, a horáriosde trabalho que respeitem o trabalha-dor, aos subsídios complementares eque fazem parte do salário.

A mobilização dos trabalhadorescontra o que o capital está a impor sóterá êxito se os objectivos da lutaestiverem perfeitamente claros aosolhos de todos, porque ninguém lutadesmobilizado, e todos pressentemque o futuro imediato não é risonho.

O capitalismo está mergulhadonuma crise mundial, provocada peloenriquecimento brutal dos burguesese pela irracionalidade do sistema que,para lá do lucro, acrescentou o roubofinanceiro em larga escala. O que seapresenta com uma crueza indisfar-çável é que a crise financeira que es-toirou lá para as bandas do tio Samveio pôr a nu a crise da economiacapitalista : a crise de sobreprodução,a incapacidade de crescer atravésda exportação de mercadorias, a bai-xa da taxa de lucro, a dependênciaem relação aos bancos, o endivida-mento das empresas e dos Estadosburgueses. Daí surge a necessidade de

A luta segue dentro de momentoslançar milhões de trabalhadores nodesemprego, de destruição do chama-do Estado social, da liquidação dosdireitos conquistados por mais de umséculo de lutas.

Quanto à pequena burguesia deesquerda, toda ela é propostas para asuperação da crise através do desen-volvimento económico, numa amplafrente dos trabalhadores com as pe-quenas e médias empresas.

É caso para perguntar; se mais de90% das empresas em Portugal sãopequenas e médias e a esmagadoramaioria do emprego está dependentedelas, que atitude tomar: vamos comos patrões para a greve e levamo-losà manifestação? Temos dó deles e nãofazemos greve? Respondam aos traba-lhadores os defensores dos pequenose médios empresários. Quanto a nós,não temos dúvidas: de um lado o tra-balho, do outro o capital.

Este veneno conciliador está aservir de tampão à procura de umasaída revolucionária para a crise. Nãotenhamos dúvidas: ou caminhamospara construir uma solução anticapita-lista, ou soluções mais à direita serãoimpostas ao povo.

Quais devem ser os objectivos daluta operária e popular? Na perspecti-va de uma corrente comunista e nãorevisionista, a solução para os proble-mas dos trabalhadores passa por rejei-tar as ilusões no parlamento e na con-ciliação com as confederações patro-nais. Esta é a questão central! Ali sónascem governos contra o povo ecedências ao capital.

O objectivo comum a todos ostrabalhadores é a recusa a aceitar asmedidas de austeridade impostas pelogoverno e pelos partidos da direita.Revogação dos PECs! Não foram ostrabalhadores que provocaram a crisemas sim os patrões, os ricos que apaguem! Pleno emprego e a reduçãoda idade da reforma sem perda dedireitos! Trabalhador despedido, sub-sídio garantido enquanto não tivernovo posto de trabalho! Não toquemnos nossos salários e subsídios! Direi-tos iguais para os trabalhadores imi-grantes! Tirem as patas do ServiçoNacional de Saúde e dos outros Ser-viços Sociais! Impostos sobre o capi-tal, as grandes fortunas e as mordo-mias dos gestores e administradores.

Façamos da jornada de luta nodia 8 de Julho uma demonstração derecusa às políticas de direita. Se nãoendurecermos a luta, tudo será pior.

Preparemos desde já a realizaçãode uma greve geral, unindo a luta dostrabalhadores portugueses à luta detodos os trabalhadores europeus!Internacionalismo proletário militan-te contra a ofensiva do capital!

JOSÉ BORRALHO

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“Nunca vi tanto povo junto!”, “Nem na manif dos professores estavam tantos!”,Éramos mais do que no primeiro 1º de Maio de 1974!” — palavras ouvidas no finalda grandiosa manifestação de 29 de Maio. Jamais se viu tanto aparato policial ehelicópteros no ar a “guardar” a manifestação…

A fome é boa conselheira. Mais de 300 mil desfilaram pela Avenida da Liberdadeaté aos Restauradores numa demonstração de raiva, revolta e indignação contraeste pântano podre em que o capitalismo bolsista e de casino nos atolou. Gritámosbem alto que não queremos esta política que nos atira para a miséria e a fome. Foio povo, sim senhor, quem lá esteve — o povo não baixa a cabeça!

Lutou-se com ambição e valentia por um outro futuro, mas… a manif, quepretendia ampla coesão a uma voz, teve (outra vez) caciques do partido ditocomunista a tentar pela força controlar os sectores independentes. O PCP écomo o catolicismo: quem não é da cor deles, excomunga-se. Vão longe? Não!

Exigia-se que após a manifestação a CGTP mobilizasse os trabalhadores e seconvocassem novas jornadas de luta, mas a próxima foi marcada para Julho… Éinconsequência?! Percebe-se?

VÍTOR COLAÇO SANTOS

E o filme repetiu-se. Mais umavez. Mecânica e inexoravelmente.A mais uma megamanifestação nãosucedeu aquilo que, lógica enaturalmente, se esperaria: um cre-scendo de lutas e greves culminan-do com a marcação da greve geralque alguns sindicatos e sindicalistasda orla da CGTP já vêm recla-mando há meses.

Ao invés, em vez de aproveita-rem esta maré de vontade, de puxa-rem pelo movimento, encorajando--o a atingir metas mais audaciosas,os chefes sindicais reformistas –trombeteando os useiros anátemassobre o radicalismo e o aventurei-rismo – optaram pelo inuendo, de-cretando o afunilamento e diluiçãodessa imensa mole de 300 mil almasde 29 de Maio numa mansa e serô-dia “jornada de luta nacional” a 8de Julho, luta mais simbólica quereal, porque só alguns sectores es-tarão em greve.

Nem sendo preciso recuar maisanos, basta lembrarmo-nos de quejá no ano passado, com a megama-nifestação de 13 de Março, tinhasucedido exactamente o mesmo:depois do dia 13 seguiu-se… o va-zio.

“Mas não achas que, se em vez de 300 mil, tivessemsido meio milhão a desfilar em Lisboa, teria sido dife-rente?”, perguntaram-me alguns camaradas mais in-génuos. Estou convencido que seria irrelevante.A decisão de esvaziar o protesto estava tomada.Aliás, era bem visível nas televisões o engulho e agaguez que assaltava os dirigentes da central, sem-pre que jornalistas legitimamente lhes pergunta-vam: “Então, e depois desta enorme manifestação, o quese segue? A greve geral?

Sim, porque essa é a pergunta mais indesejávelque pode colocar-se aos chefes reformistas: Quefazer a seguir? Porque esta simples pergunta projectaluz sobre o seu vazio, sobre a imensa distância queos separa já de qualquer veleidade insurreccionalou de qualquer projecto revolucionário de trans-formação social, em suma, ela ilumina como pou-cas o afastamento desta gente do próprio marxis-mo.

Por isso a máquina sindical reformista vivedeste pára-arranca. Assim como se alimenta detraições cíclicas à mesa negocial. Não por ser intrin-secamente corrompida, podre ou má. Fá-lo quasepor uma questão de sobrevivência, por lhe estarna massa do sangue. Por ser essa a sua naturezaideológica e a sua missão histórica: enquadrar eenredar nas suas malhas o operariado, a pequenaburguesia assalariada; conter a indignação emreservatórios estanques, facilmente manipuláveis,banalizar e ritualizar a sua exteriorização; capitali-zar a ira popular para a aplacar depois, em sede deconcertação social, com o arranque de algumasmigalhas. E tudo isto sem sobressaltar, beliscar oumuito menos pôr em causa este sistema criminosoe a sua matriz genética: o silencioso esbulho pelos

detentores do capital e dos meios de produção dariqueza criada pela mão-de-obra assalariada.

Uma delegação da CGTP chefiada por Carva-lho da Silva foi participar pacatamente no segundocongresso da reaccionária e ultra-reformista CSI,em Vancouver. Mais uma prova de que, no nossopaís, a máquina sindical reformista funciona comeficácia. Por cá, com um mar de desempregados,precários de todo o tipo e miséria e fome crescentes

Megamanifestação de 29 de Maio –fita dejà vue

ao ritmo dos PECs, friamente aplicados por Só-crates, não há qualquer greve geral no horizonte.Muito menos greves gerais combativas, que reben-tem os espartilhos legais dos serviços mínimos erequisições civis e onde os piquetes levantem barri-cadas e promovam ocupações. Estamos, de facto,muito longe dos gregos…

PAULO JORGE AMBRÓSIO

O povo não baixa a cabeça

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8 | MAIO / JUNHO 2010

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“Os portugueses comuns (os que têmtrabalho) ganham cerca de metade (55%)do que se ganha na zona euro, mas osnossos gestores recebem, em média:mais 32% do que os americanos; mais22,5% do que os franceses; mais 55%do que os finlandeses; mais 56,5% doque os suecos”. (Manuel António Pina,Jornal de Notícias, 24/10/09).

Em 2008 o salário médio em Portugalera de 1.150 euros, enquanto o saláriomédio na Zona Euro atingia 2.558, ouseja, 2,2 vezes mais (OCDE). Em Outu-bro de 2009, o salário médio em Portu-gal era apenas de 918,2 euros e o ganhomédio mensal 1101,9. (Boletim Estatísticode Maio de 2010 do Ministério do Trabalho).

As remunerações sem encargos sociaisrepresentam, em média, apenas 11,7%dos custos totais das empresas portugue-sas e, se se incluir as contribuições soci-ais, essa percentagem aumenta para 15%.(INE, 2010). 

Entre 2003 e 2008, a percentagem depatrões com escolaridade inferior aosecundário aumentou de 79,6% para81% (com os trabalhadores verificou-seo inverso, pois diminuiu de 71% para65%), e o nível de escolaridade secun-dária baixou de 12,4% para 10%. Comescolaridade superior, em 2008, eramapenas 9% (Trabalhadores:18%). (INE).

Nos primeiro cinco meses deste anoderam entrada na Câmara Municipal deLisboa 3.132 pedidos de habitação, uma

média de 700 por mês. Entre 2006 e2009 essa média situava-se nos 100 pedi-dos/mês. Nos bairros municipais exis-tem 572 fogos vagos, estando 120 a serreabilitados. (Pelouro da Habitação da CMde Lisboa).

No primeiro trimestre do ano, a taxade desemprego subiu 1,7 pontos per-centuais, fixando-se nos 10,6%, relativa-mente ao período homólogo de 2009,registando um novo recorde de desem-pregados em Portugal. Relativamenteaos mesmos períodos, o número depessoas empregadas caiu 1,8%, sobretu-do nos sectores da indústria, constru-ção civil, energia e água (INE, Maio).

Subiu para 2,8% (3,89 mil milhões deeuros), em Março, o crédito mal paradoconcedido pela banca a particulares, ouseja, aquele que as famílias portuguesasjá não conseguem pagar. Um mês antessituava-se nos 2,78%. Estes valores inci-dem principalmente no crédito ao con-sumo (7%), o valor mais elevado desdeDezembro de 1997. No sector da habita-ção, as dívidas de cobrança duvidosarecuaram para 1,72% relativamente aomês anterior. No entanto, se compara-das com o período homólogo de 2009,cresceram 1,61%. No crédito para ou-tros fins, o mal parado subiu para os7,11%, o valor mais elevado dos últimos11 anos. (Boletim Estatístico do Banco dePortugal, 20 de Maio).

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O X Congresso da FENPROF, a 23 e 24 deAbril, caracterizou-se pelo afunilamento do deba-te, pelas manobras e golpes tendentes à eliminaçãodas moções, propostas ou adendas oriundas dossectores minoritários, em benefício das já cozinha-das pelo aparelho, apesar da qualidade e radicalis-mo da intervenção organizada dos delegados precá-rios e daqueles afectos ao “Autonomia Sindical”ou à ex-lista D do SPGL.

Assim, as oposições ficaram-se por escassosganhos parcelares na versão final do Plano deAcção oficial e pela aprovação a ferros de umamoção contra a prova de ingresso na carreira, rei-vindicação abandonada em Janeiro pelas cúpulassindicais, em sede de acordo com o ministério. Oaparelho – ao contrário do que tinha sucedido noIX congresso – desta vez apresentou-se unido emtorno do secretário-geral, Nogueira, numa únicalista ao conselho nacional e secretariado, tendoreforçado posições nesses órgãos de cúpula, por

essa via, “socialistas”, independentes, bloquistasde direita e renovadores.

Um sinal claro desta deriva à direita foi osaneamento logo operado pelo secretariado recém--eleito no X Congresso no Grupo da Precariedadeda FENPROF, donde afastou sem aviso prévioseis dos seus membros contratados e desemprega-dos, ficando este colectivo agora constituído quaseexclusivamente por efectivos, simultaneamentechefes sindicais do aparelho. Isto, apesar de estegrupo ter sido fundado para representar o precariadojunto do secretariado nacional e do conselho nacio-nal da FENPROF, onde actualmente, no meio de85 e 24 efectivos respectivamente, têm assento,também respectivamente, um e zero precários.

Mas estas blindagens e saneamentos pretendemir mais longe: impedir que se repitam concentraçõesou acções de protesto orga-nizadas de forma autónomapelos precários (e seus ór-

Arregaçar as mangas e partirpara a luta!

PROFESSORES

gãos sindicais) sem autorização ou sem controleférreo do aparelho sindical reformista, que preten-de sufocar a contestação. E não só na federaçãoisto se passa, mas também nos seus sindicatos mem-bros, com realce para o SPGL, onde a direcçãotentou fazer censura às moções aprovadas no últi-mo plenário de contratados e desempregados de22 de Maio, nomeadamente a moção em defesa dagreve geral e outra exigindo a publicação das actasnegociais do acordo de princípios de 8 de Janeiroe reafirmando a condenação daquele acordo como ministério – ambas as moções aprovadas porunanimidade.

Entretanto, como se previa, o ministério ga-nhou a batalha nos tribunais e manteve a avaliaçãopara efeitos de concurso. Mas há males que vêmpor bem: as direcções sindicais estão a ser assim

desmascaradas pelavida no que toca àalegada bondade doacordo que assina-ram com a tutela, atroco de quase na-da, estoirando des-te modo com aimensa mobiliza-ção de manifesta-ções de mais de 100mil professores egreves a mais de 90por cento, que tive-ram como alvo nú-mero um precisa-mente o cego mo-delo pseudoava-liativo e economi-cista imposto pelogoverno. Governoque entretantoavança a todo ovapor com o fechode milhares de esco-las, com a imposi-ção no terreno demegaagrupamen-tos, com o reforçodos directores que

implementam já um clima de medo e repressão,típico do 24 de Abril, em muitas escolas.

Fruto desta funesta acção reformista das direc-ções sindicais, a mobilização bateu no fundo eainda não recuperou, como comprovam as escassasdezenas de professores na concentração de 19 deAbril e os cerca de somente dois mil na megamani-festação nacional da CGTP de 29 de Junho – quecontou com mais de 300 mil trabalhadores. A res-posta dos quadros e activistas que não aceitameste estado de coisas continua a ser só uma: lutarinternamente pela democracia sindical, arregaçaras mangas e remar contra a maré, pela base, nasescolas, unificando a revolta e a disposição para aluta. Mas luta a sério.

PAULO JORGE AMBRÓSIO

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DESEMPREGADOS

“Ir buscar aonde o há”?

A rua como futuro

No passado dia 19 de Maio, Belmiro de Azeve-do, o patrão dos patrões, numa palestra do Insti-tuto Superior de Gestão saiu-se alarvemente comesta: “Quando o Povo tem fome tem direito aroubar”. Esta surpreendente bravata além dumautêntico escarro na cara dos actuais 720 mil traba-lhadores, trabalhadoras (e respectivas famílias)lançados para o desemprego involuntário, deveser entendida, antes de tudo, como diagnóstico eespelho da total impunidade de classe de que aburguesia e o patronato desfrutam desde o jádistante 25 de Novembro de 1975, resultado dorefluxo e perda de consciência e autonomia donosso movimento operário e popular, e dasestratégias reformistas, nomeadamente dos nossossindicatos, que – debaixo da canga dos PECs –nem no seu último plenário nacional de sindicatose da megamanifestação de 29 de Maio avançarampara a greve geral, ao contrário dos seus congéneresgregos ou espanhóis.

E é ainda este clima de impunidade que permi-tiu ao governo Sócrates, por entre a censura plató-nica dos sindicatos, anunciar a 28 de Maio a retiradado tímido “apoio ao emprego” a 186.400 traba-lhadores e desempregados, mesmo antes da suaentrada em vigor, a 1 de Julho. São assim anuladosa extensão do subsídio social de desemprego porseis meses, a majoração em 10 por cento do

subsídio pago aos desempregados com filhos, aredução do tempo mínimo de descontos necessáriopara ter direito ao subsídio (que era de 365 dias epassará aos 450 dias anteriormente exigidos pelalei) e o termo do pagamento de um valor adicionalao abono de família, que agora se manterá somentepara os agregados mais desfavorecidos do primeiroescalão.

Mas voltando à tonitruante frase deBelmiro, ela remete-nos quase forçosamen-te para a memória histórica do início dosanos 40 do século passado, em que Portugal,atingido pelo ricochete da II Guerra Mundial,entra numa crescente conjuntura espiral dedesemprego, fome e racionamentos dos alimentosde primeira necessidade, e em que algumas parcelasde desapossados, trabalhadores rurais e urbanoscaídos num desemprego absolutamente miserável,excluídos da acção demagógica e impotente do“Socorro de Inverno” e do apoio social simbólicocaritativo da igreja, organizam “marchas da fome”e se viram, por estado de necessidade e desesperopróprio dos famintos, para o roubo quotidiano,nomeadamente assaltos nocturnos ou diurnos apadarias, armazéns, quintas e pomares, praticadosde forma individual ou colectiva, estes últimosalgumas vezes enquadrados por militantes comu-nistas, que lhes imprimem sentido político e cons-

ciência de classe. É pois compreensível que, nestequadro, o próprio comité central do PCP tenhacaucionado esta “ofensa” à propriedade privada,tendo então, por alturas das grandes greves de Ju-lho e Agosto de 1943, lançado a nível nacional eno Avante! palavras de ordem como “Abaixo afome! “, “Géneros para o povo!” e a significativa“Ir buscar aonde o há”.

Contudo esta era, para o bem e para o mal,outra época histórica, outro quadro da luta declasses e outro PCP, sem dúvida – em tudodiferentes dos actuais.

PAULO JORGE AMBRÓSIO

Os balcões das delegações da se-gurança social começaram a indefe-rir ou a não renovar  muitos paga-mentos de rendimento de inserçãosocial, para choque de muitas pes-soas ainda desconhecedoras das últi-mas medidas de crivo e corte nosapoios sociais e que agora ou vão pe-dir, ou roubar. Foi evidente o medode focos de revolta com efeito decontágio, por parte dos jornalistasque noticiaram o ambiente que se vi-veu no primeiro dia de aplicação dastais medidas.

Entretanto, da parte de algumasforças políticas, em particular do PP,Partido Popular, tem havido umatentativa de criar uma imagem de cri-minalidade em relação aos beneficiá-rios do rendimento mínimo e do subsí-dio de desemprego, com acusaçõesde subsidiodependência, de não que-rerem trabalhar, de viverem à custado Estado, etc., como se fossem delin-quentes preguiçosos e aproveitadores.

O efeito pretendido é socavar asolidariedade por parte dos restantestrabalhadores e preparar o terrenopara reduzir estes benefícios. Estacampanha não é original. Paulo Portase outros aprenderam-a com MargaretThatcher e Blair, que sempre assumi-ram que os desempregados simples-mente não querem trabalhar.

O que na realidade acontece éque há extensas zonas do país em quenão há mesmo trabalho de espéciealguma. Quanto à referência à “cria-ção de emprego”, é apenas retórica eilusória, porque o que os patrões têmandado a fazer nestes últimos doisanos é diminuir a força de trabalho,para explorar com menos custos osseus assalariados, que assim passam atrabalhar mais.

Entretanto, todos os dias patrões,governantes e a direita nos enchemos ouvidos com o discurso sobre osmalandros dos “desempregados que nãoquerem trabalhar e só querem é viver àcusta do subsídio de desemprego e do Rendi-mento Mínimo de Inserção”. Aqui fica ahistória de um desses “malandros”.

Iliassa Jaló, guineense, 61 anos,trabalhou até ser despedido, emJaneiro de 2009, na CUF- Adubos dePortugal, SA, em Alverca, nas limpe-zas. Desde que foi despedido, alimen-ta-se com uma refeição que vai buscartodos os dias à cozinha do IAC, Insti-tuto de Apoio à Comunidade, no For-te da Casa, concelho de Vila Francade Xira. Viúvo, vive sozinho no Forteda Casa. Sofre de uma incapacidadede 15%, que com o tempo se vai agra-vando devido aos ferimentos sofridosem 1972 na guerra colonial ao serviçodas forças armadas portuguesas e pela

qual não recebe nada. Em Janeiro des-te ano deixou de receber os 486 eurosde subsídio de desemprego com quepagava os 400 euros de renda mensal,mais a água e a luz. Agora corre orisco de ser despejado por não terqualquer rendimento com que possapagar a renda de casa.

Em desespero, recorreu ao GAI,Gabinete de Atendimento Integradoda Junta de Freguesia do Forte daCasa, que o remeteu para o IAC. Alémda refeição diária, aquilo que conse-guiu foi a promessa vaga de que iriamtentar que lhe fosse adiantado o Ren-dimento de Inserção Social, para

poder pagar as rendas em atraso, euma certeza: vai ser despejado. Estápor saber se para a rua ou para umadessas pensões manhosas onde aSegurança Social costuma “deposi-tar” temporariamente os desalojados.

Desalentado, diz: “Só tenho asegunda classe e com a minha idade émuito difícil arranjar emprego. Eunão tenho medo de trabalhar. Sempretrabalhei. Não tenho para onde ir enão tenho como pagar a renda. Nemsequer tenho dinheiro para comer.Se me puserem na rua, vou para onde?Para baixo da ponte? De um momen-to para o outro fiquei sem nada.”

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Se é certo que o capitalismo necessitoude instituições democráticas que substituís-sem as do feudalismo para propiciar a cria-ção de empresas, a libertação dos servospara dispor de mão-de-obra, a simulaçãode uma justiça independente e o livre jogodos partidos políticos para se enfrentaremperiodicamente nas urnas, pode dizer-se queo seu desenvolvimento posterior foi gastan-do todos estes “valores”, até os transformarnuma caricatura de si mesmos, numa cons-trução teórica que nada tem já a ver com avida real.

Passaram para não mais voltar os tem-pos em que se podia referir sem corar uma“ética do capitalismo” (a acumulação pri-mitiva e as suas vítimas por trás do cenário).São dignos de lástima os jornalistas eescritores (não sei se ingénuos ou simplesvigaristas) que salpicam os periódicos comcolunas de opinião que tentam – como res-posta aos apertos em que se encontram hojeos que aparentemente dirigem o barco ecomo remédio face ao mar de corrupçãoque impregna todas essas instituições – vol-tar-se para trás incensando os valores perdi-dos, sem notar que aquele capitalismo sópodia ser uma fase do seu desenvolvimento,que levava nos genes o monstro em que setransformou. E não há marcha-atrás: essecapitalismo em que crêem é uma utopia irrea-lizável. Os seus últimos movimentos trou-xeram à luz do dia o extremo a que se che-gou, o aberto e descarado controlo dos go-vernos de qualquer quadrante por parte damáfia dos especuladores.

A encarnação do homem no capitalismoé a do empreendedor que monta um negó-cio, cria trabalho, etc. A imprensa espanholade hoje dá-nos conta diariamente das ajudas,subvenções, etc. que tanto o governo cen-tral como os autonómicos puseram em mar-cha para estimular os jovens (homens emulheres) a enveredar por esse caminho.Mas as oportunidades que há não têm nadaa ver com as que havia há 100 anos. Dei-xando de lado o pequeno comércio ou barese tabernas (terreno totalmente saturado), oque fica são serviços para as empresas, quesó lhes interessa se lhes sair mais barato quecom empregados próprios. Porém, a cam-panha faz efeito e são milhares os empreen-dimentos que nascem, e mais os que mor-rem, nos últimos anos.

Mas o facto é que o clima social se res-sente, a figura do operário ou empregado sedegrada e os valores históricos que a acom-panhavam (orgulho de ser trabalhador, cria-dor da riqueza, companheirismo, solidarie-dade) vão para o baú das recordações. Enão importa se compõem a maioria da po-pulação.

Assim, o ataque que o governo lançoua trabalhadores e pensionistas (de uma en-

vergadura desconhecida em todo o tempoque levamos de “democracia”), agravadapelo facto de todos saberem a que bolsosforam parar os dinheiros de que o governonecessita agora, não parece encontrar a res-posta lógica por parte dos trabalhadores.Na Catalunha, Galiza, Andaluzia e PaísBasco, sindicatos e partidos políticos daesquerda clamam por uma greve geral, masos apoios que recebem para agitar o am-biente com concentrações, manifestações,etc. não conseguem levantar o ânimo osuficiente para forçar as CC OO e a UGT,pilares deste regime, a enfrentar quem lhesdá de comer. E o simples facto de todosestarem à espera deles é uma manifestaçãodo borreguismo a que nos levaram.

A apatia que presidiu aos cortejos do1º de Maio, um momento idóneo para lhesmostrar os dentes, é outra demonstraçãoda lamentável situação a que chegámos,com uma classe operária que em grandeparte se chama a si própria “classe média”e embarcou em apartamentos de 100 me-tros quadrados a pagar em 50 anos. O medode perder dinheiro com a greve é um dostravões mais potentes. Para rematar, oPartido Comunista, tão activo na Grécia,em Espanha continua a manter, contraventos e marés, as CC.OO como sua refe-rência sindical.

E os que ganham menos de 1000 eurospor mês, os que tra-balham na economiasubterrânea, em con-dições lastimosas, osdespejados por faltade pagamento dacasa, por muitos quesejam, só tiram osono aos afectados eàs suas famílias. Osoutros lançam-lhes omesmo olhar que aosmendigos que sepõem à porta dossupermercados.

ANTÓNIO DOCTOR

ESPANHA Trabalho escravoMuitos dos 67 mil trabalhadores, na sua maioria

mulheres, empregados nas 15 zonas francas viradaspara a exportação estão sujeitas a um tratamento quevai do insulto verbal e das ameaças aos maus tratosfísicos e ao assédio sexual, revela um estudo recenteda Confederação Sindical Internacional sobre o traba-lho em El Salvador.

Há uma clara política anti-sindical e de despedi-mentos de quem tente sindicalizar-se ou formar umsindicato. Muitos consideram que as condições de tra-balho nas zonas francas se assemelham a trabalho for-çado. Os trabalhadores do sector público estão proibi-dos de se organizar e viram o exercício do seu direitoà greve de tal forma restringido que, na prática, esta éimpossível.

Os trabalhadores do sector privado também se deba-tem com numerosos e complicados procedimentos bu-rocráticos quando se querem sindicalizar ou criar umsindicato.

Em El Salvador as mulheres ganham menos 88%do salário médio dos homens e têm grandes dificulda-des em aceder aos empregos qualificados e mais bempagos. O trabalho infantil está generalizado, sendopreocupante a sua incidência no fabrico de fogo de ar-tifício, nas lixeiras e na prostituição. Segundo os dadosoficiais, 67% das crianças trabalham. Nas zonas rurais,as meninas e os meninos trabalham na agricultura eno comércio. Nas urbanas, dedicam-se à venda ambu-lante e à manufactura.

Em 15 de Janeiro de 2010, Victoriano Abel Veja,secretário-geral do SITRAMSA (Sindicato dos Traba-lhadores e Empregados Municipais do Município deSanta Ana) foi assassinado a caminho de San Salvador,onde ia a uma reunião sindical para preparar umaqueixa relativa ao despedimento injustificado de váriosempregados do município. Tinha recebido ameaçasde morte devido à sua actividade sindical e por tercondenado os despedimentos.

(Adaptado de Resumen Latinoamericano, nº 105)

O proletariadoem maré baixa

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Naomi Klein tocou num dos aspectos maissinistros do funcionamento do sistema modernoquando classificou de “capitalismo de desastre” aprática corrente que consiste em apavorar as pes-soas explorando situações de crise, calamidade pú-blica e desastre: a gripe A, a nuvem de cinzas dovulcão islandês, o perigo dos incêndios incon-trolados, a criminalidade à solta, etc. O medo apo-dera-se das pessoas e dos grupos sociais e o capitaldomina-as ainda mais, ao mesmo tempo que seaproveita da situação para obter maiores lucros.

O exemplo mais flagrante é o tsunami do Su-deste Asiático, em cujas praias até então sustentá-veis e entregues a pacatas comunidades de pesca-dores se instalaram grandes grupos turísticos eeconómicos depois da catástrofe. Também o fura-cão Katrina originou a expulsão da população quemorava em terrenos que depois foram afectados àconstrução de bairros de classe média, geradoresde proventos importantes para o capital imobi-liário. No caso do Haiti, são os grandes interesseseconómicos que determinam o formato doprograma de recuperação em curso depois doterramoto, em detrimento dos reais interesses dapopulação.

As guerras também permitem ao grande capi-tal o domínio de áreas que até então não controla-

Capitalismode desastre

REFORMADOS ITALIANOS NA MISÉRIA71,9 % dos reformados italianos receberam menos demil euros mensais em 2008, segundo dados difundidospelo Instituto de Estatística Italiano (ISTAT).45,9 % dos reformados recebe menos de 500 euros depensão mensal e 26% entre 500 e 1.000 euros.Quanto à reforma médio em Itália, é de pouco mais demil euros por mês e a das mulheres é inferior à doshomens em 30,5%: 17.137 euros anuais para os primeirose 11.906 para as segundas. (Argenpress.info, 11/06/2010)

IRÃO CONTRA A ARMA NUCLEARO ministro dos Assuntos Exteriores do Irão, ManouchehrMottaki, reiterou que o programa nuclear iraniano temcarácter pacífico, ao dizer na cimeira da Organização deCoope-ração de Shanghai (OCS): “Proclamamos aconsigna: energia nuclear para todos, arma nuclear paraninguém”. Ressaltou ainda que “o uso pacífico da energianuclear é um direito inalienável de todos os signatáriosdo Tratado de Não Proliferação Nuclear”.Ao mesmo tempo, o chanceler iraniano deplorou a adop-ção pelo Conselho de Segurança da ONU de novas san-ções contra o seu país, ao passo que o ataque de Israelcontra a frota humanitária para Gaza e a morte de váriosactivistas ficou sem resposta adequada. (Argenpress.info, 11/06/2010)

RECORDE VIOLENTOCONTRA SINDICALISTASA Confederação Sindical Internacional (CSI) apresentouo seu informe anual sobre direitos sindicais, onde revelaque a Colômbia foi o país no mundo onde mais sindica-listas foram assassinados, com 48 mortes, seguido da

Guatemala com 16, devido à escalada de violência. Cemsindicalistas foram assassinados em 2009, 30% mais queno ano anterior; no caso da Guatemala, devido a umaescalada de violência que se desenvolve há anos, similarà situação das Honduras, com 12 homicídios. (Argenpress.info, 11/06/2010)

ESPANHA NA BOCA DO TUBARÃOO periódico alemão Financial Times Deutschland asseguraque a União Europeia está a preparar o resgate de Es-panha. Segundo a informação (não se citam fontes), Bru-xelas dispõe de um fundo de resgate de 750.000 milhõesde euros para tal fim, se a situação espanhola piorar, e ocerto é que há motivos para pensar que não melhorará. Amaior preocupação da UE é, além do défice, o excessivoendividamento do sector privado causado pelo reben-tamento da bolha imobiliária, e todo isso apesar de abanca privada ter recebido dinheiro do governo, tantoque este ficou sem um euro em caixa. (Argenpress.info, 11/06/2010)

va em absoluto (Iraque, Afeganistão, possivelmen-te o Irão em breve, etc). No caso das ditaduras, aimposição conseguida pela repressão, prisão, tor-tura e exílio, e o consequente efeito de choque emedo desarticulam a resistência e entregam ao capi-tal o domínio, pela força, de actividades que nãocontrolava ou permitem-lhe embarcar em cruzadasbelicistas para as quais ainda não encontrara jus-tificação.

Assim, o 11 de Setembro nos EUA foi o pre-texto para desencadear a ocupação do Afeganistão,a “guerra santa” contra os suspeitos de terrorismoe a nova doutrina da segurança nacional, pela qualos governantes norte-americanos se arrogam odireito de interferir e atacar onde bem lhes apete-

cer, para isso multiplicando as suas bases militares(Colômbia), reforçando o apoio aos regimes autori-tários da sua confiança e criando novas academiasde formação das forças repressivas (não só nosEUA mas também na Hungria, Tailândia e Bo-tswana), ampliando os seus dispositivos bélicosde alcance mundial (Africacom, 4a e 7a Esquadra)e interferindo nas decisões de governos nacionaissupostamente soberanos.

Naomi Klein considera que se é imperioso umtrabalho ideológico para as pessoas se aperceberemdestes mecanismos que fazem perigar a suasegurança e liberdades cívicas. Há que explicar-lhes que este capitalismo de desastre, mais agressivodo que nunca, faz parte da crise actual, é a resposta

imperialista à crise. Não procura refor-mar o sistema, mas sim que os efeitosdesastrosos do neoliberalismo sejamcontrolados pelos Estados: parasuperar a crise financeira, os bancosfalidos recebem financiamento dosgovernos e o défice público é pago àcusta do aumento de impostos e àdescida do nível de vida dos de baixo.

Por todo o mundo há quem reajacontra a situação, mas sem elementosde unificação e homogeneidade dessaslutas, elas mantêm-se fragmentadas econdenadas ao isolamento, a nívelnacional e internacional. Klein citacontudo formas de resistência queconsidera promissoras: gera-se umacultura difusa que é uma forma deenfrentamento, muitas vezes surdo emal expresso, mas de qualquermaneira uma manifestação de dissi-dência e insatisfação pela apropriaçãodos excedentes para fins criminosospor parte de uma camada que nãorecua diante de nada para levar avanteos seus desígnios. A manipulação daconsciência dos cidadãos através domedo é um sintoma de que as desvanta-gens são tantas para as massas que já sóassim é possível mantê-las em respeito.Comparados com estas perversidades,os tão vituperados mecanismos decapitalismo estatal de Cuba, Vietna-me, Venezuela, etc. acabam por serbenévolos: garantem aos cidadãoseducação, saúde e segurança social enão os colocam num estado de pavorpropício às piores manipulações eatropelos.

ANA BARRADAS

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Tem que suceder algo de extra-ordinário, inesperado e fora do comumpara que apareçam de repente aspectosda realidade que estão presentes masa “normalidade” do dia a dia não nosdeixava ver. É como um terramotoque de repente nos deixa ver o quetemos debaixo dos pés.

Surge esta reflexão perante osucedido na Câmara de Deputados navotação sobre as medidas de austeri-dade propostas pelo governo para re-duzir o défice do Estado.

Que a esquerda proponha medi-das de direita e que a direita as rejeitetomando a bandeira dos reformadosnão é o mais importante neste pito-resco país, mas sim outros aspectosque parecem não ter importância paraos inefáveis comentaristas de nossosmeios de comunicação.

A primeira a colocar na galeriados horrores é a servil obediência dosmembros de todos os partidos à suacúpula dirigente. Nenhum parlamentarrecordou a sua consciência na hora devotar. Nenhum se demarcou, nenhumempregou a sua tão espanhola honraa desmontar o tão laboriosamenteconstruído castelo de naipes.

Que é o que isto mostra de forma clara?Simplesmente que tanto os que a aprovaramcomo os que a rejeitaram tinham os olhos postosnumas eleições antecipadas, uns para provocá--las, outros para impedi-las. Por mais leiturasque se façam do episódio, a única coisa queexplica de maneira rotunda e sem paliativos essaobediência cega – que leva inclusive a desmentirhoje o que se disse ontem, atirar pela borda forade repente os supostos princípios que dizem sera razão dos partidos políticos – é a colocação daluta pelo poder acima de qualquer outra consi-deração. Tudo vale, até a destruição da própriaimagem pública. A auto-estima, a coerência, adignidade, o respeito por si mesmo, tudo isto sesacrifica para continuar a gozar de altos saláriose prebendas. Não é – o que legitimaria a lutapelo poder – que se queira receber para pôr emmarcha um projecto de sociedade: os especu-ladores e o servilismo em relação a eles da pró-pria UE eliminaram toda a possibilidade de sesair do guião escrito por eles. Já só podem actuarcomo gestores, não como políticos, o que signi-fica que desejar o poder político nestas circuns-tâncias só pode ser para enriquecer.

Se, examinando seriamente o sucedido, al-guém encontrar outras razões de peso para expli-cá-lo, que o faça.

Por outro lado, com que cara pode qualquerpartido político apresentar depois disto um pro-grama de acção para as eleições? A não ser que oapresentem com a ressalva de que tem de recebera aprovação do FMI, ou que façam constar quese vão confrontar com ele com todas as conse-

O que igualaesquerda e direita

quências.Este é o triste final a que estava destinada a

democracia burguesa na Europa. Nem os que seapoderaram dos mercados com o sonho fútil daEuropa comunitária (Alemanha, França...) sesalvam.

ANTÓNIO DOCTOR

ESPANHARacismo esobrexploração

O racismo nos EUA cria as condições materiaise ideológicas da sobreexploração capitalista. Aliás,por todo o mundo o capitalismo marginaliza ne-gros, latinos, imigrantes, etc., desenvolvendo no-vas teorias raciais para justificar a sobreexploraçãoe dividir e controlar a classe operária.

De facto, apesar de todo o alarido em torno daeleição de um presidente negro, a sobrexploraçãoracista é uma realidade em todo o mundo. Todosos trabalhadores são explorados, recebendo o estri-tamente necessário à sua reprodução como forçade trabalho; porém, os trabalhadores negros e lati-nos ainda são mais explorados. A realidade doracismo manifesta-se nos números sobre o desem-prego. Em Abril de 2010, a taxa oficial de desem-prego era de 8,8% para os brancos,16,5% para osnegros, e 12,6% para os hispanos. Mas estes núme-ros não revelam toda a verdade, porque a taxa dedesemprego para os negros de Detroit é de 50%.Em 2004, uma família típica negra tinha um ren-dimento equivalente a 73% do de uma famíliabranca. Antes da actual depressão, 75% das fa-mílias brancas tinham casa própria, contra 48%das negras.

O racismo deprecia os salários dos trabalhado-res, e isso é evidente nos estados com um historialesclavagista, onde os salários dos trabalhadoresnegros, branco e latinos são os mais baixos dopaís. Por exemplo, nos últimos meses de 2009, aBoeing anunciou a abertura de uma fábrica naCarolina do Sul, para montar o seu novo avião depassageiros. Aí utiliza peças feitas na Califórniapor subcontratados e não sindicalizados, levandoa que recentemente, na Carolina do Norte, os tra-balhadores votassem o abandono do sindicato. ACarolina do Sul espera atrair mais produção daBoeing oferecendo baixos salários, trabalhadoresnão sindicalizados e, mais importante, com umbaixo nível de militância, como atesta o The Econo-mist de 9/1/2010, que referia que em 2008 ospatrões da Carolina do Sul não perderam dias deprodução devido a greves.

(Adaptado de Challenge, 23 Junho)

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A intervenção de Israel contra a frota de apoioa Gaza em águas internacionais não é novidade,pois há mais de trinta anos inspecciona naviosentre Beirute e Chipre.

Desta vez, porém, procedeu a um assalto parti-cularmente selvagem, no pânico de fazer abortaruma operação de solidariedade que fragiliza sobre-maneira aos olhos do resto do mundo a sua teimosiaem perpetuar o bloqueio criminoso a Gaza.

A brutalidade do acto indispôs o mundo inteirocontra Israel e fez-lhe perder parte do apoio doseu eterno aliado, os Estados Unidos. Sob pressãointernacional, viu-se forçado a levantar parcial-mente o bloqueio, numa manobra que o Hamasclassificou como “propaganda mediática”.

O governo de Gaza exige a abertura de todasas entradas para anular o bloqueio imposto desde2007, numa evidente tentativa de impedir oHamas de levar a cabo uma experiência estatal,quando esta organização islâmica venceu aseleições e passou a governar.

Isto de nada valeu a Israel. Apesar do terrívelagravamento das condições de vida e da decompo-sição social a que se assiste, o Hamas, que gasta 70milhões de dólares ao ano em assistência social,continua a gozar de uma popularidade indesmen-tível.

Está provada a inviabilidade do programa dedois Estados. Tornou-se impossível a entrega dasterras aos camponeses expropriados em 1948. Is-rael não consegue evitar a revolta palestiniana eperde terreno na cena internacional. A resistênciapopular em Gaza e na Cisjordânia, o boicote comer-

Contra o bloqueio a Gaza

cial aos produtos israelitas no exterior, a exigênciade sanções pela ONU e a condenação generalizadada política sionista favorecem a causa palestiniana,mas não impedem a passividade da ONU e dosEstados árabes e o apoio dos EUA a Israel nosseus crimes contra a humanidade.

Numa situação de impasse total, só uma acu-mulação de forças que resulte na socialização dosmeios de produção num Estado único poderá cons-tituir uma saída viável. O caminho está aberto e asolidariedade é uma arma certeira, como se viuagora.

Em Novembro reúne-se em Lisboa a cimeirada NATO, para aprovar o novo conceito estraté-gico da aliança, o que não deixa de ser estranha-mente sintomático numa aliança militar imperialque se encontra envolvida há anos em sangrentas

Onde pára o inimigo?guerras nos Balcãs e na Ásia Central e é o braçoarmado do banditismo e do terrorismo de Estadodo EUA e do seu parceiro europeu, a União Euro-peia.

Criada nos anos da “guerra fria” para conter a“ameaça comunista”, a NATO ficoucomo que sem inimigo após a implosãodo Bloco de Leste e a dissolução do Pactode Varsóvia. De repente, ficaram sempréstimo, por falta de alvo, milhares eefectivos e meios militares dos mais so-fisticados e mortíferos, mais o complexoindustrial e de espionagem que lhes estavaassociado. E, como esteve fora de questãoabrir mão de uma força militar das maispoderosas, sempre útil quando se tratade dar consistência aos planos geoestra-tégicos das grandes potências ocidentais,havia que desencantar um inimigo. Temsido um ver-se-te-avias algo trapalhão einconsistente. Com a “libertação” doKuwait desco-briu-se a “ameaça do Sul”,em substituição da “ameaça do Leste”, aque se seguiu a teoria do “choque decivilizações”, do “terrorismo” e da “pro-liferação nuclear” (Irão, Iraque, Coreiado Norte).

Pelo meio flutuam as “ameaças, desa-fios, incertezas, crises, riscos, mutações,

interesses” em prol da democratização com origemnos “Estados falhados”.

Agora, em tempo de crise económica e finan-ceira nos grandes centros imperialistas ocidentais,chegou a altura de rever a estratégia de forma aassegurar a manutenção da hegemonia imperialpelo terror armado. Isto passa por abandonar defi-nitivamente a ideia de um inimigo principal – agoraele está em todo o lado, até dentro de portas – eacautelará a emergência de novas potências regio-nais que, a prazo, possam pôr em perigo a hegemo-nia norte-americana e europeia do mundo.

Pelo que se vai sabendo, e tendo em conta asorientações estratégicas de defesa nacional da admi-nistração de Obama (porque os EUA continuam aser o patrão), os novos conceitos estratégicos daNATO deverão andar em torno da ameaça terro-rista, da utilização dos meios electrónicos, nomea-damente a internet, pelos inimigos das democra-cias, e o desenvolvimento das “armas inteligentes”,dado que há uma cada vez maior oposição popu-lar às aventuras guerreiras ocidentais e uma fracatolerância relativamente a baixas militares – nadacomo fazer a guerra à distância, como um jogo devídeo, com escassos efectivos militares, mas gran-des meios tecnológicos e financeiros, em que sómorrem (anonimamente) os outros.

ANTÓNIO BARATA

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A décima quarta edição das Jor-nadas Independentistas Galegas con-tou com a presença de cinco dirigen-tes das esquerdas independentistasda Escócia, Galiza, Países Catalães,Córsega e Porto Rico. Os intervenien-tes analisaram os impactos da crisecapitalista sobre lutas de libertaçãonacional no centro do sistema.

As instalações do Centro Social

GAITA ARMADA,Estaleiro do Som, Galiza.

Em dois CD reúnem-se cerca demeia centena de cantigas galegas ealgumas portuguesas. São cantos po-pulares uns, outros popularizados,que expressam a vivência e a culturadas classes despossuídas. São cantospara cantar em grupo nas tabernas,nas festas e em momentos de camara-dagem e de luta.

Esta é uma edição cuidada, comnotas explicativas sobre as canções,os seus autores, e as histórias que mui-tas delas carregam, que os responsá-veis aconselham a ser copiada, difun-dida, pirateada… Um trabalho degrande qualidade, recheado de nomesque são referências da música e dacultura popular galega e portuguesa,como Fuxam os Ventos, José Afonso,Luís Cília ou Voces Ceibes.

A CANTIGA É UMA ARMA,POIS CANTÉ, …E VIRA BOM,…RONDA DE ALEGRIA!, GAC­ Grupo de Acção Cultural – Vozesna Luta, edição e distribuição iPlay

Som e Imagem, sob licença daValentim de Carvalho, Maio 2010.

Esgotadas há mais de 25 anos,foi agora reeditada a totalidade dasgravações do GAC, um grupo semparalelo no nosso país, cujas cançõesestão na memória da geração que vi-veu os tempos turbulentos que se se-guiram ao 25 de Abril. Criado emcima do 25 de Abril pela generalidadedos cantores de intervenção, conhe-cerá sucessivos afastamentos motiva-dos pelas opções políticas e ideológi-cas dos seus integrantes. Os primeirosa sair serão os cantores ligados ao PCP(Luís Cília, Adriano Coreia de Olivei-ra, José Jorge Letria, Manuel Freire),após o concerto realizado no dia 7 deMaio de 1974. Após isso o grupo radi-

SARROUNIA,Med Hondo, 1986 

Sarrounia é um filme sobre umarainha africana que governou na re-gião dos Haúças, da África Ocidental,no século XIX. Passou recentementeno Institut Franco-Portugais, inse-rido num ciclo de cinema africano.

Sarrounia combateu as tropas co-loniais francesas em 1899, ao contrá-rio dos outros reinos, que capitularamsem luta e colaboraram com elas paraa derrotar. Num violento ataque àcapital fortificada de Lougou, os fran-ceses ocuparam a fortaleza e espalha-ram o terror pelas aldeias e cidades,enquanto os guerreiros retiraram paradepois flagelarem os franceses numatáctica de guerrilhas, obrigando-os aabandonar o projecto de “pacifica-ção” do reino.

caliza-se e reorienta a sua actividadepara o apoio às lutas operárias e revo-lucionárias, ligando-se à movi-mentação popular avançada – greves,lutas pelo saneamento de fascistas,ocupações de terras e casas, lutas desoldados, etc. Colectivo cultural deintervenção política, que desde aprimeira hora se liga ao movimentocomunista marxista-leninista e àUDP/PCP(R), entendia que a “acanção, a poesia, são uma bomba euma bandeira”. Avesso aos grandespalcos, actuava gratuitamente na rua,em quartéis, fábricas, bairros popula-res, herdades agrícolas ocupadas, apoi-ando as lutas dos trabalhadores, mo-radores pobres, soldados e marinhei-ros.

Fruto da efervescência e da “de-sordem” revolucionária aberta pelo25 de Abril, o GAC entrou em crise edesagregação, acompanhando o reflu-xo do movimento popular e da cor-rente política e ideológica em que seintegrava – o maoísmo de esquerda.Desapareceu após 4 anos de intensaactividade em que percorreu o paísde norte a sul, deixando uma obra degrande qualidade, reconhecida mes-mo por aqueles que se encontram nosantípodas de qualquer ideia de sub-versão revolucionária da ordem bur-guesa.

O realizador é famoso em África:trata-se de Med Hondo, que adaptouao cinema o romance Sarraounia (Har-mattan, 1980) do nigeriano Abdou-laye Maman. O filme foi premiadono Festival Pan-Africaino de Cinemade Ouagadougou.

JORNADASINDEPENDENTISTAS

GALEGAS

8 de Junho. A última de uma sériede sessões sobre pensadores marxistasorganizada pela Kultra na livraria LerDevagar em Lisboa. Fernando Rosasera o orador convidado para a sessãosobre Mao Tsé-tung. Fez um exaus-tivo levantamento da vida e obra deMao, centrado sobretudo na sua con-tribuição para a história da Revolu-ção Chinesa e evitando as implicaçõesinternacionais.

Rosas há muito que se afastoudo maoísmo. Apesar disso, em toda asua intervenção via-se que permane-cia algum fascínio pela figura de Mao,tendo salientado a sua importânciaenquanto dirigente comunista e tendodestacado alguns dos aspectos maisinovadores da sua obra.

Desde muito cedo, Mao compre-endeu as particularidades da históriae encruzilhadas da Revolução na Chi-na, mas também analisou a situaçãointernacional e as lições e sobretudoas limitações da pouco antes vitoriosaRevolução Soviética que tinha cria-do a então única sociedade socialistado mundo. Desde o início da sua vidade dirigente comunista, Mao concluiuque a via da insurreição operária ur-bana tinha grandes dificuldades numpaís como a China, com uma popula-ção essencialmente rural, e soube vero potencial das revoltas camponesasque surgiam e cresciam apesar da au-sência de uma liderança comunista.Ao participar e liderar as campanhasmilitares da Revolução Chinesa, e emparticular a heróica Longa Marcha,Mao desenvolveu a teoria militar dasrevoluções comunistas e, na realidade,a teoria militar em geral. Mais tarde,

MAO EM DEBATE,Kultra/Ler Devagar

ao analisar o desenvolvimento do so-cialismo na China, desenvolveu a suateoria da continuação da luta de clas-ses no socialismo e toda uma série deprincípios para a edificação do socia-lismo, rumo ao comunismo, salientan-do o papel mobilizador da ideologiana transformação da sociedade.

Durante a sua intervenção, Rosasdescreveu em detalhe a vida de Mao,distinguindo as suas várias etapas econtribuições. Talvez devido à suadeformação profissional de historia-dor, por vezes perdeu-se demasiadonos detalhes, alongando desnecessa-riamente a palestra, embora raras ve-zes fazendo com que perdesse o inte-resse. Na maior parte do tempo, Rosasmostrou ter feito o trabalho de casa,citando muitas vezes fontes originaise referindo diversas interpretações daobra deste dirigente comunista. Infe-lizmente, nem sempre teve esse cuida-do, por exemplo quando se referiu aoGrande Salto em Frente e, sobretudo,à Grande Revolução Cultural Prole-tária, aceitando acriticamente as in-terpretações burguesas, muito negati-vas em relação a esse períodos. Rosassaltou por cima dos factos, que nãoanalisou, limitou-se a repetir as frasesfeitas e as generalidades normalmentecitadas pelas fontes burguesas e a re-produzir as conclusões oficiais da lide-rança chinesa pós-Mao, nomeadamen-te da clique contra-revolucionária en-cabeçada por Teng Siao-ping. Na reali-dade, muitas fontes recentes, incluin-do de participantes na RevoluçãoCultural, têm vindo a contrariar essaversão oficial. É o caso de Some ofUs: Chinese Women Growing Up Duringthe Mao Era, um livro publicado nosEstados Unidos com testemunhos demulheres chinesas que actualmentevivem nos EUA sobre a sua experiên-cia de jovens urbanas que se desloca-ram para os campos para trabalharemcom os camponeses.

Apesar destas limitações, a sessãocontribuiu para um melhor conheci-mento da importância de Mao, e pararealçar a sua obra e o papel determi-nante que desempenhou no movi-mento revolucionário e comunista doséculo XX, um papel que se tem vindoa tentar diminuir e denegrir, tendên-cia que esta palestra certamente con-tribuiu para contrariar.

Rui Mendes

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MAIO / JUNHO 2010 | 15

À espera dos bárbaros

O que esperamos na ágora reunidos?

É que os bárbaros chegam hoje.

Por quê tanta apatia no senado?Os senadores não legislam mais?

É que os bárbaros chegam hoje.Que leis hão-de fazer os senadores?Os bárbaros que chegam as farão.

Por quê o imperador se ergueu tão cedoe de coroa solene se assentouem seu trono, à porta magna da cidade?

É que os bárbaros chegam hoje.O nosso imperador conta saudaro chefe deles. Tem pronto para dar-lheum pergaminho no qual estão escritosmuitos nomes e títulos.

Por quê hoje os dois cônsules e os pretoresusam togas de púrpura, bordadas,e pulseiras com grandes ametistase anéis com tais brilhantes e esmeraldas?Por quê hoje empunham bastões tão preciososde ouro e prata finamente cravejados?

É que os bárbaros chegam hoje,tais coisas os deslumbram.

Por quê não vêm os dignos oradoresderramar o seu verbo como sempre?

É que os bárbaros chegam hojee aborrecem arengas, eloquências.

Por quê subitamente esta inquietude?(Que seriedade nas fisionomias!)Por quê tão rápido as ruas se esvaziame todos voltam para casa preocupados?

Porque é já noite, os bárbaros não vême gente recém-chegada das fronteirasdiz que não há mais bárbaros.

Sem bárbaros o que será de nós?Ah! eles eram uma solução.

ÁLVARO CUNHAL,SETE FÔLEGOS

DO COMBATENTE,Carlos Brito,  Edições Nelson deMatos, 376 páginas, 25 euros.

A revelação para nós mais surpre-endente deste livro é que afinal CarlosBrito poucas ou nenhumas divergên-cias teve com Álvaro Cunhal. Pode-mos até concluir que Cunhal, bemconversado, poderia figurar, se fossevivo, entre os dirigentes renovadoresda actualidade, tal foi a justeza, pers-picácia, acerto e genialidade da suaactividade como dirigente comunista.

Carlos Brito integrou a direcçãopolítica do PCP desde 1967 até 2002,data em que cindiu e co-fundou oMovimento Renovação Comunista,insatisfeito com a rigidez dos dirigen-tes “conservadores”, a falta de demo-cracia interna, e a inflexibilidade emrelação às alianças tácticas à sua direi-ta, mais concretamente com o PS.Cunhal acusou-o de querer social-democratizar o partido, mas ele nega.

compostelano Gentalha do Pichelacolheram no sábado 29 de Maio oimportante evento de reflexão mar-xista que a organização Primeira Li-nha vem realizando de forma ininter-rupta desde 1997.

Do programa constaram as inter-venções “Galiza e os Países Catalãesfrente ao assimilacionismo espanhol”,por Alberte Moço, porta-voz nacio-nal de NÓS-UP (Galiza) e Aquiles

Rubio i Villalvilla, da Endavant--OSAN (Países Catalães); “Escócia,Córsega e Porto Rico, três lutas anti--imperialistas, por Johanna Dind, doScotish Socialist Party (Escócia),Paulu Antone Susini, da Corsica Libe-ra (Córsega) e Salvador Tió, indepen-dentista e membro da presidência co-lectiva do Movimento ContinentalBolivariano (Porto Rico).

Neste livro Carlos Brito faz umrelato pormenorizado do trajectopartidário de Cunhal e de si próprio,quase sempre em sintonia mútua.Recorre a profusas referências às dife-rentes etapas ideológicas e políticaspor que passou a política do PC sobresponsabilidade do dirigente máxi-mo e revela sem complexos todos osseus preconceitos em relação ao papeldos “esquerdistas” na crise revolucio-nária.

A Batalha, 239, LisboaAbrente, 56, CompostelaBoletim Anarco-Sindicalista, 35,LisboaChallenge, 13, Nova IorqueContropiano, 2/2010, RomaDans le monde une classe enlutte, Mar., ParisÉchanges, 123, ParisEl Martinete, 23, MadridÊxodo, 103, MadridIl comunista, Abril, MilãoInsurreiçom, 8, GalizaLutte de classe, 128, ParisLutte Ouvrière, 2184, ParisMonthly Review, Abril, NovaIorqueN+1, Abril, TurimO Arrifana, 108, PenafielO militante socialista, Abril,LisboaOctubre, 36, MadridPartisan, 239, ParisResumen Latinoamericano, Mar./Abr., San Sebastian

Nascido em Alexandria, noEgipto, é considerado o maisimportante poeta grego doséculo XX. A sua poesia sófoi publicada em livropostumamente, poucos aconheciam antes. O poetaimprimia folhas soltas compoemas e distribuía-as entreamigos. A obra também não éextensa: são apenas 154poemas.

“O capital não entregará o seu poder aos representantes denenhum partido anticapitalista ‘democraticamente eleito’ sópara obedecer às regras do comportamento democrático e às‘tradições democráticas’.”

István Mészàros, Beyond Capital, 1995

Konstantinos Kaváfis

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Caso o povo e os pobres de pedir nãose oponham, de forma violenta de prefe-rência – contra a violência reaccionária,exige-se violência revolucionária! – quemserão as vítimas? A generalidade da popu-lação, por via dos aumentos das taxas deIRS e das despesas por via do IVA. Ostrabalhadores da função pública e das em-presas do sector empresarial do Estadopor via do congelamento directo dos salá-rios. Os trabalhadores do sector privadoda economia por via do boicote à contra-tação colectiva. Os desempregados pela

Diário Liberdade:Novo espaço galegoe lusófono de informaçomanticapitalista

Pode parecer surpreendente que seja precisamentea partir do “elo fraco” do espaço internacional de falagalego-luso-brasileira que se lance umha ferramentacom vocaçom de unir informativamente as luitas, comoo Diário Liberdade aspira a ser. Porém, nom é assim tamestranho, se tivermos em conta que é precisamente àGaliza que interessa de modo mais premente a afirma-çom como parte dessa área lingüística e cultural, faceao risco certo de assimilaçom que representam a nossadependência de Espanha e o isolacionismo fomentadopolas instituiçons espanholas em relaçom a Portugal.

O núcleo que lançamos este site, com experiência notrabalho informativo no seio da esquerda anticapitalistagalega e noutros sites internacionais, madureceu umprojecto que acolhe todo o tipo de informaçons popularesna voz dos seus protagonistas. Os critérios som claros:total prioridade para as iniciativas surgidas à margemdas instituiçons, máxima abertura para todas as visons eprojectos da esquerda nom domesticada, desde o anar-quismo até as diferentes famílias comunistas e os novosmovimentos sociais.

Graças a um trabalho colaborativo de base, o sitetem actualizaçons constantes e inclui nom só a reprodu-çom de conteúdos de organizaçons e militantes, mastambém os conteúdos criados pola equipa redactora e aspessoas colaboradoras do próprio Diário Liberdade. Sabe-mos que nom é fácil integrar num mesmo espaço tantasdiferenças e desconfianças como no seio da esquerda,mas achamos positivo permitir a livre expressom e odebate aberto sobre questons políticas, favorecendo nopossível dinámicas de trabalho comum ali onde for pos-sível.

Com umha forte componente nacional, por surgirnumha naçom oprimida como é a Galiza, o Diário Liber-dade bebe do espírito internacionalista que sempre inspi-rou a esquerda digna de tal nome. Eis a dialéctica quenos guia no caminho da luita final que permita a derrotaglobal do capitalismo.

Bem sabemos que nom será um meio de comunicaçomque torne possível tam ambicioso objectivo como o indi-cado, mas sim vamos dar voz às e aos que luitam paraesse fim no ámbito intercontinental dos povos que falama língua de Rosalia, Camões e Machado de Assis.

O projecto e o empenho som abertos no seio da esquer-da anticapitalista. O convite a participar fica feito aquem nos lê.

MAURÍCIO CASTRO

Convertida em protectorado daUnião Europeia, a Grécia cumpre a con-tragosto o programa de austeridade quereforça o aparelho de Estado ao serviçodo interesse dos capitalistas, com o gover-no na posição de “comité executivo daclasse dirigente”, como dizia Marx. Coma Alemanha, a França e a Grã-Bretanha aliderar o processo grego, a União Euro-peia afirma-se assim como espaço de ex-ploração dos seus Estados mais fracos.

Foi notável a reacção combativa dasmassas gregas, mas o ajustamento preco-nizado para o país agravará a sua situação.

A solução encontrada pelas cliquesdirigentes europeias foi liquidar o sistemade segurança social, incluindo as reformas,e atirar os países para uma recessãoprolongada. Porém, interessante é reterque as medidas tomadas demonstram oesgotamento da política de intervençãodo Estado, como o próprio FMI assinalouao afirmar: “A política monetária, emtodas as suas formas, alcançou os seuslimites”.

Há indicadores de que as medidas deausteridade, conducentes a uma baixa donível de vida, não serão aceites sem luta.

GRÉCIA

Tudo depende da maior ou menor deter-minação de resistir por parte do movi-mento popular grego, assim como da res-posta que o resto da Europa dará ao apeloafixado no Parténon de Atenas: “Povosda Europa, levantem-se!”

A ameaça que se faz agora à Grécia éque, a verificar-se a cessação dos paga-mentos, será excluída da moeda europeia.Mas isso significaria o princípio do fimda União Europeia. O processo, aliás, jácomeçou: a própria situação criada à Gré-cia é já uma manifestação dessa desagre-gação. Outros sintomas claros são a en-trega pelo Tratado de Lisboa da defesada Europa à NATO e o controlo peloFMI da política financeira do continente.

Além do mais, não se esqueça que hávida para lá do euro: de facto, o fim daUnião Europeia poderá ser mesmo umabênção, na medida em que significar asuspensão de transferência para os bancosde fundos na ordem de milhares de mi-lhões, fundos que nos pertencem e sãoconfiados a irresponsáveis e predadores.A Grécia está afinal na frente do pelotãoque pode levar de vencida todo este de-sastre que se abate sobre os trabalhadores.

INFORMAÇÃO ALTERNATIVA

Diário Liberdade é um projecto jornalísticoalternativo anticapitalista e anti-imperialista,

virado para a realidade social e as lutas de classesna península Ibérica, América Latina e África de

expressão portuguesa e castelhanawww.diarioliberdade.org

Pobreza vai aumentarredução e perda do subsídio de desempre-go. Os beneficiários dos regimes não con-tributivos da Segurança Social, bem comoaqueles, que tendo efectuado descontos,beneficiam do complemento solidário pa-ra idosos e das pensões mínimas. Os doismilhões e 900 mil pensionistas e reforma-dos do sistema público de Segurança So-cial. O acordo bicéfalo Sócrates-PassosCoelhos deu-nos isto. Dará mais? Se nósquisermos…

VÍTOR COLAÇO SANTOS

Quem vai pagar a crise?