tema 1 - o que é Ética

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  • 5/26/2018 Tema 1 - O Que tica

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    tica Empresarial

    O que tica?

    Prof. Me. Laerci Jansen Rodrigues

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    tica Empresarial | O que tica?2

    Ol! Sejam bem-vindos!

    Antes de iniciar a nossa aula, assista ao vdeo a seguir para conhecer os

    temas que sero abordados.

    Introduo

    Nesta primeira aula, pensaremos sobre a importante e cada vez mais

    necessria questo da tica, relacionando os conceitos ticos ao mundo

    empresarial. Conheceremos o que significa esse termo e como as concepes

    ticas podem nortear o mundo dos negcios.

    Alm disso, aprenderemos a construir uma nova tica empresarial,

    baseada no respeito mtuo entre indivduo e instituio.

    Bom incio de curso a todos!

    O Que tica?

    Certa vez, foi perguntado ao ndio mais velho de uma tribo:

    - Quem o responsvel pelos impulsos bons e maus que nos invadem aalma?

    O ndio refletiu por um instante e respondeu da seguinte forma:

    - Dentro de ns, existem dois lobos: um deles cruel e mau, o outro

    pacfico e muito bom. Os dois esto sempre medindo foras.

    Ento lhe foi perguntado:

    - Qual dos lobos o mais forte?

    O ndio respondeu:- Aquele que voc alimentar.

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    tica Empresarial | O que tica? 3

    Essa parbola ilustra bem uma das condies existenciais dos seres

    humanos, sempre tensionados em suas escolhas entre o bem e o mal, o certo

    e o errado, o justo e o injusto. Por isso, devemos nos questionar:

    Sobre quais parmetros baseamos nossas decises? Que referncias

    temos do bem e do mal? Bem e mal so categorias objetivas ou

    subjetivas? O que nos motiva na escolha entre um e outro? Somos

    verdadeiramente livres para fazer escolhas? O que liberdade?

    Essas e outras questes so estudadas e debatidas quando nos

    debruamos para pensar a respeito da tica. Enquanto disciplina, a tica sedebrua sobre um elemento: a conduta humana. Assim, encontramos a

    seguinte definio de Vasquez (2011):

    Outro autor faz uma definio similar e a descreve da seguinte maneira:

    Etimologicamente, a palavra tica deriva do termo grego ethos, que

    designa o modo de ser, o carter ou a morada humana. Ao considerar essa

    concepo, Leonardo Boff tece o seguinte comentrio:

    Ethos tica, em gregodesigna a morada humana. O ser humano separa umaparte do mundo para, moldando-a ao seu jeito, construir um abrigo protetor epermanente. [...] tico significa, portanto, tudo aquilo que ajuda a tornar melhor oambiente para que seja uma moradia saudvel: materialmente sustentvel,psicologicamente integrada e espiritualmente fecunda. (BOFF, 2001, p. 26).

    A partir disso, podemos procurar entender mais aproximadamente esse

    modo de ser e esse carter, compreendendo a maneira como se

    estabelecem os juzos humanos sobre a realidade e, ento, fundamentar os

    critrios sobre os quais estabelecemos os princpios da tica.

    A tica a teoria ou cincia do comportamento moral dos homens em

    sociedade. Ou seja, cincia de uma forma especfica de comportamento

    humano. (VASQUEZ, 2011, p. 20)

    tica a reflexo sobre a ao humana,para extrair dela o conjunto

    excelente de aes.(PONCHIROLLI, 2011, p. 12).

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    Juzos de Fato e de ValorUma das principais caractersticas da conscincia humana a

    capacidade de formular juzos sobre todos os fenmenos que a alcana. A

    princpio, podemos distinguir tais juzos em duas formas ou modalidades:

    Na Filosofia, a parte que estuda os juzos de fato chamada de

    Gnosiologia ou Teoria do Conhecimento , e a parte que estuda os juzosde valor chamada de Axiologia, que tem como um de seus ramos a tica.

    Antes de continuarmos, assista ao vdeo a seguir para elucidar alguns

    elementos vistos at aqui.

    Veja mais sobre a tica e as questes fundamentais abordadas nesta disciplina,

    lendo o captulo 1 do livro O que tica, disponvel em:

    JuzosdefatoSo as

    apreenses de nossa conscincia

    que nos do constataesobjetivas, fsicas e imediatas de

    um fenmeno. Por exemplo: est

    chovendo, a cortina azul, o rio

    est cheio.

    JuzosdevalorSo

    atribuies qualitativas com as

    quais determinamos aconvenincia do fenmeno em

    relao ao que julgamos ser bom

    ou mal, justo ou injusto, certo ou

    errado, verdadeiro ou mentiroso.

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    Princpios da tica

    Para que determinada conduta possa permitir o julgamento tico, necessrio levar em considerao trs princpios bsicos:

    1. Conscincia

    2. Liberdade

    3. Responsabilidade do sujeito da ao

    Moralmente falando, no se pode imputar qualquer responsabilidade

    sobre uma pessoa que no tenha, em sua ao, a conscincia dos fins a serem

    alcanados e a liberdade de escolha diante das opes que a realidade lhe

    dispe. Assim sendo, uma criana que se machuca por estar brincando com

    um objeto cortante no pode ser responsabilizada pelas consequncias, por

    no ter conscincia do risco e, consequentemente, no ter liberdade para

    escolher entre o bem e o mal.

    Quando a conscincia do sujeito limitada por circunstnciasinsuperveis ou quando algum sofre algum tipo de coero, seja externa ou

    interna (provocada por alguma patologia ou hipnose, por exemplo), no se

    pode aplicar um juzo de valor, responsabilizando-o com o mesmo rigor que se

    faria a algum plenamente consciente e livre pelos seus atos.

    Assim, o juzo tico pressupe que o indivduo tenha conscincia de si

    mesmo, do seu lugar e do papel que ocupa no mundo, dos outros e das coisas

    que o rodeiam, estando apto para discernir sobre a melhor forma de atuar

    sobre esses elementos. A conscincia moral (...) conscincia do fim

    desejado, dos meios adequados para realiz-lo e do resultado possvel,

    segundo Vasquez (2011), para, ento, finalmente decidir sobre como e por que

    realizar determinada ao. A conscincia e a liberdade delegam ao sujeito da

    ao total responsabilidade pelos seus atos. Responsabilidade, porm, no se

    resume apenas em responder por seus atos e assumi-los com todas as suas

    consequncias, mas tambm tem o sentido de cumprir com suas obrigaes e,

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    ainda, de zelar pelo meio e pela integridade das pessoas, estejam elas perto ou

    longe.

    Em suma, toda ao que tiver esses trs elementos presentes a

    conscincia, a liberdade e a responsabilidade ser necessariamente tica,

    pois estar sempre de acordo com aquilo que se espera do ethos,do modo de

    ser da conduta humana em todo lugar e em qualquer tempo.

    tica e Moral

    Enquanto a tica deriva do termo grego ethos, a palavra moral tem

    origem no termo mores, do latim, e significa costumes, no sentido de normas

    e regras provenientes do conjunto construdo pelas tradies, crenas e

    hbitos que constituem a forma de ser de um grupo ou de uma cultura. Assim,

    toda moral est alicerada ou referenciada na viso de mundo de uma

    coletividade, que prescreve normas e regras de convivncia dentro da

    sociedade.

    Segundo Ponchirolli (2007), uma reflexo terica que analisa e critica

    ou legitima os fundamentos e princpios que regem um determinado sistema

    Essa caracterstica faz com que a tica possa julgar a prpria moral. Na verdade,

    muitos autores concordam que a tica uma teoria sobre a prtica moral.

    Cada um de ns responsvel pelo lugar em que vive e igualmente responsvel

    pelo bem-estar de todos que compartilham esse lugar conosco.

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    moral, isto , a dimenso prtica de nossa vida. Portanto, a moral um

    fenmeno localizado em um determinado meio social. Em contrapartida, por

    no estar localizada nessa ou naquela sociedade ou grupo, mas no modo deser do homem enquanto espcie consciente, livre e responsvel, a tica se

    distancia da moral e pode julg-la se est de acordo ou no com o que pede a

    dignidade humana.

    Acompanhe a reportagem a seguir, da Revista Superinteressante, para

    ver um exemplo disso:

    A retirada do clitris comum na frica

    Por Tnia Menai, de Nova York

    verdade que, em algumas regies do mundo, se retira o clitris das mulheres?

    Sim. A clitoridectomia, como chamada, um ritual de passagem, ou iniciao,praticado na frica, Oriente Mdio e sudeste asitico h 2000 anos. O objetivo evitar que a mulher tenha prazer sexual. As vtimas em geral so bem jovens entre uma semana e 14 anos e os tipos de extirpao variam. Pode ser retiradodesde uma parte do clitris at os pequenos lbios da vagina. As operaes soseguidas de muita dor e sangramento. Como so feitas em condies

    precarssimas de higiene, com tesouras, facas e navalhas, o nmero de infeces muito grande e boa parte das mulheres operadas torna-se estril. Est provadotambm que a prtica no traz nenhum benefcio para o organismo feminino. AOrganizao Mundial de Sade estima que entre 80 e 114 milhes de mulheres jpassaram por esse ritual macabro.

    uma prtica ligada aos costumesdos povos, sem relao direta com a religio.No verdade que o Alcoro (a bblia islmica) defenda o costume.

    Para o Ocidente essa prtica chocante. Mas no assim nas regies onde praticada. A mulher totalmente submissa e os povos que fazem a clitoridectomiaacreditam que ela ajuda a manter a virgindade das solteiras. Alm disso, reforariaa identidade do grupo. (REVISTA SUPERINTERESSANTE, julho-1997, disponvel

    em: ).

    O costume relatado na reportagem categorizado como um processo

    moral dentro da sociedade em que realizado. Analisado sob o enfoque da

    tica, a questo que se coloca vai alm do gnero masculino ou feminino

    estamos diante de um ser humano e podemos expor as seguintes questes:

    A dignidade e a integridade da pessoas esto sendo respeitadas? O ato

    responsvel para com a pessoa que a sofre?

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    Como a resposta evidentemente negativa, a prtica moral, por estar

    em um contexto cultural; porm antitica, por ferir o princpio da dignidade

    humana.

    Para saber mais sobre os elementos que compem a conscincia, a

    liberdade e a responsabilidade, alm da distino entre tica e moral, assista

    ao vdeo a seguir e fique por dentro!

    As Diferentes Concepes ticas

    Existem inmeras concepes ticas, as quais buscam dar respostas

    complexa tarefa de encontrar a razo de ser da conduta humana. Vejamos

    agora algumas dessas concepes e em quais princpios cada uma delas se

    fundamenta.

    A concepo platnica

    Plato nasceu em Atenas, provavelmente em 427 ou 428 a.C. Para

    entendermos o pensamento desse filsofo, necessrio sabermos que Plato

    era um filsofo dualista, ou seja, ele entendia a existncia das coisas marcada

    por uma dupla realidade:

    Realidade sensvel aquela que podemos captar pelo uso dos cinco

    sentidos; essa realidade fsica tem como principal caracterstica o engano, a

    iluso, a efemeridade e a superficialidade, ou seja, o mundo sensvel um

    mundo de sombras, no qual no podemos encontrar a verdade essencial

    das coisas, apenas suas aparncias.

    Realidadeinteligveloucognoscvelcorresponde ao mundo das ideias,

    mas no quaisquer ideias, aquelas que so perfeitas, eternas e imutveis;

    nesse nvel, o entendimento das coisas verdadeiro e absoluto, o indivduo

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    que ama a verdade (que supera as aparncias) deve se esforar para se

    libertar dos enganos do mundo sensvel e contemplar, atravs do dilogo

    racional (por isso todos os escritos de Plato tem a forma de dilogo), oconhecimento essencial de todas as coisas.

    Uma vez entendido o dualismo platnico, fica relativamente simples

    compreender sua concepo tica. Segundo esse filsofo, todo mal e todo

    vcio sempre fruto da ignorncia, ou seja, as pessoas que cometem erros e

    injustias o fazem por estarem mergulhados e ludibriados pelas aparncias do

    mundo sensvel. Da mesma forma, todo bem e toda virtude fruto doconhecimento verdadeiro e essencial das coisas.

    Ao contemplar o mundo cognoscvel, o indivduo se torna

    necessariamente bom e virtuoso, impossibilitado de praticar o mal. Vamos

    entender esse processo:

    A concepo aristotlica

    Aristteles nasceu em 384 a.C., na cidade de Estagira, na Macednia, e

    morreu em 322 a.C. Foi para Atenas aos 17 anos, onde se tornou discpulo de

    Plato.

    Embora tenha tido Plato como mestre, Aristteles se contraps a

    muitos elementos fundamentais da filosofia platnica: uma delas foi a diviso

    da realidade em sensvel e cognoscvel.

    Plato defende que todo ser humano, ao agir, busca a felicidade, mas no

    raramente suas escolhas acabam por torn-lo infeliz; isso acontece por

    causa dos erros cometidos nas escolhas cotidianas, os quais so resultado

    da ignorncia que o mundo das aparncias nos provoca. Se eliminarmos a

    ignorncia e no nos deixarmos levar pelas aparncias, faremos sempre

    escolhas virtuosas, que nos levaro necessariamente felicidade e paz

    interior.

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    Ao se concentrar sobre a questo da tica, Aristteles parte do princpio

    que o fim ltimo, a razo e o objetivo da existncia humana a felicidade.

    Segundo ele, a felicidade seria a realizao plena daquilo que caracteriza o

    homem e o diferencia dos outros animais no caso a prpria racionalidade.

    Sendo assim, o homem que deseja se realizar e viver bem, feliz, deve viver

    sempre segundo a razo. O indivduo que capaz de viver segundo sua

    racionalidade se torna necessariamente virtuoso, segundo esse filsofo.

    Mas qual , efetivamente, a distino da concepo aristotlica em

    relao platnica?

    Aristteles considera que a virtude adquirida com o hbito. Em seulivro tica a Nicmaco,essa concepo est bem explicada:

    As coisas que temos de aprender antes de fazer, aprendemo-las fazendo-asporexemplo, os homens se tornam construtores construindo, e se tornam citaristastocando ctara; da mesma forma, tornamo-nos justos praticando atos justos,moderados agindo moderadamente, e corajosos agindo corajosamente.(ARISTTELES inMARCONDES, 2007, p. 53).

    A frmula que faz um indivduo ser virtuoso simples em Aristteles: a

    pessoa se utiliza da razo para suplantar seus impulsos instintivos e, nessamedida, se esfora para ser virtuoso, se deixando guiar por sua racionalidade e

    praticando a virtude em seu dia a dia at que ela se torne um hbito. Assim, o

    homem encontra o bem, a felicidadee a realizao pessoal.

    A virtude, ento, a justa proporo, o meio-termo entre a deficincia e

    o excesso de um atributo. Em outras palavras, a justa medida entre dois

    vcios opostos.

    Segundo Aristteles, o mundo sensvel no nos d apenas enganos e verdades

    aparentes, mas a fonte privilegiada de conhecimentoreal sobre tudo que existe.

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    tica Empresarial | O que tica? 11

    Observe o quadro a seguir, que ilustra essa definio:

    DEFICINCIA MEIO-TERMO EXCESSO

    Covardia Coragem Temeridade

    Avareza Prodigalidade Esbanjamento

    Negligncia Prudncia Precipitao

    Nesses termos, o homem est sempre diante de uma escolha e, quando

    escolhe pela mediania, porque foi capaz de contemplar a situao e colocar

    em primeiro plano a sua razo como referncia e fundamento de sua deciso.

    J que a meta final do homem a felicidade e que essa condio

    acontece no interior da sociedade, Aristteles compreende que a poltica uma

    prtica que, necessariamente, deve estar ligada ao bem do individuo e da

    coletividade.

    tica e poltica, portanto, caminham juntas para o bem e para a

    realizao humana.

    Outro elemento que no podemos deixar de citar a ao prtica do homem no

    interior da plis (cidade): para Aristteles, o homem um animal poltico, portanto

    dentro da plis, da sociedade, que a possibilidade de realizao do indivduo

    acontece.

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    tica Empresarial | O que tica?12

    Para ter esclarecida ainda mais a concepo tica de Plato e de

    Aristteles, assista ao prximo vdeo.

    As Concepes Contratualistas

    O contratualismo a doutrina da filosofia que defende a instaurao doEstado de direito a partir de um pacto entre os indivduos. Portanto, tal pacto

    visto como a prpria justificativa para a existncia poltica do Estado. Seus

    principais representantes so Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques

    Rousseau.

    Colocado sobre o ponto de vista da tica, a noo de contrato

    pressupe a doutrina em que a moralidade parte de um contrato social,

    portanto, de uma conveno social que pode ser alterada como consequnciade uma luta pelo poder.(BUNGE, 2002)

    Thomas Hobbes (1578-1679)

    O pensamento contratualista do filsofo ingls Thomas Hobbes foi

    exposto em sua principal obra: Leviat.

    O leviat um monstro mitolgico e, no livro, Hobbes faz uma analogia deste com

    a figura do Estado enquanto instituio dominadora, centralizadora e controladora

    qual o homem espontaneamente entrega sua liberdade e sua vontade

    individual.

  • 5/26/2018 Tema 1 - O Que tica

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    tica Empresarial | O que tica? 13

    O que justificaria tal entrega?

    Segundo esse filsofo, os seres humanos tm como caracterstica

    natural o desejo de aumentar o seu poder e a sua influncia sobre as outras

    pessoas. A essa caracterstica, soma-se o fato de que, para alcanar seus

    objetivos, o homem tem poderes similares uns aos outros, ou seja,

    genericamente, ningum muito mais forte ou muito mais habilitado fsica ou

    racionalmente que possa imprimir certa superioridade intransponvel aos

    outros indivduos que o rodeiam. O ponto de partida do raciocnio , assim, a

    ideia de igualdade mais precisamente a ideia de uma igualdade de poder

    entre os homens, entendendo por podera capacidade que cada um tem para

    realizar o que deseja. (MARAL, 2009, p. 341). Assim sendo, se dois homens

    desejam algo que no podem ter igualmente ao mesmo tempo, acabam se

    tornando inimigos.

    Neste estado, no h lugar para o trabalho, para o comrcio, para a

    cincia, para as artes. No h justia nem lei. O medo e o perigo regem uma

    vida humana solitria, pobre, desagradvel, brutal e curta. (THIRY-

    CHERQUES, 2008, p. 57)

    E, nessa condio, afirma Hobbes, o homem o lobo do

    homem, ou seja, somos predadores uns dos outros.

    Em uma situao como essa, o que aconteceria se no houvesse leis, regras ou

    normas para referenciar a ao dos indivduos? Qual seria o resultado se cada um

    seguisse livremente o prprio juzo?

    Viveramos em estado de guerra constante, em que o temor e o medo da morte

    violenta estariam sempre presentes.

  • 5/26/2018 Tema 1 - O Que tica

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    tica Empresarial | O que tica?14

    exatamente para dar vida uma condio mais favorvel, a fim de que

    as pessoas possam se sentir seguras e menos ameaadas, que se justifica a

    fundao do Estado, por meio de um contrato em que os indivduos renunciama sua liberdade e a entregam nas mos de um soberano, tornando-se a ele

    submissos.

    A resignao s normas de convivncia o preo que cada homem tem

    que pagar para ter a possibilidade de realizao da prpria existncia.

    John Locke (1632-1704)

    O filsofo britnico John Locke esboou suas ideias contratualistas a

    partir do princpio dos direitos naturais. Tais direitos esto fundamentados

    naquilo que o homem traz como inalienvel desde o incio de sua vida.

    Ora, mas o que pertence ao homem no momento de seu nascimento?

    Quem responde essa pergunta Locke:

    Em um sentido mais geral, o contratoque d origem ao Estado poltico

    e retira o homem de seu estado de natureza tem por princpio a defesa

    absoluta da propriedade privada, a comear pela vida e pela liberdade e, em

    O Estado ir reger a vida pblica e privada, prescrevendo as normas e as regras

    de socializao, mediando conflitos, julgando e punindo aqueles que,

    inadvertidamente ou deliberadamente, desrespeitarem o contrato.

    A vida, a liberdade e a prpria pessoa. Portanto, todo homem tem direitonatural a esses elementos e ningum possui nenhuma prerrogativa para

    retirar tais direitos dele. O papel do Estado se justifica e se legitima na

    medida em que defende e protege prioritariamente esses interesses.

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    tica Empresarial | O que tica? 15

    seguida, estendendo-se a toda propriedade conquistada pelo homem por meio

    de seu trabalho.

    Por que o trabalho deve ser fonte de constituio de propriedade?

    O argumento de Locke simples e convincente: Deus, atravs de seu

    trabalho, criou todo o cosmos e tudo o que existe nele, e o produto dessa

    atividade pertence ao prprio Criador. O universo , assim, propriedade privada

    e inalienvel de Deus. Seguindo essa lgica, justo que o fruto do trabalho

    humano tambm gere para ele propriedade inalienvel.

    interessante notar que a concepo de Locke sobre o estado de

    natureza humano bem diferente da concepo de Hobbes: o estado natural

    do ser humano no o do estado de guerra de todos contra todos, mas o da

    inocncia e retido. A sociedade dos homens iguais, o estado onde a lei

    (natural) permanece na mo dos indivduos, no da comunidade. (THIRY-

    CHERQUES, 2008, p. 61). Assim, no estado de natureza, o indivduo possui

    uma referncia tica tambm natural, que estabelecida a partir dos direitos

    bsicos de autoconservao.

    O contrato social, segundo Locke, surgiu com a evoluo das formas de

    organizao humanas e os conflitos que as mudanas no interior da sociedade

    provocaram. O contrato se fez necessrio para conciliar tais conflitos e para a

    preservao do bem comum, entendido aqui como a garantia da propriedade

    privada.

    Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)Ao contrrio de Hobbes, Rousseau entende o homem em estado de

    natureza como um ser benevolente, autntico, generoso e compassivo. O que

    o distingue dos animais so sua liberdade e sua capacidade de se aperfeioar

    e de se adaptar s circunstncias. Entre o estado de natureza e o estado de

    sociedade h vrios estgios, na concepo de Rousseau; o mais feliz

    quando o homem vive em pequenas sociedades, ainda sem o estabelecimento

    da propriedade privada.

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    tica Empresarial | O que tica?16

    exatamente quando se instaura a propriedade que surge a sociedade

    fundamentada no contrato a necessidade de preservar a propriedade faz com

    que o homem em estado de sociedade se corrompa, tornando-se egosta,malicioso, preconceituoso e ganancioso.

    O contrato intudo por Rousseau uma tentativa de recriao da

    sociedade em novas bases, em que a liberdade e a igualdade possam imperar.

    O que lhe permite pensar a liberdade na sociedade o fato de seu contrato

    no ser feito entre indivduos particulares, mas entre indivduos e soberano

    sendo que o soberano o povo, do qual o prprio indivduo faz parte. Assim

    nasce o conceito de vontade geral, que no deve ser confundido como a soma

    das vontades particulares.

    A vontade geral , na verdade, aquilo que pode ser generalizado em

    cada vontade particular, na medida em que considera os objetos que

    interessam a todos os cidados. Em suma, s pode ser considerada vontade

    geral aquela que est de acordo com o bem de toda coletividade. A liberdade

    moral e a civil s se sustentariam tendo como fundamento instituies erigidas

    por cidados livres e iguais entre si.

    No se deve, porm, confundir a liberdade resultante do contrato com a

    liberdade que o homem tinha em estado de natureza. O objetivo do contrato

    justamente extinguir a liberdade natural e instaurar a liberdade civil, pois a

    permanncia da liberdade natural dentro do estado de sociedade uma das

    causas dos males polticos, j que, quando algum se comporta como se

    tivesse direito a tudo e sem nenhum dever dentro da sociedade, torna-se um

    risco para os que vivem de acordo com o contrato estabelecido.

    Na concepo de Rousseau, o homem nasce bom, porm a sociedade o

    corrompe. Ele entendia que o grande mal dos tempos modernos era a

    civilizao burguesa, com sua moral mercantil de favorecimento dos hbitos

    de luxo e de criao de desejos artificiais. (COMPARATO, 2006, p. 233)

  • 5/26/2018 Tema 1 - O Que tica

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    tica Empresarial | O que tica? 17

    Assista ao vdeo a seguir para saber mais a respeito do contratualismo.

    A tica do Dever

    Immanuel Kant (1724-1804)

    Kant considera que o princpio fundamental de toda concepo ticadeve ter como referncia o homem. Na viso do filsofo, o ser humano existe

    como um fim em si mesmo, no simplesmente como meio do qual uma ou

    outra vontade pode se servir arbitrariamente.

    O que faz do homem ser um fim em si mesmo o fato de

    nenhum ser humano ter preo.

    O preo o valor daquilo que pode ser substitudo por outra coisa. Mas

    os homens em geral, e cada homem em particular, so propriamente

    insubstituveis na vida. (COMPARATO, 2006, p. 296). A liberdade, juntamente

    com a impossibilidade de calcular o valor do ser humano, forma o cabedal

    caracterstico da dignidade humana. A liberdade, no sentido kantiano, no est

    ligada ideia de se fazer o que quiser de maneira indiscriminada, mas pela

    condio racionalmente determinada de se agir sem ser induzido por fatores

    alheios sua autonomia e racionalidade. A medida da liberdade humana acapacidade de contrariar seus impulsos naturais e, atravs de sua razo, optar

    pelo seu dever. Essa compreenso acentua o reconhecimento do dever como

    uma expresso da racionalidade humana a legtima raiz da moralidade.

    Dessa constatao, Kant (1993) elabora o que ele denominou na obra

    Fundamentao da metafsica dos costumes de imperativo categrico: Age

    apenas segundo um princpio tal qual possas ao mesmo tempo querer que ela

    se torne lei universal(KANT, 1993). Esse princpio imperativo porque deve

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    ser observado em qualquer ato ou deciso tomada pelo homem. Portanto, se

    uma ao no puder ser universalizada, certamente no ser moralmente

    correta, e as eventuais aes contrrias a esse imperativo s acontecerocomo exceo, jamais como regra.

    A tica Utilitarista

    A concepo utilitarista, formulada pelos pensadores ingleses Jeremy

    Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873), defende que a ao

    humana, para ser moral, deve estar alicerada na busca do bem maior para o

    maior nmero possvel de pessoas. Nesse sentido, uma ao ser correta sepromover a felicidade no apenas do agente da ao, mas da maior parte da

    coletividade. Ento, o que determina se uma ao certa ou errada, para alm

    da inteno do agente, seriam tambm as circunstncias na qual ela se deu e

    os impactos que ela causou, pois pode ser que uma conduta que tenha uma

    motivao m acabe resultando em uma coisa boa e vice-versa. Nesse caso, o

    indivduo que se encontra diante de uma situao que exige uma tomada de

    deciso deve discernir sobre qual escolha vai promover o maior bem-estar ou omenor nvel de sofrimento possvel para ele e para a maioria das pessoas.

    O utilitarismo considera que as normas so provisrias. Por exemplo:

    mentir considerado um ato imoral, porm sob determinadas circunstncias,

    mentir talvez seja exatamente a coisa certa a se fazer para a preservao da

    felicidade e do bem-estar de si mesmo e dos outros; roubar tambm errado,

    mas se algum est faminto e no tem outra alternativa, no estar errando ao

    cometer esse ato.

    Ao postular o dever como norma universal, a tica kantiana ganha o statusde

    formal, pois se configura na forma necessria da conduta tica.

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    Assim, no existe nada que, a priori, possa informar com segurana

    sobre a correo de uma ao. (THIRY-CHERQUES, 2008, p. 97). Sob essa

    perspectiva, a utilidade um bem em si mesma, pois ela est relacionada coma felicidade lembrando sempre que esta deve ser buscada no de maneira

    egosta, pois o mais desejvel que todos possam alcan-la.

    Sntese

    Assista ao vdeo a seguir, que trata da tica do dever e da tica

    utilitarista e faz, ainda, um apanhado geral sobre os principais tpicos

    abordados nesta aula.

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    Leia o texto a seguir para responder s duas questes que sero

    apresentadas:

    Supondo que um administrador descobre que seus colegas esto

    participando de algumas fraudes contbeis. Ele resolve relatar o fato aos seus

    superiores, porm estes no tomam nenhuma providncia. Inconformado com

    a inao dos superiores e sem concordar com a prtica dos colegas, ele

    resolve denunciar o esquema Receita Federal. (SROUR, 2000)

    1. Partindo de uma perspectiva aristotlica, podemos afirmar que a sua

    denncia foi motivada:

    a. Por acreditar que cada indivduo deve agir conforme os valores

    hegemnicos da sociedade.

    b. Por entender que a excelncia individual ou empresarial s pode ser

    alcanada atravs da prtica habitual das virtudes.

    c. Por compreender que a falta de virtudes nos companheiros eraprovocada pela ignorncia deles; ento, agindo corretamente, eles

    teriam acesso verdade, o que leva a uma boa conduta.

    d. Sua deciso se justificaria a partir do princpio da no contradio s

    leis da macrocomunidade.

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    2. Partindo de uma perspectiva kantiana, sua deciso teria a seguinte

    justificativa:

    a. Ele teria cumprido o seu dever, pois essa deciso, por mais difcil que

    seja, cumpre com aquilo que se espera da dignidade humana.

    b. Sua deciso se justificaria a partir do princpio de fidelidade total s leis

    do governo e do Estado.

    c. Sua deciso teve como principio o postulado diz com quem andas e

    eu te direi quem s. Para no ficar no nvel dos corruptos, a soluo

    foi entreg-los.

    d. Por acreditar que cada indivduo deve agir conforme os valores

    pautados na soberania social.

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    Referncias

    BOFF, L. A guia e a galinha. Petrpolis: Vozes, 2005.

    BUNGE, M. Dicionrio de Filosofia (Traduo de Gita K. Guinsburg). So

    Paulo: Perspectivas, 2002.

    COMPARATO, F. K. tica: direito, moral e religio no mundo moderno. So

    Paulo: Cia. das Letras, 2006.

    KANT, E. Fundamentos da metafsica dos costumes(Traduo de Lourival

    de Queiroz Henkel). So Paulo: Ediouro, 1993.

    MARCONDES, D. Textos bsicos de filosofia: dos pr-socrticos a

    Wittgenstein. 5. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.

    MARAL, J. (org.). Antologia de textos filosficos. Curitiba: SEED-PR, 2009

    PONCHIROLLI, O. tica e responsabilidade social empresarial. Curitiba:

    Juru, 2011.

    LUCCA, N. tica geral tica empresarial. So Paulo: Quartier Latin, 2009.

    THIRY-CHERQUES, H. R. tica para executivos. Rio de Janeiro: FGV, 2008.

    SANCHEZ VAZQUEZ, A. tica. 32. ed. Rio de Janeiro: Civilizao brasileira,

    2011.

    SROUR, R. H. tica empresarial. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

    _____. Casos de tica empresarial: chaves para entender e decidir. So

    Paulo: Campus, 2011.