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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A INCLUSÃO DE ALUNOS TDAH EM ESCOLAS
CONVENCIONAIS
Por: Helber Luiz Boldrini
Orientadora
Profª. Maria Esther de Araújo Oliveira
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Niterói – Rj
Janeiro de 2005
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
A INCLUSÃO DE ALUNOS TDAH EM ESCOLAS
CONVENCIONAIS
Apresentação de monografia à Universidade Candido
Mendes como condição prévia para a conclusão do
Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em
Administração Escolar
Por: Helber Luiz Boldrini
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço a direção do Colégio Salesiano
pela ajuda e aos meus amigos pelo grande
incentivo
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha esposa e às
minhas filhas pela compreensão nos
momentos de minha ausência.
Aos meus pais, exemplares mestres na
escola da vida.
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RESUMO
Este trabalho apresenta um pouco do que é nossa escola: um espaço que
ainda não valoriza o potencial de cada aluno e, infelizmente, seus conteúdos são
desconectados do dia-a-dia do aluno.
Neste trabalho também, apresentamos como gostaríamos que fosse uma
escola: um espaço onde o aluno encontra sentido e percebe que o conteúdo
trabalhado tem ligação estreita com suas experiências de vida. Onde o aluno não é
somente mais um e sim ele é o protagonista da sua própria história.
Procuramos ainda, apresentar a definição do que vêm a ser uma criança
com TDAH. Percebe-se que não é um problema incomum. Hoje em dia, graças ao
desenvolvimento da medicina, encontramos um número razoável de crianças com
este tipo de transtorno.
Finalizando, valorizamos o papel da escola e, sobretudo do professor.
Mostramos que é possível trabalhar com este tipo de aluno. Basta a escola investir
neste professor e por sua vez, o docente fazer a sua parte, ou seja, reciclar-se,
buscar conhecer seus alunos e a sua história e acreditar no potencial dessas
crianças. Acontecendo desta forma, como mostramos neste trabalho, estaremos
promovendo a inclusão destes alunos.
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METODOLOGIA
Realizou-se este trabalho a partir da pesquisa bibliográfica sobre o assunto
em questão da seguinte forma: identificação das fontes de pesquisa, leitura do
material selecionado, organização dos textos e redação da monografia.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I – A Escola Tradicional 11
CAPÍTULO II – O Aluno TDAH na Escola 16
CAPÍTULO III – O Aluno TDAH na Escola 21
CAPÍTULO IV – A Inclusão do Aluno TDAH nas Escolas 35
CONCLUSÃO 48
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 53
ÍNDICE 54
8
INTRODUÇÃO
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é um distúrbio
neurocomportamental que vem merecendo estudos e pesquisas em centros de
referência do mundo inteiro.
Uma pesquisa divulgada pelo Ministério da Educação dos Estados Unidos
demonstrou que, um dos causadores do maior nível de reprovação escolar, tem
origem em crianças e adolescentes com TDAH que não foram tratadas
corretamente.
As características principais do transtorno do déficit de
atenção/hiperatividade são a desatenção, a hiperatividade e a impulsividade. Elas
afetam de modo adverso o desempenho acadêmico, os relacionamentos familiar e
social, o ajustamento psicossocial e a vida no trabalho e devem ser alvo de
intervenção especializada. É importante também dizer que, além dos sintomas
básicos do transtorno, em mais de 50% dos casos existe co-morbidade
(envolvimento com álcool, drogas, depressão, ansiedade e ainda TDAH). A
presença de co-morbidade freqüentemente torna o prognóstico, ao longo do tempo,
ainda mais devastador. Somente na década de 90 ficou claro que transtornos
9
denominados internalizantes (ansiedade e depressão) ocorriam em co-morbidade
com o TDAH. Além de todos esses fatores, crianças que experimentam o fracasso
precocemente, algo comum no TDAH, são desproporcionalmente vulneráveis a uma
ampla variedade de complicações psicossociais. Essas complicações, por sua vez,
podem levar a problemas crônicos em diferentes esferas da vida, persistindo
mesmo quando os sintomas principais do transtorno remitiram ou melhoraram de
modo significativo ao longo dos anos.
O TDAH é considerado um transtorno do desenvolvimento, acometendo
crianças desde a tenra idade e persistindo na vida adulta em mais da metade dos
casos. É também a principal causa de encaminhamento de crianças para serviços
especializados e provavelmente também seja aquele com a maior incidência de
autodiagnóstico na vida adulta. Ele já foi entendido como um transtorno
comportamental de meninos, porém, na atualidade é solidamente identificado em
meninas, adolescentes e adultos e pode ser subdividido em três tipos, de acordo
com a predominância dos sintomas: predominantemente desatento,
predominantemente hiperativo-impulsivo e combinado.
O cérebro humano é um sistema complexo, que estabelece relações com o
mundo que o rodeia. São duas as suas especificidades: a primeira é referente às
vias que levam, da periferia ao córtex, informações provenientes do mundo exterior;
a segunda diz respeito aos neurônios. São estas características que permitem
determinar áreas motoras, sensoriais, auditivas ópticas, olfativas, etc.,
estabelecendo noções exatas e ricas no aprendizado.
O aprender implica, portanto, certas integridades básicas, que devem estar
presentes quando oportunidades para a aprendizagem são oferecidas.
O termo TDAH tem sido usado para indicar uma perturbação na aquisição
de informações ou na habilidade para solução de problemas. Portanto, quando
existe uma falha no ato de aprender, esta exige uma modificação dos padrões de
10
aquisição, assimilação e transformação, seja por vias internas ou externas ao
indivíduo. A tentativa de definir e esclarecer os termos relacionados a essa falha na
aprendizagem tem sido uma tarefa bastante difícil.
Este trabalho também vai mostrar como é fundamental para a inclusão de
alunos TDAH nas escolas, a relação professor-aluno. Perceberemos que quanto
mais estreita for esta relação maior a possibilidade de êxito.
Ao trabalharmos a inclusão, mostraremos que as escolas não fazem
nenhum favor em aceitar os alunos com estes transtornos. É direito destas crianças,
desde que acompanhadas devidamente, a freqüentar estas escolas.
Todas as questões faladas acima serão trabalhadas com aprofundamento e,
com certeza, perceberemos que se o aluno tiver um acompanhamento com um bom
profissional e o professor estiver preparado para este aluno, ganhará a escola, o
professor e, sobretudo o aluno.
11
CAPÍTULO I
A ESCOLA TRADICIONAL
“Ninguém caminha sem aprender a caminhar, sem aprender
a fazer o caminho caminhando, refazendo e retocando o
sonho pelo qual se pôs a caminhar”.
PAULO FREIRE (1980)
13
Ensinar e aprender são as duas vocações inatas que o ser humano tem
para exercer o viver.
O homem, para desenvolver a capacidade que dispõe, exercita essa
aptidão através de dois instrumentos: a escola convencional e a escola da vida ou
natural.
Na ordem humana o processo de aprendizagem começa com o
nascimento. A criança percebe as primeiras lições sob a proteção da mãe. E
assim, vai aprendendo e ensinando, ora na formação familiar e segue na escola
convencional, ou nas formas fortuitas, escola da vida, cujo aprendizado decorre do
meio ambiente e das condições de sobrevivência de cada um.
Segundo Paulo Freire (1980), nas sociedades tribais existiam
comunidades sem escola. A prática educativa consistia na aquisição de
instrumentos de trabalho e na interiorização de valores e comportamentos, enquanto
o meio ambiente em seu conjunto era um contexto permanente de formação. Não
havia professores. Todo adulto ensinava, aprendia-se a partir da própria
experiência e da experiência dos outros. Aprendia-se fazendo o que tornava
inseparáveis o saber, a vida e o trabalho.
De início, podemos admitir que o homem é um ser histórico, já que suas
ações e pensamentos mudam no tempo, à medida que enfrenta os problemas não
só da vida coletiva, como da experiência pessoal.
O trabalho – que é a ação transformadora do homem sobre a natureza –
modifica também a maneira de pensar, agir e sentir, de modo que nunca
permanecemos os mesmos ao fim de uma atividade, qualquer que ela seja. É
nesse sentido que dizemos que, pelo trabalho, o homem se autoproduz, ao mesmo
tempo em que produz sua própria cultura.
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Se o homem é o resultado desse devir, do processo pelo qual constrói a
cultura e a si próprio, é impossível pensar em uma natureza humana com
características universais e eternas. Ou seja, não se compreende o homem fora de
sua prática social, porque esta, por sua vez, se encontra mergulhada em um
contexto histórico-social concreto.
A partir das relações que estabelecem entre si, os homens criam padrões
de comportamento, instituições e saberes, cujo aperfeiçoamento é feito pelas
gerações sucessivas, o que lhes permite assimilar e modificar os modelos
valorizados em uma determinada cultura. É a educação, portanto, que mantém viva
a memória de um povo e dá condições para a sua sobrevivência. Por isso é que a
educação é uma instância mediadora que torna possível a reciprocidade entre
indivíduo e sociedade.
Esse processo, no entanto, não é isento de distorções. Maria Lúcia de
Arruda Aranha (1996) fala que nas sociedades tribais a cultura global era
transmitida de maneira informal pelos adultos, atingindo todos os indivíduos. Nas
sociedades mais complexas, porém, com o passar do tempo, a educação formal
assumia um caráter intelectualista cada vez mais distanciado da atividade concreta,
destinando-se apenas à elite. As demais classes tinham preterido a sua formação,
considerada desnecessária porque a elas era destinado o trabalho braçal. Portanto
a dicotomia trabalho intelectual versus trabalho manual ora excluía os filhos dos
trabalhadores manuais, ora criava uma escola dualista, com objetivos diferentes:
para a elite, uma escola de formação que poderia se estender até os graus
superiores, enquanto para os trabalhadores restavam os rudimentos do ler e
escrever e o encaminhamento para a profissionalização.
Sobre o ensino no Brasil, no período colonial, Nelson Werneck Sodré diz: “...
o traço característico do ensino dessa fase era o seu aspecto marginal. Ele se
destinava a distinguir o indivíduo, fornecendo-lhe um ornamento a mais, voltava as
atenções para problemas subjetivos, distanciados, irrelevantes, desligados da
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realidade. Não era instrumento para a vida e muito menos abria perspectivas para
novos horizontes”.
A escola reproduz, portanto, a divisão da sociedade em categorias sociais
distintas. Apesar de toda a boa vontade e de todo o esforço de alguns colégios e
professores, a realidade é que é o próprio funcionamento da escola que seleciona e
elimina.
As crianças já chegam à escola com saberes diferentes. Tratá-las em pé de
igualdade significa não apenas manter a desigualdade, mas até aumentá-la.
A escola é um mundo uniforme. Ela trata a todos da mesma maneira.
Todos devem ter o mesmo ritmo de trabalho, com o mesmo livro, o mesmo material,
todos devem aprender as mesmas frases, saber as mesmas palavras. Todos
devem adquirir os mesmos conhecimentos, devem fazer os mesmos exames, ao
mesmo tempo. Um mundo com conteúdos estranhos que não tem qualquer
significação nem qualquer utilidade imediata para os alunos. Os conteúdos não têm
ligação com o que acontece lá fora, com o cotidiano, com a realidade política
(Babette Harper et alli, 1980).
Exemplo de uma aula de história relatado no livro Cuidado, Escola:
“Tocou a sineta. O professor de História entrou na
sala, mas a discussão entre os alunos continuou, intensa
e apaixonada... Dois alunos desta sala do Colégio de
Genebra são espanhóis. Na noite anterior, o general
Franco havia ordenado a execução de três bascos
oposicionistas, o que provocou reações no mundo
inteiro. Os alunos viram-se para o professor e pedem sua
opinião, sua ajuda para compreenderem o que se
passava: Agora silêncio, calem a boca que está na hora
16
de começar a aula de história...”. (Babette Harper, et alli,
1980, p. 63).
Tudo isto vêm confirmar que o papel da escola consiste na preparação
intelectual e moral dos alunos para assumir sua posição na sociedade. O
compromisso da escola é com a cultura, os problemas sociais pertencem à
sociedade. Os conteúdos são separados da experiência do aluno e das realidades
sociais. O caminho cultural em direção ao saber é o mesmo para todos os alunos,
desde que se esforcem. Assim, os menos capazes devem lutar para superar suas
dificuldades e conquistar seu lugar junto aos mais capazes. Caso não consigam,
devem procurar o ensino profissionalizante.
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CAPÍTULO II
A ESCOLA QUE QUEREMOS
“A sociedade só vai mudar no dia em que pais e mães
estiverem conscientes de que precisam ensinar os filhos a
ter autonomia, responsabilidade e valores como disciplina,
gratidão, religiosidade, ética e cidadania”.
DR. IÇAMI TIBA (2004)
18
O século XXI é um tempo de avanços do conhecimento humano e de novas
tecnologias. O mundo está passando por incríveis mudanças que, de forma
acentuada, marcam nova direção na história da humanidade. Para se ter uma visão
mais real da situação descrita, basta observar que, nos últimos 25 anos, as
descobertas e inventos da terra equivalem ao que aconteceu nos últimos 5.000
anos. E mais, 80% dos descobridores e inventores estão vivos e acompanhando o
desenvolvimento humano e tecnológico (Luiz Gonzaga de Oliveira Pinto, 2003).
Portanto, Continua o escritor Luiz G. O. Pinto, o mundo está em ebulição e,
nesse contexto, estamos envolvidos, observando, colaborando, desfrutando
informações instantâneas, criando um mundo cada vez menor, levando-se em conta
os conhecimentos. Para a população ativa restringem-se os empregos formais,
aperfeiçoam-se as tecnologias, diminuem-se as oportunidades laborais. Nessa luta
pela ocupação do espaço, só aos bem formados e informados restam bem
remuneradas ocupações. Nessa tarefa, a educação detém o maior índice de
responsabilidade, principalmente se considerarmos a profunda alteração do papel
da família nos últimos 30 anos. A mãe, que até então assumia grande parcela de
responsabilidade na formação do filho, deixa a função específica de cuidadora da
família para assumir a condição de provedora. Assim, a responsabilidade da escola
aumentou e, sem dúvida alguma, suas condições diminuíram em qualidade. A última
metade do século XX tornou-se um marco da mudança criativa e inovadora para a
história da humanidade. A responsabilidade da escola é tanto maior porque os
avanços tecnológicos não correspondem às demandas de uma humanidade em
larga escala empobrecida. O crescimento do número de excluídos é assustador. E a
situação só se reverterá com a educação.
Por estes motivos precisamos de uma nova escola. Uma escola que leve
em consideração todas estas mudanças.
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A escola que queremos para nosso aluno é aquela que acolhe, que
possibilita o seu crescimento integral e um relacionamento de prazer com o
aprender. É aquela que enfatiza uma troca positiva com os educadores para que o
aluno possa apropriar-se do conhecimento de que precisa para viver e conviver na
sociedade do século 21.
A escola que queremos valoriza a experiência vivida como base da relação
educativa e a autogestão pedagógica. Valoriza a ação pedagógica enquanto
inserida na prática social concreta. Entende a escola como mediação entre o
individual e o social, exercendo aí a articulação entre a transmissão dos conteúdos
e a assimilação ativa por parte de um aluno concreto (inserido num contexto de
relações sociais); dessa articulação resulta o saber criticamente reelaborado.
A educação é uma atividade onde professores e alunos, mediatizados pela
realidade que apreendem e da qual extraem o conteúdo de aprendizagem, atingem
um nível de consciência dessa mesma realidade, a fim de nela atuarem, num
sentido de transformação social. Ela questiona concretamente a realidade das
relações do homem com a natureza e com os outros homens, visando a uma
transformação. O importante não é a transmissão de conteúdos específicos, mas
despertar uma nova forma da relação com a experiência vivida.
A escola precisa mostrar a que se propõe, defendendo seu projeto político-
pedagógico, atendendo às necessidades sócio-culturais da comunidade a que
pertence, desenvolvendo um trabalho contínuo em que as etapas bem planejadas e
definidas sejam passos seguros para atingir uma meta final: a formação do
cidadão. Ela tem como meta a formação integral do homem nos seus aspectos
físico, intelectual, emocional e social. Um homem capaz de resistir e superar suas
frustrações e dificuldades, que seja produtivo, capacitado para fazer escolhas e
com possibilidades de modificar essa sociedade hostil.
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O educador precisa estar engajado no processo, acreditar no potencial do
educando, crer no homem como protagonista da própria vida, estar atento e
capacitado para atender às necessidades reais de seus alunos e da sociedade.
A escola que queremos valoriza a qualidade de vida; a formação da auto-
estima; a vivência de situações prazerosas e saudáveis; o fortalecimento do
autocontrole para resistir ao sofrimento e às frustrações buscando alternativas para
supera-las; o desenvolvimento do senso crítico e a oportunidade de tomar iniciativas
e decisões.
É função da escola criar oportunidades para que seus alunos desenvolvam
suas capacidades e aprendam conteúdos necessários para compreender a
realidade e participar das relações sociais, culturais e políticas. Possibilitando a
eles o pleno exercício da cidadania na construção de uma sociedade mais justa,
democrática e não excludente.
A escola tem papel preponderante na formação do cidadão, porque investe
nesta proposta de modo intencional, sistemático e planejado por período contínuo e
tempo prolongado:
...um ensino de qualidade busca formar cidadãos
capazes de interferir criticamente na realidade para
transformá-la e não apenas formá-los para que se
integrem ao mercado de trabalho. A escola ao se
posicionar desta maneira, abre oportunidades para
que os alunos aprendam sobre temas normalmente
excluídos e atua propositadamente na formação de
valores e atitudes do sujeito em relação ao outro, à
política, à economia, ao sexo, à droga, à saúde, ao
meio ambiente, à tecnologia, etc.
21
(PCNs, função da Escola, agosto de 1999,
p. 31).
A escola só atenderá às necessidades atuais da sociedade se introduzir
em seu currículo as problemáticas de vida de seus alunos.
Na escola que queremos, deve haver coerência entre o que se diz e o que
se faz. A ética não se aprende através de discursos, mas de experiências
favoráveis de vida.
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CAPÍTULO III
O ALUNO TDAH NA ESCOLA
”O que será que me dá/ que me bole por dentro será que
me dá/ e que me sobe às faces e me faz chorar/ e que me
salta aos olhos a me atraiçoar/ e que me aperta o peito e
me faz confessar/ o que não tem mais jeito de
dissimular...”.
“O que será?” (à flor da pele).
(Chico Buarque)
23
Desde pequeno já é inquieto. Em casa, corre daqui para lá o dia todo, sem
que nada o detenha, nem sequer o perigo. Tira brinquedos de seu lugar, esparrama
todos eles pelo chão e, quase sem usá-los, pega outros e outros, sem deter-se em
nenhum. Interrompe permanentemente os adultos e as outras crianças, respondendo
impulsivamente e de forma exagerada àqueles que o molestam. Seus
companheiros de escola o evitam, mesmo assim ele sempre termina chamando-os
para pedir-lhes ajuda nas lições que não consegue copiar a tempo.
Essa criança perde os objetos, é desordenada, tendo que cobrá-la o tempo
todo, não só para que complete as tarefas, mas também porque, distraído, se
esquece de que é hora de almoçar, de jantar ou de tomar banho.
Quando começa fazer alguma coisa, se esquece de terminar, para na
metade. Quando vai a algum lugar para no caminho, se detém pra falar com alguém,
pra entreter-se numa brincadeira, com algum animal ou passarinho que passa
voando.
O que foi citado acima demonstra um típico caso de uma criança com TDAH.
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade na infância em geral se
associa a dificuldades na escola e no relacionamento com demais crianças, pais e
professores. As crianças são tidas como “avoadas”, “vivendo no mundo da lua” e
geralmente “estabanadas” e com “bicho carpinteiro” ou “ligados por um motor” (isto
é, não param quietas por muito tempo). Os meninos tendem a ter mais sintomas de
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hiperatividade-impulsividade que as meninas, mas todos são desatentos. Crianças
e adolescentes com TDAH podem apresentar mais problemas de comportamento
como, por exemplo, dificuldades com regras e limites.
Segundo o Dr. Paulo Mattos (Doutor em medicina pela UFRJ), 1998, o
Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um problema
bastante comum e se caracteriza por dificuldade em manter a atenção, inquietude
acentuada (por vezes hiperatividade) e impulsividade. Ele é chamado às vezes de
DDA (Distúrbio do Déficit de Atenção). Em muitos casos o transtorno acompanha o
indivíduo na vida adulta, embora os sintomas sejam mais brandos quando
comparados aos de crianças.
Continua Dr. Paulo Mattos, o TDAH deriva de um mau funcionamento do
cérebro. O dado mais informativo é que há uma alteração metabólica,
principalmente nas regiões pré-frontal e pré-motora do cérebro. Como a região
frontal é a principal reguladora do comportamento humano, falhas na bioquímica
desta região levariam às alterações encontradas no TDAH (alteração, impulsos e
inquietação).
Deve-se destacar ainda que existe forte histórico familiar neste distúrbio
(carga genética), uma vez que é comum encontrar várias pessoas acometidas numa
mesma família.
Quando pessoas que têm este tipo de problema tentam se concentrar, a
atividade cerebral diminui, ao invés de aumentar (como nas pessoas normais).
Assim sendo, sujeitos que sofrem desta doença mostram muitos destes sintomas:
fraca supervisão interna, pequeno âmbito de atenção, distração, desorganização,
hiperatividade, problemas de controle de impulso, dificuldade de aprender com
erros passados, falta de previsão e adiamento.
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A falta de controle do impulso faz com que muitas pessoas que têm TDAH
se metam em enrascadas. Elas podem dizer coisas inadequadas para os pais,
amigos, professores e outros. Ao invés de pensar antes de dizer qualquer coisa
eles falam sem pensar e acabam criando problemas. A impulsividade pode também
levar a condutas problemáticas com mentir, roubar.
A maioria dos profissionais da saúde da criança concorda que a
desatenção, a impulsividade e a hiperatividade são os padrões primários do TDAH.
As descrições clínicas de crianças com esta doença freqüentemente incluem
queixas de “não escutarem as instruções”, “não terminarem o trabalho determinado”,
“sonharem acordados”, “incomodarem-se facilmente”, e assim por diante. Comum a
todas essas preocupações referidas encontra-se uma menor capacidade de
vigilância, ou seja, dificuldades para manter a atenção na tarefa (Douglas, 1983).
Esses problemas podem ocorrer em atividades lúdicas (Routh e Schroeder, 1976),
mas com freqüência aparecem em situações que exigem atenção mantida em
tarefas chatas, enfadonhas e repetitivas (Milich, Loney e Landau, 1982).
As crianças com TDAH podem interromper outros que estiverem ocupados
ou apresentarem tremenda dificuldade em aguardar a sua vez em jogos. Elas
podem também iniciar tarefas antes das orientações terem sido terminadas, correr
riscos desnecessários, falar fora de sua vez ou fazer observações indiscretas sem
considerar as conseqüências sociais.
Elas têm dificuldade de manter atenção em atividades muito longas,
repetitivas ou que não lhes sejam interessantes. Elas são facilmente distraídas por
estímulos do ambiente externo, mas também se distraem com pensamentos
“internos”, isto é, vivem “voando”. Nas provas, são visíveis os erros por distração
(erram sinais, vírgulas, acentos, etc.). Como a atenção é imprescindível para o bom
funcionamento da memória, elas em geral são tidas como “esquecidas”: esquecem
recados ou material escolar, aquilo que estudaram na véspera da prova, etc. ( o
“esquecimento” é uma das principais queixas dos pais).
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Embora possam ser inteligentes e criativas, seu desempenho sempre
parece inferior ao esperado para a sua capacidade intelectual. O TDA/H não se
associa necessariamente a dificuldades na vida escolar, embora seja uma queixa
freqüente de pais e professores. É mais comum que os problemas na escola sejam
de comportamento que de rendimento (notas).
Quando elas se dedicam a fazer algo estimulante ou do seu interesse,
conseguem permanecer bem tranqüilas, isto ocorre porque os centros de prazer no
cérebro são ativados e conseguem dar um “reforço” no centro da atenção que é
ligado a ele, passando a funcionar em níveis normais. O fato de uma criança
conseguir ficar concentrada em alguma atividade não exclui o diagnóstico de
TDA/H. É claro que não fazemos coisas interessantes ou estimulantes desde a hora
que acordamos até a hora em que vamos dormir: os portadores de TDA/H vão ter
muitas dificuldades em manter a atenção em um monte de coisas.
Segundo Dr. Fabio Barbirato (vice-presidente da Associação Brasileira de
Neuropsiquiatria Infantil),2003, a pessoa não se torna TDAH. Nasce-se TDAH.
Estes já se mexem mais na barriga das mães.
Um aspecto importante: as meninas têm menos sintomas de hiperatividade-
impulsividade que os meninos (embora sejam igualmente desatentas), o que fez
com que se acreditasse que TDA/H só ocorresse no sexo masculino. Como as
meninas não incomodam tanto, eram menos encaminhadas para diagnóstico e
tratamento médicos.
3.1- Diferentes tipos de TDAH
Assim como não existem dois diabéticos iguais, mesmo que o nível de
açúcar no sangue seja exatamente o mesmo em ambos; muitas diferenças podem
existir: um pode ser gordo e o outro não, um deles pode contar com a ajuda da
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família em casa e o outro não etc. Pessoas que são portadoras de TDAH têm
muitas coisas em comum, mas não são necessariamente iguais no seu
comportamento.
Os portadores de TDAH têm problemas parecidos, mas é importante
entender que são indivíduos com um determinado histórico pessoal, personalidades
diferentes, estilos de vidas particulares, contexto familiar etc. Os sintomas podem
ser sempre os mesmos, mas a sua expressão vai depender de quem os manifesta.
Existem três subtipos de TDAH: forma predominantemente
hiperativa/impulsiva, forma predominantemente desatenta e forma combinada e
segundo o DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual – manual preparado pela
Associação Psiquiátrica Americana) as características principais desses subtipos
de TDAH são:
1 – TDAH – tipo desatento;
A pessoa apresenta, pelo menos, seis das seguintes características:
Não enxerga detalhes ou faz erros por falta de cuidado.
Dificuldade em manter a atenção.
Parece não ouvir.
Dificuldade em seguir instruções.
Dificuldade na organização.
Evita/não gosta de tarefas que exigem um esforço mental prolongado.
Freqüentemente perde os objetos necessários para uma atividade.
Distrai-se com facilidade.
Esquecimento nas atividades diárias.
2 – TDAH – tipo hiperativo/impulsivo;
É definido se a pessoa apresenta seis das seguintes características:
Inquietação, mexendo as mãos e os pés ou se remexendo na cadeira.
Dificuldade em permanecer sentada.
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Corre sem destino ou sobe nas coisas excessivamente.
Dificuldade em engajar-se numa atividade silenciosamente.
Fala excessivamente.
Responde a perguntas antes delas serem formuladas.
Age como se fosse movida a motor.
Dificuldade em esperar sua vez.
Interrompe e se intromete.
3 – TDAH – tipo combinado;
Pessoa que apresenta características dos tipos desatento e
hiperativo/impulsivo.
4 – TDAH – tipo não específico;
A pessoa apresenta algumas características mas número insuficiente de
sintomas para chegar a um diagnóstico completo. Esses sintomas, no
entanto, desequilibram a vida diária.
3.2 - Diagnóstico
O diagnóstico de TDAH pede uma avaliação ampla. Não se pode deixar de
considerar e avaliar outras causas para o problema. Assim, é preciso estar atento à
presença de distúrbios concomitantes (co-morbidades). O aspecto mais importante
do processo de diagnóstico é um cuidadoso histórico clínico e desenvolvimental. A
avaliação do TDAH inclui, freqüentemente, um levantamento do funcionamento
intelectual, acadêmico, social e emocional. O exame médico também é importante
para esclarecer possíveis causas de sintoma semelhantes aos do TDAH (por
exemplo, reação adversa à medicação, problemas de tiróide, etc.) O processo de
diagnóstico deve incluir dados recolhidos com professores e outros adultos que, de
alguma maneira, interagem rotineiramente com a pessoa sendo avaliada ( Luiz
Augusto Rodhe e Paulo Mattos, 2003).
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Muitas pessoas normais já se viram envoltas em atos desatentos,
impulsivos ou mesmo hiperativos. Portanto, isto somente não serve como
diagnóstico.
A partir do que foi colocado acima, costuma-se afirmar que o melhor critério
para se diagnosticar o TDAH é a própria história pessoal vista pelos mais diversos
ângulos de sua existência: escolar/profissional, familiar, social e afetiva. A visão
global é que nos dará oportunidade de criar o critério para estabelecer-se a
necessidade de tratamento para essa alteração.
3.3 - Tratamento
Segundo Dr. Fabio Barbirato, o tratamento de crianças com TDAH exige
um esforço coordenado entre os profissionais das áreas médica, saúde mental e
pedagógica, em conjunto com os pais. Esta combinação de tratamentos oferecidos
por diversas fontes é denominada de intervenção multidisciplinar. Um tratamento
com esse tipo de abordagem inclui:
1 - Treinamento dos pais quanto à verdadeira natureza do TDAH e em
desenvolvimento de estratégias de controle efetivo do comportamento.
2 – Um programa pedagógico adequado.
3 - Aconselhamento individual e familiar, quando necessário, para evitar o
aumento de conflitos na família.
4 – Uso de medicação, quando necessário.
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Ainda, segundo Dr. Fabio Barbirato, uma das verdades no tratamento do
TDAH é que há necessidade de receitar medicamento. O maior estudo feito no
mundo, coordenado por psicólogos e médicos em seis centros de referência,
concluiu que o tratamento com drogas é imprescindível no TDAH. A melhor
abordagem é a combinação de terapia, medicamento e a orientação de pais e
professores.
As formas mais comuns de tratamento do TDAH, como já foi dito, incluem a
prescrição de medicações psicoestimulantes e intervenções comportamentais. E as
medicações psicoestimulantes mais eficazes para este transtorno são metilfenidato
(Ritalina), dextroanfetamina (Dexedrine) e pemoline (Cylert).
Estas drogas aumentam à amplitude da atenção, o controle do impulso, a
produtividade acadêmica, as relações sociais e a confiança em ordens de figuras
de autoridade em 70 a 80% das crianças com TDAH recebendo medicação. De
forma similar, descobriu-se que as intervenções comportamentais que incluem
reforço, custo da resposta, reprimendas negativas e tempo livre a partir de reforço
positivo diminuem os sintomas do TDAH, enquanto aumentam o controle da conduta
e o desempenho escolar na maioria das crianças que recebem este tratamento
(Barkley, 1990).
É importante dizer que estes procedimentos não curam o TDAH no sentido
de normalizar totalmente o comportamento da criança. Os efeitos das medicações
desaparecem quatro horas depois da ingestão. Logo, existe a necessidade de
intervenções adicionais.
Uma intervenção muito eficaz é a orientação educacional a respeito do
transtorno. Ela é o primeiro passo para que o paciente aprenda a lidar com suas
dificuldades e limitações. Estratégias compensatórias para melhorar o rendimento
atencional são úteis em muitos casos. Alguns portadores desenvolvem suas
próprias técnicas para evitar falhas no dia-a-dia e estas devem ser fomentadas e
aperfeiçoadas. Estabelecer metas e condições adequadas no trabalho, rotinas
31
diárias, são de grande ajuda. Diminuir estímulos através da obtenção de um espaço
tranqüilo (se possível isolado) para o trabalho ou estudo, evitar deixar na mesa de
trabalho materiais que possam estimular a distração. Objetos de uso diário devem
ser deixados sempre no mesmo local pré-estabelecido; anotações, agendas
também são úteis. Tudo isto ajuda no controle da hiperatividade e da impulsividade
e, sobretudo, ajuda o hiperativo a desenvolver seu auto-contole, avaliando melhor as
conseqüências dos seus atos impulsivos.
3.4 - Criança hiperativa na escola
Enquanto a criança TDAH convive apenas em seu meio familiar, muitas de
suas características repousam em estado de latência. Demonstrações de que ela é
algo diferente já foram dadas para a família, mas é no início da vida escolar que
essas diferenças podem revelar sua potencialidade problemática (Ana Beatriz B.
Silva, 2003).
Em casa, na família, a criança contava com a estrutura familiar para se
organizar e, além disso, muitas de suas características hiperativas e/ou desatentas
poderiam não estar acarretando problemas, sendo até consideradas
engraçadinhas.
Dificuldades maiores começam a surgir no âmbito escolar quando a criança
é solicitada a cumprir metas e seguir rotinas, executar tarefas e ser recompensada
ou punida de acordo com a eficiência com que são cumpridas. Os pais já não estão
presentes e não podem cumprir tarefas ou facilitar as coisas para a criança. Ela
precisa começar a caminhar com suas próprias perninhas. Perninhas que até então
cumpriam mais as funções de correr, pular, chutar ou mesmo permanecer em
repouso enquanto sua mente divagava. Agora não podem correr a todo momento,
como também não podem ficar imóveis. Devem caminhar em direções
determinadas, em tempos estabelecidos e em ritmo compatível com as demais
32
crianças com quem irá conviver quase que diariamente. As direções, tempos e
ritmos serão definidos pelo professor da turma, que é orientado por objetivos até
entÃo diferentes de seus pais, mas cujos propósitos agora interessam
sobremaneira a estes.
A criança com TDAH agora precisa ajustar-se às regras e à estrutura de uma
educação continuada, em que há cobranças de desempenho. Muitas vezes,
experimentará dificuldades em adequar-se a rotinas tão esquematizadas.
O desempenho da criança com TDAH é marcado pela instabilidade. Em um
momento, ela é brilhante. Em outro, não consegue aprender os conteúdos
ministrados. A instabilidade de atenção é a causa desse sobe-e-desce no
desempenho.
No período da pré-escola, a ênfase geral nas propostas pedagógicas se
baseia na utilização de jogos ou brincadeiras para iniciar interações sociais com a
criança.
As crianças hiperativas neste período, por apresentarem comportamento
desatento e impulsivo, muitas vezes podem ser excluídas dessas vivências pelo
próprio grupo ou pela disciplina do professor. Com isso, elas deixam de dar os
primeiros passos necessários para sua adaptação social na escola.
Acredita-se no princípio que a capacidade de manter amizade é um
componente essencial da boa saúde mental de uma criança. Um estudo feito por
Barkley, (1981), demonstra que 80% dos pais de crianças hiperativas informaram
que seus filhos apresentavam problemas ao brincar com outras crianças. Os
mesmos problemas ocorrem com uma freqüência inferior a 10% entre crianças sem
hiperatividade (Goldstein, 1992).
33
Observa-se nos ambientes escolares, com a presença da criança hiperativa,
que as outras crianças reagem negativamente a essa presença.
Freqüentemente a interação entre elas se dá de maneira difícil que conduz à
rejeição. Por exemplo, não conseguem iniciar uma conversa e falam muito e
rapidamente, batem em alguém sem perceber os limites de sua agressividade
(Goldstein, 1992).
É comum perceber-se nessas crianças, um comportamento inadequado
frente à rejeição de seus colegas. Decorrente dessa incapacidade de enfrentar a
rejeição, a criança hiperativa tende a aumentar seu potencial agressivo e busca
exercer controle sobre o ambiente, desencadeando um ciclo vicioso. Tudo isto
causa uma baixa auto-estima nas crianças atrapalhando assim, seu
desenvolvimento.
Devido a sua desatenção e impulsividade, a criança hiperativa não consegue
considerar a perspectiva da outra pessoa e nem tão pouco consegue lidar com as
emoções decorrentes de sua frustração. Esses fatores impedem uma troca de
informações mais tranqüila, suscitando a irritabilidade no outro. Trata-se de uma
incapacidade de ser influenciado pelo outro com espontaneidade, requer a
presença qualificada desse outro para administrar as inquietações, que são muito
freqüentes.
Por tudo que já se colocou a respeito de TDAH é verdadeiro afirmar que esta
doença apresenta um grande impacto no desenvolvimento educacional da criança.
O risco de fracasso escolar é muitas vezes maior em crianças com TDAH do que
em crianças sem este transtorno.
Déficits de atenção significativos, associados ou não à hiperatividade,
freqüentemente comprometem o rendimento escolar, uma vez que a atenção
seletiva é essencial para a aprendizagem em geral.
34
As crianças com TDAH têm dificuldade em manter a atenção durante um
tempo prolongado e selecionar informações relevantes para estruturar e realizar
uma tarefa determinada. A dificuldade acentua-se em trabalhos com o grupo, uma
vez que nestes casos é necessária a atenção sustentada e seletiva, para a
absorção da quantidade e variedade de informações apresentadas.
Os sintomas do TDAH, na escola, evidenciam a dificuldade em terminar os
trabalhos na sala de aula ou de participar tranqüilamente de uma equipe de
esportes. A criança se envolve em atividades improdutivas, tanto durante a aula,
como no recreio, se comparada a seus colegas.
3.5 - TDAH e Outras Associações
“Fazia um lindo pôr-do-sol lá fora, era final de tarde e cá
estávamos nós, um grupo de pessoas que passava
pelos problemas e mais alguns outros diferentes.
Reuníamo-nos todas as semanas e sentíamo-nos muito
bem quando isto acontecia. Como era bom poder ouvir
as pessoas relatarem problemas tão semelhantes aos
nossos. Você se sente menos anormal, menos
inadequado e, aos poucos, vai se livrando da incômoda
sensação de ser diferente. Fazíamos terapia de grupo”.
(Mentes Inquietas, 2003, p. 124).
Em grande parte dos casos, o TDAH não vem sozinho. Ele pode vir em
dupla, em trio e o que felizmente não é comum, até em bando. A este tipo de
ocorrência chamamos de co-morbidade. Ou seja, um ou mais transtornos
psiquiátricos em coexistência com um transtorno primário. Com certeza, isso
35
contribui em muito para agravar o quadro, obrigando o médico a atacar em várias
frentes.
Normalmente esses transtornos desenvolvem-se secundariamente como
conseqüência do transtorno primário, pois o desconforto e o sofrimento causados
por este atingem de tal forma a vida de uma pessoa, que outras síndromes vêm
somar-se à preexistente.
No caso do TDAH, a distração, os freqüentes esquecimentos, a
desorganização, a constante sensação de que algo está errado, a costumeira
protelação de tarefas que causam muita ansiedade: São características que podem
fazer com que a pessoa TDAH desenvolva transtornos associados, como
ansiedade generalizada, depressão , pânico, fobias etc.
Há outros transtornos específicos que “acompanham” o TDAH, não porque
são conseqüências dele, mas porque parece haver uma íntima relação em suas
origens biológicas. As mesmas alterações bioquímicas e/ou funcionais parecem
estar envolvidas em transtornos como o TDAH e a Dislexia, a Discalculia, a
Disgrafia etc.
Evidentemente que estes transtornos não acompanham todas as pessoas
com TDAH. Pelo contrário, existem muitas pessoas que tem TDAH e apresentam
um excelente rendimento escolar e, não muito raro, até acima da média.
Finalizando este capítulo é importante dizer que estes transtornos colocados
acima e tantos outros não mencionados atrapalham muito o dia-a-dia do educando
e por este motivo devemos estar atentos a eles.
A escola que melhor atende as necessidades destas crianças é aquela que
tem como objetivo o desenvolvimento do potencial de cada um, respeitando as
características individuais, sempre reforçando os pontos fortes e auxiliando na
36
superação dos pontos fracos, evitando que os problemas da criança sejam
personalizados e que o aluno seja rotulado.
A comunicação entre a escola e a família é muito importante, permitindo a
troca de experiências entre pais e professores. Saber o que se passa com a
criança ou o adolescente durante o tempo em que está em um dos dois ambientes
(casa/escola) é extremamente útil para a composição do quadro real.
37
CAPÍTULO IV
A INCLUSÃO DO ALUNO TDAH NAS ESCOLAS
”Viver e não ter a vergonha de ser feliz/
Cantar e cantar e cantar a beleza de
ser um eterno aprendiz/ Eu sei que a
vida devia ser bem melhor e será/ Mas
isso não impede que eu repita/ É
bonita, é bonita e é bonita”.
“O que é o que é”
(Gonzaguinha)
Se em sala de aula existem alunos míopes e, naturalmente existem, não
constitui responsabilidade do professor saber as causas da miopia, as
possibilidades de sua evolução e a administração dos óculos adequados para
minimizar esse problema com seus alunos. Essa missão constitui responsabilidade
de especialistas e eles, e somente eles, podem dar cabo da mesma com
competência e a finalidade que o caso exige. Mas, evidentemente, constitui
responsabilidade intransferível de todo professor, diante da presença de alunos
míopes, providenciar sua posição na sala de aula mais compatível com sua
limitação, a maneira como desenhará a estrutura na lousa para que possa o mesmo
38
enxergá-la plenamente e, em algumas circunstâncias, seu encaminhamento para
profissionais especializados que, por certo, providenciarão o tratamento devido
(Celso Antunes, 2002).
Esse exemplo é óbvio e circunstância alguma pode negá-lo. O educador
jamais pode assumir funções de psicopedagogo ou médico, mas as limitações de
sua ação não o exclui da responsabilidade da identificação do problema e o
encaminhamento pedagógico que o mesmo requer.
Neste sentido é fundamental e de suma importância o papel do professor
na inclusão do aluno TDAH nas atividades do dia-a-dia e na própria escola.
A inclusão deve ser uma proposta, um ideal. Se quisermos que nossa
sociedade seja acessível, que dela todas as pessoas com algum tipo de transtorno
possam participar em igualdade de oportunidades. É preciso fazer desse ideal uma
realidade a cada dia. A ação de cada um de nós e das instituições deve ser
pensada e executada no sentido de divulgar os direitos, a legislação e implementar
ações que garantam o acesso de todos. Sabemos que isto não acontecerá de uma
hora para a outra, mas é preciso começar.
A inclusão de pessoas, com algum tipo de transtorno, nas escolas
convencionais é um processo que deve envolver a todos nós, por isso é um trabalho
desafiador.
Na escola inclusiva o processo deve ser entendido como um processo
social, onde todas as crianças portadoras de necessidades especiais e de
distúrbios de aprendizagem têm o direito à escolarização o mais próximo possível
do normal.
Segundo Maria Tereza Eglér Mantoan,2002, o princípio democrático da
educação para todos só se evidencia nos sistemas educacionais que se
especializam em todos os alunos, não em alguns deles. A inclusão, como
39
conseqüência de um ensino de qualidade para todos os alunos provoca e exige da
escola brasileira novos posicionamentos e é um motivo a mais para que o ensino se
modernize e para que os professores aperfeiçoem as suas práticas.
Ainda, segundo Maria Tereza Eglér Mantoan, o sucesso da inclusão de
alunos com deficiência na escola regular decorre, portanto, das possibilidades de
se conseguir progressos significativos desses alunos na escolaridade, por meio da
adequação das práticas pedagógicas à diversidade dos aprendizes. E só se
consegue atingir esse sucesso, quando a escola regular assume que as
dificuldades de alguns alunos não são apenas deles, mas resultam em grande parte
do modo como o ensino é ministrado, a aprendizagem é concebida e avaliada.
De acordo com Romeu Kazumi Sassaki, 1998, o professor deve preparar
suas aulas e desenvolver suas atividades em sala de aula respeitando a
diversidade humana e diferenças individuais de seus alunos. Acrescentando a isto o
cuidado de propiciar condições para atingir os objetivos individuais. O professor
também deve levar em conta a participação ativa dos alunos em todos os aspectos
da vida escolar.
Sabemos de professores que sempre entenderam que a função deles é a
de ensinar falando o tempo todo para os alunos, escrevendo no quadro para os
alunos copiarem e dando aos alunos tarefas escritas para provar que entenderam a
matéria dada. Trata-se de uma abordagem muito limitada da aprendizagem, cujos
resultados práticos são desastrosos: alunos desinteressados na aula, alunos
desmotivados para executar tarefas, alunos que acabam não aprendendo nada de
relevante para sua vida.
Por outro lado, quando o professor valoriza os diversos conhecimentos de
seus alunos e se esforça em preparar uma aula mais contextualizada na realidade,
ele está ampliando ao mesmo tempo o seu repertório de estratégias de ensino e a
gama de participação positiva do aluno no processo de aprendizagem. Portanto, os
40
professores não precisam de receitas prontas e sim de habilidades para avaliar
situações novas, desenvolver estratégias e encontrar respostas educativas às
necessidades de cada aluno.
O artigo 8, inciso I, da Resolução CNE/CBE nº. 2, diz que:
“As escolas da rede regular de ensino devem prever e
prover na organização de suas classes comuns:
professores das classes comuns e da educação especial
capacitados e especializados, respectivamente, para o
atendimento às necessidades educacionais dos alunos”.
Desde o início deste capítulo estamos abordando o tema da inclusão de
forma geral, mas tratando da inclusão mais específica do aluno TDAH nas escolas
convencionais, é importante ressaltar o papel fundamental do professor nesta difícil
mas, mais do que nunca, possível tarefa de inclusão do aluno com TDAH.
Para que isto aconteça é importante que o professor crie nas suas turmas
um clima de afeto, confiança, liberdade e alegria. É importante que o aluno sinta-
se aceito e valorizado independente das dificuldades que possa apresentar ou
estar vivendo. Precisa ter liberdade para se expressar, alegria e prazer na
convivência com professores e colegas.
A educação que tem o aluno como centro valoriza suas experiências,
sentimentos, preocupações e interesse. Enfatiza o desenvolvimento pessoal do
aluno. É a qualidade da relação professor aluno que facilita, dificulta ou até impede
o desenvolvimento do processo educativo.
Rogers (1973) propõe, numa visão humanista, a educação centrada no
aluno e destaca três qualidades do professor que facilitam a aprendizagem. São
41
elas a autenticidade do professor, apreço, aceitação e confiança no aluno e
compreensão empática.
A autenticidade se dá quando o professor ou facilitador da aprendizagem se
mostra para o aluno de um modo autêntico e real. Apresenta-se e relaciona-se com
o aluno sem máscaras e disfarces. O professor não está representando um papel, é
ele mesmo. Esse comportamento permitirá que a relação professor-aluno seja uma
relação pessoa a pessoa.
O apreço, aceitação e confiança demonstram o valor que o professor dá ao
aluno, a seus sentimentos, a suas opiniões, a sua pessoa. Aceita-se como alguém
independente, com valores e direitos próprios. E, confia nas suas potencialidades,
na sua capacidade.
“Sem afeto não há confiança e sem confiança não há educação” (Dom
Bosco in Auffray, 1969, p. 198).
O professor aceita e compreende os momentos da apatia e desinteresse do
aluno, suas dificuldades, sua momentânea aversão à autoridade. Está também
atento valorizando seus esforços, seus desejos de realização e sua satisfação com
o êxito. Enfim, ele percebe e aceita seu aluno como ser humano imperfeito, mas
capaz de buscar seu próprio crescimento.
Quando o professor desenvolve com o aluno uma compreensão empática,
este se sente compreendido, aceito e não avaliado e julgado. Essa situação
predispõe o aluno a aceitar-se e crescer.
É essa inter-relação professor-aluno e aluno-escola que torna a
aprendizagem significativa.
42
Se ao contrário, a inter-relação professor-aluno e aluno-escola não
acontecem, se predomina o autoritarismo ou a permissividade, se o aluno não se
percebe pessoa na escola, a relação que se estabelece é hostil. Cria-se um clima
de desconfiança, de competição, comprometendo e até inviabilizando a
transmissão de conhecimentos.
Com a relação professor-aluno, até os conteúdos tornam-se significativos. O
aluno não tem uma posição passiva de receptor do ensino. É ativo na troca de
conhecimentos e experiências interagindo com o professor e os colegas. É sempre
estimulado a buscar, pesquisar, conhecer, desenvolvendo o espírito crítico.
Nas atividades escolares, tem oportunidade de discutir e debater sobre os
assuntos, fortalecendo e, muitas vezes, revendo suas opiniões e valores.
Como se percebe pessoa, o aluno se permite mudar de opinião, repensar
suas idéias e atitudes buscando sempre o próprio crescimento.
4.1 – Orientações aos Professores
1 - Suas queixas são relativas ao relacionamento difícil e desgastante com
seu aluno que apresenta TDAH. A relação se torna tensa e tumultuada.
2 - Lembre-se, no entanto, de que ele está tendo certas dificuldades não
porque ele é ruim ou teimoso, e sim porque o TDAH leva a criança a agir
diferentemente do esperado.
3 - O importante é compreendermos os problemas sociais, escolares e
familiares que o aluno enfrenta e estarmos dispostos a auxiliá-lo sempre. De
nada adianta exigir mais do que ele pode dar.
4.2 – Dicas Gerais
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1 - Pense antes de agir. Não se esqueça de que você, assim como os pais,
são modelos de identificação para essa criança.
2 - Use o reforço positivo antes da punição. Evite críticas constantes. Procure
reforçar o que há de melhor nele.
3 - Sempre que possível, sente-se com seu aluno a sós e dê-lhe o retorno
sobre como ele está se saindo na sala de aula. Ouça-o sobre seus
progressos e dificuldades.
4 - Assinale e elogie os sucessos desse aluno tanto quanto for possível.
5 - Sempre que possível, transforme as tarefas em jogos. A motivação para
aprendizagem certamente aumentará.
6 - Avalie mais pela qualidade do que pela quantidade das tarefas
executadas. O importante é que os conceitos estejam sendo aprendidos.
7 - Procure estabelecer regras de funcionamento em sala de aula. O aluno se
sente mais seguro sabendo o que é esperado dele. As regras devem ser
breves e claras.
4.3 – Sugestões de Estratégias para o Manejo de Classe
1 - Mantenha o esquema de trabalho o mais constante e previsível possível.
No início da aula, planeje com seus alunos as atividades e tarefas que irão
ser desenvolvidas.
2 - Dê preferência, sempre que possível, à estratégia de ensino participativo.
Promova e introduza jogos e novidades nas aulas.
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3 - Divida as tarefas grandes em várias pequenas. Esse aluno rapidamente
se desmobiliza frente a tarefas muito longas.
4 - Utilize vários recursos de ensino, e não somente a voz. Use figuras,
recursos audiovisuais e cores. Module a voz.
5 - Estimule o aluno a ler em voz alta. Isso ajuda na manutenção da atenção.
6 - Sempre que for possível, coloque esse aluno sentado próximo da sua
mesa na primeira fila.
7 - Evite trabalhos em grandes grupos. Normalmente esse aluno necessita de
atividades individualizadas.
4. 4 – Reduzindo o Comportamento Hiperativo
1 - Reforce sempre o positivo do comportamento esperado.
2 - Evite estratégias punitivas, como advertência ou expulsões.
3 - Dê preferência para estratégias reparadoras, como consertar algo que
ele estragou.
4 - Quando estratégias punitivas se fizerem necessárias, explique claramente
a razão da advertência ou exclusão. Faça isso de modo imediato. É
fundamental para esse aluno o estabelecimento da conexão causa-efeito.
5 - Permita que ele possa deixar a sala de aula por alguns minutos em
momento de hiperatividade. Isso irá ajudá-lo a reorganizar-se interiormente.
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Para a inclusão do aluno TDAH nas escolas convencionais é necessário
que ele seja tratado. E para isto acontecer é fundamental, além da terapêutica
medicamentosa, da orientação à família, do acompanhamento terapêutico, que a
escola seja orientada, a fim de ajudar a criança a se entender melhor, ampliando
suas possibilidades de sucesso pessoal, social e acadêmico.
O que fazer, então, com estes alunos que rompem com a harmonia da sala
de aula, interferem no trabalho didático e atrapalham a atividade de seus
companheiros e, não apresentam resultados acadêmicos compatíveis com o seu
potencial? Se o professor não souber diagnosticar esse comportamento na criança
e, conseqüentemente, utilizar uma ação pedagógica que auxilie a neutralizá-lo,
poderá, em contrapartida, contribuir para que o comportamento hiperativo se torne
cada vez mais evidenciado, impedindo, com isso, o desenvolvimento integral da
criança.
Infelizmente, as técnicas mais comuns utilizadas são as de coação, de
ameaça e até, em alguns casos, de indiferença total, fazendo com que problemas
de ordem sócio-afetiva venham a surgir na relação professor-aluno, interferindo
grandemente na formação da auto-imagem e da auto-estima da criança.
Há de se convir que a competência necessária para lidar com tais eventos
não faz, normalmente, parte da formação do professor. Embora o professor esteja
ciente de que precisa aceitar os alunos com necessidades especiais em suas
classes. O professor considera que o número de alunos que apresenta dificuldade
na aprendizagem é grande e, a presença dos alunos TDAH acarreta um encargo a
mais, para o qual não se acha preparado.
A Lei 9.394/96, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira, reforça, nos artigos 58 e 59, a importância do atendimento educacional a
pessoas com necessidades especiais, ministrado preferencialmente em escolas
regulares. Estabelece, também, que sejam criados serviços de apoio especializado
e assegurados currículos, métodos e técnicas, recursos educativos e organizações
46
específicas para atender às peculiaridades dos alunos. Destaca, ainda, a
necessidade de capacitar docentes do ensino regular para o atendimento escolar
destes educandos em classes regulares.
O professor, portanto, precisa ser preparado e conhecer o transtorno de
déficit de atenção e hiperatividade e, sobretudo, saber diferenciá-lo de “má-
educação”, “indolência” ou “preguiça”.
Ele terá que conseguir equilibrar as necessidades dos demais alunos com
a dedicação que uma criança com TDAH necessita, o que pode ser difícil com uma
turma numerosa. Ele tem que percebê-la como uma pessoa que tem potencial,
interesses particulares, medos e dificuldades e tem que estar realmente interessado
em ajudá-la.
O professor tem que ter criatividade para gerar uma variedade de
alternativas, avaliando qual delas funciona melhor para cada situação. Ou seja, ele
tem que ser capaz de modificar as estratégias de ensino, de modo a adequá-las ao
estilo de aprendizagem e às necessidades da criança.
O professor deverá entender bem o fato de a criança prestar atenção e se
dedicar apenas àquilo que a interessa ou motiva. Essa é uma das características do
transtorno que mais facilmente se confunde com uma série de outras coisas,
geralmente malvistas pelos professores. Outro aspecto muito importante é saber
distinguir “incapacidade para atender a regras” (o caso do TDAH) com “falta de
vontade de atender a regras” (problemas comportamentais).
4.5 – A Relação Professor-Aluno
A ralação professor-aluno é fundamental em qualquer circunstância. Quando
se fala, então, em um aluno com TDAH ela é fundamental, imprescindível.
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Em primeiro lugar, a relação professor-aluno não tem receita. Ela acontece,
é um fato. É um fato dependente, em última análise, da disponibilidade de cada um,
do esforço, do envolvimento e do interesse que tenham em construir algo em
comum.
A capacidade de relacionar-se é única, impar... Muitas vezes, basta um
olhar, um gesto, uma palavra e se estabelece o vínculo da empatia. Às vezes, não é
tão simples assim.
Os encontros e desencontros, as divergências de visualização que surgem
a todo o momento no relacionamento não devem ser vistas como obstáculos que
impossibilitem a concretização da meta, mas desafios a serem superados
conjuntamente. Ou as duas partes colaboram, ou ela é impossível. Por mais flexível
e jeitoso que seja o professor ele nada conseguirá se não puder contar com um
mínimo de colaboração por parte dos alunos. E por mais interessados que sejam os
alunos, também eles desanimarão se não tiverem um professor com espírito aberto
à nova realidade.
O professor deve encontrar o meio termo equilibrado e adequado sem cair
num autoritarismo repressivo e incompreensível nos dias de hoje e, por outro lado,
não adotar uma atitude tímida e medrosa de quem não sabe pôr limites e barreiras.
O grande desafio, na relação professor-aluno, está em estabelecer um bom
vínculo com os alunos, desenvolvendo um processo construtivo nessa relação, de
modo que o professor possa despertar ou resgatar nos alunos o prazer de
aprender, de ter curiosidade e descobrir novos caminhos.
No passado o grande desafio do professor era saber transmitir seus
conhecimentos aos alunos. Hoje o grande desafio consiste em conseguir relacionar-
48
se com eles e vice-versa, respeitosamente, para que professores e alunos
caminhem nesse processo de ensino/aprendizagem.
Por outro lado, como já foi dito, é necessário que o aluno também faça a
sua parte. Por isso, conhecer o próprio comportamento é fundamental para uma
mudança de perspectiva que possibilite um redirecionamento em sua vida. É
importante ao TDAH aceitar o seu modo de ser e acreditar sinceramente em seus
talentos, transformando, assim, potencialidades criativas em atos criativos. Ele tem
que adquirir confiança para buscar seu espaço nesse novo sistema de trabalho, ou
seja, numa economia globalizada. Pois, para bem adapta-se a esses novos
tempos, é preciso ter na bagagem, junto com a criatividade, a coragem e a
perseverança; a coragem de errar e continuar tentando. É necessário que tenha um
ideal firme e que creia no seu próprio sonho para torná-lo real.
Finalizando, não há motivos para uma escola não aceitar um aluno TDAH.
Basta exigir que ele seja acompanhado e tratado devidamente e que seus
professores estejam preparados para esses novos tempos onde, cada vez mais, o
comportamento do ser humano é mais complexo. Que tenhamos todas as
competências necessárias para podermos oferecer um porto seguro para essas
crianças que têm muito a aprender e ensinar para todos nós. Enfim, que possamos
ajudá-las a construir o seu mundo, mesmo que seja aos poucos, tijolo por tijolo.
Subiu a construção como se fosse máquina/ ergueu no
patamar quatro paredes sólidas/ tijolo com tijolo num
desenho mágico/ seus olhos embotados de cimento e
lágrima/ sentou pra descansar como se fosse sábado/
comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe...
“Construção” (Chico Buarque)
49
CONCLUSÃO
O homem é um ser complexo, que estabelece relações com o mundo que o
rodeia. Nesta convivência com o que o cerca não há como ele não aprender,
50
adquirir conhecimentos. Ele sempre irá aprender. Alguns de modo mais rápido,
outros mais lentamente, mas a aprendizagem, com certeza absoluta, se processará
independente da via neurológica usada, mas utilizando-se de uma associação
infalível, baseada em uma vertente básica: ambiente adequado, estímulo, motivação
etc.
A educação precisa mudar seu foco. Em vez de permanecer centrada nas
lógicas de ensinos, precisa focar nos processos de aprendizagem. Estamos
habituados a olhar para as escolas a partir do ponto de vista dos professores,
ignorando o ponto de vista daqueles que são os sujeitos da aprendizagem.
Precisamos pensar a educação como um ciclo que coincide com o ciclo
vital; colocar a pessoa no centro dos processos Educativos; privilegiar o aprender;
articular a educação com a experiência; valorizar os processos educativos não-
formais.
Segundo Rui Canário (19910), a escola corresponde a uma invenção
histórica recente que emerge no princípio da modernidade, coincidindo com a
transição das sociedades de Antigo Regime para as modernas sociedades liberais
e industriais. Apesar de ser inequivocamente uma criação humana, a escola, ao
tornar-se hegemônica, sofreu um processo de “naturalização” , que torna difícil um
distanciamento crítico. Ou seja, a escola não é vista como uma realidade social,
mas sim como algo de “natural” e, portanto, imutável.
Por outro lado, continua Rui Canário, a escola correspondeu a uma
formidável invenção organizacional, que permitiu que um mestre pudesse ensinar
simultaneamente muitos alunos, como se fossem um só. A invenção da organização
por classes permitiu passar do ensino individual ao ensino simultâneo e, assim,
lançar a base do que viria a ser uma escola de massas.
51
Na escola que conhecemos, os alunos não se dedicam a colocar
problemas e a construir soluções. Pelo contrário, são sistematicamente treinados
para dar as respostas certas, previamente ensinadas, relativas a perguntas que não
formularam. Para que o aluno seja mais crítico, é indispensável modificar, na escola,
a relação com o saber, por meio de um acréscimo de pertinência das situações
escolares.
O trabalho escolar terá de ser encarado como um processo de conhecer e
intervir no mundo. Por outro lado, será também necessário modificar as relações de
poder que permeiam as situações escolares. É necessário que as crianças
aprendam a ser gente a partir do exercício da autonomia e da responsabilidade.
É legítimo, portanto, dentro do que já foi dito, esperar que a educação seja
menos escolarizada e que a escola possa integrar-se, de forma coerente e
harmoniosa, num processo de educação ao longo da vida, sem o hegemonizar.
Será também legítimo esperar que a escola “aprenda” com a educação não-formal,
enfatizando a aprendizagem pela experiência e pela indagação, favorecendo a
cooperação na aprendizagem, favorecendo processos de autoformação, induzindo
o gosto pelo ato intelectual de aprender, entendido como um ato de criação.
Levando-se em conta o que já foi colocado a respeito de como é e de como
deveria ser o nosso sistema educacional, percebe-se com clareza a dificuldade de
incluir educandos TDAH em nossas escolas.
Sabemos, como já foi dito, que as três principais características do
comportamento TDAH são a desatenção, hiperatividade e impulsividade. A forma
dessas pessoas se relacionarem com a escola também será influenciada por essa
tríade de intensidade variável. Mas uma coisa é certa: em todos os casos sobra
emoção e quase sempre falta razão.
52
Toquinho, na música “aquarela” nos dá uma noção do comportamento de
uma pessoa com TDAH:
Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo/ e com
cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo/ Corro o lápis
em torno da mão e me dou uma luva/ e se faço chover,
com dois riscos tenho um guarda-chuva/ Se um pinguinho
de tinta cai num pedacinho azul do papel/ num instante
imagino uma linda gaivota a voar no céu/ Vai voando,
contornando a imensa curva Norte e Sul/ Vou com ela
viajando Havaí, Pequim ou Istambul...
Um TDAH com impulsividade assemelha-se a um grande “tornado”
apaixonado. É capaz de conhecer alguém, apaixonar-se perdidamente, casar,
brigar, odiar, separar, divorciar e tornar a casar-se; tudo em menos de um mês. Por
isso que nosso sistema educacional precisa se reformular. É urgentemente
necessário que os conteúdos estejam de acordo com o que os alunos vivem no seu
dia-a-dia. Não é possível, sobretudo para um aluno TDAH, ficar horas a fio
prestando atenção no que o professor está falando em sala se isto não tem nada ou
quase nada do que ele vive diariamente.
Lendo o poema “Liberdade” de Fernando Pessoa encontramos indicativos
de um comportamento TDAH:
“Ai, que prazer/não cumprir um dever/ter um livro para ler/e
não o fazer!/ Ler é maçada,/estudar é nada./O sol doira
sem literatura/O rio corre bem ou mal,/sem edição
original/E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal/ como
tem tempo, não tem pressa.../Livros são papéis pintados
com tinta/Estudar é uma coisa em que está indistinta/A
distinção entre nada e coisa nenhuma/Quanto melhor é
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quando há bruma/Esperar por D. Sebastião,/quer venha
ou não!/ Grande é a poesia, a bondade e as
danças.../Mas o melhor do mundo são as crianças,/flores,
música, o luar, e o sol que peca/só quando, em vez de
criar, seca/E mais do que isto/É Jesus Cristo,/que não
sabia de finanças,/nem consta que tivesse biblioteca...”.
A contradição, a visão imprecisa sobre si mesmo e a baixa auto-estima
presentes nos comportamentos TDAH também aparece claramente no poema
“Tabacaria” do mesmo Fernando Pessoa:
“Não sou nada/Nunca serei nada/Não posso ser nada/À
parte isso/Tenho em mim todos os sonhos do mundo...”.
Por tudo isto colocado acima, quando nos propomos a trabalhar com alunos
com transtorno de défict de atenção e hiperatividade, não há como deixar de levar
estas características em conta, sobretudo, tratando-se da inclusão dessas pessoas.
“Saber é poder”. O velho e sentencioso ditado nunca esteve tão atual como
nos tempos globalizados. Afinal, só é possível optar por uma ajuda adequada, aos
comportamentos TDAH, através do saber advindo do conhecimento adquirido.
Quanto mais informação e conhecimento tivermos sobre este transtorno,
mais capacitados estaremos para compreendermos toda a sua história de vida e
para contribuirmos efetivamente na elaboração de um tratamento que lhe seja mais
eficaz e confortável. Lembremo-nos de que nenhum tratamento e que também
nenhuma inclusão acontecerá se mantivermos posturas passivas. Precisamos nos
informar, estudar, debater, trocar idéias, experiências... Só assim, estas pessoas
terão condições de se sentirem gente e se sentirem incluídas para poderem
desenvolver todo o seu potencial.
54
Talvez nunca, em toda a história da humanidade, a responsabilidade da
escola tenha envolvido tantos desafios quanto no momento presente.
De um lado, vivemos numa época de colossais avanços tecnológicos, que
tornam a vida humana mais fácil do que outrora. Do outro lado, porém, vivemos
numa época perturbada, em que se acumulam crises econômicas, políticas, sociais,
culturais etc. Pode-se falar numa crise de valores que atinge todos os países do
mundo. Vivemos numa sociedade perplexa diante das mudanças de valores:
crenças até há pouco tempo vistas como imutáveis; de repente são contestadas e
negadas. Os tempos mudaram, ou melhor, estão mudando a todo o momento e nem
sempre de modo muito ordenado.
Tudo isto acaba por isolar cada vez mais o indivíduo. A relação humana –
que representava o mais importante aspecto da vida comunitária – tende a diminuir.
Hoje, quase tudo pode se fazer individualmente e por meio de tecnologias.
Hoje, investir na relação humana parece que passa a se tornar alto antigo e
fora de moda. As relações humanas ficaram mais superficiais, afastadas e
descartáveis.
É Neste contexto que entra a responsabilidade da escola. Ela, através do
seu corpo docente, não pode reproduzir toda esta individualidade crescente, onde é
cada um pra si e Deus pra todos. A escola precisa trabalhar seus professores,
capacitá-los para estas novas competências, sobretudo para a competência da
inclusão.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação, 2º ed. São Paulo: Moderna,
2001.
FREITAS, Nilson Guedes de. Escola competente. Rio de Janeiro: Wak, 2003.
HARPER, Babette et al. Cuidado Escola! 24º ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
MATTOS, Dr. Paulo. No mundo da lua. São Paulo: Lemos, 2001.
MONEREO, Carles e SOLÉ, Isabel. O assessoramento psicopedagógico. Porto
Alegre: Artmed, 2000.
PERRENOUD, Philippe. Novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artmed,
2000.
REINECKE, Mark A. DATTILIO, Frank M. e FREEMAN, Arthur. Terapia cognitive
com crianças e adolescentes. Porto Alegre: Artimed, 1996.
ROHDE, Luis Augusto e MATTOS, Paulo. Princípios e Práticas em tdah. Porto
Alegre: Artimed, 2003.
SCOZ, Beatriz J. Lima et al. Psicopedagogía: Avanços Teóricos e Práticos. São
Paulo: Vetor, 2000.
SILVA, Ana Beatriz B. Mentes inquietas. 19º Ed. São Paulo: Gente,2003.
BRASIL. Livro do 6º Simpósio Nacional sobre Distúrbios de Aprendizagem. São
Paulo: 3 a 6 de julho de 2002.
BRASIL. Ministério da Educação: Informativo MEC. Brasília, 2004.
SIMPRO. Dificuldades de Aprendizagem: Compreender para Melhor Educar. Rio de
Janeiro: Ano 5, nº 6, 2004.
O GLOBO. Revista. Como Tratar o Déficit de Atenção – Fábio Barbirato – Rio de
Janeiro: Ano 1, nº 17, 2004.
ÍNDICE
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INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
A ESCOLA TRADICIONAL 11
CAPÍTULO II
A ESCOLA QUE QUEREMOS 16
CAPÍTULO III
O ALUNO TDAH NA ESCOLA 21
3.1 – Diferentes Tipos de TDAH 25
3.2 – Diagnóstico 27
3.3 – Tratamento 28
3.4 – Criança Hiperativa na Escola 29
3.5 – TDAH e Outras Associações 32
CAPÍTULO IV
A INCLUSÃO DO ALUNO TDAH NA ESCOLA 35
4.1 – Orientação aos Professores 40
4.2 – Dicas Gerais 41
4.3 – Sugestões de Estratégias para o Manejo de Classe 41
4.4 – Reduzindo o Comportamento Hiperativo 42
4.5 – A Relação Professor-Aluno 45
CONCLUSÃO 48
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 53
ÍNDICE 54