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Alexandra Rezende Assad Daniel Volquind Pedro Thadeu Galvão Vianna Carlos Eduardo Lopes Nunes Edno Magalhães Curso de Educação a Distância em Anestesiologia Comissão de Educação Continuada - 2010 VOLUME X EDITORES 2010

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Page 1: EDITORES Curso de Educação a Distância em · Científica da Saesp, membro do Comitê de Anestesia Ambulatorial da SBA José Fernando Bastos Folgosi Presidente do Comitê de Anestesia

Alexandra Rezende AssadDaniel volquind

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Edno magalhães

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EDITORES

2010

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Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

Copyright© 2010, SBA – Sociedade Brasileira de Anestesiologia

Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer sistema, sem prévio consentimento de Segmento Farma Editores Ltda.

Todos os direitos desta edição estão reservados a Segmento Farma Ltda.

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)

Rua Anseriz, 27, Campo Belo – 04618-050 – São Paulo, SP. Fone: 11 3093-3300 • www.segmentofarma.com.br • [email protected]

Diretor-geral: Idelcio D. Patricio Diretor executivo: Jorge Rangel Coordenadora editorial: Cristiane Mezzari Capa: Renata Variso Peres Diagramação: Triall Composição Editorial Ltda Revisora: Renata Del Nero • Cód. da publicação: 10974.10.10

Índices para catálogo sistemático

1. Anestesiologia : Educação a distância 617.962. Anestesiologia : Estudo e ensino 617.96

C753 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia, volume X / Sociedade Brasileira de

Anestesiologia – Comissão de Educação Continuada. – 10.ed. – São Paulo: Segmento Farma, 2010.

128 p.

ISBN 978-85-7900-030-0

1. Anestesiologia – educação a distância. 2. Anestesiologia – estudo e ensino. I. Sociedade Brasileira de Anestesiologia – Comissão de Educação Continuada

CDD 617.96

O conteúdo desta obra é de inteira responsabilidade de seu(s) autor(es).Produzido por Segmento Farma Editores Ltda., com o patrocínio de Abbott Laboratórios em novembro de 2010.

Material de distribuição exclusiva à classe médica.

IMPrESSO NO BrASIL2010

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COMISSÃO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA

EDITORES

Alexandra Rezende Assad, TSA-SBA (RJ)Professora adjunta da Universidade Federal Fluminense, anestesiologista do

Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coordenadora do Serviço de Anestesiologia do Hospital Badim e Hospital Israelita (RJ)

Daniel Volquind, TSA-SBA (RS)Membro da Comissão de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, professor da

Universidade de Caxias do Sul (UCS), anestesiologista da Clínica de Anestesiologia (CAN) (RS), presidente da Sociedade de Anestesiologia do Rio Grande do Sul (SARGS)

Pedro Thadeu Galvão Vianna, TSA-SBA (SP)Professor titular do Departamento de Anestesiologia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade

Estadual Paulista (Unesp), presidente da Comissão de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA), representante da SBA na Comissão Nacional de Acreditação do Conselho

Federal de Medicina a Associação Médica Brasileira (CFM/AMB), representante da SBA na Comissão Técnica de Anestesiologia do CFM

Carlos Eduardo Lopes Nunes, TSA-SBA (RJ)Responsável pelo Centro de Ensino e Treinamento (CET) Dr.

Rodrigo Gomes Ferreira, presidente da SBA (2010)

Edno Magalhães, TSA-SBA (DF)Professor, mestre e doutor pela Unifesp, professor pesquisador associado pleno da

Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (FM/UnB), responsável pelo CET de Anestesiologia UnB, diretor do Departamento Científico da SBA (2010)

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Presidente

Carlos Eduardo Lopes Nunes

Vice-Presidente

Nádia Maria da Conceição Duarte

Secretário-Geral

Sylvio Valença de Lemos Neto

Tesoureiro

Henri Braunstein

Diretor do Departamento Administrativo

Airton Bagatini

Diretor do Departamento de Defesa Profissional

José Mariano Soares de Moraes

Diretor do Departamento Científico

Edno Magalhães

SOCIEDADE BRASILEIRA DE ANESTESIOLOGIA

Diretoria

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AuToRES

Adilson Hamaji, TSA-SBA Doutor anestesiologista pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), supervisor anestesista (IOT–FMUSP–TSA), coordenardor CPT bloqueios periféricos SAESP

Ana LuftAnestesiologista, mestre em Ciências Médicas pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA)

Cláudia Regina Fernandes, TSA-SBA (CE)Doutora em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP), na área de Anestesiologia, responsável pelo Centro de Ensino e Treinamento (CET) da Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA) do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará (UFC), professora assistente do Curso de Medicina da Universidade de Fortaleza (Unifor)

Daniela Bianchi Garcia Gomes, TSA-SBA (PR)Anestesiologista do Hospital Pequeno Príncipe de Curitiba, responsável pelo CET do Hospital Universitário Cajuru, presidente do Comitê de Anestesia Pediátrica da SBA

Danielle M. H. Dumaresq, TSA-SBA (CE)Responsável pelo CET do Instituto Dr. José Frota de Fortaleza, diretora científica da Sociedade de Anestesiologia do Estado do Ceará (Saec), membro do Comitê de Anestesia Pediátrica da SBA

Deoclécio Tonelli, TSA-SBA (SP)Responsável pelo CET Integrado da Faculdade de Medicina do ABC, responsável pelo Serviço de Dor do Hospital Mário Covas e do Hospital Brasil, Membro do Comitê de Anestesia Ambulatorial da SBA

Fernando Antonio CarneiroDoutor em Medicina pela Santa Casa de São Paulo, chefe do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Goiás (UFG), membro da Comissão de Título Superior em Anestesiologia (TSA) da SBA

Fernando Antônio Nogueira Cruz MartinsResponsável pelo CET da SBA do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo, mestre e doutor em Ciências, segundo tesoureiro da Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo (Saesp) (2010-2011)

Florentino Fernandes Mendes, TSA-SBA (RS)Professor adjunto doutor em Anestesiologia do Departamento de Clínica Cirúrgica da UFCSPA, mestre em Farmacologia pela UFCSPA, responsável pelo CET da SBA da UFCSPA

Gualter Lisboa RamalhoEspecialista em Anestesiologia com atuação na Área de Tratamento da Dor pela SBA, especialista em Acupuntura pela Sociedade Médica Brasileira de Acupuntura (SMBA), membro do Comitê de Dor da SBA, professor de Anestesiologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

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Irimar de Paula PossoProfessor associado do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), professor titular de Anestesiologia da Universidade de Taubaté (Unitau), médico anestesiologista do Hospital Israelita Albert Einstein

João Aurilio Rodrigues EstrelaPresidente do Comitê de Anestesia Locorregional da SBA, ex-presidente da SBA (2006), anestesiologista do Hospital Universitário da UFPB

Jose Eduardo Bagnara OroszCorresponsável pelo CET da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), membro da Comissão Científica da Saesp, membro do Comitê de Anestesia Ambulatorial da SBA

José Fernando Bastos FolgosiPresidente do Comitê de Anestesia Cardiovascular e Torácica, instrutor corresponsável do CET da SBA Dr. Juca Ludovico e Dr. Eduardo Bufaiçal, presidente da Sociedade de Anestesiologia do Estado de Goiás (Saego) (2009-2010)

Luis Claudio de Araujo Ladeira TSA/SBACorresponsável pelo CET/SBA Centro de Anestesiologia da Universidade de Brasília,chefe do Centro de Anestesiologia da Univesidade de Brasília

Magda Lourenço Fernandes (MG)Anestesiologista da Santa Casa de Belo Horizonte e do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), responsável pelo CET da Santa Casa de Belo Horizonte, diretora científica da Sociedade de Anestesiologia de Minas Gerais (Samg), membro do Comitê de Anestesia Pediátrica da SBA

Paulo Adilson HerreraResponsável pelo CET do Hospital Evangélico de Londrina, mestre em Medicina Interna da Universidade Estadual de Londrina (UEL), especialista em Dor e Cuidados Paliativos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Renato Santiago Gomez, TSA-SBA (MG)Professor associado do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da UFMG, corresponsável pelo CET do Hospital das Clínicas da UFMG, presidente do Comitê de Anestesia Ambulatorial da SBA

Ricardo Lopes da SilvaResponsável pelo CET da SBA da Santa Casa de Curitiba, doutor em Clínica Cirúrgica

Ricardo Vieira CarlosMembro do Comitê de Anestesia Obstétrica da SBA, médico anestesiologista da Maternidade Pró Matre Paulista, médico assistente do Instituto da Criança (ICr) do Hospital das Clínicas (HC) da FMUSP, membro da Comissão Científica da SAESP

Rômulo Frota Lôbo, TSA-SBA (CE)Corresponsável pelo CET do Hospital Geral de Fortaleza, vice-presidente da Saec, membro do Comitê de Anestesia Obstétrica da SBA

Vinícius Pereira de Souza, TSA-SBA (MG)Presidente do Comitê de Anestesia Obstétrica da SBA (2010), coordenador do Serviço de Anestesiologia do Hospital Mater Dei de Belo Horizonte, primeiro secretário da Samg

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Sumário

Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9Edno Magalhães

Capítulo 1

medicina perioperatória .................................................................................... 11Cláudia Regina Fernandes, Florentino Fernandes Mendes

Capítulo 2

Anestesia intravenosa total para cirurgia ambulatorial ................................... 27Deoclécio Tonelli, Jose Eduardo Bagnara Orosz, Renato Santiago Gomez

Capítulo 3

Conduta anestésica no paciente pneumopata — Avaliação e preparo pré-operatório ...................................................................................... 39Fernando Antônio Nogueira Cruz Martins, José Fernando Bastos Folgosi, Ricardo Lopes da Silva

Capítulo 4

infecção e anestesia — Parte i ........................................................................ 51Ana Luft, Cláudia Regina Fernandes, Florentino Fernandes Mendes

Capítulo 5

infecção e anestesia — Parte ii ........................................................................ 65Ana Luft, Cláudia Regina Fernandes, Florentino Fernandes Mendes

Capítulo 6

Condutas anestésicas nas síndromes hemorrágicas obstétricas ................. 77Ricardo Vieira Carlos, Rômulo Frota Lôbo, Vinícius Pereira de Souza

Capítulo 7

Tratamento farmacológico da dor neuropática ............................................... 89Irimar de Paula Posso, Gualter Lisboa Ramalho, Paulo Adilson Herrera

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Capítulo 8

Peridural torácica ............................................................................................. 99Adilson Hamaji, Fernando Antonio Carneiro, João Aurilio Rodrigues Estrela, Luis Claudio de Araujo Ladeira

Capítulo 9

Transplante de órgãos na criança — Transplante renal ................................ 111Daniela Bianchi Garcia Gomes, Danielle M. H. Dumaresq, Magda Lourenço Fernandes

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PREFÁCIo

Idade avançada, comorbidades aumentadas, pacientes de alto risco e polimorfismos diversos, agora mostrados pela farmacogenômica, caracterizam a prática atual da anestesia. Soma-se ainda o cres-cimento contínuo da gama de intervenções cirúrgicas para tornar a prática da anestesia mais com-plexa que a simples provisão da anestesia perioperatória. Chegamos à medicina perioperatória.

O Departamento Científico da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, por meio de sua Comis-são de Educação Continuada, apresenta a seus associados mais uma ferramenta valiosa e neces-sária para a atualização científica constante.

O volume X da série 2010 do Curso de Educação a Distância em Anestesiologia comemora o décimo aniversário de mais um excelente projeto de ensino da Sociedade Brasileira de Anestesio-logia (SBA).

Este livro é o resultado do esforço dedicado e contínuo de editores, membros de comissões, comitês e colaboradores voluntários associados à SBA.

De valor pedagógico já comprovado nos nove anos que o antecedem, o volume X do Curso de Educação a Distância em Anestesiologia certamente acrescentará algo na atualização de conheci-mentos, princípios e abordagens próprios do caráter dinâmico da anestesiologia.

É motivo de justo orgulho apresentá-lo a nossos associados.

Edno MagalhãesDiretor do Departamento Científico da SBA

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Capítulo 1

mediCinA PerioPerATóriA

Cláudia Regina FernandesFlorentino Fernandes Mendes

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12 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

CONSTRuçãO DE um CONCEITO Greene, em 1992, durante a 31a Rovenstine Lecture realizada no congresso anual da Sociedade Ameri-cana de Anestesiologia, fez uma reflexão sobre as mudanças que haviam ocorrido, nos últimos 50 anos, na atividade do anestesiologista e propôs uma mudança do nome da especialidade para melhor refletir as novas atividades desempenhadas pela moderna anestesiologia.1 A denominação medicina periope-ratória (MPO) foi proposta por Saidman, dois anos mais tarde, durante a 33ª Rovenstine Lecture.2

Desde então, o termo MPO ganhou aceitação e foi agregado ao nome de vários serviços de anestesiologia.3

Em 1998, pesquisa realizada com anestesiologistas de 60 países evidenciou que MPO era o nome preferido por 61,3% para ser a nova denominação da especialidade.4

Pela própria definição de MPO, a prática e o escopo da anestesiologia são ampliados e di-recionados ao cuidado médico global do paciente cirúrgico, não mais restringindo-se apenas à administração da anestesia. Trata-se de melhorar a qualidade, a segurança e os resultados do paciente antes, durante e depois do procedimento cirúrgico. A opção por envolver-se com qua-lidade e segurança e com a melhoria dos resultados aproxima de forma estreita a MPO do novo paradigma de medicina baseada em evidências5 e também das ações que visam desenvolver qualidade e segurança. MPO é a prática da medicina que abrange todos os aspectos da atenção ao paciente. Ela compreende uma sequência de cuidados que vão desde a decisão de realizar a cirurgia, ou o procedimento não cirúrgico, até o momento em que o paciente tem alta do hospital (podendo ir até mais além).6

Assim, do ponto de vista clínico, a MPO significa prover ao paciente, com base em evidências científicas e resultados, cuidados relacionados ao preparo pré-operatório, à anestesia, à evolução pós-anestésica, à recuperação pós-operatória e ao tratamento da dor.

Os objetivos deste capítulo são descrever a interface entre a MPO e a medicina baseada em evi-dência; enfatizar pontos como a avaliação pré-operatória, a estratificação do risco anestésico-cirúrgico dos pacientes e a importância da interconsulta com especialistas; demonstrar o papel da reabilitação precoce e da interdisciplinaridade no contexto da MPO; descrever o impacto sobre custos, gestão e indicadores de desempenho e de boas práticas clínicas quando se pratica a MPO; descrever al-gumas etapas para estruturação de um serviço interdisciplinar de avaliação pré-operatória, sobre a importância de protocolos assistenciais e a implantação da cultura da prevenção.

mEDICINA pERIOpERATóRIA E mEDICINA BASEADA Em EvIDêNCIAMedicina baseada em evidência (MBE) é definida como o uso consciente, explícito e crítico da melhor evi-dência atual, integrando com a experiência clínica os valores e as preferências do paciente.7

A MBE é um movimento que preconiza o uso dos resultados de pesquisa clínica de boa qualidade no atendimento do paciente; valoriza a aplicação de medidas de acurácia dos testes diagnósticos, a força de predição de marcadores prognósticos, a atenção para eventuais danos decorrentes do tratamento, bem como a precisão das medidas de benefícios decorrentes das intervenções terapêuticas e preventivas.

Na proposta da MBE, a opinião, o comentário e a evocação do mito não se qualificam como fundamento para a tomada de decisão clínica, uma vez que eles podem ser confundidos pelo efeito placebo, pelo acaso e pelos vícios de observação. A prática da MBE implica incorporar à experiência clínica as habilidades de recuperar a informação, avaliá-la criticamente, aplicá-la no contexto clínico e apresentar ao paciente os benefícios e danos decorrentes.8

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Capítulo 1 Medicina perioperatória 13

Assim, não é surpresa que exista uma tensão frequente entre o empirismo e a MBE, pois na prática clínica o conhecimento adquirido com a experiência muitas vezes não coincide com os resultados obtidos por intermédio de uma abordagem utilizando a MBE. A especialidade médica reconhece que há um estado de arte na medicina. Entende-se que dados derivados de rigorosos estudos clínicos, quando aplicados criticamente, são mais convincentes do que opiniões pessoais. Quando intervenções preventivas e terapêuticas são consideradas, existem diferentes níveis de evidência com diferenças hierárquicas (Quadro 1).9

Quadro 1. Níveis de evidência para intervenções terapêuticas

Nível de evidência Terapia — Prevenção — Etiologia — Dano

1ABC

Revisão sistemática (com homogeneidade*) de ensaios clínicos randomizados e controlados Ensaios clínicos randomizados e controlados (com intervalo de confiança estreito)Resultados terapêuticos do tipo tudo ou nada

2ABC

Revisão sistemática (com homogeneidade*) de estudos de coorteEstudo de coorte (incluindo ensaio clínico randomizado de menor qualidade < 80% de seguimento)Estudo observacional de resultado terapêutico; estudo ecológico

3AB

Revisão sistemática (com homogeneidade*) de estudos de caso-controleEstudo de caso-controle

4 Relato de casos (incluindo coorte ou caso-controle de menor qualidade**)

5Opinião desprovida de avaliação crítica explícita, baseada em consensos, estudos fisiológicos, com materiais biológicos ou modelos animais

* Homogeneidade significa revisão sistemática livre de variações preocupantes (heterogeneidade) em direções e graus dos resultados entre os estudos individuais. Nem todas as revisões sistemáticas com heterogeneidade estatisticamente significativa devem ser preocupantes, nem todas as heterogeneidades preocupantes precisam ser estatisticamente significativas.** Estudo de coorte de má qualidade é aquele que não define claramente os grupos de comparação, ou não mede as exposições e os desfechos do mesmo modo (preferencialmente encoberto) em indivíduos expostos e não expostos, ou não identifica nem controla adequadamente os confundidores conhecidos, ou não faz o seguimento completo e suficientemente longo dos pacientes.

Um estudo de caso-controle de má qualidade é aquele que não define claramente os grupos de comparação ou não mede as exposições e os desfechos do mesmo modo encoberto e objetivo em casos e controle ou não identifica nem controla adequadamente os confundidores conhecidos.

Após estabelecer-se o nível de evidência é possível classificar os estudos em graus de reco-mendação (Quadro 2).10

Quadro 2. Estudos e graus de recomendação

Grau de recomendação Estudos

A Consistentes estudos de nível 1

B Consistentes estudos de níveis 2 e 3 ou extrapolação de estudos de nível 1

C Estudos de nível 4 ou extrapolação de estudos de níveis 2 e 3

D Nível 5 ou estudos inconclusivos de qualquer nível

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14 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

A prática clínica deveria, sempre que possível, ser baseada em estudos com nível de evidência 1 e grau de recomendação A. Em alguns casos, entretanto, não é possível obter esse nível de evidência para intervenções particulares.9

Um ensaio clínico bem conduzido é a metodologia experimental mais robusta e confiável para comparar intervenções preventivas ou terapêuticas. Um estudo clínico randomizado é geralmente considerado grande se inclui no mínimo mil pacientes.11

As revisões sistemáticas caracterizam-se pelo emprego de métodos rigorosos e explícitos de identificação, avaliação e síntese de artigos científicos originais, obtidos de todas as fontes de in-formação científica pertinentes à questão clínica revisada. A possibilidade de a evidência resultante da revisão sistemática ser verificada, conferida e reproduzida é que a coloca como a evidência mais convincente.12

Uma revisão sistemática de boa qualidade deve satisfazer alguns critérios: definição clara da questão da pesquisa-alvo da revisão, busca ampla e sistemática de artigos originais de interesse, estratégia de busca explicitada de forma detalhada, critérios bem definidos de inclusão de artigos, avaliação crítica da qualidade dos artigos originais incluídos, relação dos artigos excluídos com os motivos da exclusão, forma de obtenção dos resultados originais explicitada, análise apropriada dos resultados, se possível por meio de metanálise, análise de subgrupo por desenho de estu-do dos artigos originais, metarregressão pela qualidade dos artigos (na ausência de exclusão), avaliação da heterogeneidade dos artigos originais, exploração de eventual presença de viés de publicação, discussão sobre as limitações do estudo e das evidências obtidas.9

AvALIAçãO pRé-OpERATóRIA, ESTRATIfICAçãO DO RISCO ANESTéSICO-CIRúRGICO DOS pACIENTES E ImpORTâNCIA DA INTERCONSuLTA COm ESpECIALISTASTalvez a mais importante atividade da MPO seja o desenvolvimento de clínicas de avaliação pré-opera-tória. Assim, não é surpresa que muitos centros médicos estejam dispostos a desenvolver programas de avaliação pré-operatória, objetivando, com isso, melhorar a qualidade dos serviços prestados e a utilização do centro cirúrgico.13-16

Segundo Roizen et al., a maior razão para o desenvolvimento de clínicas de avaliação pré-operatória foi a redução da morbidade perioperatória, por meio da otimização da condição clínica e emocional do paciente.17 Conforme Pasternak, a avaliação pré-operatória do paciente submetido à cirurgia é feita para acrescentar segurança e eficiência ao processo perioperatório.18

As clínicas de avaliação pré-operatória ambulatorial (APOA) são um excelente caminho para de-monstrar a importância da avaliação pré-operatória e adicionar valor ao processo de atendimento ao paciente cirúrgico.19 Elas não englobam o conceito de MPO, que é mais amplo, mas sem seu desenvolvimento não se poderá falar desse conceito.

Consultas em clínicas especializadas Na avaliação pré-operatória, o encaminhamento de pacientes para outros especialistas era, até algum tempo atrás, conduta de cirurgiões. Com o surgimento das clínicas de APOA, a decisão dessas inter-consultas passou a ser do anestesiologista.20,21

Em pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas, a avaliação pré-operatória realizada com o concurso do anestesiologista pode reduzir a necessidade de avaliações clínicas, especialmente pelo cardiologista.22 O contrário acontece com a avaliação realizada pelo clínico, uma vez que esta é associada com interconsultas mais frequentes a especialistas.22,23

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Capítulo 1 Medicina perioperatória 15

Além disso, verificou-se que a consulta realizada pelo clínico não indica qualquer alteração no manejo transoperatório em 70% dos casos24 e que o uso criterioso de exames laboratoriais e con-sultas a especialistas está associado com menor retardo e cancelamentos de cirurgias.25

O desenvolvimento de clínicas de avaliação pré-operatória por anestesiologistas é fenômeno relativamente novo e tem sido universalmente difundido.26

A necessidade de diminuir a prática de solicitação de exames laboratoriais pré-operatórios de “rotina”,16,27,28 aumentar as cirurgias ambulatoriais ou com internação no mesmo dia da cirurgia,13 reduzir custos,25,29 diminuir o tempo de permanência hospitalar,30 melhorar a qualidade dos servi-ços,29,30 melhorar a satisfação dos pacientes,22,31,32 evitar o cancelamentos de cirurgias,21 estratificar e reduzir riscos33 e melhorar processos32 tem sido citada como justificativa, isolada ou associada, para a implantação desses serviços. A clínica de avaliação pré-operatória é um investimento posi-tivo para o serviço de anestesia e para o hospital, porque diminui custos, melhora a eficiência do atendimento clínico, possibilita o desenvolvimento de protocolos de avaliação clínica, desenvolve programas educacionais e aumenta a satisfação de pacientes e cirurgiões.26

Além disso, a consultoria médica em anestesiologia, obtida com antecedência, facilita o pla-nejamento da anestesia, da monitorização e do suporte perioperatório. A avaliação pré-operatória anestésica ambulatorial permite melhor atendimento, por haver mais tempo para a consulta, além de proporcionar também melhor documentação das informações obtidas.22

É importante notar que avaliações inadequadas, com falta de informações, foram identificadas como fator desencadeante de eventos adversos, segundo estudo australiano de incidentes anes-tésicos.34

A suspensão cirúrgica e os atrasos no dia da cirurgia são causas significantes de frustração para pacientes e médicos,13 e a diminuição das suspensões de cirurgias e da permanência hospi-talar são os maiores benefícios atribuídos à criação de clínicas de APOA.35

A clínica de avaliação pré-operatória é frequentemente o primeiro contato do paciente com o serviço de anestesiologia e com o hospital. Durante o atendimento, facilidades no funcionamento e eficiência organizacional influenciam a percepção do paciente em relação à qualidade do servi-ço prestado pela instituição hospitalar.15 Em estudo, verificaram-se índices de satisfação de 99%, 97% e 76% de pacientes, de anestesiologistas e de cirurgiões, respectivamente, com a clínica de APOA.31

ORGANIzAçãO E ESTRuTuRAçãO DE um SERvIçO DE mEDICINA pERIOpERATóRIAO grau no qual o papel do anestesiologista como médico perioperatório se expandirá não está claro, mas é provável que, em instituições selecionadas, o anestesiologista irá tornar-se o médico dominante do cuidado médico perioperatório. Somente a adequada avaliação e o conhecimento individual da condição do paciente podem evitar atrasos, diminuir a angústia e facilitar o cuidado ótimo, reduzindo a possibilidade de complicações anestésicas e contribuindo para a melhora da satisfação e dos desfe-chos apresentados pelos pacientes.36

O manejo do paciente no período perioperatório é frequentemente fragmentado, não padroniza-do e conduzido por múltiplos grupos, com focos dispersos e variados graus de comunicação.37

Do ponto de vista do paciente o gerenciamento do período perioperatório engloba todos os aspectos e cuidados desde o início do sintoma cirúrgico, passando pela decisão de realizar a cirurgia, a anestesia e o período pós-operatório imediato, até o paciente ser atendido na consulta final. Portanto o período inclui logística, comunicação e alterações médicas que deveriam ser co-

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16 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

ordenadas para prover segurança, transparência, medicina baseada em evidências e satisfação do paciente.37 A implantação de um serviço de MPO com a ótica anteriormente descrita depende de cultura local, liderança, motivação, envolvimento do grupo, sistema de gestão e capital humano disponível, entre outros. Dessa forma, uma estratégia vitoriosa utilizada em uma instituição não garante que será bem-sucedida quando utilizada em outra.

Embora não exista fórmula capaz de garantir o desenvolvimento com sucesso da MPO, algu-mas iniciativas podem facilitar sua implantação (Quadro 3).

Quadro 3. Estratégias para desenvolvimento/expansão do serviço de anestesia

Realizar o planejamento estratégico do serviço de anestesia

Difundir o conceito de MPO dentro do serviço e da instituição

Obter o apoio dos gestores e envolver-se com a gestão do centro cirúrgico e do hospital

Trabalhar em equipe e desenvolver lideranças dentro do serviço de anestesia

Trabalhar em conjunto com as demais especialidades médicas envolvidas com o paciente cirúrgico

Estruturar um espaço físico apropriado para avaliação clínica pré-operatória

Criar e monitorizar indicadores de desempenho

Desenvolver cultura de segurança

Avaliar processos e buscar continuamente melhorias

Avaliar as oportunidades e expandir áreas de atuação

Investir no desenvolvimento do capital humano

Realizar o planejamento estratégico do serviço de anestesiaÉ importante definir com os membros da equipe do serviço de anestesia a visão (o que o serviço pre-tende ser em alguns anos, qual a imagem que o serviço deseja ter perante a sociedade), a missão (o que se deve fazer para atingir a visão) e os valores (quais valores o serviço executará em sua missão). Mais importante ainda é definir as ações que serão tomadas para realizar a visão e a missão, por quem, em quanto tempo, quais os resultados esperados, como serão monitorados, entre outras definições. O planejamento estratégico do serviço de anestesia, necessariamente, deve estar alinhado com o da instituição hospitalar.

Difundir o conceito de mpO dentro do serviço e da instituiçãoO desenvolvimento e a implantação da MPO dentro do serviço de anestesia deveria ser um processo natural resultante de seu desenvolvimento. A inovação e a mudança não deveriam ser percebidas como ameaças e deveria existir um grupo altamente motivado e interessado em seu desenvolvimento. Infeliz-mente aquilo que idealizamos quase nunca ocorre. Um dos maiores obstáculos, senão o maior, para a implantação da MPO é a cultura do serviço de anestesia, da instituição hospitalar e do meio onde ambos estão inseridos. A maioria dos anestesiologistas foi treinada para atuar realizando o ato anestésico, a ava-liação pré-anestésica e para ter algum envolvimento com o tratamento da dor aguda pós-operatória. As habilidades necessárias para atuar como médico perioperatório vão muito mais além e exigem outro tipo de comprometimento e de treinamento. Assim, dependendo das condições e da massa crítica de cada

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serviço à implantação do novo paradigma — MPO —, será necessário um tempo de maturação, pois há a necessidade de uma mudança de cultura.

O currículo desenvolvido durante a residência médica em anestesia deveria ser voltado para a busca do melhor resultado, focando a avaliação pré-operatória, a estratificação dos riscos, as medidas preventivas, o tratamento da dor, a relação médico-paciente, o bem-estar e a satisfação do paciente, avaliando-se, ao final do tratamento, pelo ponto de vista do paciente, a qualidade do atendimento integral relacionado aos cuidados recebidos. Para se difundir o conceito de MPO, as atividades teóricas relacionadas ao tema devem ser contempladas no currículo da graduação e da residência médica.38

A inserção de estudantes e internos dentro do serviço de anestesia é importante, como também é a construção de um currículo voltado para o entendimento da importância e para a difusão da prática da MPO. É igualmente importante que os membros da equipe de anestesia inseridos no contexto estejam disponíveis para o serviço de anestesiologia, com o objetivo de promover a avaliação pré- -operatória adequada, conduzir a anestesia e o manejo das intercorrências, prover analgesia e cuida-dos intensivos pós-operatórios, incluindo cuidados que têm repercussão no resultado final: adequada analgesia pós-operatória,39 transfusão sanguínea racional,40 controle da hipotermia,41 prevenção de infecção,42 práticas relacionadas à modulação imunológica43 e distúrbios da cognição.44

Obter o apoio dos gestores e envolver-se com a gestão do centro cirúrgico e do hospitalQuase a totalidade dos exemplos bem-sucedidos de serviços que desenvolveram o conceito de MPO e estão inseridos neste também estão inseridos em gestão do centro cirúrgico ou do próprio hospital. A acreditação hospitalar e a gestão da qualidade também se constituem em oportunidades naturais direcionadas a um perfil de liderança comprometido com o resultado, com a satisfação dos pacientes e com os custos associados à prática médica. O desenvolvimento de um programa voltado para a prática da MPO envolve a elaboração do projeto, os objetivos e os resultados desejados, os recursos humanos e materiais necessários, a formatação de protocolos, entre outros. O comprometimento da alta gestão é importante, pois ocorrerão necessidades de ampliação do espaço físico e de sustentação financeira para desenvolver o projeto. Além de, pelo mesmo motivo que acontece com a cultura do serviço de anestesia, ser muito provável a resistência por parte de segmentos da instituição ou da própria cultura institucional ao desenvolvimento da MPO.

Trabalhar em equipe e desenvolver lideranças dentro do serviço de anestesiaTalvez o aspecto mais relevante (e as maiores dificuldades) para o desenvolvimento de um serviço de MPO seja a necessidade de desenvolver e motivar a equipe assistencial dentro desse novo paradigma. É necessário desenvolver lideranças com propósitos firmes, conhecimento científico sólido, democrá-ticas e focadas no desenvolvimento de ações. O trabalho em equipe é conceituado como um modelo mental compartilhado, em que todos os membros estão acordados sobre aquilo que estão tentando fazer. Nesse modelo, deve existir confiança mútua (garantia de que os membros da equipe desempe-nharão seus respectivos papéis), comunicação (do tipo circuito fechado, caracterizado pelo intercâmbio de informações padronizadas), confirmação de que as informações foram recebidas, clareza dos pa-péis de cada um (responsabilidades específicas predeterminadas), clareza nos objetivos (cada um deve realizar tarefas específicas a fim de que se possam determinar o sucesso e o fracasso de cada membro da equipe). O líder ajuda as pessoas a resolverem seus problemas e a fazerem seu melhor trabalho.40

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E quem é a equipe em MPO? Ela é composta de todos os membros da instituição, cujo com-portamento influencia o cuidado do paciente cirúrgico. Nesse contexto, está incluso o próprio paciente, os membros da recepção da instituição, o cirurgião, o corpo de enfermagem e outros profissionais médicos e não médicos, gestores, administradores, provedores de saúde. Todo esse trabalho em equipe deve ter como meta as melhores evidências médicas disponíveis para os cui-dados do paciente cirúrgico, tendo como base a padronização de cuidados e condutas.

Trabalhar em conjunto com as demais especialidades médicas envolvidas com o paciente cirúrgicoO desenvolvimento de um programa de MPO somente será possível, e alcançado em sua plenitu-de, após articulação com outras especialidades médicas (clínica médica, cardiologia, pneumololgia, medicina intensiva, neuropsiquiatria, entre outras) e não médicas (enfermagem, fisioterapia, nutrição, farmácia) que prestam assistência ao paciente cirúrgico, pois a excelência no programa somente é conseguida com a visão da atuação interprofissional, na qual cada membro da equipe sabe exatamente sua atribuição.

A interação com outras especialidades busca o alinhamento de soluções para os problemas da instituição e do paciente, sempre com base nas melhores evidências disponíveis. Dentro da interação com outras especialidades é importante a confecção de protocolos em conjunto. Bons exemplos são os protocolos de solicitação de exames pré-operatórios direcionados para a con-dição clínica do cliente.

O ideal seria que todos os pacientes fossem encaminhados ao ambulatório de avaliação pré- -operatória, se isso não for possível, em virtude de uma demanda alta, é importante a construção de um fluxograma que permita o encaminhamento apropriado de determinado perfil de paciente cirúrgico, tomando como base a existência de comorbidades. Para que isso se processe, existem alternativas como a aplicação no ambulatório de cirurgia de um questionário de triagem baseado na interrogação da existência de doenças associadas apresentadas pelo paciente.

Estruturar um espaço físico apropriado para avaliação clínica pré-operatória Antes de 1980, a avaliação pré-anestésica consistia em realizar uma bateria de testes e avaliar o pa-ciente na noite da cirurgia ou na sala cirúrgica. Fatores econômicos levaram a um explosivo crescimento da cirurgia ambulatorial e a avaliação pré-operatória moveu-se para apropriar-se dessa área. Durante a avaliação pré-operatória, uma localização centralizada proporciona todas as necessidades de avalia-ções, de exames complementares, de registros hospitalares e de providências administrativas, o que é conveniente para o paciente, que não precisa mais visitar diversas áreas do hospital para completar os pré-requisitos necessários para a realização da cirurgia.15

Na avaliação pré-operatória, seis propósitos precisam ser contemplados: avaliação da condi-ção clínica do paciente, discutir e explicar a anestesia, reduzir a ansiedade, discutir o manejo da dor pós-operatória, obter consentimento informado e coordenar o cuidado dos pacientes com outros profissionais.45,46

É muito importante que o anestesiologista avalie o paciente durante o pré-operatório para obter informações e prever a possível resposta durante a cirurgia e para planejar a técnica anestésica mais apropriada e conduzi-la de acordo com os problemas que podem eventualmente surgir.47

Assim, a área física e a logística precisam ser adequadas às necessidades de cada serviço.

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Criar e monitorizar indicadores de desempenho A melhoria da qualidade no período pré-operatório implica que nós decidamos quem são nossos clien-tes internos e externos, o que eles querem e precisam para realizar suas missões, quais processos nós podemos melhorar e quais aspectos desse processo nós vamos medir.48

O cuidado perioperatório ideal, na perspectiva do paciente, leva em consideração o motivo pelo qual ele está ali naquela instituição, pois o paciente espera que ele seja bem tratado, que a equipe que está prestando os cuidados seja coordenada, espera voltar para casa precocemente e com segurança, que haja prevenção das complicações relacionadas à cirurgia, tais como: infec-ção, broncoaspiração, tromboembolismo venoso, eventos cardíacos, eventos adversos, quedas e alterações cognitivas, entre outros.

O cuidado cirúrgico ou perioperatório ideal na perspectiva dos profissionais de saúde leva em consideração o grau de especialidade da equipe, os cuidados baseados nas melhores evidên-cias disponíveis, a satisfação do paciente, a coordenação da equipe de profissionais de saúde envolvida com o paciente, a curta permanência hospitalar, a não readmissão em 30 dias e a pre-venção de complicações relacionadas com a cirurgia. Para reduzir o risco do paciente e melhorar o cuidado precisam-se estabelecer objetivos claros e indicadores válidos para determinar em que patamar se está e o que é necessário fazer para melhorar.38

Em MPO, a padronização de condutas contribui para melhorar o resultado, pois quando exis-te grande variabilidade também existe baixa qualidade. Quando uma ação é executada da mesma maneira, aumenta a probabilidade de fazê-la da maneira mais correta. Dessa forma podem-se inserir práticas cada vez mais superiores em matéria de normatização ou padronização. A padronização de condutas melhora a eficiência e reduz os erros. Com a normatização das condutas é possível que a boa evidência médica seja praticada de forma “automática”, o que possibilita que os profissionais envolvidos possam se concentrar nas outras tarefas que ainda estão em fase de aprendizado ou que não são uma rotina no setor. Busca-se, então, uma maneira-padrão de trabalhar em equipe.

Desenvolver cultura de segurançaO anestesiologista deveria cada vez mais se envolver com os comitês do hospital, com o desenvolvi-mento de centros de avaliação pré-operatória, com a criação e o desenvolvimento de clínicas de trata-mento da dor e com a terapia intensiva.46

O anestesiologista tem obrigação de basear suas decisões na ética e na bioética conside-rando a limitação financeira institucional, porém, levando em conta a segurança e a qualidade do atendimento. Outras habilidades devem ser particularmente desenvolvidas pelo anestesista, como participação no processo de gerenciamento do hospital, desenvolvimento de pesquisa na espe-cialidade, participação na educação e desenvolvimento de anestesia segura.49

Acredita-se que nenhuma mudança de paradigma pode ser proposta sem considerarem-se esses aspectos.

Avaliar processos e buscar continuamente melhoriasA obtenção e o acompanhamento de indicadores antes e após a implantação do serviço de MPO ser-vem para avaliar os processos implantados e para promover ajustes contínuos no desenvolvimento do programa. A avaliação e a melhoria dos processos também objetivam diminuir custos, diminuir média de permanência hospitalar, racionalizar o uso de hemocomponentes e de outros fármacos, buscando a

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melhora na qualidade dos cuidados e dos resultados e a satisfação profissional de todos os membros envolvidos.

Indicadores clínicos e indicadores de resultado somente podem ser obtidos quando todos os membros da equipe assistencial aceitarem sua responsabilidade na obtenção do bom e do mau resultado. Isso, segundo François, em 2002, deveria tornar-se uma providência essencial para melhorar a segurança anestésica, pois, mediante processos de avaliação e feedback, reflete-se sobre as condições do paciente, a estratégia médica e quais providências deveriam ser otimizadas para redução do risco do paciente.29

Avaliar as oportunidades e expandir áreas de atuaçãoA medicina e a anestesiologia estão em permanente mudança com diferentes desafios, exigências e oportunidades. A revolução tecnológica tem propiciado base para essas oportunidades. Se a espe-cialidade ignorar isso ela poderá perder valor e tornar-se menos influente como uma força capaz de beneficiar o paciente e agregar valor. Alterações no cuidado e nos padrões de avaliação da saúde e no gerenciamento da informação têm resultado numa redefinição virtual de cada aspecto do preparo pré-operatório.32

Ao mesmo tempo, a anestesiologia está expandindo seu papel para assumir o que alguns consideram ser uma atividade menos central. Em muitos casos, essa expansão permite ao anes-tesiologista interagir mais com a equipe médica, portanto providenciando oportunidade ampla de melhorar a imagem perante as outras especialidades e a sociedade.50

Investir no desenvolvimento do capital humanoOs problemas com a equipe são as principais causas preveníveis de dano adicional ao paciente.38 Precisam-se explorar novos modelos que permitam melhorar a qualidade do cuidado e colocar a habi-lidade e o conhecimento médico do anestesista no patamar de melhor uso, aproveitando cada oportu-nidade para expandir a esfera de influência e a participação no cuidado à saúde.51 Para a especialidade habilitar-se à expansão devem-se construir jovens anestesistas que possuam educação e treinamento em MPO, pois a percepção do anestesiologista como um especialista perioperatório é um sinal de maturidade do especialista.

DESCREvER O ImpACTO SOBRE CuSTOS E GESTãO DE INDICADORES DE DESEmpENhO E DE BOAS pRáTICAS CLíNICAS quANDO SE pRATICA A mpOA necessidade de diminuírem-se os custos do atendimento à saúde é muita difundida. 52,53 Dados da literatura demonstram que, nos Estados Unidos, aproximadamente 65% das cirurgias são realizadas em regime ambulatorial.54 Quando ocorre aumento das cirurgias ambulatoriais, diminuem-se os custos,54 di-minui-se a média de permanência hospitalar e reduzem-se as taxas de cancelamento de cirurgia.21,35

Considerando-se que 31% do custo hospitalar são decorrentes do paciente internado, o estí-mulo à realização de cirurgia ambulatorial tem proporcionado redução de custos que varia de 20% a 50%.55

Na opinião de van Kley et al., todo paciente é candidato à internação no mesmo dia da cirurgia. O desenvolvimento de programas de estímulo à internação no dia do procedimento ou internação somente após a realização da cirurgia contribui para diminuir a média de permanência.28

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Pollard et al. demonstraram que com esses programas seria evitada a internação de pacientes para completar avaliações, sem previsão ou data para realizar cirurgias, além de melhorar a capa-cidade operacional das equipes e o aproveitamento do horário disponível no centro cirúrgico.30

Em ensaio clínico, prospectivo e randomizado realizado em pacientes submetidas à histeros-copia, o custo foi quatro vezes menor no grupo ambulatorial, quando comparado com o do grupo internado.56

A implantação de clínicas de avaliação pré-operatória está associada com desfechos favorá-veis que levam a reduções significantes de custos, sem afetar adversamente o cuidado com o pa-ciente: redução dramática dos exames pré-operatórios realizados; diminuição das interconsultas com outras especialidades e diminuição do tempo médio de permanência hospitalar. Embora a avaliação ambulatorial anestésica esteja associada com cuidado eficiente e seguro, alguns anes-tesiologistas acreditam que o preparo pré-operatório deveria ser uma responsabilidade primária do cirurgião. Essa abordagem tipicamente resulta em altas taxas de exames solicitados desne-cessariamente, atrasos significantes no início das cirurgias e frequentes cancelamentos. Mais importante, os pacientes podem não ser preparados adequadamente para submeterem-se ao estresse anestésico-cirúrgico.22

A redução de custos associados com a diminuição dos testes laboratoriais, com a diminuição das consultas especializadas e com a diminuição das taxas de suspensões de cirurgias é impor-tante, mas pequena quando comparada com a diminuição de custos associados com a menor permanência hospitalar.22 Assim, intervenções que decrescem a permanência hospitalar podem resultar em considerável economia.30,35

Em estudo comparando resultados antes e depois da introdução da APOA encontraram-se decréscimo de 30% nas suspensões de cirurgias por razões médicas, diminuição no tempo de admissão pré-operatória, aumento da taxa de admissão no mesmo dia da cirurgia e diminuição do número de exames pré-operatórios do tipo: eletrocardiogramas (ECG) e de exames radioló-gicos de tórax (Rx de tórax).28 Somente 13% das suspensões de cirurgias foram devidas à falta de condições clínicas dos pacientes. O desenvolvimento de clínicas de APOA tende a aumentar a padronização e reduzir a variabilidade nos julgamentos feitos pelos anestesiologistas do centro cirúrgico, reduzindo atrasos e obtendo as condições necessárias para o desenvolvimento de ci-rurgias ambulatoriais ou com internação no mesmo dia da cirurgia.57

Em estudo sobre o tema, a taxa de suspensão de cirurgias de pacientes que receberam avalia-ção pré-anestésica ambulatorial entre 24 horas a 30 dias antes da cirurgia foi comparável à taxa de suspensão de pacientes ambulatoriais que receberam a avaliação nas 24 horas antes da cirurgia. Como os grupos foram similares, conclui-se que os pacientes podem ser vistos no tempo mais conveniente, sem que isso afete adversamente a taxa de cancelamentos de cirurgias.58

Traber et al. avaliaram 500 cirurgias consecutivas realizadas como primeiro caso na programa-ção diária e demonstraram que os pacientes que foram avaliados pela clínica de avaliação pré- -operatória tiveram menores retardos (1,7 vez) no início das cirurgias, quando comparados com os que não foram avaliados.59

Diversos estudos têm demonstrado uma redução no tempo de admissão pré-operatória e na média de permanência.26,28,30 Essa redução resulta de um aumento no número de admissões no mesmo dia da cirurgia ou de um aumento do número de pacientes que são submetidos a cirurgias em regime ambulatorial.28,30

Metodologia clara para identificar a contribuição do anestesiologista no custo hospitalar fre-quentemente não está disponível. Fischer25, em Stanford, demonstrou redução de 87,9% na taxa de suspensão de cirurgias após a implantação de uma clínica de avaliação pré-operatória, com

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maior satisfação dos anestesiologistas quando os pacientes foram avaliados pela clínica. Substan-cial redução de custos pode ser observada por meio da redução do número de exames labora-toriais solicitados. No primeiro ano de APOA na Universidade de Stanford a redução dos exames determinou uma economia de 52,3%, ou 112,09 dólares por paciente, resultando em redução de custos no ano de 1995, somente neste item, em 1,01 milhão de dólares para o hospital. Disso resultou melhora na utilização do centro cirúrgico e maior renovação dos pacientes internados.60

ExAmES DE LABORATóRIO E ExAmES COmpLEmENTARESUma justificativa financeira comum atribuída à criação de clínicas de avaliação pré-operatória é a re-dução de exames pré-operatórios, o que potencialmente salva grandes somas em dinheiro. Para se reduzir o uso excessivo de exames primeiramente é necessário demonstrar aos anestesiologistas que alguns são desnecessários.57

De fato, o uso de testes de triagem pré-operatórios para detectar doenças tem motivado inúme-ras publicações,20,23,35,32,61-63 as quais têm demonstrado que poucos testes beneficiam ou alteram o cuidado dos pacientes, o que contribui substancialmente para aumentar os custos hospitalares. Um teste desnecessário é ineficiente, caro e muitas vezes indica estudos adicionais. Estes quando inapropriados podem levar ao diagnóstico de falsos-positivos, determinar cancelamentos ou atra-sos das cirurgias e acrescentar aumento potencial de riscos aos pacientes.13

Desde a década de 1980 passou-se a verificar a efetividade da indicação de exames de labo-ratório de acordo com a história e com o exame físico do paciente.26

Com isso, alguns centros conseguiram demonstrar que determinados pacientes não necessi-tam de exames para a realização de suas cirurgias.35

A tendência atual é de se realizarem exames segundo os dados positivos da história clínica ou do exame físico, de acordo com a necessidade dos cirurgiões, ou clínicos, de determinados exames que podem sofrer alterações durante a cirurgia e conforme a inclusão do paciente numa população de alto risco para alguma condição específica, ainda que sem dados positivos na his-tória clínica ou no exame físico.18,27

Reduções consideráveis nos gastos hospitalares foram obtidas após a definição do padrão mí-nimo de exames laboratoriais, sem que isso afetasse a qualidade da avaliação dos pacientes.13,29

Estudos têm demonstrado redução do custo com exames pré-operatórios, quando os testes são coordenados por intermédio de clínica de APOA.13,25,64

Em estudo realizado com população com mais de 70 anos de idade, embora houvesse preva-lência de testes anormais variando de 0,5% até 12%, não houve associação entre resultados dos testes pré-operatórios e desfechos clínicos desfavoráveis.65

TRATAmENTO DA DOREm adição à melhora da analgesia por fatores humanitários é importante fornecer a melhor qualidade de alívio possível da dor, pois conhece-se que a dor também tem um importante papel na fisiopatologia da lesão tecidual e pode prolongar a recuperação do trauma cirúrgico.

O trauma cirúrgico acarreta importantes alterações neuroendócrinas, com a liberação de uma variedade de mediadores como catecolaminas, corticoides, vasopressina, citocinas e fatores en-doteliais que implicam aumento do metabolismo e catabolismo. Esses mediadores podem também levar à imunossupressão e à disfunção de múltiplos órgãos.39 Muitas dessas alterações levam ao desenvolvimento de complicações pós-operatórias e é importante que o anestesiologista entenda

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a fisiopatologia da resposta ao estresse, para que possa estar atento para executar a prevenção e diminuir os danos. Em hospitais auditados, o tratamento da dor pós-operatória é inadequado em 13% a 80% dos casos.47

Tratamento intensivo pós-operatórioEm virtude da habilidade do profissional anestesiologista em cuidar de pacientes críticos, este tem-se envolvido cada vez mais em unidades de terapia intensiva como campo de atuação. Nas últimas dé-cadas, o aumento da complexidade da condição clínica do paciente cirúrgico, associado à abordagem em pacientes cada vez mais idosos, incorre na necessidade de se estabelecerem cuidados intensivos pós-operatórios em cenários de unidades de terapia intensiva, sob a tutela de anestesiologistas.47

Pronovost et al. demonstraram que o round diário por um médico da unidade de cuidados intensivos foi associado com redução de dois terços na mortalidade de pacientes recuperando-se de cirurgia de aorta abdominal, com diminuição associada de custos.66

Em quase todas as especialidades cirúrgicas tem acontecido um aumento na duração e na complexidade das cirurgias. Isso tem confrontado o anestesiologista com a necessidade de man-ter a homeostasia do paciente sob contínuas alterações nas condições cirúrgicas. Então a ha-bilidade do anestesiologista para manter o cuidado intensivo durante o transoperatório tem-se estendido para manter/sustentar dados relacionados com problemas inerentes ao cuidado médico intensivo pós-operatório.47 A terminologia MPO enfatiza a contribuição do anestesiologista para o cuidado médico fora da sala de cirurgia.67

No Brasil, ainda não é tão frequente a existência de unidades de terapia intensiva exclusivamente pós-operatória, embora seja uma necessidade, pois com o envelhecimento da população passaram- -se a realizar cirurgias cada vez mais complexas em pacientes cada vez mais idosos e com várias doenças associadas. Durante o período pós-operatório são imperativos o entendimento da resposta endócrino-metabólica relacionada ao trauma cirúrgico, o entendimento sobre a reposição volêmica e a terapia transfusional, o equilíbrio hidroeletrolítico, a ventilação mecânica e a terapia analgésica. Em nosso entender o anestesiologista é o profissional mais adequado, quando capacitado, para realizar esses cuidados, em razão de seu conhecimento técnico nessa área e de sua habilidade com esse tipo de doente. Nos países desenvolvidos, é uma regra os anestesiologistas tomarem conta das uni-dades de terapia intensiva, no Brasil nem todas as instituições adotam essa prática.

Em conclusão, a MPO constitui-se em uma extensão natural da anestesiologia, em consonân-cia com os avanços científicos da medicina. O grau de expansão dos serviços em direção à MPO não está claro, e novas habilidades, além das necessárias no modelo tradicional, serão exigidas: avaliação pré-operatória, otimização da condição clínica, medicina baseada em evidências, tra-tamento da dor, cuidados intensivos, liderança, trabalho em equipe, relacionamento e interação com as demais especialidades, gestão da qualidade, entre outras. Nenhuma dessas habilidades é estranha ao meio ou difícil de se desenvolver e não existe fórmula segura capaz de assegurar a expansão da anestesiologia em direção à MPO.

A MPO formaliza a atuação do anestesiologista para além da sala de operações, propiciando oportunidades para ampliar a área de atuação e exigindo um novo modelo de entendimento, de comportamento e de treinamento dos futuros profissionais.

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Capítulo 2

AneSTeSiA inTrAvenoSA ToTAL PArA CirurgiA

AmBuLAToriALDeoclécio Tonelli

Jose Eduardo Bagnara OroszRenato Santiago Gomez

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INTRODuçãOA anestesia geral é chamada de anestesia intravenosa total (AIT) quando é obtida por meio de admi-nistração exclusiva de agentes intravenosos. Essa técnica ganhou aceitação nos últimos anos após a introdução de novos fármacos com características farmacocinéticas que permitem administração venosa contínua. Em geral, as drogas administradas na AIT são menos tóxicas para o profissional do que os agentes inalatórios, pois não causam poluição do ambiente, além de não apresentarem risco de hipertermia maligna.1 A AIT proporciona maior estabilidade hemodinâmica e redução do estresse ci-rúrgico. Nessa técnica anestésica, utilizam-se diferentes drogas com o objetivo de se obterem hipnose (propofol, cetamina, metoexital, midazolam) e analgesia (remifentanila, fentanila, alfentanila, sufentanila e cetamina).

Alguns anestesiologistas salientam as desvantagens dessa técnica como prolongamento do período de recuperação, o que pode ser minimizado pelos conhecimentos farmacocinéticos da droga, não deixando de levar em consideração os aspectos individuais relacionados à farmacoci-nética e à farmacodinâmica. Outra preocupação refere-se ao risco de recuperação da consciên-cia, o que pode ser minimizado pelo uso de monitores da consciência ou de drogas hipnóticas de acordo com suas características farmacocinéticas. Nos últimos anos, a associação de propofol e remifentanila, em infusão contínua, tornou-se a técnica de AIT mais popular, sendo sinônimo de AIT em muitos serviços. O propofol pode ser titulado com base na análise do índice bispectral (BIS) ou mantendo uma concentração-alvo suficiente de forma constante para assegurar a hipnose. Por outro lado, a administração de remifentanila pode ser ajustada de acordo com o estímulo cirúrgico e o grau de nocicepção.

Atualmente, várias cirurgias estão sendo realizadas ambulatorialmente em pacientes com maior risco cirúrgico [American Society of Anesthesiologists (ASA) III e IV]. Portanto, a técnica anestésica deve ser segura, eficaz e com boa relação entre custo e benefício. Neste capítulo, a AIT será com-parada com as diferentes técnicas de anestesia para cirurgia ambulatorial. Será também abordado o desenvolvimento das diferentes técnicas de AIT.

COmpARAçãO DA AIT COm OuTRAS TéCNICAS ANESTéSICAS Em estudo de artroscopia de joelho, o uso da AIT com propofol resultou em menor tempo para micção do que a anestesia regional com bloqueio de nervo femoral e ciático.2 Em estudo de coleta ovular, houve redução de 20% na dose-alvo de propofol controlada sem qualquer benefício clínico adicional.3 Na cirurgia de rinosseptoplastia, não se observaram diferenças em parâmetros hemodinâmicos, perfil de recuperação e custos entre a manutenção da anestesia com desflurano/remifentanila e propofol/remifentanila.4

Estudo envolvendo 1.158 pacientes adultos, submetidos a diferentes tipos de cirurgia em regi-me ambulatorial, comparou a anestesia com sevoflurano associado ou não ao óxido nitroso (N2O) com AIT utilizando-se propofol.5 Os autores encontraram maior incidência de dor à injeção e solu-ços com o propofol, maior incidência de desconforto respiratório e consciência durante a indução com o sevoflurano. O grupo do sevoflurano foi associado à maior incidência de náuseas e vômitos pós-operatórios (NVPO), mas o tempo para a alta hospitalar e a taxa de internação por essa com-plicação foram semelhantes entre os grupos. De forma similar, foi observada menor incidência de NVPO após biópsia de mama com propofol e remifentanila.6 Entretanto, o grupo do sevoflurano e N2O apresentou menor incidência de bradicardia, apneia e dor pós-operatória, mas associou-se com despertar mais lento do que após AIT.

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Capítulo 2 Anestesia intravenosa total para cirurgia ambulatorial 29

São causas importantes de morbidade NVPOs em pacientes submetidos à anestesia geral. Estas podem ser especialmente problemáticas em pacientes ambulatoriais, pois podem retardar a alta hospitalar, provocar admissão inesperada, causar complicações como deiscência de sutura e aspiração de conteúdo gástrico. A estratégia ideal na prevenção de NVPO permanece incerta. Estudo prévio comparou dois esquemas profiláticos de NVPO em cirurgia ginecológica ambulato-rial avaliando a incidência e a gravidade de NVPO antes da alta hospitalar e a incidência de NVPO nas primeiras 24 horas após a alta hospitalar.7 Os autores concluíram que o grupo de pacientes que recebeu AIT com propofol sem medicação antiemética e o grupo submetido à anestesia geral com sevoflurano associado à dolasetrona apresentaram redução na incidência habitual de NVPO. Entretanto, diferentemente do grupo da dolasetrona, a ação antiemética do propofol foi de curta duração, não tendo influência na incidência de NVPO após a alta hospitalar. Outro estudo, comparando AIT com propofol, AIT com propofol mais dolasetrona e anestesia inalatória mais dolasetrona em laparoscopia ginecológica não observou diferença entre os grupos em relação ao uso de antieméticos de resgate antes da alta hospitalar.8 Por outro lado, a incidência de NVPO nas primeiras 24 horas foi maior após anestesia inalatória mais dolasetrona do que no grupo AIT com ou sem dolasetrona.

O esvaziamento gástrico pode ter influência na incidência de NVPO. Foi observado em cirurgia de colecistectomia laparoscópica ambulatorial retardo no esvaziamento gástrico sem diferenças entre o grupo do propofol mais remifentanila e o grupo do sevoflurano sem opioide.9 Por outro lado, a relação de custo e benefício da administração da AIT com propofol e sufentanila foi melhor do que o uso de baixo fluxo de sevoflurano e sufentanila, em colecistectomia laparoscópica ambulatorial.10

Em procedimento de braquiterapia transperineal da próstata, a AIT (fentanila associada ao pro-pofol) permitiu micção e alta mais precoces quando comparada com anestesia geral balanceada (fentanila, tiopental e isoflurano) e raquianestesia com 5 mg de bupivacaína a 0,5%.11 Entretanto, uma limitação importante desse estudo é que as drogas utilizadas na anestesia geral balanceada não eram as mais adequadas para anestesia ambulatorial. Desse modo, o uso do propofol em vez de tiopental e sevoflurano em vez de isoflurano poderia resultar em recuperação e alta mais precoces nesse grupo.

O uso de sedação intravenosa em procedimentos odontológicos ambulatoriais é prática co-mum dos cirurgiões dentistas nos Estados Unidos. Os agentes mais utilizados para sedação moderada ou profunda são os benzodiazepínicos e os narcóticos. Com a introdução de agentes de curta duração como propofol e metoexital, vários estudos demonstraram as vantagens desses agentes na manutenção da sedação.12,13 Estudo prospectivo envolvendo 47.710 pacientes sub-metidos a procedimento odontológico ambulatorial avaliou três esquemas de sedação: propofol mais fentanila, metoexital mais fentanila e benzodiazepínico mais fentanila.14 O grupo do metoexital apresentou maior incidência de efeitos adversos como náusea e vômito (1,1%) quando comparado com os outros grupos. Além disso, ocorreram diferenças estatisticamente significativas entre os efeitos adversos do grupo do benzodiazepínico (0,8%) e do propofol (0,4%). Os autores concluíram que o propofol é a droga mais adequada para esse tipo de cirurgia ambulatorial.

Não existe um protocolo de anestesia ideal para a realização de procedimentos invasivos em pediatria oncológica (punção lombar e aspiração de medula) realizado em caráter ambulatorial. O propofol é largamente utilizado nesses procedimentos, mas pode estar associado à instabilidade hemodinâmica. A cetamina possui ação analgésica e estabilidade cardíaca, mas está associada a efeitos psicomiméticos e prolongamento da recuperação. Estudo prévio demonstrou que a adição de baixas doses de cetamina (0,5 mg/kg), em esquema utilizando propofol e fentanila, resultou na redução do consumo de propofol e fentanila sem prolongar a recuperação.15 A cetamina pos-

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sibilitou maior estabilidade hemodinâmica, entretanto, observou-se maior incidência de agitação durante o despertar com esse agente (40% versus 6%). Existem trabalhos mostrando bons re-sultados com o uso de cetamina em cirurgia plástica sob anestesia local.16,17 O uso do propofol com doses suplementares de cetamina para se obter sedação leve ou profunda em ventilação espontânea não produziu alucinações e NVPO, embora outros estudos não tenham demonstrado benefícios específicos com essa técnica.1

Nos últimos anos, o padrão das cirurgias ambulatoriais mudou com a inclusão de procedimen-tos mais complexos e de maior duração, como a laparoscopia pélvica. Os bloqueadores neuro-musculares são utilizados nessa cirurgia para prevenir o aumento da pressão intra-abdominal e intratorácica induzido pelo pneumoperitônio e melhorar as condições cirúrgicas. Alguns estudos têm demonstrado o manuseio anestésico sem relaxantes durante laparoscopia de curta dura-ção.18,19 A não administração de relaxantes neuromusculares reduz a paralisia residual e pode ser benéfica para uma recuperação segura após laparoscopia cirúrgica ambulatorial. Recente investi-gação avaliou a função cardiorrespiratória em pacientes ambulatoriais submetidos à laparoscopia pélvica.20 Os pacientes foram anestesiados com propofol e remifentanila na presença ou na au-sência de rocurônio. Não houve diferença entre os grupos em relação aos parâmetros avaliados [frequência cardíaca, pressão arterial sistólica, pressão arterial diastólica, end tidal carbon dioxide (ETCO2), pressão de pico inspiratória, volume por minuto expirado e pressão intra-abdominal], sugerindo que os relaxantes neuromusculares não são necessários quando se utiliza AIT com propofol e remifentanila para laparoscopia pélvica.

O uso de opioides durante a cirurgia ambulatorial pode retardar a alta hospitalar, assim como causar admissão hospitalar inesperada. Em cirurgia de colecistectomia laparoscópica ambulato-rial, os efeitos colaterais mais comuns são NVPO, dor e retenção urinária, ocasionando admissão hospitalar em aproximadamente 5% dos pacientes. Os opioides são amplamente utilizados ambu-latorialmente, entretanto eles podem estar associados com muitos efeitos colaterais como NVPO e atraso na alta hospitalar.21 O esmolol, antagonista beta-1-adrenérgico cardiosseletivo de curta duração, tem sido proposto como alternativa ao uso intraoperatório de opioides reduzindo assim o tempo de alta após cirurgia ambulatorial.22-23 Além disso, demonstrou-se que a infusão intrao-peratória de esmolol reduz a incidência de náusea em decorrência da redução da administração de opioide.24 Da mesma forma, houve menor consumo de ondansetrona no pós-operatório como também propiciou alta hospitalar mais precoce (45 a 60 minutos).

fáRmACOS A utilização mais frequente da anestesia venosa total em regime ambulatorial se deve, sobretudo, ao de-senvolvimento de fármacos de curta e ultracurta duração, que permitem rápida indução da anestesia, manutenção em infusão contínua pelo tempo necessário e previsibilidade de despertar superior à obti-da com a anestesia inalatória ou combinada. Da mesma forma, a qualidade da recuperação é superior com emprego do propofol para manutenção da anestesia venosa, quando se observa despertar mais tranquilo, menor desorientação e mínima agitação psicomotora.25-29 Essa característica exclusiva da AIT é viabilizada pela utilização de fármacos com meia-vida contexto-dependente favorável, como propofol e, sobretudo, remifentanila.

Esse conceito da farmacocinética ganhou evidência na anestesiologia clínica com o adven-to das infusões venosas para manutenção da anestesia e se refere ao comportamento de um fármaco quando administrado continuamente. Sua importância reside na necessidade de des-crever como o contexto da infusão contínua (infusão contínua não implica velocidade constante,

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Capítulo 2 Anestesia intravenosa total para cirurgia ambulatorial 31

podendo ser esta, aliás, variável com o tempo) influencia os efeitos de determinado fármaco, por modificar seu comportamento no organismo.30

Objetivamente, a meia-vida contexto-dependente expressa o tempo necessário para que a con-centração plasmática de determinado fármaco caia à metade, cessada sua infusão. Fármacos com meia-vida contexto-dependente favorável são adequados à infusão contínua, como o propofol.

A remifentanila, com meia-vida contexto-dependente fixa de cerca de quatro minutos, apre-senta na prática comportamento extremamente favorável à infusão contínua, chegando mesmo a ser considerada independente do contexto. Isso equivale a dizer que cessada qualquer infusão de remifentanila, a cada quatro minutos, cai à metade sua concentração no plasma, sucessiva-mente. Isso não acontece com o propofol, cuja meia-vida contexto-dependente se eleva com o decorrer da infusão, evidenciando discreto “acúmulo”. Isso significa que à medida que prolonga-mos a infusão, aumenta o tempo para que, cessada, a concentração plasmática decresça e o paciente desperte.30

O propofol apresenta-se como hipnótico de curta latência, com redistribuição entre os com-partimentos central e periférico, cuja rapidez excede o clearance plasmático e é responsável pelo término de ação ao se interromper a infusão.

A manutenção de concentração plasmática efetiva reduz o risco de consciência intraoperatória e, sendo estável, oferece também maior previsibilidade de despertar. É esta, aliás, a ideia que nor-teia a anestesia venosa-alvo controlada. Mesmo quando não se faz a adequação da velocidade de infusão em função do tempo decorrido, como na infusão em velocidade constante, não há grande comprometimento de rapidez no despertar. Apenas não se tem a otimização que a técnica de infusão-alvo controlada, mais refinada, pode oferecer em termos de controle hemodinâmico, míni-mos efeitos adversos e abreviação do tempo de despertar. Tais características fazem do propofol o anestésico de escolha para manutenção do componente hipnótico na AIT.

Já a remifentanila, em razão de sua ultrarrápida metabolização plasmática, por esterases ines-pecíficas, e ao mínimo volume de distribuição, fica restrita aos compartimentos centrais. Por isso sua concentração plasmática atinge estabilidade em poucos minutos (cerca de dez minutos) e per-manece constante durante a infusão, não havendo acúmulo em tecido gorduroso. Dessa forma, a despeito de quanto dure o procedimento e sua infusão, a recuperação da ventilação espontânea acontecerá sempre de forma rápida e absolutamente previsível em até sete minutos. Prescinde, portanto, de ajustes na velocidade de infusão para se obter concentração plasmática estável.31 Tais características fazem da remifentanila o fármaco analgésico que mais próximo chegou do que se considera ideal e o opioide mais adequado para prover analgesia efetiva, manutenção estável e despertar tão breve como previsível, sem efeitos residuais, predicados excepcionais para a anestesia ambulatorial.

No entanto, ao mesmo tempo em que oferece recuperação singular, sem depressão respirató-ria, prostração ou NVPO, não oferece também analgesia residual, que deve ser planejada e provi-da com a devida antecedência, previamente ao despertar, sempre que o procedimento envolver dor pós-operatória.

Analgesia pós-operatória considerada “padrão-ouro” é obtida com o uso de anestésicos locais, seja em bloqueios locorregionais ou mesmo por intermédio de infiltração do campo ou da ferida cirúrgica. Associação de fármacos anti-inflamatórios e analgésicos colabora ainda com o controle tardio da dor, após o término de ação dos anestésicos locais, e pode ser empregada com suces-so também sem estes últimos, para procedimentos com pouca dor pós-operatória ou quando o tipo de intervenção não possibilitar seu uso. A importância do emprego de fármacos analgésicos com ação anti-inflamatória cresce nas cirurgias com maior reação de reparação tecidual, envolven-

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do intensidade variada de edema e dor, devendo ser ponderado o emprego de corticosteroides no pós-operatório imediato.

Analgésicos opioides devem ser evitados sempre que possível, pois determinam maiores in-cidências de prostração, náuseas e vômitos e eventualmente internação hospitalar não prevista. Quando seu emprego for mandatório para o adequado controle da dor, sugere-se o uso profilático de antieméticos potentes, sendo a ondansetrona exemplo comum e de relativo baixo custo em nosso meio. Dimenidrinato e metoclopramida são menos efetivos e, não raro, causam algum grau de sedação que somado ao do opioide eleva a incidência de despertar prolongado e o atraso ou o impedimento da alta hospitalar.30

Indução com doses moderadas de opioides de duração mais longa, como fentanila ou sufen-tanila, tem sido proposta para evitarem-se os riscos da indução em bolus da remifentanila, além de prover maior estabilidade da analgesia intraoperatória (e do plano anestésico) e algum grau de analgesia residual.32

Indução em bolus com remifentanila tem sido abandonada por ser determinante de repercus-sões hemodinâmicas importantes, com hipotensão acentuada e bradicardia, sobretudo em idosos e pacientes com baixa reserva cardiovascular.33,34 Além disso, por atingir os receptores muito rapi-damente, é o opioide com maior risco de desencadear rigidez torácica quando usado em bolus.

Infusão contínua de 0,5 mcg.kg-1.min-1 gera concentração efetiva de cerca de 6 ng.mL-1 após nove minutos em adultos jovens, suficiente para a entubação traqueal segura, devendo ser reduzi-da para 0,1 a 0,2 mcg.kg-1.min-1 até o início da cirurgia e então titulada de acordo com a intensidade do estímulo nociceptivo.31,35,36

Sob suficientes hipnose e analgesia a possibilidade de movimentação do paciente é mínima. Por isso a tendência é restringirmos a manutenção de bloqueador neuromuscular (BNM) aos pro-cedimentos que exijam relaxamento ou imobilidade absoluta, administrando apenas a dose inicial para entubação. Com isso, reduz-se a incidência de curarização residual operatória, e com ela o risco de hipoventilação e aspiração.37

A fentanila não se presta à infusão contínua por causa de suas características de grande vo-lume de distribuição e menor metabolização hepática, se comparada à sufentanila e à alfentanila. Estas fazem com que se acumulem em tecidos periféricos, de onde, após o término da infusão, retornam ao compartimento central e aos receptores, retardando o despertar e elevando o risco de depressão pós-operatória da ventilação.38

Alfentanila apresenta meia-vida contexto-dependente favorável ao uso sob infusão contínua e, desde que esta seja interrompida com a devida antecedência (cerca de 20 a 40 minutos), permite seu emprego em anestesia ambulatorial. Seu custo, porém, torna a técnica mais onerosa e, assim como a remifentanila, não oferece analgesia residual satisfatória.39 Outra desvantagem é que não oferece a mesma previsibilidade de despertar daquela, pois após cerca de 120 minutos de infusão constante começa a apresentar aumento do tempo de recuperação.40

Para evitar esse inconveniente, há necessidade de ajustar sua velocidade de infusão, o que é feito automaticamente pela bomba microprocessada usada em infusão-alvo controlada, mas é mais complicada de ser feita manualmente, utilizando-se bomba de infusão contínua, pois os cál-culos e as reprogramações da bomba tomariam muito tempo do anestesiologista.

Sufentanila também pode ser usada em anestesia ambulatorial, mas seus efeitos residuais podem determinar intensa prostração, além de náuseas e vômitos. Apresenta, além de grande po-tência analgésica, duração de efeito prolongada, semelhante à da fentanila. Também tem grande volume de distribuição, mas difere da fentanila em relação à metabolização hepática, mais rápida, o que a torna elegível para infusão contínua.

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Capítulo 2 Anestesia intravenosa total para cirurgia ambulatorial 33

SISTEmAS DE INfuSãODiferentemente do que acontece com a anestesia inalatória, quando os agentes são adicionados ao circuito de ventilação, na AIT há necessidade de se infundirem os fármacos por acesso venoso. À medida que se introduzem os agentes diretamente na circulação sanguínea, prescinde-se da etapa de absorção, e tem-se, então, a oportunidade de administrar exatamente a dose que deve ser distri- buída aos tecidos. A partir da distribuição pelo sangue uma fração das moléculas injetadas alcançará seu local de efeito: os receptores.

Da ligação do fármaco aos receptores, presentes, sobretudo, no sistema nervoso central, sur-girão os efeitos previstos. Mas para isso é imprescindível que as moléculas da droga utilizada al-cancem determinada concentração junto a esses receptores, a chamada concentração-alvo, que produzirá os efeitos desejados. Assim, o objetivo final de qualquer sistema de infusão é o de prover administração de quantidade suficiente dos fármacos à circulação, de maneira ordenada, seja em bolus ou em infusão contínua, a fim de fornecer dose (ou concentração) adequada, suficiente e controlada, evitando variações que possam desencadear efeitos adversos.

O organismo humano é descrito, de maneira simplificada, como um modelo de três compar-timentos. Na AIT introduzimos a droga diretamente no primeiro compartimento, de onde passa ao segundo e ao terceiro, obedecendo sempre a tendência natural do equilíbrio entre os com-partimentos. Considera-se como primeiro compartimento o sangue e o tecido cerebral, muito perfundido, e que por isso recebe grande quantidade do fármaco usado, “quase instantanea-mente”, praticamente no intervalo de tempo da “circulação braço-cérebro”. Estão também incluí- dos nesse compartimento central coração, pulmões, fígado e rins, órgãos que recebem grande volume de sangue.

Do segundo compartimento fazem parte os demais órgãos ricamente vascularizados, e os músculos, onde os fármacos injetados, chegam com algum atraso. Já o terceiro compartimento é formado por tecidos que recebem menor perfusão sanguínea, como o adiposo, além de ossos e pele. Menor perfusão se reflete em atraso para que o fármaco passe para esse compartimento e para que daí saia, ao final da infusão.

Após intervalo de tempo que varia não só com o fármaco, mas também com as característi-cas do paciente (idade, peso, massa magra e gênero), os três compartimentos entram em equi-líbrio, e cessada a infusão, começa a haver decaimento da concentração no primeiro, de onde a droga é eliminada. Isso cria um gradiente inverso e retorno dos compartimentos periféricos para o central.

Durante a indução da anestesia emprega-se frequentemente um bolus, que produz no plas-ma determinada concentração da droga utilizada, que se eleva rapidamente, atingindo um pico. Posteriormente, ocorre distribuição das moléculas infundidas aos diferentes compartimentos, com velocidade proporcional à perfusão de cada tecido.

Compartimentos de maior perfusão são “saturados” mais rapidamente, uma vez que recebem em curto espaço de tempo quantidade maior do fármaco, com elevação mais precoce de sua concentração. Aos compartimentos menos perfundidos, como o segundo, mas principalmente ao tecido adiposo do terceiro compartimento, o sangue chega mais lentamente, e o equilíbrio de concentração com o plasma ocorrerá mais tardiamente. Por isso esses compartimentos mais pe-riféricos, menos perfundidos, e eventualmente de maior tamanho, serão tanto preenchidos quanto esvaziados (quando for interrompida a administração) mais lentamente que o central, e, ao final da infusão, devolverão ao plasma as moléculas que acumularam.

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Quando administramos bolus sucessivos produz-se concentração sanguínea muito variável do fármaco utilizado, que logo após a injeção poderá ser muito superior à necessária, produzindo efeitos adversos. Segue-se então uma fase de decaimento rápido da concentração plasmática, à medida que a droga é levada para os demais compartimentos, e que, algum tempo depois, poderá ser insuficiente para produzir os efeitos necessários. Isso acontece de forma ainda mais pronunciada quando se utilizam fármacos de curta ou ultracurta duração, tendência natural para a moderna anestesia ambulatorial, quando são imprescindíveis o rápido despertar e a recuperação abreviada, segura e confortável do paciente, sem demandar pernoite na instituição.

A utilização de infusão contínua do fármaco, seja ela constante ou de velocidade variável, possibilita evitar essa variação da concentração plasmática, com menor incidência de complicações. Para tanto é imprescindível o emprego da bomba de infusão, acoplada ao circuito formado por equipo, exten-são, perfusor e divisor de fluxo, também chamado “polifix” ou “torneirinha”, que conduzem a solução utilizada desde o equipamento de infusão até o acesso venoso do paciente. O uso de dispositivos como buretas e equipos de microgotas não oferece controle da infusão com a precisão necessária e apresenta-se como má prática, não devendo ser admitido nos dias atuais.41

Idealmente deve-se utilizar acesso venoso exclusivo para infusão das drogas, para evitar aci-dentes com bolus inadvertido, pela variação do fluxo do cristaloide utilizado. Quando isso não é possível, deve-se posicionar o divisor de fluxo o mais próximo possível do acesso venoso.

Qualquer volume de fármaco remanescente no circuito de infusão venosa do paciente deve ser lavado ao final do procedimento, para que isso não aconteça de forma inadvertida na sala de recupe-ração anestésica, quando uma eventual depressão respiratória pode ter consequências trágicas.42

A fim de reduzir desperdício de medicação e evitar custos desnecessariamente elevados, recomenda-se utilizar circuitos de baixo volume de preenchimento. Extensores de cerca de 120 cm, mas de calibre reduzido, podem ser preenchidos com menos de 2 mL da solução ou do fár-maco não diluído, enquanto extensões com calibre semelhante ao de um equipo comum de soro podem demandar cerca de 15 mL, com consequente desperdício da medicação, que ao final da infusão permanece retida no sistema.

Bombas de infusão que empregam seringas, pelo mesmo motivo, tendem a ser mais eco-nômicas que as de rolete, ou peristálticas, que usam equipos, pois estes apresentam extensão e calibre maiores que o do perfusor usado para conectar a seringa ao acesso venoso. Bombas que exigem seringas ou equipos específicos também podem apresentar custos mais elevados, enquanto que maior economia tem sido obtida pelo emprego de equipamentos que aceitam se-ringas descartáveis comuns, de boa qualidade, conectadas à linha de infusão venosa por exten-sores de baixo volume de preenchimento.

Quanto às soluções, é imprescindível que sejam preparadas sob condições assépticas, so-bretudo quando se emprega o propofol, fármaco de características farmacocinéticas formidáveis, mas apresentado sob a forma de emulsão lipídica, em veículo que é rico meio de cultura. Deve-se restringir ao mínimo a manipulação do propofol, evitando diluí-lo, pelo risco de contaminação. Isso reduz também a possibilidade de instabilização da emulsão e eventual coalescência das microve-sículas lipídicas, presentes nas apresentações comercialmente disponíveis, diminuindo-se assim a dor à infusão.

Soluções de fármacos opioides devem ser preparadas utilizando-se soro fisiológico de cloreto de sódio a 0,9% ou soro glicosado a 5% e em concentração adequada. Recomenda-se no caso de remifentanila que a concentração seja de no máximo 50 mcg/mL, ou seja, 5 mg a cada 100 mL, sendo a mais recomendada a que se obtém da adição de 2 mg a cada 100 mL da solução

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Capítulo 2 Anestesia intravenosa total para cirurgia ambulatorial 35

(20 mcg/mL). Isso facilita a titulação do efeito desejado e ajuda a evitar grandes variações hemo-dinâmicas, por hipotensão arterial decorrente de eventual bolus acidental.42

Uma vez que se busca com a AIT explorar a oportunidade de manejar hipnose, analgesia e relaxamento muscular separadamente, pelo uso de fármacos específicos para cada um desses componentes, é no mínimo incoerente associar numa mesma solução propofol e opioide, como a remifentanila. Além disso, diluir remifentanila em propofol pode causar hidrólise do grupo éster do opioide.43

Do ponto de vista técnico, a depender das concentrações de cada uma das drogas na solu-ção, há grande risco de ocorrer memória intraoperatória ou variações hemodinâmicas tão indese-jadas como perigosas, motivos suficientes para que a administração de mais de um fármaco na mesma solução seja considerada má prática, devendo ser veementemente desaconselhada.

INfuSãO-ALvO CONTROLADA: OTImIzANDO quALIDADE INTRAOpERATóRIA E DESpERTAR Equipamentos de infusão-alvo controlada nada mais são que bombas de infusão que incorporam mi-croprocessadores capazes de calcular (e recalcular contínua e rapidamente) a quantidade da solução a ser infundida necessária para se obterem os efeitos desejados. Assim, a depender da droga e do mo-delo farmacocinético utilizado, deve-se alimentar o equipamento com os dados necessários, referentes ao paciente a ser assistido. Estes podem incluir apenas peso, como também altura, idade e gênero.33

Com os dados fornecidos, o equipamento é capaz de estimar, ao longo do tempo, a quantida-de de fármaco a ser fornecida à circulação, a fim de prover a concentração solicitada, e se encar-regará de mantê-la estável à medida que os compartimentos corporais vão sendo preenchidos, ou de corrigi-la quando assim se deseja. Para tanto, pode ser o caso de interromper a infusão por alguns momentos, retomando-a a velocidades menores e ao tempo oportuno, se reduzir-se a concentração-alvo. Ou, de outra forma, proceder a um bolus seguido de velocidade superior à vigente anteriormente, se for necessário elevar a dose-alvo programada, tudo calculado a partir do modelo farmacocinético disponível para cada droga e com rapidez e precisão muito superiores às que seriam capazes de se alcançar manualmente.

Um modelo farmacocinético é um conjunto de equações, desenvolvido a partir da observação das concentrações promovidas por diferentes doses dos fármacos estudados e que descrevem seu comportamento no organismo e sua movimentação entre os diferentes compartimentos, a partir do momento em que é infundido na circulação.33

Empregando dados sobre o paciente e a concentração do fármaco na solução utilizada, forne-cidos pelo anestesista, o microprocessador que comanda a bomba pode estimar, com base no modelo farmacocinético, a cada momento, qual a concentração predita da droga no plasma e ao nível dos receptores e variar a infusão a fim de que se forneça a quantidade “exata” do fármaco que é necessária.

Assim se promove uma adequação da dose a cada paciente e a cada contexto, buscando-se evitar tanto sub quanto sobredose, oferecendo técnica anestésica refinada, de qualidade superior à obtida com a infusão contínua, minimizando variações hemodinâmicas, efeitos adversos e cus-tos, com ganhos relevantes pela maior satisfação do paciente.

A adequação da infusão possibilita menor risco de complicações intraoperatórias, decorrentes de plano anestésico eventualmente inadequado, como memória intraoperatória.44 Isso é ainda mais importante se não se dispõe de monitorização cerebral de efeito, como BIS, e se reflete em

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ganhos em qualidade e em segurança. Da mesma forma, doses adequadas reduzem o risco de efeitos adversos pós-operatórios, como sedação prolongada e dor, além de náuseas e vômitos.

O cálculo da concentração plasmática estimada permite que a própria bomba proceda à redu-ção da infusão com o decorrer do tempo, tornando o despertar mais previsível, reduzindo a dose total utilizada e os custos.

A concentração-alvo necessária de remifentanila em anestesia geral varia em função da in-tensidade do estímulo doloroso, situando-se entre 3 e 6 ng.mL–1. A do propofol deve ser de 2 a 4 mcg.mL–1, a depender dos outros fármacos utilizados, já que seu sinergismo varia com o opioide empregado, sendo máxima quando combinado à remifentanila.

Para a sufentanila, a dose-alvo a ser fornecida à bomba de infusão deve estar entre 0,1 e 0,3 ng/mL, também de acordo com o estímulo nociceptivo vigente.

Além da intensidade do estímulo nociceptivo, tem grande importância para o ajuste da dose de remifentanila a idade e o estado físico do paciente, pois é, dos opioides atualmente em uso, o que apresenta o menor volume de distribuição, ficando restrito praticamente ao compartimento central, distribuindo-se pouco pelo tecido adiposo do terceiro compartimento.34,45 Por esse motivo seus efeitos são fortemente modificados por alterações do volume central. Pacientes entre 50 e 80 anos de idade apresentam redução de cerca de 20% no volume central e de 30% na depuração plasmática, tornando, para alguns autores, o ajuste da dose pela idade ainda mais importante do que pelo peso.46

Isso é feito pela bomba quando se opta pela infusão alvo-controlada, pois o modelo farmacoci-nético usado, desenvolvido por Minto, leva em consideração, além do peso, também altura, sexo e idade para o cálculo do volume central, tornando seu uso ainda mais seguro.33

Quando usado em bomba comum, em infusão contínua, é de suma importância que façamos a adequação da dose pela idade e pelo estado físico do paciente, iniciando-se com infusão baixa, elevada progressiva e lentamente, titulando-a de acordo com a resposta clínica observada.

Quando se utiliza remifentanila como único opioide, objetivando a previsibilidade de despertar, a recuperação abreviada e a maior garantia de alta hospitalar, torna-se imprescindível prover anal-gesia eficaz com a devida antecedência. Isso pode ser feito na maioria dos procedimentos ambu-latoriais com analgésicos e anti-inflamatórios não esteroidais. Opioides como tramadol e codeína devem ser reservados para os casos de dor mais intensa, já que elevam incidência de náuseas e vômitos, que podem retardar ou impedir a alta hospitalar.47 Quando o procedimento cirúrgico e a região operada permitem, é conveniente o emprego de bloqueio regional ou infiltração com anes-tésico local, já que são as formas mais eficientes de analgesia pós-operatória.

CONCLuSãOO regime ambulatorial vem-se consolidando na prática diária de muitos serviços pelas inúmeras vanta-gens que oferece, o que vem sendo facilitado pela forte tendência de cirurgias por meio de abordagens cada vez menos invasivas.

Alinhada aos avanços das áreas cirúrgicas, a anestesiologia tem oferecido fármacos e técnicas que possibilitam o manejo do paciente de curta permanência de forma efetiva e segura, sem pre-juízo à rápida recuperação.

É nesse contexto que propofol e remifentanila ocupam lugar de destaque na anestesia ambu-latorial, sobretudo quando empregados sob infusão-alvo controlada, que otimiza o perfil farmaco-cinético tão favorável desses fármacos, com ganhos em segurança, qualidade e satisfação do paciente, sem elevação relevante nos custos finais.

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Capítulo 2 Anestesia intravenosa total para cirurgia ambulatorial 37

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Capítulo 3

ConduTA AneSTéSiCA no PACienTe PneumoPATA

— AvALiAção e PrePAro Pré-oPerATório

Fernando Antônio Nogueira Cruz MartinsJosé Fernando Bastos Folgosi

Ricardo Lopes da Silva

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40 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

Num universo de procedimentos cirúrgicos efetuados, estima-se que cerca de 3% a 10% são passíveis de algum tipo de morbidade, sendo a maioria de origem pulmonar, cardíaca ou infecciosa. No intuito de preveni-las ou atenuá-las, é indispensável a adoção de precauções pré-operatórias estritas, que incluem, além do diagnóstico prévio, um conjunto de medidas que visem avaliar a funcionalidade dos vários órgãos ou sistemas, bem como a obtenção da melhor condição fisiológica possível para o paciente suportar o trauma cirúrgico.

A avaliação pré-operatória da função pulmonar é de estreita importância, pois qualquer proce-dimento cirúrgico se acompanha de algum grau de disfunção respiratória, mesmo se os pulmões não se encontram diretamente envolvidos. A anestesia, o uso de próteses na ventilação controlada, a hipoventilação dependente da dor, a ineficácia da tosse, a imobilização e a depressão do sistema nervoso central imposta pela ação de drogas anestésicas representam alguns elementos potencial-mente capazes de desencadear uma insuficiência respiratória.1,2

Dentro da avaliação pulmonar pré-operatória, teremos dois objetivos principais: identificar os pacientes com fatores de risco para complicações pulmonares (fumantes, asmáticos, bronquíticos crônicos, enfisematosos e, principalmente, idosos) e distinguir, entre eles, aqueles que poderiam ser alvo de intervenção no perioperatório a fim de reduzir a ocorrência de complicações.3 Os fatores de risco para complicações pulmonares podem ser separados em três grandes grupos:

fATORES RELACIONADOS COm A CIRuRGIA

LocalÉ o principal preditor de risco. As complicações estão relacionadas principalmente com as cirurgias torá-cicas e do andar superior do abdômen. Nos outros procedimentos cirúrgicos o risco está principalmente relacionado com as pneumonias por broncoaspiração.4

DuraçãoAs cirurgias com duração acima de três horas estão relacionadas com uma incidência maior de compli-cações pulmonares.4,5

Cirurgia laparoscópica versus abertaA cirurgia laparoscópica exige cuidado durante o ato cirúrgico em razão de duração maior que a da cirurgia aberta, da absorção do CO2 insuflado e do pneumoperitônio que eleva o diafragma, mas causa menor agressão tecidual, menos dor; a mobilização do paciente é mais precoce, o íleo é de menor du-ração e as modificações dos volumes pulmonares são menos acentuadas. Com isso há uma diminuição no risco de complicações pós-operatórias.4

fATORES RELACIONADOS COm O pACIENTE

TabagismoO fumo causa aumento de secreção e reatividade brônquicas, inflamação nas vias respiratórias infe-riores, diminuição da atividade mucociliar e aumento do volume de fechamento do espaço alvéolo-

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Capítulo 3 Conduta anestésica no paciente pneumopata — Avaliação e preparo pré-operatório 41

-pulmonar. Independentemente da presença de sintomas respiratórios, pacientes que fumam mais de 20 maços de cigarros por ano têm maior risco de complicações pulmonares.6,7

IdadeO estudo de Arozullah et al,8 em 2001, controlou bem as condições de comorbidades e mostrou, em análise prospectiva e com grande amostragem, que a idade ainda é um fator de risco independente para as complicações pulmonares infecciosas. Os idosos apresentam alterações fisiológicas importantes como diminuição da capacidade pulmonar total e da complacência pulmonar associada ao aumento da pressão de fechamento, à diminuição do volume corrente e da capacidade vital forçada (CVF).9

Estado imunológicoCondições que comprometam o estado imunológico, tais como uso crônico de corticoides, insuficiência renal crônica, ingestão de grande dose diária de álcool, perda ponderal acelerada e várias transfusões, entre outras, são situações consideradas de risco para complicações pulmonares.4,8

ObesidadeAlém de diminuição de complacência pulmonar, capacidade vital, capacidade inspiratória, reserva ex-piratória e capacidade pulmonar, como também de um distúrbio de ventilação e perfusão provocando áreas de shunt, não existem dados na literatura relatando a obesidade como determinante isolado de risco para complicações pulmonares.1,2,10,11

Asma e doença pulmonar obstrutiva crônicaO paciente asmático deve ser submetido ao procedimento cirúrgico apenas quando estiver no melhor de seu estado funcional. Mesmo assintomático, apresenta uma incidência para complicação pulmonar em torno de 1,7%.

Os pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) possuem um risco de 2,7% a 4,7% de complicações pulmonares relacionadas com a gravidade da doença pulmonar, por isso também devem estar em seu melhor estado funcional possível para a realização da intervenção cirúrgica.1,2,12

fATORES RELACIONADOS àS TéCNICAS ANESTéSICAS

Anestesia geral versus regionalA incidência de complicações pulmonares perioperatórias é influenciada pelo tipo e pela duração da anestesia. Os agentes inalatórios diminuem o transporte mucociliar e promovem a retenção de secre-ção na árvore respiratória, favorecendo com isso a ocorrência de complicações pulmonares. Em uma metanálise, Rodgers et al.,13 em 2000, mostraram uma redução de 40% na incidência de complicações pulmonares quando submeteram os pacientes à anestesia regional associada ou não à anestesia ge-ral.5,8,13,14

O tempo de duração está diretamente ligado ao desenvolvimento de complicações pulmonares, e o risco aumenta a partir de duas horas e mais ainda após três horas de anestesia.

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42 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

Bloqueador neuromuscularO uso de bloqueador neuromuscular de longa duração está associado a um maior bloqueio residual no pós-operatório, causando hipoventilação, sendo por isso um fator de risco para complicações pulmo-nares.1,2

AvALIAçãO puLmONAR pOR méTODOS COmpLEmENTARES

Radiografia do tóraxFornece informações quanto às alterações radiológicas de base nos pacientes que apresentam risco pulmonar elevado, auxiliando no ajuste da terapêutica dos pacientes com pneumopatias e sinais ou sintomas respiratórios.15

EspirometriaO uso rotineiro da espirometria para a estratificação do risco de complicações pulmonares no perio-peratório permanece controverso devido à falta de uniformidade e metodologia dos estudos. Estudos em operações abdominais ou cardiovasculares demonstraram que a espirometria tem especificidade e sensibilidade baixa quando comparada com o conjunto das outras variáveis clínicas, por isso não se justifica o uso rotineiro.

Seu uso deve ser reservado a pacientes submetidos a cirurgias torácicas ou abdominais altas, com sintomas de tosse, dispneia ou intolerância ao exercício e quando há dúvidas quanto ao grau de obstrução do fluxo aéreo existente após abordagem clínica.12,16

O American College of Physicians recomenda o uso da espirometria nas seguintes situações:17

Pacientes submetidos à cirurgia de ressecção pulmonar.

Pacientes com doença pulmonar suspeita, mas não caracterizada.•Pacientes submetidos à cirurgia torácica e abdominal alta e que possuam história de taba-•gismo ou dispneia.Pacientes submetidos à cirurgia de revascularização miocárdica e com história de tabagismo •importante.

Os valores de espirometria associados às complicações são: CVF menor que 70%, volume ex-piratório final no primeiro segundo (VEF1) menor que 70% e a relação entre CVF e VEF1 menor que 65% do predito.

Gasometria arterialPode ser de auxílio na avaliação do paciente com doença pulmonar conhecida ou na investigação de dispneia. Uma pressão arterial parcial de dióxido de carbono (PaCO2) superior a 45 mmHg é um mar-cador de doença pulmonar avançada e de uma pequena ou inexistente reserva funcional pulmonar.

A avaliação pré-operatória do risco de complicações pulmonares pode ser feita por meio de índices que consistem na avaliação de variáveis clínicas e laboratoriais, os quais têm a finalidade de separar os pacientes em grupos diferentes de risco para as complicações.11,18

Em 1988, Torrington e Henderson desenvolveram uma escala (Tabela 1) que é utilizada até os dias atuais. Ela foi definida por intermédio de um estudo dos parâmetros clínicos e laboratoriais baseando-se em sintomas respiratórios, tipo de cirurgia, idade e espirometria. Com base nessa

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Capítulo 3 Conduta anestésica no paciente pneumopata — Avaliação e preparo pré-operatório 43

escala, podem-se classificar os pacientes em baixo risco, cuja soma é no máximo 3 pontos, 4 a 6 pontos em moderado, e 7 a 12 em alto risco (Tabela 2)19.

Tabela 1. Escala de torrington e Henderson

Variáveis Pontuação

Espirometria

CVF < 50% do previsto 1

VEF1/CVF: 65% a 75% 1

VEF1/CVF: 50% a 64% 2

VEF1/CVF: < 50% 3

Idade superior a 65 anos 1

Peso acima de 150% do ideal 1

Cirurgia abdominal alta ou torácica 2

Outras cirurgias 1

Tabagismo 1

Sintomas pulmonares (tosse, dispneia, catarro) 1

História de doença pulmonar 1

Tabela 2. Classificação de risco para complicações pulmonares

Classificação Pontos Taxa de complicações (%) Mortalidade (%)

Baixo 0-3 6 2

Moderado 4-6 23 6

Alto > 7 35 12

Arozullah et al. desenvolveram e validaram outro índice de risco multifatorial, em que prediz o ris-co de pneumonias no pós-operatório de cirurgias não cardíacas e faz uma classificação em cinco classes de acordo com a pontuação obtida no índice de risco (Tabelas 3 e 4).1,8

Tabela 3. índice de risco de pneumonia no pós-operatório

Fatores de risco pré-operatório Pontuação

Tipo de cirurgia

Aneurisma de aorta abdominal 15

Torácica 14

Abdômen superior 10

Pescoço 8

Neurocirurgia 8

Vascular 3

(continua)

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44 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

Idade (anos)

Mais de 80 17

70 a 79 13

60 a 69 9

50 a 59 4

Estado funcional

Totalmente dependente 10

Parcialmente dependente 6

Perda ponderal > 10% nos últimos 6 meses 7

História de DPOC 5

Anestesia geral 4

Diminuição do nível de consciência 4

História de acidente vascular cerebral (AVC) 4

Nível sanguíneo de ureia

< 8 mg/dL 2

22 a 30 mg/dL 3

> 30 mg/dL 4

Transfusão acima de quatro unidades 3

Cirurgia de emergência 3

Uso crônico de esteroide 3

Tabagista nos últimos 12 meses 3

Ingestão de álcool acima de dois drinques diários nas últimas duas semanas 2

Tabela 4. Classe de risco

Classe Pontuação Taxa de complicação

1 0 a 15 0,2%

2 16 a 25 1,2%

3 26 a 40 4,0%

4 40 a 55 9,4%

5 > 55 15,8%

Empregando-se a avaliação clínica, os exames radiológicos, a bioquímica e os testes fun-cionais, a probabilidade de complicações pulmonares no pós-operatório é mínima (< 5%), se seus valores forem normais, aumenta para 50% se tivermos a alteração em uma ou mais dessas provas.

Tabela 3. índice de risco de pneumonia no pós-operatório (continuação)

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Capítulo 3 Conduta anestésica no paciente pneumopata — Avaliação e preparo pré-operatório 45

ANESTESIA NO pACIENTE COm pNEumOpATIAAnestesiar um paciente com doença pulmonar obstrutiva crônica é sempre um grande desafio, pois a anestesia está associada a crises de broncoespasmo e complicações pulmonares no pós-operatório.

Anestesia geral Para execução de uma anestesia geral tem de se garantir uma via aérea pérvia, e isso geralmente é realizado por meio da entubação traqueal, cuja manipulação da traqueia pode causar broncoconstrição. Um plano anestésico adequado associado ao relaxamento muscular é a melhor maneira de evitar o broncoespasmo.20 A indução da anestesia pode ser feita de forma segura com propofol associado a opioides como fentanila, sulfentanila e remifentanila; a associação de lidocaína endovenosa na dose 1 mg/kg ajuda a evitar crise de broncoespasmo. Em pacientes que estejam em crises, principalmente os asmáticos, a utilização de cetamina para indução se mostra vantajosa em relação ao propofol e ao etomi-dato.21 Dentre os relaxantes musculares, o cisatracúrio, que não libera histamina, é o agente de escolha. Sendo o rocurônio muito útil naqueles que necessitam entubação sequencial rápida.21 Os halogenados, especialmente o sevoflurano e o halotano, apresentam a característica de promoverem broncodilatação. Sua utilização na manutenção da anestesia causa uma redução no tônus da via aérea melhorando a mecânica respiratória, principalmente o fluxo expiratório,22 que está reduzido nesses pacientes.

A utilização de máscaras laríngeas em substituição ao tubo endotraqueal nesses pacientes é vantajosa, pois produz uma baixa estimulação da via aérea prevenindo a broncoconstrição e reduzindo a tosse no despertar.23 A utilização de tubo traqueal com cuff insuflado exerce uma significante pressão sobre a mucosa traqueal, ocasionando diminuição na eliminação do muco. A máscara laríngea, por sua vez, exerce pressão sobre a mucosa faríngea, não diminuindo a eliminação do muco. O acúmulo de muco promove atelectasia e aumento na incidência de in- fecções pulmonares.5

Nesses pacientes temos de ter um cuidado especial com a ventilação mecânica, pois apre-sentam uma tendência à hiperinsuflação pulmonar devida ao aprisionamento aéreo. Os principais mecanismos envolvidos são: aumento da obstrução ao fluxo aéreo causada por inflamação, hi-persecreção brônquica, broncoespasmo e uma redução da retração elástica pulmonar.24 É muito importante monitorizar a relação entre o volume corrente e o volume exalado para diagnosticar o aprisionamento de ar. Caso este ocorra, necessita-se otimizar a expiração. Para compensar essa dificuldade expiratória, deve-se ajustar os parâmetros ventilatórios a fim de aumentar o tempo expi-ratório. Isso se consegue com uma menor relação inspiratória:expiratória (1:3, 1:4), uma frequência respiratória de 8 a 10 incursões por minuto e um volume corrente em torno de 6 a 8 mL/kg. A utili-zação de pressão positiva ao final da expiração (PEEP) é bastante controversa, porém acredita-se que uma PEEP extrínseca menor que a PEEP intrínseca, aquela gerada pelo aprisionamento de ar, evita o colapso de pequenas vias aéreas e melhora a ventilação.24

Anestesia regional A anestesia regional apresenta vantagens sobre a anestesia geral por evitar os severos estímulos propor-cionados pela entubação e minimizar o comprometimento da função pulmonar pós-operatória, porém é necessário valorizar o fato de que esses pacientes são frequentemente inaptos para permanecerem estritamente na posição supina, pois podem tornar-se progressivamente não cooperativos com o agra-vamento da hipóxia, e nem sempre a sedação consegue contornar essa situação.20

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46 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

A anestesia peridural lombar e a raquianestesia podem ser usadas nesses pacientes, quando o nível do bloqueio fica abaixo da décima vértebra torácica não ocorrendo alterações na função respiratória, porém bloqueios torácicos extensos bloqueiam a musculatura expiratória dificultando a expiração, o que ocasiona um aumento do PEEP intrínseco, piorando o quadro pulmonar. Desse modo, em cirurgias que necessitem de um bloqueio sensitivo mais alto, como as cirurgias abdomi-nais, é preferível optar pela anestesia geral.

A associação da anestesia peridural para promover analgesia com a anestesia geral é uma ótima técnica nesses pacientes. A dor pós-operatória, especialmente quando relacionada com cirurgia torácica ou abdominal alta, constitui-se na principal causa da diminuição da capacidade vital, resultando em hipoventilação, na formação de atelectasias e pneumonia. Vários estudos têm demonstrado os efeitos benéficos da anestesia peridural torácica no controle da dor pós-operatória, na restauração da função pulmonar e na aceleração da recuperação do paciente submetido a uma cirurgia torácica ou abdominal alta. É importante ressaltar dois fatores: (1) a utilização de anestési-cos locais em baixa concentração promove analgesia sem causar bloqueio motor e interferir com a mecânica ventilatória; (2) o bloqueio neural simpático não induz broncoconstrição porque o tônus motor brônquico é preferencialmente determinado pela estimulação beta-2-adrenérgica em compa-ração ao balanço dos sistemas parassimpático e simpático autônomo.14

O bloqueio de membro superior pode ocasionar um bloqueio ipsilateral do nervo frênico, com-prometendo a atuação do diafragma na mecânica ventilatória. Essa paralisia promove um movimento paradoxal da cúpula diafragmática do mesmo lado do bloqueio, de modo que, durante a inspiração, ocorre uma ascensão da cúpula em vez da movimentação distal do diafragma.25 Por isso deve ser evitado em pacientes que tenham dificuldades respiratórias prévias. Apenas a técnica pela via axilar não apresenta esse risco, porém ela só está indicada para cirurgias abaixo do cotovelo. A técnica do bloqueio regional de membro inferior não compromete a mecânica ventilatória, sendo uma boa indicação para as cirurgias de membro inferior.

CuIDADOS póS-OpERATóRIOS DO pACIENTE pNEumOpATAO paciente pneumopata apresenta risco aumentado de eventos adversos respiratórios após uma de-terminada cirurgia, particularmente os tabagistas portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) submetidos à cirurgia do abdômen superior ou à cirurgia torácica. A via aérea desses pacientes permanece vulnerável por cerca de 24 horas, e hipoventilação pode ocorrer até três dias após, depen-dendo da cirurgia e da técnica anestésica utilizada.26

Na sala de recuperação pós-anestésica (SRPA), a via aérea deve ser assegurada, mantida funcionante, e a ventilação adequada, associada à oxigenação, antes da alta. É importante que o bloqueador neuromuscular administrado seja revertido, com o monitor da junção neuromuscular registrando relação T4/T1 > 0,9 com o uso da sequência de quatro estímulos. Por outro lado, o paciente deve ser mantido aquecido e hidratado corretamente. A presença de dificuldade de ventilação ou oxigenação implica necessidade de transferência para a unidade de cuidados in-tensivos (UTI).26

TERApIA COm OxIGêNIOApós cirurgia de pequeno porte, pode ocorrer hipóxia nas primeiras duas horas de pós-operatório. Des-sa forma, deve-se administrar oxigênio até que o paciente esteja completamente desperto e recuperado da anestesia. Após cirurgias de maior porte, a hipóxia pós-operatória pode ocorrer até o terceiro dia

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Capítulo 3 Conduta anestésica no paciente pneumopata — Avaliação e preparo pré-operatório 47

de pós-operatório, principalmente à noite. Essa tendência é mais grave em pacientes que receberam opioides por qualquer via de administração. Nessa situação, a presença de doença cardíaca isquêmica ou pulmonar associada pode ser agravada. Para esses pacientes, oxigênio suplementar deve ser admi-nistrado durante esse período por cânula nasal de 2 a 4 L/minuto.27

Alguns pacientes com DPOC grave dependem da hipóxia para manter a ventilação. É difícil diagnosticar as situações em que o estímulo para ventilação depende da hipóxia. Assim sendo, nesses pacientes a fração inspirada de oxigênio deve ser monitorizada e gasometrias arteriais se-riadas devem ser realizadas com o objetivo de determinar o nível de terapia com oxigênio que deve ser instituído.27

ANALGESIA póS-OpERATóRIAA analgesia efetiva reduz a incidência de eventos adversos respiratórios pós-operatórios.

Opioides intravenosos podem ser administrados para alívio da dor na SRPA, mas deve-se tomar cuidado com a depressão da ventilação. Caso haja opção pela administração de opioides endo-venosos contínuos, a supervisão deve ser mais intensa. Uma opção ao excesso de opioides é a associação desses fármacos com anti-inflamatórios não hormonais (AINH), o que reduz o risco de depressão ventilatória. Sistemas de analgesia controlada pelo paciente (PCA) permitem a este me-lhor controle da analgesia associado também ao menor risco de efeitos adversos.26

Analgesia peridural com uso de cateter torácico para cirurgias do abdômen superior e torá-cicas resultam também em boa qualidade da analgesia associada a baixo risco de eventos ad-versos. Entretanto não há consenso que demonstre a superioridade dessa técnica de analgesia sobre as demais.

A combinação de baixas concentrações de anestésicos locais com baixas doses de opioides no espaço peridural resulta em excelente analgesia com reduzida incidência de efeitos indesejáveis. Uma vez que essa técnica seja utilizada, deve-se proceder a vigilância adequada dos sinais vitais, da oxigenação, da frequência respiratória e do nível de consciência. O ideal é que sejam criados protocolos de treinamento do pessoal de enfermagem para cuidados com a analgesia e condutas diante de alterações indesejáveis.26

fISIOTERApIAA orientação do paciente durante o período pré-operatório, em relação às técnicas para mobilizar se-creções e melhorar os volumes pulmonares no pós-operatório, reduz a incidência de eventos adversos respiratórios. Os métodos empregados são a tosse, a respiração profunda, a movimentação precoce e a percussão torácica associadas à drenagem postural. Para que sejam empregadas técnicas adequadas de fisioterapia, o paciente deve ter adequada analgesia instituída, o que facilita as manobras.28

uSO DE ESTEROIDESO paciente asmático ou com DPOC grave pode beneficiar-se da terapia com prednisolona (20 a 40 mg/dia) durante a semana que antecede a cirurgia.29

Pacientes que já utilizam esteroides nos seis meses que antecedem a cirurgia ou que rece-bem dose de manutenção de prednisolona superior a 10 mg/dia apresentam risco de supressão adrenocortical. Nesses casos, a suplementação perioperatória com esteroides deve ser instituída. Hidrocortisona, 100 mg, intravenosa deve ser administrada oito horas antes da cirurgia, e a terapia

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48 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

deve ser continuada com redução progressiva da dose até o retorno à dosagem habitual nos cinco dias subsequentes (hidrocortisona, 100 mg, endovenosa = prednisolona, 25 mg, via oral).29

pROBLEmAS RESpIRATóRIOS NO póS-OpERATóRIO Dispneia pós-operatória indica habitualmente dificuldade respiratória e hipóxia, mas pode ser decorrente de dor, ansiedade, sepse, anemia e acidose. O tratamento inicial consiste em assegurar a via aérea e aumentar a concentração de oxigênio no ar inspirado. A observação da oximetria de pulso deve guiar a conduta para manter saturação periférica superior a 92%. A causa da dispneia é investigada por história, exame físico e exames complementares, especialmente radiografia do tórax.26

Estridor A via aérea pode ser comprometida no pós-operatório por efeito residual da anestesia (em particular opioides e sedativos), por vômitos e por complicações operatórias (sangramento e lesão de nervos). Nessas situações a via aérea deve ser controlada usando dispositivos menos invasivos (cânulas oro ou nasofaríngeas), entubação traqueal e máscara laríngea, lembrando-se do risco de edema das vias aéreas com esta última. Pode-se administrar adrenalina, 2,5 a 5 mg, por nebulização, e dexametasona, 4 a 8 mg, intravenosa.26

Atelectasia e pneumoniaDor, desidratação e imobilidade levam à atelectasia dos segmentos pulmonares inferiores algumas horas após a cirurgia. Tosse ineficiente pode promover retenção de secreções. Os objetivos do tratamento são: analgesia adequada, oxigênio umidificado, hidratação, fisioterapia e mobilização precoce. Atelectasia e tosse ineficiente favorecem a ocorrência de pneumonia e infecção. Uma vez que pneumonia tenha-se ins-talado, culturas de sangue venoso e do escarro devem ser realizadas para orientar antibioticoterapia.26

BroncoespasmoPode ser decorrente de asma prévia, broncoaspiração de sangue ou vômito ou reação alérgica. Edema pulmonar e embolia pulmonar podem imitar broncoespasmo. O paciente torna-se dispneico, taquip-neico e usa musculatura acessória da ventilação. A fala torna-se difícil e sibilos são ouvidos à ausculta pulmonar. Radiografia de tórax pode ser útil para excluir pneumotórax e evidenciar áreas colabadas após broncoaspiração. Presença de hipercarbia na gasometrial arterial indica fadiga e insuficiência respiratória iminente. O tratamento deve incluir oxigênio, nebulização com salbutamol, 2,5 a 5 mg, a cada quinze minutos (ou até que ocorra aumento significativo da frequência cardíaca), associação do ipratropium ao agonista beta-adrenérgico, 250 a 500 mg, a cada seis horas, e hidrocortisona, 100 mg, intravenosa. Nebulização com adrenalina deve ser usada quando não há outro agonista beta-adrenérgico, na dose de 2,5 mg. Adrenalina intramuscular, 0,5 mg, deve ser usada nos casos de broncoespasmo grave. Como a insuficiência respiratória pode ocorrer rapidamente, equipamento para ventilação mecânica e entubação traqueal devem estar disponíveis.29

pneumotóraxPode ocorrer como consequência de ventilação com pressão positiva em pacientes asmáticos e com DPOC. O paciente apresenta dispneia e queixa-se de dor torácica. Ocorre hiper-ressonância à percus-

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Capítulo 3 Conduta anestésica no paciente pneumopata — Avaliação e preparo pré-operatório 49

são torácica e, em casos graves, desvio da traqueia para o lado oposto ao pneumotórax. Ocorre aumen-to da pressão venosa central e colapso cardiovascular devido ao desvio do mediastino. Em pacientes estáveis, a radiografia do tórax confirma o diagnóstico. Nos casos de pneumotórax hipertensivo, deve-se proceder a imediata inserção de uma cânula endovenosa 14-Gauge na cavidade pleural, no nível do segundo espaço intercostal, na linha médio clavicular.30

Em resumo, podem-se dividir as estratégias de redução dos riscos ligadas às orientações perio-peratórias em pré-operatórias, intraoperatórias e pós-operatórias (Quadro 1).4,31-33

Quadro 1. orientações perioperatórias

Pré-operatórias

Parar o tabagismo oito semanas antes do procedimento cirúrgico.

Compensar a doença pulmonar de base e tratar as infecções, se necessário.

Iniciar a educação das manobras de expansão pulmonar.

Intraoperatórias

Limitar a duração da cirurgia em menos de três horas, se possível.

Evitar o uso de bloqueador neuromuscular de longa duração.

Preferir anestesia epidural ou espinhal se possível ou sua associação.

Utilizar a via laparoscópica, quando possível.

Pós-operatórias

Uso de exercícios com respiração profunda.

Uso de fisioterapia com pressão positiva.

Controle rigoroso da dor, até mesmo com analgesia peridural, se necessária.

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Capítulo 4

inFeCção e AneSTeSiA — PArTe i

Ana LuftCláudia Regina Fernandes

Florentino Fernandes Mendes

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52 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

INTRODuçãOAntes de Joseph Lister (1860) introduzir os princípios da antissepsia, a infecção da ferida operatória era a maior causa de sepse e morte. O trabalho de Lister radicalmente alterou os resultados da cirurgia, antes uma atividade associada à infecção e à morte, e, posteriormente à introdução da antissepsia, uma atividade com possibilidade de eliminar o sofrimento e prolongar a vida.1

A despeito das técnicas antissépticas, a infecção cirúrgica permanece problemática, consti-tuindo-se na terceira mais frequente infecção nosocomial e acometendo 14% a 16% dos pacientes hospitalizados.2,3

No paciente cirúrgico, a infecção da ferida operatória é a mais comum causa de infecção no-socomial, sendo responsável por 77% das mortes.1,4

Pacientes que desenvolvem infecção duplicam a chance de morrer, quando comparados com pacientes submetidos aos mesmos procedimentos sem infecção. Estima-se que 40% a 60% das infecções cirúrgicas sejam preveníveis.3 Instituições hospitalares que desenvolvem programas para reduzir a incidência de infecção substancialmente diminuem morbidade, mortalidade e custos.

DEfINIçãO DE INfECçãO CIRúRGICAO Center for Disease Control and Prevention (CDC) desenvolveu critérios padronizados de vigilância para definir infecção do sítio cirúrgico (Quadro 1).

Infecção incisional superficial — Definida como aquela que ocorre dentro de 30 dias da cirurgia e é confinada à pele ou ao tecido subcutâneo no local da incisão. Um ou mais parâmetros do quadro 1 precisam estar presentes.

Infecção incisional profunda — Envolve o tecido mais profundo (fáscia, músculos) e é relacionada à cirurgia realizada. O início da infecção precisa ser dentro de 30 dias após a cirurgia, na ausência de um implante (prótese valvular cardíaca, prótese de quadril, enxerto vascular) ou dentro de um ano se um implante for colocado.

Infecção de órgão ou espaço — Infecção que se relaciona com a cirurgia e envolve qualquer parte da anatomia que foi aberta ou manipulada durante a cirurgia. Na ausência de um implante, o início da infecção precisa ocorrer dentro de 30 dias após a cirurgia e dentro de um ano se o implante estiver presente.

Quadro 1. Definição de infecção1,3

Superficial Profunda Órgão/Espaço

Drenagem purulenta da incisão superficial

Drenagem purulenta profunda da incisão, mas não de órgão/espaço componente do sítio cirúrgico

Drenagem purulenta de dreno colocado dentro de órgão ou espaço

Organismos isolados assepticamente obtidos de cultura ou fluido ou tecido da incisão superficial

Deiscência de sutura profunda ou abertura pelo cirurgião

Organismo isolado de cultura asséptica de fluido ou tecido obtido de órgão ou espaço

Sinais ou sintomas de infecção (dor, rubor, calor, edema)

Abscesso ou outra evidência de infecção envolvendo a incisão profunda (exame direto, reoperação ou exame radiológico)

Abscesso ou outra evidência de infecção envolvendo órgão ou espaço (exame direto, reoperação ou exame radiológico)

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Capítulo 4 Infecção e anestesia — Parte I 53

fATORES DE RISCO ASSOCIADOS COm O DESENvOLvImENTO DE INfECçãO póS-OpERATóRIARelacionados ao paciente — Existem diversas características que estão associadas com au-mento de risco de desenvolver infecção pós-operatória (Quadro 2). Em cirurgia cardíaca, aumento de três vezes nas taxas de infecção foi demonstrado nos pacientes diabéticos com hiperglicemia pós-operatória (glicose sanguínea > 200 mg/dL).5 Essa associação provavelmente está relacionada com o decréscimo da função dos granulócitos que ocorre com a hiperglicemia. A hiperglicemia afeta a função dos granulócitos por interferir com a aderência, com a quimiotaxia, com a fagocitose e com a atividade bactericida.3 Em cirurgia cardíaca, o tabagismo pode aumentar a incidência de in-fecção da ferida operatória, constituindo-se em fator de risco independente para o desenvolvimento de infecção da esternotomia.6 Pacientes mal nutridos em uso crônico de corticosteroides ou com resposta imune alterada (HIV, quimioterapia, câncer) têm uma deficiente imunocompetência e risco aumentado para desenvolver infecção pós-operatória.7

Extremos de idade e obesidade são outros fatores de risco relatados.8

O estafilococo áureo é encontrado nas narinas de 20% a 30% dos indivíduos saudáveis. Após cirurgias cardiotorácicas, a condição de carreador positivo é um fator de risco independente para o desenvolvimento de infecção pós-operatória.9 Ensaio clínico randomizado demonstrou que a identificação rápida dos carreadores e a descolonização dos sítios nasais e extranasais reduz sig-nificativamente a incidência de infecção hospitalar.10 Além disso, a internação prolongada associa- -se com aumento do risco de desenvolver infecção pós-operatória.1 Em pacientes submetidos a cirurgias de câncer colorretal, a transfusão sanguínea aumenta em 14%, por unidade de sangue transfundida, o risco de infecção.11 Em cirurgias cardíacas pacientes que recebem sangue têm aumento de 76% na possibilidade de desenvolver infecções sérias (sepse, choque séptico, pneu-monia ou mediastinite).12

Quadro 2. Fatores de risco associados com o desenvolvimento de infecção pós-operatória1,3

Relacionados ao paciente Relacionadas à cirurgia

Diabetes com controle inadequado Duração da escovação cirúrgica das mãos

Uso de nicotina Antissepsia da pele

Uso de esteroide Tricotomia pré-operatória

Malnutrição Profilaxia antimicrobiana

Idade Ventilação da sala cirúrgica

Obesidade Material estranho no campo cirúrgico

Infecções coexistentes Drenos cirúrgicos

Internação prolongada Técnica cirúrgica

Resposta imune alterada

Transfusão perioperatória

Relacionados à cirurgia — Fatores cirúrgicos associados com a prevenção de infecção são aqueles envolvidos com a antissepsia. Os membros da equipe cirúrgica que têm contato com o campo cirúrgico ou com instrumentos estéreis precisam realizar escovação cirúrgica apropriada.

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54 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

A primeira escovação do dia, que deve ser de no mínimo cinco minutos, deve incluir limpeza su-bungueal.13 Escovações subsequentes devem ser de, no mínimo, três minutos. Antes de aplicar antisséptico na pele do paciente, qualquer pelo deve ser removido com máquina, não com lâmina, quando uma lâmina é utilizada aumentam as taxas de infecção cirúrgica.14,15

Antes de utilizar o antisséptico, a pele do paciente deve ser preparada e degermada para se ter certeza de que nenhuma contaminação grosseira está presente. Demonstrou-se que a escovação da pele utilizando clorexidina reduziu em mais de 40% a taxa de infecção quando comparada com povidine-iodine.16,17

pREvENçãO DE INfECçãO RELACIONADA à ANESTESIADesinfecção dos equipamentos — O aparelho de anestesia pode ser potencialmente exposto ao material infectante durante o uso. O equipamento pode tornar-se contaminado pelo contato direto com a pele, com mucosa, com secreções e com sangue do paciente. O interior do circuito respiratório pode tornar-se contaminado pelo contato com secreções respiratórias. A contaminação pode ocorrer por manuseio impróprio do equipamento ou pela quebra da técnica de controle de infecção. Embora documentada, a transmissão de infecção pelo aparelho de anestesia é rara.18-20

A esterilização/desinfecção de rotina dos componentes internos do aparelho de anestesia não é necessária ou factível.

Válvulas unidirecionais e absorvedores de CO2 devem ser limpos e desinfectados periodica-mente. As recomendações do fabricante devem ser seguidas para a limpeza e a desinfecção.

Em anestesia, existem dados insuficientes para suportar o uso de rotina de filtros antibacterianos no circuito respiratório ou nos ventiladores. O filtro, adaptado na peça em Y prévio ao contato com um paciente, está indicado para uso em pacientes com alto risco de desenvolver tuberculose.

Os foles e tubos de ventilação devem ser limpos e desinfectados a intervalos regulares. Em contraste com os ventiladores mecânicos utilizados em terapia intensiva, os ventiladores usados em anestesia apresentam baixo risco para transmissão de infecção e não necessitam limpeza e desinfecção após cada uso.

Dispositivos como cateteres, agulhas, o interior de linhas vasculares, conectores, seringas, ca-teteres urinários, ou seja, qualquer instrumento que entrar em contato com ambientes estéreis do corpo do paciente também deve ser estéril, e a esterilidade precisa ser mantida durante o uso. Além disso, para evitar a introdução de microrganismos, técnicas assépticas devem ser observadas.

Instrumentos que entram em contato com membrana mucosa, mas não penetram na superfície corporal, devem ser livres de contaminação, mas não necessitam ser estéreis. Essa premissa é válida para lâminas de laringoscópio, dispositivos orais e nasais, máscara facial, circuitos respira-tórios, estetoscópio esofágico e sensores de temperatura.18-20

Durante a utilização, embora se espere que ocorra alguma contaminação por secreções orais/nasais, os tubos endotraqueais e endobrônquicos devem ser conservados livres de contaminação até o momento do uso.21 Durante o uso desses tubos outras potenciais fontes de contami- nação (estiletes, lubrificantes, cateteres de aspiração) também devem ser mantidas livres de con-taminação. Após a utilização, itens reutilizáveis devem ter secreções e sangue removidos ime-diatamente e uma descontaminação prévia à reutilização deve ser feita, mediante processo de esterilização ou desinfecção de alto nível.21,22

Outros equipamentos, tais como: sensor de oxímetro, cabos de monitores, aquecedores de sangue, bombas de infusão, aparelhos de pressão não invasiva, entre outros, que usualmente

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Capítulo 4 Infecção e anestesia — Parte I 55

não tocam o paciente ou que tocam somente pele intacta, devem ser limpos com um desinfetante ao final do dia ou quando visivelmente contaminados. As superfícies horizontais dos monitores e do aparelho de anestesia são mais propensas à contaminação e devem ser limpas regularmente.

Em anestesia, a reutilização de dispositivos descartáveis não é recomendada, pois não existem dados suficientes sobre a segurança dessa prática. O processo de desinfecção ou esterilização química pode danificar ou alterar as propriedades do equipamento descartável tornando seu uso inseguro. A reutilização também transfere a responsabilidade legal do fabricante para o usuário.21

medicamentos — Para prevenir infecções, a manipulação segura das medicações parenterais que são utilizadas em anestesia e sedação é importante. Ampolas, frascos ou seringas pré-cheias contêm medicação planejada para utilização em um único paciente e geralmente sem agentes bacteriostáticos/preservativos que geralmente são encontrados nos frascos com multidoses. O CDC sugere que a me-dicação seja mantida fechada até o tempo da administração. Fármacos parcialmente usados e ampolas abertas podem ser contaminados com bactérias ou outros microrganismos presentes em fragmentos de vidro não estéril, com contaminantes do ar ou por falha no uso de técnica asséptica.23 Essas reco-mendações se aplicam a todas as medicações, embora microrganismos proliferem mais rapidamente em algumas medicações, propofol por exemplo.24-26

Seringas e agulhas — Seringas e agulhas são itens de uso único. Medicações de uma seringa não devem ser administradas para múltiplos pacientes, mesmo se a seringa ou a agulha forem trocadas.

Após entrar em contato com a infusão intravenosa (IV) de um paciente a seringa e a agulha devem ser consideradas contaminadas e usadas somente para aquele paciente. Ao final de cada anestesia, todas as agulhas e seringas devem ser descartadas imediatamente em um recipiente apropriado.

Para evitar contaminação, seringas e agulhas não usadas e itens relacionados devem ser es-tocados em área limpa.

Toda a literatura é contrária à administração de medicação para múltiplos pacientes usando a mesma seringa, ainda que a agulha seja trocada. A remoção da agulha da seringa cria um efeito sifão que aspira conteúdo da agulha para dentro da seringa. Uma agulha contendo vírus ou bactérias pode contaminar a seringa, mesmo quando a agulha é lavada antes da remoção da seringa.27,28

Quando usada para administração de medicamento por via IV, subcutânea ou intramuscular, a seringa pode tornar-se contaminada com microrganismos presentes no sangue. A linha IV pode tornar-se contaminada por refluxo de sangue durante aspiração de amostra ou transfusão. Infecção por patógenos do sangue pode estar presente mesmo se o sangue não é visível na linha.29,30

A seringa e seu conteúdo podem também ser contaminados por contato direto ou por trans-missão pelo ar. Durante a abertura da seringa, líquidos podem contaminar seu conteúdo.31 Inje-ções múltiplas aumentam a chance de contaminação da seringa.

Diversos fatores afetam a estabilidade e a esterilidade das medicações. Estes incluem a droga em particular, a presença de agente bacteriostático ou preservativo, a solução usada para diluição, a contaminação potencial durante o processo de administração, a técnica asséptica utilizada, as condições de estocagem e a estabilidade química dos compostos. Em condições favoráveis, mui-tas bactérias entram em uma fase logarítmica de crescimento após aproximadamente 24 horas, o que aumenta a possibilidade de contaminação. Preparar as medicações ao tempo da administra-ção pode minimizar o potencial para que ocorra crescimento bacteriano significante ou formação de endotoxinas.25,32

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Fármacos como o propofol, que são formulados em emulsão lipídica, possibilitam o cres-cimento bacteriano que aumenta rapidamente seis horas após a inoculação.33 Febre, infecção, sepse ou outras condições que ameaçam a vida foram relatadas após contaminação extrínseca do propofol.25,26

O propofol agora tem um agente bacteriostático adicionado à solução para diminuir a taxa de crescimento bacteriano e evitar a contaminação extrínseca.

Se a técnica asséptica é utilizada, frascos multidoses não contaminados podem ser usados até a data de vencimento. Se a contaminação é suspeitada ou visível, ou se a esterilização é questionável, o frasco deve ser descartado. Toda vez que um frasco multidose é utilizado, técnica asséptica deve ser usada, incluindo limpeza da borracha de vedação com álcool e uso de agulha e de seringa estéreis. O risco de infecção nosocomial causada por contaminação extrínseca de um frasco multiuso é pequeno e estimado em 0,5 por 1.000 frascos.22,34

Foram publicados relatos de infecções virais e bacterianas, incluindo infecção fatal por vírus da hepatite B (HBV), com a utilização de frascos multiuso.35-38

Com quebra da técnica asséptica, a contaminação microbiana da agulha, da seringa ou da tampa de borracha pode introduzir agentes infectantes para dentro do frasco. Embora o exame cultural de frascos usados na prática anestésica, escolhidos de forma randomizada, tenha en-contrado resultados negativos,39 a contaminação deliberada do frasco demonstra que bactérias viáveis podem existir por até 16 horas.36 Endotoxinas produzidas por contaminação bacteriana40 e partículas virais podem sobreviver e estar presentes em alguns frascos multiusos.41

Frascos multiusos devem ser descartados se o prazo de validade for atingido ou se ocorrer contaminação grosseira do frasco que foi manipulado sem se utilizar técnica asséptica.41 Quando preparações estéreis apropriadas são usadas com frascos multiusos, a instituição deve estabelecer um tempo específico de uso para o frasco aberto,22,42,43 sendo o frasco rotulado, datado no momen-to do primeiro uso e descartado após expirar o prazo estipulado. Se frascos multiuso previamente usados podem ser armazenados por um período prolongado, é boa prática usar o frasco armaze-nado há mais tempo, antes de utilizar o mais novo. Na área clínica, na sala cirúrgica ou no depar-tamento de emergência, onde é mais provável o tratamento de pacientes criticamente enfermos, pode ocorrer quebra da técnica asséptica, assim, algumas instituições sugerem o uso de frasco de uso único e recomendam descartar frascos multiusos após o uso em um único paciente.44

Itens que entram em contato com o sistema vascular ou com outras áreas estéreis do organis-mo precisam ser estéreis.22

A esterilidade não pode ser garantida se uma infusão é usada em múltiplos pacientes. A retira-da de sangue para exames ou a realização de transfusão podem potencialmente contaminar o dis-positivo venoso. Uma válvula unidirecional na linha de administração não previne o fluxo retrógrado de sangue no interior do um cateter IV.29 A esterilização do produto e a ausência de contaminação não podem ser garantidas por inspeção visual.

INSERçãO E mANuTENçãO DE CATETER vENOSO CENTRALO uso de cateter venoso central pode acarretar uma variedade de complicações relacionadas a in-fecções locais e sistêmicas, tais como: tromboflebite séptica, endocardite, septicemia, infecção a dis-tância. Infecções relacionadas ao cateter são associadas com aumento de morbidade, mortalidade, hospitalização prolongada e aumento de custos médicos e hospitalares.34,45

Assim, para prevenir infecção recomenda-se: lavar as mãos antes e após palpar, inserir, reco-locar ou trocar o curativo em todo o dispositivo intravascular.22,46

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Capítulo 4 Infecção e anestesia — Parte I 57

Aderência estrita a protocolos de lavagem das mãos e utilização de técnica asséptica perma-nece sendo a principal medida para a prevenção da infecção relacionada ao cateter.47

Estudos epidemiológicos demonstram que a bacteremia associada a dispositivos intravas-culares relaciona-se com técnica inapropriada do pessoal hospitalar para lavar as mãos.48 Antes da inserção do cateter, recomenda-se lavar a pele local com um antisséptico apropriado, álcool a 70%, povidine-iodine a 10%, clorexidina a 4% ou tintura de iodo a 2%.49 O uso de antissepsia cuidadosa reduz a incidência de infecções de cateteres venosos centrais.50 Cateteres multilúmen são associados com uma taxa mais alta de infecção, quando comparados com cateteres mo-nolúmen.22,51

A escolha do local de inserção do cateter venoso central e a relação risco:benefício com a in-serção subclávia, jugular ou femoral devem ser consideradas. Cateteres inseridos na veia subclávia têm menores riscos de infecção do que os inseridos na veia jugular ou na veia femoral. Contudo cateteres inseridos na veia jugular interna apresentam menos complicações mecânicas.52 Para a inserção de cateteres venosos centrais recomenda-se máxima barreira de proteção: avental, luvas estéreis, gorro, máscara, campos estéreis que cubram a cabeça e o corpo do paciente. O risco de infecção associa-se com a barreira de proteção usada durante a inserção do cateter mais do que com a esterilidade do ambiente em que o cateter é introduzido.22,53,54

Curativos transparentes semipermeáveis ou curativos usando gaze estéril apresentam menores taxas de colonização da pele e infecções relacionadas ao cateter.22 Se o paciente apresentar dia-forese, se existir sangramento ou exsudato, o curativo com gaze estéril é preferível em relação ao curativo transparente semipermeável.22

A aplicação tópica rotineira de antimicrobiano no local de inserção do cateter não é recomen-dada. Estudos de eficácia dessa prática são contraditórios, e o uso de antibióticos que não são fungicidas pode aumentar significantemente as taxas de colonização por fungos.55

O risco diário de infecção permanece constante, e a troca de rotina do cateter venoso cen-tral não reduz a taxa de colonização do cateter ou de infecção sanguínea relacionada a este.56

A administração de fluidos deve ser trocada a cada 72 horas,57 pois não existe redução nas taxas de infecção se a troca ocorrer em intervalos menores.57,58

Em resumo: lavar as mãos, usar máxima barreira de proteção, lavar a pele com clorexidina, se possível evitar a punção femoral e remover cateteres assim que possível são práticas recomenda-das pelo CDC22 que foram validadas.47

pRECAuçõES DIANTE DE um pACIENTE ImuNOSSupRImIDOSabe-se que os pacientes com síndrome de imunodeficiência adquirida representam um risco de in-fecção ocupacional para o anestesiologista. Por outro lado, é importante reconhecer que o anestesio-logista pode transmitir agentes infecciosos para um paciente imunossuprimido. A transmissão de um organismo ordinariamente benigno para um paciente imunossuprimido (transplante de órgãos, aids) pode causar infecções que ameaçam a vida.

Diferentemente do que acontece com o paciente imunocompetente, o herpes simples no pa-ciente com aids (ou outros pacientes imunocomprometidos) é debilitante, doloroso, potencialmen-te fatal e frequentemente fulminante. Muitos anestesiologistas com sistema imunológico intacto abrigam Pneumocystis carinii ou citomegalovírus e são assintomáticos. Esses microrganismos no paciente com aids ou imunossuprimido podem causar doenças graves e morte. Assim, é impera-tivo tomar todas as precauções para evitar o risco potencial de transmissão de microrganismos do anestesiologista para os pacientes.59

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58 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

Quando procedimentos eletivos precisam ser realizados em pacientes com tuberculose, idealmente o procedimento deve ser retardado até o paciente deixar de ser bacilífero. Quando pro-cedimentos precisam ser realizados num paciente com, ou suspeito de ter, tuberculose pulmonar ativa, a porta da sala cirúrgica deve permanecer fechada e o trânsito de pessoas deve ser limitado. A cirurgia deve ocorrer com o menor número de cirurgias concomitantes, sendo realizada ao final do dia. Pacientes com tuberculose que necessitam de cirurgia devem ser conduzidos ao centro cirúrgico usando máscara apropriada para prevenir exposição de secreções ao ar.59 Embora não existam casos descritos de transmissão de tuberculose via ventilador ou aparelho de anestesia, há tecnologia que previne o risco de contaminação. Filtros de ar particulados, que são colocados entre a conexão em Y adaptada às traqueias do aparelho de anestesia e à máscara ou ao tubo endotraqueal, são caracterizados como de alta eficiência e removem até 99,97% de todas as par-tículas maiores ou iguais a 0,3 µm.60,61

TRANSmISSãO OCupACIONAL DE INfECçãO pARA O ANESTESIOLOGISTAAs principais rotas de exposição ocupacional resultando em transmissão sanguínea são as lesões percutâneas (acidentes punctórios), contato de secreções com a mucosa (olho, boca e membrana mucosa) ou contato com pele não intacta.62

Lavar as mãos é um dos mais efetivos meios de proteger a equipe de saúde da infecção. Fluidos do corpo que contenham microrganismos produtores de doenças facilmente contaminam a pele de mãos sem luva. Adicionalmente, as mãos podem ser contaminadas via rupturas nas luvas.63 No ambiente hospitalar microrganismos que são frequentemente encontrados na pele dos anestesiologistas são adquiridos de pacientes infectados ou colonizados, podendo ser origem de infecção nosocomial. Essa flora microbiana pode ser facilmente removida lavando-se as mãos.63

A história médica e o exame físico não conseguem identificar todos os pacientes infectados com HIV ou outros microrganismos causadores de doenças. Portanto, é recomendado que bar-reiras de precaução sejam usadas em todos os pacientes, principalmente se considerar-se que existe um aumento da prevalência de infecções sanguíneas em todo o mundo.64-66

O risco de transmissão de infecção por HIV após contato com a pele, com membrana mucosa ou com sangue de paciente portador do vírus HIV, é estimado ser de 0,1% ou menos. O risco aumenta com a quantidade de vírus inoculado, com altos níveis de titulação viral no sangue, com tempo prolongado de contato, quando uma grande área de superfície é envolvida ou quando existe lesão exposta de pele. Existem poucos dados sobre a exposição da conjuntiva ao HIV ou sobre o sangue infectado com HIV ou outros fluidos corporais, mas duas soroconversões de HIV e uma de vírus de hepatite C (HCV) foram documentadas com taxas de transmissão de 0,8% para HIV e de 0,3% para HCV.62

A lesão percutânea por acidente de punção associa-se com maior risco de transmissão de infecção sanguínea. O risco de adquirir infecção HIV após uma exposição acidental permanece desconhecido, mas foi estimado em 0,3%.66,67 O risco aumenta se a lesão do anestesiologista for profunda, se existir sangue visível na extremidade da agulha, se a agulha for colocada diretamente na veia ou na artéria do paciente, se o paciente tiver doença retroviral aguda ou estágios avança-dos de aids.67-69

O plasma sanguíneo e o fluido cerebroespinhal têm altas concentrações de HIV e apresentam um risco maior de exposição. Saliva, lágrimas, urina, leite, líquido amniótico e secreções vaginais possuem menor risco.69

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Capítulo 4 Infecção e anestesia — Parte I 59

Após exposição percutânea com sangue infectado, o risco de transmissão de HBV para um anestesiologista não imune ao HBV varia entre 6% e 37%,70 e o risco de transmissão de HCV é de aproximadamente 3% a 10%.71

Comparado com o uso de um único par, o uso de luvas duplas oferece aumento de proteção quando ocorrem lesões penetrantes nas mãos.71-74

O uso de luvas pode também diminuir o risco de infecção por inóculo penetrante em alguns tipos de acidentes com lesões por picada de agulha.73-75

Os serviços de anestesia devem ter um protocolo detalhado para o tratamento e o acompa-nhamento do anestesiologista que tenha exposição ocupacional a sangue ou fluidos corporais. Imunização para HBV e imunoglobulina HBV são usadas para reduzir o risco de transmissão ocupacional. O uso de terapia antiviral profilática com multidrogas para HIV é recomendado por serviços de saúde pública.76-78

Recomendações atualizadas para o tratamento e o acompanhamento devem ser consultadas, já que a escolha do agente antiviral pode alterar e os anestesiologistas expostos ao HIV devem receber aconselhamento e terapia antiviral pós-exposição.76-78 Está descrito que a profilaxia pode não ser efetiva se iniciar 24 a 36 horas após a exposição, mas isso não é certo.76-78 Após exposição percutânea a sangue infectado por HIV, o CDC relatou decréscimo de 79% no risco de infecção entre anestesistas que usaram zidovudina.67

víRuS DA hEpATITE B (hBv) E vACINAçãOEm anestesistas que têm contato frequente com sangue e fluidos, a infecção por HBV é um risco ocupacional.79 O CDC estimou que, em 1994, mil anestesistas foram infectados com HBV. Em estudo multicêntrico a prevalência dos marcadores séricos para infecção prévia por HBV foi de 19%.80 Isso é quatro a seis vezes maior do que a soroprevalência na população em geral. Considerando que o risco para infecção por HBV está aumentado em anestesistas não protegidos, a imunização deveria ser feita durante o treinamento médico, antes da primeira exposição ao sangue.

EvACuAçãO DA fumAçA DuRANTE CIRuRGIA COm uSO DE laserEstudos clínicos e laboratoriais indicam que o DNA viral pode ser encontrado na fumaça após o uso de dióxido de carbono para vaporizar verrugas como no condiloma acuminado,81,82 entretanto, a infec-tividade não foi provada. Estudo demonstrou que vírus viáveis podem ser transmitidos por intermédio da fumaça.83 O uso de aspiradores que removam adequadamente a fumaça diminuem os riscos da vaporização,84 e o uso de barreiras de precauções como máscaras e luvas estabelecem prevenção do contato do vírus com a membrana mucosa.

CheCklist E mELhORA DA quALIDADEOs seres humanos são limitados em sua habilidade para lembrar e realizar tarefas, especialmente se submetidos a situações de fadiga ou de estresse intenso. Sistemas informatizados melhoram a com-placência em áreas como dispensação de medicamentos e previnem erros de medicamentos por fornecer alertas.85 Para o sucesso da implementação de alertas clínicos é necessário a aceitação dos usuários, além dos alertas eletrônicos terem de ser simples e efetivos, devendo estar relacionados com situações clínicas importantes.86 Checklist para padronizar processos, melhorar o acesso à informação

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e proporcionar controle reduz a confiança na memória.87 Estudos têm demonstrado que a utilização de checklist perioperatório,88 a adesão, a vigilância e o treinamento são ferramentas importantes para promover troca de informação e melhoria da qualidade.89

Em conclusão, o procedimento anestésico/cirúrgico está relacionado com riscos de trans-missão de agentes infecciosos ao paciente, que podem estar relacionados ao próprio paciente, a falhas humanas, aos equipamentos, aos dispositivos e insumos utilizados para a execução do ato anestésico. O procedimento também pode acarretar risco de contaminação do profissional anestesiologista por agentes advindos do paciente. A lavagem apropriada das mãos, a utilização de equipamentos de proteção individual, bem como a educação continuada, adaptando o am-biente de trabalho ao uso de checklist de segurança, melhoram a qualidade e diminuem os riscos de infecção tanto para o paciente quanto para o anestesiologista.

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Capítulo 4 Infecção e anestesia — Parte I 61

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Capítulo 5

inFeCção e AneSTeSiA — PArTe ii

Ana LuftCláudia Regina Fernandes

Florentino Fernandes Mendes

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66 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

INTRODuçãOEm agosto de 2002, o Center for Medicare Medicaid (CMS) e Center for Control Disease and Prevention (CDC) programaram o projeto National Surgical Infection Prevention (SIP) com o objetivo de reduzir a morbidade e a mortalidade associadas à infecção cirúrgica pós-operatória, cuja meta foi estabelecer a adequada seleção da antibioticoprofilaxia e o tempo ideal de administração. Três medidas de desem-penho foram desenvolvidas: administração do antibiótico uma hora antes da incisão cirúrgica, seleção do antibiótico de acordo com as recomendações nacionais (CDC, Joint Comission, CMS) e desconti-nuação do antibiótico 24 horas após o início da cirurgia.1-3

Em 2005 os esforços do SIP envolveram o Surgical Care Improvement Project (SCIP) com o ob-jetivo de melhorar os cuidados perioperatórios a fim de reduzir significantemente as complicações cirúrgicas. O objetivo estabelecido era diminuir, em 25%, a morbimortalidade cirúrgica até o ano de 2010, com foco definido em seis áreas: (1) antibioticoprofilaxia dentro de 60 minutos antes da incisão cirúrgica; (2) seleção do antibiótico de acordo com as recomendações; (3) descontinuação do antibiótico 24 horas após a cirurgia; (4) adequada tricotomia; (5) controle glicêmico para cirurgia cardíaca; (6) normotermia para cirurgia colorretal.1

Entre janeiro de 2005 e julho de 2006, o Institute for Healthcare Improvement estimou que a implantação, em larga escala, das seis determinações poderiam evitar cem mil mortes. Iniciou-se então a campanha das cem mil vidas. Estima-se que os 3.100 hospitais participantes dessa inicia-tiva salvaram aproximadamente 122.000 vidas em 18 meses.

No paciente cirúrgico, 80% das infecções nosocomiais se concentram em quatro sítios: sistema urinário, usualmente associada à cateterização vesical; sítio cirúrgico; corrente sanguí-nea, geralmente associada ao dispositivo intravascular; sistema respiratório, usualmente ventila- dor-associada.4

Os objetivos deste capítulo são: descrever os quatro determinantes da campanha do Institute for Healthcare Improvement que comprovadamente modificam o risco de morbimortalidade rela-cionada à infecção do paciente cirúrgico; descrever os aspectos que contribuem para minorar a incidência de infecção e os fatores de riscos de cunho biológico, que estão associados ao agente infeccioso, ao paciente, ao procedimento cirúrgico e à anestesia em si, que podem contribuir para ocorrência de infecção no período pós-operatório.

uSO ApROpRIADO DE ANTIBIóTICOUma das mais importantes intervenções para prevenir a infecção cirúrgica é a otimização da antibiotico-profilaxia.4 Esta refere-se à administração de um curso breve de antibiótico antes do início da cirurgia.5 O objetivo é reduzir a carga total de microrganismos que contaminam a ferida operatória para um nível no qual as defesas do hospedeiro possam lidar com o quantitativo.6

Estudos relacionados à profilaxia antimicrobiana são relevantes. Em 400 pacientes submetidos a cirurgias eletivas intra-abdominais, resultados satisfatórios foram obtidos quando a profilaxia foi realizada uma hora antes da incisão cirúrgica.7 Outro estudo comparou três grupos de pacientes: (1) os que receberam antibiótico no pré-operatório, antes da incisão; (2) os que receberam antibió- tico no intraoperatório; (3) os que receberam antibiótico no pré- e no pós-operatório. Observou- -se diminuição significante na taxa de infecção pós-operatória no grupo que recebeu antibiótico no pré-operatório, antes da incisão cirúrgica. Em contrapartida, o grupo que recebeu antibiótico no intraoperatório apresentou risco três vezes maior de desenvolver infecção, e o grupo que rece-beu a medicação antimicrobiana nos períodos pré-operatório e pós-operatório apresentou risco

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Capítulo 5 Infecção e anestesia — Parte II 67

cinco vezes maior de desenvolver infecção.8 Recomenda-se que a terapia antimicrobiana seja descontinuada dentro de 24 horas após a cirurgia. Demonstrou-se que a antibioticoterapia após o fechamento da ferida operatória é desnecessária e que o uso prolongado de antibióticos com o propósito profilático associa-se com resistência bacteriana.2

ApROpRIADA REmOçãO DE pELOS (TRICOTOmIA) O uso de lâminas para a realização de tricotomia aumenta a incidência de infecção quando comparado com o uso de máquinas apropriadas (tricotomizador) ou a não remoção de pelos. Assim, deve-se dar preferência à remoção de pelos por intermédio de máquinas.9,10

CONTROLE GLICêmICO póS-OpERATóRIONo paciente cirúrgico a hiperglicemia é uma resposta comum. A resposta ao estresse aumenta a libera-ção de hormônios contrainsulínicos (cortisol, glucagon, epinefrina, hormônio do crescimento), levando a um upregulation da gliconeogênese e da glicogenólise, que culmina com o comprometimento da regulação da captação periférica de glicose catalisada pela insulina.11 Embora o racional para a resposta hiperglicêmica não seja ainda muito bem compreendido, sabe-se que a hiperglicemia aguda tem mui-tos efeitos deletérios. Sobre esses efeitos, podem-se citar: a diminuição da vasodilatação fisiológica, o decréscimo da reatividade endotelial ao óxido nítrico, o comprometimento na função do sistema do complemento, o aumento na expressão de leucócitos e moléculas endoteliais de adesão, o aumento dos níveis de citocinas, o prejuízo na quimiotaxia e a fagocitose dos neutrófilos, comprometendo a res-posta inflamatória, que causa maior vulnerabilidade para o desenvolvimento de infecção e disfunção de múltiplos órgãos.12

Em pacientes submetidos a cirurgias cardíacas, a hiperglicemia pós-operatória está relaciona-da ao aumento na incidência de infecção.13,14 Nesse tipo de intervenção, foi demonstrado que o controle agressivo da glicemia diminui a incidência de infecção cirúrgica.11,15 Em cirurgia vascular infrainguinal, demonstrou-se por meio de estudo de coorte retrospectivo que a hiperglicemia é fa-tor de risco para infecção.16 Outro estudo, realizado durante o pós-operatório de cirurgias de clam-peamento de aneurisma cerebral, comparou o controle estrito da glicemia com terapia insulínica, cujo alvo da glicemia era de 80 a 120 mg/dL, com tratamento convencional, cujo alvo glicêmico era de 80 a 220 mg/dL. Foi observada diminuição das taxas de infecção de 42% para 27% nos pacientes com controle intensivo.17

Em pacientes diabéticos, demonstrou-se que quanto maior forem os níveis glicêmicos, maior será o risco de desenvolver infecção.18 Entretanto, ainda não se demonstrou com clareza se o con-trole agressivo com terapia insulínica traz benefícios para os demais tipos de cirurgia, se somente para pacientes diabéticos ou para todos os pacientes e se existe diferença na resposta entre pacientes diabéticos do tipo 1 e do tipo 2.11 Essas considerações são importantes, pois estudos têm evidenciado aumento das taxas de hipoglicemia e de morte súbita com o controle glicêmico agressivo.19,20

NORmOTERmIA INTRAOpERATóRIADurante a anestesia ocorre perda de calor por meio de radiação, convecção, condução e evaporação. Mediante radiação, é dissipada a maior parte do calor. A anestesia predispõe à diminuição da tempe-

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ratura corporal por causar vasodilatação periférica, que causa distribuição do calor do compartimento central para o compartimento periférico.21

Pacientes submetidos à cirurgia colorretal têm maior predisposição à infecção cirúrgica se hou-ver hipotermia no período perioperatório.22 Diminuição de 1,9 oC na temperatura central de pacien-tes submetidos à ressecção de cólon triplica a incidência de infecção e aumenta a permanência hospitalar em 20%.23,24

Hipotermia leve está associada à infecção cirúrgica. A explicação para essa associação se dá pelo fato de que a vasoconstrição termorregulatória diminui a tensão de oxigênio no tecido sub-cutâneo. A diminuição das tensões de oxigênio prejudica a morte dos microrganismos, já que o processo de lise se dá mediante oxidação, por meio da atividade dos neutrófilos. Os baixos teores de oxigênio também prejudicam a cicatrização da ferida operatória em consequência à redução do depósito de colágeno.23

Hipotermia leve (temperatura central 1,3 oC abaixo do normal) é achado comum durante cirurgias de grande porte, em razão de prejuízos ocasionados na termorregulação normal, que são induzidos pela anestesia e pela alteração na redistribuição da temperatura corporal.25,26

A hipotermia é mais intensa quando a anestesia geral é combinada com a peridural27 e, a menos que o paciente seja ativamente aquecido, a hipotermia leve inadvertida é considerada inevitável durante a anestesia, já que os métodos passivos de aquecimento geralmente não são efetivos.28-30

Além de prejudicar a fagocitose dos microrganismos pelos granulócitos, mediante processos de oxidação, a hipotermia leve também interfere na produção de anticorpos.31

Ensaio clínico randomizado realizado em pacientes submetidos a cirurgias colorretais encon-trou redução de três vezes nas taxas de infecção nos pacientes que receberam aquecimento ativo durante a anestesia, associada à diminuição de 2,6 dias no tempo de internação hospitalar.32

A hipotermia perioperatória leve também aumenta a suscetibilidade para perda sanguínea e a ne-cessidade de transfusão no pós-operatório, que predispõe à infecção.

EvITAR ADmINISTRAçãO DE hEmOCOmpONENTESJá está bem consolidado na literatura que a hemotransfusão diminui a imunidade e predispõe à infec-ção. No contexto da cirurgia colorretal, estudo retrospectivo demonstrou aumento das taxas de infecção de 4% para 11%, em pacientes que foram transfundidos.33 Em análise multivariada, foi calculado um aumento no risco de 7% de desenvolvimento de infecção pós-operatória, para cada unidade de con-centrado de hemácia transfundida.33 Portanto, componentes sanguíneos deveriam ser usados com critério e somente quando especificamente indicados.

Além da diminuição da resposta imune, a transfusão de sangue e seus produtos podem poten-cialmente causar infecções bacterianas, virais, por protozoários e por príon.34

SupLEmENTAçãO DE OxIGêNIO DuRANTE O pERIOpERATóRIOA lise de organismos infectantes por leucócitos polimorfonucleares, mediante mecanismo oxidativo, é o mecanismo de defesa primário durante a cirurgia. A pressão parcial de oxigênio na região da ferida

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Capítulo 5 Infecção e anestesia — Parte II 69

operatória é importante para esse mecanismo de defesa e se correlaciona com a incidência de infecção do sítio cirúrgico.35

Estudo demonstrou que o aumento da fração inspirada de oxigênio, mantido por duas horas no pós-operatório imediato, reduz a incidência de infecção de 11% para 5%.36 Em cirurgias color-retais usando oxigenoterapia suplementar no pós-operatório foi demonstrada diminuição na inci-dência de infecção.36,37 Os mesmos achados foram observados em cirurgias de coluna, usando frações inspiradas de oxigênio de 50%.10 Em contrapartida, em pacientes submetidos a diferentes tipos de cirurgia abdominal, ensaio clínico randomizado comparando frações inspiradas de oxi-gênio de 80% e de 30%, durante duas horas após a cirurgia, não encontrou diferença nas taxas de infecção.38

Metanálise de ensaios clínicos randomizados demonstrou que a hiperóxia perioperatória reduz o risco de infecção [redução do risco relativo (RRR) de 25,3%, redução risco absoluto (ARR) de 3,0% e número necessário para tratar (NNT) de 33,0] sem modificar a incidência de complicações pulmonares (atelectasia). O benefício se mostrou maior nos procedimentos colorretais.39

fATORES DE RISCO BIOLóGICOS pARA INfECçãO pERIOpERATóRIA Destaca-se a seguir uma série de variáveis que também contribuem para o desenvolvimento de infec-ção no paciente cirúrgico:

virulência intrínseca — Refere-se à habilidade do agente infectante para resistir à imunidade do hospedeiro.

Carga bacteriana — Um número crítico de organismos invasores (105) é necessário para que ocorra a infecção. Menor carga é necessária para alguns microrganismos muito virulentos ou se um corpo estranho, como um fio de sutura, está presente.40

perfusão tecidual — Um bom suprimento de sangue capacita as células do sistema imunológico para atingir a área infectada. A virulência da fasceíte necrotizante é parcialmente atribuída ao fato de que o suprimento sanguíneo do músculo é perdido, porque a infecção percorre através do plano fascial. O oxigênio é necessário para a morte de microrganismos por fagocitose, então, uma redução na oferta e na liberação de oxigênio (DO2) favorece a infecção. A redução da DO2 pode ser agravada por hipo-volemia perioperatória, anemia ou hipoxemia. A perfusão tecidual pode ser influenciada pela presença de sepse.

O intestino é a principal fonte de infecção endógena, que potencialmente pode levar à sepse sistêmica e à síndrome de disfunção de múltiplos órgãos. Na sepse ocorre redução da liberação de oxigênio na circulação esplâncnica, respiração celular anaeróbica e consequente diminuição do pH. A hipóxia regional predispõe ao aumento da permeabilidade da mucosa intestinal, que causa translocação de bactérias e toxinas para dentro da circulação sistêmica, uma importante causa de infecção em pacientes críticos.25

A hipótese do mecanismo da infecção nosocomial endógena é suportada pelo fato de que a des-contaminação seletiva de organismos endógenos intestinais, usando terapia antimicrobiana tópica e sistêmica, pode reduzir a incidência e a severidade da infecção por microrganismos entéricos.41

Resposta do hospedeiro — A imunidade pode ser classificada como inespecífica e específica.

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Imunidade inespecífica — É processada por todos os indivíduos e não requer memória por exposição prévia para ser efetiva. Em geral, ela atua para prevenir acesso microbiano aos tecidos, como pele e membranas mucosas, e acidez gástrica.42

A ruptura da integridade da pele se dá por incisão cirúrgica, trauma, queimadura ou colocação de cateter intravascular e pode ser a causa de sérias infecções. A atividade de leucócitos poli-morfonucleares (neutrófilos), incluindo quimiotaxia, fagocitose e atividade bactericida, faz parte da imunidade inespecífica.

O sistema respiratório, de especial interesse para o anestesiologista, tem três mecanismos de defesa inespecíficos: os reflexos da glote, que previnem aspiração; as células epiteliais ciliadas, que movimen-tam uma camada de muco por meio da via aérea de maior calibre; e o muco propriamente dito, que atua prevenindo a aderência de microrganismos no epitélio respiratório. O muco contém diversos compostos antimicrobianos, tais como: imunoglobulinas (IgA e IgG), surfactante e fibronectina.25

Imunidade específica — Trata-se de uma resposta adaptativa que requer memória por meio de exposição prévia a um organismo infectante. Pode ser classificada como imunidade humoral ou celular. A imunidade humoral refere-se ao desenvolvimento de moléculas como os anticorpos, sintetizadas por linfócitos B, que neutralizam organismos infectantes. A imunidade celular refere-se aos linfócitos T, que desenvolvem uma resposta específica para um organismo invasor.

Os agentes anestésicos gerais causam diminuição na quimiotaxia, na fagocitose e na atividade bactericida dos leucócitos polimorfonucleares (neutrófilos) e na atividade de células T.25 A produ-ção de anticorpos por intermédio dos linfócitos B não é afetada pela anestesia.42

Diabetes mellitus — As anormalidades metabólicas resultantes do diabetes mal controlado prejudi-cam a quimiotaxia de leucócitos, a opsonização, a fagocitose, a resposta imune mediada por células, a morte intracelular, a aderência de leucócitos e os sistemas antioxidantes envolvidos na atividade bactericida.43

O adequado controle do diabetes pode melhorar a função imune e reduzir a aceleração da aterosclerose. A aterosclerose causa alterações macro e microangiopáticas, reduz a perfusão tecidual e contribui para o surgimento de infecções.44

Tabagismo — O cigarro altera a resposta imune. O uso de tabaco aumenta a produção de muco, diminui a mobilidade ciliar e prejudica a resposta imune específica, pois diminui os níveis de imunoglo-bulina e reduz a atividade dos leucócitos. O alto teor de carboxi-hemoglobina, encontrado em fumantes, reduz a oferta de oxigênio aos tecidos (DO2), que é importante na lise de bactérias mediada por células do sistema imunológico.45

Extremos de idade — Neonatos apresentam imaturidade do sistema imunológico. Pré-termos e recém-nascidos de baixo peso são hipogamaglobinêmicos,46 o que acarreta maior risco de desenvolver infecção.

Infecção é também um problema maior em idosos. Existe uma deterioração idade-relacionada do sistema imunológico que conflui para aumento da atividade das células T supressoras, invo- lução do timo e reabsorção da medula óssea. Esses acontecimentos fisiológicos resultam em re-dução da imunocompetência e perda da reserva hematopoética. Na população geriátrica há maior risco de se desenvolver pneumonia. Nessa faixa etária, frequentemente existem outros fatores de risco para o desenvolvimento de infecção no período pós-operatório, tais como: diabetes, neoplasias e doenças crônico-degenerativas, que influenciam na precariedade da resposta imu-nológica quando comparada com o adulto jovem e saudável.25

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Capítulo 5 Infecção e anestesia — Parte II 71

Abuso de álcool — Pacientes com história de uso crônico de álcool têm risco aumentado de desen-volver infecção. O alcoolismo reduz a resposta imune de hipersensibilidade retardada. Estudo observou aumento de três vezes nas taxas de mortalidade pós-operatórias em alcoolistas crônicos, sendo a infecção o maior determinante.25,47 A pneumonia nosocomial é a infecção mais comum nesses pacien-tes.48 A abstinência melhora a resposta imune e a função cardíaca.49

pROCEDImENTOS ANESTéSICO-CIRúRGICOS E INfECçãO

Infecção associada à cateterização urinária, à intubação e à monitorização invasiva Estudo observou que 15% a 25% dos pacientes hospitalizados recebem sondagem vesical.50 Pacientes com cateteres na uretra requerem somente 102 colônias por mL para estabelecer infecção. Em pacientes hospitalizados, a cateterização vesical é a causa predisponente mais comum para sepse fatal por gram- -negativo. Sendo esse procedimento o responsável por 40% de todas as infecções nosocomiais.

A redução do risco de infecção por sondagem vesical requer: diminuição do tempo de ca-teterização, utilização de cateterização intermitente quando possível e evitar o uso profilático de antibióticos, que pode levar à colonização por organismos resistentes.50

A infecção pulmonar nosocomial é responsável por 20% de todas as infecções adquiridas no hospital, e os pacientes submetidos à entubação endotraqueal e à ventilação mecânica apresen-tam quatro vezes mais risco, quando comparados com aqueles que não requerem suporte venti-latório.50 Estratégias anestésicas que minimizam a duração da entubação, ou que a evitam, podem contribuir para reduzir a incidência de infecção pulmonar.51

Infecções de linhas intravasculares também são comuns. Staphylococcus coagulase nega-tiva são os organismos mais encontrados, ocorrendo em até 50% dos casos. Fatores de risco incluem: estado físico, duração da cateterização, material com que o cateter é feito e a qualidade da técnica asséptica. Cateter revestido com Teflon® e linhas invasivas revestidas com prata ou heparina resistem à aderência bacteriana.25

Estresse cirúrgico e sistema imune — A imunossupressão fisiológica do paciente cirúrgico re-sulta, primariamente, da resposta ao estresse cirúrgico, mais do que de agentes anestésicos em si. A cirurgia e outros insultos corporais (trauma, queimadura, infecção) desencadeiam uma profunda res-posta neuroendócrina e a produção de citocinas, conhecida como resposta ao estresse. A produção de citocinas é proporcional à extensão do tecido local lesado. Citocinas são pequenas moléculas de glicoproteínas produzidas principalmente por macrófagos em resposta à lesão celular e, quando são liberadas, ativam um número de cascatas de enzimas inflamatórias.52

A amplitude da resposta das citocinas é proporcional ao dano tecidual. Cirurgias laparoscópi-cas têm menor produção de citocinas do que a cirurgia aberta.53 Existem interações complexas entre citocinas [fator de necrose tumoral α (FNT-α), interferona, interleucinas, especialmente IL-1 e IL-6] e sistemas imune, endócrino e nervoso. Em cirurgias menores o número de linfócitos perma-nece inalterado, mas tende a decrescer em cirurgias de grande porte.54

A imunossupressão pós-operatória dura diversos dias, sendo mais longa no paciente imuno-deprimido.25 Esse fato pode predispor o paciente a desenvolver infecção pós-operatória ou facilitar o desenvolvimento de metástase tumoral.55

Anestésicos gerais não suprimem a resposta ao estresse (exceto quando doses muito eleva-das de opioides são usadas), entretanto, podem inibir a resposta imune (Quadro 1).

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Quadro 1. Efeitos dos anestésicos na resposta imune25

Óxido nitroso Supressão da medula óssea, reduz a formação de superóxidos, reduz a migração de leucócitos.

Halotano Reduz a produção de superóxidos, reduz o metabolismo do ácido aracdônico, reduz a atividade de células Natural Killer estimulada por interferona, reduz a migração de leucócitos.

Enflurano Reduz a produção de superóxidos.

Isoflurano Em altas concentrações reduz a produção de superóxidos, aumenta a citotoxicidade ativada por neutrófilos, reduz a atividade de células Natural Killer estimulada por interferona.

Opioides Reduz a atividade de células Natural Killer (altas doses), reduz a migração de leucócitos e linfócitos.

Tiopental Reduz a atividade fagocitária.

Cetamina Reduz a atividade fagocitária.

Propofol Possível redução na locomoção de leucócitos, se contaminado propicia meio para crescimento bacteriano.

Diazepam, midazolam Reduz a produção de superóxidos.

Etomidato Reduz a atividade adrenocortical, se infusão contínua na UTI, aumenta a mortalidade.

Lidocaína, bupivacaína Tóxica para leucócitos e linfócitos em concentrações usadas para infiltração local.

A anestesia regional, mais comumente a anestesia peridural contínua utilizando anestésico local, com a finalidade de analgesia pós-operatória, preserva a função imune.56

Existe evidência experimental de que os anestésicos locais do tipo amida, quando absorvidos na circulação sistêmica, têm propriedades anti-inflamatórias diretas e previnem a liberação de superóxidos e enzimas citotóxicas.57 Isso pode contribuir para reduzir a incidência de infecção pós-operatória e melhorar a cicatrização cirúrgica.

Muitos mediadores da resposta ao estresse (cortisol, epinefrina) são imunossupressores dire-tos. Em estudos clínicos, a atenuação da resposta ao estresse produzida pela anestesia peridural associa-se com redução de complicações infecciosas pós-operatórias.58,59

Existência de doença pulmonar, pobre status nutricional, cirurgia torácica ou de abdômen su-perior e entubação endotraqueal são os principais fatores de risco para o desenvolvimento de pneumonia nosocomial.60

Estratégias preventivas incluem fisioterapia pré- e pós-operatória, espirometria de incentivo, otimização nutricional, se necessário usando nutrição parenteral total, provisão de analgesia pós- -operatória ótima, evitar aspiração excessiva do paciente ventilado e implementação de política estrita de prevenção e controle de infecção.25 Durante a realização de bloqueio neuroaxial ou de nervo periférico, a contaminação do infusato é uma causa de infecção e pode ser uma fonte im-portante de morbidade, especialmente nos pacientes mantidos com cateter e bombas de infusão para analgesia contínua durante diversos dias.

Duas importantes considerações relacionadas à contaminação do infusato precisam ser res-pondidas. Por quanto tempo uma preparação pode ser administrada com segurança sem o risco de contaminação microbiológica ou instabilidade química? Em geral os anestésicos são quimi-camente estáveis por semanas ou meses, mas faltam dados sobre a estabilidade microbiológi-ca desses compostos. Evidências sugerem que quando soluções contendo anestésico local ou anestésico local e opioides são preparadas usando técnica estéril, a estabilidade microbiológica é mantida por 72 horas.

Microrganismos podem ser introduzidos dentro do espaço neuroaxial ou perineural por três rotas: (1) por meio de contaminação da pele e subsequente extensão ao longo do trajeto da agulha

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Capítulo 5 Infecção e anestesia — Parte II 73

ou do cateter; (2) por extensão direta ou hematogênica de um sítio distante; (3) pela contaminação do infusato.

Embora diversos autores tenham postulado que a contaminação da pele é a causa mais co-mum de infecção neuroaxial em anestesia regional, é importante entender que essa conclusão sobre as causas da infecção é baseada em cultura da ponta do cateter, sem investigação micro-biológica do infusato. Os microrganismos mais frequentemente encontrados são o Staphylococcus aureus e o Staphylococcus epidermidis, que também são fontes comuns de contaminação do infusato, o que torna a causa definitiva da infecção difícil de se provar.61 Além disso, em estudos com cultura da ponta do cateter inserida próximo de nervos periféricos, é relativamente alta a taxa de colonização do cateter, entretanto é baixa a taxa de infecção clínica relatada.62-64

quadro 2. Qualidade do ar — International Standards organization (ISo)61

Classe ISO Número de partículas no ar > 0,5 µg/m3 Exemplo

1 0 Salas de biossegurança controladas por computador

2 3,5

3 35,2

4 352 Nanofabricação

5 3.520 Capela estéril com fluxo laminar

6 35.200 Sala cirúrgica com filtros de ar de alta eficiência

7 352.000

8 3.520.000 Ar fresco

9 35.200.000 Ar ambiente urbano

Toda solução estéril preparada para ser administrada durante diversos dias deveria ser prepa-rada em uma classe ISO 5. Essas condições com certeza não são encontradas na maioria dos hospitais. Mesmo numa sala cirúrgica vazia com filtros de ar de alta eficiência a quantidade de partículas variou entre 0 e 46.263 (ISO classe 0 – 6).65

Em geral compostos comumente usados em anestesia regional, incluindo lidocaína, bupiva-caína, ropivacaína, morfina, fentanila e hidromorfona são quimicamente estáveis por períodos de semanas a meses e não são fatores limitantes no tempo de duração da infusão. Por causa da falta de dados sobre crescimento bacteriano, o tempo de infusão é determinado por políticas de controle de infecção pelo CDC. O cateter deve ser implantado com técnica asséptica, e a diluição não deve utilizar soluções contendo glicose, pois facilita o crescimento bacteriano.66,67

A levobupivacaína e a ropivacaína, dois anestésicos locais que têm ganhado popularidade por causa da reduzida toxicidade cardíaca,68,69 têm demonstrado ser menos promissoras como drogas antimicrobianas. Estudo demonstrou que a levobupivacaína apresenta metade da ativida-de bactericida da bupivacaína70 e a ropivacaína apresenta atividade bactericida fraca71 ou não a apresenta.72

Em conclusão, a despeito da existência de fatores de risco associados à ocorrência de infec-ção no pós-operatório que são inerentes ao paciente, ao microrganismo infectante, ao tipo e à extensão da cirurgia e a outros procedimentos invasivos, o uso apropriado da antibioticoprofilaxia, a adequada tricotomia, o controle glicêmico, a manutenção da normotermia por intermédio do aquecimento ativo no intraoperatório, a oxigenoterapia suplementar no pós-operatório e o uso

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74 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

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Capítulo 6

ConduTAS AneSTéSiCAS nAS SíndromeS hemorrágiCAS

oBSTéTriCAS Ricardo Vieira Carlos

Rômulo Frota LôboVinícius Pereira de Souza

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INTRODuçãOAs síndromes hemorrágicas foram responsáveis por 17% dos óbitos maternos nos Estados Unidos de 1991 a 1999, sendo a incidência de hemorragia grave em torno de 6,7 por 1.000 partos.1 No Reino Unido ocorreram 18 e 17 óbitos nos triênios 2000-2002 e 2003-2005, respectivamente.2 As síndromes hemorrágicas representam, atualmente, as terceira e segunda causas de óbitos maternos no Reino Unido e no Brasil, respectivamente.

Estima-se que 90% dos óbitos decorrentes de síndromes hemorrágicas poderiam ser evitados, encontrando-se inúmeras falhas assistenciais durante o atendimento a essas pacientes.3 As prin-cipais falhas evidenciadas foram:

não identificação dos fatores de risco para sangramento;•

estimativa inadequada das perdas sanguíneas perioperatórias; •

negligenciar a presença de sinais clássicos de sangramento, como taquicardia e taquipneia, •

não atribuindo esses sinais às perdas sanguíneas; aguardar a presença de hipotensão arterial para identificar e abordar perdas volêmicas;•

reposição volêmica com soluções não aquecidas; •

cuidados inadequados em sala de recuperação pós-anestésica; •

falta de comunicação entre as diversas clínicas envolvidas no atendimento.•

As alterações ou os procedimentos que merecem considerações anestésicas especiais duran-te a gestação são a placenta prévia, o descolamento prematuro de placenta (DPP), a ruptura uteri-na e a vasa prévia, além das hemorragias pós-parto decorrentes de atonia uterina, trauma genital, placenta retida, placenta acreta e inversão uterina. Cada uma dessas situações clínicas apresenta uma fisiopatologia característica, interagindo com os diversos fármacos e técnicas anestésicas.

Este capítulo objetiva a discussão de condutas anestésicas em diferentes cenários das síndro-mes hemorrágicas obstétricas.

ARmADILhAS DAS SíNDROmES hEmORRáGICASAs alterações fisiológicas da gestação determinam alterações nos sistemas cardiovascular e hematoló-gico, alterando respostas do organismo à perda sanguínea (Tabela 1).3

Tabela 1. perdas sanguíneas e repercussões maternas

Perda sanguínea (mL) Volume sanguíneo (%) FC (bpm) PAS Sinais e sintomas

500 – 1.000 10 - 15 < 100 Normal NDN

1.000 – 1.500 15 - 25 100 - 120 Normal Vasoconstrição

1.500 – 2.00025 - 35 120 - 140 80 - 100 Oligúria

Perfusão reduzida, palidez

2.000 – 3.00035 - 45 > 140 60 - 80 Anúria

Alteração de consciência

FC = frequência cardíaca; bpm = batimentos por minuto; PAS = pressão arterial sistólica; NDN = nada digno de nota

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Capítulo 6 Condutas anestésicas nas síndromeshemorrágicasobstétricas 79

Um dos principais problemas na paciente obstétrica com sangramento é o critério de avaliação da perda sanguínea. Alguns parâmetros podem ser utilizados:

visão direta — Nem sempre é adequada, já que pode ser mais lenta, repetida e por longo período (placenta prévia) ou pode estar oculta (DPP).

hematócrito — A gestante apresenta hemodiluição fisiológica. Os níveis de hemoglobina e hemató-crito podem atingir baixos valores, requerendo transfusão de sangue. A anemia pode se instalar aguda ou cronicamente, sendo que os fenômenos adaptativos a essas perdas sanguíneas são também dife-rentes (Quadro 1).

Quadro 1. adaptações do organismo materno à anemia

Crônica:

Organismo adaptadoVolemia normal — aumento de 2,3 DPGValor de Hb mínimo aceitável de 6 g/dLTransfusões são mais raras

Aguda:

Organismo não adaptadoHipovolemiaValores de Hb/Ht mínimos aceitáveis de 8 g/dL e 25% sem hipovolemiaTransfusões são mais frequentes

Hb = hemoglobina; DPG = difosfoglicerato; Ht = hematócrito

Não existem níveis de hemoglobina e hematócrito fixos para indicar a transfusão sanguínea em gestantes. O critério para transfusão deverá ser individualizado, orientado mais por parâmetros clínicos que laboratoriais.

pressão arterial — Modifica-se muito durante a gestação, em virtude do aumento do débito cardíaco e da redução da resistência periférica. Não reflete a real perda sanguínea em quadros hemorrágicos. Romney et al.,4 em 1963, estudando os efeitos do sangramento em cadelas prenhes, observaram que a pressão arterial cai lentamente na vigência do sangramento, mantendo-se a pressão parcial arterial de oxigênio (PaO2) materna. Por outro lado, há uma queda dramática e precoce da PaO2 nos vasos uterinos e fetais, que acompanha a perda sanguínea (Figura 1).

Em pacientes hipertensas, a interpretação da pressão arterial é ainda mais difícil. No DPP, o grande aumento do tônus uterino faz com que a resistência periférica esteja aumentada; dessa forma, o DPP com sangramento oculto importante pode cursar com frequência cardíaca normal e pressão arterial normal, apesar da paciente estar hipovolêmica. Na placenta prévia, a pressão arterial reflete diretamente a perda sanguínea.

pressão venosa central — Altera-se pouco durante a gestação, desde que seja realizada a des-compressão da veia cava. Sua avaliação contínua pode auxiliar no diagnóstico e pode orientar a tera-pêutica de reposição volêmica.

Diurese — A gestação impõe ao organismo materno uma alta taxa de reabsorção tubular. Por isso, qualquer redução na filtração glomerular reduz imediatamente o volume urinário, sendo este um sinal precoce de hipovolemia.

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Figura 1. Efeitos maternos e fetais da hemorragia aguda em cadelas prenhes4

Os quadros hemorrágicos obstétricos cursam, frequentemente, com distúrbios de coagula-ção.5 Em aproximadamente 10% dos casos de DPP ocorre coagulação intravascular disseminada e fibrinólise.6

O consumo de fatores de coagulação ocorre em duas fases: local e disseminada. A primeira fase, local, decorre de formação e acúmulo de coágulo retroplacentário. Posteriormente, há a passagem de tromboplastina para a corrente sanguínea, disseminando a ativação dos fatores de coagulação.

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Capítulo 6 Condutas anestésicas nas síndromeshemorrágicasobstétricas 81

A fibrinólise é desencadeada pela hiperatividade do sistema fibrinolítico e pela introdução na circulação de fibrinoquinases e lisoquinases, a partir do útero isquêmico. O controle hematoló-gico frequente é fundamental, sendo que na fase de consumo ocorre hipercoagulabilidade. Ins-tala-se em seguida a hipocoagulação, com fibrinogênio menor que 50% e plaquetas inferiores a 50.000/mm3. Nessa fase são contraindicados os bloqueios regionais. A reposição volêmica com soluções hipotérmicas pode agravar os distúrbios de coagulação e o quadro clínico das pacientes, perpetuando o círculo vicioso de hipotermia, acidose e distúrbios de coagulação.

DESCOLAmENTO pREmATuRO DE pLACENTAO DPP decorre da separação da placenta da decídua basal uterina, podendo ser total ou parcial. Ocorre em 1% das gestações (com tendência a aumento), associando-se a hipertensão arterial, idade materna avançada, tabagismo, uso de cocaína, ruptura prematura de membranas e histórico de DPP prévio.7

O DPP promove hemorragia materna e redução do aporte de oxigênio e nutrientes ao feto. A tríade clássica de DPP consiste em sangramento vaginal, hipertonia uterina e dor abdominal. A hemorragia, entretanto, pode ser oculta, dificultando o diagnóstico dessa patologia. As princi-pais complicações do DPP são: choque hemorrágico, insuficiência renal aguda, coagulopatias, sofrimento e óbito fetal.8

Em relação à técnica anestésica, nos casos em que a hemorragia está controlada, a reposição volêmica está sendo eficiente e não se evidencia alteração hemodinâmica importante, a anestesia regional, raqui ou peridural, poderá ser realizada, dependendo da necessidade urgente ou não para extração do feto.1

A gravidade do descolamento placentário pode ser classificada em graus de I a III, de acordo com a área descolada, a perda sanguínea e a presença de sofrimento fetal (Figura 2). A presen-ça de feto vivo é indicador de que o descolamento é de grau I ou II. Nesses casos a anestesia regional é indicada. Ocorrem raros casos de descolamento em grau II extremo ou incipiente grau III, em que o feto ainda está vivo, porém praticamente moribundo. Nesses casos deve-se optar pela anestesia geral. Na maioria dos casos, porém, a presença de feto vivo permite a realização de anestesia regional.

A anestesia geral para cesárea é indicada quando existe sofrimento fetal grave ou óbito fetal, geralmente associado a choque ou coagulopatia. Ela também poderá ser indicada diante do agra-vamento da hemorragia inicialmente abordada com bloqueio do neuroeixo. O grande momento de decisão para o profissional consiste em quando indicar a entubação traqueal nesses casos. Deve-se procurar antever, quando possível, potenciais situações de agravamento do quadro clíni-co, realizando a entubação em condições um pouco mais favoráveis.3

pLACENTA pRévIAA incidência de placenta prévia é aproximadamente de um caso para 200 gestações, sendo associada a multiparidade, idade materna avançada e cesariana ou procedimentos cirúrgicos uterinos prévios. Com os métodos de imagem habitualmente disponíveis, destacando-se a ultrassonografia, é possível identificar quadros de placenta prévia no período pré-operatório. O exame de toque vaginal deve ser evitado nessas pacientes.9

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Figura 2. Relação entre grau, gravidade, área de descolamento, hemorragia e indicação da anestesia em Dpp.

As principais complicações decorrentes da placenta prévia são: aumento do risco de sangramen-to perioperatório, hipotonia uterina no segmento de implantação anômala da placenta, correlação po-sitiva entre placenta prévia e acretismo placentário e risco aumentado de histerectomia periparto.6,10

A escolha da técnica anestésica dependerá da indicação, da urgência para a realização da ce-sariana e da gravidade da perda volêmica, seguindo-se os princípios descritos no tópico anterior. Avaliação das vias aéreas, acessos venosos de grosso calibre e reserva de hemoderivados são fundamentais para a melhoria de resultados.

RupTuRA uTERINA E vASA pRévIAA incidência de ruptura uterina é menor que 1%, nas parturientes que apresentam úteros previamente operados. A presença de cesariana prévia não se constitui em contraindicação formal para a realização de parto normal.11 Entretanto, o Colégio Americano de Ginecologistas e Obstetras recomenda que a con-dução de partos normais, em pacientes com cesariana prévia, seja feita somente em instituições capazes de realizar cesarianas em caráter de urgência/emergência, num período máximo de 30 minutos após sua indicação. Por outro lado, a ruptura uterina é extremamente rara em primíparas sem histórico cirúrgico.12

As condições associadas à ruptura uterina são cirurgia prévia em útero, traumas diretos (lesão penetrante, manipulação intrauterina, utilização de fórceps, curetagem pós-parto e extração ma-nual de placenta) ou indiretos (pressão fúndica excessiva, extensão da laceração cervical e trauma contuso), uso inapropriado de ocitocina, multiparidade, anormalidades uterinas, placenta percreta, tumores e problemas fetais (macrossomia e anomalias). O manuseio anestésico dessas pacientes

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Capítulo 6 Condutas anestésicas nas síndromeshemorrágicasobstétricas 83

segue as mesmas regras já descritas para a placenta prévia e o DPP, sendo a monitorização he-modinâmica invasiva apropriada nos casos de dúvida quanto ao volume intravascular.1

A vasa prévia é associada a uma inserção velamentosa do cordão, na qual os vasos fetais transfixam as membranas fetais à frente da apresentação fetal. Pode ocasionar grande sofrimento fetal, sendo seu diagnóstico precoce essencial para evitar a morte fetal, por exsanguinação. Ocor-re um caso a cada 2.000 - 3.000 partos e apresenta altas taxas de morte fetal (50% - 75%), sendo seu quadro clínico muito semelhante ao do DPP. O manejo anestésico dessas pacientes é guiado de acordo com a via de parto mais rápida para o nascimento, com equipe pediátrica preparada.3

hEmORRAGIA póS-pARTOHemorragia pós-parto é definida como perda sanguínea de mais de 500 mL em parto normal ou 1.000 mL em cesárea, sendo considerada primária nas primeiras 24 horas pós-parto e secundária até seis semanas após o parto.5 A atonia uterina é sua principal causa, podendo ocorrer em até 10% dos par-tos.13 A conduta obstétrica/anestésica é baseada na manutenção hemodinâmica e na contenção do sangramento conforme se demonstra na figura 3.

A atonia uterina geralmente ocorre imediatamente após o parto. O tratamento inicial inclui com-pressão bimanual, massagem uterina e administração de ocitocina endovenosa, que na maioria dos casos é efetivo.14 Nos casos de falha no tratamento inicial, podem-se utilizar outras medica-ções uterotônicas como os derivados de ergotamina (ergonovina e metilergonovina, IM/IV — ao se utilizar a via endovenosa usar doses fracionadas com constante avaliação da pressão arterial) e as prostaglandinas E2 (via retal, F2 — IM) e misoprostol (análogo da prostaglandina E1 — via retal). Se a atonia uterina persistir mesmo após a terapia medicamentosa, a resolução cirúrgica é indicada e a conduta anestésica dependerá do estado hemodinâmico da paciente, eventualmente necessitando de terapia transfusional e monitorização invasiva.5

Figura 3. plano para abordagem de hemorragia pós-parto (Colégio americano de Ginecologistas e obstetras, Washington, D.C., 1998)

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A retenção placentária ou de restos placentários nem sempre cursa com hemorragia pós-parto, mas pode ser uma causa de sangramentos tardios e insidiosos, difíceis de serem estimados.1

A técnica anestésica utilizada visa ao relaxamento uterino, que pode ser feito por meio de anesté-sicos inalatórios ou endovenosos, dependendo da hemodinâmica da paciente. Como adjuvante, pode ser utilizada nitroglicerina em bolus de 50 a 100 mcg ou infusão contínua de 10 mcg/kg/min.

Os casos de acretismo placentário vêm aumentando progressivamente nos últimos anos em decorrência do aumento no número de cesáreas.15 A placenta acreta é definida como uma placen-ta anormalmente aderida, podendo ser classificada em três tipos. Na placenta acreta vera ocorre aderência ao miométrio sem invasão ou passagem através do músculo uterino, já na placenta increta ocorre invasão do miométrio, e na placenta percreta, invasão da serosa uterina, podendo acometer outras estruturas pélvicas. A incidência de placenta acreta associada à placenta pré-via em útero sem cicatriz é de 5%. Já em pacientes com uma cesárea prévia é de 10% a 24%, sendo que a incidência aumenta para 59% a 67% em casos de duas ou três cesáreas prévias. Atualmente, com o aperfeiçoamento da tecnologia do ultrassom, o diagnóstico é suspeitado pré- -operatoriamente e podem ser utilizadas novas técnicas para a resolução do quadro, não sendo obrigatória a histerectomia.

A histerectomia, por sua vez, na vigência de quadros hemorrágicos graves, é tecnicamente mais difícil que a histerectomia eletiva, resultando frequentemente em lesões de ureter, bexiga, alças intestinais e necessidade de reoperação em até 33% dos casos. Estima-se uma mortalida-de entre 1% e 6% e uma média de transfusões de dez unidades de concentrado de hemácias e quatro unidades de plasma fresco para essa cirurgia.16

A identificação pré-operatória de acretismo placentário exige um planejamento para a aborda-gem da paciente, planejamento este que deve envolver todas as equipes responsáveis pela assis-tência. Abordar casos de acretismo como patologia corriqueira, negligenciando os achados sem planejamento prévio, pode conduzir a resultados catastróficos em virtude da grande complexidade cirúrgica desses casos.5

Novas técnicas para se evitar a transfusão sanguínea heteróloga maciça em casos de acre-tismo placentário estão sendo testadas. O uso de cell-saver intraoperatório parece ser promissor, mas há controvérsia quanto à utilização em gestantes por causa do risco de embolia por líquido amniótico.5 A hemodiluição normovolêmica aguda e a transfusão sanguínea autóloga por doação prévia também parecem ser boas estratégias, com poucos riscos para a paciente, porém os estudos atuais estão voltados a técnicas de contenção do sangramento por embolização arterial angiográfica e oclusão por balão. Nessas condições, pode-se realizar o balonamento das artérias uterinas previamente ao parto com anestesia local, sem interferência às técnicas obstétricas e anestésicas que irão ser utilizadas para o parto e com resultados bastante satisfatórios.

EmBOLIzAçãO ARTERIAL uTERINAOs critérios para a realização da embolização arterial incluem a presença da radioscopia, cateteres arteriais, material para embolização e radiologistas experientes em procedimentos intervencionistas e angiográficos.5 As alterações de coagulação não são infrequentes, sendo os introdutores mantidos por 24 horas após o procedimento.17 Estudos mostraram melhora do padrão de coagulação após a embolização que seria por facilitação das contrações uterinas secundárias à liberação de fatores pró- -coagulantes. Os materiais comumente utilizados para a embolização são Gelfoam®, partículas de PVA, molas de aço e cola de n-butil-2-cianocrilato. O Gelfoam® é o material mais popular em virtude de sua degradação em quatro semanas, com a restituição da circulação normal, preservando a fertilidade e o potencial reprodutivo. A taxa de sucesso foi de 90% a 95% em três séries de casos com 38 pacientes apresentando hemorragia pós-parto persistente, tratadas com embolização. As complicações são in-

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Capítulo 6 Condutas anestésicas nas síndromeshemorrágicasobstétricas 85

comuns, podendo ser classificadas em angiográficas (perfuração de artéria ilíaca externa e formação de hematoma), infecciosas e isquêmicas.

REpOSIçãO vOLêmICA E hEmOCOmpONENTES A reposição volêmica é etapa fundamental na abordagem de pacientes com quadros de síndromes he-morrágicas (Quadro 2). A reposição volêmica deve ser feita com base em parâmetros clínicos, incluindo a pressão arterial, a pressão venosa central e a diurese.

Quadro 2. Ressuscitação da paciente portadora de síndrome hemorrágica

Monitorar adequadamentePressão arterial automática não invasiva ou invasivaCardioscópioSpO

2

DiuresePressão venosa centralCuidado para não subestimar o sangramentoEstar preparado para o quadro Venóclise: duas vias de grosso calibre (cateter 14G) Acionar precocemente o banco de sangue HemocomponentesReposição volêmica: soluções isotônicas aquecidas Cristaloides Coloides

SpO2 = saturação de oxigênio

A solução básica é a solução de Ringer com lactato. Coloides e albumina podem ser úteis, excetuando-se a dextrana. Não existem evidências de superioridade dos coloides em relação aos cristaloides. As soluções para reposição volêmica devem ser aquecidas a 37 oC, a fim de prevenir a hipotermia e suas repercussões sobre a coagulação.

A solução cristaloide que mais se ajusta às necessidades da reposição volêmica aguda é a de Ringer com lactato, cuja composição é vantajosa por ser a que mais se aproxima da composição plasmática (Tabela 2).

Tabela 2 Soluções intravenosas e suas composições

Plasma RL NaCl 0,9% SG5%

pH 7,4 6,5 5,0 4,0

Osmolaridade (mOsm/L) 300 272 308 252

Sódio (mEq/L) 140 130 154 0

Potássio (mEq/L) 4 4 0 0

Cálcio (mEq/L) 5 3 0 0

Cloro (mEq/L) 103 109 154 0

Lactato (mEq/L) 1 28 0 0

Bicarbonato (mEq/L) 27 0 0 0

Glicose (mEq/L) 100 0 0 5.000

Peng ATC et al.

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É razoável que o emprego das soluções hipertônicas de cloreto de sódio seja útil na ressuscita-ção volêmica. A solução mais utilizada é o cloreto de sódio a 7,5%. A ação dessa solução inclui au-mento do débito cardíaco, dilatação vascular pré-capilar, constrição dos vasos de capacitância, aumento da pressão arterial e melhora do fluxo mesentérico. Sua ação sobre o fluxo placentário é ainda desconhecida.

A reposição das células vermelhas deve ser feita com concentrado de hemácias. O sangue fresco, ou seja, aquele coletado com menos de 24 horas, não é atualmente disponível, podendo ser utilizado o plasma fresco congelado. Cada unidade de concentrado de hemácias eleva, em média, o hematócrito em 3%.

É fundamental que o banco de sangue seja acionado precocemente pela equipe envolvida no atendimento. O banco de sangue deverá trabalhar em sintonia com a equipe cirúrgica, responden-do rapidamente às demandas emergentes ou urgentes dos quadros hemorrágicos obstétricos. A terapêutica básica é a reposição volêmica e de glóbulos vermelhos.

A reposição dos fatores de coagulação deve ser criteriosa, sendo fundamental a correção prévia da volemia. Recentemente, Borgman et al. (2007)18 realizaram um ensaio clínico em vítimas de trauma com quadros de hemorragia grave. Os autores evidenciaram que a transfusão mais liberal de plasma na proporção de uma unidade para cada concentrado de hemácias transfundido reduziu a mortalidade dos pacientes de 92,7% para 37%. Esses cenários de guerra e trauma são os que mais se assemelham às condições encontradas nos casos de hemorragias obstétricas graves. Diante da grande dificuldade da condução de estudos controlados em casos de hemorra-gias obstétricas graves, alguns autores sugerem a extrapolação da conduta anteriormente descrita também para a obstetrícia.

Recentemente, foi aprovada pela US Food and Drug Administration (FDA) a administração de fa-tor VIIa recombinante.9 Em obstetrícia, é utilizada em casos graves de hemorragias, sugerindo uma melhoria de resultados com sua utilização. As doses preconizadas variam de 20 a 120 mcg/kg, não existindo um efeito dose-resposta até o momento. O custo desse tratamento encontra-se em torno de dez mil dólares por paciente. Ainda não existem evidências para sua recomendação rotineira. Deve ser utilizada em casos selecionados, de acordo com protocolos bem definidos da instituição; pode causar trombose.

CONCLuSõES Apesar dos grandes avanços da medicina, a mortalidade materna decorrente de síndromes hemorrá-gicas permaneceu inalterada na última década. Torna-se fundamental o planejamento pré-operatório, em pacientes com risco aumentado para hemorragia, e uma abordagem sistematizada, em casos de urgência/emergência, para a melhoria de resultados. O anestesiologista deverá atuar de maneira pro-ativa, procurando identificar, reconhecer e estimar as perdas sanguíneas. Suas intervenções deverão ser realizadas antes da deterioração do quadro clínico. A comunicação entre as equipes envolvidas no atendimento (anestesiologia, obstetrícia, banco de sangue, enfermagem) poderá influenciar decisiva-mente nos resultados.

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Capítulo 7

TrATAmenTo FArmACoLógiCo

dA dor neuroPáTiCAIrimar de Paula Posso

Gualter Lisboa RamalhoPaulo Adilson Herrera

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90 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

INTRODuçãODor neuropática é a dor não nociceptiva causada ou iniciada por lesão primária ou disfunção do sistema nervoso central ou periférico. A dor é geralmente crônica, o tratamento é difícil e tipicamente a dor não responde bem a analgésicos convencionais.

De acordo com estudos epidemiológicos estima-se que 6% a 8% da população mundial relate dores com características neuropáticas de diversas etiologias.1 Diferentes doenças cursam com do-res neuropáticas. Didaticamente podem ser divididas em quatro grandes grupos etiológicos: lesões focais e multifocais do sistema nervoso periférico, lesões sistêmicas do sistema nervoso periférico (polineuropatias), lesões do sistema nervoso central e doenças neuropáticas complexas (Quadro 1).2

Quadro 1. Doenças que cursam com dores neuropáticas classificadas de acordo com o diagnóstico etiológico

Lesões focais e multifocais do sistema nervoso periférico

Neuralgia pós-herpéticaNeuralgia do trigêmeoNeuralgia glossofaríngeaSíndrome do túnel do carpoMononeuropatia diabéticaPlexopatia actínicaPlexopatia tumoralDor de membro-fantasmaNeuralgia intercostal

Lesões sistêmicas do sistema nervoso periférico — polineuropatia

Metabólicas: diabetes mellitus, beribéri, pós-gastroplastia, hipotireoidismoTóxicas: álcool, isoniazida, antirretrovirais, quimioterápicos, óxido de etilenoInfecciosas: HIV, Guillain Barré, borrelioseHereditária: doença de FabryNeoplasia: carcinomatoseOutras: neuropatia de pequenas fibras idiopáticas

Lesões do sistema nervoso central

Trauma raquimedularAcidente vascular cerebralHérnia discal extrusaEsclerose múltiplaDoença de Parkinson

Doenças neuropáticas complexas

Síndrome dolorosa regional complexa tipos I e II

Dores neuropáticas podem apresentar sintomas distintos que podem fazer seu diagnóstico complicado. Na verdade não há nenhum fenótipo que diferencie sintomaticamente um estado do outro,3 porém alguns indícios auxiliam o médico no diagnóstico. A lesão ou a disfunção do sistema nervoso deve estar presente ao exame; é comum que haja um intervalo de tempo entre a lesão do sistema nervoso e o início da dor, paradoxo entre perda sensorial e dor ou hiperalgesia, descrição bizarra da dor, dores paroxísticas, presença de hiperpatia e alodínia, sintomas que ajudam estabe-lecer o diagnóstico de dor neuropática.

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Capítulo 7 Tratamento farmacológico da dor neuropática 91

Pacientes com dor neuropática têm altos índices de ansiedade e depressão, a dor causa incapacidade produtiva e desajustes familiares.4 Tratar a dor neuropática crônica deve ser uma prioridade em saúde pública, mas também é um desafio para todos os envolvidos nessa tarefa. Desafio que exige uma equipe multidisciplinar com uma abordagem multifatorial. Mas não se deve esquecer que a terapêutica medicamentosa, com todas suas limitações, tem lugar de destaque no tratamento desses pacientes. O número de fármacos de diferentes classes farmacológicas disponível para o tratamento da dor neuropática tem aumentado nos últimos anos. Novas classes farmacológicas estão em pesquisa, abrindo um sem-número de possibilidades de esquemas te-rapêuticos. É necessário então que a escolha do fármaco para o tratamento seja individualizada, baseada em evidências, levando em consideração eventos adversos, contraindicações, doenças associadas e custos do tratamento.

Não existe fármaco ideal. Mesmo as medicações com eficácia estabelecida têm efeitos ad-versos, início de ação geralmente tardio e tratamento prolongado, causando muitas vezes a baixa adesão ao tratamento. Menos de 70% dos pacientes tratados com dor crônica não neoplásica são aderentes ao tratamento proposto, continuam visitando médicos, aumentando o custo do tratamento com exames adicionais e o custo pessoal com sofrimento desnecessário.5

DIRETRIzES GERAIS pARA O TRATAmENTO fARmACOLóGICO E SELEçãO DE pACIENTESDiagnóstico apropriado, avaliação e reavaliações constantes são fundamentais para o sucesso do tra-tamento. O tratamento das doenças subjacentes não deve ser ignorado, como o controle da glicemia nos pacientes diabéticos.

Metas realísticas devem ser estabelecidas, assim como uma conversa franca com o paciente sobre a efetividade do tratamento e eventos adversos esperados. A maioria dos doentes não terá sua dor aliviada completamente com o tratamento, e isso lhe deve ser adiantado.

Na seleção individualizada do analgésico, devem-se considerar:

Eficácia da medicação baseada em evidências disponíveis. Apesar da maioria dos ensaios •

clínicos randômicos e controlados avaliando analgésicos para dor neuropática terem sido conduzidos em neuralgia pós-herpética e polineuropatia diabética, na prática clínica as mes-mas medicações demonstram grau semelhante de eficácia.Efeitos adversos, comorbidades como depressão, distúrbios do sono, ansiedade, obesida-•

de, distúrbios cognitivos, constipação, hiperplasia prostática etc. e doenças associadas.Interação com outros fármacos, custo, risco de abuso, risco de suicídio devendo-se evitar o •

uso de fármacos de baixo índice terapêutico nesses pacientes.

Titular a medicação iniciando com uma única droga, na menor dose possível, observando o alívio dos sintomas e a presença de eventos adversos. Elevar a dose gradualmente e associar analgésicos de outras classes farmacológicas caso seja necessário quando a primeira medicação atingiu o efeito-teto ou os efeitos colaterais sejam intoleráveis. As associações de medicamentos de diferentes classes podem reduzir as doses individuais com redução dos efeitos adversos. Permitir um tempo adequado para o início da ação, geralmente em torno de duas semanas na maior dose tolerada, antes de considerar a medicação não eficaz. A figura 1 sumariza o tratamento farmacológico da dor neuropática em quatro etapas.6

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Figura 1. Fluxograma do tratamento farmacológico da dor neuropática6

Os analgésicos utilizados para o tratamento da dor neuropática podem ser agrupados em analgésicos de primeira, segunda e terceira linhas segundo o grau de recomendação e classifica-dos em diferentes classes farmacológicas de analgésicos segundo a classificação proposta por Lussier e Beaulieu,7 utilizada neste texto (Quadro 2).

Resumo das recomendações de tratamento e doses utilizadas são encontrados na tabela 1. As recomendações são baseadas em evidências para o tratamento da dor neuropática periférica, que podem ser extrapoladas para o tratamento da dor neuropática central, no entanto mais es-tudos são necessários para estabelecer a eficácia dessas recomendações no tratamento da dor neuropática central.

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Capítulo 7 Tratamento farmacológico da dor neuropática 93

Quadro 2. Classificação dos analgésicos

Analgésicos antinocicep-tivos Anti-hiperalgésicos

Moduladores da atividade descendente inibitória ou excitatória

Moduladores de sensibilização ou transmissão periférica

Mistos (analgésicos antinociceptivos e moduladores da atividade descendente inibitória ou excitatória) Outros

Paracetamol Antagonistas NMDA ADTs Anestésicos locais Tramadol Calcitonina

Dipirona Gabapentinoides (pregabalina, gabapentina)

IDRSN Carbamazepina Tapentadol Bifosfonados

AINEs Levetiracetam ISRS Oxcarbazepina

Opioides Lamotrigina Agonistas α-2-adrenérgicos Topiramato

Canabinoides NefopamÓxido nitrosoCoxibes

Capsaicina

AINEs = anti-inflamatórios não esteroides; ADTs = antidepressivos tricíclicos; IDRSN = inibidores duais da recaptação de serotonina e noradre-nalina; ISRS = inibidores seletivos de recaptação de serotonina

Tabela 1. Recomendações para o tratamento para dor neuropática periférica2

Medicamento/Classe

Fase do tratamento

Dose para manutenção (mg/dia)

NNH combinado

NNT combinado para alívio de 50%

Moduladores da atividade descendente Inibitória

Antidepressivos tricíclicos primeira 25-150 14,7 2,1/2,5/3,1Duloxetina primeira 60-120 RRNS 4,1/5,2Venlafaxina primeira 150-225 RRNS 4,6Paroxetina, bupropiona, citalopram terceira RRNS 6,8Anti-hiperalgésicosPregabalina primeira 150-600 11,7 4,2/4,9Gabapentina primeira 1.200-3.600 17,8 4/4,4Lamotrigina terceira 200-400 RRNS 4,9Moduladores da transmissão/sensibilização periféricaOxcarbazepina terceira 600-1.800 RRNS NDCarbamazepina terceira 200-1.200 21,7 2,0Topiramato terceira 200-400 6,3 7,4Valproato terceira 1.000 RRNS 2,8Capsaicina tópica terceira 6,7Lidocaína tópica primeira 3-4 adesivos /dia RRNS 4,4Antinociceptivos

Oxicodona segunda 10-120 RRNS 2,6

Morfina segunda 15-300 RRNS 2,5Metadona segunda 15 ND NDCanabinoides terceira 5-15 RRNS 9,5MistosTramadol segunda 9 3,9

NNH = número necessário para sair do estudo por evento adverso; NNT= número necessário para tratamento (alívio de 50% da dor inicial); RRNS = risco relativo não significante; ND = dados não disponíveis

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ANALGéSICOS DE pRImEIRA LINhA

moduladores da atividade descendente inibitória ou excitatória Antidepressivos tricíclicos (ADTs) são eficazes para tratar a dor neuropática, especialmente neuropa-tias focais e polineuropatias. Os ADTs são baratos e fáceis de administrar, geralmente é usada uma única dose diária. Seu efeito anticolinérgico responde pela maioria dos efeitos adversos: boca seca, visão borrada, constipação, taquicardia, aumento do apetite e retenção urinária.

Os ADTs amina-secundária nortiptilina e desipramina são mais bem tolerados e possuem efe-tividade semelhante à dos ADTs amina-terciária amitriptilina e imipramina e devem ser a primeira escolha ao iniciar um tratamento. Cuidado adicional com a administração de ADTs para pacientes cardiopatas, pois causam taquicardia sinusal e podem aumentar ectopia ventricular. Muita cautela com os pacientes com risco de suicídio devido ao baixo índice terapêutico, e com idosos, uma vez que estes podem piorar distúrbios cognitivos e a marcha aumentando o risco de quedas. As doses iniciais de ADTs devem ser as mais baixas possíveis, aumentadas vagarosamente de acor-do com a analgesia obtida e os efeitos adversos observados.

A duloxetina é um antidepressivo inibidor dual da recaptação de serotonina e noradrenalina (IDRSN) e tem um perfil mais favorável em idosos. Não altera o eletrocardiograma (ECG), porém pode aumentar ligeiramente a glicemia. Náusea é o efeito colateral mais comum. Deve ser inicia-da com dose de 30 mg ao dia e esta deve ser aumentada lentamente conforme a necessidade, sempre considerando-se que com os ADTs a resposta analgésica inicia aproximadamente após uma semana do início da medicação.

A venlafaxina também é um antidepressivo IDRSN. Estudos randomizados e controlados em polineuropatias dolorosas demonstram sua eficácia com doses de 150 a 225 mg/dia. A dose ini-cial é de 75 mg/dia, que pode ser aumentada gradualmente, sendo que cerca de 5% dos pacien-tes que utilizam a venlafaxina têm alterações no ECG. A retirada da venlafaxina deve ser gradual, pois existe risco de síndrome de descontinuação da droga.

Anti-hiperalgésicos A gabapentina e a pregabalina são eficazes no tratamento da dor neuropática. Elas reduzem a liberação de neurotransmissores após se ligarem a subunidade acessória α2δ-1 de canais de cálcio voltagem- -dependentes e inibem correntes em canais de cálcio tipo N.8 Estudos com gabapentinoides compro-vam analgesia no tratamento de neuralgia pós-herpética, polineuropatias dolorosas, dor de membro- -fantasma, lesão medular aguda e crônica e neuropatias associadas ao câncer.9 Os principais efeitos adversos dos gabapentinoides são dose-dependentes e incluem sonolência, tontura, ataxia e edema de membros inferiores. Pacientes com insuficiência renal necessitam de ajuste de dose.

A gabapentina deve ser iniciada com a dose de 300 mg à noite e esta deve ser aumentada progressivamente até que apareçam efeitos adversos ou até 2.400 mg/dia divididos em três to-madas. Deve-se aguardar até duas semanas após se atingir a dose desejada para a observação dos efeitos analgésicos.

A pregabalina tem eficácia e efeitos adversos semelhantes ao da gabapentina, porém é seis vezes mais potente e pode ser administrada em duas tomadas ao dia. Deve ser iniciada com dose única noturna de 75 mg, aumentando-a progressivamente até 300 mg/dia. O início da analgesia é mais rápido comparado ao com a gabapentina; tem atividade ansiolítica e melhora o padrão de sono dos pacientes.

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Capítulo 7 Tratamento farmacológico da dor neuropática 95

moduladores da sensibilização/transmissão periféricaA aplicação de lidocaína tópica em adesivos ou gel é eficaz no tratamento de neuropatias periféricas com presença de alodínia. Adesivos de lidocaína a 5% são seguros, não atingem concentrações séri-cas tóxicas quando utilizados nas doses recomendadas de três a quatro adesivos por dia, porém mais precauções devem ser tomadas naqueles pacientes com disfunção hepática ou que utilizem outros an-tiarrítmicos especialmente de classe I, como a mexiletina. A lidocaína em gel pode ser utilizada quando o adesivo não estiver disponível.

ANALGéSICOS DE SEGuNDA LINhA

Analgésicos antinociceptivosAnalgésicos opioides podem ser utilizados no tratamento de dores neuropáticas de diversas etiologias, sozinhos ou associados a outros analgésicos de primeira linha. Podem-se associar os opioides para o controle imediato de dor intensa como a dor do câncer e do herpes-zóster ou como medicação de resgate para crises dolorosas. Os opioides apresentam mais efeitos adversos que as medicações de primeira linha e podem induzir hiperalgesia e tolerância necessitando aumento frequente de doses. Além disso, opioides podem causar adição, um fenômeno pouco frequente que na maioria dos estudos incide em menos que 5% dos pacientes tratados, porém pode ser incapacitante e de difícil tratamento. Antes de iniciar o tratamento avalia-se o potencial de abuso e a história pregressa de abuso de opioides ou de outras drogas lícitas ou ilícitas. Os opioides são reservados aos pacientes que não responderam ou não toleraram os efeitos colaterais dos analgésicos de primeira linha.

Os efeitos adversos mais comuns são náuseas e vômitos, sonolência e constipação. Pacientes idosos podem apresentar alterações cognitivas e risco de queda. Deve-se iniciar o tratamento com opioides com apresentações de liberação rápida na menor dose possível e intervalos corretos, aumentando gradualmente a dose até o alívio da dor ou até que os efeitos adversos não possam ser tolerados. Alguns efeitos adversos como náusea e sonolência diminuem com a continuidade do tratamento, no entanto a constipação produzida pelos opioides não diminui com o tempo podendo até limitar sua utilização. Algumas estratégias estão sendo desenvolvidas para suprimir esses pro-blemas sem afetar a analgesia. Uma dessas estratégias é a utilização concomitante de antagonistas de receptores opioides periféricos que não atuam no sistema nervoso central, tais como a metilnal-trexona e o alvimopan. Apesar de eficaz, a utilização desses medicamentos aumenta sensivelmente o custo do tratamento.10

mistos — analgésicos antinociceptivos e moduladores da atividade descendente inibitória ou excitatória O tramadol é um agonista opioide fraco que também inibe a recaptação de serotonina e noradrenalina. É eficaz no tratamento de dor neuropática de diversas etiologias. A utilização do tramadol também pode cau-sar sonolência, tonturas, náuseas, vômitos e constipação. Pode reduzir o limiar convulsivante e a síndrome serotoninérgica central quando associado a IERS. A dose inicial é de 50 mg de uma a duas vezes ao dia, aumentando gradativamente até 400 mg/dia em quatro tomadas.

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ANALGéSICOS DE TERCEIRA LINhAAnalgésicos de terceira linha são aqueles em que há menor acúmulo de evidência de sua eficácia no tratamento da dor neuropática em comparação àqueles de primeira e segunda linhas. Devem ser utilizados como alternativa aos opioides nos casos em que eles são contraindicados. Em algumas situações especiais podem ser considerados de segunda linha, como a carbamazepina e a oxcarba-zepina no tratamento da neuralgia do trigêmeo, ou ainda associados a medicações de primeira linha para tratamento de dores neuropáticas paroxísticas associadas ao câncer, por exemplo.

moduladores da atividade descendente inibitória/excitatóriaO citalopram e a paroxetina são dois antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), mas não a fluoxetina, que apresentaram respostas positivas no tratamento da dor secundária à neuropatia diabética. A bupropiona é um inibidor da recaptação de noradrenalina e dopamina e também pode ser utilizada no tratamento da dor neuropática. Esses antidepressivos podem ser alternativas aos ADTs e aos duais quando estes falharam e o paciente necessita de medicação antidepressiva para tratamento de depressão associada.

moduladores da transmissão/sensibilização periféricaA carbamazepina e a oxcarbazepina devem ser utilizadas no tratamento inicial de pacientes com neu-ralgia do trigêmeo. A sonolência e a ataxia são efeitos adversos dessas medicações que limitam sua utilidade. A carbamazepina, a oxcarbazepina, a lamotrigina, o topiramato e o ácido valproico podem ser alternativas ao tratamento da dor neuropática não aliviada ou aliviada apenas parcialmente pelas medi-cações de primeira e segunda linhas. A dose inicial de lamotrigina deve ser baixa, cerca de 50 mg/dia, com titulação lenta para reduzir a possibilidade de reações cutâneas graves. Reações de hipersensibi-lidade cutânea tardia são relativamente comuns com a carbamazepina e melhoram prontamente com a retirada da medicação.

A mexiletina é um antiarrítmico classe I análogo estrutural da lidocaína que pode beneficiar pacientes com neuropatias periféricas, porém a adesão ao tratamento é dificultada pelos efeitos adversos, principalmente a epigastralgia.

A capsaicina tópica pode ser utilizada no tratamento da dor neuropática de pacientes com neuralgia pós-herpética e polineuropatias periféricas com alodínia. A queimação resultante da apli-cação dificulta a adesão ao tratamento e a realização de estudos duplo-cegos.

AntinociceptivosCanabinoides não seletivos como o Sativex® (canabidiol plus THC) têm demonstrado eficácia clínica para reduzir a dor neuropática,11 entretanto esses fármacos também produzem euforia, tontura e seda-ção em concentrações terapêuticas. Esses efeitos adversos são mediados por receptores CB1 no sis-tema nervoso central e limitam o ajuste da dose analgésica em pacientes com dor crônica. Atualmente a indicação dos canabinoides está limitada àqueles pacientes em que a relação de custo e benefício é razoável. O Sativex® está aprovado para uso no Canadá desde 2005, sendo indicado para o tratamento da dor neuropática associada à esclerose múltipla.12

Anti-hiperalgésicosOs antagonistas NMDA produzem muitos efeitos adversos como sedação, confusão, incoordenação motora em doses muito próximas às doses farmacológicas eficazes, consequentemente não há mar-

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Capítulo 7 Tratamento farmacológico da dor neuropática 97

gem terapêutica para esses agentes.12 Isso associado a estudos conflitantes de eficácia com memanti-na e dextrometorfano no tratamento da dor neuropática tem tornado a utilização clínica desses agentes pouco recomendável.

NOvAS pERSpECTIvASHá um interesse muito grande no desenvolvimento de novos fármacos para o tratamento da dor neu-ropática. Há ainda um número muito grande de pacientes que ou não se beneficiam das medicações existentes ou não conseguem tolerar os tratamentos existentes. Agonistas canabinoides mais seletivos e com redução dos efeitos adversos e bloqueadores de canais de sódio de mais largo espectro podem aumentar nossas opções de analgésicos para a dor neuropática. Há ainda um antagonista de receptor NMDA (NeurodexTM/ZenviaTM, Avanir) em estudo para a dor neuropática, e novos antidepressivos duais IDRSN, como a desvenlafaxina da Wieth e o milnaciprana da Forest/Cypress, estão sendo avaliados para o controle da dor neuropática.12

Novos ensaios deverão ser realizados avaliando a resposta analgésica de associação de fár-macos e tolerabilidade. Existe a necessidade de estudos direcionados e a identificação de carac-terísticas exclusivas dos respondedores. Metodologias emergentes poderão melhorar o critério de seleção de pacientes aumentando a confiabilidade e a reprodutibilidade desses estudos.3

CONCLuSõESO tratamento farmacológico é um componente importante na abordagem multidisciplinar do paciente portador de dor neuropática. O tratamento deve ser individualizado levando-se em consideração as diretrizes anteriormente citadas que auxiliam na escolha racional dos analgésicos a serem utilizados, e também devem ser consideradas as comorbidades, doenças associadas, ansiedade, depressão, expectativas do paciente e a história pregressa de abuso de medicações. Ao iniciar o tratamento, o paciente e seus familiares devem ser informados de modo realista sobre os resultados que podem ser esperados. Avaliação e reavaliações constantes são fundamentais para o sucesso do tratamento e para manter a adesão do paciente à terapia proposta. Os pacientes que não melhorarem com o tratamento devem ser encaminhados a outros centros multidisciplinares de tratamento da dor.

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Capítulo 8

PeridurAL ToráCiCA Adilson Hamaji

Fernando Antonio CarneiroJoão Aurilio Rodrigues Estrela

Luis Claudio de Araujo Ladeira

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INTRODuçãOO bloqueio peridural permanece como a principal técnica de anestesia regional, pois possibilita aneste-sia cirúrgica, analgesia durante o trabalho de parto, analgesia pós-operatória, tratamento de dor crônica e a complementação da anestesia geral. Fatores como a segurança da analgesia/anestesia segmentar (dermátomos), a ausência de cefaleia pós-punção, o uso de técnicas de infusão com a possibilidade da utilização de uma grande variedade de agentes anestésicos locais e opioides firmam um sólido argumento para sua indicação para pacientes cirúrgicos.1 Acredita-se que o anestesiologista brasileiro seja um dos mais experientes nessa técnica de bloqueio não associada à anestesia geral, embora a quantidade de publicações seja pequena a esse respeito.

É importante que o anestesiologista clínico conheça com profundidade as características do bloqueio peridural e suas respostas fisiológicas. A maioria das publicações conclui que tanto a anestesia quanto a analgesia moderam a resposta inflamatória ao trauma cirúrgico, principalmente quando a técnica peridural torácica é utilizada em cirurgia torácica ou abdominal alta. Sua atividade nos estados de hipercoagulabilidade é considerada semelhante à de baixas doses de heparina quando empregada na profilaxia da trombose venosa profunda.2,3 Além disso, efeitos cardiovascu-lares benéficos, com redução de morbimortalidade em cirurgias de grande porte, são demonstra-dos. O bloqueio peridural torácico limita a extensão da isquemia coronariana, melhorando a função ventricular esquerda de pacientes coronariopatas, durante situações de estresse. O bloqueio das fibras de C5 a T5 diminui o tônus simpático para o coração, principalmente a inervação adrenérgica para os ventrículos que se origina em T1-4.

O efeito hemodinâmico do bloqueio peridural torácico é o resultado de uma série complexa de mecanismos, entre os quais a atividade endógena adrenérgica do paciente, o decréscimo do tô-nus vascular, a vasoconstrição compensatória, a redução da frequência cardíaca (FC) por prolon-gamento do potencial de ação ou por estimulação vagal e a diminuição do inotropismo cardíaco.4 Goertz et al. concluíram que a resposta do reflexo barorreceptor cardíaco depende da integridade do tônus do sistema simpático, que pode atuar diretamente no referido reflexo, com o bloqueio de sua atividade cardioaceleradora, como também, de maneira indireta, por intermédio da alteração do balanço entre o sistema de inervação cardíaca simpática e parassimpática. Esse mecanismo é proposto como causa da bradicardia e hipotensão arterial após o bloqueio peridural torácico, podendo explicar os fenômenos hemodinâmicos graves (hipotensão arterial e bradicardia) que podem acompanhar, por vezes, sua associação com anestesia geral, isso porque a última pode interferir de maneira significativa no balanço entre tônus do sistema adrenérgico e colinérgico.

O bloqueio do sistema autônomo simpático é mais extenso do que o bloqueio sensitivo poden-do-se observar importantes alterações na relação de atividade adrenérgica/colinérgica, mesmo durante bloqueios sensitivos peridurais com extensão restrita a poucos dermátomos.

ANATOmIANa região torácica, as raízes nervosas são nomeadas pelas vértebras da metade cefálica do forame intervertebral — T4 emerge entre as vértebras T4 e T5, por exemplo.5 E como a medula espinhal termina entre as vértebras L1 e L2, as raízes nervosas torácicas emergem dos forames intervertebrais a distân-cias progressivamente maiores de suas origens na medula espinhal — tais quais as raízes lombares e sacrais.5

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Capítulo 8 Peridural torácica 101

REpERCuSSõES SISTêmICAS

Aparelho cardiovascularBloqueios peridurais altos com soluções de anestésico local sem adrenalina causam redução do volu-me sistólico, do débito cardíaco, da resistência vascular periférica e da pressão arterial.5 A magnitude dessas alterações, entretanto, é menor do que a que ocorre numa raquianestesia que atinge os mes-mos níveis de bloqueio.5 Tais alterações hemodinâmicas são devidas às dilatações arterial e venosa induzidas pelo bloqueio de fibras simpáticas.5

Já os bloqueios peridurais altos com a utilização de soluções com epinefrina resultam em aumento significativo do volume sistólico e do débito cardíaco.5 Entretanto, a resistência vascular periférica diminui drasticamente, o que resulta em queda da pressão arterial mais intensa do que a observada quando se utilizam soluções sem epinefrina.5 Isso se explica pela vasodilatação promo-vida pelo efeito β2 da adrenalina.5 O débito cardíaco aumentado pode se explicar pela diminuição acentuada da resistência vascular periférica ou pelo aumento do retorno venoso — venoconstri-ção consequente à adrenalina.5

A anestesia peridural torácica segmentar pode ter alguns efeitos exacerbados ou diminuídos de acordo com o nível de bloqueio realizado.

Um bloqueio de T1-T5 provoca vasodilatação mínima, com queda acentuada da FC. Quando associada à anestesia geral pode não se observar elevação da FC em resposta à diminuição da pressão arterial, variando de acordo com o grau de bloqueio simpático. Contudo, a resposta sim-pática à hipercapnia por contribuição eferente da adrenal pode estar preservada.6

Há controvérsias em relação à contratilidade: a depressão da função ventricular esquerda, com queda do volume sistólico, pode ser responsabilidade da solução anestésica utilizada, no caso a bupivacaína racêmica.

Um benefício das alterações da peridural segmentar (T1-T5), observado em pacientes com doença coronariana, seria o balanço entre o consumo e a oferta de oxigênio, principalmente pela diminuição da FC.

Quando o bloqueio peridural é mais extenso (T1-T12), ocorre hipotensão acentuada por queda da resistência vascular sistêmica e ação cardiodepressora, bloqueio simpático extenso (ação ba-rorreceptora suprimida), bloqueio dos nervos esplâncnicos (T6-L1) com consequente bloqueio da adrenal, perda do tônus dos vasos dos membros inferiores com redistribuição do fluxo sanguíneo sem considerar o enchimento cardíaco (vasodilatação em territórios denervados).

Com bloqueio de T5-S5 ocorre vasodilatação, hipotensão e bradicardia em consequência ao bloqueio simpático periférico e esplâncnico. Nos bloqueios de T10-S5 pode haver hipotensão acen-tuada e até mesmo colapso cardiovascular em pacientes hipovolêmicos. Deve-se ter precaução na instalação desse bloqueio em pacientes hipertensos e coronariopatas.

No manejo das alterações hemodinâmicas, temos de tratar principalmente as causas do pro-blema: baixo débito cardíaco ou resistência vascular periférica diminuída.5 A infusão de soluções cristaloides pode ser uma opção para restaurar a resistência vascular e, consequentemente, o débito cardíaco; entretanto, a efetividade em pacientes normovolêmicos é controversa.2 A pré- -hidratação, com 500 a 1.500 mL de cristaloides, não previne a hipotensão de maneira confiável.5

Em relação aos vasopressores, drogas com ação α- e β-adrenérgicas, estes têm-se mostrado superiores aos α-agonistas puros.2 Nesse sentido, a efedrina tem sido a droga mais utilizada; com bolus de 5 a 10 mg consegue-se aumentar a pressão arterial com restauração do débito cardíaco

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e da resistência vascular periférica.2 Em casos de necessidade de repetidas doses, que podem levar à taquifilaxia, está poderá ser substituída pela dopamina.5

Agentes α-agonistas puros como a fenilefrina também são usados. Entretanto, podem desen-cadear uma disfunção ventricular isquêmica transitória durante um bloqueio peridural sem vaso-constritor: o aumento da pressão pelo aumento da resistência vascular sistêmica pode levar a uma diminuição mais acentuada ainda do débito cardíaco.5 No caso de soluções contendo vasocon-tritores, os α-agonistas puros poderiam ser usados pela expressiva queda na resistência vascular sistêmica desencadeada por esses bloqueios.2

Não há nenhum estudo que defina claramente um limite seguro e aceitável de pressão arterial ou de FC para qualquer grupo de paciente.2 Assim sendo, muitos autores recomendam o trata-mento caso a pressão arterial caia 25% a 30% do valor basal ou a sistólica se encontre abaixo de 90 mmHg, em pacientes normotensos; além disso recomenda-se tratar FC abaixo de 50 ou 60, não sendo uma aplicação universal.5

Sistema respiratórioA anestesia peridural torácica provoca diminuição da capacidade vital, da capacidade pulmonar total e do volume expiratório forçado em um segundo (FEV1) em consequência ao bloqueio motor dos mús-culos intercostais.

Em bloqueios até níveis médio-torácicos, drogas sedativas perioperatórias têm maior impacto na função respiratória que o bloqueio em si, em pacientes sem doença pulmonar preexistente.2 Entretanto, bloqueios altos, com paralisia abdominal e intercostal, podem requerer exalação ativa, devendo se tomar cuidado em pacientes com doença pulmonar obstrutira crônica (DPOC)2 (au-mento da capacidade residual funcional).6

Nesses casos, os pacientes podem se queixar de dispneia, apesar da ventilação-minuto poder estar normal ou aumentada. Isso se deve à incapacidade de sentir a movimentação do tórax.2 Um diagnóstico importante se faz com a paralisia de músculos respiratórios, que se apresenta com alteração na fonação inicialmente.5

Pode haver compensação do bloqueio dos nervos intercostais pelo diafragma, que passa a ter sua atividade aumentada podendo chegar até mesmo à disfunção, sendo o principal mecanismo de alteração respiratória no pós-operatório de cirurgia torácica e abdominal. Assim, para melhor controle dos efeitos pulmonares da anestesia peridural torácica, deve-se evitar o bloqueio dos nervos intercostais, optando por anestésicos locais com menor potencial para bloqueio motor ou utilização de soluções menos concentradas (bloqueio diferencial).6

Sistema gastrointestinalA inervação simpática dos órgãos abdominais derivam de T6-L2. O bloqueio dessas fibras resulta em atividade parassimpática livre de oposição. Isso resulta em aumento de secreções, relaxamento de esfíncteres e aumento do peristaltismo.5

Náusea, de etiologia desconhecida, pode ocorrer, associada a bloqueios acima de T5, hipoten-são, opioides e história prévia de discinesia.5

Sistema endócrino-metabólicoAinda que a anestesia peridural iniba muitas das alterações endócrino-metabólicas, tal efeito é menor em procedimentos torácicos e abdominais altos.5 O fato é que informações sobre a presença do blo-

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Capítulo 8 Peridural torácica 103

queio simpático, sua extensão e sua relação com o bloqueio sensorial são escassas.6 Entretanto, os benefícios da anestesia peridural torácica são parcialmente atribuídos ao bloqueio simpático torácico. Ela induz bloqueio simpático torácico e lombar, que precede e ultrapassa o bloqueio sensorial.7

O conjunto de reações definidas como “resposta ao estresse cirúrgico” é geralmente visto como mal adaptativo e como um dos fatores que aumentam a morbimortalidade pós-opera-tória.5,7 A ativação do sistema simpático resulta em taquicardia e aumento do consumo de oxigênio pelo miocárdio. Além disso, ocorre hipoperfusão e disfunção intestinal perioperatória, comumente encontradas após grandes cirurgias e agravadas quando a terapia com opioides é necessária.7

pERIDuRAL TORáCICA ASSOCIADA à ANESTESIA GERALA associação com a anestesia geral previne o reflexo vagal e dor pela tração do diafragma.1 A influên-cia do bloqueio peridural torácico associado à anestesia geral tem sido muito estudada na atualidade, quando administrada em pacientes com e sem coronariopatias. A ausência de situações de isquemia coronariana no grupo de pacientes submetidos à anestesia peridural torácica, apesar da presença de significativa hipotensão arterial, pode ser justificada pelos seguintes mecanismos:

Diminuição da fC — Durante o bloqueio peridural torácico houve em média 15 batimentos por minu-to (bpm) a menos do que com o peridural lombar, o que possibilitou uma relação pressão-FC idêntica nos dois estudos. A queda da FC no bloqueio peridural torácico pode ser devida ao bloqueio das fibras cardioaceleradoras autônomas, o que provavelmente não ocorreu após o bloqueio lombar.

Efeito inotrópico negativo — O bloqueio de fibras simpáticas cardíacas, que ocorre após o blo-queio peridural torácico, diminui o inotropismo, como foi evidenciado no estudo por meio da eleva-ção da pressão capilar pulmonar; esse bloqueio realizado na região lombar não atinge esse tipo de fibra, com o volume de anestésico local empregado. Geralmente tem sido aceito pela literatura que o efeito inotrópico negativo causado pelo bloqueio peridural torácico está restrito às situações em que este atinge segmentos torácicos altos, não sendo na maioria das vezes muito intenso, justificando, dessa forma, que a hipotensão arterial resultante do referido bloqueio é, principalmente, secundária à vasodilatação.

Estudos experimentais8 mostram que, na presença de doença coronariana isquêmica instável, o bloqueio peridural cervicotorácico resulta em uma menor incidência de disritmias ventriculares e alterações hemodinâmicas similares àquelas apresentadas após a administração de um agente farmacológico com atividade β-adrenérgica. Um estudo realizado por Koch et al.9 evidenciou que a função ventricular esquerda, global e regional, é mais bem preservada em pacientes coronariopa-tas isquêmicos com o bloqueio peridural cervicotorácico do que na ausência deste. Scherer et al.13

documentaram o número de bloqueios peridurais torácicos efetivos para cirurgias abdominais e seus efeitos colaterais e concluíram pela indicação do bloqueio peridural torácico, associado ou não à anestesia geral, como a técnica anestésica ideal para a realização de cirurgias abdominais, quando comparada com a anestesia geral isoladamente.

Estudo comparativo entre bupivacaína, 0,25%, e ropivacaína, 0,2%, em anestesia para cirurgia torácica demonstrou que a técnica combinada peridural torácica e anestesia geral mostrou-se eficaz e segura nos pacientes submetidos à toracotomia. Quando se utilizou bupivacaína, a dimi-nuição da pressão arterial foi maior e a pressão máxima nas vias aéreas foi menor do que quando comparada à ropivacaína.10

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ANáLISE DE fATORES TéCNICOS NA REALIzAçãO DO BLOquEIO pERIDuRAL As vértebras torácicas apresentam características próprias importantes: diferentes inclinações de seus processos espinhosos, processos transversos e corpos vertebrais com facetas que se articulam com as costelas. As vértebras torácicas primeira (T1), segunda (T2), décima (T10), décima primeira (T11) e dé-cima segunda (T12) têm processos espinhosos com inclinações iguais às do segmento lombar, e os processos espinhosos da quinta até a oitava vértebras torácicas (T5-T8) têm inclinações que podem ultrapassar 60 graus em relação à pele.

Figura 1. Coluna vertebral nível toracolombar

As punções peridurais ao nível torácico requerem maior experiência do anestesiologista, por serem menores as distâncias entre o ligamento amarelo e a dura-máter. O ligamento amarelo é mais fino do que no segmento lombar. Embora a punção paramediana predisponha à maior pos-sibilidade de sangramento pelo risco de lesão vascular, tecnicamente torna-se mais fácil quando comparada à punção na linha média. A técnica paramediana é a mais indicada para a colocação do cateter peridural em razão da alta incidência de falso-positivo no teste da perda de resistência quando a punção mediana é executada.1 Além disso, a angulação dos processos espinhosos, especialmente na região médio-torácica, pode tornar a técnica da linha média um desafio, mesmo para anestesistas experientes.1

A medula espinhal apresenta duas intumescências que devem ser lembradas: uma entre C3-T2 e a outra entre T9-T12, regiões de origem das raízes nervosas dos membros superiores e inferiores.11

No Brasil, o bloqueio peridural se popularizou nas cirurgias estéticas mamárias ambulatoriais com ou sem sedação perioperatória. Propofol em infusão contínua4 ou midazolam12 com ou sem fentanila são titulados para se obterem diferentes graus de sedação em anestesia regional. Nas técnicas anestésicas regionais, a “sedação consciente” é considerada ideal principalmente quan-do se necessita da cooperação do paciente.

Em voluntários calmos, dosagens plasmáticas de catecolaminas durante diversos níveis de bloqueio peridural (T

8,T4,C8) não registraram diminuição significativa da norepinefrina, sugerindo que a simpatectomia química é apenas parcial13 e que a vasoconstrição compensatória de outros territórios, não atingidos pelo bloqueio nervoso, ameniza a diminuição da pressão arterial. A alta

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Capítulo 8 Peridural torácica 105

ambulatorial pós-bloqueio peridural implica reversão do bloqueio motor dos membros acometidos, sem instabilidade hemodinâmica.14

LOCALIzAçãO DO CATETERÉ importante a correta localização da ponta do cateter dentro do espaço peridural em relação aos dermátomos comprometidos pela lesão cirúrgica, para que o efeito da droga utilizada por essa via de administração seja o melhor possível, principalmente quando se utilizam anestésicos locais ou opioides lipossolúveis (fentanila ou sufentanila), sendo menos importante quando são utilizados opioides hidros-solúveis como a morfina ou drogas α2-agonistas (clonidina).

A proximidade da ponta do cateter com os dermátomos referidos possibilita a utilização de doses menores de anestésicos locais, diminuindo a extensão do bloqueio somático e simpático, reduzindo consequentemente a incidência de bloqueio motor e hipotensão arterial; além disso, possibilita o emprego de doses menores de opioides, diminuindo a incidência de seus efeitos adversos no período perioperatório (Figura 2).1

Figura 2. punção peridural torácica com passagem de cateter contínuo

Em relação às doses, vários regimes têm sido sugeridos com um ponto em comum: analgesia cirúrgica, com o uso de uma anestesia geral “leve” — o que reduz os efeitos residuais depressores do sistema respiratório.15,16

Frequentemente são utilizados grandes volumes e baixas concentrações de anestésico local em níveis médios a baixos para grandes cirurgias toracoabdominais.7

Em se tratando de punções torácicas médias ou altas, é prudente reduzir as doses de anes-tésico local em 30% a 50% em relação às doses utilizadas na punção lombar, prevenindo uma dispersão cefálica excessiva.5

Diferentemente da raquianestesia, a peridural produz bloqueio segmentar que se difunde tanto caudal quanto cranialmente, a partir do local de injeção.5 No caso da peridural torácica, a técnica produz uma faixa de anestesia segmentar e simétrica, sendo que a extensão dependerá da massa de anestésico local utilizada.5

Vários fatores podem interferir com a dispersão desse anestésico no espaço peridural. Sua massa parece ser o mais importante fator na extensão dos bloqueios sensorial, motor e simpático.7 A idade também está relacionada, principalmente em se tratando de peridural torácica — dose 40% menor em pacientes idosos.7,17 O mecanismo é incerto, mas aventa-se uma menor perda do anestésico pelos forames intervertebrais em consequência às calcificações.7

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A posição e a velocidade de injeção exercem pequeno efeito na dispersão do bloqueio.9 Em relação à altura, não há consenso — a não ser, talvez, nos extremos.7 Peso e índice de massa corporal (IMC), apesar de fraca correlação em peridural lombar, inexistem em peridural torácica.7 Em razão do maior ingurgitamento de vasos peridurais por aumento da pressão intra-abdominal, a gravidez seria um fator que diminuiria a dose necessária de anestésico local. Entretanto, os dados disponíveis são referentes à peridural lombar: estudos clínicos e em animais têm demonstrado que o bloqueio nesses casos é mais intenso e têm seu início mais rápido.7,18,19

pERIDuRAL TORáCICA pARA mASTECTOmIASA anestesia peridural torácica é utilizada com frequência para procedimentos estéticos da mama, porém há poucos relatos de seu emprego para mastectomias com exploração axilar.20 A anestesia peridural to-rácica é muito utilizada para operações plásticas21,22 e para analgesia pós-operatória de toracotomias13,14 e com menos frequência em intervenções cirúrgicas oncológicas de mama.23,24 Estudo comparativo entre anestesia peridural torácica e anestesia geral em mastectomia oncológica20 mostrou que é pos-sível realizar mastectomias oncológicas com esvaziamento axilar com técnica peridural torácica com punção única e que essa opção apresenta algumas vantagens em comparação com a anestesia geral. No período intraoperatório, a qualidade anestésica foi adequada na maioria das pacientes, apesar da necessidade de complementação com anestésico local na região axilar em três casos. Nessas pacien-tes a dissecção foi até o segundo nível, e a intervenção cirúrgica não foi comprometida. Um problema da anestesia peridural torácica nessa região está vinculado à inervação torácica e axilar. Na superfície acima do segundo dermátomo torácico está o território da quarta raiz cervical (C4) e as raízes cervicais inferiores dão inervação à axila em conjunto com a segunda raiz torácica (C2). Por isso, um bloqueio adequado para a superfície deve incluir a quarta raiz cervical (C4).

Na axila, o bloqueio deve incluir as raízes cervicais e a segunda torácica (T2), porém quando a dissecção progride até o segundo ou terceiro nível (por trás e em direção medial ao músculo pei-toral menor) outras raízes cervicais estão envolvidas na inervação acima de C4. Os dados desse estudo mostraram que essa altura do bloqueio, na quarta raiz cervical, pode ser obtida de forma consistente após a administração de dose única de anestésico local com opioide. Apesar do volume da solução ter sido grande (20 mL), a dose do anestésico [bupivacaína com excesso enantiomérico de 50% (S75-R25) na concentração de 0,375% (75 mg)] não é considerada alta e foi utilizada diluição porque esse procedimento não precisa de relaxamento muscular intenso. Artigo recente25 mostrou que a abordagem torácica média tende a ter maior dispersão caudal que cer-vical do anestésico local, o que justifica usar volumes maiores quando esse bloqueio é feito. Um bloqueio alto pode ter consequências hemodinâmicas ou respiratórias, o que não foi detectado nessas pacientes.

A incidência de hipotensão arterial foi alta (60%), porém a diminuição dos valores da pressão arterial não foi significativa e foi controlada sem dificuldade com pequenas doses de vasopressor. O bloqueio torácico médio pode causar bradicardia ao inibir as fibras simpáticas cardíacas. Isso não ocorreu, assim como demonstrado em outros estudos.23,26,27 A respiração não foi afetada de acordo com a monitorização usada e há estudos que mostram que a anestesia peridural toráci-ca28 pode ser empregada com segurança para esse tipo de operação mesmo quando a paciente apresenta doenças como asma ou doença pulmonar obstrutiva crônica. A abordagem cervical, com bloqueio até a segunda raiz cervical (C2), altera a respiração, deprimindo a função do diafrag-ma29 e se correlaciona com a concentração do anestésico local utilizada. Vantagem da anestesia regional comparada com a anestesia geral é a diminuição da incidência de náuseas e vômitos que ocorre em vários procedimentos e estudos publicados.30

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Capítulo 8 Peridural torácica 107

ANTICOAGuLAçãO E BLOquEIO pERIDuRAL — hEmATOmA ESpINhALApesar do tromboembolismo venoso continuar sendo uma importante fonte de morbidade e mortalida-de perioperatórias, sua profilaxia e seu tratamento não estão isentos de risco. Sangramento é a maior complicação da terapia antitrombótica.31 Os principais fatores de risco para ocorrência de sangramento são anticoagulação excessiva, idade avançada, sexo feminino, história de sangramento gastrointestinal, uso concomitante de antiagregantes plaquetários e duração da terapia anticoagulante.32

Durante o tratamento com varfarina, o risco de sangramento é baixo quando o INR é mantido entre 2,0 e 3,0. A elevação do INR acima de 4,0 se associa com um risco significativamente maior de sangramento (7%). A incidência de complicações hemorrágicas durante anticoagulação tera-pêutica com heparina não fracionada, venosa ou subcutânea, bem como com heparina de baixo peso molecular é menor que 3%.3 A terapia trombolítica representa o maior risco de sangramento (6% a 30%).33

O sangramento no canal espinhal se origina, mais comumente, a partir do plexo venoso pe-ridural. Apesar do trauma de vasos sanguíneos peridurais ocorrer em 3% a 12% das tentativas de inserção do cateter peridural, o hematoma espinhal sintomático é uma complicação rara, mas potencialmente catastrófica.34 A incidência do hematoma espinhal manifesto clinicamente é des-conhecida. Todavia, parece que sua ocorrência tem-se tornado mais frequente, possivelmente como resultado do uso mais difundido da anestesia regional em pacientes com estados alterados da coagulação.

A incidência de hematoma espinhal relatada na literatura varia bastante entre os estudos. Em um extremo do espectro, uma revisão com mais de 850.000 bloqueios peridurais relatou três ca-sos, com uma incidência de 0,0004%.35 Por outro lado, estudos relataram incidências de 0,03%14 e 0,2%.36 Com base nessas informações, em pacientes com a coagulação normal, Tryba estimou o risco de hematoma espinhal em 1:150.000 casos de anestesia peridural, e 1:220.000 raquia-nestesias.37

Alteração da coagulação secundária à terapia anticoagulante ou a coagulopatias é o fator de risco mais comumente incriminado como causa de hematoma espinhal após a realização de bloqueios neuroaxiais.2 Outros fatores de risco incluem: punções múltiplas, difíceis e traumáti-cas, idade avançada e presença de anormalidades anatômicas.40

Em revisão da literatura, Vandermeulen et al.9 relataram 61 casos de hematoma espinhal as-sociados à anestesia peridural e raquianestesia. Em 42 casos (68%), o hematoma ocorreu em pacientes com evidências de anormalidades na hemostasia. A inserção da agulha de punção ou do cateter foi difícil em 25%, e com sangramento em outros 25% dos casos. De forma geral, em 53 dos 61 pacientes (87%), anormalidade da coagulação ou dificuldade na inserção da agulha estiveram presentes. Em 15 dos 32 pacientes que usaram cateter peridural, o hematoma espinhal ocorreu imediatamente após a retirada do cateter. Nove desses cateteres foram retirados na vi-gência de níveis terapêuticos de heparinização. Dessa forma, foram identificados fatores de risco potencias para o desenvolvimento de hematoma espinhal, destacando-se a presença de anticoa-gulação ou outra anormalidade da coagulação e o momento da inserção e da retirada do cateter peridural em relação à administração da medicação anticoagulante ou antitrombótica.41

O desenvolvimento do hematoma imediatamente após a retirada do cateter peridural demons-tra que o sangramento não ocorre apenas na punção com a agulha ou com a inserção do cateter, mas também após a retirada deste.41

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Assim, com base nos dados encontrados na literatura, propomos uma série de fatores de risco inerentes à condição clínica do paciente, à técnica anestésica e ao uso de medicações antico-agulantes. O risco de hematoma espinhal será potencialmente maior em pacientes idosos e do sexo feminino; nos casos de inserção traumática e após várias tentativas da agulha ou do cateter peridural; com o uso da técnica peridural (quando comparada às agulhas mais finas da raquianes-tesia); quando se utiliza cateter peridural; com a permanência do cateter durante a tromboprofilaxia (especialmente com heparina de baixo peso molecular); quando a inserção ou retirada do cateter peridural é realizada na presença de níveis significativos de anticoagulação; na presença de altera-ções hemostáticas; com altas doses do anticoagulante; com a associação de drogas que alteram a coagulação.

A situação se modificou dramaticamente e o risco de hematoma espinhal aumentou bastante após a introdução do uso rotineiro das heparinas de baixo peso molecular para a profilaxia dos eventos tromboembólicos perioperatórios. Com isso, o uso da heparina de baixo peso molecular se tornou um novo fator de risco para o desenvolvimento de hematoma espinhal após bloqueio neuroaxial,32 devendo-se levar em consideração a relação de risco e benefício em sua indicação.

INDICAçõESA anestesia peridural torácica é indicada para cirurgias torácicas,15 assim como cirurgias cardíacas, abdo-minais e plásticas. Uma classificação simples divide os níveis de punção em torácica alta (C7-T12 — cirur-gia cardíaca), médio torácica (T2-T6 — cirurgia torácica); e torácica baixa (T6-L1 — cirurgia abdominal).5

É considerada como padrão-ouro para analgesia pós-toracotomia, com menos efeitos colate-rais que outros métodos comumente usados.15 Tem indicação precisa para anestesia da região torácica e abdominal5,7 associada ou não à anestesia geral.

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Capítulo 9

TrAnSPLAnTe de órgãoS nA CriAnçA —

TrAnSPLAnTe renALDaniela Bianchi Garcia Gomes

Danielle M. H. DumaresqMagda Lourenço Fernandes

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112 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

INTRODuçãO A doença renal é considerada um problema de saúde pública crescente em todo o mundo. Segundo da-dos do relatório anual do North American Pediatric Renal Trials and Collaborative Studies (NAPRTCS), em 2008, 104 novas crianças e adultos jovens com idade inferior a 20 anos foram acrescentados aos 7.037 indivíduos com taxa de filtração glomerular (TFG) menor que 75 mL/min/1,73 m2 de superfície corporal.¹ O censo realizado em 2008 pela Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), em colaboração com 310 das 684 unidades renais ativas e cadastradas, registrou 41.611 pacientes em terapia renal substitutiva, sendo que destes 1,6% tinha menos de 20 anos de idade.²

O transplante renal (TR) é o mais bem estabelecido de todos os transplantes de órgãos sólidos realizados e uma opção efetiva para o tratamento da insuficiência renal crônica (IRC) tanto em adultos quanto em crianças.

O primeiro TR realizado em pediatria ocorreu em 1909, quando Unger, em Berlim, transplantou um rim de macaco para uma criança que sofria de insuficiência renal aguda (IRA). Mas os resul-tados da época não foram satisfatórios e, por muitos anos, o TR pediátrico foi tratado com muitas restrições que se deviam, principalmente, aos efeitos decorrentes dos imunossupressores e à escassez de órgãos.

Estudos publicados mais recentemente vêm demonstrando que o sucesso do TR está asso-ciado à melhor qualidade de vida e sobrevida do transplantado renal a longo prazo, e que essa qualidade é significativamente melhor que a dos pacientes em esquema de diálise para quase todas as formas de doença renal.3-5 Seu progresso torna-se aparente quando analisamos os re-sultados de grandes registros como o NAPRTCS, no qual observamos melhora na sobrevida em um ano do enxerto de 89,4% e 75,2% no período de 1987 a 1990 para 95,3% e 92,3% no período de 1999 a 2003 para os transplantes de doador vivo e cadavérico, respectivamente.6 Entretanto, não existem muitos dados disponíveis na literatura da sobrevida a longo prazo do paciente e do enxerto, bem como das morbidades associadas.

Na população pediátrica, o TR permite um estado fisiológico que facilita o crescimento e o desen-volvimento neurológico, tornando-se o primeiro método de tratamento nessa população com IRC.

Os avanços na técnica cirúrgica ocorreram basicamente nas fases iniciais do transplante e pouco evoluiu nos últimos anos. Foi basicamente o desenvolvimento de novas drogas imunos-supressoras que desempenhou um importante papel na manutenção do órgão transplantado. Do início dos anos 1960, quando foi introduzida a azatioprina e os corticosteroides no esquema imunossupressor, até 1984, com a liberação da ciclosporina, a incidência de rejeição aguda caiu drasticamente, revolucionando não só o TR, mas também o transplante de outros órgãos sólidos como coração e fígado, que passaram a ser realizados em larga escala. Dez anos depois a US Food and Drug Administration (FDA) liberou a introdução do tacrolimo no esquema imunossupres-sor, logo acompanhada do micofenolato de mofetila em 1995 e do sirolimo em 1999.7 Não existe o melhor esquema imunossupressor, mas uma combinação que melhor se adapta às condições do paciente em determinado momento.

Fatores técnicos, imunológicos, metabólicos e psicológicos tornam o TR pediátrico diferente daquele do adulto. As crianças apresentam características únicas, incluindo diferentes etiologias da falência renal, crescimento físico, resposta imune aumentada idade-relacionada e alto risco de hipoperfusão do enxerto.

INDICAçõES O Comitê da Sociedade Americana de Transplantes definiu como indicações para transplantes renais em pediatria toda criança com IRC em fase terminal, estando o paciente em diálise ou em fase pré-dialítica.

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Capítulo 9 Transplante de órgãos na criança — Transplante renal 113

Apesar do avanço na terapia conservadora, o TR ainda é a melhor opção para criança com doença renal em estágio terminal, ou seja, quando a TFG atinge valores abaixo de 30 mL/min por 1,72 m2 de superfície corporal.

A etiologia da IRC é particular para cada faixa etária de pacientes e difere da observada em adultos. As malformações congênitas e hereditárias são responsáveis por mais de metade dos casos, distúrbios congênitos do trato urinário respondem por 35% e doenças hereditárias, como rim policístico, contribuem com aproximadamente 25%.

Como não existe um consenso na literatura para a classificação da doença renal primária, Soares et al. em 2007, após analisarem vários estudos, sugeriram classificar a doença renal primária em cinco grandes grupos (Quadro 1).7 As uropatias e as glomerulopatias são responsáveis por prati-camente 60% dos casos de falência renal nas crianças e nos adolescentes. Mas enquanto as do-enças estruturais (uropatias obstrutivas, aplasia/displasia e nefropatia do refluxo) são mais comuns em crianças com menos de 5 anos de idade, a glomeruloesclerose segmentar focal representa menos de 6% nesse grupo de pacientes e 15% nos pacientes com mais de 12 anos.

Quadro 1. principais causas de doença renal em pediatria

Uropatias

Válvula de uretra posterior

Disfunções vesicais neurogênicas

Refluxo vesicoureteral

Estenose da junção ureterovesical

Disfunção miccional

Glomerulopatias

Glomeruloesclerose segmentar e focal

Glomerulonefrite

Síndrome hemolítico-urêmica

Púrpura de Henoch Schonlein

Nefropatias hereditárias

Síndrome de Fanconi

Síndrome de Bartter

Rim policístico infantil

Rim policístico tipo adulto

Displasia/Hipoplasia renal

Causas menos prevalentes

IRC indeterminada

IRA indeterminada

Trauma

Necrose tubular aguda

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A doença responsável pela IRC poderá apresentar importante impacto no resultado pós-trans-plante. As uropatias obstrutivas, como exemplos, se não adequadamente corrigidas, podem levar à perda do rim transplantado. Entretanto, cresce nos últimos anos a preocupação com a recor-rência da doença de base. Dentro desse grupo, uma patologia que se destaca na população pediátrica com crescente aumento em sua incidência anual e que apresenta impacto negativo na sobrevida do enxerto renal é a glomeruloesclerose segmentar e focal, responsável por 11,5% dos casos de IRC nas crianças transplantadas.8

Considerando-se que o TR tem a capacidade de melhorar a função cognitiva e diminuir o grau de desajuste social da criança, o ideal seria realizá-lo antes do início do tratamento dialítico (transplante preemptivo). Existem alguns serviços que rotineiramente realizam TR em lactentes com resultados satisfatórios.9 Mas, se por um lado, a sobrevida em três anos desses pacientes em diálise é de apenas 66%, aumentando para 91,5% e 80,7% após o transplante com doador vivo e cadáver, respectivamente, as dificuldades técnicas e nutricionais pré-transplante devem ser consideradas, já que a prevalência de desnutrição severa é maior nesse grupo de pacientes, assim como a incidência de trombose da artéria do rim transplantado.

pREpARO pARA O TRANSpLANTE RENAL Os cuidados corretos durante o tratamento dialítico são essenciais para o transplante. A ingestão hídri-ca dificilmente obedecida, a hipervolemia cronicamente sustentada associada à hipertensão, a fístula arteriovenosa e outros fatores podem comprometer a função cardíaca. Crianças com diagnóstico de IRC em tratamento dialítico apresentam aumento na massa ventricular esquerda procurando manter a performance do ventrículo esquerdo e a contratilidade de repouso, mas sua reserva contrátil pode estar reduzida durante o exercício, achado que pode ser um indicativo de disfunção sistólica severa no futuro, dependendo do tempo em diálise do paciente.10

Na tentativa de manter a homeostase do organismo, o rim sofre uma série de adaptações dian-te de um quadro de IRC, e o organismo, uma série de consequências, como hipertensão arterial, desequilíbrio hidroeletrolítico (sódio e água), hipercalemia, acúmulo sérico de fosfatos, acidose metabólica e anemia, distúrbios mineral e ósseo, calcificações extraósseas, hiperparatireoidismo secundário, hiperfosfatemia, alterações do metabolismo da glicose e da insulina, alteração do sistema imunológico.

Antes de a criança ser submetida ao TR, os problemas relacionados à insuficiência renal de-vem ser diagnosticados e, se possível, corrigidos previamente.

Pacientes sem etiologia definida de IRC devem ser submetidos à avaliação urológica cuidadosa que inclui, inicialmente, a realização de uma uretrocistografia miccional (UCM) e, se necessário, posteriormente, estudo urodinâmico em razão da elevada frequência de uropatias obstrutivas, bem como anomalias do trato urinário nessa faixa de pacientes.

Um dos aspectos fundamentais no transplante pediátrico é a avaliação nutricional dos pacien-tes em preparo para transplante, que envolve medidas desde orientação nutricional correta até a realização de gastrostomia em situações especiais. Além disso, os familiares e o próprio paciente raramente estão preparados para o transplante, tornando a participação de uma assistente social e uma psicóloga fundamental.

Infecção ativa é uma contraindicação para o TR e sítios comumente infectados nessa popula-ção de pacientes incluem trato urinário, pulmão, cateter venoso e, eventualmente, líquido de diálise peritoneal.

Ainda, rotineiramente, realizam-se sorologias para citomegalovírus (CMV), vírus Epstein Barr, hepatites B e C, Chagas, toxoplasmose e reações sorológicas para sífilis tanto do doador quanto

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Capítulo 9 Transplante de órgãos na criança — Transplante renal 115

do receptor, não só para a investigação de infecções preexistentes, mas também para a avaliação do risco de infecções primárias.

pROCEDImENTO CIRúRGICO A cirurgia do TR envolve basicamente três anastomoses: artéria, veia e ureter. O entendimento das etapas do TR desde dissecção, clampeamento, anastomose vascular, desclampeamento, anastomose ureteral até o início do funcionamento do enxerto é essencial de forma a permitir ações precisas e ime-diatas, favorecendo o prognóstico. A tabela 1 mostra as etapas cirúrgicas e algumas peculiaridades no manuseio em cada fase.

Tabela 1. Etapas do transplante renal pediátrico e aspectos importantes do manuseio

Etapa Duração Reposição de fluidos Manuseio

Incisão, dissecção de vasos e estruturas renais (ureter)

2-3 horas Reposição de perdas insensíveis e sangramentos

*Antibioticoterapia*ImunossupressoresCorreção de acidose e hiperpotassemia

Clampeamento de vasos Média: 30-60 minutos

*Heparinização, 1 mg/kgAprofundar o nível da anestesia

Anastomose vascular 30 minutos Reposição com cristaloides e coloides de forma a manter pressões de enchimento (PVC 15 -20 mmHg) e Ht entre 25% e 30%

**Manitol

Desclampeamento vascular (veia depois artéria)

Manter pressões de enchimento (PVC 12-18 mmHg)

**ManitolFurosemida

Anastomose ureteral 30 minutos Observar o débito urinário no campo cirúrgicoManter hipervolemia moderada (PVC 10 - 15 mmHg)

Fechamento 30-60 minutos Manter volemia por reposição do débito urinário com solução salina 1:1

*De acordo com o protocolo do serviço.**Momento a ser administrado de acordo com o protocolo do serviço.

Na população adulta, a anastomose vascular é usualmente realizada em artéria e veia ilíaca exter-na, mas na criança dependerá do tamanho dos vasos do doador e do receptor. Dessa forma, poderá ser realizada nas artérias e veias ilíaca externa, ilíaca comum e, eventualmente, em aorta e cava, de forma a garantir um bom fluxo de sangue para o enxerto. A questão do acesso vascular para diálise nas crianças pequenas foi beneficiada nos últimos anos com a evolução dos cateteres intravascula-res de longa permanência, mas, ainda assim, alguns pacientes são admitidos para transplante após inúmeras passagens de cateter para acesso venoso em território femoral, fato que pode inviabilizar tal região para anastomose. Tais pacientes deverão ser cuidadosamente investigados.

SOBREvIDA DO ENxERTO RENAL Apesar da contribuição da terapia de imunossupressão ser considerada a grande responsável pela maior sobrevida de crianças transplantadas, alguns aspectos implicam sucesso ou falha do enxerto renal, tais como:

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116 Curso de Educação a Distância em Anestesiologia

Tipo de doador.•

Idade de doador e receptor.•

Compatibilidade de HLA.•

Sensibilização ou presença de anticorpos anti-HLA pré-formados.•

Tempo prolongado de isquemia fria.•

Etnicidade do receptor.•

História de glomeruloesclerose focal.•

Retardo no funcionamento do enxerto.•

Episódios de rejeição aguda.•

Infecção.•

Relatos de enxertos que falharam dentro de dez anos, fornecidos pela NAPRTCS,21 mostraram que crianças mais velhas, não caucasianas, com história de glomeruloesclerose focal, além de enxertos de doadores vivos, apresentaram melhor prognóstico.

AvALIAçãO ImuNOLóGICA Excluindo-se raros serviços que realizam transplante ABO incompatível, o primeiro fator necessário para o transplante é um doador ABO compatível. Na população pediátrica é muito comum o rim transplanta-do ser procedente de um dos pais ou eventualmente avós, já que os irmãos dificilmente se encontram em idade ideal para a doação. Desde março de 2001, a alocação de doadores cadavéricos foi prioriza-da para as crianças de tal forma que rins de doadores com menos de 18 anos de idade são alocados para pacientes com menos de 18 anos de idade.11 Após a tipagem sanguínea, procede-se a realização da tipagem HLA e a reação de microlinfocitotoxicidade cruzada, ou crossmath, cuja positividade, em sua maioria, contraindica o transplante. Finalmente, o status de sensibilização para transplante, determinado por condições prévias que estimularam a resposta imunológica (transfusões de sangue, transplante pregresso e gestação anterior), é avaliado por meio da realização de um teste denominado reatividade contra painel, realizado contra vários antígenos presentes na população. Nesse teste, procura-se a pre-sença de anticorpos da classe IgG dirigidos contra antígenos específicos e que possam comprometer a evolução do transplante.

CONSIDERAçõES ANESTéSICAS A magnitude das diferenças entre pacientes pediátricos e adultos resulta em considerações anestési-cas especiais, nem sempre evidentes ao anestesiologista. O conhecimento das diferenças anatômicas, fisiológicas, farmacológicas e psicológicas aliado à experiência técnica é fundamental nos cuidados direcionados a essas crianças.12

fARmACOCINéTICA DAS DROGAS NA INSufICIêNCIA RENAL CRôNICA Nos pacientes com IRC, drogas ligadas a proteínas plasmáticas devem ter sua dose diminuída, uma vez que a ligação proteica está reduzida pela azotemia. A redução das proteínas plasmáticas na IRC terminal é causada mais pela redução da albumina do que da globulina, o que pode causar aparente potencialização de drogas que se ligam à albumina. Já, as drogas que se ligam à globulina (como relaxantes musculares não despolarizantes) são menos afetadas por esse mecanismo. Os pacientes

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Capítulo 9 Transplante de órgãos na criança — Transplante renal 117

com uremia não tratada podem ter aumento do volume do líquido extracelular e, consequentemen-te, aumento do volume de distribuição para drogas hidrossolúveis. Nesses casos, doses maiores de drogas hidrossolúveis podem ser necessárias para se atingir o efeito desejado. Embora a maioria dos pacientes agendados para cirurgia de TR esteja clinicamente controlada, a diálise pré-operatória pode causar depleção de volume e grandes reduções na pressão arterial após a administração de drogas que liberam histamina (como morfina e atracúrio) ou de drogas que atuam em receptores adrenérgicos (como droperidol, labetalol). A acidose associada a esses pacientes também pode potencializar os efei-tos de algumas drogas (relaxantes musculares como vecurônio, rocurônio, pancurônio).13

mONITORIzAçãO Além da monitorização intraoperatória-padrão (oximetria de pulso, eletrocardiograma, pressão arterial não invasiva, temperatura, PETCO2 e gases inalados), está indicada monitorização complementar. Du-rante o procedimento cirúrgico, a monitorização hemodinâmica invasiva pode auxiliar na adequação da reposição volêmica e da perfusão renal.14 Pacientes com insuficiência renal geralmente apresentam alterações nos líquidos corporais e alta incidência de doença cardíaca. Em razão desses dois fatores aliados à importância de perfusão e função precoces do enxerto, a monitorização da PVC é recomen-dada.13 Em casos especiais, como na presença de cardiopatias ou coagulopatias, pode ser necessário também monitorizar a pressão arterial invasiva.14,15

REpOSIçãO híDRICA E CONTROLE hEmODINâmICO A reposição hídrica deve ser guiada pelo status cardiovascular do paciente e pela pressão venosa central. Hipovolemia é comum nos pacientes submetidos à diálise pouco antes do transplante.12 Uma agressiva expansão de volume se justifica, porque o atraso no funcionamento do rim transplantado está associado a 20% a 40% de diminuição na sobrevida do enxerto e a aumento da mortalidade. Necro-se tubular aguda pós-operatória pode resultar de uma inadequada hidratação.13 Geralmente líquidos intraoperatórios são repostos na ordem de 60 a 80 mL/kg/h.15 Em estudo retrospectivo incluindo 50 pacientes pediátricos, Coupe et al. não evidenciaram diferença entre a quantidade de fluidos adminis-trados durante a cirurgia e a ocorrência de necrose tubular aguda. Entretanto, nesse estudo utilizou-se volume de líquidos que variou de 30 a 190 mL/kg (média de 88 mL/kg), sendo que crianças menores receberam maiores volumes. 16

Solução salina isotônica é considerada a primeira escolha para reposição hídrica no TR.17 As várias soluções cristaloides podem apresentar diferentes impactos no balanço eletrolítico e ácido- -básico. Solução de Ringer com lactato é tradicionalmente evitada, em razão de sua composição com potássio (4 mEq/mL). No entanto, deve-se lembrar que reposições de grandes volumes com solução fisiológica podem estar associadas a quadros importantes de acidose metabóli-ca e consequente hiperpotassemia. Em pacientes adultos, compararam-se três soluções de re-posição (solução salina a 0,9%, Ringer com lactato e Plasmalyte®), concluindo-se que, durante transplantes não complicados, o melhor resultado metabólico foi observado nos pacientes que receberam Plasmalyte®,17seguido do Ringer com lactato. Hipercalemia é um achado frequente e pode contribuir para distúrbios da condução cardíaca, devendo ser idealmente corrigida antes da anestesia.12

Um adequado controle hemodinâmico intraoperatório é fundamental. A monitorização da pres-são venosa central pode diminuir o risco de necrose tubular aguda e insuficiência do rim trans-plantado, causadas por hipovolemia. A medida do volume intravascular no intraoperatório permite aumentar a probabilidade de função imediata do enxerto por manter um adequado volume in-

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travascular e garantir a perfusão satisfatória do rim transplantado. Pressão venosa central de 10 mmHg a 15 mmHg tem sido recomendada para manter um ótimo volume intravascular.13 A pressão arterial deverá ser mantida 10% acima dos valores basais, e a PVC em níveis elevados antes da liberação do clamp da artéria renal. Especial atenção deve ser dirigida aos pacientes que tiverem a aorta clampeada, bem como às crianças pequenas recebendo rim de tamanho adulto. Nestes últimos, o volume sanguíneo necessário para perfundir o novo rim representa uma significante proporção do volume intravascular total da criança.12 O anestesiologista deve estar preparado para manusear quadros de hipotensão aguda com o objetivo de evitar uma inadequada perfusão e piora da sobrevida do enxerto. Em casos de hipotensão grave, além de cristaloides, albumina, na dose de 0,8 g/kg, pode ser utilizada para diminuir o risco de disfunção tardia do enxerto.13 Drogas vasoativas também podem ser utilizadas. Alguns autores evitam o uso de vasopressores de ação direta, preferindo dopamina ou efedrina para adequar os níveis pressóricos,13 entretanto, os alfa- -agonistas podem ser necessários em casos de hipotensão severa.18 Acidose pode acompanhar hipotensão após a liberação do clamp da aorta.. O uso de manitol confere proteção renal contra is-quemia cortical, por meio da expansão do volume intravascular, estando indicado antes do clamp dos vasos renais. Entretanto, deve-se estar atento ao fato de que essa rápida expansão do volume intravascular pode provocar falência cardíaca e edema pulmonar.12

TéCNICA ANESTéSICA Em casos eletivos, a indução anestésica pode ser realizada por via inalatória, porém a indução venosa é preferível em pacientes com acesso venoso disponível e nos casos considerados de estômago cheio. Todos os agentes de indução disponíveis podem ser usados. A escolha da droga deve considerar o status cardiovascular e o volume intravascular do paciente, além das alterações na farmacocinética e na farmacodinâmica dessas drogas na IRC. Os opioides, frequentemente, são administrados na indu-ção para minimizar as alterações hemodinâmicas que ocorrem durante a laringoscopia e a entubação traqueal. A diminuição da excreção renal característica de relaxantes musculares deve ser considerada, porém todos os relaxantes musculares disponíveis são seguros, desde que utilizados com monitoriza-ção cuidadosa. A succinilcolina pode causar uma elevação de 0,5 a 0,75 mEq/L no potássio sérico e, potencialmente, causar uma hipercalemia transitória que pode estar associada com distúrbios de con-dução. A manutenção da anestesia geralmente consiste na combinação de agente inalatório e opioide. Óxido nitroso pode ser usado, mas é prudente evitá-lo para prevenir a distensão de alças intestinais.12

Recentemente a nefrotoxicidade dos anestésicos tem sido considerada em debates sobre o composto A, produto resultante da degradação do sevofurano. Esse anestésico reage com a cal sodada, formando, entre vários produtos da degradação, o CF2=C(CF3)-O-CH2F, denominado composto A. O composto A está presente em maiores concentrações nos circuitos de anestesia com baixo fluxo (menor do que 1 L/min), quando comparado aos altos fluxos. Sendo esse produto sabidamente nefrotóxico em ratos, a questão da segurança da anestesia com sevoflurano em fluxo baixo foi então considerada para o rim humano. Estudos que avaliaram a tolerância renal na anestesia com sevoflurano mostram resultados conflitantes. Portanto, enquanto persiste a questão acerca do prejuízo à função renal, é prudente evitar seu uso para manutenção da anestesia.19

A anestesia venosa total com propofol e alfentanila pode ser vantajosa, em virtude da curta duração de ação dessas drogas e da não interferência na farmacocinética, quando utilizadas em pacientes com uremia.13

Anestesia peridural em combinação com anestesia geral pode ser útil na manutenção da esta-bilidade hemodinâmica, no controle da dor e a na recuperação pós-operatória.12,15 Estudo retros-

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Capítulo 9 Transplante de órgãos na criança — Transplante renal 119

pectivo incluindo 46 pacientes pediátricos submetidos a TR demonstrou que a anestesia peridural, combinada com anestesia geral, possibilitou estabilidade hemondinâmica no intraoperatório e boa analgesia pós-operatória.20

Muitas crianças podem ser extubadas na sala de cirurgia, antes de serem transportadas para o centro de terapia intensiva (CTI). Essas crianças deverão estar hemodinamicamente estáveis, normotérmicas, acordadas, com relaxamento neuromuscular normal e terem níveis normais de eletrólitos e balanço ácido-básico.12

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