reforma pombalina - carlota boto
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A dimenso iluminista da reforma pombalina dos estudos: das primeiras letras universidade*
Carlota Boto Universidade de So Paulo, Faculdade de Educao
* O presente artigo foi originalmente elaborado com o ttulo
O Iluminismo e as reformas pombalinas, a convite do Col-
quio 250 anos de ensino pblico no Brasil, realizado em junho
de 2009, na Faculdade de Educao da Universidade Federal de
Minas Gerais.
A secularizao como um modo de ser mundo
O Iluminismo foi um fenmeno intelectual que
teve lugar na Europa em meados do sculo XVIII.
Tinha por principal baliza a referncia da crtica; com-
preen dendo o mesmo conceito de crtica como o reco-nhecimento das possibilidades, mas tambm dos limites da capacidade humana de conhecer. Mais do que isso,
os iluministas compreendiam que a instruo condu-ziria no apenas a um acrscimo de conhecimento no sujeito, mas tambm a um aprimoramento do indivduo
que se instrui. Movimento crtico do Absolutismo;
crtico da sociedade estamental; dos consequentes pri-
vilgios da aristocracia e do clero; crtico, enfim, das
instituies de uma ordem poltica considerada arcaica.
Propunha-se refundar a nacionalidade; e, para tanto,
havia de ser criado um novo pacto civil.
Apostando no avano do esprito humano e do conhecimento, no progresso dos povos e na caminhada do gnero humano rumo a um indefectvel percurso de aprimoramento a que chamava perfectibilidade ,
o Iluminismo foi tambm um movimento de f: f na
razo, no futuro, na flecha de um tempo, no comrcio
entre os homens e, finalmente, f na educao. Edgar
Morin (1988) admite ter sido a f nessa racionalidade
crtica que transformada em mstica quase religio-sa firmou no Ocidente, para o bem e para o mal, o
universalismo do conceito de Humanidade.1 De todo modo, o esprito racional era e universal (p. 85).
Uma das marcas do Iluminismo portugus foi sua dimenso religiosa, convivendo com a ideia de um Estado condutor dos assuntos temporais. Pode-se
1 Edgar Morin dir que h um antagonismo profundo nesse
humanismo europeu, que se radicaliza no sculo das Luzes. As
contradies manifestar-se-iam entre a crena na universalidade
desse mesmo humanismo, a qual, por si mesma, dissimula um
euro pocentrismo dominador, e a sua potencialidade verdadeira-
mente universalizante, aberta a todos os indivduos e a todas as
culturas, que desmascara e critica o europocentrismo (Morin,
1988, p. 101).
o Mtodo o primeiro requisito do Estudo, para, por
meio dele se poder adquirir um conhecimento profundo
e slido das Cincias. Quem desconhece o Mtodo no
pode ter ordem no Estudo. E quem estuda sem ordem,
adianta-se pouco na Estrada das Cincias, tropea a
cada passo e perde um tempo infinito.
Compndio, 1972, p. 245
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dizer que se toda a laicidade uma secularizao,
nem toda a secularizao (ou foi) uma laicidade
(Catroga, 2006, p. 273). So conceitos com significa-dos diversos. Como diz ainda Catroga, o conceito de
secularizao passou a conotar a perda, nas sociedades modernas ocidentalizadas, da posio-chave que a religio institucionalizada ocupava na produo e na reproduo do elo social e na atribuio de senti-do (p. 62). A religio deixa de ser a viga mestra da
cultura, sua pedra de toque, e passa a ser um recurso auxiliar. J a laicidade supe de modo radical a
institucionalizao da diferena entre o espiritual e o temporal, o Estado e a sociedade civil, o indivduo e o cidado (p. 273). A clivagem entre a instruo p-blica portuguesa e o modelo pedaggico arquitetado pelos planos da Frana revolucionria acontece a. A
escola pombalina no era conduzida pela utopia da emancipao.
O fenmeno da secularizao este sim, como
j se observou acima um dos alicerces do Iluminismo
e da modernidade. Junto da progressiva secularizao
das instituies, vinham os emblemas da racionaliza-o, da civilizao de costumes (Elias, 1993, 1994)
e do que Weber (2000) qualificou de desencantamento do mundo.
Carlos Guilherme Mota (2006) define o homem
da Ilustrao como o homem da Razo, da Lgica, da
Experimentao, da Cincia, do Direito Natural. Era o
pesquisador, cosmopolita, reformista, antiabsolutista
(p. 67). Fenmeno europeu no sculo XVIII, a secula-rizao integra o movimento que separa a moralidade da religio, que marca os limites entre Estado e Igreja;
que determinar o mundo e o modo-de-ser-no-mundo
do homem moderno. Por isso, uma interpretao do
Iluminismo , por essncia, uma leitura da Seculari-zao (Pereira, 1990, p. 7).
Tambm Roberto Romano (2003) destaca o prin-cpio da secularizao inscrito no projeto das Luzes
como elemento essencial para estruturar um imaginrio
que daria lugar a preceitos de universalidade, nos quais os signos da impessoalidade e da igualdade jurdica se
tornassem as grandes ideias-fora da cultura poltica moderna: lei natural, razo, vontade geral, povo etc.
(p. 22). Trata-se de um movimento no qual, progressiva-mente, por etapas, o Estado-Nao viria a vassalizar
a Igreja (Morin, 1988, p. 45). Por isso, vale para o caso
portugus, sob a gide de Pombal, a caracterizao de Edgar Morin acerca da situao francesa do Antigo Regime: a monarquia absoluta foi relativa (idem, ibidem). Laerte Ramos de Carvalho destaca tambm o sentido de secularizao impresso na reforma pomba-lina dos estudos menores. Diz o historiador:
[...] seu objetivo superior foi criar a escola til aos fins do
Estado e, nesse sentido, ao invs de preconizarem uma
poltica de difuso intensa e extenso do trabalho escolar,
pretenderam os homem de Pombal organizar uma escola que,
antes de servir aos interesses da f, servisse aos imperativos
da Coroa. (1978, p. 139)
Marques destaca que despotismo esclarecido foi a fase tardia do absolutismo rgio, muito mais em cone-
xo com as grandes mudanas que a Europa sofreu no sculo XVIII do que com a nica influncia de uma
atitude filosfica (1984, p. 322). Maria Lcia Garcia
Pallares-Burke (2001) acredita que as principais medi-das voltadas para a criao e organizao de escolas de Estado no sculo XVIII europeu seriam oriundas, no
tanto das ideias iluministas, mas, sobretudo, daqueles que a histria chamou de dspotas esclarecidos. Por
sua iniciativa, foram adotadas polticas pblicas diri-gidas a racionalizar e ilustrar seus Estados (idem, p. 59). Para tanto, a historiadora d o exemplo da in-
troduo do ensino compulsrio e universal nos rei-
nados de Frederico II da Prssia (1740-1786) e Maria
Tereza da ustria (1740-1780) (idem, ibidem). O mode lo de ensino arquitetado para ambos os reinos tinha como ponto comum o atendimento das neces-sidades do Estado quanto formao de consensos.
Nesse sentido, os principais valores vei culados pela escolarizao especialmente a primria seriam
di li gncia, obedincia, sentimento de dever e preste-za na interiorizao de regras. Tratava-se pode-se
dizer de um modelo voltado para a formao de
sditos esclarecidos; mas no de cidados. Mesmo
assim, Pallares-Burke se interroga: como explicar que
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dois governos absolutistas, e no os mais progressistas regimes ingls e holands, procurassem pr em prtica
a educao do povo e, com isso, fossem coerentes com o princpio do ecumenismo racional que era defendido em teoria? (idem, ibidem). Seja como for, esses monarcas orientavam-se inequivocamente por uma compreenso diversa acerca da potencialidade da educao na produo do controle social. Mas
talvez os mesmos soberanos compreendessem que o desenvolvimento da escolarizao teria algo a ver com a prosperidade dos povos.
Luzes, esclarecimento, Iluminismo ou despotis-mo esclarecido? Muitos j tentaram definir o Marqus
de Pombal. Para ns, educadores brasileiros do prin-cpio do sculo XXI, a certeza que temos a de que, nos territrios que geriu, foi ele o criador da escola pblica de Estado precisamente h 250 anos.
O modelo de escola pblica que Pombal gestou ti-nha vale dizer caractersticas prprias: tratava-se de
um artefato organizador da fora e da potncia do Es-tado. Sem dvida alguma, rascunhavam-se ali como
sublinha Antnio Nvoa (2005) as condi es para o
processo histrico de uma sociedade de ba se escolar
(p. 23). O Estado tomava para si a tare fa de selecionar,
nomear e fiscalizar professores. O Estado controlaria as
matrias a ser ensinadas. Mas no havia intuito de, por
meio da educao, alterar a base poltico-social desse mesmo Estado. O projeto pombalino (e a Ilustrao
portuguesa que o embasou) no se inscreveu como
observa Catroga (2006, p. 360) em nenhuma luta de
libertao nacional. A veia regalista conduzia um pro-cesso de secularizao das instituies e dos costumes.
Tal percurso traduziu-se como a Modernidade possvel para o mundo lusitano.
A escola estatal do mundo que Portugal perfilha-va teve lugar a partir de 28 de junho de 1759 com o
Alvar Rgio que implementava a Reforma dos Es-
tu dos Menores. O protagonista da mesma reforma,
personificando a lgica do despotismo esclarecido
por tuguesa, o Marqus de Pombal que tinha por
referenciais polticos alguns tericos e pedagogos lu-sitanos: D. Lus da Cunha, Antnio Nunes Ribeiro
Sanches e Lus Antnio Verney.
Todos eles compunham uma gerao de es-trangeirados; tanto porque viviam fora de Portugal
quanto porque observavam a situao portuguesa com base em tal deslocamento do olhar (Andrade, 1980; Moncada, 1941). A ambiguidade profcua dessa
situao de estrangeirado adviria da observao da realidade estrangeira por parte de algum que tem no seu pas de origem a referncia. A comparao
com outros pases parecer, nesse caso, irresistvel e
inevitvel. Os estrangeirados portugueses do sculo
XVIII preocupavam-se com o atraso cultural do
pas. Consideravam que a situao do seu Portugal
contemporneo era de decadncia: perante os pases
mais avanados da Europa; luz dos rumos tomados
pela colonizao; diante do poder que um dia o pas
acreditou possuir.
Muitos fatores explicam o poder do Ministro; a
maior parte deles compreensvel luz de uma histria comparada. Porm h sempre algo que diz respeito
especificidade nacional; quilo que, do exterior, no
facilmente identificado. Alis, alm disso, na histria,
h o fator acaso; e talvez Oliveira Martins (1991) no
estivesse errado quando disse que uma das causas do poder do Marqus decorreu da atuao que este tivera quando do terremoto que faria morrer em Lisboa de
10.000 a 15.000 pessoas.
Consta que, ao ser indagado pelo Rei sobre o que
fazer diante da tragdia que fizera ruir mais da metade
dos prdios de Lisboa, o ento Ministro dos Assuntos
Exteriores e da Guerra (desde 1750), Sebastio Jos
de Carvalho e Melo, teria respondido: enterre os
mortos, feche os portos e cuide dos vivos. A partir
da, o Ministro teria conquistado definitivamente a
confiana do Rei; que, no ano seguinte (1756), o no-mearia Secretrio de Estado dos Negcios do Reino
de Portugal. O Rei, com esse ato, daria a Sebastio
Jos de Carvalho e Melo futuro Conde de Oeiras,
em 1759, e Marqus de Pombal, em 1769 estatura
de primeiro ministro do reinado portugus. Como
bem observa Kenneth Maxwell (1996, p.24), foi o
terremoto que deu a Pombal o impulso para o poder virtualmente absoluto que ele conservaria por mais de vinte e dois anos, at a morte do rei, em 1777.
Carlota Boto
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Dom Lus da Cunha e seu Testamento poltico: decadncia, sangrias e alternativas
Ao abordar a atuao de D. Lus da Cunha (1662-
1749), a bibliografia costuma sublinhar sua atividade
diplomtica em Londres, onde teria sido nomeado
embaixador. Ao olhar do exterior para seu pas di-zem os historiadores , Lus da Cunha acentuava a
necessidade de se fortalecer o papel do rei. Alm disso,
preocupava-se com a dependncia portuguesa perante a Gr-Bretanha, com as dificuldades comerciais en-frentadas pelo pas, e, especialmente, com uma certa fraqueza auto-imposta de Portugal no tocante falta
de populao e de esprito de iniciativa (Maxwell,
1996, p. 16). Como indica, sobre o tema, Carlos
Guilherme Mota (2006, p. 39), o Testamento poltico de D. Lus da Cunha escrito nos anos de 1740, um pouco antes da subida do prncipe D. Jos ao poder
orienta o monarca sobre quem deveria ser escolhido como principal ministro do reino. Ele sugere mais de
um nome, dentre os quais sublinha o de Sebastio Jos
de Carvalho e Melo, cujo gnio paciente, especulativo
e ainda que sem vcio, um pouco difuso, se acorda com o da nao (Cunha, 1976, p. 27). Mota assinala
que D. Lus da Cunha teria se destacado tambm por
uma viso mercantilista inovadora para seu tempo, tendo sido, indubitavelmente, um dos idealizadores da modernizao econmica do Reino: seu discpulo,
Pombal, tornar-se-ia a figura central dessa constelao
da qual D. Lus era o mentor (Mota, 2006, p. 47).
Lus da Cunha discorreria sobre a lastimvel
situao de Portugal no concerto europeu (idem, p. 35). Mota compreende que, inspirador do mar-qus reformista (idem, p. 38), D. Lus da Cunha foi a ex presso mxima do pensamento cosmopolita e
reformista luso da primeira metade do sculo XVIII,
antecipando a Ilustrao portuguesa (idem, ibidem). Inaugurava-se ali uma reflexo crtica sobre os males
de Portugal e os seus remdios (idem, ibidem). Por-tugal era compreendido como um organismo doen te, a quem se deveria observar os sintomas, os humores e a debilidade; de modo a buscar identificar o co-nhecimento da causa do mal que o aflige: isto no s
para remediar a sua queixa, mas para prevenir o de que pode estar ameaado (idem, p. 43).
A causa primordial da fragilidade portuguesa residiria na estreiteza dos limites de seu territrio. Tal
debilidade era, ainda, acentuada quando se comparam nossas foras proporo das dos seus vizinhos
(idem, ibidem). Em virtude dessa irreparvel fraqueza, Portugal se teria lanado ao encalo de outras terras;
favorecido por uma situao geogrfica que esta
sim lhe era favorvel: a vizinhana do mar. Porm,
a aventura das navegaes no teria sido capaz de con-ter o mau uso das terras do reino: terras incultas,
proprietrios que no cultivavam seus terrenos e,
at mesmo, pores de terras usurpadas ao comum
das cidades, vilas e lugares (idem, p. 61). As terras incultas por desinteresse dos donos ou dos rendeiros deveriam ser-lhes retiradas para ser entregues a pes-soas que pudessem e quisessem cultiv-las (Falcon,
1982, p. 254).
D. Lus da Cunha desenvolve a tese de que as
razes que levaram Portugal a se apequenar perante os demais pases de Europa consistiram em um conjunto
de fatores que ele caracterizou como sangrias.A primeira sangria que destrua e despovoava o
reino portugus residiria no conjunto de pes soas de
ambos os sexos que procuravam os conventos.
Tornando-se frades e freiras, renunciavam ao mundo, no procriavam, no trabalhavam para o pas e no povoavam o reino com sua prole.
A segunda sangria que no deixa de enfraque-cer o corpo do Estado, e a que no acho remdio, o socorro da gente que anualmente se manda para a ndia (idem, p. 74). Eram especialmente marinheiros que, ao fazer isso, deixavam mulheres e filhos mu-lheres que, no fosse isso, poderiam ter muitos outros filhos. O Brasil estava tambm includo nessa segunda
sangria: para l iam todos os que sem passaporte
encantavam-se com a promessa das minas e o desejo
de fazer nova vida.
A terceira sangria do Estado portugus viria dos atos da Inquisio relativamente queles que eram
por causa dela chamados cristos-novos. Essa san-
gria D. Lus da Cunha caracteriza como insensvel
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e cruelssima (idem, p. 75). Diariamente saem de Portugal essas pessoas, que, em solo portugus, no teriam qualquer oportunidade. O reino, assim, era,
tambm por isso, despovoado. Uma forma de extinguir
esse problema seria dar aos judeus a possibilidade
de viver sua religio como, alis, se pratica entre
todas as naes da Europa (idem, p. 88). D. Lus da Cunha expressava sua convico de que, quanto mais
gente fosse perseguida, acusada e punida, maior seria o nmero de judeus travestidos de cristos-novos. Alm
disso, quando cessassem as perseguies, deixaria de haver tantos sacrlegos quantos, sendo no corao
judeus, frequentam os santos sacramentos, para no
serem descobertos (idem, p. 91). Finalmente sem as clivagens que retiram das pessoas oportunidades que seriam justas , os judeus (convertidos ento em
cristos-novos), caso pudessem assumir sua verda-deira identidade religiosa, permaneceriam no Reino, fazendo com que seu capital girasse em torno dos negcios portugueses; o que desenvolveria a econo-mia nacional e faria florescer o seu comrcio (idem, ibidem). A liberdade de religio e a confiana de que no teriam seus bens confiscados fariam com que os
judeus contribussem para desenvolver e equilibrar o
comrcio portugus.
E o desequilbrio comercial preocupao
com que Lus da Cunha finaliza o texto pode ser
compreen dido como a quarta sangria que ceifava o vigor e a potncia do reino portugus.
Ribeiro Sanches e suas Cartas sobre a educao da mocidade
Antnio Nunes Ribeiro Sanches (1699-1782) era
um mdico que, cristo-novo, embora tenha iniciado seus estudos em Coimbra, cedo se transferiu para Sa-lamanca, onde formou-se em medicina. Diz Rmulo
de Carvalho (1986) que ele saiu do pas aos 27 anos e
nunca mais regressou. Exerceu a Medicina na Rssia,
entre 1731 e 1747, tendo sido mdico da Czarina. Na
Rssia, ele dirigiu um hospital, desenvolveu investi-gaes cientficas e clinicou na Escola Militar de
So Petersburgo. Quando soube que Pombal havia
publicado o Alvar de 28 de junho de 1759, expul-sando a Companhia de Jesus, Ribeiro Sanches teria
se entusiasmado a redigir um trabalho sobre o tema da educao. Publicada em 1760, essa obra, sob o ttulo
Cartas sobre a educao da mocidade, constitui um importante opsculo para se ter uma ideia do que foi, em matria educativa, o Iluminismo no tempo e no territrio do Marqus de Pombal.
Ribeiro Sanches destacava que os privilgios e as imunidades das ordens privilegiadas teriam sido a causa da deturpao de costumes e da m educa-o portuguesa. A mocidade no era preparada para
ser boa nem para ser til Ptria. Pelo contrrio: o
fidalgo era educado para tratar como escravos todos
os subalternos como se as pessoas do povo no
fossem proprietrias de seus corpos e de sua honra.
A fidalguia ainda criticada porque acostumava mal
as pessoas. Aqueles que desfrutavam do epteto de
fidalgos no poderiam, por exemplo, ser presos por
dvidas. O resultado do privilgio era frontalmente
contrrio aos interesses do reino: o senhor dissi-pador, nem sabe o que tem, nem o que deve; perde
toda a ideia de justia, da ordem, da economia; pede
emprestado com mando, maltrata e arruna a quem lhe recusa (Sanches, s.d., p. 97). Alm disso prossegue
o autor , se pela religio crist todos seriam iguais pe-rante os mandamentos da Igreja, como justificar essas
desigualdades de tratamento entre as pessoas? Como
justificar as regalias? Contraditoriamente, o plano das
Cartas traando um retrato do que seria adequado ao ensino portugus nos estudos menores e nos maio-res dividia a mocidade em trs grupos sociais cujo
destino escolar nada tem a ver com as capacidades dos componentes dos grupos, mas apenas com a sua situao social. Os grupos so o povo, a classe mdia
e a nobreza (Carvalho, 1986, p. 439-440). A educao
estaria, sob tal perspectiva, diretamente subordinada aos interesses econmicos, polticos, comerciais e at
militares do Estado portugus.
As escolas para Ribeiro Sanches precisavam
ser distribudas estrategicamente. Existiriam apenas
naqueles lugares onde fosse necessria a educao da
juventude. Nesse sentido, o autor propunha a instau-
Carlota Boto
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rao de um tribunal voltado especificamente para as
coisas do ensino; e, assim, que em nenhuma aldeia,
lugar ou vila onde no houvesse duzentos fogos no fosse permitido, a secular ou eclesistico, ensinar por
dinheiro ou de graa a ler ou a escrever (Sanches, s.d.,
p. 129). Por qual motivo? Diz o autor que a instruo
criaria no esprito uma certa altivez, inadequada para a maior parte das pessoas, especialmente para aquelas destinadas s lides do trabalho. O estudo, alm do
mais, exigia um esforo diametralmente contrrio ao
esforo fsico; fazendo com que a juventude perdesse
o vigor e a fora: aquela desenvoltura natural; porque
a agitao, o movimento e a inconstncia prpria
da idade da meninice (idem, ibidem). O excesso de estudo enfraqueceria o corpo, j que, na escola, os me-
ninos ficam assentados, sem bulir, tremendo e temen-do (idem, ibidem). Por causa de tudo isso, Ribeiro Sanches conclui que nem todos deveriam frequentar a escola: no convm uma educao to mole a
quem h-de servir repblica, de ps e de mos, por
toda a vida (idem, ibidem). Para o povo mido, no convinha a escola. Ribeiro Sanches era iluminista; e
o Iluminismo era tambm isso.
Para as escolas a serem abertas e controladas pelo Estado, Ribeiro Sanches sugere que particularmente
nas de primeiras letras , em vez do aprendizado por
catecismos religiosos, fosse elaborado catecismo de novo tipo aquele voltado para ensinar s crianas as
obrigaes com que nasceu (Sanches, s.d., p. 133).
Para tanto, as escolas deveriam providenciar livri-nhos impressos em portugus por onde os meninos aprendessem a ler, onde se inclussem os princpios da vida civil de um modo to claro que fosse a doutrina compreendida por aquela idade (idem, ibidem). A isso o autor denomina catecismo da vida civil (idem, ibidem). Conhecimentos, valores e condutas ali im-pressos seriam ensinados s crianas com castigos e
com prmios, acostumando aquela idade mais a obrar conforme a razo do que a discorrer (idem, ibidem). Por meio do livro escolar, seriam instrudas quanto a comportamentos e aes para com os mais velhos, os colegas, a vida social. Pelo compndio se haveria
de compreender que ningum na prosperidade e na
grande alegria se deve desvanecer nem ensoberbecer, porque somos nascidos para viver uma vida cerceada sempre pela alegria e pela tristeza; que nenhum bem
sem mistura de mal, nem nenhum mal sem mistura de bem (idem, p. 135). Tudo isso saberes e costumes poderia ser ensinado meninice; o que, alis, no
era difcil, como demonstra a facilidade natural que qualquer criana apresenta em dominar rapidamente a forma oral de sua lngua materna.2 Mas fundamental que no nos esqueamos que, para atingir a meninice, ser necessrio o mestre lhe falar na lngua e na frase
que prpria quela idade (idem, ibidem). Relativamente ao ensino das Universidades,
Ribeiro Sanches centra-se no exemplo portugus da Universidade de Coimbra. Ali havia, na poca,
quatro faculdades: Direito Cannico, Jurisprudncia,
Teologia e Medicina. Porm, segundo o autor, todos
os cursos eram defasados e obsoletos. Note-se que no
havia sequer um curso de Filosofia compreendendo-
se esse estudo como uma pertena do territrio da Teologia. Tomando o caso do Direito Cannico e
da Jurisprudncia, Ribeiro Sanches assegura que
as referncias daquele modelo de ensino eram absolutamente insuficientes para formar conselheiros
de Estado, embaixadores, generais, almirantes, etc.
(Sanches, s.d., p. 159). E a razo de tal insuficincia
residia no fato de estar a universidade sob a exclusiva alada do clero.
Havia uma arquitetura do Estado que pressu-punha pessoas para gerirem a organizao do reino.
Isso requereria planejamento, execuo de metas,
fiscalizao e controle. Da a necessidade, identificada
por Ribeiro Sanches, de preparo desses profissionais
especializados, que teriam cargos na administrao do reino. A instruo das chamadas escolas maiores
2 admirvel o juzo humano: na idade de trs anos apren-
deu um menino a sua lngua falar sem saber o que faz, com o no-
minativo, com o verbo no singular ou no plural, no tempo, no modo,
etc. O que to difcil aos adultos que aprendem as lnguas doutas
ou estrangeiras, pode o menino aprender, no dia, de trs ou quatro
mestres sem confundir o que aprende (Sanches, s.d., p. 135).
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teria a tarefa de instruir o sujeito em suas obrigaes
de cristo e cidado (idem, p. 172). Para tanto, ha-veria o menino de aprender latim e grego, histria e geografia, poesia
[...] e que saiba escrever, ou na lngua latina ou na sua, com
elegncia e propriedade: porque o Estado no somente tem
necessidade de letrados, jurisconsultos e mdicos, mas
tambm de secretrios, de notrios pblicos, de intenden-
tes, de conselheiros e assessores nos tribunais ou colgios
que devem governar a economia poltica e civil do reino.
Tanto mais instrudos sarem estes estudantes das escolas
referidas, tanto melhor exercitaro os cargos em que sero
empregados. (idem, ibidem)
Ribeiro Sanches prope, ento, com base nos requisitos profissionais acima assinalados, trs tipos de
escolas maiores, que deveriam, por um lado, preparar a mocidade nobre para o aprendizado das cincias e, por sua vez, os sditos para bem servirem a ptria.
Diz Joaquim Ferreira (s.d., p. 60) que essas escolas
maiores ou Faculdades seriam de fundao rgia, in-dependentemente da anuncia da Santa-S. Ribeiro
Sanches, ao tratar dos estudos maiores, sugere, sob os critrios acima indicados, a classificao das cincias
em trs modalidades de escolas.
Na primeira escola, seriam aprendidos os assun-tos da natureza humana, dos corpos, de suas combi-naes, a histria natural, a botnica, a anatomia, a
qumica, a metalurgia e a medicina. A segunda escola seria voltada para os saberes necessrios ao Estado
poltico e civil para governar-se e a conservar-se
(Sanches, s.d., p. 158), de modo a assegurar a felici-dade dos sditos. Aqui as matrias de estudo seriam
histria universal, profana e sagrada; a filosofia mo-ral, o direito das gentes, o direito civil, as leis ptrias;
a economia civil, que se reduz ao governo interior de cada Estado (idem, ibidem). Finalmente, haveria uma terceira escola, que abarcaria os assuntos da religio mas essa teria sua estrutura organizada pelos prprios eclesisticos , sobre a qual Sanches afirma: no me
pertence a mim indicar o que nelas se devia aprender
(idem, ibidem). Assim, as coisas da religio ficariam separadas das cincias humanas (idem, p. 159).
E como deveriam ser as aulas de tais escolas? Comear-se-ia pela observao, semelhana da percepo que temos na vida cotidiana, quando pres-tamos ateno s coisas, s pessoas e a ns mesmos.
Da partia-se para a lio, que era o modo de ilustrar o entendimento luz do legado dos que vieram an-tes aquilo que as geraes anteriores aprenderam e
experimentaram, como se nos valssemos das riquezas que ajuntaram nossos antepassados (Sanches, s.d.,
p. 165). Em seguida, ocorreria o chamado ensino dos mestres; sempre por viva-voz e no por postilas3 nem temas, explicando o que deve inculcar no nimo dos
discpulos, perguntando, orando s vezes, e arguin-do, no por silogismos, mas em forma de dilogo
(idem, ibidem). A partir da, o quarto movimento do ensino seria a conversao, mediante a qual se pode apreender aquilo que os outros sabem. Ouvimos e
aprendemos quando partilhamos; ou, nos termos do
texto, quando imitamos sem nos apercebermos o
judicioso que ouvimos e admiramos; e, com agrado e
amor da sociedade, transformamos o nosso entendi-mento naquele com quem tratamos (idem, ibidem). Finalmente, aconteceria o momento da meditao; uma reflexo ou ateno madura da alma voltada para
todos os movimentos anteriormente feitos no percurso desse aprendizado.
Crtico do ensino domstico, Ribeiro Sanches
recomenda o estabelecimento, em Portugal, de uma Escola Militar, que seria, para a mocidade portuguesa, de muito maior proveito do que a profuso do que o autor nomeia estabelecimentos literrios (Sanches,
3 O Dicionrio Contemporneo da Lngua Portuguesa:
feito sobre o plano de F. J. Caldas Aulete, em sua terceira edio,
no vo lume II, define a palavra postila: livro, caderno ou folhas
em manuscrito, por onde os alunos de uma escola ou universi-
dade estudam as lies explanao, explicao, comentrio
(ordinariamente manuscrito) a qualquer texto, doutrina, tratado,
etc. lio que nas aulas de instruo primria, o professor dita
e os discpulos escrevem para se aperfeioarem na ortografia
(Aulete, s.d., p. 760).
Carlota Boto
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s.d., p. 183). Essa Escola Real Portuguesa seria vol-tada para a formao da nobreza e da fidalguia; com o
fito de educar sditos amantes da ptria, obedientes s
leis e ao seu rei, inteligentes para mandar e virtuosos para serem teis a si e a todos com quem devem tratar
(idem, p. 184). Nesse estabelecimento, os meninos ingressariam entre doze ou quatorze anos. Segundo
comenta Rogrio Fernandes, essa Escola Militar ou Colgio dos Nobres foi pensada para ser um colgio destinado educao militar da nobreza, com a con-dio, no entanto, de se no esquecer que os filhos
da nobreza receberiam nesse colgio uma educao polivalente, de tal sorte que poderiam desempenhar funes nos estratos superiores do aparelho do Es-tado (1992, p. 80).4 Joaquim Ferreira (s.d., p. 65)
destaca que Ribeiro Sanches, propondo ao Marqus
de Pombal a criao do Colgio dos Nobres, nutria a
certeza de ofertar sua ptria um ncleo de estadistas
capa zes de engrandec-la. E o Marqus de Pombal
talvez ouvindo seu conselheiro funda em 7 de maro
de 1761 o Colgio dos Nobres.5
4 Rogrio Fernandes (1992) recorda que, voltando-se para
as questes de organizao do sistema escolar, Ribeiro Sanches j
dialogava, de alguma maneira, com as primeiras medidas tomadas
pelo Marqus de Pombal nos estudos menores. H ressonncia
das ideias de Ribeiro Sanches tambm em vrias iniciativas pom-
balinas, revelando o modo pelo qual ideias e aes circulavam e
se entremeavam poca: fundao do Real Colgio dos Nobres
(1761), cuja abertura se efetua em 1766, e da Real Escola Nutica
do Porto (1762); criao da Real Mesa Censria (1768), organismo
que passa a superintender na atividade do Diretor dos Estudos;
criao da Junta de Providncia Literria (1770) (Fernandes,
1992, p. 85).
5 Embora no se conheam documentos que nos autorizem
a admitir qualquer afinidade entre o pensamento iluminista das
cartas de Ribeiro Sanches e a orientao doutrinria do pombalis-
mo, ainda que seja nos anos mais dramticos da disputa com os
jesutas, o certo que estas cartas no deixaram de ter repercusso,
pois a criao do Colgio dos Nobres, por elas preconizada, logo
encontrou o firme apoio do gabinete de Dom Jos I (Carvalho,
1978, p. 91).
Ribeiro Sanches no hesita em indicar que o
primeiro e cotidiano ensino dessa escola deve ser a religio, para cumprirmos a obrigao de cristo
(Sanches, s.d., p. 193). Diferentemente, no entanto,
da cultura clerical que imperava no perodo, a escola ser administrada por mestres leigos militares, que
ensinaro os exerccios corporais para fortificar o cor-po, faz-lo gil e endurecido ao trabalho e fadiga
(idem, ibidem). Procos e vigrios restringir-se-iam a administrar
sacramentos e a instruir nos Domingos e dias de festa
na religio; mas sem novenas, irmandades, confrarias
e outras instituies, que no so essenciais religio catlica (idem, ibidem). Verifica-se aqui um modelo de ensino que, embora no fosse laico, porque man-tinha em seu cenrio o universo religioso, era, sem
dvida, secularizado. Ou seja: quem mandava ali era
o Estado. Esse era o plano. No projeto de Ribeiro
Sanches, o controle da ao educativa no mais per-tenceria Igreja. Seria, antes de tudo, responsabilidade
do Estado; inclusive porque a educao da mocidade
era tida por estratgia para conservar e fortalecer a monarquia.
Outra providncia recomendada por Ribeiro Sanches era a instituio de outro tipo de colgio:
este voltado para formar meninas fidalgas. Sendo as
mes as primeiras educadoras, tais escolas preparariam aquelas que, em primeiro lugar, teriam por misso a formao das novas geraes. Percebe-se, todavia,
que a preocupao com a instruo das mulheres tem tambm o objetivo de ensinar a elas quais eram as
coisas permitidas e as proibidas; o que deveria ser lido
e o que estava proscrito. Nesse sentido,
Todas as primeiras ideias que temos provm da criao que
temos das mes, amas e aias; e se estas forem bem educadas
nos conhecimentos da verdadeira religio, da vida civil
e das nossas obrigaes, reduzindo todo o ensino destas
meninas fidalgas geografia, histria sagrada e profana,
e ao trabalho de mos senhoril, que se emprega no risco,
bordar, pintar e estofar, no perderiam tanto tempo em ler
novelas amorosas, versos que nem todos so sagrados, e em
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Revista Brasileira de Educao v. 15 n. 44 maio/ago. 2010 289
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outros passatempos onde o nimo no s se dissipa, mas s
vezes se corrompe. Mas o pior desta vida assim empregada
que se comunica aos filhos, aos irmos e aos maridos.
(Sanches, s.d., p. 190-191)
O Verdadeiro mtodo de estudar como projeto pedaggico de Verney
Lus Antnio Verney (1713-1792) era filho de
pai francs e me portuguesa. Nasceu em Lisboa e
foi aluno do Colgio Jesutico de Santo Anto. Depois
frequentou Artes e Teologia na Universidade de vo-ra. De l, seguiu para a Itlia, onde defendeu tese em
Teologia (Cidade, 1985, p. 143). Defensor da filosofia
moderna, que se assentava na fundamentao cientfica
newtoniana, Verney postula a renovao dos estudos
do reino portugus sob nova base moderna. Para
ele, isso supunha colocar de parte autores consagrados como Aristteles, Galeno ou Hipcrates.
Luis Antnio Verney, iluminista, foi com
D. Lus da Cunha e Antnio Nunes Ribeiro Sanches
referncia terica do pombalismo. Seu principal
texto Verdadeiro mtodo de estudar foi publicado antes na Itlia do que em Portugal, onde logo depois
tambm era impresso. Veio a pblico, pela primeira
vez, em 1746, em Npoles. Era um manual escrito na
forma de cartas que contemplava variados aspectos
da cultura: lgica, gramtica, ortografia, metafsica
etc. (Maxwell, 1996, p. 12). Em suas cartas, Verney,
de alguma maneira, articula por meio da crtica sa-trica formas alternativas de se ensinar. Ele reputa
como fundamental uma reforma que abrangesse, em Portugal, todo gnero de estudos: os menores (escolas
de primeiras letras e colgios secundrios) e os maio-res (universidades).
Para o caso das escolas menores especialmen-te no nvel elementar Verney declara que bastava
examinar o interior das instituies de ensino para verificar que os mestres sobrecarregavam a memria
das crianas com coisas desnecessarssimas (Verney,
s.d., p. 76). O excessivo apelo aos castigos derivaria,
na vida escolar, dessa incapacidade de ensinar as
coisas importantes e da incompetncia para facilitar
o caminho para entend-las (idem, ibidem). Reco-menda Verney que, em vez dos longos perodos em
latim, devia o mestre ensinar ao discpulo compor
bem uma orao portuguesa breve uma carta, um
cumprimento, ou coisa semelhante (idem, p. 78). O estudante faria isso com muito maior facilidade do que realizava suas composies em latim, j que agora o
faz em uma lngua que sabe, na qual o mestre pode cla-ramente mostrar-lhe os erros (idem, ibidem). Verney advertia os contemporneos para o que compreendia
ser a realidade dos colgios; dos quais saam homens
que, alm de no saber latim, no eram sequer capazes de redigir uma carta em portugus (idem, p. 79).
luz dessa preocupao com os temas relativos ao ensino da lngua, Verney critica a ignorncia exis-tente em matria de cincia moderna, bem como o uso de tratados obsoletos sobre questes da fsica, o excessivo apego a um aristotelismo fora de poca, e tambm o inaceitvel recurso ao argumento de autori-dade. Tudo isso paralisaria a razo o que era, ainda,
agravado pela excessiva valorizao do verbalismo no ensino das cincias. Para Verney, em matria de
cincias, no interessa quem disse o que. No interessa
tanto como isso foi dito. O que parecia fundamental
era verificar se a experincia comprova a veracidade
da hiptese. Ao tratar agora do conhecimento das
cincias, o autor encaminha-se para abarcar sua apreciao, no apenas dos estudos dessas matrias, mas dos modos de organizao das chamadas escolas maiores ou universidades.
Verney enfatiza a necessidade de se observar para
saber. Compreender a natureza das coisas seria para
ele observar bem e, para tanto, havia de se possuir
um juzo claro: observar muito, e bem, ou saber-se
servir dos que o fizeram; e fundar os seus raciocnios
em princpios evidentes, quais so os matemticos
(Verney, s.d., p. 176). Sublinha sempre que apenas a
experincia poder conduzir ao conhecimento. Somen-te, pois, luz da observao que se poder discorrer
sobre qualquer coisa. Ns no temos conhecimento
imediato das naturezas; unicamente temos dois meios
para o conseguir: observar as propriedades; e ver se,
Carlota Boto
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mediante alguma resoluo, podemos chegar a co-nhecer os princpios de que se compe esta ou aquela entidade fsica (idem, p. 177). Mais do que isso, no devemos querer que a natureza se componha segundo as nossas ideias; mas devemos acomodar as nossas
ideias aos efeitos que observamos na natureza (idem, ibidem). Finalmente, Verney argumenta que a cincia aristotlica enredada em suas noes de matria,
forma e privao no possui aparato conceitual para
apreender, de fato, as realidades descortinadas pela cincia moderna. Tanto a lgica aristotlica quanto
a razo escolstica eram absolutamente insuficientes
para explicar os fenmenos da natureza.
Assim como fizera o mdico Ribeiro Sanches,6 Verney que no era mdico critica severamente
os modos de se ensinar a medicina. Ambos Ribeiro
Sanches e Verney aconselhavam o adiantamento da
filosofia natural (fsica e cincias naturais) e da clnica.
Propugnavam o abandono da filosofia peripattica e
da Medicina galeno-rabe (Guerra, 1983, p. 283).
Alm disso, os iluministas portugueses destacam o
primado das manifestaes objetivas da doena, basea-
do no conhecimento das cincias exatas e naturais; o
desenvolvimento do ensino e da prtica da anatomia e
da cirurgia (idem, ibidem). Enfim, parecia imperioso substituir como se dizia poca a experincia da
autoridade pela autoridade da experincia.
Verney identificava desdobramentos de uma
ignorncia a outra: o desconhecimento da fsica e da
qumica era fundamento para a ausncia de conhe-cimentos na medicina. A mesma estupidez conduzia
ao desprezo pela anatomia. Desconhecendo-se a
anatomia, erravam-se os diagnsticos e abusava-se de remdios errados. A cirurgia era um saber apenas
prtico, sem qualquer estatura terica, j que esta re-quereria intrinsecamente conhecimento de anatomia.
6 D. Joo V teria consultado Ribeiro Sanches sobre uma pos-
svel reforma dos estudos mdicos (Guerra, 1983, p. 286). Ribeiro
Sanches escreveu ento, em 1761, um texto intitulado Mtodo
para aprender a estudar a Medicina o qual procurei abordar em
O enciclopedismo de Ribeiro Sanches: pedagogia e medicina na
confeco do Estado (Boto, 1998).
Verney (s.d., p. 207) reconhece que o bom prtico ,
de fato, aquele que domina a causa particular dessa
determinada enfermidade para pod-la curar. Porm
o prprio saber prtico por isso mesmo s seria
enriquecido pelo conhecimento da anatomia. O corpo
uma mquina a ser esquadrinhada; e no se cura s
apalpadelas (idem, p. 208). A destreza necessria ao cirurgio vista por
Verney como absolutamente tributria de seu co-nhecimento anatmico, e ele d exemplos de como
o desconhecimento poderia ser funesto na prtica
cirrgica: conheci uma senhora a quem um clrigo
deslocou duas costelas, querendo consertar-lhe uma;
e ficou toda a sua vida com uma deformidade nas cos-tas (Verney, s.d., p. 215). Finalmente, para concluso
desse tpico, o texto assinala que, de todos os perigos, o pior seria o de recorrer quelas pessoas que, dizendo possuir poderes mgicos, arrogam-se para si a virtude
de curar. Era necessrio tornar racional o aprendizado
da medicina e especialmente era urgente introduzir a
matria da anatomia com base no estudo de cadveres
humanos. S assim seria superada a ignorncia relati-vamente ao conhecimento do corpo humano, de suas enfermidades e de suas possibilidades de cura.
Lus Antnio Verney parte de um pressuposto
jusnaturalista para defender sua concepo de tica:
os homens nasceram todos livres, e todos so igual-mente nobres (s.d., p. 194). Os primeiros grupos
sociais j teriam reconhecido a necessidade de se
conferir racionalidade vida em comum, alm de ordem e obedincia. Para isso, era indicado meditar
sobre os costumes. As pessoas dependem umas das
outras. Os mais virtuosos dentre os homens tendem
a se destacar tanto em tempos de guerra quanto em tempos de paz. Sendo assim, costumam ser mais
prestigiados do que os outros. Esse o verdadeiro
princpio da nobreza. Por a, talvez erroneamente,
acreditou-se que as pessoas transmitiam a seus filhos
suas prprias virtudes.
Assim conclui Verney o que confere a nobreza
ao sujeito no o prncipe, mas a educao recebida:
se conduzirem esta criana a um pas incgnito, e for
criado por viles, h-de ser vilo e no prncipe, e em
A dimenso iluminista da reforma pombalina dos estudos: das primeiras letras universidade
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tudo se parecer com quem a criou (s.d., p. 200). A
pedra de toque do carter e da verdadeira estirpe da
alma seria, nesse sentido, a educao recebida; j que
os inteligentes sabem muito bem que o sangue do pai
poder comunicar ao filho alguma enfermidade here-ditria, como gota, escorbuto, glico, epilepsia etc.;
mas de nenhum modo lhe comunica nem vcios nem virtudes (idem, p. 202). Muitas vezes, pelo contrrio, aqueles que so socialmente reputados como nobres frequentemente adquirem hbitos afetados, quando
no pouco civis. Inclusive, muitos, para fingirem
uma nobreza mui elevada, at so descorteses: no
cumprimentam quem os sada; no respondem a quem
lhes escreve; ou, se o fazem, de uma maneira mais
injuriosa que civil (idem, p. 203).Verney aqui tambm como Ribeiro Sanches
um defensor da instruo das mulheres. Sero mes
de famlia; e, portanto, primeiras mestras. Ensinam as
crianas a falar. Dirigem a economia das casas. Tudo
isso, por si, j constituiria motivo para que elas fossem
instrudas na cultura das letras. Alm disso, o estudo
formar seus costumes. Exatamente por no terem
assunto com suas mulheres ignorantes (porque as julgam tolas no trato) que homens casados vo a
outras partes procurar divertimentos pouco inocentes
(Verney, s.d., p. 217). Nesse sentido, instruir as mulhe-res seria uma forma de obteno de paz e de harmonia familiar. Alm disso, cada donzela deveria aprender
a ter o seu livro de contas, em que assente a receita e despesa, porque sem isso no h casa regulada
(idem, p. 223). Muitas vezes as senhoras ficam vivas e os bens so arruinados exatamente porque elas no possuem qualquer noo do modo de conservar e
aumentar as rendas de suas fazendas (idem, ibidem). Por tudo isso, os trabalhos manuais e especialmente as prendas de salo7 seriam menos importantes do que
7 Como diz Rmulo de Carvalho (1986, p. 417), aqui o pro-
gressivismo de Verney no foi suficiente para vencer os preconceitos
de classe. Ao dizer quando avalia a futilidade do apren dizado das prendas de salo que nas senhoras grandes no to condenvel aplicar-se a estes divertimentos inocentes, se o fazem com o fim
de no ficarem ociosas (Verney, s.d., p. 227), Verney distingue as
os conhecimentos rudimentares da leitura, da escrita e do clculo. Desse modo, Verney prope que o ensino
feminino seja, tanto quanto possvel, o mesmo que se
deveria aplicar aos rapazes:
O primeiro estudo das mes deve ensinar-lhes por si ou,
tendo possibilidade, por meio de outra pessoa capaz os
primeiros elementos da f etc., explicando-lhes bem todas
estas coisas, o que podem fazer desde a idade de cinco anos
at os sete. Depois, ler e escrever portugus corretamente.
Isto o que rara mulher sabe fazer em Portugal. No digo
eu escrever corretamente, pois ainda no achei alguma que
o fizesse; mas digo que pouqussimas sabem ler e escrever; e
muito menos fazer ambas as coisas corretamente. Ortografia
e pontuao, nenhuma as conhece. As cartas das mulheres
so escritas pelo estilo das bulas, sem vrgulas nem pontos; e
algumas que os pem, pela maior parte, fora do seu lugar.
Este um grande defeito, porque daqui nasce o no saber
ler e, por consequncia, o no entender as coisas. (Verney,
s.d., p. 218)
Enfim, cobrindo praticamente todos os campos
da instruo, o trabalho de Verney possibilitava uma
avaliao panormica da situao do ensino portugus;
por cuja leitura em larga medida Pombal se pau-taria para levar a efeito as suas reformas educativas
(Marques, 1984, p. 325).
A escola pblica traada peloMarqus de Pombal
Quando sobe ao trono D. Jos I, em 1750, Se-bastio Jos de Carvalho e Melo toma posse como
ministro da Secretaria do Exterior e da Guerra. Ele
trazia consigo a experincia diplomtica e o que ob-servara no exterior. Convivera durante anos com uma
comunidade de expatriados portugueses (Maxwell,
1996, p. 10); os quais, na grande maioria das vezes,
pessoas nobres das outras. Essa contradio tpica dos autores
iluministas; e o Iluminismo portugus no fugiria regra.
Carlota Boto
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tinham deixado o pas por se sentirem perseguidos ou tolhidos pela ao inquisitorial. Mas havia outro
aspecto tambm fundamental: as preocupaes
de Pombal tambm refletiam as de uma gerao de
funcionrios pblicos e diplomatas portugueses que
haviam meditado muito sobre a organizao imperial e as tcnicas mercantilistas (idem, ibidem). O padro econmico mercantilista e no ainda a economia de
mercado era compreendido pelos contemporneos
como o grande responsvel pelo vigor poltico e pela
riqueza econmica dos pases centrais da Europa.
Laerte Ramos de Carvalho (1978) consagrou
no Brasil a ideia de que teria havido ao menos duas reformas pombalinas da instruo pblica, posto que vincula o ano de 1759 reforma dos estudos menores e o ano de 1772 reforma dos estudos maiores (ou da Universidade). Mas, luz da interpretao de Antnio
Nvoa (1987), Ruth M. Chitt Gauer (2001, 2004) e Tereza Fachada Levy Cardoso (2002), seria mais
adequado compreendermos a existncia de dois (ou mais) momentos de uma mesma reforma dos estudos;
at porque as medidas implementadas relativamente aos estudos menores continuaram a ser elaboradas at a dcada de 1770 e, do mesmo modo, algumas dire-trizes relativas aos estudos maiores so anteriores.
Pode-se dizer que a reforma dos estudos gestada e executada por Pombal, em suas diferentes etapas, re-volucionou a estrutura do ensino portugus. Fechou os
colgios da Companhia de Jesus. Expulsou os jesutas
do Reino e de seus domnios sob pretexto de que eles
teriam participado de alguma maneira de um suposto atentado contra o rei. Confiscou seus bens. Muitos
membros da Companhia foram deportados.
Por Alvar de 28 de junho de 1759, o futuro
Marqus de Pombal reestruturou os chamados estudos menores. Criou-se, a partir dali, a acepo de aulas
rgias, compreendendo tanto as classes de primeiras letras quanto as classes de humanidades daquilo
que, posteriormente, se caracterizar como ensino
secundrio. Assinala Tereza Fachada Levy Cardoso
(2004) que a palavra rgio tem um carter ambguo,
porque, ao mesmo tempo em que remete figura do
monarca, reiterando uma tradio absolutista, que persiste perodo afora, representa tambm o avano que o termo traz, pela contraposio tradio de ensino por parte da Igreja (p. 182). Eram, em sua
grande maioria, classes de primeiras letras, incluindo o ensino da leitura, da escrita, da aritmtica, do cate-cismo e dos preceitos da civilidade; mas havia tambm classes de latim, grego, hebreu e retrica (Marques, 1984, p. 337). Em todas elas, era proibido aos mestres
e professores valerem-se dos livros e materiais de ensino utilizados pelos jesutas.8
O Alvar de 28 de junho de 1759 parte da
constatao de que existiria uma decadncia em todos os campos dos estudos do Reino. Tal decadncia era
atribuda ao escuro e fastidioso mtodo (in Almeida, 2000, p. 32) que os padres jesutas introduziram nos colgios sob sua responsabilidade. O projeto
da Reforma era, ento, o de reaver o que Pombal denomina mtodo antigo: reduzido aos termos
smplices, claros e de maior facilidade que se pratica atualmente nas naes mais polidas da Europa
(idem, ibidem). Haveria, pelo plano pombalino, um diretor dos estudos responsvel por fazer observar
tudo o que se contm neste alvar e sendo-lhe todos
os professores subordinados (idem, ibidem). Esse
8 Thas Nvia de Lima e Fonseca (2006, p. 3709) sublinha
que, para o caso da Capitania de Minas Gerais, at que fossem im-
plantadas as reformas na educao durante a administrao do
Marqus de Pombal, no governo de Dom Jos I, foi pouco visvel
a institucionalizao da instruo elementar, na Capitania, j que
no houve aqui a presena dos estabelecimentos educacionais
jesutas ou de qualquer ordem religiosa. Mesmo considerando as
determinaes constantes nas Ordenaes do Reino, as aes no
sentido de promover o ensino das primeiras letras ou o ensino se-
cundrio estavam, em geral, restritas aos particulares. A partir das
reformas pombalinas e principalmente depois da criao das aulas
rgias, tornaram-se mais freqentes as referncias a esse tipo de
educao na documentao administrativa. Foram recorrentes os
ofcios enviados pelas Cmaras das vilas mineiras ao rei, solicitando
a instalao de aulas, associando a necessidade da educao como
instrumento de civilizao, o que significa reforar a formao
moral, cvica e religiosa da populao.
A dimenso iluminista da reforma pombalina dos estudos: das primeiras letras universidade
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diretor dos estudos, auxiliado por comissrios9 que inspecionariam as escolas, deveria verificar o que
faziam os professores, o que deixavam de fazer, alm de adverti-los e corrigi-los (idem, ibidem), quando isso se fizesse necessrio. Eram su bordinados do
diretor dos estudos todos os professores das escolas menores (Gomes, 1984, p. 9). Por isso, caberia a ele
controlar os progressos dos alunos.
O projeto previa tambm que o diretor deveria ter
todo o cuidado em extirpar as controvrsias e de fazer
com que haja entre eles (professores) uma perfeita paz
e uma constante uniformidade de doutrina, de sorte que todos conspirem para o progresso de sua profisso
e aproveitamento de seus discpulos (Alvar, 2000, p. 32). No deixa de ser revelador o fato de o Alvar
de 1759 se referir ao ofcio do magistrio como profis-so (Mendona, 2005). O Alvar de Pombal indicava
tambm as matrias que deveriam constituir as aulas rgias; e, alm disso, prescrevia quando e onde elas
deveriam ser abertas. Chegava a recomendar livros
para uso das escolas, de modo que fossem escolhidos compndios alternativos queles utilizados pelos colgios jesuticos. As aulas rgias seriam abertas a
todos, sem distines de classe.
Quanto reforma dos estudos maiores ou univer-sitrios j destacava Rogrio Fernandes (1992) , ela
teria sido deflagrada quando a Junta da Providncia
Literria, a que presidiam o Cardeal da Cunha e o
prprio Marqus de Pombal, elaborou em 1771 o Compndio Histrico do Estado da Universidade de Coimbra (Compndio, 1972, p. 88). O referido documento oferece um preciso diagnstico do que teriam sido os estragos realizados pela Companhia
de Jesus nos estudos portugueses; especialmente nos
estudos universitrios.
9 Como consta da obra de Laerte Ramos de Carvalho (1978, p. 116),
os Comissrios eram designados, nos diferentes lugares do Reino e de
seus domnios, para fazer o levantamento do nmero de professores
existentes, tirando informao sobre sua vida e cos tumes, a fim de levar
ao conhecimento do diretor geral dos estudos ampla notcia do estado em
que se achavam as escolas em cada localidade.
A crtica severa do Compendio Historico do Estado da Universidade de Coimbra Companhia de Jesus vem expressa na prpria continuidade do texto
que d ttulo ao documento: no tempo da invaso
dos denominados jesutas e dos estragos feitos nas
sciencias e nos professores e directores que a regiam pelas maquinaes, e publicaes dos novos estatutos por elles fabricados (Compndio, 1972). Suprimir os vestgios da Companhia de Jesus significava, poca,
substitu-la altura. Em primeiro lugar, desconstruir o
suposto atraso; em seguida, formular uma alternativa.
Quando foi feita a reforma da universidade, aos no-vos professores catedrticos de Coimbra e vora foi
concedido o uso de residncias dos jesutas expulsos
(Maxwell, 1996, p. 205).
Ainda a propsito da estrutura do currculo, uma das censuras explicitadas no Compndio pombalino dizia respeito ao fato de as escolas maiores bem
como todos os colgios controlados pelos jesutas
limitarem o estudo da moral ao conhecimento da moral aristotlica. A tica de Aristteles era, segundo consta do Compndio, adotada como obra para se ler nas escolas da Universidade de Coimbra; para se difundir
nas Aulas de todos esses Reinos; e para constiturem
nela o venenoso charco, donde saram as mortferas inundaes (Compndio, 1972, p. 204). O argumento aqui cristo. A obra do filsofo grego do sculo IV
a.C. considerada mpia, ateia, prejudicial e indigna,
por no ser regida pelos preceitos do cristianismo.
Curiosamente, a denncia do Compndio repudia os estatutos jesuticos vigentes na Universidade de
Coimbra em virtude de uma defesa religiosa: a moral
crist. A est uma das tantas contradies do discurso
iluminado do sculo XVIII.
O Compndio tambm severo ao denunciar o atraso dos mtodos com que se ensinava em Coimbra.
No caso dos cursos jurdicos, por exemplo, as aulas eram sempre uniformemente organizadas luz do que o documento chama de mtodo analtico (Compn-dio, 1972, p. 262). O mtodo analtico corresponderia a aulas centradas em comentrios de textos considerados
clssicos. Muitas vezes os professores ficavam presos
a questinculas, fazendo longas digresses sobre
Carlota Boto
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uma s lei ou captulo (idem, ibidem); mas que era tido como aquele que contemplaria a questo central e prpria do texto. Essas lies analticas (idem, ibidem) eram explicaes dadas sempre do mesmo modo, todos os anos, invariavelmente pelo mesmo professor, fazendo com que, no transcurso de sua vida universitria, o estudante travasse contato com
pouqussimos textos e doutrinas; e ainda elas sem a
conexo e deduo, que mais que tudo concorrem para elas bem se perceberem, e se imprimirem melhor na memria (idem, ibidem).
Lia-se pouco; ouvia-se e copiava-se muito. Os
lentes da universidade expunham, amide, somente
algumas leis e captulos avulsos, cujas concluses
prin cipais e doutrinas a elas pertencentes, e que nos mesmos textos se tratam, no podem bastar para a necessria instruo dos ouvintes (Compndio, 1972, p. 262-263). Por causa disso, os estudantes enfadavam-
se das aulas, muitas vezes deixavam a universidade sem terem chegado a aprender, e nem ainda a ouvir
as principais Regras e Primeiros Princpios de todas as matrias do Direito (idem, p. 263) como usualmente acontecia. Alm disso, os comentrios dos professores
tornavam-se postilas, que para as mesmas lies se
ditavam (idem, ibidem). E os alunos no estudavam pelos textos, mas pelas postilas. Tudo isso era feito sem
qualquer domnio do que o Compndio qualifica por impreterveis subsdios da interpretao genuna dos
Textos (idem, ibidem). Nada disso seria to descabi-do complementa o documento caso esse referido
mtodo analtico fosse seguido do estudo sinttico
dos princpios e da doutrina do direito. Os estudantes
precisariam aprender no apenas a interpretar corre-tamente as leis e os cnones, mas, se fossem mais
textuais, seriam mais hbeis para entenderem bem
os textos; saberiam deduzir deles as suas verdadeiras
concluses (idem, p. 264). No estudo da medicina, a situao no era melhor.
A ineficcia dos estudos preparatrios do curso de
medicina tambm era um tpico bastante destacado no Compndio pombalino. Formava-se em medicina sem ser preparado para a prtica mdica; sem sequer
haver aprendido anatomia; sem que o sujeito houvesse
assistido a cirurgias. Enfim, a formao dos mdicos
era completamente alheia prtica do ofcio mdico.
No se ocupava de observar o que mdicos faziam com pessoas que adoeciam. Com a reforma do curso
de medicina, Pombal dava concretude s sugestes que lhe haviam sido feitas por parte da gerao de estrangeirados com quem conviveu. O ponto de par-tida da reforma do curso de medicina era o seguinte:
a autoridade, comparada com a experincia e com a
demonstrao racional, de nada vale (Guerra, 1983,
p. 293). O substrato da reforma ser, portanto, o de
considerar as grandes descobertas que modificavam
o olhar da compreenso biolgica como, por exem-plo, a descoberta de Harvey de que o sangue circula no corpo.
Na descrio feita das aulas ministradas para o curso de medicina, o Compndio reitera aquele bi-nmio tpico, das lies e das disputas; estas ltimas
transformando-se, muitas vezes, em brigas ruidosas
especialmente em ocasio de exames. A descrio fala
por si mesma:
A Aula da Medicina oferecia, ento, um espetculo notvel,
ao qual concorriam os Estudantes das mais Faculdades para
se divertirem. Enfurecia-se o Presidente; gritavam os Ar-
guentes; acendia-se o Defendente; todos queriam ter razo;
e, como estavam dela distantes, nenhum sossegava, todos
clamavam; e s vencia quem era mais destro e sutil em lanar
palavras picantes. O Defendente saa com tudo aprovado,
podia ser promovido honra dos Graus Acadmicos, e de-
pois ir exercitar livremente a Medicina em prejuzo comum
de todo este Reino. (Compndio, 1972, p. 340)
Uma das principais dificuldades assinaladas pelo
Compndio referia-se ausncia de uma ordem certa no ensino das matrias (Compndio, 1972, p. 330). Assim, alguns aprendiam os Aforismos de Hipcrates
no terceiro ano; e outros no quinto, conforme as ma-trias que o Lente ensinava quando eles principiavam
seus estudos (idem, ibidem). Depois que deixavam a faculdade, a prtica dos
que se haviam formado em medicina pela Universi-dade de Coimbra era simplesmente a de purgar,
san grar, etc.; sem saber as ocasies oportunas em que
A dimenso iluminista da reforma pombalina dos estudos: das primeiras letras universidade
Revista Brasileira de Educao v. 15 n. 44 maio/ago. 2010 295
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deviam aplicar esses remdios (idem, p. 342). Por no se terem habituado observao mdica, no eram capazes de conhecer as enfermidades; e, pela mesma
razo, no sabiam prescrever remdios. Enfim, no
sabiam curar. Por isso, toda gente achava que poderia
fazer as vezes de mdico.
Tal era o estudo pblico da Medicina e tais os mdicos que
dele saam. E que diremos da inumervel cpia de Cirur-
gies, de Boticrios, de Barbeiros, de Charlates, de Se-
gredistas, de Mezinheiros, de Impostores e at de mulheres
Curadeiras, que, pelas Cidades, pelas Vilas, pelos Lugares
e Campos se metiam a praticar a Medicina; e conseguiam
a fortuna de serem atendidos e chamados at que a triste
experincia de muitas mortes, de que eram rus, os fizesse
ser desprezados? Teramos aqui um largussimo campo para
discorrer, e fazer ver quanto essa praga infeccionou o Estado.
(Compndio, 1972, p. 342-343)
O Compndio assinala com veemncia a ne-cessidade de se introduzir a prtica de dissecao de
cadveres humanos no curso de medicina da univer-sidade. S isso permitir que os discpulos aprendam
a conhecer a estrutura, a configurao, a conexo de
qualquer parte do corpo humano com outras partes
(Compndio, 1972, p. 326). Enfim, recuperar o atraso portugus era interagir
com a transformao do estado das coisas em reas con-
sideradas estratgicas. Assim eram a educao (tanto os
estudos menores quanto os maiores), a justia e a medi-cina. Da o privilgio dado pelo Compndio tanto for-mao jurdica quanto ao ensino da medicina. Reformar
os estudos universitrios bem como reformar a instru-o de primeiras letras e secundria era o passaporte
para a Reforma do Estado; um Estado que se pretendia
includo em seu tempo competitivo e potente.
Consideraes finais: 250 anos depois; o legado dessa escola rastreada
Um pas como os outros, a contas nunca certas
com o tempo (Loureno, 1999, p. 109). Poderamos
emprestar a bela frase de Eduardo Loureno para nos
referirmos a esse Portugal do final do sculo XVIII.
Diz Maxwell (1996, p. 104) que foram trs os ob-jetivos principais da ao pombalina em matria de
ensino: trazer a educao para o controle do Estado,
secularizar a educao e padronizar o currculo. De
fato, temos aqui uma sntese do que fizera o Marqus.
Mas havia nisso uma preocupao com a demarcao das fronteiras. Nesse sentido, a expulso dos jesutas
tambm era uma necessidade imperiosa do Estado portugus. Por causa da ao jesutica, os indgenas
brasileiros resistiam a submeter-se autoridade por-tuguesa, que eles viam como inimiga (idem, p. 54). Pombal desejava a miscigenao para estabelecer o
povoamento brasileiro, sem que, para tanto, ocorresse uma grande emigrao dos portugueses. Era preciso,
por todas as razes, retirar os jesutas do controle das
terras e das naes indgenas. Era necessrio traar
a fronteira brasileira. O Estado necessitava disso. A
coeso do Brasil significava naquele momento a fora
de Portugal.
Os orculos do Marqus de Pombal como j
foram chamados os autores aqui estudados (Guerra,
1983, p. 287) haviam alertado os contemporneos
sobre a fragilidade histrica do Estado portugus; so-bre a necessidade de se estabelecer um plano mediante o qual o controle dos assuntos da instruo passasse de mos religiosas para a tutela do Estado; sobre a
urgncia de, nesse mesmo sentido, reformarem-se os cursos universitrios, que preparariam os funcionrios
do Reino. Tratava-se de pensar em um novo modo de
gerir a justia; tratava-se de fazer com que as pessoas
vivessem mais e, vivendo mais, pudessem se tornar
hbeis para aprender coisas teis. Tratava-se, sobretu-do, de formar no territrio e nas colnias um modo de
ser Portugal que fosse mais avanado, mais racional, mais moderno (Gauer, 1996, 2001).
Finalmente, preciso compreender que Iluminis-mo no houve um s: foram vrios. H o Iluminismo
da racionalidade e do progresso; mas h aquele que
acentua a decadncia nacional; aquele temeroso do
atraso... O Iluminismo portugus racionalizador,
centralizador, secularizador no era laico; e no era
demasiadamente adepto da extenso das liberdades
Carlota Boto
296 Revista Brasileira de Educao v. 15 n. 44 maio/ago. 2010
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individuais (Maxwell, 1996, p. 170). Mesmo assim,
a ao do Estado pombalino, em consonncia com o
pensamento iluminista portugus, foi alm e trouxe medidas que no apenas favoreceram a laicidade
ao reforar o poder do Estado na ao poltica e no controle pblico como promoveram tambm uma
via emancipatria que ficaria clara no liberalismo
portugus do sculo XIX e nas lutas por libertao nacional que aconteciam no Brasil daqueles tempos. O
Iluminismo constitudo de luzes e sombras (Pallares-Burke, 2001, p. 53-54). Mas em Portugal como
tambm aconteceria depois na Frana a ao poltica
radicalizou o pensamento iluminista que a precedeu.
Como ressaltou Jos Vicente Serro (1989, p. 12),
o pombalismo chega a ser maior do que o prprio Pombal. Tratava-se, no limite, de um projeto de gesto;
empreendido, portanto, por um conjunto de homens
e de entidades institucionais, unidos numa espcie de rede de solidariedades polticas e pessoais, que tinha por centro a figura do Marqus de Pombal. Para
o autor, o pombalismo significou a construo do
moderno Estado portugus com uma clara vertente
intervencionista; tida como imprescindvel em decor-rncia da debilitao sofrida por Portugal nos anos que antecederam o reinado de D. Jos, e que haviam
presenciado a desorganizao dos servios adminis-trativos, o aumento da corrupo, a proliferao de faces intestinas, uma grande indefinio de com-petncias (idem, p. 13). O pombalismo luz das ideias iluministas que lhe precederam dignificou, em
contrapartida, o estatuto de funcionrios pblicos
como parte integrante duma entidade institucional
ampla: o Estado (idem, p. 16). Para concluir, creio que preciso tomar cuidado
com um aspecto. Pombal criou para si uma posteridade
antecipada. Foi capaz de produzir representaes, de
fomentar uma autoimagem que indicasse ao futuro os significados desejados de sua biografia e muito
especialmente de sua dimenso poltica. Porm, como
recorda Falcon (1982, p. 361), preciso que se tenha
clareza de que nem sempre coincidem as prticas de
uma poltica ilustrada e as representaes que tinham sobre elas os prprios protagonistas:
A imagem que o ministro faz de si mesmo e do seu governo,
a conscincia que revela do poder real e dos deveres e atri-
buies dos ministros e secretrios de Estado, seu universo
mental, em suma, no tm nada em comum com a filosofia
do despotismo ilustrado.
Pombal foi moderno, at onde era possvel a Portugal daquele tempo ser. Foi a conscincia-possvel (Goldman, 1972) de uma gerao de estrangeirados.
Foi iluminista; mas foi, acima de tudo, homem de ao.
Pelo discurso, mas especialmente pelos atos, ele, de fato pode-se dizer , enterrou os mortos e cuidou
dos vivos. No se compreender a lgica do ensino
pblico brasileiro sem que essa histria seja muito bem
rastreada uma histria de 250 anos atrs...
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na agenda pblica. E-mail: [email protected]
Recebido em julho de 2009
Aprovado em novembro de 2009
A dimenso iluminista da reforma pombalina dos estudos: das primeiras letras universidade
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Isabel Cristina Alves da Silva Frade
Uma genealogia dos impressos para o ensino da escrita no Brasil no sculo XIX O objetivo deste artigo caracterizar
e compreender diferentes modelos e formatos de livros escolares ou de outros impressos para ensinar os princpios da escrita, utilizados na Provncia de Minas Gerais e no Brasil a
partir do incio do sculo XIX. Anterior
a uma produo escolar mais autoral de livros para ensinar a ler, encontramos menes sobre o uso de abecedrios,
cartas do ABC e silabrios. Na ausncia
de materiais conservados, buscaram-se indcios de como eles se apresentavam e eram utilizados em fontes primrias
(correspondncias, relatrios, mapas de desempenho) produzidas na Provncia de Minas Gerais, desde 1823. Com
essas fontes, problematizamos o uso de tabelas, tbuas e cartas. Outro conjunto
de fontes analisado constitudo por quatro livros brasileiros e um livro traduzido para o portugus, cujos
ttulos continham as denominaes silabrio, abecedrio e cartas de ABC.
A investigao baseia-se no s nos campos da histria da leitura e do livro (Roger Chartier), que abordam as
formas dos textos, dos impressos e de seus usos, mas tambm nos estudos da histria da alfabetizao e da educao, no mesmo perodo. Para uma anlise
comparativa, fontes secundrias
francesas ajudam a compreender a
forma e os usos de tabelas, abecedrios
e silabrios.
palavras-chave: impressos, tbuas, tabelas, cartas de ABC, silabrios,
abecedrios, histria da alfabetizao,
cultura escrita, escolarizao da escrita.
A genealogy of printed material for teaching writing in Brazil in the nineteenth centuryThe aim of this article is to characterize and understand the different models and formats of textbooks or other printed material for teaching the basics
of writing, used in the Province of Minas Gerais and in Brazil, from the early nineteenth century. Before the production of more authorial books to teach reading at school, we find
mention of the use of literacy primers, ABC letters and first reading books.
In the absence of well preserved materials, we searched for evidence of how they were presented and used, in primary sources (correspondence, reports, performance charts) produced in the Province of Minas Gerais since 1823. With these sources the use of tables, boards and letters was problematised. Another set of sources examined is composed of four Brazilian textbooks and a book translated into Portuguese, whose titles contained such denominations as first reading book,
literacy primers and ABC letters. The research is based not only on studies related to the history of books and reading (Roger Chartier), which deal with the types of text, printed matter and their uses but also to studies on the history of literacy education in the same period. For a comparative analysis, French secon dary sources help to understand the form and uses of tables, literacy primers and first
reading books.Key words: printed material, boards, tables, ABC letters, first reading books,
literacy primers, history of literacy, written culture, school taught writing
Una genealoga de los impresos para la enseanza de la escrita en Brasil en el siglo XIX El objetivo de este artculo es ca-racterizar y comprender diferentes mo delos y formas de libros escolares o de otros impresos para ensear los principios de la escritura, utilizados en la Provincia de Minas Gerais y en Brasil a partir del inicio del siglo XIX. Anterior a una produccin es co lar ms autoral de libros para ensear a leer, encontramos menciones sobre el uso de abecedarios, cartas de ABC y silabarios. En la falta de materiales conservados, se buscaron indicios de cmo ellos se presentaban
y eran utilizados, en fuentes primarias (correspondencias, velatorios, mapas de desempeo) producidas en la Provincia de Minas Gerais, desde 1823. Con estas fuentes, se problematiza el uso de tablas y cartas. Otro conjunto de fuentes analizado es constituido por cuatro libros brasileos y un libro traducido para el portugus, cuyos ttulos contenan las denominaciones silabario, abecedario y cartas de ABC. La investigacin se fundamenta no slo en los campos de la historia de la lectura y del libro (Roger Chartier), que abordan las formas de los textos, de los impresos y de sus usos, como tambin en los estudios de la historia de la alfabetizacin y de la educacin, en el mismo perodo. Para un anlisis comparativo, fuentes secundarias fran-cesas ayudan a comprender la forma y los usos de tablas, abecedarios y sila-barios.Palabras clave: impresos, tablas, cartas de ABC, silabarios, abecedarios, historia de la alfabetizacin, cultura escrita, escolarizacin de la escritura.
Carlota Boto
A dimenso iluminista da reforma pombalina dos estudos: das primeiras letras universidade O presente artigo tem por propsito discutir o tema da educao luz da interseco entre os ideais polticos e pedaggicos de trs pensadores iluministas portugueses Dom Lus da Cunha, Antnio Nunes Ribeiro Sanches
e Luiz Antnio Verney e a reforma
dos estudos empreendida pelo Marqus de Pombal. A ao de Pombal como
ministro do reino portugus foi, em certa medida, embasada por reflexes
tericas acerca de Portugal e da crise do imprio portugus. Essas reflexes,
entre outros aspectos, destacavam ser uma necessidade histrica para o desenvolvimento do pas o Estado portugus tomar para si o controle das questes do ensino em todos os seus nveis. Ao expulsar os jesutas, ao
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Resumos/Abstracts/Resumens
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idealizar o modelo das aulas-rgias, mas, sobretudo, ao reformar os estudos da Universidade de Coimbra, a prtica
da ao pombalina indicava sua filiao
terica ao movimento iluminista portugus.
palavras-chave: instruo pblica; Portugal; histria da educao;
Marqus de Pombal; Iluminismo.
The illuminist dimension of the pombaline reform of studies: from literacy to the universityThe objective of this article is to discuss the theme of education in the light of the intersection between the political and pedagogic ideals of three Portuguese Enlightenment thinkers Dom Luis da Cunha, Antonio Nunes Ribeiro Sanches and Luiz Antonio Verney and the educational reform carried out by the Marquis of Pombal. The action of Pombal as minister of the Portuguese kingdom was to some degree based on theoretical reflections on Portugal and the crisis
of the Portuguese empire. Such reflections, among other aspects,
emphasized that, for the country to develop, the Portuguese government was historically bound to take control of teaching issues at all levels. By expelling the Jesuits, idealizing the model of the regal-classes, but, above all, by reforming the studies of the University of Coimbra, the practice of Pombals action indicated its theoretical affiliation with the
Portuguese Enlightenment movement. Key words: public education; Portugal, history of education; Marquis of Pombal; Enlightenment
La dimensin iluminista de la reforma pombalina de los estudios: de las primeras letras a la universidad Este artculo tiene como propsito discutir el tema de la educacin a la luz de la interseccin entre los ideales polticos y pedaggicos de tres pensadores iluministas portugueses Don Luis da Cunha, Antnio Nunes
Ribeiro Sanches y Luiz Antnio Verney y la reforma de los estudios emprendida por el Marqus de Pombal. La accin de Pombal como ministro del reino de Portugal fue, en cierta medida, sustentada por reflexiones tericas
acerca de Portugal y de la crisis del imperio portugus. Tales reflexiones,
entre otros aspectos, destacaban que era una necesidad histrica para el desarrollo del pas, el Estado portugus tom para s el control de las cuestiones de la enseanza en todos sus niveles. Al expulsar los jesuitas, al idealizar el modelo da las clases regias, mas, sobretodo, al reformar los estudios de la Universidad de Coimbra, la prctica de la accin pombalina indicaba su filiacin terica
al movimiento iluminista portugus.Palabras clave: instruccin pblica; Portugal; historia de la educacin; Marqus de Pombal; Iluminismo
Danilo R. Streck
Entre emancipao e regulao: (des)encontros entre educao popular e movimentos sociais O artigo analisa a dupla face da educao popular na sua relao com os movimentos sociais na Amrica Latina, como subsidiria e promotora
destes. Por um lado, pode-se dizer
que a educao popular a expresso pedaggica dos movimentos e como tal aliada na conquista de direitos polticos e civis. Ao mesmo tempo,
enquanto processo pedaggico, ela tambm uma instncia formadora e
orientadora da sociedade e dos prprios movimentos sociais. Analisam-se as
mudanas nas relaes entre a educao popular e os movimentos sociais especialmente a partir da dcada de 1990, quando entram em cena novas forma de regulao e controle. So
destacados dois temas neste estudo: os
territrios de resistncia e as respectivas pedagogias, e a questo da nova governabilidade e as implicaes para a educao popular.
palavras-chave: educao popular; movimentos sociais; Paulo Freire;
Amrica Latina
Between emancipation and regulation: (mis)matches between popular education and social movementsThe article analyzes the double face of popular education in its relation with social movements in Latin America, functioning both as subsidiary and as their promoter. In this sense, one can say that popular education is the pedagogical expression of social movements and, as such, is an ally in the struggle for political and civil rights. At the same time, popular education, as a pedagogical process, fulfils a formative and directive role
within society and for the very social movements. In this article, emphasis is placed on analysis of the ch