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EditorEditorEditorEditorEditorProf. Ms. Richardson Xavier Brant

Organização, padronização e revisão linguísticaOrganização, padronização e revisão linguísticaOrganização, padronização e revisão linguísticaOrganização, padronização e revisão linguísticaOrganização, padronização e revisão linguísticaProf. Ms. Waldir de Pinho Veloso

Conselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialProf. Ms. Edson Pires da Fonseca

Prof. Ms. Rafael Soares Duarte de MouraProf. Ms. Richardson Xavier BrantProf. Ms. Waldir de Pinho Veloso

e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho

ISSN 2179-8222

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho,v. 5, n. 1/2015 – ISSN 2179-8222 – Semestral – Montes Claros

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FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho

EditorProf. Ms. Richardson Xavier Brant

Organização, padronização e revisão linguísticaProf. Ms. Waldir de Pinho Veloso

Conselho EditorialProf. Ms. Edson Pires da Fonseca (Faculdade UBRES – Bahia)

Prof. Ms. Rafael Soares Duarte de Moura (Faculdade de Direito Santo Agostinho – Minas Gerais)Prof. Ms. Richardson Xavier Brant (Universidade Estadual de Montes Claros – Minas Gerais)

Prof. Ms. Waldir de Pinho Veloso (Faculdade de Direito Santo Agostinho – Minas Gerais)

Editoração GráficaMaria Rodrigues Mendes

CapaAdriano Magno de FreitasMaria Rodrigues Mendes

Ficha catalográfica elaborada por Edmar dos Reis de Deus CRB6 2486.

FAS@JUS : e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho / Faculdade de Direito SantoAgostinho. – Vol. 5, n. 1, 2015 - . - Montes Claros, MG. Fundação Santo Agostinho, 2015-

v. : il. 21 x 29cm.

SemestralISSN 2179-8222

1. Direito. I. Faculdade de Direito Santo Agostinho. lI. Título.

CDU: 34 (05)

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................

ENTREVISTA............................................................................................................................

ARTIGOS DO CORPO DOCENTE

PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO E A INFLUÊNCIA NO TRATAMENTO DADO AOS QUEESTÃO POR NASCER NO BRASIL E ARGENTINACyntia Mirella Cangussu Fernandes Sales .......................................................................................

O PENSAMENTO EGOLÓGICO NA TEORIA DE CARLOS CÓSSIO: a experiência jurídica paraalém do fixionismo normativo estruturalRafael Soares Duarte de Moura ....................................................................................................

ARTIGOS DO CORPO DISCENTE

O NEOCONSTITUCIONALISMO, A SUPREMACIA CONSTITUCIONAL E O ATIVISMOJUDICIAL: uma proposta de conciliação entre o Judiciário e povo como intérpretes e efetivadores daConstituição para garantir a democraciaBetânia Gusmão MendesPatrick Luciano Guilhoto do Prado .................................................................................................

ANÁLISE DA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS EM FACE DO PRINCÍPIO DA RE-SERVA DO POSSÍVELDiana Alves Câmara ....................................................................................................................

SITUAÇÃO DO COMPANHEIRO COMO HERDEIRO ESPECIAL NA UNIÃO ESTÁVELCamila Micaelen Freitas OliveiraIsabella Teresa Silva Souto .............................................................................................................

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1998: a efetividade da prestação administrativa à luz doprincípio da eficiênciaLucas Versiani Cardoso .................................................................................................................

RELAÇÕES ENTRE A HISTÓRIA E O DIREITO: convergências e definições dessas duas áreasdo saberRenat Nureyev Mendes ..................................................................................................................

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AUTOR CONVIDADO

PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE HUMANA E O DIREITO FRATERNOCONSTITUTIONAL PRINCIPLE OF HUMAN DIGNITY AND THE FRATERNAL LAWLafayette PozzoliÁlvaro Augusto Fernandes da Cruz ..............................................................................................

RESENHA

DIREITO E LITERATURA: um estudo da obra “Contar a lei”, de François OstGabrielle Xavier Ribeiro .............................................................................................................

REGRAS PARA PUBLICAÇÃO .............................................................................................

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APRESENTAÇÃO

Nas palavras bíblicas, a cada tempo sãocreditadas as suas próprias preocupações. A cadasemestre que nasce, nasce com ele o desejo deter mais um número da Revista Eletrônica Fas@Juslevada a lume. Nasce, também, o conforto da alma,por ver a concretização do sonho, a materializaçãodo intangível, a transformação da ideia em umarealidade.

Neste primeiro semestre de 2015, arealização da ideia vem com o complemento daRevista Eletrônica Fas@Jus, do Curso de Direitoda Faculdade de Direito Santo Agostinho, que levaa identificação como Volume 5, Número 1.Significa que este é o primeiro volume do anosequencialmente contato como número cinco. Erepresenta, por si só, a consolidação, a segurançae, sobretudo, a certeza de que, durante este tempo,não houve atraso, não houve descontinuidade, nãohouve desconexão entre a data constante da capae a data efetiva do lançamento. Especialmenteporque há temas que são sazonais, especialmenteno campo do Direito. Assim, o eventualdescompasso entre a época da publicação e a dataconstante na capa pode fazer com que artigosfiquem mofando em gavetas, adquirindo o limo dadesatualização.

Com a Revista Eletrônica Fas@Jus, do Cursode Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho,graças à efetiva participação dos Corpos Docentee Discente desta Faculdade, não há descompasso.

Prova é que a seção destinada ao CorpoDocente do Curso de Direito da Faculdade deDireito Santo Agostinho, nos presentes Volume eNúmero, vem ocupada por dois Professores daCasa. Antes, porém, uma pausa para falar da seçãoEntrevista. Para tal espaço, o convite foi feito àAdvogada Fernanda Joyce Ferreira Botelho,que faz parte da Diretoria da Subsecção montes--clarense da Ordem dos Advogados do Brasil.Há um desfile de falares múltiplos, passando peloexercício profissional, a necessidade deatualização permanente quanto aos estudos doDireito e, principal foco, sobre a ética profissionale o Tribunal de Ética da Ordem dos Advogadosdo Brasil.

Agora, especificamente sobre o segmentoque é aberto aos Professores do Curso de Direitoda Faculdade de Direito Santo Agostinho.

A Professora Cyntia Mirella Cangussu

Fernandes Sales escreveu o artigo científicodenominado “Princípios Gerais do Direito e aInfluência no Tratamento dado aos que estão porNascer no Brasil e Argentina”, tratando o Direitode Família sob duas visões, a brasileira e aargentina, quando se refere ao ordenamentojurídico. No texto, a autora desfila análisescomparativas tanto da legislação quanto dadoutrina. E mostra diferenças de tratamento porparte do ordenamento jurídico e dos aplicadoresdo Direito.

Por seu lado, o Professor Rafael SoaresDuarte de Moura alinha a sua área de pesquisa,muito voltada à Filosofia do Direito, à HermenêuticaJurídica e à Argumentação e Lógica, com a suafacilidade de expressar o que quer escrever. E,assim, nasce o artigo científico que leva oconvincente título de “O Pensamento Egológicona Teoria de Carlos Cóssio: a experiência jurídicapara além do fixionismo normativo estrutural”.Como dito, algo filosófico. Mas, sobretudo, umtexto entremeado de qualidades que envolvem aoleitor e trazem a quem o estuda a sensação de quehá muito mais matéria de fácil compreensão doque dotada de complicações.

A Revista Eletrônica Fas@Jus, do Curso deDireito da Faculdade de Direito Santo Agostinho éuma das únicas publicações científicas do Brasilque serve como efetiva prova de que o Curso deDireito apoia, verdadeiramente, a pesquisacientífica. Embora a Missão da Faculdade deDireito Santo Agostinho seja a iniciação àpesquisa, a Fas@Jus é a prova viva de que, maisdo que fomento à iniciação, há efetivo suporteaos Acadêmicos que pesquisam. Há um espaçopróprio para que os Acadêmicos publiquem seustextos científicos. E desta vez, são seis asparticipações, sendo cinco artigos e uma resenha,como se verá. O Corpo Discente está de parabéns,pelos seus representantes fixos neste Volume 5,Número 1, da Revista Eletrônica Fas@Jus.

Em ordem alfabética pelos nomes dosautores, o primeiro artigo científico publicado nestenúmero é de autoria da Acadêmica BetâniaGusmão Mendes em parceria com o AcadêmicoPatrick Luciano Guilhoto do Prado. Eles,unidos em estudos e pesquisa científica,escreveram o texto jurídico sob a denominação de“O Neoconstitucionalismo, a Supremacia

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Constitucional e o Ativismo Judicial: uma propostade conciliação entre o Judiciário e povo comointérpretes e efetivadores da Constituição paragarantir a democracia”. O tema – ativismo judicialou a intervenção do Poder Judiciário comoelemento legislador – cada vez mais credor denecessário debate, recebe considerações quejustificam os termos “científico” e “pesquisa”, poisos autores tecem comentários fundamentados emleis, em jurisprudência e em doutrina.

A também Acadêmica Diana AlvesCâmara desenrola um tema carente de explicaçõesdoutrinárias. E o faz em tom acessível e recheadode citações. Mais do que isso, o texto comprova aquantidade de doutrina alcançada pela pesquisadopara empreender a sua atividade de cientista.Escreve sobre a “Análise da Efetivação dosDireitos Sociais em face do Princípio da Reservado Possível”, deixando claro dos conceitos tantode Direitos Sociais, Direitos Fundamentais e apossibilidade de a Administração Pública efetivarou colocar tais direitos à disposição dosadministrados, dentro das suas possibilidades,conveniência e oportunidade.

Outra parceria entre membros do CorpoDiscente do Curso de Direito da Faculdade deDireito Santo Agostinho aconteceu, e a Fas@Juspublica neste número, entre a Acadêmica CamilaMicaelen Freitas Oliveira e a AcadêmicaIsabella Teresa Silva Souto. O assunto pelasduas abraçado é a “Situação do Companheirocomo Herdeiro Especial na União Estável”. Por sisó, o tema exige – e as Acadêmica se propuserama assim proceder – estudos acerca do instituto daUnião Estável e da vocação sucessória. E odesbravamento do tópico se deu em palavras cujoentendimento não é um inimigo.

Em continuação à lista, em ordem alfabética,o Acadêmico Lucas Versiani Cardoso escreveuum texto científico com o título de “A ReformaAdministrativa de 1998: a efetividade da prestaçãoadministrativa à luz do princípio da eficiência”.Como se vê desde a indicação do nome do texto,há uma mescla entre o Direito Administrativo e oDireito Constitucional. A alteração na ConstituiçãoFederal de 1988, ocorrida dez anos após o seu iníciode vigência (em 1998) trouxe alguns pontos deaplicação cogente à Administração Pública comoum todo (nas esferas federal, estaduais emunicipais), exigindo eficiência, Escolas deAdministração, exames que precedem à efetivaçãodo servidor público e outros tópicos. Tópicos

tratados no artigo em assunto.Por último, a seção do Corpo Discente é

ocupada pelo Acadêmico Renat NureyevMendes, cuja história é interessante: é graduadoem História e Acadêmico do Curso de Direito.Logo, portador de qualidades próprias para tecerou desenrolar a meada existente entre o Direito ea História. Por isso, o título do seu artigo científico,“Relações entre a História e o Direito:convergências dessas duas áreas do saber”,demonstra, desde o início e por si só, que letrascontém, para desenvolver o texto mostrando o eloou a interdisciplinaridade.

Outra seção da Revista Eletrônica Fas@Jusque é tratada com máximo carinho é a destinadaaos Autores Convidados. Desta vez, oProfessor Álvaro Augusto Fernandes da Cruz,que coordenado o Curso de Direito da FaculdadeSanto Agostinho de Sete Lagoas, obteve a parceriacom ninguém menos do que o ProfessorLafayette Pozzoli, cujos Pós-Doutorado eDoutorado são em Filosofia do Direito. O textocontém, sim, algo de Filosofia do Direito, mas ocerne é o Direito Constitucional e, como subtema,a dignidade da pessoa humana. O título, por si só,explica: “Princípio Constitucional da DignidadeHumana e o Direito Fraterno”. Dá para notar,apenas pelo tema e seus autores, que merecem,sim, a condição de “convidados” a acrescer.

A Revista Eletrônica Fas@Jus tem, para asua última seção, o nome Resenha. As regras sãodiferentes em relação à feitura de um artigocientífico. A resenha do semestre é de autoria daAcadêmica Gabrielle Xavier Ribeiro que fazanálise detalhada (um resumo crítico e, exatamentepor isso, denominado “resenha”) sob o título“Direito e Literatura: um estudo da obra ‘Contar alei’, de François Ost”. Na resenha, a Acadêmicadesce a detalhes e pormenores quanto ao estudodo livro “Contar a Lei”, de François Ost, e umadas obras que os Acadêmicos do Curso de Direitoda Faculdade de Direito Santo Agostinho estudamdurante a graduação como alicerce para oconhecimento do Direito.

A esperança tem um pedido de que sejatransformada em certeza. A certeza de que todosse encantem com este Volume 5, Número 1 daFas@Jus, e-Revista do Curso de Direito daFaculdade de Direito Santo Agostinho.

Prof. Ms. Richardson Xavier BrantEditor

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A Ordem dos Advogados do Brasil é inte-grada por graduados em Direito que são aprova-dos em exame de suficiência denominado Examede Ordem. Uma vez aprovado, pode ser inscritocomo advogado e pode exercer a Advocacia.Mesmo após a aprovação no Exame da Ordem eregularmente inscrito, está o advogado está sujei-to a ter suspenso, por prazo fixo ou “até que cum-pra a punição”, o seu direito de advogar. Pode,também, ser excluído da condição de advogado.

Na composição da Diretoria da Ordem dosAdvogados do Brasil (OAB), tanto em nível fede-ral quanto em níveis estaduais (Secções) e muni-cipais ou regionais (Subsecções), a OAB somenteaplica qualquer punição aos seusintegrantes após processo admi-nistrativo com concessão, ao re-presentado, de direito à ampladefesa e ao contraditório. Aspunições são aplicadas pelo Tri-bunal de Ética, que é seccional(estadual), após os Conselhos deÉtica (subseccionais) preparemo procedimento administrativo.

A Advogada FernandaJoyce Ferreira Rabelo é com-ponente do Conselho de Ética daSubsecção de Montes Claros daOrdem dos Advogados do Brasil. Foi Presidenteda OAB-Mulher (ala da Diretoria da Subsecçãoque reúne as advogadas). É Graduada em Direito(2000) e advogada militante desde 2001, com atu-ação na área cível, especialmente nas áreas defamília e sucessões. Tem pós-graduação latosensu em Processo, com Ênfase em ProcessoCivil, e em Direito de Família.

Para a Fas@Jus, a e-Revista do Cursode Direito da Faculdade de Direito SantoAgostinho, a Advogada Fernanda Joyce FerreiraRabelo concedeu a seguinte entrevista, com foconas questões éticas e profissionais e, por acrésci-mo, falando um pouco sobre a atuação da mulher

ENTREVISTA

Entrevistada: Advogada Fernanda Joyce Ferreira Rabelo

na Advocacia e a necessidade de o profissional doDireito estar permanentemente estudando.

Fas@Jus: Para início, fale sobre a éticana profissão de advogado.

Advogada Fernanda Joyce: A palavraética tem sua origem em Ethos e, segundo o di-cionário Melhoramentos, é: “1. Parte da filo-sofia que os estuda os valores morais. 2. Con-junto de princípios morais que se devem ob-servar no exercício de uma profissão.”. Segun-do o Regimento Interno do Tribunal de Ética eDisciplina da OAB/MG, este Tribunal tem porobjetivo:

I - julgar processos disciplinares instruídospor órgãos competentes doConselho Seccional e dos Con-selhos Subseccionais;

II - conciliar e julgar re-presentação de advogado con-tra advogado, cabendo aoRelator designado pelo Presi-dente do Conselho Seccionalproceder à instrução do proces-so e oferecimento do parecerpreliminar, a ser submetido aoTribunal;

III - orientar e aconselharsobre ética profissional,

respondendo às consultas em tese, bem assimmediar e conciliar nas questões que envolvamdúvidas e pendências entre advogados, partilha dehonorários contratados em conjunto ou mediantesubstabelecimento ou decorrente de sucumbênciae controvérsias surgidas quando da dissolução desociedade de advogados;

IV - instaurar, de ofício, processos discipli-nares sobre consulta, ato ou matéria que conside-re passível de configurar, em tese, infração a prin-cípio ou norma de ética profissional;

V - promover a ética profissional de advoga-dos em todo o Estado de Minas Gerais, na formado Código de Ética e Disciplina.

A advocacia é,talvez, uma das

profissões mais antigasde que se tem

conhecimento, hajavista que todo o homemé dotado de direitos e

obrigações.

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Fas@Jus: Como é a sua função no Conselhode Ética da Subsecção?Advogada Fernanda Joyce: A Ordem dos Ad-vogados do Brasil, Seção de Minas Gerais,desenvolve sem tréguas o seu trabalho em de-fesa da classe que representa, mantendo a suapresença solidária e eficaz em prol do corretoexercício profissional. E, por isso, não se omi-te de seus deveres disciplinares com rigorosoefeito punitivo. Como membro do Conselho deÉtica da 11.ª Subseção da OAB/MG, sou res-ponsável por instruir e emitir pareceres em pro-cessos movidos contra colegas de profissão,que poderão ser punidos com pena de adver-tência, suspensão ou até mesmo exclusão.

Fas@Jus: Quando um cliente não se sentesatisfeito com a atuação profissional de umadvogado, em termos éticos, pode represen-tar contra tal advogado junto à Ordem dosAdvogados do Brasil?Advogada Fernanda Joyce: O Tribunal de Éti-ca pode agir de ofício ou mediante representa-ção, sendo que esta última não pode ser anôni-ma. Quando um cliente não se sente satisfeitocom a atuação de um advogado que contratou,pode representar contra este, no prazo de cincoanos – é prazo prescricional, significando que,uma vez ultrapassado, o interessado perde o di-reito da representação – e tal prazo é contado apartir do conhecimento do fato. O processo dis-ciplinar é sigiloso, sendo que seu acesso é ga-rantido às partes, seus representantes e autori-dade judiciária competente. Recebida a repre-sentação, o Presidente do Conselho Seccionalou Subsecção nomeia um Relator para presidira instrução processual e este pode determinaras diligências que entender necessárias, ou ain-da propor o arquivamento da representação,quando estiver desconstituída dos pressupostosde admissibilidade.

Fas@Jus: Qual a duração média de um pro-cesso disciplinar contra um advogado?Advogada Fernanda Joyce: Na Subseção deMontes Claros, o Dr. Antônio Luís Nunes Sal-gado, que atualmente é o Presidente do Con-selho de Ética e Disciplina da 11.ª Subseçãoda OAB/MG, apurou que, em 2014, o tempomédio de duração da tramitação local é de onzemeses. Após a emissão do Parecer, pelo Relator,

segue para o Tribunal de Ética, em Belo Hori-zonte, que decide pelo acolhimento ou não doParecer, sendo que nesta fase, o processo se-gue por mais três meses, totalizando assim umperíodo médio de um ano e dois meses paradecisão.

Fas@Jus: Quais as punições possíveis, im-postas pelo Tribunal de Ética, aos advogados?Advogada Fernanda Joyce: Segundo a Lei n.º8.906/94, que é o Estatuto da Ordem dos Ad-vogados do Brasil, as sanções disciplinaresconsistem em censura, suspensão, exclusão emulta. As condutas infratoras também estãoprevistas neste mesmo ordenamento jurídico, noartigo anterior ao que prevê as sanções. E es-tas serão aplicadas conforme a gravidade dainfração.

Fas@Jus: Como o advogado punido, apóscumprida a punição pela atitude imposta oupelo decurso de prazo, pode voltar a advo-gar?Advogada Fernanda Joyce: A condenação àexclusão encontra-se no rol das situaçõesensejadoras do cancelamento da inscrição. Éa punição mais gravosa imposta ao inscrito nosquadros da Ordem dos Advogados do Brasil.Tratando-se do cancelamento da inscrição pelapena de exclusão, observa-se que esta se dáem duas hipóteses, de acordo com o artigo 38da Lei n.º 8.906/94: nos casos de aplicação,por três vezes, da pena de suspensão ou noscasos elencados nos incisos XXVI a XXVIII, doartigo 34 desta mesma Lei. Com a exclusão,cancela-se a inscrição. O advogado poderávoltar a advogar, mas terá de se submeter aprovas de reabilitação, decorrido um ano documprimento da pena imposta. É facultado aointeressado proceder à instauração do devidoprocesso, competindo-lhe o ônus de provar asua aptidão à reabilitação. No caso de exclu-são pela prática de um crime, deverá, também,ser promovida a reabilitação criminal. E hápunições que, no próprio dispositivo, já con-templa um termo final, como aquelas em que asuspensão do direito de advogar vigorará “atéque sejam prestadas contas ao cliente”. Parapunições como esta do exemplo, uma vez com-provado junto à OAB que houve o cumprimen-to da pena, a inscrição é restabelecida. Impor-

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tante dizer que os atos eventualmente pratica-dos, durante o período de suspensão, não têmvalidade. Assim, um processo ou uma sua par-te – como um recurso – pode serdesconsiderado e com perda para o cliente,caso o advogado esteja suspenso e assine al-guma petição. Se a pena é de multa, o paga-mento da multa faz restaurar a situação deanormalidade. A censura é uma advertência,ou conselho ou conserva, acerca de procedi-mentos e, em tal caso, não importa em inter-rupção do exercício profissional.

Fas@Jus: Ainda dentro do tema, há outraspunições paralelas?Advogada Fernanda Joyce: Há outras puni-ções que não têm liame com a OAB. Por exem-plo, se um advogado está em débito para coma anuidade da OAB e, ainda assim assina al-guma petição iniciando processo perante o Tri-bunal de Justiça, o período de inadimplêncianão é considerado tempo de exercício da pro-fissão para efeitos de títulos. Há casos de pro-fissionais que, para pontuação como tempo deatuação como advogado, em concurso de pro-vas e títulos, juntam “prova” de que advoga-ram durante um determinado ano. Mas, por aentidade promotora do Concurso também exi-gir declaração da OAB de estar o concorrenteem dia com suas obrigações, acaba o órgãopromotor do Concurso eliminando do tempo deexercício da advocacia o período deinadimplência.

Fas@Jus: E como é a carreira do advogado?Advogada Fernanda Joyce: A advocacia é,talvez, uma das profissões mais antigas de quese tem conhecimento, haja vista que todo ohomem é dotado de direitos e obrigações. Emface das complexas relações interpessoais quea vida impõe a todos nós e do nível de civiliza-ção a que chegamos, tornou-se indispensávela atuação deste profissional. A ConstituiçãoFederal do Brasil de 1988 consagrou e elevoua profissão do advogado, ao assim dispor emseu art. 133: “O advogado é indispensável àadministração da justiça, sendo inviolável porseus atos e manifestações no exercício da pro-fissão, nos limites da lei.”. A principal ativida-de de um advogado é representar e defenderos interesses de seus clientes com base nas leis

vigentes do país. Ele pode representar pessoasfísicas e jurídicas. Além disso, o advogado queoptar por ter um escritório deverá gerir estaestrutura, captar clientes (de forma ética!) ebuscar se especializar.

Fas@Jus: E a advocacia, para a mulher, emparticular?Advogada Fernanda Joyce: A mulher temconquistado cada dia mais espaço na liderançade empresas e de instituições, no cenárionacional e mundial. Supera os obstáculos edificuldades encontradas na rotina profissional,e se dedica ao crescimento pessoal e profissional,na busca, ainda, da contribuição para com ofortalecimento da carreira dos advogados. Nãosomente na advocacia, mas no Direito como umtodo, a mulher está presente em todos os níveis,em todos os órgãos, em todos os setores.

Fas@Jus: Fale um pouco sobre sua trajetó-ria como advogada.Advogada Fernanda Joyce: Atuo comoadvogada desde quando me graduei e fuiaprovada no Exame da OAB. Desde a minhaformatura, procurei me especializar e escolhiatuar como advogada na área de Família eSucessões. Sempre procurei agir de forma ética,com meu cliente, com a parte contrária, com aJustiça e comigo mesmo. Por algumas vezes,recusei atender um possível cliente, por nãocompartilhar do mesmo entendimento destefrente a determinada situação, agindo, assim,de forma ética comigo mesmo e com meusprincípios.

Fas@Jus: Destaque pontos positivos enegativos da atuação como advogada.Advogada Fernanda Joyce: A profissão deadvogado é controvertida. Por vezes, oadvogado é confundido com o próprio cliente...Muitas vezes sua competência não éreconhecida, mesmo “dando seu melhor” poruma causa – o cliente achará que, afinal, eraum direito dele – e, não tendo êxito na causa, aculpa é “do advogado”. Quem optar por seradvogado deve ter habilidade de saber lidarcom esta situação e, independente do resultado,fazer o melhor. Vejo esta situação como umponto negativo. Além disso, trabalhando comoprofissional liberal, no início da carreira, via

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como ponto negativo o fato de restrição deférias e baixa remuneração. Com o tempo,consegui me organizar para ter um pouco maisde tempo livre e uma remuneração condizentecom o tempo dedicado a minha atividade. Comoponto positivo, destaco o fim máximo do Direito,que é a pacificação social. Atuando nasrelações familiares, superando o conturbadoperíodo de dissolução de um relacionamento,tento trazer um pouco de paz, intermediando acomunicação entre as partes e buscandopreservar os laços familiares. É gratificantequando executamos bem o serviço que nospropomos fazer.

Fas@Jus: E como escolheu a sua área de atu-ação? E qual a importância de se especializar?Advogada Fernanda Joyce: Durante a Facul-dade, fiz estágio em diversas áreas, penal, cívele trabalhista. Na área cível, me identifiqueimuito com o Direito de Família, e iniciei minhaatividade atuando como advogada na área deFamília. Acredito que é fundamental melhorarsempre, por isso, acredito na importância dese especializar. Em uma ciência tão complexacomo o Direito, para o qual há um número infi-nito de legislação, doutrinas divergentes,posicionamentos, jurisprudências majoritáriase minoritárias, atuar sem limitar uma área tra-rá, provavelmente, vários clientes ao escritó-rio, mas levará a uma queda na qualidade doatendimento e das petições elaboradas.

Fas@Jus: Especializar é...Advogada Fernanda Joyce: Estudar, estudar eestudar. Fazer pós-graduação no segmento emque atua... Estar sempre em dia com as novasleis, acompanhar o máximo possível sobre oDireito como um todo e, obrigatória e necessa-riamente, conhecer toda a doutrina sobre aespecialidade abraçada. Quando se opta porum ramo do Direito, deve-se debruçar, a todahora, sobre assuntos relacionados ao tema.

Nada na área deve ser despercebido. Tudo daárea deve ser do conhecimento.

Fas@Jus: Um recado final...Advogada Fernanda Joyce: Acredito que sejaimportante se especializar, optar por atuar,precipuamente, em um segmento do Direito. Istoporque é difícil, ou quase impossível, ser bomem tudo, ainda mais na área do Direito, com tan-tas mudanças na legislação e na interpretaçãodas leis por nossos Tribunais. É fundamentalescolher uma área de atuação e buscar bonscursos, seminários, livros, para se manter atua-lizado. É importante também conhecer as leis,defender o interesse do cliente e, quando ne-cessário, ir até mesmo contra o que dispõe a lei,para que se mude a interpretação desta! Alémdisso, acredito ser importante tratar com respeitoa todos os envolvidos na nossa atividade, prin-cipalmente nosso cliente, e estender esse trata-mento aos membros do Poder Judiciário, aosservidores das diversas instituições por aondepassamos, a parte contrária num processo, bemcomo o colega advogado que arepresenta. Lembrando sempre que, como expos-to no art. 6.º do Estatuto da Advocacia, “nãohá hierarquia nem subordinação entre advoga-dos, magistrados e membros do Ministério Pú-blico, devendo todos tratar-se com considera-ção e respeito recíprocos”. Por fim, recomendoque, se se aventurarem pelo caminho da Advo-cacia, conheçam a Ordem dos Advogados doBrasil. A OAB é muito mais do que uma sala deapoio nos Fóruns ou uma banca examinadorarigorosa do Exame da OAB. É uma entidade querepresenta uma classe de profissionais. Mas,além disso, atua na defesa do Estado Democrá-tico de Direito. É Formada por diversas comis-sões, atuando incessantemente nas defesas dasprerrogativas dos seus membros. Eu me orgulhode fazer parte da OAB, ocupando atualmente ocargo de Conselheira, no Conselho de Ética daSubseção de Montes Claros.

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ARTIGOS DOCORPO DOCENTE

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RESUMO

O presente trabalho tem por escopo destacar asimilitude do tratamento dispensado ao nascituro noBrasil e na Argentina a partir da adoção dos mesmosPrincípios Gerais do Direito. Para tanto, se acentuaa importância dos Princípios Gerais do Direito, bemcomo a controvérsia doutrinária acerca do tema,levando-se em conta as diversas teorias adotadaspara o entendimento e aplicabilidade do instituto aolongo do tempo. Destaca também a semelhançaprincipiológica dos países latino-americanos emvirtude da mesma base cultural e jurídica.

Palavras-chave: Princípios Gerais do Direito.Nascituro. Brasil. Argentina

ABSTRACT

The scope of this paper is to emphasize thesimilarity of the treatment given to the unborn childin Brazil and Argentina from the adoption of thesame general principles of law. Thus, it accentuatesthe importance of the general principles of law aswell as the doctrinal controversy about the topic,taking into account the various theories adoptedfor understanding and applicability of the instituteover time. It also emphasizes the similarity of legalprinciples of Latin American countries under thesame legal and cultural basis of the countries inthe region.

Keywords: General Principles of Law. Unbornchild. Brazil. Argentina

1 INTRODUÇÃO

Os Princípios Gerais do Direito, temacontrovertido entre os estudiosos, têm ganhado

PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO E A INFLUÊNCIA NO TRATAMENTO DADOAOS QUE ESTÃO POR NASCER NO BRASIL E ARGENTINA

Cyntia Mirella Cangussu Fernandes Sales1

destaque pela relevância prática que apresenta naatualidade, visto que, cada vez mais, têm sidoutilizados nas soluções dos conflitos sociais.

Dentre tantas divergências acerca do tema,não há como negar a sua importância naestruturação e delimitação do ordenamento jurídi-co.

A América Latina contém regramento pare-cido, ante a semelhança na descoberta e explora-ção dos países que a compõem, gerando, por con-seguinte, sociedades com culturas e hábitos simi-lares.

Similitude estendida aos Princípios Gerais doDireito. Um mesmo princípio pode, embora compalavras diferentes, ser encontrado em váriospaíses da América latina.

Nessa perspectiva, por compartilharem damesma base principiológica o Brasil e a Argenti-na, embora divergentes em alguns aspectos, temdispensado tratamento idêntico, na proteção e con-cessão de direitos, ao ser que ainda não nasceu.

O presente trabalho tem por objetivo demons-trar a semelhança de tratamento dado ao nasciturono Brasil e na Argentina, devido à adoção dosmesmos Princípios Gerais do Direito, herdados dasraízes do Direito Romano por eles compartilha-das.

2 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO –ASPECTOS GERAIS

Conceituar Princípios Gerais do Direito nãotem sido tarefa fácil, ao longo do tempo, para osestudiosos das Ciências Jurídicas. Segundo Amaral(2003, p. 93), “os princípios ocupam um posto in-termediário entre o valor e o conceito, aquele maisgenérico e abstrato, este já uma definição.”. En-tende que nos valores se encontra um maior graude generalidade, enquanto que os princípios en-cerram pensamentos jurídicos que indicarão a di-reção em que a regra será encontrada. Segundo oautor,

1 Advogada. Professora do Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho. Especialista em CiênciasPenais. Inscrita no Doutorado em Direito Civil pela Universidade de Buenos Aires.

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Os princípios jurídicos são pensamentosdiretores de uma regulamentação jurídica.São critérios para a ação e para a constitui-ção de normas e modelos jurídicos. Comodiretrizes gerais e básicas, fundamentam edão unidade a um sistema ou a uma insti-tuição. O direito como sistema, seria assimum conjunto ordenado segundo princípios(AMARAL, 2003, p. 92).

Nesse mesmo sentido, Reale (2003, p. 304)afirma que Princípios Gerais do Direito “sãoenunciações normativas de valor genérico, quecondicionam e orientam a compreensão doordenamento jurídico, quer para a sua aplicação eintegração, quer para a elaboração de novas nor-mas.”.

Os Princípios Gerais do Direito, na atualidade,desempenham no ordenamento, variadas funções.São considerados como a base estrutural doordenamento jurídico, verdadeiras fontes do Direito,constituem critérios orientadores para a criaçãodas normas jurídicas, como também exercem afunção de norma de integração para preenchimentode suas lacunas.

Entre os estudiosos do Direito, porém, pairasobre o tema grande controvérsia. Divergem acer-ca da origem, natureza jurídica e até mesmo quan-to a normatividade dos Princípios Gerais do Direi-to, dependendo da corrente de pensamento sob aqual se sustentam.

Reale (2003) destaca a controvérsia em re-lação à origem e ao fundamento dos PrincípiosGerais do Direito. Explica que das várias teoriasexistentes, concentra seus estudos em três delas.As duas primeiras, de cunho histórico-positivista,têm como variante apenas a extensão da aplica-ção desses Princípios. E a terceira, de cunho filo-sófico, sustenta-se no ideal de justiça.

Ensina o autor que a primeira teoria, à qualchama de “Princípio de Direito Pátrio”, trata dosprincípios que estão implícitos na legislação positi-va, da qual são extraídos mediante um processode indução e abstração. Nesse caso, só seriamválidos no sistema jurídico de cada nação. Consti-tuiriam, portanto, as razões estruturais doordenamento positivo de determinado país.

Segundo o doutrinador em assunto, essa cor-rente – ou tendência – é defendida por uma mino-ria. Pecam seus defensores ao perceberem todosos princípios de uma mesma maneira. Apregoa

Reale que alguns princípios podem ser frutos daformação histórica de um determinado país; ou-tros, entretanto, são de aplicação universal, e por-tanto, seria um equívoco perceber os PrincípiosGerais apenas sob a perspectiva regional.

A segunda teoria, apresentada por Reale(2003) é a chamada de “Princípios de Direito Com-parado”. Tem bom base esta teoria que os Princí-pios Gerais não se conformam dentro dos estrei-tos limites do nacionalismo. Acentua que algunsPrincípios Gerais do Direito estão presentes noDireito Positivo de vários países. E, mesmo apre-sentando distorções em sua aplicação, tratar-se-iade um mesmo princípio.

Para essa corrente, os Princípios Gerais doDireito ganham maior relevância e objetividade,justamente quando são confirmados pelo estudocomparativo da legislação de diversos países. Reale(2003) ilustra a afirmativa em destaque da seguin-te forma. Ante a existência de lacuna na legisla-ção de determinado povo, o intérprete deveria bus-car a solução encontrada por outra legislação quetenha com ela maior afinidade cultural e moral,porque os Princípios Gerais de Direito, segundo oque acreditam, seriam os Princípios de DireitoComparado aptos a solucionar o conflito social.

Por último Reale (2003) traz a lume a teoriado “Direito Natural”. Segundo ele, nessa perspec-tiva, os Princípios Gerais do Direito não existemtão somente em função das normas positivas, re-veladas historicamente num dado país ou em vári-as nações, mas como Princípios universais, supe-riores. Destaca (REALE, 2003, p. 310) que paraessa corrente, os Princípios Gerais “se legitimamcomo pressuposto de natureza lógica ou axiológica,isto é, como Princípios de Direito Natural.”.

Reale (2003) lembra que a ideia do DireitoNatural foi solidificada com os pensadores gregos(Sócrates, Platão e Aristóteles; o último, que aestruturou). Em Roma, a teoria ganhou destaquea partir de Cícero, que difundiu a lei natural. Di-vulgava que a Lei Natural não precisa ser promul-gada pelo legislador para ter validade. Ao contrá-rio, é ela que confere legitimidade ética aos pre-ceitos da lei positiva.

Pensamento no qual norteia a discussãotrazida por Díaz Couselo (1971)2. O autor emreferência destaca que o conceito/origem dosPrincípios Gerais de Direito varia conforme aposição adotada pelos juristas. Segundo o autor,

2 Material discutido em sala de aula. Enero, 2012.

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para os jusnaturalistas, corrente que defende, osPrincípios Gerais de Direito teriam sua origem nopróprio pensamento jurídico e “se referem a juízosde valor inerentes à natureza do homem.”.

Amaral (2003, p. 96), porém, destaca que,embora contraditórias as correntes, não sãoexcludentes, mas complementares, pois os Princí-pios Gerais do Direito “por sua amplitude abran-gem tanto os princípios superiores de justiça, comotambém os que informam o ordenamento jurídicodo País.”.

Alheios à posição de Amaral (2003),anteriormente destacada, os positivistas ejusnaturalistas discordavam também quanto ànormatividade dos Princípios Gerais do Direito.

Bonavides (1998) lembra que nojusnaturalismo, a normatividade dos Princípios erapraticamente inexistente. E havia um reconheci-mento forte da dimensão ético-valorativa da ideiade justiça. Informa (BONAVIDES, 1998, p. 234)que para os jusnaturalistas “o ideal de justiça im-pregna a essência dos Princípios Gerais do Direi-to.”. Por isso, devem apenas nortear o legisladorna criação das leis.

No positivismo, a visão quanto aos Princípiosera diversa. Bonavides (1998) demonstra que osPrincípios Gerais do Direito passam a integrar oscódigos como fonte normativa subsidiária. Paraessa corrente, os Princípios Gerais do Direito sãoextraídos da lei, e servem de fundamento para oDireito Positivo, pois expressam elementoscontidos no próprio ordenamento jurídico.

Informa o autor que com o pós-positivismo adiscussão quanto a normatividade dos Princípiosfoi aplacada e, a partir de então, restou assentadoentre os adeptos dessa corrente que a norma égênero, do qual Princípios e regras, são espécies.Cita em reforço a esse entendimento, os pensa-mentos de Esser, Alexy, Dworkin e Crisafulli, paraquem “os princípios são normas e as normas com-preendem igualmente os princípios e as regras.”(BONAVIDES, 1998, p. 243). Reforça que Esserreconhece que “o princípio atua normativamente,é parte jurídica e dogmática do sistema de nor-mas.”.

Para Bobbio (1999), os Princípios são normascomo todas as outras, pois cumprem a mesma fun-ção, qual seja, regular o caso concreto. E acrescen-ta, quando utilizados como fontes de integração, tam-bém atuam como norma, pois passam a regular umcomportamento social não regulado.

Bonavides (1998) destaca, sustentado nospós-positivistas, que os Princípios Gerais são nor-

mas que contêm eficácia. Ora escritas, ora nãoescritas. Ressalta que muitos desses Princípios sãoencontrados no ordenamento, positivados, comoacontece no plano constitucional ou mesmoelencados em códigos. Porém, a maioria dos Prin-cípios Gerais do Direito não consta de textos le-gais. E são tais Princípios detentores de forçanormativa tanto quanto os que estão escritos, poissão aplicados eficazmente na solução dos confli-tos sociais.

Rosenvald (2009) assevera que os PrincípiosGerais do Direito cumprem papel positivo enegativo no ordenamento jurídico. Atuam,positivamente, influindo na formulação de decisões;e, negativamente, quando impedem decisões quesejam contrárias aos seus postulados fundamentais.

Resta, pois, acentuada a importância dosPrincípios Gerais do Direito na configuração daordem jurídica. Seja qual for a corrente do pensa-mento a que se filie, ou a função que se lhes atri-bua, é indubitável o destaque dos Princípios noordenamento jurídico. Assim, não há como negara sua influência na construção, aplicação eestruturação do próprio ordenamento.

3 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO NAAMÉRICA LATINA

As semelhanças históricas na “descoberta”,exploração e independência, ditaram a similitudecultural e modo de ser dos países latino-america-nos. Identidade presente inclusive nosordenamentos jurídicos dos países que compõe aAmérica Latina.

Isso se deu, segundo Rabinovich-Berkman(2006), porque a incorporação do território ameri-cano pelos espanhóis, e também a efetivada noterritório brasileiro pelos portugueses, contou coma semelhança cultural, social e jurídica de ambosos países incorporadores.

Segundo o autor, a identidade jurídica entreesses países se dá também porque todos eles com-partem da mesma herança jurídica, descendemcomumente do mesmo tronco, o Direito Romano.

A conformidade dos ordenamentos da Amé-rica Latina se materializa na codificação. E issose dá, na perspectiva de Rabinovich-Berkman(2006), porque os Códigos dessas nações sofre-ram estreita e similar influência das codificaçõesfrancesa e alemã, notadamente, firmados em raízesromanas. E facultaram a difusão das mesmas ideiasentre os povos que compõem esse território daAmérica Latina.

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Identidade presente também nos PrincípiosGerais do Direito porque, para Reale (2003), ohomem fixado em uma mesma estrutura socialtende a agir ou reagir, diante de um mesmo fato,da mesma forma, o que conduz a soluçõesnormativas equivalentes.

Rabinovich-Berkman (2006) ressalta que osPrincípios Gerais do Direito podem decorrer tantodo ordenamento, formando parte dele, como tam-bém podem decorrer de uma tradição específica,pela aplicação pacífica e reiterada de suas nor-mas. Destaca que, ainda que não escritas, essasnormas seguem como princípios fora doordenamento, porém, são aplicadas porque estãona mente dos juristas e juízes, bem como de toda asociedade.

No que concerne às normas escritas, os Có-digos dos vários países que compõem a AméricaLatina muito bem traduzem essa realidade. Con-forme ressalta Rabinovich-Berkaman (2006), omesmo Princípio escrito em um ordenamento lati-no-americano será facilmente encontrado em ou-tro, mesmo que não escrito com as mesmas pala-vras. Mas, comumente, traduz a ideia do mesmoPrincípio Geral do Direito.

Com essa prática semelhante, os países lati-no-americanos compartem o mesmo ideal de Jus-tiça, visto que os Princípios Gerais são postuladosextraídos da cultura jurídica, que fundam o própriosistema da Ciência Jurídica.

Assim, como a América Latina teve a mes-ma base cultural e jurídica, é factível que, quantoaos Princípios Gerais do Direito, os tenham tam-bém na mesma medida, como preceitos fundamen-tais do ordenamento jurídico de cada um deles.

4 A SIMILITUDE DA PROTEÇÃODESTINADA À PESSOA QUE AINDANÃO NASCEU, NO BRASIL EARGENTINA

Os Princípios Gerais do Direito têm aplica-ção geral, quando repercutem em todos os ramosdo Direito, como o que acontece com aintangibilidade da pessoa humana. Nesse contex-to, a proteção jurídica à pessoa natural, em qual-quer que seja o ramo do Direito e nas mais varia-das ordens jurídicas, percebe-se a intangibilidadeda pessoa como princípio fundamental.

Proteção essa, destacada inclusive para aspessoas que estão por nascer. Os ordenamentosjurídicos latino-americanos têm traçado como prin-cípio a proteção integral ao nascituro, ainda que

alguns países não lhe tenham atribuído personali-dade.

Como salientado, de raízes romanas, ospaíses da América Latina absorveram seus uni-ficados ideais de Justiça. Destaca Rabinovich--Berkman (2011) que a proteção ao nasciturose dá pela difusão da ideia posta por Paulo, noDigesto, quando determinou que o amparo aoconcebido deveria ser integral naquilo que lhefosse benéfico.

Rabinovick-Berkaman (2006), em outra obra,lembra que já no Digesto havia normas protetivasdas mulheres gestantes e em alguns artigos dessedispositivo chegam a tratar o ser ainda não nasci-do como se nascido fosse.

Embora seja presente e frequente o dissensoentre os países componentes da América do Sulquanto ao momento da aquisição da personalida-de, todos são uníssonos no entendimento de que oser em desenvolvimento intrauterino merece a pro-teção do Direito.

No Brasil, o artigo 2.° do Código Civil vigen-te determina que “A personalidade civil da pessoacomeça a partir do nascimento com vida; mas alei põe a salvo, desde a concepção, os direitos donascituro.”.

Apesar da contradição – conceder direitos aquem não é considerado como sujeito de direitos –apresentada pelo dispositivo em referência, o Brasilbusca, com isso, preservar a integridade do con-cebido.

Adota a teoria natalista, a qual considera onascimento como o marco aquisitivo da personali-dade. Mas, embora o nascituro não seja pessoapara o ordenamento brasileiro, é considerado comotitular de direitos, digno de proteção.

A doutrina e a jurisprudência têm amenizadoessa contradição sob o entendimento de que, ape-sar de não se tratar de uma pessoa, deve oordenamento primar pelos direitos que garantamum nascimento viável e que, portanto, garantam aaquisição da personalidade.

Por causa disso, o Brasil pune o aborto (arts.124 ao 128 do Código Penal, instituído pelo De-creto Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940), e qual-quer tipo de tentativa de ceifar a vida no ventrematerno, pune dessa forma condutas capazes deinviabilizar o nascimento do concebido.

Além dessa proteção, vários outros direitossão garantidos ao ser que ainda não nasceu. Em 5de novembro de 2008, foi editada a Lei 11.804,denominada Lei dos Alimentos Gravídicos, com oobjetivo de garantir à gestante meios de obter aju-

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da do suposto pai na manutenção de uma gravidezsaudável.

A proteção ao nascituro está disseminada emtodo ordenamento brasileiro. O Estatuto da Crian-ça e Adolescente, Lei 8.069, de 13 de julho de 1990,difundiu a ideia da proteção integral ao ser emdesenvolvimento inclusive em desenvolvimentogestacional. Para tanto dispôs expressamente essaproteção em vários artigos, tais como a que é en-contrada em seu art. 7.° que determina: “[...] têmdireito à proteção, à vida e à saúde, mediante aefetivação de políticas sociais públicas que permi-tem o nascimento e o desenvolvimento sadio eharmonioso, em condições dignas de existência.”.Além disso, apregoam o art. 8.° e seus respecti-vos parágrafos:

Art. 8.° É assegurado à gestante, atravésdo Sistema Único de Saúde, o atendimen-to, pré e perinatal.§ 1.º A gestante será encaminhada aos di-ferentes níveis de atendimento, segundocritérios médicos específicos, obedecendo--se aos princípios de regionalização ehierarquização do Sistema.§ 2.º A parturiente será atendida preferen-cialmente pelo mesmo médico que a acom-panhou na fase pré-natal.§ 3.º Incumbe ao Poder Público propiciarapoio alimentar à gestante e à nutriz quedele necessitem.

Sintetizando a proteção conferida ao nasciturodesde a concepção, Stolze e Pamplona (2011, p.129 a 130), trazem um quadro esquemático quebem ilustra o tema:

a) o nascituro é titular de direitospersonalíssimos (como o direito à vida, odireito à proteção pré-natal, etc.);b) pode receber doação, sem prejuízo dorecolhimento do imposto de transmissãointer vivos;c) pode ser beneficiado por legado e heran-ça;d) pode ser-lhe nomeado curador para adefesa dos seus interesses (arts. 877 e 878do CPC);e) o Código Penal tipifica o crime de abor-to;f) como decorrência da proteção conferidapelos direitos da personalidade, o nasciturotem direito à realização do exame DNA, paraefeito de aferição da paternidade.

Stolze e Pamplona (2011) ressaltam que, alémdos que linhas atrás foram elencados, outros direi-

tos têm sido concedidos ao nascituro pela jurispru-dência brasileira, como as decisões proferidas peloSuperior Tribunal de Justiça (STJ). Em 2002, oTribunal em destaque beneficiou o nascituro comindenização por danos morais sofridos em decor-rência do atropelamento e morte de seu pai.

Recentemente, também o Tribunal Regionaldo Trabalho (TRT) da 24.ª Região determinou orestabelecimento do vínculo trabalhista da mãe ges-tante como garantia do bem-estar do nascituro, con-forme Processo n.° 0046500-15.2009.5.24.0003, queteve como Relator o Desembargador AmauryRodrigues Pinto Júnior (voto vencido) e, como Re-visor, o Desembargador André Luís Moraes de Oli-veira.

Com essas medidas, o ordenamento brasilei-ro só não diz expressamente que o nascituro épessoa, mas todo ele se coaduna com essa ideia,conferindo cada vez mais direitos ao ser que seencontra no ventre materno.

Na Argentina, adota-se a teoriaconcepcionista. Sustentado na ideia do jurista bra-sileiro Teixeira de Freitas, o Código Civil Argenti-no, Lei 340, de 1.° de janeiro de 1871, apregoa noseu artigo 70 que “Desde La concepcion em elseno materno comienza la existência de laspersonas; y antes de su nacimiento pueden adqui-rir algunos derechos, como si ya hubiensen nacido[...].”.

Segundo Ghersi (2011), ao afirmar que a exis-tência da pessoa se dá ainda no ventre materno, aLei Civil acentua que é a concepção a esfera deimputação na qual se reconhece direitos a esseser que ainda não nasceu.

Ao contrário do brasileiro, o sistema argenti-no é coerente com o reconhecimento da persona-lidade na concepção do ser humano, para que possaatribuir direitos e dispensar a proteção necessáriaao nascituro, visto que destaca no artigo 30, doCódigo Civil vigente naquele país vizinho, que “Sonpersonas todos los entes susceptibles de adquirirderechos, o contraer obligaciones.”.

Nesse contexto, o Código Penal de La NacionArgentina, nos artigos 85 a 88 pune o aborto tantoquanto o brasileiro, e permite a sua efetivação so-mente em algumas situações excepcionais neledefinidas.

O Código Civil da República Argentina trata,sob os Título III e IV, respectivamente, das pesso-as por nascer e a existência das pessoas humanasantes do nascimento. Sob esses signos, o legisla-dor argentino traça o momento da aquisição dapersonalidade, define quem é considerado como

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nascituro e traz expresso no artigo 64 o direito derepresentação do nascituro indicando a sua possi-bilidade de adquirir bens por doação ou por heran-ça, bem como as regras para que essa represen-tação se configure e tenha termo.

Segundo Ghersi (2011, p. 113), com a difu-são dos Direitos Humanos se tem percebido umaampliação na proteção ao nascituro. Questõesantes ignoradas têm sido atualmente consideradas.Destaca, “Consolidando um derecho pre-nacimiento frente a situaciones tales como eltrabajo como médio de agresion al concebido o elderecho de alimentos durante el embarazo, etc.”.

Apesar de manterem distintos o momento daaquisição da personalidade, percebe-se idênticosistema de proteção aos que estão por nascer, noBrasil e na Argentina, fato atribuído à considera-ção de um mesmo princípio geral de proteção àvida humana.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os Princípios Gerais do Direito, há muito,despertam a atenção dos estudiosos. E, por suaimportância, cada vez maior nos ordenamentosjurídicos vêm assumindo posição de destaque.

Como base de sustentação e estruturação doordenamento jurídico, os Princípios Gerais delimi-tam o seu senso de Justiça.

A América Latina possui uma base socialcomum, por isso aplica e difunde os mesmos Prin-cípios Gerais nos países que a integram.

Traço perceptível no tratamento dado ao serque ainda não nasceu. O Brasil e Argentina, em-bora adotando teorias distintas no que concerneao momento da aquisição da personalidade, dis-pensam ao nascituro regras de proteção idênticas,por compartilharem da mesma base principiológica,fruto da herança greco-romana também compar-tida por esses países.

Acentua-se pois, com esses elementos, aidentidade perpetuada pelos Princípios Gerais doDireito nos países detentores da mesma base so-cial e cultural ou que descendam de uma mesmaraiz jurídica, pois se utilizam dos Princípios Geraisdo Direito para a solidificação de ordens jurídicassemelhantes.

REFERÊNCIAS

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ARGENTINA. Ministerio de Economía yFinanzas Públicas. Centro de Documentación eInformación. Información legislativa. Disponívelem: <http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/1500019999/16546/texact.htm#15>.Acesso em: 7 mar. 2015.

BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico:lições de filosofia do direito. Tradução de MárcioPugliesi, Edson Bini e Carlos E. Rodrigues. SãoPaulo: Ícone, 2006.

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Quando se pensa a estrutura normativo-jurí-dica proposta pela clássica corrente de pensamentokelseniana, tem-se que analisar a necessidade daépoca em que foi desenvolvido o pensamento deuma Teoria Pura do Direito, de sorte que, à época,a afirmação do Direito, enquanto ciência, deveriapossuir critérios marcadamente definidos por umalinguagem epistêmica e, por conseguinte, lógica.Deve-se ressaltar que o pensamento desenvolvidopor Hans Kelsen se apresenta dentro de toda aescola normativista, surgida dentro da tradiçãojuspositivista.

O normativismo é uma escola do pensamen-to jurídico de matriz juspositivista surgidano início do século XX. Por serjuspositivista, o normativismo jurídico aceitaos seus dois principais postulados, quaissejam: a) limitação do objeto de estudo aodireito posto, ou seja, efetivamente existen-te na realidade social, o que traz comoconsequência a negação da existência dequalquer ordem jurídica metafísica, tal comoa do direito natural; b) assunção de umapostura epistemológica orientada rumo àvaloratividade e à construção de um dis-curso científico rigoroso, no que se perce-be a influência do Círculo de Viena deCarnap, Neurath e Schlick (MATOS, 2011,p. 45).

Convém, como complemento da fala sobre atradição juspositivista, transcrever a seguinte evalorosa doutrina:

Assim como a lei natural é uma afirmaçãoou enunciado descritivo da natureza, e nãoo objeto a descrever, assim também a leijurídica é um enunciado ou afirmação des-critiva do Direito, a saber, da proposiçãojurídica formulada pela ciência do Direito, enão o objeto a descrever, isto é o Direito, anorma jurídica. Esta – se bem que, quandotem caráter geral, seja designada como “lei”– não é uma lei, não é algo que, por qual-quer espécie de analogia com a lei natural,

O PENSAMENTO EGOLÓGICO NA TEORIA DE CARLOS CÓSSIO: aexperiência jurídica para além do fixionismo normativo estrutural

Rafael Soares Duarte de Moura1

possa ser designado como “lei”. Ela não é,com efeito, um enunciado pelo qual se des-creva uma ligação de fatos, uma conexãofuncional. Não é, sequer, um enunciado, maso sentido de um ato com o qual se prescre-ve algo e, assim, se cria a ligação entre fa-tos, a conexão funcional que é descrita pelaproposição jurídica, como lei jurídica(KELSEN, 2003, p. 90).

Tem-se que “la teoría del Derecho seencamina en busca de un nivel de mayor certezaal subordinar las valoraciones contenidas en lasnormas de Derecho positivo a un aparato lógico-formal.” (CATALINI, 1991-1992, p. 50).

Kelsen, nesse sentido, realiza uma crítica àciência jurídica, consubstanciada por reflexõesdesenvolvidas que atentam-se para “las formaspropias del pensamiento de los juristas, de suerteque sus indagaciones no tienen un carácterempírico, sino lógico y metodológico” (CATALINI,1991-1992, p. 51). Exatamente nessa busca poruma identificação própria da ciência jurídica, umencontro identitário, enquanto ciência positiva, con-duz o pensamento kelseniano ao expurgo de tudoo que possa ser considerado como externo à ciên-cia jurídica. Em suas palavras, tem-se que:

Al calificarse como Teoría Pura, indica queentiende constituir una ciencia que tengapor único objeto el Derecho e ignore todolo que no corresponda estrictamente a sudefinición. El principio fundamental de sumétodo es pues eliminar de la Ciencia delDerecho todos los elementos que le sonextraños (KELSEN, 1963).

Como interpretação de Kelsen, busca-sepelas palavras de Matos (2011, p. 46), para quem“Na Teoria Pura do Direito Kelsen se preocupacom a forma do direito, acolhendo a lição deAristóteles, para quem só é possível fazer ciênciado universal, eis que o particular escapa à capaci-dade generalizante e sintetizante própria do enten-dimento humano.”.

1 Doutorando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), Mestre em Direito pela Universidade Federal de MinasGerais, onde também se graduou. Professor de Direito Constitucional. Coordenador do Curso de Direito da Facul-dade de Direito Santo Agostinho.

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Percebe-se que, em sendo o objeto da ciên-cia jurídica, o Direito, deve-se buscar uma “pure-za”, enquanto necessária para que sua “identida-de” seja encontrada, verificada e preservada. Nãoé sem menos que Kelsen denuncia o fato de que

la Ciencia del Derecho se ha ocupado de laPsicología y la Biología, de la Moral y laTeología. Puede decirse que hoy no haydominio científico en el cual el jurista no seconsidere autorizado a penetrar, más aún,estima que su prestigio científico sejerarquiza al tomar conocimiento de otrasdisciplinas. El resultado no puede ser otroque la ruina de la verdadera ciencia jurídica(KELSEN, 1963, p. 50).

Em outra obra, Kelsen (2003, p. 37) lecionaque

Como ordem coativa, o Direito distingue--se de outras ordens sociais. O momentocoação, isto é, a circunstância de que o atoestatuído pela ordem como consequênciade uma situação de fato consideradasocialmente prejudicial deve ser executadomesmo contra a vontade da pessoa atingidae – em caso de resistência – mediante oemprego da força física, é o critério decisivo.

Em meio à construção e uma ciência jurídicaestruturalmente calcada em fundamentos próprios,Kelsen apresenta dois expurgos necessários. Oprimeiro se dá em relação “la primera, purifica alDerecho de su relación estricta con las demásciencias llamadas ‘causativas’: la Sociología y laPsicología.” (CATALINI, 1991-1992, p. 50),consideradas como áreas epistemológicas externasao Direito, em quanto objeto da ciência jurídica. Osegundo expurgo “elimina del Derecho el aspectoético valorativo del ideal de justicia. Este ultimoconsiderado como emocional y extracientífico esdesterrado a la Política, Etica y Filosofía de laJusticia como la denomina a la Filosofía Jurídica.”(CATALINI, 1991-1992, p. 50). Observe-se que

essas duas eliminações, uma epistêmica e outraético-valorativa pavimentam a construção de umacompreensão diferenciada do Direito e do seuestudo.

Assim, analisar da maneira mais fiel possí-vel determinado objeto de estudo não é,como querem os pós-modernos, heresia outolice. Trata-se apenas de uma posturagnoseológica que prefere – e nessa prefe-rência está a semente da ideologiajuspositivista – descrever a realidade me-diante juízos de fato, rechaçando as propo-sições pseudocientíficas assentadas sobrejuízos de valor (MATOS, 2011, p. 43).

No campo das definições e conceituações,mostra-se que,

A Ciência Jurídica, porém apenas pode des-crever o Direito; ela não pode, como o Di-reito produzido pela autoridade jurídica(através de normas gerais ou individuais),prescrever seja o que for. Nenhum juristapode negar a distinção essencial que existeentre uma lei publicada no jornal oficial eum comentário jurídico a essa lei, entre oCódigo Penal e um tratado de Direito Penal(KELSEN, 2003, p. 82).

Percebe-se com isso que a ciência jurídica,enquanto normativa, não se restringe a mera pres-crição de normas, mas, não se deve obliterar doiselementos de calibre, quais sejam: a observaçãonormativa por um olhar objetivo, técnico e “impar-cial”2, bem como a análise do conteúdo normativo3,enquanto fruto das demandas e necessidades so-ciais que categorizam a licitude ou não dos com-portamentos e atos em sociedade sistematizadosem uma cadeira validativa em cujo centrogravitacional se acha a norma fundamental.

Proposições jurídicas são juízos hipotéti-cos que enunciam ou traduzem que, de con-formidade com o sentido de uma ordem ju-rídica nacional ou internacional dada ao

2 O papel da ciência jurídica, segundo Kelsen, seria análogo ao da ciência natural: proceder à descrição de seu objetoatravés da formulação de leis. Por isso, Kelsen admite que a proposição jurídica seja também denominada “lei”jurídica, à semelhança da expressão “lei” natural e, nessa analogia não importa a diferença do objeto da ciênciajurídica e o da ciência natural. Enquanto ciências, ambas se destinam a descrever o objeto de que se ocupam e tantoa lei natural como a lei jurídica são instrumentos para a descrição de uma conexão funcional (AFONSO,1984, p. 224).

3 Kelsen insiste na diferença existente entre as normas jurídicas, objetos formais da ciência do direito, e as propo-siçõesjurídicas (Rechtssätze) que as descrevem. As primeiras, são criadas pelas fontes produtoras de Direito, tais como olegislador e o juiz; as segundas, constituem o resultado teórico do estudo das normas jurídicas, cabendo a sua criaçãounicamente ao cientista do Direito. Este não estatui normas jurídicas, apenas as descreve mediante pro-cedimentoscientíficos e tendo em vista a categoria básica que lhes confere realidade, qual seja, a validade (MATOS, 2011, p. 48).

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conhecimento jurídico, sob certas condi-ções ou pressupostos fixados por esseordenamento, devem intervir certas conse-qüências pelo mesmo ordenamento deter-minadas. As normas jurídicas, por seu lado,não são juízos, isto é, enunciados sobreum objeto dado ao conhecimento. Elas sãoantes, de acordo com o seu sentido, man-damentos e, como tais, comandos, impera-tivos. Mas não são apenas comandos, poistambém são permissões e atribuições depoder ou competência. Em todo o caso, nãosão, como, por vezes, identificando Direitocomo Ciência Jurídica, se afirma – instru-ções (ensinamentos). O Direito prescreve,permite, confere poder ou competência –não “ensina nada.” (KELSEN, 2003, p. 80-81).

Quanto à cadeira validativa, tratada no pará-grafo anterior, cabe a ilustração com as seguintesletras:

Dado que o fundamento de validade de umanorma somente pode ser uma outra norma,esse pressuposto tem de ser uma norma:não uma norma posta por uma autoridadejurídica, mas uma norma pressuposta, querdizer, uma norma que é pressuposta sem-pre que o sentido subjetivo dos fatos gera-dores de normas postas de conformidadecom a Constituição é interpretado como oseu sentido objetivo. Como essa norma é anorma fundamental de uma ordem jurídica,isto é, de uma ordem que estatui atos coer-civos, a proposição que descreve tal nor-ma, a proposição fundamental da ordemjurídica estadual em questão, diz: devem serpostos atos de coerção sob os pressupos-tos e pela forma que estatuem a primeiraConstituição histórica e as normasestabelecidas em conformidade com ela(KELSEN, 2003, p. 224). O centrogravitacional do projeto universalista deKelsen radica-se no conceito de norma ju-rídica, dever-ser objetivo mediante o qualcaracterizamos o Direito enquanto uma or-dem sancionatória diversa das demais –v.g., moralidade social, religiões – graças àpossibilidade de reconduzir todos os ele-mentos do sistema a uma instânciaunificadora chamada de norma fundamen-tal (Grundnorm) (MATOS, 2011, p. 46).

Verificar, portanto, mediante critérios lógico--objetivos o processo, produção e aplicaçãonormativa, observando-se a complexidade de um

sistema e a coerência que se deva guardar, comorequisito de validade e funcionalidade da partenormativa com o sistema jurídico como um todo,apresenta-se como ponto nevrálgico do pensamen-to kelseniano, base elementar para toda a produ-ção teórica de Carlos Cóssio.

En sentido kelseniano, la Jurisprudenciadebe ser una ciencia normativa no porqueda o prescribe normas, sino porque lasdescribe neutralmente, las estudia, las con-sidera su objeto científico. Su objeto esúnicamente la norma ya sea desde una pers-pectiva estática, esto es, analizando larelación de las normas en un sistemacoherente, ya desde un punto de vistadinámico, en su producción y aplicación(CATALINI, 1991-1992, p. 51-52).

Não pode passar desapercebido que o pen-samento cossiniano deita raízes, igualmente, nateoria egológica de Husserl que se passa a expor,em apertada síntese, para que se possa melhorcompreender o pensamento de Carlos Cóssio.

Não é sem relevância a construção teóricahusserliana de uma fenomenologia que se preten-da ao desenvolvimento do pensar que vise a con-ferir ao pensado, ao reduzido pelo seu métodofenomenológico, uma universalidade valorativa,uma certeza que em muito se afastaria da ciênciaempírica4. “Husserl irá conferir às ciências dasessências – ciências eidéticas – uma dignidadeontológica. Sobre o tema, há a seguinte doutrina:

Convencido da excelência da tradição inte-lectual do ocidente e da dignidade supre-ma do espírito científico, Husserl inquieta-se com as bases inconstantes em que seassenta o edifício do saber. [...] a lógica, aciência das ciências, onde cedo perceberáLeibniz o germe de uma mathesisuniversalis, permanecerá a grande preocu-pação da sua vida. A fenomenologiatranscendental será uma mathesisuniversalis pensada até o fim. Daí, essaconcepção do trabalho filosófico expostono famoso artigo sobre a filosofia enquan-to ciência do rigor e que mereceu tanta no-toriedade (LÉVINAS, 1997, p. 12).

A própria fenomenologia enquanto análise daconsciência constituinte será, segundo Husserl,uma ontologia e uma ciência eidética.” (LÉVINAS,1997, p. 28).

4 Para reflexão aprofundada e diálogo crítico sobre a temática, Cf. HUSSERL, 1989.

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A filosofia, porém, é por essência uma ciên-cia dos inícios verdadeiros, das origens,dos rizómata pánton. A ciência do radicaltem que proceder também radicalmente, esob todos os respeitos. Sobretudo ela nãodeve descansar antes de ter chegado aosseus inícios, isto é, aos seus problemasabsolutamente claros, aos métodos deline-ados no próprio sentido desses problemas,e ao campo ínfimo da elaboração das coi-sas de apresentação absolutamente clara(HUSSERL, 1965, p. 72).

Essa ciência, baseada apenas em postuladosteóricos desenvolvidos na exterioridade do huma-no, e, portanto, imbuídos de uma limitação racionalclara, não alcançaria a verdadeira visão de mundoque seria proporcionada pela reduçãofenomenológica.

A fenomenologia teria, então, por meta re-montar a consciência reduzida, questionare tornar a questionar a suposta suficiênciado mundo dado na evidência ingênua dohomem-no-mundo ou do ser dado comomundo, depois de ter descoberto que, naintuição dirigida sobre o mundo, ou em umaconsciência integrada ao mundo em formade consciência psicológica, o pensamentonunca é suprido pela presença daquilo queele visa, mas se abre por um processo depreenchimento infinito (LÉVINAS, 2008, p.40).

É exatamente este anseio por dotar o pensarfilosófico de parâmetros científicos que garantis-sem um rigor ao pensar, que não se afasta em ab-soluto da forma e da maneira pelas quais às ciên-cias da natureza concepcionavam o processo devalidação da ideia, do pensar e da produção deconhecimento que Husserl procura

desancorar a lógica das ciências historica-mente dadas ou possíveis, para radicá-lana intencionalidade da consciência, numtrabalho da superação da lógica formal emdireção à lógica transcendental. Com isto,Husserl pretende que a lógica seja essenci-almente filosófica tanto quanto o foi paraPlatão. À lógica transcendental de Husserlconfia, pois, a tarefa de garantir a rigorosacientificidade específica da Filosofia e afundação das ciências particulares, não emsua mera ordenação formal (SOUZA; OLI-VEIRA, 2001, p. 111-112).

Se para Husserl “Descartes inaugura umnovo tipo de filosofia. Com ele, a filosofia mudatotalmente de estilo e passa radicalmente doobjetivismo ingênuo ao subjetivismotranscendental.” (HUSSERL, 1990, p. 46), reco-nhece o mestre de Lévinas que muito aFenomenologia deve a este pensador que assen-tou as primeiras pedras que deram suporte funda-mental para o desenvolvimento de uma ontologiapautada pelo rigor da ciência. Dessa forma,

os novos impulsos que a fenomenologiarecebeu devem-se a René Descartes, omaior pensador da França. É pelo estudodas suas Meditações que a nascentefenomenologia transformou-se em um novotipo de filosofia transcendental. Pode-sequase denominá-la um neocartesianismo,ainda que ela se tenha visto forçada arejeitar quase todo o conteúdo doutrinárioconhecido do cartesianismo, pelo própriofato de ter conferido a certos termoscartesianos um desenvolvimento radical(HUSSERL, 1990, p. 43).

Ocorre que Husserl critica a natureza dividi-da do ego proposta pelo pensamento descartiano.“Descartes [...] faz do ego uma substantiacogitans separada, um mens sive animus huma-no, ponto de partida de raciocínios de causalidade.É essa confusão que fez de Descartes, o pai docontrassenso filosófico, que é o realismotranscendental.” (HUSSERL, 1990, p. 58). Dessaforma, “Husserl aborda o problema da certeza e ofundamento do saber de forma estranha a Des-cartes. Para ele, trata-se menos de assegurar acerteza das proposições do que de determinar osentido que a certeza e a verdade podem ter paracada domínio do ser.” (LÉVINAS, 1997, p. 12).Proposta estaria a tarefa de “explorar o campoinfinito da experiência transcendental.”(HUSSERL, 1990, p. 69).

Essa cientificidade surge como necessidademesma diante do desejo de se enriquecer odesenvolvimento do pensamento filosófico com oscritérios seguros que sustentam a produção dasciências5. Tudo isso em uma perspectiva que buscase afastar de certo abstracionismo advindo do quefoi chamado por Husserl de ilusão transcendental,ao mesmo tempo em que se procura oestabelecimento de uma via nova em relação amesma ciência, via essa que se afasta de

5 Para maior aprofundamento, Cf. MARCONI, D. Filosofia e scienza cognitive. Roma-Bari: Laterza, 2001.

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conceituações científicas que suplantaram arealidade observada e alcançaram a abstraçãoteorética que prescinde do homem comoobservador e criador. Dessa forma, a propositurado método fenomenológico “não leva apenas a umaterminologia mais fixa e mais precisa. Ela introduz--nos numa nova dimensão de inteligibilidade.”(LÉVINAS, 1997, p. 23).

Husserl tece profundas críticas a forma comque “na base das ciências exactas humanas oufísico-matemáticas” se apresenta “um mundo dadoque se presta assim ao seqüestro e a manipula-ção.” (LÉVINAS, 1984, p. 16). Assim, o conheci-mento científico é, igualmente, alvo de um profun-do refletir, um refletir a própria reflexão científica.Chega-se, portanto o momento em que

haja necessidade de uma filosofia distintado “bom senso” e da pesquisa científica –eis em que consiste a novidade docriticismo. O kantismo, no qual se concor-da ver o “começo do fim” da filosofia, terásido o momento decisivo desse apelo a umafilosofia diferente da ciência. Momento ca-racterizado pela denúncia da ilusãotranscendental – da malícia radical na boa--fé ou numa razão inocente de todo o sofis-ma e que, paradoxalmente, Husserl chamouingenuidade. [...] o fato de que a razão pos-sa ser ingênua e ainda insuficiente desper-ta, que ela deva desconfiar de sua seguran-ça (LÉVINAS, 2008, p. 34).

Husserl sustenta que o conhecimento da vida,a aferição dele por meio do pensar, se daria pormeio de um mundo já existente; “o saber apóia-seem coisas dadas num mundo dado, a que chamarámundo da vida, a famosa Lebenswelt.”(LÉVINAS, 1984, p. 16). Fato que comporta oseguinte ensinamento:

O que Husserl entende por Lebenswelt? Éo mundo histórico-cultural concreto,sedimentado intersubjetivamente em usose costumes, saberes e valores, entre osquais se encontra a imagem do mundo ela-borada pelas ciências. Para Husserl, o mun-do da vida é um a priori dado como subjeti-vidade transcendental. O erro doobjetivismo foi esquecê-lo (SOUZA; OLI-VEIRA, 2001, p. 511).

Esse conhecimento em discussão se dá pormeio da intuição, meio pelo qual se viabiliza o co-nhecimento fenomenológico.

Mas, é precisamente próprio da filosofia,

desde que remonte às suas origens extremas,o seu trabalho científico situar-se em esferasde intuição direta, e constitui o maior passoa dar pela nossa época, reconhecer-se que aintuição filosófica no sentido autêntico, apercepção fenomenológica do Ser, abre umcampo imenso de trabalho e leva a umaciência que, sem todos os métodosindiretamente simbolizantes e matemati-zantes, sem o aparelho das conclusões eprovas, não deixa de chegar a amplasintelecções das mais rigorosas e decisivaspara toda a filosofia ulterior (HUSSERL, 1965,p. 73).

Neste mundo da vida se daria todo o processode descoberta e significação. Seria ele umarealidade dada, pré-existente ao observador.

O investigador da natureza não se dá contade que o fundamento permanente de seutrabalho mental, subjetivo, é o mundocircundante vital, que constantemente épressuposto como base, como terreno daatividade, sobre o qual suas perguntas eseus métodos de pensar adquirem um sen-tido (HUSSERL, 2002, p. 90).

Percebe-se que, apesar dessa realidadepreexistente, não há um determinismo na produ-ção do conhecimento. Esta noção de fixidez nãoexiste para Husserl, pois o pensamento não é con-dicionado pela imersão do homem no horizonte his-tórico, que se apresenta como um espaço tempo-ral do futuro, ou seja, “é aberto ao infinito, ele évazio, indeterminado e apela ao preenchimento. Ohorizonte do passado já está preenchido e posto àvista do presente. E é o presente que Husserl cha-ma de horizonte de historicidade.” (SOUZA; OLI-VEIRA, 2001, p. 13-14). Este, apesar de ser fatorinfluenciador das cogitações, possibilita rupturascom a realidade dada por meio do pensar.

O sujeito e o homem encontram-seenglobados pelo mundo histórico-cultural:o mundo da vida. Esse atua como fatormediador do que se dá do objeto naconsciência. O Lebenswelt não é uma somade objetos, mas o mundo do subjetivo doqual emerge toda a atividade humana. Ohomem exerce sua função de criar fatosculturais no mundo da vida. Entre essesfatos, está o mundo objetivo da ciência edos instrumentos técnicos. Também essessão produtos históricos com finalidade eprocedimentos que mudam. A categoria de“horizontes” supõe que cada experiência,cada dado ou cada palavra se encontra num

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nexo global de sentido proveniente daintencionalidade subjetiva. Os dados e asexperiências singulares compartilham ser esentido com a totalidade na qual se inserem.O horizonte, entretanto, constitui umatotalidade aberta e viva (SOUZA;OLIVEIRA, 2001, p. 513).

É nesta esteira do rigorismo científico, quepermeia todo o pensamento husserliano, que a vi-são pautada pela transcendência é deixada de lado,pois a construção da consciência se verifica pormeio da redução da qual provém a ideia formadado próprio objeto resultante desta por meio da evi-dência6 dada na epoché7 – . “Pode-se dizerassim que é o método universal e radicalpelo qual me percebo como eu puro, com a vidade consciência pura que me é própria, vida na quale pela qual todo mundo objetivo existe para mimexatamente da forma como existe para mim.”(HUSSERL, 1990a, p. 38). Neste sentido:

Así, la evidencia es un modo universal de laintencionalidad referido a la vida de concienciaen su conjunto; gracias a Ella la concienciatiene una estructura teleológica universal, unainclinación a la “razón” y aun una tendenciacontinua hacia ella; tiende, en efecto, acomprobar la corrección y a suprimir lasincorrecciones (HUSSERL, 1962, p. 169).

Deve-se compreender que a subjetividade,aqui, é diferente do que predica Lévinas, pois, aconsciência subjetiva se pauta pela compreensãoegolátrica dos fenômenos reduzidos. Isto é, o Eu,por meio da sua própria percepção, é que se colo-ca como autor, senhor próprio da produçãoperceptiva da vida. Neste sentido, tem-se que

A subjetividade realiza, então, as operaçõesconstitutivas da vida de experiência, e elapossui igualmente estruturas invariantes.

Ela é, antes de tudo, uma estrutura signifi-cativa e, justamente por isto, não se defineapenas em função dos atos intencionais,mas também dos conteúdos noemáticosdestes. Põe-se, então, para Husserl, a ques-tão da constituição da subjetividade, poisos vividos têm uma gênese temporal e umahistoricidade. O Ego transcendental é es-sencialmente temporal (SOUZA; OLIVEI-RA, 2001, p. 19).

A subjetividade husserliana se evidencia namedida em que a consciência, por meio do exercí-cio da intencionalidade, seria anunciadora do sen-tido. “A consciência de si determina, pois, o sujeito[...] mais do que uma simples constatação do seuexercício, é intelecção e, por conseguinte, luz eliberdade. Ela cumpre-se na consciência imanentedo tempo.” (LÉVINAS, 1997, p. 53).

A constituição ou a explicação do sentidode um Eu diferente que eu, partindo da ana-logia entre corpos animados – síntese pas-siva, realizando-se no eu primordial – ar-ranca o eu da sua hipóstase, do aqui, já queseu caminhar de sonâmbulo não basta paraseparar do centro do mundo. [...] Mas,Husserl não separará o viver da vida e apresença, condição do discurso filosófico.Com ele, a própria espiritualidade do espíri-to permanece sempre saber. E essa neces-sidade para a filosofia de permanecer, en-quanto saber, saber da presença e do ser,não poderá, tanto em Husserl como no con-junto da filosofia ocidental, não significar aúltima figura do significativo (sensé) ou, oque dá no mesmo, esta necessidade só po-derá significar que o significativo (sensé)tem seu sentido, no fundamental, no Mes-mo. O espírito permanece fundamentado napresença do ser, ele é o acontecimento des-ta presença (LÉVINAS, 2008b, p. 50-51).

O sujeito, em posição de passividade, no sen-tido de receptividade, ante o objeto analisado, se-

6 Na evidência a coisa ou o “fato” não é somente vista, de maneira distante e inadequada; ela própria está presentediante de nós, e o sujeito que julga tem dela uma consciência imanente. Um juízo que se limita a uma simplespresunção, se é passado na consciência à evidência correlativa, ajusta-se às coisas e aos “fatos” em si. Essapassagem tem um caráter especial, pela qual a simples intenção vazia se preenche e se completa; ela assume ocaráter de uma síntese pela recuperação exata da intuição e da evidência correspondente, a intuição evidente deque essa intenção, até então “distanciada da coisa”, é exata (HUSSERL, 1990a, p. 26).

7 Para realizar tal programa, Husserl recorre a “Epoche” ou Redução de todos os nossos conhecimentos científicose filosóficos, isto é, precisamos fazer suspensão de nossos juízos sobre as coisas. Pela “Epoche” começamos aduvidar das crenças acerca da transcendência, desenvolvidas pela subjetividade mundana e pelos ensinamentosque nos foram transmitidos a respeito das coisas, sedimentados pela tradição e pela cultura. Husserl ainda diz queeste ponto de partida é o mesmo de Descartes, mas não confundível com ele. Com efeito Descartes chegou ao EgoCogito mas deu a este uma interpretação substancialista, ou seja “mens” separada do corpo, tendo por garantia deexistência a transcendência divina (SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p. 20).

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ria, então, conectado ao mundo, por meio dessaconsciência intuitiva anunciadora de sentido.

A fenomenologia husserliana impregnada derazão enquanto presença do ser em original,e invocando como princípio dos princípios –como racionalidade da razão – a intuição, foientretanto a crítica mais rigorosa da evidên-cia e isso até na evidência dos encadeamen-tos lógico-matemáticos (que afenomenologia, no entanto, preservou con-tra toda psicologização, a ponto de passar,notadamente após os Prolegômenos, por suasuprema garantia). [...] Às vezes, na obrahusserliana, o recurso ao subjetivo toma aaparência de grande preocupação com a sub-jetividade. Tanto é verdade que, à guisa depsicológico, o subjetivo pertence a totalida-de do mundo e do ser. Assim, na sua Psicolo-gia fenomenológica, os modos subjetivos doaparecer do mundo e da natureza – asErscheinungsweisen, os aspectos do real quevariam segundo as orientações e movimen-tos do corpo – e, mais profundamente ainda,a camada hilética do vivido, em sua funçãode sumários, ou “silhuetas” (Abschattungen)constituindo “os aspectos subjetivos” doobjeto ( e mesmo a camada hilética despojadadessa função e considerada como vivida porela mesma) – e, sem dúvida, aquém destasorientações subjetivas, as condições sociaisda pesquisa e da identificação do verdadeiro(de que Husserl não fala) – tudo isso ainda éser e faz parte do mundo. A ponto de se pro-longar nas instituições de pesquisas, labora-tórios e anfiteatros das Universidades queorientam estas “condições” do aparecimentodo “ser uma sua verdade” fazem evidente-mente parte do ser e do mundo e justificam arecuperação do psíquico pela objetividade epela extensão da ciência à psicologia. [...] suadescrição fenomenológica é um caminho pri-vilegiado que leva à Redução, isto é, ao “ab-soluto” da consciência cujo sentido não émais devedor a nada que seja existência nomundo. [...]. A necessidade de ir em direçãoao sujeito e de refletir sobre a consciência e avida intencional em que o mundo e os obje-tos estão “noematicamente” presentes é, se-guramente, motivada de vários modos, nosdiversos momentos da apresentação da obrahusserliana, enquanto o gesto motivado ésempre o mesmo (LÉVINAS, 2008b, p. 36-37,grifos nossos).

O mundo adentraria na consciência de for-ma que, ao proclamar uma coisa como ela mes-

ma, seria conferido o sentido e, desta forma, po-deria essa coisa ser definida como linguagem mes-ma, na “absoluta claridade do estar dado.”(HUSSERL, 1990b, p. 29).

O outro, nesta visão de subjetividade, não temnenhuma esfera de interferência nesta produção,pois este outro é também um definidor próprio dosfenômenos da vida, produzindo, de forma, até mes-mo, absolutamente diversa do seu igual, valoraçõese conceituações advindas da redução, por meio daqual seriam descobertas “as potencialidades‘implicadas’ nas atualidades da consciência.”(HUSSERL, 1990a, p. 64). Portanto, “tudo o quevale para mim vale também para todos os outroshomens, que me estão à mão no meu mundocircundante. Experimentando-os como homens,compreendo-os e os aceito como ‘eu’, qual eu sou.”(HUSSERL, 2006, p. 61).

A “redução” tratada no tópico anterior, me-rece ser explicada: “A redução seria um despertarem que desponta uma racionalidade do pensamento– significância de sentido – que rompe com asnormas que ordenam a identidade do mesmo.”(LÉVINAS, 2008b, p. 41). Ou ainda:

A redução fenomenológica é, pois, uma ope-ração pela qual o espírito suspende a valida-de da tese natural da existência para estudaro seu sentido no pensamento que a consti-tuiu e que, ele próprio, já não é um aparte nomundo, mas anterior ao mundo. Voltando,assim às primeiras evidências, encontro si-multaneamente a origem e o alcance de todoo meu saber e o verdadeiro sentido da mi-nha presença o mundo. [...] a evidência darealidade do mundo nunca está concluída.[...] a infinita regressão que a questão pare-ce impor resolve-se graças à idéia do retor-no sobre si (LÉVINAS, 1997, p. 48).

Observa-se, neste ponto de reflexão, que oindividualismo do humano não se apresenta comoalgo questionável por Husserl, pois o que se apre-sentava como mais importante para um dos paisda fenomenologia era justamente desenvolver todoum método que proporcionasse às ciências huma-nas uma forma afastada das improbabilidades eincertezas da abstração e da transcendência. Dessaforma, o indivíduo torna-se, nessa busca por crité-rios que proporcionem uma maior segurançaconceitual, afastando-se das incertezas e abstra-ções, sujeito e objeto a ser analisado8.

8 Para reflexão aprofundada e diálogo crítico sobre a temática, Cf. HUSSERL, Edmund. L’idea di Europa, a cura dicorrado sinigaglia. Milano: Rafaello Cortina, 1999, p. 44.

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Será necessário fazer a redução da consci-ência mundana ou empírica, do fatual, parase chegar à consciência transcendental emsua forma universal da temporalidade. Oparadoxo da subjetividade humana, segun-do Husserl, é ser sujeito para o mundo e aomesmo tempo objeto no mundo. A subjeti-vidade constitui o mundo e é também cons-tituída no mundo (SOUZA; OLIVEIRA,2001, p.13).

O pensamento husserliano é permeado emtoda a sua extensão por critérios que se utilizamde instrumentais lógico-sistemáticos, ainda que ostenha acrescido a uma percepção fenomênica, que,juntos, evidenciariam o mundo analisado por meioda síntese de identificação.

Assim, o cogito tem consciência de seucogitatum não em um ato não diferencia-do, mas em uma “estrutura demultiplicidades” de caráter noético enoemático bem determinado, estrutura co-ordenada de maneira essencial com a iden-tidade desse cogitatum determinado(HUSSERL, 1990a, p. 78).

Dessa forma, para Husserl, diante das incer-tezas de uma metafísica etérea, necessário se faz acompreensão e a utilização instrumentais lógico-sis-temáticos que, em não sendo utilizados, contribuiri-am para uma compreensão dos elementos da vidasujeitos a abstração que “veria sem dúvida umaameaça à verdade, a que está votada a marcha ci-entífica dos homens.” (LÉVINAS, 1984, p. 17).

A verificação da síntese de identificação sefaz pelo presente, pelo preenchimento exe-cutado pelo ato de visar. Assim, os objetosnos são dados quer como apreensões doagora (percepção presente), quer comoapreensões do passado (retenção ou lem-brança primária), quer como protensão (lan-çar-se para o que advirá). Tais apreensõesse entrecruzam e se situam como uma sín-tese viva, já constituída de modo anônimopela intencionalidade latente (SOUZA;OLIVEIRA, 2001, p. 19).

Não é sem razão que, por temor a essa ame-aça à verdade, o pensamento husserliano tenha sedesenvolvido sob critérios rigorosamente estabe-lecidos, de forma que, por meio do conhecimentoresultante da redução, encontrar-se-ia o sentidorevelado.

O aspecto positivo da “Epoche” é a aber-

tura que ela propicia, para a entrada no cam-po transcendental, tanto da subjetividadequanto dos fenômenos. O mundo torna-seum “cogitatum” ou objeto de experiênciado Ego transcendental. [...] É o plano daredução fenomenológica a via de acessoao objeto puro e, segundo Husserl, ser umobjeto significa ter um sentido para um su-jeito, significa ser visado pelo Ego. [...] Oresultado desta “Epoche”, como já disse-mos, foi o de alcançar a estrutura “ego-cogitatum”, onde o mundo se torna fenô-meno para a consciência, ou seja, correlatoda subjetividade absoluta doadora de sen-tido (SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p. 21-22).

O pensamento husserliano destaca estaenlevação do ser pensante como aquele que de-senvolve sua vida psíquica pela passividade e pelaatividade espontânea como dado na experiênciade si. “Eu sou, numa experiência evidente, cons-tantemente dado como eu mesmo.” (HUSSERL,1990a, p. 102).

Husserl distingue dois níveis da vida psí-quica: o da passividade e o da atividadeespontânea, criadora do Eu. A passividadee entendida como receptividade pela sen-sibilidade. [...] Somente pela atividade do“Eu quero”, podemos falar de espontanei-dade criadora do eu operante no conheci-mento e na espontaneidade produtora dosobjetos. [...] um objeto não possa ser intuídoa não ser que tenha sido pré-dado inicial-mente (SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p. 14-15).

Este pensamento conduz ao descontenta-mento de Lévinas, pois o Eu é concebido como oponto de partida e de chegada da intencionalidademanifestada na Epoché.

Encontra-se, então, o Eu como ponto dechegada de nossas afecções, e como pontode partida de nossas atividades. É por istoque os limites da passividade e da atividadenão são rígidos. [...] A atividade judicativapressupõe objetos dados preliminarmente,para os quais se volta o juízo. [...] tudo istose instaura numa atividade de conhecimen-to (SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p. 16).

Para Lévinas (2008b, p. 188-189), “Nafenomenologia husserliana – apesar daespontaneidade criadora conferida ao Egotranscendental – os modos do conhecimento sãocomandados – teleologia da consciência –essencialmente pelo ser ao qual o conhecimentoacede.” A desconsideração da alteridade, assim,

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enquanto parte fundamental na formação da própriaconsciência constitui uma deficiência na teoriahusserliana, porquanto essa, por mínimo que secogitasse, não passa de um dado, um elemento aser interpretado, analisado, reduzido sob a ópticado Eu referencial9. Husserl se propunha essequestionamento ao perscrutar que “quando eu, oeu que medita, me reduzo pela epochéfenomenológica ao meu ego transcendentalabsoluto, não me torno por isso mesmo solus ipsee não permaneço assim à medida que, sob o rótuloda fenomenologia, efetuo uma explicação demim?” (HUSSERL, 1990a, p. 104-105). Nestesentido,

doutrina do saber absoluto, da liberdadedo homem satisfeito, o hegelianismo – aoqual, como a fenomenologia husserliana,vão dar as diversas tentativas do pensa-mento ocidental – promoção de um pensa-mento que, na plenitude das suas ambiçõesse desinteressa do outro enquanto outroque não se aloja em noema de uma noese[...] o trabalho do pensamento leva a me-lhor sobre toda a alteridade das coisas edos homens, e é nisto que reside a própriaracionalidade (LÉVINAS, 1984, p. 17).

Observa-se que a construção lógica na quala consciência10 se apresenta como a única fonteda qual o sentido provém, por meio do qual o pró-prio Eu pode ser colocado na condição de objeto aser intuído, e, como tal, ratifica, mais uma vez, osolipsismo gnoseológico do sujeito que pensa. Se-gundo Lévinas (1997, p. 61) “Husserl mostra comose constitui a intersubjectividade completa a partirdo solipsismo da mónada. Solipsismo que não negaa existência de outrem, mas descreve uma exis-tência que, em princípio, pode considerar-se comose existisse sozinha.” Ainda, “Façamos aqui, se-gundo os passos de Descartes, o grande gesto devoltar-se sobre si mesmo, o qual, se corretamenterealizado, conduz à subjetividade transcendental:o debruçar-se sobre o ego cogito, domínio último eapoditicamente certo sobre o qual deve ser funda-

mentada toda filosofia radical.” (HUSSERL,1990a, p. 58).

Mesmo que venha o Eu, por vezes, observare analisar o outro, será este pensado sob o prismada objetificação dentro do processo intencionalensimesmado enquanto reflexo do “egotranscendental [...] é aquilo que ele é unicamenteem relação aos objetos intencionais.” (HUSSERL,1990a, p. 99).

Nesse processo, o “eu constitui um campode investigação possível, particular e próprio.”(HUSSERL, 1990a, p. 69).

Constata-se, dessa forma, que, ainda queapresentando reservas ao pensamento idealista,segundo o qual a razão deveria ser o meio peloqual se daria o despertar do homem, em detrimen-to das incertezas da opinião, pois haveria umsolipsismo em torno da própria razão elevada,Husserl, ao propor a vigília da ipseidade da alma,garantindo assim a existência da subjetividadecomo locus do pensar, por meio da consciênciaadvinda da redução, reduz a própria subjetividadeà concepção da preponderância do ego, visão essaque se encerra, igualmente no solipsismo (RIBEI-RO JÚNIOR, 2008, p. 39).

Ainda que Husserl tenha considerado o outroque não eu, essa intersubjetividade seria secundáriano processo da busca pela experiência do si na exis-tência, tendo em consideração que “evidentemen-te, é preciso possuir a experiência dessa esfera depertença própria do eu para poder constituir a idéiada experiência de um outro que não eu.”(HUSSERL, 1990a, p. 110). Dessa forma, essa “in-dependência” dos Eus se manifesta em uma nãodialogicidade, na medida em que “se me decido, porexemplo, pela primeira vez, num ato de julgamento,pela existência de um ser e por esta ou aquela de-terminação desse ser, esse ato passa, mas eu sou epermaneço daqui por diante um eu que decidiu des-ta ou daquela maneira, ‘tenho uma convicção cor-respondente’.” (HUSSERL, 1990a, p. 100-101).

Assim, o universo da consciênciadesconsidera o outro como presença essencial no

9 “Husserl estabelece o sujeito enquanto mónada. O sujeito pode dar conta do Universo no seu foro íntimo. Toda arelação com outra coisa se estabelece na evidência e tem nele, por conseguinte, sua origem. [...] dizer que o sujeitoé uma mónada é negar a existência do irracional. [...] o sujeito é absoluto, não porque seja indubitável, mas éindubitável porque responde sempre por si mesmo e a si mesmo. Esta auto-suficiência caracteriza o seu absoluto.”(LÉVINAS, 1997, p. 61).

10 A sensibilidade é a consciência originária do tempo. Entre sensibilidade e consciência, Husserl traça uma ligaçãomuito estreita: as coisas são percebidas nas qualidades que as revestem. Porém, as qualidades são descobertas navivência que é um evento temporal (MELO, 2003, p. 51).

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processo da convivência e construção conceitual.

Husserl compara o Eu à unidade deapercepção transcendental de Kant, o que,seguramente, terá sua razão, mas a identi-dade deste idêntico se rompe pela diferen-ça da insônia, ao fazer um vazio que semprese recria, não pelo desprendimento em rela-ção a tudo o que foi adquirido, mas porresistência, se assim se pode dizer, a todacondensação deste próprio vazio que tomaconta de mim como sonolência (ou comoser do ente). Insônia como desnucleaçãoda própria atomicidade do uno (do qual seprevalece ainda a unidade da apercepçãotranscendental que sintetiza o dado) oucomo des-apontamento de sua própria pon-tualidade. [...] Em todo caso, é a partir deOutrem que Husserl descreverá a subjeti-vidade transcendental, arrancando o Eu doseu isolamento em si. [...] O Eu está em si eem si ele está aqui e aqui ele está no mun-do. É preciso arrancá-lo deste enraizamento.A Redução transcendental de Husserl tema vocação de despertá-lo do entorpecimen-to, de re-animar sua vida e seus horizontesperdidos no anonimato. A Reduçãointersubjetiva a partir do outro arrancará oeu de sua coincidência consigo e com ocentro do mundo, mesmo que Husserl nãocesse de pensar na relação entre o eu e ooutro em termos de conhecimento(LÉVINAS, 2008b, p. 47-48, grifos nossos).

Neste sentido, o solipsismo se verifica no

facto de, na representação, o Mesmo defi-nir o Outro sem por ele ser determinado jus-tifica a concepção kantiana da unidade daapercepção transcendental que permaneceforma vazia dentro da sua obra síntese.Longe de nós o pensamento de partir darepresentação como de uma condição não-condicionada! (LÉVINAS, 2008a, p. 117).

Observa Lévinas que à fenomenologiahusserliana bastaria o interrogar as intenções dopensamento para saber aonde o pensamento che-garia (LÉVINAS, 1984, p. 17). Esse perquirir opensamento realizado é, tão somente, um feito namesmidade, ou seja, na óptica do Eu só, que pensaindependente da presença do outro, que limita odesvelamento do mundo a um critério objetificador.

Essa vigilância do Eu que vem dasprofundezas da subjetividade que transcen-de sua imanência, de profundis do espírito,ruptura no coração da substância, insônia,tudo isso se descreve, seguramente, em

Husserl, como intencionalidade. O eu-em--estado-de-vigília vela o objeto, permane-ce atividade objetivante, até sob sua vidaaxiológica ou prática. É da alteridade doobjeto, do choque do real que depende,aqui, o desembriagamento do despertar. Aafecção sofrida e estimulação recebida vi-rão do objeto, daquilo que “se salienta”(sich abhebt) na imanência. O despertarresponde ainda a uma alteridade a ser as-similada pelo Eu. É bem essa assimilaçãoque a metáfora ótica do raio exprime, o qual,a partir do eu desperto, se dirige sobre oobjeto que o despertara, se dirige sobre eleà guisa de saber, o espírito assimilando oque o atinge. Seguramente (LÉVINAS,2008b, p. 45).

Seria como se a consciência fosse um cien-tista no laboratório da mente, no qual há, exclusi-vamente, objetos de análise e uma mente parapensá-los e defini-los em meio ao desenvolvimen-to das pesquisas.

Cada estado de consciência possui um “ho-rizonte” que varia conforme a modificaçãode suas conexões com outros estados e comas próprias fases de seu decorrer. É um ho-rizonte intencional, cuja característica é re-meter a potencialidades da consciência quepertencem a esse mesmo horizonte. Assim,por exemplo, em toda percepção exterior,os lados do objeto que são “realmente per-cebidos” remetem aos que ainda não o sãoe que somente são antecipados na expec-tativa de maneira não intuitiva como aspec-tos “que estão por vir” na percepção. Estaé uma “protensão” contínua, que para cadanova fase perceptiva assume um novo sen-tido (HUSSERL, 1990a, p. 82).

É evidente que não se pode dar, mesmo nesteexemplo, uma conotação apenas empírica, pois amera indução e dedução, enquanto métodoscientíficos, não conseguiam, segundo Husserl,atender aos propósitos e questionamentos que nãoobtinham soluções. Dessa forma, segundo opensamento deste filósofo,

as ciências manifestam-se meras constru-ções de outras evidências do Lebenswelt.Com isso, o saber científico define-se comomero processo de idealização da realidadeconcreta, cuja consciência se verifica nomundo da vida. A crise consiste, pois, nofato de a redução objetivista do saber terdesvinculado a atividade científica do mun-do do homem. A ciência assim formalizadanada tem a dizer ao homem sobre suas ne-

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cessidades vitais, perdendo o sujeito comosuporte de experiências pessoais e dasintencionalidades que caracterizam os atoshumanos. Para Husserl, a superação da cri-se acontecerá quando a Filosofia se inte-ressar de novo pelo homem e suas criaçõesculturais, pela sociedade e seus sistemasde valores (SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p.517, grifos nossos).

Não se pode olvidar que Husserl não se con-centra nas ciências naturais, apesar de toda a suahistórica vinculação com o desenvolvimento dasteorias matemáticas e do mundo da física. O obje-to de verificação pelo método fenomênico desen-volvido reside no ambiente sociocultural, no qualse desenvolve as interações da sociedade, nãosendo reduzidos a dados fictos, teóricos ou subs-tâncias a serem trabalhadas11.

Diante das inúmeras interações, extrema-mente mutáveis, das relações em sociedade, daspossíveis crises de identidade de institutos, como afamília, a forma de constituição de Estado, suaestruturação, o desenvolvimento das atividades ecompetências dos poderes que o compõe, concep-ções sobre ideologias, manifestações culturais,evolução das estruturas normativas para que res-pondam as arestas deixadas pela rápida desinte-gração de antigos preceitos normativos que a so-ciedade não credita mais, dentre outros, tudo istoé, segundo Husserl, material para ser, por meio daredução intencional fenomenológica, refletido deforma a, compreendidos, poder se pensar soluções,marcadas pela originalidade e realismos próprios,dado que surgidas na consciência.

Tudo dentro do esforço, já mencionado, deconferir certeza científica do saber por meio daintencionalidade consciente do Eu. Portanto, en-contra a fenomenologia um método que propõe umcaminho diferente da visão evidenciada pelo idea-lismo, ou, ainda, como via à moral apresentada pelouniversalismo do imperativo categórico (RIBEI-RO JÚNIOR, 2008, p. 47).

Ora, a fenomenologia pautada pelo pensa-mento de Husserl representa essa capacidademesma de:

recuperar o meu próprio domínio de formu-lar a pergunta: ‘Onde estamos?’, saberexactamente onde se está [...] sentido maisamplo e para além da visão das essências

[...] a fenomenologia é a evocação dos pen-samentos – das intenções subentendidas– mal entendidas – do pensamento que estáno mundo (LÉVINAS, 1982, p. 23).

Husserl representa essa sede, essa busca pelodesvelar do mundo, por meio do processar o dadona intencionalidade. Essa busca pela verdade quereluz sem véus que obscureçam a compreensãodo dado. A busca pela certeza de que a

transcendência do mundo não se constituifora da experiência do mundo; ela nada maisé do que um sentido pertencente à esferaimanente da experiência. Por esta interpre-tação, a crença no mundo, como pressu-posto da experiência, não pode ser destruídapela atitude transcendental (SOUZA; OLI-VEIRA, 2001, p. 18).

Representa, ainda, a expressão de toda apotencialidade humana que, para muito além de sesituar na mera contemplação das formas em umplano ideal metafísico, poderá ela mesma, por meioda intenção manifesta na consciência, diante de umapostura proativa do próprio humano, conscientizar--se do algo pensado, do objeto analisado. “Em todosos níveis da vida espiritual – seja no estado dasensação ou do pensamento matemático – opensamento é desígnio e intenção.” (LÉVINAS,1997, p. 29). Ocorre que todo esse processo reflete“a preocupação principal de Husserl, que oacompanhou durante toda a sua vida, foi a de sabercomo as coisas nos aparecem e como podemosrestabelecer o contato com as coisas nelas mesmase como o sentido de tais coisas se constitui em nós.”(SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p. 20).

É exatamente por meio da consciência queHusserl ratifica o agir na eticidade, tendo em con-sideração que a subjetividade, e o agir moral de-corrente dela, parte da elementar consideração dohumano, do sujeito pensante, cujo sentido atribuí-do à coisa/objeto resplandece na consciência pormeio do agir na subjetividade.

O pensamento husserliano almeja uma viade concepção de agir moral, proveniente, não deuma conceituação de sujeito moral abstrato12, de-corrente do pensamento kantiano, muito menos dadesconsideração por completo da subjetividade(RIBEIRO JÚNIOR, 2008, p. 48), mas, sim, daconsciência doadora de sentido na intencionalidade.

11 Para maior aprofundamento, Cf. HUSSERL, Edmund. Renovación del hombre y de la cultura: cinco ensayos.Barcelona: Anthropos; México: Universidad Autônoma Metropolitana (Iztapalapa), 2002, p. 28.

12 Para reflexão aprofundada e diálogo crítico sobre a temática, Cf. JAEGER, W. Paidéia, a formação do homemgrego. Tradução de Arthur M. Parreira. São Paulo: Martins Fontes, 1986, p. 10.

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E esse pensar do humano, essa autonomiaadvinda do desvelamento do mundo por meio daredução fenomenológica, muito se afasta de umavisão de pensar como resultado do simplesequacionamento do agir histórico e das herançasculturais.

O pensador recorre à História não comoingênuo compilador de dados ou crítico dedocumentos, mas como leitor de um passa-do desde a perspectiva de um presente cons-tituído por seu próprio mundo espiritual. Ofilósofo busca a verdade inteira que esca-pa ao positivismo historicista: pelo fato deconceber ideias, o homem torna-se um ho-mem novo, que, vivendo na finitude, se ori-enta para o polo do infinito. Afenomenologia propõe-se a ser um métodono qual todo o conhecimento se constróiem referência à subjetividade (SOUZA;OLIVEIRA, 2001, p. 518).

O que se apresenta do pensamentohusserliano é, de certa forma, uma retomada daintencionalidade da consciência que apregoa que

toda a consciência é consciência de algu-ma coisa, não é descritível sem referênciaao objeto que ela pretende [...] focagem in-tencional que não é um saber, mas que, nossentimentos e aspirações, é, com o seu pró-prio dinamismo, “afectivamente qualifica-da.” (LÉVINAS, 1982, p. 24).

Tem-se, desta forma, um posicionamento queconfere radicalidade a prioridade do não-teoréticoque, posteriormente, terá sua ideia revisitada emHeidegger por meio da delimitação da noção de uten-sílio. Assim, a maneira como a consciência acessaos objetos se apresenta imbricada, em uma relaçãode simbiose, a forma como se dá a própria essênciados objetos. O acessar o ser, assim, se vincula adescrição do ser (LÉVINAS, 1982, p. 24).

Lévinas aponta uma possibilidade de, em uti-lizando a ideia de intencionalidade husserliana, quereduz o objeto para que ele seja evidenciado nasua real constituição, apresentar a ideia de umaintencionalidade irredutível para que a relação deeticidade com a alteridade seja contemplada deforma a não se desconsiderar o outro. Apesar des-sa possibilidade, reconhece o filósofo lituano queesse pensamento ocasionaria “a ruptura daintencionalidade” (LÉVINAS, 1982, p. 25) mes-ma, ou pelo menos, como fora concepcionada pelopensamento husserliano.

A grande contribuição husserliana, portanto, seapresenta nesse agir moral, decorrente da existênciada subjetividade do humano que, como consciênciaintencional, procure a vivência ética pelo desvelamentodo pensar na redução fenomenológica. É o viver ocotidiano, “este retorno ao mundo da vida [...] nãoesqueçamos que é por causa disto que Husserl fala degenealogia, de filiação, de origem, de historicidade.”(SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p. 17). Diante das váriassituações que se apresentam ao sujeito, este, por meiodo imergir na absorção do mundo pela consciência, naintencionalidade, prover-se-á de uma consciênciasempre em estado de observação, buscando respostase definições às questões analisadas, de forma a garantiresse infindável processo de geração de conhecimentoconsciente diante do viver mesmo. “Caberá àfenomenologia reconciliar o mundo da ciência e datécnica com o mundo da vida a partir da teleologia aoúltimo.” (SOUZA; OLIVEIRA, 2001, p. 515).

As percepções decorrentes do viverproporcionarão ao humano a experiência que será boaconselheira ao se pensar os balizamentos do agir moralno cotidiano da vida visando à atitude que conduza àética e, em última instância, ao agir na justiça.

Influenciado por toda a teoria husserliana doagir humano por meio da redução fenomenológica,na intencionalidade, Carlos Cóssio desenvolverásua Teoria Egológica do Direito13 alicerçando-se,

13 “El problema terminológico consistía en que me era indispensable un adjetivo que correspondiera al substantivo‘sujeto’. Si para la teoría egológica el Derecho es conducta y el objeto del conocimiento dogmático es la conductaen interferencia intersubjeva; si el dato a conocer, por lo tanto, es el hombre plenario en tanto que es sujetoactuante – pues la persona humana su libertad metafísica fenomenalizada y sus acciones cumplidas soninseparablemente una y la misma cosa, según se explica largamente en mi libro de marras –, es claro queencontrándome siempre con el sujeto actuante como objeto de conocimiento, necesitaría a cada momento eladjetivo correspondiente a sujeto. Etimológicamente este adjetivo está dado pelo por el vocablo ‘subjetivo’, quehoy en día este adjetivo tiene múltiples acepciones, todas ellas independientes ya de su correspondiente substan-tivo. Imagínese la confusión que hubiera acarreado decir Teoria subjetiva del Derecho. Casi lo mismo hubieraocurrido si, derivando del substantivo ‘persona’, hubiera dicho Teoría personalista del Derecho. Es así que lanecesidad de permanecer al margen de todas las resonancias filosóficas sedimentadas hoy em el adjetivo ‘subjeti-vo’, al par que la necesidad de recurrir a la calificación originaria que a este vocablo corresponde, me llevó alvocablo ‘egológico’, derivado de ego yo.” (COSSIO, 2002, p. 215-216).

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igualmente, nos fundamentos kelsenianos de ciên-cia jurídica e da norma.

De este modo, la Teoría Egológica trata deanalizar el Derecho como una singularexperiencia; el Derecho es un objeto cultu-ral cuyo conocimiento requiere unaintuición (al modo husserliano), unacomprensión y un pensamiento normativo.Se opera entonces en la teorización jurídicaun cambio profundo la norma jurídica dejade estar en el centro de las preocupacionesjurídicas como objeto lógico, cuyoconocimiento es susceptible de unprocedimiento racional y, en su lugar, seinstala la experiencia concreta del Derechoen toda su complejidad gnoseológica-exis-tencial-valorativa (CATALINI, 1991-1992, p.54).

Destaque-se a importância, não afastada, dese pensar a estrutura normativa, mas, por outrolado, ressaltando o aspecto cultural do Direito, que,de certa maneira, extrapola um estudo focado nofixionismo positivista-normativista. Neste ponto,válida a seguinte citação:

No plano em que particularmente se proje-ta – o da fundamentação da ciência jurídica–, a Teoria Egológica empreende uma exaus-tiva busca fenomenológica das notas es-senciais ao jurídico, encontrando-as final-mente no fenômeno da interferênciaintersubjetiva das condutas. Desvendan-do, com exemplaridade, o preconceitopositivista do purismo metodológico deHans Kelsen e o caráter pré-temático de suaontologia jurídica, demonstra a possibili-dade de encontrar o direito, em toda suainteireza, ainda que com abstração de qual-quer referência normativa (PINTO, 1979, p.73).

Ressalte-se o fato de, em sendo o Direitofruto/objeto do mundo da cultura, assim predefinidopor Cóssio, apreendido e assimilado por uma intui-ção ou compreensão desenvolvidos por um pen-samento normativo, tem-se que apresentar o Di-reito com uma abordagem idealista, torna imper-feita a sua compreensão calcada estritamente emprocedimentalismos lógicos.

Una de las determinaciones de la conductajurídica así delimitada se presenta comointerferencia intersubjetiva. Mi propiaconducta puede relacionarse o interferir conotras conductas mías o con las de otrossujetos. Si hay un “hacer” y un “omitir”conductas del mismo sujeto, la interferenciaes subjetiva y es objeto del conocimientomoral (CATALINI, 1991-1992, p. 55).

Percebe-se que a reflexão normativa--teorética não prescinde de considerar o elementoda conduta humano/jurídica na esfera daintersubjetividade14. O próprio fato de, em sendoos seres humanos gregários por natureza, conduzao fato de o relacionamento interpessoal interferira realidade do outro, noção essa que alcança aprópria compreensão, criação, modificação eextinção da norma enquanto fruto de sentido quelhe é conferido socialmente.

Percebe-se, portanto que o elemento subje-tivo-cultural é apresentado como uma flexibilizaçãodo binômio restritivo permitido/proibido apresen-tado pela estrutura normativa quando da regula-mentação da vida em sociedade pautada por de-terminados padrões de comportamentos eleitoscomo juridicamente relevantes.

la existencia humana es coexistencia y esen relación con otro sujeto actuante, don-de la ejecución de una acción quedacontrapuesta al impedimento de la mismaque le opone o no la acción de otro sujeto;el “hacer” se integra con el “impedir”. Aquíestamos en presencia de la conducta jurídi-ca (CATALINI, 1991-1992, p. 55).

A conduta humana, por primeiro existente,conduz a uma posterior compreensão jurídica desua categorização. Deve-se pensar que, na reali-dade cultural em que a sociedade está imersa, ocomportamento deixa de ser unicamente o agentepassivo da obra normatiza, atuando, portanto, comopolo ativo, mediante contribuições para aressignificação do Direito, fruto das transforma-ções e realidades em contínua transformação.Afirma Carlos Cóssio:

con la Teoría Egológica se despliega en for-ma absolutamente rigurosa, por primera vez,

14 [...] como el derecho es intersubjetivo e implica, por lo menos, dos conductas que se cruzan, ocurre que no hay enla experiencia jurídica, ni puede hacer, una norma aislada. Siempre hay en ella, por lo menos, dos normas coordinadas,cada una representando la conducta de cada una de estas partes; pero por la misma razón, en cualquier otro puntode la experiencia jurídica, estas normas están cruzadas a su vez por otras normas, en plano horizontal (MACHADONETO, 1988, p. 53-54).

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la problemática del conocimiento jurídico;y para ello reclama simplemente el juegoconcordante de una intuición y unasignificación, es decir, reclama la conductaque es el objeto óntico y ontológicamenteintuible y reclama la norma que es lasignificación intelectualmente mencionada(CÓSSIO, 1954, p. 747).

Veja-se que a norma, em sua concepção clás-sica, atenta-se a realidade do dever ser, verifican-do e aferindo uma conduta por meio de umparâmetro apresentado como ponderação/juízo deimputação, que considera o comportamento pos-terior em face da prescrição anteriormenteestabelecida quando da conduta em análise. Éexatamente essa compreensão da conduta/com-portamento refletido a posteriori da estruturanormativa que será criticamente refletida pelo pen-samento cossiniano. Nesse sentido,

El jurista sabe lo que jurídicamente dicemerced al código que aprendió o a lo quelos precedentes le enseñaron; pero podríadecir todo cuanto quisiera sobre esa basesin que haya en ello ningún conocimientojurídico, si lo que estuviere diciendo no loes acerca de algo que estando dado, podríaconfirmar o desmentir su afirmación. Estealgo es lo que el jurista así conoce o pre-tende conocer; siempre es alguna conductacompartida [...] (CÓSSIO, 1954, p. 747).

Isso significa ressaltar que a estrutura do de-ver ser apresentada pela norma, essa concepçãológico-instrumental aprioristicamente consolidadaa conduta humana, que a ela deve se enquadrar eobservar dentro de uma liberdade subjetiva já pre-vista pelo próprio conteúdo normativo apresentamuma noção de panopticismo normativo, que reduzo agir humano a possibilidades, teoreticamente cal-culadas quanto ao risco ou ao benefício, mas quenão possibilitam uma compreensão ampla da nor-ma enquanto substrato/objeto a ser reinterpretadoe revisitado por agentes externos a estrutura lógi-co-jurídico-interpretativa.

Quando se prensa no criacionismo da nor-ma, no pensamento cossiniano, está-se somandoalgo de novo à subjetividade social/cultural queextrapole o mecânico ato do reconhecimento da

norma pré-constituída.

El tránsito del ser entitativo al valor esininteligible: lo que es, nada nos dice sobrelo que debe ser y a la inversa. En cambio,no es ininteligible para la libertad el tránsitoal valor, porque la libertad no es escuetaespontaneidad o ciego “poder ser”, sinoque es espontaneidad proyectada en elproyecto vital del futuro inmediato, en razónde la anticipación del futuro contenida enel presente existencia! La libertad no quedabien descrita como un “ser” sino como un“deber ser existencia!”, “deber ser”, por-que al estar proyectada en el proyecto vitaldel futuro inmediato siempre es un poderser dirigido y existencia! porque algo “es”al ser siempre de presencia (CÓSSIO, 1949,p. 35).

Veja-se que a liberdade apresenta-se confi-gurada à existência. Não é de menor importânciaesse apontamento, justamente porque conduz apercepção de que a norma, ao ser apropriada peloser existente em sua vida, passa pelo crivo domomento histórico, ou seja, de sua compreensãopelo olhar da sociedade e suas subjetividades queatribuem o sentido a estrutura normativa medianteestruturas culturais, morais e jurídicas apreendi-das pelo juízo histórico-temporal do momento emque se processa esse olhar reflexivo. Está-se di-ante de uma realidade que extrapola a lógica dosestreitos limites apresentados pelas estruturas for-mal-racional-lógico-dedutiva da norma15.

A realidade tematizada e abordada de formamenos estática e presumível, apresenta-se comoum exercício de pensamento do real que contribuide forma densa para a estrutura e desenvolvimen-to orgânico da estrutura das normatividades vigen-tes e em constante processo de (re)interpretação.

Pensar o Direito em interação/integração comoutros fenômenos/áreas da sociedade significapossibilitar novos caminhos e horizontesinterpretativos para a configuração formal apre-sentada pelas normas vigentes, mas não estáticas.

La Teoría Egológica explora la dimensiónaxiológica de la conducta jurídica tomandoel descubrimiento de la analítica existencialque presenta en el ser del hombre tres

15 Según la enseñanza de Husserl, la mención es tributaria del objeto. Y en la medida en que hay identidad entremención (norma) y objeto (conducta bajo este perfil), el tributo significa que la norma emerge, por abstracción, dela conducta; y no que la conducta, para adquirir forma, se pliega a la norma (CÓSSIO, 2002, p. 218).

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dimensiones existenciales: el mundo obje-tivo, la persona y la sociedad. De tal maneraque los valores jurídicos se van a confor-mar en un plexo axiológico distribuyéndoseen tres pares de valores, uno de autonomíay otro de heteronomía, con suscorrespondientes desvalores ycoincidiendo con aquellas tres dimensionesapuntadas (CATALINI, 1991-1992, p. 64).

Pensar a teoria egológia é aventurar-se emrealidades que extrapolam, não dispensando, o olharlógico-normativo restrito, de forma que o mundoobjetivo, o homem e a sociedade apresentam-secomo motores impulsionadores dos fatos da vida edo Direito como fruto dessas múltiplas e intermi-náveis (des)combinações evidenciadas no horizontehistórico fenomênico.

Se trata de valores bilaterales: en efecto elorden y seguridad aparecen como valoresdel mundo por su exterioridad; a su vez elpoder y la paz, se encuentran como valoresde existencia por su personalización; porúltimo la cooperación y la solidaridad sonpropiamente valores de coexistencia. Sinembargo, este plexo axiológico no estácompleto si no nos referimos a aquel valorque confiere armonía y totaliza a todos losotros: la justicia. Dentro de la TeoríaEgológica la justicia carece de un contenidomaterial específico pero acompaña a cadauno de los otros valores como su sombra,de suerte que si por ejemplo las exigenciasdel valor “orden”, de ineludible realizaciónen la vida comunitaria, cercenara asolidaridad, parcializaría a la justicia(CATALINI, 1991-1992, p. 65).

A justiça, como catalizador e equalizador dopoder, da paz, da ordem e da segurança, coopera-ção e solidariedade, reflete a possibilidade de secompreender dialogicamente como as dimensõesdo existir com os outros são filtradas eamadurecidas quando do estabelecimento de ins-trumentos e instituições que oportunizem aconcretização plena da existência, da coexistên-cia. O Direito não representa, dessa forma, umfim em si, um conceito superior, abstrato, perfeito,

intangível e controlador da sociedade, no sentidode submissão irrestrita as suas estruturas e apara-tos lógico-racionais. Mas, deve-se compreendê-locomo ponte de oportunidades que serão tanto maisefetivas e eficazes quando possibilitarem um es-paço aberto de (re)construção de suas própriasestruturas, de forma a atender às reais epresentificadas necessidades sociais. Teoria e prá-tica imbricadas16 diante do realismo histórico--fenomênico apresentado pelo pensamentohusserliano.

Lo suyo de cada cual es lo que a cada unole falta para estar en iguales condicionesde libertad con quien lo interfiere, en elmomento de la interferencia de lasconductas. En vez de dar más en proporciónal que tiene más mérito, como afirmabaAristóteles, la verdadera justicia consisteen dar más a los que están más abajo paraigualar el punto de partida en el presentevital (CÓSSIO, 1949, p. 57).

A presentificação da justiça17 na esferaintersubjetiva das relações humanas se consolidacom a máxima aristotélica da equidade, mediantea consecução de um tratamento mediato desigualpara que se alcance uma finalidade expressa pelabusca de uma justiça materialmente aferida. A cadaum compete um tratamento dispensado em obser-vância as suas realidades, limitações e necessida-des. O pensar o outro na teoria egológica apreen-de essa sensibilidade para além da mera subsunçãodos fatos da vida às estruturas normativas. A lei eseus institutos são úteis e, mais do que isso, neces-sários para que a justiça e seu intento sejam al-cançados.

Si se considera a los sujetos como personas,la reunión de las mismas puede darse enverdad como unión, lo que actualiza el valorpositivo paz o como desunión, la quecorresponde al polo negativo del valor, ladiscordia. En esta última la reunión depersona, en su espontaneidad autónoma esun conflicto. Lo que puede internarserespecto de este último es dominarlo medi-ante el ejercicio de la autoridad. Surge

16 El jurista va a la experiencia para conocerla y sin este contacto con ella nada conocerá; pero va desde cierto ángulo,va como jurista, va aportando un modo de pensar que tiene cierta contextura para poder valer como pensamiento(CÓSSIO, 2002, p. 91).

17 [...] la justicia resulta un valor de totalidad y por eso la justicia acompaña siempre como una sombra a cada uno delos valores parcelarios; por ejemplo, si una institución realiza un buen orden, pero una mala solidaridad, ya, poraquello, es parcialmente justa. En la justicia, la mera coexistencia aparece como razón suficiente en la medida en quecoexistir es entenderse y en que este entendimiento se vive con la emoción de la justicia (CÓSSIO, 1964, p. 611).

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heterónomamente así el valor positivo po-der. Este último no se confunde con la fuerzabruta, sino que consiste en la capacidad deinculcar sentidos espirituales. Si el poder noes suficiente para dominar el conflictoestamos aún en la discordia de los conflictosindividuales, pero el conjunto de éstosproyectado sobre la jerarquía que es lasociedad como tentativa del poder nos da lasituación de impotencia. El desvalor especí-fico del poder le adviene por exceso cuandola dominación excede los requerimientos delconflicto, constituyéndose así en opresión(AFTALION; VILANOVA; RAFFO, 2009, p.317).

Mas, não se deve sobrestimar suas estrutu-ras em detrimento do horizonte histórico das múl-tiplas realidades e dimensões socioculturais em quea sociabilidade se manifesta em intersubjetividadecriativa e possibilitadora de novos rumos, novosolhares construtivos de uma realidade em cons-tante processo de (des)identificação.

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ARTIGOS DOCORPO DISCENTE

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RESUMO

No Brasil, atualmente, vive-se sob égide doneoconstitucionalismo que traz como premissa asupremacia da Constituição e a necessidade degarantir os direitos considerados fundamentais,principalmente pelo Judiciário. Resguardar os pre-ceitos elencados na Constituição, por vezes, ensejauma postura ativa dos juristas. Tanto na interpre-tação como na efetivação da norma. Mesmo quepara tal posicionamento seja exigido certa mitigaçãoda separação dos poderes. Dessa maneira, faz-senecessária uma atuação proativa do Judiciário sen-do difícil aceitar teorias contrárias a talposicionamento visto que a realização do judicialreview não pode ensejar na supremacia dos Tribu-nais. Assim, fazem-se necessário diálogos entre apopulação e as Cortes, com intuito de que o povoseja parte do processo interpretativo e decisório.O presente trabalho tem como objetivo, através dométodo dedutivo e da pesquisa bibliográfica, anali-sar a tendência moderna de abertura democráticada jurisdição constitucional brasileira, ao passo quese abordará o possível paradoxo existente entre oConstitucionalismo Moderno, como forma de limi-tação do poder, e a teoria democrática.

Palavras-chave: Jurisdição Constitucional,neoconstitucionalismo, democracia.

ABSTRACT

In Brazil currently living under the aegis ofneoconstitutionalism that brings premised on thesupremacy of the Constitution and the need toguarantee fundamental rights, particularly theJudiciary. Safeguard the principles listed in theconstitution, sometimes, entails an active stance by

O NEOCONSTITUCIONALISMO, A SUPREMACIA CONSTITUCIONAL E OATIVISMO JUDICIAL: uma proposta de conciliação entre o Judiciário e povo como

intérpretes e efetivadores da Constituição para garantir a democracia

Betânia Gusmão Mendes1

Patrick Luciano Guilhoto do Prado2

the judiciary. Both in interpretation as in theeffectiveness of the standard. Even if this requirespositioning to a certain mitigation of separation ofpowers. Thus, it is necessary a proactive actionby the judiciary being difficult to accept theoriescontrary to such positioning. However, completionof the judicial review cannot give rise to thesupremacy of the courts. Thus, it is necessary di-alogue between the public and the courts, with theintention that people be part of the interpretationand decision-making. This study aims to analyzethe trend of modern democratic opening of theBrazilian Constitutional Jurisdiction, while wediscuss the possible paradox between ModernConstitutionalism, as a form of power limitation,and democratic theory.

Keywords: Constitutional Jurisdiction,Neoconstitutionalism, democratic

1 INTRODUÇÃO

O constitucionalismo no Brasil e no mundopassou por mudanças significativas nos últimos anos,implicando o surgimento de um fenômeno que temalterado o modo de examinar a Constituição e seupapel na interpretação do ordenamento jurídico.Trata-se do denominado Neoconstitucionalismo.

Esse conjunto de alterações ocorridas noDireito Constitucional contemporâneo representaum processo de mudanças de paradigmas queabarca fenômenos complexos e ainda não inteira-mente assimiláveis. Atualmente, oNeoconstitucionalismo traz como premissa a su-premacia da Constituição e a necessidade de ga-rantir os direitos fundamentais, de maneira inde-pendente e harmônica pelo Executivo, Legislativo

1 Acadêmica do Sétimo Período no Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.2 Acadêmico do Sétimo Período no Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.

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e Judiciário. No entanto, quando existe uma omis-são latente pelo Poderes Legislativo ou Executivo,surge o Poder Judiciário para colmatar essa lacu-na social.

Resguardar os preceitos fundamentaiselencados na Constituição possibilita uma posturaativa por parte do Poder Judiciário. Mesmo que,para tal posicionamento, seja exigida certamitigação da separação dos poderes para efetivaros direitos fundamentais. A atuação proativa porparte do Judiciário enseja na realização do judicialreview que visa dar sentido efetivo e alcancealmejado à norma constitucional. No entanto, talprática não pode propiciar a supremacia absolutados Tribunais.

Assim, faz-se necessário diálogo entre a po-pulação e as Cortes, com intuito que a povo sejaparte do processo interpretativo e decisório. O pre-sente trabalho tem como objetivo, através do mé-todo dedutivo, analisar a tendência moderna deabertura democrática da jurisdição constitucionalbrasileira, ao passo que se abordará o possívelparadoxo existente entre o ConstitucionalismoModerno, como forma de limitação do poder, e ateoria democrática.

Busca-se, promover uma análise da possívelparticipação social na interpretação constitucional,a inserção de processo de aprofundamento dasinstituições democráticas, fiscalização elegitimação da atuação estatal e concretização dedireitos, bem como observar os benefícios e a for-ma para que ocorra a conciliação entre o judiciá-rio e povo como intérpretes e efetivadores da Cons-tituição com fim de garantir a democracia.

2 O NEOCONSTITUCIONALISMO, ASUPREMACIA CONSTITUCIONAL EO ATIVISMO JUDICIAL

O Neocosntitucionalismo é um movimentohistórico e teórico do Direito que visa à suprema-cia constitucional para a garantia dos direitos fun-damentais. Nesse sentido, leciona Sarmento (2009,p. 123)

[...] até então, as constituições não eramvistas como autênticas normas jurídicas,não passando muitas vezes de merasfachadas. [...] Até 1988, a lei valia muito maisdo que a Constituição no tráfico jurídico, e,no Direito Público, o decreto e a portariaainda valiam mais que a lei. O PoderJudiciário não desempenhava um papelpolítico tão importante, e não tinha o mesmo

nível de independência que passou a gozarposteriormente. As constituições erampródigas na consagração de direitos, masestes dependiam quase exclusivamente daboa vontade dos governantes de plantãopara saírem do papel – o que normalmentenão ocorria. Em contextos de crise, asfórmulas constitucionais não eramseguidas, e os quartéis arbitravam boa partedos conflitos políticos ou institucionaisque eclodiam no país.

Tal movimento possui como objetivo funda-mental as transformações de um Estado Legal emum Estado Constitucional, no qual se funda o Di-reito Constitucional com base em novas premis-sas como a difusão da perspectiva do desenvolvi-mento da teoria dos direitos fundamentais. Busca--se, com o Neoconstitucionalismo, a efetivação ea concretização dos Direitos Fundamentais, tendocomo núcleo axiológico a dignidade da pessoa hu-mana. A visão neoconstitucionalista aponta parauma constituição que possui força normativa e visaa expansão da jurisdição constitucional em conjuntode novas técnicas de interpretação da constitucio-nal.

Na atual percepção, tem-se a proposição dasupremacia constitucional, à qual se subordinamos demais poderes. Nesse sentido aduz Barroso(2009, p 36): “Em virtude desta primazia, a Cons-tituição encontra-se em posição hierárquica supe-rior às demais normas, de modo que leis e atosjurídicos não serão considerados válidos casoafrontem alguma norma constitucional.”.

A Magna Carta é a ordem fundamental epossui posição de supremacia. Dessa maneira,como forma de garantia de aludida prioridade,elenca Clevé (2000, p. 36) que “são conferidosmecanismos de controle de constitucionalidade.”.Compreender a Constituição como norma funda-mental, mais do que implicar o reconhecimento desua supremacia no ordenamento, faz necessária aexistência de instrumentos que tutelem sua condi-ção prioritária na ordem jurídica. Leciona Barroso(2009) que é em decorrência da força e suprema-cia constitucional que pode o intérprete se negar aaplicar uma norma entendida como violadora daConstituição.

Com o advento da Constituição Federal de1988 (CFBR/88) e com diversas modificaçõessociais e históricas, a perspectiva deNeoconstitucionalismo busca a garantia invioláveldos direitos fundamentais e a possibilidade daconcretização destes pelos poderes Executivo,

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Legislativo e Judiciário. Para resguardar uma ju-risdição constitucional eficiente, a ação dos trêspoderes deve ser realizada de maneira indepen-dente e harmônica.

No entanto, resguardar os preceitos consti-tucionais exige, por vezes, uma postura ativa porparte do Judiciário, tanto no que tange à interpre-tação quanto na efetivação das normas, mesmoque tal interferência represente uma possívelmitigação da separação dos poderes. A forma es-pecífica e proativa de interpretar a Constituição,expandindo o seu sentido e alcance, instala-se emsituações de retração do Poder Legislativo, de certodescolamento entre a classe política e a sociedadecivil, impedindo que as demandas sociais sejamatendidas de maneira eficiente.

Na jurisdição constitucional moderna, a in-terferência proativa dos Tribunais – segundo o qualos juízes passaram a desempenhar um papel maispolítico, observando as transformações sociais,econômicas e administrativas – mostra-se impres-cindível a necessidade de tal ingerência quandoverificada a violação dos direitos fundamentais,referentes à conduta omissa dos agentes públicos.

Assim como explicita Barroso (2009), com aabertura e a indeterminação semânticas das nor-mas constitucionais, que são em sua maioria prin-cípios, foi necessário ir bem adiante da tradicionalsubsunção e adotar uma nova hermenêutica, emque o povo viesse a participar. Isso porque, comoaduz Sarmento (2008, p. 119), “as disposições daConstituição não apresentam sentido único, reve-lando-se como moldura em que se tornam possí-veis diversas interpretações.”.

Nesse diapasão, elenca Barroso (2009, p.263):

Deste modo, aumentou a importância polí-tica do Poder Judiciário, que passou cadavez mais a ser responsável pela interpreta-ção constitucional e pela resolução de ques-tões polêmicas e relevantes para a socieda-de. Ainda, com a constitucionalização dosdireitos fundamentais, coube ao Poder Ju-diciário a sua proteção em face de ações doprocesso político majoritário que podemeventualmente lhes ofender.

No que se refere à separação de poderes noEstado Democrático de Direito, é de suma impor-tância que seja bem definida a separação de po-deres, instituto esse que permite a limitação dospoderes, a garantia das liberdades políticas, a nãoinfluência política no Judiciário e a realização ple-na das funções fiscalizatórias dos diversos órgãos.

Diniz (1992) preceitua que a tripartição dos pode-res assegura a realização de um modo de vidacorrespondente à democracia, ou seja, visa à rea-lização de uma vontade legitimada pelas vias de-mocráticas, sob os crivos de um status em que ospoderes estão interligados, em que eles se comu-nicam e se harmonizam, porém também realizamfiscalização mútua.

Uma das grandes críticas à atuação do Po-der Judiciário na atualidade é a sua atuação ativaque estaria utilizando prerrogativas legislativas paraas quais não estaria apto, principalmente por seusintegrantes não terem sido eleitos. O que se verifi-cará na sequência é que, diante da necessidade degarantia de direitos fundamentais pelo Poder Judi-ciário, uma forma de legitimação de suas decisõesse dá pela oitiva das associações de pessoas dossetores influenciados pelas decisões.

3 O JUDICIAL REVIEW E A DEMOCRACIA

O judicial review, ou revisão judicial, comoleciona Silva (1992) consiste em atos do sistemade governo dos Estados Unidos, em que as açõesdos Poderes Executivos e Legislativos estão su-jeitas à revisão pelo Poder Judiciário, podendo ser,eventualmente, invalidados de acordo com a deci-são proferida pelos juízes do caso. A revisão judi-cial permite que a Suprema Corte assuma umafunção ativa, no sentido que ela possa garantir quetodos os outros poderes cumpram com os precei-tos da Constituição. Esta revisão judicial teve seuinício nos EUA com o famoso caso Marbury vs.Madison (1803).

E no que se refere à revisão judicial, é possí-vel que se encontre em diversos âmbitos jurídicosdiscussões acerca de sua defesa, assim como deoposição. O debate sobre o uso das revisões judi-ciais pelas Cortes Supremas sobre o controle deconstitucionalidade das normas que foram produ-zidas pelos Parlamentos tem se tornado cada vezmais comum nos Estados democráticos.

Na posição contrária à revisão judicial, muitosdoutrinadores questionam se os juízes deverão terautoridade para revogar leis quando estiveremconvencidos de que elas violam direitos individuais,dando caráter contramajoritário à Corte, na qual,por vezes, defendem interesses políticos mascaradospela proteção das minorias.

Questionando sobre a legitimidade das Cor-tes Supremas decidirem e declararem inconstitucio-nalidade, em determinadas leis, que fora produzidapor parlamentares, que tem em suas mãos a vonta-

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de do povo expressa pelo devido voto, surge outroproblema em relação a democracia e a separaçãodos poderes. Este poder de invadir, em nome daConstituição, competências que pertencem ao par-lamento como sucedâneo da soberania popular é oque evoca maior problematização.

Assim, como aduz Barroso (2010) verifica--se, em verdade, que aludido debate reflete a tensãoentre constitucionalismo e democracia. Isso porquea adoção de uma Constituição rígida, por meio deprocesso constituinte democrático, dificulta adeliberação pela maioria acerca dos temas neladispostos, os quais passam a contar com critériosrigorosos para serem rediscutidos. Assim, os quese consideram iluminados o suficiente para acompreensão dos temas debatidos na Constituinteduvidam das gerações vindouras e proíbem arediscussão.

A opinião contrária, em defesa da revisãojudicial, diz que, quando em uma sociedade, o seuParlamento não se apresenta um bom funciona-mento, quando o senso popular apregoa poucaconfiabilidade, a transferência de confiança podeceder facilmente ao Poder Judiciário, que, na me-dida em que passa a ser o principal interlocutor dedemandas políticas não resolvidas na searalegislativa. Barboza (2007) dispõe que o problemacom isso é que a partir do momento em que o Ju-diciário assume como principal responsável estasquestões podem conferir a essas decisões cargasde imprecisões, podendo transferir todo o mal vis-to do parlamento ao Judiciário, e podendo tambémsofrer posteriormente pela mesma falta deconfiabilidade, uma vez à corrupção presente emtodos os âmbitos. Com isso, o Judiciário pode serlegislador de si próprio.

Silva (1992) ensina que, para que haja a de-mocratização do processo interpretativo e de apli-cação constitucional, faz-se necessária a amplia-ção da comunidade de intérpretes, com a inclusãode cidadãos, de partidos políticos e de associações,sem que se retire a Constituição dos Tribunais, afim de que sejam garantidos os direitos fundamen-tais e a tutela das minorias.

4 O POVO COMO INTÉRPRETECONSTITUCIONAL

A teoria clássica do Direito Constitucionalapresenta como intérpretes da Constituição ape-nas os juízes e tribunais constitucionais. Ou seja,não caberia demais legitimados proferir aquilo quetenham entendido como sendo a vontade de todo

o povo. Contudo, diante da doutrina que apregoa aConstituição como um produto da vontade de umpovo, e que outorga poderes para que esta sejaescrita em seu nome, convém questionar diantedesse espírito democrático qual o porquê de nãoperguntar diretamente ao povo, os verdadeiros ti-tulares do poder constituinte originário, a sua opi-nião sobre as questões constitucionais, a fim deefetivar sua presença como característica de umaverdadeira democracia.

Nisto, Peter Häberle, com a crise do proces-so democrático nos anos 70 na Alemanha, em suaanálise concretista dos problemas constitucionais,apresentou uma proposta na qual demais intérpre-tes integrariam a esse processo, participariam daanálise da Constituição, a fim de este não estejatão somente ligado com os intérpretes clássicos.Ele ofereceu a proposta de uma dinâmica maisvasta de intérpretes da Constituição. Para esteautor, as normas constitucionais devem ser enten-didas pelos seus destinatários e não deixada à pers-pectiva dos intérpretes oficiais da Constituiçãoelencados pela teoria clássica.

Häberle sugere uma sociedade com intérpre-tes que possa abarcar o maior número possível dedestinatários da Constituição, tornando uma inter-pretação mais democrática. Isso é o que ele cha-mou de sociedade aberta de intérpretes, em oposi-ção à sociedade fechada, na qual há poucos intér-pretes legitimados, e estes seriam os juízes e ostribunais constitucionais. Ou seja, trata-se depluralizar a participação do povo em todas as fa-ses por que se perpassa a lei, da sua criação atéuma posterior declaração de inconstitucionalidade,dando fim à lei, pois a sociedade deve ter papelativo na produção legislativa, dando um caráter deamicus curiae à criação legislativa.

A proposta da sociedade aberta de intérpre-tes, embora seja de extrema importância, a suaviabilidade, a efetivação, como democracia con-temporânea, não é tão simples. O conceito abarcadiversas críticas pontuais, quanto a sua viabilidadeuma vez que isso poderia abarcar mais conceitoscomplexos que se pode analisar. O sistema de so-ciedade aberta para interpretação das normas podese tornar o inverso de sua base, abrindo possibili-dades para sua inefetividade, ou até mesmo comoum sistema corruptível. Mas é preciso uma dis-cussão constitucional para que seja o norte dasrealizações para com este sistema.

Nesse sentido, para Dworkin (2011), a con-cepção de Direito Constitucional associada à de-mocracia pressupõe requisitos morais que não são

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suficientemente atendidos pelo processodeliberativo majoritário, mas pela resposta certasobre direitos fundamentais, a qual é inspirada peloideal da igual consideração e respeito, e ajuda apromover a filiação moral de cada pessoa à co-munidade política.

A democracia, para Dworkin (2011), requermais que a garantia da decisão da maioria por meiode procedimentos formalmente igualitários, exigin-do incremento de teor substantivo. Considerandoque todos merecem igual respeito e consideração,os direitos das minorias devem ser resguardados,e disso decorre a importância do judicial review.

Assim, faz-se necessária uma interpretaçãoconstitucional conjunta, na qual os destinatários dasnormas e a corte constitucional poderão chegar auma justiça que seja democrática. Em sua teoria,Häberle apresenta uma proposta da participaçãoefetiva de intérpretes. Por tal proposta, a normadeve apresentar uma maior característica demo-crática, aperfeiçoando e aumentando o sentimen-to de espírito do povo e supremacia do povo naparticipação efetiva na política.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na perspectiva atual de Neoconstitucio-nalismo, tem-se como proposta a operacionalizaçãodo sistema jurídico de acordo com o ideal da ex-pansão das garantias e direitos fundamentais. Paraque ocorra a efetivação constitucional, faz-se ne-cessária a aplicação de uma hermenêutica pro-gressista, a fim de que a Lei Maior seja entendidacomo projeto coletivo com vistas a garantir e exe-cutar os direitos fundamentais.

Dessa maneira, torna-se difícil conceber asdoutrinas que limitem ou impeçam a participaçãodo Judiciário na interpretação e realização dos pre-ceitos constitucionais, considerando sua açãoproativa necessária para a proteção dos direitosdas minorias. Entretanto, a realização do judicialreview não pode representar uma supremacia dosTribunais.

Nessa perspectiva, faz-se primordial o incre-mento de formas de diálogo entre o povo e asCortes com a finalidade de que os cidadãos se tor-nem parte do processo decisório e interpretativo.Assim, a participação popular no controle deconstitucionalidade se torna uma forma de concili-ar democracia e constitucionalismo. Um exemploé o amicus curie.

Perante as críticas da interpretação consti-tucional feita pela voz das Cortes Superiores, no

sentido que elas estariam atuando em caráterLegislativo, mas também respondendo aos anseiossociais, propõe-se a participação social no proces-so interpretativo constitucional. Assim, aproxima-se o Estado, pelos braços do Poder Judiciário, dasociedade. E, por meio dessa interpelação, éconferida uma maior legitimidade a tais delibera-ções, efetivando a democracia e permitindo umaconciliação entre o judiciário e povo como intér-pretes e efetivadores da Constituição.

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RESUMO

Este artigo busca abordar a efetividade dos direi-tos sociais, que implicam uma atuação no que tan-ge às autoridades públicas, a fim de assegurar umasituação de estabilidade socioeconômica, constitu-indo-se como núcleo normativo medular do Esta-do Democrático de Direito amplamente empenha-do em sanar as desigualdades que atinge a socie-dade. Em face do princípio da reserva do possível,para o qual a insuficiência de recursos financeirostorna inexigível a aplicabilidade de tais direitos, im-põem-se obstáculos de cunho político e econômi-co. Ante a peculiaridade da estrutura do estudoem pauta, o recurso metodológico utilizado, pró-prio das pesquisas jurídicas, exprimiu-se por meioda análise e interpretação de textos, leitura e in-vestigação em leis, doutrinas, teses, bem comopesquisa complementar. O objetivo é produzir umjuízo crítico do tema abordado cuja fundamenta-ção geral se deu na crença da supremacia da Cons-tituição Federal em que o Direito só se concretizapor meio da efetivação dos direitos fundamentaise cumprimento dos imperativos constitucionais.

Palavras-chave: Efetivação dos direitos sociais,reserva do possível, Estado Democrático de Di-reito.

ABSTRACT

This article address to effectiveness of social rightsthat imply an act by public authorities in order tosecure a situation of socioeconomic stability,constituting like central normative core ofDemocratic Right State broadly committed inremedy the inequality that reaches the society.From possible reserve in witch insufficiency offinancial resources makes unenforceable theapplicability of these rights, imposing political andeconomics obstacles. Before peculiarity of thestructure of this study, the methodological resource

ANÁLISE DA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS EM FACE DOPRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL

Diana Alves Câmara1

utilized, own from legal researches, was expressedthough review and interpretation of texts, readingand research in law, doctrines, theses, as well ascomplementary online survey. Aiming to producea critical judgment of the subject whose generalstatement of reason was given in the belief of thesupremacy of the Federal Constitution in whichthe right is realized only through the enforcementof fundamental rights and constitutionalimperatives.

Keywords: realization of social rights, possiblereserve, democratic right state.

1 INTRODUÇÃO

Os direitos sociais integram a categoria dosdireitos e garantias fundamentais na vigente Cons-tituição Federal, especificamente no artigo 6.°.Como o vocábulo nome já informa, fundamental éelementar, imprescindível, não podendo, portanto,tais direitos ser relegados a apenas existir na Cons-tituição sem efetividade social. Não obstante, oBrasil é um Estado Social Democrático de Direi-to. Importa ressaltar que tal designação implicaem um Estado com finalidade voltada ao bem co-mum e ao interesse social, consoante a vontadeda maioria com respeito às necessidades da mi-noria. Isto é democracia.

Nítido observar que o Direito foi concebidoa fim de proteger aos hipossuficientes colocando--os em nível de igualdade com os demais que es-tejam em uma categoria superior seja intelectual,social ou financeiramente. A busca pela isonomiaconsiste em ofertas de iguais oportunidades paratodos, a serem caucionadas pelo Estado. Soma--se a isso o conceito realista que pugna pela igual-dade proporcional, que se sintetiza em um trata-mento congênere aos substancialmente similares.

1 Acadêmica do Quarto Período Matutino do Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.

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Ademais, impõe abordagem distinta aos desiguaisna dimensão de suas diferenças, na medida emque, supridas as discrepâncias, atinja-se a igualda-de, de fato.

A primazia do ordenamento jurídico brasilei-ro não é apenas a vida, como bem de valor consti-tucional supremo, mas um viver com dignidade.Subentende-se um viver em que as pessoas pos-sam ter acesso a todos os meios para o seu com-pleto desenvolvimento.

O presente estudo acadêmico se destina ainvestigar se a efetivação dos direitos sociaispode ser condicionada à reserva do possível.O texto mostrará a abordagem tendo comosubstrato as doutrinas, leis e pareceres de estudio-sos sobre o assunto tratado. E, por derradeiro, se-rão catalogadas as considerações finais.

2 CONTEXTUALIZANDO OS DIREITOSSOCIAIS

Os direitos sociais se direcionam ao desígniode oportunizar o efetivo gozo das liberdades fun-damentais, propiciando aos indivíduos as condiçõesnecessárias para uma sobrevivência digna. Inten-tando melhor contextualização é pertinente citar adoutrina, nos seguintes termos:

A origem histórica encontra-se na tradiçãodo Estado Social de Direito, que rompendocom os padrões formalistas de igualdade ede liberdade do paradigma anterior, vãobuscar mecanismos mais concretos de re-dução das desigualdades socioeconômicasdentre os membros da sociedade(FERNANDES, 2014, p. 461).

Isto é o primórdio do entendimento de que oEstado pode ser encarado não mais como uminimigo erga omnes (oponível) da sociedade, mascomo um viabilizador de sua existência(FERNANDES, 2014). Isto porque os direitossociais “para serem usufruídos, reclamam, em facede suas peculiaridades, a disponibilidade dasprestações materiais que constituem seu objeto, jáque tutelam interesses e bens voltados à realizaçãoda justiça social.” (CUNHA JÚNIOR, 2008, p.696-697). Em outras palavras, “os direitosfundamentais sociais, em vez de serem direitoscontra o Estado, constituem-se por meio doEstado.” (BARRETO, 2013, p. 207). Tal conceitorompe o paradigma de que o “Estado é o comitêexecutivo dos negócios da burguesia” (MARX;ENGELS, 1973, p. 69), visto que nasceu,

precisamente, em virtude e como resposta àsdesigualdades social e econômica da sociedadeliberal, que se instalaram no mundo no período pós--Segunda Guerra Mundial, constituindo-se comonúcleo normativo central do estado democráticode direito, como aponta Barreto (2013). Com vistasa solucionar essa profunda crise de desproporçãosocial – subtende-se a dicotomia entre pobres ericos, em que os primeiros sobreviviam comrecursos ínfimos e os últimos adquiriam cada vezmais – emergiu a necessidade de transição domodelo liberal de Estado para o Democrático deDireito que se articula por meio de uma democraciarepresentativa, participativa e pluralista, além degarantir a execução prática dos direitosfundamentais abrangendo os sociais, por intermédiode métodos apropriados outorgados aos cidadãos,visando à dignidade humana (MAGALHÃESFILHO apud CARVALHO, 2006).

Em síntese:

A concepção liberal-burguesa do homemabstrato e artificial foi substituída pelo con-ceito do homem em sua concretitude histó-rica, socializando-se então os direitos hu-manos. O Estado deixa de ser absenteístapara assumir uma postura ativa, de quemsão exigidas prestações para que sejam as-segurados os direitos sociais [...]. (CAR-VALHO, 2006, p. 479).

Do exposto, infere-se a deserção da percep-ção de uma conduta absenteísta por parte do Es-tado, para ao contrário, atestar a necessidade dointervir, gerando condições para execução de pro-gramas públicos voltados para saúde, trabalho, etc.(FERNANDES, 2014).

No Brasil, a preocupação com os direitossociais granjeia seu marco introdutório na Consti-tuição de 1934. Porém, é na vigente Lei Maiorque estes passam a agregar a pauta de direitos egarantias fundamentais. O que cabe menção aotexto constitucional que elenca “a educação, a saú-de, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, asegurança, a previdência social, a proteção à ma-ternidade e à infância, a assistência aos desampa-rados”, como se vê do teor do art. 6.° da Consti-tuição de 1988, como direitos sociais. Nas pala-vras de Lenza (2014) trata-se do desdobramentode um Estado Social de Direito, com o comple-mento de “Que nasceu das lutas contra o absolu-tismo, sobretudo através da afirmação dos direitosnaturais da pessoa humana.” (DALLARI, 2011,p. 147).

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São, portanto, imperativos que limita e im-põem deveres ao Poder Público a fim de resguar-dar a população contra a ingerência do Estado,sendo, em virtude do apresentado, designados comoliberdades individuais – em consequência das de-mandas judiciais relacionadas à efetivação dos di-reitos sociais em sua vasta maioria serem de cu-nho individual e não coletivo – consoante Piovesan(2010). De forma análoga, afirma Lafer (2006, p.127) que “o titular dos direitos sociais continuasendo, como nos direitos civis e políticos, o ho-mem na sua individualidade”, consistindo em pres-suposto substancial para o exercício da cidadaniaao disponibilizar circunstâncias materiais e execu-tar condições fáticas que fomentem a homologa-ção dessas liberdades. Fato que possibilita meiosfavoráveis propícios a auferir a isonomia, maiscompatível com o exercício da liberdade (SILVA,2014). Corroborando tal assertiva, vem a seguinteexplicação:

Direitos sociais são direitos fundamentaisdo homem, caracterizando-se como verda-deiras liberdades positivas, de observân-cia obrigatória em Estado Social de Direito,tendo por finalidade a melhoria de condi-ções de vida aos hipossuficientes, visan-do à concretização da igualdade social, esão consagrados como fundamentos doEstado democrático (MORAES, 2013, p.2013).

Depreende-se, então, que tais garantiasobjetivam ofertar ao homem como cidadão de di-reito uma condição digna de convívio, relaciona-mento e sobrevivência dentro da sociedade. O queacaba por demandar a intervenção ativa e frequen-te dos Poderes Públicos. Evidente que reivindicamdo Estado, enquanto ente soberano, um leque dediversidade de ações e políticas públicas que de-vem ter por escopo a efetivação dos direitos soci-ais, que por se enquadrarem na categoria dos sub-jetivos, esteiam poderes de exigir. Importarelembrar o já anteriormente mencionado, que emcontraste com os denominados direitos individu-ais, cujo cerne se respalda em um “não fazer”, um“não violar”, por parte das demais pessoas princi-palmente no que tange às autoridades públicas, emcontraposição o conteúdo dos direitos sociais acar-reta “um fazer”, “um ajudar” por intermédio dosórgãos estatais (CARVALHO apud SILVA,2006). Ademais são instituídos pelo texto constitu-cional como “valores supremos.” (BARRETO,2013, p. 205).

Em última análise, Otávio Henrique MartinsPort, explica que

A ideia central que levou à incorporaçãodos sociais ao rol dos direitos fundamen-tais tem seu alicerce na necessidade de quea todos sejam garantidas condições míni-mas de bem-estar, assegurando-se a igual-dade de oportunidades, o que está intrin-secamente ligado ao princípio da solidarie-dade (PORT, 2005, p. 9, apud GONÇALVES,2015).

Notadamente, o objetivo é extinguir, ou nomínimo amainar, as desigualdades existentes.

2 DIREITOS SOCIAIS E ECONÔMICOS

Por outro lado, “não é fácil estremar, comnitidez, os direitos sociais dos direitos econômicos”(SILVA, 2014, p. 288). Conjuntura que pode serdeslindada com a divergência no que tange aosdireitos dos trabalhadores pertencerem aos soci-ais ou aos econômicos – pelo seu inquestionávelvínculo para com a economia. Válido atentar, to-davia, que a Constituição classifica os supraditosdireitos no rol dos sociais, por ser de conhecimen-to geral que o trabalho é um exercício laboral, tipi-camente humano, que dignifica o homem por lheprover o sustento e demais necessidades. O que,decerto, conduz ao elo entre os direitos sociais eeconômicos considerando que os últimos tambémtencionam proporcionar o suprimento das neces-sidades humanas, agraciando vida digna ao ho-mem.

Nos dizeres de Silva (2014, p. 288):

O direito econômico tem uma dimensãoinstitucional, enquanto os direitos sociaisconstituem formas de tutela pessoal. O di-reito econômico é o direito da realização dedeterminada política econômica, ou segun-do Geraldo Vidigal “é a disciplina jurídicade atividades desenvolvidas nos mercados,visando a organizá-los sob a inspiraçãodominante do interesse social”. Os direitossociais disciplinam situações subjetivaspessoais ou grupais de caráter concreto.

Silva agrega ainda a seguinte assertiva:

Pode-se admitir que os direitos econômi-cos constituirão pressuposto da existên-cia dos direitos sociais, pois sem uma polí-tica econômica orientada para a interven-ção e participação estatal na economia, não

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se comporão as premissas necessárias aosurgimento de um regime democrático deconteúdo tutelar dos fracos e mais nume-rosos (SILVA, p. 288, 2014) (Grifos nossos).

Relevante aludir ao equívoco da afirmativaacima grifada, uma vez que, na concepção deBarreto (2013), os direitos sociais não são subsidi-ários de outros direitos. Ademais, se estes possu-íssem caráter residual, qual seria a finalidade dotexto constitucional os listar como direitos funda-mentais? Não é preciso ir além do disposto naConstituição para entender que todos os coroláriosdos direitos e garantias fundamentais possuem amesma hierarquia e a mesma importânciaconstitutiva no estado democrático. Ficam, então,eximidos de se tornarem meras promessas consti-tucionais inconsequentes (PIOVESAN, 2010).

Ratificado o argumentado, cabe menção àDeclaração Universal dos Direitos Humanos, quedisserta em seu art. 22 a liberdade concedida atoda pessoa como membro da sociedade, ao exigira satisfação dos direitos econômicos, sociais eculturais. O que concretiza, assim, o dever do Es-tado de comedir as consequências da pobreza, quenão podem ser delegadas privativamente aos pró-prios indivíduos, proporcionando suprimentosatisfatório das necessidades pessoais(BARRETO, 2013).

O que se pretendeu com a explanação foimostrar a existência autônoma dos direitos soci-ais, que independem dos demais para ser ferra-mentas de direitos e garantias fundamentais. O quenão se confunde, obviamente, com a intrínseca li-gação destes com os demais direitos, principalmen-te os econômicos. Como mostrado por Silva, é in-discutível a indispensabilidade de uma orientaçãoeconômica voltada ao cumprimento dos ditamesconstitucionais. E é justamente essa inegável co-nexão que leva alguns operadores do direito a sus-tentar que a execução fática dos direitos sociaisprestacionais estaria suscetível à disponibilidade derecursos voltados para esse fim. De modo que ainsuficiência, carência, de tais recursos tornariainexigível a garantia dos supracitados direitos.

3 EFETIVAÇÃO DOS DIREITOSSOCIAIS E A “RESERVA DOPOSSÍVEL”

Há embate entre a efetivação dos direitossociais e a reserva do possível. “O conceito dereserva do possível é uma construção da doutrina

alemã que coloca, basicamente, que os direitos jáprevistos só podem ser garantidos quando há re-cursos públicos” – explica Lima (2014). Destarte,carece observar que os direitos sociais são caros(CANOTILHO, 2010), em virtude de todas as di-mensões dos direitos fundamentais demandaremgastos públicos. E perante uma situação que nãohaja recursos suficientes para atender todas asdemandas, deve-se priorizar a mais pertinente,conforme a situação do momento e por questãode conveniência administrativa. Como bem sali-entado por Troester e Mochón (2004), a necessi-dade de escolha é inerente a toda sociedade, des-de o indivíduo, a empresas e também o governo,que tem que escolher entre investir na educaçãoou no comércio internacional, por exemplo.Consequentemente, existirão beneficiados e pre-teridos, e em consonância com Barreto (2013), osdireitos sociais jamais poderão ser desprezados porconsistirem no núcleo normativo central do estadodemocrático de direito. Ademais, “a estrutura de-mocrática da sociedade consiste no climasocioeconômico favorável à vivência concreta dosdireitos fundamentais.” (MAGALHÃES FILHOapud CARVALHO, 2006, p. 458).

Em sua obra, Canotilho alega que o EstadoSocial só estaria apto a desempenhar satisfatoria-mente as suas tarefas de sociabilidade se houvera observância de quatro requisitos básicos, umavez que a efetivação dos direitos sociais deve serassegurada de forma gratuita ou tendencialmentesem ônus. São esses requisitos:

1 - provisões financeiras necessárias e su-ficientes, por parte dos cofres públicos, oque implica um sistema fiscal eficiente ecapaz de assegurar e exercer relevante ca-pacidade de coação tributária;2 - estrutura da despesa pública orientadapara o financiamento dos serviços sociais(serviços sociais) e para investimentos pro-dutivos (despesa produtiva);3 - orçamento público equilibrado de formaa assegurar o controle do défice das des-pesas públicas e a evitar que um défice ele-vado tenha reflexos negativos na inflaçãoe no valor da moeda; e4 - taxa de crescimento do rendimentonacional de valor médio ou elevado (3%pelo menos ao ano) (CANOTILHO, 2010,p. 19-20).

Ademais, elucida o recém-citado autor quealguns alegam que a ideia dos direitos sociais estáalicerçada em expectativas às quais o Estado não

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possui condições de cumprir. O que, na visão deBarreto (2013), é uma falácia que se embasa nopretexto de que a efetividade dos direitos sociaisdepende da presença de uma economia estável,na qual as cifras de manutenção das prestaçõessociais poderiam ser suportadas, simplificando ointricado sistema econômico e social dacontemporaneidade. Isto porque “parte do pres-suposto de que somente os países ricos teriamcondições de sustentar políticas sociais consisten-tes e que atendessem aos ideais de justiça social.”(BARRETO, 2013, p. 213).

Canotilho (2010, p. 20) anexa, ainda, em suaobra, a informação de que “no banco dos réus estáa célebre política do déficit spending:endividamento do Estado com a finalidade de fi-nanciar a despesa pública, sobretudo a despesasocial.”. É a partir dessas premissas que algunsoperadores brasileiros do direito vão sustentar quea aplicação de recursos financeiros em defluênciaà consumação de providências positivadoras dedireitos sociais seria um conteúdo restrito e priva-tivo das decisões gorvenamentais e parlamenta-res, condensadas nos planejamentos de políticaspúblicas e em conformidade as previsões orçamen-tárias (FERNANDES, 2014), que continua lecio-nando:

A crítica de Dirley da Cunha Júnior é impor-tante e deve ser marcada, pois, afinal, adoutrina constitucional brasileira pareceestar deslumbrada pelo modismo e pelaautoridade da doutrina alemã, importandoteses e institutos jurídicos sem a menorpreocupação de adequação (adaptação)dos mesmos ao nosso contexto histórico--hermenêutico (FERNANDES, 2014, p. 583).

Pode-se deduzir, então, que o princípio da“reserva do possível” nada mais é que umahipocrisia decorrente de um Direito ConstitucionalComparado equivocado, no aspecto em que ocenário social brasileiro não se compara ao dospaíses consignatários da União Europeia ondevigora a máxima da igualdade material. Informaçãoprontamente testificada por Barreto (2013) queconstata serem estas justificativas arcaicas, comvistas a eximir o Estado enquanto ente soberanode suas responsabilidades, dado ao desnível darealidade político-social da Alemanha pós-SegundaGuerra Mundial e Brasil atual – em que este últimoatravessa um momento de constantes crises sociaiscom a maioria das pessoas sendo socialmenteexcluídas, vivendo à margem e sem perspectivas

de vida. O que cabe menção ao juízo de AndréasKrell citado por Fernandes (2014, p. 583) paraquem a “leitura da reserva do possível é falaciosa,pois, se os recursos são incontroversamentereconhecidos como insuficientes, devemos retirá--los de áreas menos importantes do ponto de vistado interesse público [...]”. Sobre tal declaraçãolegitima Barreto que é ilusória a racionalidade quedistingue a reserva do possível como limite fáticoa efetivação dos direitos sociais prestacionais, poresse argumento desconhecer em que pese ser ocusto consubstancial a todos os direitosfundamentais. Salienta o alto custo do conjuntoestatal administrativo-judicial exigido para garantiados direitos civis e políticos.

Não obstante, a escassez de recursos termi-na por afetar precisamente em razão da unidadedos direitos humanos tanto os direitos civis quantoos políticos (BARRETO, 2013). Obsta evocar queem nenhum momento o texto constitucionalenaltece a importância que se efetive determina-do direito fundamental em detrimento de outro, umavez que o ordenamento jurídico se constitui comoum todo, uno, indivisível e harmônico. Aludindo aFernandes (2014, p. 575) “os direitos sociais nãosó alargam a tábua de direitos fundamentais, mastambém redefinem os próprios direitos individuais.”.E “estabelecer uma relação de continuidade entrea escassez de recursos públicos e a afirmação dedireitos acaba resultando em ameaça à existênciade todos os direitos.” (BARRETO, 2013, p. 214).

Em um exame mais apurado do texto consti-tucional, como um todo é pertinente citar o Pre-âmbulo da Constituição Federal, que institui umEstado Democrático destinado a assegurar oexercício dos direitos sociais e individuais, alémdo bem-estar e desenvolvimento. Portanto, se oEstado não assegura tais direitos, está passandopor cima de todo fundamento basilar da democra-cia social e representativa. O que representa, “emúltima análise, ignorar a exigência estabelecida nopróprio Preâmbulo da Constituição de 1988.”(BARRETO, 2013, p. 212). Oportuno mencionarCunha Júnior (2008), para quem “nem a reservado possível, nem a reserva de competência orça-mentária do legislador, podem ser invocados comoóbices, no direito brasileiro, ao reconhecimento eà efetivação de direitos sociais originários a pres-tações.”. Compreende-se que o referido princípioda reserva do possível denotaria, por conseguinte,um instrumento restritivo à exequibilidade dos di-reitos fundamentais e sociais.

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O Ministro Celso de Melo, do Supremo Tri-bunal Federal, ao relatar o Recurso Extraordinárion.º 39 3175 RS/ DF, descreve que entre dar prote-ção à inviolabilidade do direito à saúde e à vidaque se caracteriza como direito subjetivo inalienávela todos respaldado pela Constituição da Repúblicaou fazer sobrepujar versus essa garantia funda-mental, uma conveniência financeira e acessóriado Estado, compreende – uma vez configuradoesse impasse – que motivos de ética jurídicacompulsam ao julgador uma singular e razoávelalternativa: aquela privilegia a deferênciaindeclinável à vida e saúde do ser humano.

Não obstante, voltando ao cerne daindagação, condicionar a eficácia dos direitossociais à disponibilidade de haveres financeirosfiguraria em lhes remover toda pujança normativaque os circunda e lhes refuta o regimento decustódia estatuído pela Lei Maior e pelo sistemainternacional de tutoria dos direitos humanos. Emconsonância com o dito, Barreto (2013) sustentajustamente ser essa – negar-lhes a característicade direitos fundamentais – uma das maneiras maisgenérica de contestar a efetividade aos direitossociais. Em suas palavras,

Afastados da esfera dos direitos funda-mentais, ficam privados de aplicabilidadeimediata, excluídos da garantia das cláusu-las pétreas, e se tornam assim meras pautasprogramáticas, submetidas à “reserva dopossível” ou restritos à objetivação de um“padrão mínimo social” (BARRETO, 2013,p. 209).

Explana ainda que tais polos argumentativosse prestam ao propósito de legitimar protótipos,tanto políticos quanto sociais, que se antepõem àideia medular do Estado Democrático de Direito,que sanciona ser a observância dos direitos soci-ais uma exigência de cunho moral e ético, não su-jeita a entendimentos políticos. Semelhantemente,ponderam Lima e Melo (2014) que não haveriaóbice ao aproveitamento do princípio da reservado possível por analogia a fim de se valer de sus-tentação legal ante à inércia do Poder Público que,em consequência, gera condições fáticas desfa-voráveis à admissão de melhores providências queseria essencial e inescusável no sentido de viabilizaro direito à vida. Acrescentam, ainda, que o intuitodo Estado em alegar tal princípio seria tão somen-te legalizar sua omissão na implementação de po-líticas públicas, cuja atribuição seria perseguir ointeresse público primário.

Conveniente remeter ao Direito Penalbrasileiro, que não admite analogia in malampartem (em prejuízo do acusado). Adaptando talpremissa à interpretação do Direito Constitucional,figuraria em proibição de analogia em prejuízo aodestinatário dos direitos assegurados pelaConstituição. O que, consoante Canotilho (2010,p. 481) “no caso de dúvidas deve preferir-se ainterpretação que reconheça maior eficácia aosdireitos fundamentais.”. Isto porque tais direitos“constituem-se em direitos impostergáveis naconcretização dos objetivos últimos pretendidospelo texto constitucional.” (BARRETO, 2013, p.207). De modo símile, menciona Novelino (2008)que congruente ao princípio da máxima efetividade– também conhecido como princípio dainterpretação efetiva ou princípio da eficiência – éfixado que se deve outorgar na interpretação dasnormas constitucionais o sentido que lhes conferea maior efetividade factível. O que implica naconsumação do direito, ao exercício concreto desua missão social, que se relaciona de forma íntimacom a dignidade da pessoa. E que será devidamenteesmiuçado no próximo tópico.

4 QUANTO À DIGNIDADE DA PESSOAHUMANA

O termo dignidade designa “o respeito quequalquer pessoa merece” (CARVALHO, 2006, p.462). Não obstante, é incontroverso que nahodierna Constituição Federal a dignidade da pes-soa humana é alicerce de todas as normas e dita-mes que dela decorrem. Implica não apenas umarecognição do valor do homem, mas um Estadoedificado com base nesse princípio.

A dignidade se caracteriza como uma parti-cularidade do gênero humano, que possibilita iden-tificar todos os homens como pertencentes a ummesmo gênero (BARRETO, 2006). Em semelhan-ça, a Declaração Universal dos Direitos do Ho-mem prega em seu art. 1.° que todos os seres hu-manos nascem livres em dignidade e em direitos.E em seu preâmbulo, versa sobre o reconhecimentoda dignidade inerente a todos os membros da fa-mília humana e dos seus direitos que se constitu-em como fundamento da justiça e paz do mundo.Em outras palavras, “todos são dotados de umamesma dignidade.” (BARRETO, 2013, p. 66).

Numa concepção mais clássica de dignida-de humana, “o homem é um fim em si mesmo”(KANT, 2004, p. 65). Em consonância com opensamento kantiano, em casos de confronto en-

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tre normas jurídicas alusivas a progênie financei-ra, tributária, administrativa e econômica do Direi-to e normas imediatamente vinculadas aos direitosfundamentais, as últimas nunca podem ceder àsprimeiras, sob penalidade de converter o ser hu-mano em meio de satisfação de políticas públicas,violando-lhe os direitos fundamentais e sua digni-dade primordiais do modelo do Estado Democráti-co de Direito, à qual toda norma deve secontextualizar, aponta Gomes (2014). Pois, “a dig-nidade humana encontra-se na ordem daquilo quenão é demonstrável, mas existe como pré-condi-ção.” (BARRETO, 2013, p. 67).

Nítido reparar que “o conceito de dignidadehumana repousa na base de todos os direitos fun-damentais (civis políticos e sociais)” – pontificaDelpérée (apud Carvalho, 2006, p. 463), consa-grando, assim, na redação constitucional um direi-to de resistência em favor do homem. Conclui-se,então, que “a dignidade da pessoa humana, na suaacepção jurídica, não pode ficar restrita a camposdefinidos pelo direito positivo, mas pressupões paraa sua materialização jurídica perspectivas maisamplas que permite o espaço jurídico positivado.”(BARRETO, 2013, p. 64-65).

No âmbito da Constituição brasileira de1988, a dignidade da pessoa humana é ofundamento de todo o sistema dos direitosfundamentais, no sentido de que estes cons-tituem exigências, concretizações e desdo-bramentos da dignidade da pessoa e quecomo base nesta é que aqueles devem serinterpretados (CARVALHO, 2006, p. 465).

Por conseguinte, a dignidade é basicamenteum direito que irrompe em mister daimprescindibilidade de se atestar os outros direitosda pessoa, que se situem além dos individuais, cons-tituindo a fonte legitimadora de todos os demaisdireitos (BARRETO, 2013). Pois, abarca não so-mente os direitos individuais como também os decunho econômico, social e cultural. No EstadoDemocrático de Direito a liberdade não é mera-mente negativa (ausência de constrangimento),mas liberdade positiva que se funda na desoneraçãode obstáculos que possam impedir a completa re-alização da personalidade humana (CARVALHO,2006).

Em consonância ao exposto, arrazoa Sarlet(2010) que a dignidade da pessoa humana, deman-da por meio de prestações positivas (direitos fun-damentais sociais) uma existência condigna paratodos. O que, consequentemente, implica em uma

vedação às medidas que fiquem aquém desse pa-tamar. Além do mais, mediante a supressão de dadodireito social, será também deflorado, a dependerdo caso, a própria dignidade, o que desde logo semostra como inadmissível. Portanto, a dignidadesitua-se no âmago da batalha contra o risco dedesumanização (BARRETO, 2013), por ser umvalor que norteia todo o corpo jurídico asseguran-do a todos os cidadãos, os direitos a eles ineren-tes.

Em última análise, levando em consideraçãoa natureza jurídica da dignidade humana, consta-ta-se de que não se trata de um direito subjetivo,mas ela possui competência para exigir que essesdireitos sejam reconhecidos para o indivíduo(BARRETO, 2013). E como proferido por Sarlet(apud Carvalho, 2006,) “os direitos fundamentaisrepresentam explicitações da dignidade humana jáque em cada direito fundamental há um conteúdoe uma projeção da dignidade da pessoa.”, que apermite gozar o dom da vida de forma digna, poisnada é tão belo quanto viver. Não importa a cor dapele, a nacionalidade, o físico, ou a moradia, nin-guém ocupa o lugar de ninguém no palco da vida(CURY, 2002), sintetizando nas palavras deEldeman (apud BARRETO, 2013) no sentido deque a liberdade é a essência dos direitos humanose a dignidade a essência da humanidade.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando todo o relatado, capta-se quea finalidade do presente trabalho não foi esgotar otema discutido e tampouco se devota a uma pes-quisa acadêmica em prol de mera satisfação inte-lectual por meio de análise, comparação e expli-cação de textos, leis e doutrinas. Assume, antes,relevância eminentemente prática e útil, por pro-duzir um esquadrinhamento da atual realidade so-cial, auxiliando e esclarecendo tanto aos operado-res do Direito quanto àqueles que se interessampelo assunto em pauta.

Das informações elencadas, presume-se queos direitos sociais asseguram uma existência hu-mana digna alicerçada na promoção da justiça so-cial, tratamento isonômico e respeito à manifesta-ção material da liberdade, além de consagrar oEstado Democrático de Direito no qual os direitossociais obtiveram tutela máxima e efetiva.

Não obstante, são cláusulas pétreas, não po-dendo ser limitados ou relegados, dada àinexistência de motivos e argumentos que legiti-mem a limitação de seus efeitos. Portanto,

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condicioná-los ao princípio da reserva do possívelseria, antes de qualquer coisa, afastar-lhes da for-ça normativa, contrariando o disposto no própriotexto constitucional por meio de uma tese do Di-reito Comparado que visa justificar as omissõesdas autoridades públicas ou facultar aosgovernantes efetivar ou não os direitos sociais.

Em síntese, não se deve importar teses de-senvolvidas no exterior por intermédio do DireitoComparado sem a medida cautelar de adaptá-lasàs necessidades do povo brasileiro. Afinal, o Di-reito é um produto social que regula a vida emsociedade. Portanto, deve haver uma relação har-mônica entre o Direito e seus destinatários, o quesó é possível quando a realidade se torna um re-flexo dos ditames constitucionais.

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RESUMO

O presente trabalho tem como finalidade analisaros direitos do herdeiro especial frente à vocaçãohereditária, buscando uma equiparação entre asgarantias do cônjuge e do companheiro como astratadas constitucionalmente, sem distinção ou hi-erarquia de direitos, conforme previsões legislativasno que tange à sucessão. Através de apontamen-tos citados no referido estudo, observa-se a evolu-ção que o tema adquiriu no decorrer do tempo atéos dias atuais, como os posicionamentos dos julga-dos no que tange à constitucionalidade do artigo1.790 do Código Civil e também no que diz respei-to à situação da entidade familiar. Desta forma,propõe-se uma interpretação inclusiva de direitosem razão da atual situação do companheiro, pre-valecendo perante o direito sucessório medidasgarantidoras, conforme os ditames da Justiça.

Palavras-chave: União Estável. Herdeiro Espe-cial. Direito Sucessório.

ABSTRACT

This study aims to analyze the rights of special heirfront heredity, seeking a match between theguarantees of spouse and partner treated asconstitutionally, without distinction or hierarchy ofrights, according to legislative predictions regardingthe succession. Through notes cited in the study,we observed the evolution of the subject acquiredthrough time to the present day, as the positions ofjustices regarding the constitutionality of Article1790 of the Civil Code and also regarding the statusof the entity family. Given this it proposes an inclu-sive interpretation of rights due to the currentsituation mate, prevailing inheritance law againstguaradictates of Justice.

Keywords: Stable Union. Special heir. SuccessionDuty.

SITUAÇÃO DO COMPANHEIRO COMO HERDEIROESPECIAL NA UNIÃO ESTÁVEL

Camila Micaelen Freitas Oliveira1

Isabella Teresa Silva Souto2

1 INTRODUÇÃO

Buscando a necessidade de garantir as li-berdades do cidadão afirmado pela Constituição eagregado aos direitos fundamentais e valorativosdo ser humano, o Código Civil de 2002 contém umLivro específico sobre a união estável, em seusartigos 1.723 a 1.727. Às regras referidas se juntaa orientação jurisprudencial e doutrinária, além deregulares leis específicas sobre o regime de co-munhão, a saber: Lei 8.971/94 e Lei 9.278/96, járevogadas parcialmente.

A união estável assume papel essencial nasociedade contemporânea, pois se realiza comounidade fundamental de família, consolidando odireito fundamental constitucional. E dá suportepara significativo feixe jurisprudencial e para aconstrução de direitos.

Há necessidade de tratar do surgimento dosdireitos da união estável, da busca incessante degarantia constitucional que se viabiliza na obten-ção e na efetivação da sua tutela, como mecanis-mo utilizado para que outras garantias possam serdesfrutadas no decorrer dos anos. Uma dessasgarantias, assegurada nos dias atuais, pode sematerializar na classificação da união estável comoentidade familiar amparado pelo Direito de Famí-lia.

O presente Artigo também apresenta deta-lhes quanto à discussão doutrinária e jurisprudencialacerca da evolução do Direito Sucessório, tentan-do sanar a diferença, existente na legislação bra-sileira, em relação ao cônjuge frente à figura docompanheiro. Jurisprudência que, muitas vezes,vem impedindo que se desdobrem injustiças acer-ca do herdeiro especial nas relações jurídicassucessórias e garantindo a proteção da herançaao companheiro, em igualdade de condições àqueladada ao cônjuge, prevista no artigo 1.809 do Códi-go Civil, de forma que independente do núcleofamiliar, tenha sustentação legal dos direitos dosseus membros.

1 Acadêmica do Nono Período Matutino do Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho (FADISA)2 Acadêmica do Nono Período Matutino do Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho (FADISA)

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2 ASPECTOS DA UNIÃO ESTÁVEL NODIREITO BRASILEIRO: FAMÍLIAAFETIVA

As famílias, dentre todos os agrupamentoshumanos se inserem no agrupamento básico social,em relação à elementaridade da vida do serhumano, desde o seu nascimento até a sua morte.No decorrer da história, a família desempenhavárias funções na sociedade, em relação ainfluência natural, biológica, filosófica e psicológica,com também, nas escolhas profissionais e afetiva,nos fenômenos culturais, além das necessidades,dos problemas e sucessos, segundo lecionam Fariase Rosenvald (2014, p. 521).

A necessidade do convívio em família é umfenômeno humano inerente à sociedade, sendoimpossível compreendê-la sem uma construçãointerdisciplinar, adequando os fatos evolutivos e ascondições multifacetárias dos institutos familiares.

Gama (1998, p. 38), cita em seu livro algunsproblemas enfrentados pela família, nos seguintestermos:

É certo que inúmeros problemas vêm afe-tando seriamente a segurança familiar, comoquestões de ordem social (miséria, fome),econômica (desemprego, instabilidade mo-netária), política (crises dos regimes políti-cos, guerras, revoluções), mas não há dese perder de vista que sempre a família seráa célula básica da sociedade, cabendo aosEstados-Nações promoverem medidas con-cretas e efetivas no sentido de assegurar areal proteção da família como entidade eorganismo fundamental para a própria so-brevivência da espécie humana.

Por essa razão, como uma das modalidadesda família moderna, a união estável assumeespecial papel na sociedade contemporânea, sendoentendida como uma forma de constituição familiar,permitindo que se identifique o ideal constitucionalde que a família, seja constituída ou não pelo formalcasamento, tenha proteção especial por parte doEstado. E a proteção legislativa dada ao caráterinstrumental da família para os casos de uniãoestável tem ninho no artigo 226, § 3.º daConstituição Federal de 1998, “para efeito daproteção do Estado, é reconhecida a união estávelentre o homem e a mulher como entidade familiar,devendo a lei facilitar sua conversão emcasamento.”.

É garantido, por meio do ordenamento jurídicobrasileiro, que qualquer norma infraconstitucional

ou decisão judicial, deverá assegurar especialproteção aos membros da união estável. Por sernorma constitucional e, portanto acima das leis edos comportamentos de interpretação e integraçãolegislativa, estão garantidos que nenhuma normainfraconstitucional que trate da união estávelcontenha discriminação ou privilégios em relaçãoa outras modalidades de constituição de famílias.

Vale destacar que a entidade familiar possuicomo sustentação sólida o afeto, em que tudo oque se relaciona com o referido instituto deveráser baseado no amor e na solidariedade, como ummeio de se garantir a realização efetiva da exis-tência da própria família. Em verdade, não cabeao direito a instituição da família, cabendo-lhe ocaráter de tutelar apenas as que se formarem na-turalmente. Para Pereira (2008, p. 52-53), o afetoé natural da família, não sendo provocado pelo di-reito. Continua o autor:

Agora dizei-me: que é que vedes quandovedes um homem e uma mulher, reunidossob o mesmo teto, em torno de umpequenino ser, que é o fruto de seu amor?Vereis uma família. Passou por lá o juiz, coma sua lei, ou o padre, com o seu sacramen-to? Que importa isso? O acidente conven-cional não tem força para apagar o fato na-tural. A família é um fato natural, o casa-mento é uma convenção social. A conven-ção social é estreita para o fato, e este nãose produz fora da convenção. O homemquer obedecer ao legislador, mas não podedesobedecer à natureza, e por toda a parteele constitui a família, dentro da lei se épossível, fora da lei se é necessário (PE-REIRA, 2008, p. 52-53, grifos originais).

Ainda quanto ao afeto como elemento es-sencial na formação familiar, bem como quanto ànão possibilidade de discriminação entre relaçõesfamiliares formais ou informais, pode-se transcre-ver a seguinte doutrina:

Ora, seja o casamento, seja a união estável,seja qualquer outro modelo de família, cer-to é que toda e qualquer entidade familiarestá, sempre, fundada na mesma base sóli-da: o afeto. E não se justifica, por certo,discriminar realidades idênticas – todaslastreadas no amor e na solidariedade recí-proca, com vistas à realização plena de seuscomponentes [...].Observe-se, inclusive, que tratar de formadiscriminatória a união estável implicarianegar o papel promocional da família e,consequentemente, atentar contra a digni-

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dade e a realização da personalidade de seuscomponentes (FARIAS; ROSENVALD,2014, p. 377).

Observam Farias e Rosenvald (2014) quemais da metade da população vive em união está-vel. Sendo instituto tão amplamente usado, não écredor de discriminação, o que acarretaria, con-forme a doutrina transcrita, uma afronta à condi-ção que de proteção que a lei diz garantir à famíliacomo um todo. Uma ofensa à dignidade da pessoahumana, garantia, por sinal, constante da Consti-tuição Federal de 1988, em seu art. 1.º, inciso III,exatamente como um dos Fundamentos da Repú-blica Federativa do Brasil.

Para Farias e Rosenvald (2014, p. 377) “Nãoé crível, nem admissível, que as pessoas sejamobrigadas a casar somente para adquirir mais di-reitos. A opção pelo casamento, pela união está-vel, ou, seja lá pelo que for, não pode implicar naaquisição de mais ou menos garantias jurídicas.”.Fala que, em outros termos, demonstra a ideia dosautores no sentido de que não deve haver diferen-ça, quanto à aquisição de direitos, quando se tratade formalidade ou informalidade – ou documenta-ção ou falta de – na relação matrimonial.

3 A UNIÃO ESTÁVEL NA LEI E NAJURISPRUDÊNCIA BRASILEIRAS

Pode-se considerar que desde o início da vidasocial, a união informal entre o homem e a mulhernão era algo tido como reprovável. Mais adiante,e com base nas doutrinas da Igreja Católica, pas-sou-se a documentar as relações familiares. Asuniões familiares, sem formalidades, passaram aser taxadas de ilegais. Mesmo assim, a união in-formal sempre existiu. Mais recentemente, pas-sou a ser reconhecida pelo ordenamento jurídico,configurando os seus efeitos como forma paralelaàs atitudes formalmente constituídas.

A anunciada ilegalidade das uniões familia-res não concebidas na modalidade do casamentonem sempre foi no sentido de afronta à lei, pro-priamente dita, mas como um descumprimento dosensinamentos da Igreja. Poderia ser mais facilmen-te classificado como um pecado do que como umcrime, portanto. As dificuldades históricas, porém,levam para o lado dos direitos patrimoniais, poisaté o reconhecimento da união estável como for-ma de constituição de família, a questão de parti-lha de bens e da sucessão tinha traços muito des-favoráveis – pelo menos, revestidos de nenhuma

facilidade de comprovação – em comparação comos casamentos formais, principalmente em rela-ção à mulher. Neste sentido, as seguintes pala-vras:

Em nosso país, outra não foi a situação:nunca o relacionamento livre entre homeme mulher foi tratado como crime ou ato ilíci-to, mas as suas consequências se proje-tam, tão só, no âmbito do Direito das Obri-gações, afastado do Direito das Famílias(FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 464).

Com essa análise, observa-se que o CódigoCivil de 1916 não admitia a criação do instituto daunião estável, inadmitindo a união extraconjugal,reconhecendo apenas o casamento como entida-de ou instituto familiar, sendo considerada comofamília legítima. Na vigência de CódigoBevilácqua, até 2003, a relação extraconjugal –ainda que constituída por pessoas não impedidasde se casar uma com a outra – considerava-secomo família ilegítima, mesmo possuindo o afeto.Nesses conceitos, os filhos tidos por meio da fa-mília ilegítima não possuíam os mesmos direitosdos filhos havidos pala família legítima. Nos pró-prios registros de nascimento constavam, na pri-meira hipótese, a qualidade de filhos ilegítimos; e,na segunda, filhos legítimos.

Nessa época, a união só poderia existir pormeio do casamento, sendo a união extraconjugalnão submetida à proteção do Direito de Família.Vale destacar que o casamento, até 27 de dezem-bro de 1977, quando entrou em vigor a Lei 6.515,de um dia antes, era tido como entidadeindissolúvel. Assim, as pessoas, quando se sepa-ravam de fato e constituíam outro relacionamento,passavam a ser tratadas como concubinos.

O concubinato é a união entre homem emulher sem que haja o casamento por opção denão se casarem ou por não poderem se casar, sendoamparado pelo Direito das Obrigações e não peloDireito de Família.

Essas relações passaram a ser questionadasperante o Poder Judiciário, para que fossem asse-gurados os seus direitos. Foi então, perante a Cor-te Suprema, antes da Constituição de 1998, que oTribunal reconheceu alguns direitos às pessoas queviviam fora do casamento, como concubinos, pormeio da Súmula 380 que dispõe: “comprovada aexistência de sociedade de fato entre osconcubinos, é cabível a sua dissolução judicial, coma partilha do patrimônio adquirido pelo esforçocomum.” A Súmula 382 ainda assevera: “a vida

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em comum sobre o mesmo teto, ‘more uxório’,não é indispensável à caracterização doconcubinato.”.

Por mais que tenham sido adquiridos direitosatravés das Súmulas anteriormente transcritas, arelação de concubinato ainda não garantia direitosaos alimentos, passando a jurisprudência brasilei-ra a adotar os posicionamentos dos Tribunais fran-ceses, que reconheciam ao concubinato o direito àindenização por serviços domésticos e sexuaisprestados, sendo um significativo avanço que maistarde passou a Corte Máxima de Justiça a reco-nhecer outros direitos como a inventariança.

A competência para julgar as demandas re-lacionadas ao concubinato era da Vara Cível, de-vido não se configurar como entidade familiar (dacompetência das Varas de Família). Antes, porém,do tratamento por parte da legislação, começaramalguns benefícios a ser atribuídos pelos Tribunais.

Foi com o advento da Constituição Federalde 1988 que o concubinato passou a ter a altitudede entidade familiar, sendo submetido ao Direitode Família, ganhando um aparato estatal, passan-do o concubinato puro (pessoas que não queriamse casar) à condição de união estável.

A Lei 8.971/94 passou a disciplinar o direitodos companheiros à sucessão e aos alimentos, tra-zendo como requisito da união estável que os com-panheiros fossem solteiros, divorciados ou viúvose que houvessem uma convivência entre ambosde, pelo menos, cinco anos, ou a existência de fi-lhos.

Com a Lei 9.278/96, sem desconsiderar a Leianteriormente citada, excluiu a convivência míni-ma de cinco anos passando a considerar comorequisitos da união estável a convivência duradou-ra, pública, contínua entre o homem e a mulhercom o intuito de constituir família.

A partir do Código Civil de 2002, em seu art.1.727, o sistema optou em não conferir os efeitosjurídicos aos concubinos como alimentos, herança,habitação, estabelecimento de vínculo deparentesco por afinidade, sendo tratado pelo DireitoObrigacional. Porém, a união estável recebeuqualidades de casamento, em termos patrimoniais,inclusive quanto à possibilidade de, ao serformalmente constituída – extrajudicialmente, porescritura pública de união estável, lavrada emTabelionatos de Notas, ou perante o PoderJudiciário – ser eleito regime patrimonial quantoaos adquiridos pelo casal durante a vigência daconvivência.

Não se qualificando como união estável, o

que se tem é o concubinato, como já restou dito.E, quanto a este formato, em julgados, o SuperiorTribunal de Justiça (STF) restringiu os direitos, oumelhor, os efeitos patrimoniais, sendo afastada aindenização pelos serviços prestados pelaconcubina. No entanto, a única garantia a favorda concubina, nos dias atuais, é o direito à partilhado patrimônio adquirido, comprovadamente, peloesforço comum. Orientação do STJ no que tangea este direito pode ser vista no seguinte Acórdão:

[...] Inviável a concessão de indenização àconcubina, que mantivera relacionamentocom homem casado, uma vez que tal provi-dência eleva o concubinato a nível de pro-teção mais sofisticado que a existente nocasamento e na união estável, tendo emvista que nessas uniões não se há de falarem indenização por serviços domésticosprestados, porque, verdadeiramente, deserviços domésticos não se cogita, senãode uma contribuição mútua para o bom fun-cionamento do lar, cujos benefícios ambosexperimentam ainda na constância da união.1 - Na verdade, conceder a indigita indeni-zação consubstanciaria um atalho para seatingir os bens da legítima, providênciarechaçada por doutrina e jurisprudência. 2- Com efeito, por qualquer ângulo que seanalise a questão, a concessão de indeni-zações nessas hipóteses testilha com a pró-pria lógica jurídica adotada pelo CódigoCivil de 2002, protetiva do patrimônio fami-liar, dado que a família é a base da socieda-de e recebe especial proteção do Estado(art. 226 da CF/88), não podendo o Direitoconter o germe da destruição da própriafamília (STJ, Ac. unân. 4.ª T. REsp. 988.090/MS, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, j. 2.2.10,DJe 22.2.10).

Focando no âmbito regional, o Tribunal deJustiça do Estado de Minas Gerais vem mudandoseu posicionamento, por meio da decisão que deuprovimento ao recurso, garantindo aconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Ci-vil. É o que se pode ver em análise à seguinte trans-crição jurisprudencial:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITODAS SUCESSÕES - UNIÃO ESTÁVEL -ART. 1.790, CÓDIGO CIVIL -CONSTITUCIONALIDADE. 1 - A opção dolegislador em dispensar tratamento dísparpara regular a sucessão do companheiro,que está prevista no art. 1.790, CC, não vio-la a Constituição da República. 2 - Recursoprovido. (TJ-MG - AI: 10024121771752001

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MG, Relator: Jair Varão. Julgamento: 27/03/2014, Câmaras Cíveis / 3.ª Câmara Cível.Publicação: 22/04/2014).

Já para o Poder Judiciário do Rio Grande doSul, não houve essa evolução se associando aosdemais posicionamentos, desprovendo os recursosno que tange a ação de união estável no direitosucessório, como visto na seguinte amostra:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITOCIVIL. SUCESSÃO. AÇÃO DE INVENTÁ-RIO. O DIREITO SUCESSÓRIO DO COM-PANHEIRO ESTÁ DISCIPLINADO NOART. 1.790 DO CC, CUJO INCISO III NÃOÉ INCONSTITUCIONAL. TRATA-SE DEREGRA CRIADA PELO LEGISLADOR OR-DINÁRIO NO EXERCÍCIO DO PODERCONSTITUCIONAL DE DISCIPLINA DASRELAÇÕES JURÍDICAS PATRIMONIAISDECORRENTES DE UNIÃO ESTÁVEL.NEGADO SEGUIMENTO. (TJRS - SétimaCâmara Cível. AI 70055608160 RS. Relator:Liselena Schifino Robles Ribeiro. Data deJulgamento: 18/07/2013. Data de Publica-ção: Diário da Justiça do dia 22/07/2013).

Deve-se lembrar, em resumo, que os alimen-tos em relação a conviventes estão asseguradospelas Leis 8.971 e 9.278. O que acaba por se apli-car aos concubinos. O que ainda não recebe tra-tamento em lei especial é a sucessão.

4 A SITUAÇÃO DA COMPANHEIRA NAVOCAÇÃO HEREDITÁRIA

A união estável solidificou-se e está ampa-rada por égide constitucional, estabelecendo que alei facilitará a conversão da união estável em ca-samento. Sendo assim, não há nenhum modo nointuito hierárquico entre as duas modalidades. Mas,há divergência doutrinária quanto a sua equipara-ção, pelo menos quanto aos direitos sucessórios.

Em razão disso, o cônjuge concorre com osdescendentes do autor da herança, conforme pre-visto no artigo 1.829, I do Código Civil de 2002, eem caso de concorrer com os ascendentes do fa-lecido até a terceira classe, recebe a integralidadeda herança em relação a todos os bens, indepen-dentemente do regime de bens do casamento.

Mesmo a união estável sendo legítima, poistem sua instituição prevista em lei, o companheiro,dito com herdeiro especial, não está elencado jun-tamente com os herdeiros previstos no artigo 1.829.Encontra-se inclusão no seu Direito Sucessório noartigo 1.790 do Código Civil, conforme redação:

Art. 1.790. A companheira ou o companhei-ro participará da sucessão do outro, quan-to aos bens adquiridos onerosamente navigência da união estável, nas condiçõesseguintes:I – se concorrer com filhos comuns, terádireito a uma quota equivalente à que porlei for atribuída ao filho;II – se concorrer com descendentes só doautor da herança, tocar-lhe a metade do quecouber a cada um daqueles;III – se concorrer com outros parentessucessíveis, terá direito a um terço da he-rança;IV – não havendo parentes sucessíveis, terádireito a totalidade da herança.

Conforme observa Tartuce (2014, p. 248) “anorma está mal colocada, introduzida entre as dis-posições gerais do direito das sucessões”. O tra-tamento dado à união estável não incluiu na ordemde vocação hereditária o companheiro, por nãoconstar este dispositivo no projeto original do Có-digo Civil de 2002. Percebe-se ainda em um pri-meiro momento que “o caput do comando enun-cia que somente haverá direitos quanto aos bensadquiridos onerosamente durante a união.”(TARTUCE, 2014, p. 249).

Assim durante a existência da união estável,comunicam-se os bens adquiridos por um ou am-bos os companheiros, excluindo-se os bens havi-dos a título gratuito, como doação e sucessão.“Deve ficar claro que a norma não está tratandode meação, mas de sucessão a herança, indepen-dentemente do regime de bens adotado.”(TARTUCE, 2014, p. 1.392).

Diferentemente dos direitos que foram con-feridos ao cônjuge, a sucessão do companheiro estárestrita a uma parte da quota, igualmente àquelaatribuída ao descendente do falecido, em caso deconcorrer com os filhos comuns, ou a metade daquota, se concorrer com os filhos somente por partedo autor da herança. A maior diferença entre asduas modalidades de união em que em caso deconcorrência com outros parentes, colaterais atéo quarto grau, quando o companheiro terá direito aapenas um terço dos bens deixados (FARIAS,ROSENVALD, 2014, p. 525).

Ressalta-se, aqui, a importância de umareformulação interpretativa com relação às regrasdo Direito hereditário do companheiro. Quando setrata de união estável entre os indivíduos, sejamdo mesmo sexo ou não, no caso de apenas umpossuir um vasto patrimônio e em decorrência deum lapso temporal de dez, quinze anos juntos, mes-

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mo que este venha a falecer, o companheiro so-brevivente não terá direito à meação (pois os bensnão foram adquiridos na constância da união está-vel) e nem mesmo à herança (sendo que é neces-sário que a ocorrência tenha sido a título oneroso).

Detecta-se ainda que, segundo a doutrina,“limitando o direito hereditário do companheiro aosbens adquiridos onerosamente durante a constân-cia (chamados de aquesto), além de implicar eminjustificável discriminação do companheiro.” (FA-RIAS; ROSENVALD, 2014, p. 517). Em caso denegar esse direito, estará ignorando a realidade damaioria da população brasileira.

E completam os autores:

Exemplificando: se imaginar um homem quevem morrer deixando um sítio, que possuíaantes de iniciar a união estável e onde resi-dia e retirava o sustento com a sua compa-nheira, com quem dividiu a vida durantemais de trinta anos, não tendo deixado qual-quer outro bem, nem deixando descenden-tes ou ascendentes, tem-se, segundo oCódigo Civil (art. 1.790) que seus colaterais(imagine-se os seus primos) ficarão com osítio, enquanto a companheira não fará jusa nada! Efetivamente, esse absurdo estáconsagrado no direito brasileiro e precisaser repelido (FARIAS; ROSENVALD, 2014,p. 517-518).

De fato, não se pode negar o direito real docompanheiro de sucessão, visualizando umainconstitucionalidade do artigo 1.790 do CódigoCivil, defendendo assim o Estado Democrático deDireito e a igualdade sucessória ente os cônjugese companheiros, baseando-se no art. 3.º, inciso I,da Constituição Federal de 1988.

Conforme entendimento jurisprudencial já épossível identificar uma correspondência com anorma constitucional:

Sucessão – União Estável –Inconstitucionalidade do art. 1.790 do CCdiante do tratamento paritário entre a uniãoestável e o casamento por força do art. 226da CF. [...] as regras sucessórias previstaspara a sucessão entre companheiros nonovo Código Civil são inconstitucionais.Na medida em que a nova lei substantivarebaixou o status hereditário do companhei-ro sobrevivente em relação ao cônjugesupérstite, violou os princípios fundamen-tais da igualdade e dignidade (TJ/RS, Ac.unân. 8.ª Câm. Cív. Ag. Instr, 70009524612,Rel. Des. Rui Portanova, j. 18.11.04).

Sendo assim, torna-se necessário um novoolhar dos legisladores brasileiros acerca do direitosucessório daqueles que vivem em união estável,cabendo, antes de tudo, uma interpretação da LeiMaior, cobrando dos Tribunais uma pronta atua-ção, garantindo assim a proteção efetiva do Esta-do conferida à família.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como cediço, a união estável é reconhecidano ordenamento brasileiro como entidade familiar.De fato, o casamento e a união estável não sãosociedades iguais, mas não há hierarquia entre eles.Além disso, o Código Civil de 2002 traz um capítu-lo próprio sobre a união estável, contendo um con-junto de direitos relativos aos companheiros, comotambém o polêmico art. 1.790, que trata do direitosucessório do companheiro.

Dentre decisões dos Tribunais de Justiça es-taduais já se verifica uma mudança jurisprudencialacerca do tema, que busca solucionar a desigual-dade no caso do direito sucessório do companhei-ro, analisadas as divergências entre os Tribunaisde Minas Gerais e do Rio Grande do Sul. OsAcórdãos transcritos mostram que a interpreta-ção relacionada à equiparação entre as entidadesfamiliares ainda não é pacífica. Mas, os Tribunais,em dias mais atuais, têm concedido ao companhei-ro a garantia dos direitos hereditários mesmo quenão previstos no Código Civil de 2002, mas ampa-rado constitucionalmente.

Observa-se, então, que a jurisprudência temse posicionado de forma favorável à situação docompanheiro, interpretando relativamente o artigo1.790 do Código Civil de 2002 e aplicando as me-didas mais benéficas previstas nas Leis 8.971/94e 9.278/96.

Em meio às formas discriminatórias tratadasno Código Civil de 2002, e visando à igualdade dedireitos previstas independentemente da configu-ração da entidade familiar, há uma expectativa deconsolidação das garantias previstas constitucio-nalmente que asseguram o tratamento indistintoentre o herdeiro especial e o cônjuge.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição daRepública Federativa do Brasil. Brasília: Senado,1988.

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BRASIL. Lei 6.515, de 26 de dezembro de1977. Regula os casos de dissolução dasociedade conjugal e do casamento, seus efeitose respectivos processos, e dá outrasprovidências. Diário Oficial [da] RepúblicaFederativa do Brasil. Brasília, DF, 27 dez.1977.

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BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.Institui o Código Civil. Diário Oficial [da]

República Federativa do Brasil. Brasília, DF,11 jan. 2002.

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RESUMO

O trabalho abarcará o conceito de AdministraçãoPública e o regime jurídico administrativo, venti-lando os princípios constitucionais, destacando-seo princípio da eficiência como corolário da Refor-ma Administrativa de 1998, sem olvidar os efeitospropulsores da globalização na perseguição daefetividade. Noutro bordo, necessária será a pas-sagem sociológica pela teoria da dominação deWeber, perfazendo-se sustentáculo para se enten-der a evolução e os retrocessos das reformas, par-tindo do patrimonialismo até se chegar ao modelogerencial. Serão ressaltadas as inovações da Emen-da Complementar 19/1998, trazendo à baila diver-gências entre autores, no intuito de filtragem dosargumentos para uma compreensão crítica.

Palavras-chave: Reforma Administrativa. Efici-ência. Efetividade. Inovações.

ABSTRACT

The work will cover the concept of publicadministration and the administrative legal regime,fanning the constitutional principles, highlighting theprinciple of efficiency as a consequence ofAdministrative Reform 1998, without forgetting thedrivers of globalization effects in the pursuit ofeffectiveness. Another board will be required topass through sociological Weber domination theory,making up mainstay for understanding the progressand setbacks of reform, starting frompatrimonialism to get up in the managerial model.They will be highlighted innovations ofComplementary Amendment 19/1998, bringing updifferences between authors, the filtering order ofthe arguments for a critical understanding.

Keywords: Administrative reform. Efficiency.Effectiveness. Innovations.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1998:a efetividade da prestação administrativa à luz do princípio da eficiência

Lucas Versiani Cardoso1

1 INTRODUÇÃO

Em uma sociedade contingente, em que osanseios da população exigem mudanças,principalmente no tanger da eficácia, aAdministração Pública paulatinamente se aperfeiçoa,no intuito de se encontrar com a população, atingindoseus escopos econômicos, sociais e culturais. Opresente trabalho objetiva demonstrar as noçõesgerais acerca da mutação administrativa, abarcandoem seu bojo os paradigmas e os papéis do Estado,transcorrendo sobre os modelos patrimonialista,burocrático e gerencial, instando que este últimomerecerá destaque nas abordagens. A EmendaConstitucional 19, de 1998, fornecerá o conteúdojurídico a ser debatido, ressaltando as instituiçõesintroduzidas na perseguição da efetividade daatuação administrativa. Desta feita, serão utilizadoscomo base argumentativa os ensinamentos domentor da reforma, o então ex-Ministro daAdministração Federal e Reforma do Estado, LuísCarlos Bresser Pereira. Entretanto, outros preclarosmestres comporão esta discussão, no intuito de criardiálogos que traduzam o que era, o que é, e o quepode vir a ser a Reforma Administrativa de 1998,visto que se trata de um planejamento estratégico,objetivando resultados a longo prazo.

2 NOÇÕES GERAIS ACERCA DA ADMI-NISTRAÇÃO PÚBLICA

Nada melhor que iniciar abordando concei-tos, e utilizando a perspectiva do jogo de tênis, emque o bate e rebate de autores poderá construiruma fixação única, e diversas acepções acerca domesmo tema. De acordo com Marinela (2011, p.2), “O Direito Administrativo pode ser conceitua-do, em sentido amplo, como um ramo do DireitoPúblico Interno que tem como objeto a busca pelobem da coletividade e pelo interesse público.”. doseu lado, Mello (2014, p. 29) o conceitua como “o

1 Acadêmico do Sexto Período do Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.

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ramo do Direito Público que disciplina o exercícioda função administrativa, bem como pessoas eórgãos que a desempenham.”. Corroborando comestes, Carvalho Filho (2014, p. 8) assevera comosendo “o conjunto de normas e princípios que, vi-sando sempre ao interesse público, regem as rela-ções jurídicas entre as pessoas e órgãos do Esta-do e entre este e as coletividades a que devemservir.”. Inobstante a diferença das palavras, atra-vés de uma interpretação teleológica se chega-seque os mestres supramencionados sindicalizam omesmo escopo: a supremacia do interesse públi-co.

Ademais, de nada convêm conceitos se nãoofertados os mecanismos para realização do obje-tivo idealizado, e estes nada mais são que os prin-cípios constitucionais e o regime jurídico adminis-trativo.

Em brilhante raciocínio, e com agudeza pe-culiar, preleciona Mello:

Princípio é, pois, por definição, mandamen-to nuclear de um sistema, verdadeiro alicer-ce dele, disposição fundamental que se ir-radia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério paraexata compreensão e inteligência delas, exa-tamente porque define a lógica e aracionalidade do sistema normativo, con-ferindo-lhe a tônica de que lhe dá sentidoharmônico. Eis porque: violar um princípioé muito mais grave que transgredir umanorma. A desatenção ao princípio implicaofensa não apenas a um específico manda-mento obrigatório, mas a todo o sistema decomandos. É a mais grave forma de ilegali-dade ou inconstitucionalidade, conforme oescalão do princípio violado, porque repre-senta insurgência contra todo sistema, sub-versão de seus valores fundamentais,contumélia irremissível a seu arcabouçológico e corrosão de sua estrutura mestra(MELLO, 2014, p. 54).

Nesta necessária reflexão sobre o significa-do de princípios, que se faz inesgotável pela pro-fundidade de virtudes que lhe são conferidos, pode-se iniciar breves comentários sobre os queembasam a Administração Pública.

Citam-se e definem-se aqueles constantes naatual Constituição, especificamente os pertencen-tes ao artigo 37, caput, in verbis:

A administração Pública direta e indireta dequalquer dos Poderes da União, dos Esta-dos, do Distrito Federal e dos Municípios

obedecerá aos princípios da legalidade,impessoalidade, moralidade, publicidade eeficiência [...] (grifos nossos).

O princípio da legalidade consiste na subor-dinação à lei e não-contradição à lei. Noutros ter-mos, só existe a atuação da Administração Públi-ca se houver previsão legal. A impessoalidade, ou“não-discriminação”, consagra as práticas do Es-tado por meio do agente público, não se confun-dindo com tal pessoa. A moralidade ressalta a le-aldade, a honestidade, ou seja, a não corrupção notrato com a atividade pública. A publicidade é agarantidora da transparência, é o controle da efi-cácia dos atos administrativos, excetuando-se osatos que pela intimidade e segurança que necessi-tam, inviabilizem a perpetuação do referido princí-pio, justificando a inaplicabilidade por meio da pon-deração dos interesses envolvidos.

Desta feita, em síntese apertada, abordam--se aqueles constantes no artigo retromencionado,executando-se o princípio da eficiência, que serátratado com especificidade, adentrando a reformaadministrativa, guardando para o próximo parágra-fo dois outros, que por justificarem todo o regimeadministrativo, ganham espaço neste trabalho.

Decorrentes da busca pelo interesse públi-co, os princípios da supremacia e indisponibilidade,em fina sintonia, fornecem ao Estado o poderextroverso, ou seja, a restrição de direitos indivi-duais na busca do interesse da coletividade, bemcomo a garantia de que o administrador não seempenhará em interesses individuais em detrimentodo interesse público. Destarte, resta o princípio daeficiência.

2.1 Princípio da Eficiência

A busca pela eficiência atravessou séculos emudou a história, sempre no intuito de impulsionaras possibilidades de garantia de excelência narealização dos fins do Estado, de forma concreta,direta e imediata.

Negritou-se no artigo 37 da Constituição,alhures, a palavra eficiência. Passa-se a análisede suas diferentes conotações, visto que ogerencialismo a aprecia como chave-mestra paraalcance dos escopos da Reforma, epicentro dapesquisa.

Em brilhante dissertação de mestrado, Oli-veira (2013) esmiúça as raízes da palavra eficiên-cia, aduz a sua origem, perpassa a sua utilização,bem como assevera sobre as dissonâncias entre

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eficiência, eficácia e efetividade, até se chegar àaplicação na seara administrativa. Sustentada peloartigo “The origins and restriction of efficiencyin public administration: regaining efficiency asthe core value of public administration”, de Vander Meer e Rutgers (2010), a autora ressalta asideias aristotélicas, guiando o significado de efici-ência ao encontro da teoria da causalidade,explicitando que a atribuição da palavra como “for-ça motriz” enveredou a Administração Pública noséculo 20.

Nesse sentido, as associações entre causa eefeito presentes na teoria da causalidade, revelamde acordo com Van der Meer e Rutgers (2010,apud OLIVEIRA, 2013, p. 43), que:

a eficiência está sempre ligada a um propó-sito ou causa final: fim de alguma coisa(telos). O efeito real (alteração ou saída dorepouso) da causa eficiente pode ou nãoresultar na realização da causa final (a leipode falhar...). Fazendo um salto no tempo,isso significa que um gestor (agente efici-ente) pode ou não realizar as tarefas quelhe são atribuídas.

Nesse contexto, Oliveira (2013, p. 43-44) trazà baila o raciocínio feito por Benthan (1817) que,ampliando o viés da teoria da causalidade, dife-rencia eficiência e efeito, aduzindo que “enquantoa primeira se refere à produção, a última diria res-peito aos resultados ou efeitos que poderiam ounão servir à finalidade (causa final) da ação”.Desta feita, “a eficiência é, portanto, entendidacomo um atributo capaz de contribuir para os finsperseguidos, e não como uma relação econômicaentre recursos e resultados.”. Destarte, evidenteque a elevação dessa palavra ao status de princí-pio não deve levar em conta apenas a produçãocom menores gastos possíveis (economicidade),mas também efeitos que se traduzam em qualida-de e efetividade na vida da população.

Por derradeiro, indispensável a compreensãoque Oliveira (2013, p. 45) propicia ao concluir quea Administração, em seus diferentes aspectos eobjetivos, sejam os de fortalecimento financeiro oua construção/manutenção de uma imagem sólidae confiável, deve-se utilizar dos meios adequados(eficiência) para o alcance dos melhores resulta-dos (eficácia), acompanhando a marcha do tempopara se renovar e se aprimorar às demandas soci-ais, tornando a efetividade mais próxima da reali-dade dos indivíduos.

Feita esta singela análise, culmina neste mo-

mento a trajetória histórica na perseguição da efi-ciência, esta já compreendida em todas as suasformas. Será que realmente se está empregandoo verdadeiro valor do princípio da eficiência?

3 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICAPATRIMONIALISTA, BUROCRÁTICAE GERENCIAL

Salienta-se que este tópico será guiado apartir dos estudos de Neves (2010), que prelecionaem valioso artigo a reforma administrativa de1995-1998 sob a óptica de Max Weber. Será agre-gado a este ínterim, também, as anotações do ex-Ministro da Administração Federal e Reforma doEstado, Pereira (1997), trazendo à baila a trajetó-ria para a mudança de paradigma.

Através dos estudos de Weber, em que esseutiliza a dominação como elemento da ação social(essencial), compreende-se as raízes sociológicasda Administração Pública patrimonialista(tradicional) e burocrática (legal).

Dentre os modelos de dominação, perfeita-mente enquadráveis no meio administrativo, reser-va-se dois, quais sejam: tradicional e legal, comose vê, a seguir:

No modelo tradicional a característica daimpessoalidade, que é característica do tipoburocrático, deixa de existir, não havendo odever de servir à determinada finalidadeobjetiva e impessoal mediante a obediên-cia de ordens abstratas que legitimam aconduta do dominado. Ao contrário, asnormas que devem ser obedecidas têm ocaráter da pessoalidade e são ditadas pelomandante, tendo como fundamento a [...]tradição; a crença na inviolabilidade daqui-lo que foi assim desde sempre (NEVES,2010, p. 1).

Desta feita, pode-se elencar como caracte-rísticas do modelo patrimonialista adiscricionariedade do dominador (senhor), ainexistência de competência, a meritocracia emsegundo plano, prevalecendo indicações e nomea-ções para funções públicas. Trocando em miúdos,sob um critério do “privilégio”. Esse modelo foiempregado pela nação lusitana no domínio do Bra-sil, e, com as transformações proporcionadas pelotempo, modificou-se, mas deixou como herança opróximo modelo a ser analisado, o burocrático, emque a eficiência aparece, só que ainda tímida.

O modelo burocrático (legal), em

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contrapartida ao patrimonialista, possuía como ca-racterísticas determinantes as competências, atra-vés das leis ou regulamentos administrativos. Ahierarquia de cargos e de instâncias prosperava,havendo clara distinção entre público e o privado,acarretando em especialização e exclusividade dofuncionário com a Administração Pública. Essemodelo se evidenciou no Brasil com a Revoluçãode 1930, em que o Estado Novo colocou comoprimazia as características acima descritas, racio-nalizando os meios (eficiência), mas olvidando aefetividade na gestão administrativa em aspectogeral, ou seja, ineficiência latente para produçãode efeitos (eficácia).

Nestes termos, percebe-se a análise acuradade Max Weber nas reformas que a sociedadeimplementava, observando os reflexos de seusestudos nos modelos administrativos desenvolvi-dos no Brasil pré-reforma gerencial. Em corres-pondência ao tema, pontificou Pereira (1997, p.41) que:

É importante apenas assinalar que a admi-nistração pública burocrática, que Weberdescreveu como uma forma de dominação“racional-legal”, trazia embutida uma con-tradição intrínseca. A administração buro-crática é racional, nos termos daracionalidade instrumental, na medida emque adota os meios mais adequados (efici-entes) para atingir os fins visados. É, poroutro lado, legal, na medida em que definerigidamente os objetivos e os meios paraatingi-los na lei. Ora, em um mundo em ple-na transformação tecnológica e social, éimpossível para o administrador ser racio-nal sem poder adotar decisões, sem usar deseu julgamento discricionário, seguindocegamente os procedimentos previstos emlei. No século dezenove, quando a admi-nistração pública burocrática substituiu apatrimonialista, isto representou um gran-de avanço no cerceamento da corrupção edo nepotismo. Entretanto, no século vinte,quando o Estado cresceu e assumiu novospapéis, ficou patente a ineficiência ineren-te a esse tipo de administração. Ao mesmotempo que a burocracia estatal, ou seja, oconjunto de administradores públicos pro-fissionais, via sua posição estratégica nasociedade aumentar, ficava claro que setornava necessário adotar novas formas.

Nesse contexto, fica evidente que a socie-dade sofria alterações incessantes, e aefervescência das relações internacionais traziamnovos auspícios para se atingir uma plenitude na

prestação de serviços. Resta saber se estas refor-mas estão de acordo com um contexto social ouse foram eleitas para beneficiar alguns poucos.

Passa-se a análise do modelo gerencial, per-correndo suas peculiaridades.

3.1 Administração Pública Gerencial

Em janeiro de 1995 assumiu o Ministério daAdministração Federal e Reforma do Estado, noGoverno Fernando Henrique Cardoso (1994-2002),Luís Carlos Bresser Pereira. E ninguém melhordo que o próprio ex-Ministro para desenhar ascaracterísticas da “nova administração pública”,quais sejam: orientação da ação do Estado para ocidadão usuário; o enfoque no controle dos resul-tados por meio dos contratos de gestão; a amplia-ção e o fortalecimento da burocracia estatal, valo-rizando os trabalhos técnico e político, agregadosno intuito de formulação das políticas públicas; aseparação entre as secretarias de políticas públi-cas centralizadas pelo Estado das unidades des-centralizadas; criação das agências executivaspara realização das atividades exclusivas de Esta-do, e os serviços sociais e científicos de carátercompetitivo, em que o Estado não se pode envol-ver; transferência para o setor público não-estataldos serviços sociais e científicos competitivos;adoção conjunta de controles, seja através doscontratos de gestão ou diretamente pela socieda-de; terceirização das atividades auxiliares ou deapoio, mediante licitações.

Nesse ínterim, de acordo com Pereira (1997,p. 44) o escopo seria diminuir o tamanho da atua-ção Estatal, porém tornando-o mais forte finan-ceiramente, evitando crises fiscais, que assolaramo país na década de oitenta, bem como aestruturação de sua área de atuação, mantendoum núcleo estratégico de decisões, auxiliadas poruma burocracia capaz e motivada.

Diante o exposto, resta percorrer a ambiênciaque propiciou a Reforma Administrativa de 1998,traçando as influências da globalização até a Emen-da Complementar 19/1998.

4 A REFORMA ADMINISTRATIVA DE1998: DA GLOBALIZAÇÃO ÀS NOVASINSTITUIÇÕES

Em meio à emancipação do “neoliberalismo”,em que as multinacionais se alastravam por todo omundo, e sob ares de crises fiscais que deturpa-ram países em desenvolvimento, cria-se um deba-

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te de como adequar a Administração Pública aosnovos processos sociais. Na opinião de quem foiMinistro e que escreve,

A globalização impôs, assim, uma duplapressão sobre o Estado: de um lado repre-sentou um desafio novo – o papel do Esta-do é proteger seus cidadãos, e esta prote-ção estava agora em cheque; de outro lado,exigiu que o Estado, que agora precisavaser mais forte para enfrentar o desafio, setornasse também mais barato, mais eficien-te na realização de suas tarefas, para aliviaro seu custo sobre as empresas nacionaisque concorrem internacionalmente (PEREI-RA, 1997, p. 15).

Nesse sentido, o mentor da reforma em telapreconizava que com a perda de autonomia doEstado, pela globalização, as crises fiscais esgota-vam as formas de intervenção, acarretando emobsolescência do modelo burocrático de adminis-trar, que se fazia ineficiente e de baixa qualidade.Nesse mister, o Estado deveria passar a atuar comosócio, um agente facilitador, delimitando o seu pa-pel com utilização de processos de privatização,publicização, terceirização, desregulação, aumen-tando a governança e a governabilidade. Em ou-tras palavras, Pereira (1997) idealiza, respectiva-mente, a lógica dos processos de redução do ta-manho do Estado, a diminuição de sua interferên-cia nas atividades econômicas, o aumento da ca-pacidade fiscal e administrativa, e o aumento dopoder político democrático dos governantes.

Em consonância com esse raciocínio, ponti-fica Justen Filho (2014) que houve inúmeras cau-sas para a globalização, podendo citar o progressotecnológico, a influência militar, política e econô-mica dos Estados Unidos, bem como o “fim” dachamada guerra-fria, etc. Desta maneira, ressaltao autor que se torna difícil para o Estado a manu-tenção dos modelos difundidos em meados do sé-culo 20. Conclui Justen Filho (2014, p. 108) assi-nalando que, “há a redução da atuação estatal, coma convocação da sociedade e da empresa privadapara promover a satisfação de necessidades decunho coletivo.”.

Ora, o desafio para a Administração Públicapassa a ser a sua transformação nos moldes dogerencialismo.

Nessa missão, instrumentos jurídicos foramintroduzidos. E passa-se à análise.

A Emenda Complementar 19, de 1998, alte-rou a recém-promulgada Constituição Cidadã

(1988), implementando a Reforma Gerencial doEstado. Como destaques iniciais do plano diretorda reforma, cita-se: instauração de políticas deprofissionalização do serviço público; capacitaçãopara os servidores gerenciarem os contratos degestão; controle dos resultados; aumento da efici-ência dos serviços; modificação das formas decontrole da política fiscal e de gastos.

Dentre várias modificações, trata-se agoradas mais relevantes, e que por substancial modifi-cação, atrai embates doutrinários.

4.1 Controle de Resultados pelos Contratosde Gestão

Sob o prisma dos contratos de gestão, faz-senecessária a exposição de motivos que o fizeramsurgir, para ponderação de críticas. Nesse bordo,há as seguintes palavras:

Ao mesmo tempo que a burocracia estatal,ou seja, o conjunto de administradores pú-blicos profissionais, via sua posição estra-tégica na sociedade aumentar, ficava claroque se tornava necessário adotar novasformas de gestão da coisa pública, maiscompatíveis com os avanços tecnológicos,mais ágeis, descentralizadas, mais voltadaspara o controle de resultados do que o con-trole de procedimentos. E também mais com-patíveis com o avanço da democracia emtodo o mundo, que cada vez mais exige umaparticipação mais direta da sociedade nagestão pública (PEREIRA, 1997, p. 41-42).

Nesse sentido, a intenção seria dinamizaros mecanismos de controle, diminuindo o “ta-manho do Estado”, terceirizando as atividadesauxiliares, e, por conseguinte, viabilizando atémesmo privatizações. Seria a fortificação es-trutural, financeira e estratégica da Administra-ção Pública.

Em desacordo com os contratos de gestão,completa a doutrina:

[...] consiste em instituto que, para não sefalar em outras violações à Constituição,se propõe a ensejar a ampliação da esferade liberdade de pessoas da Administraçãoindireta por contrato. Ora, até mesmo umprimeiranista de Direito sabe que a esferade competências outorgadas por lei a umaentidade pública não pode ser ampliada ourestringida senão por lei (MELLO, 2014, p.1096).

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Congruente com esse raciocínio, há as se-guintes lições:

A utilização desse contrato é dispensávelquando se fala em cumprimento de metasde desenvolvimento e de repasse de recur-sos, porque essas medidas poderiam sertomadas por mero ato unilateral, sendo inó-cua a formalização do contrato. No que tan-ge à maior eficiência, essa consiste em umaobrigação mínima de todos os entes daAdministração Pública, sendo também umgrande contrassenso a necessidade de con-trato (MARINELA, 2011, p. 442).

Nesses termos, a ênfase no contrato de re-sultados se apresenta polêmica, instando a con-cordância deste trabalho a respeito da desneces-sária contratação na busca da eficiência, em to-das as suas acepções já esmiuçadas, visto que estetipo de ampliação de autonomia enseja atos cor-ruptos e desvio de finalidades, possibilitandolesividades ao erário.

Ademais, um dos pontos nevrálgicos a seressaltar são as unidades criadas para se valer doscontratos de gestão, em breve síntese e análisecrítica. Dentre as entidades que se subsumam acontratualização do controle, foram escolhidas asagências reguladoras e as agências executivas.

Antes de adentrar nas especificidades, po-rém, necessária a dissertação genérica de Pereira(1997) acerca dos escopos dos novos institutos, inlitteris:

Na execução das atividades exclusivas deEstado é na verdade necessário distinguirtrês tipos de instituição: as secretariasformuladoras de políticas públicas, que, nonúcleo estratégico do Estado, em conjuntocom os ministros e o chefe do governo,participam das decisões estratégicas dogoverno; as agências executivas, que exe-cutam as políticas definidas pelo governo;e as agências reguladoras, mais autônomas,que buscam definir os preços que seriamde mercado em situações de monopólionatural ou quase natural. As agências re-guladoras devem ser mais autônomas doque as executivas porque não existem pararealizar políticas do governo, mas para exe-cutar uma função mais permanente que éessa de substituir-se aos mercados compe-titivos (PEREIRA, 1997, p. 43).

Após essa abordagem, importante pincelaracerca das agências reguladoras e executivas, bemcomo as inovações da reforma frente aos agentes

públicos.

4.2 Agências Reguladoras

Em sintonia com os ensinamentos deMarinela (2011), as agências reguladoras possu-em este nome, “agência”, como forma pomposapara atribuir especial função, sendo uma produ-ção exógena, fora da sociedade brasileira. Segun-do a autora “A expressão ‘agência’ vem sendomal utilizada em virtude de algumas improprieda-des na estrutura da Administração Pública, fazen-do parecer mero entusiasmo do governante quan-do copiou o modelo americano, talvez por acredi-tar que a entidade teria maior credibilidade em ra-zão do nome.” (MARINELA, 2011, p. 121).

As agências podem regular os serviços pú-blicos propriamente ditos, como os de transportesterrestres (Agência Nacional de Transportes Ter-restres – ANTT), aquaviários (Agência Nacionalde Transportes Aquaviários – ANTAQ); discipli-nar atividades de fomento e fiscalização da ativi-dade privada, citando-se o estímulo as atividadescinematográficas (Agência Nacional do Cinema– ANCINE); atividades econômicas integrantesda indústria do petróleo (Agência Nacional doPetróleo – ANP); regular atividades que o Estadoe o particular prestam (Agência Nacional de Vigi-lância Sanitária – ANVISA); disciplinar o uso dobem público (Agência Nacional de Águas – ANA).

Para efetivação das perspectivas desta mo-dalidade de autarquia especial, são a elasconferidas maior estabilidade e independência,sendo essas prerrogativas sindicalizadas pelo con-trato de gestão, que amplia sua esfera de liberda-de. Como características salutares, podem serelencadas o regime de pessoal, que segue a Con-solidação das Leis do Trabalho, diferentemente dosservidores das demais autarquias; a forma de es-colha de seus dirigentes, que ocorre por meio deato complexo de manifestação do Presidente daRepública e do Senado, aglutinando as vontades;a atribuição de poder normativo (direitoregulatório), possibilitando a inovação noordenamento, regulamentando a lei, bem como oprocesso licitatório. Cumpre ressaltar que esteponto já foi alvo de polêmicas, que levou a doutri-na assim cuidar da questão:

A Lei n.° 9.472/97, denominada norma geraldas telecomunicações e que cria aANATEL, estabelecia que tal agência nãoestaria sujeita à Lei n.º 8.666/93 e poderia

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definir seus próprios procedimentos paralicitação, podendo inclusive adotar moda-lidades específicas como o pregão e a con-sulta (art. 54, parágrafo único). […] NessaADIN, foram discutidos vários dispositi-vos da Lei n” 9.472/97. […] determinando oSTF que essa contratação se submeta àsregras da Lei n.º 8.666/93. Com essa deci-são, não resta dúvida de que a agência re-guladora está sujeita à norma geral das lici-tações, ficando rejeitadas as soluçõeslegislativas similares previstas em outrasnormas, a exemplo da Lei n.º 9.478/97(MARINELA 2011, p. 127).

Ainda a despeito das agências reguladoras,severas as críticas apontadas por Mello (2014, p.1.096), que se fazem necessárias sobrelevar, as-sim:

No que atina às agências reguladoras, aoque parece criadas para atender a exigênciasdos investidores estrangeiros, constituem--se em instituto que não se acomoda bemao Direito brasileiro e que, do modo comoforam reguladas, incorrem, além disso, eminconstitucionalidade. Deveras, aosdiretores destas entidades, cujos mandatosultrapassam o período correspondente aodo Chefe do Poder Executivo, atribui-se agarantia de não serem exonerados salvo emdecorrência de infração grave, após regularprocesso apurador. Ora, é da essência doregime republicano a temporariedade dosmandatos precisamente para que o povopossa sufragar quem altere a orientaçãopolítico-administrativa rejeitada naseleições. […].

Desta feita, enxerga-se os dois lados da mo-eda. Entretanto, este trabalho vai de encontro àscríticas do eminente doutrinador supra. Não se podeperseguir a eficiência a qualquer custo. Ideias dereforma sempre devem ser bem-vindas, principal-mente as que visem a otimizar o sistema. Mas,feitas a qualquer maneira, acabam por ferir os prin-cípios basilares do regime jurídico administrativo,sendo preferível a demora transparente do que aeficácia obscura na realização dos serviços públi-cos.

4.3 Agências Executivas

De acordo com Carvalho (2015, p. 187), asautarquias comuns, após estabelecimento de pla-no estratégico de reestruturação e de desenvolvi-mento institucional, bem como a celebração de um

contrato de gestão, passam a gozar do status deagência executiva, adquirindo vantagens especi-ais, como maior independência e orçamento, com-prometendo-se, no entanto, a aperfeiçoar seus ser-viços, ou seja, cumprindo o contrato de gestão.

A Lei 9.649/1998, dispõe:

Art. 52. Os planos estratégicos dereestruturação e de desenvolvimentoinstitucional definirão diretrizes, políticas emedidas voltadas para a racionalização deestruturas e do quadro de servidores, a re-visão dos processos de trabalho, o desen-volvimento dos recursos humanos e o for-talecimento da identidade institucional daAgência Executiva.

Seguindo a linha de raciocínio de Carvalho(2015, p. 188), a agência executiva não se confun-de com a reguladora, pois ao contrário desta últi-ma, não goza de regime especial de nomeação dedirigentes e autonomia financeira, bem comoinexiste o poder de edição de normas gerais defiscalização de atividades.

Desta maneira, percebe-se que a qualifica-ção como executiva apenas prima pela eficiênciados serviços públicos, não ocorrendo modificaçõesno tanger as finalidades da autarquia.

Sem mais delongas, oportunizando a contra-dita a respeito das inovações trazidas pela refor-ma, Mello (2014) refere-se aos contratos de ges-tão como “um arremedo de contrato, sem qual-quer valor jurídico”, pensamento esse que se coa-duna com toda pesquisa elaborada por este traba-lho.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise realizada por este trabalho preten-deu percorrer as nuanças da Reforma Adminis-trativa de 1998, demonstrando a interpretação co-erente acerca do princípio da eficiência, e questio-nando a sua efetividade. Percebe-se que se con-frontaram ideias de autores renomados, sempreno intuito de despertar máxima discussão acercadas mutações administrativas que ocorreram nasúltimas décadas.

Por derradeiro, frisa-se na pergunta: será queas mudanças trazidas pela reforma gerencial pro-piciaram a efetiva realização dos interesses públi-cos ou visaram aos interesses privados? A res-ponda adequada seria, “depende”. Os auspíciosforam os melhores, porém, incongruências são fa-cilmente verificáveis, e, enquanto não se fizerem

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as necessárias ponderações entre os princípios eos instrumentos inseridos pela emenda, reduzindoo tamanho do Estado sem retirada de seu poder,não se alcançará resultados satisfatórios para apopulação, que anseia qualidade, transparência eefetividade na prestação administrativa gerencial.Apesar da introdução de mecanismos jurídicosconsideráveis, percebe-se que se alcançou a efi-ciência (meio), mas não a eficácia (resultado),inviabilizando a efetividade. Nesse sentido, a Ad-ministração Pública deve enfrentar os desafios daeficácia, elevando o regime jurídico administrati-vo, ao revés do atalho perigoso que se chama “con-trato de gestão”, e dessa forma olhar para si, enão se idealizar nos países vizinhos que se acham“desenvolvidos”.

Não se deve rejeitar as boas ideias. Não. Mas,deve-se amoldá-las para o que realmente se fazindispensável na prestação administrativa, que nadamais é, que efetividade em toda sua imensa searade atendimento à sociedade.

REFERÊNCIAS

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RESUMO

O presente trabalho procura relacionar duas áreasdo saber, quais sejam a História e o Direito. Dessarelação nasce uma terceira: a História do Direito.Aqui, buscar-se-ão os conceitos de ambas, alémde fazer alguns outros apontamentos. Baseado emreferências bibliográficas que dizem respeito aotema, o texto procura explicar como funciona adisciplina derivada: a História Jurídica. Dessaforma, de modo a cumprir tais objetivos, tentar--se-á buscar o seu conceito, bem como os seusobjetivos e a sua razão de existir, além de tentarperceber como as transformações da sociedadeinfluenciam as duas áreas em questão.

Palavras-chave: História, Direito, História doDireito.

ABSTRACT

This paper seeks to relate two disciplines, namelyhistory and law. This ratio rises a third: the Historyof Law. Here, the concepts of both will seek to, inaddition to a few other notes. Based on referencesthat relate to the theme, we sought to betterunderstand how the discipline derived works: TheLegal History. Thus, in order to accomplish theseobjectives, will try it out-get your concept, as wellas their purpose and their reason for being, and tryto understand how the changes in society influencethe two areas in question.

Keywords: History, Law, History of Law.

1 INTRODUÇÃO

A fim de melhor compreender a História doDireito, entendendo, assim, os diálogos entre es-

RELAÇÕES ENTRE A HISTÓRIA E O DIREITO:convergências e definições dessas duas áreas do saber

Renat Nureyev Mendes1

1 Graduado em História pela Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Pós-graduado em Didática eMetodologia do Ensino Superior pela Unimontes. Acadêmico do Curso de Direito pela Faculdade de Direito SantoAgostinho (FADISA).

2 Numa nova óptica da história, o que se percebe é que surge uma variedade de objetos possíveis de seremestudados; nesse sentido, não só grandes feitos, grandes heróis, as nações mais “importantes” têm história, mas,todos e tudo também as têm.

sas duas áreas do saber, tentar-se-á responder aalgumas questões fundamentais para tal intuito,quais sejam: o que é História? O que é Direito? Oque é História do Direito? Quais pontos História eDireito têm em comum? Qual o objetivo do estudode História do Direito?

Satisfeitas tais questões, haverá naturalmenteuma simplificação do estudo do objeto a ser abor-dado pelos jus-historiadores. Nesse sentido, “estanecessidade do conhecimento do objeto antes deuma análise de seus pontos é a base para a com-preensão global do objeto de estudo de qualquerciência.” (CASTRO, 2009, p. 1).

Para alcançar os escopos pretendidos, divi-diu-se, aqui, o trabalho de uma maneira didáticade modo a facilitar a leitura dos interessados. Pri-meiramente, buscou-se tratar da História,conceituando-a e fazendo alguns outros aponta-mentos. Em um segundo momento, tentou-seconceituar, outrossim, o Direito; e fazer algumasobservações importantes. Por fim, houve uma ten-tativa de relacionar essas duas áreas do saber que,por vezes, andam de mãos dadas. Aqui, tentar-se-á buscar o conceito de História do Direito, bemcomo, seus objetivos e quais os pontos em comumessas duas áreas do saber (História e Direito) têm.

2 HISTÓRIA: CONCEITOS E ALGUNSAPONTAMENTOS

“Passado” é a primeira palavra que vem àmente quando se pensa em História. Crucial, nessesentido, torna-se pensar se o passado seria história;se todo o passado seria história; e, por fim, se tudono passado seria história (CASTRO, 2009). Acre-dita-se que todo o passado poderia ser história eque, desse modo, tudo nele também poderia sê-lo2.Todavia, há alguns elementos que devem ser leva-dos em consideração – e são justamente sobre osquais que se tratará neste primeiro tópico.

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Borges (1993) busca o conceito de Históriano dicionário, onde encontra algumas definiçõessobre o termo. Dentre as quais, elenca quatro oucinco definições, dando especial destaque a duas,que julga ser as mais apropriadas para o que sebusca um historiador. Nesse sentido, segundo aautora em assunto

No novo dicionário Aurélio, ao se procuraro termo ‘história’ encontramos muitos sig-nificados para a palavra. Entre uns quinzeenumerados, podemos destacar alguns queenfocam a história como: o passado da hu-manidade, o estudo desse mesmo passa-do, uma simples narração, uma ‘lorota’, umacomplicação, etc. Todos esses conceitospodem ser vistos como relacionados aoconceito atual de história (BORGES, 1993,p. 47).

Neste trabalho, entretanto, serão utilizadosos dois primeiros conceitos elencados pela referi-da autora. Borges (1993) destaca que, na LínguaPortuguesa – ao contrário do que acontece comoutros idiomas, como o Alemão, em que há termosdistintos para a situação em estudo – usa-se ummesmo termo para significar, ao mesmo tempo,dois sentidos diferentes. Nesse diapasão, o termo“história” significa, simultaneamente, os aconteci-mentos que se passaram e o estudo desses acon-tecimentos (BORGES, 1993). “Numa extensãoampla dos dois sentidos, história seria então aquiloque aconteceu [principalmente com o homem] e oestudo desses acontecimentos” (BORGES, 1993,p. 48). Destarte, percebe-se que as duas defini-ções da palavra estão, pois, intimamente ligados:os acontecimentos históricos são o objeto de estu-do do conhecimento histórico.

Ehrarde e Palmade dizem que “a história é amemória da humanidade, mas não é suficiente re-cordar para ser historiador.” (EHRARDE;PALMADE apud CASTRO, 2009, p. 1). Eis oporquê de alguns historiadores diferenciarem o tra-balho de sua “classe”, do trabalho dosmemorialistas. Segundo esse pensamento, os his-toriadores constroem um trabalho com uma visãocrítica, buscando algo diferenciado; enquanto queos memorialistas apenas reproduzem fatos ocor-ridos no passado, registrando-os. Assim, perce-be-se que é demasiado importante buscar umaóptica crítica nos trabalhos desenvolvidos na ciên-cia histórica – visto que o vernáculo “crítica” temde estar na definição da história e, por conseguin-te, do historiador.

Já se falou, nessa oportunidade, de passadoe de visão crítica. A essas duas expressões, quedeveriam fazer parte do conceito de história, pode--se, outrossim, adicionar a esse conceito a trans-formação e o fator humano. Aquela, por ser aessência da história; e este, o ser humano, por sero único capaz de executar tal tarefa (CASTRO,2009). Assim, pode-se chegar à conclusão de queo homem é o objeto da História, ou seja, “o estudoda História concentra-se no Ser Humano e a su-cessão temporal de seus atos.” (CASTRO, 2009,p. 2). Deste modo, “a história é a história do ho-mem, visto como um ser social, vivendo em socie-dade. É a história das transformações humanas,desde o seu aparecimento na terra até os dias emque estamos vivendo.” (BORGES, 1993, p. 48).

Para Albergaria (2012), os seres humanossão, simultaneamente, atores e observadores daHistória. Eles têm consciência, ou seja, sabem daimportância dos fatos em suas vidas e, munidosdesses conhecimentos, tentam modificar tudo aquiloque não os agradam ou que simplesmente podeser melhor, o que demonstra a importância da His-tória.

Há uma tentativa de explicação do Ser Hu-mano estudando a sua própria espécie, por Veyne.Segundo ele, há dois motivos para isso:

Primeiramente, o fato de pertencermos agrupo nacional, familiar [...] pode fazer comque o passado desse grupo tenha um atra-tivo particular para nós [seres humanospertencentes a esse grupo]; a segunda ra-zão é a curiosidade, seja anedótica ou acom-panhada de uma exigência da inteligibilidade(VEYNE, 1998, p. 69).

Assim, na tentativa de criação de um con-ceito para a história, levando em consideração tudoque foi tratado nessa primeira parte deste traba-lho, chegou-se a este: História é o passado da hu-manidade, bem como o seu estudo, normalmentefeito pelos historiadores, com uma visão crítica,levando-se em consideração, as transformaçõesocasionadas pelo homem na sociedade, com seusatos, ao longo do tempo.

Sabe-se, agora, o que é a história. Mas, paraque ela serve? Eis a respostas: “A função da his-tória, desde seu início, foi a de fornecer à socieda-de uma explicação sobre ela mesma.” (BORGES,1993, p. 49). Dessa maneira, “saber o que o ho-mem fez em sociedade desde que está na Terramostra muito sobre o próprio homem, ajuda aentendê-lo e a entender as sociedades. É como o

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fato de se saber o que faz e fez uma pessoa. Aju-da a entendê-la” (idem, ibidem, p. 54).

Ainda sobre a importância e função da His-tória, Albergaria (2012) leciona que para que o serhumano possa entender quem é, como pensa ecomo sente, é necessário que se tenha consciên-cia da sua história, do seu passado. Para ele, deve-se aprender, com a História, o que Homem já feze deu certo, para repetir; bem como perceber oque deu errado, para tentar evitar esses erros. Sóquem conhece a história consegue entender seusentido e utilizá-la como ferramenta para melho-rar o presente e, quem sabe, antever um pouco ofuturo.

A fim de fornecer uma explicação à socie-dade sobre ela mesma e tentar repetir acertos eevitar erros, a história, hodiernamente, aproxima-se cada vez mais das outras áreas do conheci-mento que estudam o homem (a Sociologia, a An-tropologia, a Economia, a Geografia, a Psicologia,a Demografia, e outras).

A estas áreas do conhecimento, elencadas noparágrafo anterior, adiciona-se, nestas linhas, o Di-reito. Este sempre tem ajudado a história a dar al-gumas explicações para a sociedade. Muitas vezeso Direito serve, até mesmo, de fonte para a história,e, em outras oportunidades, busca, na história, res-postas para questões hodiernas; entretanto, sobre arelação entre os dois, tratar-se-á adiante.

3 DIREITO: CONCEITOS E ALGUNSAPONTAMENTOS

Sobre a origem do termo “Direito”, há a se-guinte doutrina:

A palavra ‘Direito’, bem como ele própriono sentido amplo da Ciência do Direito, vemdos Romanos antigos e é a soma da pala-vra DIS (muito) + RECTUM (reto, justo,certo); ou seja, Direito em sua origem signi-fica o que é muito justo, o que tem justiça(CASTRO, 2009, p. 2).

Sabendo, portanto, que a palavra “Direito”formou-se desta junção latina (dis + rectum), pode-se entendê-la, segundo um verbete de De Plácidoe Silva, como “tudo aquilo que é conforme à ra-zão, à justiça e à equidade” (apud NASCIMEN-TO, 2001, p. 7).

Nos dizeres de Reale (2011, p. 64), “a pala-vra Direito tem diferentes acepções, o que podeparecer estranho, mas já advertimos que é impos-sível nas ciências humanas ter-se sempre uma sópalavra para indicar determinada ideia e apenasela.”. Não se pode negar a verdade do comentá-rio de Reale. Todavia, pode-se acrescentar que,não obstante a palavra ‘direito’ se apresente comuma diversidade de acepções, e cada uma comsuas peculiaridades, elas se inter-relacionam.

Sobre essa questão, discutida no parágrafoacima, há o seguinte comentário, cheio de deta-lhes, verbis:

O vocábulo direito pertence à classe daspalavras analógicas4 – aquelas que têm sen-tidos diferentes, mas com ligação, conexão,entre si. Assim, se se diz que Direito é umalei, uma norma, há uma classificação de talciência com objetividade. Para se entenderDireito em sentido subjetivo, tem-se deentendê-lo como uma possibilidade de dis-por do que pertence a alguém ou conces-são de uma atitude a outrem na área que éparticular a alguém, e, se se pensa o direitocomo aquilo que é correto, reto, perfeito, aqualidade justiça é que vale mais. Comopalavra analógica, pode-se perceber quetanto o caráter objetivo quanto o subjetivoou na questão da qualidade, o que se falaem direito tem ligação entre si. Há, portan-to, conexão de ideias, embora com signifi-cados diferentes (VELOSO, 2005, p. 22).

Apesar de parecer simples dar uma defini-ção para o Direito, esta é uma tarefa demasiadocomplexa. Nesse sentido, o Direito pode ser defi-nido, assim como a História (vide “tópico 2”), dediversas maneiras. Deste modo, semanticamente,“o vocábulo direito é polissêmico, por ter mais deum significado para um único verbete.” (VELOSO,2005, p. 22). Entendendo, portanto, a palavra di-reito como polissêmica, ter-se-ão, assim, muitasacepções para ela. Dessa forma, Direito pode serum curso superior que forma bacharéis; pode serainda, o ordenamento jurídico de um país (Direitobrasileiro, Direito argentino, alemão, etc.); pode,outrossim, ser um direito subjetivo de alguém; podeser utilizado como sinônimo de Justiça, como fatosocial, entre outras possibilidades.

Indo pelo mesmo caminho do parágrafo an-terior, Dimoulis (2008) distingue quatro significa-

4 Assim como a “história”, como pode ser visto no tópico anterior, o “direito” também é uma palavra analógica(sentidos diferentes, mas com ligação entre estes).

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dos diferentes do termo “Direito”. No primeiro,ele escreve que: “Direito é o justo, aquilo que cadapessoa deve fazer ou deixar de fazer em uma so-ciedade bem ordenada e justa. Este significado estárelacionado com o termo latino directum, que sig-nifica reto, bem direcionado, correto.”(DIMOULIS, 2008, p. 18-19). No segundo signi-ficado para o termo, ele diz que: “Direito é aquiloque alguém pode fazer, exercendo uma faculdade[...], exigindo uma prestação [...] ou omissão [...].Esta é definição do ‘direito subjetivo’” (idem,ibidem, p. 19) – de onde a ideia da facultas agendi.Em uma outra definição, Dimoulis registra: “Direi-to é o estudo das normas jurídicas [...]. Aqui otermo ‘direito’ designa o conjunto das disciplinasjurídicas, que muitos denominam ‘ciências jurídi-cas’” (idem, ibidem, p. 19).

Em uma última tentativa de mostrar mais umadefinição que é a dada ao direito, Dimoulis ensinaque este “é o conjunto de normas que objetivamregulamentar o comportamento das pessoas nasociedade. Essas normas são editadas pelas auto-ridades competentes e preveem, em caso de vio-lação, a imposição de penalidades por órgãos doEstado.” (DIMOULIS, 2008, p. 19) – eis a ideiada normas agendi.

Soibelman preleciona que:

Existem dezenas de definições do Direito, eKant admitiu que não havia uma definiçãoque satisfizesse a todos. É que a definiçãoexige um estudo prévio para separar o di-reito das normas de outra natureza que re-gem a vida humana, tais como as regrasmorais, a de adesão a uma filosofia queconceitua o jurídico desta ou daquela for-ma, por antecipação ao conjunto com a re-alidade que deverá ser reconhecida comojurídica (SOIBELMAN, 1981, p. 120).

Concorda-se, por evidente, com Soibelman,quando ele enfatiza a dificuldade em se definir oDireito. Já se mostrou, nos parágrafos acima, ocaráter analógico e polissêmico do Direito. Cabe,ainda, ressaltar, nessa oportunidade, que o concei-to de Direito sofre mudanças ao longo dos tem-pos. Dimoulis elenca dezoito definições do direitona “Lição 1” de seu livro Manual de introduçãoao estudo do direito, mostrando exatamente essaideia de diferença entre os conceitos. Entre ospensadores que ele, Dimoulis, trabalha, buscandoo conceito de Direito, pode-se elencar Platão,Aristóteles, Celso e Ulpiano, Tomás de Aquino,Thomas Hobbes, Samuel Pufendorf, Baruch

Spinoza, Jean-Jacques Rousseau, Immanuel Kant,Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Friedrich Carl vonSavigny, Karl Magnus Bergbohm, Eugen Ehrlich,Hans Kelsen, Yevgeniy Bronislavovich Pachukanis,Robert Alexy, Eros Roberto Grau. E passa pelosestoicos, como fundamento.

Pensando nas convergências das definiçõesdos pensadores elencados acima, Dimoulis (2008)percebe que os pontos em comum existentes nessesconceitos são a relatividade histórica do Direito e oDireito como dever ser social e a coerção. Essessão elementos presentes nas definições, daquelesautores citados, feitas em diversos períodoshistóricos.

Sobre a relatividade histórica do Direito,Dimoulis (2008) leciona que a definição do Direitonão pode ser válida para todas as sociedades epara todos os tempos. Nesse sentido, fica eviden-te o dinamismo do Direito. Como exemplo disso,têm-se as palavras de que “O direito que conheciaPlatão ou Aristóteles era diferente do direito cris-tão da época medieval e este último é diferente dodireito capitalista da atualidade.” (DIMOULIS,2008, p. 35).

Em todas as definições, os autores dos con-ceitos de Direito consentem que ele é compostode normas que regulamentam o comportamentodas pessoas na sociedade, mostrando, assim, acaracterística do dever ser social do Direito. Porfim, “um outro elemento em comum das váriasdefinições encontra-se na constatação de que odireito é um dever ser de particular natureza [...]um dever ser particularmente forte e ameaçador.”(DIMOULIS, 2008, p. 38), o que demostra a pre-sença do elemento “coerção” nos conceitos dedireito.

Refletindo um pouco sobre as divergênciasideológicas nas definições de Direito, Dimouliscomenta que “esses elementos em comum nãoescondem as grandes divergências entre as defi-nições do direito. Quando se trata de autores queviveram em épocas diferentes podemos explicaras diferenças lembrando da relatividade históricadas experiências jurídicas.” (DIMOULIS, 2008,p. 38). Todavia, quando os autores atuaram nomesmo período e contexto, e às vezes até na mes-ma cultura, e mesmo assim divergem nas defini-ções do Direito, deve-se, a divergência, “ao fatode que cada um adota uma ótica diferente, devidoàs suas concepções filosóficas e científicas.”(DIMOULIS, 2008, p. 39), como já explicouSoibelman, em palavras anteriormente transcritas.

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Pensando o Direito em qualquer uma das suasdefinições, mas, observando, principalmente, a úl-tima definição feita por Dimoulis, já supracitado, eentendendo o Direito, em um sentido comum, como“o conjunto de normas para a aplicação da justiçae a minimização de conflitos de uma dada socie-dade.” (CASTRO, 2009, p. 2), pode-se percebero fator humano. Tanto é que “estas normas, estasregras, esta sociedade [presentes no conceito aci-ma] não são possíveis sem o Homem, porque é oSer Humano quem faz o Direito e é para ele que oDireito é feito.” (CASTRO, 2009, p. 2). Aqui, per-cebe-se a mister importância do indivíduo na con-fecção do Direito e a quem ele se destina.

Ráo comenta sobre essa dependência do fa-tor humano. Segundo ele, “o direito pressupõe,necessariamente, a existência daquele ser e da-quela atividade. Tanto vale dizer que pressupõe acoexistência social, que é o próprio homem.” (1995,p. 51). Nesse mesmo diapasão, a doutrina ensinaque:

O ser humano é gregário por natureza, nãosó pelo instinto sociável, mas também porforça de sua inteligência, que lhe demonstraque é melhor viver em sociedade para atingirseus objetivos. O homem é “essencialmentecoexistência”, pois não existe apenas, mascoexiste, isto é, vive necessariamente emcompanhia de outros indivíduos. Com isso,espontânea e até inconscientemente, é le-vado a formar grupos sociais: famílias, esco-la, associações esportiva, recreativa, cultu-ral, religiosa, profissional, sociedades agrí-cola, mercantil, industrial, grêmio, partido po-lítico, etc. (DINIZ, 2012, p. 260).

Nesse sentido, frente às reflexõesapresentadas sobre a História e o Direito enquantociências, fica evidente a importância das duas áreas,bem como uma clara das suas relações com oHomem. Não se faz História ou Direito sem seperceber as constantes transformações dasociedade e os mecanismos tradicionais e legais queconformam as relações sociais. História e Direito,nesse contexto, se inter-relacionam, permitindo,dessa forma, compreender, com maior eficácia, umaHistória do Direito.

4 HISTÓRIA DO DIREITO: CONCEITOE CONVERGÊNCIAS DE DUAS ÁREASDO CONHECIMENTO

Rabinovich Berkman (2011) entende queexistem duas áreas do saber presentes na Histó-

ria do Direito, todavia, mesmo sendo um jurista,pelas suas palavras, não desvalorizando o Direito(logicamente), percebe-se uma exaltação da His-tória. Para ele, quando se diz “História do Direi-to”, faz-se referência a duas ciências: a históricae a jurídica. Dessa forma, assumir-se-ia como pro-posta a existência de uma terceira disciplina. Estateria suas peculiaridades, mas sempre seria umaciência histórica. Ainda sobre essa questão, escla-rece:

O fato de tratar-se de uma disciplina históri-ca significaria que as pessoas que a cultivabuscam pesquisar, descobrir e recriar o pas-sado humano. O fato de ser “jurídica” impli-caria que elas se interessariam especifica-mente pelos aspectos do passado vincula-dos ao direito de modo mediato ou imediato(RABINOVICH-BERKMAN, 2011, p. 1).

Destarte, quem optar por trabalhar com essadisciplina História do Direito deverá utilizar asferramentas críticas e as categorias terminológicasde ambas as disciplinas: a História e o Direito(RABINOVICH-BERKMAN, 2011).

Ao contrário do que prega Rabinovich--Berkman, Albergaria valoriza o Direito no quediz respeito a essa relação História-Direito, e, as-sim, ele acusa, tempestivamente, sobre a impor-tância da História do Direito e o seu papel sinequa non para se entender a sociedade e a huma-nidade. Para ele,

é importante destacar que o Direito é a pró-pria História da nossa humanidade. Não hácomo separar os dois elementos. Apesar dea História poder ser vista por várias facetas,tais como pelas artes, pela culinária, pela fi-losofia, pela medicina, pelo desenvolvimen-to científico e tecnológico, é justamente pelanoção jurídica dos povos que se tem umacorreta interpretação do mundo pretérito ede cada cultura (ALBERGARIA, 2012, p. 4).

Dessa forma, percebe-se, portanto, que aHistória do Direito, tratada como disciplina ou comosegmentação para fins de estudos, é apresentadacomo a História do próprio mundo jurídico, comoum todo. Nesse sentido, “o objetivo da história dodireito é a interpretação dialética do fenômeno ju-rídico e seu dimensionamento em função do tem-po.” (DINIZ, 2012, p. 249).

Wolkmer disserta que se pode, ademais,

conceituar a História do Direito como par-te da História geral que examina o Direito

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como fenômeno sociocultural, inserido numcontexto fático, produzido dialeticamentepela interação humana através dos tempos,e materializado evolutivamente por fonteshistóricas, documentos jurídicos, agentesoperantes e instituições legais reguladoras(WOLKMER, 2010, p. 5).

Nesse ínterim, pode-se dizer que “a históriado direito estuda as instituições jurídicas dos po-vos civilizados nas fases sucessivas de seu desen-volvimento. Baseia-se em documentos, represen-tados por escritos ou por monumentos chegadosaté nós, como o Código de Hamurabi, de mais oumenos 2000 a.C.” (KLABIN, 2004, p. 21).

É interessante destacar, ainda, que o “direitonão se conserva estático, mas se dinamiza e setransforma na medida em que as condições soci-ais assim exigem; não há como desvinculá-lo darealidade histórica, pois é preciso saber como estedireito foi, até ontem, para entendê-lo, hoje, emelhorá-lo, amanhã” (AZEVEDO, 2005, p. 21).

Assim, com outros termos, mas que se com-pletam em termos de melhor definição,

o historiador procura reviver ou reconstruiro fenômeno jurídico em sua singularidadeespecífica a fim de compreender seu signi-ficado no tempo. Faz uma análise atual dodireito pretérito para, verificando os finsque perseguiram e seus efeitos sobre a so-ciedade, assinalar as vantagens ou incon-venientes das normas ou instituições nopassado, comparando as soluções que sederam antes ou surgiram depois, para che-gar ao conhecimento de todo processo his-tórico do direito (DINIZ, 2012, p. 248-249).

Sabe-se que, para se fazer História do Di-reito é preciso se pesquisar as legislações da épo-ca. Mas, só as leis são suficientes como fontespara esse tipo de pesquisa? A resposta vem assim:

As fontes da história do direito, além dosescritos propriamente jurídicos, tais comoleis e obras dos jurisconsultos, utilizam tam-bém documentos de ordem histórica e lite-rária. A ‘história romana’ de Tito Lívio; osdiscursos tratados de Cícero, por exemplo,completam o manancial de documentos nosquais se abebera o historiador do direitoromano (KLABIN, 2004, p. 22).

Pensando na finalidade de se estudar Histó-ria do Direito, Wolkmer (2010) leciona que quan-to aos objetivos da História do Direito, o escopo éfazer compreender como é que o Direito hodierno

se formou e se desenvolveu, bem como de quemaneira evoluiu na defluência dos séculos. Domesmo modo, o intuito é o exame crítico das legis-lações passadas com a finalidade de exposição desuas sucessivas transformações, frisando, comefeito, os modos por que estas ocorreram, confor-me as mudanças da consciência, das condições enecessidades sociais. Em resumo, a História doDireito tem uma finalidade precípua, que interpre-tar, criticamente, todos os caminhos que levam àvisão das instituições jurídicas atuais, com alicer-ce no que aconteceu alhures e em tempos idos.Tudo isso, em busca de fixação de normas quetornem o Ser Humano mais social, mais condizen-te com a sua condição de “humano”, cumpridordas regras de convívio.

Conhece-se, agora, a importância da Histó-ria do Direito, o seu conceito, qual o seu objeto equal a sua finalidade. Assim, para complementaresse tópico, pretende-se relacionar, de maneiramais detalhada, a História e o Direito. Nesse sen-tido, além de serem palavras em que ambas têmcaráter polissêmico e analógico, como já tratado,é “possível perceber que História e Direito têm[ainda] algo em comum: o Homem. Assim, partin-do do Ser Humano, é necessário salientar algunspontos primordiais.” (CASTRO, 2009, p. 3).

Dentre todos os seres vivos, o Homem é, porexcelência, o que produz cultura, o que manifestaraciocínio elevado, o que valoriza a memória (his-tória). Para inteirar o tema, é interessante recor-dar algumas formulações convencionais de Cul-tura. Assim, cumpre assinalar que esta pode ex-pressar: “a totalidade das manifestações e formasde vida que caracterizam um povo.” (JAEGER,1979, p. 7); “o conjunto de tudo aquilo que, nosplanos material e espiritual, o homem constrói so-bre a base da natureza, quer para modificá-la, querpara modificar-se a si mesmo.” (REALE, 2011, p.25); e, ainda, que “cultura é o conjunto das práti-cas, das técnicas, dos símbolos e dos valores quese devem transmitir às novas gerações para ga-rantir a reprodução de um estado de coexistênciasocial.” (BOSI, 1992, p. 16).

Os conceitos de cultura desenvolvidos noparágrafo acima vão, todos, pelo mesmo caminho;todos têm o mesmo sentido. Dessa forma, há con-vergências nos conceitos, pois, Jaeger, Reale e Bosivisualizam a Cultura como “o processo pelo qualo homem acumula as experiências que vai sendocapaz de realizar, discerne entre elas, fixa as deefeito favorável e, como resultado da açãoexercida, converte em ideias as imagens e lem-

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branças. [...]” (PINTO apud CASTRO, 2009, p.4).

Pode-se, portanto, perceber que o que se temcomo cultura representa um tom temporal,marcador de um tempo, fixador do momento his-tórico. A cultura indica, além das característicasdo indivíduo que a professa, também indica a épo-ca, o local e até o grupo social em que está maispresente quem a manifesta. E, para confirmar isso,tem-se o ditado árabe citado por Bloch, que diz:“O Homem se parece mais com seu tempo quecom seus pais.” (BLOCH, 1976, p. 36).

Nesse diapasão, pode-se concluir que,

Sendo o Direito uma produção humana, eletambém é cultura e é produto do tempo his-tórico no qual a sociedade que o produziuou produz está inserida. Plagiando o dita-do árabe, poderíamos afirmar que o direitose parece com a necessidade histórica dasociedade que o produziu; é, portanto, umaprodução cultural e um reflexo das exigên-cias desta sociedade (CASTRO, 2009, p. 4).

Compartilhando desse pensamento, Altavila(1963, p. 8) escreve que “os direitos sempre fo-ram espelhos das épocas.”. Para o mesmo autor,

os direitos dos povos equivalem precisa-mente ao seu tempo e explicam no espaçode sua gestação. Absurdos, dogmáticos,rígidos, lúdicos e liberais, - foram, todavia,os anseios, as conquistas e os baluartes demilhões de seres que, para eles, levantaramas mãos, em gesto de súplica ou de enter-necido reconhecimento (ALTAVILA, 1963,p. 12).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acredita-se que um maior diálogo entre aHistória e o Direito contribuiria para um maioravanço dessas duas áreas do saber. Com efeito,o Direito serviria como campo (ou como fonte) depesquisa para a História. E já esta poderia ser útilpara o melhor entendimento daquele.

Ainda pensando na relação entre as jásupracitadas áreas do saber, “a história se mostraimportante para o Direito no momento em que servecomo conhecimento e acúmulo de experiênciaspassadas, possibilitando uma ampliação das análi-ses de situações jurídicas e na interpretação dostextos normativos.” (FERREIRA, 2008, p. 1). Arecíproca é verdadeira. A História, outrossim, pre-cisa do Direito. O Direito propicia à História a vi-

são do passado que faz com que as regras do pre-sente e do futuro sejam mais apuradas, mais jus-tas e, sobretudo, representativas da cultura do queé Bom, Justo, Humano e apreciável. Portanto, é anoção jurídica da História é que permite que secompreenda melhor a cultura, a sociedade, a polí-tica e o sistema de um determinado povo.

Mesmo assim, um importante aspecto deveser reafirmado quando se procura interseções en-tre duas áreas: não se faz História sem compreen-der o Homem. Não existe Direito sem a importan-te consideração quanto aos atos do indivíduo emsociedade. Logo, a História Jurídica só se legiti-mará a partir da exata compreensão das transfor-mações sociais que alteraram a visão do homemsobre a História e sobre o Direito.

REFERÊNCIAS

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AUTOR CONVIDADO

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RESUMO

O presente artigo está ligado à linha de pesquisaConstrução do Saber Jurídico, do Programa de Pós--Graduação em Direito do UNIVEM e ao Grupode Pesquisa denominado Grupo de Estudos, Pes-quisas, Integração e Práticas Interativas (GEP) doqual os autores fazem parte. Os princípios consti-tucionais regem todo o ordenamento jurídico e aspráticas jurisdicionais com alto grau de subjetivi-dade, fazendo com que, sempre ao se tomar atitu-des e defender posicionamentos no âmbito jurídi-co, deve-se passar pelo crivo dos princípios cons-titucionais, desde os expressos de forma direta nalegislação, como aqueles que não o são claramen-te prescritos como o princípio da dignidade huma-na. A importância de se respeitar o princípio dadignidade humana está em afirmar o Direito emseu papel de controlar a coexistência dos sereshumanos de forma justa, que neste sentido se re-fere na busca pela paz. Entendendo por Justiçaaquilo que permite ao ser humano ter seus direitosrespeitados de forma eficaz, pode-se considerarque o Direito deve garantir à pessoa seu direito de“ser humano” no sentido de viver em paz, comdignidade em um ambiente fraterno. Na compre-ensão deste Direito fraterno, deve-se pressuporum Direito não mais pensado como meramentepunitivo, mas sim, com o Direito com funçãopromocional da pessoa humana. Enfim, a defesapor um Direito fraterno é a garantia de que se teráuma ordem jurídica voltada para o ser humano na

PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE HUMANA E O DIREITO FRATERNO

CONSTITUTIONAL PRINCIPLE OF HUMAN DIGNITY AND THE FRATERNAL LAW

Lafayette Pozzoli1

Álvaro Augusto Fernandes da Cruz2

1 Pós-Doutor pela Universidade “La Sapienza”, Roma (2002). Doutor (1999) e Mestre (1994) em Filosofia do Direitopela PUC/SP. Graduação em Direito (1986) pela PUC/SP. Membro do Conselho Editorial da Revista EM TEMPO(UNIVEM) e da Revista de Direito Brasileira - RDBras, do CONPEDI. Membro da Comissão de Ensino Jurídico daOAB/SP. Advogado. Professor no UNIVEM e Professor na PUC/SP. Chefe de Gabinete na PUC/SP. Coordenadordo Mestrado em Direito no UNIVEM. Sócio fundador da AJUCASP. Avaliador para cursos de Direito INEP/MEC.Foi membro do Tribunal de Ética - TED-1 e da Comissão da Pessoa com Deficiência da OAB/SP.

2 Mestre em Direito pelo Centro Universitário Eurípides de Marília (2011); Graduado em Direito pelo Centro Univer-sitário Eurípedes de Marília (2008); Especialista de Perícias em Avaliações Imobiliárias (2010). Professor e Coorde-nador do Curso de Direito na Faculdade de Ciências e Tecnologia de Unaí (FACTU); Professor e Coordenador doCurso de Direito da Faculdade Santo Agostinho de Sete Lagoas (FASASETE).

sua dignidade e com isso, a conquista de um Direi-to cada vez mais justo, atingindo a máxima eficá-cia no controle social pleno para o qual foi criado.Palavras-chave: Dignidade Humana.Fraternidade. Princípios Constitucionais. Direito àVida. Justiça. Igualdade.

ABSTRACT

This article is on line connected to KnowledgeConstruction in Law, the Post Graduate Programin Law from the Univem and Research Group -GEP - Group of Studies, Research, Integration andInteractive Practices, which the authors aremembers. The constitutional principles rule all ourlegal planning and judicial practices with a highdegree of subjectivity, so that when we take theattitudes and defend positions in the legal sense,we must pass the scrutiny of constitutionalprinciples, since the cast directly in the legislation,as those that are not clearly prescribed as theprinciple of human dignity. The importance ofrespecting the principle of human dignity is to assertthe right in its role of monitoring the co-existenceof human beings fairly, in this sense refers to thequest for peace. Understanding as justice whatmakes possible to a human have their rightsrespected effectively, we can consider that a lawmust guarantee the individual right to “human being”in the sense of living in peace with dignity in afraternal environment. In understanding this rightfraternal, we must assume a right no longer thought

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of as merely punitive, but with the right topromotional function of the human person. Finally,the defense by a fraternal law is the guaranteethat we will have a law aimed at human beings indignity and with it the conquest of a law more fair,reaching maximum effectiveness in social controlfor which full was created.

Keywords: Human Dignity. Fraternity.Constitutional Principles. Right to Life. Justice.Equality.

1 INTRODUÇÃO

O artigo desenvolve um estudo do princípioda dignidade humana em que se vê não ser estedogmatizado conceitualmente, podendo serexemplificado através de alguns tipos legais, po-rém, deve-se permitir sua análise com toda subje-tividade que lhe é próprio.

Diante do aspecto subjetivo do que vem aser dignidade humana, pode-se concluir que o di-reito à vida, como um direito mais protegido peloser humano, está em um mesmo nível de valor dadignidade humana. Isto porque não é possível daro direito à vida sem preservar um mínimo de digni-dade ao ser humano que é detentor deste direito.

É possível a aplicação deste princípio subje-tivo uma vez que se pode analisar cada ato do uni-verso jurídico com uma carga de valores própriosde uma sociedade ou de uma parcela desta socie-dade, baseando-se nas condutas morais e éticasde cada sociedade que são possíveis de ser en-contradas na mera compreensão das práticas so-ciais. É seguindo este raciocínio que a fraternidadese torna uma categoria importante no processo deefetivação dos direitos.

Deve-se ainda ressaltar o pensamento de umdireito com função promocional da pessoa huma-na, com a qual se cumpre o direito não meramentepor seus instrumentos de coação, mas pela neces-sidade. Função social que efetiva a consciênciade que o cumprimento desse direito é essencialpara proporcionar uma vida digna entre os homens.

Por fim, quando é tomada a dignidade huma-na com uma carga valorativa intensa e realmentepraticada e aceita no universo jurídico, está-se di-ante de um direito que não prima pelo texto que foiescrito, seja ele atual ou retrógrado, mas um direi-to que busca a paz entre os seres humanos e quelhes gera o instinto de vida fraterna.

2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANAE O DIREITO A VIDA

O Princípio da Dignidade da Pessoa Huma-na está disposto no Título I da Constituição Fede-ral, no artigo 1.º, in verbis:

Art. 1.º A República Federativa do Brasil,formada pela união indissolúvel dos Esta-dos e Municípios e do Distrito Federal,constitui-se em Estado Democrático de Di-reito e tem como fundamentos:I - a soberania;II - a cidadania;III - a dignidade da pessoa humana;IV - os valores sociais do trabalho e da livreiniciativa;V - o pluralismo político. (Grifo nossos)

Contudo, a aplicação deste princípio não estádeterminada. Não se encontra no texto constituci-onal norma regulamentadora do referido princípio.Entende-se, assim, que o artigo 3.º da Carta Mag-na, demonstra exemplos de quais seriam os direi-tos de garantia da dignidade humana. Trazem as-sim as letras constitucionais:

Art. 3.º Constituem objetivos fundamen-tais da República Federativa do Brasil:I - construir uma sociedade livre, justa esolidária;II - garantir o desenvolvimento nacional;III - erradicar a pobreza e a marginalização ereduzir as desigualdades sociais e regio-nais;IV - promover o bem de todos, sem precon-ceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, equaisquer outras formas de discriminação.

Nessa seara, não há de se olvidar que se estádiante de um rol meramente paradigmático que olegislador apresentou para nortear o que deve en-tender a hermenêutica jurídica no tocante à digni-dade humana.

Assim, torna-se inevitável a aplicação doPrincípio da Proporcionalidade na tentativa devalorar os direitos entendidos como de dignidadedo ser humano e o direito mais preservado pelaracionalidade humana que é o direito à vida. Nes-se embate, entende-se que tais direitos não devemser distintamente valorados, uma vez que estão nomesmo nível de igualdade por sua importância fun-damental. Com uma análise humanística, pode-seconcluir pela não existência de uma vida humanase esta não é provida de um mínimo de dignidade.

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Neste sentido:

O ser humano é “pessoa” por não ser obje-to nem animal, mas ser dotado deracionalidade e vontade, e é “pessoa hu-mana” porque também é dotado de uma in-dividualidade, isto é, forma um todo com-pleto em si, uma vez que possui valoreshumanos e um espírito digno de respeito eliberdade (MOREIRA, 2001, p. 23).

Seguindo este raciocínio, é de grande valia oensinamento de José Afonso da Silva ao sustentarque tal tipo de dignidade é inerente ao comporta-mento humano, mas que a dignidade prescrita naConstituição Federal de 1988 reporta-se a um atri-buto próprio do ser humano, como um “valor detodo o ser racional” e em virtude disso é que umapessoa não pode ser privada de seu direito funda-mental – a vida. Isto remete sistematicamente ànecessidade da discussão jurídica da dignidadehumana, como sendo a garantidora da vida huma-na.

3 DIGNIDADE HUMANA NA PRÁTICASOCIAL

O ser humano moderno elegeu como direitode principal proteção e cuidado, o direito à vida.Com toda razão, de que valem códigos, leis e nor-mas de conduta na esfera jurídica, se não existiruma vida a ser tutelada, um sujeito? Assim, umavez que o direito à vida é indisponível, surge a ques-tão no sentido de que, do que valeria uma vida porsi só? Ou ainda, existe uma vida se ela não temum valor ou sentido de ser?

É com tal raciocínio que se consegue chegarao ponto em que é indispensável para se falar emproteção à vida, sem fazer dela uma carga de va-lores particulares ou somente sociais.

Portanto, no intuito de agregar à vida essevalor, que é inerente ao ser humano, surge a ne-cessidade de salvaguardar a dignidade humana,para que haja sentido na proteção desse bem tãoprecioso que é a vida humana. O ProfessorFernando Ferreira dos Santos ensina que:

A proclamação do valor distinto da pessoahumana terá como consequência lógica aafirmação dos direitos específicos de cadahomem, o reconhecimento de que, na vidasocial, ele, homem, não se confunde com avida do Estado [...] (1999, p. 20).

Tendo como referência, a dignidade do ser

humano, é fácil identificar seu critério subjetivo, jáque cada ser humano possui sua própria dignidade.Não, perante o Estado, mas perante sua sociedade.Assim, a dignidade humana passa a ter valor em“pé de igualdade” com a vida do homem, vez queum não tem sentido sem o outro. Neste sentido:

Consequentemente, cada homem é fim emsi mesmo. E se o texto constitucional dizque a dignidade da pessoa humana é fun-damento da República Federativa do Bra-sil, importa concluir que o Estado existe emfunção de todas as pessoas e não estas emfunção do Estado (SANTOS, 1999, p. 92).

Pode-se exemplificar de várias formas o queseria uma vida digna que, mesmo já estudado serinerente a cada ser humano, pode ser facilmenteprotegida, no seu mínimo, pelo detentor do Direitoque é o Estado.

O ser humano digno é aquele que tem valo-res agregados a sua vida, valores esses instituídospela sociedade em que vive ou por si próprio, queo Estado pode e consegue muitas vezes reconhe-cer, a exemplo do disposto no artigo 5.º da Consti-tuição Federal.

Ensina Guerra Filho:

O respeito à dignidade humana, à qual sereporta a idéia democrática, requer uma con-cepção diferenciada do que seja “seguran-ça”, “igualdade”, “justiça”, “liberdade”, etc.,onde o ser humano jamais pode ser tratadocomo “objeto” e “meio” de realização dequalquer desses valores, mas sim os sujei-tos a que eles se referem e à promoção dequem essa realização tem por finalidade.

Não há que se falar assim, que cabe apenasà particularidade de cada ser humano sua defesaà dignidade mas, ao detentor do direito, o Estado,cabe a responsabilidade de garantir ao cidadão suadignidade humana como forma de fazer valer sua“autoridade democrática”.

4 DIGNIDADE HUMANA EFRATERNIDADE

A dignidade humana, como se viu anterior-mente, pode ser entendida de diversas formas,considerando a cultura de cada povo. Da mesmaforma, há que se falar em um fio condutor queperpassa o todo da história humana caracterizan-do o princípio da dignidade humana com a vida decada ser humano.

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Não se pode falar em dignidade sem propor-cionar a igualdade entre os seres humanos. Igual-dade material e não igualdade no sentido formalda palavra.

Por outro lado, o conceito material de igual-dade apresenta uma conceituação no cam-po social e observa regra semelhante aoconceito formal, pais a igualdade está emtratar desigualmente os desiguais. A pre-sença do valor “justiça” é uma constante;assim, ao afrontar o princípio da igualdadetratando igualmente os desiguais, estariagerando uma visível situação de injustiça.[...] A paz, assim como a justiça, tem em vis-ta o bem de cada pessoa e de todos, numaexigência de ordem e verdade. Estando apaz sob a mira da ameaça, atinge simultane-amente a justiça (POZZOLI, 2001, p. 106-108, passim).

Apenas o Direito fraterno poderá dar a efe-tiva igualdade entre as pessoas, eliminando o di-reito à igualdade baseado em um poder soberano,ao qual todos estão subordinados, porque o direitoà igualdade deixa de ser efetivo em decorrênciadas desigualdades que ele mesmo impõe, a come-çar pela subordinação dos povos a um poder so-berano, um poder desigual. Pensando neste senti-do, o Princípio da Dignidade Humana, como fun-damento do Estado e garantidor da vida, é possí-vel dizer que se está diante de uma humanizaçãodo Direito ou, ainda, de um Direito mais digno.

Tal entendimento sobre a preocupação coma dignidade da pessoa humana nada mais é do quefalar de um Direito fraterno.

A fraternidade, por mais que esteja impreg-nado na cultura em relação com a religião, aquifica claramente apresentada como o grande obje-tivo da organização jurídica. A ordem jurídica, fun-dada no princípio da igualdade e da paz, voltadapara a dignidade da pessoa humana, é oordenamento da fraternidade. O ser humano nãodeve ser visto apenas como um ser que existe,mas deve ser visto essencialmente como um serque vive em sociedade.

A fraternidade não deve ser vista apenascomo uma ordem suprema ou mística mas, princi-palmente, como uma necessidade para uma me-lhor convivência em sociedade. É assim que lecio-na Toledo (2004, p. 240):

Na medida em que vivemos em um mundoglobalizado, não só econômica, mas cultu-ralmente, o valor da tolerância e do respei-

to à alteridade se faz cada vez mais neces-sário, devendo o Estado, na qualidade deárbitro dos valores sociais, desfazer-se dequalquer liame religioso que impeça o cor-reto exercício de sua função em prol do ver-dadeiro interesse público.

Então, ao se tratar da fraternidade no uni-verso jurídico como uma essência da ordem jurídi-ca, precisa-se atentar para as medidas que devemassegurar ao ser humano digno um Direito frater-no. O exemplo de maior amplitude e historicamentemarcado na vida humana foi, sem dúvidas, a ela-boração da Declaração Universal dos Direitos Hu-manos, da Organização das Nações Unidas(ONU), maior documento jurídico produzido pelahumanidade no século XX. O conteúdo da Decla-ração demonstra, claramente, um único objetivouniversal que é o da busca da paz, o que faz comque o ordenamento jurídico tenha intrínseca liga-ção com o que se afirma ser fraternidade. Sobreeste assunto:

A referida Declaração [...] consigna no seutexto o reconhecimento da dignidade dapessoa humana inerente a todos os mem-bros da família humana e de seus direitosiguais e inalienáveis como constitutivos dofundamento da liberdade, da justiça e dapaz. Foram elementos importantes que tor-naram os direitos da pessoa humana prote-gidos, para que a pessoa não se veja leva-da ao supremo recurso da revolta contra atirania e a opressão (POZZOLI, 2001, p. 110).

A fraternidade é uma nova possibilidade deintegração entre os povos e nações, fundamenta-da no cosmopolitismo, em que as necessidades vi-tais serão suprimidas pela amizade, pelo pacto ju-rado conjuntamente. Com a Declaração Univer-sal dos Direitos Humanos, de 1948, o compromis-so dos ideários foi praticamente universalizado.Conforme dispõe no seu art. 1.º, “todos os homensnascem livres e iguais em dignidade e direitos. Sãodotados de razão e consciência e devem agir unsaos outros com espírito de fraternidade.”. E, noart. 29, item 1, outra importante disposição: “todapessoa tem deveres para com a comunidade, emque o livre e pleno desenvolvimento de sua perso-nalidade é possível.”.

A ideia de “jurar em conjunto” é também umrequisito básico e que dá fundamento para que umnovo humanismo brilhe. Este novo conceito temvínculos com um futuro mais fraterno, em que osacordos são estabelecidos entre os iguais. Não émais o direito comandado por um “Pai-soberano”.

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Um novo conceito ou novo/velho pressupos-to, muitas vezes esquecido ou contaminado é aamizade, que no mundo moderno nada mais quese faz do que acelerar seu processo ambivalente,representada pelo paradoxo inclusão/exclusão.

Certamente que estas reflexões sobre asquestões suscitadas poderão contribuir para a cons-trução de um novo paradigma para o sistema doDireito em especial, e, também, para o sistema dapolítica.

Vale aqui reproduzir o Preâmbulo da Consti-tuição Federal de 1988, em que o Constituinte teveinspirações fundamentadas nos valores quepermeiam a sociedade brasileira, notadamente aparte que faz referência a uma “sociedade frater-na”. In verbis:

Nós, representantes do povo brasileiro, reu-nidos em Assembléia Nacional Constituin-te para instituir um Estado Democrático,destinado a assegurar o exercício dos direi-tos sociais e individuais, a liberdade, a se-gurança, o bem-estar, o desenvolvimento,a igualdade e a justiça como valores supre-mos de uma sociedade fraterna, pluralistae sem preconceitos, fundada na harmoniasocial e comprometida, na ordem interna einternacional, com a solução pacífica dascontrovérsias, promulgamos, sob a prote-ção de Deus, a seguinte Constituição daRepública Federativa do Brasil. (Grifos nos-sos).

5 CIDADANIA É PARCEIRA DA DIGNIDA-DE HUMANA E DA PAZ

Nos últimos tempos, é possível constatar quemuitos relacionamentos entre pessoas (e tambémentre alguns Estados) têm sofrido pequenos aba-los3. Talvez isto vem ocorrendo devido ao fato deque todos se aproximam mais intensamente doprocesso de globalização, intensificando a dimen-são da comunicação.

Para analisar a questão, toma-se, de manei-ra analógica, o seguinte exemplo: existe uma per-feita ordem no universo e que – tudo indica – pa-rece contrastar com uma assim chamada desor-dem que costuma reinar entre as pessoas e povos,como se as suas mútuas relações não pudessemser reguladas senão pela força! Aliás, uma con-cepção errônea, mas frequente, que leva muitos a

julgar que as relações de convivência entre as pes-soas e a sua respectiva comunidade política pos-sam a se reger pelas mesmas leis das forças e doselementos “irracionais” do universo. Mas, a ver-dade é que, sendo leis de gênero diferente, deve--se buscar apenas onde as inscreveu o Criador detodas as coisas, a saber, na natureza humana.

São, de fato, essas leis que indicam clara-mente como regular na convivência humana asrelações das pessoas entre si, as dos cidadãos comas respectivas autoridades públicas. As relaçõesentre os diversos Estados, bem como as das pes-soas e comunidades políticas com a comunidademundial, cuja criação é hoje urgentemente postu-lada pelo bem comum universal que tem nafraternidade um instrumento de grande valia.

Em uma convivência humana bem constituí-da e eficiente é fundamental o princípio de quecada ser humano é pessoa, isto é, natureza dotadade inteligência e vontade livre. Por essa razão,possui em si mesmo direitos e deveres, que ema-nam direta e simultaneamente de sua própria na-tureza. São direitos e deveres universais,invioláveis e inalienáveis.

O Estado de direito garante a inviolabilidadeda dignidade da pessoa humana por meio da or-dem jurídica. Assim, falar em paz é falar da De-claração Universal dos Direitos Humanos, da ONU,que representa um conjunto de aspirações procla-madas como ideal comum de todos os povos quebuscam a paz. Nela, foi resumido o conjunto devalores presentes nos quatro cantos do planeta,tornando-a um documento histórico e da maiorimportância, produzido em meados do século XX.

A referida Declaração consigna no seu tex-to o reconhecimento da dignidade da pessoa hu-mana inerente a todos os membros da família hu-mana e de seus direitos iguais e inalienáveis comoconstitutivos do fundamento da liberdade, da justi-ça e da paz. Foram elementos importantes quetornaram os direitos da pessoa humana protegi-dos, para que a pessoa não se veja levada ao su-premo recurso da revolta contra a tirania e a opres-são.

Objetivando mais facilmente alcançar a pazentre as nações, para que os Estados-membros daONU pudessem convalidar em seus respectivosordenamentos jurídicos da Declaração, foramaprovados em 1966 os Tratados Internacionais

3 Vale lembrar que a ONU proclamou o ano de 2009 como sendo o “Ano Internacional da Reconciliação”, conformeResolução da Assembleia Geral das Nações Unidas (61/17).

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denominados “Pacto Internacional dos DireitosEconômicos, Sociais e Culturais” e “Pacto Inter-nacional dos Direitos Civis e Políticos”4. Com isto,os Estados-membros assumiram a condição decoadjuvantes partícipes da paz.

Os respectivos Pactos, ou melhor, os Direi-tos Humanos, foram concebidos como propostade um sistema de vida integral que abarcasse to-dos os âmbitos, o cultural, o econômico, o políticoe o social, tanto em nível individual como coletivo,e aplicável a todos, sem qualquer discriminação.Este, um desejo de sobrevivência cada vez maisprofundo à medida que cresce a ameaça. Não secontentam em proclamar a sede da vida dos sereshumanos, mas tentam permitir concretamente asobrevivência. Enfim, o exercício da cidadania podeintensificar o processo de discussão de um projetode desenvolvimento que aponta para o bem co-mum, coisa salutar desde que seja observado orespeito à dignidade da pessoa humana a todos,sem distinção.

Resta uma análise da efetividade dafraternidade com sua correlação com a dignidadehumana. Para tanto, deve-se investigar o Direitocom a sua função promocional da pessoa huma-na.

6 O DIREITO COMO FUNÇÃOPROMOCIONAL DA PESSOA HUMANA

O que caracteriza o Direito Positivo, no mun-do contemporâneo, é uma contínua mudança. Porisso mesmo, torna-se difícil identificar o jurídico sópelo conteúdo. Daí, a necessidade de conhecer,identificar e qualificar as normas como jurídicas,pela sua forma. A este respeito, Kelsen deu umacontribuição teórica, de admirável rigor, ao elabo-rar, no âmbito da sua teoria, o Princípio da Dinâ-mica do Direito, graças ao qual conhece-se queuma norma é válida não porque tem um certo con-teúdo mas, sim, porque foi formalmente criada deacordo com as normas previstas no ordenamento.E, dentre elas, as do Preâmbulo da ConstituiçãoFederal de 1988, como visto no item anterior.

Com isto, não é difícil identificar no Direitoum instrumento promocional da pessoa humana,não sendo tão somente um Direito punitivo masum Direito fraternal. Neste ponto, há harmoniacom a seguinte doutrina:

O fim do Direito é ordenar a vida da socie-dade, orientando a conduta de seus mem-bros e a atividade de suas instituições. Paraesse objetivo, ele estabelece normas e pro-cura garantir a eficácia das mesmas, atribu-indo conseqüências positivas a seu cum-primento e negativas ou punitivas à suaviolação. Ver no Direito apenas o aplicadorde sanções punitivas é diminuí-lo(MONTOURO, 1999, p. 252, grifos nossos).

É a nova forma de ver/analisar/aplicar o Di-reito. Aliás, o uso de estímulos positivos, de ma-neira preponderante o fraternal, em relação aosaspectos negativos, passa a ser uma característi-ca das diversas ciências, não se circunscrevendotão somente ao Direito. Afinal, os humanistas, ohumanismo, estão presentes nos diversos setoresda sociedade.

É com as indicações acima ponderadas quese busca supedâneo no contexto da Teoria do Di-reito Formal para mais bem poder compreender otipo de normas que tratam dos Direitos Humanose, notadamente do Direito fraternal, considerandotal Direito com a sua efetiva aplicação, ou seja, oexercício da cidadania.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, é neste sentido que a fraternidadeno Direito deixou, há muito, de ser uma preocupa-ção somente para os teólogos ou filósofos. O Di-reito fraterno, hoje, é um Direito do ser humanocomo pessoa digna, e é dever do Estado garantirtal segurança.

Cabe, notadamente aos juristas, posicionar elutar por este Direito. Mas, também, uma tarefa--dever de todos os cidadãos. O Direito fraterno éracional, é lógico e totalmente possível como de-monstrado. E, por isso, merece a atenção de todosos cidadãos e, notadamente, a classe dos agentesdo Direito que é a maior responsável pelas maisdiversas doutrinas existentes no mundo jurídico.

A defesa por um Direito fraterno é a garan-tia de que se terá uma ordem jurídica voltada parao ser humano na sua vida digna e com isso, a con-quista de um Direito cada vez mais justo, atingindoa máxima eficácia no controle social pleno para oqual foi criado.

Deve-se ter em mente um Direito que nãodeve ser pensado como mecanismo para legalizar

4 O Brasil já convalidou em seu ordenamento jurídico os respectivos Pactos em 1992.

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punições ao cidadão por seu descumprimento mas,o Direito com sua função promocional, que o fazser obedecido pela consciência do homem à im-portância da norma.

O começo da concreta efetivação de umanorma jurídica se dá com a sua plena correlaçãocom os valores existentes na sociedade, num pro-cesso de conscientização. Assim, como analisado,no contexto há que ser observado o Princípio daFraternidade, lastreado como um farol que iluminatodo o Ordenamento Jurídico que é o Princípio daDignidade da Pessoa Humana. Em síntese, valeressaltar, um Direito voltado para a proteção esegurança da dignidade da pessoa humana, quemuito ajuda na construção de uma cidadania res-ponsável na busca de uma sociedade solidária efraterna, sem exclusões de qualquer segmentosocial.

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RESENHA

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RESUMO

Este trabalho possui o escopo de, a partir da aná-lise da obra “Contar a Lei” de François Ost, pro-mover uma leitura acerca das distinções, bem comodas similitudes ou entrelaçamentos, existentes en-tre o Direito e a Literatura. Por meio de um estu-do analítico, intenta-se traçar a necessidade de queambas as vertentes, jurídicas e literárias, se enlei-em com o objetivo de que o Direito se edifique,aprimore e seja ungido da sensibilidade e poderinventivo que a Literatura agrega em si.

Palavras-chave: direito e literatura, “Contar a lei”,François Ost.

LAW AND LITERATUREA study of the book “Tell the Law” of

François Ost

ABSTRACT

This work has the scope from the analysis of thebook “Tell the Law” of François Ost, promotereading about the distinctions and the similaritiesor twists existing between Law and Literature.Through an analytical study, an attempt is made totrace the need for both sides, legal and literary, isinvolve with the purpose of that Law is built up,improve and be anointed sensitivity and inventivepower that Literature adds itself.

Keywords: Law and Literature, “Tell the law,”François Ost.

Introdução

A obra de François Ost apresenta riquezaexplícita de intertextualidades trabalhadas numcontexto que busca a aproximação einterdisciplinaridade entre Direito e Literatura. Tra-

DIREITO E LITERATURA: um estudo da obra “Contar a lei”, de François Ost

Gabrielle Xavier Ribeiro1

1 Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Santo Agostinho; Pós-Graduanda em Direito Público pela FaculdadeDamásio.

ta-se, pois, de uma nova hermenêutica que buscainterpretar o Direito sob um filtro inovador. Nestetrabalho, serão abordadas diversas semelhanças ediferenças entre as duas áreas de modo que o au-tor demonstra, em sua conclusão, a importânciade que ambas atuem de forma convergente per-mitindo que o Direito se enriqueça e se preenchadas contribuições que a Literatura pode angariarpara sua compreensão.

Desenvolvimento

Inicialmente, o autor remonta a Platão, inau-gurando a análise de que, primordialmente, as re-lações entre Direito e Literatura padeciam de um“não acolhimento”, dada a censura que havia pe-rante a aceitação ou não de uma obra de arte paraapreciação do público quando esta partisse de in-teresses meramente jurídicos. Todavia, FrançoisOst descreve que o próprio Platão afirma que aordem jurídica é a “mais excelente das tragédias”o que evidencia sua admissão da literatura comodetentora de um poder constituinte que origina econstrói montagens políticas e jurídicas. Destarte,Ost sustenta que se analise a relação citada alhu-res “com Platão” e “contra Platão” tendo comomedida os aspectos que serão posteriormente dis-cutidos.

No delinear da obra são propostos diversosquestionamentos os quais o próprio autor se com-promete a responder ao longo do estudo, possibili-tando assim um compreender perscrutado dos pen-samentos ventilados.

Questão 1: Entre Direito e Literatura, as li-gações são necessariamente perigosas?

Em resposta a essa interpelação, Ost elencaas diferenças existentes entre os dois discursosanalisados abrindo o espaço da “ficção imaginárialiterária” e ressaltando a realidade e imperatividadeda ordem jurídica.

A primeira diferença, conforme o autor, severifica na premissa de que: “a literatura libera ospossíveis, o direito codifica a realidade” (p. 13).

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Com isso, procura demonstrar que a literatura, di-ferentemente do direito, não se prende a regraspostas, mas sim desordena o que se mostra rígidopermitindo uma interpretação por vezes colidenteao que a ordem jurídica instaura.

A literatura se apresenta como a crítica, onão estar conforme que caracteriza seu podermutacional e a imprevisibilidade do desfecho, bemcomo é mencionado pelo autor no exemplo deÉsquilo. Em contrapartida, o direito preocupa-seem fixar regras de conduta, limitando os compor-tamentos e os codificando, como forma de preverrespostas ao que a realidade utopicamenteconstruída exigir, sempre condizente ao ponto devista dominante, a despeito das minorias. A litera-tura também se presta a demonstrar os desarran-jos originados pelo excesso de direito, ou seja, quan-do este é aplicado ferrenhamente. Ost cita as inú-meras fontes de saber que as narrativas de ficçãoguardam e que deviam ser aproveitadas pelas ci-ências sociais vez que trazem uma nova interpre-tação do texto normativo que expõe suas fragili-dades e sugere inovações. Ainda segundo o autor:

[...] o direito faz escolhas que se esforçapor cumprir, em nome da “segurança jurídi-ca” à qual atribui a maior importância. Entreos interesses em disputa, ele decide; entreas pretensões rivais, ele opera hierarquia.Assim o exige sua função social que lheimpõe estabilizar as expectativas etranquilizar as angústias. Livre dessas exi-gências, a Literatura cria, antes de tudo, asurpresa: ela espanta, deslumbra, perturba,sempre desorienta (OST, 2004, p.15)

Ainda nessa perspectiva, é traçada a segun-da diferença que se perfaz no poder explorador daliteratura enquanto desvendadora de todas as saí-das do caminho. Nesse diapasão, esta vislumbraconhecimentos novos e engendra novos olharessobre o fato enquanto que o direito não dar-se aconhecer essas saídas, tendo em vista o fato deque este direciona o caminho a ser seguido e nãoabre margem a possibilidades.

A terceira diferença concerne ao estatuto dosindivíduos de que fala cada um desses discursos.Citando Ch. Biet, François Ost assevera que: “oDireito produz pessoas, a literatura, personagens.”(p. 16). O Direito impõe aos indivíduos uma más-cara normativa na medida em que dita comporta-mentos padrões e características pessoais quequalificam ou desqualificam as pessoas, como, porexemplo, cite-se o “homem médio”, a já rechaçada

“mulher honesta”, pessoa de “reputação ilibada”e de “notório saber jurídico”, entre tantas outras.Já nos personagens literários, sua naturezaambivalente se constrói a depender da situaçãoenfrentada por estes, metamorfoseando-se e in-vertendo papéis sem obedecer a uma padroniza-ção. Ao explicar mais detidamente a diferençaexposta, o autor traz a distinção que P. Ricoeurestabelece entre duas formas de identidade, sen-do estas:

[...]a identidade idem, que corresponde àquestão “o que eu sou?” e que se traduzpor traços fixos, e a identidade ipse, quecorresponde à questão “quem eu sou?”,ligada às variações de uma personalidadeque evolui com o tempo e com os outros(OST, 2004, p. 18).

A literatura é quem abre espaço para a dis-cussão do idem esclarecendo que os seres huma-nos não são estereótipo imutável e fixado, mas simque respondem por si mesmos e se modificamconforme as circunstâncias também se modifica-rem.

A quarta e derradeira diferença diz respeitoao fato de que o direito se declina para o registroda generalidade e abstração, isto é, procurar abar-car, abstrativamente, o maior número de situaçõese pessoas possíveis, ao passo que a literatura sedesdobra no particular e no concreto, singularizan-do uma determinada história condizente com igual-mente determinado personagem.

Após apresentadas as diferenças, FrançoisOst alude ao fato de que, malgrado todas as distin-ções feitas e sem lhes retirar o devido apreço, adiscussão não finda com o mero elencar de pontosdivergentes posto que estes se comunicam e atu-am convergentemente em alguns aspectos. O au-tor trata, por conseguinte, das posições instituídase funções instituintes do direito e, de maneira in-versa, a vertente instituinte do imaginário e suasformas instituídas. O direito, enquantoregulamentador da realidade social não é uma for-ça estática, apesar de se pautar em normas previ-amente fixadas, visto que este se depara, constan-temente, com práticas e interesses contrastantescom a norma que lhe exigem uma criação imagi-nária e desconstrução de significações instituídas.Nesse contexto, o direito possui a capacidade dese mobilizar e refundar-se de acordo com os dita-mes individuais e situações vislumbradas no casoconcreto. Logo, o imaginário jurídico concebido

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enquanto intérprete inovador, em muito se asse-melha à literatura em seu poder inventivo e explo-rador.

No que reputa às formas instituídas, aliteratura não se mostra alheia a estas, o que podeser verificado em sua “submissão” às regras delinguagem e ao jogo da comunicação. Ainda quese tente desformalizar as chamadas “leis universaisde produção de sentido”, o princípio de umacodificação mínima não pode ser abolido bem comonão se pode ignorar a linguagem. Outrossim, aliteratura deixa-se dominar pela ética e não sedesvincula do que é justo, mormente, quando estase propõe a representar um dispositivo demanutenção do vínculo social. Conforme apregoao autor, a narrativa deixa-se apoderar pela normae se traduz numa obrigação de contá-la e revivê--la em significações novas, a exemplo das normasreligiosas, pedagógicas e políticas. Destarte, restacomprovado que a relação direito-literatura permiteum entrelaçamento de ambos os discursosfazendo-se necessário compreender o que decomum existe entre estes.

Ost defende que, diversamente do que seentabula nas faculdades de direito, este não se ori-gina do fato e sim da narrativa, posto que este éconstruído e reconstruído a partir das realidadesindividuais de personagens reais que vão além daspessoas juridicamente criadas pelo direito. Direitoe literatura assemelham-se em sua raiz igualmen-te fundada no imaginário coletivo que induz à co-incidência e confusão entre ambos de modo que,excluindo a literatura do direito, este padecerá deperdas imensuráveis como o empobrecimento dalinguagem.

Questão 2: O que ganha o estudo do direitonesse confronto com o espaço literário?

Para François Ost, a referência literária pro-duz uma “diversão erudita” capaz de ornamentare florear os discursos jurídicos e reduzir o uso daliteratura a um discurso de apoio capaz de banali-zar os textos literários que perdem sua força, esti-lo, efeitos de narração, contexto e textura. O gan-ho do direito deve, pois, calcar-se na função desubversão crítica que aquela agrega a este quan-do assume o viés de narrativa fundadora que pro-picia um pensar a norma e saber crítico sobre asconstruções jurídicas, valorizando-a e prescreven-

do-a, promovendo assim sua refundação alicerçadana razão prática. A literatura faz uso de sua lin-guagem para dar voz às minorias marginalizadas.

O autor propõe uma compreensão do direitocontemporâneo evocando a pertinência das noçõesde “comunidade narrativa” e de “narrativafundadora” demonstrando a importância jurídica dainterpretação de mundo feita por esta última nacriação de comunidades políticas, por exemplo. Nessepasso, os juristas operam dentro da comunidadenarrativa partilhando de suas significações eproduzindo, ao se basear nestas, um direito vivo,debatido e condizente com a história do homem.

Por fim, Ost apresenta a tese de RonaldDworkin que trata o direito como “prática socialargumentativa” e defende que:

[...] cada caso sendo, para o magistrado quedele se ocupa, a ocasião de escrever umnovo capítulo da história jurídica da nação,sob a dupla exigência do respeito à integritydo direito e à necessidade de particularizarda melhor maneira a solução proposta (OST,2004, p. 30).

Com isso, o autor reafirma sua convicção deque o direito deve ser reavivado na análise de cadacaso, levando em consideração as particularida-des apresentadas e situações contextualizadas,assim como é vislumbrado na literatura que seamolda e readapta.

Conclusão

Com o estudo exposto, pode-se concluir quepensar o direito assumindo como pressuposto ohorizonte literário propicia a compreensão da rea-lidade jurídica aportada sob um aspecto ficcionalque instiga a reflexão, imaginação e um olhar so-bre si mesma enquanto realidade carente decompletude, vez que as respostas nem sempre seencerrarão na legislação crua mas sim deverãoser criadas, em observância aos contextos fáticose ao que o imaginário coletivo anseia.

REFERÊNCIA

OST, François. Contar a lei: as fontes doimaginário jurídico. São Leopoldo: Unisinos, 2004.

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ARTIGOS DO CORPO DISCENTE – espaçodestinado a publicar artigos científicos de autoriade Acadêmicos do Curso de Direito da Faculdadede Direito Santo Agostinho (FADISA). São acei-tas parcerias entre Acadêmicos, embora não sen-do aconselhável porque tais publicações com maisde um autor, normalmente, não resultam em pon-tuação em concursos públicos de provas e títulose, no caso da FADISA, somente a publicação in-dividual pode levar o Acadêmico autor a ser dis-pensado de feitura e apresentação de monografiacomo trabalho de Curso;

ARTIGOS DE EGRESSOS – seção destinadaaos ex-alunos do Curso de Direito da Faculdadede Direito Santo Agostinho;

ELO COM OUTRAS IES – espaço apropriadopara publicação de artigos científicos de autoriade:Acadêmicos de outras Instituições de Ensino Su-

perior de todo o Brasil;Egressos de outras Instituições de Ensino Supe-

rior de todo o Brasil;Professores de outras Instituições de Ensino Su-

perior de todo o Brasil;

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AUTOR CONVIDADO – seção destinada aconter artigos científicos de autoria de pessoas queo Editor ou os componentes do Conselho Editorialconvidam a colaborar;

RESENHA – espaço destinado a publicação deresumo crítico, comparativo ou contendo emissãode juízo de valor por parte do autor sobre obrasartísticas que são da área do Direito ou são a talárea inter-relacionados. São exemplos: livros, fil-mes, peças teatrais, músicas e outras atividadesartísticas que tocam no tema dos segmentos doDireito.

2 NORMAS GERAIS E INICIAIS PARAQUAISQUER TIPOS DE MATERIALSUBMETIDO À ANÁLISE, APRECIA-ÇÃO E PUBLICAÇÃO

I – somente serão analisados, pelo Conselho Edi-torial, materiais inéditos, entendendo como inéditoo texto que tenha sido motivo de, em forma deresumo, eventuais apresentações orais, em even-tos científicos;II – a submissão de texto científico a ser analisadoe, se aprovado, publicado, importa em ciência deque há originalidade, não há plágios, fraude oucópias e que o material é inédito em termos depublicação, afirmações sob a responsabilidade, nassearas penais e civis, do autor;III – a submissão dos trabalhos implica:a) aceitação e autorização da publicação, se apro-vado pelo Conselho Editorial, com cessão dos di-reitos autorais de colaboração autoral inédita;b) ciência de que o material, se aprovado parapublicação, poderá ser submetido a correçãolinguística, metodológica, de formatação e padro-nização;c) ciência de que a não aprovação, por parte doConselho Editorial, não implica em responsabilida-de de informar em que partes do texto foram no-tadas deficiências (a reprovação do texto não setraduz por oferta de correção ou sugestões);d) ciência de que somente em casos excepcionaiso Conselho Editorial devolverá o material ao autor,para melhoramentos, adequações e adaptações,sendo a regra a reprovação do que não se encai-xar nas regras ora fixadas.

3 NORMAS PARA PUBLICAÇÃO DE AR-TIGOS

A Revista Eletrônica Fas@Jus, do Curso de Di-reito da Faculdade de Direito Santo Agostinho acei-ta analisar artigos científicos que lhe sejam sub-metidos, com as seguintes condições.

PRIMEIRA. TEMAOs artigos científicos submetidos dever conter, aprincípio, exclusivamente temas de Direito. Mas,há como mesclar Direito e outros segmentos dosaber (Direito e Economia, Direito e Psicologia,Odontologia Legal, Medicina Legal, por exemplos)assim como são aceitos textos envolvendo, tam-bém como exemplo, Educação Superior.

SEGUNDA. FORMATO DO DOCUMENTOO artigo científico submetido:I – deve ser enviado exclusivamente em textodigitado, redigido em Língua Portuguesa, sem en-vio de material impresso;II – deve estar digitado com tipos Times NewRoman (preferencialmente) ou arial;III – exceto as citações longas, o texto deve tertipos tamanho 12, com espaço 1,5 entre linhas;IV – as citações curtas, de até três linhas, devemvir dentro do texto, entre aspas;V – as citações longas devem:a) ser digitadas em tipos de tamanho 11;b) ser recuadas em 2,5cm (duas vezes o espaço1,25cm do parágrafo normal);c) ter espaço simples (espaço 1) entre linhas;d) ter referência a autor – apenas pelo sobrenomee em letras maiúsculas – data e número da pági-na;VI – ter, no mínimo, dez páginas, incluindo biblio-grafia e notas de rodapé;VII – estar redigido em formato word (não se ad-mitindo arquivo em PDF ou outro formato), comas seguintes especificações:a) a página deverá ser padronizada com margenssuperiores e esquerda com 3cm e margens supe-riores e direita com 2cm;b) os recuos de parágrafos devem ter 1,25cm, e aseparação entre parágrafos deve ser feita comutilização de espaço normal entre linhas;VIII – o título do artigo deve ser digitado em ta-manho 14 ou 16, com efeito negrito e centralizado;IX – se houver subtítulo do artigo, deve vir todo

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digitado em letras minúsculas – exceto em se tra-tando de nomes próprios – e após o título, tendodois pontos imediatamente após a última letra dotítulo e antes do subtítulo;X – o nome completo do autor do texto deve serdigitado em tamanho 12, alinhado à direita, comnota de rodapé contendo a qualificação resumidado autor (títulos e Instituições de Ensino às quaisse acha ligado ou nas quais obteve os títulos);XI – o Resumo deve:a) ter o máximo de 200 palavras, em único pará-grafo;b) estar digitado em espaço simples (espaço 1);c) ser redigido em Língua Portuguesa;d) conter até cinco palavras-chave, estas escritasna última linha;XII – o Resumo deve ser traduzido, preferencial-mente em inglês, na mesma condição do Resumo,sob a forma de ABSTRACT, inclusive as cincocorrespondentes keywords;XIII – os destaques devem ser feitos exclusiva-mente com utilização de tipos itálicos, não se ad-mitindo negrito e sublinhado;XIV – a Bibliografia deve:a) ser inserta ao fim do texto, exclusivamente;b) ter o subtítulo como, apenas, REFERÊNCIAS;c) ter espaço simples entre as linhas;d) estar alinhada à esquerda;e) conter:1) nome de família do autor, em letras maiúsculas,seguido de vírgula;2) restante do nome do autor somente com iniciaismaiúsculas, exceto partículas de ligação que ficamescritas em minúsculas (exemplos: de, da, e), se-guido de ponto final;2) título da obra somente com a primeira inicialmaiúscula, exceto em se tratando de nomes pró-prios, com efeito itálico; seguido de dois pontos sehouver subtítulo ou ponto final quando não houversubtítulo;3) se houver, subtítulo da obra somente com inici-ais minúsculas, exceto em se tratando de nomespróprios, sem efeitos;4) nome do tradutor, se houver, seguindo de pontofinal;5) número da edição indicada apenas pelo algaris-mo arábico seguido de ponto final e somente emsendo da segunda edição em diante, e seguido dapalavra “ed.”, em letras minúsculas seguidas deponto final, como forma de abreviar “edição”;6) o nome da cidade em que houve a publicação,seguido de dois pontos;7) o ano da edição, seguindo de ponto final;

8) notas esclarecedoras como título original ou aqual coleção pertence, se houver;XV – o material gráfico e ilustrações devem:a) ter largura entre 8,5cm e 16cm;b) ser numeradas sequencialmente em algarismosarábicos;c) estar localizados(as) dentro do texto, quandotratado do assunto em que a ilustração, quadro,tabela ou outra forma de ilustração se referir;d) ter legendas escritas em tipos Times NewRoman, tamanho 8, logo abaixo da figura.

TERCEIRA. O TEXTO E OS SUBTÍTULOSO texto deve ser apresentado em estilo “justifica-do” (de um lado ao outro da página) e separadopor subtítulos, precedidos de algarismos arábicos.Quando se tratar de numeração primária (exem-plos: 1, 2, etc.), o subtítulo dever vir todo escritoem letras maiúsculas, com efeito negrito. Quandose tratar de numeração secundária (exemplos: 1.1;1.2; 2.1; 2.2, etc.), o subtítulo deve ter somente asiniciais maiúsculas, exceto partículas de ligação epalavras monossilábicas (exemplos: de, para, por,as), com efeito negrito. Subtítulo com numeraçãoterciária (exemplos: 1.1.1; 1.1.2, etc.) deve conterapenas a primeira inicial maiúscula, e sem efeitonegrito.

QUARTA. NOTAS DE RODAPÉSomente são admitidas notas de rodapé para iden-tificação resumida do autor (inciso X da nota SE-GUNDA) e para notas explicativas. Não são ad-mitidas referências bibliográficas como nota derodapé. Os tipos das notas de rodapé devem serde números 9 ou 10.

QUINTA. ABREVIATURAS, ABREVIAÇÕESE SIGLASA primeira utilização de iniciais, abreviatura e si-gla somente será admitida após o nome por exten-so da sequência abreviada, e entre parênteses. Apartir da primeira utilização de iniciais, abreviatu-ras e siglas, pode-se utilizar, opcionalmente, todo onome ou a forma diminuída. Não se admite o usode abreviações (exemplos: cine, fone).Notar que não há pontos finais em iniciais ou si-glas.Exemplos de siglas: Faculdade de Direito SantoAgostinho (FADISA) ou Faculdade de DireitoSanto Agostinho (Fadisa) (nos exemplos, a pala-

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vra formada tem mais de quatro letras e, por isso,pode aparecer em caixa-alta ou somente com aprimeira letra em maiúscula; se fosse compostade até quatro letras, o uso seria, exclusivamente,exclusivamente com letras maiúsculas).Exemplos de iniciais: Fundo Monetário Internaci-onal (FMI); Núcleo Docente Estruturante (NDE).

SEXTA. NUMERAISNo texto, os numerais são escritos por extensoentre um e vinte e a cada vez que a indicação forem números pronunciados com única palavra(exemplos: trinta, cem, quinhentos, mil) e em alga-rismos nos demais casos (exemplos: 21, 45, 135,1.011). Deve-se notar que a partir de mil, há pontofinal entre o milhar e a centena. Não se usa pontofinal entre o milhar e a centena é em datas. Exem-plos: 2015, 1968; 2045.

4 NORMAS ESPECÍFICAS PARA PUBLI-CAÇÃO DE RESENHAS

A Revista Eletrônica Fas@Jus, do Curso de Di-reito da Faculdade de Direito Santo Agostinho acei-

ta analisar resenhas que lhe sejam submetidas. Aelaboração de resenhas deve obedecer, em tudo,as normas para publicações de artigos, exceto asseguintes particularidades:I – admite-se texto sem subtítulos ou com subtítu-lo sem numeração;II – o texto deve ter, no mínimo, cinco páginas;III – não há resumo e/ou abstract;IV – as obras resenhadas devem, obrigatoriamen-te, envolver o Direito, não se fixando quais asmodalidades intelectuais em que a arte analisadaé apresentada (exemplos: filmes, livros literário,peças teatrais e outras).V – admite-se Referência com apenas dados daobra resenhada.

5 NORMAS DA ABNT

Em quaisquer textos submetidos à análise do Con-selho Editorial da Fas@Jus, a e-Revista do Cursode Direito da Faculdade de Direito Santo Agosti-nho, devem ser observadas as normas da Associ-ação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) emtudo que não ficou descrito nas regras anterior-mente descritas.

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