produção de dendê - reporter brasil

Upload: rogerio-miranda

Post on 09-Mar-2016

21 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

dendê

TRANSCRIPT

Expediente

Reprter Brasil - Organizao de Comunicao e Projetos SociaisEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

Coordenao geralLeonardo Sakamoto

Centro de Monitoramento dos AgrocombustveisMarcel Gomes (coordenao) Verena Glass (pesquisa)

Suporte FinanceiroFabiana Garcia

Suporte AdministrativoMaia Fortes

O relatrio Expanso do dend na Amaznia brasileira: elementos para uma anlise dos impactos sobre a agricultura familiar no nordeste do Par uma realizaodo Centro de Monitoramento de Agrocombustveis da ONG Reprter Brasil

AutoraVerena Glass

RevisoMarcel Gomes

FotosVerena Glass

DiagramaoGustavo Monteiro

Endereos para correspondncia [email protected] http://twitter.com/reporterb http://www.facebook.com/ONGReporterBrasil

Rua Bruxelas, 169, So Paulo - SP, CEP 01259-020Telefones: (+55 11) 2506-6570, 2506-6562, 2506-6576 e 2506-6574

ApoioCordaidFederao de rgos para Assistncia Social e Educacional - FASE/Amaznia Sigrid Rausing Trust

Copyright ONG Reprter Brasil permitida a reproduo total ou parcial da publicao, devendo citar fonte de referncia.

ndice

Expanso do dend na Amaznia brasileira05Aspectos econmicos06Estudo dE cAso: pArcEriA com AgriculturA08fAmiliAr Em concrdiA do pArreordenao da produo regional09Estudo dE cAso: trAbAlho pEnoso E consumo dE drogAs11Aspectos ambientais11consideraes finais14notas15

5A expanso do dend no nordeste do parEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

Apesar de constar como prioridade do Programa Nacional de Produo e Uso de Biodiesel (PNPB) para a re- gio Norte desde a sua criao em 2004, o dend (ou palma) passou a receber investimentos mais vultosos, principal- mente no estado do Par - maior estado produtor -, a partir do lanamento do Zoneamento Agroecolgico do Dend1 e do Programa de Produo de Palma de leo, em 20102.

A institucionalizao da dendeicultura amazni- ca - que j ocorre industrialmente na regio desde a dca- da de 1990 -atravs da nova regulamentao das polticas pblicas para o setor possibilitou a implementao, com o apoio financeiro do Pronaf Eco Dend3, da integrao da agricultura familiar a grandes empresas de biodiesel sob uma nova tica. Com contratos de parceria de 25 anos (de- talhado mais adiante), empresas devero se beneficiar de incentivos fiscais na produo de biodiesel atravs do Selo Combustvel Social4, enquanto pequenos agricultores so inseridos em uma nova escala de produo agroindustrial.Fonte: Sagri e Reprter Brasil

A participao da agricultura familiar no cultivo do dend est ampliando a rea ocupada pela cultura no Nordeste do Par, principal regio produtora do estado com 37 municpios adequados atividade, segundo o Zoneamen- to Agroecolgico do Dend. Atualmente, de acordo com da- dos da Secretaria de Agricultura do Estado do Par (Sagri), somando-se as reas prprias do setor empresarial s ocu- padas com dend na agricultura familiar, a regio contabili- za cerca de 166 mil hectares ocupados pela cultura5.

Atualmente, empresas de mdio e grande porte, como Agropalma, Biopalma Vale,Yossan, Dempasa, Mar- borges, Dentau, Petrobras/ Galp, ADM e Palmasa, alm de outras de menor envergadura, ocupam, juntas, 140 mil hectares, com perspectivas de expanso para 329 mil ha at 2020, como mostra tabela 1.

Foto: Verena Glass

TABELA 1: PRODUO DE DEND NO PAR

EMPRESAMUNICIPIOSREA PLANTADA (ha)CAPACIDADE INSTALADA (t)PROJETOS DE EXPANSO (ha)

AgropalmaAcar, Moju e Tailandia45.00020150.000

BiopalmaAbaetetuba, Acar, Concrdia do Par, Moju, Tom Au e So Domingos do Capim42.0004080.000

YossanSanta Isabel do Par16.000---------------------20.000

DenpasaSanta Brbara do Par6.0001210.00

MarborgesMoju5.0002010.000

DentauConcrdia do Par, Santo Antnio do Tau4.000----------------------6.000

Petrobras/GalpMoju Tailndia, Tom-Au, Acar, Concrdia do Par, Bujaru e Abaetetuba4.000----------------------75.000

ADMSo Domingos do Capim3.00050.000

PalmasaIgarap Au3.000288.000

Outros12.000----------------------20.000

Total140.000340329.000

Adicionalmente s reas de dend cultivadas pela agricultura familiar antes de 2010 (cerca de 20,2 mil ha), entre aquele ano e 2012 o setor firmou, de acordo com da- dos do Banco da Amaznia (Basa, repassador dos finan- ciamentos do Pronaf Eco Dend ), 581 novos contratos de parceria, como mostra a tabela 2.EXPANSO DO DEND NA AMAZNIAFonte: Basa

6

J para a safra 2012/2013, o Basa projetou o fi- nanciamento de outros 1.610 contratos entre empresas e agricultores familiares, adicionando mais 15,3 mil ha dendeicultura da regio, como mostra a tabela 3:Fonte: Basa

1. Aspectos econmicos

Como constatam os pesquisadores da Universi- dade Federal do Para (UFPA) Joo Santos Nahum e An- tonio Malcher6, a populao do plo paraense do dend composta predominantemente por ribeirinhos, quilom- bolas, agricultores familiares e trabalhadores rurais, que usam a terra como ncleo estruturante das comunidades. Segundo Nahum e Malcher, tal fato, associado viso se- torial e econmica de meio rural que prevalece nos recen- seamentos, provavelmente explica a quase invisibilidade

da produo camponesa nas estatsticas dos rgos oficiais, que insistem em reforar que as unidades familiares cam- ponesas amaznicas no tm peso econmico, so obsole- tas, irracionais economicamente.

A fragilidade, na opinio do poder pblico, dos processos produtivos da agricultura fa- miliar no Nordeste paraense tem justi- ficado os investimentos no dend como uma alternativa vivel de renda. De acordo com o programa do dend na agricultura familiar, que prev reas de 10 hectares cultivados em bases familia- res, pequenos agricultores podero obter uma renda de cerca de R$ 2 mil mensais no pico produtivo, que se estende do quinto ao 18 ano de vida das palmeiras.

Uma base de clculo de gastos e ganhos, elaborada pela Empresa Brasi- leira de Pesquisa Agropecuria (Embra- pa) em parceria com a empresa Dend do Par S.A. (Denpasa) em 2010, tem orde- nado os financiamentos do Pronaf Eco Dend do Banco da Amaznia, que atu-almente disponibiliza at R$ 80 mil por famlia com prazo de 14 anos (prorrogveis por mais seis) para quitao dos dbitos. A estimativa das empresas que, se manejado de acordo com as indicaes tcnicas, uma famlia poder pro-duzir de 80 toneladas de dend por ano, em 10 ha, a partir do terceiro ano, e at 280 t/ano, a partir do 10 ano7.

Na prtica, porm, os clculos apresentam algumas distores se fossem aplicados ao p da letra em 2013. Alm da inflao dos ltimos trs anos, que aumentou os custos com insumos, mo-de-obra, equipamentos de proteo in- dividual, instrumentos de tra- balho (como pulverizadores) ehoras-mquina, muitos agricultores produzem bem menos e utilizam bem mais agrotxicos, mo-de-obra e outros itens do que o previsto pela Embrapa.

Por outro lado, a produo dos dendezais no tem chegado a 280 toneladas/ano em lotes de agricultura familiar, como pode ser constatado nas experincias mais antiga da regio. Na comunidade de Araua, no municpio de Moju, por exemplo, onde cerca de 150 famlias plantam dend para a empresa Agropalma desde 2002, a produo mdia fica em torno de 200 toneladas em 10 ha, de acor- do com os produtores. Partindo-se desta experincia, a

7Fonte: base de clculo Embrapa/DenpasaEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

possibilidade de que o ganho de uma famlia com a cultura no atinja os ndices previstos pela Embrapa real. Agricultores de Araua ainda no colhem volume prometido pela EmbrapaFoto: Verena Glass

Diante disto, na ta- bela 4 esto listados apenas os itens referidos para o clculo de custos e rendimentos, por amostragem de anos, para au- xiliar numa projeo mais re- alista dos agricultores sobre gastos e ganhos.

@ Estudo dE caso: parcEria com agricultura familiar Em concrdia do parEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

8

Raimundo Reis, parceiro da Biopalma Vale, ainda gasta mais do que ganha

Raimundo Lopes dos Reis, agricultor de Concrdia do Par, municpio localizado no nordeste do Estado, iniciou uma parceria com a Biopalma Vale no incio de 2010. Plantou 10 hectares e tomou R$ 57,5 mil emprestados no banco, aportando mais R$ 8 mil do prprio bolso. Em janeiro de 2013, comeou a colher e, muito satisfeito com a parceria, conta que ganhou R$ 1,8 mil com o dend. Questionado se este valor cobriu os custos de produo, Raimundo dos Reis comeou a fazer contas.

Para ajudar no trabalho de adubao e coroamento das palmeiras (aplicao de herbicida ao redor das plantas), Raimundo contratou quatro pessoas por cinco dias, a R$ 30 a diria: um gasto de R$ 600. Depois, foram contratadas mais trs pessoas por seis dias para ajudar no trato e na colheita da lavoura. Gasto: R$ 540. Mais duas dirias de trator (a R$ 300 a diria), R$ 600. Adi- cionando a isso R$ 666 de adubo e R$ 105 de veneno,

Contratao de ajudantes e diria de trator elevam os custos

Foto: Verena Glass os gastos totais foram de R$ 2.511, contra R$ 1.800 de renda. Dessa forma, em janeiro o agricultor teve um prejuzo de R$ 711.

Pode-se argumentar que o caso de Raimundo dos Reis caracterstico para os que esto iniciando o cultivo do dend. Com o passar dos anos e o aumento da produo, tambm aumentar a renda. Ainda as- sim, possvel fazer uma estimativa grosseira do que poder ocorrer.

Tomemos como base a comunidade de Araua, em Moju, que j planta dend em parceria com a Agro- palma h quase dez anos. A produtividade mdia das famlias de 20 toneladas por ha/ano, segundo a em- presa. Multiplicando a produo por 10 hectares, tem--se 200 toneladas/ano por famlia. Com base no preo de R$ 255 pagos pela tonelada (cotao da Agropalma em 12/03/2013), o rendimento mdio bruto da rea ficaria em R$ 51 mil/ano. Dividido por 12 meses, so R$ 4.250/ms.Foto: Verena Glass

Do total da renda advinda da produo, porm, 25% so retidos no Banco da Amaznia para quitao do financiamento, e 25% para o pagamento do adubo, for- necido pela empresa. Isso significa uma diminuio de 50% no ganho lquido, que passaria a girar em torno de R$ 2.125. Calculando os gastos de manejo, com base na experincia de Raimundo dos Reis, pode-se concluir que, tirando o adubo, j contabilizados nos 25% acima, sobram cerca de R$ 1.800 de despesas. Subtraindo este valor do ganho mensal, uma famlia teria um lucro de cerca de R$ 325/ms com 10 hectares de dend at a quitao de suas dvidas com o banco (entre 14 e 20 anos), descontado o pagamento pela mo-de-obra (pr- pria ou contratada).

Contratos de parceria Empresas/Agricultores Familiares

Os contratos de parceria entre empresas e agri- cultores familiares, elaborados pelas empresas, apesar de seguirem estritamente as provises legais, em sua maioria determinam uma relao bastante impositiva entre as in- dstrias e seus integrados.

Tomemos como exemplo o contrato da Petro- bras8. Como condio inicial, a empresa estipula que a rea ocupada pelo dend reservada para cultivo exclusivo deste, estando vedado ao agricultor que consorcie outras culturas com dend, apesar de ser proprietrio da terra em questo.

A empresa tambm exige, por contrato, acesso ilimitado rea do produtor, estipulando que a COM- PRADORA ter livre acesso ao imvel do PRODU- TOR/VENDEDOR, podendo visitar as suas depen- dncias sempre que julgar conveniente, para verificar a regularidade das condies do plantio e do solo, prestar a assistncia necessria, bem como fiscalizar a execuo do presente Contrato.

tambm a empresa que gerencia o plantio e o manejo do pequeno agricultor. Segundo o contrato, o PRODUTOR/VENDEDOR obriga-se a preparar a rea de plantio seguindo rigorosamente o organograma e as es- pecificaes tcnicas fornecidas pela COMPRADORA.

O PRODUTOR/VENDEDOR obriga-se a rea- lizar as atividades de plantio e manuteno da cultura de palma de leo, de acordo com as recomendaes tcnicas e de segurana, meio ambiente e sade ocupacional da COMPRADORA, em especial no que se refere limpeza, rebaixo, coroamento, poda e afastamento, adubao e con- trole fitossanitrio dos plantios.

O PRODUTOR/VENDEDOR obriga-se a efe- tuar a limpeza e a conservao dos plantios de palma, em especial na rea abrangida pelo presente Contrato, deven- do a mesma estar em boas condies de colheita e escoa- mento da produo. (...)

O PRODUTOR/VENDEDOR obriga-se a exe- cutar fielmente todas as operaes agrcolas e orientaes referentes a segurana, meio ambiente e sade ocupacional definidas pela Assistncia Tcnica da COMPRADORA, conforme definido na Instruo Normativa n 01/2009.

A empresa tambm estipula o preo a ser pago pela produo e j institui penalidades em caso de descon- tentamento com o resultado. Segundo o contrato, o preo a que se refere o item 8.1 para o produto que atenda s especificaes tcnicas designadas como padro no Ane- xo VI. Ao produto que no se enquadrar na classificao padro ser aplicado fator de desconto no preo conforme anexo VI. Tambm a empresa que produz relatrios pe- ridicos para o Banco da Amaznia, para que este libere (ou no) o pagamento ao agricultor contratado na opera- o de financiamento do Eco Dend.

Outras clusulas do contrato apresentam dispari- dades entre os direitos de ambas as partes. O documento prev, por exemplo, que o PRODUTOR/VENDEDOR no poder ceder, no todo ou em parte, os direitos previstos no presente Contrato, salvo com autorizao prvia e porEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

escrito da COMPRADORA. No entanto, a COMPRADO-9RA fica desde j autorizada a ceder o presente Contrato, notodo ou em parte, a empresas controladas, controladoras, relacionadas, joint-ventures ou empresas sob o controle ou com participao acionria da COMPRADORA ou da Petrleo Brasileiro S.A PETROBRAS. O contrato tam- bm garante empresa que este poder ser rescindido a qualquer tempo pela COMPRADORA por justa causa, na hiptese de se tornar impossvel, seja do ponto de vista tcnico ou legal, o desenvolvimento das atividades Objeto do Contrato.

De acordo com Joo Augusto Arajo Paiva, gerente geral de Produo da Diretoria de Biodiesel da Petrobras Biocombustveis (PBio), as clusulas contratu- ais que garantem o acesso da empresa s terras de seus parceiros, bem como as que definem as praticas de mane- jo, devem garantir o bom desempenho do dendezal e sua produo, fator de interesse tanto da Petrobras como dos agricultores.

J a exigncia de que o dend seja cultivado sem consorciamento com outras culturas real, mas a Pe- trobras teria encomendado estudos Embrapa para que desenvolvesse manejos alternativos, neste sentido. Con- firmo que esta clausula existe, mas vamos tentar mudar isso, j pedimos estudos Embrapa, explica Joo Augus- to Paiva. Questionado sobre a incapacidade de muitas fa- mlias de manterem seus dendezais e cultivarem roas, o gerente da Petrobrs disse que a empresa tem procurado prioritariamente fechar parcerias com agricultores que se comprometem a no abandonar as roas. Claro, no est no contrato, mas uma das condies para a parceria.

102. reordenao da produo regionalDend deixa pouco tempo e espao para cultura alimentaresEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

O ritmo acelerado da expanso da dendeicultu- ra e da incorporao da agricultura familiar atividade j tem modificado a estrutura produtiva do nordeste do Par, como constata a pesquisa de Joo Santos Nahum e Antonio Malcher. Entre os anos 2008 e 2010, a aquisi- o de terras por parte das grandes empresas focou, em grande medida, lotes de pequenos agricultores, muitos dos quais, depois de vendida a terra, passaram a trabalhar como funcionrios de agenciadores de trabalho - os cha- mados gatos - ou das prprias empresas no plantio dos novos dendezais agroindustriais.Farinha de mandioca nunca esteve to cara no ParFoto: Verena GlassFoto: Verena Glass

J os produtores que optaram pelo dend em parceria com as empresas tm, via de regra, abandonado os plantios e as roas de cultivos alimentares. De todos os depoimentos colhidos a campo em cinco anos de pesquisa do Centro de Monitora- mento de Agrocombustveis (CMA) da Reprter Brasil nos municpios de Aba- etetuba, Acar, Concordia do Par, Moju, Tom Au e Tailndia, apenas um produ- tor no deixou de cultivar alimentos e ro- as, em funo de um sistema de organiza- o microempresarial da propriedade.

Estes dois fenmenos j tm sido relacionados por especialistas a uma alta de preos de itens bsicos dos ali- mentos, tanto na regio nordeste quanto na capital paraen- se Belm. De acordo com levantamentos do Departamento Intersindical de Estatstica e Estudos Socio-econmicos no Par (Dieese/PA), o principal responsvel pela alta de 12% da cesta bsica no Estado entre janeiro e dezembro de 2012 (quase duas vezes a inflao do ano calculada pelo IBGE) foi a farinha de mandioca, que sofreu um aumento de 90% neste perodo.

O mesmo fenmeno se repetiu nos primeiros me- ses de 2013. Segundo o Dieese, maro de 2013 foi o 11 ms consecutivo de alta no preo da farinha de mandioca consumida pelos paraenses. (...) Os preos por quilo da fa- rinha de mandioca praticados hoje na Grande Belm so os maiores j verificados pelo Dieese/PA desde o inicio da Pesquisa da Cesta em 1980.

Outros itens da alimentao bsica da popula- o paraense que tiveram altas significativas so o aa e o peixe. De acordo com levantamento do Dieese relativo ao ms de maro de 2013, na regio da grande Belm o aa do mdio (tipo mais consumido) apresentou uma alta de 45,27% em relao aos preos praticados em feverei- ro. No 1 trimestre de 2013 (janeiro a maro), a alta neste tipo de aa chegou a 80,14%. J o pescado sofreu altas de at 20,3%, a depender do peixe. A inflao oficial para este mesmo perodo girou em torno de 3,50%.

Apesar de apontar fatores como situaes de sa- zonalidade, quebra de safra e entraves na comercializao, o economista e supervisor tcnico do Dieese/PA, Roberto

Sena, avalia que existe uma relao entre o avano do den- d e a alta dos alimentos. O problema da agricultura fami- liar que falta poltica de produo; deixaram de fomentar mandioca em troca do dend, afirma Sena. Segundo ele, o pouco investimento na produo de alimentos faz com que cerca de 60% do que consumido no Estado venha de fora. O Par tem hoje o maior custo de vida do pas, de acordo com o IBGE, afirma Sena.

Por outro lado, um comparativo entre a renda do dend e algumas das principais culturas da agricultura fa- miliar da regio tem apontado desvantagens do primeiro em 2013. o caso da pimenta e do aa, segundo os clcu- los de pequenos agricultores ouvidos pelo CMA em maro. Apesar de ter abandonado qualquer outro plantio desde que fechou a parceria de dend com a Biopalma/Vale, Rai- mundo Lopes dos Reis calcula que os ganhos com pimen-EXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

ta em 10 hectares girariam em torno de R$ 3 mil/ms, e11com o aa, 1.250/ms. Mas com o preo da farinha, queest em torno de R$ 8,00/kg em Belm, se tivesse plantado mandioca estaria rico hoje, pondera ele.

@ Estudo dE caso: trabalho pEnoso E consumo dE drogas

Ex-agricultora, B.R.9 trabalha atualmente como gato (agenciador de mo-de-obra) em uma comunidade loca- lizada s margens da PA-252, rodovia que liga Abaetetu- ba a Moju. Em 2009, a Biopalma Vale comprou a rea de 400 hectares da famlia e ajudou B. R. a montar o neg- cio que, em maro de 2013, agenciava 30 homens para trabalhar no plantio e manejo de dend para a empresa.

De acordo com B. R., a mdia do rendimento dos traba- lhadores terceirizados nos dendezais empresariais gira em torno de R$ 1.200/ms. No plantio, calculada a remunerao de um salrio mnimo por 20 mudas plan- tadas, mais 20 centavos por muda adicional. O mesmo pagamento se aplica poda, e apenas a adubao paga R$ 0,86 por planta adicional.

Pelos contratos de terceirizao de mo de obra da Bio- palma Vale, os gatos recebem um valor pr-estabe- lecido para realizar um servio determinado em uma determinada rea, explica B. R. O pagamento de sal- rios, o transporte, os Equipamentos de Proteo Indivi- dual, a alimentao e todos os demais gastos com os trabalhadores ficam a cargo do agenciador. Isto pode ser um problema. Por exemplo, quando chove muito, somos obrigados a trabalhar assim mesmo. Os homens plantando dend com gua na canela, as covas cheias dgua. A bate um vento durante a noite e todas as mudas tombam. No dia seguinte no tem jeito, temos que voltar l e refazer todo o servio sem ganhar um centavo a mais por isso, explica B.R.

A penosidade do trabalho no dend foi um dos aspectos mais destacados pela agenciadora. De acordo com B.R., um novo fenmeno, j conhecido nos canaviais paulis- tas, est se espalhando nas frentes de trabalho do den- d paraense: o consumo e a vicio em drogas pesadas como cocana e crack. Pelo menos quatro dos meus

30 trabalhadores se viciaram em cocana nas frentes de dend. Dos que eu sei, digo; pode ter mais. Mas o problema das drogas geral, isso eu sei, disse.

Atualmente desempregado, J. R. M, apontado por vi- zinhos como um dos trabalhadores que se viciou nas frentes de trabalho, foi funcionrio de outro gato por um ano. Segundo J. R. M, que trabalhou nas fazendas Pra- teada e Malhada, da Biopalma Vale, ele no suportou a presso do trabalho pesado. A gente acordava as 3 da madrugada, tomava um cafezinho ralo e ia pro dend. Trabalhvamos das 6h s 15h no plantio e no raleio de mudas, mas qualquer deslize tnhamos descontos no pa- gamento. Nem eu nem meu irmo aguentamos, explica.

Questionado sobre o uso de drogas, J. R. M no admitiu que tivesse sido ou ainda fosse usurio, mas confirmou a prtica. Tem muita gente usando. Porque enquanto voc faz uma linha (de mudas de dend), o cara que usou cocana faz uma e meia. Ganha muito mais assim, no sente cansao, no sente fome, no sente quando se machuca. Por isso muita gente usa.

De acordo com moradores da comunidade do Pontilho, em Abaetetuba, uma puruca (papelote) de cocana vendida por R$ 20 na regio, e um cigarro de maconha por R$ 2. J havia droga antes aqui, mas nunca como agora, desde a chegada do dend. Na nossa comunida- de eu sabia de nove pontos de droga. No ano passado, pulou para 17. Posso dizer com certeza que a droga nas comunidades veio com o dend, afirma uma liderana comunitria, que pediu para no ser identificada. Sei de casos onde o trabalhador deixou R$ 600 na mo do traficante assim que pegou seu salrio. Tem traficante at nas frentes do dend, fazendo negcio. Mas aqui no pode denunciar, temos muito medo da reao dos traficantes, explica.

3. Aspectos ambientaisEXPANSO DO DEND NA AMAZFoto:NVIeArena Glass

12Igarap Curuper: ccontaminao por agrotxicos preocupa quilombolas

Um dos principais impactos ambientais do dend j detectados no nordeste paraense (depois da onda de des- matamentos praticados por - ou a mando de - empresas em lotes de agricultura familiar para a implantao de dend entre 2008 e 201010) tem sido a contaminao por agrot- xicos de igaraps que alimentam os inmeros rios - como o Par, Tocantins, Moju, Acar, Acar Miri, Capim, Aiu--Au, Maracan e Camari, entre outros - da regio.

Na comunidade Murutinga, localizada margem da rodovia PA-252 no municpio de Abaetetuba, morado- res relataram que mulheres que lavam roupa no igarap de mesmo nome e que tangencia as plantaes de dend, tm se queixado frequentemente de coceiras e erupes na pele. J no da mais pra usar a gua do Murutinga, t tudo en- venenado, afirma seu Sebastio, dono de um restaurante na beira da estrada.

O problema se estende tambm aos moradores de comunidades vizinhas aos plantios, muitos dos quais esto vendendo suas reas. Em Concrdia do Par, o agricultor Antonio Ribeiro possui um pequeno lote na comunidade Castanhalzinho (prxima comunidade quilombola Curu- per), localizado diretamente na fronteira de um grande plantio de dend da Biopalma Vale. Segundo Antonio Ri-

beiro, nos dias de aplicao de veneno no dend a famlia tem sofrido com fortes dores de cabea (ontem mesmo passei 24 horas no hospital por conta da dor), e no possvel manter nenhuma criao de aves, como galinhas e patos. Eu at tentei, mas a elas ficam doentes, comea a melar o bico, e elas morrem. No sei dizer se por causa do veneno, mas acredito que sim, diz o agricultor. O prin- cipal problema da famlia, no entanto, que a nica fonte de gua para consumo, um poo artesiano, est localizado a menos de 50 metros do dendezal.

O igarap Curuper, que passa no interior da rea de dend em questo, um dos principais cursos dgua que alimentam a comunidade quilombola de Curuper. Se- gundo Jos Francisco Maciel, dirigente da Associao de Remanescentes de Quilombos de Nova Esperana de Con- crdia (Arquinec), a populao local est apreensiva sobre a possibilidade de contaminao com agrotxicos, prin- cipalmente por causa das crianas. O igarap um dos principais locais de lazer da comunidade, h muito medo do que possa acontecer se suas guas estiverem sendo en- venenadas, explica Maciel.

De acordo com o tcnico da Secretaria de Agri- cultura do Estado do Par (Sagri) Arnaldo Martins, a mdia de aplicao de herbicida em um hectare de dend

de 2 litros por ano, sendo feitas duas aplicaes anuais. Tomando como base a estimativa da Sagri de que o Es- tado cultiva atualmente 166 mil hectares de palma, pode--se projetar que cerca de 332.000 litros de herbicida so ou sero aplicados todos os anos na cultura, a depender de sua fase de desenvolvimento.

A isto, pode-se adicionar, na mesma lgica, ou- tros venenos listados na tabela de insumos da Embrapa (tabela 4 deste estudo), como raticida (20kg/10 ha, per- fazendo 33,2 toneladas/ano nos 166 mil ha de dendezais paraenses), inseticida (10 l/10 ha, ou 166 mil litros/ano), formicida isca (10 kg/10 ha, ou 166 toneladas/ano), e inseticida armadilha (12 cpsulas/10ha, ou 19.920 cp- sulas/ano).

Estes clculos obviamente so imprecisos em fun- o da peculiaridade de cada rea produtiva. As indicaes da Embrapa se baseiam em unidades familiares, e estima-se que o uso de venenos nos grandes plantios seja bem maior. Fato que o grande volume de agrotxicos em reas an- teriormente pouco atingidas por estes produtos, com alta ocorrncia de cursos dgua e altos ndices de pluviosidade, pode se transformar num risco tanto para as comunidades quanto para a biodiversidade animal e vegetal expostas contaminao.

13EXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

Foto: Verena Glass

Antonio Ribeiro, que mora ao lado de dendezal da Biopalma, tem sade afetada

isEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

Da forma que foi conduzida, a implantao do Programa de Produo de Palma de leo no Par, com apoio, incentivos e suporte tcnico e financeiro dos go- vernos federal e estadual, da iniciativa privada e at de setores sindicais, pouco foi debatida com o mais impor- tante pblico alvo - os agricultores familiares. Muito se prometeu e pouco se discutiu sobre seus impactos nos modos de vida tradicionais e sobre outras alternativas de renda e desenvolvimento.

Convidado pelo Centro de Monitoramento de Agrocombustveis (CMA) da Reprter Brasil a analisar o contrato da Petrobras com pequenos agricultores, o juiz do Trabalho Marcus Barberino, especialista em relaes de trabalho no campo, chamou a ateno para um fato importante: a imposio de monocultivos em reas de pe- quenos agricultores atenta contra a prpria estrutura do programa de agricultura familiar, que gerar alimentos e meios de subsistncia in loco para as famlias, e no ex- clusivamente meios monetrios.14

De acordo com Barberino, o modelo adotado pelo programa do dend - expresso nos contratos de par- ceria - , alm de evidenciar uma assimetria (a desigual- dade de armas) entre as partes contratantes, incentiva a desconstruo da diversidade representada pela agricul- tura familiar. As clusulas que estipulam a difuso de conhecimentos tcnicos, padronizao de processos pro- dutivos e formulao de proposta de financiamento bus- cam dar uniformidade ao comportamento dos produtores e, em tese, disseminar entre estes as prticas relacionadas com a gesto capitalista do agronegcio (...). Em snte- se, esmagam a economia agrria tradicional, educando a economia de subsistncia para a explorao em maior escala e bases tcnicas atualizadas, avalia o juiz.

O modelo monocromtico de desenvolvimento da dendeicultura, baseado em uma espcie extica ao bio- ma amaznico e voltada para a produo de biodiesel, j apresenta indcios de que a segurana alimentar da re- gio produtora ser afetada. Seus efeitos sobre a renda da agricultura familiar, sobre a reconcentrao de ter- ras, sobre a transformao de pequenos agricultores em trabalhadores assalariados - muitas vezes em condies precrias e expostos a problemas como a dependncia de drogas -, sobre as comunidades tangenciadas pelas reas de dend e sobre a biodiversidade, rios e igaraps, carece de estudos mais aprofundados, mas, novamente, indcios de problemas se multiplicam.

Diante deste quadro, preciso questionar se os recursos e investimentos em tecnologia reservados dendeicultura, outrossim, no poderiam ser aplicados na consolidao de uma agricultura familiar diversificada e social, ambiental e economicamente saudvel. Permanece o desafio s organizaes representativas dos pequenos agricultores, s instituies de apoio e assessoria, aca- demia, aos agentes do poder pblico e principalmente aos prprios agricultores de aprofundar este debate.

notas

1 Mais informaes sobre o Zoneamento Agroecolgico da Cultura da Palma de leo: http://www.cnps.embrapa.br/zoneamento_ dende/ZonDende.pdfEXPANSO DO DEND NA AMAZNIA

2 Mais informaes sobre o Programa de Produo de Palma de leo: http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/file/camaras_ setoriais/Palma_de_oleo/1_reuniao/Programa.pdf

3 Criado em 2007, o Pronaf Eco, destinado a estimular a produo de culturas agroenergticas da agricultura familiar no mbito do Programa Nacional de Produo e Uso de Biodiesel (PNPB), tem se afirmado como uma das principais ferramentas de poltica pblica agrcola no Nordeste do Par desde 2010. Atualmente, disponibiliza um crdito de at R$ 80 mil a agricultores familiares integrados a grandes empresas.4 Mais informaes sobre o Selo Combustvel Social: http://www.mda.gov.br/portal/saf/programas/biodiesel/2286313155 Mais informaes sobre o Programa de Dend - Estado do Par, fevereiro de 2013: http://palmadeoleo.cpatu.embrapa.br/menu/ apresentacoes-workshop/dia-26-02-2013-manha/hildegardo-nunes-apresentacao-embrapa-26-02.13

6 Nahum, Joo Santos, e Malcher, Antonio Tiago Correa - Dinmicas territoriais do espao agrrio na Amaznia: a dendeicultura na micro-regio de Tom Au (PA) - http://confins.revues.org/7947

7 A tabela original pode ser acessada atravs do link http://reporterbrasil.org.br/wp-content/uploads/2013/05/Cpia-de- coeficientetecnicodend-Denpasa-Curso-Embrapa-Roberto.xls

8 Para ler o contrato integral, o link http://reporterbrasil.org.br/wp-content/uploads/2013/05/Contrato-dende-Petrobras-AF.pdf

9 Omitimos o nome dos entrevistados neste estudo de caso para preserv-los

10 A agricultura familiar e o programa nacional de biodiesel, pgs 25 e 26 - http://reporterbrasil.org.br/documentos/AgriculturaFamiliar_Biodiesel2010.pdf

Reprter Brasil - Organizao de Comunicao e Projetos Sociais [email protected] http://twitter.com/reporterbhttp://www.facebook.com/ONGReporterBrasil

Rua Bruxelas, 169, So Paulo - SP, CEP 01259-020 Telefones: (+55 11) 2506-6570, 2506-6562, 2506-6576 e 2506-6574