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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE Programa de Pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvimento MARISA DE LOURDES VALADÃO PACHECO O PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO EM TRÊS CRIANÇAS COM DIAGNÓSTICO DE TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito par- cial para a obtenção do título de Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento. Orientadora: Prof. Dra. Elcie S. Masini São Paulo 2006

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i

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Programa de Pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvimento

MARISA DE LOURDES VALADÃO PACHECO

O PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO EM

TRÊS CRIANÇAS COM DIAGNÓSTICO DE TRANSTORNO

DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH)

Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito par-cial para a obtenção do título de Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento. Orientadora: Prof. Dra. Elcie S. Masini

São Paulo 2006

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ii

MARISA DE LOURDES VALADÃO PACHECO

O PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO EM

TRÊS CRIANÇAS COM DIAGNÓSTICO DE TRANSTORNO

DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH)

BANCA EXAMINADORA

Profª Drª Elcie Aparecida Fortes Salzano Masini

Profª Drª Elena Etsuko Shirahige

Profª Drª Marian Dias

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Dedico este trabalho à minha família e, em especial, à minha irmã, Márcia, que

disponibilizou horas preciosas da sua vida para me ajudar a torná-lo realidade.

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iv

AAggrraaddeecciimmeennttooss ____________________________________________________________

Expresso meus agradecimentos a todos aqueles que contribuíram para mais

esta etapa da minha vida universitária e profissional, nominalmente a:

- Universidade Presbiteriana Mackenzie, por ter me acolhido como aluna no

Programa de Pós-graduação;

- Prof. Dr. Décio Brunoni, pela impecável coordenação do Programa de Pós-

graduação em Distúrbios do Desenvolvimento;

- Profª Drª Elcie Salzano Masini, por ter orientado esta pesquisa com paciência

e disponibilidade.

- Professores do Programa de Pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvi-

mento, pelos conhecimentos transmitidos com grande competência ao longo do cur-

so.

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v

SSuummáárriioo __________________________________________________________________________ Resumo ................................................................................................................. vi

Abstract ................................................................................................................. vii

Antecedentes ........................................................................................................ 1

Introdução ............................................................................................................. 3

Capítulo I

Fundamentação teórica ......................................................................................... 5

1.1 O psicodiagnóstico interventivo ................................................................. 5

1.2 O contexto fenomenológico existencial na psicologia ............................... 15

1.3 O psicodiagnóstico infantil ......................................................................... 20

1.4 O transtorno de Déficit de Atenção Hiperatividade .................................... 27

Capítulo II

Método de Pesquisa .............................................................................................. 39

2.1 Procedimento metodológico ...................................................................... 39

2.1.1 Participantes ................................................................................... 40

2.1.2 Procedimentos ................................................................................ 40

2.1.2.1 Coleta de dados ................................................................ 40

2.1.2.2 Análise dos dados ............................................................. 41

2.2 Apresentação dos dados ........................................................................... 42

2.2.1 Levantamento das categorias ......................................................... 42

2.2.2 Agrupamento das categorias .......................................................... 44

2.2.3 Etapa 1: Categorização dos dados ................................................. 45

2.2.4 Etapa 2: Agrupamento das categorias ............................................ 70

2.2.5 Etapa 3: Reflexões sobre os dados ................................................ 76

Considerações Finais ............................................................................................ 86

Referências ........................................................................................................... 90

Fontes consultadas ............................................................................................... 94

Anexos .................................................................................................................. 95

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vi

RReessuummoo __________________________________________________________________________

PACHECO, M. L. V. O psicodiagnóstico interventivo em três crianças com diagnóstico neu-

rológico de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). [Dissertação]. São

Paulo: Programa Pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Pres-

biteriana Mackenzie, 2006.

Esta dissertação sobre o atendimento clínico de três crianças com diagnóstico

de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) com queixa de dificul-

dade de aprendizagem teve como objetivo identificar quais os recursos utilizados na

relação psicólogo-cliente que foram para elas facilitadores do entendimento de si

próprias e que propiciaram condições para lidarem com suas dificuldades. A funda-

mentação teórica foi subdividia em dois itens, sendo um sobre o atendimento e outro

sobre o déficit de atenção e hiperatividade. A literatura sobre o atendimento clínico e

as intervenções enfocou o psicodiagnóstico interventivo de Ancona-Lopez (1987),

Ancona-Lopez et al. (1995) e Trinca (1984). No que diz respeito ao TDAH, baseou-

se em especialistas no assunto, dentre os quais Barkley (2002) e Marcelli (1998). A

análise qualitativa dos dados foi realizada em três etapas: Categorização, Agrupa-

mento das Categorias e Reflexão sobre os dados. Os dados analisados evidencia-

ram que o psicodiagnóstico interventivo (1) facilitou o atendimento de crianças com

TDAH e dificuldades de aprendizagem; (2) assinalou a propriedade da intervenção

do psicólogo em momentos pontuais e o entendimento dos recursos que poderão

ser utilizados para identificar como seu cliente está se sentindo em relação às suas

dificuldades, esclarecendo momentos em que se mostrou capaz e que o favorece-

ram a lidar e ultrapassar suas dificuldades.

Palavras-chave: Psicodiagnóstico interventivo; Transtorno de Déficit de Atenção;

Déficit de Atenção; Hiperatividade; Dificuldades de Aprendizagem.

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vii

AAbbssttrraacctt __________________________________________________________________________

PACHECO, M. L. V. Intervening psychodiagnosis in three children with neurological diagno-

sis of Attention Deficit Disorder / Hyperactivity (ADDH). [Monograph]. Postgraduation Pro-

gram on Development Disorders of the Mackenzie Presbyterian University, 2006.

This investigation on the clinical support to three children with Attention Deficit

Disorder / Hiperactivity (ADDH) and complain of learning disabilities has aimed at

identifying the resources in psychologist/client relation which the children had as fa-

cilitating their comprehension of themselves, and which provided to them conditions

to deal with their difficulties. Theoretical basis was divided into two topics: one of

them related to the clinical support and interventions, emphasizing the intervening

diagnosis proposed by Ancona-Lopez (1987), Ancona-Lopez et al. (1995), and

Trinca (1984). The other topic was related to ADDH, based on specialists such as

Barkley (2002), and Marcelli (1998). Qualitative analysis was carried out in three

phases: Categorization, Categories Grouping, and Reflections on data. The analysis

evidenced that intervening diagnosis (1) facilitated the clinical support to children with

ADDH and learning disabilities, and (2) pointed out the psychologist's effective inter-

vention in punctual moments, as well as the comprehension of resources that can be

used for identifying how the client feels in relation to her/his difficulties, perceiving the

moments when she/he shows her/his abilities, making possible to her/him deal with

and overcome difficulties.

Keywords: Intervening diagnosis; Attention Deficit Disorder; Attention Deficit; Hyper-

activity; Learning disabilities.

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AAnntteecceeddeenntteess __________________________________________________________________

A psicóloga que realizou esta pesquisa iniciou sua trajetória profissional como

professora do curso de Magistério, entre 1993 e 1997, lecionando Psicologia Geral,

Psicologia da Educação, Dificuldades de Aprendizagem, e orientando estagiários.

Uma queixa presente em suas alunas de Magistério era a dificuldade que as

crianças apresentavam em relação à aprendizagem. Esse tema era discutido em

sala de aula e passou a ser motivo de preocupação em sua atuação e estudos.

Posteriormente lecionou Ética e Cidadania a alunos da 5ª série do Ensino Fun-

damental ao 3º ano do Ensino Médio em escola de rede particular. O contato com as

crianças e os adolescentes ofereceu oportunidade de conhecer alguns dos motivos

que podiam acarretar dificuldade de aprendizagem nos alunos, entre os quais Trans-

torno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Dislexia, Distúrbios Psicomoto-

res, Distúrbios de Comportamento.

Foi convidada a atuar também como psicóloga da escola, o que favoreceu seus

estudos e possibilitou uma visão mais ampla de aspectos da dinâmica escolar e refe-

rentes às dificuldades de aprendizagem, introduzindo-a em questões a respeito do

TDAH.

Iniciou atendimento em consultório particular a crianças ou adolescentes que

apresentavam dificuldades de aprendizagem, deparando-se com o questionamento,

por parte desses clientes, a respeito dos motivos que os levavam a não conseguirem

aprender.

Durante este percurso fez especializações em Psicologia Clínica e em Psico-

pedagogia, cursos que ampliaram seus conhecimentos, levando-a a melhor atuação.

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Na intervenção clínica, a adoção do psicodiagnóstico interventivo, na leitura fe-

nomenológica existencialista das situações vivenciadas com o cliente, favoreceu de

forma marcante a relação psicólogo-cliente, oportunizando ganhos para o cliente no

entendimento de si próprio e na apropriação de condições para lidar com suas difi-

culdades.

Interessada sempre em compreender a afetividade e o estado emocional de

seus clientes, decidiu aprofundar seus estudos sobre crianças com transtornos em

seu desenvolvimento, ingressando para tal no Programa em Distúrbios do Desenvol-

vimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie. O motivo que a levou ao Mestra-

do foi o que a levou a definir o tema de sua Dissertação, isto é, sistematizar dados

de sua atuação clínica junto a crianças com TDAH e analisar recortes do atendimen-

to para tornar mais claro quais recursos utilizados na relação psicólogo-cliente foram

para seus clientes facilitadores do entendimento de si próprios e propiciaram condi-

ções para lidarem com suas dificuldades.

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3

IInnttrroodduuççããoo ______________________________________________________________________

Esta Dissertação focaliza o atendimento clínico de três crianças com diagnósti-

co de TDAH com queixa de dificuldade de aprendizagem

Objetivou identificar, por meio de estudo minucioso das sessões de atendimen-

to, quais os recursos utilizados na relação psicólogo-cliente que foram para elas,

facilitadores do entendimento de si próprias e propiciaram condições para lidarem

com suas dificuldades.

A fundamentação teórica, no que diz respeito ao atendimento clínico e às inter-

venções realizadas, enfatizou o psicodiagnóstico interventivo com abordagem feno-

menológico existencial de Ancona-Lopez (1987), Ancona-Lopez (1995), e Trinca

(1984). No que diz respeito ao TDAH, baseou-se em especialistas no assunto, den-

tre os quais Barkley (2002) e Marcelli (1998).

A investigação se realizou a partir da análise de recortes das sessões de aten-

dimento de cada uma das crianças, sujeitos da pesquisa, retiradas dos respectivos

prontuários dos arquivos do Consultório de Psicologia.

A análise dos dados foi feita em três etapas:

1 – O Levantamento das Categorias, a partir da fundamentação teórica;

2 – O Agrupamento das Categorias em quatro itens ilustrativos das principais

diretrizes do atendimento.

3 – A Reflexão sobre os dados, relacionando as categorias e agrupamentos

das crianças sujeitos da pesquisa, de forma a identificar o que há em comum entre

eles e o que é particular a cada um, em relação ao objetivo da investigação.

O trabalho foi estruturado conforme segue:

Antecedentes é o capítulo que relata a trajetória profissional da pesquisadora,

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na qual emergiu o tema da dissertação.

O Capítulo I trata do conceito de psicodiagnóstico, breve esclarecimento do

psicodiagnóstico clássico, histórico do psicodiagnóstico interventivo, contribuições

teóricas mais recentes, contexto fenomenológico existencial, psicodiagnóstico infantil

e informações e esclarecimentos sobre TDAH.

O Capítulo II aborda a pesquisa e os procedimentos metodológicos de modali-

dade qualitativa e analisa recortes do atendimento de situações em que ocorreu o

psicodiagnóstico interventivo.

As considerações finais é o ultimo capítulo, constituído de comentários sobre o

que foi alcançado dos objetivos da Dissertação, o que se interpôs como limite para

que fossem atingidos, e o que os ultrapassou. Faz menção à importância da investi-

gação realizada para os estudos sobre a criança com TDAH e a intervenção do psi-

cólogo junto a ela, à luz do psicodiagnóstico interventivo.

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5

CCaappííttuulloo II FFuunnddaammeennttaaççããoo tteeóórriiccaa ________________________________________________

1.1 O psicodiagnóstico interventivo

Etimologicamente, a palavra diagnóstico origina-se do grego diagnõstikós e

significa discernimento, faculdade de conhecer, de ver através de (CUNHA, 1987).

No dicionário da Língua Portuguesa, diagnóstico significa "a qualificação dada por

um médico a uma enfermidade ou a um estado fisiológico, com base nos sintomas

que observa" (FERREIRA, 1999).

No que se refere à psicologia, encontramos que "psicodiagnóstico é uma avali-

ação psicológica, feita com propósitos clínicos e que, portanto, não abrange todos os

modelos de avaliação psicológica de diferenças individuais" (CUNHA, 2003, p. 23).

A definição apresentada pelo Conselho Federal de Psicologia em documento

organizado por Macedo et al (1980) introduziu a noção do caráter preventivo que o

psicodiagnóstico pode possuir. Em outras palavras, "Diagnóstico psicológico é um

processo pelo qual o psicólogo chega à compreensão do sujeito de estudo, de ma-

neira a possibilitar a tomada de decisões quanto ao tipo de intervenção necessária,

ao nível preventivo ou de solução problemas".

E completando:

Cabe ao psicólogo conceituar as questões a serem respondidas, de-

cidir sobre os procedimentos a serem utilizados para cada caso e integrar

os diferentes dados obtidos num todo coerente, que permite a compreensão

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da natureza e causas do problema em estudo.

Historicamente o psicodiagnóstico está relacionado à psicologia e consiste na

obtenção de informações sobre a personalidade do paciente. É estruturado por eta-

pas previamente estabelecidas, entrevistas e aplicação de testes, buscando com-

preensão dos aspectos da personalidade para direcionar uma forma de atuação. O

psicodiagnóstico está relacionado, portanto, a inúmeras teorias que procuram co-

nhecer e compreender o homem (CUNHA, 2003).

Ocampo et al. (1990) discorrem sobre o psicodiagnóstico clássico e enfatizam

sua evolução na aquisição de uma identidade própria. Assim, caracterizam o psico-

diagnóstico como uma prática bem delimitada, cujo objetivo é

conseguir uma descrição e compreensão a mais profunda e

completa possível da personalidade total do paciente ou do grupo

familiar. (...) Uma vez alcançado um panorama preciso e completo do

caso, incluindo os patológicos e os adaptativos, trataremos de formu-

lar recomendações terapêuticas adequadas. (p. 17).

Ainda segundo as mesmas autoras, o psicodiagnóstico possui os seguintes

passos:

1º) Primeiro contato e entrevista inicial com o paciente.

2º) Aplicação dos testes e técnicas projetivas.

3º) Encerramento do processo: devolução oral ao paciente e/ou seus pais.

Ancona-Lopez (1995) esclarece que "a visão clássica do psicodiagnóstico re-

comenda uma atitude de neutralidade, o que leva a certo distanciamento do profis-

sional, para facilitar as manifestações do cliente" (p. 31).

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Nessa abordagem, o psicólogo deve manter uma postura distante, de não en-

volvimento, que é a maneira de não influenciar nem ser influenciado pelo paciente.

Por outro lado, Santiago (1995) apresenta posicionamento relevante a respeito

dessa assertiva, pois aponta para algumas dificuldades difíceis de serem reparadas:

1. separação nítida entre uma primeira etapa do diagnóstico (quando

o psicólogo trata de fazer uma investigação por meio de entrevistas e tes-

tes) e a etapa final (quando ele devolve um conhecimento e compreensão);

2. provável intensificação da ansiedade do paciente devido ao perío-

do de espera entre a entrevista inicial e a final;

3. dificuldade de retomar atitudes anteriores do paciente que possam

contribuir para uma melhor integração do material devolvido e que depen-

dem, portanto, da memória do psicólogo e do paciente;

4. as possibilidades de esclarecimento, reflexão ou "metabolização"

do paciente, que dependam da ajuda do psicólogo, parecem estar concen-

tradas nas entrevistas finais. (p. 15).

Na verdade, foi com a introdução do processo psicodiagnóstico do tipo com-

preensivo que se abriu a possibilidade de se elencarem vários fatores que não eram

computados na clínica psicológica diagnóstica. Assim, segundo os ensinamentos de

Trinca (1984), "o diagnóstico psicológico em psicologia clínica tem, como propósito

básico, a exploração e o estudo dos fatores intrapsíquicos, interpessoais e sociocul-

turais, cuja interação acarreta desajustamentos no paciente" (p. 25).

Neste sentido, o processo diagnóstico de tipo compreensivo trouxe mudanças

significativas ao psicodiagnóstico, refletidas na consideração de diversos fatores pa-

ra a compreensão totalizadora do indivíduo humano. Nesta concepção, o psicodiag-

nóstico tem por objetivo:

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... encontrar um sentido para o conjunto das informações disponíveis,

tomar aquilo que é relevante e significativo na personalidade, entrar empati-

camente em contato emocional e, também, conhecer os motivos profundos

da vida emocional de alguém. (TRINCA, 1984, p. 15).

Esse processo diagnóstico que preza a totalidade considera o início do contato

com o paciente, a forma de seu encaminhamento para o psicodiagnóstico, as entre-

vistas, as observações, os resultados de testes psicológicos, os fatores da persona-

lidade do psicólogo que são utilizados para compreensão clínica, até o desligamento

final do paciente. Não existe, assim, um processo diagnóstico prévio, mas sim uma

flexibilidade que busca destacar e tratar das situações mentais emergentes.

O autor salienta que:

A visão é, sempre, uma visão de conjunto para o material clínico, de

modo que o sentido de um aspecto é o sentido que ele faz dentro do todo.

Assim, o psicólogo não apenas descreve suas observações, mas estabele-

ce relações e conexões entre os diferentes níveis do observado, realizando

uma análise globalística. (Ibid; p. 18).

Um fator de importância, segundo esse autor, é o posicionamento epistemoló-

gico do psicólogo que atua com o processo diagnóstico compreensivo, destacando

que ele deve se orientar por um olhar que toma a personalidade como única, consi-

dera a existência de experiências subjetivas e dinâmicas psíquicas inconscientes.

Destaque-se, neste ponto, que muitos autores valorizam especialmente a devo-

lução dos dados.

Ocampo et al. (1990), por exemplo, consideram a entrevista devolutiva um

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momento de intervenção, na medida em que a discussão dos resultados já mobiliza

mudanças internas. Nesse sentido, mencionam que:

Seguindo a lei de fechamento (teoria da Gestalt), é necessário trans-

mitir o resultado de uma comunicação realizada. A comunicação por nós hi-

erarquizada não é, pois, de tipo unidirecional, do psicólogo para o paciente,

mas sim circular, do paciente para o psicólogo e vice-versa, restituindo, as-

sim, ao processo comunicacional as características de diálogo entre consul-

tante e consultor. (p. 316).

De acordo com as autoras, quando a informação é devolvida ao paciente, é

dada a ele a oportunidade de se ver com mais critério de realidade, com menores

distorções idealizadoras ou depreciativas (p. 318).

As considerações de Ocampo et al. sobre a entrevista devolutiva parecem bas-

tante significativas, sobretudo quando referem que, mesmo na busca de distancia-

mento, o psicodiagnóstico está repleto de intervenções, ainda que não explícitas,

traduzidas na maneira como o psicólogo conduz a(s) entrevista(s), na entonação de

sua voz, nas perguntas que elabora e realiza, na escolha e na organização dos tes-

tes a serem aplicados etc.

O processo devolutivo de informação também foi abordado por Verthelyi

(1993), que relatou que a devolução se inicia já na pré-entrevista e está presente

durante toda a avaliação de forma implícita na atitude do psicólogo, na forma de

perguntar, pensar, definir e informar certos aspectos dos critérios de saúde e de en-

fermidade.

Verthelyi (1993) esclarece sobre os dados que norteiam o profissional a plane-

jar a transmissão dos resultados, enfatizando que a capacidade e a experiência clí-

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nica do psicólogo devem ajudá-lo a determinar as técnicas defensivas e os conflitos

do examinando, o seu grau de tolerância à frustração e a motivação para mudança.

A pessoa que busca um psicólogo, quer por iniciativa própria ou por indicação

ou solicitação de médicos ou da escola, apresenta-se angustiada porque as coisas

não estão dando certo para ela. O momento inicial – que é o psicodiagnóstico – po-

derá aliviar ou aumentar a angústia para essa pessoa. Se já no processo diagnóstico

não houver alguma forma de intervenção, o entendimento do que está acontecendo

fica dificultado, e o paciente deve aguardar o término do processo para poder rece-

ber de volta a indicação do atendimento que lhe trará efeitos benéficos para lidar

com a dificuldade que o levou ao psicólogo.

Esta forma de abordar o cliente implica passividade do paciente, e esta passi-

vidade é aceita pelo psicólogo; o paciente, então, apenas espera que, ao término do

processo, o psicólogo traga a solução para o problema.

A inquietação diante dessa forma de relação trouxe outras indagações: Como o

paciente que vivencia a "passividade" poderá ter recursos para ousar algo novo na

sua relação com ele mesmo e com o mundo?

E o esclarecimento para essa questão está nas palavras de Santiago (1995):

A nosso ver, faz-se necessária, uma atitude continente e empática

com o paciente, uma disposição para escutá-lo e estabelecer com ele um

verdadeiro diálogo. E isso implica necessariamente incluir o paciente no

processo diagnóstico de um modo diferente do que comumente ocorre, ou

seja, estimulando-o a compartilhar do trabalho compreensivo em curso. (p.

12).

Estes primeiros momentos de interação com o cliente, conhecidos como psico-

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diagnóstico ou como diagnóstico do tipo compreensivo, foram tomando corpo e for-

mas diferentes, e foi essa plasticidade que permitiu reflexões sobre as intervenções

que ocorrem já durante o diagnóstico.

Foi Ancona-Lopez quem elucidou essa forma de psicodiagnóstico como um

processo de intervenção. Em sua tese de doutorado defendida em 1987, intitulada

"Atendimento a pais no processo psicodiagnóstico infantil: Uma abordagem fenome-

nológica", a autora inovou o modelo de psicodiagnóstico no atendimento clínica-

escola, ao focalizar o atendimento em grupo de pais que levam os filhos para psico-

diagnóstico.

Segundo a autora:

Estes dados devem ser discutidos diretamente com os clientes, esta-

belecendo-se com os mesmos as possíveis conclusões. Apesar de empre-

garem testes e informações derivadas de diferentes correntes do conheci-

mento psicológico, utilizam-nas apenas como recursos ou estratégias a se-

rem trabalhadas com os clientes. O psicodiagnóstico é considerado mais do

que um estudo e avaliação. Salienta-se o seu aspecto de intervenção, dilu-

indo-se os limites que separam o psicodiagnóstico da intervenção terapêuti-

ca. (ANCONA-LOPEZ, 1984, p. 7).

Esse psicodiagnóstico interventivo veio legitimar a necessidade de atuação te-

rapêutica já ao curso do diagnóstico. A escolha desse enfoque está relacionada à

noção de que todo contato psicólogo-cliente pode ser um momento significativo para

ambos, quando se adota postura dinâmica, ou seja, quando a fala do cliente pode

trazer o entendimento do psicólogo que, por sua vez, redimensionará esse mesmo

entendimento. Isso quer significar que apenas o reconhecimento das angústias e

das emoções não traz necessariamente os recursos necessários para a mudança; é

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importante que o cliente possa reconhecer sua capacidade para compreender e re-

solver os seus problemas.

É ainda Ancona-Lopez quem esclarece que:

Os apontamentos serão interventivos se não repetires as situações

de vida cotidiana do cliente. Ou seja, quando introduzires a estranheza no

relacionamento, de modo a fazer o cliente confrontar-se com uma ruptura: a

ruptura de seus comportamentos atuais, a ruptura da compreensão costu-

meira, a ruptura dos jogos relacionados que aprendeu a jogar. (ANCONA-

LOPEZ, 1995, p. 34).

Esta relação não é, então, um processo que garante a mudança, mas resulta

em uma possibilidade de mudança, como aponta Santiago (1995):

... Um assinalamento do psicólogo não levará o paciente a mudar seu

ponto de vista sobre si mesmo (sabemos que algumas atitudes podem estar

cristalizadas e ter seus benefícios secundários), mas uma observação perti-

nente, no momento oportuno, resulta muitas vezes útil porque possibilita ao

paciente tomar contato com determinado aspecto de sua personalidade. (p.

17).

Importante mencionar que, apesar de adotarem a mesma abordagem interven-

tiva frente ao psicodiagnóstico, as autoras se referem à pessoa que busca o atendi-

mento psicológico de modos diferentes. Santiago refere-se ao paciente, e Ancona-

Lopes ao cliente.

Neste estudo optamos por usar a palavra cliente, cujo significado envolve rela-

ção de troca, enquanto o vocábulo paciente implica numa postura passiva de quem

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recebe algo de um agente.

Então, para compreensão mais ampla, é importante ressaltar que, na Língua

Portuguesa (FERREIRA, 1999), "intervir" significa ser ou estar presente, e é este o

sentido que encontramos na prática desse tipo de psicodiagnóstico. Com o psicólo-

go e o cliente presentes na relação, este momento se torna significativo pela singula-

ridade que acarreta. Mas como se estabelece essa singularidade?

Pergunta-se como gerar esta situação de singularidade?

Procurando responder a partir da psicologia fenomenológica, esta

singularidade se estabelece à medida que o psicólogo mostra ao cliente o

que ‘lhe parece’ através do que o cliente está lhe trazendo. Não é um de-

monstrar ou um avaliar entre verdades e mentiras, mas o iluminar de um

momento, de uma situação. Esta iluminação ou clareira que se abre no exis-

tir do cliente de algum modo desestrutura o estabelecido.

[...]

Destruída ou abalada a maneira usual de o cliente agir, ele se verá

diante da necessidade de uma reorganização, o que abrirá a possibilidade

de novas escolhas. (ANCONA-LOPEZ, 1995, p. 35).

Os apontamentos de Ancona-Lopes vão de fato ao encontro da vivência clíni-

ca, em que a fala do psicólogo pode declarar ao cliente a sua própria fala, mostran-

do o que está guardado, dando sentido à forma como ele se apresenta. Esta vivên-

cia pode trazer um novo olhar para o que é manifesto e oportunizar mudanças, se

forem necessárias.

O cliente de psicodiagnóstico espera conhecer alguma coisa nova

sobre si mesmo. Melhor ainda, espera que a clareira, que abrirá um vazio

no conhecimento que tem sobre sua maneira de funcionar, lhe apresente

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novas possibilidades de ser. É, pois, injusto, por parte do psicólogo, negar

esta possibilidade ao cliente e desonesto trair-lhe a confiança, guardando

para si os conhecimentos que ele veio pedir que fossem apresentados. (I-

bid, p. 36).

Estudo recente de Paulo (2005) envolve a prática de psicologia clínica atual, a

depressão (suas manifestações como sofrimento psíquico e a compreensão psicodi-

nâmica desse distúrbio), e o processo de atendimento em psicodiagnóstico interven-

tivo, utilizando técnicas projetivas. A autora compreende o psicodiagnóstico interven-

tivo como forma de:

... apreensão da dinâmica intrapsíquica, compreensão da problemáti-

ca do indivíduo e intervenção nos aspectos emergentes, relevantes e/ou de-

terminantes dos desajustamentos responsáveis por seu sofrimento psíquico

e que, ao mesmo tempo, e por isso, permite uma intervenção eficaz. (p. 90).

As conclusões de Paulo (2005) esclarecem e consolidam a nossa forma de

pensar e atuar que, afinal, fundamenta esta nossa pesquisa. Assim,

Psicodiagnóstico interventivo permite promover experiências que se-

jam mutativas com pessoas que sofrem. Desde as primeiras consultas, di-

agnosticando e intervindo, mas também podendo estabelecer contatos e

encontros que sejam, de fato, terapêuticos. (PAULO, 2005, p. 90).

Na prática profissional clínica, o repensar acarreta busca, e com ela vêm as in-

certezas, os temores, mas também o prazer do encontro... Tanto o encontro com o

cliente, ao perceber-se diferente, quanto o encontro com autores nos quais nos re-

encontramos:

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Cada terapeuta deve desenvolver seu próprio corpo de experiência e

sofisticação clínica, a fim de aperfeiçoar sua capacidade terapêutica. Um de

seus importantes aspectos é a necessidade de constante avaliação própria,

como também de suas interações com o paciente e das táticas e vicissitu-

des do processo terapêutico. Deve finalmente, julgar este contexto à luz de

seu impacto no resultado do tratamento. É deste modo que o terapeuta a-

cumula suas experiências clínicas pessoais e é baseando-se nelas que gra-

dualmente, desenvolve seu estilo terapêutico pessoal. (DEWALD, 1981, p.

331).

1.2 O contexto fenomenológico existencial na psicologia

Segundo Ancona-Lopez (1987), vários autores tendem a enfatizar a participa-

ção do cliente e sublinhar a relação que ele estabelece com o profissional, mas é no

contexto da psicologia fenomenológico-existencial que o cliente vem sendo mais va-

lorizado como responsável por si mesmo, considerando suas possibilidades de aber-

tura e seus limites, e tornando-se co-participante no atendimento psicológico.

Para a referida autora:

... nessa abordagem são valorizadas a primazia da experiência sobre

os construtos teóricos, a expressão da situação do ponto de vista do sujeito,

a aproximação descritiva e a busca de significado, a concepção de homem

como ser-no-mundo considerado em sua corporalidade, espacialidade, tem-

poralidade e relacionamentos com o mundo, os outros e si próprios, assim

como a possibilidade de comunicação pelo diálogo e da co-constituição de

um conhecimento ou compreensão consensuais. (p. 125).

Desse ponto de vista, o psicodiagnóstico é situação em que cliente e psicólogo

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são parceiros ativos. Ao psicólogo, então, deve caber a facilitação de mudanças po-

sitivas, a oportunização de uma gama maior de escolhas, e o estímulo ao viver com

novas perspectivas.

A principal contribuição do psicodiagnóstico fenomenológico existencial está na

reavaliação do papel desempenhado pelo cliente e pelo psicólogo nesta situação: o

psicólogo está mais interessado em capacitar seu cliente a engajar-se num processo

contínuo de autodiagnóstico em vez de se limitar a compreender sozinho o proble-

ma; conseqüentemente, o cliente se torna um parceiro ativo e envolvido no diagnós-

tico e na solução de seus problemas, adquire maiores possibilidades de continuar

acessando o significado de suas experiências, transformando-o em conhecimento

pessoal que pode ser utilizado nas soluções de problemas presentes ou futuros

(ANCONA-LOPEZ, 1987, p. 7).

Nessa perspectiva de Ancona-Lopez, o diagnóstico psicológico torna-se uma

situação cooperativa na qual tanto psicólogo como cliente têm por objetivo compre-

ender melhor o cliente. A descrição do mundo próprio do cliente e de sua situação

apóia-se numa aproximação que procura captá-lo em sua multiplicidade. Neste pro-

cesso, a capacidade de ambos para observar, apreender, compreender, constitui a

base indispensável para o trabalho.

Para Ancona-Lopez (1987), porém, "interpretar não é decifrar; é dar a ver, dar a

ver o sentido do fenômeno tal como o apreendi" (p. 9).

Na abordagem fenomenológica, fenômeno é aquilo que se mostra, e é na fala,

mais enfaticamente, que determinado fenômeno aparece, é anunciado, é conhecido

pelo outro. Neste sentido, a fenomenologia extrapola a simples descrição desse fe-

nômeno anunciado, mas explica o modo como ele aparece, traz à luz aquilo que o-

pera e se dissimula em todo fenômeno, mostra explicitamente aquilo que dá a ver e

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se mantém de início velado (ANCONA- LOPEZ, 1987, p. 9).

Para Ancona-Lopez, "o fato de falarmos já é uma tomada de consciência na

medida em que cumprimos o pensamento e, desta forma, entramos em contato com

ele".

Então, interpretar uma fala é tornar explícita a compreensão que dela se tem.

Mas, para Ancona-Lopez, compreender tampouco é simplesmente captar uma situa-

ção expressa numa fala, mas sim revelar as potencialidades concretas do ser, no

horizonte da situação que cada um ocupa no mundo. A interpretação "opera sempre

no interior de um conjunto de relações já interpretadas, num todo relacional. Portan-

to, ela nunca é a captação sem pressupostos de algo previamente dado. Vemos e

compreendemos o presente através das intenções, modos de ver e preconceitos que

o passado nos transmitiu" (Ibid, p. 11).

A autora continua:

Se não pode haver uma interpretação sem pressupostos, então a no-

ção de interpretação correta é um ideal impensável, é uma impossibilidade.

Não há interpretação sem relação com o presente e este nunca é perma-

nente ou rígido. O significado não é uma propriedade imutável de um objeto,

o significado é sempre para nós. (Ibid, p.11).

E conclui: "Compreender uma fala é estar pronto para que nos diga algo e a ela

responder, e nesta resposta procurar promover novas possibilidades existenciais na

medida em que ajude o outro e a si mesmo a avançar em sua abertura, transfor-

mando seu projeto".

Os conceitos da fenomenologia serviram de base para o desenvolvimento da

Psicologia Fenomenológica que, segundo Corrêa (2004), "está interessada em com-

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preender a experiência vivida, externa e racionalmente, ou seja, sentida, agida e

pensada" (p. 18).

Para a Psicologia Fenomenológica o homem se constitui, enquanto subjetivi-

dade, a partir da trama de relações que estabelece com o mundo. Desse modo, o

ser humano é sempre um "ser em", um "ser com", "um ser junto com outros seres".

Forghieri (1993) assinala:

Ser no mundo uma estrutura originária e sempre total, não podendo

ser decomposta em elementos isolados. Entretanto, tal estrutura primordial

pode ser visualizada e descrita em seus vários momentos constitutivos man-

tendo a sua unidade. É desse modo que podemos considerar os vários as-

pectos do mundo e as diferentes maneiras do homem existir no mundo. (p.

28).

No trabalho clínico, a Psicologia Fenomenológica remete à busca de compre-

ender a experiência e seus significados em dois movimentos, segundo Forghieri

(1993): envolvimento existencial e distanciamento reflexivo. Esses movimentos são

utilizados no processo psicodiagnóstico em uma abordagem fenomenológico-

existencial na procura de compreender, junto com o cliente, os significados que ele

atribui às suas experiências.

Na mesma linha de pensamento fenomenológico, Donatelli (2005) assinala que

o psicodiagnóstico interventivo se caracteriza, então, por propostas devolutivas ao

longo do processo acerca do mundo interno do cliente. São assinalamentos, pontua-

ções, clarificações que permitem ao cliente buscar novos significados para suas ex-

periências, apropriar-se de algo sobre si mesmo, e re-significar suas experiências

anteriores (p. 24).

A esse respeito, Santiago (1995) informa que os profissionais "reconhecem a

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necessidade de fazer certos apontamentos ao paciente durante o processo psicodi-

agnóstico por considerarem que o trabalho alcança uma dimensão mais ampla e

compreensiva. Também argumentam a favor de devoluções parciais e de realizar

um trabalho em conjunto com o paciente" (p. 17).

Neste ponto, voltamos a Trinca (1984), quando enfatiza que os processos psi-

codiagnósticos do tipo compreensivo, derivados da psicanálise e conhecidos como

psicodinâmicos, têm por objetivo a obtenção de "uma compreensão psicológica glo-

balizada do paciente, e não apenas de aspectos ou partes que correspondem a de-

terminados testes psicológicos" (p. 17).

E continua:

Algumas correntes da Psicologia Fenomenológica-Existencial (...) re-

formularam a visão do psicodiagnóstico, considerando que a interação com

o cliente por meio de testes e outros instrumentos poderia ser útil para as

pessoas, ajudando-as no caminho do autoconhecimento. Esses dados de-

vem ser discutidos com os clientes, estabelecendo com os mesmos as pos-

síveis conclusões . (TRINCA, 1984, p. 17).

Sobre os testes psicológicos e o seu uso, Ancona-Lopez (1987) relata que os

psicólogos que adotaram abordagens fenomenológico-existenciais na década de

1970 teceram críticas à maneira tradicional com que os testes eram usados e apre-

sentaram uma nova visão a esse respeito:

Na avaliação dos testes, esses psicólogos procuravam, conjuntamen-

te com o cliente, explorar o significado dado às várias partes dos testes e às

avaliações que se podia extrair delas. Buscavam novas informações e solici-

tavam ajuda para compreender melhor as respostas. Os resultados objeti-

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vos dos testes, os escores, eram considerados como dados secundários,

válidos apenas como referências das instâncias para as quais haviam sido

estabelecidos, e estas eram explicadas ao sujeito. (p. 62).

Com relação ao uso de testes psicológicos, Côrrea e Ancona-Lopez (2005) co-

mentaram:

A característica principal do uso dos testes nessa abordagem é o fato de

que tanto a aplicação quanto a avaliação são compartilhadas com o cliente.

Isto é,a compreensão dos testes é co-constituída , é construída em conjunto

pelo psicólogo e seu cliente. (p. 379).

1.3 O psicodiagnóstico infantil

Mas todas essas considerações sobre a relação psicólogo-cliente devem ser

destacadas de maneira mais cuidadosa quando o tema é o psicodiagnóstico infantil.

O primeiro contato é realizado com os pais que buscam orientação sobre e para o

filho que não "está bem" em algum contexto: na relação com os pais e/ou amigos,

com ele mesmo, com o processo de aprendizagem.

Segundo Yehia (1995), "quando a criança começa a apresentar atitudes e

comportamentos que rompem com algumas expectativas dos pais, dos professores

ou outros agentes da comunidade, surge o encaminhamento ou busca espontânea

do psicólogo" (p. 117).

No psicodiagnóstico infantil, o trabalho do psicólogo com os pais prioriza co-

nhecer o significado da queixa, as características dos sintomas apresentados pela

criança, a compreensão que eles têm das dificuldades e das facilidades, e como é a

relação com a criança.

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Já em relação às intervenções psicólogo-cliente, Yehia (1995) ensina que:

O conhecimento que o cliente traz é valorizado, e é a partir dele que

minhas falas terão ou não sentido. Por outro lado, para que seja eficiente, a

intervenção deve pertencer ao campo de possibilidades do cliente, marge-

ando aquilo que ele não compreende, uma vez que, se estiver distante des-

te campo, ela poderá não ser compreendida ou ser recusada por ele. (p.

124).

Um olhar cuidadoso deve estar sempre presente sobre a criança. É necessário

compreender certos aspectos da vida e do relacionamento que parecem irrelevantes

para a criança e, a partir disso, ampliar ou possibilitar a compreensão do que ocorre

com ela.

Embora chegue ao consultório psicológico levada pelos pais, é na criança que

o psicodiagnóstico deve ser centrado, e não em um tratamento de diagnóstico fami-

liar. Com os pais, são compartilhadas as facilidades e as dificuldades encontradas

na criança em relação à queixa; são transmitidas as orientações para o momento; e,

se necessários, são realizados os encaminhamentos para outros profissionais.

O psicólogo deve estabelecer a relação entre a criança e as instituições envol-

vidas, e auxiliar a criança a entender as relações estabelecidas entre ela e seus en-

caminhadores.

Outra questão importante a salientar é a necessidade de um olhar crítico e pro-

fissional sobre a queixa dos pais. Se eles têm concretizada a idéia de que a criança

é possuidora de um problema, o psicólogo poderá comprometer o seu atendimento

caso se deixe vestir-se com este enfoque apenas.

Sobre essa consideração, Tsu (1984) esclarece que:

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Vemos que, se o leigo já vem com uma definição acerca de

quem é o indivíduo-problema, o profissional não pode aceitar acriti-

camente essa colocação, sob pena de adotar uma posição ingênua

[...] a rede relacional, que são os componentes da dinâmica familiar,

pode ter uma visão distorcida e discutível sobre o que ocorre com a

criança, pois a criança está intimamente ligada à família a ponto de

expressar sempre, através de seu sofrimento psicológico, que não

são só suas, mas de todo o grupo. (p. 37-38).

Para Ancona-Lopez (1987), o processo de psicodiagnóstico interventivo, quan-

do efetuado numa abordagem fenomenológico-existencial, "é uma prática colabora-

tiva, contextual e intervencionista". No caso do psicodiagnóstico infantil, todavia, es-

se processo pressupõe a implicação da família na problemática atribuída à criança

na queixa. Parte da idéia de que, se a criança apresenta um comportamento que

atinge os pais, mobilizando-os a procurar por um psicólogo, a família está, de algum

modo, envolvida no problema. Este modo de compreender o psicodiagnóstico decor-

re, como já mencionado, da concepção de homem e de mundo postulada pela fe-

nomenologia existencial, isto é, considera o ser humano como um ser sempre em

relação, cuja subjetividade se constitui pelas relações que o indivíduo estabelece no

decorrer de sua existência. Dessa forma, os pais ou responsáveis também são clien-

tes e têm participação ativa no referido processo.

Além disso, como diz Yehia (1995),

... mesmo sendo a criança a precisar de atendimento psicológico, são

os pais que arcam com muitos dos custos do atendimento infantil; o tempo

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para levar e buscar a criança, o pagamento das sessões (quando são gra-

tuitas, o pagamento das conduções) e os possíveis efeitos transformadores

do atendimento infantil na dinâmica da família. (p. 118).

Yehia (1995) complementa: "A situação do psicodiagnóstico torna-se então

uma situação de cooperação, em que a capacidade de ambas as partes observa-

rem, apreenderem, compreenderem, constitui a base indispensável para o trabalho"

(p. 120).

Redirecionar as idéias dos pais a partir da compreensão da criança e da dinâ-

mica familiar, objetivando facilitar o relacionamento, propiciar novas formas de inte-

ração, e abrir novas perspectivas de experiências é um dos aspectos que caracteri-

zam a abordagem fenomenológico-existencial de um psicodiagnóstico interventivo.

Aqui merece destaque o relato de Cupertino (1995), sobre um atendimento em

psicodiagnóstico infantil que não alcançou o resultado esperado. Analisa os desen-

contros entre cliente e psicólogo a partir da teoria da ordem negociada. Ao apontar

as dificuldades de uma abordagem que "não deu certo", identifica posições esclare-

cedores do psicodiagnóstico interventivo:

Psicólogo e cliente se envolvem, a partir de pontos de vista diferentes

mas igualmente importantes, na tarefa de construir os sentidos da existência

de um deles – o cliente. [...] Assim, enquanto esperamos do psicólogo uma

postura mais "democrática", colocando-se como um dos elementos da rela-

ção, desejamos que o cliente esteja disposto a cooperar, abrindo-se para

essa intervenção. (p. 138-139).

Nessa perspectiva fenomenológica do psicodiagnóstico, todos os dados devem

ser devolvidos com discussões que possibilitem re-significar os modos de funciona-

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mento apontados e, assim, optar ou não por uma maneira de redirigir a vida.

Também embasada na fenomenologia-existencial, Munhoz (1995) traz contri-

buições mais pragmáticas sobre psicodiagnóstico infantil grupal, e aborda procedi-

mentos que estejam de acordo com a orientação que se adota na clínica psicológica.

Assim, relata que utiliza testes como o WISC; o Teste do Desenho; Casa-Árvore-

Pessoa; o Procedimento de Desenhos-História de Walter Trinca; Teste de Apercep-

ção Temática para Crianças (CAT-A), entre outros, mas que, antes de iniciar qual-

quer testagem, conversa com as crianças sobre o que irá fazer e sobre o que se pre-

tende chegar a conhecer. Ao final da aplicação dos testes, conta para as crianças

como foi o seu desempenho.

Na prática clínica, o Teste WISC-III é um teste de inteligência apresentado sob

a forma de subtestes agrupados em Verbais e de Execução. Segundo Weiss (2001),

"o importante no uso de testes não é definir QI, mas verificar se o paciente está po-

dendo usar a inteligência a seu favor. Esclarece que é importante o registro minucio-

so de todas as respostas e atitudes durante a avaliação para chegar a uma idéia

mais precisa sobre o seu potencial" (p.114).

O desenho da dupla educativa, sistematizado por Malvina Oris e Pichona O-

campo (apud Weiss, 2001), esclarece a relação ensinante-aprendente, o papel vivi-

do na escola, em turma, as rejeições às situações escolares, ameaça da figura do

professor etc. (p. 120).

Os temas bastante pesquisados no grafismo são a figura humana, a árvore e a

casa. Estes temas podem constituir isoladamente um teste, ou podem constituir o

chamado H.T.P (House, Tree and Person), temas esses que são agrupados numa

seqüência mobilizadora e analisados em conjunto. O desenho da família também

revela as relações do paciente no núcleo familiar.

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Munhoz (1995) relata que, apenas quando está convicta de que os aspectos

importantes a respeito do estudo foram discutidos e devidamente esclarecidos, é

que propõe a sessão final, na qual lê e discute o relatório que elaborou. Fala sobre

as dificuldades e facilidades das crianças para aprender coisas novas, sobre as ati-

vidades que desempenham, como as realizam e em qual delas encontram maior ou

menor dificuldade, referindo-se aos aspectos intelectuais e psicomotores observa-

dos. Ao final, pergunta como se sentiram durante o trabalho, se houve mudanças em

sua forma de pensar, agir e sentir.

Munhoz (1995) esclarece:

A atitude de contar às crianças o que pude obter no processo de psi-

codiagnóstico está embasada na crença de que a criança não só é capaz

de receber e entender as informações a seu respeito, como tem o "direito"

de saber o que está acontecendo com ela, uma vez que foi levada a um

profissional para ser avaliada, sendo considerada pelos pais ou por quem

as encaminhou como portadora de algum "problema". (p. 190).

A autora salienta, ainda, que o momento mais rico desse trabalho tem sido a-

quele em que é possível penetrar no mundo das crianças, colocando-se em seu lu-

gar, sentindo o que sentem. Para isso, é necessário sair do papel interpretativo, libe-

rar a mente das suposições teóricas, e procurar, disciplinadamente, experimentar os

fenômenos como se apresentam. Para ela, tem sido a única forma possível de entrar

numa relação vivencial com a criança.

Munhoz menciona a forma cuidadosa de se relacionar com a criança nesse en-

foque psicodiagnóstico: "informo aos psicólogos interessados em trabalhar com esta

modalidade de atendimento que devem, como eu, ter o cuidado de verificar o "co-

mo", o "quando" e o "quanto" falar a cada criança" (p. 195).

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Outra pesquisa significativa voltada para clientes crianças é a de Becker

(2002), que estudou o psicodiagnóstico interventivo destacando a colaboração de

estagiários de psicologia para a devolutiva para as crianças, com o objetivo de sina-

lizar, esclarecer ou re-significar ao cliente sua experiência emocional e seus compor-

tamentos sintomáticos.

Segundo a autora, essa atitude "possibilita a expressão dos recursos já dispo-

níveis ou possíveis de serem ativados para uma efetiva compreensão e conseqüente

mudança na condição problemas" (p. 51).

Para Becker (2002), no diagnóstico interventivo o cliente "é um parceiro ativo

no processo, e o psicólogo compartilha continuamente a compreensão do problema.

Possibilita ao cliente atribuir significados às experiências vividas no processo e dar

valor à relação cliente-psicólogo. No diagnóstico infantil, então, esse conceito valeria

tanto para a criança quanto para os seus pais".

Em pesquisa com clientela infantil em período pré-operatório na qual utilizou

desenhos e estórias, Trinca (2002) esclarece que:

A intervenção (interpretação, orientação, apoio, esclarecimentos etc.)

vem clarificar a mente do paciente, os pontos nodais e/ou situacionais dos

conflitos e angústias. A seqüência de desenhos e estórias, combinada com

os demais elementos, pode fornecer ao psicólogo a base necessária para

que ele ofereça à criança a elucidação da problemática que opera nessa si-

tuação de crise. (p. 34).

Nossa opção pelo Psicodiagnóstico Interventivo ocorreu por propiciar uma rela-

ção psicólogo-cliente em que o cliente é acolhido em suas necessidades de forma

constante, imediata, o que facilita o entendimento da situação apresentada.

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Como a relação psicólogo-cliente, nessa abordagem, oportuniza ouvir o cliente

e a ele responder, nessa forma dinâmica, o psicodiagnóstico interventivo é um facili-

tador do entendimento das dificuldades.

1.4 O Transtorno de Déficit de Atenção Hiperatividade

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Desordens Mentais (APA, 2003) define o

Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) como um problema de saú-

de mental, que apresenta como característica essencial um padrão persistente de

desatenção e/ou hiperatividade, mais freqüente e severo do que aquele tipicamente

observado em crianças de mesma idade e que estão em nível equivalente de de-

senvolvimento.

O TDAH é uma condição cujas definições e nomes vêm sofrendo modificações

desde os primeiros estudos científicos dedicados a pesquisá-la. Em 1902, Still (apud

SCHWARTZMAN, 2001) a denominou de Defeito na conduta moral, ao notar que o

transtorno resultava em inabilidade da criança para internalizar regras e limites, co-

mo também na manifestação de sintomas de inquietação, desatenção e impaciência.

De 1930 a 1960, o conceito desse transtorno enfatizava o potencial para lesão

ou disfunção cerebral mínima (SCHWARTZMAN, 2001).

A primeira hipótese que relacionou a hiperatividade com a presença de lesão

cerebral mínima foi introduzida por Strauss e Lehtinen, em 1947 (apud

SCHWARTZMAN, 2001), quando explicaram sinais de inquietação e hiperatividade

em crianças diagnosticadas com a lesão.

Em 1962, o Grupo de Estudos Internacionais de Oxford, ao debater sobre a

precariedade da definição de lesão mínima do sistema nervoso central, propôs e

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consolidou o termo "disfunção cerebral mínima" (AJURIAGUERRA, 1976). A defini-

ção de "disfunção cerebral mínima" foi, então, publicada em 1962, pelo Serviço de

Saúde Pública de Oxford, da seguinte forma:

O termo disfunção cerebral mínima refere-se a crianças com inteli-

gência geral próxima da média ou superior à média, com distúrbios de a-

prendizagem e/ou de comportamento, que variam de grau leve a severo,

associados a desvios de funcionamento do sistema nervoso central . Esses

desvios manifestam-se por variadas combinações de déficit na percepção,

conceituação, linguagem, memória e controle da atenção dos impulsos ou

da função motor. Essas anomalias podem ser decorrentes de variações ge-

néticas, irregularidades bioquímicas, sofrimento perinatal, moléstia ou trau-

mas sofridos durante os anos críticos para o desenvolvimento e maturação

do sistema nervoso central (SNC), ou causas desconhecidas. A definição

admite a possibilidade de que privações severas precoces possam resultar

em alterações permanentes do SNC. Durante os anos escolares uma varie-

dade de incapacidades de aprendizagem constitui a mais importante mani-

festação do que é definido por disfunção cerebral mínima. (CLEMENTS,

PETERS, 1962, apud SCHWARTZMAN, 2001, p. 13).

Com o advento da segunda edição do Manual Diagnóstico e Estatístico das

Desordens Mentais (DSM-II) em 1968, a síndrome foi intitulada de "reação hiperciné-

tica da infância", e o transtorno foi caracterizado por "níveis excessivos de atividade"

(APA, 1968).

Em 1978, a nona edição da Classificação Internacional das Doenças (CID-9)

chamou-a de "síndrome hipercinética da infância", sob o código 314, incluindo três

subgrupos: "perturbação simples da atividade e atenção", "hipercinesia com atraso

do desenvolvimento", e "perturbação da conduta hipercinética" (OMS, 1978).

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29

Em 1980, a terceira edição do DSM (DSM-III) ampliou o conceito da condição,

incluindo a desatenção e a impulsividade em adição à hiperatividade e denominan-

do-a de "transtorno de déficit de atenção com ou sem hiperatividade" (APA, 1980).

Em 1987, o DSM-IV publicou nova designação: "transtorno de déficit de aten-

ção/hiperatividade", reinstituindo os critérios diagnósticos que passaram a exigir que

os sinais clínicos tenham início antes dos sete anos de idade, durem por mais de

seis meses, e incluam, pelo menos, oito dos 14 sinais descritos (APA, 1987).

A décima edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), publica-

da em 1993, manteve a nomenclatura de "transtornos hipercinéticos" (sob o código

F.90), que se referem a "transtornos emocionais e de conduta com início usualmente

ocorrendo na infância e na adolescência". Os transtornos hipercinéticos caracteri-

zam-se por início precoce, comportamento hiperativo, pobreza modular, desatenção

marcante, falta de envolvimento persistente nas tarefas, condutas invasivas nas si-

tuações e persistência no tempo dessas características de comportamento (OMS,

1993, p. 256).

A revisão do DSM-IV publicada em 1994 ratificou a denominação de "transtor-

no de déficit de atenção/hiperatividade", utilizando dois grupos de sintomas: a desa-

tenção e a hiperatividade/impulsividade. O déficit de atenção/hiperatividade está in-

cluído juntamente com os transtornos de aprendizagem (APA, 1995).

O diagnóstico do TDAH é eminentemente clínico, e se baseia em sintomas e

sinais manifestos por comportamentos característicos de desatenção e hiperativida-

de, num padrão mais severo e mais freqüente que o tipicamente encontrado em in-

divíduos em fases de desenvolvimento equivalente.

Neste sentido, o posicionamento de Andrade (2000) é bastante esclarecedor:

Na atualidade, o diagnóstico é eminentemente clínico, baseado nos

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30

dados colhidos, numa anamnese minuciosa, pela observação clínica do pa-

ciente, pelo exame neuropediátrico e pelas avaliações e testagem das áreas

comprometidas, já que estes dados serão fundamentais para o planejamen-

to do tratamento do paciente. (p. 116).

No quadro da página 31 estão transcritos os critérios diagnósticos para o TDAH

propostos pelo DSM-IV (APA, 1995, p. 83).

Outra classificação também utilizada, ainda que menos usualmente, por profis-

sionais e pesquisadores para o diagnóstico dos transtornos hipercinéticos é aquela

proposta pela CID-10 (ver quadro na página 32).

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31

Critérios Diagnósticos para Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade conforme o DSM-IV (APA, 1995).

A. Ou (1) ou (2)

1) seis (ou mais) dos seguintes sintomas de desatenção persistiram por pelo menos 6 meses, em grau mal-adaptativo e inconsistente com o nível de desenvolvimento: Desatenção: (a) freqüentemente deixa de prestar atenção a detalhes ou comete erros por descuido em atividades escola-res, de trabalho ou outras (b) com freqüência tem dificuldades para manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas (c) com freqüência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra (d) com freqüência não segue instruções e não termina seus deveres escolares, tarefas domésticas ou de-veres profissionais (não devido a comportamento de oposição ou incapacidade de compreender instruções) (e) com freqüência tem dificuldade para organizar tarefas e atividades (f) com freqüência evita, antipatiza ou reluta a envolver-se em tarefas que exijam esforço mental constante (como tarefas escolares ou deveres de casa) (g) com freqüência perde coisas necessárias para tarefas ou atividades (por ex., brinquedos, tarefas escola-res, lápis, livros ou outros materiais) (h) é facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa (i) com freqüência apresenta esquecimento em atividades diárias

(2) seis (ou mais) dos seguintes sintomas de hiperatividade persistiram por pelo menos 6 meses, em grau mal-adaptativo e inconsistente com o nível de desenvolvimento: Hiperatividade: (a) freqüentemente agita as mãos ou os pés ou se remexe na cadeira (b) freqüentemente abandona sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentado (c) freqüentemente corre ou escala em demasia, em situações nas quais isto é inapropriado (em adolescen-tes e adultos, pode estar limitado a sensações subjetivas de inquietação) (d) com freqüência tem dificuldade para brincar ou se envolver silenciosamente em atividades de lazer (e) está freqüentemente "a mil" ou muitas vezes age como se estivesse "a todo vapor" (f) freqüentemente fala em demasia Impulsividade: (g) freqüentemente dá respostas precipitadas antes de as perguntas terem sido completadas (h) com freqüência tem dificuldade para aguardar sua vez (i) freqüentemente interrompe ou se mete em assuntos de outros (por ex., intromete-se em conversas ou brincadeiras)

B. Alguns sintomas de hiperatividade-impulsividade ou desatenção que causaram prejuízo estavam presen-tes antes dos 7 anos de idade. C. Algum prejuízo causado pelos sintomas está presente em dois ou mais contextos (por ex., na escola [ou trabalho] e em casa). D. Deve haver claras evidências de prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional.

E. Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o curso de um Transtorno Invasivo do Desenvolvimen-to, Esquizofrenia ou outro Transtorno Psicótico e não são melhor explicados por outro transtorno mental (por ex., Transtorno do Humor, Transtorno de Ansiedade, Transtorno Dissociativo ou um Transtorno da Persona-lidade). Codificar com base no tipo:

F90.0 - 314.01 Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Tipo Combinado: se tanto o Critério A1 quanto o Critério A2 são satisfeitos durante os últimos 6 meses. F98.8 - 314.00 Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Tipo Predominantemente Desatento: Se o Critério A1 é satisfeito, mas o Critério A2 não é satisfeito durante os últimos 6 meses. F90.0 - 314.01 Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Tipo Predominantemente Hiperativo-Impulsivo: Se o Critério A2 é satisfeito, mas o Critério A1 não é satisfeito durante os últimos 6 meses. Nota para a codificação: Para indivíduos (em especial adolescentes e adultos) que atualmente apresentam sintomas que não mais satisfazem todos os critérios, especificar "Em Remissão Parcial".

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Critérios Diagnósticos para Transtorno Hipercinéticos conforme a CID-10. F90 Transtornos hipercinéticos

Grupo de transtornos caracterizados por início precoce (habitualmente durante os cinco primeiros anos de vida), falta de perse-verança nas atividades que exigem um envolvimento cognitivo, e uma tendência a passar de uma atividade a outra sem acabar nenhu-

ma, associadas a uma atividade global desorganizada, incoordenada e excessiva. Os transtornos podem se acompanhar de outras anomalias. As crianças hipercinéticas são freqüentemente imprudentes e impulsivas, sujeitas a acidentes e incorrem em problemas disciplinares mais por infrações não premeditadas de regras que por desafio deliberado. Suas relações com os adultos são freqüente-mente marcadas por uma ausência de inibição social, com falta de cautela e reserva normais. São impopulares com as outras crianças e podem se tornar isoladas socialmente. Estes transtornos se acompanham freqüentemente de um déficit cognitivo e de um retardo específico do desenvolvimento da motricidade e da linguagem. As complicações secundárias incluem um comportamento dissocial e uma perda de auto-estima.

Exclui:

- esquizofrenia (F20) - transtornos (da) (do):

- ansiosos (F41) - globais do desenvolvimento (F84) - humor [afetivos] (F30-F39)

F90.0 Distúrbios da atividade e da atenção Síndrome de déficit da atenção com hiperatividade

Transtorno de déficit da atenção com hiperatividade Transtorno de hiperatividade e déficit da atenção Exclui: transtorno hipercinético associado a transtorno de conduta (F90.1)

Com relação aos tipos de TDAH elencados pelo DSM-IV (Predominantemente

Desatento, Predominantemente Hiperativo-Impulsivo, e Tipo Combinado), Rohde e

Halpern (2004) esclarecem:

O tipo com predomínio de sintomas de desatenção é mais freqüente

no sexo feminino e parece apresentar, conjuntamente com o tipo combina-

do, uma taxa mais elevada de prejuízo acadêmico. As crianças com TDAH

com predomínio de sintomas de hiperatividade/impulsividade são, por outro

lado, mais agressivas e impulsivas do que aquelas com que outros dois ti-

pos e tendem a apresentar altas taxas de impopularidade e de rejeição pe-

los colegas. O tipo combinado apresenta um maior prejuízo no funciona-

mento global quando comparado aos dois outros tipos. (p. 66).

A taxa de prevalência do TDAH pode variar consideravelmente, levando-se em

conta fatores como a população estudada, os métodos de avaliação utilizados, crité-

rios diagnósticos empregados e a fonte de informação (BENCZIK, 2000).

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33

O DSM-IV (1994) estima prevalência entre 5% e 13%. Barkley (2002) relata

prevalência entre 3% e 7%. No Brasil ainda existem poucos estudos, e nenhum de-

les tem abrangência nacional; mas os números já constatados apontam para índices

semelhantes. Um desses estudos foi realizado com 1022 crianças em Porto Alegre

por Rohde (1997), que encontrou incidência de 5,8%. Na Paraíba, Barbosa (1995)

relatou 3,3% em estudo com amostra de pouco mais de cem estudantes.

Um fato relevante a destacar é que, de acordo com a fonte de informação, en-

contramos diferentes prevalências. Assim, os pais e a própria criança tendem a sub-

estimar a prevalência do TDAH, enquanto os professores tendem a superestimá-la.

Os educadores estimam o taxa de crianças com TDAH na idade escolar em torno de

15% a 20%, independentemente do sistema escolar e do nível sócio-econômico de

que provenham, taxa essa compatível com a de outros estudos realizados com cri-

anças alemãs (17,8%), americanas (11,4%) (apud ROHDE, 1997), e brasileiras

(15,2%) (BENCZIK, 1997).

Andrade (2000) apresenta alguns dados epidemiológicos importantes relativos

ao TDAH:

O Transtorno é mais freqüente no sexo masculino, variando de 4;1 a

9:1 dependendo da população e cultura. Tem uma prevalência de 3 a 5% da

criança em idade escolar. Existem estudos mostrando uma maior incidência

do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade em parentes do primeiro

grau (filhos de hiperativos têm oitos vezes mais risco de virem a ser hipera-

tivos); estudos também mostram uma maior prevalência de Transtorno do

Humor e de Ansiedade, Transtonos Relacionados ao Uso/abuso de Subs-

tancias Psicoativas e Transtorno da Personalidade Anti-social. (p.114).

Em pesquisa realizada por Araújo et al. (2001), foi investigada a percepção de

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34

um grupo de professores de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental, a partir da apli-

cação de um questionário aberto composto de cinco perguntas, sobre questões que

indagavam desde o que é hiperatividade até comportamentos que caracterizam o

sujeito hiperativo. Os resultados demonstraram que, apesar de a maioria responder

que convivia com alunos hiperativos, o relato de outros comportamentos associados,

como o egocentrismo e relacionamentos autoritários, descaracterizou a identificação

do TDAH. Isso levou os autores a concluir que, ainda hoje, há grande desinformação

por parte dos professores, principalmente no que se refere às causas e aos sintomas

característicos do transtorno, e sugeriram a elaboração de programas psicoeduca-

cionais que instruam os professores sobre o TDAH.

O insucesso dos adultos em reconhecer o TDAH na vida de uma criança pode

deixá-la com constante sentimento de fracasso em todas as áreas de sua vida.

Barkley (2002) afirma que entre 30% e 50% dessas crianças podem estar sujei-

tas a repetir o ano ao menos uma vez. Cerca de 35% não chegam a completar o

Ensino Médio. Para a metade dessas crianças, os relacionamentos sociais ficam

seriamente comprometidos e, para mais de 60%, comportamentos profundamente

desafiadores levam a mal-entendidos e ressentimentos por parte dos colegas, fre-

qüentes desentendimentos e punições, e a um grande potencial para a delinqüência

e abuso de drogas, mais tarde.

Barkley (2002) faz uma analogia esclarecedora sobre o que pode acontecer de

desastroso na vida social de uma criança com TDAH:

estamos começando a compreender como esses "átomos" de com-

portamentos momentâneos do TDAH passam a formar "moléculas " da vida

diária, como essas "moléculas " formam componentes sociais da existência

semanal e mensal, e como esses "componentes" sociais formam os está-

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35

gios maiores ou estruturas no desenvolvimento de uma vida durante anos.

Como resultado vemos que o TDAH não é apenas a hiperatividade ou dis-

tração do momento ou a incapacidade de conseguir realizar o trabalho diá-

rio, mas um relativo enfraquecimento na maneira como o comportamento é

organizado e dirigido rumo ao mundo do amanhã. Isto esclarece os motivos

pelos quais aqueles com o transtorno lutam para conseguir se adaptar ás

demandas da vida social e freqüentemente fracassam em alcançar objetivos

e metas que tentaram estabelecer para si próprios. (p. 40).

É por isso que, conforme afirmam Souza, Ingberman (2000), o diagnóstico e o

início de tratamento precoce para o TDAH são de importância fundamental para que

se evitem conseqüências psicológicas piores, ocorrência de distúrbios co-mórbidos e

o surgimento de grandes prejuízos na vida adulta.

Um tratamento eficaz envolve a combinação de medicamentos e psicoterapia.

As medicações mais utilizadas são os psicoestimulantes. Mas Andrade (2000) ad-

verte que o tratamento medicamentoso deve ser estritamente cauteloso e parcimo-

nioso.

O tratamento não deve se restringir apenas o uso de medicamentos,

mesmo porque a maioria desses pacientes apresenta, como já comentado,

um comprometimento mais extenso do que uma alteração da atenção, ou

hiperatividade. Deste modo, dependendo das manifestações clínicas, pode

ser necessário uma terapia fonoaudiológica, ludoterapia ou uma abordagem

psicopedagógica para aprimorar a sua performance e melhora sua conduta.

(ANDRADE, 2000, p. 116).

As intervenções psicoterápicas comportamentais podem seguir pressupostos

teóricos cognitivistas, de análise do comportamento, ou ainda basear-se em ambas

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36

as linhas. É importante considerar que a seleção de estratégias para tratamento de-

ve estar voltada para cada criança individualmente. Também têm papel no tratamen-

to o apoio e a compreensão da família e das pessoas que mais convivem com a cri-

ança (SOUZA, INGBERMAN, 2000).

Barkley (2002) relata que alguns estudos científicos sugerem a relação entre

agentes causadores potenciais e a ocorrência de problemas no comportamento ca-

racterísticos do TDAH. Cita, por exemplo, que mães que fumam durante a gravidez

apresentam um crescente risco de hiperatividade e falta de atenção no produto des-

sa gravidez. Mas ressalta, logo em seguida, que o fato de dois eventos ou condições

ocorrerem juntos não prova que um seja o causador do outro.

Segundo o mesmo autor, a ciência ainda tem muito para nos explicar sobre as

verdadeiras causas do TDAH; entretanto, grandes avanços foram feitos nos últimos

anos, no sentido de desvendá-las. Todas as evidências científicas, hoje, apontam os

fatores neurológicos geneticamente determinados como a causa mais importante.

Pesquisadores têm voltado os seus esforços ao estudo do TDAH quase que

exclusivamente do ponto de vista sintomatológico. Ao se basearem em critérios pu-

ramente sintomatológicos, embora sejam seguramente muito úteis, deixam de lado

toda a investigação semiológica e o estudo psicodinâmico que, por sua vez, podem

auxiliar em critérios prognósticos adequados e na proposição de uma correta estra-

tégia terapêutica.

Marcelli (1998) destaca:

Nenhuma compreensão psicodinâmica é considerada, sendo a crian-

ça com TDAH vista como se não fosse um ser social, engajada em uma sé-

rie de interações (família, escola) que podem assim desempenhar seu pa-

pel. As múltiplas especificações da criança não apenas devido à sua matu-

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ração, à sua dependência ao meio, mas também ao seu psiquismo em via

de estruturação parecem ignoradas, bem como toda abordagem psicodinâ-

mica que dá um sentido a essas condutas, além de um simples "déficit". (p.

285).

Gabbard (1998) esclarece que o diagnóstico psicodinâmico tem o propósito de

informar e orientar o planejamento terapêutico global, visto que a adesão de qual-

quer intervenção terapêutica, seja ela medicamentosa, psicológica, de orientação

sexual, modificação de comportamento, terapia familiar, ou de grupo, será afetada

pelo substrato caracteriológico individual. Além disso, utilidade de um diagnóstico

dinâmico não se limita aos pacientes cujo tratamento prescrito seja a psicoterapia

dinâmica.

Gebara et al. (2003) conduziram estudo para compreender a personalidade de

uma criança com TDAH diagnosticado pelos critérios do DSM-IV. Para tanto, aplica-

ram o CAT-A (Teste de Apercepção Temática), e observaram algumas distorções da

percepção do conteúdo animal, sugerindo relações com o conflito vivido pela crian-

ça. Os resultados também revelaram alguns acréscimos indicando a presença de

angústia nessas situações. De forma geral, a criança se manteve dentro do espera-

do em relação ao estímulo apresentado, e apresentou tanto linguagem compatível

com seu nível sociocultural e com sua idade cronológica quanto coerência e logici-

dade regulares.

Analisando os aspectos psicodinâmicos, as autoras entenderam que os com-

portamentos dessa criança têm um sentido e refletem o sofrimento e a angústia que

interferem em sua vida, dificultando seu desenvolvimento, o que justifica a necessi-

dade de atendimento psicológico a partir do qual seja criado um vínculo de continên-

cia para que suas dificuldades possam ser trabalhadas, propiciando uma experiência

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verdadeiramente mutativa.

Por fim, é importante destacar a presença de comorbidades psiquiátricas que

podem estar associadas ao TDAH, e cujos comprometimentos para a criança podem

ser ainda piores do que as conseqüências do próprio déficit de atenção e hiperativi-

dade.

Em pesquisa recentemente realizada na Faculdade de Ciências Médicas de

Porto Alegre por Possa et al. (2005), a maioria das crianças com TDAH apresentou

alguma co-morbidade psiquiátrica, e as mais freqüentes foram o Transtorno de Con-

duta e o Transtorno Opositor Desafiante. Assim, as autoras salientaram a necessi-

dade relevante de se investigarem comorbidades associadas em casos de TDAH,

cuja identificação pode ser fundamental para o sucesso do tratamento.

O TDAH é condição que ainda exige pesquisas constantes, já que o seu co-

nhecimento ainda está sendo construído. Da mesma forma, cabe aos clínicos que

lidam com essas crianças questionamentos constantes e intensos para melhor aten-

dê-las e para aprimorar a prática profissional com essa população.

Em minha prática profissional é freqüente atendermos pais que, por razão do

mau desempenho escolar de seus filhos, procuram orientação e intervenção psico-

lógica. Sendo necessário, mediante meu psicodiagnóstico, solicito parecer neuroló-

gico para poder confirmar o diagnóstico e propor intervenção.

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39

CCaappííttuulloo IIII

MMééttooddoo ddee PPeessqquuiissaa ______________________________________________________

2.1 Procedimento Metodológico

Esta pesquisa pautou-se pelo referencial metodológico da pesquisa qualitativa

voltada para questionamento sistemático e crítico de três casos atendidos em con-

sultório de psicologia.

A escolha pela pesquisa qualitativa ocorreu com o objetivo de ampliar o conhe-

cimento da relação psicólogo-cliente, buscar fundamentação teórica e elucidar um

tipo de relação que parece trazer conforto ao cliente.

Para tanto é necessário reportarmo-nos ao referencial de pesquisa qualitativa

expressa por André (apud LINCON, GUBA, 1985, p. 58):

... as abordagens qualitativas levam à proposição de novos critérios

de julgamento, alguns se contrapondo aos já conhecidos e respeitados, ou-

tros se referindo aos aspectos específicos de novos tipos de estudo. Para

substituir a validade surge a plausibilidade, no lugar da fidedignidade apare-

ce a credibilidade, em vez de generalização fala-se em transferência.

Para a realização da pesquisa utilizamos como referencial o critério destacado

por ANDRÉ:

Que o trabalho de pesquisa seja devidamente planejado, que os da-

dos sejam coletados mediante procedimento rigorosos, que a análise seja

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densa e fundamentada que o relatório descreva claramente o processo se-

guido e os resultados alcançados. (2001, p. 57).

Com base nesses pressupostos buscamos analisar a relação psicólogo-cliente

como um facilitador do entendimento das queixas apresentadas.

2.1.1 Participantes

Foram participantes desta pesquisa três crianças (Lucas, Carlos e Roberto)

com o diagnóstico médico de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade

(TDAH).

2.1.2 Procedimentos

A realização dessa pesquisa foi devidamente aprovada pelo Comitê de Ética

em Pesquisa da Universidade Presbiteriana Mackenzie, e foi iniciada após a devida

apresentação da Carta de Informação (Anexo 1) aos responsáveis pelas crianças,

que assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 2).

2.1.2.1 Coleta de dados

Informações sobre as crianças e sobre as queixas que as levaram ao consultó-

rio se encontram no Relato Resumido das Entrevistas com os Pais, apresentado no

Anexo 3.

Foram coletados dos prontuários de clínica psicológica e psicopedagógica re-

cortes dos relatórios de atendimento (Anexo 4) que priorizassem três itens:

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- queixa que levou os pais a buscarem atendimento psicológico aos filhos;

- descrição do contato com a criança, palavras, gestos, escolhas de atividades;

- situações e atividades descritivas da relação psicólogo-cliente.

2.1.2.2 Análise dos dados

Os dados foram analisados em três etapas:

Etapa 1: Levantamento das categorias

Na primeira etapa procedeu-se ao levantamento das categorias em dois mo-

mentos:

A. Definição das categorias

Primeiramente, as categorias foram elencadas tendo como referencial a Fun-

damentação Teórica da investigação, objetivando-se explicitar as características do

Psicodiagnóstico Interventivo.

B. Categorização dos dados do atendimento

Posteriormente, a categorização dos dados dos sujeitos da pesquisa ocorreu a

partir dos registros das sessões, identificando situações ilustrativas das categorias

características do Psicodiagnóstico Interventivo para cada uma das três crianças

atendidas.

Etapa 2: Agrupamento das categorias

A leitura e a releitura dos dados categorizados evidenciaram que poderiam ser

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42

agrupados em quatro grandes itens ilustrativos das principais diretrizes do atendi-

mento:

Agrupamento 1: Incluir o paciente no processo;

Agrupamento 2: Abrir uma clareira no existir do paciente;

Agrupamento 3: Intervir, clarificando o que o paciente diz e mostra;

Agrupamento 4: Penetrar no mundo do paciente livre de suposições teóricas.

Foram realizados os agrupamentos de cada uma das três crianças.

Etapa 3: Reflexão sobre os dados

A reflexão sobre os dados pautou-se na seqüência dos Agrupamentos apre-

sentados, iniciando-se com as categorias mais convergentes, que aparecem no a-

tendimento das três crianças, caminhando para o que é menos convergente, que

apareceu apenas no atendimento de uma das crianças.

2.2 Apresentação dos dados

2.2.1 Levantamento das categorias

No quadro a seguir se encontra o levantamento das 18 categorias elencadas

com base no referencial teórico (ver página seguinte).

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43

Levantamento das categorias de análise C1 Estabelecer um diálogo incluindo o cliente no processo diagnóstico.

C2 Discussão dos recursos e situações com o cliente e possíveis conclusões.

C3 Apontamentos interventivos: quando introduzir estranheza no relacionamento, o cliente confronta-se com a ruptura.

C4 Observação pertinente, oportuniza o cliente tomar contato com aspecto de sua personalidade.

C5 Singularidade se estabelece à medida que o psicólogo mostra ao cliente o que ‘lhe parece’ através do que o cliente está lhe trazendo.

C6 Clareira, o iluminar de um momento, desestrutura o estabelecido, favorecendo novas compreensões.

C7 Compreensão da problemática do indivíduo e intervenção nos aspectos emergentes.

C8 Psicodiagnóstico interventivo permite promover experiências que sejam mutativas.

C9 O cliente se torna um parceiro ativo e envolvido no diagnóstico e na solução de seus problemas.

C10 Interpretar não é decifrar; é dar a ver, dar a ver o sentido do fenômeno tal como o apreendi.

C11 Compreendemos o presente através das intenções, modos de ver e preconceitos que o passado nos transmitiu.

C12 Não há interpretação sem relação com o presente e este nunca é permanente ou rígido. O significado não é uma propriedade imutável de um objeto, o significado é sempre para nós.

C13 Compreender uma fala é estar pronto para que nos diga algo e a ela responder, e nesta resposta procu-rar promover novas possibilidades.

C14 O conhecimento que o cliente traz é valorizado, e é a partir dele que minhas falas terão ou não sentido. , a intervenção deve pertencer ao campo de possibilidades do cliente, margeando aquilo que ele não compreende

C15 Antes de iniciar qualquer testagem, conversa com as crianças sobre o que irá fazer e sobre o que se pretende chegar a conhecer.

C16 Momento mais rico aquele em que é possível penetrar no mundo das crianças - sair do papel interpreta-tivo, liberar a mente das suposições teóricas, experimentar os fenômenos como se apresentam.

C17 O cliente é um parceiro ativo no processo, e o psicólogo compartilha continuamente a compreensão do problema. Possibilita ao cliente atribuir significado às experiências vividas.

C18 Intervenção (interpretação, orientação, apoio, esclarecimentos etc.) vem clarificar a mente do paciente, os pontos nodais e/ou situacionais dos conflitos e angústias.

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44

2.2.2 Agrupamento das categorias

No quadro seguinte se encontra a distribuição das categorias levantadas entre

os quatro agrupamentos previamente definidos.

Agrupamento 1: Incluir o paciente no processo

C1 Estabelecer um diálogo incluindo o cliente no processo diagnóstico.

C2 Discussão dos recursos e situações com o cliente e possíveis conclusões.

C9 O cliente se torna um parceiro ativo e envolvido no diagnóstico e na solução de seus problemas.

C15 Antes de iniciar qualquer testagem, conversa com as crianças sobre o que irá fazer e sobre o que se pretende chegar a conhecer.

C17 O cliente é um parceiro ativo no processo, e o psicólogo compartilha continuamente a compreensão do problema. Possibilita ao cliente atribuir significado às experiências vividas.

Agrupamento 2: Abrir uma clareira no existir do paciente

C3 Apontamentos interventivos: quando introduzir estranheza no relacionamento, o cliente confronta-se com a ruptura.

C4 Observação pertinente, oportuniza o cliente tomar contato com aspecto de sua personalidade.

C6 Clareira, o iluminar de um momento, desestrutura o estabelecido, favorecendo novas compreensões.

C8 Psicodiagnóstico interventivo permite promover experiências que sejam mutativas.

Agrupamento 3: A intervenção clarifica o que o paciente diz e mostra

C5 Singularidade se estabelece à medida que o psicólogo mostra ao cliente o que ‘lhe parece’ através do que o cliente está lhe trazendo.

C7 Compreensão da problemática do indivíduo e intervenção nos aspectos emergentes.

C10 Interpretar não é decifrar; é dar a ver, dar a ver o sentido do fenômeno tal como o apreendi.

C12 Não há interpretação sem relação com o presente e este nunca é permanente ou rígido. O significado não é uma propriedade imutável de um objeto, o significado é sempre para nós.

C13 Compreender uma fala é estar pronto para que nos diga algo e a ela responder, e nesta resposta procu-rar promover novas possibilidades.

C18 Intervenção (interpretação, orientação, apoio, esclarecimentos etc.) vem clarificar a mente do paciente, os pontos nodais e/ou situacionais dos conflitos e angústias.

Agrupamento 4: Penetrar no mundo do paciente livre de suposições teóricas

C11 Compreendemos o presente através das intenções, modos de ver e preconceitos que o passado nos transmitiu.

C14 O conhecimento que o cliente traz é valorizado, e é a partir dele que minhas falas terão ou não sentido. , a intervenção deve pertencer ao campo de possibilidades do cliente, margeando aquilo que ele não compreende

C16 Momento mais rico aquele em que é possível penetrar no mundo das crianças - sair do papel interpreta-tivo, liberar a mente das suposições teóricas, experimentar os fenômenos como se apresentam.

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45

2.2.3 Etapa 1: Categorização dos dados

Nas páginas seguintes, são apresentados os dados de cada um dos três sujei-

tos da pesquisa adequados às categorias levantadas e cabíveis a cada caso.

Os dados de cada categoria destacada para cada criança são apresentados em

quadros independentes. Os dados de Lucas estão em sete quadros (Quadros L1 a

L7); os de Carlos, em nove (Quadros C1 a C9), e os de Roberto, em 14 (Quadros R1

a R14).

2.2.3.1 Lucas

Quadro L1. C2 - Discussão dos recursos e situações com o cliente e possíveis con-clusões. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Perguntei o que ele queria fazer,

Responde ao solicitado pela psicóloga: Desenhar. (Figura 1).

Eu coloquei papéis sobre a mesa,

Pegou o lápis, desenhou um sol depois pediu tinta e pintou. Parecia um sol com a boca costu-rada.

Perguntei: O que é?

É um sol?

Mas parece que está com a boca costurada!

É isso mesmo.

Falei que deveria ser horrível ter a boca costu-rada, não poder falar.

Falou que todos falam mal dele.

Comentei: não é que seja ruim ter a boca costu-rada, acho que você tem vontade de costurar a bocas das pessoas para não falarem mal de você.

Sorriu, e falou que a pintura precisava secar.

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Figura 1. Quadro L2. C17 - O cliente é um parceiro ativo no processo, e o psicólogo compar-tilha continuamente a compreensão do problema. Possibilita ao cliente atribuir significados às experiências vividas. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Lucas já havia mencionado que falam mal dele. Minha intenção nesse momento é procurar saber como ele percebe isso. Mencionei: Lucas, no encontro passado, você falou que as pessoas falam mal de você, por quê?

Respostas ao solicitado pela psicóloga. Faço as coisas erradas.

Explique-me melhor?

Abre a mala, pega sua apostila. A capa está quase solta, abre a apostila, na disciplina de matemática, aponta os exercícios e fala: Erra-do, Errado. Anda pela sala e volta a sentar-se. Levanta, vai até a janela, volta e mexe no material.

É! As coisas não estão fáceis para você. Você não consegue parar (me referi à agitação), isso pode atrapalhar você conseguir aprender. Não aprendendo, você irá cometer erros e irá rece-ber críticas.

Franze a testa Volta a andar pela sala. É, eu não consigo parar.

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Quadro L3. C4 - Observação pertinente, oportuniza o cliente tomar contato com aspecto de sua personalidade.

Situação 1 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Nessa sessão pretendia retomar o desenho "do sol", mas devido à forma como entra no consul-tório, parece muito irritado, dou a opção para escolher o que fazer.

Escolheu jogar. Jogamos "jogo da velha", ele perdeu e falou: droga! Andou pela sala, foi até a janela.

Eu mencionei que é chato perder.

Falou: vamos jogar dama!

Aceitei, montamos o tabuleiro.

Apresentou dificuldade para jogar, movimentou as pedras de forma errada, queria fazer tudo rápido.

Vou orientando sobre as regras.

Jogamos, ele ganhou. Ao terminar volta a andar pela sala.

Comentei: você percebeu! Nós jogamos, você perdeu e andou pela sala, depois você ganhou e também andou pela sala. Você não consegue ficar parado. Mencionei que a agitação que ocorre indepen-dente das facilidades (ganhar o jogo) ou dificul-dade (perder o jogo)

Responde: Não consigo mesmo! Olha-me de forma séria.

Situação 2 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU O jogo consiste em um da dupla tirar a carta, lê o que está escrito, por exemplo: objetos cortan-tes e o outro tem que falar, dentro de um tempo dado por um temporizador, tudo que lembrar sobre o tema exemplo: faca, tesoura, estilete..., depois inverte-se tirando nova carta. Ganha a jogada quem falar mais coisas no tempo estipulado. Jogamos, e Lucas perdeu.

Falou vamos jogar, concordei, fomos para o tapete e escolheu o jogo que tem o nome "Jogo deu Branco".

Você fica muito agitado. Será que foi por isso que você perdeu, esqueceu diversas palavras, deu branco?

Pela primeira vez deu muita risada.

Parece que você gostou da coincidência das palavras "Deu branco" em você e o nome do jogo é "Deu branco". Será que também dá branco na escola.

Confirma, balançando a cabeça.

Mencionei: Que droga que isso acontece!

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Quadro L4. C6 - Clareira, o iluminar de um momento, desestruturando o estabele-cido e favorecendo a novas compreensões.

Situação 1 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Desenhe "Como você se sente na sala de au-la".

Responde ao solicitado pela psicóloga. Lucas desenhou um rosto, com os olhos por onde saem setas, apontando para todos os lugares. (Figura 2).

Explica-me o que você desenhou?

Está olhando para todos os lados.

Que difícil e cansativo ficar olhando para todos os lados. Perguntei como então você deveria ficar na sala de aula?

Rapidamente pela um lápis para desenhar Desenhou um rosto de um menino, destacando os olhos, sem setas.

E agora, o que é?

Prestando atenção, olhando para a professora.

Conversamos sobre o desenho, mencionei que parecia ser muito difícil para ele ficar olhando para a lousa e prestar atenção no que era ensi-nado, embora soubesse que precisava fazer isso.

Presta atenção na nossa conversa.

Situação 2 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Perguntei: você gostaria de fazer mais dese-nhos de como você se sente na aula.

Responde ao solicitado pela psicóloga Desenhou o rosto de um menino com a palavra história entrando por um ouvido e saindo pelo outro, colocou símbolos não decifráveis. (Figura 3).

Isso também é bastante difícil, pois parece que você escuta algo e não entende nada. Pergun-tei como deveria ser?

Desenhou um rosto de um menino com a pala-vra história entrando por um ouvido e saindo pelo outro.

Perguntei: O que é?

É um aluno na aula de história e no dia da pro-va sabe responder.

Comentei: O que você fez é muito legal, você está percebendo como é em sala de aula e como deveria ser. E isso é muito importante, porque você poderá tentar mudar essa situa-ção. Lucas concordou e combinamos que podería-mos criar situações que facilitaria ter mais aten-ção.

Olha-me com atenção de forma mais relaxada.

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Figura 2.

Figura 3.

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Quadro L5. C13 - Compreender uma fala é estar pronto para que nos diga algo e a ela responder, e nesta resposta procurar promover novas possibilidades. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU

Entrou com a mala, colocou a sobre a mesa e a abriu, tirou um caderno e uma apostila, andou pela sala, sem seguida pegou na caixa de brin-quedos dois carrinhos, um avião e dois dinos-sauros e os colocou sobre a mesa. Abriu o caderno com a intenção de mostrar-me algo, mas logo s e distraiu com os brinquedos.

Comentei: Espera aí ! Levantei peguei um lençol e cobri os brinque-dos e perguntei: Será que assim fica melhor, você consegue abrir o caderno e me mostrar o que quer?

Sorriu abriu a apostila na disciplina de matemá-tica.

Conversei com ele que se colocasse muita coisa na mesa, logo iria se distrair e não faria nada. Perguntei se agia da mesma forma em sua casa e na sala de aula.

Respondeu que não daquele jeito, mas fazia.

Pedi para experimentar só colocar a apostila, o caderno, um lápis, caneta e borracha.

Balança a cabeça concordando

Quadro L6. C14 - A partir do conhecimento do que o cliente traz que minhas falas terão ou não sentido, a intervenção deve pertencer ao campo de possibilidades do cliente, margeando aquilo que ele não compreende.

Situação 1 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Perguntei como as coisas estavam?

Responde ao solicitado pela psicóloga. É "muita coisa". Levantou-se e foi até a janela, depois abriu a caixa de brinquedo, pegou um avião e brincou de forma bastante agitada, com movimentos rápidos,

Comentei que parecia que o avião estava deso-rientado e indaguei: será que você também está assim?

Falou da prova de matemática, português, história, se expressou de forma confusa.

Comentei que não entendi direito para me ex-plicar melhor

Falou: Deixa pra lá!.

Situação 2 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU

Apontou a dificuldade em matemática. Mostrou-me um exercício, expressão numérica, em que para realizá-lo é necessário cálculos em diver-sas etapas.

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Pedi para que fizesse novamente um exercício que já havia errado em sala de aula.

Fez o exercício da mesma forma errado.

Comparamos os dois exercícios observamos que havia feito da mesma forma, todas as eta-pas. Sugeri que observássemos e comparás-semos com um exercício similar e correto.

Percebeu o erro, comparando as etapas.

Valorizei falando que ele sabia sim, só tinha duvida em uma passagem e o mais legal sabia corrigir comparando.

Sorri

Quadro L7. C18 - A intervenção (interpretação, orientação, apoio, esclarecimentos etc.) vem clarificar a mente do paciente, os pontos nodais e/ou situacionais dos conflitos e angústia. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU

Entra e fala que quer desenhar, faz um dese-nho e colagem, um personagem com a boca muito aberta gritando: "Uma prova atrás da outra! Estudar muito!". (Figura 4).

Perguntei como assim ?

Respondeu: Estou tendo provas todos os dias.

Deve estar muito difícil para você, se pudesse, gostaria de gritar assim na escola!

Sorri e fala: é isso aí.

Figura 4.

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2.2.3.2 Carlos

Quadro C1. C1 - Estabelecer um diálogo incluindo o paciente no processo diagnós-tico. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Iniciei perguntando se sabia por que estava ali.

Respondeu: Para você me ajudar, porque vou muito mal na escola.

Comentei: Nós iremos fazer várias atividades, e também conversaremos, para sabermos porque você vai mal na escola e o devemos fazer para superar isso.

Balança a cabeça concordando.

Quadro C2. C9 - O cliente se torna um parceiro ativo e envolvido no diagnóstico e na solução de seus problemas.

Situação 1 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU

Escolheu o "jogo da velha", e jogamos. Às ve-zes ele ganhava, às vezes eu ganhava.

Mencionei: Você não é mal nisso, aprendeu legal.

Sorriu.

Qual é a sua dificuldade na escola?

Respostas ao solicitado pela psicóloga. Gostaria de estar na 7a série.

Por quê?

Já teria aprendido tudo isso, é que na verdade deveria estar na 6 a série, mas repeti a 1a.

Comentei: As coisas parecem confusas, e deve ser chato estar na 5a série querendo estar na 7ª sendo que, se não tivesse repetido estaria na 6ª série, mas 5 ª série é a série você está!

É chato estar na 5ª série!

É! Poderemos conversar mais sobre isso.

Situação 2 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Gostaria que você fizesse um desenho! Dese-nhe o que você quiser. Coloquei lápis e papéis sobre a mesa.

Respostas ao solicitado pela psicóloga. Desenha com atenção um menino. (Figura 5).

Perguntei: Me fale sobre o que você desenhou?

Como assim?

Imagine quem é essa pessoa, quantos anos tem...

É um menino, tem 13 anos, gosta de andar de skate e estuda na (menciona uma das melhores

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escolas da região, conhecida por ter ex-alunos aprovados na USP). É muito inteligente, está na 1a série do Ensino Médio.

Acho que você gostaria de ser este garoto!

"Oh!".

Comento: Parece que você está muito preocu-pado com a idade e com a série em que uma pessoa está na escola, e você faz confusão.

Como assim?

Será que dá para um garoto de 13 anos estar na 1a série do Ensino Médio?

Por que não?

Comento: Faça a relação com a idade e com a série, com 13 anos estaria na 7a série!

É mesmo!

Você também falou sobre a série quando disse que gostaria de estar na 7a série. Acho que você não está se sentindo bem na série que está!

Sorriu.

Figura 5.

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Quadro C3. C6 - Clareira, o iluminar de um momento, desestruturando o estabele-cido e favorecendo novas compreensões. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Explico que através dos desenhos conversare-mos como ele aprende. Peço para desenhar "Como alguém aprende" e "Como alguém Ensina". "Como alguém aprende": "Como alguém ensina":

Respostas ao solicitado pela psicóloga: Desenha uma orelha e escreve do lado som. (Anexo 6a). Desenha olhos, nariz e uma grande boca. (Figura 6b).

Parece que para você aprender só basta escu-tar o que o outro tem para falar, mas será que não é mais do que isso?

Eu acho!

Pense como o seu avô ensinou você a jogar palitinho.

Ensinando.

Mas como?

Ele jogava sobre a mesa os palitos e me ensi-nava a pegar.

Você pegava?

Pegava.

Comento: Então a gente aprende fazendo. Se seu avô só falasse e você só escutasse prova-velmente não teria aprendido a jogar com facili-dade.

Fica pensativo.

Figura 6a. Figura 6b.

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Quadro C4. C5 - Singularidade se estabelece à medida que o psicólogo mostra ao cliente o que "lhe parece" através do que o cliente está lhe trazendo. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU

Carlos falou da professora que brigou com ele; contou que uma menina disse para a professo-ra que ele estava jogando bolinhas de papel, a professora brigou com ele, e ele xingou a meni-na de forma muito agressiva.

Como você xingou a menina?

Responde ou comenta com a psicóloga: "Com palavrões".

Parece que você não consegue se controlar e isso pode ser uma confusão, porque você aca-ba brigando com os colegas.

Eu brigo mesmo.

Mostrei dois papéis, um pequeno e outro gran-de. Falei que acontecia algo do tamanho do papel pequeno e ele sentia e respondia propor-cional ao papel de tamanho grande.

Entendeu o comentário balançando a cabeça em sinal de afirmação.

Quadro C5. C10 - Interpretar não é decifrar; é dar a ver, dar a ver o sentido do fe-nômeno tal como o apreendi. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU

Comentou sobre a escola: um colega brigou com outro, ele foi separá-los e bateu naquele que julgava estar errado.

Comento: Me explique melhor.

Eles estavam brigando, devido ao jogo de fute-bol, que a gente faz no recreio. Eu fui separá-los e bati no que estava errado.

É parece estranho, você foi separá-los e aca-bou batendo! Você pode ter desejado separar os dois, mas "puxou" a briga para você.

Como assim?

Eu entendi assim: Havia duas pessoas brigan-do, você foi separá-las, separou, e bateu em um menino, puxou a briga para você!

Ah!

Faz expressão que entendeu e ficou pensativo.

Fica pensativo, cala-se!

Expliquei que através dos desenhos da casa, árvore e uma família poderíamos conversar sobre como ele está no momento.

Pedi para desenhar.

Resposta ao solicitado pela psicóloga: Desenho de sua casa de campo.

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Fale-me sobre a casa.

É grande, bonita, tem muito espaço. (Figura 7).

Comento: Diferente da escola?

Muito diferente! Desenho de um coqueiro. (Figura 8).

Onde está esse coqueiro?

Está numa praia lá na Bahia.

Como está o tempo? Tem muita gente?

Está calor, tem muita gente na praia, jogando bola, tomando sol.

Você gostaria de estar lá ?

E como!

Quem são?

Desenhou três pássaros voando. (Figura 9). É uma família de pássaros: pai, mãe e filho.

Para onde estão indo?

Para as montanhas.

Lá também deve ser muito bonito!

Exclama: Oh!

Os três desenhos são sobre lugares livres, ale-gres e festivos. Você gosta muito disso?

Eu gosto.

A escola para você parece um pouco com isso?

Não.

Será que quando você está na escola fica pen-sando nesses lugares?

É, eu fico pensando na minha casa de campo.

Então não dá para prestar atenção na aula?

Silencia.

Figura 7. Figura 8.

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Figura 9. Quadro C6. C13 - Compreender uma fala é estar pronto para que nos diga algo e a ela responder, e nesta resposta procurar promover novas possibilidades. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Ofereço a possibilidade de escolher o que quer fazer.

Dirigiu-se para o espaço dos brinquedos.

Após mexer em jogos como memória, dominó, deu branco, cilada e outros, interessou-se pelo jogo de varetas, perguntou se eu jogaria com ele, confirmei, e iniciamos o jogo.

Mostrou-se atento e cuidadoso.

Tinha estratégias para pegá-las, como colocar uma vareta como apoio para a outra escorre-gar, apertar a ponta da vareta para levantá-la e pegá-la na outra extremidade, agachar-se para ver em quais uma estava apoiada. Sabia as regras com clareza, mencionou a diferença dos pontos relacionada às cores diferentes das varetas. Valorizei dizendo que ele era muito bom no jogo.

Respondeu: é isso eu sei jogar bem, acho que só isso.

Respondi: Precisamos então descobrir em que outras coisas você também é bom.

Olha-me atentamente.

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Quadro C7. C18 - Intervenção (interpretação, orientação, apoio, esclarecimentos etc.) vem clarificar a mente do paciente, os pontos nodais e/ou situacionais dos conflitos. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Aplicação e explicação do teste WISC III. O teste foi aplicado em duas etapas. Falei para Carlos que gostaria que ele fizesse uma teste que consiste em diversas atividades, expliquei que esse teste serve para verificar as facilidades e dificuldades que uma pessoa pos-sui em alguns aspectos. Disse que após analisá-los lhe explicaria os resultados.

Após aplicação mostrei o WISC III, expliquei: Você tem facilidade em: aritmética, conheci-mento da sequência lógica, sabendo organizar histórias com início, meio e fim.

Aceitou fazer o teste Perguntas e comentários sobre o teste Aquelas histórias dos quadrinhos então eu fui bem?

Respostas e comentários Foi sim, como também naquelas perguntas de matemática.

Mas eu vou mal na escola.

Eu entendo o que você diz, mas você possui condições para aprender. Você tem dificuldade para compreender as palavras, falta vocabulário, o que contribui com que vá mal na escola.

Olha-me com atenção Eu não entendo geografia e historia...

Eu sei disso, você deve ter dificuldade para entender o que a professora explica e o que está escrito. Você entende, compreende o que a professora fala?

Muitas vezes não.

É nós temos que encontrar estratégias para amenizar suas dificuldades.

Balança a cabeça confirmando

Quadro C8. C11 - Compreender o presente através das intenções, modos de ver e preconceitos que o passado nos transmitiu. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Jogou palitos Perguntei: Como aprendeu?

Responde ao solicitado pela psicóloga. O meu avô me ensinou quando eu era peque-no. Ele era muito bom nisso.

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59

Você jogava muitas vezes?

Jogava, quase sempre.

Demorou para você aprender a jogar dessa forma, foi difícil?

No começo eu perdia, depois eu só ganhava.

Então, você aprendeu treinando! É treinar tam-bém é uma forma de se aprender na escola.

Fez expressão que entendeu e continuamos a jogar.

Quadro C9. C14 - A partir do conhecimento do que o cliente traz que minhas falas terão ou não sentido, a intervenção deve pertencer ao campo de possibilidades do cliente, margeando aquilo que ele não compreende. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Jogou palitos Perguntei: Como aprendeu?

Responde ao solicitado pela psicóloga. O meu avô me ensinou quando eu era peque-no. Ele era muito bom nisso.

Você jogava muitas vezes?

Jogava, quase sempre.

Demorou para você aprender a jogar dessa forma, foi difícil?

No começo eu perdia, depois eu só ganhava.

Então, você aprendeu treinando! É treinar tam-bém é uma forma de se aprender na escola.

Fez expressão que entendeu e continuamos a jogar.

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2.2.3.3 Roberto

Quadro R1. C1 - Estabelecer um diálogo incluindo o paciente no processo diagnós-tico. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Dou oportunidade para escolher o que fazer e orientar como fazer.

Escolheu jogar dardos e colocou as regras. Vale os pontos do tabuleiro: se cair no meio vale o menor ponto; devemos ficar aqui (quarta lajota).

Roberto fica agitado, joga rapidamente e com força. Suas orientações são claras e rígidas.

Quadro R2. C9 - O cliente se torna um parceiro ativo e envolvido no diagnóstico e na solução de seus problemas. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Conforme combinado anteriormente eu escolheria o jogo depois ele. Eu escolho jogar trilha!

Movimenta os braços de forma agitada Responde: Não quero.

Falo: Puxa, também é difícil para você fazer o que foi combinado, o que o outro pede. Antes você não quis mais jogar porque jogou errado e perdeu, agora você não quer fazer o que combinamos. Você fala muito "não". (tomo cuidado ao falar, para que ele não perceba meu comentário, como crítica e sim como uma forma de agir)

Silenciou, olhou para baixo, ficou pensativo.

Quadro R3. C15 - Antes de iniciar qualquer testagem, conversa com a criança so-bre o que irá fazer e sobre o que se pretende chegar a conhecer. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Na sessão seguinte retomo que eu iria escolher o que fazer. Peço para desenhar porque perce-bo que Roberto já é mais flexível nesta ativida-de. Gostaria que você fizesse dois desenhos. Você falou que as coisas não dão certo na escola, com estes desenhos poderemos conversar sobre porque as coisas não dão certo na esco-la.

Responde: Está bem.

Coloquei papéis e lápis sobre a mesa. Gostaria que você desenhasse "Como alguém aprende".

Mexe no material Como assim?

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Desenhe o que uma pessoa faz para aprender.

Desenhou uma mulher sentada, uma mesa, uma menina com algo grande na mão e dese-nhou uma estrela sem usar a régua. (Figura 10).

Agora desenhe "Como alguém ensina"

Desenhou uma casa e três pessoas. Falou que desenhou em forma de palitos porque era mais fácil. Fez vários pontinhos e uma estrela. (Figura 11).

Figura 10.

Figura 11.

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Quadro R4. C17 - Compreendemos o presente através de modos de ver e precon-ceitos do passado. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Peço para falar sobre o seu desenho. Quem disse que tem que ser retinho? (destaco esta fala repetindo) Aqui você pode fazer seus desenhos sem ré-gua, mesmo se os achar feios, para mim de-senho é desenho. Tente fazer sem régua! Você é muito bom tanto no lançamento de dardos quanto nas contas. Percebo que fala com seriedade.

Responde: Ficou tudo torto Roberto pede régua Só sei fazer coisas com régua. Sem régua fica tudo torto, feio Olha-me com seriedade Roberto inicia o desenho sem a régua. Não sou bom nas contas. Franze a testa.

Quadro R5. C3 - Apontamentos interventivos: quando introduz a estranheza no re-lacionamento, o cliente confronta-se com a ruptura. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Fala que quer desenhar Respondo: Pode. Ofereço condições colocando papéis, lápis preto e colorido.

Pede régua.

Dou a régua. Fez uma estrela grande, com ângulos bem deli-neados . (Figura 12).

Menciono: Está muito bonita!

Só sei fazer coisas com régua.

Por quê?

Sem régua fica tudo torto, feio.

Aqui você pode fazer seus desenhos sem ré-gua, mesmo se os achar feios, para mim de-senho é desenho. Tente fazer sem régua!

Franze a testa e olha-me estranhando o meu comentário Inicia o novo desenho sem a régua.

Quadro R6. C4 - Observação pertinente, oportuniza o cliente tomar contato com aspecto de sua personalidade. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Comento: O lápis que esta no chão não tem culpa do seu desenho não ter saído como gos-taria e você é muito duro com você mesmo. O que você acha?

Eu fico com raiva.

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Figura 12. Quadro R7. C6 - Clareira, o iluminar de um momento, desestruturando o estabele-cido, favorecendo novas compreensões. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Nesta sessão Roberto brincou com a pedra e espoja, comparando-as primeiro com olhos abertos e depois fechados em seguida colocou-as na água.

Responde ao solicitado pela psicóloga: Com os olhos abertos. A pedra é pesada!

E o tamanho?

Grande.

E se cair no pé?

Machuca.

E a esponja? É grande ou pequena?

Grande.

E se cair no pé?

Não machuca.

A pedra é quente ou fria?

Com os olhos fechados: Fria e dura.

E a esponja?

É mais quente e macia.

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Colocando a pedra e a esponja na água. Conversamos que a água entra na esponja e que não entra na pedra. Conversei com Roberto porque eu havia falado que ele parecia pedra: era porque ele era bra-vo, não aceitava perder (rígido), tinha dificulda-de para aceitar o que o outro falava, como a pedra (que não entra água). Poderia ser legal experimentar ser esponja: aceitar que às vezes pode perder, errar, não sendo tão duro consigo próprio. Ouvir o que o outro fala, como a esponja, que aceita a entra-da da água, assim, provavelmente, poderia se dar melhor na escola.

Brinca, movimentando a pedra e a esponja na água

Quadro R8. C5 - Singularidade se estabelece à medida que o psicólogo mostra ao cliente o que "lhe parece" através do que o cliente está lhe trazendo. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Comentei que, quando falei, no encontro ante-rior, que ele parecia pedra, é que ele parecia ser sempre pedra, "aí não dá certo". Propus que relacionassemos a pedra e a es-ponja com o que acontecia no seu dia-a-dia. Jogar o jogo longe quando perde?

Olha-me com atenção. Responde ao solicitado pela psicóloga. Pedra.

Achar que seus desenhos são sempre feios?

Pedra.

Não fazer o combinado?

Pedra.

Eu peguei a esponja e perguntei: Qual a situa-ção que se parece mais com uma esponja?

Sorriu e falou: Eu sei.

Respondo: Esponja.

Pergunta: Fazer o que o outro pede?

Esponja.

Fazer a lição?

Esponja.

Atender quando a mãe chama para o almoço?

Roberto entendeu a "brincadeira" e continua-mos.

Fala de forma vibrante sobre várias situações vivenciada por ele.

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Respondi que sim.

Ao final Roberto perguntou se poderia chamar a mãe para mostrar a pedra e a esponja.

A mãe falou que estava entendendo a "brinca-deira", comentou que ele havia conversado com ela sobre a pedra e a esponja e que ele parecia pedra. Confirmei. Despedimo-nos.

Chamou a mãe, pegou a pedra e falou: Isto parece quando eu estou bravo e não quero fazer as coisas, e a esponja, quando não estou.

Quadro R9. C7 - Compreensão da problemática do indivíduo e intervenção nos as-pectos emergentes. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU

Escolhe jogar dama, ele perde, fica irritado, faz cara feia, empurra o jogo.

Comento: Quando as coisas saem erradas, você perde, você empurra longe. Parece que quer tirar da sua frente.

Me olha.

Eu continuo. É! Aqui tem certo e errado, você fez a jogada errada e perdeu. Será que você empurra a lição e para de fazer as coisas na escola quando erra?

Abaixa a cabeça

Se faz isso, pode ser uma "encrenca", porque na escola passam várias atividades, se não fizer ou fizer errado pode se dar mal". Você quer conversar sobre a escola?

Não gosto de fazer contas, não sou bom em contas. Lá tem que fazer muitas coisas e sai errado.

Comento: Estranho, em um de nossos encon-tros você fez contas de mais, que na escola chamam de adição, de cabeça. E parecia bom nisso.

Responde: Lá (na escola) não.

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Quadro R10. C10 - Interpretar não é decifrar. É dar a ver, dar a ver o sentido do fenômeno tal como o apreendi. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Jogamos e ele perdeu. Comentei que perder para ele era insuportável e fazer o que o outro pedia era muito difícil.

Escolheu jogar jogo da velha. Jogamos, ele perdeu, ficou irritado, cruzou os braços e fez cara feia, não empurrou o jogo.

A forma como agia fazia com que parecesse uma pedra, e as pedras são duras e podem machucar, e que talvez fosse mais legal ele experimentar (às vezes) ser esponja, que é macia. Perguntei se queria que eu trouxesse esponja e pedra no próximo encontro para continuarmos o nosso papo.

Falou que sim.

Quadro R11. C12 - Não há interpretação sem relação com o presente, o significado não é permanente ou rígido, não é uma propriedade do objeto, se faz na relação. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Você é muito bom tanto no lançamento de dardos quanto nas contas.

Responde ao solicitado pela psicóloga. Não sou bom nas contas.

Ofereço oportunidade para que Roberto reco-nheça a sua facilidade, eu faço as contas na lousa e mostro que o resultado foi o mesmo. Comento: você pode não ser bom em outras coisas, mas nestas contas você é bom.

Fala com seriedade e franze a testa. Não sou bom não.

Menciono que entendo o que está falando, mas o que observo é diferente, ou seja, tanto as contas que fez de cabeça como as que fizemos na lousa deu o mesmo resultado. Aceito o seu parecer e continuo o jogo.

Olha-me atentamente.

Quadro R12. C18 - Intervenção (interpretação, orientação, apoio, esclarecimentos) vem clarificar a mente do cliente, os pontos nodais e/ou situacionais dos conflitos. ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Conversamos sobre o desenho, exploro os dados e busco esclarecimento de como se re-laciona com a aprendizagem.

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Mostrei o seu desenho de "Como Alguém A-prende" . Pergunto: Me explique o que você desenhou.

Responde ao solicitado pela psicóloga: É a professora ensinando a menina.

Pergunto: O que é isso na mão da menina?

É o caderno.

Parece que, apesar da menina estar sorrindo, deve ser muito difícil para ela carregar aquele caderno, pois é muito grande e deve ter muita lição.

Sorri e concorda.

Comento: Puxa! A mesa da professora é mais alta do que a menina, deve ser difícil para ela aprender, não dá para ver direito o que a pro-fessora escreve no caderno! Quando você iniciou aqui, falou que ia mal em tudo, será que é difícil para você aprender, como a menina do desenho? Entendo! Silenciei.

Olha para o desenho e movimenta a cabeça em sinal de entendimento. Eu não gosto de fazer lição, eu erro quando escrevo.

Peguei o outro desenho que fez de "Como al-guém ensina" para que comentasse.

Olha para o desenho Estão em um sítio, deitados na grama, conver-sando, olhando as estrelas.

Que "legal"! Seria maravilhoso se a gente pu-desse aprender assim, e o mais legal seria aprender como você falou: "conversando". Continuo mencionando. Conversar é um falar e o outro escutar, depois quem escutou fala e o outro escuta, é essa troca.

Sorri Ouve com atenção e sorri.

Quadro R13. C14 - A partir do conhecimento do que o cliente traz que minhas falas terão ou não sentido, a intervenção deve pertencer ao campo de possibilidades do cliente, margeando aquilo que ele não compreende.

Situação 1 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Iniciei perguntando se sabia por que estava ali comigo. Ele me olha sério e responde.

Respondeu: Sim, é que eu vou mal em tudo.

Percebo que está precisando falar, mas explo-rar o consultório atrai mais sua atenção, aten-do sua necessidade e mostro o consultório

Demonstra curiosidade pelos jogos, perguntan-do sobre os mesmos.

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Situação 2 ATITUDE DA PSICÓLOGA O QUE A CRIANÇA MANIFESTOU Dando continuidade à proposta de desenhar sem régua.

Desenhou uma casa com porta, janelas, chami-né e jogou o lápis no chão. (Figura 13).

Menciono: Que chato que o desenho não saiu como você queria, mas aqui não tem certo nem errado quando se trata de desenho.

Ficou parado, sério, depois pegou outro lápis e continuou a desenhar. Fez menino e menina jogando futebol, jardim com flores e árvores, várias famílias de animais, pássaros voando, sol.

Ofereço condições para que continue dese-nhando não me manifestando frente a sua atitude.

Desenha com movimentos rápidos.

Figura 13.

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Quadro R14. C16 - Momento mais rico é aquele em que é possível penetrar no mundo das crianças – sair do papel interpretativo, liberar a mente das suposições teóricas, experimentar. Peguei o desenho de "Como alguém ensina" para que comentasse.

Estão em um sítio, deitados na grama, conver-sando, olhando as estrelas.

Que "legal"! Seria maravilhoso se a gente pu-desse aprender assim, e o mais legal seria aprender como você falou: "conversando". Continuo mencionando. Conversar é um falar e o outro escutar, depois quem escutou fala e o outro escuta, é essa troca.

Ouve com atenção e sorri.

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2.2.4 Etapa 2: Agrupamentos das categorias

2.2.4.1 Lucas

Agrupamento 1:

Incluir o paciente no processo, as situações que seguem.

Lucas demonstra por meio do desenho sua acentuada insatisfação em ser criti-

cado e o desejo de pôr fim a esta situação. Lucas percebe e concorda com a minha

observação sobre sua agitação, quando me refiro ao seu comportamento (C2).

Lucas relata que falam mal dele porque faz coisas erradas; entende que isso

ocorre na disciplina de matemática porque comete sucessivos erros, mostra-me sua

apostila. Anda pela sala, vai até a janela, volta a mexer no material da escola. Apon-

to que está agitado e esse comportamento pode dificultar sua aprendizagem (C17).

Agrupamento 2:

Abrir uma clareira no existir do paciente, as situações que seguem.

Lucas percebe e concorda com o meu apontamento quando me refiro à sua a-

gitação: Ocorre independentemente do que acontece (ganhar ou perder no jogo)

(C4).

Em duas situações foram realizadas conversas sobre seu desenho, introduzin-

do o recurso "Como Você Se Sente na Sala de Aula" e "Como Deveria Ser". Lucas

consegue expressar "Como Você Se Sente na Aula" por meio do desenho de um

menino que recebe informações através dos olhos (visão) vindas de todas as dire-

ções, e através do ouvido (audição), não entendendo o que o professor fala. No de-

senho "Como deveria Ser" expressa que sabe que deveria concentrar sua atenção

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(visão) na professora e entender o que a professora fala (audição) (C6). Utilizando o

lúdico (jogo "Deu Branco"), Lucas percebe que sua agitação atrapalha seu desem-

penho (não consegue responder o que é solicitado porque "deu branco"). Aceita es-

sa "descoberta" de forma descontraída (C8).

Agrupamento 3:

Intervir clarificando o paciente diz e mostra, a situação que segue.

Lucas coloca sobre a mesa material escolar e brinquedos, sendo que queria

mostrar apenas o material escolar; eu favoreço experimentar uma outra maneira de

comportar-se, selecionando o que pretende fazer. Lucas percebe que seu compor-

tamento contribui para que se distraia a ponto de não saber qual é seu objetivo mai-

or. Entende e aceita ser orientado para experimentar novo comportamento (C13).

A partir do seu desenho, converso e exponho a Lucas que ele demonstra raiva,

cansaço, tem vontade de gritar, em conseqüência das várias provas e de ter que

estudar muito. Lucas concorda com o meu parecer, mostro que entendo a amplitude

de seus sentimentos (C18).

Agrupamento 4:

Penetrar no mundo do paciente livre de suposições teóricas, as situações

que seguem.

Lucas brinca com um avião fazendo como se este estivesse desgovernado.

Verbalizo seu comportamento visando sua confirmação. Pergunto se está se sentin-

do desorientado como o avião. Prefere não falar a respeito. Aceito sua opção. Em

outro momento, Lucas aponta sua dificuldade em matemática (expressões numéri-

cas); descobrimos que é capaz de fazer o exercício de forma correta, desde que se-

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lecione uma estratégia conveniente (comparar o exercício realizado corretamente e

o errado) (C14).

2.2.4.2 Carlos

Agrupamento 1:

Incluir o paciente no processo, as situações que seguem.

Carlos entende que a psicóloga poderá ajudá-lo a melhorar seu desempenho

na escola, e lhe é participado que, por meio de conversas e atividades, buscarão

formas para superar as dificuldades (C1).

Mostro que possui facilidade para jogar; concorda com esse elogio. Pergunto

se sabe qual é a sua dificuldade na escola; responde que gostaria de estar numa

série mais avançada, tendo já ultrapassado suas dificuldades. Por meio do desenho,

manifesta o desejo idealizado de ser um menino mais velho, muito inteligente, evi-

denciando sua insatisfação com o seu momento presente (C9).

Agrupamento 2:

Abrir uma clareira no existir do cliente, as situações que seguem.

Por meio do seu desenho "Como Alguém Aprende" e "Como Alguém Ensina",

Carlos entende que ensinar está relacionado ao falar e ao aprender a escutar. Ilustra

uma ampliação dessa compreensão em que não aparece sua participação de forma

ativa; reporto-me ao seu histórico e, assim, exemplifico que já experimentou que a-

prender está relacionado ao fazer (C6).

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Agrupamento 3:

Intervir clarificando o que o paciente diz e mostra, as situações

que seguem.

Carlos fala que xingou uma menina, usando palavrões, por tê-lo denunciado à

professora porque estava jogando bolinhas de papel, sendo repreendido pela pro-

fessora. Aponto a forma exagerada de como reagiu, mostro de forma material como

isso acontece. Peguei dois papéis de tamanhos diferentes, mencionei que acontecia

algo, comparei com um papel pequeno, e ele sentia e respondia proporcionalmente

ao papel do tamanho grande. Carlos mostra que entendeu balançando a cabeça

(C5). Carlos conta que, visando acabar com uma briga entre colegas, envolve-se na

briga e, ao contrário do que desejava, agride um dos envolvidos. Relato o aconteci-

mento, enfocando o seu comportamento contraditório; faz expressão que entendeu a

incoerência entre sua intenção e sua ação e se cala (C10).

Carlos escolheu jogar varetas, e falei que apresenta facilidade nesse jogo.

Concordou comigo, mas percebe-se pouco capaz. Propus que descobríssemos em

quais outras atividades apresenta também facilidade (C13).

Desenha casa, árvore e família, e em todos manifesta o desejo de estar em

contato com a natureza; é lembrado de que a escola não está inserida nessa dinâ-

mica. Afirma que quando está na escola fica pensando em estar em contato com a

natureza, livre. É explicado e aplicado o teste WISC-III, depois são discutidos os re-

sultados. Obteve facilidade em aritmética, conhecimento da seqüência lógica, sa-

bendo organizar histórias com início, meio e fim. Apresenta falta de vocabulário, o

que vem dificultando sua aprendizagem. Ficou esclarecido que juntos encontrare-

mos estratégias para amenizar suas dificuldades (C18).

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Agrupamento 4:

Penetrar no mundo do paciente livre de suposições teóricas, a situação

que segue.

Pergunto como aprendeu tantas estratégias no jogo de varetas, e Carlos men-

ciona que foi praticando com seu avô; destaco que foi treinando que se aperfeiçoou.

2.2.4.3 Roberto

Agrupamento 1:

Incluir o paciente no processo, as situações que se seguem.

Roberto escolhe jogar dardos, impõe regras, eu as aceito (C1). Roberto aceita

minhas instruções para que desenhe "Como Alguém Aprende" e "Como Alguém En-

sina", e oriento que por meio dos desenhos tentaremos entender suas dificuldades

(C15). Como Roberto se negasse a fazer o combinado (jogar), tal comportamento é

aproveitado para mostrar-lhe também sua intolerância frente às suas dificuldades

(C9). Roberto manifesta insatisfação com o seu desenho; menciono que o desenho

não tem que corresponder ao que ele considera ser perfeito. Conversamos sobre

seu desejo de estar em um lugar livre, no campo (C17).

Agrupamento 2:

Abrir uma clareira no existir do paciente, as situações que seguem.

Roberto concorda em desenhar sem régua, sendo mais flexível, após eu men-

cionar que não há julgamento para esta atividade (C3). Comento que é "muito duro"

consigo mesmo, já que demonstra insatisfação, agressividade (joga o lápis no chão),

quando não corresponde ao que deseja (C4). Partindo de uma atuação prática ele é

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levado a perceber e conhecer as diferenças entre ser flexível ou rígido. Introduzo o

seu comportamento na dinâmica (C6).

Agrupamento 3:

Intervir clarificando o que o paciente diz e mostra as situações

que seguem.

Relacionando seus comportamentos com objetos, de forma lúdica, foi possível

Roberto perceber suas características: agressividade, impulsividade, rigidez (C5).

Roberto, por meio do jogo, percebe como age quando não atinge o seu objeti-

vo, fica irritado, impulsivo. Comparo esta situação com o seu comportamento na

escola (C7). Roberto demonstra irritação mediante frustração em perder no jogo,

aceita a observação que faço mostrando tal comportamento, concorda em nos

aprofundarmos nessa dificuldade a partir de comparação com objetos, facilitando o

entendimento de como é ser flexível e rígido (C10). Provo sua eficiência em fazer

contas mostrando que o resultado das contas que faz mentalmente está correto. Não

concorda em possuir esta facilidade; diante deste comportamento não insisto e

retornamos à atividade (C12). Conversamos sobre seu desenho de "Como Alguém

Aprende". Concordamos que ocorre dificuldade para ele aprender, pois utiliza

recursos inadequados (impedindo a visualização para um melhor entendimento).

"Como Alguém Ensina" mostra situação idealizada, em que há uma liberdade que a

escola não oferece e destaca o diálogo como forma de ensinar (C18).

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Agrupamento 4:

Penetrar no mundo do paciente livre de suposições teóricas, as

situações que seguem.

Percebo que quer conversar sobre suas dificuldades na escola, coloco-me a-

cessível, sente-se atraído para conhecer o consultório, procuro atendê-lo respeitan-

do sua necessidade. Apesar de mostrar intolerância no momento em que não atinge

seu objetivo, ao ser incentivado retoma sua atividade (desenhar) (C14). Aceito a si-

tuação idealizada em que há liberdade e valorizo o diálogo como forma de ensinar

(C16).

2.2.5 Etapa 3: Reflexões sobre os dados

Retomamos esta terceira etapa da análise dos dados organizados conforme os

agrupamentos das categorias relacionadas anteriormente: 1) Incluir o paciente no

processo; 2) Abrir uma clareira no existir do cliente; 3) Intervir clarificando o que o

paciente diz e mostra; e 4) Penetrar no mundo do paciente livre de suposições teóri-

ca.

Estaremos mencionando cada um dos agrupamentos na seqüência que apare-

ceu na Etapa 2. Iniciaremos daquelas mais convergente, isto é, que aparecem no

atendimento das três crianças, para o que é menos convergente, aparecendo ape-

nas no atendimento de uma das crianças.

Agrupamento 1:

Incluir o paciente no processo.

Nas sessões oferecemos a cada uma das crianças oportunidade para escolher

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o que fazer bem como, às vezes, orientar as atividades a serem realizadas. Isso faci-

litou o nosso relacionamento e propiciou que participassem ativamente do processo

de atendimento. Essa característica do diagnóstico interventivo aparece nos quadros

de Levantamento das Categorias e de Agrupamentos das Categorias.

Conversei com Carlos sobre como seria nossos encontros e que buscaríamos

formas de ajudá-lo. Visei com isso interagir, incluindo-o no processo diagnóstico

(Quadro C1. C1).

No encontro com o Roberto, dei oportunidade para que ele escolhesse o que

fazer e me orientasse nas atividades, o que facilitou o nosso relacionamento e a

compreensão do seu modo de ser (Quadro R1. C1).

Essas intervenções, conforme Santiago (1995), são um compartilhar de um

trabalho compreensivo de forma a escutá-lo, estabelecendo um verdadeiro diálogo.

A atividade que propusemos propiciou oportunidade para que Carlos mostrasse

estar insatisfeito em relação à série escolar em que se encontra. Por meio de dese-

nhos ficou clara sua insatisfação e a idealização que fazia em ultrapassar suas difi-

culdades de aprendizagem, sem esforço (Quadro C2. C9).

Com Roberto dialogamos a respeito de sua dificuldade em cumprir o que foi

previamente combinado e sua atitude em não aceitar seu erro. Quando perdeu a

partida de um jogo, negou-se a continuar jogando. Desta forma foi possível pontuar

como reage frente a uma frustração (Quadro R2 C9).

Segundo Ancona-Lopez (1987), o cliente se torna um parceiro ativo e envolvido

no diagnóstico e na solução de seus problemas, transformando-o em conhecimento

pessoal que pode ser utilizado nas soluções de problemas presentes ou futuros.

No atendimento com o Lucas, devido ao seu comportamento na sessão, foi

possível evidenciar sua agitação. Visando fazê-lo compreender a conseqüência des-

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se comportamento, esclarecemos como a sua aprendizagem pode estar sendo pre-

judicada devido a isso (Quadro L2. C17).

No atendimento, Roberto manifestou insatisfação com o seu desenho. Busquei

uma reflexão, comentando que o desenho não tem que corresponder ao que ele

considera ser perfeito (Quadro R4. C17). Identificamos sua insatisfação com o seu

momento (escola), pois desejava estar em um lugar livre, no campo.

Objetivei com essas intervenções o que Becker (2002) esclarece como "possi-

bilitar a expressão dos recursos já disponíveis ou possíveis de serem ativados para

uma compreensão e conseqüente mudança na condição problemas".

Utilizando o desenho realizado por Lucas e dialogando a respeito de seu signi-

ficado, foi possível compreender como se sentia frente às suas dificuldades (Quadro

L1. C2).

Conforme Ancona-Lopez (1984), as informações devem ser discutidas

diretamente com os clientes, estabelecendo com eles possíveis conclusões.

Uma atitude importante no psicodiagnóstico interventivo é o esclarecimento

que o psicólogo deve fazer quando solicita uma atividade previamente organizada

(testes ou desenhos). Sempre que utilizei esses recursos esclareci o cliente para

que soubesse o que faria e o que se pretendia com a atividade.

Podemos ilustrar esta forma de abordagem no atendimento de Roberto. Escla-

recemos, antes de ele desenhar, que faria dois desenhos que representassem "Co-

mo Alguém Ensina" e "Como Alguém Aprende", e que essa atividade poderia facilitar

o entendimento sobre suas dificuldades em relação à escola (Quadro R3. C15).

Munhoz (1995), embasada na fenomenologia-existencial, relata que utiliza tes-

tes, mas que, antes de iniciar qualquer testagem, conversa com a criança sobre o

que irá fazer e sobre a que se pretende chegar a conhecer.

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Agrupamento 2:

Abrir uma clareira no existir do paciente.

Utilizando o lúdico, desenhar e brincar, foi possível identificar, clarificando, a

forma como os clientes se relacionavam com o outro.

Por meio do desenho, Carlos mostrou como se relacionou com a aprendiza-

gem, Como Alguém Aprende e Como Alguém Ensina. Em ambos os casos, não apa-

rece sua participação ativa. Reportando-nos ao seu histórico foi possível esclarecê-

lo, pela sua própria experiência, de que também se aprende exercitando (Quadro

C3. C6).

Da mesma forma, por meio dos desenhos, Lucas revelou que se sentia disper-

so em sala de aula, sem concentração, e também mostrou que tem conhecimento de

como deveria se comportar para aprender. Procuramos mostrar-lhe que já fez a dis-

tinção a respeito da maneira correta de como deve se comportar para aprender

(Quadro L4. C6).

Com Roberto utilizamos objetos como pedra e esponja, visando fazê-lo distin-

guir suas características. Relacionamos as características desses dois objetos com

seu comportamento (Quadro R7. C6).

O iluminar de um momento, segundo Ancona-Lopez (1995), de algum modo

pode desestruturar o estabelecido. Destruída ou abalada a maneira usual de o clien-

te agir, ele se verá diante da necessidade de uma reorganização, o que abrirá a

possibilidade de novas escolhas.

No atendimento, Lucas apresentou dificuldade em jogar. Reportamo-nos à sua

agitação, comentamos que esta vem atrapalhando o seu desempenho, e esclarece-

mos que pode ter perdido a partida devido à falta de concentração, por estar agita-

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do. Voltou a jogar permitindo que fosse orientado sobre as regras.

Em outro momento quando Lucas se mostrava agitado, assinalamos que sua

agitação independia da situação em que se encontrava. Concordou reiterando que

não consegue mesmo ficar parado (Quadro L3. C4).

Com Roberto mencionamos que ele era "muito duro" consigo mesmo, e

demonstrava insatisfação, agressividade, quando não correspondia ao que

desejava. O cliente concordou e reiterou "que fica com raiva" (Quadro R6. C4).

Essa forma de relação psicólogo-cliente não é um processo que garante mu-

dança; segundo Santiago (1995), pode resultar em uma possibilidade de mudança, e

isso ocorre a partir de uma observação pertinente, no momento oportuno, e é útil

porque pode possibilitar ao cliente tomar contato com determinado aspecto de sua

personalidade.

Ao concordar com a nossa observação de que foi possível desenhar sem usar

régua, como costumava fazer, Roberto, que apresentou perfeição nas formas, permi-

tiu-se experimentar desenhar de forma diferente, livre de julgamentos (Quadro R5.

C3).

Com esta forma de interação psicólogo-cliente, podemos nos reportar aos es-

clarecimentos de Ancona-Lopez (1995) que menciona que os apontamentos serão

interventivos se não repetirem as situações de vida cotidiana do cliente. Dito em ou-

tras palavras, quando se introduz a estranheza no relacionamento, de modo a fazer

o cliente confrontar-se com uma ruptura.

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Agrupamento 3:

Intervenção clarifica o que o paciente diz e mostra.

O desenho, dirigido ou não, nos três casos que seguem, foi uma forma de ex-

pressão que facilita o entendimento das dificuldades.

Carlos manifestou o desejo de estar em um lugar livre, em contato com a natu-

reza. Propusemos uma reflexão sobre este desejo e sobre ter que estar na escola.

Com essa abordagem, evidenciamos que, quando está na escola, pensa em estar

no campo (Quadro C7. C18).

Em outro encontro, após explicação e aplicação do teste WIC-III, esclarecemos

Carlos sobre os resultados positivos e sobre as áreas em que apresentou dificulda-

de. Propusemos encontrarmos juntos estratégias para superar essas dificuldades.

No atendimento a Roberto, esclarecemos que seu desenho expressou que a

dificuldade na aprendizagem pode ocorrer pela utilização de recursos inadequados;

já em outro desenho manifestou o desejo de aprender por meio de conversas, num

ambiente livre, em contato com a natureza, diferente do que vivencia (Quadro R12.

C18).

Buscamos entender o desenho feito por Lucas, refletimos e concordamos que

se sentia cansado, com raiva, por estar vivenciando um momento difícil (provas

constantes) (Quadro L7. C18).

Buscamos com essas intervenções, conforme ilustra Trinca (2002), clarificar a

mente do paciente, os pontos nodais e/ou situacionais dos conflitos e angústias.

Com Carlos, que apresentou comportamento impulsivo, pudemos mostrar a

forma exagerada como vem agindo. Refletimos a respeito de uma situação vivencia-

da por ele, em que ficou evidenciado o seu comportamento desproporcional e a-

gressivo. Comparamos dois objetos iguais, porém de tamanhos diferentes, com a

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situação que vivenciou e a sua reação. O objeto menor equivaleu à situação e o

maior, à sua reação (Quadro C4. C5).

Em outro momento Roberto apresentava um comportamento rígido. Visando

fazer com que percebesse sua forma de agir, propusemos que relacionássemos su-

as reações com objetos de características opostas (esponja e pedra), para conseguir

atribuir o devido valor ao seu comportamento (Quadro R8. C5).

Segundo Ancona-Lopez (1995), a singularidade se estabelece à medida que o

psicólogo mostra ao cliente o que "lhe parece" pelo que o cliente está lhe trazendo.

No atendimento com Roberto propiciamos, de forma lúdica, a comparação de

objetos, como esponja e pedra, com sua maneira de agir, e refletimos a respeito

(Quadro R10. C10). Esta forma particular de intervir facilitou seu entendimento em

relação aos benefícios e às dificuldades que seu comportamento pode vir a acarre-

tar.

Em outro caso, Carlos relatou sua experiência no envolvimento em uma briga,

visando separar colegas que brigavam; sem prévia intenção, envolve-se e agride um

deles (Quadro C5. C10).

É possível identificar comportamento contraditório e impulsivo; repetimos sua

história enfocando partes nas quais tal comportamento apareceu, possibilitando seu

entendimento.

Para Ancona-Lopez (1987) interpretar não é decifrar, é dar a ver, dar a ver o

sentido do fenômeno tal como o apreendi.

Em um dos atendimentos com Carlos, que apresentou dificuldade na aprendi-

zagem, valorizamos a facilidade que demonstrou no jogo. Mesmo negando sua ca-

pacidade, propusemos identificar outras atividades que poderá desempenhar com a

mesma facilidade (Quadro C6. C13).

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Lucas demonstrou acentuada dificuldade em organizar-se. Tinha intenção de

mostrar-me seu material escolar, mas distraiu-se e, esquecendo seu primeiro objeti-

vo, misturou material escolar com brinquedos. Respondemos a essa dificuldade se-

parando os brinquedos do seu material escolar, de forma que percebeu, visualizan-

do, a possibilidade de conseguir se organizar (Quadro L5. C13).

Buscando uma intervenção esclarecedora, Ancona-Lopez (1987) conclui que

compreender uma fala é estar pronto para que nos diga algo e a ela responder, e

nesta resposta procurar promover novas possibilidades existenciais na medida em

que ajude o outro e a si mesmo a avançar em sua abertura, transformando seu pro-

jeto.

No atendimento, Roberto frustrou-se por perder uma partida de jogo e empur-

rou objetos que estavam à sua volta. Intervimos, transferindo esse comportamento

para sua vivência na escola, onde freqüentemente é testado (Quadro R9. C7).

Para Paulo (2005), a intervenção nos aspectos emergentes e na compreensão

da problemática do indivíduo está relacionada à prática do psicodiagnóstico

interventivo.

Em outro atendimento com Roberto, com o objetivo de mostrar sua facilidade

em fazer contas, habilidade que não admitiu, possibilitamos vivenciar uma situação,

provando com sua própria experiência que foi capaz (Quadro R11. C12).

Para Ancona-Lopez (1987) não há interpretação sem relação com o presente,

o significado não é permanente ou rígido, não é uma propriedade do objeto, se faz

na relação.

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Agrupamento 4:

Penetrar no mundo do paciente livre de suposições teórica.

No atendimento a Roberto nos mostrávamos, por vezes, acessíveis às suas

necessidades, não direcionando as atividades, propiciando o entendimento de como

estava se sentindo (Quadro R13. C14).

Com Lucas mostramo-nos disponíveis para poder compreendê-lo; mesmo

quando fazíamos observações que não eram bem recebidas, respeitávamos seu

momento e não insistíamos.

Em outra situação com Lucas, propusemos uma forma de solucionar determi-

nada dificuldade (exercício de matemática), e utilizamos a estratégia correta, a com-

paração, conhecimento que já havia adquirido para solucionar esse problema (Qua-

dro L6. C14).

No encontro com Carlos, procuramos transferir uma ação que experimentou

com sucesso para sua vida escolar. Destacamos que foi treinando o "Jogo de Pali-

tos" que se aperfeiçoou, e que pode agir da mesma forma, exercitando-se, para a-

prender na escola (Quadro C9. C14). Objetivei com essa intervenção valorizar o co-

nhecimento que o cliente trazia.

Yehia (1995) destaca que, para que seja eficiente, a intervenção deve perten-

cer ao campo de possibilidade do cliente, margeando aquilo que ele não compreen-

de, uma vez que, se estiver distante deste campo, ela poderá não ser compreendida

e ser recusada por ele.

No atendimento a Carlos reportamo-nos à sua experiência com seu avô, com

quem aprendeu e praticava o "Jogo de Palitos". Destacamos que poderia usar a

mesma estratégia para aprender (Quadro C8. C11).

Ao fazer esta intervenção, reportando-nos ao passado, em que conseguiu a-

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prender, procuramos fazer com que, no presente, retomasse a mesma estratégia.

Para Ancona-Lopez (1987), a interpretação "opera sempre no interior de um

conjunto de relações já interpretadas, num todo relacional. Portanto, ela nunca é a

captação sem pressupostos de algo previamente dado. Vemos e compreendemos o

presente por meio das intenções, modos de ver e preconceitos que o passado nos

transmitiu" (p.16).

Roberto, por meio do desenho, manifestou o desejo de aprender com liberda-

de, deitado na grama, conversando, olhando as estrelas. Aceitamos esta situação

idealizada, e informamos também desejar vivenciá-la (Quadro R14. C16).

Essas atitudes do psicólogo no atendimento identifica-o com o que Munhoz

(1995) salienta, ou seja, que o momento mais rico desse trabalho tem sido aquele

que é possível penetrar no mundo das crianças, colocando-se em seu lugar, sentin-

do o que sentem.

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CCoonnssiiddeerraaççõõeess FFiinnaaiiss ____________________________________________________

O objetivo de identificar os recursos utilizados na relação psicólogo-cliente, pa-

ra o atendimento de crianças com diagnóstico de TDAH e queixa de dificuldade de

aprendizagem, visando o entendimento de si próprias para lidarem com suas dificul-

dades, foi alcançado.

Isso fica evidenciado pela análise de recortes do atendimento, realizada a partir

das categorias levantadas a partir da fundamentação teórica baseada em autores

como Ancona-Lopes (1987, 1995) e Santiago (1995) sobre o Psicodiagnóstico Inter-

ventivo de abordagem Fenomenológica Existencial.

O primeiro agrupamento das categorias – Incluir o cliente no processo de diag-

nóstico –, como mostra a comunicação a Carlos de que buscaríamos formas de aju-

dá-lo (Quadro C1. C1), e a oportunidade dada a Roberto para que escolhesse o que

fazer e orientar-me nas atividades (Quadro R1. C1) reiteram Ancona-Lopes (1987) e

Santiago (1995). Ancona-Lopez quando afirma que o psicodiagnóstico interventivo é

um processo de intervenção relacionado à noção de que todo contato psicólogo-

cliente pode ser um momento significativo para ambos, quando se adota postura

dinâmica, ou seja, quando a fala do cliente pode trazer o entendimento ao psicólogo

que, por sua vez, redimensionará esse mesmo entendimento. Santiago quando afir-

ma que intervenção é um compartilhar de um trabalho compreensivo de forma a es-

cutá-lo, estabelecendo um verdadeiro diálogo. É necessária uma atitude continente

e empática com o paciente, e isso implica incluir o paciente no processo diagnóstico.

Para isso, demos liberdade ao cliente, para escolher a atividade, e quando dirigido

fizemos isso com sua concordância.

O segundo agrupamento das categorias – Abrir uma clareira no existir do paci-

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ente – foi identificado em diferentes situações, por meio de comandas para clarificar

determinado momento do cliente, como ao solicitar que desenhasse de forma a mos-

trar como entendia determinada situação: "Como você se sente na sala de aula"

(Quadro L4. C6); "Como alguém aprende" "Como alguém ensina" (Quadro C3. C6);

relacionar uma característica pessoal que dificultava o seu desempenho com obje-

tos, clarificando seu entendimento do seu modo de ser (Quadro R7. C6). Essas situ-

ações ratificam Ancona-Lopez (1995) quando menciona que "a iluminação ou clarei-

ra que se abre no existir do cliente de algum modo desestrutura o estabecido" (p. 9).

Visando essa abordagem,utilizamos como recursos desenhos e objetos para mostrar

como se sentiam.

O terceiro agrupamento de categorias – A intervenção clarifica o que o paciente

diz e mostra –, reflete-se em quando reintera, num ato de apoio, o significado do de-

senho feito por Lucas, um personagem com a boca muito aberta, gritando: "Uma

prova atrás da outra!" (Quadro L7. C18); ao interpretar com Carlos seu desenho,

possibilitando entender como ele estava no momento, e conversar sobe os resulta-

dos do teste WISC-III (Quadro C7. C18); e ao que Roberto demonstrou por meio de

seu desenho "Como alguém aprende" e "Como alguém ensina" (R12. C18). Ancona-

Lopez (1987) afirma que "interpretar não é decifrar; é dar a ver, dar a ver o sentido

do fenômeno tal como o apreendi".

Mediante a relação psicólogo-cliente foi possível refletirmos sobre o significado

dos desenhos que usamos como recursos. Refletimos a respeito das experiências

trazidas pelos clientes por meio do diálogo, recurso também utilizado, que facilitou o

entendimento de sua forma de agir.

O quarto agrupamento – Penetrar no mundo do paciente livre de suposições

teóricas – evidencia-se no diálogo com Carlos em que aponto ter aprendido treinan-

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do (Quadro C9. C14); ao procurar refletir com Lucas a respeito de sua agitação e

mostrar que, pela estratégia da comparação, é possível aprender (Quadro L6. C14);

e quando Roberto é atendido em sua necessidade de explorar o consultório, ocasião

em que lhe foi esclarecido que não há certo nem errado quando se trata de desenho

(Quadro R13. C14).

Segundo Yehia (1995), para que a intervenção seja eficiente deve pertencer ao

campo de possibilidades do cliente margeando aquilo que ele não compreende, uma

vez que, se estiver distante desse campo, ela poderá não ser compreendida ou ser

recusada por ele (p. 20). Reportamo-nos a essa contribuição teórica na relação psi-

cólogo-cliente, permitindo que fizessem o que desejavam, colocando-nos acessível,

foi possível interagir de forma significativa, possibilitando novos esclarecimentos a

respeito de suas dificuldades e facilidades.

Identifiquei nos três casos as seguintes similaridades: comportamentos de insa-

tisfação e frustração consigo próprio.

Identificamos alguns recursos que favoreceram a relação psicólogo-cliente,

numa prática em que objetivamos o conhecimento de si próprio, o que propiciou a

identificação de estratégias apropriadas que amenizassem suas dificuldades.

Com esta pesquisa foi possível identificarmos os aspectos emocionais relevan-

tes nas crianças, no que apresentavam em comum e em particular.

Reiteramos, conforme a fundamentação teórica referente ao atendimento e aos

recursos na relação psicólogo-cliente, que esses recursos permitiram que a criança

fosse ouvida no que desejava, fazendo-a sentir que nos colocávamos acessíveis,

propiciando a ela a possibilidade de uma interação de forma significativa e esclareci-

da a respeito de sua problemática.

Os três clientes demonstraram estar esgotados em relação à dinâmica escolar,

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insatisfeitos, sentiam desejo de estar fora da escola. Demonstravam-se incapazes,

com baixa auto-estima, pois, mesmo tendo acesso a momentos de capacitação, a-

presentavam dificuldades em percebê-los.

Em uma situação problemática em que o cliente não se considerava capaz pa-

ra solucioná-la, a análise dos recortes de atendimento mostrou que, por meio dos

recursos expressivos e do diálogo, outras perspectivas permitiam ampliação de seu

autoconhecimento, favorecendo-o a ultrapassar dificuldades.

A partir desta pesquisa, poder-se-ia sugerir estudos de acompanhamento do

processo de aprendizagem do aprendiz com comprometimentos devido ao TDAH.

Caberia uma investigação sobre as dificuldades de aprendizagem, após a interven-

ção psicológica favorecedora do entendimento de si próprio e de suas atitudes, que

primaria pela compreensão e enfrentamento de suas dificuldades na escola.

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FFoonntteess ccoonnssuullttaaddaass ____________________________________________________

ANDRÉ, M.; LUDKE, M. Pesquisa em educação. São Paulo: Editora Pedagógica Universitá-

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AAnneexxooss ____________________________________________________________________________

ANEXO 1

CARTA DE INFORMAÇÃO AO SUJEITO DA PESQUISA

Com o objetivo de identificar as Características Emocionais encontradas em clientes

no consultório de Psicologia que apresentam com Transtonro de Déficit de Atenção Hipera-

tividade, estamos realizando uma pesquisa a esse respeito.

As informações serão colhidas dos prontuários da clinica de Psicologia

Os dados coletados e analisados farão parte de uma pesquisa a ser apresentada à

Universidade Presbiteriana Mackenzie para a obtenção do título de Mestre em Distúrbios do

Desenvolvimento.

Esclarecemos que os participantes poderão abandonar a pesquisa e retirar sua parti-

cipação a qualquer momento.

São Paulo, ....... de ................................ de 2006.

Prof. Dra. Elcie F. Salzano Masini Marisa de L.V.Pacheco

Universidade Presbiteriana Mackenzie Psicóloga/Psicopedagoga

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ANEXO 2

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Pelo presente instrumento que atende às exigências legais o(a) senhor(a)

.......................................................................... sujeito de pesquisa, após leitura da CARTA

DE INFORMAÇÃO AO SUJEITO DA PESQUISA, ciente dos serviços e procedimentos aos

quais será submetido, não restando quaisquer dúvidas a respeito do lido e do explicado,

firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de concordância em participar da

pesquisa proposta.

Fica claro que o sujeito de pesquisa ou seu representante legal podem a qualquer

momento, retirar seu CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO e deixar de participar do

estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo trabalho realizado torna-se informação confi-

dencial, guardada pela força do sigilo profissional.

São Paulo, ....... de ............................... de 2006

Assinatura do representante legal

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ANEXO 3

RELATO RESUMIDO DAS ENTREVISTAS COM PAIS

Caso Roberto

Em dezembro de 2004, os pais de Roberto nos procuraram para orientações e atendimento

psicológico do filho que já havia passado pelo médico neuropediatra e psicopedagoga, tendo sido diagnosticado com transtorno de Déficit de Atenção Hiperatividade.

Esteve tratamento medicamentoso por uma ano. Foram orientados a procurar tratamento psicológico pela psicopedagoda que realizou a avalia-

ção psicopedagógica. A queixa dos pais era que o filho tinha dificuldades de aprendizagem e de relacionamento,

mostrava-se resistente em atender as orientações dos pais e professores. Realizamos quatro encontros com os pais, no período de final de dezembro a janeiro de 2005,

visando esclarecê-los, orientá -los e informá-los a respeito da forma de intervenção. Combinamos dois encontros semanais com o filho.

No quarto encontro com os pais, fizemos a devolutiva. Retomamos o nosso encontro de de-zembro em que mencionaram as dificuldades do filho. Relatamos que Roberto era muito crítico com ele mesmo, tinha medo de errar, e achava que sempre fazia as coisas erradas (baixa auto-estima). Era bastante impulsivo, não aceitava perder (baixa resistência a frustração), tinha dificuldade para fazer o combinado, apresentava comportamento rígido e se irritava facilmente.

Orientei-os para que restringir as cobranças ao Roberto ao que fosse necessário e conversas-sem de forma clara com o filho.

Foi combinado que teríamos encontros com a coordenadora e professora da escola, para ser informada sobre o desempenho de Roberto e orientá-las no que fosse possível.

Roberto esteve em acompanhamento de ludoterapia durante três meses, depois iniciamos in-tervenção na abordagem psicopedagógica, que durou nove meses.

Após este período, por dois meses passou a ser atendido uma vez por semana, mediante veri-ficação que estava acompanhando as aulas e tendo bom aproveitamento e melhorou o convívio soci-al, teve alta.

Caso Carlos

Em setembro 2004 encaminhados por neuropediatra atendemos os pais de Carlos, que nos procuraram visando orientação devido ao diagnosticado com Transtorno de Déficit de Atenção Hipe-ratividade de seu filho.

O neuropediatra o medicamento por dois anos. Os pais relataram que seu filho estava na 5ºsérie e apresentaram a queixa de que tinha dificul-

dade para aprender, e envolvia-se constantemente em brigas, tendo já sido reprovado na escola. Explicamos sobre o psicodiagnóstico e que teríamos dois encontros semanais com Carlos e

encontros com eles. Com os pais foram realizados 4 encontros, visando esclarecimentos de ambas as partes. No quarto encontro fizemos a devolutiva, retomamos sua queixa de que o filho ia mal na escola

e estava sempre envolvido em brigas. Relatamos que Carlos apresentou inteligência normal e esclareci sobre as facilidades e dificul-

dades, mencionamos que era bastante impulsivo,apresentava tendência a reações agressivamente o que dificultava as relações sociais

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Orientamos para que procurassem dialogar com o filho visando esclarecê-lo em suas dificulda-des, o ajudassem a perceber as consequências de seu comportamento bem como valorizar os aspec-tos positivos que apresentava.

Colocamos a necessidade da intervenção psicológica para auxiliar Carlos e que teríamos en-contros com os pais para conversarmos sobre as dificuldades e acertos encontrados. Informei a res-peito da necessidade de mantermos contato com a escola para orientá-los e recebermos informações sobre o seu desempenho.

Após o psicodiagnósotico fez seis meses de ludoterapia , uma vez por semana, após esta in-tervenção iniciou atendimento psicopedagógico.

A 6º série ocorreu de forma satisfatória. Em 2006 na 7º série apresentou dificuldade relaciona-da a maior complexidade das disciplinas e impulsividade.

Caso Lucas

No mês de maio de 2004 os pais de Lucas nos procuraram encaminhados pela escola do filho,

havia passado por avaliação com neurologista tendo sido diagnosticado comTranstorno de Déficit de Atenção Hiperatividade.

Os pais nos relataram que Lucas estava na 6º série, apresentava dificuldade para aprender e relacionar-se com amigos. Havia tomado medicamento por três meses mas naquele momento não mais estava tomando.

Expliquei a respeito do psicodiagnóstico e informei que teríamos alguns encontros para escla-recimentos.

Foram realizados cinco encontros com os pais. No quinto encontro fizemos a devolutiva relatamos que Lucas apresentou acentuada agitação e

esta ocorria independente da situação que se encontrava. Tinha conhecimento de como se apresen-tava em sala de aula e que isso comprometia a sua aprendizagem, apresentava dificuldade para lidas com a angustia e sentimento de inadequação.

Orientamos -os para auxiliá-lo, quando possível, sobre o seu comportamento e que juntos bus-cassem formas para amenizar essa dificuldade.

Informei sobre a necessidade do acompanhamento de ludoterapia e encontro com os pais para auxiliá-los nas dificuldades e na busca de estratégias para amenizar as dificuldades.

Os pais foram orientados para que procurassem novamente um neuropediatra para novos es-clarecimentos, inclusive em relação a medicação. Os pais tiveram encontro com o neuropediatra e os pais decidiram não medicamentá-lo.

Foi combinado que teríamos encontros com a coordenadora da escola para maiores esclareci-mentos e orientação.

Lucas esteve em acompanhamento de ludoterapia por 6 meses, apresentando maior esclare-cimento e controle sobre o seu comportamento depois iniciamos intervenção psicopedagógica, atua-mos com intervenção psicopedagógica por 8 meses. Lucas apresentou maior acertividade e buscava recursos para superar as dificuldades, as vezes conseguindo utiliza-los as vezes não.

Após este período mudou de cidade esclarecemos a necessidade de continuarem com o a-campanhamento psicopedagócico.

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ANEXO 4

RECORTES DOS ATENDIMENTOS

Caso Carlos

Primeira sessão

A sala do consultório media 4m de largura por 7m de comprimento, contendo dois ambi-

entes divididos por um biombo: um com mesa, cadeiras e armário e outro com armário com jo-gos e livros infantis, caixas de brinquedos, sucatas, papéis, casa de boneca e na parede jogo de dardo e lousa branca.

Carlos veio com a mãe, me apresentei, Carlos entrou na sala, perguntei se sabia quem eu era, Carlos para você me ajudar, porque vou muito mal na escola.

Comentei que nós iremos fazer várias atividades, e também conversaremos bastante pa-ra sabermos porque você vai mal na escola e o que fazer para superar isso.

Carlos olhou para a sala, Comentei que ele poderia escolher o que fazer. Carlos dirigiu-se para o espaço dos brinquedos.

Após mexer em jogos como memória, dominó, deu branco, cilada e outros, interessou-se pelo jogo de varetas, perguntou se eu jogaria com ele, confirmei, e iniciamos o jogo.

Carlos mostrou-se atento, cuidadoso, e tinha estratégias para pegá-las, como colocar uma vareta como apoio para a outra escorregar, apertar a ponta da vareta para levantá-la e pe-gá-la na outra extremidade, agachar-se para ver em quais uma estava apoiada. Sabia as regras com clareza, mencionou a diferença dos pontos relacionada às cores diferentes das varetas. Valorizei dizendo que ele era muito com no jogo. Respondeu: é isso eu sei jogar bem, acho que só isso. Respondi: "Precisamos então descobrir em que outras coisas você também é bom. Carlos olha-me atentamente.

No consultório tinha dois jogos de varetas, um com varetas de tamanho normal e outro com varetas do tamanho de uma agulha de tricô. Carlos apontou para o jogo de varetas gran-des e perguntou este também eram varetas; confirmei; Carlos perguntou se podíamos jogar, e falei que sim.

Carlos fez vários comentários sobre o tamanho das varetas, não as conhecia assim, jo-gamos, Carlos aplicou as mesmas técnicas e várias vezes ganhou.

No final do encontro falei para Carlos que gostaria de ter outros encontros para entender sua dificuldades e buscarmos formas de minimizar suas dificuldades na escola. Carlos concor-dou, combinamos as datas dos encontros, nos despedimos de forma amistosa.

Segunda sessão

Carlos entrou e logo quis jogar varetas, e jogamos. Depois de algumas jogadas ele quis mudar de jogo, escolheu o "jogo da velha", e jogamos. Às vezes ele ganhava, às vezes eu ga-nhava. Mencionei: você não é mal nisso, havia aprendeu legal. Carlos sorriu. Perguntei sobre qual era a sua dificuldade na escola, ele falou que gostaria de estar na 7a série; perguntei por quê, ele falou que já teria aprendido tudo isso, e que na verdade deveria estar na 6a série, mas repetiu a 1 a.

Comentei que as coisa pareciam confusas, que para ele devia ser chato estar na 5a série querendo estar na 7a sendo que, se não tivesse repetido estaria na 6a série, mas 5a é a série que ele estava. Carlos comentou que era chato estar na 5a série. Comentei que poderíamos conversar mais sobre isso.

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Carlos escolheu jogar o jogo de varetas, jogamos. Jogamos com as varetas grandes e com as menores, alternadamente.

Terceira sessão

Carlos entrou na sala, e eu disse que gostaria que ele fizesse um desenho, o desenho que quisesse.

Coloquei lápis e papéis sobre a mesa. Carlos começou a desenhar, fez o desenho com atenção. Desenhou um menino. Quando terminou, pedi para que falasse sobre o desenho. Car-los não entendeu, e eu pedi para que imaginasse quem seria aquela pessoa, quantos anos te-ria etc. Carlos falou: "é um menino, tem 13 anos, gosta de andar de skate e estuda na (mencio-na uma das melhores escolas da região, conhecida por ter ex-alunos aprovados na USP), é muito inteligente, e está no 1a do Ensino Médio.

Comentei que talvez ele gostaria de ser este garoto, e Carlos falou "Oh!". Continuei: "pa-rece que você fica muito preocupado com a idade e com a série em que a pessoa está na esco-la, e você faz confusão". Carlos questionou: como assim? Continuei: "Será que dá para um ga-roto de 13 anos estar na 1a série do Ensino Médio?". Carlos falou: "por que não?". Comento: "Faça a relação com a idade e com a série: com 13 anos estaria na 7a série!". Carlos percebeu o engano. E disse: é mesmo. Eu continuei: "Você também falou sobre a série quando disse que gostaria de estar na 7a". "Acho que você não está bem onde está". Carlos sorriu.

Carlos perguntou se eu queria jogar palitinhos, jogamos. Perguntei "Como aprendeu?" Carlos respondeu que seu avô o ensinou quando era pequeno e que ele era bom nisso. Per-guntei se ele jogava muitas vezes. Responde que sim, quase sempre. Pergunto se demorou para aprender a jogar dessa forma, se foi difícil? Carlos respondeu que no começo perdia, de-pois só ganhava. Eu continuei, então você aprendeu treinando! É treinar também é uma forma de se aprender na escola. Roberto fez expressão que entendeu e continuamos a jogar.

Quarta sessão

Expliquei que gostaria que ele fizesse alguns desenhos (casa - árvore- família) e que conversaríamos sobre os mesmos e poderíamos compreender como ele estava no momento. Carlos concordou. Fez o desenho de uma casa. Após ter desenhado, perguntei sobre a casa. Carlos falou que era a sua casa de campo, era grande, bonita, tinha muito espaço. Comentei: "Diferente da escola". Carlos respondeu: "Muito diferente!".

Pedi para desenhar uma árvore. Carlos desenhou um coqueiro. Após ter desenhado, perguntei onde estava o coqueiro. Carlos falou que estava numa praia lá na Bahia. Perguntei como estava o tempo, se tinha muita gente? Carlos falou que estava calor, que tinha muita gen-te na praia, jogando bola, tomando sol. Mencionei: "Você queria estar lá?". Carlos confirmou: E como!.

Pedi para Carlos desenhar uma família. Desenhou três pássaros voando. Depois de ter desenhado, perguntei quem são, e ele disse que era uma família de pássaros: pai, mãe e filho. Perguntei para onde estavam indo. Carlos mencionou que iam para as montanhas. Comentei: "Lá também deve ser muito bonito!". Carlos confirmou, exclamando "Oh"

Comentei com Carlos que os três desenho eram sobre lugares, livres, alegres e festivos. Perguntei se ele gostava muito desses lugares. Carlos confirmou. Perguntei se a escola para ele parecia um pouco com isso. Respondeu que não. Questionei perguntando: Será que quan-do você está na escola fica pensando nesses lugares? Carlos respondeu que ficava pensando na casa de campo. Indaguei: Então não dá para prestar atenção na aula? Carlos silencia

Depois Carlos comentou sobre a escola: um colega brigou com outro, ele foi separa-los e bateu naquele que ele julgava estar errado. Como eu não entendi pedi para me explicar melhor. Carlos mencionou que eles estavam brigando devido o jogo de futebol que a gente faz no re-creio, ele foi separá-los e bateu no que estava errado.

Falei que achava estranho, foi separa-los e acabou batendo, você poderia ter desejado

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separar os dois mas "puxou" a briga para você. Carlos pareceu estranhar e perguntou "Como assim?" . Respondi: "Eu entendi assim: Havia duas pessoas brigando, você foi separá-las, se-parou e bateu em um menino, puxou a briga para você!" Carlos faz expressão que entendeu e ficou pensativo, se cala.

Quinta sessão

Expliquei para Carlos que gostaria que ele iniciasse uma atividade, que era um teste que consistia em diversas atividades, expliquei que o teste serve para verificar as facilidades e difi-culdades que uma pessoa possui em alguns aspectos.Disse que após analisa-los explicaria os resultados. Carlos aceitou fazer o teste.

Depois Carlos falou da professora que brigou com ele; contou que uma menina disse pa-ra a professora que ele estava jogando bolinhas de papel, a professora brigou com ele, e ele xingou a menina de forma muito agressiva. Perguntei como ele tinha xingado a menina, e ele falou "com palavrões". Falei que parecia que ele não conseguia se controlar e isso poderia ser uma confusão, porque acabava brigando com os colegas. Respondeu que brigava mesmo. Mostre dois pápeis, um pequeno e outro grande. Falei que acontecia algo do tamanho do papel pequeno e ele sentia e respondia proporcional ao papel de tamanho grande. Carlos entendeu o comentário balançando a cabeça em sinal de afirmação.

Sexta sessão Carlos completou o WISC III. Carlos quis jogar palitinhos, misturou os dois jogos de palitos que havia no consultório, os

grandes e os pequenos. Jogamos. Carlos gostou da atividade e mencionou que assim ficava mais difícil, era mais legal.

Sétima sessão

Comento que gostaria que ele fizesse dois desenhos, explico que através dos desenhos

conversaríamos como ele aprende. Peço para desenhar "Como Alguém Aprende" e "Como al-guém ensina". "Como alguém aprende" Carlos desenha uma orelha e escreve do lado som."Como Alguém Ensina" Carlos desenha olhos, nariz e uma grande boca.

Converso com ele que parece que para ele aprender só basta escutar o que o outro tem para falar e questiono:mas será é mais do que isso. Carlos respondeu que sim.

Comento: Pense como o seu avô ensinou você jogar palitinhos. Carlos fala ensinando, questiono: mas como? Carlos responde: ele jogava sobre a mesa os palitos e me ensinava a pegar. Você pegava? Carlos responde: pegava. Comento, então a gente aprende fazendo, se seu avô só falasse e você escutasse provavelmente não teria aprendido a jogar com facilidade. Carlos fica pensativo.

Oitava Sessão (Devolutiva)

Comentei que conversaríamos sobre o que fizemos durante os nossos encontros e que

gostaria de iniciar com o teste de inteligência (WISCIII), mostro o teste e explico: você tem faci-lidade em aritmética, conhecimento da seqüência lógica, sabendo organizar histórias com iní-cio, meio e fim. Carlos pergunta: aquelas histórias dos quadrinhos então eu fui bem? Respondo que sim, como também naquelas perguntas de matemática. Carlos comenta "Mas eu vou mal na escola". Respondo que entendo o que diz, mas você possui condições para aprender. Car-los olha-me com atenção. Comento: você tem dificuldade para compreender as palavras, falta vocabulários, o que contribui com que vá mal na escola. Roberto comenta: Eu não entendo ge-ografia, história... Respondo: Eu sei disso, você deve ter dificuldade para entender o que a pro-fessora explica e o que está escrito. Você entende, compreende o que a professora fala? Res-

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ponde: muitas vezes não. Eu continuo:É nós temos que encontrar estratégias para amenizar suas dificuldades. Carlos balança a cabeça confirmando.

Conversamos sobre as atividades realizadas: o seu desejo de ser diferentes, estar em outra série, achar que vai mal em tudo (baixa auto-estima), querer estar num lugar diferente da escola, o envolver-se em discussões com colegas de classe e as coisas ficarem pior (impulsivi-dade), a idéia errônea que aprender não está relacionado com a fazer, ou seja só relacionado ao escutar.

Carlos fica atento e demonstra entender o que falo. Comento que gostaria de continuar tendo encontros com ele para que continuássemos as

nossas conversas e buscássemos formas de amenizar suas dificuldades. Informei que teria um encontro com seus pais para esclarecedor sobre suas dificuldades

e se poderia conversar com os pais sobre o que havíamos falado. Carlos responde que sim.

Caso Lucas

A sala do consultório media 4m de largura por 7m de comprimento, contendo dois ambientes

divididos por um biombo: um com mesa, cadeiras e armário e outro com armário com jogos e livros infantis, caixas de brinquedos, sucatas, papéis, casa de boneca e na parede jogo de dardo e lousa branca.

Primeira Sessão

Lucas veio com a mãe, me apresentei, Lucas entrou na sala, perguntei se sabia quem eu

era, respondeu que a mãe mencionou que eu era psicóloga, e que eu poderia ajudá-lo. Lucas andou pela sala, mexeu nos brinquedos e sentou-se junto a mesa.

Comentei que nós iriamos fazer várias atividades, e também conversaríamos. Perguntei como as coisas estavam, respondeu "É muita coisa" , levantou-se e foi até a janela, depois a-briu a caixa de brinquedo, pegou um avião e brincou de forma bastante agitada, com movimen-tos rápidos,

Comentei que parecia que o avião estava desorientado e indaguei: será que você tam-bém estava assim? Lucas falou da prova de matemática, português, história, falou de forma confusa. Comentei que não entendi direito para me explicar melhor. Lucas falou " deixa pra lá".

Perguntei o que ele queria fazer, respondeu desenhar. Eu coloquei papéis sobre a mesa e Lucas pegou os lápis, desenhou um sol depois pe-

diu tinta e pintou. Parecia um sol com a boca costurada. (P.psicóloga, L. Lucas) P.: O que é? L.: É um sol? P.: Mas parece que está com a boca costurada. L.: É isso mesmo. Falei que deveria ser horrível ter a boca costurada, não poder falar. Lucas fala que todos

falam mal dele. Comento não é que é ruim ter a boca costurada , acho que ele tinha vontade de costurar a bocas das pessoas para não falarem mal dele. Lucas sorri, e fala que a pintura pre-cisa secar.

Como estava próximo do término da sessão falei para Lucas que gostaria de ter outros encontros para entender o que eram "aquelas muitas coisas" e buscarmos formas de minimizar suas dificuldades, Lucas concordou, combinamos as datas dos encontros , nos despedimos de forma amigável.

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Segunda Sessão

Nessa sessão Lucas veio direto da escola, trouxe a mala e a jogou num canto. Pretendia retomar o desenho "do sol" mas devido a forma que entra no consultório, parece muito irritado (rosto sério, testa franzida) , dou a opção para escolher o que fazer. Escolheu jogar. Jogamos " jogo da velha" , ele perdeu e fala: droga.

Anda pela sala, vai até a janela, eu mencionei que é chato perder. Lucas falou vamos jo-gar dama, aceitei, montamos o tabuleiro. Lucas apresentou dificuldade para jogar, movimentou as pedras de forma errada, queria fazer tudo rápido. Vou orientando sobre as regras. Jogamos ele ganhou. Ao terminar volta a andar pela sala.

Comento você percebeu, nos jogamos, você perdeu e andou pela sala, depois você ga-nhou e também andou pela sala. Você não consegue ficar parado.

Lucas responde, não consigo mesmo. Mencionei que a agitação que ocorre independe das facilidades (ganhar o jogo) ou difi-

culdade (perder o jogo). Lucas me olha de forma séria. Lucas já havia mencionado que as pessoas falam mal dele. Minha intenção nesse mo-

mento é procurar saber como ele percebe isso. Mencionei: Lucas , no encontro passado, você falou que as pessoas falam mal de você,

porque? Lucas respondeu: Faço as coisas erradas. Peço para me explicar melhor. Lucas abre a

mala, pega sua apostila. A capa está quase solta, abre a apostila na disciplina matemática, a-ponta os exercícios e fala: Errado, Errado. Anda pela sala e volta a sentar-se. Levanta vai até a janela, volta, e meche no material.Menciono: é as coisas não estão fáceis para você. Você não consegue parar (me referi à agitação) , isso pode atrapalhar você conseguir aprender, não a-prendendo, você irá cometer erros e irá receber críticas. Lucas franze a testa.

Lucas volta a andar pela sala e comenta: É, eu não consigo parar. Ao término da sessão nos despedimos de forma amigável.

Terceira Sessão

Lucas entra e fala que quer desenhar, faz um desenho e colagem, um personagem com

a boca muito aberta gritando: " Uma prova atrás da outra! Estudar muito!" Perguntei como as-sim? Lucas respondeu: "Estou tendo provas todos os dias". Respondi; "Deve estar muito difícil para você, se pudesse, gostaria de gritar assim na escola! Lucas sorri e fala: é isso aí.

Lucas falou vamos jogar, concordei, fomos para o tapete e escolheu o jogo que tem o nome " Jogo deu Branco" . O jogo consiste em um da dupla tirar a carta, lê o que está escrito, por exemplo: objetos cortantes e o outro tem que falar dentro de um tempo dado por um tempo-rizador, tudo que lembrar sobre o tema exemplo: faca, tesoura, estilete..., depois inverte-se ti-rando nova carta. Ganha a jogada quem falar mais coisas no tempo estipulado. Jogamos Lucas perdeu. Comentei: Você fica muito agitado. Será que foi por isso que você perdeu, esqueceu diversas palavras, deu branco? Lucas pela primeira vez deu muita risada. Comento: Parece que você gostou da coincidência das palavras "Deu Brando" em você e o nome do jogo é "Deu branco". Perguntei: Será que também dá branco na escola? Lucas confirma, balançando a ca-beça. Mencionei: que droga que isso acontece!

Como terminou o horário nos despedimos.

Quarta Sessão

Nesta sessão solicitei que gostaria que desenhasse "como ele se sente na sala de aula". Lucas desenhou um rosto, com os lhos por onde saem setas, apontando para todos os lugares.

P.: me explica o que você desenhou? L.: está olhando para todos os lados. P.: que difícil e cansativo ficar olhando para todos os lados. Como então deveria ficar na

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sala de aula? Rapidamente pega um lápis para desenhar. Desenhou um rosto de um menino destacando os olhos, sem setas. P.: e agora, o que é? L.: Prestando atenção, olhando para a professora. Conversamos sobre o desenho, mencionei que parecia ser muito difícil para ele ficar o-

lhando para a lousa e prestar atenção no que era ensinado, embora soubesse que precisava fazer isso. Lucas presta atenção na nossa conversa.

Lucas quis jogar velha, as vezes ele ganha, as vezes eu ganho. Apresenta o mesmo mo-

vimento de andar pela sala.

Quinta Sessão

Perguntei você gostaria de fazer mais desenhos de "Como Você Sente-se na Escola. Lu-cas desenhou o rosto de um menino com a palavra história entrando por um ouvido e saindo pelo outro, colocou símbolos não decifráveis.

Comentei: isso também é bastante difícil pois parece que você escuta algo e não entende nada. Perguntei como deveria ser ?

Lucas desenhou um rosto de um menino com a palavra história entrando por um ouvido e saindo pelo outro.

P.: o que é? L.: é um aluno na aula de história e no dia da prova sabe responder. Comentei: O que você fez é muito legal, você está percebendo como é em sala de aula e

como deveria ser. E isso é muito importante, porque você poderá tentar mudar essa situação. Lucas olha-me com atenção, de forma mais relaxada. Lucas concorda e combinamos que

poderíamos criar situações que facilitaria ter mais atenção. Lucas escolheu jogar dama, jogamos as vezes ganhava as vezes perdia.

Sexta Sessão

Lucas entrou com a mala, colocou a mala sobre a mesa e a abriu, tirou um caderno e

uma apostila, andou pela sala, em seguida pegou também na caixa de brinquedos dois carri-nhos, um avião e dois dinossauros e colocou sobre a mesa. Abriu o caderno com intenção de mostrar-me algo, mas logo se distraiu com os brinquedos. Comentei: espera aí. Levantei peguei um lençol e cobri os brinquedos e perguntei: Será que fica melhor, você consegue abrir o ca-derno e me mostrar o que quer? Sorriu abriu a apostila na disciplina de matemática.

Conversei com ele que se colocasse muita coisa na mesa, logo iria se distrair e não faria nada. Perguntei se agia da mesma forma em sua casa e na sala de aula. Lucas responde que não daquele jeito, mas fazia. Pedi para experimentar só colocar a apostila, o caderno, um lápis, caneta e borracha.Balança a cabeça concordando.

Retomamos a apostila na disciplina de matemática, apontou a dificuldade em matemáti-ca. Mostrou-me um exercício, expressão numérica, em que para realizá-lo é necessário cálcu-los em diversas etapas. Pedi para que fizesse novamente um exercício que já havia errado em sala de aula. Lucas fez o exercício da mesma forma errado. Comparamos os dois exercícios, observamos que havia feito da mesma forma, todas as etapas. Sugeri que observássemos e comparássemos com um exercício similar e correto. Lucas percebeu o erro, comparando as e-tapas. Valorizei falando que ele sabia sim, só tinha duvida em uma passagem e o mais legal sabia corrigir comparando. Lucas sorri.

Sétima Sessão

Comento que gostaria de conversar sobre o que fizemos nestes dias. Lucas concorda.

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Falo que quando iniciamos eu indaguei como estava e mencionou que "era muita coisa" , e ele não estava conseguindo se sair bem na escola. Falei que um das dificuldades, nós tínhamos conversado quando ele desenhou como se sentia na sala de aula, tinha dificuldade para prestar atenção, e raiva por não conseguir (desenho do sol com a boca costurada), foi muito legal quando percebeu que conseguia aprender comparando exercícios de matemática, a agitação estava sempre presente, e isso dificultava aprender de uma forma geral (escola e jogos) e que no encontro que coloquei o lençol sobre a mesa separando os materiais da escola e os brin-quedos foi possível perceber como ele se comporta, misturando tudo, e mais uma vez dificul-tando as "coisas para ele".

Comento que gostaria de continuar tendo encontros com ele para que continuássemos as nossas conversas e buscássemos formas de amenizar suas dificuldades.

Mencionei que teria um encontro com seus pais para esclarecer sobre suas dificuldades e se poderia conversar com os pais sobre o que havíamos falado. Lucas responde que sim.

Caso Roberto

Os encontros foram realizados em sala medindo 4m de largura por 7m de comprimento, con-

tendo dois ambientes divididos por um biombo: um com mesa, cadeiras e armário, e outro com armá-rio com jogos e livros infantis, caixas de brinquedos, sucatas, papéis, casa de boneca e, na parede, jogo de dardo e lousa branca. Primeira sessão

Roberto veio acompanhado pela mãe. Apresentei-me, pedi para que entrasse. A mãe fi-

cou aguardando na sala de espera. Falei que era psicóloga e perguntei se ele sabia por que es-tava ali comigo. Roberto responde que sim, e que ia mal em tudo.

Roberto olhou a sala com curiosidade. Percebo que está precisando falar, mas explorar o consultório atrai mais sua atenção, atendo sua necessidade e mostro o consultório. Mostrou cu-riosidade pelos jogos e pergunta sobre os mesmos. Escolheu jogar dardos e colocou as regras: valeriam os pontos do tabuleiro: se caísse no meio, valeria o menor ponto; também disse que deveríamos ficar na quarta lajota para lançar o dardo. Roberto fica agitado, joga rapidamente e com força. Fez a soma dos pontos mentalmente e falou: eu ganhei! Valorizei-o dizendo que era muito bom tanto no lançamento de dardos quanto nas contas. Roberto respondeu que não era bom nas contas. Fala com seriedade e franze a testa. Retomei o cálculo, pedindo para ele fa-lasse os pontos de cada jogada, anotei-os na lousa, e fui apontando os números e somando. Comentei: você pode não ser bom em outras coisas,mas nestas contas você é bom.Roberto responde: "Não sou bom, não!". Falo que entendo o que está falando, mas o que observo é di-ferente, tanto as contas que fez de cabeça como as que fizemos na lousa deu o mesmo resul-tado. Olha-me atentamente. Aceito o seu parecer e continuamos o jogo.Faltando por volta de 10 minutos para o término de sessão o avisei do tempo, continuamos a jogar, depois fomos até a mesa, falei que gostaria de ter outros encontros com ele para verificar e entender porque ele vai mal em tudo, Roberto concorda, o informei sobre os horários nos despedimos de forma afe-tiva (beijo).

Segunda sessão

Roberto entrou, olhou a mesa perguntou se poderia desenhar; eu falei que sim. Senta-

mos, ele de frente para mim. Coloquei papéis sulfite, lápis preto e colorido sobre a mesa. Ro-berto perguntou se teria régua; dei-lhe a régua; ele fez uma estrela grande, com ângulos bem delineados. Falei que estava muito bonita, e Roberto falou que só sabia fazer coisas com ré-gua. Perguntei por que. Ele respondeu que sem régua ficava tudo torto, feio. Falei que aqui ele poderia fazer seus desenhos sem régua, mesmo se os achasse feios, pois, para mim, desenho

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era desenho. Pedi para tentar fazer um sem régua. Roberto franziu a testa e olha-me estra-nhando o meu comentário. Inicia o novo desenho sem régua.

Fez o desenho de uma casa, com porta, janela, chaminé e jogou o lápis no chão. Acolhi a angústia comentando: "Que chato que o desenho não saiu como você queria, mas aqui não tem certo nem errado quando se trata de desenho". Ficou parado muito sério, depois pegou ou-tro lápis preto, e fez menino e menina jogando futebol, jardim com flores e árvore, várias famí-lias de animais, pássaros voando, sol. Conforme desenha não me manifesto, Roberto desenha com movimentos rápidos.

Valorizei o desenho comentando que tem bastante detalhes e que ficou muito lindo. Perguntei: Você gosta disso? (me referi ao seu desenho que parecia um lugar no campo).

Roberto sorri e balança a cabeça. Depois retomei, eu achava havia ficado bonito e que o lápis que estava no chão não tinha

culpa que o desenho não ter saído como ele gostaria e que ele era muito duro com ele mesmo. Perguntei o que ele achava disso (me referi ao comportamento de jogar o lápis no chão)?

Roberto me olhou e disse "Eu fico com raiva" Como o horário estava terminando, combinamos dividir o tempo no próximo encontro. Ele escolheria o que iríamos fazer no início da sessão, de-pois eu escolheria.

Terceira sessão

Iniciei o encontro retomando o que havíamos combinado no último encontro. Ele escolhe-ria o que iríamos fazer primeiro; depois eu escolheria .

Roberto escolheu jogar dama. Conhecia as regras. Jogamos, e ele perdeu, ficou irritado, fez cara feia, empurrou o jogo. Mencionei que às vezes, quando as coisas saíam erradas, ele jogava longe, empurrava. Parecia que queria tirar aquilo de sua frente. Roberto me olha, eu continuo: "É ! aqui tem certo e errado, você fez a jogada errada e perdeu". Roberto abaixa a cabeça. Eu retomo a fala "Será que você empurra a lição e para de fazer as coisas na escola quando erra? Se faz isso, pode ser uma encrenca, porque na escola passam várias atividades, se não fizer ou fizer errado pode se dar mal. Você quer conversar sobre a escola ?" Roberto responde "Não gosto de fazer contas, não sou bom em contas. Lá tem têm que fazer muitas coisas e sai errado"

Falei que estava achando estranho o que ele dizia, porque em um dos nossos encontros fez contas de mais, que na escola chamam de adição, de cabeça.E parecia bom nisso. Roberto respondeu que lá (na escola) não.

Falei que, conforme o combinado, eu queria escolher o que fazer, e escolhi jogar "trilha". Roberto balançou a cabeça e falou que não queria. Falei: "Puxa, também é difícil para você fa-zer o que foi combinado, o que o outro pede.Antes você não quis jogar porque jogou errado e perdeu, agora você não quer fazer o que combinamos. Você fala muito "não". (tomo cuidado ao falar, para que ele não perceba meu comentário como crítica e sim como uma forma de agir). Roberto silenciou, olhou para baixo , ficou pensativo. Perguntou: Vamos jogar dardo? Respondi que sim e jogamos. Ao terminar a sessão falei que na próxima sessão eu gostaria de escolher primeiro, e ele escolheria depois.

Quarta sessão

Roberto entrou e mencionei o combinado. Peço para desenhar porque percebo que Ro-berto já é mais flexível nesta atividade. Falei que gostaria que ele fizesse dois desenhos, você falou que as coisas não dão certo na escola, com estes desenhos poderemos conversar sobre porque as coisas não dão certo na escola.Roberto concordou.

Coloquei papéis e lápis sobre a mesa. Roberto mexe no material.Pedi como tema para o desenho "Como Alguém Aprende". Roberto perguntou: "Como assim?". Orientei: Desenhe do que uma pessoa faz para aprender.

Roberto desenhou uma mulher sentada, uma mesa, uma menina com algo grande na

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mão da menina, desenhou uma estrela sem usar régua. Depois pedi para desenhar "Como Alguém Ensina". Roberto desenhou casa e três pes-

soas. Falou que desenhou em forma de palitos porque era mais fácil. Fez vários pontinhos e uma estrela.

Retornei ao desenho "Como Alguém Aprende" e perguntei, apontando para a mulher, quem era? Roberto falou que era a professora ensinando a menina. Perguntei o que era aquilo na mão da menina. Roberto falou que era o caderno. Comentei que, embora a menina estives-se sorrindo, poderia ser muito difícil para ela carregar aquele caderno, pois era muito grande e devia ter muita lição. Roberto sorri e concordou. Eu continuei: "Puxa! Parece que a mesa da professora é mais alta do que a menina, deve ser difícil para ela aprender, não dá para ela ver direito o que a professora escreve no caderno".Roberto olha para o desenho movimenta a ca-belça em sinal de entendimento. Comento: "Quando você iniciou aqui, falou que ia mal em tudo, será que é difícil para você aprender, como a menina do desenho? Roberto responde "não gos-ta de fazer lição, eu erro quando escrevo". Respondo que entendo, silenciei.

Depois peguei o desenho "Como alguém ensina" e pedi para falar sobre o desenho. Ro-berto falou que estavam num sítio, deitados na grama, conversando, olhando as estrelas. Falei "Seria maravilhoso se a gente pudesse aprender assim, e o mais legal seria aprender como ele falou: "conversando".Roberto sorri.Continuo: Conversar é um falar e o outro escutar, e depois quem escutou fala e o outro escuta, é essa troca". Roberto ouvi com atenção e sorri.

Roberto falou que ele escolheria então o que fazer. Concordei. Escolheu Dardo. Pergun-tei como poderíamos jogar. Roberto falou que igual ao outro dia: se caísse no meio valeria o ponto menor. Roberto fala rápido e gesticula. Jogamos, ele faz o cálculo de cabeça, ele ga-nhou.

Quinta sessão

Ao entrar, Roberto falou que queria jogar o Jogo da Velha. Jogamos, ele perdeu, ficou ir-ritado, cruzou os braços, fez cara feia, não empurrou o jogo.

Comentei que para ele perder era insuportável, fazer o que o outro pedia também, e que a forma como agia fazia com que parecesse uma pedra, e as pedras são duras e podem ma-chucar, e que talvez fosse mais legal ele experimentar às vezes ser esponja, que é macia.

Perguntei se queria que eu trouxesse esponja e pedra no próximo encontro para continu-armos o nosso papo, e Roberto falou que sim.

Roberto perguntou se podia escolher o que fazer. Confirmei. Escolheu jogar dardo, a mesma forma impulsiva. Comentei que parecida que ele tinha que jogar aquele jogo porque não conseguia ficar parado. Fez a soma de cabeça e ganhou.

Sexta Sessão

Providenciei uma pedra e uma esponja, Ao entrar falei que havia trazido a pedra e a esponja. Brincou com apedra esponja, com-

parando-as primeiro com olhos aberto e depois fachados, em seguida colocou-as na água. Roberto aceitou e falou: pedra é pesada! P1: E o tamanho? R2: Grande. P: E se cair no pé? R: Machuca P: E a esponja? É grande ou pequena? R: Grande. P: E se cair no pé?

1 Psicóloga. 2 Roberto.

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R: Não machuca. Falei que poderíamos fazer a brincadeira com os olhos fechados. Roberto concordou. P: A pedra é quente ou fria? R: Fria e dura P: E a esponja? R: É mais quente e macia Propus colocá-las na água, e brincar. Roberto aceitou. Peguei uma bacia e "brincamos"

de mexer com a pedra e com a esponja na água. Conversamos que a água entra na esponja e que não entra na pedra.

Conversei com Roberto porque eu havia falado que ele parecia pedra: era porque ele era bravo (rígido), tinha dificuldade para aceitar o que o outro falava, como a pedra (não entra á-gua). Poderia ser legal experimentar ser esponja: aceitar que às vezes pode perder, errar, não sendo tão duro consigo próprio. Ouvir o que o outro fala, como a esponja, que aceita a entrada da água, assim provavelmente, poderia se dar melhor na escola.

Brinca movimentando a pedra e a esponja na água.

Sétima sessão

Roberto entrou e falou que queria brincar com a pedra e a esponja. Peguei as duas e fi-zemos as mesmas "brincadeiras". Depois de "brincarmos" sobre as características das duas, comentei que, quando havia falado, no encontro anterior, que ele parecia pedra, é que ele pa-recia ser sempre pedra, "aí não dá certo". Roberto olha-me com atenção.

Brincamos de pegar a pedra e a esponja e relacionar com o que acontecia no seu dia-a dia.

P: jogar o jogo longe quando perde? R: Pedra. P:Achar que seus desenhos são sempre feios? R: Pedra P: Não fazer o combinado? R: Pedra Eu peguei a esponja e perguntei: Qual a situação que se parece mais com uma esponja? R. sorriu e falou: Eu sei R: Fazer o que o outro pede? P: Esponja R: Fazer a lição? P: Esponja R: Atender quando a mãe chama para o almoço? P:Esponja Roberto entendeu a brincadeira e continuamos, fala de forma vibrante sobre várias situa-

ções vivenciadas por ele. Ao final Roberto perguntou se poderia chamar a mãe para mostrar a pedra e a esponja. Respondi que sim. Chamou a mãe, pegou a pedra e falou: Isto parece quando eu estou bravo e não quero fazer as coisas, e a esponja, quando não estou.

A mãe falou que estava entendendo a "brincadeira", comentou que ele havia conversado com ela sobre a pedra e a esponja e que ele parecia pedra. Despedimo-nos.

Oitava sessão

Roberto brincou com a pedra e esponja e falou sobre quando se comportava como pedra e como esponja. Exemplificava: fez a lição em classe – esponja; não quis anotar a lição de casa – pedra...

Mencionei quando iniciamos os nossos encontros ele falou que ia mal em tudo, e nas nossas conversas, através dos desenhos, jogos, conversamos sobre como ele estava neste momento: quando jogava falava as regras de forma clara, era bom em contas, não aceitava

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perder, tinha dificuldade para fazer o combinado, e se irritava facilmente, tinha raiva e medo de errar, gostaria que a escola fosse diferente é tudo isso contribuía para ter dificuldade para a-prender.

Mencionei que gostaria de continuar com os nossos encontros, tínhamos que conversar e fazer muitas coisas para amenizar sua dificuldades. Comentei sobre o encontro que teria com os pais e que eu estaria falando com eles como ele estava neste momento. Roberto menciona fala da pedra e da esponja. Comento: Tá legal.

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