revista elis 02

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ELIS::02 revista literária on line::ano01.edição02::novembro2012 Australiana Bella Dona Betina Menini Hacha Magnólia Reis Maria Miranda de Paula Marina de Los Pasos Munique Duarte Regina de Lourdes Virginia Z. participações especiais Bruna Moury Grupo Dani Alegria

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ELIS é uma Revista Literária online, gratuita, que tem a mulher como personagem principal. "Elis é irreverente, feminina, ousada, criativa, inteligente... Elis é mulher, ama, sofre, talvez sofra mais do que ame, e continua, viva. Elis é o que sobra no reflexo do espelho: o elemento secreto em cada mulher." mundo da ELIS | Com uma temática e um desafio diferentes à cada Edição, os colaboradores são convidados a assumir um papel feminino e prosear em versos, textos e imagens. Opiniões e gostos à parte, o intuito é trazer aos leitores uma variedade literária para o seu desfrute, com muito bom gosto e prazer. Colaboração de Joakim Antonio, como Bella Dona, na Página 8 da revista.

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Page 1: Revista Elis 02

ELIS::02

revista literária on line::ano01.edição02::novembro2012

AustralianaBella Dona

Betina MeniniHacha

Magnólia ReisMaria Miranda de Paula

Marina de Los PasosMunique Duarte

Regina de LourdesVirginia Z.

participações especiais

Bruna MouryGrupo Dani Alegria

Page 2: Revista Elis 02

02elis::sapatos

edição::Ani Almeidaco-edição.diagramação::Tammy Almeidacolaboradores::Ani Almeida::Eduardo F. Moura::Guilherme C. Antunes::Ingrid Machado::Joakim Antonio::Munique Duarte Alvim::Paulo Juner::Rafael Zen::Rosa Queli Cambraia Soares::Sonia Regina Rocha Rodriguesparticipação especial::Bruna Moury::Grupo Dani Alegriaimagens::Bruna Moury::Sandra Martins Modesto::Tammy Almeida

ELIS::02

::Por ser uma Revista literária e de colaboração coletiva, as ideias e conceitos expressos pelos autores selecionados são de suma responsabilidade dos mesmos, assim como as declarações de autoria pelos textos e imagens publicados.

contate::colabore::

[email protected]@revistaelis

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ELIS é uma Revista Literária online, gratuita, que tem a mulher como personagem principal.

"Elis é irreverente, feminina, ousada, criativa, inteligente... Elis é mulher, ama, sofre, talvez sofra mais do que ame, e continua, viva. Elis é o que sobra no reflexo do espelho: o elemento secreto em cada mulher."

mundo da ELIS | Com uma temática e um desafio diferentes à cada Edição, os colaboradores são convidados a assumir um papel feminino e prosear em versos, textos e imagens.

Opiniões e gostos à parte, o intuito é trazer aos leitores uma variedade literária para o seu desfrute, com muito bom gosto e prazer.

Assuma o seu melhor papel de mulher, perca o controle, escreva e convença o leitor de que o seu texto é o mais feminino da Revista, de que nele há a presença da Elis (mulher brasileira, musa inspiradora da Revista, talvez, uma entidade).

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"Não sei como a Leila insiste em namorar aquele pé-rapado do Robertinho! Já falei que ela se daria muito melhor com o costa-larga do Ricardão, mas ela me escuta? Naaada! É pior que burro quando empaca, continua enfiando o pé na lama, andando de meia furada...Tá parecendo a Irene, aquela rasteirinha do 202, que gosta de sofrer, vive de idealismos. Feminista até o último fio de cabelo, pra ela, salto alto é hipocrisia, havaianas é status e all star, apenas modismo. Ela ainda se deu ao luxo de dar uma bota no Fernandinho, acredita? Um rapaz pé-quente, ele não é de se jogar fora não... Eu me pergunto: porque eu não tenho essa sorte? De ter um homem como o Fernandinho pra fazer meu pé-de-meia? As vezes a vida é tão injusta, né, Joanete? Ah, agora sim, você ficou uma bonequinha com essa meia fina...hum, vai arrasar o coração do Paulão. É isso aí, amiga, pelo menos uma de nós têm que se dar bem! Falando nisso, deixa eu ir ajeitar a janta do Juarez, uma verdadeira pedra no meu sapato, ou melhor, uma pedra de tropeço, óh vida...".

::salto fino

::havaianas

::pantufa

::ana bella

::bonequinha

::rasteirinha

::bota

::all star

::sapatilha

::sandália

::meia fina

::pé quebrado

::pé rapado

::bicho de pé

::pé-de-moleque

::meia furada

::pedra no sapato

::sapato velho

::sapato molhado

::sapato apertado

::pé descalço

::couro e camurça

ELIS::02

Então, qual SAPATO você vai usar hoje?

Abra o seu armário para a ELIS e revele os seus sapatos mais íntimos, engraçados, encardidos e embolados!

Page 5: Revista Elis 02

::editorial::

::pé descalço::

Par Ou Ímparsem título

::bonequinha::

.de.abraços.pro.ar.

::rasteirinha::

Nada como um encontro espontâneo e casual

::meia fina::

Meia fina rosa

::sandália::

Meias Azuis

::sapatilha::

Sapatilha.

::salto fino::

R$20.Depois de dois goles

::pé quebrado::

fricote

::botas::

O delírio comum das botas roxas

::sapato molhado::

sem tíltulo

::créditos::

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Com que sapato eu vou... pra onde mesmo?

Entre a briga de sapatos, chinelos e sandálias, a segunda ELIS traz na sua vitrine textos repletos de bom-humor, amor, inquietações e dramas nada incomuns.

Das ilustrações que apresentam o tema com leve destreza (Conversa central e Ensolarou as pernas) aos sapatos e pés que relatam momentos cômicos (Meias Azuis), a Revista é preenchida com páginas animadas.

Entretanto, algo que predominou nos textos enviados foi não apenas a busca pelo sapato ideal, mas por si mesmas: personagens e mulheres que, oras se entendem muito bem consigo (Meia fina rosa), outrora não compreendem a caminhada (Depois de dois goles) e caminham sem escorregar na poética (Sapatilha.).

Mulheres, meninas, bailarinas e nem tão mulheres assim (vide a dama de paus dos R$20.) expressam o repensar dos passos, dos caminhos percorridos por nós, Elis. Mulheres que, na própria etimologia poética da palavra, constantemente sonham (O delírio comum das botas roxas) e amam (Sem título, Bella Dona).

Para finalizar, um gostoso haicai (Sem título) encerra essa caminhada. Esperamos que o Sol desponte logo na próxima manhã.

Ótima leitura em passos sem pressa!

editorialAni Almeida

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Chinelo e sapatoestão me dando uma canseira;brigam tanto todo dia,botei de castigo na prateleira.

Sapato anda emburrado,chinelo não quer conversa,vou dar puxão de orelhanum e noutro e vice versa.

Sapato quer ir à praia,chinelo quer ter palmilha,vão pro raio que os partae eu fujo para uma ilha.

Sapato é desaforado,chinelo muito briguento.Vou é andar descalçaque estes dois eu não aguento!

Par Ou ÍmparBetina Menini

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Já quis ser bailarinanão pela dança

é que desde criançame pegam nos braços

Sempre fui diferentepode até ser fetichemas escolho sapatospensando nos braços

Que irão me envolverna dança, na cama

me levantando no arcomo a uma criança

Dançarei na terraserei alçada a luatua doce loucura

erguida nos braços

Bella Dona

Quando os vejonem sequer disfarçocontato nos olhoscom tato nos braços

Mas com esse gostosei não ser únicapor isso eu cuidonão por isso amarro

Só ando de pé descalçoSe acabar minha sortepossui braços fortesmeu melhor sapato

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.de.abraços.pro.arMagnólia Reis

MAGRELArodopia

GIRAfio de cabelona cabeçafeito balé

Abraça vento todocomo seapertasse todo mundo

Cabelocomprido-curtobrilho de purpurina.

Coloridaa pequena meninamenina bailarinapisa em passo de valsao mundo que rodopia.

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O fato é que toda vez que a gente se arruma toda, se produz, se perfuma, o sujeito desaparece! - desabafou Helena. - Homem gosta é de mulher desmazelada. Pois outro dia eu saí de manhã pra ir a padaria, com o casaco por cima do pijama, que estava um frio de congelar pingüim, amarrei o cabelo de qualquer jeito na nuca, pois ninguém imagina que vai trombar com o sapo encantado às sete da manhã em plena padaria, e não é que encontro um advogado todo alinhado, de terno e gravata, tomando café no balcão, eu toda envergonhada e o gajo vem puxar papo comigo, me convida para jantar e acabou virando namoro?O mesmo acontece comigo - confessou Rita - eu quando saio com calcinha nova, combinando com sutiã, não rola nada, nada. Pois quando acho que não vai rolar, enfio qualquer calcinha tipo 'olá, mamãe' como no filme da Bridgit Jones, o camarada me arrasta para a cama?As três amigas riram.- Acho que nunca via rolar nada comigo, então - exclamou Patrícia. - eu nunca saio de pijama e estou sempre com as calcinhas bonitas, vocês não vão acreditar, mas é trauma de infância, um dia mamãe

Nada como um encontro espontâneo e casualAustraliana

me disse que a gente nunca devia colocar calcinhas rasgadas ou desfiadas, porque se a gente desse azar de ser atropelada, todo mundo ia ver as nossas calcinhas e seria uma vergonha - riu - como se quem acudisse uma vítima de atropelamento fosse lá se preocupar em olhar as calcinhas. Ou como se fosse lá uma coisa comum a gente ser atropelada por aí.O fato é que Patrícia estava de olho no dentista do plantão de domingo. Até já dera um cartão do consultório para ele, como quem não quer nada, acrescentando o seu telefone pessoal atrás, mas o moço, até agora, não dera sinal de ter entendido a mensagem.Logo, logo, Patrícia teve a oportunidade de verificar esta particularidade dos homens - sua predileção pelo que não é arrumado, arranjado, perfeito. Pois ao sair de casa em um dia de verão, foi surpreendida por uma chuvarada destruidora de sandálias rasteirinhas.A coitada da moça, não bastasse estar sem guarda-chuva, também ficou descalça. E lá estava ela, sem graça, a voltar para casa como um pinto molhado, cabelos escorrendo, rasteirinhas na mão, quando esbarra no dentista. Ele, todo seco, elegante em seus trajes de consultório. Ela bem que tentou passar sem

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ser notada, mas ele chamou-a pelo nome, e, como se não percebesse o lastimável estado da moça, toca a tagarelar, emendando um assunto no outro, e, por fim, confessando:- Faz tempo que estou a fim de você, que tal jantarmos esta noite? Você gosta de lagosta?

Pois Patrícia contou esta história para as amigas na praia de domingo: - Lagosta? Ora essa, eu toda arrumada não ganho nem copo de água, e descalça ganho lagosta? Pois vivam os pés descalços, as rasteirinhas arrebentadas, e desisto de vez de entender os homens !

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Saiu de lá de dentroonde era um calor infernaldo lado de forafrio alarmante de 10 grausatravessou a rua e perdeu o táxique bom que economizaria entãoa mixaria que ganhavadentro de uma meia fina vermelhadançando o que não entendiado cantarolar inglês da birosca de calor infernal.Não escolheu nada daquiloera uma fada quando criançafez balé em meia fina rosasonhava flores na portadepois de campainha tocadaa vida dá pontapés em quem não espera.Imagina trocar a cor da meia finae ainda sonha com sapatilhasas flores ela deixará para depoisse ajeita no casaco no frio invernalamanhã é outro dia, quem sabe?Ela sabe muito bem.A meia fina não trocará de cor.

Meia fina rosa Munique Duarte

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Amo Gustavo mais do que tudo. É meu noivo e, a não ser que aconteça uma catástrofe, a não ser que uma bicicleta o atropele distraído pela praça, vamos nos casar em, no máximo, um ano. Ele está para ser promovido no cartório. Disse que se continuar puxando o saco do chefe como já puxa, é promovido em menos de um ano. É só isso que falta para nos casarmos: uma promoção. Com o aumento, vai dar para pagar o aluguel no Catete. É que Gustavo não quer morar longe da mãe. E não é má idéia ter a sogra por perto, uma senhora muito experiente. Ela pode ajudar quando os netinhos chegarem. Se chegarem. Berenice, coitada, casou já tem seis anos e ainda não veio uma criança. Mas ela casou de maneira precipitada. Eu sempre disse, e mamãe sempre dizia, "quem casa quer casa, Berenice. Vai viver de que? De vento?", mas ela nem te ligo. Casou com o Geremário, que não tem onde cair morto. Casamento assim não dura, menina. Berenice diz que mais vale o amor. Besteira achar que o amor é tudo. Mas eu amo o Gustavo, que fique claro, mais do que tudo nesse mundo. É claro, sei que ele não é perfeito, como sei que eu também não sou. Gustavo tem manias. Ele chega em casa todo dia às seis da

Meias AzuisRegina de Lourdes

tarde, desabotoa a camisa de linho e a põe pra secar o suor na cadeira antes de levar para o cesto. Livra-se da calça vincada e põe o short de ficar em casa, com uma camisa de algodão. Mas sua mania, eu ainda não disse (por uma vergonha boba, sei lá)... É que Gustavo trabalha de sandália de couro e meia azul.

No início eu também achava pavoroso, mas já me acostumei. Só não consigo olhar. Ele chega em casa, se livra da camisa, se livra da calça, mas permanece com a sandália de couro e a meia azul. Eu tenho que tratá-lo assim, olhando no olho. Se olhar para seus pés azuis na ponta daquele caniço de perna, fico roxa, desconcentro, consigo fazer nada. Ele só retira a sandália para dormir. Ao menos isso. Mas a meia permanece. Amo Gustavo, mas aquela meia... Ele dorme com ela e só a retira na manhã do dia seguinte, ao tomar banho, para colocar outra. Às vezes, me pego imaginando que pé pavoroso, de dedos finos e branquinhos, deve ter Gustavo para estar sempre de meia. E quando me ponho a imaginar nossas núpcias, nada me deprime mais do que imaginá-lo nu em pêlo, mas vestido com as desgracildas meias azuis.

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Samuel é verdureiro. Verdureiro, ué. Vende aipim na feira. Toda terça-feira eu compro aipim, porque o Gustavo gosta. A mãe dele faz fritinho, com manteiga, fica uma delícia. Ele senta-se à mesa, com suas meias azuis e a sandália de couro, e devora! Toda terça-feira, quando peço o aipim ao Samuel, ele não quer me deixar pagar. "Pra moça bonita é de graça", ele diz, às vezes gargalhando, às vezes muito sério. "Mais respeito, Samuel, que eu sou noiva do seu Gustavo, do cartório". Aí então que ele ri mais alto. Acho que verdureiro não vai ao cartório, não é possível. Samuel é um mulato feio que nem cipó, mas é bem alimentado, sabe? Essa semana, na hora de em entregar o saco do aipim, Samuel me segurou pelo braço antes de dizer "pra moça bonita é de graça". Ultrajadíssima, me senti ultrajadíssima! Eu sou noiva do seu Gustavo, do cartório! Minha vontade foi virar a mão na cara do verdureiro safado. Não sei o que me deu, subiu uma coisa, menina. Eu disse "mostra o pé". Assim, na cara dura, nem sei como. Samuel gargalhou e, meio desajeitado, trouxe o pé para cima da barraca, que o ocultou esse tempo todo. O pé do Samuel parecia um sapo gordo e preto, enorme, saudável. As unhas

eram largas e muito brancas. A sola era rosadinha, mas só se via o contorno, porque ele calçava aquela havaiana azul e branca de pedreiro. As tiras do chinelo pareciam que estavam a ponto de arrebentar, por tentarem sufocar o opulento pé que sustentava Samuel. Um pé bojudo e livre.

Estou noiva do Samuel e nos casamos dentro de uma semana, de qualquer maneira. Se uma bicicleta o atropela distraído na praça, pior para a bicicleta.

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"Quando calçava ela as sapatilhas, não sabia mais seu nome ou sua platéia. Pois de olhos fechados era a própria dança, e não mais a dançarina, quem se entregava diante da música e também do silêncio dos seus convidados. Quando lua morena despontava no céu, de doce cabana saia chorosa, com os pés descalços em busca do mar. Era jeito dela de andar em paz com sua solidão. Quando o sol lhe convidava a despertar, era de sapato e coração apertado que saia de casa, para conseguir um espaço na própria vida e uma folga das suas dívidas. E quando de volta pra casa com seu salto fino na mão, percebia o seu tamanho e seu lugar diante do mundo. Ainda que as tantas versões de si pudessem escolher as cores, os preços, os modelos e os tamanhos dos seus sapatos, eram as ocasiões - e também os acasos - quem definiam seus passos. Era o seu coração quem de verdade caminhava, até que um dia resolveu parar, cansado da caminhada".

Sapatilha.Marina de los Pasos

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a prostituta parada no palco diz para os pais que é bailarina.

completamente lúcida, se comunica com os pais por cartas, dançarina descartável. diz que tem saudade do acre, mas se cobre de batom e entope o nariz de acetona. top de canutilho preto, salto agulha e um brinquedo no meio das penas, rainha de paus. sai de casa para o calçadão antes que as cortinas fechem, porque o balé é ruim demais depois das onze.

dança na rua antes que os holofotes dos postes se apaguem.antes que o patrocínio cesse.

mas antes que o carro passe,antes que o meio-fio chegue,

o salto fino quebrae a bailarina caie um menino chora

sem música o balé das coxas até acontece,sem coxia acontece,sem vontade acontece,

sem salto é impossível.

R$20.Virgínia Z.

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Foi no dia em que o Sol se fechou em si e o céu gotejava fino.Neste dia pela tarde usei o meu melhor vestido e coloquei os meus sapatos vernizados de salto doze agulha; vermelhos.Mesmo sendo mulher não entendo muito deste assunto, de ser mulher, porém de vermelho, entendo muito bem. Vermelho é meu sangue, são as minhas unhas, o meu batom, a marca de um chupão no teu pescoço, é como eu fico com vergonha, quando eu te via, quando você me tinha, as rosas que nunca ganhei, o sinal de parar, a raiva que me acaba, minha menstruação desregularizada, as placas de trânsito, a marca das minhas mãos nas tuas costas de um abraço que eu não queria mais soltar...

Quando abandonei as chaves do portão, lancei o meu salto palito de dente no barro com água, cambaleei por duas quadras levando os teus restos, rapaz. Me ajoelhei em um montinho de terra, minhas unhas ficaram barrentas, minha pele seguia o mesmo esquema, eu era porco na lama. Lancei mão da única coisa material que lembrava a você. O meu sapato vermelho de salto alfinete que espetava a terra enquanto eu era a que sangrava. Mesmo sendo mulher não entendo muito bem deste assunto, de ser mulher, porém julgo que toda mulher deveria ter um par destes sapatos vermelhos, também julgava que era preciso amar. Optei nessa fase da minha vida, ser homem, cerveja e mesa de bar.

Depois de dois golesHacha

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Pois bemeu assimaula de salsarebolei.

Ia bematé o fimeu descalçadespenquei.

Lá vemeu sem mimcalor da dançatropecei.

fricoteMagnólia Reis

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Cinco da tarde não pousava naquele relógio imenso e imundo há muitos dias. Quando o tempo e as amoreiras não estão a nosso favor, tudo apodrece em data esquecida. Muito frio na espera. Nada ao redor de casas minúsculas e redes penduradas. Tudo era muito amarelo e com escadas na terra distante que chamaram de impaciência. Lália está impaciente com suas saias curtas e pretensões enormes. Bebendo água infectada de chafariz e arrastando suas botas roxas com meias grossas roxas de um tom abaixo. Não acreditava mais no relógio da igreja cheio de restos de pombos e de migalhas de miradas humanas. Todos os dias iguais e todas as portas fechadas para o mundo solteiro de Lália que perdeu o caminho da passarela que cruzava a avenida fumegante interminável e que terminava no seu coração empoeirado. Botas roxas não podem andar muito quando trazem na sola lembranças cardiovasculares terríveis. A água de chafariz servida em taça rosa naquele fim de tarde tão aconchegante perto da lareira que estalava fagulhas perigosas. Pegou fogo muitos dias e muitas madrugadas para desembocar no calçar das mesmas botas roxas fora da estação primaveril que Lália já havia se esquecido há muito.

Há muito Lália é inverno decepcionante de folhas decadentes. A amoreira virou as costas para a doce menina que sonhava em ser bailarina e que fazia café forte como ninguém. Dançou muitas valsas em muitos verões quentes de chafarizes límpidos. Agora o vento do leste chegou com suas pestes inconfundíveis. Lália repassa todas as noites ao relento a sua decadência poética. Sofreu com uma história tão comum como acontece com qualquer um. Qualquer um servia depois para afogar as memórias que restavam e incomodavam como cravo nos dentes. Sorte, sorte, sorte. Pedia toda noite sorte para continuar seus rumos e sorte para a sola da bota roxa durar um pouco mais. O inverno interior de mesmices castiga. E as cinco horas que não chegam com o grande relógio e sua moldura de pombas sujas catedráticas.Sonha com anjos e suas trombetas brancas polidas, de cabeleiras arrumadas e hálito de jardim. Sente já o cheiro das horas mornas, sem botas roxas e olhares depressivos, descalça nos pés e nas mãos, e na mente e nos planos, pronta para mergulhar nos afazeres que fazem sentir um ser humano vivo e vivível. Sonha, Lália. Ela sonha todas as noites, e o gatilho que dispara terá o som mais doce das

O delírio comum das botas roxas Munique Duarte

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horas mais bem vividas por ela, bailando sobre a ponta do chafariz e reluzindo como trombeta branca de quem conhece o mundo como a palma da mão lida pela romena que morreu semana passada ao beber água suja. Chafarizes envenenados. Vidas plantadas em locais errôneos com suas dores de amor. Amor de amora. Escuro, mole, perecível. Nada romântico e vermelho. Sujo, feito a água urinada do anjinho maldito do chafariz da mesmice da praça.Hoje é dia de festa e as luzes se acendem para novas auroras boreais. Botas roxas a postos. O dia inteiro a postos. Coração de Lália pulsando na poeira. Tudo certo, menos com aquele relógio roxo imenso que não toca o blém-blém esperado das cinco. As pombas devem ter comido o mecanismo do funcionamento. Lália é a meia-noite repetida de cinco em cinco horas. Como remédio roxo feito de botas de amoreira.

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chuvosa manhã - os sapatos na calçada sabem seu destino?

Maria Miranda de Paula

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Ani Almeida é comunicóloga e poetisa com pretensões de escritora. É também a idealizadora e editora da Revista [email protected]

Tammy Almeida é arquiteta e [email protected]

créditos

::participação especial::

Bruna Moury tem 21 anos e atualmente cursa Artes Plásticas (Visuais) na Aeso em Recife. Tem experiência no campo das ilustrações manuais e digitais. Já trabalhou para outra revista como ilustradora e design gráfico. Conta com a bagagem do curso de design de moda já concluído anos atrás. Além do mundo dos desenhos tem a fotografia como hobbie bem empregado. http://celulascinza.blogspot.com.br

Grupo Dani Alegria é uma ação social coordenada por Sandra Martins Modesto, que gentilmente nos envio a imagem ao lado: professora da rede pública de ensino. Nasceu em São Paulo, capital. Adora ler e escrever e atualmente lidera o grupo de palhaços que visita escolas, instituições, asilos e ongs. Jovens com faixa etária de 15 a 17 anos se vestem de palhaço levando entretenimento a pessoas que possuem uma realidade bem difícil. Na foto, você tem os pés de Matheus Mendes, Luan Cardoso, Paulo Giordan, Thaís Mariano, Cibelly Karoline, Fernanda Dayane, Ricardo Rocha e Igor [email protected]

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Australiana é Sonia Regina Rocha RodriguesMédica de profissão e escritora por vocação. Ativista cultural por muitos anos, editou em Santos, junto com três outras escritoras santistas, o jornal literário Um dedo de prosa e a revista cultural Chapéu-de-sol, que circularam entre 1996 e 2001. http://alegriadeler.blogspot.com.br/

Bella Dona é Joakim AntonioUm paulistano apaixonado por comunicação. Nascido na selva de pedra, mas com um pé no sertão nordestino, de origens indígenas. Herdou a bagagem da cultura e tradição oral, tornando-se contador de histórias. Em 2009, começou a escrever poesias e, desde então, nunca mais passou um dia sequer sem escrever. http://descortinamental.blogspot.com.br

Betina Menini é Rosa Queli Cambraia SoaresEstudei Letras na PUC-POA. Adoro literatura, sou viciada em livros e me dedico a escrever contos e poesias sempre que sobra um tempinho. Gosto principalmente de textos bem-humorados, que divirtam e encantam.

Hacha é Ingrid Machado | @laahachaTem 22 anos, leonina, graduanda do curso de artes cênicas pela UFPE, é de Recife e o lugar mais longe que já esteve foi Brasília. Trabalha com teatro, produção cultural, maquiagem social/artística e escreve desde dos onze anos.

Magnólia Reis é Ani Almeida | @lunaticapoesiaRelações Públicas? Gestora Cultural? Escritora? Tem muitas dúvidas, mas agora tem cabelos curtos. Não tem barba nem bigode. Tem vontade de ver palavras voando por aí. Edita a Revista Elis e às escreve quando dá na telha na Lunatiquia. www.lunaticapoesia.blogspot.com

Maria Miranda de Paula é Paulo Juner Oficineiro do escritor Charles Kiefer em 2005 e 2006, em Porto Alegre, RS. Participante, com 3 contos, da antologia "Inventário das Delicadezas" lançada em 2007 pela editora Nova Prova, em idem, idem. Vivente, no mais.http://inventariodasdelicadezas.wordpress.com

créditos

Marina de los Pasos é Guilherme C. Antunes | @guglicardosoSommelier de groselha, alvissareiro, poeta e farsante. Sinestésico e musical. Buscador, contraditório, intenso. Vasto... Escreve n'A Ilha de um homem só.http://arkhipelago.blogspot.com

Munique Duarte é Munique Duarte Alvim | @muniquealvimNasceu e vive em Santos Dumont-MG. É jornalista responsável pelas publicações de quatro sindicatos de Juiz de Fora-MG. Bloga em http://textosimperdoaveis.blogspot.com. Participa da obra Escritos de Amor, lançada pela Casa do Novo Autor Editora, e Poesia e Prosa no Rio de Janeiro, pela Taba Cultural. Já colaborou n'O BULE, Sobrecapa Literal, Escrita Criativa (Portugal), Revista Diversos Afins, Jornal Opção, Jornal Relevo, Revista Elis, Revista Pâncreas e Revista O Viés. Admiradora de Dalton Trevisan, Lygia Fagundes Telles e Ferreira Gullar.http://textosimperdoaveis.blogspot.com

Regina de Lourdes é Eduardo Ferreira MouraCarioca, 23 anos, teve seu primeiro romance publicado em 2011, Esposa Perfeita, pela Editora Multifoco. Em 2012, pela mesma editora, veio o Meus Textículos, seu livro de contos. Atualmente escreve para a Revista IN, para o site Obvious, para o blog Letras et Cetera e para o Dona Zica tá Braba. Mantém também um blog pessoal, primeira moradia de seus textos, em: www.lifeonmarx.blogspot.comwww.lifeonmarx.blogspot.com

Virginia Z. é Rafael ZenEscritor, artista plástico e publicitário. Já publicou dois livros coletivos em parceria com a Editora SESC: Só mais uma coisa (2008) e De Veritate (2009). Em 2012 lança seu primeiro livro solo, intitulado "A questão da Andorinha", vencedor do Edital do Fundo de Cultura da Prefeitura de Brusque/SC, edição 2012. Também é coautor do concurso Poesia Urbana, que em 2012 lançou sua segunda edição. Na área das artes plásticas possui linha de pesquisa centrada na palavra e participa do Grupo G13 Arte Contemporânea, iniciativa privada de produção e incentivo às artes. Reside em Brusque, Santa Catarina, e tem 24 anos.

autores desta edição

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créditosimagens

::capa e índice::composição com as ilustrações "Conversa Central" e "Ensolarou as pernas"Bruna Moury::ilustração

::07::sem títuloautoria desconhecida::ilustração

::09::Fada 2 (2008) Fairy 2Gepeto-Pinóquio::fotografia de esculturahttp://madeiraviva.blogspot.com.br/2008/10/fada-2-2008-fairy-2.html

::12::isem títuloTammy Almeida::ilustração sobre foto de autoria desconhecida

::13::sem títuloTammy Almieda::ilustração

::14::sem títuloTammy Almeida::ilustração

::16::sem títuloautoria desconehcida::foto

::18::sem títuloTammy Almeida::ilustração

::21::sem títuloautoria desconhecida::foto

::22::sem títuloSandra Martins Modesto::foto