cultura e Ética nos negócios: uma investigação sobre a ... · trabalho de geert hofstede mostra...

15
Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a influência da cultura no comportamento ético nos negócios. Autoria: Edmundo Inácio Júnior e Jorge Manuel Vitória Caetano Junior Resumo: O presente artigo apresenta o resultado de uma pesquisa efetuada com alunos de um curso de especialização para executivos e profissionais em administração, sobre a influência da cultura de um país no comportamento ético das pessoas dentro das empresas. De caráter exploratório, a pesquisa indica algumas proposições para a tendência das decisões éticas nas empresas brasileiras. O trabalho aborda o modelo cultural multidimensional de Hofstede, que destaca cinco dimensões culturais: Fuga à Incerteza, Distância do Poder, Individualismo, Masculinidade e Dinamismo Confuciano; e para o estudo das linhas de orientação ética nas empresas o modelo de estruturas éticas competidoras de Robin e Reidenbach, que apresenta as seguintes orientações éticas: Relativismo, Egoísmo, Utilitarismo (teleologia), Deontologia e Justiça. Seguindo os resultados da pesquisa de Hofstede, o Brasil apresenta baixos índices em Individualismo e Masculinidade e elevados índices em Distância do Poder, Fuga à Incerteza e Dinamismo Confuciano. Este trabalho sugere que os resultados da pesquisa de Hofstede ainda são válidos para as dimensões de: Distância do Poder, Fuga à Incerteza, Individualismo e Masculinidade, e que os indivíduos dentro das empresas seguem as orientações éticas baseadas na Justiça, no Relativismo e no Egoísmo. Considerações iniciais Este trabalho é uma investigação sobre as influências da cultura no comportamento ético nos negócios. Ele foi realizado através de uma pesquisa efetuada com uma amostra de alunos de um curso de pós-graduação para executivos. O tema deste trabalho não é, absolutamente, de todo original. Diversos pesquisadores identificaram durante a década passada possíveis influências da cultura de um país no comportamento das pessoas dentro de empresas (Hofstede et al., 1991; Vitell, Nwachukwu e Barnes, 1993; Ralston, Holt et al., 1996), e mais precisamente no que diz respeito à tomada de decisão e comportamento ético nas empresas (Hansen, 1992; Reidenbach e Robin, 1990). Buscando uma definição de cultura que possa ser adotada neste trabalho, será utilizada a definição apresentada por Agrícola Bethlem em seu livro Gestão de Negócios – uma abordagem brasileira: “A cultura se reflete em significados emprestados pelos indivíduos a vários aspectos da vida, tais como a forma de olhar o mundo e a função do indivíduo nele; nos valores do indivíduo (o bom e o mau); e também em crenças coletivas (verdadeiro versus falso) e em expressões artísticas (o bonito e o feio). A cultura e as instituições têm uma relação de feedback positivo. A cultura influi nas instituições, que influem por sua vez na cultura, e assim por diante, levando um dado sistema a uma diferenciação cada vez maior dos demais” (Bethlem, 1999: 16). Alguns trabalhos identificaram possíveis elementos culturais que poderiam ser responsáveis pelo sucesso ou fracasso de empresas em determinados países e sob certas condições econômicas (Hofstede, 1991; Hofstede, 1980 citado por Bethlem, 1999). O Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada de decisões dentro de uma empresa (Hofstede et al., 1991), e o que pode levar as pessoas a 1

Upload: vuongkhuong

Post on 23-Sep-2018

222 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a influência da cultura no comportamento ético nos negócios.

Autoria: Edmundo Inácio Júnior e Jorge Manuel Vitória Caetano Junior Resumo: O presente artigo apresenta o resultado de uma pesquisa efetuada com alunos de um curso de especialização para executivos e profissionais em administração, sobre a influência da cultura de um país no comportamento ético das pessoas dentro das empresas. De caráter exploratório, a pesquisa indica algumas proposições para a tendência das decisões éticas nas empresas brasileiras. O trabalho aborda o modelo cultural multidimensional de Hofstede, que destaca cinco dimensões culturais: Fuga à Incerteza, Distância do Poder, Individualismo, Masculinidade e Dinamismo Confuciano; e para o estudo das linhas de orientação ética nas empresas o modelo de estruturas éticas competidoras de Robin e Reidenbach, que apresenta as seguintes orientações éticas: Relativismo, Egoísmo, Utilitarismo (teleologia), Deontologia e Justiça. Seguindo os resultados da pesquisa de Hofstede, o Brasil apresenta baixos índices em Individualismo e Masculinidade e elevados índices em Distância do Poder, Fuga à Incerteza e Dinamismo Confuciano. Este trabalho sugere que os resultados da pesquisa de Hofstede ainda são válidos para as dimensões de: Distância do Poder, Fuga à Incerteza, Individualismo e Masculinidade, e que os indivíduos dentro das empresas seguem as orientações éticas baseadas na Justiça, no Relativismo e no Egoísmo. Considerações iniciais

Este trabalho é uma investigação sobre as influências da cultura no comportamento ético nos negócios. Ele foi realizado através de uma pesquisa efetuada com uma amostra de alunos de um curso de pós-graduação para executivos. O tema deste trabalho não é, absolutamente, de todo original. Diversos pesquisadores identificaram durante a década passada possíveis influências da cultura de um país no comportamento das pessoas dentro de empresas (Hofstede et al., 1991; Vitell, Nwachukwu e Barnes, 1993; Ralston, Holt et al., 1996), e mais precisamente no que diz respeito à tomada de decisão e comportamento ético nas empresas (Hansen, 1992; Reidenbach e Robin, 1990). Buscando uma definição de cultura que possa ser adotada neste trabalho, será utilizada a definição apresentada por Agrícola Bethlem em seu livro Gestão de Negócios – uma abordagem brasileira:

“A cultura se reflete em significados emprestados pelos indivíduos a vários aspectos da vida, tais como a forma de olhar o mundo e a função do indivíduo nele; nos valores do indivíduo (o bom e o mau); e também em crenças coletivas (verdadeiro versus falso) e em expressões artísticas (o bonito e o feio). A cultura e as instituições têm uma relação de feedback positivo. A cultura influi nas instituições, que influem por sua vez na cultura, e assim por diante, levando um dado sistema a uma diferenciação cada vez maior dos demais” (Bethlem, 1999: 16).

Alguns trabalhos identificaram possíveis elementos culturais que poderiam ser responsáveis pelo sucesso ou fracasso de empresas em determinados países e sob certas condições econômicas (Hofstede, 1991; Hofstede, 1980 citado por Bethlem, 1999). O Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada de decisões dentro de uma empresa (Hofstede et al., 1991), e o que pode levar as pessoas a

1

Page 2: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

um comportamento ético distinto, segundo outros pesquisadores (Reidenbach e Robin, 1990; Vitell, Nwachukwu e Barnes, 1993). Este fenômeno cultural pode explicar a adoção de diferentes critérios de gestão e ética para empresas multinacionais, e a compreensão do comportamento dos gestores de empresas globais. Por outro lado, não estamos falando aqui de modelos ou trabalhos totalmente definitivos, ou que contenham todas as evidências comprovadas sobre este fato cultural. Ainda que se possa encontrar um vasto número de trabalhos sobre este tema, não se encontra, ao contrário, pesquisas empíricas em grande número para se comprovar todas as influências da cultura no comportamento ético nos negócios. E mesmo os resultados de pesquisas empíricas desta categoria estão sujeitos a mudanças ao longo do tempo, tratando mais uma vez de evidenciar a necessidade de uma observação constante sobre este tema. Assim, o objetivo desta pesquisa é retomar o trabalho de investigação sobre a cultura e o comportamento ético nos negócios a partir do modelo cultural multidimensional de Hofstede (Hofstede et al., 1991), e sobre as estruturas de comportamento ético e tomada de decisão ética na empresa, de Reidenbach, Robin e outros autores (Reidenbach e Robin, 1988 e 1990; Hansen, 1992; Cohen, Pant e Sharp, 1993). As conclusões e os resultados deste trabalho foram obtidos através da aplicação de um questionário que segue o mesmo modelo adotado pelos autores acima citados, e que representa a opinião sobre o comportamento ético e cultural de executivos participantes de um programa de pós-graduação para profissionais executivos em administração. Atenhamo-nos, por enquanto, a examinar mais detalhadamente o modelo cultural multidimensional de Hofstede e em seqüência o modelo de comportamento e tomada de decisão ética de Reidenbach, para mais adiante abordarmos os procedimentos da pesquisa aplicada e seus resultados. O modelo cultural multidimensional de Hofstede

No final da década de 60 e início da década de 70, Geert Hofstede e seu grupo de pesquisadores desenvolveram um vasto estudo sobre as diferenças culturais existentes entre mais de 70 países. Eles buscavam compreender como estas diferenças culturais em países distintos poderiam influenciar o trabalho nas empresas e na gestão administrativa, e identificar diferenças competitivas entre nações que poderiam estar presentes nos valores culturais de um país (Hofstede et al., 1991). O trabalho de Hofstede foi conduzido pelo ILO (Intenational Labour Office) de Genebra, e teve a colaboração da IBM (International Business Machines), uma grande empresa multinacional que até então estava presente em 67 países. Em seu livro “Conseqüências da Cultura” (Culture’s Consequences) (Hofstede, 1980 citado por Bethlem, 1999) Hofstede mostra os resultados de sua pesquisa conduzida por psicólogos nas subsidiárias da empresa para um total de 72.215 funcionários. Hofstede sugere primeiramente quatro dimensões para se medir os valores culturais que podem afetar a forma como a cultura influencia o comportamento, são elas: Distância do Poder, Fuga à Incerteza, Individualidade e Masculinidade. Mais adiante ele identificou uma quinta dimensão, o Dinamismo Confuciano (ou orientação em longo prazo/curto prazo), que poderia explicar o sucesso das nações orientais como a China e o Japão (Hofstede et al., 1991). Estas cinco dimensões descritas por Hofstede vem sendo testadas e aplicadas, a partir de então, por vários pesquisadores em todo o mundo. Várias são as pesquisas que apontam uma validade positiva na adoção destas cinco dimensões para se estudar a cultura, e referenciá-las aos mais diversos aspectos da administração nas empresas. Vitell, Nwachukwu e Barnes (1993), em seu artigo The Effects of Culture on Ethical Decison-Making: an application of Hoftede’s typology, apresentam uma proposta para se testar a validade do

2

Page 3: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

modelo de Hofstede ao avaliar a influência da cultura na tomada de decisão ética. Hofstede, Franke e Bond (1991) no artigo “Cultural Roots of Economic Performance: a research note”, apontam a validade de seu modelo, em três diferentes pesquisas, para se explicar uma performance econômica de um país baseando-se na cultura. Também os pesquisadores Beekun e Stedham (1999), em seu artigo The Effects of Culture on Business Ethics: a cross-cultural, comparative investigation, propõe a adoção do modelo de Hofstede para a aplicação no contexto de comportamento ético. Mais recentemente, Beekun, Stedham et al. (2000) apresentam no artigo Business Ethics in Brazil and the U.S.: a comparative investigation, uma comparação entre duas pesquisas realizadas, uma no Brasil (que é o objeto deste trabalho) e outra nos EUA, utilizando o modelo cultural multidimensional de Hofstede. Abordemos, então, estas cinco dimensões: Distância do Poder: é “o quanto membros menos poderosos de instituições e organizações aceitam que o poder seja distribuído desigualmente”. (Hofstede, 1980 citado por Beekun, Stedham et al., 2000). Em países com alta distância do poder encontram-se pessoas que consentem sem questionar às ordens daqueles com maior autoridade. Distância do poder “pode ser vista como o endosso da sociedade à desigualdade, e o seu inverso como a expectativa de uma relativa igualdade nas organizações e instituições” (Hofstede et al., 1991). Em países com elevada distância do poder, as empresas tendem a ser mais centralizadas, e verifica-se uma obediência rigorosa entre as pessoas. Em contra partida, empresas em países com baixa distância do poder valorizam menos a supervisão, e há menores desigualdades no poder. Fuga à Incerteza: “aponta um sentimento de desconforto em situações desestruturadas ou incomuns, enquanto seu inverso mostra tolerância a circunstâncias novas ou ambíguas” (Hofstede et al., 1991). A Fuga à Incerteza nos diz “o quanto pessoas se sentem ameaçadas por situações ambíguas, e tem criado crenças e instituições que tentam evitá-las” (Hofstede, 1980 citado por Beekun, Stedham et al., 2000). Culturas que apresentam alta fuga à incerteza necessitam de elevada segurança, tendem a ser agressivas, e possuem alta crença nos técnicos e em seus conhecimentos. “Neste ambiente, indivíduos tentam evitar situações imprevisíveis, desestruturadas e incertas adotando códigos estritos de comportamento” (Vitell et al., 1993). Já culturas com baixa fuga à incerteza aceitam melhor o risco e tendem a ser menos agressivas. Esta dimensão também aponta o grau de adoção e aceitação que uma cultura tem a regras escritas. Individualismo: “descreve a tendência que as pessoas tem em se preocuparem apenas com seus próprios e imediatos interesses familiares” (Hofstede, 1980 citado por Beekun, Stedham et al., 2000). “Individualismo é a tendência de indivíduos em primeiramente cuidarem de si próprios e de seus familiares imediatos, e seu inverso é a integração de pessoas em grupos coesos” (Hofstede et al., 1991). Esta dimensão descreve a extensão entre o individualismo e o coletivismo, que está para a tendência de pessoas em grupo cuidarem uns aos outros, protegendo os interesses de todos os membros. O coletivismo mostra um senso de lealdade para com o grupo, e o indivíduo está entre seu próprio individualismo e sua fidelidade ao grupo. Masculinidade: “é uma orientação à afirmação ou competição, bem como uma distinção de papéis sexuais, e o seu inverso é uma atitude mais modesta e cuidadosa para com outros.” (Hofstede et al., 1991). Assim, nesta dimensão encontra-se a masculinidade em um extremo, “a situação em que os valores dominantes da sociedade são sucesso, dinheiro e bens materiais” (Hofstede, 1980 citado por Beekun, Stedham et al., 2000), e a feminilidade em outro, onde a Feminilidade pode ser descrita como “a cultura onde pessoas se preocupam com outras pessoas e com a qualidade de vida” (Hofstede, 1980 citado por

3

Page 4: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Beekun, Stedham et al., 2000). Assim culturas mais masculinas esperam que homens sejam mais ambiciosos e competitivos, e que a tarefa das mulheres seja a de servir àqueles mais fracos e que precisem de ajuda. Desta forma, favorece-se o crescimento econômico, em contraposição às culturas mais femininas, onde o local de trabalho é menos estressante, a sobreposições de papéis sociais entre os sexos é favorecida, a cooperação e segurança no emprego são mais valorizados. Em culturas mais femininas as decisões nas empresas são mais centradas no grupo. Dinamismo Confuciano: “é uma aceitação da legitimidade da hierarquia e da valorização da perseverança e economia, tudo sem a indevida ênfase na tradição e nas obrigações sociais que poderiam impedir iniciativa nos negócios”. (Hofstede et al., 1991). Segundo Beekun e Stedham (1999), “Culturas com elevado dinamismo Confuciano, ou orientação de logo prazo, possuem grande interesse no futuro e enfatizam a moderação e a persistência. Sociedades assim consideram como as ações atuais podem influenciar as gerações futuras.” Em culturas mais orientadas em longo prazo, as empresas tomam uma visão maior e mais longa em seus investimentos. Elas não precisam mostrar lucratividade imediata, mas sim uma evolução em direção ao objetivo de longo prazo. O Japão e a China são países que se mostram com alto índice de dinamismo confuciano.

“Em países com baixo dinamismo Confuciano, ou orientação de curto prazo, valores são voltados ao passado e ao presente. Existe respeito por tradições e a satisfação das obrigações é uma preocupação, mas o aqui e agora é mais importante. Empresas em culturas orientadas em curto prazo, como os EUA, focam em resultados de lucratividade trimestrais e anuais” (Beekun, Stedham et al., 2000).

Estruturas Éticas nas Decisões de Negócios

Em poucas palavras, pode-se definir ética como sendo: “os padrões morais não influenciados pela lei que focam nas conseqüências das ações humanas” (Francesco e Gold, 1998 citados por Beekun, Stedham et al., 2000). Mas saber o que é ético para um, para outro ou para todos é um problema filosófico que a muito vem sendo discutido. É correto afirmar que o comportamento ético, ou a tomada de decisão ética, implica em um comportamento que não está baseado apenas em leis formais. Um indivíduo através de uma ação legalmente válida para a sociedade pode gerar um benefício para si em detrimento do benefício de outro. Entre tantas correntes filosóficas que buscam um significado para a ética, e principalmente no que se refere ao comportamento ético nos negócios, Reidenbach e Robin (1988) identificaram cinco principais linhas filosóficas, e as isolaram em um modelo para estudá-las. Este modelo de análise sobre o comportamento ético nos negócios foi posteriormente replicado e validado pelos resultados de pesquisas subseqüentes, realizadas pelos próprios autores (Reidenbach e Robin, 1990) e posteriormente por Hansen (1992), Cohen, Pant e Sharp (1993). As correntes filosóficas identificadas por Reidenbach e Robin (1988) são: Relativismo, Egoísmo, Utilitarismo (teleologia), Deontologia e Justiça. Estas cinco dimensões do modelo de Reidenbach e Robin não aparecem isoladas, independentes umas das outras. Nas pesquisas de Hansen (1992) e Cohen, Pant e Sharp (1993) elas mostram estar presentes, todas ao mesmo tempo, no conteúdo ético de um comportamento ou uma decisão ética. São estruturas éticas que competem entre si, nos valores morais e comportamentais de alto nível que determinam o comportamento ético na tomada de decisão. Tratemos agora de estudá-las mais detalhadamente:

4

Page 5: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Relativismo: segundo Reidenbach e Robin (1990) “O conceito básico de relativismo é o de que todas as crenças normativas são uma função da cultura ou do indivíduo, portanto, nenhuma regra universal para ética pode se aplicar a todos”. Assim, nenhum critério único e universal pode ser usado para determinar quando uma ação é ou não ética. Este conceito ainda se estende para uma generalização maior sobre a cultura, onde regras éticas que definem o comportamento e os valores de uma pessoa em uma cultura não necessariamente os definem em outra cultura (Reidenbach e Robin, 1990). Para o estudo da ética nos negócios, usa-se, em maior profundidade, o aspecto individual desta teoria ética, baseando-se no fato de existirem diferenças pessoais entre indivíduos, ou entre indivíduos e a sociedade. Sobre a questão cultural, pode-se citar um exemplo usado por Reidenbach e Robin (1990) para ilustrar este fato:

“Muitos administradores usam na justiça, como uma defesa contra um suposto comportamento não ético em ambientes internacionais, as diferenças culturais existentes nos métodos de negócios. La mordida ou baksheesh – suborno ou comissão ilegal – são dois comportamentos culturalmente aceitos em alguns países. Especificamente, esta justificação foi usada pela Boeing na defesa de suas ações no Japão”.

Beekun, Stedham et al. (2000) definem:

“Esta abordagem para a ética é egoísta; foca somente o indivíduo e exclui qualquer interação com ou para o exterior. Cada pessoa usa seu próprio critério, e este critério pode variar de cultura para cultura. O caráter ético de diferentes comportamentos e valores sociais são julgados dentro do próprio contexto cultural específico (Weiss, 1994)”.

Egoísmo: esta corrente ética está para as teorias que medem a moralidade das coisas nas conseqüências das ações. Assim, o egoísmo mostra que o indivíduo orienta suas decisões para que as conseqüências estejam a seu favor. O único padrão válido para o comportamento de uma pessoa é a sua obrigação por avançar a si mesmo acima de qualquer outro (Beauchamp e Bowie, 1997 citado por Beekun, Stedham et al., 2000). Beekun, Stedham et al. (2000) ainda complementam:

“Autopromoção se torna o único objetivo recompensador. Nada é devido aos outros ou a organização em que trabalha. Aqueles que se conformam com esta abordagem ética acreditam intensamente que todos os esforços altruísticos de outros são na verdade atos para promoverem a si mesmos”.

Utilitarismo: assim como no egoísmo, no utilitarismo o comportamento ético também é avaliado pelas conseqüências que ele causa. Só que para o utilitarismo o que importa é se o resultado deste comportamento beneficia o maior número de pessoas possíveis para uma sociedade. Citando Reidenbach e Robin (1990):

“Ele força os atores a considerarem todos os resultados de suas

ações ou inações e a balancearem uma contra a outra para determinar qual é a melhor para a sociedade. (...) Que é, uma ação menos eficiente tende a produzir menos utilidade que uma ação mais eficiente, e portanto menos ética.”

5

Page 6: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Ainda para Beekun, Stedham et al. (2000), sobre o utilitarismo:

“Uma ação é ética se resulta no melhor benefício ou no bem para o maior número de pessoas. Ainda, o utilitarismo é altamente centrado nos resultados, mas não diz quem determina o que é o bem para o número máximo de pessoas. Será ele riqueza, prazer, ou saúde? Simultaneamente, direitos e responsabilidades individuais são ignoradas em favor dos direitos e responsabilidades coletivos”.

Deontologia: esta corrente ética refere-se às ações, ou obrigações, específicas dos indivíduos. Ela sugere que as pessoas baseiam suas atitude em obrigações para com a sociedade e com as outras pessoas, satisfazendo suas exigências legais. A deontologia se preocupa com a justiça que está na ação ou no comportamento. Segundo Beekun, Stedham et al. (2000):

“Esta teoria ética postula que a moral digna de uma ação não pode ser julgada apenas por seu resultado porque resultados são relativamente nebulosos no momento em que a pessoa decide agir. Ao invés, a deontologia propõe que a intenção da pessoa tomando a decisão ou executando a ação deverá fornecer a base para a avaliação da moral digna de uma ação. A suposição é a de que boas intenções vão em geral resultar em bons resultados. Ainda, esta abordagem supõe que o que é moralmente correto para mim deve ser moralmente correto para outros”.

Justiça: em seu trabalho, Reidenbach e Robin (1990) sugerem que esta corrente abrange muitas linhas filosóficas individuais, mas ponderam sobre a justiça, muito antes definida por Aristóteles em “O Princípio da Justiça Formal”. A justiça prega em uma distribuição igualitária de benefícios para todos, e que todos devem ser tratados de forma igual. Embora a justiça assim pareça universal, não é simples definir que critérios serão escolhidos para que se possa saber o que é igual para todos, ou como um benefício pode ser distribuído igualmente a todos. Esta é a chamada justiça distributiva, e é muito utilizada atualmente para a discussão ética nos negócios. No trabalho de Beekun, Stedham et al. (2000):

“Para ser considerada ética, esta abordagem sugere que

decisões ou ações deverão assegurar uma distribuição eqüitativa de ganho, benefícios e encargos. Ela sugere que diversos princípios para assegurar esta distribuição adequada de benefícios e encargos (Shaw, 1991). Por exemplo: • Para cada um uma parte igual. Quando uma empresa distribui seus

bônus anuais, cada parte elegível deverá receber uma porção igual a todas as outras partes elegíveis.

• Para cada um de acordo com a necessidade individual. Recursos deverão ser distribuídos para cada indivíduo ou departamento de acordo com o nível de necessidade que eles passam.

• Para cada um de acordo com o esforço individual. Em tudo sendo igual, empregados deverão receber aumentos ou cortes de salários em proporção direta ao seu nível de esforço. Apenas o mérito

6

Page 7: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

interessa e nenhuma outra consideração deverá ser levada em conta”.

Cultura e Ética nos Negócios

Até agora nos atemos a estudar os modelos que fundamentam este trabalho. Foram identificadas as principais características da cultura, que se evidenciam nas empresas e nos negócios, e as principais correntes filosóficas que delimitam o comportamento ético dos indivíduos nas empresas. A seguir veremos uma comparação estreita entre resultados encontrados por Hofstede, no que diz respeito à posição cultural do Brasil nas dimensões de seu modelo, e o que se espera encontrar na aplicação do modelo de Reidenbach e Robin (1990). A característica exploratória deste trabalho permite que o tema seja abordado apresentando brevemente algumas implicações sobre que orientações no comportamento ético podem ser determinadas pela cultura, e mais adiante verificando se os resultados da pesquisa apontam para essas hipóteses. Abaixo, no Quadro 1, encontram-se os resultados apresentados por Hofstede (1980 citado por Beekun, Stedham et al., 2000) para o Brasil nas cinco dimensões culturais encontradas por ele:

Quadro 1 – As Dimensões Culturais de Hofstede para o Brasil em uma escala de 0 a 100 pontos.

Dimensões da Cultura Pontuação Distância do Poder 69

Fuga à Incerteza 76 Individualismo / Coletivismo 38 Masculinidade / Feminilidade 49

Dinamismo Confuciano 65 A pontuação acima indica que o Brasil possui elevada Distância do Poder e alta Fuga a Incerteza. A alta pontuação na dimensão do Dinamismo Confuciano apresenta uma relativa orientação do Brasil a uma visão de longo prazo. Já a dimensão do Individualismo/Coletivismo mostra que o Brasil é um país eminentemente voltado ao Coletivismo. A tabela ainda mostra uma tendência à Feminilidade – vale lembrar que a média da escala de Hofstede é de 50 pontos, e o Brasil estaria muito próximo ao equilíbrio nesta escala. As implicações da cultura no comportamento ético podem ser identificadas relacionando-se as dimensões de Hofstede (1980 citado por Beekun, Stedham et al., 2000) com as dimensões do modelo ético de Reidenbach e Robin (1990), como sugeriu Vitell et al. (1993) ao relacionar a Deontologia e o Utilitarismo (Teleologia) com as dimensões culturais de Individualismo e Fuga à Incerteza. O Quadro 2, a seguir, mostra as proposições sugeridas por Beekun, Stedham et al. (2000) para esta relação entre os dois modelos:

Quadro 2 – As Dimensões Culturais e Orientações Éticas para o Brasil. Dimensão Cultural Nível da Dimensão Orientação Ética Distância do Poder ALTO Egoísmo

Fuga à Incerteza ALTO Relativismo e Egoísmo1 Individualismo BAIXO Justiça Masculinidade BAIXO Justiça

Dinamismo Confuciano ALTO Utilitarismo2 Analisemos as relações entre os dois modelos, caso a caso:

7

Page 8: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Alta distância do Poder: um elevado índice nesta dimensão demonstra que as pessoas dentro das empresas tendem a obedecer cegamente às ordens de seus superiores, evitando fugir as regras por eles impostas, e a seguir suas decisões considerando-as um comportamento mais próximo do ético. No caso do Brasil, espera-se que superiores possam agir de forma autoritária e centralizada, tomando suas decisões a partir do modelo de ético do Egoísmo.

“Similarmente, baixa distância do poder implica em decisões avaliadas em respeito às conseqüências relacionadas à maximização de benefícios para todos. Portanto, baixa distância do poder pode estar associada a uma orientação ética Utilitariana” (Beekun, Stedham et al., 2000).

Assim, em países com baixa distância do poder, as pessoas não associariam as decisões éticas aos seus superiores, mas sim em função dos benefícios para o grupo. Ainda, um indivíduo se retrataria moralmente aos componentes de seu grupo quando tomar uma decisão. Alta Fuga à Incerteza: espera-se que as pessoas mantenham-se dentro das regras já estabelecidas pela empresa, e sob as condições que se apresentam. Indivíduos mostram-se menos ambiciosos e não estão dispostos a enfrentar os riscos que a situação em que se encontram oferece. O critério ético para a tomada de decisão, neste caso estaria relacionado a Deontologia, diferentemente de países com baixa fuga a incerteza, que estariam relacionados ao Relativismo e Egoísmo. As pessoas estariam mais preocupadas com as intenções das ações, que levam as conseqüências, do que exatamente ao seu próprio benefício. Baixo Individualismo: em países com elevado individualismo, as pessoas tendem a tomar suas decisões em seu benefício próprio, uma vez que estas pessoas estão pouco preocupadas com os interesses dos outros, e a seguirem a corrente ética do Egoísmo. No Brasil, com o baixo índice na dimensão do Individualismo, espera-se que as pessoas baseiam suas decisões na linha ética da Justiça distributiva, e possivelmente do Utilitarismo. Os indivíduos estariam mais orientados ao Coletivismo, e mais preocupados com o benefício maior para todos. Baixa Masculinidade: esta dimensão está para o grau de ambição material dos indivíduos e em um país com alta Masculinidade, as pessoas estariam propensas a tomar decisões não éticas. Por outro lado, alta Masculinidade implicaria em critérios éticos baseados no Utilitarismo, pois tende a um comportamento que prioriza conquistas e lucratividade. No Brasil, o índice não indica propriamente uma tendência forte à Masculinidade ou à Feminilidade, mas mostra que está longe de ser um país totalmente masculino. Assim, a característica próxima à Feminina, que indica qualidade de vida e bem estar, mostra uma tendência para pessoas estarem orientando suas decisões éticas à Justiça distributiva, preocupando-se com a distribuição igualitária do bem social. Alto Dinamismo Confuciano: esta dimensão aproxima o comportamento das pessoas nas empresas a uma atitude de longo prazo. Em um país com baixo Dinamismo Confuciano, as decisões éticas estariam baseadas no Utilitarismo. Esta orientação ao Utilitarismo é demonstrada, em países com baixo índice nesta escala, a uma preocupação nas atitudes de curto prazo sobre o benefício imediato consecutivo à tomada de decisão, e a quem elas podem afetar. No caso do Brasil, com alto Dinamismo Confuciano, a orientação não estaria para o Utilitarismo, uma vez que o Dinamismo Confuciano também indica uma tendência a manutenção das tradições e das obrigações sociais, mas estaria para a Deontologia e para a Justiça.

8

Page 9: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Os Procedimentos da Pesquisa

Amostragem

A população compreendia os alunos do curso de Pós-Graduação para profissionais e executivos na área de administração de uma universidade de Maringá, no Paraná, que compreendia 80 pessoas. Para o cálculo da amostra fez-se necessário realizarmos um teste piloto com alguns estudantes, composta de uma amostra aleatória, para estimarmos o valor de s (desvio-padrão da amostra). Conforme afirma SLIVER (2000) para estudos nas áreas sociais costuma-se utilizar valores de Z (nível de confiança) de 95%. Tomamos e (erro amostral) de 0.5 porque consideramos que intervalos de +/- 0,5 na média dos valores para cada característica ética encontrados forneceriam uma clara definição da tendência adotada. O Quadro 3 abaixo revela que uma amostra de 22 estudantes seria o suficiente.

Quadro 03 - Determinação do Tamanho da Amostra

2225,0

224,1296,12

22≅

×=

×=

e

sZn

Para a pesquisa foram enviados 80 questionários dos quais obtivemos retorno de trinta e quatro respondentes, satisfazendo, assim o critério. Os dados foram coletados através de um questionário impresso que foi distribuído diretamente aos respondentes. A pesquisa consiste em sete cenários de negócios baseados no instrumento de pesquisa modificado de Reidenbach e Robin (1988). Os respondentes avaliaram cada um dos sete cenários em quinze diferentes critérios, utilizando uma escala de sete pontos de Likert. Cada critério permite considerar os fatores que os respondentes usaram para avaliar as situações éticas. Questionário

Reidenbach e Robin (1988) desenvolveram e testaram um instrumento de pesquisa que contém múltiplos critérios para se avaliar, ao mesmo tempo, as correntes éticas do Relativismo, Egoísmo, Utilitarismo (teleologia), Deontologia e Justiça. Este instrumento inclui um conjunto de escalas que tem mostrado validade e confiabilidade no estudo do comportamento ético, sendo que por este motivo não iremos realizar testes de validade e confiabilidade do instrumento utilizado. Uma cópia do questionário entregue aos respondentes consta no Anexo 1 deste artigo. No questionário poderão ser observados os cenários utilizados na pesquisa e a escala de critério utilizada pelos respondentes para avaliar cada uma das ações adota nos cenários. Abaixo, o Quadro 4 relaciona a dimensão de cada critério com linha ética correspondente:

Quadro 4 – Orientações Éticas e a escala de sete pontos de Likert Orientação Ética Itens da Escala (escala de sete pontos de Likert)

Justiça Justa / Injusta Imparcial / Parcial

Relativismo Culturalmente aceitável / Culturalmente inaceitável Individualmente aceitável / Individualmente inaceitável Tradicionalmente aceitável / Tradicionalmente inaceitável Aceitável em minha família / Inaceitável em minha família

Egoísmo É Autopromoção / Não é Autopromoção É um sacrifício pessoal / Não é um sacrifício pessoal

9

Page 10: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

É pessoalmente satisfatório / Não é pessoalmente satisfatório Utilitarismo Maximiza a utilidade / Minimiza a utilidade

Maximiza benefícios e minimiza os danos / Minimiza benefícios e maximiza os danos Leva ao maior bem para a maioria / Leva ao menor bem para a maioria

Deontologia Viola um contrato não escrito / Não viola um contrato não escrito Obrigado a agir desta maneira / Não obrigado a agir desta maneira Viola uma promessa não falada / Não viola uma promessa não falada

Análise dos Dados

Foi utilizada estatística descritiva simples para a análise dos dados, através das médias aritméticas obtidas na pontuação de cada critério. Os resultados obtidos estão apresentados na Tabela 4 e separados de acordo com o cenário correspondente. Cada critério avaliado, para cada cenário, foi classificado de acordo com a linha de orientação ética da qual pertence, e foram obtidas as médias aritméticas correspondentes às orientações éticas. Assim, por exemplo, a pontuação dada para a Justiça no Cenário 1 é a média das médias das respostas para os critérios “Justo/Injusto” e “Parcial/Imparcial” do questionário. Foram utilizadas apenas as respostas completas dos questionários para cada cenário, sendo descartados os questionários que não continham respostas completas para aquele cenário, ou seja, que não possuíam todas as respostas para os critérios que completassem a média daquela orientação ética para aquele cenário. Também foi elaborado um agregado geral com a média das respostas dos critérios para as orientações éticas em todos os cenários. Resultados da Pesquisa

Os resultados obtidos estão listados na Quadro 5, logo abaixo. Quanto maior for a pontuação em cada cenário menos éticas foram avaliadas às decisões tomadas. Assim, quanto maior for a pontuação obtida na orientação ética correspondente, mais os respondentes utilizaram esta orientação para avaliar o cenário, e logo maior é a ênfase nela:

Quadro 5 – Resultados obtidos na Pesquisa Orientações

Éticas Freq Méd D.P. Freq Méd D.P. Freq Méd D.P. Freq Méd D.P.

Cenário N.1 Cenário N.2 Cenário N.3 Cenário N.4 Relativismo 34 4,29 1,51 34 4,48 1,84 33 4,02 1,81 33 5,32 2,14 Egoísmo 34 4,65 0,96 34 4,38 1,15 32 4,34 1,20 33 4,76 1,34 Deontologia 33 4,40 1,43 33 3,91 1,28 33 4,64 1,47 32 3,91 1,56 Justiça 34 4,72 1,75 34 4,88 2,11 33 4,12 1,89 33 5,46 2,25 Utilitarismo 34 4,25 1,57 32 3,65 1,79 33 4,08 1,68 33 4,36 1,91 Cenário N.5 Cenário N.6 Cenário N.7 Todos os Cenários Relativismo 34 6,02 1,33 33 6,36 1,00 33 5,52 1,20 33 5,14 1,78 Egoísmo 33 5,73 1,29 32 5,17 1,32 33 4,48 1,20 31 4,78 1,28 Deontologia 34 3,29 1,06 33 3,66 1,24 33 3,79 1,10 31 3,94 1,36

10

Page 11: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Justiça 34 6,62 0,89 32 6,52 1,06 33 5,54 1,34 32 5,46 1,87 Utilitarismo 33 5,91 1,45 33 5,92 1,29 33 5,30 1,55 31 4,78 1,81

A partir do cenário total foi construído o intervalo de confiança – IC de cada característica ética, sendo que a maioria dos cenários ficou dentro deste IC (95%), conforme Quadro 06. Desta maneira, nossas afirmações a seguir, serão tomadas com relação ao cenário total. O agregado de todos os cenários mostra que o Relativismo e a Justiça foram as orientações éticas que, na média, receberam maior pontuação. Ainda no agregado de todos os cenários, a Deontologia foi a orientação ética que menor pontuação recebeu. O Egoísmo e o Utilitarismo tiveram praticamente a mesma pontuação.

Quadro 06 – Intervalo de Confiança (95%) para cada cenário

Intervalo de Confiança C1 C2 C3 C4 C5 C6 C7 Relativismo +/- 0,69 4,45 5,83 4,29 4,48 4,02 5,32 6,02 6,36 5,52 Egoísmo +/- 0,52 4,26 5,30 4,65 4,38 4,34 4,76 5,73 5,17 4,48 Deontologia +/- 0,55 3,39 4,49 4,40 3,91 4,64 3,91 3,29 3,66 3,79 Justiça +/- 0,74 4,72 6,20 4,72 4,88 4,12 5,46 6,62 6,52 5,54 Utilitarismo +/- 0,73 4,05 5,51 4,25 3,65 4,08 4,36 5,91 5,92 5,30 Obs: os valores em negrito indicam valor fora do IC.

Nos cenários 1, 2 e 3 a pontuação média de todas as orientações éticas foram muito próximas, diferentemente dos outros cenários. Isto pode indicar que os respondentes não estavam familiarizados com as situações apresentadas. Já nos cenários restantes, 4, 5, 6, e 7, as situações parecem ser mais conhecidas pelos respondentes. Conclusão

Retomemos as proposições efetuadas no começo do trabalho referente aos possíveis resultados da pesquisa quanto à influência da cultura no comportamento ético. Esperava-se que: 1) a elevada Distância do Poder, verificada por Hofstede, tendesse à orientação ética do Egoísmo; 2) a elevada Fuga à Incerteza e o elevado Dinamismo Confuciano levasse o Brasil a uma orientação ética Deontológica; 3) o Baixo Individualismo tendesse à Justiça e possivelmente ao Utilitarismo e 4) o baixo índice em Masculinidade tendesse também à Justiça. A pesquisa apontou que a orientação ética de maior pontuação foi a Justiça distributiva, como esperado. As dimensões culturais de Hofstede (1980 citado por Beekun, Stedham et al.,2000) que influenciam diretamente são a baixa Masculinidade e o baixo Individualismo, e foram exatamente as dimensões que menor pontuação receberam na pesquisa de Hofstede. Uma orientação ética baseada na Justiça distributiva implica em padrões de comportamento fundamentados no coletivo e no grupo, e os indivíduos preocupam-se com o bem estar social e distribuição igualitária de benefícios nas empresas. A Justiça ainda aponta para a necessidade de se estudar a proporção de benefícios, encargos, responsabilidades e tarefas atribuídas para os indivíduos nas empresas. Um desequilíbrio nesta relação pode levar indivíduos a comportamentos não éticos. Reidenbach e Robin (1990) ainda apontam que diferentes países assumem critérios diferentes para a Justiça, e isso implicaria em significativas diferenças de comportamentos éticos entre indivíduos em países com elevada orientação à Justiça distributiva.

11

Page 12: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Em segundo lugar está a orientação ética do Relativismo, e em terceiro o Egoísmo. Diferentemente do que se esperava, uma orientação ética à Deontologia, a ênfase no Relativismo e no Egoísmo mostram que os respondentes utilizaram valores e elementos culturais mais distantes da Fuga à Incerteza. Aparentemente a Fuga à Incerteza não apresentou influência significativa para os respondentes, como apontou Hofstede para o Brasil. O Egoísmo também apresenta um índice menor à Distância do Poder apontado por Hofstede. Uma orientação ao Relativismo indica uma preocupação maior dos indivíduos com suas próprias idéias e valores. Isto mostra uma tendência ao Individualismo. Semelhante ao Relativismo, o Egoísmo aponta também uma tendência à dimensão cultural do Individualismo. Indivíduos que seguem a orientação ética do Relativismo nas empresas recebem maior influência dos valores e da cultura local. O trabalho de Hofstede (1980 citado por Beekun, Stedham et al., 2000) pode ser considerado o maior trabalho de avaliação de padrões de comportamento cultural dentro das empresas já efetuado em dezenas de países. Entretanto, foi um trabalho realizado a vinte anos. Esta limitação cronológica não é de todo significativa, pois a cultura de um país não muda de forma tão acelerada, e em especial quando se refere a ela dentro das empresas. Mas, por outro lado, nota-se, pela pesquisa aqui realizada, que a pontuação para algumas das dimensões avaliadas por Hofstede, para o Brasil, sofreram modificações ao longo desses vinte anos. A Deontologia, ou orientação em longo prazo, foi a que menos relevância recebeu pelos respondentes. Isto não quer dizer que ela não influencie nas outras linhas de orientação ética, mas diretamente ela deixou de ser importante, dando lugar ao Egoísmo e ao Relativismo. Uma ênfase maior no Egoísmo e no Relativismo mostra uma evolução do Individualismo no país, conseqüência de um possível avanço no padrão econômico do Brasil. Os baixos índices apontados por Hofstede no Individualismo e na Masculinidade dizem que o Brasil ainda está longe de ser um país culturalmente individualista. O Individualismo e a Masculinidade são características de países economicamente mais fortes, onde a distribuição da renda acontece de forma mais igualitária. Os resultados da pesquisa efetuada por Beekun, Stedham et al. (2000) apontam exatamente esta característica para os E.U.A. em comparação com o Brasil. O Coletivismo Brasileiro pode ser resultado de uma distribuição desigual da renda, bem como um elevado índice de Fuga à Incerteza, onde os indivíduos dependem do auxílio do grupo e de outras pessoas para elevarem seu padrão de renda. Foi verificado ainda que, a partir dos resultados da pesquisa, alguns cenários não continham descrições familiares aos respondentes, e portanto, estes cenários podem ter sido incorretamente avaliados. São os cenários de número 1, 2 e 3. Eles descrevem situações da área contábil que parecem ser incomuns no Brasil. Isto mostra que o questionário deve ser modificado ligeiramente nas próximas pesquisas para que os respondentes brasileiros possam compreender adequadamente as situações descritas. Entretanto a pontuação média apresentada por estes cenários não influenciou significativamente o resultado desta pesquisa. Ressalta-se mais uma vez a característica exploratória e investigatória deste trabalho, que apontam a algumas proposições sobre a cultura e ética que futuramente merecerão maior atenção em pesquisas subseqüentes. Nota-se também uma carência brasileira de pesquisas empíricas nesta área, o que ajudaria em muito a fundamentação das hipóteses sobre a influência da cultura na tomada de decisão ética aqui apresentadas. Acreditamos que este trabalho cumpriu os objetivos pelo quais foi proposto, em retomar a pesquisa sobre a ética nos negócios e dar um primeiro passo no sentido de criar um banco de pesquisas empíricas sobre a área. Esperamos que a pesquisa possa servir de parâmetro para executivos e administradores ao avaliar o comportamento ético em suas

12

Page 13: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

empresas, e conseqüentemente, compreender pragmaticamente e profundamente as diferenças culturais e éticas que existem entre indivíduos de empresas de outros países.

Anexo I – Questionário da Pesquisa

Para cada um dos cenários descritos no questionário assinale com um (x) a posição que melhor representa, em sua avaliação, as decisões tomadas em relação aos 15 aspectos mencionados:

Cenário N.º01 - CONTABILIDADE - Irmãos A irmã de um Contador Público Titulado Z, Susana, é tesoureira e dona de 26% das ações da empresa ABC.

O presidente da empresa ABC pergunta a Z se ele pode fazer a auditoria anual da empresa ABC. ( Nota: Um Contador Público Titulado - CPT - é um contador que realiza funções de auditoria ).

Ação: Z aceita o compromisso da auditoria. Usando os critérios abaixo3, por favor avalie a decisão do CPT Z em aceitar a realização da auditoria na

empresa ABC:

Cenário N.º 02- Falência O CPT Z trabalha como auditor para Empresa ABC. O mercado da ABC caiu drasticamente, e Z sabe que a

ABC logo abrirá falência. Outro cliente de Z é a Empresa Sólida. Enquanto faz uma auditoria nas contas a receber da Sólida, Z descobre que esta tem $200.000 para receber da ABC.

Ação: O CPT Z adverte seu cliente, Empresa Sólida, sobre a iminente falência da Empresa ABC. Usando os critérios abaixo, por favor avalie a decisão do CPT Z em advertir seu cliente sobre a iminente

falência da Empresa ABC:

Cenário N.º 03 - Serviço Comunitário O CPT Z, além de praticar contabilidade pública, está altamente envolvido em atividades comunitárias. Ele é

especialmente conhecido por sua emotiva promoção de votos nas eleições. A empresa Alta Votação, uma companhia formada recentemente, desenvolveu um revolucionário processo promocional que, afirmam os executivos da companhia, incrementará grandiosamente a participação eleitoral de qualquer candidato. O presidente da Alta Votação perguntou a Z se ele faria a auditoria inicial da empresa.

Ação: O CPT Z aceita fazer a auditoria. Usando os critérios abaixo, por favor avalie a decisão do CPT Z em realizar a auditoria para a empresa Alta

Votação:

Cenário N.º 04 - Fusão O CPT Z está considerando uma fusão com o CPT F. Para facilitar as negociações, F solicita acesso aos

arquivos de trabalho, declarações de imposto de renda, e correspondência dos clientes de Z. Os clientes de Z não estão a par da fusão proposta.

Ação: O CPT Z permite a F o acesso aos arquivos. Usando os critérios abaixo, por favor avalie a decisão do CPT Z em permitir a F o acesso aos arquivos de

seus clientes:

Cenário N.º 05 - Vendas - Automóvel Uma pessoa comprou um carro novo de um revendedor autorizado local. Oito meses depois de ter comprado

o carro, ele começou a ter problemas com a transmissão do automóvel. Ele levou o carro de volta ao revendedor, onde pequenos ajustes foram feitos. Durante os próximos meses ele continuamente teve problemas com a transmissão, que estava patinando. Em cada vez o revendedor fez apenas pequenos ajustes ao carro. De novo, durante o décimo terceiro mês depois que o carro foi comprado, o homem voltou com o carro ao revendedor porque a transmissão continuava sem funcionar corretamente. Desta vez a transmissão foi completamente reconstruída.

Ação: Uma vez que a garantia era de apenas um ano ( 12 meses da data da compra ), o revendedor autorizado cobrou o preço total pelas peças e mão-de-obra. Usando os critérios abaixo, por favor avalie a decisão do revendedor autorizado em cobrar o preço total pelas

peças e mão-de-obra:

Cenário N.º 06 - Loja da vizinhança ( Mercearia ) Uma rede mercearias opera várias lojas através da área local, incluindo uma em um bairro pobre da cidade.

13

Page 14: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

Estudos independentes mostram que os preços tendem a ser mais altos e com pouca seleção de produtos nesta loja em particular se comparada com outras em outras localidades. Ação: Nos dias de pagamento o dono da mercearia aumenta os preços de todas as mercadorias desta

loja. Usando os critérios abaixo, por favor avalie a decisão do dono da loja em aumentar os preços das

mercadorias nos dias de pagamento:

Cenário N.º 07 - Vendedor Um jovem, recentemente contratado como vendedor de uma loja no varejo local, tem trabalhado duro para

impressionar favoravelmente seu chefe de suas habilidades em vendas. Algumas vezes, este jovem, ansioso por uma venda, tem sido impaciente. Para conseguir uma venda exagera no valor de um item, ou omite informações relevantes sobre o produto que está querendo vender. Ele não pretende enganar ou fraudar com suas ações, ele é simplesmente ansioso por uma venda.

Ação: Seu chefe, o dono da loja, está atento às ações do jovem vendedor, mas não tem feito nada para impedir tais ações. Usando os critérios abaixo, por favor avalie a decisão do chefe em não fazer nada para deter tais ações:

1 2 3 4 5 6 7

01 Justa Injusta 02 Imparcial Parcial 03 Culturalmente aceitável Culturalmente inaceitável 04 Individualmente aceitável Individualmente inaceitável 05 Tradicionalmente aceitável Tradicionalmente inaceitável 06 Aceitável em minha família Inaceitável em minha família 07 É Autopromoção Não é Autopromoção 08 É um sacrifício pessoal Não é um sacrifício pessoal 09 É pessoalmente satisfatório Não é pessoalmente satisfatório 10 Maximiza a utilidade Minimiza a utilidade 11 Maximiza benefícios e minimiza

os danos Minimiza benefícios e maximiza os

danos 12 Leva ao maior bem para a maioria Leva ao menor bem para a maioria 13 Viola um contrato não escrito Não viola um contrato não escrito 14 Obrigado a agir desta maneira Não obrigado a agir desta maneira 15 Viola uma promessa não falada Não viola uma promessa não falada

Referências Bibliográficas BEEKUN, Rafik I., STEDHAM, Yvonne, GIMENEZ, Fernando A., CAETANO, Jorge Jr. e YAMAMURA, Jeanne H. (2000). “Business Ethics in Brasil and the U.S.: a comparative investigation.” Business Association of Latin American Studies, Venezuela. BEEKUN, Rafik I. e STEDHAM, Yvonne. (1999). “The Effects of Culture on Business Ethics: a cross-cultural, comparative investigation.” The Fifth International DSI Conference. Athens, Greece. BETHLEM, Agrícola S. (1999). “Gestão de Negócios, uma abordagem brasileira.” Rio de Janeiro: Campus. COHEN, Jeffrey, PANT, Laurie e SHARP, David (1993). “A Validation and Extension of a Multidimensional Ethics Scale.” Journal of Business Ethics, 12, 13-26. HANSEN, Randall S. (1992). “A Multidimensional Scale for Measuring Business Ethichs: a purification and refinement.” Journal of Business Ethics, 11, 523-534.

14

Page 15: Cultura e Ética nos Negócios: uma investigação sobre a ... · Trabalho de Geert Hofstede mostra que a cultura de um país influencia diretamente a tomada ... modelo de Hofstede

15

HOFSTEDE, Geert, FRANKE, Richard H. e BOND, Michael H. (1991). “Cultural Roots of Economic Performance: a research note.” Strategic Management Journal, 12, 165-173. RALSTON, David A., HOLT, David H. et al. (1996). “The impact of National Culture and Economic Ideology on Managerial Work Values: a study of the United States, Russia, Japan and China.” Journal of International Business Studies, First Quarter, 177-207. REIDENBACH, R. Eric e ROBIN, Donald P. (1988). “Some Initial Steps towards Improving the Measurement of Ethical Evaluations of Marketing Activities.” Journal of Business Ethics, 7, 871-879. REIDENBACH, R. Eric e ROBIN, Donald P. (1990). “Toward the Development of a Multidimensional Scale for Improving Evaluations of Business Ethics” Journal of Business Ethics, 9, 639-653. VITELL, Scott J., NWACHUKWU, Saviour L. e JAMES H. Barnes (1993). “The Effects of Culture on Ethical Decision-Making: An Application of Hofstede’s Typology.” Journal of Business Ethics, 12, 753-760. SLIVER, Mick. Estatística para administração. Tradução de Sonia Vieira e José Eduardo Corrente. São Paulo: Atlas, 2000.

Notas de Final 1 Nesta dimensão, o critério ético de Relativismo e Egoísmo relaciona-se com contrário desta tendência, ou seja, um país com baixa Fuga à Incerteza mostra que as pessoas estão mais dispostas a enfrentar os riscos, e seguem então esta perspectiva egoísta e relativista. No caso do Brasil, identifica-se que o alto grau de Fuga à Incerteza mostra uma tendência de evitar os riscos, onde as pessoas apresentam-se menos dispostas a fugir as regras, então o critério ético adotado estaria mais para a Deontologia. 2 Em Beekun, Stedham et al. (2000) sugere-se que em países com uma orientação em curto prazo, com baixo dinamismo confuciano, as pessoas estariam mais preocupadas com os resultados imediatos e tendem a seguir muito mais a perspectiva ética do utilitarismo, sendo que no contrário, como é o caso do Brasil, esta dimensão poderia não estar associada ao Utilitarismo. 3 Os critérios serão descritos apenas no final do Anexo 1, pois não há a necessidade da repetição aqui, uma vez que são os mesmo para todos os cenários