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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO CAMPUS II PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA Medidas sanitárias de que a Bahia precisa”: as Delegacias de Saúde, o Hospital de Isolamento e a Reforma Sanitária em Salvador (1921-1930) CHACAUANA ARAÚJO DOS SANTOS ALAGOINHAS-BA 2018

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2

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS II

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

“Medidas sanitárias de que a Bahia precisa”: as Delegacias de Saúde, o

Hospital de Isolamento e a Reforma Sanitária em Salvador (1921-1930)

CHACAUANA ARAÚJO DOS SANTOS

ALAGOINHAS-BA

2018

3

CHACAUANA ARAÚJO DOS SANTOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em História do Departamento de

Educação – Campus II, Alagoinhas, da

Universidade do Estado da Bahia (UNEB) como

requisito para obtenção do grau de Mestra em

História, sob a orientação da Prof. Dra. Maria

Elisa Lemos Nunes da Silva.

Orientadora: Prof. Dra. Maria Elisa Lemos Nunes

da Silva

ALAGOINHAS-BA

2018

4

FICHA CATALOGRÁFICA

Sistema de Bibliotecas da UNEB

Biblioteca do Campus II / Uneb

Bibliotecária: Iza Christina P. de A. Costa - CRB: 5/1042

S237m Santos, Chacauana Araújo dos.

“Medidas sanitárias de que a Bahia precisa”: As delegacias de

saúde, o hospital de isolamento e a reforma sanitária em Salvador

(1921-1930)./ Chacauana Araújo dos Santos – Alagoinhas, 2018.

95f. il.

Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado da Bahia.

Departamento de Educação. Mestrado em História.

Orientador: Prof.ª Dr.ª Maria Elisa Lemos Nunes da Silva.

1. Reforma sanitária – Salvador (BA). 2. Política de saúde. 3. Saúde

Pública. I. Silva, Maria Elisa Lemos Nunes da. II. Universidade do

Estado da Bahia. Departamento de Educação. III. Título.

CDD 362.1098142

5

CHACAUANA ARAÚJO DOS SANTOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História do Departamento de

Educação – Campus II, Alagoinhas, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), para a

seguinte banca examinadora:

__________________________________________________

Prof. Dra. Maria Elisa Lemos Nunes da Silva – Orientadora

Universidade do Estado da Bahia–UNEB/Campus II – Alagoinhas

__________________________________________________

Prof. Dr. Paulo Santos Silva – Examinador

Universidade do Estado da Bahia–UNEB /Campus II - Alagoinhas

__________________________________________________

Prof. Dra. Cleide Lima Chaves – Examinadora

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB

ALAGOINHAS-BA

2018

6

À minha Vó Alzira e à minha Vó Isabel

os pilares da minha família.

7

AGRADECIMENTOS

No processo de construção desta Dissertação coisas muito boas aconteceram, mas

outras difíceis de lidar também surgiram. Assim, a conclusão do Mestrado só foi possível por

existir pessoas especiais em minha vida, dentro e fora da academia.

Por isso quero agradecer ao Programa de Pós-Graduação em História, em especial à

Professora Maria Elisa Nunes Lemos da Silva, que acolheu o meu projeto e me orientou

durante todo o período de escrita, acompanhando cada passo. Lembrarei com saudades de

nossos momentos de orientação. Tudo se tornou possível porque pude contar com uma

orientadora que soube me entender e me ajudar nos momentos difíceis que passei durante o

Mestrado.

Agradeço ao Professor Paulo Santos Silva, que aceitou participar da minha Banca de

qualificação e defesa. Além disso, fui sua aluna e fiz tirocínio em sua turma, isso me ensinou

que estar ao seu lado é sempre um aprendizado.

Muito obrigada a Professora Cleide Chaves, pelo carinho e boa vontade em aceitar

participar da minha defesa, agradeço desde já as contribuições. Serei sempre grata à

Professora Christiane Cruz, pelas contribuições na Banca de qualificação.

Meu obrigado a CAPES, por me conceder bolsa durante o mestrado.

Agradeço a Maurício, Igor e Diana, amigos que o Mestrado presenteou-me e, em

especial, a Lise, que esteve ao meu lado durante alguns momentos difíceis, ajudando-me a não

desistir.

Durante todo o Mestrado, a minha família foi essencial para que esse momento se

tornasse real, por isso, agradeço a minha mãe, sem ela jamais chegaria até aqui, às minhas tias

Neves, Lia, Kika, Irá e Suzan, pela alegria e amor que sempre me trataram. Às minhas

sobrinhas Cibele, Catrine, Heloisa e Iasmin, por vocês tento sempre ser o melhor exemplo. Às

minhas irmãs e irmão, pela torcida, em especial minha irmã Beybe, a pessoa que mais tem

paciência comigo no mundo e está sempre ao meu lado não importa o que aconteça, e a

Bartira Batista, pela torcida e alegria que sempre me recebe! Agradeço aos primos e primas,

principalmente Matheus Araújo, que ajudou a cuidar de mim durante toda a minha

recuperação.

8

Agradeço ao meu primo/irmão e companheiro de todas as horas, Ricardo Batista,

sempre presente em minha vida, me ajudou a construir o projeto para a seleção de mestrado e

discutiu textos e fontes comigo durante todo o processo. Sempre aparecia com um livro ou

uma fonte nova para contribuir com a minha pesquisa, é sempre muito bom contar com você

dentro e fora da academia!

Agradeço, imensamente, à minha companheira Kadja Nataly, que acompanhou essa

pesquisa desde o início. Sempre entendeu sem questionar os dias e noites dedicados aos

estudos, as viagens para congressos e todas as abdicações necessárias para chegar até aqui. E

a sua família, que ajudou a cuidar de mim no momento em que a minha saúde estava

comprometida, em especial Silene, Ruy e Beto.

Aos amigos, agradeço os momentos de alegria que sempre passamos juntos, vocês

sempre foram meu refúgio para todos os momentos, especialmente Leandro Nascimento,

Carlos Alberto e Diego Rebelo sei que sempre posso contar com vocês, e Leandro Colling,

pela vibração a cada conquista.

9

RESUMO

Esta dissertação tem como objetivo analisar o papel das Delegacias de Saúde e do

Hospital de Isolamento de Mont’Serrat, no processo da Reforma Sanitária que ocorreu na

Bahia na década de 1920. A ideia é discutir questões ligadas às políticas sanitárias que foram

implementadas após a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública e do Código

Sanitário, ambos em 1925. As fontes utilizadas nesta pesquisa foram: relatórios das

Delegacias de Saúde; relatórios do Subsecretário de Saúde da época; relatórios médicos

do Hospital de Isolamento de Mont’Serrat; leis e decretos sanitários; Mensagens dos

Governadores e matérias dos jornais A Tarde, Diário de Notícias e Diário da Bahia. Foi

possível conhecer o perfil dos atendidos pelas instituições pesquisadas, bem como as

suas condições de moradia. A população pobre e negra foi a que mais necessitou desses

serviços. As ações desenvolvidas pelas Delegacias de Saúde e pelo Hospital não foram

isoladas. Buscou-se criar uma rede de atendimento, vinculado à Sub-Secretaria de Saúde

e Assistência Pública que tinha como base o Código Sanitário. Ambos tiveram um papel

importante no processo da reforma, contribuindo para a articulação do estado com as

políticas sanitárias nacionais.

Palavras-chave: Reforma Sanitária. Delegacias de Saúde. Hospital de Isolamento.

10

ABSTRACT

This dissertation objective to analyze the role of the Health Police and the Isolation

Hospital of Mont'Serrat, in the process of Sanitary Reform that occurred in Bahia in the

1920s. The idea is to discuss issues related to the health policies that were implemented after

the creation of the Subsecretariat of Health and Public Assistance and the Sanitary Code, both

in 1925. The sources used in this research were: reports from the Health Departments; reports

of the Assistant Secretary of Health at the time; medical reports from the Isolation Hospital of

Mont'Serrat; laws and sanitary decrees; Messages from Governors and newspaper articles “A

Tarde”,” Diário de Notícias” and “Diário da Bahia”. It was possible to know the profile of

those attended by the institutions surveyed, as well as their living conditions. The poor and

black population was the one that most needed these services. The actions developed by the

Health Police and the Hospital were not isolated. It was sought to create a service network,

linked to the Sub-Secretariat of Health and Public Assistance that was based on the Health

Code. Both played an important role in the reform process, contributing to the articulation of

the state with national health policies.

Key-words: Sanitary Reform; Health police; Isolation Hospital

11

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Dois casos de Peste Negra.......................................................................................41

Figura 2 – Sede da 1ª Delegacia de Saúde................................................................................49

Figura 3 – Apelo ao Subsecretário............................................................................................56

Figura 4 – Pavilhão de Administração..... ................................................................................67

Figura 5 – Enfermaria para Variolosos.....................................................................................67

Figura 6 – Será entregue amanhã à S. P. B. O novo hospital de variolosos.............................68

Figura 7 – Vacinai-vos e aos vossos filhos, enquanto é tempo.................................................74

Figura 8 – Além de tudo, escamoteador de cadáveres..............................................................79

Figura 9 – A Bubônica em ronda sinistra pela cidade..............................................................81

12

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Número de habitantes nos anos de 1890, 1900 e 1920..........................................26

Quadro 2 – Número de infectados pela Peste Bubônica por Distrito no ano de 1904.............32

Quadro 3 – Número de mortos na Bahia entre 1908 a 1912....................................................35

Quadro 4 – Número de mortos na Bahia por moléstias transmissíveis entre 1908 a

1912...........................................................................................................................................35

Quadro 5 - Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública....................................................... 45

Quadro 6 – Inspetorias Sanitárias, 1925...................................................................................52

Quadro 7 – Organização das Delegacias de Saúde no momento da sua criação......................55

Quadro 8 – Tipos de cobertura nas residências da região suburbana em 1930.....................62

Quadro 9 – Dados de pacientes que deram entrada no HIMS...............................................72

Quadro 10 – Dados do atendimento das 5 Delegacias de Saúde em 1926, 1927 e

1928...........................................................................................................................................76

Quadro 11 – Dados das profissões dos pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de

Mont’Serrat nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 construídos a partir dos

relatórios..............................................................................................................................77/78

Quadro 12 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat

nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 por Distritos construídos a partir dos

relatórios....................................................................................................................................80

Quadro 13 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat

nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 separados por sexo e cor/raça construídos a partir dos

relatórios....................................................................................................................................82

13

LISTA DE MAPAS

Mapa 1 – Divisão Territorial da zona urbana de Salvador, Bahia 1920.................................27

Mapa 2 – Espacialização das Delegacias de Saúde, Salvador/Bahia, na década de

1920...........................................................................................................................................54

14

LISTA DE SIGLAS

DNSP – Departamento Nacional de Saúde Pública

HIMS – Hospital de Isolamento de Mont’Serrat

APEB – Arquivo Público do Estado da Bahia

DGSP – Diretoria Geral de Saúde Pública

BPEB – Biblioteca Pública do Estado da Bahia

IGHB – Instituto Geográfico e Histórico da Bahia

IOC – BA – Instituto Oswaldo Cruz / Bahia

15

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................16

PARTE I - A BAHIA E A REFORMA SANITÁRIA DA DÉCADA DE

1920...........................................................................................................................................23

1.1. Prelúdios da Reforma Sanitária da Bahia .........................................................................25

1.2. O atendimento sanitário e a fiscalização ..........................................................................36

1.3. De volta à Reforma Sanitária na Bahia ............................................................................42

PARTE II - AS DELEGACIAS DE SAÚDE E O HOSPITAL DE MONT’SERRAT

DURANTE A REFORMA SANITÁRIA..............................................................................48

2.1. As Delegacias de Saúde.....................................................................................................48

2.2. O Hospital de Isolamento de Mont’Serrat.......................................................................64

2.3. E a população? Quem utilizava os serviços de saúde na década de 1920 em

Salvador?...................................................................................................................................75

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................84

FONTES...................................................................................................................................86

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA...............................,,...................................................89

ANEXOS..................................................................................................................................93

16

INTRODUÇÃO

Esta dissertação tem como objetivo analisar o papel das Delegacias de Saúde e do

Hospital de Isolamento de Mont’Serrat (HIMS), no processo de constituição da reforma

sanitária na Bahia na década de 1920.

No início do século XX, desenvolveu-se no Brasil um movimento sanitarista que

divulgou as condições de vida das pessoas que moravam longe dos grandes centros urbanos.

Uma série de viagens, realizadas pelos pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz, mostrou um

país desconhecido e doente. Um dos objetivos desse movimento era diminuir a distância que

existia entre o Brasil urbano e o Brasil rural e mostrar para as elites que o rural não estava tão

distante como se imaginava, mesmo porque, as doenças estavam presentes nas cidades

assolando principalmente a população pobre.

A partir das discussões e lutas desse movimento, foi criado em 1920 o Departamento

Nacional de Saúde Pública (DNSP). Este órgão tinha objetivo intervencionista estatal de

cunho nacional, respeitada a perspectiva federalista da Constituição republicana de 1891. O

Governo Federal poderia colaborar com os estados no que diz respeito às questões sanitárias e

de saúde, através de acordos por eles solicitados.

Os políticos baianos aderiram ao projeto nacional de reforma sanitária, em 1921,

ocasião em que o governador José Joaquim Seabra assinou um acordo com a União para a

realização de serviços de Profilaxia Rural de combate à sífilis e às doenças venéreas, de luta

contra a tuberculose e de higiene infantil.1

Em 1924, na gestão de Francisco Marques de Góes Calmon, o compromisso foi

renovado por mais cinco anos. O Governo do Estado da Bahia criou a Subsecretaria de

Saúde e Assistência Pública, através da lei 1.811 de 29 de julho de 1925.2

Alguns meses depois, foi promulgado o Código Sanitário da Bahia, seguindo

orientações do DNSP a partir do Decreto 4.144 de 20 de novembro de 1925, que

indicava como deveria funcionar a nova organização sanitária da Bahia.3

Junto à Subsecretaria, novas atribuições surgiram referentes à área de saúde na

Bahia e dois órgãos chamaram a atenção para esta pesquisa: as Delegacias de Saúde e o

1BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e reforma da saúde na Bahia (1920-1945). Salvador: EDUNEB, 2017, p.

30;71. 2 BAHIA. Lei 1.811, de 19 de Julho de 1925. Cria a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, Salvador,

1925. 3 BAHIA. Decreto 4.144, de 20 de Novembro de 1925. Arquivo Público do Estado da Bahia. Salvador, 1925.

17

Hospital de Isolamento de Mont’Serrat (HIMS).

As Delegacias de Saúde foram criadas em 1925. Elas estavam localizadas em diversos

pontos da cidade e cada uma deveria atender a três Distritos, somando quinze no total. O

HIMS foi criado em 1853 com o objetivo de cuidar das pessoas que contraiam a febre

amarela. Na década de 1920, o hospital já havia passado por diversas mudanças na sua

estrutura física e na concepção do atendimento e dos serviços prestados. A partir da

criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública e do Código Sanitário, o HIMS

passou a fazer parte desse conjunto de ações sanitárias que tinham como objetivo

“sanar” a Bahia dos principais problemas de saúde que assolavam a população.

A escolha do ano de 1921 como marco cronológico inicial desta dissertação está

relacionada ao momento em que o estado baiano firmou compromissos com o Governo

Federal no sentido de combater doenças e ampliar a ação sanitária. Observa-se nesse

período grande preocupação em “educar” a população a partir dos novos ideais de

“civilização”. Esses ideais estiveram presentes nas principais cidades brasileiras da

época, inclusive Salvador. A baliza cronológica final é o ano de 1930, quando ocorreram

mudanças na configuração política e sanitária da Bahia e do Brasil, com a Revolução de

1930.

As reflexões que desenvolvemos neste trabalho inserem-se no campo de estudos

conhecidos como história da saúde e das doenças. Embora ele seja relativamente novo,

vem se expandido desde as últimas décadas do século XX. Nos anos de 1970, os

historiadores Jacques Revel e Jean-Pierre Peter incluíram a enfermidade na coletânea

destinada aos “novos objetos”, “novas abordagens” e “novos problemas” da história,

apontando como o seu estudo poderia fornecer inúmeros esclarecimentos sobre

articulações e mudanças nas sociedades.4 Ou seja, os estudos relacionados à saúde e às

doenças possibilitam conhecer não somente problemas ligados às enfermidades, mas nos

permitem analisar as questões sociais de um período.

Na Bahia, as pesquisas no campo da história da saúde e das doenças vêm se

ampliando. Onildo Reis David foi um dos pioneiros ao pesquisar a epidemia do cólera

que atingiu a população baiana nos anos de 1855 e 1856.5 O autor abordou a

insalubridade das freguesias urbanas de Salvador, discute as concepções médicas acerca

4 REVEL e PETER. O corpo: o homem doente e sua história. In: LE GOFF, Jacques e NORA, Pierre (Dir.).

História: novos objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 141-159. 5 DAVID, Onildo Reis. O inimigo invisível: epidemia na Bahia no século XIX. Salvador: EDUFBA/Sarah

Letras, 1996.Para o estudo da epidemia do cólera de 1855 e 1856, em Salvador ver também: ATHAYDE,

Johildo Lopes de. Salvador e a grande epidemia de 1855. Centro de Estudos Baianos da UFBA, (113), 1985.

18

do cólera na época, observou o impacto causado pela epidemia e as providências

tomadas pelo Governo para combatê-la.6

A partir desse estudo, as perspectivas então abertas se ampliaram e novas

investigações foram incorporadas nesse campo de pesquisa Entre os trabalhos produzidos

destaca-se A gripe espanhola na Bahia, no qual Christiane Maria Cruz de Souza estudou essa

epidemia que atingiu o território baiano entre setembro de 1918 e os primeiros meses de

1919. A autora, utilizando uma vasta documentação de diversas áreas do estado e

dialogando com ampla bibliografia brasileira e internacional, nos ajuda a entender os

impactos que a epidemia causou à Bahia.7 Christiane Souza publicou vários artigos em

livros e periódicos. Ela ainda organizou com Maria Renilda Nery Barreto o volume História

da saúde na Bahia: instituições e patrimônio arquitetônico (1808-1958) 8

.

Maria Renilda Nery Barreto pesquisou sobre Assistência e Saúde, no livro

publicado com Christiane Souza ela faz uma analise sobre a Santa Casa de Misericórdia

de Salvador e a assistência aos doentes que a instituição ofereceu durante o século XIX.

9 A pesquisadora contribuiu ainda com vários outros estudos na área, um deles foi à

análise da História da Obstetrícia, principalmente de que maneira essa ciência se

desenvolveu ao longo dos séculos em Portugal no artigo A ciência dos partos nos

manuais portugueses de obstetrícia.10

Deslocando o enfoque da temática da saúde e das doenças para a perspectiva

institucional e biográfica, Maria Elisa Lemos Nunes da Silva analisou a trajetória do

Médico José Silveira (1904 - 2001) na luta contra a tuberculose, especialmente a partir da

criação do Instituto Brasileiro para Investigação da Tuberculose (IBIT), em 1937. A autora

observou as estratégias discursivas e as práticas por ele utilizadas para se constituir

como um tisiólogo de prestígio11

. Elisa Silva também examinou a constituição de políticas

voltadas para o combate da tuberculose, na Bahia, especificamente na cidade do Salvador.

6DAVID. O inimigo invisível. 1996.

7SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de

epidemia. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009. 8 SOUZA, Christiane Maria Cruz de. SANGLARD, Gisele. Saúde pública e Assistência na Bahia da Primeira

República (1889 -1929) IN SOUZA, Christiane Maria Cruz de. BARRETO, Maria Renilda Nery (org.). História

da Saúde na Bahia: Instituições e Patrimônio Arquitetônico (1808 – 1958) – Barueri, SP: Minha Editora, 2011 9 Idem

10BARRETO, Maria Renilda Nery. A ciência dos partos nos manuais portugueses de obstetrícia .Revista

Gênero.UFF: V. 7, n. 2, p. 219 – 236., 1 sem. 2007 11

SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da Silva. Do “Centro” para o “Mundo”: A trajetória do Médico José

Silveira na Luta contra a Tuberculose. Tese (Doutorado em História). Universidade Federal de Pernambuco.

Recife. 2009; Ciência e saúde no ''centro' do Brasil: a trajetória do médico José Silveira na luta contra a

tuberculose. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da; SILVA, Paulo Santos. (Org.). Rastros biográficos:

estudos de trajetórias. Salvador: Eduneb, 2014, p. 53-95.

19

Segundo ela, a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), em 1920, foi

essencial no tange à implementação de ações voltadas para o controle dessa doença. O acordo

firmado entre este Departamento e a Liga Bahiana Contra a Tuberculose (LBCT) possibilitou

que o Dispensário Ramiro de Azevedo, específico para atender tuberculosos, fosse colocado

em funcionamento.12

Buscando expandir os estudos para além da capital e seu entorno, Cleide de Lima

Chaves organizou a coletânea História da saúde e das doenças no interior da Bahia: séculos

XIX e XX.13

Esta obra apresenta contribuições de autores que discutem a temática em

diferentes localidades do estado. No capítulo de sua autoria, Cleide Chaves abordou o

surgimento da assistência médico-hospitalar no sertão baiano e explorou a história da

Santa Casa de Misericórdia da cidade de Vitória da Conquista, interior da Bahia.14

A autora

também estudou a atuação do médico Crescêncio Antunes da Silveira (1884-1952), cujas

trajetórias pessoal e profissional estiveram ligadas ao Hospital da Santa Casa e à filantropia

cristã, em Vitória da Conquista.15

Ampliando o campo de estudos em questão, Ricardo dos Santos Batista, abordou a

Reforma Sanitária da Bahia, entre 1920 e 1945, dando ênfase à atuação da Inspetoria de

Profilaxia da Lepra e Doenças Venéreas (IPLDV). Entre os aspectos por ele tratados, estão as

ações desempenhadas pelos médicos baianos no intuito de efetivar um projeto políico-

sanitário no estado, inclusive em cidades do interior. 16

As abordagens envolvendo instituições de saúde foram retomadas por Fátima

Lorenzo Figueiredo. Esta pesquisadora traçou a trajetória do Hospital de Isolamento de

Monte’Serrat (HIMS) desde a sua fundação, em 1853, até se tornar Hospital Couto

Maia, passando pelas reformas e ampliações. Fátima Figueiredo elaborou ainda a

12

SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. “O Dispensário Ramiro Azevedo e a Constituição de políticas de

enfrentamento da tuberculose na Bahia na década de 1920”. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da;

BATISTA, Ricardo dos Santos (organizadores). História e Saúde: políticas, assistência, doenças e instituições.

Salvador: EDUNEB, 2018 (no prelo). 13

CLEIDE, de Lima Chaves (org). História da saúde e das doenças no interior da Bahia: Séculos XIX e XX.

Vitória da Conquista: Ed UESB, 2013. 14

CHAVES, Cleide de Lima (Org.). História da saúde e das doenças no interior da Bahia: séculos XIX e XX.

Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2013. 15

CHAVES, Cleide de Lima. Crescêncio Antunes da Silveira: um médico filantropo baiano In: SANGLARD,

Gisele et al. (Org.). Filantropos da nação: sociedade e assistência no Brasil e em Portugal. Rio de Janeiro: Ed.

FGV, 2015. 16

BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945). Salvador: Eduneb, 2017.

20

biografia do Médico Augusto Couto Maia, diretor que esteve à frente do HIMS durante

anos.17

Os conflitos entre as políticas de saúde e a população foram objeto de análise de

Adriano Arruda Pontes. Em seu o trabalho ele discutiu a presença da Fundação

Rockefeller no combate à febre amarela na Bahia, entre 1918 e 1940. A cronologia deste

estudo cruza-se com nossos marcos temporais quando se leva em conta o envolvimento

da instituição americana nas ações voltadas para essa doença, no processo de

constituição da reforma sanitária no estado. Além disso, ele faz uma reflexão acerca do

posicionamento dos médicos baianos ao programa da Rockefeller e trata ainda da

resistência da população às ações propostas por essa fundação para o controle dessa

enfermidade.18

Para alcançar nosso objetivo, utilizamos como fontes principais os relatórios das

Delegacias de Saúde e os relatórios das ocorrências do Hospital de Isolamento de

Mont’Serrat. Essa documentação contém informações acerca da saúde pública em

Salvador no período analisado, desde os nomes dos médicos que atuaram nesse conjunto

de ações até dados dos pacientes atendidos. Através da sua leitura foi possível perceber

que a população pobre e negra era a mais atingida pelas moléstias, uma vez que ela

estava submetida às piores condições de vida e de trabalho. Além disso, suas moradias

dificilmente atendiam aos padrões de higiene previstos no novo código sanitário.

Os documentos são entendidos como discursos produzidos em determinadas condições

históricas, marcados por relações de poder e saber. São, portanto, materiais a serem

trabalhados na construção do texto historiográfico.19

Essa orientação em relação às fontes

esteve presente na nossa pesquisa.

Infelizmente existem algumas falhas temporais na documentação acessada. Não

encontramos relatórios de todos os anos pesquisados, por diversos motivos parte da

documentação se perdeu. Porém, isso em momento algum prejudicou a pesquisa.

Três jornais da chamada grande imprensa fazem parte do corpus documental

desta dissertação: Diário de Notícias, Diário da Bahia e A Tarde. O Diário de Notícias

17

FIGUEIREDO, Maria de Fátima Lorenzo. Hospital Couto Maia: Uma Memória Histórica (1853 – 1936)

Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências. Universidade

Federal da Bahia, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2010. 18

PONTES, Adriano Arruda. Caçando mosquitos na Bahia, a Rockefeller e o combate à febre amarela: inserção,

ação e reação popular (1918-1940). Dissertação de mestrado – Faculdade Filosofia e Ciências Humanas,

Programa de Pós Graduação em História. Universidade do Estado na Bahia, Salvador, 2007. 19

Le GOFF, J. Documento/ Monumento. In: Le GOFF, História e memória. Trad. Bernardo \Leitão. 5. ed.

Campinas: UNICAMP, 2003, p. 525-541; CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense

Universitária, 1982, p. 65-117.

21

foi fundado por Manuel da Silva Lopes Cardoso, em 1875, tendo saído de circulação em

1980. Este periódico publicou regularmente notícias sobre as epidemias e a situação

sanitária da cidade de Salvador e do estado da Bahia como um todo.20

O Diário da Bahia, fundado por Demétrio Ciríaco Tourinho e Manuel Jesuíno

Ferreira, começou a circular em 1856 e encerrou definitivamente suas atividades em 1957.

Até 1868, veiculava a linha ideológica do Partido Liberal. De 1880 até 1899, foi dirigido por

Augusto Álvares Guimarães. A partir desse período, ficou fechado por dois anos, quando foi

adquirido por Severino Vieira, voltando a circular em 1901. A orientação ideológica de

Serverino Vieira durou até 1921, quando o periódico passou a ser gerido por uma sociedade

anônima.21

O jornal A Tarde foi fundado em 1912 por Ernesto Simões Filho. Na chamada

Primeira República, a atuação política do jornal foi dividida em duas fases. A primeira de

1912 a 1924, período de dominação política de J. J. Seabra, no qual A Tarde foi um

importante instrumento de oposição política. A segunda fase corresponde à ascensão de

Francisco Marques do Góes Calmon ao governo do estado (1924-1928). Nesse período, A

Tarde passou a apoiar o executivo baiano, abandonando o caráter oposicionista.22

A pesquisa nesses jornais contribuiu para entender um pouco mais o conjunto de

ações voltadas para as questões sanitárias na Bahia, além de permitir conhecer o “jogo”

político, uma vez que o conteúdo das matérias publicadas nesses periódicos variavam

conforme a aproximação ou o afastamento entre eles e os governos.

Para trabalhar com esses periódicos, dialogamos com o conceito de “grande

imprensa” de Nelson Werneck Sodré, seguido por José Weliton Aragão ao estudar a imprensa

baiana. A “grande imprensa” é uma empresa jornalística que vende notícia e visa o lucro.

Tendo como base de sustentação a publicidade, “veicula a ideologia da classe dominante.” 23

O Diário Oficial da época também foi consultado. Ele traz informações acerca do

funcionamento dos órgãos de saúde, apresentando, por exemplo, números de vacinações

realizadas, nomeações de médicos e de demais profissionais para compor a equipe

sanitária do município. Essa documentação também está disponível no Arquivo Público

do Estado da Bahia.

20

SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. Diário de Notícias. Disponível em:

http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>. 21

SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. Diário da Bahia. Disponível em:

http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>. 22

SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. A Tarde. Disponível em:

http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>. 23

SANTOS, José Weliton Aragão. Formação da grande imprensa na Bahia. Dissertação (Mestrado em Ciências

Sociais) - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Salvador: UFBA, 1985, p. 5.

22

Constituem-se ainda como fontes deste trabalho as Mensagens e Falas dos

governadores e a legislação sanitária estadual e federal. Ao tratar da saúde pública na

Bahia nos anos 1920 é importante analisar os relatórios de Antônio Luis Cavalcanti

Albuquerque de Barros Barreto. Ele dirigiu a Subsecretaria de Saúde e Assistência

Pública, que depois se tornou Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Essa

documentação foi acessada na Biblioteca Pública do Estado da Bahia (BPEB) e no

Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB).

Esta dissertação está dividida em duas partes. Na primeira, abordaremos a reforma

sanitária de 1920 e a articulação da política sanitária baiana com a nacional. Falaremos

do cenário social e político no qual a reforma sanitária se constituiu no es tado.

Situaremos os Distritos da capital geograficamente com auxílio de um mapa e assim

analisaremos as extensões territoriais dos Distritos Centrais e Periféricos numa tentativa

de identificar como a população estava distribuída nesse território e quais as doenças

que eram notificadas. Trata-se, portanto, de buscar compreender, a partir dos Distritos, a

situação sanitária da cidade de Salvador. Além disso, falaremos das habitações e como

elas dificultavam o trabalho dos profissionais ligados à saúde pelo fato de em sua

maioria estarem fora dos padrões de higiene que estavam tentando implantar.

A segunda parte trata das delegacias de saúde e do Hospital de Isolamento de

Mont'Serrat. Discutiremos a contribuição dessas instituições no processo de reforma

sanitária da década de 1920. Analisaremos onde cada Delegacia estava localizada e qual

o território que cada uma ficava responsável através das inspetorias. Apresentaremos o

perfil da população atendida nas Delegacias de Saúde e no HIMS. O propósito é

entender quem eram essas pessoas que necessitavam dos serviços dessas instituições.

23

PARTE I

A BAHIA E A REFORMA SANITÁRIA DA DÉCADA DE 1920

As primeiras décadas do século XX são de grande relevância para os cuidados com a

saúde no Brasil, pois marcaram o processo de constituição das políticas sanitárias. Embora a

preocupação com essas questões, por parte dos poderes públicos, não estivesse de todo

ausente, as ações desenvolvidas de um modo geral eram voltadas principalmente para o

combate das epidemias.

O conhecimento da precária situação sanitária do país que levou à defesa da proposta

de uma reforma nesse setor foi resultado das expedições científicas organizadas pelo Instituto

Oswaldo Cruz, nas primeiras duas décadas do século XX, com intuito de conhecer as áreas

distantes do Brasil. Entre elas, se destacam as realizadas pelos médicos Belisário Pena e

Arthur Neiva. Eles percorreram o norte e o noroeste da Bahia, o sudoeste de Pernambuco, o

sul do Piauí e o norte de Goiás e publicaram, em 1916, um relatório apresentando a precária

condição sanitária e de saúde da população do sertão.24

Era necessário combater endemias

como a ancilostomíase, a malária e a doenças de Chagas.

Em 1916, foi iniciada a campanha pelo saneamento do sertão, intensificada, em 1918,

com a criação da Liga Pró-saneamento do Brasil. O movimento sanitarista identificou a

doença como o maior empecilho à “civilização”. As moléstias transmissíveis, mesmo que

acometessem as populações distantes, eram, em função da interdependência social, um

problema que deveria ser encarado nacionalmente.25

Gilberto Hochman, ao trabalhar com o conceito de interdependência, mostra a

centralidade que a doença adquire no processo de construção do Estado Nacional. Para fazer

essa discussão, ele dialogou com o médico Cyrus Edson, chamando a atenção de como a

doença e os micróbios não tinham fronteiras. A possibilidade do contágio aproximou ricos e

pobres e permitiu que a sociedade entendesse que as ações públicas de saúde deveriam atingir

a todos, através de cuidados coletivos e compulsórios. As elites passaram a se preocupar não

apenas com a saúde de seus pares, mas da nação.26

24 LIMA, Nísia Trindade; HOCHMAN, Gilberto. Condenado pela raça, absorvido pela medicina: o Brasil

descoberto pelo movimento sanitarista da Primeira República. In: MAIO, Marcos Chor; SANTOS, Ricardo

Ventura (organizadores). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro, Editora FIOCRUZ/ CCBB, 1996, p. 24-26. 25

HOCHMAN, Gilberto. A era do saneamento: as bases da política de saúde no Brasil. São Paulo: Editora

HUCITEC. 1998, p. 41-54. 26

HOCHMAN. A era do saneamento, p. 51.

24

Como fruto do movimento sanitarista, foi criado o Departamento Nacional de Saúde

Pública (DNSP), através do decreto de nº 3.987 de 2 de janeiro de 1920, pelo então

presidente, Epitácio Pessoa.27

Esse Departamento era subordinado ao Ministério da Justiça e

Negócios Interiores e tinha objetivo intervencionista estatal de cunho nacional, respeitada a

perspectiva federalista da Constituição de 1891, pois os acordos ocorreriam com os estados

que pedissem auxílio da União. O DNSP foi estruturado a partir de três diretorias: Diretoria

da defesa Sanitária Marítima e Fluvial; Diretoria de Saneamento e Profilaxia Rural e a

Diretoria dos Serviços Sanitários Terrestres.28

Segundo Hochman, ainda em 1920 os estados do Paraná, Minas Gerais e Maranhão,

além do Distrito Federal, firmaram acordos com o Governo Federal. Em 1922, quando

Epitácio Pessoa deixou a presidência do Brasil, quinze estados já haviam estabelecido

parceria com a União. Em 1924, esse número chegou a dezessete.29

A parceria com a Bahia ocorreu em 15 de abril de 1921, durante o segundo governo de

José Joaquim Seabra (1920-1924). Ricardo dos Santos Batista, ao tratar da reforma sanitária

na Bahia, principalmente a partir das ações direcionadas ao enfrentamento da sífilis, chama a

atenção para a amplitude do acordo feito com o Governo Federal. Ele previu a realização dos

serviços de profilaxia rural de combate à sífilis e às doenças venéreas, de luta antituberculose

e de higiene infantil.30

Até fins de 1924, o Governo Federal custeou integralmente os serviços de profilaxia

rural de combate à sífilis e às doenças venéreas. O Estado da Bahia ficou responsável em

amortizar a dívida com a união em dez parcelas, cuja quantia corresponderia à metade do

dinheiro investido. Esse convênio foi renovado, em 1925, por mais cinco anos. No que diz

respeito à tuberculose e à higiene infantil, a união assumiu integralmente os custos dos

serviços até 1929, quando passou a dividir as despesas com o Governo Estadual.31

Em 1925, durante o governo de Francisco Marques de Góes Calmon (1924-1928), foi

criada a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública através da lei 1.811 de julho de 1925.32

Alguns meses depois, foi promulgado o Código Sanitário da Bahia, seguindo orientações do

27

BRASIL, Decreto n. 3.987 – de 2 de janeiro de 1920: Reorganiza os serviços da Saúde Pública. Disponível

em: http://legis.senado.gov.br/legislação/ListaPublicacoe.action?id=48173. Acesso em junho de 2015. 28

BRASIL. Decreto 14.354 de 15 de setembro de 1920. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decr

et/1920-1929/decreto-14354-15-setembro-1920-503181-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em 19.07.2017. 29

HOCHMAN. A era do saneamento, p. 173. 30

BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945), p. 29-30. 31

SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. “O Dispensário Ramiro Azevedo e a Constituição de políticas de

enfrentamento da tuberculose na Bahia na década de 1920”. Obra citada (no prelo). 32

BAHIA, Lei 1.811, de 19 de julho de 1925. Organiza a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública.

Salvador, 1925.

25

DNSP.33

Com a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, e do Código

Sanitário ambos, em 1925, a política sanitária do estado equiparou-se cada vez mais ao

modelo de reforma do Governo Federal.34

Para maior entendimento dessa Reforma na Bahia e do papel das Delegacias de Saúde

e do Hospital de Isolamento de Monte’Serrat nesse processo, é importante observar a

trajetória das ações sanitárias empreendidas pelo Estado, nas primeiras décadas republicanas.

PRELÚDIOS DA REFORMA SANITÁRIA NA BAHIA

Salvador é uma cidade de topografia acidentada com o seu espaço dividido em Cidade

Alta e Cidade Baixa. Sua beleza natural foi ressaltada pelos viajantes que chegaram de regiões

distantes desde o período colonial. A primeira impressão, contudo, logo poderia ser

substituída pela identificação de suas mazelas. Era possível encontrar muitas áreas

abandonadas. O lixo e os excrementos eram deixados na rua em toda cidade. As precárias

condições sanitárias de Salvador indicavam que ela era uma cidade assolada por doenças

endêmicas e epidêmicas. Essa situação atravessou o século XIX e manteve-se nas primeiras

décadas republicanas.

O acesso aos dois níveis da cidade se fazia por meio de ladeiras, pelos elevadores

Lacerda e do Taboão, e pelos planos inclinados Gonçalves e do Pilar, construídos no final do

século XIX. O tráfego urbano, além de contar com os elevadores e com os planos inclinados,

era feito por bondes, caminhões e carroças de tração animal. Poucas pessoas podiam fazer uso

de automóveis que passaram a circular na cidade no início do século XX. Mas os bondes eram

o principal meio de transporte.35

Com uma população de 283.492 habitantes, em 1920, Salvador cresceu em dados

populacionais cerca de 2% ao ano.36

Se compararmos a cidade com outras capitais,

percebemos que a população soteropolitana não aumentou muito, pois o seu crescimento foi

principalmente vegetativo, enquanto outras cidades contaram com o fenômeno da imigração.

Apesar desse crescimento lento, a estruturação do espaço urbano foi desordenada.

33

BAHIA, Decreto 4.144, de 20 de novembro de 1925. Institui o Código Sanitário do Estado. Salvador. 1925. 34

BATISTA, Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945), p. 27, 71. 35

O Elevador Lacerda foi inaugurado em dezembro de 1873 e O Plano Inclinado Gonçalves em 1889. O

Elevador do Taboão e o Plano Inclinado do Pilar datam de 1897. Ver a esse respeito: CARVALHO, Carlos

Alberto de. A Locomoção da cidade através dos tempos. in: Revista do IGHB (66) : 77-108. 1940. 36

SANTOS, Mário Augusto da Silva. Crescimento Urbano e Habitação em Salvador (1890-1940), p.21;

NEVES, Laert Pedreira. O crescimento de Salvador e das demais cidades baianas. Salvador: Centro Editorial e

Didático da UFBA, 1985, p. 19.

26

O quadro abaixo mostra a população de Salvador, do Distrito Federal e de São Paulo

nos anos de 1890, 1900 e 1920.37

Capitais Número de Habitantes

1890 1900 1920

Salvador 174.412 205.813 283.492

Distrito Federal 532.651 811.443 1.157.873

São Paulo 64.934 239.813 579.013

Quadro 1 – Número de habitantes nos anos de 1890, 1900 e 1920.

Fonte: IBGE, Censo demográfico. Ministério da Agricultura, Indústria e comércio Diretoria Geral de Estatística.

Volume IV, Tomo I. 1920.

A cidade encontrava-se dividida em doze distritos urbanos, centrais e periféricos.38

Os

centrais eram Conceição, Pilar, Sé, Paço, São Pedro, Santana e Nazaré. Os periféricos: Mares,

Penha, Vitória, Brotas e Santo Antônio (Ver mapa 1).

De acordo com Mário Augusto da Silva Santos, desde o final do século XIX a

estrutura urbana de Salvador foi se modificando em função do crescimento das atividades do

comércio especialmente nos distritos da Sé, Conceição, Pilar e Passo.39

Durante as primeiras décadas do século XX, o distrito da Sé, localizado na parte alta

da cidade, mantinha-se como centro político e administrativo, mas se tornava cada vez mais

área de negócios em que se localizavam casas comerciais a varejo e de tecidos. Lá também

estavam muitos escritórios de advogados e consultórios médicos. Na Cidade Baixa,

principalmente nos distritos de Conceição e do Pilar estava localizada a principal zona de

comércio, com lojas, armazéns, depósitos, trapiches Nessa parte da cidade, ficavam as

instalações portuárias.40

37

IBGE, Censo demográfico. Ministério da Agricultura, Indústria e comércio Diretoria Geral de Estatística.

Volume IV, Tomo I. 1920. 38

Havia também a área suburbana, composta pelos distritos de Pirajá, Paripe, Aratu, Cotegipe, Matoim, Passé,

Maré e Itapoan. SAMPAIO, Lauro (Org.). Indicador e Guia Prático da Cidade do Salvador. Salvador: Typografia

Agostinho Barbosa e Cia, 1928. 39

SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1980 – 1940), p. 21-24. 40

SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 23.

27

Mapa 1

28

Quanto à moradia, era principalmente nos distritos de Vitória, Santo Antônio, Brotas,

Nazaré, Santana e São Pedro que a população de Salvador residia sem perder de vista as

desigualdades sociais.

Os distritos de São Pedro, Nazaré e Santana, por sua vez, receberam o fluxo das

atividades de comércio, mas mantiveram sua característica residencial.41

Já o centro da cidade

passou a ser, cada vez mais, uma área em que as habitações se degradavam, levando a elite

economicamente privilegiada a construir seus casarões em outros locais, como na Vitória, na

Graça e na Barra.

Parte da população pobre cada vez mais se deslocou para a região suburbana e outra

parcela continuou morando no centro, pois os aluguéis eram mais baratos e próximos dos

locais de trabalho.42

No entanto, essas moradias sequer tinham janelas e havia ainda aquelas

que eram sublocadas, abrigando um número grande de moradores.43

Christiane Maria Cruz de Souza, ao analisar a epidemia de gripe espanhola que atingiu

a cidade de Salvador, em 1918, relacionou a precariedade das casas à propagação de doenças.

Segundo a autora,

Em um período de crise na habitação e grande especulação imobiliária, as

pessoas de poucos recursos se submetiam a morar, precariamente, em velhos

sobrados encortiçados, sobrelojas, “avenidas” e casas de cômodo, imóveis de

baixo aluguel que proliferavam nos bairros operários e nos distritos do

antigo centro de Salvador. Esse tipo de moradia, que favorecia o convívio

próximo de vários indivíduos em espaços exíguos e mal arejados, contribuiu

para a rápida propagação da gripe, que facilmente se espalhou pelos

quarteirões dos bairros pobres da cidade.44

Em estudo acerca da greve geral de 1919, em Salvador, Aldrin Armstrong Silva

Castellucci chamou atenção para o problema habitacional. Para ele, os trabalhadores, além de

estarem sujeitos à carestia dos alimentos, aos baixos salários e ao aumento da jornada de

trabalho, também viviam em casas de péssima qualidade. Em função do preço dos alugueis, a

classe operária viu-se obrigada a retirar-se cada vez mais para bairros distantes.45

.

Quanto ao serviço de esgotos, a única rede existente foi construída em 1906,

compondo um conjunto de 27 km. Poucas casas eram servidas por essa rede. No que se refere

41

SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 23. 42

SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 25. 43

SANTOS. Crescimento urbano e habitação em Salvador (1890-1940), p. 26-27. 44

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de

epidemia. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009, p. 200. 45

CASTELLUCCI, Aldrin Armstrong Silva. Industriais e operários baianos numa conjuntura de crise (1914-

1921) Salvador: Fieb, 2004, 114.

Mapa 1

29

ao abastecimento de água, a primeira providência adotada em relação à prestação desse

serviço ocorreu em 1852, quando foi constituída a Companhia do Queimado. Até então o

abastecimento se fazia por meio de fontes públicas, construídas desde o período colonial. Essa

companhia era destinada a promover a captação e distribuição de chafarizes. Em função da

dificuldade que teve a companhia em arcar com a manutenção do serviço, a Intendência

Municipal passou a executar as obras sob a direção do engenheiro Teodoro Sampaio. Em

1925, este serviço passou ao governo do estado e quatro anos depois foi criada a Comissão de

Saneamento da Bahia.46

Consuelo Novais Sampaio ressaltou as limitações desse serviço pois na década de

1930, em todo o estado da Bahia apenas 39 cidades tinham abastecimento de água e 18

distribuição domiciliar. A água potável que era consumida pela maior parte da população era

vendida de porta em porta.47

Portanto, eram muitos os problemas sanitários e de saúde que atingiam a população de

Salvador nas primeiras décadas do século XX, que não foram alterados com a mudança de

governo de Monarquia para República. A perspectiva liberal e federalista da Constituição de

1891, a característica predominantemente agrário-exportadora da economia baiana e a

situação de entreposto comercial da cidade do Salvador, embora houvesse também uma

indústria consolidada em alguns setores da economia, levavam o Estado a agir principalmente

nos momentos das epidemias.48

Para Consuelo Sampaio, a autonomia dos estados perante o Governo Federal, trazida

pela República, não foi aceita facilmente pelos políticos baianos. Além disso, os grupos

políticos resistiram à implantação do novo regime, pois os ideais de igualdade não agradaram

aos mais abastados. O Partido Republicano inclusive não sobreviveu à Proclamação.49

Na Bahia, os governos republicanos foram tentando organizar os serviços sanitários e

de saúde, como pode ser observado na legislação sanitária e nas Mensagens dos

governadores do período. Cabe refletir que a existência de leis e de pronunciamentos dos

46

Quatro Séculos de História da Bahia. Álbum comemorativo do 4º Centenário. In: Revista Fiscal da Bahia 74-

78. 1949, p. 209. 47

SAMPAIO, Consuelo Novais. Poder & Representação. O legislativo da Bahia na Segunda República 1930-

1937. Salvador: Assembléia Legislativa, Assessoria e Comunicação Social, 1992. p. 32. 48

Aldrin Armstrong Silva Castellucci considera um erro imaginar que não existia em Salvador uma indústria

consolidada em determinados setores da economia, apesar da característica comercial inequívoca, tantas vezes

lembrada pela historiografia. CASTELLUCCI. Industriais e operários baianos numa conjuntura de crise (1914-

1921), p. 45. 49

SAMPAIO, Consuelo de Novais. Partidos Políticos da Bahia na Primeira república: uma política da

acomodação. Salvador: Editora da Universidade Federal da Bahia, 1998, p. 29-32.

30

gestores não implicava na realização de ações. As mensagens eram discursos de prestação de

contas e de autopromoção ainda que pudessem indicar os temas discutidos e as prioridades

das ações.

Em 23 de agosto de 1897, durante o governo de Luiz Viana (1896-1900), foi

promulgada a lei 213, voltada para as questões sanitárias do estado da Bahia.50

Essa lei tratou

da obrigatoriedade da notificação compulsória das doenças transmissíveis. O médico deveria

notificar essas moléstias à Inspetoria de Higiene. A ela caberia executar em todo o estado as

leis, regulamentos e instruções sanitárias aprovadas pelo governo. Depois de feita a

notificação deveria haver a desinfecção do ambiente e o isolamento do doente no próprio

domicílio, quando possível, ou em instituição apropriada.

Segundo essa lei, a prestação dos serviços sanitários e de saúde no estado da Bahia era

atribuição do poder municipal e estadual. A fiscalização dos portos ficava a cargo da União. O

município responsabilizava-se pelos serviços de abastecimento de água, canalização de

esgotos, coleta do lixo, fiscalização dos cemitérios, fiscalização de alimentos e organização e

direção dos serviços de vacinação e revacinação. Ao governo estadual cabia evitar a

propagação de doenças epidêmicas, a organização da estatística demografo-sanitária, a

fiscalização da medicina e da farmácia e a inspeção dos serviços sanitários a cargo do

município.51

Foram criados na capital os Inspetores Sanitários e os Delegados de Higiene, no

interior. Esta lei previu que o Estado reunisse em um Código Sanitário todas as disposições

elaboradas pelo Conselho Geral Sanitário. O Código Sanitário da Bahia, como vimos acima,

só se tornou realidade em 1925.

A Bahia vivia sob ameaça de epidemias como as de febre amarela, a peste bubônica e

a varíola.52

O governador Luiz Viana, fez referência à necessidade de investimento no

controle da varíola. Segundo informou, o trabalho de vacinação e revacinação realizado

contribuiu para que a varíola fosse debelada na capital, mas o mesmo não aconteceu em

algumas cidades do interior, pois nelas essa doença fez vítimas.53

50

APEB. Lei 213, de 23 de agosto de 1897. 51

Ver artigo 4º da Lei 231, de 23 de agosto de 1897. 52

Jorge Almeida Uzeda, em estudo acerca da política de saúde implementada pelo estado baiano durante a

primeira república, considera que em Salvador havia um “rodízio da morte” por doenças como a peste bubônica,

a varíola, a febre amarela, a febre tifóide e a tuberculose. UZEDA, Jorge Almeida. A morte vigiada: a cidade do

Salvador e a prática da medicina urbana (1890-1930). Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais.

Universidade Federal da Bahia. Salvador. 1992. 53

BAHIA. Mensagem do Governador Luiz Viana à Assembleia Legislativa, 1898, p. 8-14.

31

Em 1900, esse mesmo governador registrou o temor de que a epidemia de peste

bubônica chegasse a Salvador. Felizmente nenhum caso tinha sido registrado.54

A peste

bubônica chegou à cidade em 1904.

Os jornais da chamada grande imprensa que circulavam em Salvador no período

noticiavam matérias acerca das precárias condições sanitárias da cidade e do estado. As

doenças epidêmicas como a febre amarela, a varíola e a peste bubônica eram abordadas com

frequência, embora também houvesse matérias sobre a tuberculose, moléstia de alta

incidência e mortalidade na cidade.55

O conteúdo das publicações variava conforme a visão

política dos periódicos.

As matérias que trataram da peste bubônica, por exemplo, associaram a sua ocorrência

às questões sanitárias da cidade, de um modo geral, e às habitações especificamente. A

definição da etiologia da doença pelos pesquisadores Alexandre Yersin e Shebasabuso

Kitasaco, em 1894, possibilitou a compreensão de que a peste não era uma moléstia humana,

mas uma doença transmitida por pulgas.56

Estas picavam os ratos contaminados nos quais elas

ficavam alojadas e ao picarem os humanos os infectavam. Cleide de Lima Chaves e Tatiane

Pereira Amorim, ao estudarem a epidemia de Peste Bubônica em Vitória da Conquista, entre

1927 e 1928, consideram que a cidade repetiu o receituário profilático de outras localidades

que foi o extermínio de ratos, bem como a desinfecção das casas e de objetos.57

Em 1906, o Diário da Bahia relatou a discussão sobre a peste bubônica realizada na

sessão do Conselho Sanitário Estadual dirigido pelo médico Pacífico Pereira. De acordo com

os presentes, havia avanços em relação ao ano de 1904 quando ocorreu um surto epidêmico

na cidade. Segundo o diretor, entre 7 de julho e 7 de dezembro de 1904, período em que

ocorreram as notificações, foram registrados 207 casos. Desses, 141 foram a óbito. Na

epidemia de 1906, entre 21 de novembro do ano anterior, quando ocorreu a primeira

notificação, até 25 de março, houve 73 casos, com 45 óbitos.58

Os números mostraram

diminuição na incidência de peste bubônica na capital.

Ao analisamos os mesmos números, proporcionalmente, percebemos que a quantidade

de óbitos e curas são quase os mesmos. Em 1904, quando 207 pessoas foram infectadas, 68%

54

BAHIA. Mensagem do Governador Luiz Viana à Assembleia Legislativa, 1900, p. 9. 55

SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. Do “centro” para o “mundo”: a trajetória do médico José Silveira na

luta contra a tuberculose. p. 25-26. 56

CHAVES, Cleide de Lima; AMORIM, Tatiane Pereira. A peste bubônica nos sertões da Bahia: política e

cotidiano no raiar do século XX. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da; BATISTA, Ricardo dos Santos

(organizadores). História e Saúde: políticas, assistência, doenças e instituições. Salvador: EDUNEB, 2018 (no

prelo). 57

CHAVES, Cleide de Lima; AMORIM, Tatiane Pereira. A peste bubônica nos sertões da Bahia (no prelo). 58

Diário da Bahia, Salvador, 28 mar. 1906, p. 1.

32

foram a óbito e 32% se curaram. Em 1906, das 73 pessoas que contraíram a doença, 61%

morreram e 38% conseguiram se curar. Ou seja, o número de pessoas infectadas diminuiu,

mas a porcentagem de mortos e curados foi semelhante nesses dois momentos.

Na mesma matéria, o Diário da Bahia mostrou a quantidade de casos em cada distrito.

Os números foram organizados no quadro a seguir:

Distritos Centrais Distritos Periféricos

Distritos Quantidade Distritos Quantidade

Conceição 40 Brotas 09

Nazaré 18 Mares 08

Paço 20 Penha 09

Pilar 24 Santo Antônio 18

Santana 14 Vitória 07

São Pedro 17

Sé 23

Quadro 2 – Número de infectados pela Peste Bubônica por Distrito no ano de 1904

Fonte: Diário da Bahia, 28 de março de 1906, p. 01.

Os dados apresentados sobre a peste bubônica mostram que a maioria das notificações

ocorreu nos distritos centrais, principalmente por causa das moradias insalubres, concentradas

naquela região.

Durante o governo de José Marcelino (1904-1908), houve rearrumação dos serviços

sanitários, com a promulgação da lei 628, de 14 de setembro de 1905.59

Foram estabelecidas

as doenças que deveriam ser compulsoriamente notificadas: a peste, a varíola, o tifo, o cólera,

a febre amarela, a escarlatina a difiteria, a desinteria e a tuberculose. Essa lei manteve

características semelhantes à de número 213, de 1897, mas criou a Diretoria dos Serviços

Sanitários órgão responsável por gerir vários serviços, como: o instituto bacteriológico

antirábico e vacinogênico, o serviço geral de desinfecção, a seção de estatística demógrafo-

sanitária e o hospital de Isolamento. A “polícia sanitária” também foi criada e uma de suas

incumbências era a prevenção de epidemias.

George Rosen, ao tratar do conceito de “polícia sanitária” numa perspectiva histórica,

considera sua origem no século XVIII, na Alemanha, quando foi direcionado principalmente

às leis que deveriam ser aprovadas. Posteriormente, esse conceito foi usado em outros países

59

BAHIA, Lei 628, de 14 de setembro de 1905. Reorganiza o serviço sanitário do Estado. Arquivo Público do

Estado da Bahia. Salvador, 1905.

33

europeus, em áreas nas quais a ação governamental era voltada mais especificamente ao

controle de doenças transmissíveis e ao saneamento do meio ambiente.60

Guardadas as

devidas peculiaridades geográfica e temporal, é possível dizer que a ideia de “polícia

sanitária” presente na legislação sanitária estadual tinha essas características.

No governo de João Ferreira de Araújo Pinho (1908-1911) houve uma nova

reorganização do serviço sanitário com a Lei 840 de 24 de agosto de 1910. Um ano antes, em

mensagem à Assembleia Legislativa, Araújo Pinho levantou a possibilidade de criar um

imposto para arrecadar fundos para a saúde. Para ele, os serviços especiais, como eram os de

assistência pública, deveriam ter sua receita própria assim como os “povos cultos”, cuja

receita era formada pelo provento de uma “taxa especial”. Nas suas palavras

esta taxa afeta a classe dos favorecidos, e recai ora sobre a propriedade, ora

sobre a renda individual superior a um dado limite, aqui sob uma feição, ali

sob modalidade diversa, mas sempre como uma porção que o poder público

pede às sobras da riqueza para compensar a inevitável e a eterna desigualdade

das condições e dos indivíduos na sociedade humana.61

Seu discurso, embora defendesse que o imposto deveria ficar a cargo dos

economicamente favorecidos, apresentava a desigualdade dos indivíduos como algo

inevitável e eterno. Os anseios de civilidade esbarravam na parcela da população que não

tinha condições de viver dentro dos padrões desejados. Havia a tentativa de copiar os países

considerados desenvolvidos para o estado conseguir fundos suficientes para dar assistência

aqueles que não tinham condições.

No primeiro governo de José Joaquim Seabra (1912-1916) Salvador passou por

modificações urbanas, orientadas principalmente por médicos, higienistas e sanitaristas,

cuja tônica consistia em trazer para o estado o “progresso” e a “civilização”. Houve o

alargamento de ruas da Cidade Baixa, a abertura da Avenida Sete de Setembro como via

principal da Cidade Alta e a construção da Avenida Oceânica. Apesar das mudanças referidas,

Salvador longe estava de ser considerada urbanizada e higiênica.

Rinaldo Cesar Nascimento Leite considera que J. J. Seabra se articulou com os

governos municipais e federal para colocar em prática seu projeto de modernização da capital

baiana segundo os moldes de urbanização europeia. Leite acredita que algumas áreas,

especialmente as habitadas pela elite, foram beneficiadas. Isso agravou ainda mais os

60

ROSEN, George. Da polícia médica à medicina social: ensaios sobre a história da assistência médica. Trad.

Ângela Loureiro de Souza. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979, p. 171-172. 61

BAHIA, Assembleia Geral Legislativa. Mensagem. João Ferreira de Araújo Pinho. Salvador, 1909.

34

problemas relacionados à habitação, uma vez que a maioria dos investimentos, não chegou

principalmente onde residia a população pobre que era maioria. As benfeitorias alcançaram

aqueles que tinham maior poder aquisitivo.62

Por outro lado, a falta de esgotamento sanitário,

a má pavimentação das ruas e a ausência de medidas consideradas de higiene contribuíam

para que os problemas ligados à saúde estivessem presentes no cotidiano dos

soteropolitanos.63

O “conjunto de elementos que caracterizaram a cidade, sobrava a impressão

de que a civilização almejada não passou de numa obra inacabada e imperfeita.” 64

Nesse período, foi instituído, em Salvador, o Juízo dos Feitos de Saúde Pública. Esse

órgão, composto por um juiz, um procurador, um escrivão e dois oficiais de justiça sanitária,

tinha como objetivo fazer com que as ações relacionadas às questões sanitárias e de saúde

fossem tratadas numa perspectiva jurídica. Era de sua competência “conhecer todas as ações e

processos civis e criminais em matéria de higiene e salubridade pública concernente à

execução das leis e regulamentos sanitários.” Assim, cabiam-lhe ações de despejo, demolição,

interdição, desocupação, como também o julgamento do que considerava crime e

contravenção, e a cobrança de multas e taxas sanitárias.65

Para aumentar o respaldo legal do processo de reforma urbana, foi promulgada a lei

921, de 19 de novembro de 1912. Segundo Christiane Souza, foi criada a “Engenharia

sanitária”, ligada ao setor de Higiene, responsável pelas construções, reformas e fiscalizações

de tudo que estivesse vinculado ao atendimento sanitário.66

Em mensagem do seu primeiro ano de Governo, Seabra afirmou que buscaria garantir

a defesa sanitária do estado.67

No ano seguinte, o chefe do executivo baiano fez um

levantamento de suas realizações em prol da Saúde Pública. Para ele, até então os resultados

eram positivos, principalmente quando comparados com a gestão anterior.

Dentre as comparações feitas pelo então governador, na mensagem de 1913, há a

preocupação em mostrar que a mortalidade em Salvador estava caindo. Os quadros abaixo

reproduzem essa informação. O quadro 3 mostra os números gerais de mortes e o quadro 4

apresenta os números de mortos por moléstias transmissíveis.

62

LEITE, Rinaldo Cesar Nascimento. E a Bahia civiliza-se... Ideais de civilização e cenas de anti-civilidade em

um contexto de modernização urbana Salvador. 1912 – 1916. Dissertação (Mestrado em História) Universidade

Federal da Bahia. Salvador 1996, p. 55; 66. 63

LEITE. E a Bahia civiliza-se, p. 28. 64

LEITE. E a Bahia civiliza-se, p. 85. 65

APEB. Lei 892, de 10 de junho de 1912. Institui em Salvador o juízo dos feitos da saúde pública. 66

SOUZA. A gripe espanhola na Bahia, p. 59. 67

BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem de José Joaquim Seabra. Salvador, 1912.

35

Ano Número de Mortos

1908 5.754

1909 5.830

1910 6.151

1911 5.259

1912 5.202

Quadro 3 – Número de mortos na Bahia entre 1908 a 1912.

Fonte: Mensagem de J. J. Seabra 1913.

Houve uma diminuição de 57 mortes de 1911 para 1912, no primeiro ano do Governo

de Seabra. Quando analisadas os casos de falecimento por doenças transmissíveis (quadro 4),

o déficit foi de 228 mortes nesses mesmos anos.

Ano Número de Mortos por moléstias

transmissíveis

1908 2.112

1909 2.176

1910 2.419

1911 1.543

1912 1.315

Quadro 4 – Número de mortos na Bahia por moléstias transmissíveis entre 1908 a 1912

Fonte: Mensagem de J. J. Seabra 1913.

No entanto, a diminuição tanto da mortalidade geral quanto da causada por doenças

transmissíveis já estava ocorrendo antes de Seabra assumir o governo em 1912. Vale lembrar

que Seabra e João Ferreira de Araújo Pinho, seu antecessor, eram rivais políticos, logo, ele

tinha interesse em atacá-lo.

Seabra, em mensagem apresentada ao seu sucessor e aliado político, Antônio Ferrão

Moniz de Aragão, em 1916, descreveu as mudanças ocorridas no seu mandato. Para ele,

foram “os serviços de saúde pública” objeto de seu “maior cuidado” pois ninguém tinha dado

tanta atenção ao assunto quanto ele. Ressaltou, porém, que ainda havia muito a ser feito.68

Em 1917, durante o governo de Muniz de Aragão (1916-1920), foi promulgada a lei n. 1.231,

de 31 de agosto, que mais uma vez re-arrumou os serviços de saúde. Esse governador, em

mensagem apresentada à Assembleia Legislativa nesse mesmo ano, depois de fazer um

68

BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem José Joaquim Seabra. Salvador, 1916.

36

histórico do que tinha realizado no setor de saúde pública durante os governos anteriores,

enfatizou que, no período imperial, o poder público olhava sempre com descaso para o

serviço de higiene, daí os governos republicanos terem encontrado a Bahia totalmente

desaparelhada.

Até os últimos anos da década de 1910, as ações sanitárias foram direcionadas às

doenças transmissíveis, principalmente as que se manifestavam de forma epidêmica, ainda

que as “autoridades competentes” defendessem uma organização de serviços permanente.

Instituições foram criadas e serviços foram modificados. Se, em 1897, o órgão máximo era a

Inspetoria Sanitária, em 1905, surgiu a Diretoria dos Serviços Sanitários que, em 1910, foi

transformada em Diretoria Geral de Serviços Sanitários. Em 1912, o serviço sanitário e de

saúde do estado da Bahia ficou sob a direção da Diretoria Geral de Saúde Pública.69

Observa-se nesse período que o governo estadual vai ampliando as suas atribuições em

relação às ações sanitárias e de saúde. Os governantes tentavam intervir nos problemas

sanitários da capital, empreendendo ações e promulgando leis que as legitimassem, cujo

conteúdo estava ligado à organização sanitária e à fiscalização.

Cabe ressaltar que a política baiana na Primeira República, além de ser caracterizada

pela estrutura oligárquica e coronelística, não era representada por partidos políticos

fundamentados em programas. Para Consuelo Sampaio, eles eram “conhecidos e identificados

muito mais através dos nomes dos seus chefes que do rótulo que ostentavam”.70

Luiz Antônio de Castro Santos considera que a Bahia não conseguiu ter avanço com a

reforma sanitária nas duas primeiras décadas do século XX, apesar de terem sido criados

alguns órgãos como o Conselho de Higiene. Para ele, um dos motivos foi a elite conservadora

e um ambiente político e intelectual indiferente às ações de saúde pública. Só na década de

1920 houve progresso do movimento reformista graças à intervenção do governo federal e à

ação sanitária da Fundação Rockefeller.71

O atendimento sanitário e a fiscalização

69

SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes Do “Centro para o “mundo”. Doutorado em História. Recife, UFPE, 2009,

p. 38.. 70

SAMPAIO, C. N. Os partidos políticos na Primeira República: uma política de acomodação. Obra citada, p.

47. 71

SANTOS, Luiz Antonio de Castro. Poder, Ideologias e Saúde no Brasil da Primeira República. In

HOCHMAN, Gilberto (org.). Cuidar, controlar e curar. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2004., p. 266

37

Os anos que antecederam à reforma sanitária na Bahia foram assolados por doenças

endêmicas e epidêmicas. Esse problema já era sinalizado desde o início do século com as

fiscalizações.72

As inspetorias faziam o trabalho de fiscalização dos domicílios, em Salvador,

à luz da legislação vigente.

Caso fosse necessário, o proprietário era notificado tendo um prazo para fazer os

reparos que variava de acordo com o que deveria ser realizado. O não cumprimento do

estabelecido ocasionava multa.

Se os inspetores encontrassem um enfermo que pudesse colocar em risco a saúde dos

demais moradores da casa, deveriam imediatamente encaminhá-lo para internamento.

Em 31 de janeiro de 1900, foi entregue um relatório da polícia sanitária do 6º distrito,

região da Penha, que tratou das casas visitadas pelos inspetores. O senhor Domingos

Estrellado, que possuía uma casa térrea de nº 51 na rua Barão H. de Mello, locada por Durval

Estrellado, foi notificado. Segundo o inspetor, o local necessitava de “reparação completa do

teto da casa, limpeza do quintal e tijolamento”. E para esses reparos lhe foram concedidos 40

dias. Na mesma rua, o senhor Vitor Soares Ribeiro possuía três propriedades, sendo que uma

ele locava ao senhor Domingos Martins Faria. Durante a inspeção desse imóvel, não foi

encontrado nenhuma irregularidade. No entanto, na casa que ele alugava ao senhor Roberto

Antônio do Espírito Santo era preciso “caiar a cozinha” e para isso lhe deram um prazo de 20

dias. A casa de número 52, por sua vez, pertencente ao mesmo proprietário, estava locada ao

senhor Arlindo de Oliveira Alves e também não necessitou de reparos.73

É provável que as casas onde os proprietários residiam tivessem menos problemas

para serem resolvidos do que as residências alugadas. A probabilidade das fiscalizações

encontrarem irregularidades era grande pois a população enfrentou sérios problemas

habitacionais, como foi observado anteriormente. É possível também que as decisões de

multas ou reparos fossem manipuladas de acordo com as relações existentes.

Os jornais noticiavam como esse trabalho estava sendo feito pela equipe de saúde.

Com o título de “Salubridade Pública” o Diário da Bahia, de 22 de outubro de 1913,

estampou na primeira página a seguinte matéria:

Foram noticiados, domingo, 3 casos de peste bubônica no

prédio numero 86, ao Pelourinho, sendo os doentes 2 árabes

72

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. SANGLARD, Gisele. Saúde pública e Assistência na Bahia da Primeira

República (1889 -1929). In: SOUZA, Christiane Maria Cruz de. BARRETO, Maria Renilda Nery (org.). História

da Saúde na Bahia: Instituições e Patrimônio Arquitetônico (1808 – 1958), 2011, p. 51. 73

APEB. Mapas do movimento da polícia sanitária nos distritos de Santo Antônio, Mares e Santana ou seja 1º,

3º e 6º distritos. APEB Caixa 3688, maço 989, ano 1900.

38

residentes no 2º e 3º andares e uma criança que se

removeram para o Hospital de Isolamento. O prédio

desinfectado ficou interdito temporariamente.74

O periódico informou ainda que, segundo os inspetores sanitários dos 11º e 13º

Distritos, foram interditados provisoriamente por serem inabitáveis os prédios n. 145, a rua do

Fortinho; um sem número, pertencente ao Sr. José Joaquim dos Santos e definitivamente

interditado por ser totalmente inabitável o casebre sem número, situado no Candeal, de

propriedade da Sra. Marcellina Soares dos Santos. Isso indica que, de alguma forma, tentava-

se cumprir a legislação. Mas poderia também ser uma denúncia das condições das habitações

de Salvador, no governo de J. J. Seabra, cujo Diário da Bahia fazia oposição. 75

Em 1916, em matéria intitulada “A peste Negra”, o Diário da Bahia noticiou a

situação insalubre de alguns locais. Havia “pontos da cidade” que eram “verdadeiros ninhos

de ratos” e entre eles estavam “a ponte da ‘Navegação Baiana’ e o ‘Mercado Modelo’”.76

Os

dois locais citados eram de embarque e desembarque de mercadorias, pontos de comércio da

cidade. Neles, além de transitar muita gente, circulavam alimentos que seriam utilizados nas

refeições. Na mesma publicação, o jornal falava de algumas providências que foram tomadas

pelo Governo, como a dedetização para matar os ratos e a troca da ponte. O articulista

aproveitava para perguntar ao Secretário Gonçalo Moniz quando a peste seria erradicada,

ouvindo como resposta o seguinte:

“... é um erro falar-se em extinguir a peste na Bahia, pois para isto é preciso

arrasar a Preguiça, o Pilar e tantos outros focos, por a prova de ratos todas as

edificações da cidade e estabelecer uma admirável rede de esgoto em toda ela,

e nós não temos posses para isto...”77

Assim, a o trabalho de fiscalização, de notificação e de desinfecção permaneceu ao

longo das primeiras duas décadas do século XX, embora a legislação sanitária tenha sido

reorganizada em vários momentos.

No dia 22 de abril de 1918, o Departamento Geral da Saúde Pública da Bahia –

DGSPB recebeu da 17ª inspetoria um relatório em que constavam três visitas a residências

particulares e duas a residências para alugar. Além disso, foram aplicadas quatro vacinas

74

“Salubridade Pública”. Diário da Bahia, 22 de out. 1913, p. 1. 75

SAMPAIO, Consuelo Novais. Verbete biográfico. Diário da Bahia. Disponível em:

http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx>. 76

“A peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 28 nov. 1916, p. 01. 77

“A peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 28 nov. 1916, p. 01.

39

contra a varíola e foi requisitada uma desinfecção. Duas intimações foram expedidas para que

o proprietário fizesse os melhoramentos necessários e uma reclamação foi atendida.78

Quando o serviço de desinfecção era chamado, quase sempre se fazia necessário além

de desinfetar a casa, encaminhar o doente para o Isolamento a depender da doença. Foi o que

aconteceu dia 11 de maio de 1918, quando o serviço foi solicitado na residência do senhor

Valdomiro Athaide, localizada na Rua do Paço nº 45. Após a desinfecção, foi preciso

encaminhá-lo ao Hospital de Mont’Serrat com suspeita de varíola.79

Não foi possível saber se a suspeita foi confirmada. De todo modo, em 1919, Salvador

foi assolada pela maior epidemia de varíola ocorrida na sua história, ocasião em que 2.804

pessoas morreram.80

Um ano antes, a gripe espanhola tinha atingido a Bahia causando sérios danos. A

doença encontrou uma sociedade com péssimas habitações, problemas de esgotamento

sanitário e de abastecimento de água. Christiane Souza faz uma análise desse momento e

mostra como as autoridades baianas se organizaram para combater a moléstia. Inicialmente

não havia consenso diante do diagnóstico e alguns médicos tentaram negar a existência de

uma epidemia em Salvador.81

Na tentativa de entender o que estava acontecendo, a Diretoria Geral de Saúde Pública

da Bahia criou uma comissão para estudar a epidemia. O grupo foi composto por Frederico

Koch, Dyonisio Pereira e Aristides Novis. A comissão deveria pesquisar a doença e

apresentar um parecer sobre ela.82

A comissão entendeu que a ação da “espanhola” tinha

relação com o tipo de moradia da população, que era insalubre, e também com os espaços

públicos onde as pessoas tinham contatos. Por isso:

conscientes da contagiosidade da gripe, recomendaram a adoção de algumas

práticas de higiene individual e coletiva que poderiam contribuir para abreviar

o tempo de vida do patógeno e limitar a sua disseminação. Apesar de

78

APEB. Boletim diário dos serviços de Polícia e Vigilância Sanitárias. APEB Caixa 3688, maço 985, ano

1918. 79

APEB. Boletim diário dos serviços de Polícia e Vigilância Sanitárias. APEB Caixa 3688, maço 985, ano

1918. 80

.Christiane Maria Cruz de Souza e Gilberto Hochman buscaram identificar o impacto da epidemia na sociedade

soteropolitana e a resposta da população a esse evento. Ver: SOUZA, C. M. C. de & HOCHMAN, Gilberto Ano

de nove, ano de varíola: a epidemia de 1919, em Salvador, Bahia. Fênix, Vol. 9, Ano IX, Nº 3. Set/out/nov/dez.

2012, p. 1-19; Esdras Santos Oliveira abordou o uso político da epidemia de varíola na imprensa de Salvador,

durante a epidemia de 1919. Ver: OLIVEIRA, Esdras Santos. O uso político da varíola: epidemia, imprensa e

sucessão governamental em Salvador, Bahia, 1919. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História),

UNEB, 2014. 81

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de

epidemia. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009, p 138. 82

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A epidemia de gripe espanhola: um desafio à medicina baiana. In

História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, vol.15, n. 4, p. 945 – 972, 2008, p. 962- 963.

40

reconhecerem a causalidade específica da doença, ponderavam que as

condições materiais de existência constituíam fatores importantes a considerar,

quando se tratava da resistência do organismo humano às infecções.83

Os médicos acreditavam que era preciso melhorar as condições de vida da população,

a exemplo da moradia, alimentação, sobretudo dos menos favorecidos, assim:

Conscientes de que esses e outros fatores contribuíam para a incidência e

propagação de doenças como a gripe e para o surgimento de complicações no

decurso da doença, defendiam a adoção de medidas de saúde pública voltadas

para as camadas mais pobres da sociedade baiana, que não podiam prover o

seu próprio tratamento, e propugnavam, também, que a ação do serviço

público de saúde privilegiasse os lugares onde havia maior convívio ou

proximidade entre as pessoas.84

Dois anos depois, em 24 de março de 1920, o jornal Diário da Bahia, em matéria da

primeira página, associou a precária situação sanitária de Salvador à ocorrência da peste

bubônica. O jornal citou o boletim médico do Hospital de Isolamento e ironizou dizendo:

“Como se vê é excelente para não dizer detestável, o estado sanitário da capital.” Isso porque

segundo informações do boletim demográfico sanitário, citadas na matéria, haviam sido

notificados diversos doentes com peste, tuberculose, varíola, paludismo, gripe e febre

typhoide. Segundo a reportagem, os documentos oficiais ocultavam outros casos.85

O periódico questionava o discurso do governo na época que propagandeava as

reformas urbanas e o investimento em saneamento na Capital. Ainda nessa mesma

publicação, o articulista fez sérias denúncias sobre tais problemas:

Cidade sem esgotos, sem preceitos de higiene urbana expostos e seguidos, não

é possível combater entre nós, assim sendo, os ratos e conseguintemente as

pulgas, origem uns e vectoras as outras da peste negra humana.

Temos um mal crônico, de longa data instalado e nada quase temos feito de

profilaxia agressiva ou defensiva, ao menos, contra a sua permanência.

Quando nas suas alternativas costumeiras um surto maior se denuncia, como

agora, nem por isso os responsáveis se movem para uma campanha seria e

decisiva.

Pergunte-se que providencias já tomou o governo contra o surto atual?

As mesmas que tomou contra a varíola, isto é, nenhuma.86

83

SOUZA. A epidemia de gripe espanhola: um desafio à medicina baiana, p. 967. 84

SOUZA. A epidemia de gripe espanhola: um desafio à medicina baiana, p. 968. 85

“A peste Negra e o estado sanitário da capital”. Diário da Bahia. Salvador, 24 mar. 1920, p 1. 86

“A peste Negra e o estado sanitário da capital”. Diário da Bahia. Salvador, 24 mar. 1920, p. 1.

41

O autor finalizou criticando o posicionamento do governo baiano em relação às

providencias sobre um possível surto de peste. Além disso, acusou o governo de ter feito o

mesmo durante a epidemia de varíola.

Em 07 de outubro de 1921, mais uma vez o Diário da Bahia publicou sobre as

questões sanitárias da capital. Dessa vez, Gonçalo Muniz, diretor da Saúde Pública da Bahia,

foi entrevistado sobre a peste negra, doença que estava amedrontando a população. Um dos

problemas apontados como propiciadores foi a habitação.

Figura 1 – Dois casos de Peste Negra

Fonte: Diário da Bahia, Salvador, 07 jan. 1921, p. 1.

Durante a entrevista, o diretor deixou claro que a cidade precisava de casas para a

população e afirmou que para acabar com o problema da peste negra era preciso:

(...) que se cuidasse a sério do problema das habitações, o mais urgente

que temos na atualidade (...) Nós não temos casas suficientes para a

população, e isso determina o mal que não posso combater. É preciso

antes de tudo construir casas higiênicas, casas com ar e luz, casas para

operários, afim de que possa interditar esses pardieiros (...) 87

Para Gonçalo Moniz, era necessário interditar urgentemente inúmeras casas mas, para

isso, outras que atendessem os novos padrões de higiene precisavam ser construídas, afinal,

para onde iria toda essa população? A matéria foi finalizada com a seguinte frase: “Eis,

portanto, o que é preciso urgente: Casas!casas!casas!”.88

87

“Dois casos de peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 07 Jan. 1921.p 01. 88

“Dois casos de peste negra”. Diário da Bahia. Salvador, 07 Jan. 1921.p 01.

42

As matérias relatam problemas durante a gestão de Seabra, ainda que elas

funcionassem como uma alerta à população sobre o que estava acontecendo, havia também

um jogo político e disputa de poder.

DE VOLTA À REFORMA SANITÁRIA NA BAHIA

Quando a Reforma Sanitária foi iniciada na Bahia a partir do acordo feito com o

Governo Federal, em 1921, pelo então governador José Joaquim Seabra, conforme vimos

anteriormente, já existiam leis e instituições que de alguma maneira tentavam organizar a

saúde no estado.

Com a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, em 1925, as

instituições existentes ficaram a ela subordinadas. Outras foram criadas para atender às

demandas dessa nova organização.

A Subsecretaria, subordinada direta e exclusivamente ao governador Francisco

Marques de Góes Calmon, passou a gerir todos os serviços de higiene e saúde pública

executados no estado da Bahia. Esse aspecto deve ser observado à luz das disputas políticas

estaduais. Ricardo Batista chama a atenção que o acordo para o saneamento da Bahia deu-se

através de dois governos opositores sendo iniciado com o convênio durante a gestão de

Seabra (1920-1924), e consolidado em 1925, com a criação da Subsecretaria de Saúde e

Assistência Pública e do Código Sanitário da Bahia, durante o governos de Góes Calmon

(1924-1928). A submissão da Subsecretaria diretamente ao governador implicava o aumento

de poder do representante do executivo baiano, causando desconforto no grupo seabrista.89

Cabia à Subsecretaria: o estudo de todas as questões que interessassem à saúde

coletiva; a adoção de todas as medidas técnicas que visassem evitar diminuir e suprir as

causas de doenças e morte; o melhoramento das condições de saúde e bem estar da

população.90

O seu artigo 5º previa que enquanto vigorasse o contrato firmado entre o

Governo Federal e o Estado, os serviços de Saneamento Rural, Profilaxia da Sífiles e Doenças

venéreas, Higiene Infantil e Tuberculose seriam executados com a colaboração financeira da

89

BATISTA. Sifilis e Reforma da Saúde na Bahia (1920-1945). p. 79. 90

BAHIA. Lei 1.811, de 19 de julho de 1925. Organiza a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública.

Salvador, 1925.

43

União. Cessando o apoio federal esses serviços passariam a ser efetivados exclusivamente

pelo Estado que aproveitaria ou não os funcionários dele encarregados.

Três meses depois de criada a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, foi

instituído o Código Sanitário da Bahia. Este foi apresentado pelo então governador Francisco

Marques de Góes Calmon como um “instrumento legal” sustentado nos “modernos preceitos

da saúde pública.”91

A direção da Subsecretaria ficou a cargo do médico sanitarista Antônio Luis

Cavalcante Albuquerque de Barros Barreto. Barros Barreto nasceu no "Engenho do Meio da

Várzea", próximo à Cidade do Recife, em 11de maio de 1892. Em 1910, matriculou-se no

curso médico da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, graduando-se em 1916. Depois de

formado, Barros Barreto fez cursos nos Estados Unidos, França e Alemanha. Além disso,

frequentou vários serviços de Saúde Pública na Bélgica,Suíça e Itália. Quando retornou ao

Brasil, em 1923, chefiou a Seção de Propaganda e Educação Sanitária do Departamento

Nacional de Saúde Pública, no Rio de Janeiro. Em 1924, foi Chefe do Serviço de Saneamento

Rural no Paraná. Em seguida, foi nomeado a cargo similar na Bahia, onde liderou as

mudanças sanitárias ocorridas no estado, estando à frente da Subsecretaria de Saúde

Assistência Pública, criada em 1925. 92

No relatório acerca do primeiro ano de funcionamento da Subsecretaria, foi registrado

que durante muito tempo as leis sanitárias não estavam sendo cumpridas corretamente, daí ter

sido fundamental fazer algumas alterações para que a nova legislação fosse seguida. Barros

Barreto aproveitou para divulgar que a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública em um

curto espaço de tempo havia mandado médicos para a América do Norte, Europa e para

região Sul do Brasil a fim de aprender sobre novas técnicas de saúde e assim melhorar o

atendimento sanitário da capital baiana. Além disso, foi feita uma parceria com a Fundação

Rockfeller.93

Seu discurso visava desqualificar a gestão de Seabra e valorizar as medidas tomadas a

partir do governo de Góes Calmon. Barros Barreto também comparou a antiga Diretoria Geral

91

APEB. Assembleia Geral Legislativa. Mensagem.Francisco Marques de Góes Calmon. Salvador, 1927. 92

JACOBINA, Ronaldo Ribeiro. Memória histórica do bicentenário da Faculdade de Medicina da Bahia

(2008): os professores encantados, a visibilidade dos servidores e o protagonismo dos estudantes da FAMEB.

Salvador: Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA, 2013. 3 v. p. 37-44. 93

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de

1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. Para a discussão acerca da atuação da Fundação Rockfeler na

Bahia ver: PONTES, Adriano Arruda. Caçando mosquitos na Bahia, a Rockefeller e o combate à febre amarela:

inserção, ação e reação popular (1918-1940). Dissertação de mestrado – Faculdade Filosofia e Ciências

Humanas, Programa de Pós Graduação em História. Universidade do Estado na Bahia, Salvador, 2007.

44

de Saúde Pública (DGSP) com a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública. A ideia era

mostrar as mudanças e sobretudo os avanços que segundo ele estavam acontecendo.

A DGSP era composta por: uma secretaria, um serviço de estatística, dezoito

inspetorias, um serviço de desinfecção, o Instituto Oswaldo Cruz, o serviço de assistência

pública, o Cemitério da Quinta dos Lázaros, o Hospital de Isolamento, o Hospital dos

Lázaros, o Hospício dos Alienados, pela Justiça Sanitária e pelo Conselho Sanitário. Portanto,

essa era a estrutura que existia até 1925.

Com a criação da Subsecretaria foram instituídas seis Diretorias e cada uma tinha

vários órgãos e serviços a elas ligados. O quadro 5 mostra a estruturação dos serviços de

saúde na Bahia com a criação da Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública em 1925.

45

Quadro 5 - Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública

Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano

de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.

I - Diretoria de demografia e educação sanitária.

Estatística demógrafo sanitária

Educação sanitária

Cadastro e recenseamento

IV - Diretoria de Engenharia Sanitária

Construções

Águas

Esgotos

Obras de hidrografia sanitária

Lixo

Tombamento dos próprios pertences

da repartição sanitária

II - Diretoria de Epidemiologia e Profilaxia Geral

Serviços de enfermeiras sanitárias

Delegacias de saúde (em número de

cinco, cada uma com três distritos

sanitários).

Doenças transmissíveis

Polícia Sanitária

Verificação de óbitos

Hospital de Isolamento

Serviço Médico da hospedaria de

imigrantes

Instituto Oswaldo Cruz

Seção de microbiologia

Seção anti-rábica

Seção vacionogenica

Seção química e

bromatologia

Seção de bioterapia

Seção de medicamentos

Profilaxia da Sífilis, lepra e doenças

Venéreas

Profilaxia da tuberculose

Postos municipais de higiene e

Saneamento rural

Serviço de higiene industrial

Serviço de luta contra animais

transmissíveis

V - Diretoria de Assistência Pública

Inspeções de saúde de:

Funcionários públicos

Empregados domésticos

Empregados no comércio de

gêneros alimentícios

Fiscalização do Exercício da

profissão médica e congêneres

Fiscalização de gêneros alimentícios

Serviços de socorros de urgência

Assistência a alienados (hospital São

João de Deus)

Assistência a Leprosos (hospital dos

Lázaros)

Cemitério público da Quinta dos

Lázaros

VI - Diretoria de Expediente e contabilidade

Portaria]seção de queixas e

informações

Seção de expedientes

Seção de contabilidade

Arquivo

Museu da higiene

Biblioteca

Almoxarifado geral

Desinfetório, cocheiros e garage

Oficinas

III - Diretoria de Higiene infantil e escolar

Higiene da primeira infância

Puericultura pré-natal

Exames de nutrizes

Higiene da idade pré-escolar

Inspeção médica escolar

Fiscalização dos estabelecimentos

de assistência à infância

VII - Justiça Sanitária

VIII – Conselho Sanitário

46

Como pode ser observado, a estrutura cresceu e se diversificou, havendo um aumento

do número de Diretorias e uma maior especificação dos serviços. Para isso foi necessário criar

novos órgãos.

As Delegacias de Saúde surgiram nesse momento e foram incorporadas à Diretoria de

Epidemiologia e Profilaxia Geral, setor que cuidava principalmente da prevenção e da

fiscalização das doenças. Nessa mesma Diretoria, estavam alocados o Hospital de Isolamento

de Mont’Serrat, o Serviço de Enfermeiras Sanitárias, o Serviço médico da hospedaria de

imigrantes, o Instituo Osvaldo Cruz, a Profilaxia da Sífilis lepra e doenças venéreas, a

Profilaxia da Tuberculose, os Postos Municipais de Higiene e Saneamento Rural, o Serviço de

higiene industrial e o Serviço de luta contra animais transmissíveis.

Os serviços de enfermeiras sanitárias foram instituídos no processo de reforma. As

profissionais a eles ligadas tiveram um papel importante de visitar e acompanhar os doentes

nos seus domicílios. No ano de 1928, elas visitaram 2.166 (duas mil, cento e sessenta e seis)

enfermos e, em 1929, foram visitados 2.693 (dois mil seiscentos e noventa e três) doentes.94

No entanto, a ênfase na relevância das enfermeiras sanitárias ou visitadoras era anterior à

gestão de Barros Barreto no governo de Góes Calmon. Em 1922, o Departamento Nacional de

Saúde Pública, através do Serviço de Profilaxia Rural dirigido pelo médico Sebastião Barroso,

firmou acordo com a Liga Bahiana Contra a Tuberculose para colocar em funcionamento o

Dispensário voltado especificamente para essa doença. A assistência que norteou a nova

instituição seguiu o que vinha sendo desenvolvido nos dispensários da Inspetoria de Profilaxia

da Tuberculose, do Rio de Janeiro, sob a direção do médico Plácido Barbosa, baseado no

trabalho das enfermeiras visitadoras. Era, dessa forma “um procedimento considerado novo,

consistindo a parte mais importante do serviço”. 95

A Diretoria de Higiene infantil e escolar foi criada a partir da Subsecretaria, cabendo a

ela pensar as estratégias de cuidado e de atenção voltadas para esse público. De acordo com

Lidiane Monteiro Ribeiro, na Bahia as ações direcionadas à infância aconteceram em

conjunto. As de cunho filantrópicos que já existiam se aliaram à Diretoria de Higiene Infantil,

cujo principal propósito era combater a mortalidade infantil. Para atingir esse objetivo, foram

criados consultórios para gestantes e creches com a intenção de orientar as mães e ajudar a

94

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de

1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da

Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. 95

SILVA. O Dispensário Ramiro Azevedo e a Constituição de políticas de enfrentamento da tuberculose na

Bahia na década de 1920 (no prelo).

47

cuidar das crianças. O médico Martagão Gesteira foi o responsável por coordenar essas ações

no estado. Segundo Ribeiro:

Como Martagão Gesteira havia anunciado na entrevista concedida ao jornal A

Tarde em 5 de junho de 1923, e confirmado por meio do estatuto da instituição

benemerente, as obras consistiram em um consultório de lactentes e uma

creche. A importância de cada uma delas estava diretamente relacionada à

proposta de combate à mortalidade infantil defendida pela entidade. 96

As Delegacias de Saúde e o Hospital de Isolamento de Mont’Serrat, objeto deste

estudo, tiveram papel importante no processo de constituição das ações relacionadas à

reforma sanitária em âmbito estadual. Essas duas instituições serão tratadas especificamente

na segunda parte desta dissertação.

96

RIBEIRO, Lidiane Monteiro. Filantropia e assistência à saúde da infância na Bahia: a Liga Baiana contra a

mortalidade infantil, 1923-1935. Mestrado em História das Ciências e da Saúde. Rio de Janeiro, Fundação

Oswaldo Cruz. Casa de Oswaldo Cruz, 2011.

48

PARTE II

AS DELEGACIAS DE SAÚDE E O HOSPITAL DE ISOLAMENTO DE

MONT’SERRAT DURANTE A REFORMA SANITÁRIA.

Nesta parte da dissertação vamos analisar duas instituições que desenvolveram ações

de saúde, no momento em que o estado da Bahia passava pelo processo de reforma sanitária:

as Delegacias de Saúde e o Hospital de Isolamento de Mont’Serrat.

AS DELEGACIAS DE SAÚDE

As Delegacias de Saúde em Salvador foram criadas com a Lei 1.811 de 27 de julho de

1925, que organizou a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública. Elas foram instaladas em

diversos pontos da cidade e tiveram as seguintes funções: cadastro e recenseamento dos

prédios e da população dos distritos sanitários; estudo das causas de insalubridade e das

anomalias nosológicas existentes nas zonas de sua jurisdição; estudo epidemiológico dos

casos de doenças transmissíveis; combate às moléstias de notificação compulsória

compreendendo principalmente o isolamento domiciliário, desinfecção concorrente,

imunização específica, vigilância sanitária e luta contra animais transmissíveis; polícia

sanitária e higiene das habitações; fiscalização da profissão médica e suas congêneres, em

perfeito entendimento com respectivo serviço; fiscalização das farmácias, drogarias,

laboratórios farmacêuticos e bioterapêuticos, pertencentes a particulares, instituições oficiais,

ou privadas e serviço de verificação de óbitos.97

O sugirmento desse órgão atendia não apenas a uma deliberação estadual, mas seguia

também o modelo Federal de reforma sanitária, pois junto ao Departamento Nacional de

Saúde Pública (DNSP), criado em 1920, foram instituídas 10 (dez) Delegacias de Saúde cujo

objetivo estava voltado para a profilaxia.98

A 1ª Delegacia de Saúde funcionou no prédio do Instituto Osvaldo Cruz (IOC-BA), no

bairro do Canela. A imagem abaixo (figura 2), que está no Relatório de Barros Barreto,

Subsecretário de Saúde na época, mostra um local organizado e pronto para o atendimento.

97

BAHIA, Lei 1.811 de 27 de julho de 1925. Arquivo Público do Estado da Bahia. Salvador, 1925. 98

BRASIL. Decreto nº 14.354, de 15 de Setembro de 1920: Organização das Diretorias e Inspetorias. Disponível

em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-14354-15-setembro-1920-503181-

publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em: 28 de março de 2018.

49

Figura – 2 Sede da 1ª Delegacia de Saúde

Fonte: Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública - 1927

Cabe refletir, como nos sugere John Berger, que a fotografia não é um retrato fiel da

“realidade”, ela é uma parte daquilo que se quer apresentar. Para ele,

As fotografias testemunham uma opção humana sendo exercida numa dada

situação. A fotografia é o resultado da decisão do fotógrafo de que vale a pena

registrar em um evento (...) A fotografia já é uma mensagem sobre o

acontecimento que ela registra. A urgência dessa mensagem não é totalmente

dependente da urgência do acontecimento, mas também não pode ser

inteiramente independente dela (...).99

Assim, ela pode ser utilizada para mostrar algo específico, como é o caso da fotografia

acima, que parece sugerir que as Delegacias estavam funcionando bem.

O nome “Delegacia” vem do latim delegatus. Significa o local no qual atuam pessoas

a quem são delegados o poder para falar em nome das entidades que representam. Embora

não seja restrito a uma unidade policial, no caso específico das delegacias aqui tratadas havia

relação com ações “policiais”, sugerindo um tipo de prática de controle. As atividades

99

BERGUER, John. Para entender uma fotografia. Organização, introdução e notas Geoff Dyer. Tradução:

Paulo Geier. 1ª Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, p. 37-38.

50

desenvolvidas pelas Delegacias de Saúde, portanto, tinham como objetivo fiscalizar e

controlar doenças, sobretudo as infectocontagiosas. O principal papel das Delegacias era

garantir que Salvador estivesse livre de surtos epidêmicos e fiscalizar para que o Código

Sanitário, criado no ano de 1925, fosse cumprido.

O quadro de funcionários das Delegacias estava organizado da seguinte maneira: um

Delegado, três inspetores, um Inspetor Vacinador, um Verificador de óbitos, um Escrevente

Datilógrafo, um Guarda Chefe e vários guardas sanitários. Eles deveriam seguir o Código

Sanitário na fiscalização e notificação dos doentes, acompanhando os enfermos quando era

possível tratar em casa e, quando havia necessidade de isolamento hospitalar, encaminhá-los

para o Hospital de Mont’Serrat.100

Além disso, os inspetores deveriam aplicar multas quando

o Código não fosse seguido.

Foram criadas cinco Delegacias de Saúde e cada uma deveria atender a três Distritos

Sanitários, entre os quinze existentes.101

No entanto, a organização sanitária em forma de

Distritos era anterior ao surgimento delas. A Lei de nº 628 de 14 de setembro de 1905, que

reorganizou o serviço de saúde do Estado no governo de José Marcelino de Souza (1904-

1908), previa no artigo 28 da seção Inspetorias Sanitárias que a Capital deveria ser dividida

em seis Distritos Sanitários: cinco urbanos e um suburbano.102

Cada Distrito ficaria sob a

responsabilidade de um Inspetor Sanitário, que deveria fiscalizar o cumprimento das leis

sanitárias, verificar casos de moléstias transmissíveis e averiguar o exercício ilegal da

medicina e da farmácia.

O artigo n.º 28 da lei 628 afirmava que “em épocas anormais”, os distritos poderiam

ser “subdivididos em secções, a critério do diretor do serviço sanitário, com aprovação do

governo”.103

Esse artigo permitiu a criação de mais Distritos na Capital, na medida em que as

necessidades foram aparecendo. Assim, a modificação da legislação sanitária ocorrida através

da Lei 840 de 24 de agosto de 1910 previu, no seu artigo 5º, a possibilidade de elevar os

distritos até o número de quinze.104

Este número foi ampliado, para dezesseis, com a

promulgação da lei n.º 921 de 1912, ficando cada um deles a cargo de um inspetor sanitário

100

A depender da localização da Delegacia, o enfermo poderia ser encaminhado para o Hospital Santa Izabel. 101

A Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública apresentou no Diário Oficial do Estado a nova divisão dos

Distritos Sanitários de Salvador. No documento era evidente a organização urbana/geográfica de cada um dos

quinze Distritos. BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, domingo, 30 de agosto de 1925. Arquivo Público

do Estado da Bahia. Salvador, 1925. 102

BAHIA, Lei 628, de 14 de setembro de 1905. Reorganiza o serviço sanitário do Estado. Arquivo Público do

Estado da Bahia. Salvador, 1905. 103

BAHIA, Lei 628, de 14 de setembro de 1905. Reorganiza o serviço sanitário do Estado. Arquivo Público do

Estado da Bahia. Salvador, 1905. 104

BAHIA, Lei n. 840 de 24 de agosto de 1910. Modifica a lei n. 628 de 14 de setembro de 1905 relativa ao

serviço sanitário Estadual.

51

que deveria ser médico, podendo seu auxiliar ser estudante da Faculdade de Medicina da

Bahia, desde que estivesse cursando entre a 5ª e 6ª série médica.105

Christiane Maria Cruz de Souza, ao analisar a organização sanitária da Bahia no

período da gripe espanhola, afirma que em 1917 a cidade do Salvador foi dividida em

dezessete distritos sanitários:

Moniz de Aragão achou conveniente manter o serviço de vigilância sanitária.

Ficava a cargo dos inspetores sanitários a realização de várias visitas médicas

aos domicílios e estabelecimentos, em especial àqueles onde existia alguma

concentração de pessoas em grandes ou pequenos espaços – escolas, fábricas,

asilos, quartéis, etc.. Para viabilizar os serviços dos inspetores, Salvador foi

dividida em 17 distritos sanitários.106

O Diário Oficial de 01 de agosto de 1925,107

ao contabilizar a quantidade de pessoas

vacinadas contra a varíola, indica um número de dezoito Inspetorias Sanitárias (Quadro 6). No

mesmo ano, as inspetorias sofreram outra modificação, em virtude da criação das Delegacias

de saúde. Dessa vez, houve uma diminuição de dezoito para quinze inspetorias.

105

BAHIA, Lei 921 de 29 de novembro de 1912. Manda adaptar como lei sanitária do Estado a Organização

do Serviço Geral da Saúde Pública, editada pelo decreto 1.105 de 15 de julho do corrente ano. Arquivo Público

do Estado da Bahia. Salvador, 1912. 106

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A Gripe Espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de

epidemia, EDUFBA; Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009. p.71. 107

BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, sábado, 1 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado da

Bahia. Salvador, 1925.

52

Inspetoria Inspetor Responsável

1ª Menandro Meirelles Filho

2ª Walfedro Mendonça

3ª Pedro Ribeiro

4ª Dionysio Pereira

5ª Collatino de Borburema

6ª Edgard Tourinho

7ª Candido Figueiredo

8ª Francisco S. Senna

9ª Virgílio de Carvalho

10ª Januário Telles

11ª Franco Rocha

12ª Oswaldo Duarte

13ª Severino Pereira

14ª Mario Andrea

15ª Eduardo Diniz Gonçalves

16ª Clíniode Jesus

17ª Américo Duarte Ferreira

18ª Moneiro de Almeida

Quadro 6 – Inspetorias Sanitárias, 1925.

Fonte: BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, sábado, 1 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado da

Bahia. Salvador, 1925.

As inaugurações das Delegacias de saúde ocorreram em datas diferentes: a 1ª foi

inaugurada em 14 de agosto de 1925 e as demais em cinco de setembro do mesmo ano.108

Segundo Antônio Luis C. A. de Barros Barreto as Delegacias foram criadas para substituir as

Inspetorias, para ele:

as Delegacias de Saúde, compreendendo cada uma três inspetorias sanitárias

e que, localizadas em diversos pontos da cidade, vieram facilitar sobremodo o

trabalho de profilaxia das doenças transmissíveis e de polícia sanitária,

substituindo as primitivas 18 inspetorias que funcionavam simultaneamente no

mesmo prédio da antiga Diretoria Geral.109

108

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026, maço

14, ano 1925 – 1929. 109

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de

1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.

53

De acordo a nova legislação, as Delegacias, além de atenderem a três distritos

sanitários cada uma, deveriam estar espalhadas geograficamente pela cidade, de modo que os

serviços por elas oferecidos pudessem acontecer de maneira mais eficaz e abrangente.

Se pensarmos que antes a estrutura estava localizada em um só lugar, podemos dizer

que a rede do atendimento sanitário se diversificou. Quando existiam 18 inspetorias, todas

ficavam instaladas em um mesmo prédio, dificultando o acesso da Diretoria Geral de Saúde

Pública à população e da população até as inspetorias. Com as Delegacias, esses profissionais

puderam ficar em locais diferentes facilitando o atendimento.

O mapa 2 mostra de que maneira essas Delegacias foram instaladas geograficamente

em Salvador. 110

O quadro 7 apresenta como estavam organizados os cargos e funções das

cinco Delegacias de saúde de Salvador no momento da sua criação.

110

Para a construção desse mapa, seguimos as informações de Mário Augusto da Silva Santos no que diz

respeito aos nomes e à quantidade de Distritos. Utilizamos como referência o mapa atual de Salvador, uma vez

que as mudanças dos limites foram pequenas. Para fazermos a divisão, foi preciso analisar os endereços de cada

Delegacia de Saúde e as ruas que os distritos atendiam, conforme foi publicado no Diário Oficial. A utilização de

um mapa da década de 1940 (SILVA, M. E. N. da, 1998, p. 49), também serviu como norteador para o período

aqui tratado. Acreditamos que o resultado apresentado é próximo da divisão da época, uma vez que não

encontramos mapas datados de 1920. Essa foi a melhor maneira que encontramos para mostrar a distribuição

geográfica das Delegacias de Saúde entre os Distritos Centrais e Periféricos.

54

Mapa 2

55

Quadro 7 – Organização das Delegacias de Saúde no momento da sua criação

Fonte:BAHIA, Diário Oficial do Estado da Bahia, domingo, 30 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado da Bahia. Salvador, 1925.

1º Delegacia

Sede 1º Delegado 1º Inspetor 2º Inspetor 3º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos

Instituto Osvaldo

Cruz - Canela

Menandro dos Reis

Meirelles Filho

Eduardo Diniz

Gonçalves

Walfredo de Mendonça Francisco Vieira

Campello

Fernando de Moraes

Studart

Walter Pinto de Almeida

2º Delegacia

Sede 2º Delegado 4º Inspetor 5º Inspetor 6º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos

Edifício da

Assistência

Pública

Dionysio da Silva Lima

Pereira

Alvaro Conde Lemos Guilherme Gama de

Araújo Ramos

Virgílio de Carvalho Raymundo Leopoldo

Ribeiro da Silva

Manoel da Silva Lima

Pereira

3º Delegacia

Sede 3º Delegado 7º Inspetor 8º Inspetor 9º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos

Desinfectório Alvaro da França Rocha Eutychio da Paz Bahia José Maria Monteiro de

Almeida

Almir Aranha de

Almeida Braga

Edgard Frederico

Tourinho

Pedro de Campos Nogueira

4º Delegacia

Sede 4º Delegado 10º Inspetor 11º Inspetor 12º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos

Posto Pacifico

Pereira à Rua das

Sete Portas

Mario Andrea dos Santos Pedro Ribeiro Mariane

Bittencourt

Oswaldo Duarte Ferreira Euxuperio da Silva

Braga

Luiz Machado Almir de Sá Cardoso de

Oliveira

5º Delegacia

Sede 5º Delegado 13º Inspetor 14º Inspetor 15º Inspetor Inspetor Vacinador Verificador de óbitos

À Rua de Roma nº

294

Januário Cyrillo da Silva

Telles

ClinioAntonio Zacharias

de Jesus

Américo Duarte Ferreira Raul Vasco da Gama Flávio Ferreira Vianna

Bandeira

Carlos Chiacchio

56

A matéria do jornal Diário de Notícias, de 17 de janeiro de 1926 (Figura 3),111

fez uma rápida reflexão sobre como o Código Sanitário era utilizado na Bahia. Segundo

informou, locais como cinemas e igrejas não seguiam a legislação. Ao falar das

Delegacias de Saúde, o periódico tentou convencer a população da importância que tais

órgãos tinham para o combate às moléstias em Salvador, na década de 1920. O artigo

aparece em uma matéria de capa, com grande destaque, além de trazer a imagem dos

prédios ligados à Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública.

Figura 3 - Apelo ao Subsecretário

Fonte: Diário de Notícias, 17 jun.1926,

Ao comparar o Quadro 6 que apresenta o nome dos Inspetores Sanitários em

agosto de 1925, quando as Delegacias não haviam sido fundadas, com o Quadro 7 que

mostra os funcionários das Delegacias, percebemos que onze dos dezoito Inspetores

continuaram no serviço sanitário. Alguns como Inspetores e outros passaram a ser

Delegados.

111

“Medidas Sanitárias de que a Bahia precisa: um apelo ao Sub Secretário da Saúde Pública”. Diário de

Notícias, Salvador, 17 jan. 1926, p. 1

57

Apesar das disputas políticas, muitos que permaneceram em cargos importantes

ligados à saúde pública da Bahia destacaram-se nas suas áreas de atuação. Como

exemplos, podem ser citados os médicos Mario Andrea dos Santos e Menandro dos

Reis Meirelles.

Mario Andrea dos Santos nasceu no Estado do Amazonas em 1884 e faleceu em

1960. Formou-se na Faculdade de Medicina da Bahia em 1910 na 96ª turma e foi

Professor Catedrático dessa instituição, responsável pela cadeira de Anatomia

Patológica /Histologia. Ocupou o cargo de 14ª Inspetor Sanitário e a partir de 1925 com

a criação das Delegacias de Saúde tornou-se o 4º Delgado. Em 1923, publicou o livro

intitulado “Patologia geral”. Segundo Christiane Maria Cruz de Souza, quando a Gripe

espanhola se espalhou pela Bahia ele analisou vários exames para entender melhor a

doença e o que ela causava nos doentes. 112

Menandro dos Reis Meirelles Filho nasceu em Salvador em 1876 e faleceu na

mesma cidade em 1947. Formou-se em Medicina pela Faculdade de medicina da Bahia,

em 1898, na 82ª turma. Foi diretor interino do Hospital de isolamento de Mont’Serrat

inclusive em um momento importante, durante uma das reformas. Dentre os vários

cargos ligados à medicina, dirigiu a maternidade Climério de Oliveira entre os anos de

1914 e 1925.113

Ele esteve à frente da 1ª Inspetoria e, quando as inspetorias foram

extintas e surgiram as Delegacias de Saúde, tornou-se o 1° Delegado da 1ª Delegacia de

Saúde.

Os médicos responsáveis pelas Delegacias escreveram relatórios periódicos nos

quais abordaram os serviços realizados e as dificuldades enfrentadas. As condições de

moradia da população eram referidas como um dos problemas que mais prejudicavam o

trabalho das Delegacias de Saúde. Por outro lado, além das condições precárias das

habitações muitas delas eram sublocadas, servindo a mais de uma família, o que

atrapalhava ainda mais as ações dos profissionais envolvidos.

Outros problemas eram apontados pelos delegados como merecendo atenção, a

exemplo do número insuficiente de Delegacias. Os relatórios da 5ª Delegacia de Saúde,

com sede na rua de Roma, por exemplo, indicaram que a região Suburbana necessitava

de mais Delegacias. O médico Januário Telles, Delegado de Saúde, fez queixas em

112

JACOBINA, Ronaldo Ribeiro. Memória histórica do bicentenário da Faculdade de Medicina da

Bahia (2008):Os Professores encantados, a visibilidade dos Servidores e o protagonismo dos Estudantes

da FAMEB. Salvador: Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA, 2013. 3 v. p. 64-65 113

JACOBINA. Memória histórica do bicentenário da Faculdade de Medicina da Bahia (2008), p. 32-

33.

58

relação à quantidade de pacientes que precisavam dos cuidados daquele órgão, o que

inviabilizava o trabalho dos inspetores. No relatório enviado a Barros Barreto,

Subsecretário de Saúde e Assistência Pública, ele levantou a possibilidade de criar uma

nova unidade na região suburbana, pois as que lá existiam estavam sobrecarregadas:

Insisto no alvitre que tomei a liberdade de apontar-vos no meu ultimo

relatório e que seria a criação de uma Delegacia de Saúde Suburbana ou um

Centro de saúde, com sede em Plataforma, e que resolveria o problema do

saneamento daquela zona vastíssima e populosa, e que seria eficiente barreira

e que se oporia a uma possível incursão, na Capital, de algum surto de

moléstia epidêmica que por lá venha aparecer.114

É possível perceber que Januário Telles estava preocupado com a possibilidade

de ocorrência de algum surto epidêmico naquela região, uma vez que as pessoas viviam

em péssimas condições de higiene. Além disso, se ocorresse uma contaminação em

massa, o restante da cidade também corria o risco de ser atingido. Existia uma grande

preocupação em “sanear”, para não “espalhar”. Era preciso muito cuidado, pois não

adiantava pôr fim ao vírus em uma determinada região e outra permanecer vulnerável.

Para ele, era necessário criar uma “barreira” que impedisse a proliferação das

doenças.115

Gilberto Hochman chama a atenção para o problema da transmissibilidade das

doenças. Segundo ele, a defesa contra o contágio e a produção de condições salubres

enfrentaram problemas de cooperação e de ação coletiva.116

Eram questões que

precisavam ser resolvidas por expor as fronteiras e, no caso aqui analisado, as fronteiras

da própria cidade.

Os serviços prestados pelas Delegacias de Saúde enfrentaram sérios problemas,

desde a falta de fichas para fazer a catalogação das visitas, à falta de opção de moradia

para a população pobre. Segundo os Delegados, as inspeções não podiam ser rigorosas,

pois as pessoas eram obrigadas a recorrer a domicílios insalubres, a exemplo daqueles

localizados nos distritos da Sé e Conceição da Praia. Foi o que afirmou Mário Andrea

dos Santos, da 4ª Delegacia de Saúde, no relatório enviado a Barros Barreto:

(...) esta Delegacia a que luta mais intensamente com a ignorância e

deficiência de recursos, por que nela residem as classes mais pobres,

114

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB Caixa 4026,

maço 14, ano 1925/1929. 115

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB Caixa 4026,

maço 14, ano 1925/1929. 116

HOCHMAN. A era do saneamento, p. 39.

59

sem instrução, incapazes de qualquer medida higiênica individual que

se torna mais eficiente a campanha sanitária.

(...)

Não se poderá em certas zonas, exigir esgotos nem forças, por quanto

a falta de coletor geral e a quase ausência d’água, que apenas dá para

as necessidades orgânicas captada em poços torna impossível tais

medidas.

(...)

além disto as zonas extensas onde predominam as casas sopapo, de

palha, feitas até de folhas de latas velhas, de propriedade dos próprios

moradores que vivem quase na indigência, mal podendo conseguir o

alimento para a família.117

As reclamações e questionamentos partiam de várias regiões. Para alguns

médicos, era necessário sanear primeiro a região para só então fiscalizar corretamente as

habitações. Segundo relatos, era muito difícil seguir as regras relacionadas às

habitações, com ruas sem esgoto, água e outros serviços essenciais para o saneamento

da região. Para Mario Andrea,

(...) Só após o saneamento dos campos insalubres, que os há na 4ª

Delegacia, tais como na baixa do Cabula, Retiro, Beijú, etc, com as

obras de hidrografia sanitária varrendo o paludismo que mais persegue

às essas zonas, é que poderá estender com maior justeza a campanha

saneadora às habitações pobres.118

Atender às noções básicas de higiene na década de 1920, momento em que

mudanças sanitárias estavam ocorrendo, era difícil. Um dos questionamentos dos

Delegados de Saúde na ocasião das vistorias era que a maioria das casas não seguia o

Código Sanitário. Ainda assim, era preciso permitir que as famílias permanecessem

naqueles locais insalubres, por serem os únicos lugares que elas tinham para viver. Eles

acreditavam que para “sanear” a Bahia era preciso seguir o Código Sanitário, tarefa

nada fácil e nem sempre possível.

117

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,

maço 14, ano 1925/1929. 118

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,

maço 14, ano 1925/1929.

60

A região que compreendia a 3ª Delegacia também estava fora dos padrões de

higiene. No entanto, alguns avanços foram apontados nos relatórios do delegado Álvaro

da França:

O imundo beco do Mateus está hoje transformado em avenida Major

Mateus e nela se vêm prédios modestos, mas perfeitamente habitados

(...)

O proprietário do cinema Olympia já deu início aos melhoramentos

completando a impermeabilização de todo o piso, removendo e

substituindo aparelhos sanitários e etc. (...)119

Na citação, o delegado falou de alguns problemas que começaram a ser

solucionados a partir das ações feitas pela Delegacia sob sua responsabilidade. Porém,

mais adiante, também fez reclamações. Para ele,

Na Baixa dos sapateiros, o Mercado ali situado continua pela sua falta

de higiene e imundície, um dos maiores atentados à saúde pública, por

ventura observados nesta cidade e para ele peço a ação da Inspetoria de

Gêneros Alimentícios tanto que comecem a funcionar os seus

serviços.120

Percebemos que a ideia era criar uma rede de atendimento sanitário. As

Delegacias eram responsáveis por fazer fiscalizações inclusive em locais que

comercializavam alimentos. Nesse momento, o delegado acreditava que a Inspetoria

responsável por alimentos deveria fazer essa fiscalização, uma vez que o mercado

deveria vender exclusivamente produtos de gênero de alimentos.

O único Delegado que fez elogios às novas construções foi o médico Menandro

dos Reis Meirelles Filho, responsável pela 1ª Delegacia, segundo ele:

É com a maior satisfação que observo o desenvolvimento que tem sido

as novas construções no perímetro desta Delegacia, principalmente no

1º Distrito, sendo talvez no momento, onde só tenha construído maior

número de habitações obedecendo as condições de higiene e de

estética.121

119

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,

maço 14, ano 1925/1929. 120

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,

maço 14, ano 1925/1929. 121

APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa 4026,

maço 14, ano 1925/1929.

61

A área citada pelo médico era a Vitória, local para onde as elites migraram e

foram construir seus casarões, como já foi dito na primeira parte desta dissertação.

Talvez por isso, as habitações foram elogiadas pelo delegado. A população que estava

fazendo essas construções era a que tinha dinheiro e podia seguir os novos padrões

exigidos naquele momento.

Apesar dos relatórios das Delegacias de Saúde apresentarem alguns avanços

sobre a situação sanitária de Salvador, essa mesma documentação apontou falhas e

lacunas existentes pois uma grande parcela da população ainda permanecia fora do

“modelo” de higiene, o que dificultava o trabalho dos agentes responsáveis.

Durante os anos de funcionamento desses órgãos foi feita a fiscalização nos

estabelecimentos residenciais e comerciais de Salvador, embora não seja possível

afirmar a abrangência dessa atividade. Fiscalizar apenas não poderia resolver o

problema mesmo porque as antigas Inspetorias já faziam esse trabalho.

Os funcionários das delegacias, por sua vez, queixavam-se da sobrecarga de

trabalho e diziam não conseguir cumprir as normas e regras como deveriam. A

legislação era explícita, no entanto, a melhoria das condições sanitárias e de saúde da

população requeria mudanças nas condições de habitação, de alimentação e de questões

ligadas às condições de vida e de trabalho que só seriam alcançadas mediante

interferência governamental através de políticas sociais.

Talvez por isso, em 1930, quando os Inspetores da 4ª Delegacia de Saúde

fizeram o trabalho de fiscalização habitacional ainda encontraram um grande número de

residências apresentando antigos problemas de higiene. Muitas delas eram cobertas com

palhas, sem reboco nas paredes e de chão batido (quadro 8). Vale lembrar que nesse

período já haviam passados cinco anos da promulgação do Código Sanitário e nove dos

primeiros acordos com o Governo Federal.

62

Quadro 8 – Tipos de cobertura nas residências da região suburbana em 1930.

Fonte: APEB. Relatórios dos trabalhos executados na 1ª, 3ª, 4ª e 5ª Delegacia de Saúde. APEB. Caixa

4026, maço 14, ano 1925/1929

Com base nas informações do quadro 8, podemos perceber que em duas

localidades (Água Comprida e Muriqueira) a maioria das casas eram cobertas de palha.

Em Praia Grande e Enseada, houve o maior número de casas com telhado. Apenas 2%

delas não possuíam esse tipo de cobertura. Mesmo em Periperi, onde 320 das 509 casas

fiscalizadas possuíam cobertura de telha, o número das que não tinham era expressivo,

pois 37% do total de casas verificadas ainda eram cobertas com palhas.

Em 1927, as Delegacias de Saúde passaram a denominar-se Centros de Saúde,

através da lei nº 1.993 de 20 de julho de 1927, que transformou a Subsecretaria de

Saúde e Assistência Pública em Secretaria de Saúde e Assistência Pública.122

Segundo o

artigo 3º desta lei, os dispositivos do Código Sanitário relativos às Delegacias seriam

aplicados aos Centros.123

No entanto, embora tenha havido essa mudança no texto da

lei, elas continuaram sendo referidas como Delegacias, porém em processo de transição

que se iniciou em 1928 e foi até 1930. No relatório de 1930, Barros Barreto falou dessa

mudança e chamou as Delegacias de saúde de primitivas para justificar a mudança para

Centros de Saúde, Para ele

Até o presente apenas duas das primitivas Delegacias a título de ensaio,

foram transformadas em Centros de Saúde. Os benefícios consequentes

a essa experiência, pelas facilidades proporcionadas á difusão dos

preceitos de higiene individual e coletiva, as oportunidades de favorecer

a população pobre da Cidade, assistência médica e dentária

principalmente no que se refere ao tratamento da sífilis e doenças

venéreas, verminoses, paludismo, consultas de higiene infantil e

122

Cabe ressaltar que em 1927 já funcionava um Centro de Saúde junto ao Hospital de Isolamento de

Mont’Serrat. Ver: APEB. Relatório dos principais fatos ocorridos no Hospital de Isolamento de Mont’

Serrat. APEB. Caixa 4026, maço14, ano 1927/1929. 123

BAHIA. Lei 1.993, de 20 de Julho de 1927. Cria a Secretaria de Saúde e assistência Pública em

substituição a Subsecretaria de Saúde e Assistência Pública, Salvador, 1927.

REGIÃO TIPO DE COBERTURA TOTAL DE RESIDENCIAS

TELHA PALHA

Quant. % Quant. %

Água Comprida 39 42 53 58 92

Muriqueira 19 17 90 83 109

Periperi 320 63 189 37 509

Praia Grande e Enseada 147 98 3 2 150

63

maternal, de otorrinolaringologia, exames gratuitos dos tuberculosos,

etc. autoriza-nos a preconizar, após dois anos de funcionamento, a

metamosrfose das atuais Delegacias em centros de saúde, onde sejam

executados os seguintes serviços: educação sanitária, polícia das

habitações, inspeção de empregados domésticos, epidemiologia e

profilaxia das doenças de notificação compulsória, higiene pré-natal,

infantil e mental, imunização preventiva (anti-variolica, anti-typhica,

anti-meningitica e etc), tratamento da sífilis, doenças venéreas,

paludismo e verminoses, exames para diagnóstico da tuberculose,

assistência dentária e consultas de afecções de garganta, nariz e

ouvidos.

Com esse objetivo diligencia esta Secretaria no sentido de adaptar as 2ª,

3ª e 4ª Delegacias (...) em Centros de Saúde.124

Os dois centros que já estavam instalados em 1929 eram o 1º Centro de Sáude,

localizado na Calçada, oriundo da 1ª Delegacia de saúde que funcionava no bairro do

Canela, no distrito de Vitória, e o 2º Centro de Saúde que funcionava no Hospital de

isolamento de Mont’Serrat. Naquele momento, deixou de existir a 5ª Delegacia de

saúde, situada na Rua de Roma.

As Delegacias de Saúde foram importantes apesar do pouco tempo de

existência. Quando foram implantadas, elas ampliaram os serviços das Inspetorias e ao

serem instaladas em diferentes pontos da cidade permitiram um maior acesso da

população necessitada, chegando a lugares distantes onde antes não havia serviços

sanitários.

Em 1931, a lei 7.337 de 27 de março estabeleceu que os serviços de saúde em

Salvador seriam prestados a partir de três Centros Sanitários e cada um deles abrangeria

quatro distritos sanitários. Assim foram extintas as Delegacias de Saúde que ainda

funcionavam.125

124

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano

de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1930. 125

BAHIA, Lei 7.337 de 27 de março de 1931. Reorganiza os atuais serviços de saúde pública e modifica

a legislação sanitária em vigor.

64

O HOSPITAL DE ISOLAMENTO DE MONT’SERRAT

O Hospital de Isolamento de Mont’Serrat (HIMS) foi fundado em 1853, em uma

casa afastada do centro da cidade do Salvador, localizada na Ponte de Mont’Serrat. Seu

principal objetivo era cuidar das pessoas que chegavam à capital da Bahia em

embarcações de diversos lugares, infectadas pela febre amarela, embora desde a sua

criação ele tenha também atendido os atingidos por outras doenças epidêmicas que

periodicamente assolavam o estado.126

Dessa maneira, a instituição ficava aberta apenas

alguns meses durante o ano e quando os surtos eram contidos, dispensava os

funcionários e fechava as portas. Com o passar dos anos, o HIMS vivenciou diversas

modificações. Além de reformas físicas para aumentar sua capacidade, mudou também

sua política de atendimento, passando a funcionar o ano inteiro. O objetivo era evitar

que as doenças contaminassem outras pessoas na cidade de Salvador.127

As construções

precárias do século XIX, quando o HIMS foi fundado, não atendiam às necessidades

surgidas no início do século XX.

Christiane Souza aborda essa etapa do Isolamento e as reformas e ampliações

iniciadas, em 1911, pelo então governador João Ferreira de Araújo Pinho (1908-1911).

Além de comprar novos terrenos, o governador contratou a empresa Guinle e Cia para

fazer o serviço. A ideia era construir os novos pavilhões seguindo o modelo pavilhonar

do Pasteur Grancher de Paris. Um dos problemas enfrentados na época foi a oposição

do diretor interino do hospital, o médico Menandro Meireles Filho, que não concordava

que o modelo parisiense fosse transplantado para a capital baiana. Mesmo assim, a obra

foi iniciada mas logo em seguida embargada.

A reforma do HIMS foi retomada no governo de Antônio Ferrão Muniz de

Aragão (1916-1920).128

Esse governador, em mensagem à Assembleia Legislativa no

ano de 1918, informou que naquele ano seriam inaugurados cinco novos pavilhões no

Hospital, além de estarem sendo projetados mais dois, seguindo o modelo do hospital

Pasteur de Paris. Ele aproveitou para fazer referência a algumas mudanças sanitárias

126

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A constituição de uma rede de assistência à saúde na Bahia, Brasil,

voltada para o combate das epidemias. In: Dynamis, Granada, vol. 31, n. 1, p. 85-105, 2011, p. 90. 127

FIGUEIREDO, Maria de Fátima Lorenzo. Hospital Couto Maia: Uma Memória Histórica (1853 –

1936) Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências.

Universidade Federal da Bahia, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2010, p 31-55. 128

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A Gripe Espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em

tempos de epidemia. p. 67.

65

que estavam ocorrendo na Bahia. A ideia era centralizar as ações relacionadas às

doenças infectocontagiosas. Nessa perspectiva, o desinfectório do Hospital dos Lázaros

deveria ser anexado ao Isolamento.

Durante estas mudanças o Diretor do Hospital era o médico Augusto de Couto

Maia. Couto Maia nasceu em 12 de janeiro de 1876, em Salvador. Formou-se pela

Faculdade de Medicina da Bahia em 14 de dezembro de 1898, apresentando a tese:

Considerações sobre as polyneurites encaradas à luz da moderna concepção de sistema

nervoso. Foi Diretor do Hospital por mais de trinta anos. Fez carreira como professor

da Faculdade de Medicina da Bahia chegando a Vice-Diretor da Faculdade. Fez vários

cursos inclusive na Europa. Foi homenageado em 1936 ocasião em que Hospital de

Isolamento de Monte Serrat passou a ser Hospital Couto Maia. Faleceu em 28 de

setembro de 1944. 129

O governador Muniz de Aragão deixou registrado seu apreço pelo diretor do

hospital, o médico Augusto de Couto Maia e citou as atividades desenvolvidas. Para ele,

a equipe realizava um trabalho de excelência com as instalações antigas. Como as novas

estavam prestes a ser inauguradas, acreditava que o serviço ganharia ainda mais

qualidade.130

Apesar do Hospital de Mont’ Serrat ter sido construído em período anterior, ele

passou a integrar o conjunto de ações propostas pela reforma da saúde iniciada em 1921

e intensificada, em 1925, com a criação da Subsecretaria de Saúde e de Assistência

Pública e do Código Sanitário. Em função dessa reforma, mudanças relacionadas à

saúde pública na Bahia começaram a acontecer e com elas surgiu a preocupação de

melhorar as instalações do Isolamento.

No relatório que detalha as reformas do hospital, o médico Augusto de Couto

Maia, seu diretor, afirmou que o governador José Joaquim Seabra, em seu primeiro

mandato (1912-1916), tinha como Diretor Geral de Saúde Pública o professor Pinto de

Carvalho e nesse período houve uma tentativa de construir os novos pavilhões do HIMS

ao lado do Instituto Oswaldo Cruz, no Canela, para que na região do Mont’Serrat

permanecesse a hospedaria para imigrantes. Foram longas as negociações para

129

FIGUEIREDO, Maria de Fátima Lorenzo. Hospital Couto Maia: Uma Memória Histórica (1853–1936)

Dissertação (Mestrado), Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências.

Universidade Federal da Bahia, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2010. p.70– 75. 130

BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem. Antônio Moniz Sodré de Aragão. Salvador, 1918.

66

conseguir o terreno no Canela e após algumas tentativas não foi possível tal mudança.

Com isso, a reforma ficou parada durante o primeiro governo de Seabra.131

Contudo, no relatório referente à reforma do Hospital, Couto Maia falava sobre

o que foi feito durante a gestão de Moniz de Aragão. Segundo o médico, apesar de

inaugurar cinco pavilhões não foi possível utilizá-los para os fins que haviam sido

construídos, pois faltava o básico: água, luz, gás e esgoto. Ele relatou também que

haviam sido encomendados materiais clínicos na França, no ano de 1918, mas em

função da Primeira Guerra Mundial o material foi embargado, chegando apenas, em

1920.132

Couto Maia aproveitou para criticar o governo de José Joaquim Seabra (1920 -

1924). Segundo informou,

durante o governo do ExeºSnrº D. J. J. Seabra, de 1920 a 1924 nenhuma

modificação sofreram os pavilhões, a não ser a ruína de um deles, a pequena

fenda nas paredes de outro, a queda da muralha de arrimo e a deterioração

dos demais.133

Ele elogiou a postura do governador Francisco Marques de Góes Calmon (1924-

1928) que logo após assumir o executivo baiano fez visitas ao Isolamento, ficando

perplexo com tamanho descaso. Góes Calmon autorizou então que fosse iniciada mais

uma reforma que resultou na inauguração de várias instalações. Ainda assim alguns

melhoramentos ficaram por fazer.

Em 1925, o hospital foi entregue à sociedade com várias benfeitorias e isso

ocorreu no período em que a Bahia criava novos mecanismos para melhorar a saúde

pública.134

A partir desse momento, o hospital além de ter novos pavilhões inaugurados,

fez parte do conjunto de instituições que compuseram o novo serviço de saúde pública

da Bahia.135

Seguem algumas imagens dos novos pavilhões e instalações do HIMS após a

reforma. Mudanças foram feitas e um novo mobiliário foi comprado, resultando numa

melhor estrutura para atender os pacientes que chegavam ao hospital. A Figura 4 mostra

131

APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.

Caixa 4072, maço 97, 1925. 132

APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.

Caixa 4072, maço 97, ano 1925. 133

APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.

Caixa 4072, maço 97, ano 1925. 134

APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.

Caixa 4072, maço 97, ano 1925. 135

BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945). Salvador: Eduneb, 2017. p.

85.

67

o pavilhão da administração e a figura 5 a enfermaria para variolosos reformada e com

novo mobiliário.

Figura 4 – Pavilhão de Administração

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. 1925.

Figura 5 – Enfermaria para Variolosos

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões.1925.

As imagens acima, presentes no relatório elaborado por Couto Maia mostram o

HIMS no período em que foi reinaugurado. Podemos perceber que foram utilizadas para

68

valorizar as reformas realizadas. São fotografias que registram a instituição de maneira

limpa e organizada. “Uma fotografia preserva um momento no tempo e impede que ele

seja apagado pela sucessão de momentos seguintes”136

. Não foram encontrados registros

fotográficos na medida em ele foi sendo utilizado. Logo, não podemos acompanhar essa

sucessão de momentos, ficando apenas guardadas as imagens da sua inauguração.

Couto Maia, além de apresentar os novos pavilhões do hospital, datados de

1925, denunciou os problemas que vivenciou cotidianamente, ano após ano, à frente

daquele hospital, criticando, portanto, a gestão de J. J. Seabra.

Esse momento foi noticiado pela Imprensa da época. Em 02 de agosto de 1925,

o Diário da Bahia divulgou na primeira página a reinauguração do pavilhão dos

variolosos, como mostra a figura 6.

Figura 6 – Será entregue amanhã à S. P. B. O novo hospital de variolosos

Fonte: Diário da Bahia, 02 ago. 1925. p. 01.

136

BERGUER, John. Para entender uma fotografia. Organização, introdução e notas Geoff Dyer;

tradução Paulo Geier. – 1ª Ed – São Paulo; Companhia das Letras, 2017, p. 90.

69

Entretanto, é necessário ressaltar que a reinauguração aconteceu com pouco

tempo de governo de Góes Calmon, o que não possibilitou a realização de tantas

modificações. Assim, parece válido pensar que muitos governadores investiram no

hospital, apesar da lentidão das reformas. A década de 1920 foi um período de grande

disputa política na Bahia. De um lado estavam os apoiadores de J. J. Seabra e do outro

os defensores de Francisco Marques de Góes Calmon. Essa disputa político-ideológica

pode ser percebida nos discursos das fontes. Ricardo Batista ressalta que, apesar de

muitas ações terem sido desenvolvidas no Governo Góes Calmon, o acordo entre a

União e o governo do estado, para o desenvolvimento de atividades sanitárias na Bahia,

ocorreu pelas mãos de Seabra.137

Embora o Hospital tenha sido reinaugurado em 1925, no Governador Góes

Calmon, ele continuou necessitando de benfeitorias. Em 1930, outra reforma foi

interrompida138

devido à Revolução de 1930.139

Barros Barreto em relatório de 1926 elencou vinte e dois pontos relacionados às

melhorias que deveriam ser feitas no HIMS. Segundo ele, o Hospital ainda necessitava

de:

1º- Fechamento do terreno com cerca de arame em quatro e bons

moirões;

2º - Preparo do parque e acabamento do jardim;

3º - Canalização da água para o parque e para o jardim;

4º - Melhorar as condições do fogão, vedando convenientemente os seus

interstícios;

5º - Instalação de uma terceira fase para melhorar a iluminação;

6º - Instalação de um aparelho de gás para poderem ser utilizados os

aquecedores dos banheiros e os aparelhos dos Laboratórios;

7º - Modificação do elevador;

8º - Terminação do tanque da rua da Imperatriz, sua ligação ao pequeno

e instalação de outra bomba;

9º - Colocação de um flutuador com campa e alarme no tanque da torre;

137

BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e Reforma na Bahia (1920 – 1945), p. 30. 138

APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Monte Serrat. Sobre os novos pavilhões. APEB.

Caixa 4072, maço 97, ano 1925. 139

A Chamada revolução de 1930 foi um movimento que segundo Boris Fausto aconteceu por conta de

disputa entre as oligarquias brasileiras com a presença de movimentos militares. O objetivo era pôr fim à

hegemonia oligárquica cafeeira. Segundo Paulo Santos Silva, a Bahia recebeu o movimento liderado por

Getúlio Vargas com um “Mal-estar”. O estado estava vivendo um momento de estabilidade política e com

a chamada revolução muitos representantes políticos da elite foram retirados do poder. Após algumas

mudanças, Juracy Magalhães, um jovem tenente e cearense, foi colocado no cargo de interventor o que

não agradou os baianos. Ainda assim, ele permaneceu como chefe do governo chegando a ser eleito nas

eleições realizadas em 1933 e 1934. Um dos motivos que o levaram a permanecer no poder foi a sua

aproximação com os coronéis baianos. FAUSTO, Boris. A Revolução de 1930 – História e historiografia.

16ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1997; SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política,

intelectuais e construção do discurso histórico da Bahia (1930 – 1949) Salvador: EDUFBA, 2011.

70

10º - Ampliação da rede de esgoto;

11º - Conclusão das lavanderias de cima e do pavilhão para variolosos,

instalando nelas aparelhos de Genest, as caldeiras, o aparelho para

lavar, o parelho para passar roupa e o fogão;

12º - Construção de um pequeno forno para incineração do lixo, com

chaminé, abertura de entrada superior e passadiço;

13º - Construção de um pequeno bioteiro; canil, coelheira, pombal e

depósito com água, esgoto e iluminação;

14º - Construção de um galpão para três veículos e uma carroça, com

água, esgoto e iluminação;

15º - Construção de uma baia para seis animais, com água, esgoto e

iluminação;

16º - Construção de um galinheiro, parte cimentado, com água, esgoto e

iluminação;

17º - Colocação dos telefones nos pavilhões que ainda não possuem;

18º - Construção de uma estequeira, com oito divisões, tubo de

ventilação e esgoto;

19º - Preparo de uma planta geral do parque e dos edifícios com os

respectivos detalhes;

20º - Planta da canalização de água, esgoto, gás, água da chuva,

corrente elétrica, nas paredes dos edifícios e fora;

21º - Adaptação e reparo geral do pavilhão do alto, de acordo com a

planta apresentada ano passado;

22º - Assentamento da linha de Bondes da Boa Viagem até os diferentes

pavilhões. 140

Nesse documento, o Secretário solicitou desde coisas mais simples, como o

fechamento de terrenos com cerca de arame e a preparação dos jardins, a questões mais

complexas como a conclusão das lavanderias e do pavilhão de variolosos, a reparação

de aparelhos específicos, além de água, esgoto e iluminação. Barros Barreto pediu para

ter acesso às plantas do HIMS, pois elas poderiam ajudar a entender melhor sua

estrutura e refletir sobre o que ainda faltava ser realizado. O acesso dos enfermos e

funcionários ao hospital também era uma preocupação que apareceu no documento,

visto que foi solicitada uma linha de Bonde especifica que ligasse a Boa Viagem aos

pavilhões do hospital.

A 5ª Delegacia de Saúde, que atendia uma parcela pobre da população de

Salvador, tinha o Mont’Serrat como referência para o encaminhamento dos doentes que

não podiam ser tratados em casa. O problema era que essas pessoas viviam em casebres

insalubres, sem as condições básicas de habitação, o que inviabilizava a possibilidade de

140

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano

de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.

71

tratamento na residência e aumentava o número daqueles que seriam levados para o

isolamento.

Em um dos relatórios médicos do Hospital, os profissionais falaram sobre

algumas doenças e sua incidência em regiões pobres e populosas. Estava ocorrendo, por

exemplo, um número grande de pessoas infectadas pela Meningite Cérebro-espinhal

epidêmica. Os médicos diziam que a maioria dos doentes vinha de São João de

Plataforma (distrito suburbano de Pirajá), onde surgiram os primeiros casos e onde,

naquele momento concentrava-se o foco da moléstia. Segundo eles, foi possível conter

os surtos através das ações tomadas pela Saúde Pública.141

Os discursos veiculados principalmente nos relatórios feitos para serem

encaminhados ao Secretário de Saúde e Assistência Pública, apesar de relatarem

diversos problemas, em sua maioria estavam cheios de entusiasmos por parte dos

médicos que os redigiam. Esse entusiasmo era por conta de algumas ações feitas pela

Secretaria de Saúde e Assistência Pública que começavam a atingir seus objetivos. No

relatório que apresenta o movimento do HIMS do ano de 1928, o médico José Pinto

Soares Filho afirmou que a peste pubônica, uma das doenças que assolavam a

população, estava desaparecendo dos boletins sanitários:

Felizmente, graças a intensificação da vacina, a aplicação de outras

medidas sanitárias pela Secretaria de Saúde e Assistência Pública do

Estado pode essa terrível moléstia ser impedida em sua assustadora

marcha, voltando a ficar ausente de nosso boletim sanitário.142

A análise de relatórios médicos do HIMS e de relatórios do Secretário de Saúde

e Assistência Pública indica alguns avanços relacionados à quantidade de pessoas

atendidas e também o tipo de moléstia que chegava ao posto de observação do Hospital.

Nesse local, amostras de sangue eram colhidas e os exames laboratoriais do doente eram

encaminhados ao Instituto Oswaldo Cruz – IOC/BA. Esta instituição enviava o

resultado o mais rápido possível. Caso a suspeita da moléstia fosse confirmada, o doente

era levado para o pavilhão a ela destinado.143

O quadro abaixo foi construído a partir dos relatórios do Hospital de Isolamento,

relativos aos anos de 1924, 1928 e 1929 e dos relatórios da Secretaria de Saúde

141

APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,

maço 14, ano 1927-1929. 142

APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,

maço 14, ano 1927-1929. 143

APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,

maço 14, ano 1927-1929.

72

Assistência Pública, dos anos de 1927. Ele apresenta o número de pacientes que deram

entrada no posto de observação do hospital, nos anos de 1923, 1926, 1927 e 1928, numa

tentativa de perceber até que ponto a inauguração dos pavilhões, a promulgação do

Código Sanitário e a criação das Delegacias de Saúde (as três datadas de 1925)

influenciaram o atendimento do hospital.

DOENÇA 1923 1926 1927 1928 1929

Beriberi 5 3 - - -

Cirrose 1 - - -

Coqueluche - 1 - - -

Dengue 88 - - -

Diarrhéa Infantil - - - -

Dipheteria - 13 4 2 3

Disenteria 6 40 26 1 13

Escarlatina - - 1 -

Febre Amarela 12 19 1 2 5

Febre eruptiva - 1 1 - -

Febre Typhica 1 68 - 20 25

Gripe 1 2 4 - 13

Lepra - - - - 1

MenigiteCerebro-espinhalepidemica - 11 12 44

Meningite por infecção indeterminada - 1 1 - -

Molestia indeterminada - - 141 -

Moléstia venérea - 1 - - -

Paludismo 2 1 1 - -

Parotidite - 1 - -

Peste 7 4 4 40 -

Pneumonia - - - 2

Pneumonia Pestosa - - - - 4

Portadores de Germe (meningocoe) - - - - 10

Raiva - - - - 1

Sarampo 7 42 - - 31

Tétano - 1 - 3 4

Tipho - 18 - 3

Tuberculose Pulmonar - 1 - - 1

Varicella 5 9 47 - 12

Varíola 5 148 10 - 5

TOTAL 140 355 132 223 180 Quadro 9 – Dados de pacientes que deram entrada no Posto de Observação do HIMS

Fonte: APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa

4026, maço 14, ano 1927-1929. APEB. Relatório das ocorrências do Hospital de Isolamento de Mont’

Serrat. APEB. Caixa 4072, maço 97, ano 1924. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da

Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno

de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório

da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929.

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno

de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1930.

73

Ao analisar os números acima, algumas informações nos chamam a atenção. A

primeira é que quatorze das vinte e duas moléstias que aparecem tiveram diminuição à

medida que os anos foram passando. São elas: beriberi, cirrose, dengue, diarréia infantil,

escarlatina, febre Amarela, febre eruptiva, meningite por infecção indeterminada,

paludismo, parotidite, pneumonia, sarampo, tétano e a typho. Algumas inclusive

chegaram a desaparecer dos boletins médicos do HIMS. Ou seja, uma redução de

dezoito moléstias ao longo dos anos analisados. A redução da febre amarela contou a

intervenção da Fundação Rockfeller. Adriano Arruda Pontes refere que a primeira

missão Rockfeller chegou à Bahia, em 1919. Como resultado dessa visita, foi assinado

em 1920 um contrato com o governo do estado da Bahia para o combate da

ancilostomose. A partir de 1923, as campanhas contra a febre amarela passaram a ser

organizadas pela Fundação, quando foi criada a Comissão de Febre Amarela.144

Quatro doenças aumentaram ao longo desses anos: dipheteria, febre typhica,

peste e tétano. Muitos fatores podem justificar a diminuição ou o aumento das

moléstias. No que diz respeito à peste, o crescimento significativo dos casos, em 1928,

que passaram de 4 em 1927 a 40 ano seguinte, por exemplo, ocorreu em função da

epidemia que atingiu a cidade do Salvador mais uma vez nesse ano.145

Foram

imunizadas 964 (novecentos e sessenta e quatro) pessoas através das Delegacias de

Saúde. Os jornais diziam que a cidade estava sendo assolada pela doença. Durante todos

os meses do ano, notas sobre ela apareciam quase sempre na primeira página. Para os

articulistas, a culpa estava no trabalho do Secretário da Saúde Pública Barros Barreto.

Os títulos das matérias eram construídos para chamar a atenção do leitor, como por

exemplo “A ronda fatal e macabra da Bubônica”146

ou ainda “Enquanto a Bubônica

dizima”147

. Como já foi dito no parte 1 desta dissertação, os jornais tinham

posicionamentos políticos partidários e as matérias eram escritas numa tentativa de

enaltecer um grupo político em detrimento do outro, mas, no quadro 09, o ano em que a

peste bubônica mais aparece é exatamente em 1928, com 40 casos. Em 1929, a doença

desaparece dos Boletins médicos.

144

PONTES, Adriano Arruda. Caçando Mosquitos na Bahia: a Rockefeller e o combate à febre amarela:

inserção, ação e reação popular (1918 – 1940). Mestrado em História. Salvador, UFBA, 2007, p. 60-92. 145

CHAVES, Cleide de Lima; AMORIM, Tatiane Pereira. A peste bubônica nos sertões da Bahia:

política e cotidiano no raiar do século XX. In: SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da; BATISTA, Ricardo

dos Santos (organizadores). História e Saúde: políticas, assistência, doenças e instituições. Salvador:

EDUNEB, 2018 (no prelo). 146

“A ronda fatal e macabra da Bubônica”. Diário da Bahia, Salvador, 18 fev. 1928, p.1. 147

“Enquanto a Bubônica dizima”. Diário da Bahia, Salvador, 01 mar. 1928, p.1.

74

Ainda sobre o quadro 09, se tomarmos a varíola como exemplo, em 1923 houve

cinco casos e nos anos seguintes dez cada um. Em 1928 ela desapareceu dos boletins,

voltando, em 1929, com 5 casos. Segundo o diretor do Hospital, esse desaparecimento

se deu por causa do trabalho feito pela Secretaria de Saúde e Assistência Pública.148

Ao

verificar os números de vacinação, é possível perceber que houve um aumento ao longo

dos anos. Em 1925, foram vacinados contra a varíola 1.924 (um mil novecentos e vinte

e quatro) pessoas em Salvador.149

Dois anos depois, esse número saltou para 258.166

(duzentos e cinquenta e oito mil e cento e sessenta e seis) pessoas vacinadas contra a

varíola.150

As vacinações eram feitas em conjunto. As vacinas eram aplicadas por vários

órgãos e isso permitiu a melhora do atendimento sanitário de Salvador. Muitas

campanhas também foram feitas numa tentativa de chamar a atenção da população para

a importância da vacina, como mostra a imagem abaixo:

Figura 7 – Vacinai-vos e aos vossos filhos, enquanto é tempo

Fonte: Diário de Notícias, 6 ago. 1928. p 01

O trabalho das Delegacias de saúde pode ter contribuído para diminuir o fluxo

de doentes nos hospitais da capital. Os funcionários das Delegacias tinham como

148

APEB. Relatório das principais ocorrências no Hospital de Isolamento de Mont’ Serrat. Caixa 4026,

maço 14, ano 1927-1929. 149

BAHIA. Diário Oficial do Estado da Bahia, sábado, 1 de agosto de 1925. Arquivo Público do Estado

da Bahia. Salvador, 1925. 150

BAHIA. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Arquivo Público Municipal.

Salvador, 1928.

75

obrigação observar doentes em seus domicílios. Em muitos casos, esses pacientes eram

tratados em casa sem que houvesse necessidade de internamento hospitalar. Em 1926,

3.168 (três mil cento e sessenta e oito) pessoas foram observadas em casa pelos

funcionários das cinco delegacias.151

No ano seguinte, esse número chegou a 15.708

(quinze mil setecentos e oito) pacientes observados pelos funcionários das cinco

delegacias.152

Percebemos que na medida em que os anos foram passando, houve uma

tentativa de investimento na melhoria dos serviços de saúde da capital, embora tenham

sido insuficiente para dar conta dos problemas sanitários e de saúde da população.

Cabe destacar a ligação entre o Hospital de Isolamento de Mont’Serrat, as

Delegacias de Saúde e o Instituto Oswaldo Cruz (IOC-BA). O Hospital recebia doentes

notificados pelas Delegacias e o IOC era responsável por fazer exames de materiais

coletados nos pacientes das Delegacias, do Isolamento e de outras unidades

hospitalares. O IOC-BA incumbia-se também da distribuição das vacinas que os

Inspetores Vacinadores aplicavam na população.

E A POPULAÇÃO? QUEM UTILIZAVA ESSES SERVIÇOS DE SAÚDE NA

DÉCADA DE 1920?

Os relatórios de Barros Barreto apresentam informações sobre esses serviços. O

quadro 10 permite observar o trabalho feito pelas Delegacias de Saúde, principalmente

no que diz respeito à “polícia Sanitária”, nos anos de 1926, 1927, 1928 e 1929. Dentre

os trabalhos realizados, escolhemos as visitas feitas em residências e em edifícios que

abrigavam estabelecimentos comerciais. Além disso, serão apresentados os números das

notificações por moléstias infectocontagiosas e a quantidade de enfermos que foram

observados em suas residências.

151

BAHIA. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Arquivo Público Municipal.

Salvador, 1927. 152

BAHIA. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública. Arquivo Público Municipal.

Salvador, 1928.

76

DELEGACIA

ANO Visitas a residências

e edifícios

Notificação de

moléstias contagiosas

Enfermos observados

em casa

1926

4.926 143 300

2ª 5.061 121 5.886

3ª 4.637 88 2.099

4ª 4.891 324 921

5ª 5.037 126 4.846

TOTAL 24.552 802 14.052

DELEGACIA ANO Visitas a residências

e edifícios

Notificação de

moléstias contagiosas

Enfermos observados

em casa

1927

2.476 240 109

2ª 2.472 199 1.202

3ª 3.436 529 946

4ª 5.228 204 293

5ª 4.064 207 618

TOTAL 17.376 1.376 3.376

DELEGACIA ANO Visitas a residências

e edifícios

Notificação de

moléstias contagiosas

Enfermos observados

em casa

1928

6.910 493 585

2ª 3.093 213 1.685

3ª 8.491 435 6.217

4ª 2.352 271 4.330

5ª 4.410 27 6.891

TOTAL 25.259 1.139 15.708

DELEGACIA ANO Visitas a residências

e edifícios

Notificação de

moléstias contagiosas

Enfermos observados

em casa

1929

4.870 65 1.125

2ª 3.001 189 963

3ª 4.703 98 432

4ª 3.841 231 825

5ª 4.819 83 632

TOTAL 21.234 657 3.987

Quadro 10 –Atendimento das cinco Delegacias de Saúde em 1926, 1927, 1928 e 1929 construídos a

partir dos relatórios.

Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública:

anno de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, A. L. C. A. de Barros. Relatório da

Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1928.

BARRETO, A. L. C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1928.

Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, A. L. C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de

Saúde e Assistência Pública: anno de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1930.

Na década de 1920, Salvador possuía 283.492 (duzentos e oitenta e três mil,

quatrocentos e noventa e dois) habitantes.153

Comparando a população total com a que

foi atendida nas Delegacias, pode parecer que o número era pequeno. No entanto, o

atendimento mais próximo da população era algo novo e começava a se diversificar,

como vimos ao longo deste capítulo.

Durante os anos de 1926, 1927, 1928 e 1929, o número de enfermos observados

em casa foi 37.123 (trinta e sete mil, cento e vinte e três). O fato das pessoas estarem

sendo tratadas na residência contribuía para a diminuição do atendimento nos hospitais.

153

IBGE. Recenseamento demográfico 1920.

77

Com isso só chegavam às instituições hospitalares os doentes que não podiam

permanecer em tratamento domiciliar e em alguns casos os que ofereciam riscos às

pessoas que estavam ao seu redor.

Além do número de atendidos, os relatórios de Barros Barreto apresentam as

ocupações dos enfermos que chegaram ao HIMS de 1926 a 1929, encaminhados

principalmente pelos Inspetores das Delegacias, como pode ser visto no quadro 11.

Ocupação

Anos Total de

Doenças

1926 1927 1928 1929

Alfaiate - - 2 1 3

Aprendizes de Marinheiro - 20 - 7 27

Agricultores - - 2 5 7

Artista - 1 - - 1

Bacharel 1 - - - 1

Bombeiro 1 - - - 1

Calafate - - - 1 1

Carregador 5 2 11 3 21

Carroceiro - - 2 2 4

Carteiro 1 - - - 1

Charuteiro - - 1 - 1

Chouffeur 1 - 2 - 3

Cocheiro 3 - - - 3

Colegiais - 2 6 6 14

Comerciantes - - 9 - 9

Comercio (empregado) 24 8 17 8 57

Condutor - - 1 - 1

Condutor de Bond/Motoreiro - - 1 2 3

Copeiro - - 4 5 9

Costureira 1 - 2 1 4

Cozinheiro - - 5 5 10

Empregado de Estábulo - - 1 - 1

Enfermeiro - - 1 3 4

Engenheiro - - 1 - 1

Engomadeira - - 1 - 1

Estivador - - 2 - 2

Estudante 4 1 2 9 16

Ferreiro - - - 1 1

Ferroviário - 8 - - 8

Foguista 5 - - 3 8

Funcionário das Docas - - - 1 1

Funcionário Federal - 1 - 1

Funcionário Público - - 1 4 5

Garimpeiro 2 7 6 11 26

Guarda Noturno 1 - - - 1

Guarda Sanitários - - 1 - 1

Hoteleiro - - - 1 1

Jardineiro 2 - 1 - 3

Lavadeira - - 2 - 2

Lavrador - 7 - 6 13

Maquinista - - 1 1 2

Marceneiro - - 2 - 2

Marinheiro 5 - - 2 7

Marítimo - 4 - 5 9

Mecânico 2 - - - 2

Médico 1 - 1 - 2

Militar 115 9 12 2 138

Motorista - 1 - - 1

Negociante - - - 7 7

78

Quadro 11 – Dados das profissões dos pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de

Mont’Serrat nos anos 1926, 1927, 1928 e 1929 construídos a partir dos relatórios.

Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência

Pública: ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, Antônio Luis C. A. de

Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do

Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência

Pública: ano de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, Antônio Luis C. A. de

Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do

Estado, 1930.

Algumas ocupações apareceram todos os anos. Chamamos a atenção para os

trabalhadores do comércio, com 57 enfermos, os operários, com 68, os carregadores,

com 21, e os garimpeiros, com 26. As profissões citadas exigiam muito do trabalhador.

Elas eram exercidas por pessoas mal remuneradas e que em consequência disso se

alimentavam mal. Os operários trabalhavam em diversos ramos de produção, sujeitos a

longas jornadas de trabalho em locais mal iluminados e pouco ventilados.155

Os estabelecimentos comerciais de Salvador eram insalubres. Mario Augusto da

Silva Santos chamou a atenção para as condições de trabalho desse setor, embora ele

fosse diversificado, compreendendo desde aqueles voltados para o grande comércio de

importação e exportação, aos de pequeno e médio porte. Os trabalhadores do comércio,

muitas vezes executavam várias funções ao mesmo tempo, “de domingo a domingo” e

dormiam no trabalho.156

Os Jornais noticiavam os problemas existentes. Foi o que aconteceu no “Café

Suíço”, em 1928, ano em que Salvador foi atingida pela epidemia de peste bubônica. O

estabelecimento foi interditado quando um funcionário passou mal e veio a óbito. Todo

154

Observamos uma diferença no número total de pessoas atendidas a cada ano no Hospital de

Isolamento. De acordo com a fonte, no ano de 1925, 355 pessoas foram atendidas. Em 1927, esse número

caiu para 123. Em 1928, houve 190 atendimentos e em 1928, 180 enfermos passaram pelo Hospital.

Porém, quando fizemos essa soma manualmente os números ficam diferentes. Em 1926 foram 354, em

1927 132, em 1928 são 223 e em 1929 aparecem 144 casos. 155

CASTELLUCCI. Industriais e operários numa conjuntura de crise (1914-1921), 2004. 156

SANTOS, Mario Augusto da Silva. Casa e balcão: os caixeiros de Salvador (1890-1930). Salvador:

EDUFBA, 2009, p. 33, 40-41.

Operários 34 15 1 8 58

Polidor - - - 1 1

Quitandeira - - 1 - 1

Roceiro 13 - 7 - 20

Servente 5 - 5 5 12

Serviço Doméstico 80 26 16 22 144

Taifeiro 3 - - 3

Vendedor Ambulante - - 3 - 3

Ignorada/Ignorada/Sem profissão 45 11 55 34 145

Total 355 132 190 180 857154

79

o prédio e mais um local vizinho foram interditados para que fosse feita a desinfecção.

O edifício estava localizado na Praça Castro Alves, centro comercial da cidade.157

Nove dias antes, o mesmo jornal divulgou que um servente da Associação

Comercial da Bahia, faleceu no local de trabalho, vitimado pela peste, sendo retirado do

local às escondidas. Segundo a matéria, a notícia se alastrou e o “Juiz do comércio

suspendeu suas audiências no edifício suspeito”, como podemos ver na chamada da

matéria, figura 8.158

Figura 8 – “Além de tudo, escamoteiador de cadáveres”.

Fonte: Diário da Bahia, 14 fev. 1928, p 01

Há também no quadro 11, referência a 144 pessoas que exerciam serviços

domésticos. Essa informação deve ser tomada com reserva pois não quer dizer que eram

empregados domésticos. A referência a serviços domésticos ocorria também para as

mulheres que não trabalhavam fora de casa.

Os militares aparecem todos os anos no quadro analisado, com um número de

138 enfermos no total. Porém, vale ressaltar que só em 1926 o Hospital recebeu 115

militares necessitando de atendimento, representando 83% do total. Segundo Barros

Barreto, esses homens faziam parte do grupo de militares que estavam em:

... perseguição aos bandos rebeldes de Prestes e Miguel Costa deve ser

atribuído ao aparecimento de casos de varíola e de doentes de

symptomatelogia semelhante a febre amarela. A quase totalidade desses

enfermos provém de municípios baiano, região onde transitaram para

mais de 12.000 soldados legalistas, procedentes do Norte e Sul do país. 159

157

“A Bubônica”. Diário da Bahia, Salvador, 23 fev. 1928, p.1. 158

“Além de tudo, escamoteiador de cadáveres” Diário da Bahia, Salvador, 14 fev. 1928, p.1 159

BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública:

ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927.

80

A partir dessas informações, percebemos que a população pobre foi a que mais

os utilizou. Poucas pessoas com profissões que se pode considerar das classes média ou

alta aparecem no quadro 11. Entre elas encontram-se um bacharel, dois médicos, sete

negociantes e nove comerciantes. Podemos supor que aquelas que tinham melhores

condições econômicas preferiram se tratar em casa com o auxílio de médicos

particulares. A maioria dessas doenças era contagiosa podendo atingir também os mais

ricos, ainda que os pobres vivessem em situações bem mais vulneráveis.

Os dados do quadro 12 nos permitem observar de onde vinham esses enfermos.

A maioria era encaminhada pelas Delegacias de Saúde. Dez deles se apresentaram

diretamente na porta do Hospital, além dos 46 que vieram do interior do estado da

Bahia. Houve também 22 doentes que vieram de Alagoas.

Distritos Centrais 1926 1927 1928 1929 Total de pacientes

por Distrito

Conceição da Praia 8 20 24 12 64

Nazaré 24 18 14 18 74

Paço - 2 10 2 14

Pilar 2 3 7 8 20

Santana 7 5 7 15 34

São Pedro 32 2 27 13 74

Sé 18 7 8 19 52

Distritos Periféricos

Brotas 74 2 8 2 86

Mares 31 6 13 6 56

Penha 30 23 6 14 56

Pirajá 11 7 16 29 63

Santo Antônio 43 12 9 - 64

Vitória 20 17 10 5 52

Outras localidades

Apresentaram-se à porta do HIMS 5 - 2 3 10

Transportaram-se de bordo 15 6 5 21 47

Transportaram-se do Interior 35 2 4 5 46

Do Estado de Alagoas - - 20 2 22

Total de pacientes por ano 355 132 190 174 694 Quadro 12 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat nos

anos 1926, 1927, 1928 e 1929 por Distritos construídos a partir dos relatórios.

Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência

Pública: ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, Antônio Luis C. A. de

Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do

Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência

Pública: ano de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, Antônio Luis C. A. de

Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do

Estado, 1930.

81

Apesar do quadro 12 apresentar o Distrito do Pilar como o que levou menos

enfermos ao HIMS, a imprensa questionava o trabalho feito por lá. Segundo o Diário da

Bahia de 03 de fevereiro de 1928, o Pilar estava se tornando o “novo setor de operações

da Peste”, como mostra figura abaixo:

Figura 9 – “A Bubonica em ronda sinistra pela cidade”.

Fonte: Diário da Bahia. 30 fev..1928. p 01

O quadro 12 mostra que no ano de 1928 apenas seis pacientes residentes no

Distrito da Penha foram encaminhados ao HIMS. Um deles foi relatado em matéria do

Diário da Bahia em 28 de março de 1928. De acordo com as informações contidas no

texto, tratava-se da professora Elisabeth Bitencourt, que havia sido infectada pela peste

e encaminhada para o Hospital. Na mesma matéria, eles diziam que outros tinham

contraído a doença e questionava o trabalho do Secretário da Saúde Pública, Barros

Barreto, que naquele momento já estava sendo chamado de “Urubú Princez”. 160

Em matéria do dia 17 de outubro de 1928, o Diário da Bahia relatou que em

alguns locais da cidade havia um grande número de pessoas sendo infectadas toda

semana pela Peste. Segundo o texto, isso acontecia por conta da falta de higiene desses

locais e porque a Saúde Pública não estava cumprindo o papel de fiscalizar e higienizar

a cidade. Na matéria, algumas ruas foram citadas, entre elas a Ladeira da Preguiça, a

Rua do Sodré e a Rua do Cabeça, todas situadas no centro de Salvador, local que tinha

problemas de higiene e de moradia. O jornalista enfatizava que era o bairro comercial o

que mais necessitava de cuidados.161

160

“Já é caso de Intervenção”. Diário da Bahia, Salvador, 28 mar. 1928, p.1. 161

“Prenúncios alarmantes e inquietadores”. Diário da Bahia, Salvador, 17 out. 1928 , p.1.

82

Em relação ao sexo e à cor das pessoas atendidas nesse mesmo período, o

quadro 13 mostra os números.

Sexo 1926 1927 1928 1929

Homens 264 101 138 127

Mulheres 91 31 52 53

Cor/Raça

Brancos 88 32 73 75

Mestiços 194 71 88 73

Negros 75 29 29 32

Nacionalidade

Brasileira 342 128 174 150

Estrangeira 13 4 16 21

Quadro 13 – Quantidade de pacientes atendidos no Hospital de Isolamento de Mont’Serrat nos

anos 1926, 1927, 1928 e 1929 separados por sexo e cor/raça construídos a partir dos relatórios.

Fonte: BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência

Pública: ano de 1926. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1927. BARRETO, Antônio Luis C. A. de

Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1927. Bahia, Imprensa Oficial do

Estado, 1928. BARRETO, Antônio Luis C. A. de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência

Pública: ano de 1928. Bahia, Imprensa Oficial do Estado, 1929. BARRETO, Antônio Luis C. A. de

Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: ano de 1929. Bahia, Imprensa Oficial do

Estado, 1930.

Percebemos que a maioria dos pacientes do Hospital era do sexo masculino. Não

acreditamos que as mulheres adoeciam menos do que os homens, mas o acesso a

cuidados e consultas poderia ser mais difícil. De acordo com os quadros 6 e 7, o

atendimento médico de Salvador era feito principalmente por homens. Apesar de

existirem as enfermeiras sanitárias, os médicos estavam presentes nos principais locais

do serviço sanitário. Nos hospitais, postos, inspetorias, eram eles que compunham os

principais cargos do Serviço Sanitário de Salvador e eram eles que examinavam os

pacientes que chegavam às unidades. Talvez isso tenha sido um fator que dificultou que

as mulheres procurassem atendimento nos órgãos de saúde.

Ricardo Batista, ao analisar o atendimento sanitário na década de 1920 e a sífilis,

aborda a diferença entre homens e mulheres. Para ele, as mulheres das elites eram

atendidas em casa por médicos particulares e as mulheres pobres principalmente tinham

dificuldades em frequentar os órgãos de saúde e quando iam preferiam ser atendidas por

enfermeiras. Ele sinaliza a importância das enfermeiras no tratamento da sífilis:

83

As dificuldades na profilaxia e tratamento da sífilis em mulheres nos postos

sanitários ocorriam pela escassez de enfermeiras. Receber cuidados por doença

venérea era considerado um risco, quando o executor dos curativos era um

homem. Temia-se a possibilidade de uma liberdade masculina, sobre o corpo

masculino, como o estabelecimento de um grau de intimidade considerado

imoral, e que poderia macular a reputação feminina. (...).162

Cabe ressaltar que havia também uma perspectiva de classe, pois os homens e as

mulheres dos setores economicamente privilegiados eram atendidos em casa por seus

médicos particulares.

Em relação à cor, os negros e mestiços eram maioria. As pessoas atendidas

nesses serviços eram pobres e moravam em residências precárias, daí terem maior

probabilidade de adoecer.

De acordo com as informações dos quadros 11 e 13 podemos dizer que as

pessoas que utilizavam os serviços públicos de saúde em Salvador na década de

1920 eram, em sua maioria, homens negros e mestiços, brasileiros que

conquistavam seu sustento através de trabalhos pesados, realizados em locais

insalubres, ficando assim expostos às doenças.

162

BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e as relações de gênero na Bahia.. In FRANCO, Sebastião

Pimentel, NASCIMENTO, Dilene Raimundo, SILVEIRA, Anny Jackeline Torres (orgs) Uma História

brasileira das doenças. 1ed. Belo Horizonte – MG. Fino Traço. 2017, p. 124.

84

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procuramos nesta dissertação observar o papel das Delegacias de Saúde e

do Hospital de isolamento de Monte Serrat, no processo de constituição da reforma

sanitária da década de 1920, na Bahia. Esses dois órgãos, embora com objetivos

diferentes, funcionaram de forma integrada, visando “sanear” a cidade à luz dos novos

padrões exigidos pelo Código Sanitário.

Ao surgirem em 1925, as Delegacias de Saúde, através dos seus médicos/

delegados e inspetores, eram encarregadas de fiscalizar e punir. Elas seguiram o

modelo Federal de reforma sanitária, pois junto ao Departamento Nacional de Saúde

Pública (DNSP) foram criadas 10 (dez) delegacias cujo objetivo estava voltado para a

fiscalização e para a profilaxia

Apesar do pouco tempo de existência, as Delegacias ampliaram as ações das

Inspetorias e ao serem instaladas em diferentes pontos da cidade de Salvador

permitiram maior acesso da população necessitada, chegando a lugares distantes onde

antes não havia serviços de saúde.

O Hospital de Isolamento, embora tenha sido construído em período anterior,

passou a integrar o conjunto de ações propostas pela reforma da saúde iniciada em 1921

e intensificada, em 1925, com a criação da Subsecretaria de Saúde e de Assistência

Pública e do Código Sanitário. Ele foi ampliado e reformado para melhor atender à

população que necessitava dos seus serviços. Segundo Barros Barreto, o HIMS recebia

doentes portadores de patologias que poderiam causar um surto epidêmico na

cidade.

As ações desenvolvidas pelas Delegacias de Saúde e pelo Hospital, por sua

vez, não foram isoladas. O que ocorreu foi a tentativa de criação de uma rede de

atendimento, vinculado à Sub-Secretaria de Saúde e Assistência Pública e que

tinha como base o Código Sanitário.

A documentação consultada no que diz respeito às Delegacias de Saúde e ao

Hospital de Isolamento, além de ser esparsa e fragmentada, foi produzida por

aqueles que estavam a eles vinculados, tendo, dessa forma, objetivos específicos.

No entanto, foi possível observar, em alguns momentos, através dos relatórios dos

médios e inspetores, que eles consideravam que muitas doenças eram contraídas por

85

causa das precárias condições de vida da população. Assim, não bastava fiscalizar e

punir. As mudanças urbanas que ocorreram durante o período analisado não foram

suficientes para garantir moradia de qualidade, água potável, saneamento básico e boa

alimentação, questões essenciais para a saúde da população. Os problemas existentes

eram decorrentes das sociedades excludentes e desiguais, atingindo especialmente as

pessoas pobres e negras. Foram estas que mais necessitaram de atendimento, pois a

elite quase nunca o utilizou.

Podemos dizer que a década de 1920 foi um momento significativo na

história da saúde na Bahia. A Reforma Sanitária empreendida nesses anos, apesar

de suas limitações, trouxe mudanças, pois os serviços aumentaram e se

diversificaram.

As Delegacias de Saúde e o Hospital de Isolamento tiveram um papel

importante no processo de reforma, conseguindo contribuir para a articulação do

estado com as políticas sanitárias que estavam sendo implantadas nacionalmente.

Para concluir, a pesquisa realizada na produção desta dissertação, embora

tenha caráter inicial, abre pistas para a ampliação do conhecimento acerca da

Reforma Sanitária na Bahia, tema relevante, porém ainda pouco abordado em

âmbito estadual.

86

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BAHIA, Assembleia Geral Legislativa Mensagem.Francisco Marques de Góes Calmon.

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89

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93

ANEXOS

Imagens do Hospital de Isolamento de Mont’Serrat após a reforma.

Pavilhão para Pensionistas

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos

pavilhões.

Vista dos Pavilhões

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões

94

Quarto para Pensionistas

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões

Enfermaria para indigentes

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões

95

Lavanderia

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões

Pavilhão da Farmácia

Fonte: APEB. Relatórios do Hospital de Isolamento em Mont’Serrat. Sobre os novos pavilhões